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ISSN: 2525-8761
RESUMO
O objetivo deste trabalho é iniciar um debate sobre a crítica literária piauiense, isto é, os
modos de leitura de algumas obras de poetas e prosadores, tendo como foco a atividade
desses escritores face à tradição literária e à atualidade. Destacando-se a presença da
internet como propulsora de uma variedade temática não apenas da atividade literária,
mas do próprio exercício da crítica, e a universidade como propulsora de determinados
procedimentos de escrita, cujas produções críticas, registradas em dissertações, teses,
resenhas, ensaios e artigos, desde muito tempo, fornecem material nesse campo.
Investigam-se os fatores que permeiam as discussões sobre as publicações da obra,
ressaltando-se a crítica jornalística, o valor literário do texto como forma de
contextualizar as discussões apresentadas. Dentre os teóricos que auxiliarão essa
reflexão, destacam-se os piauienses Herculano Moraes, Socorro Rios Magalhães, Dilson
Lages, Elmar Carvalho, Francisco Miguel de Moura, Carlos Said, dentre outros da critica
literária brasileira.
ABSTRACT
The objective of this work is to initiate a debate on literary criticism from Piauí, that is,
the ways of reading some works by poets and prose writers, focusing on the activity of
these writers in light of the literary tradition and the current situation. Highlighting the
presence of the internet as a driver of a thematic variety not only of literary activity, but
of the exercise of criticism itself, and the university as a driver of certain writing
procedures, whose critical productions, recorded in dissertations, theses, reviews, essays
and articles have long provided material in this field. The factors that permeate the
discussions about the publications of the work are investigated, emphasizing journalistic
criticism, the literary value of the text as a way of contextualizing the discussions
presented. Among the theorists who will help in this reflection, the highlights are
Herculano Moraes, Socorro Rios Magalhães, Dilson Lages, Elmar Carvalho, Francisco
Miguel de Moura, Carlos Said, among others from Brazilian literary critics.
1 INTRODUÇÃO
Pensar a crítica literária no Piauí é, antes de tudo, elaborar o percurso e estabelecer
alguns questionamentos, elencando os primeiros críticos na historiografia literária no
Piauí. Francisco Miguel de Moura ( 2013 ), poeta e crítico piauiense, afirma que a “crítica
é obra promíscua, ambivalente e intelectiva [...] subsistente por si mesma quando é
realmente criadora” (p. 293).
Moisés (1978) afirma que
[...] Seu estilo mostrou-se pomposo severo, jamais contrastando com a gravidade
do lutuoso assunto; seus pensamentos revelaram-se tão expressivos – quanto a
mais sincera e profunda dor, aquela que se estampa no demudado semblante,
dando testemunho fiel do coração pungido, ou que se denuncia ingenuamente – na
voz angustiada, que provoca as lágrimas e convida aos soluços. (CALDAS, 2013,
p. 21)
digno de ser lido, - no campo como na cidade; na choupana como na casa nobre.
E oxalá que todos os nossos homens de letras não muito tarde o tenham na
merecida estima, bem como que antes do fim do século, em cada fazenda, ao
menos por ocasião de vaquejadas, se possam fazer citações desta ordem, à vista
de algum novilho indomável. ( CALDAS, 2013, p. 49)
Coriolano escrevera o poema quando em uma das suas férias na fazenda dos pais
para homenagear um touro valente que o encantara na sua infância. Moraes (2019, p. 57)
atesta que o poeta “talvez pretendesse escrever um grande e definitivo poema, narrando
a epopeia de um animal valente e dominador. Mas esbarrou nas limitações próprias de
uma poesia pouco imaginativa e de nenhuma profundidade”.
