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Superior Tribunal de Justiça

AgInt nos EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 1.124.506 - RJ


(2013/0047974-0)

RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO


AGRAVANTE : PAULO WALDEMAR RIBEIRO FALCÃO - ESPÓLIO
REPR. POR : NÉLIA CAMPELLO FALCÃO - INVENTARIANTE
ADVOGADOS : PATRÍCIA FELIX TASSARA E OUTRO(S) - RJ066803
ANDRÉ MACEDO DE OLIVEIRA E OUTRO(S) - DF015014
AGRAVADO : FLÁVIO GODINHO
ADVOGADO : JOSÉ ANTÔNIO ROMERO PARENTE E OUTRO(S) - RJ013308
AGRAVADO : CONDOMÍNIO VALE DE SÃO FERNANDO E OUTRO
ADVOGADO : JOSÉ MAURO DE ARAÚJO MACHADO E OUTRO(S) - RJ018417
EMENTA

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM


RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE PROPRIEDADE E SERVIDÃO
DE ÁGUA. EXTINÇÃO DA SERVIDÃO. AUTOSSUFICIÊNCIA.
REGISTRO IMOBILIÁRIO. CANCELAMENTO. ACÓRDÃOS
COTEJADOS. FALTA DE SIMILITUDE FÁTICA.
INADMISSIBILIDADE DOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.
AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. É inviável o conhecimento dos embargos de divergência quando ausente
a similitude fática entre os arestos confrontados.
2. Os julgados cotejados partem de premissas fáticas distintas: o aresto
paradigma julga caso em que o imóvel dominante obteve autossuficiência
perene com o abastecimento público de água; o acórdão embargado
soluciona hipótese na qual a assinalada autossuficiência não se fez presente,
mas apenas "certo nível de autossuficiência" temporária.
3. O eventual uso meramente econômico da água mostra-se desimportante
para o deslinde da controvérsia, porquanto, para ambos os acórdãos, a
manutenção da servidão é justificada ou não em face da hipossuficiência do
prédio dominante em abastecer-se de água por meios próprios.
4. O tema da oponibilidade das restrições do direito de propriedade, ainda
que não registradas, foi analisado no acórdão embargado apenas de
maneira incidental e antecedente, sem negar sua principal razão, que é a de
servir de garantia ao terceiro de boa-fé.
5. Agravo interno a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas,


decide a Segunda Seção, por unanimidade, negar provimento ao agravo interno, nos termos do voto
do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo
Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Nancy Andrighi votaram
com o Sr. Ministro Relator. Impedido o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão. Presidiu o julgamento o Sr.
Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.
Brasília, 13 de fevereiro de 2019 (Data do Julgamento)

Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 1 de 5
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MINISTRO RAUL ARAÚJO
Relator

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Superior Tribunal de Justiça
AgInt nos EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 1.124.506 - RJ
(2013/0047974-0)

RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO


AGRAVANTE : PAULO WALDEMAR RIBEIRO FALCÃO - ESPÓLIO
REPR. POR : NÉLIA CAMPELLO FALCÃO - INVENTARIANTE
ADVOGADOS : PATRÍCIA FELIX TASSARA E OUTRO(S) - RJ066803
ANDRÉ MACEDO DE OLIVEIRA E OUTRO(S) - DF015014
AGRAVADO : FLÁVIO GODINHO
ADVOGADO : JOSÉ ANTÔNIO ROMERO PARENTE E OUTRO(S) - RJ013308
AGRAVADO : CONDOMÍNIO VALE DE SÃO FERNANDO E OUTRO
ADVOGADO : JOSÉ MAURO DE ARAÚJO MACHADO E OUTRO(S) - RJ018417

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO (Relator):

Cuida-se de agravo interno interposto por PAULO WALDEMAR RIBEIRO


FALCÃO - ESPÓLIO contra a decisão que, em virtude da ausência de similitude fática entre os
arestos confrontados (nas fls. 1.404/1.414), indeferiu os embargos de divergência por ele opostos
contra acórdão da eg. Terceira Turma desta Corte, assim ementado:

