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RESENHA DE ARTIGO
I. Identificação da obra:
Na terceira e última parte, a autora tece suas considerações finais, onde constata
que a história de Carlos e os efeitos nefastos de um trabalho patogênico se imbricam ao
perceber a angústia e o sofrimento causados em um sujeito. Neste ponto, destaca e elenca
elementos patologizantes da organização, assim como os sintomas - físicos, mentais,
emocionais e sociais – que surgem no paciente.
1. Introdução
Diante deste quadro, o paciente foi atendido pela primeira vez no ADP, em
dezembro de 1998, sendo diagnosticado com Transtorno de Adaptação (CID XX – 4322).
Paul Sivadon (1907-1992) foi um médico psiquiatra francês que cunhou o termo
“psicopatologia do trabalho” em referência ao estudo do sofrimento psíquico em
decorrência do trabalho.
Contribuiu, ainda, para o campo da saúde, uma nova forma de abordar o doente
mental através da ergoterapia, que se trata de uma integração social do doente mental pelo
trabalho.
a) Tratamento desumanizado;
b) Ausência de intervalos;
c) Controle do sono;
d) Autoritarismo do síndico;
e) Retirada de benefícios;
f) Excesso de vigilância;
g) Trabalho monótono e estressante.
Tais fatores ocasionaram diversos sintomas em Carlos como úlcera, delírios, uso
de álcool e tabagismo, insônia e ansiedade.
Em 2006, a autora Maria Elizabeth Antunes Lima publicou sua obra “Escritos de
Louis Le Guillant: da ergoterapia à psicopatologia do trabalho”, com o intuito de difundir a
teoria de Le Guillant que estudou uma possível conexão entre os problemas psicopatológicos,
as condições de existência e as situações vividas pelo doente.
Além disso, o paciente apresentou, segundo o texto, uma estrutura neurótica, que
pode ser identificada através de sua história de vida.
Assim, fica claro que a normalidade esteve presente na relação de Carlos com a
organização, sendo esta uma reação diante do sofrimento psíquico decorrente das tarefas ali
desempenhadas, aliadas à sua formação pregressa de estrutura psíquica e à personalidade.
O modelo BIG FIVE, também conhecido como Modelo dos Cinco Grandes
Fatores de Personalidade, é uma teoria amplamente aceita na psicologia da personalidade. Ele
descreve a personalidade humana em termos de cinco traços principais: abertura à
experiência, conscienciosidade, extroversão, amabilidade e neuroticismo.
Desde então, muitos outros estudos foram realizados para validar e aprimorar o
modelo Big Five. Diversos autores e pesquisadores contribuíram para a compreensão e
aplicação desse modelo, incluindo McCrae e Costa, que desenvolveram uma medida
amplamente utilizada chamada NEO-PI-R (Inventário de Personalidade NEO Revisado).
A disciplina destaca fatores comuns que contribuem para um melhor contato com
paciente e o entendimento do fenômeno psíquico para uma diminuição ou alívio dos sintomas,
quais sejam:
b) Repetição: A repetição pode ser entendida como um ato que abre caminho à atuação
(acting out) - um recado ao analista, de que há um desejo e não uma objetividade, o
inconsciente quer falar algo - e que, de modo geral, se apresenta na análise como uma
força que atualiza componentes psíquicos, quando o analisando repete ou atua – daí o
termo acting out – o que "não pode" ser recordado;
a) A rigidez do pai: Pelo relato da sobrinha, o pai de Carlos era rigoroso, não era
violento, nunca bateu nos filhos, aconselhava muito e exigia bom comportamento e
respeito. Carlos relata alguns dizeres do pai, e aqui se nota a presença de alguns
significantes advindos do pai direcionados a ele e aos seus irmãos:
b) O controle: Durante a sua infância Carlos não passeou muito, seus pais ficavam
preocupados, não deixavam ele e seus irmãos irem para lugares distantes, nem estar na
presença de pessoas que beberam bebidas alcoólicas. Quando saía, Carlos ia
acompanhado de dois irmãos mais velhos.
