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Capítulo 25

(Revolução Permanente Séc. XIX)

A falta de um artesanato sólido e a insistência no estilo e na beleza quase a mataram. O


número de construções no século XIX superou todos os períodos anteriores juntos. O
empirismo e os livros-modelo, usados até o período georgiano, foram rejeitados como
simples e pouco artísticos. Arquitetos do século XIX criavam castelos normandos,
palácios renascentistas e mesquitas orientais. Algumas convenções foram aceitas, mas
não contribuíram para melhorar a situação. As igrejas foram construídas em estilo gótico,
pois predominou na Era da Fé. Alguns arquitetos do século XIX encontraram um meio-
termo entre essas duas alternativas desagradáveis. O Parlamento em Londres
exemplifica as dificuldades enfrentadas pelos arquitetos na época. Após o incêndio de
1834, a câmara antiga foi destruída. Foi realizado um concurso e o projeto de Sir Chartes
Barry foi escolhido pelo júri. Nas artes da pintura e escultura, as convenções do "estilo"
não tiveram tanto peso, o que poderia levar a pensar que a tradição não foi tão afetada.
No entanto, isso não foi verdade. A vida de um artista é sempre difícil, mas antes eles não
precisavam questionar o propósito de sua existência. Podiam criar obras normais ou
experienciar a transcendência ao realizar um trabalho excepcional. Sua posição estava
assegurada na vida, porém, quanto mais opções surgiam, menos o gosto do artista se
alinhava ao do público. Antes, artistas satisfaziam facilmente essa demanda, pois suas
obras eram semelhantes em vários aspectos. Porém, sem essa unidade tradicional, as
relações entre artista e cliente se tornaram frequentemente difíceis. No século XIX,
ocorreu uma grande divisão entre artistas que seguiam as convenções e atendiam às
demandas do público, e aqueles que se consideravam isolados e autodeterminados. A
situação piorou devido à Revolução Industrial, que levou ao declínio do artesanato, à
ascensão de uma nova classe média sem tradição e à produção de produtos vulgares e
pretensiosos disfarçados como "Arte", prejudicando assim o gosto do público. Para o
homem de negócios, um artista era como um impostor, cobrando preços absurdos por
algo que mal poderia ser chamado de trabalho honesto. Os artistas se separavam do
resto da sociedade, deixando crescer cabelos e barbas longas, vestindo tecidos de veludo
e chapéus de abas largas. Ao invés de gravatas, usavam um nó largo e voante conhecido
como Lavalliere, enfatizando seu desprezo pelas normas sociais. Apesar da carreira de
um artista ser repleta de perigos, as novas condições também tinham suas vantagens. O
artista que se submetia ao gosto daqueles sem educação estética estava condenado. O
mesmo ocorria ao artista que dramatizava sua situação, se considerava um gênio por não
ter compradores. A ampla variedade de opções e a independência dos desejos dos
clientes, conquistada a um alto preço, também tinham suas vantagens. A arte é um meio
perfeito para expressar a individualidade, desde que o artista a possua.
As regras e convenções do seu estilo eram tão rigorosas que havia muito pouco âmbito
para uma livre escolha. Sempre tem algo a ver como o modo como essa pessoa se vê a
si mesma e quer que os outros a vejam, e cada um desses atos de escolha pode ensinar-
nos acerca de sua personalidade. Mesmo que ela envergue um uniforme, poderá ainda
restar uma certa margem para ``expressão``, mas muito menos, obviamente. Nos
períodos anteriores, eram usualmente os mestres mais notáveis, artistas cuja habilidade
era suprema, os que também recebiam as encomendas mais importantes e, portanto, se
tornavam muito famosos. Isso não significa que nunca poderiam ocorrer tragédias e que
nenhum pintor era jamais insuficientemente honrado em seu país, mas, de um modo
geral, os artistas e seu público compartilhavam de certos pressupostos e, por
conseguinte, concordavam também no tocante aos padrões de excelência. É verdade que
estamos quase todos familiarizados com alguns de seus produtos, os monumentos a
grandes homens nas praças públicas, os murais em edifícios próprios da administração
pública e os vitrais em igrejas e colégios, mas a maioria deles adquiriu para nós um ar tão
cediço e desenxabido que não lhes prestamos mais atenção do que às gravuras calcadas
sobre outrora famosas peças de exposição com que ainda deparamos em saguões de
antiquados hotéis. E, no entanto, é provável que continue sendo sempre verdadeiro que,
desde a grande revolução, a palavra Arte adquiriu para nós um significado diferente e que
a história da arte no século XIX nunca venha a ser a história dos mestres de maior êxito e
mais bem pagos desse período.
A história de um grupo de homens solitários que corajosamente pensaram por si mesmos,
examinando convenções e criando novas possibilidades para a arte, fez de Paris a capital
artística da Europa no século XIX, assim como Florença foi no século XV e Roma no
século XVII. Artistas de todo o mundo iam a Paris estudar com grandes mestres e debater
a natureza da arte nos cafés de Montmartre. Era compreensível o motivo de tantos
artistas invejarem Ingres por sua segurança técnica e respeitarem sua autoridade, mesmo
discordando de seus pontos de vista. Compreende-se facilmente por que seus
contemporâneos achavam insuportável a perfeição fluente de Eugène Delacroix. Seus
adversários convergiram na crítica à arte de Delacroix. (Diminuir o texto) Ele era
complexo, com simpatias vastas e variadas. Seus diários mostram que Delacroix não era
um rebelde fanático. Cansado dos lemas eruditos da Academia, ele foi para o Norte da
África em 1832 para estudar as cores e roupagens românticas do mundo árabe. Quando
presenciou uma carga de cavalaria em Tânger, anotou em seu diário: "Desde o início, os
cavalos empinaram e lutaram com uma fúria que me fez temer pelos seus cavaleiros, mas
foi algo magnífico para pintar. O objetivo do pintor foi nos fazer compartilhar de um
momento emocionante e de sua felicidade no movimento e romantismo da cena, com a
cavalaria árabe carregando em desfile e o nobre coronel em destaque no primeiro plano.
