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Direito do Trabalho
2ª Aula: 12/08/2021
Princípios Peculiares do Direito do Trabalho
Na definição de Américo Plá Rodriguez, citado por Camino, princípios são “Linhas diretrizes que
informam algumas normas e inspiram direta ou indiretamente uma série de soluções pelo que, podem servir
para promover e embasar a aprovação de novas normas, orientar a interpretação das existentes e resolver os
casos não previstos”.
Para Ives Gandra da Silva Martins Filho, os princípios de Direito do Trabalho “constituem as linhas
diretrizes ou postulados que inspiram o sentido das normas trabalhistas e configuram a regulamentação das
relações de trabalho, conforme critérios distintos dos albergados por outros ramos do Direito.”4
Os princípios cumprem tríplice função:
a) Informadora: inspirando o legislador, servindo de fundamento para o ordenamento jurídico;
b) Normativa: atua como fonte supletiva, no caso de ausência ou lacuna da lei;
c) Interpretadora (ou interpretativa) atua como critério orientador ao juiz ou ao intérprete.
Quanto ao particular, melhor esclarecendo, aduz Martins Filho que:
Os princípios de Direito, em qualquer ramo da Ciência Jurídica, desempenham três
funções básicas:
1
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho, 4ª ed., São Paulo, LTr, 2005, p. 184.
2
MARTINEZ, Luciano. Curso de direito do trabalho: relações individuais, sindicais e coletivas do trabalho, 4ª ed., São Paulo:
Saraiva, 2013, p. 101.
3
CAMINO, Carmen. Direito individual do trabalho, 4ª ed., Porto Alegre: Síntese, 2044, p. 88-9.
4
MARTINS Filho, Ives Gandra da Silva. Manual esquemático de direito e processo do trabalho, 19ª ed., São Paulo: Saraiva,
2010, p. 58.
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a) função informadora – de orientar o legislador na confecção das leis e de
fundamentar as normas jurídicas estatuídas (os princípios mais gerais integram a base
do Direito Natural, que irá nortear a elaboração do Direito Positivo);
b) função normativa – nos casos de lacuna e omissão da lei, atuam como fonte
supletiva de direito (LICC, art. 4º; CLT, art. 8º; CPC, art. 126);
c) função interpretativa – critério orientador de interpretação e compreensão das
normas jurídicas positivadas (permite que, havendo incidência de diferentes regras de
direito sobre uma questão jurídica a ser solvida, o aplicador da lei disponha de uma
orientação quanto a qual regra merece prevalecer em relação a outra).5
5
Ibidem, p. 58.
6
CASSAR, Vólia Bonfim. Direito do trabalho, 2ª ed., Niterói: Ímpetos, 2008, p. 165-6.
7
Ibidem. p. 182-3.
8
Ibidem, p. 183.
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três importantes, regras ou ideias, ou, também, como alguns autores preferem, em três princípios ou
subprincípios, mas na verdade há convergência que se consubstanciam em: - In dubio pro operario
(misero); - Aplicação da Norma mais Favorável; Preservação da Condição Mais benéfica.
Salienta a autora, ainda, que:
Não há consenso na doutrina se este princípio é gênero de todos os outros princípios
de Direito do Trabalho ou apenas dos três princípios acima destacados. A doutrina
majoritária, seguindo a orientação de Américo Plá Rodriguez, defende que o
princípio da proteção é gênero que comporta as três espécies acima.
Assim afirma Plá Rodriguez:
[...] além do princípio protetor, no qual se inserem as regras in dubio pro
operario, da norma mais favorável e da condição mais benéfica, o Direito do
Trabalho consagra os princípios da irrenunciabilidade, da continuidade da
relação de emprego, da primazia da realidade, da razoabilidade e da boa-fé.
O princípio da proteção ao trabalhador tem fundamento na desigualdade, diferente do
Direito Civil, em que teoricamente as partes contratantes possuem igualdade
patrimonial. No direito do Trabalho há uma desigualdade natural, pois o capital
possui toda a força do poder econômico. Desta forma, a igualdade preconizada pelo
Direito do Trabalho é tratar os desiguais de forma desigual.9
Feitas tais considerações, segue o estudo dos princípios de Direito do Trabalho enumerados por
Américo Plá Rodriguez:
1. Princípio da proteção (protetor, protetivo, tutelar): Ressalta Martins Filho que: “Enquanto no
Direito Civil assegura-se a igualdade jurídica dos contratantes, no Direito do Trabalho a preocupação é
proteger a parte economicamente mais fraca, visando alcançar uma igualdade substancial”10 que pode se
concretizar em três ideias (megaprincípio), pois deste decorrem todos os demais:
a) In dubio pro operario: aplicável à interpretação da norma. Para fins de interpretação do direito
material e não para interpretação ou aplicação da prova. Quando uma mesma norma comporta
interpretações diversas deverá optar o intérprete pela que resultar em situação mais vantajosa ao empregado.
Sinala Martins Filho que para sua aplicação pressupõe-se a existência de dúvida, não se podendo ir
contra a vontade expressa do legislador, bem como que na observância desta regra deve-se “[...] escolher,
entre vários sentidos da norma, aquele que seja mais favorável ao trabalhador.”11
Por fim, não se pode olvidar que os princípios estudados são de Direito Material do Trabalho,
havendo diversos autores, todavia, que defendem a aplicação desta regra para avaliação da prova o que, sem
dúvida, tem relação com o Direito Processual do Trabalho.
