Você está na página 1de 9

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES


DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
HH054 – História Moderna I - 2019-1o semestre
Nome: Kelvin Barros Pereira NOTA: 9,0

1) Explique a relação estabelecida entre o passado e o presente pelo humanismo


renascentista. (2 pontos) (2,0)
Para melhor entender a relação passado-presente estabelecida pelo humanismo
renascentista é interessante que façamos o adendo de que sua interpretação passa pela
escrita e pelas escolhas dos historiadores que se empenharam em estudá-la. Sendo
assim, devemos lembrar que o estabelecimento do conceito de Renascimento passou
pelas mãos de historiadores que, atendendo demandas políticas do século XIX,
legitimavam com a volta ao passado uma ideia de unidade civilizacional europeia.
Dessa forma, é importante lembrar como eles se debruçaram sobre fontes como as de
Petrarca, que olhava para o medievo como uma época que inaugurou algo
novo????? - demonstrando uma espécie de consciência histórica - para fundamentar a
ideia de que o Renascimento rompeu com a Idade Média – considerada por ele uma
idade das trevas. Essa forma de análise iniciará um debate historiográfico entre autores
que viam no Renascimento uma ruptura com o medievo e autores que viam uma
continuidade.
A partir disso, podemos observar o exemplo das ideias de Michelet para a
análise da França do século XV. Ele parte de uma percepção cíclica da história,
descrevendo que o reinado de Francisco I denotou o fim de um ciclo e início de outro,
em um novo século, iniciando uma nova dinastia e um novo tempo.Somado a isso, essa
percepção partiu de uma virada de pensamento de Michelet, que passou a descrever o
medievo como um mundo moribundo, que estava morrendo e daria lugar a um novo,
jovem e radiante. Essa descrição radiante e solar da época pode ser observada ao olhar
obras de arte como “O nascimento de Vênus”, de Botticelli – a qual coincidentemente
se tornou pública no XIX, fato que poderia ter contribuído para estimular mais essa
visão solar.
Contudo, a visão de Michelet não foi a única na historiografia sobre relação
entre passado e presente estabelecida pelos humanistas renascentistas – embora a visão
solar, de ruptura e inauguração da modernidade tenha sido endossada na historiografia
do fim do século XIX e início do XX. Nesse sentido, podemos trazer o exemplo de
Jacob Burckhardt que, ao escrever sobre a cultura do Renascimento italiano, fugiu da
noção de ruptura com o passado medieval, caracterizando esse momento histórico como
um momento diferente e único, no qual havia uma ambiguidade: ao mesmo passo que
era uma época de otimismo e renovação, era também uma época de frustração e
desespero. Tal noção também poderia ser analisada no imaginário da época através da
arte, ao contrastar as pinturas “solares” de Botticelli com a arte “escura” de Bosch.
Além de Burckhardt, podemos citar o exemplo de Johan Huizinga, que via na relação do
humanismo com passado e presente uma tensão e ao mesmo tempo uma coexistência
entre o velho e o novo.Ele dá ênfase na continuidade da Idade Média mais do que na
ruptura, focando mais na crise do que no novo. Além disso ele não idealiza o conceito
de Renascimento, criticando-o por ser um termo impreciso, incompleto, sujeito a uma
perigosa doutrinação.
Essa preocupação inicial em relação a continuidade ou ruptura com o passado
medieval deu espaço à preocupação com a compreensão dos intercâmbios intelectuais
renascentistas com a tradição clássica e a singularidade de sua cultura. Isso se deu,
primeiramente, com a problematização do Renascimento por Hans Baron (e depois por
Kristeller, como veremos mais à frente), com a análise da cultura desse período pelo
fenômeno intelectual do humanismo. Baron diferia de Burckhardt por entender que
este movimento intelectual e cultural foi a origem de um movimento muito mais amplo:
o humanismo renascentista europeu e o fortalecimento de uma tradição republicana.
Devido as colaborações da tradição germânica da qual Baron fazia parte, a
historiografia do século XX deixou de lado o terreno da polêmica ruptura-continuidade
e iniciou um debate de qualidade acadêmica, mais frutífero, focado na formação da
tradição intelectual do humanismo e sua relação com a retomada dos clássicos nos
séculos XIV e XV.
Outro nome da historiografia que estudou essa formação da tradição intelectual
do humanismo renascentista foi Paul Oskar Kristeller, colega de Hans Barons. Ele
reconhece nesse fenômeno uma longa história da tradição intelectual com interrupções,
desvios de curso e acomodações. Não obstante, ele também trouxe à luz a ideia do
Renascimento como uma época de inovação da tradição intelectual, pautada pelo acesso
de fontes clássicas, fontes medievais latinas, bizantinas e árabes. Além disso, ele coloca
essa cultura intelectual como campo de empréstimos, traduções e leituras – além da
inovação e criação - do material escrito antigo e medieval que deu origem ao fenômeno
do humanismo (KRISTELLER, 1982, p. 33-34). Dessa forma, ele caracteriza esse
estudo dos clássicos como studia humanitatis, sendo, quem o faz, um humanista
(KRISTELLER, 1982, p. 35).
Por último, é interessante lembrar a importância da retórica nesses estudos para
Kristeller. Ele pontua a importância de estudar e imitar os antigos para aperfeiçoar essa
prática. Contudo, ele atenta que esses antigos são modelos a se ultrapassar. Dessa
forma, vemos que essa relação entre os humanistas e os autores clássicos não era uma
relação de subserviência. Isso também é visto quando ele explica que os humanistas,
para além de descobrirem e copiarem fontes clássicas, também as editavam e
adicionavam comentários, com o intuito de torna-las mais compreensíveis.

