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UNIDADE 2

2
Criação e desenvolvimento
das teorias sobre a
operacionalidade da mente em
J. Bruner
Objetivos de aprendizagem
 Compreender e analisar a natureza da percepção.
 Analisar o processo de aprendizado na perspectiva do
modelo Human Information Processing.
 Identificar os processos de desenvolvimento do
pensamento.
 Analisar a influência da Cultura sobre o modelo de
desenvolvimento.
 Compreender as “inteligências múltiplas” com base na
teoria de Gardner.
 Identificar aspectos que relaciona o desenvolvimento do
homem e sua história evolutiva.
 Identificar os elementos do desenvolvimento cognitivo á
luz da teoria piagetiana.

Seções de estudo
Seção 1 A natureza da percepção
Seção 2 Influência da cultura sobre o modelo do
desenvolvimento

Seção 3 Howard Gardner e a tese das inteligências


múltiplas

Seção 4 Relacionamento entre o desenvolvimento


do homem e a sua história evolutiva

Seção 5 A natureza da explicação do


desenvolvimento cognitivo

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Para início de estudo


Qual origem tem a experiência? É o resultado dos nossos
poderes essencialmente associativos (Associacionismo) ou seja,
é a conseqüência do uso das nossas categorias inatas de espaço e
tempo (Inatismo); é reduzível apenas aos dados de experiência
experimental que nós acumulamos como respostas aos estímulos
ambientais (objetivismo); é a prova da natureza física e biológica
dos nossos estados mentais (fisicalismo) ou seja, ao contrário, a
afirmação da eficácia causal da própria mente (mentalismo)?

SEÇÃO 1 -A natureza da percepção


Para iniciar este estudo, que tal um questionamento? com quais
meios os seres humanos se representam na sua experiência
do mundo, durante o seu crescimento e, em que modo
organizam para os usos futuros daquilo que eles
encontram?

O problema de partida pode ser assim resumido: o


que nos informam as nossas observações com relação
à natureza do mundo ou a natureza da mente? É
possível separar umas das outras?

Na origem, podemos situar um livro de E. Mach que fez


escola. Publicado nos últimos anos do século passado The
analysis of Sensation e traduzido para o italiano L’analisi delle
sensazioni e il rapporto tra fisico e psichico, Feltrinelli, Milano
1995, o autor sustenta que é possível interpretar a experiência
quer seja externa, isto é, como um mundo fora de nós, quer seja
interna ou subjetiva. A. Einstein elaborou a tese de E. Mach da
seguinte forma: o mundo, considerado do exterior, nunca pode
ser autônomo com relação ao ponto de referência do observador.
Isso assinala para o paradigma gnoseológico do nosso século, em
que P. Manet lembra o caso de um pintor contemporâneo de E.
Mach, que sintetizou assim o espírito da coisa: “A natureza não
é senão uma hipótese”.

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Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

Mas, se este era o estopim, a pólvora explosiva foi acesa por


alguns jovens pesquisadores de Harvard que, logo após a segunda
guerra, deram vida exatamente a um movimento de estudos sobre
a percepção, que eles mesmos chamaram New Look on Perception.

As atividades pelo menos formalmente, tiveram início, meio


século atrás com uma série de publicações (Bruner e Postman,
1947; Mc Ginnies 1949; Postman, Bruner, Mc Ginnies,
1948) nos quais se sustentava que a percepção dos estímulos
externos não é dissociada dos caracteres dos eventos internos:
comportamentos, valores, expectativas, defesas psicodinâmicas
são todos os fatores que influenciam a percepção. Esta posição se
tornou notória com o termo genérico de New Look (M. Erdelyi,
1974).

O aprendizado na perspectiva do modelo Human Information


Processing
Nesta perspectiva, se insere o modelo HIP: Human Information
Processing (geralmente traduzido como “Elaborazione Umana
dell’Informazione”, Elaboração Humana da Informação) que
me parece ter oferecido uma contribuição fundamental seja
ao seio das teorias cognitivistas, seja em relação ao estudo do
aprendizado.

Por quanto à tradição cognitivista tivesse encontrado ilustres


representantes desde o início do século passado, e alguns destes
(por exemplo: James e Bartlett) tenham sido utilizados também
por recentes métodos HIP, se pode dizer que a orientação HIP
tenha sido emersa com fortes elementos inovadores, consentidos
não só da maturação da reflexão teórica e dos desenvolvimentos
da pesquisa, mas também das novas possibilidades oferecidas
por sofisticadas técnicas experimentais (se pensa, por exemplo,
naquelas análises de tempo de resposta absoluta ou diferencial na
ordem de milisegundos) e de simulações feitas no computador.

O impacto do método HIP sobre os estudos acerca


do aprendizado foi imenso, modificou radicalmente a
maneira de considerar e estudar a área, produziu uma
elevada quantidade de modelos e dados concretos,
levou a algumas aplicações (a exemplo no campo do
aprendizado de leitura, escrita, cálculo, linguagem)
de grande sucesso, determinaram articulações e
diversificações notáveis.

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Não é evidentemente possível dar-se conta de tudo que aconteceu


na história deste método, entre 1960 e hoje, mas poderemos
brevemente recordar alguns conceitos fundamentais e, em
seguida, determo-nos em uma das primeiras e mais clássicas
exemplificações (o modelo de Atkinson e Shiffrin, pela primeira
vez ilustrado em uma publicação de 1968). No meu modo de ver
o método HIP tem o mérito de haver evidenciado o papel dos
processos ativos de elaboração realizados pelo indivíduo e de ter
desenvolvido metodologias, em condições de não se limitar a
uma genérica descrição da atividade cognitiva humana, mas de
precisar natureza, limites e relações dos processos subordinados.

Para fazer isto, o método é baseado em alguns componentes


fundamentais: estudar por si mesmo e por o seu relacionamento
com o aprendizado; processos de análise de informação; atenção e
consciência; memória breve; memória semântica e organização do
conhecimento; processos de recuperação da informação.

Os primeiros modelos HIP de memória distinguiam entre


algumas estruturas fundamentais da memória (o registro
sensorial, a memória de breve duração, a memória de
longa duração) que eram concebidas como os arquivos
(portando estruturas permanentes), com uma determinada
capacidade. Com o tempo foram desenvolvidas posições
teóricas e para tal os termos “arquivos” foram substituídos
pelos termos “categorias diferentes de processos”: a
memória de breve duração não seria um particular arquivo
de memória, mas uma forma particular de elaboração
(portanto de processo) volta a obter bons resultados com
baixos custos na lembrança de breve duração.

O fluxo de informações através do sistema mnemônico foi


imaginado nos seguintes termos: inicia com a chegada de
estímulos ambientais nos registros sensoriais (receptores +
elementos internos), entra então no arquivo de breve duração
(STS).

Durante o período no qual ele permanece neste nível, a


informação pode ser transcrita no arquivo de longa duração
(LTS), enquanto uma informação, a esta correlata, que se
encontra no LTS pode ser ativada e colocada por sua vez no STS.
Supomos que observamos um triângulo, será fácil então recordar

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o nome “triângulo”. Operações de controle localizadas no STS


influenciam as transferências desta e para o LTS e, portanto,
controlam o aprendizado, a recuperação da informação e o
esquecimento. (Cf. ATKINSON E SHIFFRIN, 1971).

Neste contexto, se desenvolve, portanto, a tendência de examinar,


mediante aqueles processos o sistema-homem, que alcançava
alguns objetivos fundamentais, quais sejam: transformar a
informação externa reduzi-la, selecioná-la, elaborá-la, armazená-
la, e recuperá-la. A transformação se refere, sobretudo, ao
processo inicial, mediante ao qual uma estimulação física (por ex.
com raios luminosos), se transforma em uma informação nervosa
percebida pelos sentidos (por ex. a fase da transdução sensorial).

A informação que provém do exterior é bloqueada


transitoriamente (por um tempo que vai de pouquíssimas
centenas de milisegundos a poucos segundos) em um registro
sensorial e em seguida, alcança a uma fase de reconhecimento
perceptivo (no qual o sujeito coloca em relação a informação em
acesso com os conhecimentos que possui e consegue decifrar
progressivamente um número crescente de características
particulares ou globais do estímulo) e a uma fase de memória
mais longa, mas sempre temporária e conseqüentemente
chamado de curta duração.

Durante esta fase (que necessariamente são concebidas como


sucessivas) o sistema-homem reduz, selecionando, a quantidade
de informações que lhe eram chegadas e as elabora de forma
que possa melhor interpretá-las com base nos conhecimentos
que possui. Esta elaboração não serve somente para uma
melhor “percepção” do estímulo (pelo qual, até este ponto
poderemos pensar que sejam implicados processos perceptivos
primários), mas serve implicitamente (se não havia a intenção
a propósito do sujeito) ou explicitamente (se havia a intenção)
no armazenamento da informação que, se tornou um vestígio
mnemônico não tão preciso, reaparecerá ou deverá então ser
reencontrada (ou - como hoje se diz – recuperada) no momento,
o qual desta se terá necessidade.

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Podemos descrever um processo humano como


uma série de linhas de programas, mesmo que,
às vezes, este puder correr o risco de levar a uma
descrição excessivamente microscópica das fases que
constituem o processo. Muitos modelos processuais
(assim com muitas análises do trabalho) se voltam
então, a individualização das fases fundamentais do
processo que podem ser tais para comprometer uma
vasta área cognitiva e inter-relações mais ou menos
consistentes com outras fases, e que por outro lado
devem permitir uma confirmação empírica.

A última exigência pode ser, todavia, mais ou menos sentida: em


certas linhas de pensamento da denominada “ciência cognitiva”
e da pesquisa sobre a inteligência artificial que se contenta
fundamentalmente em encontrar que os passos individuados
constituem um conjunto coerente e são reproduzidos em
uma máquina. Para outra linha de pensamento, mais ligada à
pesquisa empírica ou mais em particular a pesquisa experimental
– se requer que exista um indicador e uma prova empírica da
existência e da relevância daquele passo.

Mas se este é o caminho – em grandes linhas, que é desenvolvido


nestes últimos quarenta anos....

