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Capítulo 1: O Direito do Trabalho, sua função e análise histórica

O Direito do trabalho, assim como toda área jurídica, é dotado de um conjunto de


valores sociais presentes na época de sua criação, assim sendo, o campo jurídico
trabalhista possui ainda mais esse reflexo, pois representa as relações de emprego
comuns à sua época de aplicação. Sendo assim o Direito do trabalho já nasce a proteger
” melhoria das condições de pactuação da força de trabalho na ordem socioeconômica”
DELGADO, e sequer poderíamos considerá-lo como campo do Direito se assim não o
fosse.
Tal valor se monstra basilar ao observarmos os princípios norteadores do
campo justrabalhista, uma vez que todos estes aparentam-se a garantir a pactuação
das forças de trabalho, sem que haja ou ocorra nenhuma injustiça e que o trabalhador
possa se colocar interposto frente ao poder econômico do empregador, dotado assim
de Direitos para o proteger no momento da negociação trabalhista frente ao seu
empregador.
Para Maurícido Godinho Delgado “a ordem justrabalhista emerge como
importante instrumento civilizatório no que tange à utilização da força de trabalho no
mercado laborativo do País”. Dessa forma tal proteção promovida pelo Direito trabalhista
seria agente civilizador e democrático atuante no Brasil. Corroborando com isso temos
o seguinte excerto:
Ainda que antes de 1930 houvesse leis esparsas dirigidas ao trabalho, foi a
partir daquela década que, de forma sistemática, foram adotados no Brasil
diversos mecanismos públicos de regulação e proteção social do trabalho que
a Justiça do Trabalho, prevista na Constituição de 1934, criada em 1939,
implantada em 1941 e integrante do Poder Judiciário a partir de 1946, passou
a ter o dever de concretizar e dar eficácia. A regulação consolidada em 1943
pela CLT, publicada no dia 1º de maio de 1943 para viger a partir de novembro
daquele ano, culminou com a Constituição de 1988, que elevou os direitos
dos trabalhadores à condição de direitos sociais fundamentais 1.

Partindo desse ponto, temos a inovação trazida pela Lei 13.467/17, que nos
apresentou a figura do empregado hipersuficiente, que evidenciou a quebra do
paradigma na legislação vigente até a época da reforma, que considerava todo e
qualquer trabalhador hiposuficiente nas relações de trabalho e junto a isso, flexibilizou a
ideia de direito trabalhista conquistada até então.

1 TEIXEIRA, Marilane Oliveira; GALVÃO, Andréia; KREIN, José Dari; BIAVASCHI, Magda; ALMEIDA,
Paula Freitas de; ANDRADE, Hélio Rodrigues de (Org.). Contribuição crítica à reforma trabalhista.
[1.ed.]. Campinas, SP: Instituto de Economia, UNICAMP, 2017, p. 32.
Nesse seguimento, vale-se a explicação do surgimento do Direito do Trabalho no
Brasil e a consequente explicação de seus princípios norteadores das relações de
trabalho, para que assim seja feita a análise política-social do contexto em que se foi
criado a legislação trabalhista e sua consequente evolução, para assim então
compreender a figura daquele que se caracteriza como empregado hipersuficiente em
relação aos empregadores. Nestes termos, de acordo com a leitura praticada da obra de
DELGADO, M. temos a primeira constituição a vislumbrar princípios justrabalhistas como
a de 1934, que durou até o estado de sítio de 1935 e a partir desse momento todas as
subsequentes incorporaram de alguma forma os preceitos do Direito do Trabalho de
forma a resguardar seus princípios.
Após esse período de 34, perpassamos pela era vargas, que foi marcada pelo
autoritarismo e a queda de revoltadas sindicais e trabalhistas, para assim então em 1943,
termos a promulgação do Decreto-Lei 5.742, sob o nome de “consolidação das leis
trabalhistas” (CLT). Sobre essa nova legislação, vigente até os dias de hoje o Direito do
Trabalho se consolidou como área atuante na sociedade brasileira, norteando a proteção
aos empregadores e garantindo-lhes a diginidade no momento de negociar a sua força
de trabalho. Essa legislação trouxe diversas novidades, sendo uma delas considerar o
empragado hiposuficiente perante o empregador, detentor do capital, o colocando em
uma posição de proteção com uma série de direitos no momento da elaboração do
contrato de trabalho.

