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FACULDADE LUCIANO FEIJÃO

Curso de Psicologia

Disciplina: Psicologia Jurídica

RELATÓRIO CRÍTICO DOCUMENTÁRIOS:


A CASA DOS MORTOS
&
CRONICAS (DES)MEDIDAS

ANTONIO ERASMO DE SOUSA JUNIOR

JOÃO BATISTA DE SOUSA TEIXEIRA

SOBRAL

2023
ANTONIO ERASMO DE SOUSA JUNIOR
JOÃO BATISTA DE SOUSA TEIXEIRA

RELATÓRIO CRÍTICO DOCUMENTÁRIOS:


A CASA DOS MORTOS
&
CRÔNICAS (DES)MEDIDAS

Relatório elaborado como requisito


parcial para aprovação na disciplina de
Psicologia jurídica no curso de Psicologia
da Faculdade Luciano Feijão sob
orientação da Prof.ª fr.a Alana Araújo
Aragão.

SOBRAL
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................4
OBJETIVO...........................................................................................................5
2 DESENVOLVIMENTO .....................................................................................5
2. 1 A CASA DOS MORTOS ............................................................................. 5
2.2CRÔNICAS(DES)MEDIDAS...........................................................................6

3 CONCLUSÃO...................................................................................................9
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................
1. INTRODUÇÃO
Registro elaborado como requisito parcial para aprovação na disciplina de
Psicologia jurídica no curso de Psicologia da Faculdade Luciano Feijão sob
orientação da Prof.ª Alana. Segundo (FONSECA, 2012.) “O objetivo do relatório
é comunicar ao leitor e registrar para memória futura a experiência. O material
a ser relatado se trata de dois documentários bastantes pertinentes que irão
direcionar a análise crítica acerca do tema de imputabilidade e
inimputabilidade, manicômios penitenciários e perspectivas da luta manicomial
frente ao problema.

O primeiro manicômio judiciário do Brasil e da américa latina foi criado no


dia 30 de maio de 1921 na cidade do Rio de janeiro com o objetivo de
solucionar e reorganizar a conjuntura dos condenados com que apresentavam
sintomas de loucura, os chamados loucos criminosos (CARRARA, 1998, p.
194).

Desde a criação, o manicômio judicial começa com dupla atribuição, ambas


que tem função de excluir e segregar os indivíduos que fogem ao consenso de
normal em prol da proteção do tecido social. Desta relação ambígua e
contraditória que por hora pune o indivíduo que cometeu um crime passível de
pagar pena em reclusão, por outra considera este mesmo individuo não
consciente de seu delito e mentalmente incapaz (CARRARA, 1998, p. 194).

Diante disso a justiça brasileira adota um sistema biopsicológico, sistema


esse que isola a partir somente da existência de um nexo causal entre o estado
mental e a prática do delito, o que abre prerrogativas para a imposição do
conceito de periculosidade que surge com intenção de prever condutas futuras
(BMM SANTOS, 2012).

Triangulando as concepções sobre delito e periculosidade baseado na


condição mental do indivíduo, vemos que a medida de segurança ganha rigidez
excessiva provocando reais ambientes de cárceres institucionalizados.

2. OBJETIVO

O motivo da elaboração deste relatório é fazer uma reflexão sobre a


dimensão dos Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátricos (HCTP) e
levantar discussões acerca da dupla atribuição de Hospital e prisão, perda de
direitos e desafios da luta antimanicomial.

3. DESENVOLVIMENTO
3. 1 A CASA DOS MORTOS
O curta-metragem documentário “A casa dos mortos” foi produzido no ano
de 2009 pela antropóloga documentarista Debora Diniz que assina a direção e
roteiro. O curta retrata e expõe com tolerância as experiências e mazelas dos
internos do Hospital de Custódia e Tratamento (HCT) em Salvador na Bahia.