Mas como conhecemos a realidade? O que é então


a concepção antropológica?

Observar é deformar, aproximar-se é dissolver. No entanto, classificar


é necessário para perceber o existente e elaborar as nossas idéias.

O pensamento não pode se desenvolver sem operar uma


classificação seja com relação aos objetos dos quais os nossos
sentidos percebem a existência, ou seja, com relação às idéias
que elaboramos. Esta atividade – o classificar tão radicado em
nós, que não estamos mais conscientes de exercitá-la, - consiste
em delimitar o campo das diversas categorias por nós definidas:
ao lado de cá de um determinado limite os seres humanos e
os objetos classificados pertencem à classe A ou a classe B.
Classificar equivale portanto a colocar limites.

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Toda a visão da realidade circunstante vem de


tal modo colocada em discussão. A aposta em
conseqüência nunca é alta. Todavia corremos
continuamente o risco de nos fazer presos pelas
atitudes, com o resultado de definir superficialmente
classes totalmente arbitrárias e de resignar-se na
ilusão dos resultados assim obtidos.

Melhor dizendo, nos arriscamos em crer que os limites colocados


por nós mesmos, sejam os dados objetivos, presentes na natureza
das coisas, porém ao contrário não são outra coisa que o
resultados abstratos do nosso raciocínio. Vamos a um exemplo:

Uma das primeiras exigências de quem observava o


céu, era aquela de classificar as estrelas. Era natural
classificá-las segundo seu caráter distintivo mais
evidente: a intensidade luminosa. Foram criadas
então, categorias de grandezas; a cada estrela foi
atribuído um grau que vai de “primeira grandeza” a
“vigésima grandeza”. De tal forma que se corre o risco
de acreditar que a grandeza seja uma propriedade
intrínseca do astro, enquanto esta característica não é
própria do objeto em si, mas da visão com a qual nós
o percebemos; esta corresponde de fato, à soma de
dois fatores: a luminosidade própria da estrela e a sua
distância.

Mas, tudo somado, uma visão distorcida com relação às estrelas,


tem uma importância bastante relativa. O risco, ao contrário,
é bem mais grave quando procuramos classificar os homens,
traçando fronteiras entre eles, definindo assim as “raças”.

Naturalmente estabelecemos as nossas classificações baseando-


nos nos aspectos exteriores: estatura, cor da pele, tipo de cabelo,
conformação do crânio (dolicocéfalos ou braquicéfalos). Toda
a antropologia do século dezenove obstinou-se em classificar
as raças humanas baseando-se em determinadas características
físicas, colocando muita atenção em métodos e técnicas de
medições sempre mais precisas. Especializava-se em medidas
que chegavam a por em evidência uma série de diferenças: por
exemplo, entre os “nórdicos” (olhos azuis, cabelos loiros, forma

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oblonga do crânio) e os árabes (olhos escuros, cabelos negros,


crânio redondo).

O erro deste método reside no fato de que não existe


um critério para definir as características a serem
examinadas. Foram acesas intermináveis discussões
com relação ao número de raças humanas: hoje
parece evidente que este número pode ser que seja 1
(a raça coincide com a espécie) ou seja, 4. 400.000.000
(as raças são tantas quantas o número de indivíduos
existentes na terra). Todos os números intermediários
são, portanto, válidos. Querer classificar baseando-se
na aparência não leva a nada.

No início deste século acreditou-se de se poder dar finalmente


uma base objetiva à classificação das raças humanas, não
considerando mais as aparências (fenótipos), mas os fatores
hereditários (genótipo). Não se ocupava mais com a cor ou a
forma, mas do sistema circulatório ou imunológico.

Em um primeiro momento, mudando completamente a ótica,


foram colocadas em foco certas diferenças entre as populações
asiáticas ou populações do leste da Europa, ricas de genes B
(do sistema ABO), e as populações do Oeste europeu pobres de
genes B e ricas de genes A. Mas, progressivamente que os dados
são aumentados, e foram multiplicados os sistemas estudados,
as coisas se complicaram e o quadro se tornou confuso. Hoje,
os estudiosos de genética admitem não ser possível definir as
várias raças; pelo contrário são concordes na conclusão de que o
conceito de raça humana não é operativo e deveria, portanto, ser
excluído do campo da pesquisa científica.

Pode parecer um paradoxo, que a aquisição de um número


crescente de dados, acabem por esconder a realidade, em vez de
esclarecê-la. Na verdade, trata-se de um processo constante,
do qual os físicos do século vinte não tem feito outra coisa
senão tolerar as conseqüências. No passado, se podia estudar a
matéria somente nos aspectos observáveis pelo homem; com o
progresso das técnicas mais ou menos sofisticadas de observação
ao microscópio se é chegada a inesperada constatação que não
se sabe mais de que coisa se fala, quando se nos apresenta uma
“partícula”, um grão de matéria e onda ou freqüência ao mesmo

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tempo (e ainda menos quando se trata de quark). Aproximando-


se do objeto, constatamos que ele esvai-se e desaparece.

Esta barreira que desafia a nossa sede de conhecimento foi


admiravelmente ilustrada por Michelangelo Antonioni no filme
BloWup. Uma mancha sobre uma fotografia parece indicar a
presença, em uma moita, de uma possível testemunha ou o autor
de um delito. Para vê-lo melhor basta ampliar a foto, mas a cada
ampliação a mancha se esfuma e em fim desaparece.

Observar é deformar; aproximar-se é dissolver. Para concluir, nós


não classificamos nunca objetos ou homens, mas representações
particulares que arbitrariamente consideramos como essenciais.

A classificação que lentamente se cria neste modo


não é, talvez, mais arbitrária do que aquela obtida
objetivamente partindo da descrição das atividades
científicas e empregando competentes cálculos e
princípios ordenadores? No fim das contas estas se
fundam sobre pessoas mais que sobre os objetos
estudados. Mas porque não deveria ser assim?

O problema é que nós somos tentados, uma vez traçadas as


fronteiras, de acreditar na sua realidade objetiva, de projetar
sobre espaços delimitados os nossos instintos de propriedade e de
defesa do território, também quando estes espaços são abstratos e
pouco apropriados como as disciplinas científicas.

SEÇÃO 2 -Influência da cultura sobre o modelo do


desenvolvimento
Segundo Bruner, o desenvolvimento tem lugar através um
processo que vai tanto do interior para o exterior, quanto
do exterior para o interior do sujeito humano.

Tal processo consiste no desenvolvimento de


amplificadores da capacidade motriz, sensitiva e reflexiva
transmitida por uma cultura. Diversas culturas fornecem
amplificadores diversos em épocas diversas da vida da
criança: ou seja, o processo do desenvolvimento humano

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não procede paralelamente nas diversas culturas, e todavia é


legítimo comparar algumas uniformidades, apesar da diferenças,
no desenvolvimento das diversas culturas humanas.

Mas, atenção! Isto significa simplesmente que o


desenvolvimento cognitivo é inconcebível sem a
participação em uma cultura e da sua comunidade
lingüística.

O estudo da mente ou dos mecanismos do pensamento reativou,


no curso dos séculos, um interesse sempre crescente. Aristóteles
propôs por primeiro as regras para identificar a produção de
processos inferenciais formalmente corretos, colocando desta
forma os primeiros fundamentos da lógica formal.

Deste tempo depois foi aberto porém, um grande


problema de relacionamento entre o pensamento
e a lógica. O que é em efeito a lógica com relação
ao pensamento? Um modelo ideal de correto
funcionamento através do qual este deve voltar-se?

Neste caso, o pensamento deve ser considerado imperfeito com


respeito à lógica, e então desejoso, para melhor se organizar, para
aderir às prescrições desta.

Vice-versa a lógica propriamente, porque produzida


pelo próprio pensamento, deve fixar-se somente
em um de seus modos de funcionamento; e então
como tal, muito limitada com relação ao potencial
desenvolvimento completo do próprio pensamento?

Qualquer um que pense nas produções do pensamento no âmbito


artístico, ou em outro setor criativo, pode confrontar que não
existe alguma intervenção direta da parte da lógica formal.

Seja como for, por muitos anos a lógica permaneceu como o


único gênero de descrição dos mecanismos do processo do
pensamento humano.

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Em épocas mais recentes se tem assistido, por outro lado, uma


pesquisa sobre o comportamento do homem, ou seja, sobre o
pensamento no sentido lato, que se é baseada sobre a pesquisa
motivacional, utilizando-se talvez do único método possível neste
setor: a pesquisa introspectiva.

A introspecção porém, não pode ser considerada um método


verdadeiramente científico porque é vago o objeto da pesquisa
e porque todavia as sensações internas não são confrontáveis
ou quantificáveis. Assim a lógica de um lado e a psicologia por
outro, o estudo da racionalidade e o estudo dos impulsos, tiveram
procedimentos semelhantes, até pelo menos os primeiros anos
deste século, de forma em tudo autônoma e separada. O mérito do
comportamentalismo
Foi propriamente o desejo de objetividade na pesquisa do tipo foi aquele de ter
psicológico que foi possível o advento do comportamentalismo. reconduzido a observação
Segundo este tipo de impostação metodológica, o único psicológica somente aos
aspectos reproduzíveis e
objeto possível para uma psicologia cientifica é constituído do
mensuráveis: os estímulos
comportamento manifesto. O artífice desta revolução foi John de um lado e as reações a
Broadus Watson que em 1913 publicou um artigo - manifesto estes correspondentes por
intitulado A psicologia segundo os comportamentalistas. outro.

Veja um exemplo:

Uma observação conduzida segundo os cânones do


comportamentalismo observa a ligação direta entre
a visão e a percepção olfativa do alimento (estímulo)
de um lado, e o aumento repentino da salivação
(resposta) por outro lado. Nada a mais.

Mas, o apanágio deste tipo de psicologia foram inevitavelmente


as associações estímulo-resposta mais simples. O acesso
interpretativo aos comportamentos mais complexos apresentava,
ao contrário, um preço a ser pago: ocorria formular a hipótese
de uma série de cadeias internas latentes de estímulos e respostas,
antes que fosse possível observar uma resposta externa finalmente
evidente. Isto em um certo sentido forçava os cânones de
observabilidade desejados pela teoria.

