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PROTOCOLO DE ACONSELHAMENTO

ANSIEDADE E INSÓNIA
ENQUADRAMENTO

Sempre que uma pessoa se encontra perante uma situação que constitui uma ameaça para a sua integridade física,
psicológica ou emocional, o organismo responde através da ativação de vários mecanismos de alerta, que englobam
uma série de reações, físicas e psicológicas, que em conjunto preparam o organismo para que este possa responder
à situação de stress com maior eficácia. O estado de alerta consiste em dois elementos muito característicos: a
ansiedade, ou seja, uma sensação de intranquilidade ou insegurança e estado de espera penoso, e a angústia, que
se expressa através de manifestações típicas, como uma sensação de pressão no tórax e/ou palpitações. Tratam-
se, portanto, de reações fisiológicas normais e úteis, essenciais para que a pessoa possa enfrentar com uma maior
capacidade de resposta situações que considere ameaçadoras. A ansiedade pode aparecer subitamente, como o
pânico, ou gradualmente ao longo de minutos, de horas ou de dias. A duração da ansiedade pode ser muito variável,
indo de poucos segundos a vários anos. A sua intensidade pode ir de uma angústia pouco percetível a um pânico
estabelecido. Quando a ansiedade se torna duradoura e persistente e/ou quando é produzida de forma injustificada
e interfere com a qualidade de vida da pessoa, constitui um quadro designado como perturbação da ansiedade. A
ansiedade pode conduzir a estados mais graves de depressão.

A perturbação da ansiedade é um distúrbio psiquiátrico muito frequente. O diagnóstico estabelece-se através da


avaliação da sintomatologia apresentada. Uma história familiar de ansiedade pode ajudar a estabelecer o
diagnóstico, uma vez que a predisposição para a ansiedade tem frequentemente caráter hereditário. Os estados
de ansiedade podem ter também origem iatrogénica (ex. corticosteroides), em patologias (ex. hipertiroidismo), ou
mesmo no abuso de drogas (ex. cocaína). É essencial um diagnóstico correto, pois os tratamentos diferem de um
tipo de ansiedade para outro.

Muitas vezes associada à ansiedade surgem as perturbações do sono. O sono é necessário para sobreviver e gozar
de boa saúde e, embora ainda não se conheça exatamente os mecanismos pelos quais o sono nos beneficia, ele é
mais do que um intervalo de tempo em que o “cérebro desliga e o corpo repousa”. As necessidades individuais de
sono e o ritmo sono-vigília variam amplamente dependendo de inúmeros fatores intrínsecos (temperatura corporal,
secreção de melatonina) e extrínsecos (alternância luz / escuridão, ruído, alterações na rotina, ingestão de
estimulantes, atividade física, refeições e socialização). Para definir um sono normal é preciso considerar vários
fatores:
- Número de horas de sono (“short-sleepers” – necessitam de dormir poucas horas (4h a 5h); “long-sleepers”
necessitam de dormir muitas horas – 9h);
- Idade (o número de horas de sono vai diminuindo ao longo da vida);
- Estações do ano (estão intimamente relacionadas com as variações cíclicas da temperatura corporal e com
as hormonas hipofisárias);
- Capacidade de adormecer;
- Hora de deitar e levantar.

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Um sono normal será então aquele que proporciona uma sensação de bem-estar ou descanso físico e mental, de
noite “bem dormida”, com recuperação de energias, permitindo executar em boas condições físicas e mentais as
tarefas do dia seguinte.

A perturbação do sono mais comum é a insónia (dificuldade em conciliar o sono ou permanecer adormecido, ou
alteração no padrão do sono que, ao despertar, leva à perceção que o sono foi insuficiente). Pode ter como origem
fatores emocionais (ansiedade noturna, nervosismo, depressão, mente hiperativa, problemas do dia que afetam o
sono) e não emocionais (idade, má higiene do sono, jet leg ou trabalho por turnos) ou estar associada ao uso de
medicamentos ou de certos alimentos ou aditivos (como a cafeína). Há mesmo pessoas que têm dificuldade em
conciliar o sono simplesmente porque não experimentam cansaço, nem físico nem mental. É, no entanto,
importante diferenciar os vários tipos de problemas de insónia, podendo esta manifestar-se por dificuldade em
adormecer, acordar durante a noite diversas vezes (insónia de manutenção), acordar muito cedo (insónia de
despertar precoce) ou ainda má qualidade do sono (perceção de um sono insuficiente). A insónia pode ainda ser
classificada em transitória (3 dias), de curta duração (até 3 semanas) e crónica (superior a 3 semanas), devendo
esta última ser encaminhada para o médico.

No tratamento da insónia é de extrema importância a promoção de bons hábitos, designados como “higiene do
sono”. A insónia persistente, que afete consideravelmente a qualidade de vida do utente, deve ser avaliada por um
médico especialista.

Questões a colocar ao utente para avaliação da situação

ANSIEDADE INSÓNIA
- Quando teve início? - Quando teve início?
- É frequente sentir-se assim? - É uma situação pontual ou é frequente?
- Se frequente, já consultou algum especialista? - Associa a insónia a algum estado de ansiedade?
- Tem mais algum sintoma, nomeadamente - Se frequente, já consultou algum especialista?
sentimentos de tristeza? - Já tomou ou toma alguma medicação para este
- Associa este estado a algum episódio da sua problema de saúde?
vida? - Tem por hábito tomar bebidas com cafeína
- Já tomou ou toma alguma medicação para este (café, refrigerantes, chá verde)?
problema de saúde? - Tem alguma outra doença que esteja a tratar,
- Dorme bem? ou encontra-se a fazer algum tipo de
- Tem alguma outra doença que esteja a tratar, medicação?
ou encontra-se a fazer algum tipo de - Está grávida ou a amamentar?
medicação?
- Está grávida ou a amamentar?

