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Fotografia

Material Teórico
Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Ms. Claudemir Nunes Ferreira

Revisão Textual:
Profa. Ms. Fátima Furlan
Fotografia nos Movimentos de
Vanguarda e na Arte Conceitual

• Da Fotografia Vanguardista à Fotografia Conceitual


• Fotografia Futurista
• Fotomontagem e Fotografia Russa
• Nova Visão (Neue Optik)
• Fotograma e Fotomontagem Dadaísta
• Fotografia Surrealista
• Fotografia na Pop Art
• Fotografia na Arte Conceitual

OBJETIVO DE APRENDIZADO
· Conhecer os aspectos conceituais, históricos e estéticos da fotografia
vanguardista até a fotografia conceitual; compreender a assimilação
do meio, suas aplicações, desenvolvimento e desdobramentos dentro
dos principais movimentos artísticos do século XX; desenvolver e
realizar pesquisas para atualização e autoformação.

ORIENTAÇÕES
Nesta Unidade, vamos conhecer um pouco sobre a fotografia de vanguarda,
suas principais características e desdobramentos nos Movimentos Futurista,
Construtivista, Dadaísta e Surrealista até a Pop Art e Arte Conceitual, seus
principais artistas-fotógrafos e algumas de suas obras emblemáticas. Leia
o conteúdo do material com atenção e não deixe de ampliar seus estudos
consultando os materiais complementares e pesquisando mais imagens
dos fotógrafos apresentados para enriquecer seu repertório. Registre suas
dúvidas, converse com seu professor-tutor, assista à videoaula e acesse
a pasta de atividades onde encontrará as Atividades de Avaliação e uma
Atividade Reflexiva.

É importante também respeitar os prazos estabelecidos no cronograma.

Bom Estudo!!!
UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

Contextualização
Futurismo (Itália, 1909)
Movimento de vanguarda liderado pelo poeta italiano Filippo T. Marinetti. Seu
manifesto, escrito em 1909, tinha o intuito de exaltar a vida moderna, descrever
a beleza da energia, da velocidade e do movimento, desprezar o passado e as for-
mas de arte tradicionais. Planos fragmentados, simultaneidade, cores expandidas,
formas repetidas, dinamismo, deformação e desmaterialização dos objetos, valori-
zação da ciência, da técnica e da vida urbana e a sensação de vertigem são algumas
de suas características.

Dadaismo (Zurique,1915)
Movimento intensamente contrário ao conformismo social cujas forças de criação
foram colocadas a serviço da chamada antiarte (rompimento com o conceito de
arte). Publicação de manifestos, substituição da obra de arte pelo puro ato estético,
atuações interdisciplinares e provocativas, acaso, irracionalidade, subversão,
questionamento dos princípios estéticos e a dessacralização dos conceitos de arte e
artista são algumas características dadaístas.

Surrealismo (França, 1924)


Movimento de vanguarda iniciado na França com a publicação do manifesto de
André Breton, o principal teórico do surrealismo, que discutia a contradição entre
sonho e realidade com a criação da realidade absoluta, fazendo uso das teorias de
Freud relativas ao inconsciente. Suas principais características são o contraponto
entre sonho e realidade, ausência do controle exercido pela razão, liberação da
sensibilidade e dos conflitos psicológicos, busca do imaginário, representações
arbitrárias, desordem do cotidiano, ausência de qualquer sistematização ou
codificação, bizarro, acaso, loucura, sonho, alucinação, delírio e humor.

Construtivismo (Russia, 1919)


Movimento de renovação estético-política que tinha por objetivo atender
às necessidades físicas e intelectuais do mundo socialista, caracterizando-se
pela negação da arte pura, especial e separada do cotidiano. Os construtivistas
acreditavam que a arte possuía uma função prática e socialmente útil. Devoção
ao uso de elementos geométricos, temas políticos e experimentais, raramente
emocionais, são algumas características construtivistas.