Estes arcos reflexos foram considerados mediações internas


do tipo fisiológico, ou seja, ações nervosas–reações musculares.

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Todavia, como é fácil intuir, a sua observação resultou antes,


sempre problemática.

Em setembro de 1948, ocorreu no campus do Califórnia


Institute of Technology um congresso importantíssimo,
indicado por muitos expertos, como o efetivo ato de
nascimento da ciência cognitiva: o Hixon Symposium.

Uma das intervenções mais apreciadas foi aquela


do psicólogo Karl Lashley, o qual observou que o
comportamento complexo como soar um instrumento
musical ou falar, não é concebível uma elaboração
seqüencial em cadeia, assim como vinha proposta pelo
comportamentalismo.

A execução de um trecho musical é costumeiramente muito


veloz para que seja considerado como o tempo necessário para
a retroação, isto é para que seja a nota precedente a fazer as
funções de estímulo necessário para a produção da nota sucessiva
(resposta). Na produção da linguagem o lapsus linguae, ou seja,
a antecipação de palavras que deveriam comparecer somente
muito mais avante no desenvolvimento da frase atestam que não
é verdade que exista um desenvolvimento de tipo seqüencial.
Existem mais verossimilmente, segundo Lashley, os planos gerais
de ação que coordenam as ações mais específicas.

Um passo ulterior para frente, produzido pela nascente ciência


cognitiva, foi a reconsideração quanto a natureza daquilo que
acontece no interior do homem uma vez recebido o estímulo.
Tolhidos os vínculos fisiológicos ligados às exigências de
observações com medições diretas dos efeitos, é possível conceber
de maneira diferente também as “operações” internas. Estas
são concebidas agora como verdadeiras e próprias operações de
cálculo mental.

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A análise de quanto acontece na fase de elaboração da Karl Lashley tinha razão


informação (fase interna) é um tipo de investigação que pode em afirmar que existem
planos gerais de nível
ser conduzida no âmbito de seis disciplinas diferentes: filosofia, superior que – agora
psicologia, neurociência, antropologia, inteligência artificial e sabemos – dependem
lingüística. Cada uma destas é potencialmente interessada em exclusivamente do
decodificar a natureza e a tipologia das operações empregadas em programa a ser seguido,
um determinado processo elaborativo. Estas operações podem que coordenam os
níveis inferiores, mais
estar entre as mais variadas possíveis. Em muitos casos a sua específicos, de ações as
individualização e a sua descrição não geram nenhum problema. quais são contrárias na
maioria das vezes ligadas
A moderna ciência cognitiva se baseia sobre o assunto teórico, às características do meio
muitas vezes demonstrado, que é possível a individualização, para proposto a execução.
certos comportamentos ou para certos programas a ser seguido,
de todas as operações que, uma vez coordenadas, nos permitem a
execução ou a expressão.

A análise e a individualização destas operações podem ser


conduzidas por cada uma das diversas disciplinas que compõem a
ciência cognitiva; o setor de competência varia naturalmente em
base ao programa pelo qual vem proposta a análise.

Estamos, portanto, no ponto fundamental da teoria cognitivista:


qualquer coisa ou pessoa estaria em condições – mediante os
próprios mecanismos internos de atuação, qualquer um que
seja – de exprimir um conjunto coordenado de operações assim
como é expresso em um fluxograma, para a execução de uma
determinada performance, demonstraria possuir naquele âmbito
um comportamento inteligente.

O nível mais alto de coordenação entre operações


– independente, como se diz, dos níveis inferiores
que controlam o meio e o método de execução – é o
nível mental: aquele que melhor dizendo, exprime a
inteligência.

Manifestam-se por hora claramente duas coisas: a primeira é


que a inteligência não depende de nada do meio que a exprime
ou a suporta. Referindo-se ao computador, se pode afirmar que
a inteligência resida preferivelmente no software, do que no
hardware. A segunda é que não existe uma inteligência genérica,
assim como não existe um software que esteja em condições de
exprimir performances gerais, mas existem mais freqüentemente,
softwares específicos para performances específicas, na mesma

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medida nas quais são as diversas inteligências. Fala-se assim para


máquinas, de software específico ou de programas aplicativos, e
para o homem de inteligência múltipla.

Existe uma teoria – conhecida mais precisamente como teoria da


computabilidade – segundo a qual um fenômeno é de considerar-
se computável tão somente sendo possível a se individuar o seu
algorítimo de funcionamento. Assim, certos fenômenos físicos
são considerados computáveis tão logo sejam identificados os
conjuntos de relações matemáticas em condições descrevê-
los. São por exemplo computáveis todos os fenômenos de tipo
mecânico.

São de igual forma computáveis muitos comportamentos


produzidos pelo homem.

Em nível de produção industrial, são computáveis todos aqueles


processos nos quais as máquinas podem substituir o homem,
a exemplo isto acontece na quase totalidade dos processos
de produção de um automóvel. De fato é possível descrever,
mediante um específico fluxograma, o procedimento de
construção e montagem dos equipamentos mecânicos. Para
outros tipos de fenômenos são encontrados por outro lado
muitas complicações. Por exemplo, não é simples individualizar
e descrever as operações realmente implicadas nos fenômenos
de uso da linguagem e nos fenômenos da visão, ou seja, nos
processos de reconhecimento de frases e objetos produzidos a
partir das informações contextuais.

Deixamos por um momento à parte, cada consideração de mérito


sobre o porquê desta dificuldade, dado que existem todavia,
alguns métodos que tentam uma identificação das operações
mentais implicadas neste tipo de performance ou procedimento.
Mediante estes métodos não se individualizam as operações
reais que são a base destes procedimentos, mas somente algumas
regras gerais que, descrevem o seu funcionamento.

Para originar este tipo de descrição é suficiente substituir as


operações e os períodos ou as classes de um fluxograma com
uma descrição um pouco mais geral de regras e de situações,
para conservar a estrutura conceitual que caracteriza a ciência
cognitiva. Foi esta a intuição de Bruner. São muitos os autores
que atraem para si a organização teórica da ciência cognitiva e

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Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

que indagam para reconstruir as operações funcionais que são a


base dos comportamentos inteligentes.

— A teoria do conjunto de regras colocadas e interpretadas como


verdadeiras e próprias operações mentais pertencem a um dos autores
talvez hoje mais notório desta escola do pensamento: Howard Gardner.

SEÇÃO 3 -Howard Gardner e a tese das inteligências


múltiplas
Gardner formula a própria definição de
inteligência perfeitamente em linha – em nível
de conceito – com aquela própria da ciência
cognitiva, que se ocupa das operações e não de
seu eventual suporte físico:

Uma inteligência é a capacidade de resolver


problemas, ou de criar produtos, que são
apreciados internamente em um ou mais
contextos culturais. Nota-se que aqui não se
diz nada sobre fontes desta capacidade, ou sobre
os meios apropriados para medi-los.

Então, se soma para especificar que cada inteligência é


constituída de um conjunto próprio de operações único e
irredutível:

Uma tese importante da minha teoria – também se espera


ainda uma verificação adequada – é que cada inteligência é
relativamente independente da outra, e que os dotes intelectuais
de cada indivíduo, por exemplo, em música, não podem ser
inferidas de suas habilidades matemáticas ou lingüísticas ou da
sua capacidade de comunicar-se com outras pessoas.

Um critério importante para a definição das


inteligências individuais é a possibilidade de
isolamento. Um tipo de inteligência, para ser
específico, deve demonstrar a própria relativa
independência das outras de maneira tal que ao variar
a entidade de qualquer uma destas, não venha ser
perturbado, em algum modo, o seu estado.

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Surge neste ponto um problema do qual o próprio Gardner


informa a existência: as performances potencialmente
manifestadas são muitíssimas: por exemplo, uma habilidade
(muito importante em certas culturas) é o reconhecimento
de fisionomias; uma outra habilidade é a agudeza gustativa
e olfativa; existem também as inteligências computáveis, as
quais já foram mencionadas; e muitas outras ainda. Estas e
outras performances satisfazem perfeitamente os requisitos de
isolamento, mas não vêm comumente apreciados como forma de
inteligência.

Em certo sentido, a seleção parece ter sido efetuada por Gardner


segundo as avaliações do senso comum. Assim, a lista das formas
de inteligência que surge são definidas com base nos âmbitos
disciplinares presentes na sociedade dos dias de hoje, em vez de
critérios exclusivamente dedutíveis.

As inteligências assim definidas resultam inscritas em seis


contextos distintos: lingüística; musical; lógica-matemática;
espacial, corpóreo-sinestésica; peculiar.

Gardner propõe oito características para individualizar as


inteligências.

1) isolamento de faculdades mentais em conseqüência de dano


cerebral

Se uma faculdade mental em particular puder ser destruída ou


conservada, isoladamente, na presença de um dano cerebral, se
pode definir como sendo uma inteligência autônoma.

2) idiots savants, prodígios e outros indivíduos excepcionais.

Em muitos casos nos encontramos diante a desníveis consistentes


com relação a uma única faculdade. Às vezes esta se acentua
com relação ao nível médio de outras; ou por outro lado é a única
faculdade que conserva um nível de normalidade em relação a um
quadro cognitivo geral com forte degradação (como é o caso de
algumas crianças autistas). Isto consente de individualizar, ainda
uma vez, as inteligências autônomas.

70

teoria.indb 70 28/9/2007 16:13:23


Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

3) Uma operação ou um conjunto de operações centrais


identificáveis.

Sustenta Gardner: no coração de minha noção de inteligência há


a existência de uma ou mais operações ou mecanismos basilares
de elaboração da informação, em condições de ocupar-se de tipos
específicos de input.

Depois prossegue especificando o que se torna crucial para estar


em condições de identificar estas operações centrais, localizar o
substrato neural e demonstrar que estes núcleos são efetivamente
separados.

Vem então explicitamente evidenciada por Gardner esta atenção


pela ciência cognitiva com relação a pesquisa das operações com
base em performances inteligentes individuais.