"PROCESSO CIVIL E DIREITO CIVIL. DIREITOS REAIS. SERVIDÃO DE


ÁGUA. ESTABELECIMENTO. CONDIÇÃO RESOLUTIVA. EXTINÇÃO
PELA AUTOSSUFICIÊNCIA EM CAPTAÇÃO DA ÁGUA PELO PRÉDIO
DOMINANTE, POR FONTE INDEPENDENTE.
AÇÃO PLEITEANDO O CUMPRIMENTO DA SERVIDÃO.
PROPOSITURA POR CONDOMÍNIO. LEGITIMIDADE.
LITISCONSÓRCIO ATIVO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. HIPÓTESE DE
LITISCONSÓRCIO ATIVO FACULTATIVO UNITÁRIO.
LITISCONSÓRCIO PASSIVO ENTRE O PRÉDIO SERVIENTE E A UNIÃO.
INEXISTÊNCIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
INEXISTÊNCIA. JULGAMENTO DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO
PELO TRIBUNAL LOCAL. CONSIDERAÇÃO DE QUE FOI
IMPLEMENTADA A CONDIÇÃO ESTABELECIDA PARA QUE SE
EXTINGUISSE A SERVIDÃO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ
OBJETIVA, EM SEU ASPECTO DE VEDAÇÃO DE COMPORTAMENTOS
CONTRADITÓRIOS. SUPRESSIO. EQUÍVOCO. IMPOSSIBILIDADE DE
RECONHECIMENTO INCIDENTAL DA INEFICÁCIA DO REGISTRO
PÚBLICO. NECESSIDADE DE AÇÃO AUTÔNOMA. PRINCÍPIO DA
BOA-FÉ OBJETIVA INAPLICÁVEL PARA GERAR A EXTINÇÃO DE UM
DIREITO, NA ESPÉCIE. DEVER DE COLABORAÇÃO ADIMPLIDO
PELOS TITULARES DO PRÉDIO DOMINANTE. NECESSIDADE DE
ÁGUA. BEM PÚBLICO ESSENCIAL À VIDA. PONDERAÇÃO DE
VALORES. IMPOSSIBILIDADE DE SE PRIVILEGIAR O USO
COMERCIAL DA ÁGUA EM DETRIMENTO DE SEU USO PARA O
ABASTECIMENTO DAS NECESSIDADES HUMANAS. RECURSO
Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 3 de 5
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ESPECIAIS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS.
1. É cabível a interposição de embargos de declaração por terceiro
interessado, para esclarecimento de acórdão que julgou recursos de
apelação. Hipótese em que o terceiro é titular de uma das unidades
integrantes do condomínio e o processo, ajuizado por esta entidade,
discutia o adimplemento de servidão de água instituída em favor dos
condôminos.
2. Não é possível considerar, como fez o Tribunal de origem, que para
ingressar no processo o proprietário teria de se valer do instituto da
oposição. Se o condomínio não tem personalidade jurídica de direito
civil, salvo para fins tributários, é incoerente dizer que ele possa ostentar
um direito em oposição ao direito dos condôminos, notadamente quando
se fala de direito real de servidão que, por determinação expressa de lei,
é bem indivisível.
3. O condomínio está legitimado, por disposição de lei taxativa, a
representar em juízo os condôminos quanto aos interesses comuns. O
adimplemento da servidão de água, conquanto seja direito de cada
condômino, representa interesse comum de todos, de modo que é
adequada a propositura, por ele, de ação para discutir a matéria.
4. Qualquer dos titulares de direito indivisível está legitimado a pleitear,
em juízo, o respectivo adimplemento. Não há, nessas hipóteses,
litisconsórcio ativo necessário. Há, em lugar disso, litisconsórcio ativo
facultativo unitário, consoante defende renomada doutrina. Nessas
hipóteses, a produção de efeitos pela sentença se dá secundum eventum
litis: somente os efeitos benéficos, por força de lei, estendem-se aos
demais titulares do direito indivisível. Eventual julgamento de
improcedência só os atinge se eles tiverem integrado, como litisconsortes,
a relação jurídica processual.
5. Conquanto a água seja, por disposição de lei, considerada bem
público, não há litisconsórcio necessário passivo entre o proprietário do
terreno serviente e a União em uma ação que pleiteie o adimplemento de
uma servidão de água, por vários motivos: (i) primeiro, porque a União
pode delegar a Estados e Municípios a competência para outorga de
direito à exploração da água; (ii) segundo, porque não é necessária tal
outorga em todas as situações, sendo possível explorar a água para a
satisfação de pequenos núcleos populacionais independentemente dela.
Assim, numa ação que discuta a utilização da água, a União não é
litisconsorte passiva necessário podendo, quando muito, ostentar
interesse jurídico na solução da lide, nela ingressando na qualidade de
assistente.
6. Sendo de mera assistência a hipótese, não é possível ao juízo estadual
declinar de sua competência para julgar a causa sem que a União tenha,
em algum momento, manifestado interesse de participar do processo. Sem
tal manifestação, o processo deve tramitar normalmente perante a Justiça
Comum.
7. Não é possível ao juízo negar cumprimento a uma servidão
estabelecida em registro público, com fundamento na invalidade ou na
caducidade desse registro, se não há uma ação proposta para esse fim

Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 4 de 5
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específico pelo titular do prédio serviente. O que motiva a existência de
registros públicos é a necessidade de conferir a terceiros segurança
jurídica quanto às relações neles refletidas.
Para que se repute ineficaz a servidão, é preciso que seja retificado o
registro, e tal retificação somente pode ser requerida em ação na qual
figurem, no pólo passivo, todos os proprietários dos terrenos nos quais tal
servidão se desmembrou, notadamente considerando a indivisibilidade
desse direito real.
8. Não obstante, a lei é expressa em reputar a água bem essencial à vida.
Se há escassez no condomínio que fora beneficiado pela servidão, não é
possível, em ponderação de valores, privilegiar o uso comercial da água,
pelo titular do prédio serviente, em detrimento de seu uso para o
abastecimento humano.
9. A falta de requerimento de implementação da servidão por anos após
firmado o contrato indica que o condomínio cumpriu com seu dever de
colaboração, buscando seu abastecimento por fontes autônomas. Uma vez
constatada a insuficiência dessas fontes, contudo, não se pode reputar
caduca a servidão com fundamento no instituto da supressio. O princípio
da boa-fé objetiva não pode atuar contrariamente a quem colaborou para
o melhor encaminhamento da relação jurídica de direito material.
10. Se não há intuito protelatório na interposição de embargos de
declaração, é imperativo o afastamento da multa fixada pelo art. 538 do
CPC.
11. Recursos especiais conhecidos e parcialmente providos."
(REsp 1.124.506/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA
TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe de 14/11/2012)