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POP ART (Inglaterra/EUA, décadas de 50 e 60)
Movimento artístico do pós-guerra, originado na Inglaterra e posteriormente
popularizado nos EUA, que questionava as manifestações de cultura de massa
e criticava a posição do indivíduo diante da sociedade de consumo. Usou como
temas o folclore urbano das sociedades desenvolvidas, a publicidade, os meios de
comunicação de massa, os ícones populares da música, do cinema e das HQ, as
personalidades políticas, o sensacionalismo jornalístico, a TV, os luminosos e os
sinais de trânsito, enfim, tudo aquilo que agride ou atrai visualmente.

Arte Conceitual (Europa/EUA, décadas de 60 e 70)


Vertente artística que surgiu com o colapso do pensamento formalista e com a
revitalização do pensamento de Marcel Duchamp, rompendo com a tradição da
arte, suas formas, técnicas e materiais. A arte como ideia e conceito supera o fazer
artístico. Passa-se a exigir a participação mental do expectador e a experiência ou
deleite visual passa a ser secundário e não mais essencial. O objeto artístico em si
torna-se dispensável e pode ser substituído por informações, documentos, textos,
notas, cadernos de artista, fotografias, mapas, entrevistas, catálogos etc.

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UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

Da Fotografia Vanguardista à
Fotografia Conceitual
Em paralelo às divergências técnicas e conceituais entre as correntes fotográficas
artísticas (picturialismo e fotografia direta, objetiva e subjetiva) e indiferentes às
querelas entre elas e o cenário artístico (se a fotografia era ou não arte), muitos
Movimentos de Vanguarda da primeira metade do século XX assimilaram a
fotografia como um novo meio, ou mesmo como um novo material artístico alheio
às belas artes, e exploraram seu potencial expressivo sob distintas abordagens e
experimentações diversas, uma vez que o propósito maior Modernista compartilhado
era exatamente romper com todos os princípios da arte tradicional.

Findo o Modernismo, a fotografia manteve-se fortemente presente nas


manifestações artísticas da Pop Art e assumiu um papel ainda mais relevante no
mercado artístico com o advento da Arte Conceitual.

Fotografia Futurista
Os experimentos fotográficos dos irmãos Anton Giulio Bragaglia e Arturo
Bragaglia, marcados pela técnica da cronofotografia e intitulados de Fotodinamismo
Futurista, captaram a sensação de movimento repetido em uma imagem estática e
deram-lhe um ar tenso e fantasmagórico.

Figura 01: Anton Giulio Bragaglia e Figura 02: Anton Giulio Bragaglia e Arturo Bragaglia.
Arturo Bragaglia. The Smoker-The Uomo che suona il contrabbasso, 1911
Match-The Cigarette,1911 Fonte: photographers.it
Fonte: moma.org

Cronofotografia: é uma imagem formada por fotografias sucessivas com intervalos e


Explor

exposições iguais. A técnica foi criada por Eadweard Muybridge, no final do século XIX, para
estudar o movimento através de fotografias sequenciais.

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Fotomontagem e Fotografia Russa
Sob os preceitos ideológicos e políticos do Construtivismo, desenvolveu-se no
início do século XX uma fotografia tipicamente russa, influenciada pelo relativo
isolamento do país durante a Revolução Comunista e pelo envolvimento de muitos
de seus artistas fotógrafos chaves com a pintura abstrata, com a arquitetura e
com o design russo. Propaganda política, desenvolvimento da indústria soviética,
projetos de engenharia, instituições estatais, atividades do exército, promoção
da atividade esportiva pelo Estado, promulgação de modo de vida socialista e
uma cultura comunista - princípios caros ao Construtivismo são os temas mais
recorrentes na fotomontagem e na fotografia russa que, em uma nação onde
grande parte da população era analfabeta, tornaram-se meios de expressão
poderosos para o Estado.

As fotomontagens do russo Gustav Klutsis, que não são destrutivas ou caóticas


como as dos dadaístas, apresentam composições geométricas influências pelo
suprematismo e suas temáticas voltam-se para a construção da sociedade sob a
ideologia comunista.