4) Uma história de desenvolvimento característica, juntamente


com um complexo definível de performances “terminais”
competentes.

Uma inteligência deve necessariamente ter uma história própria


de desenvolvimento no curso de sua ontogênese.

A identificação desta história de desenvolvimento, e a análise


de sua disponibilidade a ser modificada através do aprendizado,
tem a máxima importância na definição dos traços característicos
desta inteligência.

5) História evolutiva e plausibilidade evolutiva.

A pesquisa das fases evolutivas, conduzidas com relação à


ontogênese, pode ser dirigida integralmente à filogênese.
Neste caso, é essencial individualizar os fatores (um ambiente
particular, a seleção casual de um determinado grupo com
certas características prevalentes) que tem condicionado
o desenvolvimento daquelas formas de inteligência que
caracterizam a espécie humana. Ocorre, porém, prudência: neste
setor as comparações objetivas particularmente insuficientes
deixam o campo aberto ao desenvolvimento de teorias quase que
totalmente especulativas.

Unidade 2 71

teoria.indb 71 28/9/2007 16:13:23


Universidade do Sul de Santa Catarina

6) Provê a sostegno ou support tests fornecidos de pesquisas


psicológicas experimentais

A psicologia cognitiva pode por si mesma formular modelos


em condições de explicar quais habilidades são a base de um
determinado tipo de inteligência, e confrontar em seguida estes
modelos experimentalmente.

7) Prove a sostegno ou support tests fornecidos de resultados


psicométricos

Os resultados de experiências psicométricas podem contribuir


para convalidar as formulações teóricas com relação a certas
faculdades. Também se alguns métodos do passado são hoje
convenientemente em desuso (ex. Q. I.) permanece de qualquer
maneira, aberta a possibilidade de operar de forma construtiva
e eficaz um levantamento quantitativo que reveja determinados
caracteres específicos e desenvolver sobre este as observações
eficazes.

8) Propensão em codificar um sistema de símbolos

Boa parte da representação e da comunicação humana ocorre


através de sistemas de símbolos, assim com grande parte
da informação transita propriamente através estes sistemas:
linguagem, figuras, matemática, são apenas três destes sistemas
que o homem utiliza para sua sobrevivência quotidiana.

Parece que cada uma das áreas cognitivas particularmente


desenvolvidas no homem, tenha requerido, em certo nível de
desenvolvimento, a fruição de um sistema simbólico específico.
O confronto de um sistema simbólico poderia ser então a
individualização indireta de uma inteligência específica feita
através daquela que parece ser uma exigência particular.

Nesta oportunidade, é possível propor um pequeno resumo


daquelas estratégias que em um contesto mais amplo são
classificadas como inteligências.

72

teoria.indb 72 28/9/2007 16:13:23


Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

INTELIGÊNCIA LINGUÍSTICA
Na análise dos cânones basilares da composição poética, Gardner
tomou a iniciativa de algumas sugestões de colocações gerais que
T. S. Eliot ofereceu ao jovem poeta inglês Keith Douglas.

Após este ter comparado ele mesmo uma coluna em


uma casa de vidro, Eliot perguntou: Você diz entender
que também é de vidro? Referindo-se depois a uma
sucessiva comparação do poeta com um rato, Eliot
denuncia a aparente contradição: Eu penso que você
não deveria ser um pilar e se assemelhar a um rato na
mesma estrofe.

Estas sugestões valem, em geral, para toda a poesia proposta


pelo jovem. Nesta, até o fim, se fala de uma casa e de uma
senhora morta em seu quarto no andar superior; a poesia quer
exorcizar a senhora morta para persuadi-la a abandonar a casa.
Observa Eliot que o exorcismo acontece quando acontece – sobre
os espíritos para induzi-los a abandonarem as coisas materiais;
neste caso o ritmo descritivo contido na poesia parece mudar
radicalmente a coisa: a senhora é descrita de maneira tal, em
transformá-la de maneira muito mais material do que a própria
casa que deveria abandonar.

Eliot evidencia, em seguida, quer seja uma contradição na


estrutura geral da poesia, quer dizer, entre os termos utilizados
e as modalidades descritivas utilizadas, quer seja entre os termos
usados nas figuras metafóricas.

Observa Gardner: “Eliot estava simplesmente esclarecendo


alguns dos processos pelos quais um poeta pode passar uma vez
que escreve uma poesia”.

O significado das palavras, argumenta Gardner, é constituído,


além da precisa indicação fornecida pela palavra em si mesma
(denotação), como também de toda uma série de encadeamentos
potenciais com outras palavras e com outros significados que
constituem a potência do termo (conotação). A poesia deve criar
um balanceamento entre as palavras e avaliando atentamente
também, os elos de interconexão que os termos lexicais portam
consigo.

Unidade 2 73

teoria.indb 73 28/9/2007 16:13:23


Universidade do Sul de Santa Catarina

Se todas estas últimas operações podem ser atribuídas à esfera


semântica, podemos entender que Gardner individualiza para a
linguagem operações dispostas em dois níveis. Com relação ao
nível sintático ele aceita o modelo de gramática gerativa proposta
por Chomsky; sobre o plano semântico individualiza, sobre a
representação das motivações de Eliot, uma aplicação de critérios
de coerência interna entre os termos, as figuras retóricas usadas e
as conotações destas.

Após este ter comparado ele mesmo uma coluna em


uma casa de vidro, Eliot perguntou: Você diz entender
que também é de vidro? Referindo-se depois a uma
sucessiva comparação do poeta com um rato, Eliot
denuncia a aparente contradição: Eu penso que você
não deveria ser um pilar e se assemelhar a um rato na
mesma estrofe.

O poeta é, portanto, aquele que consegue coordenar de maneira


harmônica também as evocações longínquas que as palavras, que
com suas presenças, induzem fatalmente. Estas são de forma
geral, as operações necessárias à produção poética, mas são
também ações que ostentam uma sua pertinência sobre todo o
uso da linguagem. A tarefa do poeta é alcançar ao seu mais alto
domínio.

Gardner parece então haver identificado algumas operações


gerais que caracterizam a produção poética.

Sem descer as particularidades, se pode observar, com Gardner,


que a linguagem satisfaz os requisitos de isolamento da
performance, com tudo aquilo que isto comporta do ponto de
vista das considerações sobre a inteligência primária.

INTELIGÊNCIA LÓGICO–MATEMÁTICA
Ao contrário do que acontece para as capacidades lingüísticas e
musicais, a competência denominada por Gardner, “inteligência
lógico-matemática” não tem origem na esfera auditiva-vocal.
Parece de fato que ela seja gerada a partir dos primeiros contatos
que o neonato tem com os objetos do mundo externo.

Para compreender os processos de pensamento dos matemáticos,


Gardner se utilizou das reflexões em mérito de Henri Poincarè.

74

teoria.indb 74 28/9/2007 16:13:23


Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

Partindo do pressuposto que a matemática utiliza-


se dos mesmos enunciados da lógica, ele se
perguntou como nunca alguém tenha dificuldade em
compreendê-la?

Poincarè formula a hipótese de que o raciocínio matemático seja


uma seqüência de silogismos onde as conclusões do precedente
sejam a premissa do conseqüente. Porque entre o momento
em que encontramos uma proposição como conclusão de um
silogismo e o momento no qual a reencontramos como premissa
do sucessivo, transcorre um certo tempo, pode ocorrer que vários
anéis da cadeia sejam interrompidos, ou que se tenha um defeito
de memória com relação a alguma proposição.

Se a memória fosse um elemento indispensável


ao pensamento matemático, encontraríamos
matemáticos excepcionalmente dotados do ponto
de vista mnemônico. Porém isto não parece ser
verdadeiro, concorda?

O motivo pelo qual a memória não abandona um matemático no


curso de seu raciocínio parece por outro lado, ser outro motivo, é
o mesmo Poincarè a sugerir, sustentando que uma demonstração
matemática não é “(...) simplesmente uma singela justaposição de
silogismos, mas é constituída de silogismos dispostos em uma
certa ordem, e a ordem em que estes elementos são dispostos
é muito mais importante do que os próprios elementos. Se
eu tenho o senso, a intuição por assim dizer, desta ordem, de
modo a perceber com um só golpe de olho o raciocínio em sua
inteireza, não tenho motivos para temer o esquecimento de um
dos elementos já que cada um deles virá a assumir o posto que lhe
foi designado na disposição geral, e tudo isto sem algum esforço
de memória de minha parte.”

O pensamento matemático parece desenvolver-se, portanto, a


partir de uma visão global dos relacionamentos entre os vários
elementos e esta visão do conjunto, denominada freqüentemente
de intuição, é a base do raciocínio de tipo matemático. À
observação de Poincarè se juntam aquelas do matemático
contemporâneo Stanislaw Ulman que evidenciando afirma:
“Muitos matemáticos relatam de terem percebido uma solução,

Unidade 2 75

teoria.indb 75 28/9/2007 16:13:23


Universidade do Sul de Santa Catarina

ou uma direção para um problema, muito tempo antes de terem


elaborado cada passo particular.”

Abstrações e intuições são, portanto, os processos primários


que caracterizam o pensamento matemático; mas existem em
complemento a estes também uma série de estratégias, mais
utilizadas, que deveriam permitir ao pensamento uma profícua
marcha aproximação em direção a solução de complexos
problemas postos pela matemática.

Diante a um problema muito complexo ou intricado,


se aconselha ao matemático a possibilidade de
encontrar um problema mais simples no interior
daquele mais complexo, de buscar uma solução
para este problema menor e depois trabalhar em
cima de tal solução. Existem também indicações de
procedimento mais gerais, como aqueles fornecidos
por Herbert Simon e Allen Newell, segundo os
quais os matemáticos deveriam perseguir processos
heurísticos de generalização: ou seja, prosseguir de
um conjunto dado de objetos do problema a um
conjunto maior que contenha o conjunto dado.

Estamos, portanto, no campo das estratégias do pensamento, ou


seja, de um conjunto de operações gerais de nível mais elevado
que requeiram, normalmente, para serem seguidas, uma série de
sub-operações secundárias ligadas ao meio de execução.