Discursos concisos por trás de falas confusas, rostos abatidos e histórias


de violência de seus delitos e do estado. Assim dá-se os primeiros dois minutos
de documentário curta metragem “A casa dos mortos” que ganha esse nome
pelo poeta e interno Bubu que já conta com 12 internações em
estabelecimentos de hospital presidio. O poema declamado em atos descreve
a condição dos internos, a negligência fantasiada em normatização, o fim
último do homem.

A casa dos mortos tem três atos que expõem a fragilidade do homem
comum frente ao poder institucional. O conceito de normalidade que tende a
atender padrões de assepsia social, processo que contribui ainda ditando a
suposição de um ideal de homem como ser social.

A ideia de "Homem" é vista como uma construção que emerge da tensão


entre poder reivindicado que refere ao poder jurídico como indivíduo munido de
direitos legais e políticos e poder disciplinar que concerne a noção do indivíduo
sujeito a disciplina e controle através do poder que vigora. Dessa forma o
conceito de homem e normalidade são meramente ilusórios, vide que ambos
podem mudar de acordo com o contexto e interesse da classe dominante.
(RTFM Pegden, AAL Ferreira apud Foucault, 2021, p. 5).

O homem que não atende a convenção social do que é delimitado e foge a


norma, logo é punido e reestabelecido a sociedade ao lugar de pária social. Na
situação dos “Louco perigosos” que cometem o delito, o biopoder e a
psiquiatria ratificam a ideia do criminoso nato. A criminologia de Cesar
Lombroso no século XIX, que se assentava no determinismo biológico marcou
essa ruptura no direito penal e contribuiu para o que temos como medida para
os crimes sem razão.

O curta perpassa ciclos interrompidos por meio de um regimento


excludente que criou maneiras de perpetuação no sistema jurídico penal. O
fator ser cidadão não cabe mais ao individuo manicomial, pois o delito já o
enjaulou, o diagnostico já classificou e a instituição já o julgou.

3. 2 CRÔNICAS (DES)MEDIDAS
O presente curta-metragem trata de relatos reais acerca da vivência em
Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP), mais precisamente o
Santa Isabel que fica no Pará, mesclando as percepções de profissionais,
custodiados, egressos e familiares, assim como, servidores de outras
instituições governamentais que interagem com os casos desses internos,
como técnico judiciário, psiquiatra, profissionais do CAPS e da Residência
Terapêutica, por exemplo.

Inicialmente, um servidor do aparato penitenciário local, informa a


realidade de superlotação do HCTP, o qual possui estrutura para 23 leitos e
naquele momento encontravam-se internados mais de 200 pacientes.

No Brasil, com a Reforma Penal de 1984, passou a ser denominado


Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP), integrando o sistema
penitenciário. Embora seja considerado um hospital, está vinculado às
Secretarias Estaduais que administram o sistema prisional, e não às
Secretarias Estaduais de Saúde (CORREIA apud CORREIA, 2017) e a
superlotação mencionada se apresenta análoga as realidades penitenciárias
brasileiras.

Adiante, um juiz de direito local apresenta superficial e objetivamente a


principal distinção entre a PENA e a MEDIDA DE SEGURANÇA, onde a
primeira é pautada no conceito de culpabilidade, que passa pelo ideal de ato
cometido, portanto pretérito, e sua relação com autoria, sendo definido o grau
de culpa e determinada a punição ao condenado. Já a segunda, é
fundamentada no conceito de periculosidade, o que acarreta uma projeção de
ação, portanto futura, pautada numa percepção enviesada por estereótipos e
estigmas sociais,
E o juiz ainda ressalta que para a cessação da custódia estabelecida
pela medida de segurança é necessário laudo psiquiátrico.