Figura 03: Gustav Klutsis. Let’s Fulfill Figura 04: Gustav Klutsis. The Development of
the Plan of Great Works, 1930 Transportation, The Five-Year Plan, 1929
Fonte: moma.org Fonte: moma.org

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Após produzir fotomontagens e fotogramas, El Lissitzky desenvolveu um estilo


fotográfico próprio combinando vários negativos na câmera escura. Muitos de seus
primeiros trabalhos estão ligados à promoção da atividade esportiva pelo Estado.

Figura 05: El Lissitzky. Self-Portrait Figura 06: El Lissitzky. Record,1926


(The Constructor),1924 Fonte: moma.org
Fonte: moma.org

Dedicando-se ao fotojornalismo e raramente manipulando seus negativos,


Alexander Rodchenko promoveu uma fotografia revolucionária de base social ao
representar diretamente a realidade e incitar o modo de vida socialista e a cultura
comunista. Rodchenko captou imagens perturbadoras da sociedade soviética sob
ângulos e pontos de vista inusitados, pois rejeitava as fotografias em ângulo médio,
(na altura dos olhos) o que ele considerava “uma educação tendenciosa e rotineira
da percepção visual humana e uma distorção unilateral do pensamento visual”.
Composições diagonais e jogos de sombra e luz também são características comuns
em suas obras.

Figura 07: Alexander Rodchenko. Steps, 1930


Fonte: photoforager.com

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Figura 08: Alexander Rodchenko. Diver, 1934
Fonte: photoforager.com

Nova Visão (Neue Optik)


O pintor, designer e fotógrafo húngaro László Moholy-Nagy, um dos grandes
nomes da Bauhaus e influenciado pelo construtivismo russo, foi uma das figuras
mais expoentes da fotografia moderna. Defensor da integração entre tecnologia
e indústria com design e artes, acreditava na fotografia como a linguagem ideal
para as necessidades da sociedade moderna e capaz de oferecer um novo modo
de ver, desafiando as convenções visuais e tornando compreensível a comunicação
universal. Segundo Moholy-Nagy, “Conhecer a fotografia é tão importante como
conhecer o alfabeto. O iletrado do futuro será tanto aquele que ignora a câmara
como o que ignora a caneta”.

Sua obra Pintura, Fotografia, Filme, publicada em 1925, apresentou sua


proposta estética que se tornaria uma tendência fotográfica conhecida como Nova
Visão (Neue Optik). Adotando composições e técnicas anticonvencionais, como
ângulos inferiores, superiores e oblíquos, visão micro ou macroscópica, inúmeras
gradações de cinzas, movimento congelado, distorções, raios-x, fotogramas
e fotomontagens, Moholy-Nagy estabeleceu um novo relacionamento entre a
fotografia e o mundo visível, capaz de superar as limitações e ideias convencionais
da visão humana e tornar visíveis existências que não poderiam ser percebidas
diretamente pelo olhar.

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UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

“(...) a câmara reproduz a pura imagem óptica e assim apresenta as


verdadeiras distorções, enquanto o olho, junto com a experiência
intelectual, complementa o fenômeno percebido através de associações
(...) Assim, na fotografia, temos a mais confiável ajuda para o começo de
uma visão objetiva”. (MAHOLY-NAGY (1925), 1987 p.28)

Figura 09: László Moholy-Nagy. The Law of Series, 1925 Figura 10: László Moholy-Nagy. Untitled, 1926
Fonte: moma.org Fonte: moma.org

As obras dos fotógrafos associados à Bauhaus e dos demais seguidores da ten-


dência estética Nova Visão apresentaram estratégias formais modernas e radicais
para desfamiliarizar temas comuns e proporcionar uma experiência perceptiva da
realidade completamente nova. Entre eles, destacam-se Otto Umbehr, T.Lux Fei-
ninger, Lucia Maholy, Hebert Bayer e Max Burchantz.