Para Moura (2013), O Touro Fusco
É um poemeto que ainda não teve igual em nenhuma literatura, pela audácia de
cantar em versos heroicos a estória de um novilho famoso, que luta e morre como
herói, e nos deixa saudades como as figuras humanas ou semidivinas de uma
epopeia. (p. 51)
José Coriolano, nas suas poesias líricas, posto que seja fluente e cadencioso, não
revelou nenhuma originalidade, com exceção de Aurora. Não foi um plagiário, foi
um imitador, o seu mérito, quer como poeta, quer como artista, não se estriba
certamente, nas poesias A grandeza de Deus e no Hino à tarde, esta visivelmente
imitada de Odorico Mendes. [...] O seu gênio era sério, e as tentativas que nos
deixou, do cômico, são frouxas e insípidas. [...] A glória de José Coriolano está
nos seus versos e esta nos basta. O leitor avalie o vigor do gênio lírico do nosso
poeta lendo esta sua mimosa poesia. (p. 133-134-140)
A aurora
Douram-se os prados ao romper da aurora,
Que surge à hora que prazer só diz,
Os horizontes de listões se arreiam,
Aves gorjeiam nos rosais gentis. [...] (CORIOLANO, 2015, p. 72)
O formidável Permínio Carvalho Ásfora, premiado pela crítica nacional (dos sete
romances publicados, três receberam premiação incomum), continua
desconhecido em sua própria terra natal. [...] Tanto escreveu que abusou do
jornalismo sério com diversas facetas literárias. Através do romance .Noite
Grande.1947, suscitou polêmicas com vertentes de ingratidão. Perseguido
tenazmente por ter denunciado o clientelismo político instalado no país, jamais
tergiversou diante de suas convicções. (p.2) [...]
Carlos Said traça o perfil da produção de Permínio Ásfora trazendo à cena outros críticos
e escritores brasileiros. A crítica finaliza assim:
Negado o seu tempo e o seu lugar, na sombra imagem que projeta de si, a literatura
piauiense volta-se para a cidade ideal, para o paraíso longínquo do Rio de Janeiro.
É na crônica principalmente que se criam e difundem essas imagens tanto
depreciativas do cenário local como enaltecedora e mistificadora do “de fora”,
especialmente a Capital Federal [...] O rio de Janeiro é o lugar por excelência da
República. (BRASIL, 1995, p. 16)
Muitos são os problemas elencados pelos críticos para o insucesso ou sucesso dos
escritores: a necessidade de sustentarem a si e as suas famílias, alguns eram profissionais
do governo e isso os prendia bastante, a não dedicação à profissão de escritores. A seleção
que Assis Brasil faz na sua coletânea, apesar de um título abrangente: A poesia piauiense
no século XX, são listados cinquenta e um poetas e dentre eles, somente duas mulheres.
O crítico literário em seu texto naquilo que para ele é original e autêntico, à luz de
certa carga subjetiva, objetiva traduzir o texto nas suas zonas mais profundas, no seu
âmago, o seu conteúdo para elucidá-lo e provocar o leitor para aceitá-lo ou não, pois se
sabe que o homem ao longo de sua existência procura decifrar os mistérios da criação,
daquilo que não lhe satisfaz claramente ou subjaz nas entrelinhas do texto.
Silva (2005) ao falar do posicionamento do narrador no conto Macambira,de
Wellington Dias (1995) relata a sua experiência como escritor engajado, cujo texto é
portador “de uma visão do mundo situada e onde, queira ele ou não, se revela assim
impregnada de posição e escolha” (DENIS, 2002, p. 36). Nota-se que o envolvimento do
criador com o meio físico e com a população, nasce o conto sem idealismo, justificando
sua posição ideológica, como testemunha de homens que foram vencidos pelas forças da
natureza, e denuncia aqueles que detêm o poder e as ações, nada fazendo para modificar
o rumo da História. Ao acusar as decisões e as ações do poder público, o narrador
apresenta uma discussão entre o prefeito e os vereadores da cidade de Paes Landim, no
capítulo Debate, cujo título carrega certa ironia: não é momento para debates, e sim para
ações concretas: a seca estava instalada, fazendo vítimas. A ironia é reforçada com a
descrição do prédio e das autoridades como se observa no excerto:
No velho prédio da prefeitura, políticos com ares de autoridades-mor,
debatiam os problemas do município.
