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ENEM COMO INTERPRETAR CORRETAMENTE AS FAMOSAS TIRINHAS, SEMPRE PRESENTES NAS PROVAS

102

Conhecimento Prático - Língua


Portuguesa e Literatura TONS MAIS
CINZENTOS
DE HORACE
LITERATURA WALPOLE A EDGAR
BRASILEIRA ALLAN POE, TEXTOS
GÓTICOS E SEUS
A BRASILIDADE
RECESSOS SOMBRIOS
ATEMPORAL DE
GONÇALVES DIAS

PRÊMIO “Em boca


JUCA PATO fechada não
CONCEIÇÃO EVARISTO entra mosquito”
VENCE E SE TORNA A
INTELECTUAL DO ANO
“Se conselho
fosse bom não se
dava, vendia-se”
“Quem com ferro
fere, com ferro
será ferido”
EDIÇÃO 102 - PREÇO R$ 17,00

“Vão-se os anéis
e ficam os dedos”
“As paredes
têm ouvidos”

O PAÍS DOS
CLICHÊS
Os famosos “chavões” são usados
indiscriminadamente por grande
parte dos brasileiros em frases vagas
e imprecisas, que provocam grande
impacto, ainda que digam pouco

ENTREVISTA
DEMIAN PAREDES, crítico literário argentino: “a escrita global está subjugada à ordem econômica”

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ENEM COMO INTERPRETAR CORRETAMENTE AS FAMOSAS TIRINHAS, SEMPRE PRESENTES NAS PROVAS
COLUNAS FIXAS
102

Conhecimento Prático - Língua


30. Nossa capa 05. Abre Alas
Portuguesa e Literatura
Histórias minimalistas
O país dos
TONS MAIS
CINZENTOS

LITERATURA
BRASILEIRA
DE HORACE
WALPOLE A EDGAR
ALLAN POE, TEXTOS
de Mário Baggio

clichês
GÓTICOS E SEUS
A BRASILIDADE

06. Aperitivo
RECESSOS SOMBRIOS
ATEMPORAL DE
GONÇALVES DIAS

PRÊMIO “Em boca


JUCA PATO fechada não Fique por dentro dos
CONCEIÇÃO EVARISTO
VENCE E SE TORNA A
entra mosquito”
Quem de nós nunca acontecimentos do
INTELECTUAL DO ANO
“Se conselho
fosse bom não se
dava, vendia-se”
ouviu dizer que “Deus é mundo da Língua
“Quem com ferro
fere, com ferro
brasileiro” ou que “contra Portuguesa e da
será ferido”
fatos não há argumentos”? Educação
EDIÇÃO 102 - PREÇO R$ 17,00

“Vão-se os anéis
e ficam os dedos” Essas frases fazem parte
“As paredes 09. Literal
têm ouvidos” da memória coletiva e
O PAÍS DOS O fenômeno Carla
provocam impacto em
CLICHÊS
Madeira, autora de
quem as ouve, porque Tudo é rio
Os famosos “chavões” são usados refletem um pouco da
indiscriminadamente por grande
parte dos brasileiros em frases vagas ampla diversidade de 14. Interfaces
e imprecisas, que provocam grande Dança e ciência:
impacto, ainda que digam pouco nossas raízes étnicas
ENTREVISTA
performances em
DEMIAN PAREDES, crítico literário argentino: “a escrita global está subjugada à ordem econômica”
geometrias e PhDs
22. Sobreimpressões
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Arte, desarte e
10. Entrevista 24. Gramática 50. Resgate gritas: questões
transgressoras
O jornalista cultural, Como são abordadas A “devassa” Gilka
tradutor, ensaísta e as tirinhas nas provas Machado e seu 29. Acontece
blogueiro argentino do Enem e da Fuvest apagamento A festa de arromba
Demian Paredes diz, da Flip-Pagu
em entrevista exclu- 38. Diretrizes 54. Literatura 44. Lusamérica
siva, acreditar que Estrangeira O livro que mudou
a literatura global Revolução estética minha vida
contemporânea pode em Luandino Vieira 52. Resenha
ser vista como algo Outra Vida,
permanentemente 58. Linguarude de Rodrigo
ameaçado e subjuga- Lacerda, analisa
do, do ponto de vista relacionamentos a
econômico O eu lírico, voz que partir do caos
não se identifica nem 63. Lugar de Fala
16. Foco com o masculino Esconjuro!
Conceição Evaristo nem com o feminino
64. Estante
ganha prêmio Juca Lançamentos
Pato como a inte- 46. Literatura literários que
lectual do ano e tem Brasileira valem a leitura
reconhecida a sua Sentido de brasili-
66. Reticências
literatura produzida dade presente em Recessos sombrios As guerras internas
fora do cânone Gonçalves Dias da literatura gótica dos docentes