Do ponto de vista teórico a situação é idêntica àquela que se


apresentava como a operação para “beber um copo de água”,
só que neste caso as operações gerais do pensamento são de
observação mais difícil: Gardner estabelece, de qualquer maneira,
(como temos visto) que as principais entre essas, ou seja, aquelas
que podem dar vida à estratégia operativa, são identificáveis. Não
é raro, portanto, encontrar uma representação geral e coordenada
destas operações no interior de um fluxograma, próprio
como ocorre normalmente com os fenômenos considerados
computáveis.

Como se pode observar, a estratégia é sempre de tipo processual,


ou seja, descreve as operações e os passos necessários para
produzirem uma certa performance em alternativa, dita
inteligência, mas não se ocupa em definir qualquer coisa com
relação aos suportes físicos prepostos para sua execução.
76

teoria.indb 76 28/9/2007 16:13:24


Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

Este processo de combinações entre operações individuais, de


um lado pode gerar uma enorme variedade de performances
possíveis (inteligência múltipla), por outro lado, torna concebível
uma intercambialidade no suporte da produção das mesmas
performances (inteligência artificial).

SEÇÃO 4 -Relacionamento entre o desenvolvimento do


homem e a sua história evolutiva
Pontos de explicações para Bruner: o acréscimo
no potenciamento dos receptores sensoriais a
distância, com relação aos primatas. O
aparelhamento nervoso dos humanos
tem, ao nascer, somente um quarto do
volume do cérebro adulto, e completa este
volume somente ao redor dos vinte anos de
idade, enquanto os símios ao nascer têm um cérebro equivalente a
dois terços daquele do adulto e completam o desenvolvimento até
um ano de idade.

É crescente afastamento da espécie através modificações


exteriores e o uso de utensílios. Em suma, o débil aparelhamento
nervoso e cerebral dos humanos ao nascer, parece ser feito de
modo a favorecer a sua adaptação ao ambiente mediante os
meios sociais e técnicos, em vez de mediante a uma adaptação
morfológica. As perguntas que nós colocamos sobre os
mecanismos cognitivos não podem ignorar as respostas das
ciências biológicas, da antropologia, da história cultural do
homem.

Mente e cérebro, espírito e matéria, humanidade e animalidade,


razão e sentidos, psique e corpo, não é outro que os diversos
termos de uma contraposição dualística que tende em separar
claramente as esferas espiritual daquela material, sustentando que
no âmbito da mesma atividade psíquica e portanto do cérebro,
existe um resíduo inacessível à analise humana, enquanto a
mente – a alma se quisermos – guia o corpo-cérebro do exterior,
essência impalpável e imaterial. Cavalo de batalha por muitos
séculos de moralistas e filósofos dualistas, objeto de diatribe
no período do renascimento, entre monísticos aristotélicos e
dualistas platônicos. A separação entre uma psique imaterial e

Unidade 2 77

teoria.indb 77 28/9/2007 16:13:24


Universidade do Sul de Santa Catarina

um cérebro material aparenta, hoje, como um árduo exercício


filosófico, necessariamente isolado de uma realidade científica,
que é dificilmente interpretável em termos dualísticos, em
contraste com a biologia evolucionista e com as ciências do
comportamento.

Do ponto de vista evolucionista existe de fato, como tem


indicado Jean Piaget, uma progressão que permite passar da
memória de reconhecimento, presente nos invertebrados, para
aquela evocativa, própria dos primatas superiores e do homem,
através de uma evolução que se realiza mediante a memória
reconstitutiva (ricostitutiva). “Existem casos – escreveu Piaget
– os quais a memória se dissocia da inteligência, mas a mesma
memória bruta é sempre esquematizada em diversos níveis e esta
esquematização mostra a sua parentela com os mecanismos da
inteligência”.

De outra forma, se da memória passamos ao setor dos esquemas


mentais, nos damos conta como o seu estudo no animal, nos
conduz diretamente ao problema da auto-consciência.

Um exemplo indicativo nos é fornecido por D. Griffin


e refere-se aos morcegos empenhados na eco-
localização, não tanto por seus sucessos e habilidade,
quanto pela situação na qual a sua orientação não
foi bem sucedida. O vôo deles é regulado pelos
ultra-sons que emitem, e que permitem a eles de
evitar os obstáculos e capturarem os insetos; mas
quando voam em ambientes totalmente familiares
a eles, muitos morcegos confiam na memória e nos
esquemas espaciais: se bem que continuando a emitir
os sons de orientação de forma normal, os morcegos
se chocam contra obstáculos colocados de última
hora, mas por outro lado, evitam obstáculos retirados
improvisamente.

Isto demonstra que no cérebro deles deve existir algum tipo de


mapa interno que representa o ambiente familiar. Este tipo de
comportamento pode ser assimilado com uma série de outras
capacidades complexas que através do uso de processos de
generalizações ou a formação de esquemas simbólicos, permitem
aos animais adaptar-se ao ambiente com comportamentos
extremamente sofisticados.

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teoria.indb 78 28/9/2007 16:13:24


Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

Por exemplo, se um animal vê desaparecer atrás de uma tela, um


objeto, um pedaço de comida que se move ao longo de uma linha
horizontal, ele prevê o reaparecimento andando a procurá-lo na
parte oposta, traseira, daquela cujo objeto desapareceu: e não
são somente os mamíferos mais complexos, a darem prova deste
comportamento de antecipação que, como tem indicado Bower, é
presente na criança a partir do 3º - 4º mês de vida.

Outro exemplo da formação de complexos esquemas mentais é


claramente evidente nos estudos conduzidos em primatas não
humanos, cujas necessidades cognitivas prescindem daquelas
perceptivas: esses animais, chegam de fato a fornecerem juízos
baseados na quantidade de líquidos e sólidos e a conservarem
os dois tipos de quantidades, apesar da transformação de suas
formas, demonstrando assim o respeito aquelas “regras” que,
como já havia indicado Piaget, são evidentes na criança de 5 a 6
anos.

Memória e aprendizado, mapas mentais e processos


de generalização, capacidade simbólica e de
comunicação, comportamentos colaborativos e
de decisão, que implicam uma intencionalidade
qualitativamente não diferente daquela evidente
no homem, tem colocado sempre mais em crise, as
posições dualistas mais radicais.
O que você acha disto?
Use o espaço para registrar suas impressões até aqui...
suas dúvidas ou exemplos de situações ilustrativas.

Unidade 2 79

teoria.indb 79 28/9/2007 16:13:24


Universidade do Sul de Santa Catarina

Comentário: Sobre a questão acima, e explicando melhor,


exortando os simpatizantes da dicotomia mente-cérebro, a
pesquisarem em outros aspectos as diferenças comportamentais
ou orgânicas a essência da verdadeira humanidade. Portanto
aquilo que um tempo atrás era para Cartesio a glândula pineal,
parece ser hoje, em nível mais sofisticado, o hemisfério esquerdo,
a metade do cérebro que em todas as pessoas – salvo os canhotos
– é encarregado das atividades lingüísticas: do mundo da
consciência no senso objetivo, das produções intelectuais ou
filosóficas, como as teológicas ou as científicas – da linguagem e
da cultura transmitida, o assim chamado mundo 3, segundo as
teorias de Popper e Eccles.

Assim, se pudéssemos ter experiências e consciência em nível


subjetivo, graças aquilo que os dois estudiosos definiram como
um verdadeiro e próprio órgão de ligação entre cérebro e mente,
entre o corpo e alma, e que não receberia interferência de uma
contraparte simétrica estaria presente somente no cérebro
humano, ou seja, no hemisfério esquerdo. Seria este hemisfério
a permitir a diferenciação clara entre o homem e os animais,
de maneira a explicar em termos essencialmente mecanicistas
somente o comportamento das espécies não humanas; neste
sentido as assimetrias entre os dois hemisférios cerebrais, parecem
apresentar características ideais: a assimetria não seria de fato
presente nos primatas não humanos, que são incapazes de
comunicação verbal.

Um elemento complementar, que jogaria a favor


destas teses dualísticas, derivariam das pesquisas que
R. W. Sperry conduziu em pessoas nas quais os dois
hemisférios foram separados, por um trauma ou por
motivos cirúrgicos, de uma secção do corpo caloso, a
parte de matéria cerebral que une como uma ponte
os dois hemisférios, o direito e o esquerdo. O “cérebro
dividido” assim obtido indica que a atividade dos dois
hemisférios é completamente independente com
relação às informações visíveis e táteis, que a estes
chegam, assim como para os comandos motores que
estes enviam às partes do corpo por eles comandadas.

80

teoria.indb 80 28/9/2007 16:13:24


Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

Nos pacientes cujo corpo caloso foi seccionado o hemisfério


subordinado – o da direita – pode de fato reconhecer a distância
de tempo, os objetos dos quais tenha tido experiência precedente
– e de cujo hemisfério esquerdo não tenha tido experiência
através de um artifício técnico: contudo o sujeito é incapaz
de identificar oralmente ou por escrito o objeto que ele tenha
reconhecido indicando-o com o dedo. O hemisfério não
dominante pareceria, portanto, desenvolver muitas das funções
mentais que habitualmente são consideradas conscientes, mas, são
tolhidas da capacidade de referi-las verbalmente.

Em essência, o hemisfério não dominante, que é, normalmente,


em conexão com o esquerdo através do corpo caloso, mesmo
que dando a sua contribuição à atividade do “cérebro de ligação”
entre a mente e a matéria, e sendo as áreas das idealizações da
linguagem colocados no esquerdo, não entraria em contato com
o mundo 2, da consciência: o hemisfério menor assemelharia
portanto a um cérebro animal. Todavia, a programação genética
do hemisfério esquerdo e daquele da direita, parece não ser assim
rígida, de forma a impedir uma troca de papéis entre eles: em
crianças com idade inferior aos cinco - seis anos, e em casos
excepcionais também em idade um pouco mais avançada, as
lesões da área lingüística do hemisfério esquerdo, podem ser
compensadas por um desenvolvimento e pela plasticidade do
hemisfério direito.

