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Estudos

Avançados
do Lazer
Metodologia da Pesquisa
Aplicada ao lazer
Christianne Luce Gomes
Maria Teresa Marques Amaral

Brasília, 2005
Metodologiada
Pesquisa Aplicada
ao Lazer
Confederação Nacional da Indústria - CNI Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia
Ocupacional
Armando de Queiroz Monteiro Neto
Presidente Pablo Juan Greco
Diretor
Serviço Social da Indústria - SESI
Luciano Sales Prado
Jair Meneguelli Chefe do Departamento de Educação Física
Presidente do Conselho Nacional
Christianne Luce Gomes
SESI - Departamento Nacional Coordenadora Pedagógica do CELAR

Armando de Queiroz Monteiro Neto Hélder Ferreira Isayama


Diretor Coordenador Administrativo do CELAR

Rui Lima do Nascimento Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa


Diretor-Superintendente
José Nagib Cotrim Árabe
Mariana Raposo Diretor Executivo
Diretora de Operações

Universidade Federal de Minas Gerais


(UFMG)

Ana Lúcia Almeida Gazzola


Reitora

Marcos Borato Viana


Vice-Reitor

Jaime Arturo Ramirez


Pró-Reitor de Pós Graduação

Edison José Corrêa


Pró-Reitor de Extensão
Estudos
Avançados
do Lazer

Metodologia da Pesquisa
Aplicada ao Lazer

Christianne Luce Gomes


Maria Teresa Marques Amaral

Brasília, 2005
© 2005. SESI – Departamento Nacional
Nota sobre o Módulo
Este livro didático integra o Programa de Educação Continuada em Lazer e foi elaborado para subsidiar o desenvolvimento da
Monografia de Conclusão do Curso de Especialização em Estudos Avançados do Lazer.

Nota sobre as autoras


Christianne Luce Gomes, docente e pesquisadora da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG, é
coordenadora pedagógica do Centro de Estudos de Lazer e Recreação (Celar) e líder do grupo de pesquisa Lazer e Sociedade
(Plataforma Lattes – CNPq). É especialista em lazer e doutora em educação pela UFMG. Editora da Revista Licere e autora de seis
livros, dentre os quais o Dicionário crítico do lazer (Autêntica Editora, 2004).
Maria Teresa Marques Amaral, docente e pesquisadora da Faculdade de Educação da UFMG, licenciada em filosofia pela UFMG,
mestre em educação, doutoranda do Programme PhD Fondements en l’Éducation _ Faculté des Études Supérieures Université
de Montréal, Quebec, Canadá. Coordenadora da Cátedra de Educação a Distância da Unesco na FAE/UFMG; coordenadora
do Projeto Seiva: Sistema de Educação Interativa para a Formação de Tutores. Autora do módulo Metodologia da Pesquisa para o
Projeto Unirede, artigos e capítulos sobre história da ciência e epistemologia.

G633m

Gomes, Christianne Luce.


Metodologia da pesquisa aplicada ao lazer / Christianne
Luce Gomes, Maria Teresa Marques Amaral – Brasília:
SESI/DN, 2005.
89 p. : il. ; 21 cm.

ISBN 85-88199-96-3

1. Metodologia Cientifica 2. Ciências Sociais I. Título II.


Amaral, Maria Teresa Marques

CDU 001.8

SESI
Serviço Social da Indústria-Departamento Nacional
Universidade Corporativa do SESI/UniSESI
Setor Bancário Norte Quadra 1 – Bloco C
Edifício Roberto Simonsen
70040-903 – Brasília – DF
Tel. (61) 3317-9480
Fax. (61) 3317-9429
E-mail: unisesi@sesi.org.br
http://www.unisesi.org.br
SUMÁRIO

Apresentação

Unidade 1 – O processo de pesquisa: dimensão


compreensiva, 13
1.1 Do senso comum à atitude científica, 17
1.2 O problema como ponto de partida, 22
1.3 O projeto de pesquisa e a monografia, 26
1.4 Relação entre o tema e o problema de pesquisa, 28
1.5 Os objetivos, 30
1.6 As hipóteses, 32
1.7 Base teórico-conceitual da pesquisa, 34

Unidade 2 – O processo de pesquisa: dimensão


metodológica, 39
2.1 Abordagens de pesquisa: a questão da intercomplementariedade, 42
2.1.1 A abordagem quantitativa e seus limites, 48
2.1.2 A abordagem qualitativa e seus dilemas, 52
2.1.3 A questão dos critérios na pesquisa qualitativa, 56
2.2 As regras do jogo, 60
6

2.3 Tipos de pesquisa, 63


2.4 A coleta de dados, 73
2.5 A análise e a interpretação dos dados, 78
2.6 O ponto de chegada: conclusão da pesquisa, 80

Referências, 85
A P R E S E N TA Ç Ã O

C ara aluna, caro aluno,

Gostaríamos de começar essa conversa lembrando o poema “O guardador de


rebanhos”, de Alberto Caeiro, um dos heterônimos do poeta Fernando Pessoa:1

O meu olhar é nítido como um girassol.


Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás…
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem…
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras…
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo.

1 PESSOA, Fernando. Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986.


A expressão “eterna novidade do mundo” pode ter várias interpretações. No
âmbito da metodologia da pesquisa, seria interessante vê-la como uma atitude
de estranhamento, mas também de deslumbramento pelo fato novo, que o autor
denomina “pasmo essencial”. Estes serão também nossos desafios: olhar, investigar
e transformar nosso olhar. Para isso, precisamos fazer escolhas e decidir caminhos,
especialmente quando nos engajamos no processo de construção de conhecimentos
sobre o lazer, essência deste livro didático.

Neste curso de especialização, você tem a oportunidade de aprofundar


conhecimentos sobre o lazer e levantar questionamentos, sendo desafiado a rever
conceitos, superar dificuldades e desvelar possibilidades nessa área de estudos e de
intervenções profissionais. Esses são alguns dos elementos que poderão contribuir
com sua pesquisa monográfica, cujo desenvolvimento requer um tratamento
rigoroso e sistemático. Denominamos esse processo de investigação científica.

A investigação científica é uma atividade que busca, em princípio, colocar em dúvida,


criticar e analisar teorias e as maneiras de pensar preconizadas pela maioria. Ela pode
também contestar um conjunto de verdades até então consideradas incontestáveis.
Ao duvidar, é-nos permitido transgredir buscando estratégias renovadoras,
produzindo saberes que fogem aos padrões costumeiros. Portanto, a investigação
sistematizada, sobretudo quando coloca em foco práticas profissionais cotidianas,
como o lazer, devem transgredir os conhecimentos patenteados e puramente
especulativos e ir além, buscando novas idéias, propondo novas hipóteses a fim de
tentar novas soluções, firmes e coerentes do ponto de vista epistemológico. Para
isso, é necessário assumir o papel de “pesquisador”.

No entendimento de Bunge (1983), o “pesquisador” é um profissional que reflete


sobre sua prática e produz novos conhecimentos. O autor dá-nos algumas dicas
para isso:

Comece por abordar problemas modestos, mas aponte para problemas ambiciosos. A
modéstia inicial é necessária em razão da escassez de conhecimentos (sic), mas não se
passa a vida no jardim de infância. Modéstia não é o mesmo que incapacidade. Comece
abordando um assunto bem circunscrito, talvez até distante, com o objetivo final de
ampliá-lo ou de abordar eventualmente problemas inéditos. Comece averiguando o
que pensa um grande teórico X sobre o problema Y e trate de pensar com sua própria
cabeça sobre o problema Y.2

Em vez de sermos meros reprodutores, Bunge (1983) instiga-nos a assumir o


papel de produtores de conhecimento. Esse encaminhamento é fundamental para
promovermos o avanço do campo de estudos sobre o lazer no país, conforme
apontado por Gomes e Melo (2003). Ao discutir trajetórias de estudos e possibilidades
de pesquisa para o lazer no Brasil, os autores citam alguns desafios, dentre os quais
selecionamos aqueles que têm uma relação com o processo de pesquisa:

(a) Dar continuidade ao processo de qualificação da produção teórica na área do


lazer, carente de análises criteriosas e de argumentos consistentes. Um passo
para isso poderia ser dado mediante questionamentos sobre a preponderância
de determinados entendimentos reproduzidos como soluções definitivas, o que
nos indica que o processo de construção de conhecimento é dinâmico e sempre
inacabado.

(b) Promover experiências refletidas com qualidade, que possam estar articuladas
com o cotidiano e auxiliem o redimensionamento das compreensões teóricas
adotadas. Esse pressuposto evidencia que podemos pesquisar a prática
cotidiana, sendo imprescindível observar os parâmetros científicos para não nos
restringirmos ao “senso comum”.

(c) Ampliar as redes de troca de experiências entre estudiosos, profissionais e


pesquisadores nacionais e internacionais, estabelecendo diálogos com quem
estuda o lazer a partir de diversos enfoques e olhares. Essa necessidade mostra-
nos que é essencial explorar os conhecimentos sobre o lazer, o que implica estar
sempre atualizado, acompanhando os estudos, as pesquisas, os projetos e as
publicações na área.3

2 BUNGE, M. Epistermologia: curso de atualização. São Paulo: Edusp, 1980.


3 GOMES, Christianne Luce; MELO, Victor A. Lazer no Brasil: trajetória de estudos,
possibilidades de pesquisa. Rev. Movimento, Porto Alegre, v. 9, n.1, p.23-44, jan./abr. 2003.
Certamente, essas metas podem ser conquistadas a partir de várias frentes, e, em
especial, pela realização de pesquisas na área do lazer. Ao ingressar no curso de
especialização, você estabeleceu o compromisso de desenvolver um trabalho
monográfico, que é um pré-requisito para a conclusão do curso. Portanto, ao
realizar uma monografia bem fundamentada e cientificamente consistente, você
poderá colaborar com o alcance desses objetivos.

