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Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 850.970 - DF (2006/0099647-2)

RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI


RECORRENTE : COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA TERRACAP
ADVOGADO : NOELMA DE ALMEIDA GOMES E OUTRO(S)
RECORRIDO : BENEDITA BANDEIRA COSTA
ADVOGADO : SERGIO FERREIRA VIANA
EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO


REIVINDICATÓRIA. OCUPAÇÃO IRREGULAR DE ÁREA
PÚBLICA. DIREITO DE INDENIZAÇÃO PELAS ACESSÕES.
INEXISTÊNCIA. PRECEDENTES.
1. A jurisprudência assentada no Superior Tribunal de Justiça considera
indevida a indenização por acessões construídas sobre área pública
irregularmente ocupada.
2. Recurso especial a que se dá provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a
Egrégia PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento
ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Arnaldo
Esteves Lima, Benedito Gonçalves (Presidente), Hamilton Carvalhido e Luiz Fux votaram com o
Sr. Ministro Relator.

Brasília, 1º de março de 2011

MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI


Relator

Documento: 1041500 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 11/03/2011 Página 1 de 4
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 850.970 - DF (2006/0099647-2)

RECORRENTE : COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA TERRACAP


ADVOGADO : NOELMA DE ALMEIDA GOMES E OUTRO(S)
RECORRIDO : BENEDITA BANDEIRA COSTA
ADVOGADO : SERGIO FERREIRA VIANA

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI (Relator):


Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e Territórios que, em ação reivindicatória imóvel público, negou provimento à apelação da
recorrente, decidindo, no que importa ao presente recurso, que, "se a Administração foi tolerante
por vários anos em relação à ocupação da área, tal fato enseja a obrigação de indenizar as
benfeitorias erigidas no imóvel pelos ocupantes de boa-fé" (fl. 188).
No recurso especial, fundado nas alíneas a e c do permissivo constitucional, a recorrente
aponta, além de dissídio jurisprudencial, ofensa aos seguintes dispositivos: (a) arts. 1200 e 1201 do
CC, alegando que (I) tratando-se de ocupação irregular de bem público, não há falar em boa-fé
hábil a embasar pretenso direito à indenização pelas benfeitorias construídas no local; (II) "a
mera tolerância da administração (...) não modifica a sorte jurídica da recorrida", pois,
tratando-se de terras públicas, "o tempo de ocupação, argumento do acórdão atacado, não tem o
poder de modificar a natureza do uso" (fl. 205); (b) arts. 1.255 do CC, porquanto "os ocupantes
irregulares devem arcar com o ônus de não serem ressarcidos por qualquer gasto realizado sobre
a coisa, uma vez já haver se locupletado com a ocupação empreendida sem qualquer
contraprestação ao Poder Público" (fl. 207); (c) art. 1219 do CC, pois, no caso, não há falar em
benfeitoria, já que a edificação erigida pelo recorrido caracteriza-se como mera acessão, não
havendo embasamento legal para qualquer indenização.
Houve contra-razões, pedindo o não-conhecimento do recurso, por ausência de
prequestionamento dos temas nele tratados, ou seu improvimento.
É o relatório.

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RECURSO ESPECIAL Nº 850.970 - DF (2006/0099647-2)

RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI


RECORRENTE : COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA TERRACAP
ADVOGADO : NOELMA DE ALMEIDA GOMES E OUTRO(S)
RECORRIDO : BENEDITA BANDEIRA COSTA
ADVOGADO : SERGIO FERREIRA VIANA

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO


REIVINDICATÓRIA. OCUPAÇÃO IRREGULAR DE ÁREA
PÚBLICA. DIREITO DE INDENIZAÇÃO PELAS ACESSÕES.
INEXISTÊNCIA. PRECEDENTES.
1. A jurisprudência assentada no Superior Tribunal de Justiça considera
indevida a indenização por acessões construídas sobre área pública
irregularmente ocupada.
2. Recurso especial a que se dá provimento.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI (Relator):


1. O acórdão recorrido enfrentou as matérias referentes aos dispositivos legais tidos por
violados (vejam-se as fls. 213/215 e 217), estando atendido, portanto, o requisito do
prequestionamento.

