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Transvaloração

A obra do filósofo alemão Friedrich Nietzsche, produzida no fim do século XIX, é


considerada o grande marco da transição entre o pensamento moderno e o contemporâneo.
No campo da Ética, esse pensador propôs uma severa crítica à moral fundamentada na
supremacia da razão e no controle dos desejos.

Decidido a questionar os valores morais defendidos pela tradição racionalista, como o bem a
origem deles a fim de mostrar que não eram absolutos e eternos, mas é intencionalmente
forjado no decorrer do tempo. Esse procedimento ficou conhecido como "genealogia da
moral" e resultou na transvaloração, ou seja, em uma inversão radical dos valores da tradição
cristã

Baco é o nome latino de Dioniso, o deus grego do vinho e dos impulsos primitivos. Para
Nietzsche, Dioniso representa os elementos vitais da existência, como os desejos e as paixões
e racionalista. Ao realizá-la, o filósofo pretendia submeter a moral à vida, à natureza, e não o
contrário.

Seu pensamento foi marcado pela defesa contundente da força vital do ser humano como o
único valor absoluto, acreditando que as proibições e os limites morais impostos pela
perspectiva racionalista enfraqueciam a natureza humana. Opondo-se a isso, Nietzsche definia
a liberdade como manifestação do aspecto dionisíaco da existência, marcado por elementos
vitais, como o desejo e as paixões. Portanto, acreditava que condená-los ao domínio da razão
seria o mesmo que negar a vida e a natureza.

Relembrando os deuses gregos Apolo e Dioniso, Nietzsche dividia a existência em dois


aspectos: o apolíneo, marcado por ordem, razão, controle das emoções; e o dionisíaco,
marcado por desmedida, força e paixões. Na Ética, ele contrastava o aspecto apolíneo das
normas morais com o aspecto dionisíaco dos impulsos vitais.

Para Nietzsche, tudo o que existe seria dotado de impulsos que agem e se relacionam entre
si, de modo diferente a cada momento. De acordo com esse ponto de vista, o impulso criador,
a vontade de potência, faria surgir novas formas a todo instante. Esse impulso não era
atribuído apenas ao ser humano, mas a toda natureza.

Segundo ele, a vontade de potência deveria ser entendida como um impulso fundamental
que tem na própria vida, e não na racionalidade, a sua causa. Ele a considerava um impulso
alegre, de desejo e aceitação da vida em todos os seus aspectos, inclusive nos de dor e luta.
Reconhecia a força e o instinto como elementos vitais e entendia os valores morais como
criações humanas, sustentando que não deveriam ser considerados transcendentes e eternos.
Além disso, defendia a vida como valor fundamental, questionando, por meio da
transvaloração, toda moral que se opusesse à vontade de potência.

Para Nietzsche, o mundo apresentava-se em eterna mutação, em um movimento perene,


pois, a cada mudança, seguia-se outra, infinitamente. Nesse contexto, o filósofo defendia a
moral dos fortes, voltada à afirmação dos instintos e, principalmente, à conservação da vida
em seu estado atual e em caráter de luta permanente.

Ao refletir sobre a moral, Nietzsche questionou a origem dos conceitos de bem e mal, assim
como os critérios utilizados para avaliar as atitudes humanas e até as próprias pessoas como
"boas" ou "más". Afirmou que o sentido etimológico (original) da palavra bom equivalia aos
conceitos de nobre, forte, aristocrático.
Sendo assim, ele não definia o bem como bondade ou benevolência, mas como nobreza,
excelência e força de quem fosse capuz de amar a vida, independentemente de como ela e
sentasse De acordo com essa perspectiva, o que a moral tradicional designava como bem, ele
definia como fraqueza, afirmando que as pessoas não podiam ser consideradas iguais em
termos de força. Para ele, os fortes (verdadeiramente bons) não conheciam angústia, medo,
remorso, humildade ou inveja. Por outro lado, os fracos (supostamente bons) viviam de
ressentimentos, preconceitos, covardia e inveja em relação à verdadeira força, desenvolvendo
estratégias para dominá-la.

Uma dessas estratégias, baseada no temor à vida, seria a invenção de outra vida após a
morte como recompensa pelo sacrifício dos impulsos vitais. Segundo Nietzsche, essa atitude
contrastava com a do homem nobre, o além do homem, que, espelhando-se no ideal gu
erreiro das antigas tragédias gregas, afirmaria sempre a sua força, recebendo com alegria e
coragem o próprio destino. Portanto, o indivíduo verdadeiramente forte seria aquele que não
negasse a vida. que não submetesse os seus instintos em favor de "outra realidade (como a
vida após a morte), por não precisar desse recurso, aceitando a transitoriedade da vida e o seu
caráter de jogo.

Ele afirmava, ainda, que o indivíduo sob o domínio da moral dos fracos temia a solidão,
sentindo-se impotente sem a explicação e o sentido que o grupo oferecia à sua realidade.
Sendo refém da obediência, ele sentiria a necessidade da paz do "rebanho, da resposta da
massa e do pressuposto da felicidade eterna. Longe de sua moral, o homem fraco não saberia
quem é. Sujeitado, ele se renderia e passaria a formular e a obedecer às regras morais que
apregoavam a igualdade no lugar da singularidade, o rebaixamento no lugar da grandeza, a
banalidade no lugar da criatividade e a escravidão em detrimento da força. Assim, diluído na
coletividade, nivelado sob a igualdade, o homem moderno temeria a si mesmo e fugiria para a
proteção do rebanho.

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