Delacroix aplaudiu o quadro de Constable em Paris, embora sua personalidade e escolha
de temas românticos tivessem mais afinidades com Turner. Nas academias, ainda
prevalecia a ideia de que pinturas dignas devem retratar personagens dignos, e que
trabalhadores e camponeses eram adequados apenas para cenas de gente, seguindo a
tradição dos mestres holandeses. Durante a Revolução de 1848, artistas em Barbizon
seguiram o programa de Constable para pintar paisagens rurais e a vida camponesa. É
curioso pensar que isso deveria ser revolucionário, mas na arte passada, os camponeses
eram vistos como engraçados, como Bruegel os pintou. Assim, as camponesas foram
mais naturais e convincentes que os heróis acadêmicos. Há um ritmo calculado no
movimento e distribuição das figuras, conferindo estabilidade ao todo e ressaltando a
solenidade da colheita. O pintor responsável por esse movimento foi Gustave Coubert.
Seu realismo revolucionou a arte, assemelhando-se a Caravaggio. Pessoas acostumadas
com a grandiosidade dos quadros acadêmicos podem achar essa tela muito infantil.
Comparada à disposição desajeitada dela, até a composição de "As Respigadeiras", de
Millet, parece cuidadosamente planejada. A ideia de um pintor se representar em mangas
de camisa como um andarilho foi considerada ultrajante pelos artistas e seus
admiradores. Era a intenção de Courbet causar essa impressão.
Em 1854, ele escreveu em uma carta: "Espero sempre viver da minha arte sem
comprometer meus princípios, sem enganar minha consciência por um segundo sequer,
sem pintar nem mesmo o que pode ser coberto pela palma da mão, apenas para agradar
a alguém ou vender mais facilmente". A renúncia de Courbet a efeitos fáceis e sua
determinação em retratar o mundo como o via inspiraram muitos outros a rejeitar o
convencionalismo e seguir apenas sua própria consciência artística. Se esta era a
verdade, a arte tomaria um rumo errado com Rafael e, consequentemente, através dele.
Se a arte precisasse ser reformada, seria necessário voltar além de Rafael, para um
tempo em que os artistas eram "sinceros e fiéis à obra de Deus" e se esforçavam em
copiar a natureza, sem pensar na glória terrena, mas na glória de Deus. Os crentes na
insinceridade da arte através de Rafael e na missão de retornar à "Idade da Fé" eram
conhecidos como a "Irmandade Pré-Rafaelita". Dante Gabriel Rossetti (1828-82), filho de
um refugiado italiano, era um dos talentosos membros do grupo. O lema era representado
no estilo medieval, como a fig. Embora Rossetti quisesse voltar ao espírito dos mestres
medievais, não pretendia copiar suas pinturas. O desejo era emular os mestres, ler a
narrativa bíblica com devoção e visualizar o momento em que o anjo saudou a Virgem
com um coração devoto. No entanto, mesmo buscando representar a natureza fielmente
como os admiradores florentinos do Quatrocentos, alguns consideram que a Irmandade
Pré-Rafaelita se impôs uma meta impossível de alcançar. Admirar a perspectiva inocente
e espontânea dos pintores do século XV, chamados de "primitivos" na época, é uma
coisa, mas um artista se esforçar para alcançá-la é outra. Apesar de terem começado de
forma semelhante a Millet e Courbet, acredito que o esforço sincero dos pré-rafaelitas
acabou em fracasso. O desejo dos mestres vitorianos por inocência foi contraditório
demais para obter sucesso. A esperança dos franceses em fazerem progressos na
exploração do mundo visível foi mais fecunda para a geração seguinte. Concluíram que a
pretensão da arte tradicional em descobrir o modo de representar a natureza como a
vemos se baseava numa concepção errônea. No máximo, a arte tradicional permitia
representar homens ou objetos de forma artificial. Os estudantes de arte nas academias
aprendiam a basear seus quadros na interação de luz e sombra. O público se acostumará
a ver as coisas assim e acabará esquecendo que ao ar livre não percebemos essas
gradações de escuro para claro. Os objetos fora do estúdio do artista não parecem tão
redondos ou modelados quanto os moldes em gesso de uma escultura antiga. As partes
iluminadas parecem mais brilhantes do que no estúdio, e até as sombras não são
uniformemente cinzentas ou negras devido aos reflexos de luz dos objetos ao redor. Se
confiarmos em nossos olhos, sem pré-conceitos acadêmicos, faremos descobertas
emocionantes.
Os artistas egípcios representavam cada parte do corpo de forma característica e reuniam
todas elas para formar uma figura completa. Os gregos romperam com o preconceito do
escorço em pinturas. Os artistas subsequentes fizeram muitas descobertas e
conseguiram criar um quadro convincente do mundo visível. No entanto, nenhum deles
desafiou seriamente a crença de que cada objeto na natureza tem uma forma e cor
fixadas definitivamente e facilmente reconhecíveis em uma pintura. Manet e seus
seguidores revolucionaram a reprodução de cores, assim como os gregos revolucionaram
a representação de formas. Eles descobriram que a natureza ao ar livre não consiste em
objetos individuais com cores distintas, mas sim em uma mistura brilhante de matizes que
se unem em nossos olhos ou mente. Essas descobertas não foram todas feitas de uma
vez ou por um único homem. As primeiras pinturas de Manet, nas quais ele abandonou o
método tradicional de sombras suaves em favor de contrastes fortes e duros, causaram
um grande protesto entre os artistas conservadores. Uma das obras de Goya o inspirou a
pintar um grupo semelhante e explorar o contraste entre a luz externa e a sombra dentro
de um balcão. Em 1869, Manet levou essa exploração ainda mais longe do que Goya
havia feito antes, há sessenta anos. Ao contrário de Goya, as cabeças das damas de
Manet não seguem o estilo tradicional. Isso pode ser observado ao compará-las com o
retrato de Leonardo da "Mona Lisa", o retrato de Rubens de sua filha ou "Miss Haverfield"
de Gainsborough. Apesar das diferentes técnicas utilizadas por esses pintores, todos
buscavam criar a sensação de corpos tridimensionais através do uso de luz e sombra. As
cabeças de Manet parecem planas comparadas às deles.