Figura 11: László Moholy-Nagy. Head,1926


Fonte: moma.org

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Embora a Nova Visão e a Nova Objetividade (movimento artístico que também ocorreu
na Alemanha e durante o mesmo período, conforme estudado na unidade anterior)
compartilhassem o objetivo comum de posicionar a fotografia como uma forma de arte
independente, desenvolvida a partir de suas especificidades técnicas, e ambos tenham
exercido um papel-chave no desenvolvimento da fotografia moderna e influenciado outras
correntes e grupos fotográficos, estas tendências apresentam propostas conceituais e
estéticas distintas.
A Nova Objetividade priorizava a função primordial da câmera de documentar a realidade
e, em posição a carga emocional do expressionismo, propunha um registro fiel e objetivo
da realidade que eliminasse qualquer visão subjetiva do fotografo ou do espectador. A
produção fotográfica do Grupo F/64 (também estudado na unidade anterior) aproxima-
se mais desta corrente, com composições que priorizam os detalhes realistas e sutis dos
temas. Os princípios da Nova Objetividade também foram incorporados pelo fotógrafo
conceitual Bernd Becher no fim dos anos 50 e viriam, posteriormente, a influenciar a
produção contemporânea de seus alunos na Escola de Dusseldorf (que estudaremos em uma
próxima unidade).
A Nova Visão buscava na fotografia um meio capaz de desafiar as convenções visuais
utilizando composições e técnicas anticonvencionais para criar novas visibilidades a partir da
realidade. Nos Estados Unidos, a fotografia direta de Stinglertiz e Paul Strand aproximou-se
mais desta corrente, assim como a fotografia subjetiva no país que se desenvolveu em torno
do Chicago Institut of Desing e das experimentações formais e técnicas de seu fundador, o
próprio Moholy-Nagy.

A Bauhaus foi uma escola de artes aplicadas fundada na Alemanha, em 1919, por
Explor

Walter Gropius que, preconizando a integração arte-indústria, unificou disciplinas como


arquitetura, escultura, pintura e desenho industrial. Tinha como objetivo formar novas
gerações de artistas de acordo com um ideal de sociedade civilizada e democrática, em
que não há hierarquias, mas somente funções complementares.

Fotograma e Fotomontagem Dadaísta


Convencidos de que toda a arte do período pós-guerra havia fracassado por
causa de sua não-objetividade e de sua falta de convicção, os dadaístas consideravam
fundamental uma mudança revolucionária de atitude para colocar a arte em
consonância com a vida e com a época atual, encontrando na fotografia um meio
de integrar o trivial e o cotidiano à prática artística, rompendo assim a distinção
entre os dois mundos – arte e vida, e um material para criar, a partir do caos da
guerra e da revolução, uma nova visibilidade.

Os artistas integrantes do movimento não estavam interessados em elaborar


novas regras estéticas e buscavam uma renovação das formas para o novo con-
teúdo, a fotografia desponta neste contexto como um poderoso meio expressão.

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UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

Destacam-se os fotogramas do artista alemão Christian Schad, associado ao


grupo dadaísta de Zurique, e do americano Man Ray, um dos fundadores do
grupo dadá de Nova York. Trabalhos produzidos recobrindo o papel fotográfico
diretamente com objetos comuns, muitas vezes encontrados na rua, e expondo-o
à luz solar. O reagrupamento dos objetos durante a exposição, com variação de
iluminação e tempo de exposição, criavam imagens que oscilavam entre repre-
sentações de objetos cotidianos e uma obra de arte abstrata.

Fotogramas são fotografias obtidas sem o auxílio da câmara, através da colocação de um


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objeto opaco ou translúcido diretamente sobre o material fotossensível. Os primeiros


fotogramas foram os photogenic drawings obtidos por Fox Talbot em 1834. Os fotogramas
de Christian Schad e de Man Ray foram batizados, respectivamente, de schadographs e
rayographs. O húngaro Lázsló Moholy-Nagy também empregou o processo na década de
1930, sem rebatizar suas com seu nome.