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Situações que requerem encaminhamento para nível 2 de intervenção ou
referenciação para consulta médica

- Utente com idade inferior a 12 anos;


- Mulher grávida ou a amamentar;
- Terapêutica concomitante com ansiolíticos e/ou antidepressivos;
- Sintomas persistentes, e sem avaliação médica prévia;
- Sem resposta à terapêutica instituída;
- Perceção do profissional de que pela intervenção prevista: o problema não se atenuará; outras patologias
associadas se possam agravar; se pode alterar negativamente a efetividade e/ou segurança da medicação
atual.

TRATAMENTO

Farmacológico

Valeriana
Nome dado aos extratos da raiz da planta Valeriana officinalis. Os extratos desta planta têm afinidade para
o recetor GABA-A (ácido gama-aminobutírico) que está envolvido na promoção e regularização do sono. A
valeriana contém uma variedade de compostos químicos (incluindo o ácido velerénico e derivados) que atuam
sinergicamente para exercer um efeito sedativo. Apesar da evidência científica ser escassa, verifica-se que
se trata de uma substância segura e que exerce efeito na insónia ligeira a moderada. Dado que o seu início
de ação lento, torna-se pouco adequada para situações agudas, como o jet-leg. Por outro lado, apresenta
efeitos benéficos na arquitetura do sono, uma vez que aumenta o sono profundo, tornando-se
particularmente útil para uso a longo prazo e em idosos. Está ainda indicado o seu uso em perturbações
nervosas ligeiras (tais como tensão nervosa, irritabilidade, stress do dia a dia, ansiedade ligeira, dificuldade de
concentração) e ainda como coadjuvante no tratamento da hipertensão arterial nervosa.

Passiflora
Planta medicinal, tradicionalmente usada na redução de estados de ansiedade. Apesar de a evidência
científica ser escassa, foi demonstrado em estudos in vitro que os efeitos farmacológicos da Passiflora
incarnata são mediados pela modulação do sistema GABA, apresentando afinidade para os recetores GABA
(A) e GABA (B), e efeitos na recaptação do GABA, traduzindo-se numa ação sedativa. Trata-se de uma
substância considerada segura, sobretudo se tomada nas doses recomendadas e por períodos não superiores
a 2 meses. A maior parte das vezes surge em combinação com outras substâncias ansiolíticas e sedativas,
nomeadamente a valeriana.

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Succinato de Doxilamina
Trata-se de um antagonista dos recetores histamínicos H1. Sendo um anti-histamínico de primeira geração,
possui efeitos sedativos e ansiolíticos, estando indicado para situações de dificuldade em adormecer: é eficaz
na redução do tempo de início do sono assim como no aumento da duração do mesmo. Não é recomendado
o seu uso prolongado, devido aos efeitos adversos que pode apresentar (sonolência diurna, retenção urinária,
obstipação) e ao rápido desenvolvimento de tolerância à substância. Deve ser tomada cerca de 30 minutos
antes de deitar.

Melatonina
É uma hormona natural produzida pela glândula pineal. Os níveis de melatonina no sangue variam muito ao
longo do dia e isto relaciona-se com a atividade da glândula pineal, a qual é influenciada pelo ciclo circadiano
e pela exposição à luz. Tipicamente, os níveis de melatonina aumentam no final do dia, depois do pôr-do-sol,
mantêm-se elevados durante a noite, por cerca de 12 horas, e começam a diminuir com o nascer do dia.
Alterações na exposição à luz do dia, pode influenciar o normal funcionamento desta glândula.
Uma vez que a melatonina está presente em vários alimentos, esta substância é também comercializada
como um suplemento alimentar, sendo indicado o seu uso em situações de perturbações do sono,
essencialmente as provocadas pelo jet leg ou o trabalho por turnos. Embora os estudos que existem sobre a
sua utilização ainda sejam escassos, o uso da melatonina tem-se revelado seguro, no entanto, em doses
elevadas, pode verificar-se a ocorrência de enjoos, dor de cabeça e sonolência excessiva. A dose, em geral, é
entre 0,2 e 5 mg, dependendo das formulações, e deve ser tomada 60 a 30 minutos antes de deitar. O
momento da toma é extremamente importante para garantir que o “relógio biológico” é restabelecido no
horário pretendido. Mulheres grávidas, a amamentar, ou que têm intenção de engravidar, não devem tomar
melatonina.

Não Farmacológico

Medidas de higiene do sono:


- Procurar sempre deitar-se e acordar à mesma hora, mesmo ao fim-de-semana;
- Estabelecer uma rotina relaxante antes de se deitar (tomar um banho quente, beber uma bebida
quente, ler um pouco, ouvir música);
- Criar um ambiente tranquilo no quarto (evitar luz e ruídos), não levar trabalho para a cama;
- Escolher um colchão e almofadas confortáveis;
- Evitar as sestas diurnas;
- Fazer refeições leves próximo da hora de deitar e não beber muitos líquidos;
- Evitar estimulantes à noite (álcool, café, nicotina, chocolate, chá);
- Não fazer exercício físico antes de se deitar;
- Se não conseguir adormecer, levante-se e faça algo relaxante.

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FLUXOGRAMA DE ACONSELHAMENTO

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BIBLIOGRAFIA

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Disponível na internet http://sleepfoundation.org/ by Passiflora incarnata L. Phytother Res. 2011 Jun; 25(6):838-
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Nunes, A., Sousa, M.. Utilização da valeriana nas perturbações
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