Podemos entender por que esse tratamento parecia inculto para aqueles que não
conheciam as intenções de Manet. Porém, ao ar livre e sob a luz do dia, as formas
redondas parecem planas e, por vezes, são apenas manchas coloridas. As novas teorias
abrangiam o tratamento de cores ao ar livre (Plein Air) e também formas em movimento. A
litografia de Manet, presente na 337, é um exemplo desse método de reproduzir
desenhos diretamente na pedra, inventado no início do século XIX. Manet busca capturar
a impressão de luz, velocidade e movimento com apenas uma sugestão das formas que
surgem da confusão. Isso evidencia sua recusa em se deixar influenciar por seus
conhecimentos ao representar a forma. O livro "Encurralados em Mojave" (338), popular
no período vitoriano pela comédia à moda de Dickens com a qual retratou os
personagens e acontecimentos do evento. Em determinado momento, apenas um ponto
pode ser focalizado por nossos olhos - o resto nos parece um emaranhado de formas
desconexas. A litografia de Manei representa algo invisível, tornando-se mais "verdadeira"
que a do humorista vitoriano. Transporta-nos para o alvoroço e a excitação do momento
que o artista presenciou e registrou. Entre os pintores que se juntaram a Manet e
ajudaram a desenvolver essas ideias estava um jovem obstinado e pobre de Le Havre.
Monet convenceu seus amigos a abandonar o estúdio e pintar apenas em frente do
"motivo". Manet, ao visitá-lo, concordou com o método e pintou um retrato de Monet
trabalhando ao ar livre (fig. Ao mesmo tempo, Monet defendia uma nova maneira de pintar
a natureza, exigindo mudanças de hábitos, desprezo pelo conforto e novos métodos
técnicos. O pintor não tem tempo para misturar e combinar cores ou aplicá-las em
camadas sobre uma base castanha, como os velhos mestres faziam. Ele precisa fixá-las
rapidamente em sua tela, em pinceladas rápidas, focando mais no efeito geral do que nos
detalhes. Apesar de Manet ter ganhado reconhecimento público pelos seus retratos e
composições figurativas, os paisagistas mais jovens próximos a Monet ainda encontravam
dificuldade em ter suas telas não convencionais aceitas pelo Salão. Uma delas era uma
pintura de Monet chamada "Impressão: Nascer do Sol", retratando um porto visto através
das névoas matinais. Um crítico considerou esse título ridículo e chamou o grupo de
artistas de "os impressionistas". Ele quis dizer que esses pintores não tinham
conhecimento sólido e acreditavam que a impressão de um momento era suficiente para
nomear seus quadros como pintura.
Algum tempo depois, o grupo passou a ser conhecido como impressionistas. É
interessante ler notícias da imprensa sobre as primeiras exposições dos impressionistas.
Exposição inaugurada na galeria Durand-Ruel com pinturas. Lunáticos, incluindo uma
mulher, exibem suas obras. Pessoas rindo muito diante dessas pinturas, mas meu
coração doeu ao vê-las. Não era só a técnica que irritava os críticos. Eram também os
motivos que esses pintores escolhiam. Poucas pessoas percebem que essa exigência
era, de certo modo, ir razoável. Os ``pinturescos`` são motivos vistos em pinturas. Os
jovens impressionistas aplicam seus princípios à paisagem e a todas as cenas reais.
Somente as cabeças de algumas figuras no primeiro plano são mostradas com detalhes,
pintadas de forma audaciosa e não convencional. O vestido vaporoso foi pintado com
pinceladas largas e soltas, diferentemente de Frans Hals ou Velázquez. Percebemos
facilmente que o esquematismo não é desleixo, mas sim resultado de sabedoria artística.
Se Renoir pintasse com todos os detalhes, o quadro seria monótono e sem vida.
No século XV, os artistas enfrentaram um conflito semelhante ao descobrir como refletir a
natureza. Os triunfos do naturalismo e da perspectiva fizeram com que suas figuras
parecessem rígidas, como madeira. Somente Leonardo, com seu gênio, conseguiu
superar essa dificuldade ao fazer com que as formas se fundissem em sombras escuras,
conhecido como sfumato. A descoberta dos impressionistas foi que as sombras escuras
usadas por Leonardo para modelar não acontecem ao ar livre e sob a luz do sol, o que os
impediu de recorrer a essa técnica tradicional. Os visitantes da primeira exposição
impressionista olharam de perto as telas e viram apenas um emaranhado de pinceladas.
Por isso pensaram: "Esses pintores são loucos". Diante dos quadros de Camille Pissarro,
líder do movimento, que evocavam a impressão de um boulevard parisiense ensolarado,
as pessoas escandalizadas perguntavam: "Se eu caminhar pelo boulevard, eu parecerei
assim?". Levou algum tempo para o público aprender que, para apreciar um quadro
impressionista, é necessário recuar alguns metros e desfrutar o milagre de ver essas
manchas intrigantes se organizarem e ganharem vida diante dos nossos olhos. Realizar
esse milagre de transferir a experiência visual do pintor para o espectador era o objetivo
principal dos impressionistas. Sentir a liberdade e o poder desses artistas deve ter sido
realmente emocionante e valioso, compensando grande parte das críticas e hostilidades
que enfrentaram. Onde ele encontrasse uma bela combinação de tons, uma interessante
configuração de cores e formas, uma alegre e satisfatória mancha de sol e sombras
coloridas, poderia pintar.
O artista era responsável apenas por sua sensibilidade na pintura. É menos
surpreendente que as ideias dos jovens artistas tenham enfrentado resistência, mas é
surpreendente que tenham sido aceitas tão rapidamente. Alguns jovens rebeldes, como
Monet e Renoir, viveram o suficiente para desfrutar o sucesso e alcançarem renome na
Europa. Essa transformação deixou uma impressão duradoura em artistas e críticos. A
luta dos impressionistas inspirou os inovadores em arte, mostrando o fracasso do público
em reconhecer novos métodos. Essa vitória foi apressada e completa graças a dois
aliados que mudaram a perspectiva das pessoas do século XIX. No início, essa invenção
era usada principalmente para retratos. O desenvolvimento da câmera portátil e do
instantâneo ocorreu ao mesmo tempo que a ascensão da pintura impressionista. O
desenvolvimento da fotografia impulsionou artistas em sua exploração e experimento,
pois um dispositivo mecânico poderia realizar tarefas de pintura melhor e mais barato. O
pintor venceu a transitoriedade da natureza e preservou objetos para o futuro, como o
dodó, retratado por um pintor holandês do século XVII antes de sua extinção. A fotografia
no século XIX estava prestes a assumir a função da arte pictórica.