Como sugerem os quadrinhos a seguir, esse é um exercício muito “arriscado”:4

Obviamente, o diálogo anterior apresenta uma visão distorcida de cultura (entendida


como sinônimo de conhecimento acumulado). Contudo, como afirmava Francis
Bacon, “conhecimento é poder”, evidenciando a importância e os “perigos”
decorrentes do investimento na construção do saber. Afinal, ao ampliarmos
nosso conhecimento sobre um determinado assunto, passamos a duvidar mais, a
questionar, a criticar e a rever princípios, conceitos e teorias já cristalizados, o que
aumenta nossa responsabilidade perante a sociedade em que vivemos.

Esta obra foi preparada com o intuito de auxiliar você a superar mais esse desafio. Por
essa razão, nosso interesse pela metodologia da pesquisa aplicada ao lazer não se

4 QUINO. Toda Mafalda, da primeira à última tira. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
p.16.
resume às questões conceituais, tendo também uma preocupação instrumental: os
debates são, antes de tudo, estratégicos, no sentido de colaborar com a realização
de sua monografia. Dessa maneira, você verá que a produção do conhecimento
científico abrange duas dimensões inseparáveis: a compreensiva (de conteúdo) e
a metodológica (operacional). De certa maneira, esses serão os assuntos tratados,
respectivamente, nas duas unidades que compõem este livro.

Bom trabalho!
O processo
Unidade
de pesquisa:
dimensão
compreensiva
15

UNIDADE 1 - O PROCESSO DE PESQUISA :


D I M E N S Ã O C O M P R E E N S I VA

Como afirmam os especialistas, pesquisar aprende-se mediante o próprio fazer


e nada poderia substituir essa prática, mesmo porque muitas situações inusitadas
esperam pelo pesquisador no decorrer dos variados momentos de seu trabalho, e os
possíveis encaminhamentos a serem seguidos não estão previamente decodificados
(e nem poderiam estar) em algum manual.

Algumas interrogações sobre o processo da pesquisa vêm, ao longo da sua


história, ocupando diversos profissionais das áreas das ciências humanas e sociais
e coloca algumas questões: é uma simples técnica que todos podem utilizar, ou
chega a constituir um conhecimento de forma específica? Como hoje concebemos
a pesquisa? Quais são os pré-requisitos para a produção do conhecimento
denominado científico?

Estamos trabalhando preferencialmente para obter informações consistentes e


rigorosas sobre um tema que nos ajudem a construir um campo específico de
forma independente com objeto e método próprios e com exigências particulares,
também marcadas pelo operacional.

A pesquisa, em suas várias possibilidades, coloca-se em um palco complexo,


marcado por desafios entre o observado e o registro, entre as situações vividas pelo
indivíduo e as vividas coletivamente, entre a narração do depoente e a interpretação
do pesquisador, entre a objetividade e a subjetividade de quem faz a pesquisa.
1616

O campo do lazer convive com muitas contradições, evidenciando a necessidade


de ponderarmos sobre elas, especialmente sobre a relação objetivo/subjetivo.
Quando as ciências humanas e sociais começaram a produzir conhecimentos, estes
foram questionados pelos cientistas, que tradicionalmente desenvolviam pesquisas
experimentais, alegando que era impossível produzir conhecimento científico em
campos tão pouco controláveis. Afinal, como confiar na fidedignidade dos dados?

Em geral, não há um consenso entre os autores no que se refere à classificação


das ciências. No Brasil, uma referência é a tabela de classificação das áreas
de conhecimento adotada pelo CNPq (www.cnpq.br/areas/tabconhecimento/
index/htm), que também vem sendo repensada. Consulte este site e procure
identificar em quais áreas você acredita que as pesquisas sobre o lazer poderiam
ser desenvolvidas.

Um dos grandes feitos da história, a partir de então, foi produzir formas de lidar com
as peculiaridades dos objetos a serem trabalhados. Isso aparece de modo mais ou
menos enfático nas pesquisas realizadas nas ciências humanas e sociais, denunciando
direta ou indiretamente o conhecimento comprometido com os poderes instituídos.
Essa crítica foi relevante e contribuiu para a renovação das pesquisas em seu conjunto.
Graças a essa postura, a pesquisa em ciências humanas e sociais foi definindo seu
duplo compromisso político: com a democratização do saber e com o direito ao
saber, que garantiu o registro de opiniões diferentes sobre temas diversos e até
marginais dentro do quadro clássico de produção científica. Esse novo horizonte
descortinou algumas possibilidades para o desenvolvimento de estudos científicos
sobre o lazer, notadamente a partir da segunda metade do século XX.

Não vamos recontar toda essa história, apenas apontar as possibilidades de realização
dessas pesquisas, que passaram a contemplar novos objetos. O que se viabiliza com
essa nova postura é que vários caminhos se abrem para os estudos sobre o lazer,
que precisam ser abordados de forma rigorosa e sistemática, superando o senso
comum e caminhando em direção à atitude científica.
17

1.1 Do senso comum à atitude científica


Historicamente, vários pensadores se preocuparam com a questão do “senso
comum”, ou “conhecimento popular”. Desde a Grécia antiga, a distinção entre mito
e razão foi objeto de preocupação de filósofos. A pergunta é simples na formulação,
porém complexa na resposta: até onde estamos mergulhados pura e simplesmente
no mundo da vida, e até onde conseguimos problematizar esse cotidiano e dele nos
afastarmos de forma suficiente para ter uma visão mais nítida da realidade e, com
isso, produzir conhecimento?

Enquanto o senso comum está baseado no conhecimento imediato, a atitude


científica tem por base a problematização. Poderíamos ficar nesse debate por um
longo tempo, mas consideramos importante desvendar essa questão da forma mais
simples possível, distinguindo esses dois tipos de conhecimento. Para isso, vamos
recorrer a Chauí, especialmente em seu livro Convite à filosofia.

Este livro está totalmente disponível na internet. Caso você queira conhecê-lo
e aprofundar seu conhecimento, acesse o site: http://pfilosofia.fateback.com/
03_filosofia/filosofia.htm.

No capítulo sobre a ciência, a autora inicia o debate indagando:

O Sol é menor do que a Terra. Quem duvidará disso se, diariamente, vemos um pequeno
círculo avermelhado percorrer o céu, indo de leste para oeste? O Sol se move em torno
da Terra, que permanece imóvel. Quem duvidará disso, se diariamente vemos o Sol
nascer, percorrer o céu e se pôr? A aurora não é o seu começo e o crepúsculo, seu fim?
As cores existem em si mesmas. Quem duvidará disso, se passamos a vida vendo rosas
vermelhas, amarelas e brancas, o azul do céu, o verde das árvores, o alaranjado da
laranja e da tangerina?

Poderíamos denominar esse saber de conhecimento espontâneo. Mas por que o


designamos “senso comum”? Porque consideramos o fato de ele trazer, em sua
1818

essência, características globais daquilo que chamamos conhecimento comum


dos homens, geralmente construído de modo imediato, a partir da observação,
das experiências, das vivências, das atividades humanas. Essa imediatidade é dada,
sobretudo, pelo fato de a realidade vivida não ser transparente à percepção humana,
isto é, pelo fato de as ações humanas e de os fenômenos em geral se apresentarem
aos homens como dados acabados, como resultado e não como um processo
de relações complexas e contraditórias. Daí a apreensão empírica das coisas, a
aparência de estático, de imutável das relações. Além disso, há o fato de o senso
comum apreender apenas o “aparente”, a “sombra”, aquilo que lhe parece “óbvio”
como sendo o real.

Empirismo: Conhecimento pelos sentidos, pela experiência sensível. Fala-se


em pesquisa empírica quando ela se apóia no exame sistemático do real ou o
submete à experiência (Laville e Dionne, 1999).

Porém, o senso comum não é algo desprezível e não deve ser confundido com
ignorância, pois trata-se do saber cotidiano disponível, com o qual organizamos
o nosso dia-a-dia. É um saber acumulado que orienta as nossas ações, mas,
obviamente, esse saber reveste-se de tradições, valores, preconceitos, tabus e
crendices. Será que a atitude científica é o contrário de tudo isso? Em que medida a
atitude científica se distingue do senso comum?

Você pode recorrer à obra de Chauí para aprimorar a distinção entre senso
comum e ciência.

De acordo com Chauí, a ciência distingue-se do senso comum porque enquanto este
representa uma opinião baseada em hábitos, preconceitos e tradições cristalizadas
19

a primeira baseia-se em pesquisas, investigações metódicas e sistemáticas. Ademais,


a ciência pauta-se na exigência de que as teorias sejam internamente coerentes e
digam a verdade sobre a realidade. Assim, ciência é conhecimento que resulta de
um trabalho sistemático, analítico e racional.

A crítica ao senso comum é, pois, um caminho para o conhecimento científico e


tem a finalidade de romper com as idéias dominantes arbitrariamente inculcadas
e disseminadas entre os indivíduos. Apesar de tudo, não nos podemos esquecer
de que todos estamos, irremediavelmente, imersos no mundo da vida. Nossa
experiência é toda ela experiência do mundo. Analisando e comparando as duas
atitudes, podemos percebê-las totalmente diferenciadas, mas não podemos eliminar
o senso comum e tomar uma decisão de pensar de forma totalmente racional.

Segundo Gramsci, na obra Concepção dialética da história, não existe diferença de


qualidade entre senso comum, filosofia e ciência, como se os dois últimos fossem
melhores que o primeiro. A diferença é de sistematização, de ordenamento
lógico. Entretanto, todos esses conhecimentos têm a mesma natureza, isto é, são
representações da realidade.