Figura 12: Christian Schad. Schadograph, 1918


Fonte: moma.org

Figura 13: Christian Schad. Amourette,1918


Fonte: moma.org

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Figura 14: Man Ray. Rayograph, 1922
Fonte: theliteratelens.com

Figura 15: Man Ray. Rayograph, 1922


Fonte: theliteratelens.com

As atividades do grupo dadaísta em Berlim, cidade mais impactada pela


guerra, foram as mais agressivas e politicamente subversivas do movimento.
A fotomontagem despontou como um dos meios favoritos de expressão e um
instrumento de crítica social e propaganda antibélica entre os artistas Raoul
Hausmann, George Grosz, John Heartfield e Hannah Höch, cujo trabalho aborda
também o movimento das mulheres.
Segundo Hausmann,
“(...) A fotomontagem impôs a consciência de que o elemento óptico
oferece possibilidades extremamente diversas. Permite elaborar as
fórmulas mais dialéticas, devido ao antagonismo das estruturas e das
dimensões, a exemplo do áspero e do liso, da vista aérea e do close-up,
da perspectiva e da superfície chata.”

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UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

Figura 16: Raoul Hausmann. The Art Critic, 1919-20 Figura 17: Hannah Höch. Cut with the Kitchen
Fonte: tate.org.uk Knife Dada Through the Last Weimar Beer-Belly
Cultural Epoch of Germany, 1919-20.
Fonte: commons.wikimedia.org

A ideia da fotomontagem é revolucionária quanto ao seu conteúdo e sua forma


é subversiva, rompe as barreiras dos gêneros literários e artísticos, ao unir fotografia
e textos impressos que, juntos, transformam-se em um filme estático. Um dos
mais célebres artistas a fazer uso dessa técnica foi John Heartfield. Suas imagens
politicas ironizam e criticam a figura de Hitler, bem como o próprio Nazismo.

Figura 18: John Heartfiled. Adolf The Superman, 1932 Figura 19: John Heartfiled. Hurrah, die Butter ist
Fonte: johnheartfield.com alle!(Hurrah, There’s No Butter Left!), 1935
Fonte: johnheartfield.com

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Fotomontagem é o termo empregado para designar a associação de duas ou mais imagens,
ou fragmentos de imagens, com o propósito de gerar uma nova imagem. São inúmeros os
processos capazes de gerar imagens desta forma, eles a colagem, que consiste na elaboração
de uma composição tomando por base distintas imagens positivas; o sanduíche de negativos
ou de diapositivos, que agrega dois ou mais originais em transparência sobrepostos para
produzir uma terceira imagem; a ampliação de partes de negativos diferentes sobre um
mesmo papel fotográfico; a múltipla exposição de um mesmo negativo no momento da
tomada da fotografia, executada diretamente na própria câmara.

Fotografia Surrealista
Muitas das icônicas obras surrealistas são fotografias. Experimentações com
espelhos, sobreposições de negativos, solarização e brûlage criaram uma espécie
de representação dos pensamentos desinibidos ou do automatismo psíquico, ao
invés de uma representação da própria realidade. São imagens frequentemente
desconcertantes que criam um proposital desconforto ou libertar sentimentos e
sensações reprimidos no subconsciente.

Man Ray, nesta época residente em Paris, foi uma das figuras-chaves tanto
na transição do Dadaísmo para o Surrealismo quanto para a fotografia moderna.
Inspirando-se nos nus neoclássicos de francês Jean-Auguste-Dominique Ingres e
aludindo a paixão do pintor pelo violino, Ray produziu uma das mais célebres
fotografias surrealistas, O Violino de Ingres (Fig.20). Um retrato da amante de Ray
nua, de costas com os braços e as pernas ocultas e com os ouvidos de um violino
pintados nas costas, transforma o corpo feminino em um objeto sugerindo a forma
do instrumento. Em outro retrato em que Ray utilizou o processo de solarização, O
primado da matéria sobre o pensamento (Fig.21)., um corpo parece “derreter” e
flutuar no centro da composição.