Antes disso, muitas pessoas consideravam importante tirar seu retrato pelo menos uma
vez na vida. Por isso, os artistas precisavam buscar novas áreas de expressão onde a
fotografia não conseguia alcançar. O segundo aliado dos impressionistas na busca por
novos motivos e esquemas de cor foi a cromotipia japonesa. No séc. XVIII, os artistas
japoneses abandonaram os motivos tradicionais e escolheram cenas da vida humilde
como tema para suas xilogravuras coloridas, mostrando grande invenção e perfeição
técnica. Os japoneses não valorizavam esses produtos baratos. Durante o século XIX,
quando o Japão foi obrigado a estabelecer relações comerciais com a Europa e a
América, as estampas eram frequentemente usadas como invólucros e enchimentos,
sendo facilmente adquiridas nas casas de chá. Os artistas do círculo de Manet foram os
primeiros a apreciar e colecionar avidamente essas estampas, descobrindo uma tradição
não contaminada pelas regras acadêmicas e clichês que os pintores franceses queriam
eliminar. Os japoneses se encantavam com o inesperado e não-convencional do mundo.
Esse desdém audacioso por uma regra básica da pintura europeia influenciou muito os
impressionistas. Por que mostrar sempre o todo ou uma parte relevante de cada figura em
uma cena? Edgar Degas (1834-1917) foi o pintor mais impressionado com essas
possibilidades. Por isso, ele preferia buscar seus temas no balé em vez de cenas ao ar
livre. Do alto, via bailarinas dançando ou repousando no palco, estudando escorço e
iluminação sobre a forma humana. Sem interesse no aspecto físico delas. Seu interesse
era o jogo de luz e sombra na forma humana e como podia sugerir movimento e espaço.
Provou que os princípios dos jovens artistas não eram incompatíveis com o desenho
perfeito, mas sim resolviam novos problemas que só um mestre do desenho poderia
enfrentar. Os princípios básicos do novo movimento encontraram plena expressão na
pintura. A escultura também se viu atraída para a batalha pró ou contra o "modernismo".
Como estudioso da estatuária clássica e de Miguel Ângelo, Rodin não teve conflito com a
arte tradicional. Ele se tornou um renomado mestre e foi reconhecido como um dos
maiores artistas de sua época. Suas obras geraram polêmicas e são frequentemente
comparadas às dos rebeldes impressionistas. Às vezes, deixava a pedra parcialmente
bruta para transmitir a sensação de que sua figura estava surgindo e tomando forma no
exato instante. Para o público comum, isso parecia ser uma excentricidade irritante ou
pura preguiça. Para o público em geral, a perfeição artística ainda exigia que tudo fosse
bem feito, acabado e polido. Ao rejeitar convenções mesquinhas para expressar sua visão
da criação divina, Rodin ajudou a afirmar o direito proclamado por Rembrandt. Como seu
procedimento não poderia ser atribuído à ignorância, a influência de Rodin contribuiu
significativamente para a aceitação do impressionismo além dos limitados admiradores
franceses. Whistler participou da primeira batalha do novo movimento ao expor com
Manet no Salão dos Recusados em 1863 e compartilhar o entusiasmo dos colegas
pintores pelas gravuras japonesas. Não era um impressionista como Degas ou Rodin,
pois seu foco principal não eram os efeitos de luz e cor, mas sim a composição de
padrões delicados. Whistler tinha em comum com os pintores de Paris o desprezo pelo
interesse público por episódios sentimentais. Para ele, o que importava na pintura não era
o tema, mas sim a forma como era traduzido em cores e formas. O título dado por
Whistler à tela em 1872 foi "Arranjo em Cinza e Preto", o qual reflete a harmonia de
formas e cores pretendida pelo artista, não contradizendo o sentimento temático. É
estranho pensar que o pintor desse quadro sensível e delicado era conhecido por seu
comportamento provocante e sua habilidade em criar inimizades. Seu hábito de dar
nomes excêntricos às suas obras e seu desdém pelas convenções acadêmicas
provocaram a raiva de John Ruskin, o renomado crítico defensor de Turner e dos pré-
rafaelitas. Whistler expôs peças noturnas japonesas intituladas "Noturnos" e cobrou 200
guinéus por cada. Whistler processou-o por injúria, expondo a distância entre o ponto de
vista do público e as concepções do artista. A questão do "acabamento" foi debatida e
Whistler foi questionado se realmente pediu essa quantia enorme "por dois dias de
trabalho", ao que ele respondeu: "Não.

Capítulo 26
Em Busca de Novos Padrões (O Final do Séc. XIX)
O fim do século XIX foi superficialmente próspero e complacente, porém, artistas e
escritores marginalizados estavam cada vez mais descontentes com os objetivos e
métodos da arte popular. A arquitetura se tornou alvo fácil dos ataques, e a construção se
tornou vazia. Os grandes blocos de prédios, fábricas e edifícios públicos das cidades em
expansão rápida eram construídos em diferentes estilos, sem relação com a finalidade do
edifício. Parecia que os engenheiros construíam primeiro uma estrutura funcional e depois
adicionavam ornamentos retirados de livros de modelos de estilos históricos. É curioso
como os arquitetos satisfizeram o público por tanto tempo com esses elementos
decorativos tão demandados: colunas, pilastras, cornijas e molduras. No final do século
XIX, mais pessoas perceberam o absurdo dessa moda. Na Inglaterra, em especial,
críticos e artistas lamentaram a diminuição da qualidade do artesanato devido à
Revolução Industrial e odiavam ver imitações baratas e pretensiosas de ornamentos feitas
por máquinas, que antes tinham significado e nobreza. Homens como John Ruskin e
William Morris sonhavam com uma reforma das artes e ofícios, substituindo a produção
em massa por um artesanato consciente e significativo. Suas críticas tiveram ampla
influência, embora os humildes ofícios manuais defendidos por eles provassem ser o
maior luxo nas condições modernas. A propaganda dessas críticas não aboliria a
produção industrial, mas abriria os olhos para os problemas criados e promoveria o gosto
pelo genuíno e simples. Ruskin e Morris ainda esperavam que a arte pudesse trazer de
volta as condições medievais. Muitos artistas buscavam uma "Nova Arte" baseada numa
nova sensibilidade para o desenho e as possibilidades de cada material. A bandeira da Art
Nouveau foi levantada na década de 1890. Os arquitetos exploraram novos materiais e
ornamentos. As ordens gregas evoluíram das estruturas de madeira e forneceram
recursos decorativos desde a Renascença. Seria o momento de a arquitetura de ferro e
aço desenvolver um estilo próprio? E se a tradição ocidental estivesse ligada demais aos
velhos métodos de construção, poderia o Oriente fornecer novos padrões e ideias? Esse
parece ter sido o raciocínio subjacente nos projetos de Victor Horta, arquiteto belga, que
se destacaram imediatamente. Horta aprenderá com a arte japonesa a descartar simetria
e explorar curvas sinuosas na arte oriental (pp. 104-105). Não era apenas um imitador.