Podemos afirmar, com isso, que os fatos ou objetos científicos não são dados
empíricos espontâneos de nossa experiência cotidiana: eles são formulados, ou seja,
construídos pelo trabalho de investigação científica. A construção é uma operação
contínua em busca da “verdade”, nunca considerada acabada. A partir do momento
em que se conseguiu desprender o objeto da situação problemática na qual se
encontrava, ele não tarda a suscitar, por seu próprio funcionamento, novas questões
e objetos de pesquisa.

Em geral, que objetos de estudo você acredita que um pesquisador deve


investigar?

Essa indagação desafia profundamente o campo do lazer, geralmente considerado


objeto irrelevante no meio acadêmico. Magnani (2000) relatou as dificuldades
que enfrentou por eleger o lazer como objeto de estudo no seu doutoramento.
Ordinariamente, acredita-se que existem questões mais nobres e importantes a
serem investigadas, o que revela um grande preconceito acerca do lazer.
20
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Apesar da permanente necessidade de justificação como objeto relevante de


pesquisa, felizmente esse quadro começou a se alterar na sociedade contemporânea,
como evidencia o crescimento dos grupos de estudos e das pesquisas sobre o lazer,
dos trabalhos apresentados em congressos científicos, simpósios e seminários,
bem como sua inserção em programas e currículos de vários cursos, em diversos
âmbitos e níveis. Essas e outras iniciativas facilitaram uma aproximação do lazer aos
parâmetros científicos legitimados em nosso meio.

No diretório de grupos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e


Tecnológico (CNPq – www.cnpq.br) existem cadastrados, atualmente, 84 grupos
de pesquisa sobre o lazer, número bastante expressivo. Esses grupos contam com
a participação de pesquisadores de diversas áreas do conhecimento: educação
física, turismo, administração, educação, antropologia, etc.

A questão do que seja ou não “científico” é muito controversa e instiga calorosos


debates. Tal constatação evidencia que a dúvida constitui o cerne da ciência, e a
curiosidade, seu principal foco. Descartes, no livro Discurso sobre o método, explica
a dúvida como necessidade radical. A dúvida metódica é uma regra da pesquisa
científica muito difícil de ser vivida no cotidiano, mas essencial ao progresso do
conhecimento. Mesmo as proposições mais brilhantes são relativas às condições
de possibilidade de suas aplicação e, justamente por essa razão, estão sujeitas a
revisões periódicas.
Demo (1994), baseado em Habermas, também destaca que é impossível fazer
ciência sem duvidar e estabelecer polêmica, e, mesmo com as controvérsias que
a rondam, existem acordos que, tradicionalmente, permanecem. Como exemplo,
podemos citar alguns pressupostos da pesquisa científica: o questionamento, a
sistematização, a lógica, a argumentação, a análise e o rigor.
A pesquisa sobre qualquer tema, dentre os quais o lazer, precisa assentar-se sobre
esses pilares. A não-observância desses princípios compromete a legitimidade
científica do trabalho, ficando este à mercê do senso comum ou da ideologia. Do
21

primeiro, quando se reveste de ingenuidade, uma vez que aceita sem discutir, não
aplica ao conhecimento nele implicado suficiente sistematização questionadora. Da
segunda (ideologia), quando enfatiza o compromisso político de defesa de posições,
que lança mão de todos os recursos possíveis para justificar condições que se deseja
preservar, conformar, reduzir, ampliar, impor, distorcer ou ocultar. Sua relação básica
é estabelecida com o exercício do poder. Contudo, assim como a ciência, a ideologia
também pode ser questionadora, mas para justificar seus interesses. Por isso é preciso
ter bastante cuidado ao definir o tema e o objeto de estudo (Demo, 1994).
A título de ilustração, podemos citar alguns trabalhos que pretendem pesquisar a
importância do lazer na vida do trabalhador (ou do cidadão em geral), mas limitam-
se a ressaltar os benefícios que algumas práticas recreativas podem promover:
na recuperação da força de trabalho, na redução do número de acidentes e dos
níveis de absenteísmo, no aumento da produtividade, na manutenção da ordem
e na promoção de valores morais, educativos e sociais. Será que esses “benefícios”
indicam realmente a importância do lazer na vida do grupo investigado, ou refletem
interesses externos a ele?
Vejamos mais um exemplo: quando as investigações assumem o caráter de
“pesquisas de opinião”, ficam limitadas ao senso comum, e, por essa razão, não
podem ser reconhecidas como científicas. É o caso, por exemplo, de estudos que
pretendem verificar a concepção de lazer das pessoas em geral. Encaminhamento
muito complicado, porque, se a pesquisa ficar restrita à opinião, não irá além do
senso comum – conseqüentemente, não irá promover avanço no conhecimento.
Dessa forma, podemos observar que o questionamento característico do senso
comum ou da ideologia é bem diferente da atitude científica, por ser esta analítica,
sistemática, metódica e rigorosa.
Assim, fazer ciência é

[...] questionar com rigor, na acepção precisa de atitude sistemática cotidiana, não de
resultado esporádico, estereotipado, especial. Ademais, a ciência não se basta com
formalidades consideradas exemplares, como o uso da lógica. [...] Até mesmo o senso
comum usa de lógica, tal qual a ideologia sagaz, que sempre busca emergir como
necessidade lógica (Demo, 1994, p.17).
22
22

Como postulou Habermas (1987), no livro Conhecimento e interesse, somente pode


ser científico o que for discutível, o que implica ir além de meras reproduções do
conhecimento já acumulado e construído. O avanço e a capacidade de inovação
não advêm da repetição, e sim da discussão. Mas não basta que a ciência seja
crítica, ela também precisa ser criativa – preenchendo lacunas, descortinando novas
possibilidades, apontando outros aportes, caminhos e interpretações num infindável
processo de busca e pesquisa, de construção e reconstrução.

Sendo um processo de busca, a discordância crítica pode ser bem-vinda, desde que
não seja apenas para sustentar posições contrárias ou se manter cegamente fiel a uma
determinada teoria ou corrente de pensamento. Todavia, para divergir é necessário,
primeiramente, deter conhecimento profundo sobre o ponto questionado. Vale
lembrar que uma resposta divergente, por mais consistente e aprimorada que seja,
não encerra a discussão: apenas a recoloca, acrescentando novos elementos ao
debate. Qualidade formal e autocrítica sistemática são, portanto, condições básicas
para formar uma atitude científica.

A marca distintiva da atitude científica é o questionamento sistemático, que


valoriza principalmente os processos de elaboração argumentativa e de
reconstrução metódica (consistente e coerente), sistemática, crítica e criativa
do conhecimento.

1.2 O problema como ponto de partida


Neste momento, daremos continuidade à discussão tratando do ponto de partida
para qualquer pesquisa: o problema.

Entretanto, como você poderá verificar, o “problema” não é privilégio das pesquisas,
estando presente em nossa prática cotidiana. Valendo-se da linguagem humorística,
os quadrinhos a seguir revelam-nos a presença e a dimensão do(s) problema(s) em
nosso dia-a-dia (Quino, 1997, p. 404).
23

Além disso, Rizzini, Castro e Santos (1999, p. 26) advertem-nos que:

[...] Problema é um termo que pode ser usado com uma grande variedade de
sentidos no linguajar cotidiano. Em todos esses usos, no entanto, problema é um
dado imediato: ou identificamos um problema, ou alguém causa problemas, ou algo é
problema, enfim, não precisamos de grandes esforços para chegar ao problema e ele
nos parece sempre evidente.

Considerando sua pluralidade de sentidos, podemos recorrer ao trabalho de


Teixeira (2003) para diferenciar o problema da prática do problema de pesquisa. A
autora destaca que o “problema da prática” refere-se, em geral, às dificuldades, aos
desconfortos e/ou complicações presentes em nosso dia-a-dia, nos lugares, nas
situações e nos contextos em que nos encontramos. Em geral, são os fatos que
nos incomodam, os empecilhos, os desafios que temos a enfrentar e uma infinidade
de coisas difíceis que aparecem em nosso trabalho, questões que precisam ser
resolvidas, superadas ou solucionadas.

Embora o “problema da prática” seja freqüentemente a origem do “problema


de pesquisa”, eles são diferentes (Teixeira, 2003). Como visto, o “problema de
pesquisa” é formulado pelo pesquisador, além de apresentar-se e expressar-se de
modo diferente do “problema da prática”: enquanto nós o vemos e o sentimos, o
“problema de pesquisa” é construído, é pensado pelo pesquisador.
24
24

Para aprofundar um pouco mais sobre a questão do problema de pesquisa,


imaginemos que um profissional do lazer esteja fazendo um projeto para um trabalho
de intervenção. Até aqui, o profissional não tem um problema de pesquisa: tem,
antes, o desafio de desenvolver bem o seu trabalho. Contudo, se ele acrescentar
a este trabalho uma questão analítica para estudo, formulando um problema de
pesquisa, seu projeto de trabalho no cotidiano profissional poderá impulsionar a
realização de uma pesquisa.

Como assinala Bachelard (1996, p.18):

Em primeiro lugar, é preciso saber formular problemas. E, digam o que disserem,


na vida científica os problemas não se formulam de modo espontâneo. [...] Todo
conhecimento é resposta a uma pergunta. Se não há pergunta, não pode haver
conhecimento científico.

A definição do problema de pesquisa, que podemos chamar, também, de questão


analítica, diferentemente do problema da prática, supõe a formulação de boas
perguntas que podem nos dar bases e elementos para pensarmos, entendermos
e, posteriormente, atuarmos tentando solucionar o problema da prática ou propor
novas soluções para os desafios da realidade cotidiana. De acordo com Teixeira
(2003), um profissional terá melhores condições para enfrentar seu problema da
prática em relação ao seu ambiente de trabalho à medida que, por meio de suas
interrogações, conseguir entender como e por que acontecem.