2) Quais os argumentos usados por Pico della Mirandola em defesa da dignidade


humana? (2 pontos) (2,0)
Pico della Mirandola apresenta uma visão positiva do homem, que vai no sentido
oposto da maioria dos humanistas e teólogos, em especial os do norte europeu, que
sublinhavam a fragilidade humana e sua inclinação para o mal e para o pecado. A tese
central de seu pensamento se dará em torno do homem e de seu lugar no mundo.
Um de seus principais argumentos para a defesa da dignidade humana será o de
que nada há de mais admirável que o homem. Isso dá ênfase aos motivos da criação,
apelando ao fato de que Deus criou o homem para compreender o sentido de sua obra,
amar sua beleza e contemplar sua grandiosidade. É interessante perceber como esse
argumento busca aproximar o criador e a criatura; aproximar Deus e o homem. Pico
também explica que o homem ocupa uma condição privilegiada na ordem universal,
“invejável não somente para os animais, mas também para os astros e os espíritos
ultramundanos” (PICO, 2016,não paginado)
Além disso, Pico também faz uma diferenciação entre a criatura humana e as
outras criaturas para argumentar que aquela tem uma responsabilidade ética sobre si;
uma capacidade de se automodelar moral e espiritualmente. Esse argumento é evocado
por ele a partir da ideia de que o homem, em relação às outras criaturas, é inacabado,
não está definido e nem pronto. Além disso, é válido lembrar que essa capacidade de
automodelação exposta nesse argumento é validada pela defesa que Pico faz do livre
arbítrio, que lega ao homem a possibilidade de escolher entre o bem e o mal, sendo um
“livre e extraordinário escultor de ti mesmo” (PICO, 2016, não paginado). Além disso,
esse processo de aperfeiçoamento seria feito via aquisição de conhecimentos 1. Isso nos é
exemplificado quando Pico explica, citando Maomé2, que quem se afasta da lei divina
se torna um animal terrestre, e que, só um homem que discerne sobre as coisas - um
filósofo – se torna um ser animal celeste.
Por fim, Pico também defende que, para alcançar o aperfeiçoamento, o homem
deve atender a ambição da alma por coisas mais sublimes, desdenhando das coisas
materiais, mundanas e carnais. Isso nos é exemplificado quando Pico explica que um
homem “puro contemplativo, indiferente ao corpo, imerso nas profundidades de sua
mente, então não é um animal terreno nem celeste que vedes, mas sim um espírito
superior revestido de carne humana” (PICO, 2016,não paginado).

3) Tomando como base o livro O Elogio da Loucura discorra sobre os termos da


crítica erasmiana. (3 pontos) (3,0)
Antes de se atentar aos termos da crítica, é interessante pontuar a tradição de que
Erasmo faz parte, a qual têm forte ligação com a renovação com os estudos bíblicos,
além de trazer um forte cunho moral em seus textos e muitas críticas à sociedade,
denunciando os males do tempo e expressando a necessidade de se reformar as
instituições e a moral3. Somado a isso, autores dessa tradição tinham a percepção que
um dos mais graves males desse tempo era o afastamento e o desconhecimento dos
princípios éticos do Cristianismo, além de criticarem a Igreja por afastar-se cada vez
mais dos fiéis, envolta com o poder e com querelas religiosas. Contudo, apesar dessa
visão negativa da humanidade ser latente entre os autores dessa tradição, devemos
lembrar que ela não é feita com base em escatologias. Em vez disso, ela se dá pela
observação histórica do comportamento, pela análise da escolha humana pelo mal, que
levou a tempos de decadência4.