Ele transformava as linhas em estruturas de ferro que se harmonizavam com os requisitos
modernos. Pela primeira vez desde Brunelleschi, construtores europeus receberam um
novo estilo. Não é surpresa que essas invenções fossem identificadas como Art Nouveau.
Na verdade, essa exigência de 'estilo' e a esperança de que o Japão pudesse ajudar a
Europa a sair do impasse constrangedor não se limitaram à arquitetura. Whistler defendia
com veemência essas ideias na Inglaterra, enfatizando a importância suprema de sutis
harmonias no desenho. Apesar do choque com Ruskin, esses adversários contribuíram
para o sucesso da Art Nouveau nas artes decorativas.
O movimento estético não tolerava livros mal impressos ou ilustrações que só contavam
histórias, sem considerar seu efeito na página. O favorito desse movimento foi Aubrey
Beardsley, um jovem prodígio (1872-98), que alcançou fama na Europa com suas
ilustrações refinadas em preto e branco, fortemente influenciadas por Whistler e gravuras
japonesas. Na França, Henri de Toulouse-Lautrec (1864-1901), talentoso seguidor de
Degas, aplicou a mesma economia de meios aos cartazes. Ele aprendeu com as gravuras
japonesas que uma ilustração pode se tornar mais impressionante ao simplificar a
modelagem e outros detalhes. A lição não seria esquecida tão cedo. O sucesso da Art
Nouveau, afastando-se das tradições ocidentais, reflete a insatisfação dos arquitetos e
projetistas com as rotinas ensinadas. O inconformismo e descontentamento com a pintura
do século XIX, que afetou jovens artistas no final desse período, é difícil de explicar. No
entanto, é essencial compreender suas origens, uma vez que foi a partir desse sentimento
que surgiram os movimentos conhecidos como "arte moderna". Alguns consideram os
impressionistas pioneiros da arte moderna, desafiando as regras da pintura acadêmica.
No entanto, é importante lembrar que eles não divergiram das tradições artísticas que se
desenvolveram desde a Renascença. Eles queriam pintar a natureza como a viam, mas
sua controvérsia com os mestres conservadores era mais sobre como alcançar isso. O
impressionismo explorou os reflexos das cores e o efeito do trabalho solto de pincel,
buscando a criação de uma réplica ainda mais perfeita da impressão visual. Foi apenas
com o impressionismo que a conquista da natureza se tornou completa, permitindo que
tudo o que os pintores viam se tornasse motivo para um quadro e que o mundo real se
tornasse um objeto digno de estudo. Talvez o triunfo completo de seus métodos tenha
feito artistas hesitarem em aceitá-los. Parecia que todos os problemas da arte de imitar a
impressão visual haviam sido resolvidos e não havia mais nada a ganhar explorando esse
objetivo. Sabemos que em arte, ao resolver um problema, surgem muitos outros. O
primeiro a compreender isso foi um artista da mesma geração dos impressionistas. Paul
Cézanne (1839-1906), próximo em idade a Manet e Renoir, participou das exposições
impressionistas na juventude. Porém, revoltado com a recepção negativa que elas
receberam, ele se retirou para sua cidade natal, Aix-en-Provence. Lá, ele estudou os
desafios da sua arte em paz, sem ser perturbado pelas críticas. Era um homem
independente e disciplinado, que não precisava buscar clientes para suas pinturas. Assim,
dedicou toda sua vida aos problemas artísticos que se propôs resolver, aplicando altos
padrões ao seu trabalho. Apesar de uma vida tranquila e de lazer, estava sempre focado
em alcançar a perfeição artística em sua pintura. Embora não fosse dado a teorias,
tentava explicar brevemente aos poucos admiradores o que gostaria de realizar. Uma das
observações atribuídas a ele é querer ser um "Poussin inspirado pela natureza".
Cézanne afirmou que os mestres clássicos, como Poussin, alcançaram um equilíbrio e
perfeição incríveis em suas obras. 'Et in Arcadia ego', de Poussin, é um exemplo de uma
pintura com uma beleza e harmonia impecáveis, onde as formas parecem se
complementar. Sentimos tudo em seu lugar, nada é casual ou vago. Cada forma se
destaca nitidamente e visualizamos como um corpo sólido e firme. O todo tem uma
simplicidade natural, de onde emana uma sensação de repouso e calma. Cézanne
buscava uma arte com algo dessa grandeza serena. Não acreditava que os métodos de
Poussin ainda funcionassem para essa finalidade. Os mestres antigos conseguiram esse
equilíbrio e solidez a um custo alto. Não se sentiam obrigados a respeitar a natureza
como a viam. Quadros são arranjos de forma aprendidas através do estudo da
antiguidade clássica. Até mesmo a sensação de espaço e solidez foi alcançada por eles
ao implementarem regras tradicionais, em vez de revisitar cada objeto representado.