O problema de pesquisa procura entender, desvelar, compreender ou destrinchar o


que se passa na realidade, em relação a um problema da prática ou a um desafio a
ela relacionado. Teixeira (2003) aponta que o problema de pesquisa é uma questão
analítica, que tenta estabelecer relações entre fatos, que analisa os processos que
constituem os fatos e os fenômenos, tentando compreender suas configurações,
suas determinações e processualidades, tentando entender seus significados e/ou as
formas como se processam.

De acordo com Laville e Dionne (1999), a construção de um bom “problema


de pesquisa” supõe a formulação de boas perguntas, de perguntas significativas e
relevantes para a análise e a compreensão dos fatos e dos fenômenos estudados.
25

Algumas perguntas podem auxiliar esse exercício: Qual a origem de uma dada
situação ou problema? Quais as possíveis causas de um determinado problema,
dificuldade ou situação? A quem tal dificuldade atinge e de que modo? Essa situação
relaciona-se com quais outras ou com que fatos ou circunstâncias? Como essa
situação ou dificuldade se constitui? Que processos os produzem? Quais são os
aspectos, as dimensões e os fatores que interferem na pesquisa?

Em suma, as boas perguntas começam a formar o esboço do problema de pesquisa,


que pode conter uma única questão analítica ou um conjunto de questões, de
aspectos, de dimensões ou de facetas do problema da prática ou da situação
considerada.

Muitas vezes, a elaboração de boas perguntas pode exigir uma análise prévia da
situação e até mesmo uma espécie de pesquisa ou estudo anterior. Isso quer dizer
que a construção, a definição ou a formulação do problema de pesquisa podem gerar
a necessidade de explorar preliminar e informalmente a situação, para possibilitar a
formulação de um conjunto completo de boas perguntas de estudo, ou seja, de uma
problematização fecunda e adequada.

Para atender ao objetivo da investigação, Laville e Dionne (1999) sugerem uma série
de reflexões que ajudariam a construir o problema que pode se tornar seu objeto
de pesquisa.

Para formular seu problema de pesquisa, procure refletir sobre as seguintes


questões:
• Por que este problema merece ser pesquisado?
• Que benefícios podem ser obtidos com a pesquisa em relação à situação
original?
• Já se pode vislumbrar o que seria desejável obter como explicação,
compreensão e informações após se ter estudado o problema? Em outras
palavras, você já tem em vista uma hipótese para ser explorada?
26
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Um problema bem definido e bem construído pode gerar uma boa pesquisa,
enquanto um problema mal delimitado pode dificultar e prejudicar a qualidade
da investigação. Construir um problema de pesquisa é tarefa do pesquisador, e
os problemas não estão prontos para ser investigados. De acordo com Laville e
Dionne (1999), eles são criados pelo pesquisador para serem pesquisados, embora
sempre partam de situações ou de problemas existentes no mundo da natureza ou
da cultura, da sociedade, da vida social.

Essa primeira etapa do planejamento de uma investigação é tão importante que


será retomada. Antes, contudo, consideramos essencial esclarecer alguns aspectos
relacionados ao projeto de pesquisa e à monografia que você deverá desenvolver
neste curso de especialização.

1.3 O projeto de pesquisa e a monografia


No tópico 1.1, você teve a oportunidade de refletir sobre o senso comum,
compreendendo as razões que o diferenciam do conhecimento científico.

Daremos continuidade ao processo apontando, inicialmente, as características de


um projeto de pesquisa, que é a primeira etapa para obter um conhecimento
sistematizado acerca da realidade. Ou seja, o projeto é a “espinha dorsal” que
irá orientar o desenvolvimento de seu trabalho monográfico. Assim, o projeto de
pesquisa consiste em um documento que explicita as ações que serão realizadas ao
longo do estudo.

O projeto deve possuir uma seqüência lógica, e todas as fases da pesquisa precisam
estar entrelaçadas e direcionadas para o mesmo objetivo. Assim, o projeto de
pesquisa precisa responder às seguintes perguntas:

1. O que fazer? (tema e problema)

2. Por que fazer? (justificativa)

3. Para que fazer? (objetivo)


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4. Onde fazer? (campo da pesquisa)

5. Como fazer? (metodologia)

6. Com o que fazer? (recursos)

7. Quando fazer? (cronograma, especificando quando é que cada ação será


desenvolvida)

Apesar de os itens anteriores não destacarem a questão da fundamentação teórica,


é essencial que se tenha em mente que não existe pesquisa sem teoria. Portanto,
será necessário lançar mão do conhecimento produzido na área do lazer para
fundamentar seu projeto e a pesquisa como um todo.

Que tal discutirmos essa questão de modo mais detalhado? Nossa proposta é tecer
considerações que envolvam a produção do trabalho monográfico como um todo,
e não contemplar apenas a estrutura de um projeto de pesquisa. Mas partimos do
pressuposto de que você já sabe que uma monografia só será bem desenvolvida a
partir do momento em que você conseguir planejar as ações, e por essa razão a
composição de um projeto de pesquisa torna-se essencial.

Segundo Teixeira (2003), em geral, o processo de elaboração de uma pesquisa


envolve três etapas distintas, porém indissociáveis, quais sejam: (1) o planejamento
da investigação, no qual é construído o processo de pesquisa; (2) a realização da
pesquisa planejada; (3) a redação do relatório final do estudo, isto é, o texto da
monografia propriamente dita. Cada uma dessas etapas envolve um conjunto de
atividades específicas. Chamamos de estrutura básica de pesquisa – e, portanto, de
monografia – a organização dos elementos que orientam a reflexão e a prática do
pesquisador na construção e no estudo do problema investigado.

Monografia é uma dissertação ou estudo minucioso que se propõe a desenvolver


determinado problema relativamente restrito. Em outros termos, a monografia é
um tipo de trabalho científico sobre um único problema, composta por três partes:
introdução (que contempla a problematização, justificativa do estudo, hipótese e
objetivo), desenvolvimento (composta pela fundamentação teórica e metodológica,
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28

que permite planejar e desenvolver o estudo por meio da coleta/análise dos dados)
e conclusão (que abarca, além da resposta ao problema de pesquisa, perspectivas
de avanço no campo de estudo), seguida das referências bibliográficas citadas
no trabalho, conforme as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas
– ABNT (França e Vasconcellos, 2004). Em suma, a monografia é a sistematização
escrita de uma pesquisa realizada dentro dos padrões de cientificidade, que trata
de desenvolver ou estudar um problema delimitado e construído pelo próprio
pesquisador.

Assim, a monografia insere-se no campo da produção dos conhecimentos


científicos. Sua elaboração representa os primeiros passos de iniciação nos caminhos
da construção da ciência, tornando-o autor de novos saberes. No entanto, a
monografia não é um trabalho simples; ao elaborá-la, os estudantes devem ter a
colaboração de professores orientadores.

Você poderá estar se perguntando: que assuntos ou temas devem ser estudados,
ou ainda que tipos de problemas podem dar origem às monografias do curso de
Especialização em Estudos Avançados em Lazer?

Pelo que foi exposto, já devem ter ficado claras, para você, algumas das razões pelas
quais a monografia é um tipo de pesquisa científica que envolve o estudo de um
problema. Toda pesquisa científica – e, portanto, toda monografia – deve delimitar
um objeto de estudo, um problema, por meio de um processo de problematização.
Não há pesquisa sem problema, e, dependendo do tipo de questão a ser investigada,
dos propósitos e do contexto da investigação, teremos uma ou outra modalidade de
pesquisa monográfica, como você verá a seguir.

1.4 Relação entre o tema e o problema de pesquisa


Um problema de pesquisa localiza-se em um campo temático, isto é, encontra-
se dentro de um assunto mais amplo. Assim, não devemos confundir o tema da
investigação com o problema. A pesquisa não estuda temas, mas sim problemas
específicos. Assim sendo, um mesmo tema pode gerar vários problemas de pesquisa,
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cada um deles investigado em uma pesquisa específica. Por isso é fundamental a


delimitação do problema de pesquisa.

Na linguagem corrente, confunde-se, por vezes, erroneamente, os termos


problema e problemática. Você sabe qual é a diferença entre essas palavras?
Problemática, na realidade, é o quadro no qual se situa o problema. Não se
pode dizer “tenho uma problemática”. Por outro lado, pode-se dizer “essa
situação é problemática”, utilizando então a palavra problemática como adjetivo
– especificando eventualmente seu problema e, portanto, estabelecendo uma
problemática (Laville e Dionne, 1999).

Para elaborar um “problema de pesquisa”, o passo inicial é fazer um recorte, definir


precisamente os aspectos que serão estudados. O que pesquisamos, portanto, são
partes de um tema ou um recorte de um assunto. E ao delimitarmos o problema
de pesquisa estaremos, também, estabelecendo as fronteiras da investigação
(selecionando o que entrará ou não na pesquisa) e orientando os critérios de
inclusão–exclusão para a seleção das informações relevantes para a pesquisa.

O problema de pesquisa precisa ser formulado de forma interrogativa, ser claro,


preciso e passível de solução.

Essas opções precisam ser justificadas, preferencialmente ressaltando sua relevância.


Dessa forma, é importante destacar as motivações que levaram à escolha do tema,
situando-o num quadro teórico referencial; especificar o nível de abrangência da
pesquisa, salientar elementos inovadores que serão trabalhados pelo pesquisador,
bem como a necessidade de realização da pesquisa.
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30

De acordo com Denker (2003), a justificativa do estudo poderá conter:


• os motivos que levaram à escolha do tema;
• especificação do nível de abrangência da pesquisa;
• definição clara do que vai ser abordado, bem como dos aspectos a serem
considerados;
• referência aos aspectos originais da pesquisa;
• destaque dos elementos inovadores que serão trabalhados pelo pesquisador;
• vínculo do tema com um quadro teórico referencial;
• explanação sobre a viabilidade de execução da proposta;
• relevância, utilidade e necessidade de realização da pesquisa.