Diante destes dados, a resposta dualística é de criar uma hipótese


de que o órgão de ligação entre o mundo 1, dos objetos e do
estado físico, e o mundo 2, dos estados de consciência, sejam
transferíveis à vontade, da esquerda para a direita: Todavia, a
falta de uma “sede própria” do órgão de ligação não é somente
o problema relacionado às posições dualísticas: as diferenças
entre os dois hemisférios não são com efeito, limitadas à espécie
humana, e em muitas espécies animais o hemisfério esquerdo é
já caracterizado por funções diversas, indicando de tal modo que
a especial diferença do cérebro esquerdo representa na espécie
humana um produto original de uma longa evolução.

Unidade 2 81

teoria.indb 81 28/9/2007 16:13:24


Universidade do Sul de Santa Catarina

SEÇÃO 5 - A natureza da explicação do


desenvolvimento cognitivo
Os eventos psicológicos exigem explicações em termos dos
processos e estes não são adequadamente explicados quando são
reduzidos em termos: sociológicos, fisiológicos, evolucionistas,
lingüísticos ou lógicos.

O desenvolvimento cognitivo é uma série de eventos psicológicos.


Veja um exemplo:

Uma criança não executa um certo ato em um certo


modo em uma certa idade, porque a cultura em que
ele vive, apresenta certos esquemas, porque pertence
à evolução dos primatas que em vista seja do senso
dominante, porque o seu linguajar tem ou não tem
um modo fácil ou obrigatório de fazer uma distinção
dotada de significado ou porque o ato da criança
mostra uma adequada estrutura lógica. Estas causas
finais são atraentes mas restam insuficientes, já que
para uma explicação psicológica necessita de uma
teoria psicológica.

De que maneira uma cultura, na qual vive a criança, influência


o seu modo de ver o mundo? O predomínio dos incentivos
visuais e auditivos no início de sua vida ajudam orientado a
atenção e selecionando a memória ou de qualquer outro modo?
Porque algumas distinções disponíveis na linguagem não tocam
o pensamento? Se uma distinção sintática se reflete sobre o
pensamento de que forma isto ocorre?” (SSC, 1968 [1966], 19).

A referência principal é o conjunto das teorias de J. Piaget sobre


o desenvolvimento da mente. Vamos conhecer um pouco mais
desse pesquisador?

82

teoria.indb 82 28/9/2007 16:13:24


Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

Jean Piaget e a psicologia genética


Vida e obra
Jean Piaget nasceu na Suíça em 1896. Discípulo de
Paolo Janet, dedicou-se aos estudos de psicologia
da infância, colaborando com Claparède nas
atividades do Instituto Jean Jacques Rousseau
de Genebra, e criando a sua volta uma escola (B.
Inhelder, A. Szeminska, M. Lambercier, A. Rey).
Piaget morreu em 1980. Entre os seus numerosos
trabalhos escritos, traduzidos em todas as principais
línguas, relembramos: A linguagem e o pensamento
na criança (1923), O julgamento e o raciocínio na
criança (1924), A representação do mundo na criança
(1926), A casualidade física segundo a criança (1927),
O julgamento moral na criança, O nascimento da
inteligência na criança, A construção do real na criança,
A gênese do número na criança, (em colaboração
com B. Inhelder; 1942), Classes relações e números, A
formação do símbolo na criança, O desenvolvimento da
noção de tempo na criança, As noções de movimento
e velocidade na criança, A representação de espaço
na criança (em colaboração com A. Szeminska), A
geometria espontânea da criança (em colaboração
com B. Inhelder e A. Szeminska), A psicologia da
inteligência (1947; traduzido para o italiano em 1952),
(1949), A gênese da idéia de caso na
criança (em colaboração com B. Inhelder; 1951), O
desenvolvimento das estruturas lógicas elementares
(1959), Sabedoria e ilusões da filosofia (1965), A
psicologia da criança (1966), Biologia e conhecimento
(1967), O estruturalismo (1968), Compêndio de
epistemologia genética (1970), As ciências do homem
(1970), Adaptação biológica e psicologia da inteligência
(1974), Teoria e métodos da educação moderna (1972).

Contra a confusão habitual dos caracteres próprios da infância e


da idade adulta, autores como Stanley Hall e Claparède tinham
reivindicado uma concessão genética, que reconhecia a infância,
como um estágio preparatório, das próprias leis peculiares: a
pedologia era assim elevada à dignidade de ciência, em certo
senso autônoma, no âmbito da vasta antropologia.

A distinção dos caracteres próprios dos dois diversos estágios de


desenvolvimento, a infância e a maturidade, foi impulsionada
ainda mais diante de Piaget. Segundo este autor, a psique

Unidade 2 83

teoria.indb 83 28/9/2007 16:13:25


Universidade do Sul de Santa Catarina

infantil é estruturada de modo fortemente egocêntrico e


subjetivo, enquanto a psique do adulto é estruturada de modo
largamente social e objetiva. A psicologia genética tem por
outro lado, a tarefa de descrever o gradual transpasse de uma para
outra estrutura para efeito da interação crescente entre o sujeito
e o mundo (coisas, pessoas) que o circunda; a distância entre o
ponto de partida e o ponto chegada, por quanto notável esta seja,
não suprime, portanto, segundo Piaget a continuidade funcional
que liga todas as manifestações da vida, das mais rudimentares
formas biológicas as mais elevadas e complexas criações do
pensamento.

Os níveis do desenvolvimento vital


Segundo Jean Piaget, a vida tem, entre os seus caracteres
essenciais, um poder morfogenético, ou seja produtor de formas, que
se explica em diversos graus ou níveis, unificando e coordenando
em totalidade, sempre mais vastas e complexas uma variada
multiplicidade de estruturas e funções.

Níveis Característica
É aquele biológico próprio do organismo, que assegura as trocas materiais entre seus órgãos e
Primeiro nível o ambiente.

é aquele dos instintos, que constitui um prolongamento funcional da estrutura dos órgãos:
Segundo nível cada indivíduo de uma determinada espécie nasce não só com uma organização anatômica e
fisiológica definida, mas também com uma dotação de instintos fundamentais.

corresponde às primeiras atividades de assimilação sensório motriz, a percepção e os


hábitos. Dentre os seus limites de desenvolvimento se podem ulteriormente distinguir
Terceiro nível diversos estágios, que coincidem com outras etapas sucessivas do processo de crescimento do
indivíduo.
fundamentalmente do desenvolvimento é aquele do pensamento simbólico preconceitual,
de um ano e meio-dois anos até seis anos. Neste período ocorre a aquisição sistemática da
linguagem, que é acima de tudo tornada possível pelo exercício de uma mais generalizada
função simbólica, ou seja, da representação de algumas coisas (significado) mediante a
outras (significante). Esta função simbólica, que atua no princípio no jogo sem destacar-se
da ação do sujeito, vem sucessivamente objetivando-se (uma pequena pedra alisada, ou
objeto arredondado pode ser um pão) e através da imitação assume um sistema de sinais
Quarto nível determinados pela convenção social. Na utilização dos primeiros sinais verbais se ajuntam
os pré-conceitos, esquemas que ficam em meio da estrada entre a generalidade do conceito
e a particularidade dos elementos que o compõem; a criança é ainda incapaz de distinguir
entre “todos” e “alguns” e não pode compreender a noção de “classe”, mas possui já um
esquema representativo capaz de evocar muitos objetos colecionados por semelhança e alguns
exemplares-modelo. Do nexo destes pré-conceitos resultam os raciocínios primitivos ou
transduções, que se verificam por analogia imediata, permanecendo, porém, dos processos
de inclusão incompletos.

84

teoria.indb 84 28/9/2007 16:13:25


Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

corresponde ao pensamento intuitivo, dos quatro aos sete-oito anos. Este é ainda um
pensamento por imagens, como o precedente, todavia se volta para configurações
de conjunto e não mais para “coleções sincréticas” simbolizadas por exemplares-
Quinto nível tipo. O pensamento intuitivo imita as ações reais por meio de experiências
mentais fundadas sobre imagens: esses dão lugar a ajustamentos e regulagens que
constituem um esquema pré-lógico.

é constituído das operações concretas, que vêm organizando-se entre os sete-oito e


Sexto nível os onze-doze anos.

é constituído das operações formais que se elaboram entre os onze e os doze anos,
até a complementação funcional da inteligência reflexiva. Operações concretas
e operações formais são manifestações lógicas verdadeiras e próprias, todavia as
Sétimo nível primeiras são ainda de qualquer modo ligadas à intuição, dado que sobre estas são
construídas, enquanto as segundas podem emancipar-se, agrupando conceitos, no
todo, abstratos.

No terceiro nível, encontram-se os estágios de desenvolvimento


que são:

a) o estágio dos reflexos, no qual se tem um início da


assimilação reprodutiva, generalizativa e explorativa,
dentre o mesmo quadro dos mecanismos regulados
hereditariamente;

b) o estágio dos hábitos elementares, no qual aos esquemas


reflexos são incorporados novos elementos, que são
verdadeiras aquisições experimentais: tais como o
condicionamento e a extensão dos mesmos reflexos;

c) o estágio das reações circulares (primárias e secundárias),


ou seja da reprodução ativa de resultados obtidos a
primeira vez por acaso e derivados de esquemas de ação
adquiridos; este estágio, corresponde a uma idade entre
3 a 6 meses, já alcança uma articulação (irreflexa) da
conduta em meio e escopo, ao menos como fase sucessiva
de um mesmo comportamento global;

d) o estágio das reações circulares inversas, no qual as duas


fases do meio e do fim podem se inverter, de modo
que o fim transforma-se psicologicamente, também se
irreflexamente, precedentemente o meio; este estágio,
corresponde a uma idade de 8 a 10 meses, já alcança
a uma extensão mais ampla dos esquemas sensório-
motores, e utiliza estes mesmos esquemas para uma
preliminar compreensão dos objetos através do seu uso.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

e) o estágio das reações circulares terciárias, no qual


a assimilação reprodutora é acompanhada de uma
acomodação intencional; os esquemas já adquiridos
como meios podem ser aplicados em situações em parte
diversas, diferenciando-se e incorporando acontecimentos
fortuitos; a este estágio corresponde a primeira conduta
corretamente definida como inteligente, como o chamado
“procedimento por tentativas” (tatonnement dos franceses,
trial dos ingleses);

f) o estágio da invenção, que ocupa uma parte do


segundo ano de vida e leva ao cumprimento da
inteligência sensório-motora; nesta os meios não são
somente descobertos mediante a experiência ativa, mas
também através uma rápida coordenação interna dos
procedimentos novos, apresentando as “reestruturações
bruscas”; a este estágio corresponde também a imitação
diferida, ou seja a execução de uma cópia também após
o desaparecimento do modelo, do campo perceptivo, e
o aparecimento de formas elementares de jogo simbólico;
estes dois fatos denunciam já a presença de processos
de imagens, que iniciam as formas de inteligência
representativa.