2. Questiona-se o direito dos demandados, ocupantes da área pública reivindicada, a indenização


do que o acórdão recorrido denomina de "benfeitorias erigidas no imóvel", assim consideradas as
moradias sobre ele construídas. O acórdão reconhece, expressamente, que "a posse dos réus é
injusta, pois não está fundada em título legítimo", mas afirma que "se a Administração foi
tolerante por vários anos em relação à ocupação da área, tal fato enseja a obrigação de indenizar
as benfeitorias erigidas no imóvel pelo ocupante de boa fé", sem o que haveria locupletamento
(fls. 214). Essa a questão.

3. A rigor, as moradias construídas sobre o imóvel não constituem propriamente "benfeitorias"


(art. 96 do CC), que são modificações ou acréscimos na coisa destinados a "mero deleite ou
recreio" (= as voluptuárias - § 1º), ou para aumentar ou facilitar seu uso (= as úteis - § 2º), ou que
têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore (= as necessárias - § 3º). Tratam-se,
tecnicamente, de "acessões" por construção (Código Civil, art. 1.248,V). Embora às vezes
confundidos ou equiparados, os conceitos são distintos e essa distinção entre benfeitoria e
acessão tem relevância jurídica, inclusive no que se refere à indenização (NADER, Paulo. Curso
de Direito Civil - Direito das Coisas, vol. 4, 2ª ed., Forense, p. 140).
Relativamente a essa espécie de acessão de que tratam os autos, produzidas em área pública,
quando o seu construtor não dispõe de justo título, há farta jurisprudência do STJ negando o
direito a indenização. É exemplo desse entendimento o REsp 945.055/DF, 2ª Turma, Min.
Herman Benjamin, DJ de 20/08/2009, com a seguinte ementa:

ADMINISTRATIVO. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA POR PARTICULARES.


CONSTRUÇÃO. BENFEITORIAS. INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
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1. Hipótese em que o Tribunal de Justiça reconheceu que a área ocupada pelos recorridos
é pública e não comporta posse, mas apenas mera detenção. No entanto, o acórdão
equiparou o detentor a possuidor de boa-fé, para fins de indenização pelas benfeitorias.
2. O legislador brasileiro, ao adotar a Teoria Objetiva de Ihering, definiu a posse como o
exercício de algum dos poderes inerentes à propriedade (art. 1.196 do CC).
3. O art. 1.219 do CC reconheceu o direito à indenização pelas benfeitorias úteis e
necessárias, no caso do possuidor de boa-fé, além do direito de retenção. O correlato
direito à indenização pelas construções é previsto no art. 1.255 do CC.
4. O particular jamais exerce poderes de propriedade (art. 1.196 do CC) sobre imóvel
público, impassível de usucapião (art. 183, § 3º, da CF). Não poderá, portanto, ser
considerado possuidor dessas áreas, senão mero detentor.
5. Essa impossibilidade, por si só, afasta a viabilidade de indenização por acessões ou
benfeitorias, pois não prescindem da posse de boa-fé (arts. 1.219 e 1.255 do CC).
Precedentes do STJ.
6. Os demais institutos civilistas que regem a matéria ratificam sua inaplicabilidade aos
imóveis públicos.
7. A indenização por benfeitorias prevista no art. 1.219 do CC implica direito à retenção do
imóvel, até que o valor seja pago pelo proprietário. Inadmissível que um particular retenha
imóvel público, sob qualquer fundamento, pois seria reconhecer, por via transversa, a posse
privada do bem coletivo, o que está em desarmonia com o Princípio da Indisponibilidade do
Patrimônio Público.
8. O art. 1.255 do CC, que prevê a indenização por construções, dispõe, em seu parágrafo
único, que o possuidor poderá adquirir a propriedade do imóvel se "a construção ou a
plantação exceder consideravelmente o valor do terreno". O dispositivo deixa cristalina a
inaplicabilidade do instituto aos bens da coletividade, já que o Direito Público não se
coaduna com prerrogativas de aquisição por particulares, exceto quando atendidos os
requisitos legais (desafetação, licitação etc.).
9. Finalmente, a indenização por benfeitorias ou acessões, ainda que fosse admitida no caso
de áreas públicas, pressupõe vantagem, advinda dessas intervenções, para o proprietário
(no caso, o Distrito Federal). Não é o que ocorre em caso de ocupação de áreas públicas.
10. Como regra, esses imóveis são construídos ao arrepio da legislação ambiental e
urbanística, o que impõe ao Poder Público o dever de demolição ou, no mínimo,
regularização. Seria incoerente impor à Administração a obrigação de indenizar por imóveis
irregularmente construídos que, além de não terem utilidade para o Poder Público,
ensejarão dispêndio de recursos do Erário para sua demolição.
11. Entender de modo diverso é atribuir à detenção efeitos próprios da posse, o que
enfraquece a dominialidade pública, destrói as premissas básicas do Princípio da Boa-Fé
Objetiva, estimula invasões e construções ilegais e legitima, com a garantia de indenização,
a apropriação privada do espaço público.
12. Recurso Especial provido.