No processo de escolha e definição do seu objeto de estudo, é também importante


ressaltar a questão da pertinência ao campo do lazer. Ou seja, tanto o tema como
o problema da pesquisa precisam ter relação direta com uma determinada área de
conhecimento ou campo de estudos. É necessário, desse modo, que você justifique a
importância de seu estudo para a área do lazer, destacando as possíveis contribuições
que ele irá gerar para o processo de produção de saberes neste campo.

1.5 Os objetivos
Ao tratar do problema de pesquisa, inevitavelmente nós estaremos nos referindo
aos objetivos da investigação. Por serem aquilo que se pretende conhecer com a
pesquisa, seus objetivos articulam-se estreitamente com as questões de estudo ou
com o problema a ser investigado. Em geral, só variam as formas de escrever um
e outro: geralmente, o problema é apresentado na forma de indagações, e o(s)
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objetivo(s), em ações concretas com caráter afirmativo, sendo o verbo comumente


colocado no modo infinitivo. Dito de outra maneira, o objetivo e o problema da
pesquisa possuem relações estreitas e, em muitos casos, repetem-se.

A seguir você encontrará, como exemplo, algumas informações sobre a


problematização e os objetivos da pesquisa de Gomes (2003). Observe como há
uma correspondência entre as questões norteadoras do estudo e os objetivos.

O Problema

Gomes (2003) destacou que a obra Lazer operário, de Ferreira (1959), é considerada
o primeiro livro brasileiro sobre o lazer, mas esse reconhecimento precisava ser
repensado. Na introdução, o próprio Ferreira esclarecia: “Trabalho pioneiro, pois
não encontrei outro com o enfoque [sociológico e urbanístico] em que o situamos”
(p.10). Citou, em nota de rodapé alguns trabalhos nacionais “sobre o lazer e suas
atividades”: “Exceção dos trabalhos de Inezil Marinho, Arnaldo Sussekind, Ethel
Bauzer Medeiros e de mais alguns poucos estudiosos, nada conseguimos encontrar
sobre o assunto” (Ferreira, 1959, p.13).

Possivelmente, publicações da primeira metade do século XX que tratavam da


recreação (livros, matérias publicadas em jornais, revistas e periódicos especializados)
poderiam ter desenvolvido reflexões sobre o lazer. Em face dessa constatação,
questionamentos foram elaborados: Que matrizes de pensamento permearam a
construção dos significados de recreação e de lazer no contexto da primeira metade
do século XX? Quando, como e por que o lazer foi analisado, nessa época, pelos
autores brasileiros envolvidos com a produção de conhecimentos sobre a recreação?

Levantamentos preliminares indicavam que muitos dos autores que realizaram


estudos sobre a recreação eram profissionais que estavam liderando políticas
públicas. Como recreação e lazer são palavras que, freqüentemente, se mesclam
em muitos empreendimentos desenvolvidos no país, a pesquisadora indagou: Que
trajetórias foram percorridas pela recreação e pelo lazer no contexto brasileiro nas
primeiras décadas do século XX? O que as experiências institucionais, desenvolvidas
no âmbito das políticas públicas, revelam sobre as semelhanças e as singularidades
da recreação e do lazer?
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Os Objetivos
Objetivo geral: Analisar as trajetórias percorridas pela recreação e pelo lazer no
Brasil, focalizando os significados incorporados por ambos, neste contexto, a partir
da produção de conhecimentos sobre o assunto.

Objetivos específicos:

a) Compreender as matrizes de pensamento que influenciaram a construção dos


significados de recreação e de lazer no âmbito das políticas públicas, por meio
do estudo de experiências institucionais desenvolvidas nas primeiras décadas do
século XX.

b) Analisar os autores, e seus discursos, envolvidos com a produção de conhecimentos


sobre a recreação até a década de 1960, procurando compreender os significados
de lazer neste contexto, bem como relações constituídas com a recreação
(Gomes, 2003).

Ao definir os objetivos do estudo, o pesquisador estabelece o que espera conseguir


com sua investigação e onde pretende chegar com a proposta. Os objetivos devem
ser explicitados de maneira clara, correlacionada com o problema proposto. Caso
necessário, os objetivos podem ser divididos em gerais e específicos, e estes últimos
dizem respeito a aspectos mais particulares do estudo.

Vale destacar que os objetivos podem ser reformulados, descartados ou acrescidos


de outros no decorrer da pesquisa. Mas essa flexibilidade não exclui a necessidade
de formulação dos objetivos desde o início do projeto.

1.6 As hipóteses
Da mesma maneira que os objetivos estão diretamente relacionados ao problema
de pesquisa, as hipóteses também são parte da problematização do tema. Contudo,
uma pesquisa pode conter ou não uma hipótese, isto é, pode haver pesquisa sem
hipótese (por exemplo, os chamados estudos exploratórios, como você verá mais
adiante na Unidade 2).
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A hipótese é uma suposição acerca do problema, ou questão analítica, que está


sendo investigado. É uma conjectura, uma possível resposta para o que está sendo
perguntado na pesquisa. A hipótese ainda não é uma verdade, uma certeza, mas sim
uma possibilidade a ser averiguada, podendo ser confirmada ou negada no decorrer
da pesquisa. Por esse motivo, a hipótese é uma afirmação provisória a respeito de
determinado fenômeno em estudo – devendo, portanto, ser apurada.

A formulação de hipóteses é complexa, pois exige sólido conhecimento prévio


acerca do problema. Além disso, demanda maior sofisticação metodológica e maior
experiência em pesquisa, seja para formular uma ou mais hipóteses adequadas ao
problema, seja para desenvolvê-la(s) na pesquisa.

A hipótese é uma suposição, uma resposta provável que se faz na tentativa de


responder ao problema.

A hipótese não é uma opinião ou idéia isolada do pesquisador, mas sim uma
afirmação a partir de bases sólidas, fundamentadas nas teorias existentes.

Ainda tomando como exemplo a pesquisa de Gomes (2003), mesmo que a


hipótese não tenha sido explicitada, nas entrelinhas do texto é possível observar que
a autora acreditava que a obra Lazer operário, de Acácio Ferreira, não representava
a primeira publicação a tratar especificamente sobre o lazer no Brasil. Na conclusão
do seu estudo, a autora afirma justamente isso.

Vale destacar que a natureza ou o tipo de “problema de pesquisa” irá orientar nossas
escolhas quanto aos procedimentos metodológicos a serem utilizados na investigação:
quem será investigado, por meio de que recursos os dados serão coletados, dentre
outras decisões a serem tomadas. Essas questões, no entanto, serão tratadas
posteriormente. Antes de explorarmos os aspectos metodológicos, consideramos
essencial discutir a base teórico-conceitual que fundamentará a pesquisa.
34
34

1.7 Base teórico-conceitual da pesquisa


A construção da base teórico-conceitual para uma pesquisa faz-se por meio do
estudo de teorias e pesquisas já realizadas acerca do problema e da temática que
está sendo pesquisada. Ao fazermos uma pesquisa, deveremos buscar os estudos e
as teorias já existentes sobre o assunto investigado.
Essa base trata-se de um conjunto de idéias, conceitos e categorias de análise
presentes nas teorias que fundamentam o objeto estudado. É um conjunto de
explicações científicas que nos ajudam a analisar, compreender e desvelar o problema
que estamos pesquisando com o rigor, a profundidade e a validade exigidos nos
trabalhos científicos e acadêmicos.
Nessa fase de fundamentação da pesquisa – muitas vezes organizada em uma seção
específica, denominada “marco teórico” – busca-se adquirir conhecimentos a partir
de uma revisão da literatura existente sobre o lazer. Procuram-se pesquisas similares
sobre o tema estudado, conceitos, explicações e modelos teóricos existentes com
o objetivo de situar a pesquisa no contexto geral do conhecimento. Essa revisão
de literatura deve ser sintética e crítica, indicando lacunas nos estudos anteriores,
bem como os conceitos e as teorias considerados “clássicos” no campo pesquisado
(Denker, 2003).
Mas o que é uma teoria?
Segundo Minayo (1996, p. 91-92), teoria é “um conjunto inter-relacionado
de princípios e definições que servem para dar organização lógica a aspectos
selecionados da realidade empírica”. Ainda segundo esta autora, “uma teoria
reúne um conjunto de pressupostos e axiomas, proposições logicamente inter-
relacionadas e empiricamente verificáveis”. A essência de uma teoria consiste na
sua potencialidade de explicar uma gama de fenômenos por meio de um esquema
conceitual que seja, simultaneamente, sintético e abrangente.
Dessa maneira, podemos afirmar que a pesquisa precisa conter um conjunto
sistemático de conceitos que formem a teoria geral dos fenômenos estudados, que
controlem e guiem seu andamento – além de ampliá-la com novas investigações – e
permitam a previsão de fatos novos a partir dos já conhecidos.
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As teorias têm seus conceitos, mas o mesmo conceito pode relacionar-se a mais
de uma teoria, caso em que adquire significados parcial ou totalmente diversos em
cada teoria. O conceito de lazer, por exemplo, pode ter diferentes significações,
dependendo do autor referenciado e da teoria considerada. O importante é
manter a coerência e a consistência teórica dos conceitos e dos pressupostos
desenvolvidos no estudo.

