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SOCIEDADE DE CONSUMO, LIBERDADE E FELICIDADE

Thalles Alexandre Takada, Universidade Estadual de Londrina,


thallestakada@gmail.com

Resumo: O consumo atual reflete a necessidade individual de ser mais, de poder


mais. Esse trabalho faz uma relação à sociedade de consumo com a liberdade
econômica e política, e o conceito atual de felicidade, derivado da corrente
utilitarista. A coisificação e precificação humana é um reflexo de um modelo criado
para produzir, distribuir e degradar. Dessa forma, não se poderia dissertar sobre
sociedade de consumo sem fazer um breve relato do modelo capitalista. Objetivou-
se mostrar que a atual sociedade é o resultado de um lento processo de
transformação social e econômica, como uma relação da liberdade individual e do
conceito atual de felicidade.

Palavras chaves: Sociedade do Consumo; Liberdade; Felicidade.

CONSUMER SOCIETY, FREEDOM AND HAPPINESS

Abstract: The current consumption reflects the individual need to be more, can
more. This work makes a relation to consumer society with economic and political
freedom, and the current concept of happiness derived from utilitarian theory. The
reification and human pricing is a reflection of a model designed to produce,
distribute and degrade. Thus, could not speak about the consumer society without a
brief account of the capitalist model. This work aimed to show that the present
society is the result of a slow process of social and economic transformation, as a
relation of individual freedom and the current concept of happiness.

Key words: Consumer Society; Freedom; Happiness


Introdução
Um tema deveras abrangente. Descrever a sociedade de consumo impõe uma
análise aos primórdios econômico e social. Um reflexo do modo capitalista de
produção, distribuição e degradação, sendo o mercado o sustentáculo dessa
sociedade, hoje baseada no consumo dos mais diversos fatores.
Não querendo expandir o tema, apesar de ser necessário buscar as fontes desde a
era antiga, passando pelo mercantilismo e pelas diversas revoluções burguesas, as
quais causaram um choque paradigmático na comunidade mundial, o trabalho busca
apenas demonstrar um liame entre essa sociedade de consumo, culturalmente
mercadológica, com um conceito, um tanto mais filosófico, de felicidade.

Revisão de Literatura
Não haveria como dissertar acerca desse tema proposto sem fazer uma breve
análise do capitalismo, entendendo-o como um modo de operar de diversos
sistemas, como o direito, a economia, a sociedade, a política, entre outros1. Esse
modelo capitalista é representado primordialmente por um complexo sistema
financeiro baseado na criação de ativos intangíveis, no crédito, nos juros e no débito.
Contudo, esse modelo deu azo a uma forma muito mais invisível aos olhos
humanos, criando um suporte cognoscível denominado consumo. Karl Marx, o
principal crítico a esse modelo, descreveu essa forma como o “fetichismo da
mercadoria”, denotando o imbróglio econômico e político das relações de trocas das
mercadorias, orientadas pelo dinheiro e capital. Para ele a mercadoria
representaria um objeto palpável a ser consumida, mas, também, corporificaria toda
uma agregação de tempo e trabalho, fator abstrato, intangível e impalpável
(MARX, 1996, p.217).
Essa forma capitalista de operar é o reflexo da transição ideológica de séculos
dominados pelo liberalismo econômico e político, pelos quais privilegiaram a
liberdade individual, com o lema de que esta traria reflexos positivos a toda
coletividade. Esse sistema pretendeu resguardar, dessa forma, todas as formas de
liberdade, como a propriedade privada, os direitos subjetivos, a soberania de um
povo, um país constitucionalmente limitado e, principalmente, para o presente
trabalho, a ordem do mercado (RAMOS, 2005).
Resta claro que diversos fatores, sendo eles ideológicos, econômicos, sociais e
filosóficos, contribuíram para o surgimento da sociedade de consumo. Sociedade
que é uma forma externada do sistema econômico e social vigente. Esse sistema é
a representação da importância dada à ordem do mercado, devendo, por suas
normas, sejam elas positivadas ou morais, deixar o livre fluir da produção, comércio
e consumo.
Nessa senda, em uma sociedade “livremente” preparada para o consumo, enseja-se
o mesmo entendimento dos pensadores utilitaristas e dos economistas clássicos do
final do século XVIII. Sejam eles, Jeremy Bentham (2000), John Stuart Mill (2006) ou
o próprio Adam Smith (1996), pelo lado dos economistas, que pregaram a
maximização da utilidade, como o ponto central para o desenvolvimento econômico-
social. Para esses pensadores, a utilidade era maximizada individualmente, na
medida em que o indivíduo buscava a sua felicidade, ao prazer proporcionado, e,
consequentemente, gerava um benefício a toda sociedade. Conforme Mill (1969,
1
Poderia entender o capitalismo como um sistema mais abrangente aos citados. Nesse sentido vale citar a
teoria autopoiética de Niklas Luhmann e a Teoria Crítica dos Sistemas, da Escola de Frankfurt. FISCHER‑
(LESCANO, Andreas. 2010)
p.952) menciona: “Eu não quero afirmar que a promoção da felicidade deva ser, ela
mesma, o fim de todas as ações, ou mesmo de todas as regras de ação. Ela é a
justificação, e deve ser o controle de todos os fins, mas não é em si mesma, o único
fim”.
Na conjectura atual, a felicidade denota outras concepções. Teria a felicidade um
vínculo ao consumo, ao poder de comprar. Para Orrell (2012, p. 206) “o dinheiro é
visto como uma loja de utilidades – um tipo de energia potencial que pode ser
transformada em prazer apenas por ser gasta”. O prazer, variante da felicidade para
os utilitaristas, seria tanto uma experiência subjetiva quanto uma emoção
compartilhada com efeitos positivos de renda (Orrell, 2012, p.208). Ou seja, a
sociedade de consumo é uma rede de indivíduos sustentada pelo agir individual,
tendo como paradigma o outro indivíduo. A felicidade em consumir dependeria do
poder de consumo que o indivíduo teria a mais ou menos do que o outro indivíduo.
“A busca da felicidade não é um objetivo solitário. Estamos ligados, e o mesmo vale
para a alegria” (FOWLER apud ORREL, 2012, p. 208).
Essa concepção de felicidade, do poder de consumir, retorna ao tema já discutido da
liberdade. A liberdade individual, muito diferente do que os filósofos entendem, pode
ser mensurada em termos de graus de liberdade. No sentido de que tudo é valor de
troca, do “fetichismo da mercadoria”, e poder desfrutar desse valor, ou seja, a
liberdade do indivíduo é ter capacidade de troca, ter acesso à cultura, à saúde e aos
bens de consumo. “A liberdade, portanto, não é algo que se tem ou não tem. A
liberdade, nesse, caso comporta graduação, comporta mediações; não é algo
absoluto” (ALVES, 2004, p. 92).
Nessa visão crítica à sociedade de consumo, ao utilitarismo e a capacidade
individual de ter liberdade, vale citar Amartya Sen:
O cálculo de utilidades pode ser demasiado injusto com
aqueles que são persistentemente destituídos: por exemplo, os
pobres-diabos usuais em sociedades estratificadas, as
minorias perpetuamente oprimidas em comunidades
intolerantes, os meeiros em propriedade agrícolas –
tradicionalmente em situação de trabalho precária, vivendo em
um mundo de incerteza -, os empregados exauridos por seu
trabalho diário em sweatshops, as donas de casa submissas
ao extremo em culturas dominadas pelo machismo (2010,
p.89).