9
Ibidem. p. 183.
10
MARTINS Filho, Ives Gandra da Silva. [op. cit.], p. 59.
11
Ibidem, p. 59.
12
CASSAR, Vólia Bonfim. [op. cit.], p. 192.
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Entretanto, a autora alerta que: “Mesmo que a norma seja mais favorável ao empregado, se violar
dispositivo expresso em lei ou for inconstitucional, não poderá ser aplicada. É o que ocorre quando uma
norma coletiva concede aumento coletivo que contrarie lei de política salarial – art. 623 da CLT.”13
2. Princípio da irrenunciabilidade
Impossibilidade jurídica de renúncia pelo empregado de seus direitos, sob o fundamento da coação
presumida. As normas trabalhistas são de ordem pública, cogentes e irrenunciáveis. Se infringidas, é nulo o
ato respectivo, conforme art. 9o da CLT.
Esclarece Martins Filho, que renúncia consubstancia “negócio jurídico unilateral que determina o
abandono irrevogável de um direito.”16
13
Ibidem, p. 194.
14
MARTINS Filho, Ives Gandra da Silva. [op. cit.], p. 60.
15
CASSAR, Vólia Bonfim. [op. cit.], p. 184.
16
MARTINS Filho, Ives Gandra da Silva. [op. cit.], p. 60.
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Constitui-se no desprezo à forma quando contra ela se sobrepõem os fatos reais.
Em caso de discordância entre o que ocorre na prática e o que emerge de documentos ou acordos,
deve-se dar preferência ao que se sucede no terreno dos fatos, desde que devidamente provados.
Segundo magistério de Martins Filho, o princípio em destaque: “Consiste em das preferência à
realidade fática verificada na prática da prestação de serviços em vez do que possa emergir dos documentos
que corporificam o contrato de trabalho, quando houver discordância entre ambos [...].”17
Argumenta Cassar que:
O princípio da primazia da realidade destina-se a proteger o trabalhador, já
que seu empregador poderia, com relativa facilidade, obriga-lo a assinar
documentos contrários aos fatos e aos seus interesses. Ante o estado de sujeição
permanente que o empregado se encontra durante o contrato de trabalho,
algumas vezes submete-se às ordens do empregador, mesmo que contra sua
vontade.18
Evidenciando a aplicação de tal princípio, a Súmula 12 do Colendo TST estabelece que "As
anotações apostas na carteira do empregado pelo empregador não geram presunção ‘juris et de jure’, mas
apenas ‘juris tantum’”.
4. Princípio da continuidade
Pressupõe que o ser humano, em suas relações trabalhistas, proceda conforme a razão.
Baseia-se no pressuposto de que o homem comum atua normalmente de acordo com a razão e
adaptado a certos padrões de conduta, que são os que corretamente se preferem e se seguem, por serem os
mais lógicos.
Frisa Martins Filho que: “A conduta das partes deve fundar-se em motivos racionais e não arbitrários
ou carentes de uma justificação razoável. [...] Critério geral e intuitivo, com certa subjetividade, que supõe o
senso comum compartilhado pela comunidade.”20
17
Ibidem, p. 66.
18
CASSAR, Vólia Bonfim. Direito do trabalho, 2ª ed., Niterói: Ímpetos, 2008, p. 201.
19
Ibidem, p. 58.
20
MARTINS Filho, Ives Gandra da Silva. [op. cit.], p. 67-8.
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Serve como critério distintivo ou como meio de aplicar os critérios distintivos, em situações limites
nas quais se deva distinguir a realidade da simulação. Critério adicional, complementar, suficiente quando
não há outros elementos de convicção.
Segundo Américo Plá Rodriguez, a falta de antecedentes pode tornar particularmente controvertida a
aplicação de tal princípio.
Refere-se à conduta da pessoa que considera cumprir realmente seu dever. Pressupõe uma posição de
honestidade e honradez no relacionamento jurídico, porquanto contém implícita a plena consciência de não
enganar, não prejudicar, nem causar danos. Implica a convicção de que as transações são cumpridas,
normalmente, sem trapaças nem desvirtuamentos.
O princípio da boa fé não é exclusivo do Direito do Trabalho, nem distintivo deste
ramo da Ciência Jurídica, mas norteia todas as relações contratuais, dentre as quais as
trabalhistas. Constitui uma das chaves-mestras do novo Código Civil, sinalizando
para o modo como devem ser interpretados os negócios jurídicos (CC, art. 113).
A boa fé é a intenção moralmente reta no agir, que se supõe na conduta normal da
pessoa. É o equivalente no Direito Civil, ao princípio da inocência até prova em
contrário, do Direito Penal (CF, art. 5º, LVII).
Assim, a conduta, quer processual, quer negocial, das partes no Direito e no Processo
do Trabalho deve ser interpretada como um agir de boa-fé, até que se demonstre, por
provas ou indícios concretos, que se agir de má-fé.21
Portanto, resulta evidente que em Juízo, a boa fé se presume, a má fé deve ser provada.
21
Ibidem, p. 71.