4 CONHECIMENTO PRÁTICO - LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA

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entrevista
Demian Paredes

“Sou um
leitor voraz
e onívoro”
O jornalista cultural e tradutor argentino acredita
que a literatura global contemporânea pode ser
vista como algo permanentemente ameaçado e
subjugado do ponto de vista econômico

por Ana Maria Haddad Baptista

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“Arrisco-me a dizer que sou, em 2018, Siete miradas. Conver-
sas sobre Literatura. Propor-
apenas através da leitura, um cionou-me uma abertura muito
estudioso da literatura, que, na sua generosa de portas para mundos
diferentes, uma aprendizagem
condição de ‘independente’, pode permanente através de histórias
colaborar, participar e associar- e tradições literárias sem fim; de
amizades e conexões com vastos
se livremente com diversas mundos da literatura e da ciên-
instituições, coletivos e editoras…” cia, desde a nossa tradição nacio-
nal até vários países da América
Latina, especialmente o México.
Além disso, participei do volume
coletivo, 12º e último, da História

E
le é múltiplo quando se meu próprio nome, baseado no Crítica da Literatura Argen-
trata de livros e leituras. romance homônimo de Hermann tina, também em 2018, dirigido
Jornalista cultural, blo- Hesse. Sempre digo isso com cer- por Jorge Monteleone, focado no
gueiro, tradutor, crítico, ensaís- teza. Eu deveria estar grato por tema da última ditadura ocorrida
ta e editor, mas principalmente não ter sido batizado com outro em nosso país.
leitor, Demian Paredes é um dos título… como Sidarta!). Além Arrisco-me a dizer que sou, ape-
grandes intelectuais argenti- disso, morei sete anos em Jujuy, nas através da leitura, um estu-
nos da atualidade. Nascido em província do Norte. Sou um leitor dioso da literatura, que, na sua
uma família que já gostava de voraz e onívoro. Desde os qua- condição de “independente”, po-
ler, recebeu o nome de um livro tro anos, sem interrupção. Tive de colaborar, participar e asso-
homônimo do escritor, pintor e vários empregos: por exemplo, ciar-se livremente com diversas
Nobel de literatura Hermann fui carteiro, no final da década instituições, coletivos e edito-
Hesse, autor do conhecido Si- de 1990 – o que logo pareceu me ras, para todo tipo de projetos
darta, e ainda brinca com o fato, relacionar com o sofrido Henri e projetos culturais, artísticos
dizendo que deveria estar grato Chinaski, alter ego de Charles e obras literárias, de forma ad
por não ter sido assim batizado. Bukowski, cujo primeiro ro- hoc, sempre que pareçam impor-
Ativo nas redes sociais, colabo- mance é justamente intitulado tantes e dignas de valor. Publi-
ra com o blog alpialdelapalabra. Postman. Estudei Comunicação co em diversas revistas, como
blogspot.com, no qual publica, Social e Literatura. Fui ativo nos Zama e Hispamérica. Compilei
sistematicamente, também au- direitos humanos e na política e e prefaciei Canton lleno (2019)
tores brasileiros, devidamente fui promotor da editora do Insti- e Canton lleno dos (2022), vo-
traduzidos por ele. Um dínamo tuto do Pensamento Socialista. lumes dedicados ao poeta Darío
em questões literárias, com ar- Atualmente me dedico ao jorna- Canton. Editei Only the Fugitive
ticulações no mundo inteiro, e lismo cultural, ensaio e crítica. Remains (2022), um volume de
amizades que resultam em es- Colaboro regularmente, há mais contos da grande dama das letras
tudos primorosos. de cinco anos, nos suplementos mexicanas Margo Glantz, e com-
dominicais “Radar” e “Radar Li- pilei e prefaciei Al margin de la
Gostaria, primeiramente, que vo- bros” do jornal Página/12. noche. Antologia (2023), do poe-
cê fizesse uma síntese de sua tra- Mantive uma relação de amizade ta argentino Esteban Moore. No
jetória pessoal e profissional. fraterna, sempre carinhosa, com blog deste último (alpialdelapa-
Nasci em 1978. Fui criado na pro- o escritor e crítico Noé Jitrik, labra.blogspot.com) venho publi-
víncia de Buenos Aires por uma morto em 2022, durante quinze cando, sob o rótulo “Poesia Brasil
família operária, com estudos em anos. Amizade da qual surgiu o Contemporâneo”, quase cinquen-
cultura artística e política (daí volume que publicamos juntos, ta autores. Pequenas “amostras