— A seguir, você terá a oportunidade de estudar sobre a teoria da


inteligência do ponto de vista da sua operação. Vamos lá? Anote suas
dúvidas para perguntar ao seu tutor(a).

A teoria operatória da inteligência


Piaget define propriamente uma teoria operatória da inteligência.
“As operações intelectuais, que no limite superior delas tem uma
forma lógica e matemática, constituem, segundo esta teoria, das
ações reais, seja enquanto produção própria do sujeito, seja como
experiência possível em confronto com a realidade”.

A inteligência é também uma forma de conduta e como cada


conduta é uma adaptação, ou seja, um equilíbrio dinâmico, entre
a ação do organismo sobre o ambiente (assimilação) e a ação
inversa (acomodação); isto é que distingue a inteligência de outras
formas de adaptação mais limitadas é a vastidão verdadeiramente
universal de seu âmbito objetivo, enquanto que, ao nível formal,
esta pode também prescindir das condições de espaço e de

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Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

tempo (hic et nunc). De qualquer forma, como conduta, também


a inteligência é uma troca de ação-reação entre o sujeito e o
ambiente; a linguagem, o sistema de sinais convencionais, é um
artifício mediante o qual essa interioriza a ação.

“A conduta verbal é uma ação que é, sem dúvida, restrita e que


resta completamente interior; uma amostra de ação que corre
continuamente o risco de interromper-se no estado de projeto,
mas resta também sempre ação, substituindo simplesmente os
objetos com os sinais, evocando os movimentos em vez de efetuá-
los, e operando mentalmente, através destas transformações.

Um caráter essencial que distinguem todavia as operações lógicas


das ações empíricas, de cujas essas são o prolongamento interior,
é que as operações lógicas não se apresentam nunca no estado
descontínuo, mas coordenadas em sistemas; assim por exemplo
cada conceito de classe pressupõe uma classificação da qual faz
parte, cada conceito de série pressupõe uma ordenação em série,
cada número existe como um elemento da inteira sucessão de
números, cada relação espacial ou temporal supõe uma unidade
esquemática do espaço e do tempo, cada avaliação supõe uma
escala de valores.

Estes sistemas operadores de conjunto obedecem a algumas


condições de equilíbrio; as estruturas de equilíbrio são chamadas
por Piaget de reagrupamentos. “Comparado ao equilíbrio
parcial das estruturas perceptivas ou motrizes, o equilíbrio dos
agrupamentos é essencialmente um equilíbrio móvel, de fato as
operações sendo das ações, o equilíbrio do pensamento operatório
não é dado de um estado de repouso, mas de um sistema
de trocas que se equilibram e de transformações contínuas
compensando-se alternadamente”.

O desenvolvimento das ciências exatas, pela contínua aquisição


de novos elementos, é um consistente exemplo.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Os requisitos essenciais de cada conjunto de


elementos são: a composição
(A + B = = C; C + D = E; etc.); a reversibilidade (A – B =
C; A – C = B); a associatividade [ I (A + B) + C = A + (B
+ C) = (D)]; a identidade geral (A – A = 0; B – B = 0); a
identidade especial tautológica (A + A = A; B + B = B;
válida somente no campo qualitativo).
Os conjuntos, por sua vez, podem ser distinguidos em
oito tipos fundamentais: quatro aditivos (classificação,
série qualitativa, substituição, equivalência) e quatro
multiplicativas (duas de tabelas com dupla entrada,
duas de correspondência uma para muitos).

O desenvolvimento da inteligência
A análise dos procedimentos lógicos corresponde, afirma Piaget,
de um lado à mais rigorosa axiomática lógica, de outro aos reais
processos psicológicos operadores do pensamento. As condições
de uma completa formalização da lógica são as mesmas condições
de um completo equilíbrio dos sistemas operadores. Note que
um sistema operatório esta em equilíbrio “quando estão em
equilíbrio assimilação e acomodação, sujeito e objeto”. Até
quando predomina a assimilação subjetiva, como ocorre durante a
infância, os sistemas operadores são incompletos e unidirecionais,
portando em certo modo rígidos; a maturidade da inteligência
exige, por outro lado, que o sujeito se eleve à compreensão de
trocas multidirecionais perfeitamente reversíveis.

A progressiva ascensão de uma visão fortemente


egocêntrica e subjetiva tal como é aquela da primeira
infância, para uma visão descentrada e objetiva
tal como é aquela do equilíbrio do pensamento
operatório maduro, é assinalada das etapas de
construção do objeto, do número, do espaço e do
tempo, as quais Piaget dedicou muitas pesquisas.

O “esquema do objeto” consiste essencialmente, segundo Piaget,


na citação da “figura percebida para um suporte substancial
de maneira que a substância e figura que representa o índice
continuem a subsistir também fora do campo perceptivo”.

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Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

O autor destaca que o princípio de conservação da substância


aflora em direção ao termo do terceiro estágio do terceiro nível
(reações circulares), consolidando-se no quarto e quinto estágio.
A construção da noção de espaço é contemporânea; assim
também como aquela do tempo.

È necessário, todavia, chegar em direção ao termo do quinto


nível (pensamento intuitivo), ou seja, para os sete-oito anos, para
que a criança esteja em condições de compreender a conservação
simultânea de relações complexas, e seja capaz das operações
constitutivas do conceito de número (também se já tenha
primeiramente adquirido o processo nominal).

De outra parte, o mesmo princípio de conservação da substância


é desenvolvido nos seus aspectos passo a passo; aos sete-oito anos
é reconhecida a conservação da quantidade de matéria; todavia,
somente entorno dos nove-dez anos é reconhecida a conservação
do peso, e somente entorno dos onze-doze anos a conservação
do volume. Primeiramente desta última idade, por outro lado,
todas as operações têm necessidade de um substrato intuitivo.

O desenvolvimento intelectual prossegue segundo estágios que se


sucedem de forma regular no curso do desenvolvimento infantil e
da adolescência. Na primeira etapa, o sensório motor, é baseada
na coordenação de ações e age sobre elementos concretos, até
quando a criança chega a possuir a capacidade de representar
mentalmente as ações antes de executá-las. É a fase pré-
operatória. Iniciam-se neste momento os avanços intelectuais
que se desenvolvem em um contexto simbólico, em vez de
sensório motor, também se a nível sempre concreto. Segue então
a fase operativa, na qual a criança executa operações mentais
sempre mais complexas (classificação, seriação, correspondência
biunívoca etc.)

Com o início da adolescência se elabora progressivamente


o pensamento formal, caracterizado por um adequado
relacionamento entre o real e o possível, da modalidade
hipotético-dedutiva de pensar, como também do pensamento
proporcional. O modelo genético de Piaget se baseia nos
conceitos de assimilação, acomodamento e equilíbrio. A criança,
primeiramente busca se adaptar aos esquemas dos quais já
tem domínio, para a nova realidade com a qual ele se encontra
pela primeira vez. Mas é obrigado a modificar os próprios

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Universidade do Sul de Santa Catarina

conhecimentos e as próprias condutas, acomodando os esquemas


precedentes até chegar a um equilíbrio satisfatório.

Cada fase do desenvolvimento propõe este ritmo: é assimilação,


isto é repetição, exercício para a consolidação dos esquemas
mentais apenas constituídos; é acomodação, isto é inovação,
aquisição de novos esquemas mentais. Alguns aspectos desta
teoria podem estar obrigatoriamente presentes na educação da
criança na idade escolar:

1. É necessário basear a aquisição de conceitos e esquemas


mentais mediante manipulação e buscando recursos
constantemente nas experiências concretas.

2. É possível seja como for, adquirir um determinado


esquema conceitual seja através da ação, seja através da
percepção, seja através da linguagem (é evidentemente
um caminho do simples ao complexo).

3. A superação de cada uma das etapas é possível mediante


a elaboração de estratégias cognitivas. Não se pode
apresentar a criança uma dificuldade intelectiva, sem
ajudar-la contemporaneamente a construir as estratégias
intelectivas válidas para afrontar tais dificuldades.
As tarefas vão, portanto, graduadas, e devem ser
proporcionadas às efetivas capacidades cognitivas de cada
criança.

A descentralização lógica e a cooperação social


Cada uma destas aquisições, primeiramente
conseguidas mediante regularizações intuitivas e
enfim sistematizadas nos agrupamentos lógicos,
constituem uma crescente descentralização. O
sujeito consegue compreender em uma totalidade
lógica os possíveis múltiplos pontos de vista de um
mesmo objeto, e a possibilidade para este último,
de modificar a sua volta. Quanto mais ele se torna
consciente de seu egocentrismo inicial, deformador
de prospectivas, tanto mais ele o desvincula e vai se
liberando.

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Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

Um fator potente de objetivação são os relacionamentos sociais,


que a linguagem em certo senso pressupõe e em certo senso
consolida. A sociedade se baseia sobre cooperação física,
intelectual, moral. Piaget reputa sem dúvida que a cooperação
intelectual, encaminhando ao equilíbrio das múltiplas
subjetividades que se encontram em confronto, encaminha ao
equilíbrio da reflexão (como diálogo interior). A lógica “acolhe
regras e normas comuns, e representa uma moral do pensamento
imposta sancionada pelo ambiente externo. Assim a obrigação
de não cair em contradição não é somente uma necessidade
puramente condicional ou “imperativo hipotético” para quem
deseja manter-se nas regras do jogo operatório, mas se transforma
em um verdadeiro imperativo moral “categórico” pelo fato que é
indispensável a cada troca intelectual e à cooperação”.