Esse tema remete a discussão acerca da inimputabilidade, conceito


oriundo do saber jurídico trazido pelo artigo 26 do Código Penal de 1940, e
ainda vigente:

“Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou


desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação
ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato
ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o
agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por
desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente
capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo
com esse entendimento”. (Código Penal, 1940)

Diante do exposto, se percebe que ao ser visto como inimputável ao


sujeito é estabelecida uma medida de segurança, atribuindo a situação um
caráter de saúde, contudo, tal cenário coloca o prazo para ressocialização
desse custodiado como indeterminado, ficando associado a evolução do seu
tratamento, que concebe uma ideação de redução da periculosidade, a qual
corresponde a probabilidade de reincidência, enquanto ao condenado por pena
tem seu tempo de cumprimento definido no momento da condenação.

Ressalte-se que o apenado ainda pode se favorecer do regime de


progressão da pena, o qual pode ter seu tempo de cumprimento reduzido,
geralmente, considerando seu bom comportamento na internação, o que não é
concedido ao cumpridor de medida de segurança.

Considere-se ainda o anacronismo do Código Penal, o qual tem como


base, pelo período de sua edição, o tratamento no modelo manicomial, e
apesar de tentativas de retificações e complementações posteriores,
especialmente após a Reforma Psiquiátrica, pouco se conseguiu avançar, em
contextos práticos, a realidade manicomial executada nos HCTPs.

Por conseguinte, acerca dos estigmas sociais relacionados a loucura e


sua relação com a periculosidade é importante enaltecer a distinção entre o
sofrimento psíquico contínuo e o surto psicótico.
A sociedade, em sua maioria, possui grande temor acerca do surto
psicótico, que corresponde a um estado temporário de perda de consciência
incorrendo em ações por impulsividade, normalmente contida a partir de um
tratamento inicialmente medicamentoso, seguido de acompanhamento
terapêutico.

Esse estado mental de fato apresenta algum grau de perigo, entretanto,


ocorrida a contenção não é certo uma reincidência, e deste modo, a
periculosidade relacionada a esse estado é cessada.

O sofrimento psíquico contínuo muitas vezes decorre de uma condição


biológica ou social, de maior duração e normalmente tratada por meio
terapêutico. Assim, se observa que a situação de um infrator em sofrimento
psicológico não está relacionada apenas a justiça ou saúde, mas passa
também pela seara social.

É possível observar no vídeo que a maioria da população do HCTP são


pessoas pretas, com diversas vulnerabilidades sociais, e que tal situação
favorece ao desamparo familiar e estatal, o qual contribui ao retorno dos
poucos egressos ou a permanência prolongada em cárcere desses sujeitos.

Um dos pilares desse cenário se pauta no modelo biomédico, que


reforçado pelos poucos psiquiatras disponibilizados pelo Estado para o serviço
nesses HCTP, dificulta a eficiência dos tratamentos e ocasiona a demora em
processos de revisão da medida de segurança aplicada.

Em virtude do tempo de permanência prolongado no cárcere,


corroborado pelas condições sociais vulneráveis da maioria das famílias
desses internos, ocasionam um significativo aumento no rompimento desse
vínculo, e faz com que o interno ao ser liberado não tenha para onde ir.

Nesse contexto, o Estado cria as Residências Terapêuticas que,


inicialmente, tinha por objetivo atender os egressos desse sistema, entretanto,
no vídeo podemos ver uma funcionária desse equipamento informar que tal
estrutura também sofre com superlotação, especialmente, em razão do
desvirtuamento desse propósito para atender também usuários de drogas em
desamparo.
Ela traz a estatística de que dos 220 residentes em seu equipamento,
apenas 75 são oriundos dos HCTP. E mencionada ainda que a população
dessas residências tem se apresentado com perfil mais jovem, usuários de
entorpecentes e mais agressivos.

Assim, o Estado reforça um ideal de política higienista que opta por


isolar situações que desagradam a população, mas não alcança a eficiência na
resolução desses problemas que se apresentam, gerando super onerações,
mas sem alcançar eficiência satisfatória a nenhumas das partes.