Com esses adendos, podemos observar como a crítica humanista de Erasmo gira
em torno do tema da inversão do mundo, que era muito recorrente na Idade Média para
1
É importante ressaltar que esse componente diz muito sobre como Pico, em sua escrita, não separava o
interesse intelectual da religiosidade.
2
É comum no texto “À dignidade humana” que Pico alie as tradições filosóficas árabes, cristãs e judaicas,
além de pagãs. Isso fez com que algumas de suas teses fossem proibidas pelo tribunal da Inquisição.
3
A necessidade de reforma expressa por essa tradição não pressupunha a ruptura com a Igreja. Isso
diferenciava Erasmo de Lutero.
4
A partir disso podemos observar que Erasmo, assim como Pico della Mirandola, enxergava a existência
de um livre arbítrio – só que de uma perspectiva negativa.
explicar os males. Na crítica, o mundo está dessa forma devido a insensatez humana,
ligada a prática de pecados e vícios, e a influência demoníaca. Em O Elogio da Loucura,
ele faz um diagnóstico moral de seu tempo utilizando da sátira e da ironia, criticando a
todos. Contudo, suas maiores críticas eram destinadas à hierarquia eclesiástica e aos
aristocratas. Não obstante, seu objetivo com isso jamais era de massacrar, mas de
iluminar quem estava no erro.

Também é importante ressaltar o elemento da sátira, que é muito incomum nos


textos humanistas - principalmente vindo de um teólogo - e vai ser a base sob a qual
Erasmo fundamenta sua crítica. Com isso, ele buscará suscitar o pensamento, utilizando
filosoficamente o riso. Dessa forma, não veremos, em seu livro, a razão como
componente de aperfeiçoamento. Em vez disso, Erasmo aciona o componente d a
loucura, que fala em primeira pessoa no livro, sendo a figura que dispensa a alegria aos
homens e aos deuses e cujo poder se estende sobre esses dois. Esse último ponto é
exemplificado no livro quando a própria Loucura se elogia por ser dominadora
(dominatrix mundi), se colocando acima da razão e da fé.

Acerca da questão do riso, ação a qual era condenada pela teologia, Erasmo
recorre à tradição clássica, especialmente à história de Demócrito e Heráclito, na qual,
em decorrência da insensatez e da falta de prudência dos homens, Demócrito só poderia
rir. Com isso, ele aproxima a Loucura a essa imagem de Demócrito. Dessa forma,
vemos no livro como aquela ridicularizava os acontecimentos da vida humana.
Contudo, como Erasmo diz, o propósito não é de magoar, mas de divertir (2002, p. 9).
Sendo assim, podemos observar que não estamos tratando de uma crítica
comportamental moralista como a do livro A civilidade pueril.

Além das críticas aos poderosos e à hierarquia eclesiástica, são tecidas críticas às
mulheres. Nelas, a mulher é colocada como um ser tomado pela loucura, que temperaria
com esta o humor áspero e triste do homem (ERASMO, 2002,p. 29). Essa crítica tem
muito a ver com uma tradição da época de ver graça nas mulheres por sua suposta
incapacidade de serem sábias5. Além disso, está presente no livro a tradição satírica de
rir de maridos cornos e submissos às mulheres viragos. Essa crítica se refere a como o
casamento era também uma loucura (ERASMO, 2002,p. 32).

5
Nas aulas tivemos algumas discussões acerca dessa crítica demonstrar (ou não) que Erasmo era
misógino. Contudo, não pretendo entrar nesse mérito aqui. Apenas gostaria de ressaltar que esta frase
expressa somente o que vimos em aula e não minha opinião.
Também são tecidas no livro críticas à inutilidade dos filósofos no contexto de
um mundo insensato. A atitude muito contemplativa desses é questionada, uma vez que
seu papel é de afastar os véus, as nuvens, a penumbra, através do conhecimento, que
deve ir além de meras elucubrações. Em outras palavras, a crítica se dá no sentido de
mostrar que esses filósofos estão muito afastados do mundo. Além disso, a Loucura
questiona se há, no mundo dos insensatos, um lugar para os filósofos (ERASMO,
2002,p. 37). A resposta vem ligada a crítica: esses filósofos devem estar ligados a
questões sociais e políticas, aconselhando mantendo-se ao lado d os governantes a fim
de buscar o bem comum. Nesse sentido também se encaixa a crítica aos príncipes.
Esses, que deveriam buscar conduzir-se de maneira ética; que têem uma
responsabilidade enorme devido a grandeza de seu poder, estão ocupados apenas com
suas riquezas e com guerras, desviando do caminho cristão. Além disso, há no livro
críticas aos retóricos daquele tempo, que eram insensatos perante seu próprio
conhecimento e decoravam, fora de propósito, palavras gregas em seus discursos
(ERASMO, 2002,p. 18).