Cézanne compartilhava da opinião de seus amigos impressionistas de que os métodos da
arte acadêmica eram contraproducentes à natureza. Admirava as novas descobertas no
campo da cor e modelação. Também queria pintar suas próprias impressões, as formas e
cores que via, não as aprendidas. Sentia-se inquieto sobre o rumo da pintura. Os
impressionistas eram mestres na pintura da "natureza". Seria isso suficiente? Onde
estava a busca pela harmonia, simplicidade e equilíbrio perfeitos que caracterizavam as
grandes pinturas do passado? A tarefa era pintar a partir da natureza, usando as
descobertas dos impressionistas e, ao mesmo tempo, recuperar o sentido de ordem e
necessidade que diferenciava a arte de Poussin. O problema em si não era novo para a
arte. Recordemos que a conquista da natureza e a invenção da perspectiva no
Quatrocento italiano ameaçaram a arte da pintura medieval e geraram um desafio que
somente a geração de Rafael poderia resolver. Agora, essa mesma questão se
apresentava em um plano distinto. A dissolução dos contornos firmes na luz e a
descoberta de sombras coloridas pelos impressionistas geraram um novo problema: como
preservar essas realizações sem perder a ordem e clareza? Em outras palavras, os
quadros impressionistas eram brilhantes, porém confusos. Cézanne não gostava da
confusão. No entanto, não queria seguir as convenções acadêmicas do desenho e
sombra para criar a ilusão de solidez, nem voltar às paisagens 'compostas' para obter
construções harmoniosas. Ele enfrentava uma questão ainda mais urgente ao considerar
o uso adequado da cor. Cézanne buscava cores fortes e intensas, assim como padrões
claros. Como nos lembramos, os artistas medievais também tinham essa preocupação.
(pp. No séc. XIV-XV, artistas não se sentiam obrigados a respeitar a realidade ao
satisfazer seus desejos artísticos. Porém, quando a arte voltou à observação da natureza,
cores puras e brilhantes deram lugar a tons suaves e misturas para sugerir luz e
atmosfera.
Os impressionistas abandonaram a mistura de pigmentos na paleta e passaram a aplicá-
los separadamente na tela com pequenas pinceladas, reproduzindo os reflexos oscilantes
de uma cena ao ar livre. Seus quadros eram mais brilhantes do que os de seus
predecessores, mas o resultado não satisfazia Cézanne. Ele buscava transmitir os tons
ricos e uniformes da natureza do sul, porém constatou que retornar à pintura de áreas
completamente com cores primárias comprometia a ilusão de realidade. Os quadros
pintados dessa forma se assemelham a padrões planos e não conseguem transmitir a
sensação de profundidade. Cézanne parecia contraditório. Queria ser fiel às suas
impressões da natureza, mas também transformar o impressionismo em algo duradouro,
como a arte dos museus. É surpreendente que ele sempre estivesse à beira do
desespero, trabalhando como escravo em sua tela e nunca deixando de experimentar. O
verdadeiro espanto é que Cézanne conseguiu realizar o impossível em suas telas. Se a
arte não fosse um cálculo, isso não seria possível; mas claramente não é. Esse equilíbrio
e harmonia que os artistas valorizam não têm relação com o equilíbrio mecânico. De
repente, acontece e ninguém sabe o porquê. Muito se escreveu sobre o segredo da arte
de Cézanne. Diversas explicações foram sugeridas sobre seus objetivos e realizações,
porém, essas explicações são incompletas e, às vezes, contraditórias. Apesar de nos
irritarmos com as críticas, os quadros sempre nos convencem. O melhor conselho é
sempre "vá ver os quadros no original". Nossas ilustrações devem transmitir a grandeza
do triunfo de Cézanne na paisagem do Mont Sainte-Victoire, no Sul da França. Banhada
em luz, a paisagem é firme e sólida. Este texto apresenta um padrão lúcido e cria a
impressão de grande profundidade e distância. Há ordem e repouso nas linhas horizontais
do viaduto e da estrada no centro, assim como nas linhas verticais da casa em primeiro
plano. No entanto, não percebemos que essa ordem foi imposta por Cézanne à natureza.
Suas pinceladas coincidem com as linhas do desenho, reforçando a harmonia natural.
Cézanne alterou a direção das pinceladas e não usou contornos para neutralizar o efeito
plano e enfatizar as rochas sólidas. Seu retrato da esposa mostra como suas formas
simples e bem delineadas contribuem para o equilíbrio e tranquilidade. Comparadas com
obras-primas mais calmas, as obras dos impressionistas, como o retrato de Monet por
Manet, parecem improvisações espirituosas. Existem pinturas de Cézanne de difícil
compreensão. Numa ilustração, uma natureza-morta pode não ser promissora.
Comparada ao tratamento seguro de um tema semelhante pelo mestre holandês Willem
Kalf, sua aparência é desgraciosa. A fruteira é mal desenhada e o pé não está no centro
do prato. A mesa está inclinada para os lados e também para a frente. O mestre holandês
se destacava na reprodução de superfícies macias e felpudas. Cézanne, por sua vez,
utiliza largas pinceladas coloridas para criar um efeito de guardanapo feito de folha de
estanho. As pinturas de Cézanne eram ridicularizadas no começo como patéticos borrões,
mas a razão é fácil de encontrar. Cézanne abandonou os métodos tradicionais de pintura,
começando do zero, como se nenhuma pintura tivesse sido feita antes dele. O mestre
holandês pintou sua natureza morta para exibir sua habilidade. Cézanne escolheu seus
motivos para estudar alguns problemas específicos que queria resolver. Ele tinha fascínio
pela relação entre cor e modelação, e escolhia um maçã brilhantemente colorido como
um motivo ideal para explorar essa questão. Ele queria um desenho equilibrado, então
esticou o prato para a esquerda e preencheu um espaço vazio. Cézanne se tornou o pai
da arte moderna ao estudar todas as formas espalhadas sobre a mesa, que foram
inclinadas para serem vistas. Em seu esforço para criar profundidade e cores vibrantes,
Cézanne estava disposto a sacrificar a correção convencional do lineamento. Ele não
tinha a intenção de distorcer a natureza, mas não se importava se houvesse alguma
distorção em detalhes menos importantes, desde que isso ajudasse a alcançar o efeito
desejado.