Por fim, o vídeo ainda apresenta um caso de paciente que egresso do


HCTP é alocado num CAPS, por conta do desamparo sociofamiliar, e chega
sem prévio aviso ou mesmo de conclusão completa da estrutura física e de
profissionais do equipamento.

O CAPS tenta amparar o paciente da melhor maneira possível, mas


reconhece não ser o local e estratégia ideal única para o caso do paciente.
Discutem as possibilidades e propõem inclusive a elaboração de um PTS
(Plano Terapêutico Singular), para cuidar da parte correspondente ao
mapeamento de saúde desse usuário.

Conforme observado, a falta de estratégias bem definidas e discussões


mais efetivas e frequentes em busca de soluções para essas pessoas
ocasionam mais onerações ao Estado e mais sofrimento psicossociais aos
envolvidos nesse sistema.

4. CONCLUSÃO

A Reforma Psiquiátrica, que no Brasil foi essencialmente um movimento


de trabalhadores da área da saúde, familiares e usuários de serviços de saúde
mental, inaugura uma nova consideração da pessoa em sofrimento mental
perante a sociedade, que o via como um individuo a ser descartado, um
empecilho, um ser sem função social.

Obviamente que devemos exaltar as vitórias que se deram desde então,


porém, cabe também perceber e apontar onde a luta perde força o qual
pudemos ver que ocorre frente ao poder jurídico penal e a condição do “louco
criminoso”.
Nesse âmbito, a camada carceraria com transtorno mental ficou à
disposição do saber jurídico e suas leis que se sobrepõem e, com isso,
invalidam alguns saberes os quais fortalecem o discurso antimanicomial,
permitindo assim sanções penais como a medida de segurança a qual
perpetua a penalização e não atinge o objetivo de recuperação deste sujeito.

Além disso, coloca em desleal desigualdade as pessoas ditas “normais”


que confrontam a lei, ao conceder-lhes diversas “vantagens” frente ao portador
de deficiências mentais o qual em sua condenação possui apenas prazo
mínimo de sua punição de 1 a 3 anos, mas não sabe quando essa cessará.

Ademais, os esforços para aplicar os preceitos antimanicomiais


legitimados em dispositivos legais, na prática têm sido vencidos pelas relações
de poder que impõe uma desvalorização desses sujeitos de direitos, direitos
esses presentes apenas em papéis.

Portanto, as discussões acerca da percepção de inimputabilidade e


periculosidade do “louco infrator” precisam ser enaltecidas e posto o
reconhecimento da capacidade de responder a culpabilidade pelo ato cometido
pelo deficiente ou sujeito em sofrimento mental, de modo, que condições de
cumprimentos análogos aos dos apenados possam ser-lhes atribuídos, além
de inclui-lo na RAPS (Rede de Atenção Psicossocial) como ocorre com
qualquer outro usuários do SUS com necessidades idênticas ou semelhantes
as desses indivíduos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARRARA, Sérgio. Crime e loucura: o aparecimento do manicômio


judiciário na passagem do século. In: Crime e loucura: o aparecimento do
manicômio judiciário na passagem do século. 1998. p. 227-227.

Código Penal brasileiro, 1940.

CORREA, Ludmila Cerqueira. A luta antimanicomial continua!


Problematizações sobre o manicômio judiciário na perspectiva da
Reforma Psiquiátrica brasileira, 2017.

FONSECA, Pedro. Guia para a redação de relatórios. 2012.


PEGDEN, Raphael Thomas Ferreira Mendes; FERREIRA, Arthur Arruda Leal.
Dos crimes-sem-razão às razões do eugenismo: racismo de Estado e
psiquiatria na origem do conceito de Biopolítica em Michel
Foucault. Mnemosine, v. 17, n. 2, 2021.

SANTOS, Bartira Macedo de Miranda. Lombroso no Direito Penal: o destino


d’O Homem Delinquente e os perigos de uma ciência sem
consciência. Revista Eletrônica, 2012.

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