A palestra “Imperialismo, disputas geopolíticas e guerra no século XXI” foi
ministrada pelo professor associado do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da Universidade Federal do Rio de Janeiro, doutor Carlos Eduardo Martins. Compondo o segundo dia do evento “XVII Colóquio Brasileiro em Economia Política do Sistema Mundo”, a exposição de Martins trouxe uma perspectiva acerca do imperialismo na contemporaneidade, com ênfase no papel dos Estados Unidos na conjuntura global no século XXI, tal qual sua singularidade para com a geopolítica vigente e os conflitos em curso.
Conforme exposto, a ascensão dos Estados Unidos à hegemonia pós-Segunda Guerra
Mundial trouxe consigo uma reavaliação da teoria do imperialismo, desafiando a visão tradicional vinculada aos processos de colonização. Nesse contexto, a teoria da dependência emergiu como uma abordagem que articulava o imperialismo à construção de Estados soberanos, mantendo a dominação econômica como elemento central. Arrighi, por sua vez, revisou a teoria do imperialismo, argumentando que a interpretação tradicional realizada por Lenin representava o declínio da hegemonia britânica, alegando que o direcionamento do sistema pelo capital rentista era apenas uma das manifestações possíveis, com ênfase na existência do imperialismo informal vigente na contemporaneidade. No contexto do pós-guerra, a geopolítica adotada pelos EUA fundamentava-se em duas principais sustentações teóricas: o equilíbrio de poder e a defesa do liberalismo e da democracia. Tendo em vista a bipolaridade em curso, o Estado cunhou uma abordagem de longo prazo para a confrontação com a União Soviética, com foco em elementos econômicos e ideológicos, relegando o componente militar a uma função secundária e estratégica, direcionada a pontos críticos onde o avanço do socialismo poderia ameaçar o equilíbrio de poder. No entanto, a intervenção no Vietnã, na sequência, surgiu como resultado de debates internos nos Estados Unidos, onde os intervencionistas buscavam conter a propagação do socialismo na Ásia, lançando as bases para uma análise que distinguia o realismo do idealismo na política externa norte-americana. Contudo, a estratégia de acumulação de capital baseada no neoliberalismo adotada pelos EUA a partir dos anos 1970 não conseguiu manter seu poder inquestionável, devido às pressões internas da classe trabalhadora. Isso levou a uma mobilização sindical, estudantil e universitária, ligada aos direitos, ao movimento anti-imperialista e à oposição à guerra, principalmente devido às perdas de vidas na Guerra do Vietnã. O crescente endividamento público dos EUA durante o conflito e a incapacidade de conter a ascensão da China, que adotou uma estratégia de fortalecimento tecnológico e científico, levaram os EUA a reavaliar sua abordagem. Assim, o Estado passou a compreender que a estratégia baseada na financeirização e no poder militar unilateral os expunha consideravelmente. Era necessário romper com o imperialismo formal e sua ênfase na violência para buscar uma nova estratégia de contenção da China, centrada no controle das massas terrestres intercontinentais em prol do domínio das ilhas peninsulares. Ademais, em meio ao rearranjo da balança de poder, a China galga rumo as suas ambiciosas metas desenvolvimentistas e tecnológicas, enquanto os Estados Unidos experimentam um declínio da mais alta hierarquia do Sistema Internacional. Buscando relacionar o conteúdo desenvolvido ao longo da disciplina de Formação Econômica do Brasil II, é possível notar que a narrativa construída a partir dos Estados Unidos está entrelaçada com o histórico de intervenções, mesmo que de teor não militar, vivenciado no país, por exemplo, no golpe Militar. Nesse contexto, os EUA estiverem presentes como incentivadores e patrocinadores da tomada de poder pelos militares, aja vista que tinham interesse em deter as supostas ameaças comunistas na América Latina, aqui representadas, segundo eles, por João Goulart. Ainda, após a adoção do regime ditatorial, as políticas econômicas adotadas, alinhadas com o modelo econômico de mercado preferido pelos Estados Unidos, induziram a contratação de empréstimos substanciais no exterior, advindas de instituições financeiras internacionais como o FMI e o Banco Mundial, resultando no aumento significativo da dívida externa do país. Ademais, a palestra de Martins, bem como as contribuições dos professores e colegas presentes, possibilitou uma reflexão ainda mais profunda acerca do lugar em que o Brasil se encontra nessa possível transição hegemônica vivenciada no contexto atual e qual será o alinhamento do país no reequilíbrio das forças que regem a concerto internacional, contribuindo, assim, para a melhor compreensão dos possíveis cenários que o futuro reserva ao país.
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