Figura 20: Man Ray. Figura 21: Man Ray. Primat de la matière sur la pensée, 1929
Le violon d’Ingres, 1924 Fonte: museoreinasofia.es
Fonte: getty.edu

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UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

O artista belga Raoul Ubac criou fotografias complexas e marcantes usando


fotomontagens, solarização e brûlage em composições que combinam a forma
feminina idealizada com distorções e fragmentações.

Figura 22: Raoul Ubac. Le Combat des Penthésilées, 1937


Fonte: metmuseum.org

Figura 23: Raoul Ubac. La Nébuleuse, 1939


Fonte: centrepompidou.fr

Solarização é uma técnica que consiste na inversão dos valores tonais de algumas áreas
Explor

da imagem fotográfica, obtida basicamente através da rápida exposição à luz da imagem


durante seu processamento, e o Brûlage corresponde à queima do negativo com uma
chama de álcool etílico ou à exposição do negativo em um recipiente de água quente para
derreter a emulsão. Ambas as técnicas possuem a particularidade de não permitir que o
fotógrafo controle totalmente o resultado obtido na imagem final.

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Não menos inquietantes, ou mesmo repulsivas, são a série de fotografias de um
manequim feminino desmembrado do alemão Hans Bellmer ou a fotografia Père
Ubu (Fig. 25) da francesa Dora Maar, que utiliza como modelo um filhote de tatu
para representar o anti-herói da peça Ubu Rei, de Alfred Jarry Ubu Roi, satirizando o
abuso de poder e o sucesso da burguesia corporificado pelo abominável personagem.

Figura 24: Hans Bellmer. Plate from La Poupée, 1936 Figura 25: Dora Maar. Père Ubu, 1936
Fonte: moma.org Fonte: metmuseum.org

Philippe Halsman tornou-se conhecido por seus irreverentes retratos de


personalidades, entre elas Albert Einstein, Richard Nixon, Marlon Brando, Audrey
Hepburn, Alfred Hitchcock, Frank Sinatra, Marilyn Monroe e Salvador Dalí. Suas
fotografias de saltos, Jump Pictures, tornaram-se sua marca registrada, Halsman
acreditava que durante tal movimento ele poderia captar uma imagem mais real
da pessoa retratada, já que o movimento torna praticamente impossível o controle
racional da expressão facial, nas palavras do fotógrafo: “Em um salto, a máscara
cai. A pessoa real é visível”.

Figura 26: Philippe Halsman. Audrey Hepburn Figura 27: Philippe Halsman. Richard Nixon
Fonte: philippehalsman.com Fonte:philippehalsman.com

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UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

As fotografias da série concebidas em parceria com o amigo Salvador Dalí,


embora pareçam, não são montagens, captadas em um único click, geralmente
demandavam inúmeras tentativas (sim, a água e os gatos foram lançados no ar).
Em outra famosa fotografia também concebida em pareceria com Dali, In Voluptas
Mors, retratou o típico olhar alucinado do amigo observando uma composição
macabra de corpos femininos nus que dão forma a uma caveira.

Figura 28: Philippe Halsman. Dali Atomicus,1948 Figura 29: Philippe Halsman.
Fonte: philippehalsman.com In Voluptas Mor, 1951
Fonte: philippehalsman.com

Fotografia na Pop Art


A fotografia exerceu um papel fundamental na Pop Art, figurando em inúmeras
obras do período de uma maneira muito peculiar, até então inédita e muito distante
da fotografia produzida pelos movimentos de vanguarda. Refletindo a sociedade
de consumo, as obras da Pop apropriavam-se da imagética da cultura urbana,
dos meios de comunicação de massa e dos bens de consumo. Rompendo com as
ideias tradicionais de originalidade e talento artístico, apropriavam-se inclusive das
fotografias de seus ícones, personalidades e produtos veiculados na imprensa.