Em seu voto, sustentou o Ministro relator:

"O legislador brasileiro, ao adotar a Teoria Objetiva de Ihering, definiu a posse como o
exercício de algum dos poderes inerentes à propriedade:

Art. 1.196 do CC. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício,

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pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.

O art. 1.219 do CC reconheceu o direito à indenização pelas benfeitorias úteis e necessárias,


no caso do possuidor de boa-fé, além do direito de retenção:

Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias


necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a
levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de
retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.

O correlato direito à indenização pelas construções é previsto no art. 1.255 do CC:

Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito
do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá
direito a indenização.
Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor
do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do
solo, mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo.

Ocorre que esses dispositivos são inaplicáveis aos imóveis públicos, que não admitem a posse
privada, mas apenas a mera detenção.
O art. 1.196 do CC, acima transcrito, define o possuidor como aquele que tem, de fato, o
exercício de algum dos poderes inerentes à propriedade.
Como é cediço, o particular jamais exerce poderes de propriedade, já que o imóvel público não
pode ser usucapido (art. 183, § 3º, da CF).
O particular, portanto, nunca poderá ser considerado possuidor de área pública, senão mero
detentor.
Essa constatação, por si somente, afasta a possibilidade de indenização por acessões ou
benfeitorias, pois não prescindem da posse de boa-fé (arts. 1.219 e 1.255 do CC).
Os demais institutos civilistas que regem tais indenizações ratificam essa impossibilidade.
De fato, a indenização por benfeitorias prevista no art. 1.219 do CC implica direito à retenção
do imóvel, até que o valor seja pago pelo proprietário.
Seria absurdo admitir que um particular retenha imóvel público, sob qualquer fundamento.
Isso seria reconhecer, por via transversa, a posse privada do bem coletivo, o que não se
coaduna com os Princípios da Indisponibilidade do Patrimônio Público e da Supremacia do
Interesse Público.
Ademais, o art. 1.255 do CC, que prevê a indenização por construções, dispõe, em seu
parágrafo único, que o possuidor poderá adquirir a propriedade do imóvel, se "a construção ou
a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno".
O dispositivo deixa absolutamente cristalina a inaplicabilidade do instituto às áreas públicas, já
que o Direito Público não se coaduna com prerrogativas de aquisição por particulares, exceto
quando preenchidos os requisitos legais (desafetação, licitação etc.).
Esta é a jurisprudência do STJ, que deve ser prestigiada:

PROCESSO CIVIL - ADMINISTRATIVO - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE


POSSE - IMÓVEL FUNCIONAL - OCUPAÇÃO IRREGULAR - INEXISTÊNCIA
DE POSSE - DIREITO DE RETENÇÃO E À INDENIZAÇÃO NÃO
CONFIGURADO - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - EFEITO INFRINGENTE -
VEDAÇÃO.
1. Embargos de declaração com nítida pretensão infringente. Acórdão que decidiu
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motivadamente a decisão tomada.
2. Posse é o direito reconhecido a quem se comporta como proprietário. Posse e
propriedade, portanto, são institutos que caminham juntos, não havendo de se
reconhecer a posse a quem, por proibição legal, não possa ser proprietário ou não
possa gozar de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.
3. A ocupação de área pública, quando irregular, não pode ser reconhecida como
posse, mas como mera detenção.
4. Se o direito de retenção ou de indenização pelas acessões realizadas depende da
configuração da posse, não se pode, ante a consideração da inexistência desta,
admitir o surgimento daqueles direitos, do que resulta na inexistência do dever de se
indenizar as benfeitorias úteis e necessárias.
5. Recurso não provido.
(REsp 863.939/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado
em 04/11/2008, DJe 24/11/2008)

Bem público. Ocupação indevida. Direito de retenção por benfeitorias. Precedentes


da Corte.
1. Configurada a ocupação indevida de bem público, não há falar em posse, mas em
mera detenção, de natureza precária, o que afasta o direito de retenção por
benfeitorias.
2. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 699374/DF, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO,
TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2007, DJ 18/06/2007 p. 257)

Finalmente, saliento que a indenização por benfeitorias ou acessões, ainda que fosse admitida
no caso de áreas públicas, pressupõe vantagem para o proprietário advindo dessas
intervenções (no caso, o Distrito Federal).
Não se desconhece que as casas e as benfeitorias têm grande valor para os recorridos. No
entanto, a necessidade e a utilidade que dão ensejo à indenização referem-se ao proprietário, à
valia desses bens para aquele a quem pertencerão.
Na clássica lição de Tito Fulgêncio, "o juiz da necessidade ou utilidade é o proprietário" (Da
Posse e das Ações Possessórias. Rio de Janeiro: Forense, 10ª edição, 2008, p. 158).
As benfeitorias não representam vantagem em favor do Poder Público quando há ocupação de
áreas públicas.
Como regra, esses imóveis são construídos ao arrepio da legislação ambiental e urbanística, o
que impõe ao Poder Público o dever de demolição ou, no mínimo, regularização.
Clovis Bevilaqua ensina que eventual indenização por benfeitorias não existe se o dano causado
pela ocupação for superior. Nas palavras do Mestre, "para que as benfeitorias necessárias e
úteis sejam indenizadas, é necessário: (...) que na compensação com os danos (Código Civil,
art. 518) excedam o valor dêstes" (Direito das Coisas – 1º vol., Rio de Janeiro: Freitas Bastos,
2ª ed., 1946, p. 105).
Seria incoerente impor à Administração a obrigação de indenizar por imóveis irregularmente
construídos que, além de não terem utilidade para o Poder Público, ensejarão dispêndio de
recursos do Erário para sua demolição.
A indenização, na hipótese, é devida pelo invasor, não pelo Poder Público.
Como visto, o acórdão do TJ, que determinou o pagamento de indenização e reconheceu o
direito de retenção por benfeitorias realizadas em área pública, não se harmoniza com a
jurisprudência do STJ e deve ser reformado.
Entender de modo diverso é atribuir à detenção efeitos próprios da posse, o que enfraquece a
dominialidade pública, destrói as premissas básicas do Princípio da Boa-Fé Objetiva, estimula
invasões e construções ilegais, e legitima, com a garantia de indenização, a apropriação privada
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do espaço público.
Eventual inércia ou tolerância da Administração não tem efeito de afastar ou distorcer a
aplicação da lei. Não fosse assim, os agentes públicos teriam, sob sua exclusiva vontade, o
poder de afastar normas legais cogentes, instituídas em observância e como garantia do
interesse da coletividade.
O imóvel público é indisponível, de modo que eventual omissão dos governos implica
responsabilidade de seus agentes, nunca vantagem de indivíduos às custas da coletividade.
Invasores de áreas públicas não podem ser considerados sócios ou beneficiários da omissão,
do descaso e da inércia daqueles que deveriam zelar pela integridade do patrimônio coletivo.
Saliente-se que o Estado pode – e deve – amparar aqueles que não têm casa própria, seja com
a construção de habitações dignas a preços módicos, seja com a doação pura e simples de
residência às pessoas que não podem por elas pagar. É para isso que existem as Políticas
Públicas de Habitação federais, estaduais e municipais. O que não se mostra razoável é torcer
as normas que regram a posse e a propriedade para atingir tais objetivos sociais e, com isso,
acabar por dar tratamento idêntico a todos os que se encontram na mesma situação de
ocupantes ilegais daquilo que pertence à comunidade e às gerações futuras – ricos e pobres.
Sim, porque, como é de conhecimento público, no Brasil, invasão de espaço público é prática
corriqueira em todas as classes sociais: estão aí as praças e vias públicas ocupadas por
construções ilegais de Shopping Centers, as Áreas de Preservação Permanente, inclusive no
Pantanal e em dunas, tomadas por residências de lazer, as margens de rios e lagos
abocanhadas por clubes, para citar alguns exemplos."