A invenção de Brunelleschi da perspectiva linear não o interessou muito. E ele a
descartou quando percebeu que estava atrapalhando seu trabalho. Essa perspectiva
científica foi criada para auxiliar pintores na criação da ilusão de espaço, como Masaccio
fez em seu fresco em Sta. Maria Novella. Cézanne não buscava criar ilusão, mas
transmitir solidez e profundidade sem usar desenho padrão. Ao perceber que essa
indiferença pelo 'desenho correto' desencadearia um movimento imparável em arte,
Cézanne lutava para conciliar os métodos do impressionismo com a necessidade de
ordem. Enquanto isso, Georges Seurat, um artista mais jovem (1859-91), encarava essa
questão quase como uma equação matemática. Partindo do impressionismo, estudou a
teoria científica da visão cromática e criou seus quadros com pinceladas de cor contínuas,
como um mosaico, para obter a mistura de cores no olho (ou cérebro) mantendo a
intensidade e luminosidade. A técnica extrema conhecida como pontilhismo pôs em perigo
a legibilidade das pinturas de Seurat. Ele evitou contornos e decompos cada forma em
áreas de pontos multicolores. Para compensar a complexidade de sua técnica, Seurat
simplificou as formas de maneira radical. Há algo egípcio na ênfase de Seurat em
verticais e horizontais, que o levou a afastar-se da reprodução fiel das aparências naturais
em favor da exploração de padrões expressivos.
No inverno de 1888, Vincent van Gogh trocou Paris pelo Sul da França em busca da
intensa luz e cor das regiões meridionais, enquanto Seurat e Cézanne estavam ocupados
em suas respectivas atividades artísticas. Van Gogh nasceu em 1853 em Groot-Zundert
(Holanda), filho de um vigário. Era religioso e trabalhou como pregador leigo na Inglaterra
e entre os mineiros belgas. Profundamente impressionado por Millet e sua arte social,
decidiu tornar-se pintor. Seu irmão mais novo, Theo, que trabalhava na loja de
marchetaria, o apresentou a pintores impressionistas. Esse irmão foi incrível. Mesmo
sendo pobre, sempre apoiou Vincent totalmente e financiou sua viagem para Arles, na
Provença. Vincent esperava trabalhar sem interrupções por alguns anos para vender suas
telas e retribuir seu irmão bondoso. Sozinho em Arles, ele registrava suas ideias e
esperanças em cartas para Theo, que funcionavam como um diário. Essas cartas, de um
artista humilde e autodidata, são emocionantes e empolgantes. Revelam a missão do
artista, suas lutas, triunfos, solidão e busca por companhia. Também mostram a intensa
tensão sob a qual ele trabalhou com energia frenética. Menos de um ano depois, em
dez/1888, sucumbiu e teve um acesso de loucura. Em mai/1889, foi internado num asilo
psiquiátrico, mas ainda tinha momentos lúcidos e continuou a pintar. A agonia durou 14
meses. Em julho de 1890, Van Gogh se suicidou - tinha 37 anos, assim como Rafael, e
sua carreira como pintor durou menos de 10 anos; os quadros pelos quais ele é famoso
foram pintados em um período de apenas três anos, cheios de crises e desespero.
Atualmente, muitas pessoas conhecem alguns quadros de Van Gogh, como os girassóis,
a cadeira vazia e retratos famosos, que se tornaram populares em reproduções coloridas
e estão presentes em diversas salas modestas, conforme o desejo do artista. Ele desejou
que suas telas tivessem o efeito das gravuras japonesas coloridas (pp. 416-17) que tanto
gostava. Buscava uma arte simples, despojada e acessível a todos, proporcionando
alegria e consolo a todos os seres humanos.
Não obstante, nenhuma reprodução é perfeita. As quadros mais baratas podem diminuir a
qualidade dos quadros de Van Gogh e às vezes cansar as pessoas. Ao ocorrer isso, é
revelador voltar às obras originais de Van Gogh e notar sua sutileza e intencionalidade em
seus impactos mais intensos. Ele assimilou as influências do impressionismo e do
pontilhismo de Seurat. Van Gogh gostava da técnica de pintar em pontos e pinceladas de
cor pura, porém, em suas mãos, ela se transformou em algo diferente do que os artistas
de Paris planejavam. Ele utilizava cada pincelada não apenas para espalhar a cor, mas
também para transmitir sua própria excitação. Na carta de Áries, descreve seu estado de
inspiração onde as emoções são tão fortes que trabalho inconscientemente. "as
pinceladas são coesas e coerentes, como palavras numa fala ou carta." Van Gogh pintava
como outros escrevem. Assim como o aspecto de uma página manuscrita revela algo dos
gestos de quem escreve, as pinceladas de Van Gogh também nos revelam algo sobre seu
estado mental. Antes dele, nenhum artista usou esse meio com tanta consistência e
efeito.
Em pintores como Tintoretto, Frans Hals e Manet, vemos um trabalho audacioso e solto
de pincel, demonstrando a mestria e a rápida percepção do artista. Já em Van Gogh, esse
estilo ajuda a transmitir a exaltação mental do artista. Ele pintava objetos e cenas que
permitiam total amplitude a esse novo meio. Podia desenhar ou pintar com seu pincel,
usando cores espessas como um escritor que destaca certas palavras. Por isso, ele foi o
primeiro a notar a beleza do restolho, cercas vivas, trigais, galhos descarnados das
oliveiras e formas escuras dos ciprestes. Os ciprestes eram esguios e pontiagudos como
labaredas. Van Gogh sentia impulso de pintar o sol e coisas simples, e também pintou
seus quartos em Arles. Explicou suas intenções ao irmão em uma carta. encurtar este
texto. Desta vez, meu quarto terá a cor como protagonista, trazendo um estilo impactante
aos objetos e sugestão de repouso. O objetivo é que contemplar o quadro seja relaxante
para o cérebro e a imaginação. As paredes são pálidas e violeta. O piso é de ladrilhos
vermelhos. A madeira da cama e as cadeiras são amarelo manteiga fresco, enquanto os
lençóis e almofadas são de um tom suave de limão esverdeado. A colcha é escarlate. A
janela verde, a mesa de toilette laranja e a bacia azul. Portas lilás, sem penumbra, sem
cortinas. As linhas amplas do mobiliário devem expressar repouso absoluto, com retratos
nas paredes, um espelho, uma toalha e roupas. A moldura será branca, pois não há
branco no quadro, como vingança pelo repouso forçado que fui obrigado a fazer. Vou
trabalhar nele o dia todo, porém a concepção é simples. As gradações e sombras foram
suprimidas, o quadro será pintado em camadas leves e planas de tinta, jogadas
livremente como nas gravuras japonesas. Encurtar este texto: Van Gogh usou cores e
formas para transmitir suas emoções. Não se importava com a "realidade
estereoscópica", reproduzindo a natureza de forma fotográfica. Exagerava e alterava a
aparência das coisas para atender ao seu objetivo. Assim, chegara a uma conjuntura
semelhante à de Cézanne ao abandonar a finalidade da pintura como imitação da
natureza. As razões de Cézanne para pintar uma natureza-morta foram explorar formas e
cores, usando apenas a perspectiva necessária para uma experiência específica. Van
Gogh buscava transmitir suas emoções em suas pinturas e, se necessário, recorria à
distorção para alcançar esse objetivo. Ambos concordavam em não desrespeitar os
padrões estabelecidos na arte. Eles não queriam chocar os críticos complacentes e não
se consideravam revolucionários. Na verdade, eles haviam quase desistido da esperança
de que alguém prestasse atenção em suas obras. Eles apenas continuavam a trabalhar
por obrigação.