A maioria das imagens nas colagens dos ingleses Eduardo Paolozzi e Richard
Hamilton é composta por fotografias retiradas de revistas americanas que ressaltam
a presença dos bens de consumo e dos meios de comunicação de massa no cotidiano
da sociedade de consumo americana. A obra O que será que torna os lares de
hoje tão diferentes, tão atraentes? (Fig.30) do inglês Richard Hamilton, realizada
com apropriações de fragmentos da sociedade de consumo, é um dos ícones da
Pop Art e explora os produtos, os meios de comunicação e as figuras masculina e
feminina como imagens símbolos da cultura de massa.

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Figura 30: Richard Hamilton. Just what is it that makes today’s homes so different, so appealing?, 1956
Fonte: commons.wikimedia.org

Figura 31: Richard Hamilton. Just what is it that makes today’s homes so different?, 1992.
Fonte: tate.org.uk

O maior representante da Pop americana, Andy Warhol se apropriou de


fotografias de celebridades veiculadas na imprensa para a produção de inúmeras das
suas famosas serigrafias, entre elas, a fotografia icônica de Che Guevara produzida
pelo cubano Alberto Korda, em 1960, e a fotografia de Marilyn Monroe utilizada
na divulgação do filme Torrente de Paixão, de 1953.

A reprodução em série destas obras é uma referencia direta a disseminação inin-


terrupta da imagem destas celebridades pelos meios de comunicação de massa.

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UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

Figura 32: Alberto Korda . Che Guevara, 1960 Figura 33: Andy Warhol. Che Guevara, 1968
Fonte: commons.wikimedia.org Fonte: andywarhol-art.tumblr.com

Figura 34: Gene Kornman. Figura 35: Andy Warhol.


Marilyn Monroe, 1952 Marilyn Monroe, 1967
Fonte: imdb.com Fonte: tate.org.uk

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Fotografia na Arte Conceitual
A fotografia assumiu um papel central na arte conceitual, um conjunto muito
divergente de práticas artísticas e assim denominada porque sobrepõe a ideia
do artista à produção da obra, principalmente porque muitas das produções
desta vertente são efêmeras, intervenções ou acontecimentos, como a Land
Art, a Intervenção Urbana, a Body Art, a Performance e o Happening, e a
fotografia foi utilizada como uma forma de documentação ou de registro da
existência destas práticas. Como a Arte Conceitual “desmaterializou a arte”,
ou melhor, produziu um tipo de arte que não é perene, nem exibível ao grande
público e muito menos comercializável, já que era, a princípio, uma ideia e
não um objeto, seu registro fotográfico passou a ocupar os espaços vazios
dos museus e das galerias e “materializou” a obra conceitual para revitalizar o
mercado de arte.

Body Art: vertente de arte que toma o corpo como meio de expressão, suporte ou
Explor

matéria, experimentando suas potencialidades com intervenções de cortes, ferimentos,


queimaduras, mutilações, implantes, escarificações etc.
Happening: Termo utilizado pela primeira vez por Allan Kaprow, em 1959, diferencia-se
da performance pela fundamental participação do público e procura provocar uma criação
artística espontânea, eventualmente coletiva.
Land Art: segmento da arte conceitual caracterizada pela intervenção e experimentação
artística sobre a natureza, rompendo com a noção de perenidade da obra, mas fixando o
instável por meio da fotografia.
Performance: vertente artística interdisciplinar que pode combinar teatro, música, poesia
ou vídeo por meio do desenvolvimento de um trabalho que usa como base o corpo e seus
potenciais gestos de arte diante de uma audiência.