Poder-se-ia perguntar, se a sociabilidade pressupõe a inteligência


e vice versa; Piaget reputa preferivelmente que a atividade
operatória interna e a cooperação exterior são aspectos
complementares de um todo, “sendo o respectivo equilíbrio
deles em condições de recíproca interdependência”. Não se pode
negar, segundo Piaget, que “um conjunto não pode atuar-se até
quando as percepções e as intuições espontâneas do indivíduo
se dividem do ponto de partida egocêntrico dele, para chegar a
um sistema de relações que permita passar de um termo ou um
relacionamento a outro, partido de uma qualquer prospectiva.
Trata-se, então, de uma coordenação de pontos de vista de
observadores diversos, ou seja de uma cooperação entre muitos
indivíduos”.

Hipótese explicativa de Bruner


No início o mundo da criança é somente conhecido por ela,
através de suas ações habituais (representação executiva)
sucessivamente ela alcança a uma técnica de representação
através da imagem, enquanto esta última é relativamente livre da
imagem (representação icônica) depois ainda a criança conquista
um potente método de traduzir ações e imagens na linguagem
(representação simbólica).

— Acompanhe, a seguir, uma síntese que remete a uma


complementaridade de conteúdos tratados. Anote as questões que para
você são centrais.

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Síntese

Primeiro tema: (seção 1)


Sobre a natureza da percepção ou seja:

 com quais meios os seres humanos se representam na sua


experiência do mundo, durante o seu crescimento
 e em que modo organizam para os usos futuros aquilo
que eles encontram.
O problema de partida é assim resumido: o que nos informam
as nossas observações com relação a natureza do mundo ou a
natureza da mente? É possível separar umas das outras?

Na origem um livro de E. Mach que fez escola. Publicado


nos últimos anos do século passado The analysis of Sensation
(trad. para o italiano L’analisi delle sensazioni e il rapporto tra
fisico e psichico, Feltrinelli, Milano 1995), o autor, sustenta que
é possível interpretar a experiência seja como externa, isto é
como um mundo fora de nós, seja como interna ou subjetiva.
A. Einstein elaborou a tese de E. Mach da seguinte forma: o
mundo, considerado do exterior, não pode ser nunca autônomo
com relação ao ponto de referência do observador. Foi isto para
assinalar o paradigma gnoseológico do nosso século. P. Manet,
lembra o caso de um pintor contemporâneo de E. Mach, que
sintetizou assim o espírito da coisa: “A natureza não é senão uma
hipótese”.

Mas, se este era o estopim, a pólvora explosiva foi acesa por


alguns jovens pesquisadores de Harvard que, logo após a segunda
guerra, deram vida exatamente a um movimento de estudos sobre
a percepção, que eles mesmos chamaram New Look on Perception.

As atividades ao menos formalmente, tiveram início, meio século atrás


com uma serie de publicações (Bruner e Postman, 1947; Mc Ginnies
1949; Postman, Bruner, Mc Ginnies, 1948) nos quais se sustentava
que a percepção dos estímulos externos não é dissociada dos caracteres
dos eventos internos: comportamentos, valores, expectativas, defesas

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Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

psicodinâmicas são todos os fatores que influenciam a percepção. Esta


posição se tornou notória com o termo genérico de New Look. ( M.
Erdelyi, 1974.

Segundo tema (seção 2)


influência da cultura sobre o modelo do desenvolvimento

Segundo Bruner tal desenvolvimento tem lugar através um


processo que vai tanto do interior para o exterior, quanto do
exterior para o interior da pessoa humana. Tal processo consiste
no desenvolvimento de amplificadores da capacidade motriz,
sensitiva e reflexiva transmitida por uma cultura. Diversas
culturas fornecem amplificadores diversos em épocas diversas da
vida da criança: ou seja, o processo do desenvolvimento humano
não procede paralelamente nas diversas culturas, e todavia é
legítimo comparar algumas uniformidades, apesar da diferenças,
no desenvolvimento das diversas culturas humanas. Isto significa
simplesmente que o desenvolvimento cognitivo é inconcebível
sem a participação em uma cultura e da sua comunidade
lingüística.

O terceiro tema (seção 3)


relacionamento entre o desenvolvimento do homem e a sua
história evolutiva, em particular com o seu passado enquanto
evolução dos primatas.

Pontos de explicações para Bruner

 o acréscimo no potenciamento dos receptores sensoriais


à distância, com relação aos primatas. O aparelhamento
nervoso dos humanos tem, ao nascer, somente um quarto
do volume do cérebro adulto, e completa este volume
somente ao redor dos vinte anos de idade, enquanto os
símios ao nascer têm um cérebro equivalente a dois terços
daquele do adulto e completam o desenvolvimento até
um ano de idade.
 Crescente afastamento da espécie através modificações
exteriores e o uso de utensílios. Em suma o débil
aparelhamento nervoso e cerebral dos humanos ao nascer,
parece ser feito de modo a favorecer a sua adaptação ao
ambiente mediante os meios sociais e técnicos, em vez de
mediante a uma adaptação morfológica.
Unidade 2 93

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Quarto tema (seção 4)


natureza da explicação do desenvolvimento cognitivo

Os eventos psicológicos exigem explicações em termos dos


processos e estes não são adequadamente explicados quando são
reduzidos em termos: sociológicos, fisiológicos, evolucionistas,
lingüísticos ou lógicos.

O desenvolvimento cognitivo é uma série de eventos psicológicos.

“Uma criança não executa um certo ato em um certo modo em


uma certa idade, porque a cultura em que ele vive, apresenta
certos esquemas, porque pertence a evolução dos primatas que em
a vista seja o senso dominante, porque o seu linguajar tem ou não
tem um modo fácil ou obrigatório de fazer uma distinção dotada
de significado ou porque o ato da criança mostra uma adequada
estrutura lógica. Estas causas finais são atraentes mas restam
insuficientes, já que para uma explicação psicológica necessita
de uma teoria psicológica. De que maneira uma cultura, na
qual vive a criança, influencia o seu modo de ver o mundo? O
predomínio dos incentivos visuais e auditivos no início de sua
vida ajudam orientado a atenção e selecionando a memória ou de
qualquer outro modo? Porque algumas distinções disponíveis na
linguagem não tocam o pensamento? Se uma distinção sintática
se reflete sobre o pensamento de que forma isto ocorre?” (SSC,
1968 , 1966, p. 19).

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Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

Atividades de auto-avaliação
1. Apresente os componentes fundamentais do modelo HIP (Human
Information Processing) e descreva asa características dele à luz do
pensamento cognitivista.

2. Elenque os vários tipos de inteligência segundo a classificação


elaborada por Gardner e destaque as características essenciais.

Unidade 2 95

teoria.indb 95 28/9/2007 16:13:28


Universidade do Sul de Santa Catarina

Saiba Mais

Para complementar seus conhecimentos, leia o texto abaixo:

Para compreender a importância da contribuição para o


estudo do aprendizado na sociedade contemporânea, devemos
identificar o seu ponto de partida e o seu ponto de chegada.
Como os navegantes nos ocorre a figura de uma carta náutica.
E para este propósito nos socorre o mesmo Bruner, o qual em
sua Autobiografia (AUTO, 68 ss.) conta sua travessia pela
psicologia como se fosse um marinheiro que se utiliza de uma
carta oceânica. Nesta existem dados topográficos ou estruturais
e dados atmosféricos ou variáveis. Entre os primeiros Bruner
identifica os seguintes problemas fundamentais que estão na
origem das transformações da psicologia contemporânea, da
psicofísica em ciência da mente:

1. Como pode o mundo parecer (ou mostrar-se) assim


como ele parece (ou mostra-se), com seus significados,
seus eventos, os seus acontecimentos, nenhum dos quais
tem lugar na sensação?

2. Qual a origem da experiência? É o resultado dos nossos


poderes essencialmente associativos (Associativismo)
ou é a conseqüência do uso das nossas categorias inatas
de espaço e de tempo (Inatismo); é restrito somente aos
dados de experiência sensorial que nos acumulamos
como resposta aos estímulos ambientais (Objetivismo); é
a prova da natureza física e biológica dos nossos estados
mentais (fisicalismo), ou ao contrário, a afirmação da
eficácia causal da própria mente (mentalismo)?

Entre o segundo item, é possível reconstruir aquilo que o próprio


Bruner descreve ao reconstruir a gênese do cognitivismo nos
últimos quarenta anos:

1. Liberação, nos últimos quarenta anos, da percepção de


um comportamento inflexível em um sensismo privado
da mente.

2. Estudo direto do pensamento.

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Teoria da Formação para a Educação do Terceiro Milênio

3. Análise do modo pelo qual pode ter início a mente.

4. Como se adquire a linguagem, como se adquire o


controle e como isso pode tornar-se um instrumento do
pensamento.

5. Quais as conseqüências práticas que todas estas coisas


têm sobre a Educação.

Uma carta náutica“As cartas oceânicas dão em primeiro


lugar as informações sobre a forma das massas de água,
e sobre as massas continentais que as circundam; ainda
contêm dados tangíveis sobre as correntes oceânicas seguras,
sobre a profundidade marítima até ao limite alcançável
dos instrumentos assim como sobre os usuais sinais de
navegação. São os dados. Se for necessário obter mais
informações, existem os almanaques astronômicos. ...As
cartas todavia levam também informações mais efêmeras
sobre o tempo provável o sobre rotas seguidas por outras
embarcações. As informações efêmeras sobre cartas náuticas
apresentam os riscos, entre as massas continentais e as
profundidades oceânicas. Estas duas categorias encontram
exata correspondência nos mapas que podemos traçar para
os grandes espaços da psicologia e que podemos classificar-
los em topográficos e atmosféricos. Aqueles topográficos
compreendem os grandes e persistentes problemas que
tem marcado por si o conhecimento, os paradigmas e as
conjecturas clássicas. Aquelas atmosféricas nos dizem como
sopram os ventos e como viajam as naves”. (AUTO, 69-70 ss.)

Unidade 2 97

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