Nesse mesmo sentido:

PROCESSO CIVIL - ADMINISTRATIVO - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE -


IMÓVEL FUNCIONAL - OCUPAÇÃO IRREGULAR - INEXISTÊNCIA DE POSSE -
DIREITO DE RETENÇÃO E À INDENIZAÇÃO NÃO CONFIGURADO - EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO - EFEITO INFRINGENTE - VEDAÇÃO.
1. Embargos de declaração com nítida pretensão infringente. Acórdão que decidiu
motivadamente a decisão tomada.
2. Posse é o direito reconhecido a quem se comporta como proprietário. Posse e propriedade,
portanto, são institutos que caminham juntos, não havendo de se reconhecer a posse a quem,
por proibição legal, não possa ser proprietário ou não possa gozar de qualquer dos poderes
inerentes à propriedade.
3. A ocupação de área pública, quando irregular, não pode ser reconhecida como posse, mas
como mera detenção.
4. Se o direito de retenção ou de indenização pelas acessões realizadas depende da
configuração da posse, não se pode, ante a consideração da inexistência desta, admitir o
surgimento daqueles direitos, do que resulta na inexistência do dever de se indenizar as
benfeitorias úteis e necessárias.
5. Recurso não provido (REsp 863939/RJ, 2ª T., Min. Eliana Calmon, DJe 24/11/2008).

Seguindo a mesma orientação, ainda, os seguintes precedentes: REsp 1194487/RJ, 2ª T.,


Min. Mauro Campbell Marques, DJe 25/10/2010; REsp 699374/DF, 3ª T., Min. Carlos Alberto
Menezes Direito, DJ de 18/06/2007; REsp 788057/DF, 4ª T., Min. César Asfor Rocha, DJ de
23/10/2006; REsp 635980/PR, 1ª T., Min. José Delgado, DJ de 27/09/2004): REsp 401287/PE, 1ª
T., Min. José Delgado, DJ de 22/04/2002; REsp 245758/PE, 1ª T., Min. José Delgado, DJ
15/05/2000 .

Não tendo sido este o entendimento firmado no acórdão recorrido, merece, portanto, ser
reformado.
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4. Pelo exposto, dou provimento ao recurso especial para restabelecer a sentença. É o voto.

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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA TURMA

Número Registro: 2006/0099647-2 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 850.970 / DF

Número Origem: 20040110095704

PAUTA: 01/03/2011 JULGADO: 01/03/2011

Relator
Exmo. Sr. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro BENEDITO GONÇALVES
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO CARLOS FONSECA DA SILVA
Secretária
Bela. BÁRBARA AMORIM SOUSA CAMUÑA

AUTUAÇÃO
RECORRENTE : COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA TERRACAP
ADVOGADO : NOELMA DE ALMEIDA GOMES E OUTRO(S)
RECORRIDO : BENEDITA BANDEIRA COSTA
ADVOGADO : SERGIO FERREIRA VIANA

ASSUNTO: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Domínio


Público - Bens Públicos

CERTIDÃO
Certifico que a egrégia PRIMEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do
Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Benedito Gonçalves (Presidente), Hamilton
Carvalhido e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro Relator.

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