Para além disso, são duras e ácidas as críticas feitas aos teólogos, que são
colocados como pessoas perigosas, que estabelecem vetos e censuras às pessoas.
Somado a isso, é apontada a sua soberba. Também são levantadas críticas em relação a
importância das questões as quais esses teólogos se empenham em debater, que são
apontadas como sem relevância por Erasmo.

A última expressiva crítica tecida no livro é voltada às grandes lideranças da


Igreja, bispos e os Papas, que se envolvem com o poder secular e vivem uma vida de
ócio e moleza (ERASMO, 2002, p. 96). O desvelar da falta de ética desses toca uma
corda muito sensível para os reformadores, que viam isso como um dos motivos para a
ruptura. A crítica não se limita aos Papas, uma vez que Erasmo critica a falta de
empenho dos monges em viverem um bom exemplo aos cristãos. Não obstante, ele
aponta que esses se davam às paixões, prestando um desserviço aos cristãos e à Igreja.

Após essas críticas, há uma virada com o início do segundo discurso da Loucura
no livro. Dessa vez trata-se de uma Loucura positiva, elogiada pelos sábios da
Antiguidade, como Horácio e Cícero, e pelas Sagradas Escrituras. Trata-se, portanto, da
loucura cristã expressa por São Paulo (ERASMO, 2002,p. 108), a qual se mostra como
sabedoria e iluminação espiritual, dada pelo fogo do amor divino. Essa loucura é
característica daquele que segue a Jesus Cristo. É adquirida ao se encontrar com a
verdade, com o bem, com a beleza e com o amor de Cristo.