ESCRITA VIVA 11

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entrevista
Luiz Fernando Emediato

de poesia”, com a esperança ou marcas, e perdendo catálogos Sabe-se que o escritor brasileiro
e intenção de que possam ser inteiros) ou mesmo no setor in- possui uma literatura de alta den-
transformadas em publicações dustrial (por exemplo, na Argen- sidade poética e um diálogo in-
futuras e impressas, sejam anto- tina, o papel para os interiores e tenso com outras fontes, além da
logias coletivas ou obras de um o “papelão” para as capas, para especificamente literária. Quais
determinado autor ou autora. E produzir livros, são mercado- foram as suas principais preocu-
está prestes a ser publicada a ge- rias, e apenas duas empresas os pações em relação à tradução?
ração que desprezava os velhos, produzem e os seus preços estão Muito obrigado pela avaliação
de Ricardo Lísias, uma tradução subindo). Poderíamos também positiva da tradução. Apesar
que fiz da coletânea de poemas, falar das próprias obras (o que do trabalho que mencionei que
tão inventivos quanto combati- se escreve, o que se publica) ou ele vinha fazendo em termos de
vos, que este narrador escreveu do que mudou no que diz respei- poesia (e mesmo antes, com en-
diante da dupla catástrofe sofri- to aos “hábitos de leitura” com trevistas e pequenos ensaios em
da por Bolsonaro e covid-19. a pandemia: por exemplo, na português), não conhecia Marco
Espanha, o florescimento de pe- Lucchesi. Por sugestão da edito-
Como avalia a literatura, numa quenas livrarias de bairro, que ra InterZona, e de um editor que
escala mais global, contempo- funcionaram ou também funcio- lá trabalhava na época, Luciano
rânea? Com quais escritores têm nam como café, centro cultural Páez Souza, li O dom do crime
tido contato mais diretamente? e local de encontro e convívio; e e fiquei agradavelmente sur-
É muito difícil responder à pri- mais: em vários casos, a opção preso e feliz com a qualidade e
meira pergunta, pela amplitude direta de encomenda do livro, originalidade do romance, então
de tudo o que ela pode (e deve, ne- no local, para que este possa ser concordei em traduzi-lo. Quanto
cessariamente) abranger e pela impresso a pedido, just in time. à tradução em si, a minha preo-
profundidade necessária (exten- Em relação aos contatos e rela- cupação foi, antes de mais nada,
são, tempo) para poder pensá- cionamentos com escritores e que a história tivesse uma che-
-la. Para citar apenas um caso, escritoras, procuro o tempo todo gada feliz e eficiente à língua de
temos os “estudos quantitativos” tê-los, mantê-los e ampliá-los. recepção, neste caso “River Plate
promovidos por Franco Moretti Como acontece frequentemente, Castelhan”. Tentar um castelha-
e colaboradores: “leitura distan- muitos laços aprofundam-se e no “neutro” teria empobrecido a
te”, mergulhando nas bases de prolongam-se ao longo do tem- obra (e a própria língua) e, claro,
dados dos grandes reservatórios po, tornando-se projetos comuns a tradução literal também teria
de bibliotecas digitais, para rea- e relações internacionais e cul- suas inevitáveis ​​limitações e
lizar análises quantitativas (de turais valiosas e muito necessá- contradições. Quanto ao conte-
palavras específicas, nomes etc.) rias, especialmente em tempos údo, a obra de Lucchesi se passa
com base em quantidades monu- de crise e de explosões reacioná- no final do século 19, em um local
mentais de livros, impossíveis rias em todo o mundo. Interajo específico, contém um assas-
de se ler durante uma única vida com artistas, escritores e escri- sinato e, portanto, discursos e
humana (e muito menos pensá- toras de vários países da Amé- discussões policiais e jurídicas,
-la e analisá-la). Mas podemos rica Latina (não é preciso citar além de especulações e histórias
também encarar a literatura no nomes: do México, do Chile, de do jornalismo seriado; há prosa
“global contemporâneo” como Cuba e do Brasil, principalmen- metaliterária e poética (musi-
algo permanentemente ameaça- te) e dos Estados Unidos. cal), há construções com alusões
do e subjugado, do ponto de vista (espaciais e geográficas) e metá-
econômico (o mercado), pela for- Recentemente você traduziu O foras (executando uma analogia
mação de monopólios, ou no cam- Dom do Crime do escritor brasi- ou “duplicata” com o romance
po editorial (onde as editoras leiro Marco Lucchesi. Li a belíssi- de Machado de Assis, ou usando
menores são absorvidas, perma- ma tradução que fez. Conte um Eternidade através das estre-
necendo como meras etiquetas, pouco como se deu o processo. las, de Blanqui). Para mim foi um

