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O sagrado direito à liberdade de expressão

(Agamenon Magalhães Júnior)

M
eu pai me ensinou uma lição que eu a levo para todos os aspectos da vida. “Os
incomodados que se mudem”, dizia ele. Acima do contexto original desse preceito
popular, meu pai intensificou seu significado, dando-lhe força e certo sentido moral. Ele
o usou, especialmente, quando suas ideias, princípios ou ideologias não se “harmonizavam”
com os diversos grupos com os quais pudesse conviver. Ele preferia “se mudar” a ter de
compactuar com opiniões que não lhe diziam nada.
Claro que não se pode negar a diversidade de pensamento, ela é tão comum quanto útil
para a sociedade. Só os regimes ditatoriais ou escravocratas se servem de uma só linha de
pensamento; em sociedades livres e democráticas (supostamente como a nossa), entretanto,
a liberdade de expressão deve ser ponto certo em que envolva bom raciocínio.
O sagrado direito à expressão é universal. E, de longe, esse direito não se nivela apenas
à inutilidade teórica. Liberdade não é sinônimo de utopia; ela é, no fundo, a única arma da
qual o povo se serve para se conscientizar dos próprios direitos. Ao se retirar o livre-arbítrio
do pensamento, diminui-se também a democracia a nível escatológico.
Tenho sido um crítico ácido das distorções que caracterizam a nossa sociedade; da
mesma forma, faço comentários que incomodam setores públicos influentes – mas, nunca
(repito, nunca!) deixei de fazê-los visando ao interesse pessoal. Eu os faço como um médico
cujo diagnóstico de câncer nas mãos conscientiza o paciente do tratamento essencial ao
restabelecimento da saúde.
Eu quero a saúde social, para tanto não me importo de meter o dedo na ferida cheia de
pus.
“A censura, seja qual for, parece-me uma monstruosidade, algo pior que o homicídio: o
atentado contra o pensamento é um crime de lesa-alma”, escreveu Gustavo Flaubert (1821-
1880), lembrando-nos de que tão essencial quanto o pão, que nutre o corpo, é a liberdade,
que alimenta o espírito!
Somos o que somos por meio das escolhas. E eu escolhi escrever para conscientizar,
informar ou divertir. Quaisquer que sejam os motivos, o único aspecto ao qual me impus foi a
honestidade (sou honesto comigo mesmo), porque é com essa característica que consigo a
confiança do leitor. Minha credibilidade junto à sociedade vem daí, por isso não posso abrir
mão desses valores. As pessoas honestas se revelam naturalmente mediante as palavras que
pronunciam ou escrevem. E essa verdade nos ensina muito sobre o tema abordado aqui.
Meus leitores me conhecem por causa de minhas palavras. Se eu não puder usá-las de forma
plena e livre, terei como me revelar para quem as lê?
A independência do homem, em seu aspecto mais amplo, está vinculada à sua
capacidade (e à sua liberdade) de se comunicar, à de dizer (ou escrever) o que pensa. As
grandes ideias da Humanidade foram concebidas por meio de partes de outros pensamentos
– não raro pensamentos contraditórios entre si. Funciona assim, desse jeito.
Contrariamente aos que só conseguem enxergar a crítica como um ato subversivo – os
lugares civilizados nos mostram que o ato de criticar, feito com responsabilidade, é a pedra
básica da democracia e, também, da liberdade social.
Que as rédeas e as amarras apenas prendam animais domesticados; nunca sejam
objeto de controle ou proibição do pensamento.

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