- Essa invenção de emergência. Não resolve nada. Faz é deixar o povo
mais preguiçoso.
Pregava o vereador Zé de Jorge.
- Ganham uma ninharia nas frentes de serviços e, na verdade, a maioria
nem pisa lá. Só têm vez os protegidos do prefeito...
Isto é calúnia.
Irritou-se o prefeito.
- Isto é verdade. [...]
Muito bem!
Aplaude a Câmara.
Comentários como esse devem ter levado a poetisa a se expressar assim, no poema Não
sou poeta ( novembro de 1872) na primeira estrofe:
Aquidabã, sem número, no item Opinião (1975, p 13-15), alguns estudiosos assim se
manifestam sobre o vate:
Com o estudo sobre Zito Baptista você acaba de enriquecer a literatura piauiense.
É deveras invejável sua notável contribuição às nossas letras com seus admiráveis
estudos críticos. Quando se escrever doravante a história da cultura piauiense, seu
nome, por certo, estará entre os que maior contribuição lhe trouxeram, através da
pesquisa, da interpretação honesta e de estilo sério. M. Paulo Nunes (p. 13)
[...] riqueza de conhecimento vestida por um estilo sóbrio e elegante, revelando o
grande mestre da língua e da história literária que você é. Manoel Rodrigues de
Melo (p. 13)
A tranquilidade, a segurança e o equilíbrio em tudo que sai da sua pena ou da sua
boca mostram a dimensão do seu invulgar talento. A. Sampaio (p. 15)
Manuel Paulo Nunes, conforme Nelson Nery Costa (NUNES, 2019, p. 19),
sua crítica “nos jornais que compõem a obra Modernismo & Vanguarda – 1ª Série, às
vezes, dá a impressão de que se trata na verdade de um romance sobre a literatura luso-
brasileira do século XIX ao XX. Nejar, na orelha do livro, afirma que Nunes “demarca
em todos os trabalhos, a lucidez da visão, a coragem e o discernimento, o apreciar os
verdadeiros valores ou aprofundar-se na aventura do espírito”.
Herculano Moraes com Visão Histórica da literatura piauiense: 1808-1978,
lançado pela primeira vez em 1975, que para Francisco Miguel de Moura (2013), “entra
em cena a nova crítica piauiense, pois Herculano é o crítico por excelência da geração
clipiana” (297) . Herculano Moraes foi ensaísta, historiador, poeta, romancista, e, antes
de falecer em 2017, deixou uma nova edição da obra (inacabada, mas publicada como ele
deixara, pela coleção Centenário da APL), contendo outros temas e outros escritores e
algumas mulheres. Nelson Nery Costa, presidente da Academia Piauiense de Letras à
época, assim dissera na orelha do livro:
Trata-se de uma segunda edição revista e aumentada para incluir todas as gerações,
inclusive as mais recentes, perfazendo assim dois ideais: cultuar nosso passado e
incentivar os que laboram, hoje, no mesmo sentido de sustentar a tocha de luz de
nossas letras. (MOURA, 2013)
REFERÊNCIAS
CABRAL, João G. da Rocha. A vis poética na literatura piauiense. Rio de Janeiro: Borsoi
& Cia, 1938.
CALDAS, David Moreira. Introdução feita por um dos mais obscuros amigos do poeta.
In: CORIOLANO, José. Impressões e gemidos. Teresina: Academia Piauiense de Letras,
2015.
FILHO, A. Tito. Praça Aquidabã, sem número. Rio de Janeiro: Artenova S.A, 1975.
MOURA, Francisco Miguel de. Literatura do Piauí ( de Ovídio Saraiva aos nossos dias).
Teresina: EDUFPI, 2013.