Capítulo 2: Os Princípios Fundamentais do Direito do Trabalho

Nesta seção, voltaremos ao cerne dos princípios do Direito do Trabalho, que


historicamente visam à proteção do trabalhador. Discutiremos conceitos como
subordinação, jornada de trabalho, direitos fundamentais do trabalhador e segurança
no emprego se encaixam na era do empregado hipersuficiente. Além disso,
exploraremos o equilíbrio necessário entre a proteção do trabalhador e a flexibilidade
exigida pelas novas realidades do mercado de trabalho.
Quando tratamos de princípios e Direitos devemos nos atentar a sua definição
teórica e consolidade no âmbito jurídico, pricipalmente no Brasil. Temos na morfologia
da palavra a ideia de início, começo e também como preposição fundamental sendo
nas palavras do autor “proposição lógica fundamental sobre a qual se apoia o
raciocínio” DELGADO, M. Nesse último sentido fora adicionada a diversas áreas do
conhecimento, dentre elas ao Direito.
Para o campo jurídico os princípios remetem aquilo que é ideal, fundamental à
matéria, logo tendo a importância necessária para nortear a legislação produzida,
defendendo a finalidade, o dever-ser.
Aprofundaremos a análise aqui sobre o princípio da proteção, que evidencia
um fundamento basilar do campos justrabalhista: a hipossuficiência do obreiro em
relação ao empregador na relação trabalhista. Esse princípio se capilariza em todos
os campos do Direito individual do trabalho.
O princípio tutelar aparece de forma a tentar equalizar a enorme força
econômica do empregador, que geralmente possui maior influência e assume lugar
de privilégio no momento da negociação por obter todos os recursos financeiros, e do
empregado que se faz valer desse princípio para poder equipar-se no momento de
pactuar o valor da sua força laborativa.
A reforma de 2017, ao flexibilizar, eliminar e desregular diversas parcelas
trabalhistas acabou por diminuir o valor do trabalho na economia, principalmente ao
deixar de proteger o trabalhador, pricipalmente quando considerado hipersuficiente.
Sendo assim o âmbito justrabalhista passou a ser campo de novidades não benéficas
ao trabalhador, possibilitando a flexibilidade no momento da contratação e pactuação,
permitindo ao trabalhador abrir mão de direitos anteriormente garantidos pela
legislação trabalhista vigente.
Ao realizar esse movimento, o legislador deixou explícito que naquele momento
optou por certa parcela da população em detrimento do trabalhadores, dentro disso
podemos destacar a figura trazida pelo art. 444 da CLT, que até então era inexistente
e foi adicionada com justificativa de possibilitar uma melhor negociação e garantir
melhores condições antes impossibilitadas pelo dito excesso de proteção. Porém tais
condições poderiam tampouco serem objeto de negociação, uma vez que o
ordenamento jurídico brasileiro optou por adotar, juntamente com a maiora dos
países, uma forma protetiva que foi consolidada na Constituição Federal de 1988,
positivados no artigo 7º2.
O princípio da proteção se subdivide ainda em outros, que são de suma
importância para entender o equívoco da figura paradigma em questão, sendo eles:
O princípio da norma mais favorável, da condição mais benéfica e do in dubio pro

2Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua
condição social:
operário. No primeiro a teoria aponta para o favorecimento da norma mais favorável
ao trabalhador, nas palavras do ministro Maurício Godinho Delgado:

O presente princípio dispõe que o operador do Direito do Trabalho deve optar


pela regra mais favorável ao obreiro em três situações ou dimensões
distintas: no instante de elaboração da regra (princípio orientador da ação
legislativa, portanto) ou no contexto de confronto entre regras concorrentes
(princípio orientador do processo de hierarquização de normas trabalhistas)
ou, por fi m, no contexto de interpretação das regras jurídicas (princípio
orientador do processo de revelação do sentido da regra trabalhista).
DELGADO, p. 235-236, 2018.

podendo ela se sobrepor sobre qualquer legislação, desde que não


inconstitucional, logo ao interpretarmos o empregado hiperssuficiente como uma
forma de abrir mão desse direito para teoricamente beneficiar seu contrato.
O segundo princípio que iremos destacar como parte da proteção é o princípio
da condição mais benéfica, que segundo definição extraída da obra:

Este princípio importa na garantia de preservação, ao longo do contrato, da


cláusula contratual mais vantajosa ao trabalhador, que se reveste do caráter
de direito adquirido (art. 5º, XXXVI, CF/88). Ademais, para o princípio, no
contraponto entre dispositivos contratuais concorrentes, há de prevalecer
aquele mais favorável ao empregado. DELGADO, p.238, 2018.

Assim sendo o princípio em questão busca defender o fato de que, havendo


negociação prévia no contrato, o trabalhador não poderá ter seus direitos alterados
após isso.
Por úlitmo temos o princípio do in dubio pro operário, que nas palavras de
DELGADO

Uma das mais antigas referências doutrinárias a princípios justrabalhistas


está na diretriz in dubio pro misero. Trata-se de transposição adaptada ao
ramo justrabalhista do princípio jurídico penal in dubio pro reo. Como o
empregador é que se constitui em devedor na relação de emprego (e réu na
relação processual trabalhista), adaptou-se o princípio à diretriz in dubio pro
misero (ou pro operario). DELGADO, p. 248-249, 2018.

Sendo esse um princípio adptado do direito penal que aplicado à seara


trabalhista busca sempre resguardar o trabalhador (constituinte sempre do polo mais
fraco da relação trabalhista) para resguardar seus direitos, mesmo que havendo
dúvida, por se tratar de direitos importantíssimos para a manuteção do seu bem estar.
Assim sendo, fica evidente a mitigação provocada ao princípio da proteção pela
reforma trabalhista ao inserir no ordenamento a figura paradigma do empregado
hiperssuficiente, que será aprofundada no próximo capítulo.

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