O embargante sustentou, de início, que o acórdão embargado, ao, alegadamente,


refutar a tese de que "a obtenção de água por outros meios acarreta a extinção da servidão de
água" (na fl. 1.212), diverge do entendimento firmado pela eg. Quarta Turma desta Corte, no
julgamento de recurso especial que ostenta a seguinte ementa:

PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DE VIZINHANÇA. RECURSO


ESPECIAL. USO DE ÁGUA DE NASCENTE DE OUTRO PRÉDIO.
APRECIAÇÃO DE VIOLAÇÃO A DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL.
INVIABILIDADE. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE.
INEXISTÊNCIA. ARTIGO 515, § 3º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
JULGAMENTO DO MÉRITO DA CAUSA PELO TRIBUNAL, CASO
TENHA SIDO PROPICIADO O CONTRADITÓRIO E A AMPLA DEFESA,
COM REGULAR E COMPLETA INSTRUÇÃO DO PROCESSO.
POSSIBILIDADE. ACORDO, HOMOLOGADO EM JUÍZO PARA
SOLUCIONAR CONFLITO, PREVENDO O USO DA ÁGUA DE PRÉDIO
DE VIZINHO, NOS MOLDES DO DISPOSTO NO CÓDIGO DE ÁGUAS.
DESCONSTITUIÇÃO DO ACORDO, TENDO EM VISTA O ULTERIOR
FORNECIMENTO DE ÁGUA NA LOCALIDADE POR CONCESSIONÁRIA
Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 5 de 5
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DE SERVIÇO PÚBLICO. POSSIBILIDADE.
RESTRIÇÃO AO DIREITO DE PROPRIEDADE PELO EXERCÍCIO DE
DIREITO DE VIZINHANÇA DE CARÁTER PRECÁRIO. USUCAPIÃO.
DESCABIMENTO.
1. Embora seja dever de todo magistrado velar a Constituição Federal,
para que se evite supressão de competência do egrégio STF, não se
admite apreciação, em sede de recurso especial, de matéria
constitucional.
2. A interpretação do artigo 515, § 3º, do Código de Processo Civil deve
ser realizada de forma sistemática, tomando em consideração o artigo
330, I, do mesmo Diploma. Com efeito, o Tribunal, caso propiciado o
contraditório e a ampla defesa, com regular e completa instrução do
processo, deve julgar o mérito da causa, mesmo que para tanto seja
necessária apreciação do acervo probatório.
3. A presente ação proposta é adequada à desconstituição do acordo
homologado por sentença, pois o artigo 486 do Código de Processo Civil
prevê que "[o]s atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que
esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos
jurídicos em geral, nos termos da lei civil".
4. O convencionado no acordo homologado em Juízo não desborda da
mera limitação ao direito de propriedade prevista no Código de Águas,
portanto é descabido cogitar-se em usucapião, pois somente "coisa hábil,
possível de apropriação e que seja do domínio privado", é que pode ser
adquirida por usucapião.
5. Embora os artigos 34 e 35 do Código de Águas prevejam o direito a
utilização de água de nascente de prédio vizinho "para as primeiras
necessidades da vida", o artigo 35, § 2º, do mesmo Diploma dispõe que o
direito ao uso das águas não prescreve, mas cessa logo que as pessoas a
quem ele é concedido possam haver, sem grande dificuldade ou
incômodo, a água de que carecem, por isso não merece acolhida a
irresignação, pois, com o fornecimento público de água, não mais subsiste
o direito da recorrente de haver água da nascente, esta situada no prédio
da autora.
6. Recurso especial parcialmente conhecido e, na extensão, não provido.
(REsp 1.179.450/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO,
QUARTA TURMA, DJe de 28/05/2012)

Defendeu que, no acórdão paradigma, a eg Quarta Turma, "corretamente, entendeu


que, com o abastecimento de água do prédio dominante por outros meios que não a servidão,
'não mais subsiste o direito [do prédio dominante] de haver água da nascente situada no
prédio da autora [serviente]', pois o art. 35, §2°, do Código de Águas dispõe que o direito ao
uso das águas cessa logo que as pessoas a quem ele é concedido possam haver, sem grande
dificuldade ou incômodo, a água de que carecem", mas que, todavia, no acórdão embargado, a
eg. Terceira Turma, "apesar de ter reconhecido que o prédio dominante atingiu

Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 6 de 5
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auto-suficiência de água durante vários anos, entendeu que o uso 'para as primeiras
necessidades da vida humana" que o Condomínio supostamente faria da água - e que se
demonstrou não ser o caso das mansões que o integram - prevaleceria sobre o uso comercial
que o Embargante pretende fazer" (grifou-se, na fl. 1.231).
Nesse passo, alegou que, "percebe-se que, não obstante tenha o imóvel
dominante, em ambos os casos, obtido água por meios próprios, sem necessidade de fazer uso
da servidão, no acórdão embargado não se admitiu a extinção da servidão quando o imóvel
dominante obteve autossuficiência em seu abastecimento, enquanto que no acórdão
paradigma a servidão foi extinta quando isso ocorreu" (na fl. 1.214).
Aduziu, ainda, que o aresto embargado "partiu da premissa evidentemente
equivocada de que a água proveniente da servidão seria usada pelo Condomínio e pelos
condôminos para atender às primeiras necessidades da vida humana, sem que haja nos autos
qualquer prova ou mesmo indício do uso que o Condomínio e seus condôminos dariam à
água proveniente da servidão" (na fl. 1.217) e que, assim, "considerando ainda que nem mesmo
os ora Embargados alegaram que a água proveniente da servidão seria usada para 'as
primeiras necessidades da vida' torna-se ainda mais evidente que a eg. 3ª Turma cometeu um
equivoco ao ressuscitar a servidão por considerar que 'as primeiras necessidades da vida'
prevaleceriam sobre o direito de propriedade do Embargante" (grifou-se, na fl. 1.219).
Noutro passo, alegou divergência com relação aos efeitos do registro imobiliário em
face de terceiro de má-fé com precedente da eg. Quarta Turma, assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. CÓDIGO CIVIL DE 1916. CONTRATO


PARTICULAR DE PERMUTA DE IMÓVEL. PACTO COMISSÓRIO.
CLÁUSULA RESOLUTIVA NÃO CONSTANTE DE REGISTRO
IMOBILIÁRIO. INADIMPLEMENTO. PARALISAÇÃO DA CONSTRUÇÃO.
CONTRATO DE COMPRA E VENDA POSTERIORMENTE CELEBRADO
PELA CONSTRUTORA. TERCEIRO QUE CONHECIA AS PENDÊNCIAS
REFERENTES AO IMÓVEL. PRESUNÇÃO RELATIVA DO DOMÍNIO.
RECURSO DESPROVIDO.
1. Tem-se ação ajuizada com o escopo principal de: (I) resolver o
contrato particular de permuta de imóvel celebrado entre as construtoras
e a promovente, então proprietária, tendo em vista as consequências do
inadimplemento contratual previstas em cláusula do próprio contrato
particular; e (II) anular a compra e venda posterior, celebrada entre
aquelas construtoras e terceiro, a ora recorrente, tendo em vista dolo das
partes, além dos consequentes pedidos de embargo da obra e de sua
demolição e de condenação ao pagamento de multa contratual, perdas e
danos e lucros cessantes.
Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 7 de 5
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2. O lapso decadencial do § 8º do art. 178 do CC/1916 não é aplicável à
espécie, porquanto tal prazo trienal está vinculado à retrovenda (art.
1.141 do mesmo Codex), do que não cuida a hipótese em exame.
3. É aplicável o prazo também decadencial previsto na alínea b do inciso
V do § 9º do art. 178 do CC/1916, cujo termo inicial é a data de
caracterização do dolo, sendo irrelevante, no caso dos autos, se este se
deu com a celebração do contrato de compra e venda a ser anulado ou
com o registro imobiliário dessa escritura, pois, em qualquer dessas
hipóteses, não houve o transcurso de quatro anos.
4. As instâncias ordinárias concluíram que a recorrente tinha
conhecimento das pendências que tocavam ao imóvel, com base na
análise tanto do acervo fático-probatório dos autos como das
circunstâncias do caso concreto e das afirmações feitas nas contestações
apresentadas pelas construtoras-rés. Então, ainda que acolhida eventual
ofensa ao art. 302, III, do CPC, o exame do recurso especial esbarraria
no óbice da Súmula 7/STJ.
5. O pacto comissório (CC/1916, art. 1.163) assegura ao vendedor o
desfazimento da venda, quando o comprador deixar de efetuar o
pagamento na data convencionada. Entretanto, se a condição resolutiva
não constar do registro imobiliário, a resolução do contrato não opera
efeitos em relação a terceiros de boa-fé.
6. Todavia, se terceiro adquirente de imóvel vinculado à condição
resolutiva em outro contrato, conhecia, de alguma forma, a restrição
imposta pelo pacto comissório, adjeto ao anterior contrato de compra e
venda ou de permuta, agindo, assim, de maneira temerária ou de má-fé
na aquisição do bem, não poderá alegar em seu favor haver presunção
absoluta do domínio constante de registro imobiliário.
7. A presunção de veracidade dos registros imobiliários não é absoluta,
mas juris tantum, admitindo prova em contrário.
8. Recurso especial a que se nega provimento.
(REsp 664.523/CE, desta relatoria, DJe de 14/08/2012)