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desafio, um prazer e uma expe-
riência completamente enrique-
“(…) muitas vezes quem escreve
cedora. Espero ter dado crédito acaba fazendo isso porque vai além
à criatividade e engenhosidade
de Lucchesi, bem como às nossas
daquela atividade, daquele papel,
duas línguas. para criar, montar, lançar ao mundo o
livro que acredita que deveria existir”
Marco Lucchesi já foi traduzido
para mais de vinte línguas, se con-
siderarmos o seu conjunto plural
de obras. Marina, uma novela
epistolar, recentemente lançada
pela Editora Rua do Sabão, está te” em (ou entre) línguas, temos dita que deveria existir. Por isso
sendo traduzida para o espanhol, uma série de autores, incluindo fiz o Léxico Laiseca, pois a mor-
para o inglês e até para o chinês. Chomsky, Eco, Steiner e a pró- te do escritor estava no notici-
O que teria a nos dizer a respeito pria Cassin, com várias teorias, ário, e a minha vontade quase
disso? Como avalia as possíveis metodologias, éticas e filosofias imediata de querer reivindicá-
dificuldades de se traduzir um em relação à tradução, todas -lo, comentá-lo, divulgá-lo, como
livro do português para o chinês? construtivas, positivas e otimis- uma homenagem merecida (foi
Afinal, duas estruturas linguísticas tas quanto às possibilidades de também uma morte que ocor-
muito diferentes em si mesmas. tradução e compreensão das lín- reu durante uma série, em que
Outra questão complicada e/ guas. Estamos falando de pontes também morreram naqueles
ou complexa. A obra de Lucche- (como foi intitulada a antologia mesmos meses Ricardo Piglia,
si é certamente rica e variada. “dupla” de poesia, produzida por Abelardo Castillo e Adriana As-
Surpreende e atrai, une quem a Heloísa Buarque de Holanda e tutti, editora de Beatriz Viter-
lê e torna-se necessária (e daí a Jorge Monteleone). E isso sem bo de Rosário). Quero escrever
tradução, que nada mais é do que esquecer as formas híbridas: lín- uma trilogia de ensaios sobre
mais uma forma de divulgação, se gua franca, línguas fronteiriças literatura e ditadura, tomando
quiserem como efeito positivo de como o portuñol (e aqui vale lem- Chile, Uruguai e Argentina (ob-
leitura). Mas acredito que qual- brar o falecido escritor parana- viamente deixei muito mate-
quer obra pode ser traduzida, ense – infelizmente assassinado rial fora do ensaio publicado no
transferida (ou mesmo, como di- – Wilson Bueno, entre outros). volume de História Crítica…). E
riam os concretistas, “transcria- estou com um livro levemente
da”) de uma língua para outra. O que tem planejado e deseja- autobiográfico no meio da es-
Sem ser especialista na área e do como tradutor e ensaísta para crita, baseado na minha leitura
muito menos no que diz respeito seu percurso futuro? muito ampla e variada, chama-
à língua chinesa, vale lembrar o Como já mencionei, considero- do O Fio Infinito. Interesso-me
trabalho coletivo de uma teóri- -me essencialmente um leitor. E por tudo que seja escrever e cri-
ca como Barbara Cassin, que foi acho que muitas vezes quem es- ticar com fragmentos e citações
batizada justamente como Dicio- creve acaba fazendo isso porque de outros livros. E continuar
nário dos Intraduzíveis. Além de vai além daquela atividade, da- traduzindo coisas do Brasil, pa-
qualquer possível existência de quele papel, para criar, montar, ís cuja cultura e literatura sem-
uma “intraduzibilidade imanen- lançar ao mundo o livro que acre- pre me fascinaram e amo.

A AUTORA ANA MARIA HADDAD BAPTISTA é mestra e doutora em Comunicação e Semiótica [PUC/SP]. Tem pós-doutoramento em História da
Ciência pela Universidade de Lisboa e PUC/SP, onde se aposentou. Pesquisadora e professora dos programas de pós-graduação Educação, stricto
sensu, da Universidade Nove de Julho de São Paulo. Possui dezenas de livros e ensaios publicados no Brasil e no exterior. professoraanahb@gmail.com.

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