Minayo (1996) observa que os conceitos são as vigas mestras de uma construção
teórica, isto é, são as unidades de significação que definem a forma e o conteúdo
de uma teoria. Podemos considerá-los como operações mentais que refletem
certo ponto de vista a respeito da realidade, pois focalizam determinados
aspectos dos fenômenos, hierarquizando-os. Dessa forma, eles se tornam um
caminho de ordenação da realidade, de olhar os fatos e as relações e, ao mesmo
tempo, um caminho de criação.

Ainda sobre as teorias e seus conceitos, devemos lembrar que eles não são válidos
para sempre. Podem e devem ser questionados, problematizados e reformulados
pelas pesquisas que os tomam como referencial. Nesse sentido, é pertinente a
seguinte afirmação:

É fundamental que se tenha em mente que não existe pesquisa sem teoria. A teoria
é a base sobre a qual desenvolvemos o modelo de explicação que testamos com a
pesquisa. É a partir da teoria que definimos nosso objeto, formulamos nossas hipóteses
e escolhemos os modelos e os métodos apropriados de análise (Denker, 2003, p.69).

O referencial teórico é um pré-requisito para qualquer tipo de pesquisa, pois servirá


como base para uma futura explanação a respeito do tema proposto. Sem esta, não
é possível realizar um trabalho satisfatório, uma vez que não será possível organizar
um texto coeso e de argumentação consistente.

Em síntese, na pesquisa, lançamos mão de teorias e conceitos para entender e


analisar em profundidade o problema que pretendemos investigar. Toda pesquisa
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36

deverá ter, desse modo, uma base teórico-conceitual para dar sustentação ao
estudo. Caso contrário, ficará limitada aos conhecimentos da experiência, do senso
comum ou das nossas pré-noções, que não têm cientificidade, não têm rigor nem a
profundidade exigida de um conhecimento científico. Em contrapartida, vale lembrar
que toda pesquisa busca discutir, confirmar, ampliar ou refutar, total ou parcialmente,
as teorias e os conceitos que constituem seu referencial.

Para viabilizar a construção da base teórico-conceitual e analítica de uma pesquisa,


um meio insubstituível é a revisão da produção científica existente sobre o problema
a ser investigado – revisão de literatura, revisão bibliográfica, ou ainda o chamado
“estado da arte”. Essa revisão consiste no levantamento e no estudo de teorias,
autores e/ou pesquisas que já abordaram o problema que pretendemos investigar,
de modo que possamos tomar conhecimento do que existe a respeito desse campo
de estudo.

Revisão de literatura
Esta é a primeira etapa de qualquer processo de pesquisa. Consiste em realizar
um estudo a respeito de um tema referente ao problema de pesquisa escolhido.
Essa busca deve contemplar um referencial teórico e a análise de outras pesquisas
que seguiram a mesma linha proposta pelo pesquisador. A revisão da literatura
é essencial para qualquer tipo de pesquisa realizada, pois ela permite uma
reflexão a respeito dos objetivos propostos para a concretização do trabalho. O
objetivo de analisar as pesquisas que já foram concluídas não é o de “reproduzir”
o que foi feito, e sim o de gerar um senso crítico a respeito do assunto. Isso
contribui para que o pesquisador seja capaz de avaliar o próprio trabalho que
está desenvolvendo. Além disso, análises de experiências já realizadas podem
evitar que a pesquisa trate de questões já investigadas em outros estudos.

Além de ajudar-nos a não perder tempo, estudando o que foi pesquisado, a revisão
da literatura auxilia-nos a construir a base teórico-conceitual de que necessitamos
37

para dar suporte à análise do problema que iremos investigar. Essa atividade é
fundamental para que possamos reelaborar e especificar melhor o problema de
pesquisa e situá-lo no tempo e no espaço, se for o caso.

A revisão da literatura não deve ser confundida com pesquisa bibliográfica, pois
ela tem como finalidade um domínio dos termos utilizados para o tema proposto.
Em uma pesquisa bibliográfica, a literatura referente ao tema possui conotação
diferenciada, uma vez que constitui o próprio objeto de estudo. Essa questão
será retomada na Unidade 2.

Como você pode perceber, o processo de pesquisa não é linear: precisamos ter
algumas referências de um campo de estudo para escolher um tema de pesquisa
e nele recortar um problema relacionado com a nossa prática ou com os nossos
interesses. Precisamos ter um problema para selecionar a bibliografia pertinente,
mas temos de estudar essa bibliografia para aprofundar conhecimentos, chegar a
uma formulação mais precisa do problema e, se for o caso, formular hipóteses que
orientarão o estudo.

À medida que esses aspectos forem definidos, você poderá estruturar o arcabouço
teórico-metodológico de sua pesquisa. Esse será o assunto tratado na Unidade 2.

Reveja o pré-projeto que você desenvolveu para se inscrever no curso de


especialização e tente responder estas questões:
De onde surgiu o interesse em estudar este tema? Por que você pretende
desenvolver essa pesquisa e qual será sua contribuição para o campo de estudos
do lazer? Qual o problema da pesquisa? Você tem alguma hipótese a respeito do
problema? Que objetivos pretende alcançar? Que autores e teorias podem auxiliar
a contextualizar o objeto e a constituir a base teórico-conceitual do estudo?
2
O processo
Unidade
de pesquisa:
dimensão
metodológica
40
40
41

UNIDADE 2 - O PROCESSO DE PESQUISA :


DIMENSÃO METODOLÓGICA

A dimensão metodológica da pesquisa constitui mais uma viga sobre a qual ela se
sustenta, podendo ser discutida a partir de diferentes perspectivas, como indicam os
diversos livros dedicados ao assunto. Quando falamos de metodologia de pesquisa
estamos tratando de um conjunto de procedimentos que inclui vários aspectos, que
se referem a “como” fazer sua pesquisa monográfica.

Outros livros de metodologia de pesquisa podem ser consultados para que você
aprofunde conhecimentos sobre a questão. Seguem algumas sugestões: Kipnis,
(2003); Laville e Dionne (1996); Alves-Mazzotti (1998); Bogdan e Biklen
(1994).

Neste texto, ao nos referirmos à dimensão metodológica do processo de pesquisa,


trataremos basicamente das abordagens, dos métodos de procedimento, dos
tipos e técnicas operacionais para a realização da pesquisa, de modo que explicite
claramente onde, quando, com quem e de que forma será realizada a investigação.
Nosso intuito é auxiliar você a construir as bases metodológicas para o planejamento
de sua pesquisa (projeto) e seu posterior desenvolvimento (monografia).
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A princípio, devemos salientar que diferentes tipos de problema requerem diferentes


modalidades de pesquisa, que, por sua vez, exigem distintos encaminhamentos
metodológicos. É também necessário ter claro e saber justificar por que serão
usados esses ou aqueles procedimentos e que tipo de informação a técnica ou o
instrumento escolhido poderá oferecer.

Devemos lembrar, ainda, que os procedimentos metodológicos da pesquisa não


representam um “pacote” pronto e acabado, podendo ser criados, recriados e
combinados pelos pesquisadores. A criatividade e a experiência do pesquisador são
tão necessárias em uma pesquisa quanto a teoria e as técnicas de coleta e análise
de dados.

Na discussão sobre a dimensão metodológica da investigação, consideramos


necessário iniciar tratando da intercomplementariedade entre as abordagens de
pesquisa.

2.1 Abordagens de pesquisa: a questão da intercomplementariedade


Adotando-se uma classificação bastante abrangente, podemos dizer que há duas
grandes abordagens (ou paradigmas) de pesquisa: a abordagem quantitativa e a
abordagem qualitativa. Elas se diferenciam não apenas pela sistemática peculiar a
cada uma delas, mas, sobretudo, pela maneira de formular e de tratar o problema.
Normalmente, é a natureza do problema ou seu nível de profundidade que definirá
a escolha da abordagem, isto é, se o problema deverá ser tratado pela vertente
qualitativa, pela quantitativa ou por ambas.

O conceito de paradigma foi proposto por Thomas Kuhn no livro A estrutura das
revoluções científicas (1982).
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Podemos analisar essas abordagens utilizando o critério de distinção relacionado


à matriz epistemológica que lhes dá sustentação. Dessa forma, tem-se, assim, de
um lado a tendência positivista qualificada de padrão para as ciências naturais, que
se apóia em algumas proposições: a) considerar a realidade como formada por
partes isoladas (variáveis); b) somente aceitar a realidade dos fatos que podem ser
observados, buscando a relação entre estes (excluindo sentimentos, percepções,
interpretações, valores culturais); c) considerar verdadeiro aquilo que é verificável,
não se preocupando em saber para que ou para quem aquele conhecimento irá
servir (crença na neutralidade da ciência); d) acreditar que tanto os fenômenos da
natureza quanto aqueles sociais são regidos por leis invariáveis, que podem ser
conhecidas pelo pesquisador; e) pretender a generalização dos resultados, por meio
de tratamento estatístico e controle de variáveis.

O termo positivismo foi elaborado a partir de Auguste Comte, que considerava a


ciência da natureza como o paradigma de todo o conhecimento. É uma posição
teórica que defende a possibilidade de um conhecimento “objetivo” do mundo,
no sentido de um conhecimento verdadeiro, quer se trate do mundo social ou
do mundo físico, num processo de transferência dos métodos das ciências da
natureza para as ciências humanas. Para o positivismo, somente o modelo fisíco-
matemático seria válido, porque estabelece as regras de verificação a partir de
uma base empírica sólida, construindo dessa forma o conhecimento científico,
garantindo a objetividade da ciência.