Alguns exemplos são as mais que famosas fotografias das emblemáticas per-
formances de Vitor Acconci (Fig.36), Chris Burden (Fig.37) e Joseph Beuys
(Fig.38); do happening de Allan Kaprow (Fig.39); da land art de Robert Smi-
thson (Fig.40); e dos trabalhos de body art de Dennis Oppenheim (Fig.41) e
Gina Pane (Fig. 42)

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UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

Figura 36: Vito Acconci. Following Piece, 1969


Fonte: moma.org

Figura 37: Chris Burden. Shoot, 1971


Fonte: theartstory.org

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Figura 38: Joseph Beuys. I Like America and America Likes Me, 1974
Fonte: wikiart.org

Figura 39: Allan Kaprow. Yard, 1961


Fonte: artsjournal.com

Figura 40: Robert Smithson. Spiral Jetty, 1970


Fonte: umfa.utah.edu

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UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

Figura 41: Dennis Oppenheim. Reading Figura 42: Gina Pane. Azione
Position for Second Degree Burn, 1970 sentimentale, 1973
Fonte: dennis-oppenheim.com Fonte: camh.org

Ao mesmo tempo, a Arte Conceitual exerceu um papel fundamental para a


fotografia artística ao inserir no mercado de arte um tipo de fotografia muito distante
da arte dos fotógrafos, caracterizada pela primazia da técnica, da composição
ou do olhar, e também muito diferente da fotografia dos artistas de vanguarda,
utilizada como um dos muitos novos meios e materiais expressivos experimentados
no período em busca de novas visibilidades modernas. Seja como o registro de uma
manifestação artística efêmera ou como um meio de expressão artística, a fotografia
conceitual sempre será caracterizada pela ideia do artista nela expressa. Entre os
artistas conceituais que exploraram a linguagem fotográfica, podemos destacar
Joseph Kosuth, Ed Ruscha, Dan Graham, Douglas Huebler, John Baldessari, Ana
Mendieta, Bruce Nauman e Duane Michals.

Depois de todos os movimentos de vanguarda foi a Arte Conceitual que,


retomando o pensamento de Duchamp, mudou definitivamente os paradigmas do
mercado de arte. O conceito da obra a define como arte, independente do meio,
da técnica, do material ou de qualquer critério visual, permitindo que em sua esteira
se delineasse a Arte Contemporânea com a celebração do pluralismo em uma
profusão de linguagens, estilos, técnicas, materiais, temas e visualidades. A partir
deste momento não haveria mais distinção entre as linguagens das belas-artes e as
novas linguagens artísticas e a fotografia passaria a ocupar um lugar de destaque
no cenário contemporâneo.

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Sites
Dennis Oppenheim
http://www.dennis-oppenheim.com/
MYMET
http://metmuseum.org/
MoMA
http://www.moma.org/

Livros
Fotomontaje
ADES, Down. Fotomontaje. Barcelona: Gustavo Gili do Brasil, 2002.
La Fotografia Plastica: Un Arte Paradojico
BAQUE, D. La Fotografia Plastica: Un Arte Paradojico. Barcelona: Editorial Gustavo
Gili, 2003.
O desafio do olhar: Fotografia e artes visuais no período das vanguardas históricas
FABRIS, Annateresa. O desafio do olhar: Fotografia e artes visuais no período das
vanguardas históricas. São Paulo, Martins fontes, 2011.

Vídeos
Fotodinamismo Futurista - Anton Giulio Bragaglia
http://goo.gl/qpFhcw
Man Ray, fotógrafo
http://goo.gl/WZmQLe
Fotografia Moderna Brasileira - Moderna para Sempre
http://goo.gl/zQViYn

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UNIDADE Fotografia nos Movimentos de Vanguarda e na Arte Conceitual

Referências
HACKING, Juliet. Tudo sobre fotografia. Rio de Janeiro: Sextante, 2012.

ROUILLE, André. A fotografia – entre documento e a arte contemporânea.


São Paulo: SENAC, 2009.

FABRIS, Annateresa. O desafio do Olhar. São Paulo: Martins Fontes, 2011.

SOUGEZ, M. L. História da fotografia. Lisboa: Dinalivro, 2001.

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