Pelos relatos abaixo, percebemos a naturalidade de Carlos com relação ao controle que
a dinâmica familiar estabelece:
“Apesar de todo o controle exercido pelos pais, Carlos não se sentia preso,
percebendo tudo com naturalidade.” (Relato da história de vida)
“Isso é tradição da família…não é prender não sabe…ninguém nunca
desobedeceu a meu pai e minha mãe.” (Carlos)
c) A escola: Carlos saía da escola, almoçava e ia trabalhar. “Nunca ficava, assim, na rua,
à toa, vadiando na rua.” (Carlos). Na fase infantil, para de estudar no quarto ano
primário, pois não havia recursos financeiros para o custeio do transporte. Na fase
adulta, tenta estudar novamente, mas, segundo ele, a relação trabalho-escola gerou
cansaço, o que o fez encerrar os estudos.
Ressaltamos que o ECA estabelece como um direito inalienável o acesso à educação
de toda criança, sendo este um elemento extremamente importante para a formação e o
desenvolvimento cognitivo, social, emocional e psicológico da pessoa humana.
Neste caso, a escolaridade incompleta na fase infantil impactou significativamente na
formação e no desenvolvimento de Carlos.
d) O brincar: Quando criança, não comenta sobre brincar em casa ou na escola, apenas
no trabalho. Em seus relatos, sua irmã e a sobrinha o descrevem como calmo e
trabalhador. Carlos, em sua história de vida, até seu último emprego, descreve sua
relação com as pessoas, como sendo boa.
Pontuamos aqui que Carlos não comenta sobre brincar em casa ou na escola, sendo
que seu único local para tal é o trabalho. Na perspectiva psicanalítica winnicottiana, o
brincar se assemelha ao falar do adulto, é terapêutico.
e) O trabalho infantil: Caçula de uma família de 10 filhos e pais lavradores, Carlos
cresceu em meio a uma dinâmica familiar pobre onde o trabalho, segundo o relato de
sua história de vida, não era imposto pelo pai, fazia porque gostava e se achava no seu
dever. Começou a trabalhar aos 8 ou 10 anos e neste período chegou a trabalhar de
7:00 às 00 na plantação de arroz.
Pontuamos aqui que, respeitando o contexto social, geográfico e econômico de sua
família, mas tomando uma posição crítica, Carlos trabalhou na idade infantil e trouxe
consigo danos ao seu desenvolvimento geral.
6. Conclusão
Por todo o exposto, concluímos que a empresa na qual Carlos laborou contribuiu
para o adoecimento do trabalhador, posto que as suas dimensões básicas de organização se
mostraram fora do padrão de funcionamento de uma empresa saudável, desconsiderando por
completo o bem-estar dos empregados.
“Não tem jeito de esquecer (...). É como se a senhora tivesse uma criança
que gostasse muito e alguém tirasse. Eu não tenho raiva dele. Eu comi, vesti
e trabalhei com ele. Por que ele veio fazer isso comigo? Mas não foi ele. O
culpado foi alguém ter exigido muito de mim. Não precisava… Eu morria de
medo de chamarem minha atenção. Tinha não. Tenho. Não gosto de fazer
nada errado.” (pág. 29).
E partindo deste fragmento do texto, nos perguntamos: sua relação com o relógio
seria um pedido de socorro - acting out - por não conseguir verbalizar algo que habita seu
inconsciente? Seria um gozo? Seria a representação – do controle, da vigilância, da
responsabilidade, ser perfeito, honrar seu pai – de desejos sexuais reprimidos em seu passado?
O relógio seria seu pai?
Referências bibliográficas
ARAUJO, Jane Pereira; FREITAS, Lêda Gonçalves de. Normalidade no trabalho sob o
olhar da psicodinâmica do trabalho: uma revisão integrativa. Estud. psicol. (Natal), Natal,
v. 26, n. 4, p. 370-379, dez. 2021. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?
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SILVA, Izabella Brito; NAKANO, Tatiana de Cássia. Modelo dos cinco grandes fatores da
personalidade: análise de pesquisas. Aval. psicol., Porto Alegre, v. 10, n. 1, p. 51-62, abr.
2011. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-
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