De outro lado, situam-se as ciências humanas e sociais, que não se “enquadram”


nesse modelo por considerá-lo reducionista, uma vez que o positivismo enxerga
a realidade apenas por meio dos fatos observáveis e quantificáveis. Resgatando a
dimensão interpretativa dos fatos observados, essa outra tendência foi denominada
qualitativa. Respaldada pela fenomenologia, essa linha de trabalho defende que
a pesquisa não deve desprezar a intencionalidade, a consciência e a paixão e o
desejo que move o sujeito. Portanto, a realidade não poderia estar separada da
subjetividade, nem dos sujeitos pesquisados, nem do próprio pesquisador.
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Fenomenologia é o estudo dos fenômenos ou de um conjunto de fenômenos na


sua essencialidade. Trabalha com aquilo que faz sentido para o sujeito, com o
que se apresenta como significativo ou relevante no contexto no qual a percepção
e a manifestação ocorrem.

Esses dois grupos de abordagem podem ser considerados paradigmáticos, no


sentido de que correspondem a pontos de partida e a programas de pesquisa
distintos. Isso não quer dizer que não existe a possibilidade de trabalhar com a
complementariedade das duas abordagens. Contudo, por ser uma proposta mais
arrojada, de maior complexidade, traz maiores desafios aos pesquisadores.

Apesar desse desafio, vamos inverter a lógica da oposição entre as abordagens


examinando o tema da intercomplementariedade entre quantitativa e qualitativa.
Dito de outra forma: quais seriam as possibilidades de tratarmos um tema de
pesquisa utilizando a metodologia quantitativa, que observa, compara e mede, e a
metodologia qualitativa, que observa, interpreta e compreende?

Não podemos abordar esse desafio sem pensar nas trajetórias da pesquisa
contemporânea, que se têm caracterizado por uma multiplicidade de correntes
científicas e filosóficas. Essa característica, expressão do esgotamento do modelo
lógico-formal de fazer ciência, torna difícil, senão impossível, enquadrar o
pensamento contemporâneo em um modelo de conhecimento. Num primeiro
momento, isto é o que se denomina crise dos paradigmas. Essa crise, que ainda tem
como referência a noção de modelo, manifesta-se na pergunta: Qual o modelo,
o paradigma científico, mais adequado para se conhecer a realidade? Kuhn (1982)
defendia a idéia de que um modelo ou paradigma se refere a um conjunto de
crenças e argumentos defendidos por um grupo de cientistas, não sendo a “verdade”
absoluta ou o sinônimo de “ciência”.
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Alguns teóricos já realizam um trabalho bastante consistente na linha


transdisciplinar. Seria interessante conhecê-los. Seguem-se dois exemplos:

MORIN, Edgard, A religação dos saberes: o desafio do século XXI. Rio de


Janeiro: Bertrand Brasil, 2004.
SANTOS, Boaventura de Souza (Org.). Conhecimento prudente para uma vida
decente: “Um discurso da ciência” revisitado. São Paulo: Cortez, 2004.

Uma das dificuldades dos pesquisadores é abordar essa crise em seus aspectos
epistemológicos e fazer escolhas coerentes (Amaral, 2001). E quando se trata
da escolha de metodologia de pesquisa, é necessário examinar as posições dos
pesquisadores diante do tipo de relação que pode existir entre as metodologias
qualitativas e as quantitativas, verificando a possibilidade de compatibilizá-las
ou não. A maior parte dos autores considera essa acomodação insustentável
– afirmam que existe uma descontinuidade e um conflito entre os dois “tipos” de
abordagem, persistindo a rivalidade de paradigmas, e um não é jamais convocado
a substituir o outro.

Alves-Mazzoti (1998) trata desse tema de forma muito interessante.

Entretanto, existe um bom número de teóricos que sustentam essa compatibilidade.


Por exemplo, André (2002) insiste sobre as convergências que existem entre as
diferentes abordagens de observação. A autora aceita a possibilidade de combinar
essas abordagens numa mesma proposta. Goldenberg (2001) também aborda a
questão da possibilidade de integração entre as abordagens e aponta Max Weber,
que acreditava que se podia tirar proveito da quantificação na sociologia, desde que
46
46

esse método se mostrasse fértil para a compreensão de um determinado problema.


Como nenhum pesquisador tem condições para produzir um conhecimento
completo da realidade, diferentes abordagens de pesquisa poderiam projetar luz
sobre diferentes questões. Assim, são as formas diferenciadas de coletar e analisar os
dados (qualitativa e quantitativamente) que permitem uma idéia ampla e inteligível da
complexidade de um problema.

Em contrapartida, Milles e Huberman (1991) advertem-nos sobre a distância


que existe entre o nível do discurso, no qual a abordagem qualitativa pode ser
julgada irreconciliável com a abordagem quantitativa, e o nível da prática da
pesquisa, no qual muitas vezes os pesquisadores combinam as duas perspectivas.
De fato, embora vários pesquisadores considerem não fundadas as pretensões
de complementariedade entre as abordagens quantitativa e qualitativa, julgando
equivocados os resultados de pesquisa obtidos pela mistura dos dois tipos de
abordagem, uma análise das pesquisas produzidas por pesquisadores reivindicando
uma ou outra das perspectivas epistemológicas permite constatar que, na prática da
pesquisa, a maioria dos pesquisadores recorre à combinação das duas perspectivas.
Por um lado, os estudos quantitativos utilizam as abordagens fenomenológicas
para complementar as entrevistas e os questionários estruturados; por outro lado,
um número crescente de pesquisas etnográficas serve-se de quadros conceituais
preestabelecidos.

Dessa forma, a integração entre as pesquisas quantitativa e qualitativa permite que


o pesquisador faça um cruzamento de suas conclusões no intuito de ter maior
confiança de que seus dados não são produto de um procedimento específico ou
de alguma situação particular. Ele não se limita ao que pode ser coletado em uma
entrevista: pode entrevistar repetidamente, pode aplicar questionário, pode investigar
diferentes questões em diferentes ocasiões, pode utilizar fontes documentais e, até
mesmo, dados estatísticos.
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Embora vários pesquisadores considerem não fundadas as pretensões de


complementariedade entre as abordagens quantitativa e qualitativa e julguem
equivocados os resultados de pesquisa obtidos pela mistura dos dois tipos de
abordagem, uma análise das pesquisas produzidas reivindicando uma ou outra
das perspectivas epistemológicas permite constatar que na prática a maioria dos
pesquisadores recorre à combinação das duas perspectivas.

Em resumo, a tese de uma distinção entre qualitativo e quantitativo está cada vez
mais difícil de ser sustentada, pois tanto a abordagem de base positivista como
a abordagem interpretativa de base fenomenológica não são necessariamente
excludentes. Existem possibilidades de uso qualitativo da pesquisa quantitativa e vice-
versa. Se for preciso conhecer o panorama da situação atual de um determinado
segmento da população, posso buscar respostas quantitativas, ou seja, uma amostra
representativa dessa população, com controle de variáveis interpretando os dados.
Por exemplo, sobre o lazer na terceira idade, posso obter dados concretos sobre
essa população e fazer posteriormente uma leitura qualitativa.

Desse modo, em um primeiro momento, a investigação quantitativa pode dar um


panorama da situação. Em um segundo momento, a investigação qualitativa pode
auxiliar a detectar a rede de vivências, de práticas e de significados que envolve o
cotidiano de uma determinada população, associando vários aspectos.

Basicamente, portanto, deve-se buscar desafiar preconceitos com relação a qualquer


metodologia de pesquisa, sejam quantitativas ou qualitativas. Enquanto a pesquisa
quantitativa apresenta vantagens no que diz respeito, principalmente, à possibilidade
de generalizar resultados, perde no que diz respeito ao conhecimento da realidade
em suas nuanças em seus aspectos não observáveis e quantificáveis. Por outro
lado, as metodologias qualitativas, embora não possam permitir generalizações
estatísticas de seus resultados, podem, no entanto, oferecer um quadro descritivo e
aprofundado dos significados e das percepções que movem os sujeitos da pesquisa,
permitindo o que se denomina de “generalizações naturalísticas”. Isso se refere
48
48

à possibilidade de uma pesquisa qualitativa permitir que os leitores em outras


realidades identifiquem pontos em comum com a experiência relatada, o que é
conseguido quando a pesquisa qualitativa insere suas preocupações no contexto
maior em que está colocada. Mas convém ter clareza de que o cruzamento de
diferentes abordagens requer um pesquisador com mais experiência e com aguçado
senso de análise. Cautela e bom-senso são fundamentais.

Enfim, como diz a Mafalda, a complexidade é muito maior (Quino, 1997, p.104):

Vimos a possibilidade de tratar, de forma intercomplementar, as abordagens qualitativa


e quantitativa de pesquisa. Não precisamos contar com uma forma única de pesquisar
e de produzir conhecimento. Os diferentes paradigmas abrem uma série de
possibilidades para buscar compreender e solucionar problemas. Nossos objetivos
são diversos, mas dentro de cada um desses paradigmas podemos estar interessados
em diferentes metodologias. Por essa razão, é fundamental conhecermos um pouco
mais essas abordagens, bem como seus respectivos limites.

2.1.1 A abordagem quantitativa e seus limites

Nosso objetivo é propor uma passagem pelas marcas da pesquisa quantitativa e


verificar sua influência nas ciências humanas e sociais. A história da ciência tem
como marco o século XVII, a Era das Revoluções, de acordo com Hobsbawm
49

(1986). Na história da ciência, esse momento rompeu com o conhecimento


apenas especulativo que contemplava o mundo, iniciando um novo paradigma que
experimentasse a realidade e fosse capaz de dominar a natureza compreendendo
suas leis e construindo teorias explicativas. No entanto, em sua evolução histórica,
o triunfo dessa forma de produzir conhecimento deu-se no século XIX: foi quando
a ciência ganhou corpo no domínio da natureza (Amaral, 2001). Dessa maneira, o
ritmo e o número das descobertas saíram dos laboratórios para ter aplicação prática:
ciência e tecnologia estabeleceram seus vínculos. O triunfo maior esteve ligado a
essa forma objetiva, empírica, experimental com alta capacidade de previsibilidade.
Esse foi o paradigma dominante (Santos, 1991), que teve como centro a noção de
lei, de modelo simples, eficaz, mas irrefutável.