Dessarte, assegurou que o acórdão embargado "também afirmou que a servidão só


poderia ser extinta se o Embargante ajuizasse ação judicial em face 'de cada um dos
proprietários dos imóveis dominantes, em litisconsórcio passivo necessário' (são mais de 60
condôminos), para requerer o cancelamento do registro da servidão em razão do implemento
da condição resolutiva, pois somente dessa maneira se poderia resguardar que eventual
terceiro adquirente de unidade, do condomínio tivesse ciência da extinção da servidão",
divergindo do entendimento adotado pelo aresto paradigma, que "entendeu que o terceiro que
tenha agido com má-fé ou de modo temerário se submete às restrições impostas ao imóvel
ainda que tais restrições não tenham sido levadas a registro" (grifou-se, na fl. 1.222).
Logo, concluiu que "o entendimento a que chegou a E. 4ª Turma - segundo a
qual o terceiro que age de má-fé ou de forma temerária na aquisição de imóvel deve suportar
Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 8 de 5
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todas as restrições impostas ao imóvel, ainda que não averbadas no registro - é que deveria
ter sido empregado pela E. 3ª Turma ao presente caso, pois se revela o correto", e que, "se
esse entendimento da 4ª Turma fosse aplicado ao presente caso, a 3ª Turma teria dado
solução diversa à controvérsia, pois se chegaria à conclusão de que a servidão aqui
discutida pode, sim, ser declarada extinta na presente demanda, e seus efeitos se estenderiam
a todos os imóveis situados no condomínio" (grifou-se, na fl. 1.225).
Assim, requereu o conhecimento e provimento dos embargos de divergência para
fazer prevalecer o entendimento adotado no acórdão paradigma.
Inicialmente distribuídos no âmbito da col. Corte Especial, os embargos de
divergência foram indeferidos liminarmente e redistribuídos perante a eg. Segunda Seção para a
análise da divergência remanescente.
A decisão agravada (nas fls. 1.404/1.414) indeferiu os embargos de divergência em
virtude da ausência de similitude fática entre os arestos confrontados.
O agravante sustenta que "as questões acima foram apreciadas no v. acórdão
embargado, ainda que no voto vencido proferido pelo MM. Ministro Villas Bôas Cueva (fls.
e-STJ 1.146/1.159), merecendo reforma a r. decisão agravada, a fim de que as divergências
suscitadas pelo agravante sejam detidamente apreciadas pela Egrégia 2ª Seção do Superior
Tribunal de Justiça" (na fl. 1.421).
Nesse passo, salienta que, "conforme se depreende do voto vencido do Ilmo.
Ministro Villas Bôas Cueva, a auto-suficiência de abastecimento de água do condomínio e a
implementação da condição resolutiva foram, sim, temas enfrentados pelo v. acórdão
embargado" e "também constou do voto da Ministra Relatora Nancy Andrighi" (na fl. 1.164).
Na mesma toada, assegura que "também constou da r. decisão agravada que (i)
os efeitos do registro imobiliário, (ii) a destinação da água objeto da servidão e (iii) a
presunção de um terceiro adquirente dos imóveis do CONDOMÍNIO não teriam sido
debatidos no v. acórdão embargado. No entanto, mais uma vez, os temas restaram
expressamente consignados no da Ilma. Ministra Relatora Nancy Andrighi e no voto vencido
do Ilmo. Ministro Villas Bôas Cueva" (na fl. 1.423).
Requer o conhecimento e provimento do agravo interno, fazendo prevalecer o
entendimento exposto no acórdão paradigma.

Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 9 de 5
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Intimada, a parte agravada apresentou impugnação (nas fls. 1.432/1.437).
É o relatório.

Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 10 de 5
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VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO (Relator):

A decisão agravada (nas fls. 1.404/1.414), ao indeferir os embargos de divergência


em virtude da ausência de similitude fática entre os arestos confrontados, salientou que:
a) os julgados cotejados partem de premissas fáticas distintas: o aresto paradigma
julga caso em que o imóvel dominante obteve autossuficiência no abastecimento de água, que
passou a ter fornecimento público, enquanto o acórdão embargado soluciona hipótese na qual a
assinalada autossuficiência não foi transitória, temporária;
b) os temas relativos ao uso de água para subsistência, para o atendimento das
primeiras necessidades da vida ou para comércio, não foram decididos no aresto paradigma e foram
analisados pelo acórdão embargado tão somente como reforço de argumentação, em especial para
dar relevo à necessidade de manutenção da servidão em face da escassez de água;
c) tanto o acórdão paradigma quanto o aresto embargado, apesar de breve menção,
não decidiram a matéria relativa ao implemento de condição resolutiva, máxime com o sentido
pretendido pelo embargante; e
d) o tema concernente à possibilidade de oposição de restrições do direito de
propriedade, ainda que não levadas a registro, contra terceiro de má-fé ou em atuação
temerária, não foi decidido no acórdão embargado, tampouco pelo acórdão proferido pelo eg.
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, destacando-se que a má-fé depende de
comprovação cabal e a boa-fé é presumida.
Alega o embargante que, embora ambos os acórdãos confrontados reconheçam que
o imóvel dominante obteve autossuficiência no abastecimento de água, por meios próprios, portanto

Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 11 de 5
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sem necessidade de fazer uso da servidão, o aresto paradigma admitiu a extinção da servidão e o
acórdão embargado, em evidente divergência jurisprudencial, negou o perecimento do direito (na fl.
1.214).
Não lhe assiste razão, contudo, porque, se é certo que, no caso do aresto paradigma,
a autossuficiência de água foi tida como fato incontroverso, em razão do adequado fornecimento
público, na hipótese do acórdão embargado foi constatado que o prédio dominante obteve água por
meios diversos que não a servidão apenas de modo temporário, tanto que destacou que "a escassez
de água do condomínio não é negada pelo acórdão recorrido, que apenas ponderou que, por
um determinado período de tempo, este conseguiu atingir certo nível de autossuficiência"
(grifou-se, na fl. 1.143).
A propósito, confiram-se os seguintes excertos dos arestos paradigma e embargado,
respectivamente:

"Como o artigo 35, § 2º, do Código de Águas, dispõe que o direito do uso
das águas não prescreve, mas cessa logo que as pessoas a quem ele é
concedido possam haver, sem grande dificuldade ou incômodo, a água
de que carecem, não merece acolhida a irresignação" e que, diante do
incontroverso fornecimento público de água, não mais subsiste o direito
da recorrente de haver água da nascente situada no prédio da autora
que, por outro lado, conforme a moldura fática, necessita de toda água
da nascente para que possa expandir seu rebanho, resultando em melhor
aproveitamento econômico de sua propriedade" (grifou-se, na fl. 1.260).
"A escassez de água do condomínio não é negada pelo acórdão recorrido,
que apenas ponderou que, por um determinado período de tempo, este
conseguiu atingir certo nível de autossuficiência. Ora, se não se nega a
escassez, como negar o acesso à água? Não há uma menção sequer no
acórdão recorrido à circunstância de que o condomínio pretenda se
valer da servidão para qualquer outro fim, que não seja o de se
abastecer. Não se cogita que o condomínio queira comercializar a água,
em vez de simplesmente utilizá-la para consumo humano. Não há,
portanto, sentido em que se lhe negue o exercício desse direito essencial"
(grifou-se, nas fls. 1.143/1.144).

Logo, inexiste a alegada divergência de teses, pois os julgados cotejados partem de


premissas fáticas distintas e chegam a conclusões semelhantes: o aresto paradigma julga caso em
que o imóvel dominante obteve autossuficiência no abastecimento de água; e o acórdão embargado
soluciona hipótese na qual a assinalada autossuficiência não se faz presente, mas apenas "certo
nível de autossuficiência" temporária.
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Por via de consequência, o dissídio também não se aperfeiçoa no tocante ao alegado
implemento de condição resolutiva, pois, como visto acima, o acórdão embargado, ao contrário do
aresto paradigma, expressamente afasta sua ocorrência.
Também carece de viabilidade a alegação do embargante de que o aresto
embargado "partiu da premissa evidentemente equivocada de que a água proveniente da
servidão seria usada pelo Condomínio e pelos condôminos para atender às primeiras
necessidades da vida humana" (na fl. 1.217), porquanto eventual uso diverso da água pelo
condomínio não foi enfrentado pelo aresto embargado como questão principal, tampouco pelo eg.
Tribunal a quo.
Com efeito, a eg. Terceira Turma salientou que a matéria não foi prequestionada no
acórdão recorrido, usando essa evidência como reforço de argumentação para dar relevo à
necessidade de manutenção da servidão em face da escassez de água. Confira-se:

"Não há uma menção sequer no acórdão recorrido à circunstância de que


o condomínio pretenda se valer da servidão para qualquer outro fim, que
não seja o de se abastecer. Não se cogita que o condomínio queira
comercializar a água, em vez de simplesmente utiliza-la para consumo
humano. Não há, portanto, sentido em que se lhe negue o exercício desse
direito essencial.
No confronto entre a necessidade de água para subsisistência e a
necessidade de água para comércio, é evidente que privilegiar o comércio
ofende os arts. 1º, III, da Lei 9.433/97 e 71, §3º, do Código de Águas. As
necessidades do condomínio, garantidas por contrato de servidão
registrado, devem ser atendidas com urgência" (grifou-se, nas fls.
1.143/1.144).

Ademais, o eventual uso meramente econômico da água mostra-se desimportante


para o deslinde da controvérsia, porque, para ambos os acórdãos, a manutenção da servidão é
justificada ou não em face da hipossuficiência do prédio dominante em abastecer-se de água por
meios próprios.
Em outro norte, o embargante sustenta que o acórdão embargado "também afirmou
que a servidão só poderia ser extinta se o Embargante ajuizasse ação judicial em face 'de
cada um dos proprietários dos imóveis dominantes, em litisconsórcio passivo necessário' (são
mais de 60 condôminos), para requerer o cancelamento do registro da servidão em razão do
implemento da condição resolutiva, pois somente dessa maneira se poderia resguardar que
eventual terceiro adquirente de unidade, do condomínio tivesse ciência da extinção da

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servidão", divergindo do entendimento adotado pelo aresto paradigma (REsp 664.523/CE), que
"entendeu que o terceiro que tenha agido com má-fé ou de modo temerário se submete às
restrições impostas ao imóvel ainda que tais restrições não tenham sido levadas a registro"
(grifou-se, na fl. 1.222).
Não lhe assiste razão, mais uma vez, pois o tema da oponibilidade das restrições do
direito de propriedade, ainda que não levadas a registro, contra terceiro de má-fé, não foi decidido
no acórdão embargado da maneira como exposto nos presentes embargos.
De fato, o aresto embargado salienta, de início, que o desmembramento da área em
favor da qual a servidão foi constituída provocou a criação de matrículas autônomas para cada
imóvel e que, desse modo, a servidão também foi regularmente registrada em cada uma delas (nas
fls. 1.140/1.141).
Nessa esteira, defendeu o aresto embargado que o cancelamento da servidão
regularmente registrada na matrícula de cada um dos imóveis integrantes do condomínio deveria ser
objeto de ação "proposta pelo proprietário do prédio serviente em face de cada um dos
proprietários dos imóveis dominantes, em litisconsórcio passivo necessário", mas não poderia
ser decidida incidentalmente no presente processo, em que "não há a participação de todos,
como já amplamente abordado nesta decisão" (grifou-se, nas fls. 1.140 e 1.141).
Justificou seu entendimento afirmando que outro caminho traria "insegurança para
o eventual terceiro que porventura decidisse adquirir algum dos imóveis com registro da
servidão permaneceria, já que ele não terá ciência do grande risco de se ver impossibilitado
de exercer esse direito real, no futuro" (grifou-se, na fl. 1.140).
A propósito, confira-se o trecho do aresto embargado que analisa a questão:

"No processo ora em julgamento, há uma servidão regularmente


registrada na matrícula dos imóveis integrantes do condomínio autor,
conferindo aos titulares o direito real de usufruir da água, nos termos do
respectivo contrato. Tal registro é válido e não foi, até este momento,
objeto de um pedido de anulação ou de cancelamento, pela via principal.
A pergunta que se deve fazer, portanto, é: É possível negar eficácia a esse
registro, criativo de direito real de servidão, sem o respectivo
cancelamento?
A questão é tortuosa. Via de regra, a nulidade de um contrato ou a
caducidade de um direito podem ser reconhecidas pela via incidental, se
alegadas em matéria de defesa, sem necessidade de propositura de ação
própria.
Contudo, esse raciocínio não pode ser estendido à hipótese presente.
Quando se trata de direito real, que pela peculiar característica de ser
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oponível contra todos necessita de registro em órgão público, o
reconhecimento da respectiva caducidade deve trazer, como consequência,
a anulação ou modificação do respectivo registro, sob pena de profunda
insegurança jurídica. Basta pensar que um terceiro, desconhecendo o fato
de a servidão ter sido reputada insubsistente pelo Poder Judiciário, pode
perfeitamente adquirir, por alto preço, um imóvel sob a crença de poder
contar com a parcela de água garantida pelo contrato de servidão
registrado. É justamente para a proteção da boa-fé e da segurança
jurídica que o registro público existe.
Pode-se argumentar, em oposição a esse raciocínio, que a sentença
proferida nesta ação seria passível de apresentação ao registro público
para cancelamento da servidão, resolvendo-se, com isso, a insegurança
jurídica apontada acima. Mas na hipótese dos autos isso não poderia ser
feito. Como já dito, do desmembramento da área em favor da qual a
servidão foi constituída decorreu a criação de matrículas autônomas para
cada imóvel, fazendo-se constar dessas matrículas, individualmente, o
direito à servidão. Nessas circunstâncias, uma ação que pleiteasse o
cancelamento desse registro, para ser eficaz, deveria ter sido proposta pelo
proprietário do prédio serviente em face de cada um dos proprietários dos
imóveis dominantes, em litisconsórcio passivo necessário. Neste processo
não há a participação de todos, como já amplamente abordado nesta
decisão.
Também poderia ser argumentado, ainda para justificar o caminho
trilhado pelo acórdão recorrido, que a improcedência da ação produz
efeitos apenas perante o condomínio, não prejudicando os proprietários
individuais (coisa julgada secundum eventum litis formada nas causas em
que há litisconsórcio ativo facultativo unitário). Assim, o direito à servidão
poderia ser denegado ao condomínio e cada condômino poderia procurar,
por via individual, garantir esse mesmo direito, até que o titular do prédio
serviente decidisse propor uma ação em face de todos, pleiteando o
cancelamento da servidão.
Essa solução, contudo, também não seria adequada. Em primeiro lugar, a
insegurança para o eventual terceiro que porventura decidisse adquirir
algum dos imóveis com registro da servidão permaneceria, já que ele não
terá ciência do grande risco de se ver impossibilitado de exercer esse
direito real, no futuro. Vale lembrar, neste ponto, que ainda que a coisa
julgada não prejudique o direito de terceiros, a sentença aqui proferida
produziria significativa influência em eventuais ações futuras. Em segundo
lugar, se permitisse que a servidão fosse discutida em cada processo,
individualmente, o judiciário estaria a incentivar a multiplicação de ações
judiciais, em lugar de fomentar a sua concentração." (grifou-se, nas fls.
1.140/1.141).

Desse modo, verifica-se que o acórdão embargado não divergiu do entendimento


adotado pelo aresto paradigma, pois não afirmou que o terceiro de má-fé não se submete às
restrições do direito de propriedade, ainda que não registradas.