4) No livro de Thomas More a crítica à sociedade e aos costumes se faz em


contraponto à projeção de uma sociedade perfeita. Explique os fundamentos da
crítica social e explique como se organiza a República perfeita. (3 pontos) (2,0)
Thomas More, em seu livro, busca projetar uma sociedade perfeita, para a qual
cria a palavra utopos, ou seja, o bom lugar (eutopos). Esse lugar abrigaria uma
sociedade pautada pela igualdade que se encaixa em um pensamento mais amplo,
chamado de pensamento desiderativo, no qual se encaixa tudo aquilo que desejavam os
homens; suas projeções e expectativas. Dentro desse pensamento, temos diversos
exemplos de lugares utópicos: a idade do ouro, de Platão, o Reino de Deus, da
escatologia cristã, o País da Cocanha, da tradição medieval, e a utopia moderna, a qual
seria fruto do alcance da perfeição pelos homens. É nesta última que se encaixa a utopia
de Thomas More, tendo em vista que, no livro, ele conta sobre a existência desse lugar
perfeito, que fora criado por seres humanos bons e virtuosos. Isso nos mostra que havia
um caráter pedagógico nessa projeção, pois somente homens exemplares poderiam
construir essa utopia. Também é valido lembrar a imprecisão geográfica desse lugar no
livro. Além disso, é importante ressaltar que essa projeção de More se dá, na primeira
parte do livro, através do diálogo com outras personagens históricas, principalmente
Rafael Hitlodeu, sábio viajante, conhecedor do latim e do grego, que se aventurou por
diferentes terras e conheceu diversos povos.
A partir dessas considerações iniciais, podemos citar o primeiro ponto da crítica
social de Thomas More: a crítica dos males da época. Ela se dá no livro quando More
questiona Rafael Hitlodeu sobre os motivos pelos quais ele não serve um príncipe. Este
então responde aludindo à sua viagem a Inglaterra, explicando que os príncipes não
estão interessados pela paz, pela justiça e nem pelo bem comum. Ele observa uma
grande crueldade nesta sociedade, que puniaacometia ladrões com pena de morte.
Podemos inserir nessa parte da crítica a posição de More, que aponta a desordem da
sociedade como causa desses roubos. Além disso, é apontado por ele como os nobres e
ricos exploravam os mais pobres. Outro ponto dessa crítica vai em direção ao
capitalismo comercial e à propriedade privada (MORE, 2001,p. 29), que eram os
causadores da desigualdade social e eram motores dessa exploração. Neste ponto da
crítica, podemos inserir a metáfora de More em relação à indústria têxtil inglesa, que
coloca esta como um a metáfora dos carneiros que devoram as pessoas, numa alusão
aos movimento dos cercamentos dos campos, que expulsavam “engoliam” os originais
residentes das terras os camponeses. Contudo, é importante ressaltar que More não
defende o fim da propriedade privada, pois não tinha como totalmente certa a
funcionalidade de uma solução desta proporção. Apesar disso, ele reforça a
possibilidade de existir um mundo melhor no seu presente – que é algo validado por
Rafael, que afirma existir, na utopia, uma sociedade sem propriedade privada -,
produzida através do aperfeiçoamento humano, que levaria à dignidade.
Ainda em relação ao aconselhamento, More levanta a crítica de que aconselhar
poderosos, que estavam mais empenhados em guerras e no enriquecimento pessoal, era
como falar para surdos (MORE, 2001,p. 44). Isso demonstra como o discurso humanista
de paz não encontrava ecos num contexto de expansão dos Estados. Era um discurso
pacifista em meio a um contexto de inevitabilidade da guerra.Essas críticas giram em
torno da falta de justiça dessa sociedade. Contudo,para que houvesse bons governos,
seria é necessário que haja a justiça,componente importantíssimo da filosofia moral. Por
fim, é importante ressaltar que no texto de More não há ponto final sobre o dever ou não
do humanista de aconselhar os príncipes.
Para além disso, há também, assim como em Erasmo, a crítica à dissipação dos
costumes, uma crítica moral: as pessoas estavam se deixando levar pelo luxo, pela
luxúria prostituição, pelas bebidas e pelos jogos de azar. Isso nos mostra a
fundamentação cristã dos argumentos de More.
Em relação a descrição da república perfeita, presente na segunda parte do livro,
é reforçada sua característica insular a fim de reforçar sua diferença e seu afastamento
do mundo imperfeito. Essas diferenças dizem respeito aos âmbitos social e material,
portanto, vemos ainda uma autoridade presente nela. Além disso, há grande
uniformidade na organização das cidades, as quais harmonizavam com o campo.
Somado a isso, as famílias são organizadas de maneira racionalista e ordenadora, com
um número definido de quarenta pessoas, juntamente com dois escravos, todos sob a
direção do casal. Ao somar trinta famílias, temos uma tribo. É importante explicar que a
escravidão nessa sociedade supostamente perfeita existia somente como forma de
punição. Além disso, essa república é caracterizada pela ausência de mudança, tendo em
vista que tudo é ordenado para o bem e assim deve permanecer. Em outras palavras, é
uma sociedade que, para manter o bem comum, a ausência de diferenças, a ordem e a
valorização dos bons prazeres, deve manter-se estática. ELA É ESTÁTICA.
Por fim, podemos problematizar toda essa uniformidade e estabilidade da
república perfeita pela via contrária ao da utopia. Sendo assim, podemos nos questionar
sobre a possibilidade dessa utopia, dessa descrição de um lugar teoricamente perfeito,
ser o embrião de algo oposto a isso, algo imperfeito, sem movimento: uma sociedade
distópica.
VOCÊ DEU MAIS ESPAÇO PARA A IMPERFEIÇÃO DO QUE PARA A
REPÚBLICA PERFEITA. DEVERIA TER EXPLORADO MAIS SEUS
SIGINFICADOS: UNIDADE, UNIFORMIDADE, IGUALDADE, CONTROLE,
ANULAÇÃO DAS DIFERENÇAS.
Referências
ERASMO. O elogio da loucura. Tradução de: OLIVEIRA, P. Ponta Grossa: Atena
Editora, 2002. Título original: Encomium Moriae.
KRISTELLER, P. O. “El pensamento renascentista y la antiguedad clássica”. In: El
pensamento Renacentista y sus Fuentes. Tradução de: LÓPEZ, F. P. Cidade do
México: Fondo de Cultura Económica, 1982. P. 33-51. Título original: Renaissance
Thought and its Sources.
MORE, Thomas. Utopia. Tradução: GARCIA, N. J. 2001.
PICO, G. À dignidade humana. Disponível em:
<http://www.teatrodomundo.com.br/oracao-a-dignidade-do-homem/>. Acesso em: 18
de maio de 2019

Você também pode gostar