Em 1888, no Sul da França, Paul Gauguin (1848-1903) se juntou a Van Gogh em Arles.
Gauguin não tinha humildade nem senso de missão, ao contrário de Van Gogh. Ao
contrário, era orgulhoso e ambicioso, mas tinha alguns pontos em comum com os dois.
Assim como Van Gogh, Gauguin também começou a pintar tarde na vida (sendo antes um
corretor de Bolsa bem-sucedido) e, como ele, era em grande parte autodidata. No
entanto, a amizade dos dois teve um final desastroso. Van Gogh agrediu Gauguin durante
um acesso de loucura e este fugiu para Paris. Dois anos depois, ocorreu o incidente.
Gauguin deixava a Europa e ia para o Taiti em busca de uma vida simples nas ilhas do
Pacífico. Ele acreditava que a arte poderia se tornar leviana e superficial, pois o
conhecimento europeu havia tirado dos homens a força e intensidade de sentimentos,
assim como um modo direto de expressá-los. Gauguin não foi o único artista com essas
preocupações sobre a civilização. Desde que os artistas se sentiram constrangidos em
relação ao "estilo", as convenções passaram a gerar desconfiança e a mera habilidade
causava impaciência. Eles ansiavam por uma arte sem truques que pudessem ser
aprendidos, por um estilo que fosse mais do que apenas estilo, mas algo intenso e
poderoso como a paixão humana. Delacroix foi ao Norte da África (Marrocos e Argélia)
em busca de cores mais intensas e de uma vida menos restrita. Os pré-rafaelitas na
Inglaterra esperavam encontrar essa orientação e simplicidade na arte da 'Era da Fé'. Os
impressionistas admiravam os japoneses, mas a arte deles era sofisticada em
comparação à intensidade e simplicidade que Gauguin buscava. No começo, estudou a
arte popular, mas não se manteve nela por muito tempo. Precisa deixar Europa e viver
entre nativos do Pacífico para se salvar. Suas obras de lá surpreenderam até antigos
amigos. Pareciam selvagens e primitivas. Era o desejo de Gauguin. Orgulhava-se de ser
chamado de 'bárbaro'. Até sua aparência deveria ser 'bárbara' para honrar os puros filhos
da natureza que ele aprendeu a admirar no Taiti. Ao considerar uma dessas leis
atualmente, talvez não consigamos recuperar essa mentalidade. Estamos acostumados a
uma "selvageria" muito maior na arte contemporânea. No entanto, é visível que Gauguin
trouxe uma nova essência em seus quadros, que não se limita apenas ao tema estranho
e exótico. Ele tentou compreender a perspectiva dos nativos, estudando seus métodos e
incorporando suas representações em suas obras. Esforçou-se por harmonizar com a arte
"primitiva" ao retratar nativos, simplificando contornos e usando grandes manchas de cor.
Ao contrário de Cézanne, ele não se importava com a aparência plana de suas pinturas,
focando em representar a intensidade pura dos elementos naturais. Ele nem sempre
alcançava plenamente seu objetivo de sinceridade e simplicidade. Mas seu anseio era tão
apaixonado quanto o de Cézanne por uma nova harmonia e o de Van Gogh por uma nova
mensagem; pois Gauguin também sacrificou sua vida pelo seu ideal. Sentiu-se
incompreendido na Europa e regressou às ilhas do Pacífico, onde morreu de doença e
privações após anos de solidão e desapontamento. Cézanne, Van Gogh e Gauguin foram
três solitários desesperados, incompreendidos. Os problemas de sua arte, sentidos por
artistas mais jovens, insatisfeitos com a habilidade das escolas de arte. Eles aprenderam
a representar a natureza, desenhar corretamente e usar tinta e pincel. Dominaram a
representação dos reflexos da luz do sol e das vibrações do ar, inspirados pelas lições da
Revolução Impressionista. Alguns artistas renomados seguiram nesse caminho e
defenderam esses novos métodos em países contrários ao impressionismo. Alguns
sentiram vazio ao reconhecer o princípio e garantir a vitória. Também notaram que algo
desapareceu da arte ao representar a natureza como realmente é, e tentaram recuperá-
lo. Cézanne achava que o sentido de ordem e equilíbrio se perdera; o impressionismo
negligenciou as formas duradouras da natureza. Van Gogh acreditava que ao render-se
às impressões visuais e explorar apenas as qualidades ópticas, a arte perdia intensidade
e paixão, que são necessárias para expressar sentimentos aos semelhantes. Gauguin
buscava simplicidade e autenticidade na vida e na arte, e pensava que poderia encontrá-
las entre os primitivos. A arte moderna surge da insatisfação e os três pintores têm
diferentes soluções que se tornam ideais para três movimentos: a solução de Cézanne
levou ao cubismo, a de Van Gogh ao expressionismo e a de Gauguin ao primitivismo.
Apesar de parecerem "loucos" inicialmente, esses movimentos foram tentativas
sistemáticas e consistentes para escapar de um beco sem saída dos artistas.

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