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Superior Tribunal de Justiça
Em suma, é inviável o conhecimento dos embargos de divergência quando ausente a
similitude fática entre os arestos confrontados. Confira-se:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE


DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. DEPÓSITO
PARA GARANTIA DO JUÍZO. RESPONSABILIDADE POR JUROS E
CORREÇÃO. DÍVIDA NÃO DEPOSITADA INTEGRALMENTE. REFORÇO
DE PENHORA. ACÓRDÃO EMBARGADO PUBLICADO NA VIGÊNCIA
DO CPC/1973. FALTA DE SIMILITUDE FÁTICA. NÃO CABIMENTO.
DECISÃO MANTIDA.
1. Conforme a orientação jurisprudencial firmada no STJ, ratificada no
texto do art. 1.043, § 4º, do CPC/2015, a demonstração do dissenso
interpretativo, suscitado em sede de embargos de divergência, exige o
cotejo analítico entre o julgado paradigma e o embargado mediante a
transcrição de trechos que revelem a similitude fática e jurídica entre os
casos confrontados, a fim de evidenciar que, diante do mesmo contexto
fático, foram adotadas conclusões diferentes quanto ao direito federal
aplicável.
2. No caso, porém, em relação ao paradigma decorrente do julgamento
do AgRg no REsp n. 1.016.433/PR, invocado nos embargos de
divergência, o agravante limitou-se a mencioná-lo nas razões recursais
sem realizar o necessário cotejo analítico.
3. Não se podem admitir embargos de divergência quando inexistente a
indispensável semelhança fático-processual entre os arestos
confrontados.
4. Os precedentes indicados e juntados (AgRg no AREsp n. 376.498/SC e
AgRg no REsp n. 1.016.433/PR) apenas concluíram - fazendo menção a
julgados desta Corte - que a responsabilidade pelos juros e pela
correção monetária (remuneração) da importância depositada é do
banco depositário, também executado. Não cuidam, entretanto, de casos
em que apenas parte do respectivo débito tenha sido depositada,
ensejando reforço de penhora.
5. O acórdão ora embargando, entretanto, reconheceu que a importância
depositada e posteriormente levantada representava apenas parte da
dívida.
6. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt nos EREsp 1.436.075/RS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS
FERREIRA, SEGUNDA SEÇÃO, DJe de 30/10/2017)

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE


DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. ACÓRDÃO EMBARGADO.
SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA.
1. São incabíveis os embargos de divergência quando inexistente a
indispensável semelhança fático-processual entre os arestos
confrontados.
2. No caso dos autos, consoante bem assentou a Primeira Seção em caso
idêntico ao dos autos, não há similitude fática entre os acórdão
confrontados, na medida em que "o acórdão recorrido reconheceu a
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Superior Tribunal de Justiça
legalidade da incidência de IRPJ e da CSLL sobre os créditos apurados
no REINTEGRA, uma vez que provocam redução de custos e consequente
majoração do lucro da pessoa jurídica, o acórdão paradigma analisou a
possibilidade de inclusão de valores relativos a créditos fictos de IPI na
base de cálculo do IRPJ e da CSLL.(AgRg nos EREsp 1.501.412/RS, Rel.
Ministra Regina Helena Costa, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
28/10/2015, DJe 03/11/2015) 3. Agravo interno não provido.
(AgInt nos EDcl nos EREsp 1.541.110/RS, Rel. Ministro BENEDITO
GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 03/10/2017)

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.


É como voto.

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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
SEGUNDA SEÇÃO

AgInt nos
Número Registro: 2013/0047974-0 PROCESSO ELETRÔNICO EREsp 1.124.506 /
RJ

Números Origem: 20050790016082 200700135213 200813400954 200813502342


200900307330

PAUTA: 13/02/2019 JULGADO: 13/02/2019

Relator
Exmo. Sr. Ministro RAUL ARAÚJO

Ministro Impedido
Exmo. Sr. Ministro : LUIS FELIPE SALOMÃO

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MAURÍCIO VIEIRA BRACKS
Secretária
Bela. ANA ELISA DE ALMEIDA KIRJNER

AUTUAÇÃO
EMBARGANTE : PAULO WALDEMAR RIBEIRO FALCÃO - ESPÓLIO
REPR. POR : NÉLIA CAMPELLO FALCÃO - INVENTARIANTE
ADVOGADOS : PATRÍCIA FELIX TASSARA E OUTRO(S) - RJ066803
ANDRÉ MACEDO DE OLIVEIRA E OUTRO(S) - DF015014
EMBARGADO : FLÁVIO GODINHO
ADVOGADO : JOSÉ ANTÔNIO ROMERO PARENTE E OUTRO(S) - RJ013308
EMBARGADO : CONDOMÍNIO VALE DE SÃO FERNANDO E OUTRO
ADVOGADO : JOSÉ MAURO DE ARAÚJO MACHADO E OUTRO(S) - RJ018417

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas - Servidão

AGRAVO INTERNO
AGRAVANTE : PAULO WALDEMAR RIBEIRO FALCÃO - ESPÓLIO
REPR. POR : NÉLIA CAMPELLO FALCÃO - INVENTARIANTE
ADVOGADOS : PATRÍCIA FELIX TASSARA E OUTRO(S) - RJ066803
ANDRÉ MACEDO DE OLIVEIRA E OUTRO(S) - DF015014
AGRAVADO : FLÁVIO GODINHO
ADVOGADO : JOSÉ ANTÔNIO ROMERO PARENTE E OUTRO(S) - RJ013308
AGRAVADO : CONDOMÍNIO VALE DE SÃO FERNANDO E OUTRO
ADVOGADO : JOSÉ MAURO DE ARAÚJO MACHADO E OUTRO(S) - RJ018417

CERTIDÃO

Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 18 de 5
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Certifico que a egrégia SEGUNDA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão
realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Seção, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do
Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas
Cueva, Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Nancy Andrighi votaram com o Sr.
Ministro Relator.
Impedido o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

Documento: 1793152 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/02/2019 Página 19 de 5

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