Resultado e Discussões
Percebe-se que a discussão inicial do começo do trabalho, do modelo capitalista de
operar, é um instrumento ideologicamente criado para a formação de uma sociedade
de consumo, em que impera a liberdade individual, malgrado, na concepção de
poder consumir, e a ordem do mercado é voltada para essa concepção. Não se
tentou diminuir a importância das teorias filosóficas e econômicas dos pensadores
aqui citados, mas demonstrar o nítido aspecto cultural que a conjectura atual denota.

Conclusões
A sociedade de consumo é o resultado de um complexo sistema do modelo
capitalista, que privilegia grandes corporações, exalta o luxo, e precifica e coisifica
todos os elementos humanos. Traz a felicidade individual como o motor da
sociedade e a liberdade como um valor monetário.
Enquanto, o próprio indivíduo não entende que o maior valor social não pode ser
mensurado, que é o valor humano, o sistema se manterá inerte a mudanças.
Sociedade de consumo, liberdade e felicidade refletem a tendência individualista do
indivíduo, a criar um modelo centrado para o bem estar individual, aos anseios de
cada um, sem pensar no bem da coletividade.

REFERÊNCIAS
ALVES, Alaôr C. As Raízes Sociais da Filosofia do Direito: uma visão crítica. In:
Alaôr Caffé Alves, Celso Lafer, Eros Roberto Grau, Fábio Konder Comparato,
Goffredo da Silva Telles Junior, Tercio Sampaio Ferraz Junior: O que é filosofia do
direito?- Barueri, SP: Manole, 2004.
BENTHAM, Jeremy. An Introduction to the Principles of Morals and Legislation.
Kitchener: Batoche Books, 2000.
FISCHER‑LESCANO, Andreas. A Teoria Crítica dos Sistemas da Escola de
Frankfurt. Tradução de Rúrion Melo. Novos Estudos 86, Março 2010.
MARX, Karl. O Capital. Livro I, dois volumes. Tradução de Regis Barbosa e Flávio
Kothe. São Paulo: Nova Cultural, 1996.
MILL, John S. A System of Logic. Book VI, Chapter xii §8. Ed. J.M. Robson.
Collected Works of John Stuart Mill. Toronto: Toronto University Press, 1969
____________. Ensaio Sobre a Liberdade. Tradução de Rita de Cássia Gondim
Neiva. São Paulo: Editora Escala, 2006.
ORREL, David. Economitos: Os dez maiores equívocos da Economia. Tradução:
Adriana Ceschin Rieche. Rio de Janeiro: Best Business, 2012.
RAMOS, Cesar A. O liberalismo político e seus críticos. In: Crítica: Revista de
Filosofia, Londrina, v.10, n.32, p.229-264, out. 2005.
SMITH, Adam. A riqueza das nações: investigação sobre sua natureza e suas
causas. Tradução de Luiz João Baraúna. São Paulo: Editora Nova Cultural Ltda,
1996.

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