Sua ênfase maior está ligada ao positivismo, que, como ressaltado anteriormente,
se caracteriza como uma teoria do conhecimento de inspiração empirista que
limita o conhecimento à observação dos fatos e das relações estabelecidas entre
eles, admitindo unicamente a certeza do tipo experimental, por ser esta capaz de
produzir leis. Esses princípios orientaram a origem da pesquisa em vários segmentos
e, inevitavelmente, no campo das ciências humanas e sociais.

Os pesquisadores partidários do paradigma positivista afirmam:

• O fenomenismo, que significa que somente o mundo dos fatos pode ser analisado
cientificamente.

• O objetivismo, que considera como verdadeiro o conhecimento que capta com


precisão os objetos externos sem interferência da subjetividade.

• O empirismo, tendo o observador externo e o teste empírico objetivo como os


únicos guias das teorias cientificas.

• A noção da lei geral como centro do programa positivista.

• A previsibilidade como a marca de um conhecimento verdadeiro.

O resultado dessa proposição é postular a uniformidade da vida social por meio dos
comportamentos e de suas significações. Enfim, a pesquisa marcadamente positivista
50
50

visa à descoberta e à verificação de leis gerais – o particular é julgado sem interesse


e não significativo em si mesmo.
Se o método quantitativo tem como ênfase o positivismo, isso significa que ele é
um processo formal, objetivo e sistemático, segundo o qual os dados numéricos
são utilizados para obter informações acerca do mundo. Esse método de pesquisa é
usado para descrever, testar relações e determinar causas.

Algumas pesquisas realizadas no campo do lazer seguem esse paradigma. Silva


(1999), por exemplo, realizou uma pesquisa quantitativa com alunos do 2o
segmento do ensino fundamental do Colégio Pedro II do Rio de Janeiro com o
objetivo de estabelecer correlações entre a prática da educação física escolar e as
formas de lazer jovem, fora do tempo escolar. Como instrumento de coleta de
dados, foi aplicado um questionário estruturado composto de 37 questões, que
envolveu 969 respondentes. O autor constatou que enquanto na 5a série 43,6%
dos entrevistados se diziam estimulados pelo lazer esportivo em função da educação
física escolar, 46,9% responderam que nunca tiveram seu interesse aumentado em
função dessa atividade. Como conclusão, a pesquisa destaca a adesão do jovem
ao lazer esportivo em razão de elementos culturais próprios, e não do papel
desempenhado pela educação física na escola.

Em síntese, a pesquisa quantitativa caracteriza-se pelo emprego da quantificação,


tanto na fase de coleta de dados quanto no tratamento destes, por meio de técnicas
ou programas estatísticos. Empenha-se por garantir precisão dos resultados, evitar
distorções de análise e interpretação dos dados, possibilitando uma margem de
segurança quanto aos resultados. É freqüentemente aplicada nos estudos descritivos,
naqueles que procuram descobrir e classificar a relação entre variáveis, bem como
nos que investigam a relação de causalidade entre fenômenos.

Consulte um banco de dados (tais como IBGE, Inep, etc.) que desenvolva
pesquisas quantitativas que possam ser úteis para a área do lazer. Procure
interpretar criticamente essas informações.
51

Mesmo tendo afirmado a possibilidade de utilizar a integração entre as abordagens,


é necessário perceber que tanto a abordagem quantitativa como a qualitativa
possuem limites. Cada uma delas tem vantagens e desvantagens, a escolha de um
a implica muitas vezes renunciar às vantagens da outra. Procurando resolver certos
obstáculos metodológicos, cada abordagem provoca outros problemas, que são
com certeza seus dilemas. No entanto, não é por essas dificuldades que a pesquisa
quantitativa será rejeitada.

Em primeiro lugar, há o reconhecimento de que o positivismo foi de grande valia


para a humanidade, permitindo que a ciência avançasse em suas descobertas, com
critérios de controle da realidade estudada e de rigor científico que superaram
“mitos” e fantasias em muitas áreas do conhecimento. Em segundo lugar, reconhece-
se hoje que o positivismo tinha diferentes adeptos com distintas idéias, não podendo
ser reduzido a um “pacote” de noções homogêneas, como fazem seus críticos. Em
terceiro lugar, a rejeição a algumas idéias do positivismo, já superadas nas discussões
científicas, não pode significar a rejeição às metodologias quantitativas como um
todo, nem a qualquer critério de rigor e de objetividade em pesquisa. Embora
muitas das críticas ao positivismo sejam pertinentes, essas observações não podem
ser desconsideradas.

1. As pesquisas quantitativas são úteis e necessárias, como uma “fotografia” da


situação mais ampla do fenômeno estudado, permitindo que se generalizem
os resultados para toda a população.
2. Ainda que a compreensão do fenômeno estudado não se esgote na pesquisa
quantitativa, ela pode servir de ponto de partida para outros estudos
qualitativos que busquem aprofundar certos aspectos apontados e analisar
significados atribuídos a esses aspectos no cotidiano dos sujeitos.
3. O fato de uma pesquisa ser qualitativa ou quantitativa não significa, por si
só, uma adesão ou uma rejeição aos aspectos do positivismo criticado no
pensamento científico.
52
52

2.1.2 A abordagem qualitativa e seus dilemas


A expressão “metodologias qualitativas” cobre um conjunto de possibilidades que
recebem diferentes denominações. No momento que se utiliza a denominação
paradigma interpretativo para designar o conjunto das abordagens qualitativas,
alguns autores recorrem também à expressão paradigma compreensivo. A tendência
é reagrupar sob a categoria chamada de pesquisa qualitativa o conjunto das
metodologias: etnografia, estudo de caso, pesquisa participante. Além disso, o
paradigma da pesquisa qualitativa/interpretativa tem por base essencialmente os
contextos, assim como as significações individuais que as pessoas imprimem às suas
experiências (Huberman e Miles,1991; André, 1986, 2001, 2002; Bogdan e Biklen,
1994; Van der Maren, 1996).

Podemos justificar a utilização da categoria “pesquisa interpretativa” principalmente


pelo fato de que a “família” das abordagens assim designadas compartilha um interesse
central pela significação dada pelos “atores” às ações nas quais eles estão envolvidos.

A ênfase é, desse modo, colocada sobre a necessidade de reconhecer que o sentido


primeiro dessas abordagens se situa não sob o plano dos procedimentos e das
técnicas, mas sobre o objeto mesmo da pesquisa e dos postulados que se agregam.
Van der Maren (1996) defende essa posição afirmando, sobretudo, que uma mesma
técnica qualitativa pode ser utilizada em contextos diferentes.

No quadro do paradigma qualitativo, o pesquisador concebe de forma diferente


seu objeto de pesquisa. O objeto da pesquisa social qualitativa é a ação e não
o comportamento. Diante do objeto ação-significação, o pesquisador busca
compreender as formas de comportamento e os significados que os atores lhes
atribuem por meio de suas interações sociais.

De um ponto de vista ontológico, o objeto de pesquisa é o mundo humano. Os fatos


sociais não são coisas, a sociedade não é um organismo natural, mas, principalmente,
um artefato cultural, como foi tratado no primeiro núcleo do curso. É necessário
compreender a significação dos símbolos sociais construídos. Estudar o social é
compreender (o que só é possível vivendo) que o objeto social não é uma realidade
externa, é uma construção subjetivamente vivida.
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Na mesma ordem de idéias, os grandes temas do paradigma compreensivo são a


subjetividade e o mundo social como lugar de produção de sentido e de valorização:
é o indivíduo, e não o conceito, que está na fonte das concepções válidas sobre o
social (Van der Maren, 1996). A pesquisa será sobre a forma como se desenvolvem
e mantêm os sistemas de significações.

O pesquisador pode considerar o contexto social imediato na sua forma espacial e


na sua forma temporal. Sobre o plano espacial, as significações variam em função
dos grupos particulares de indivíduos que, pelo conjunto de suas interações,
partilham certas compreensões e tradições próprias ao seu meio, uma microcultura
diferente de um grupo-classe para outro. Sobre o plano temporal, as significações
são construídas e reconstruídas sem cessar em tempo real, uma vida renova-se
constantemente, mesmo nos acontecimentos cotidianos mais repetitivos.

Busquemos na área do lazer mais um exemplo de pesquisa com este enfoque: a


pesquisa de Alves (2000) teve como foco de análise a comunidade indígena Maxakali.
Seu objetivo foi buscar a compreensão dos sentidos e dos significados do corpo e do
lúdico presentes na comunidade. O método de investigação científica considerado
adequado foi o etnográfico, que encontrou na antropologia seus pressupostos
teóricos e metodológicos, bem como as categorias de análise. A coleta de dados
foi realizada por meio da observação participante, registrada em diário de campo.
Outros recursos foram utilizados, como fotografias, desenhos e entrevistas.

Em contextos sociais mais distantes – como sinalizado na pesquisa anterior –, é


necessário considerar que as significações têm uma história, isto é, que elas podem
ser conectadas, na origem, a uma cultura mais ampla que a de seu ambiente
imediato. Essa cultura é definida, em termos cognitivos, como aprendizagem de
normas que guiam a percepção, a crença, a ação e a avaliação das ações dos outros.
As significações que os sujeitos têm por certo podem também ser influenciadas pelas
percepções das vantagens e das restrições ligadas a um contexto mais amplo que
aquele das suas relações imediatas com os outros atores do mesmo grupo.

Os pesquisadores que assumem a abordagem qualitativa pensam que problemáticas


formuladas a partir de tais centros de interesse permitirão produzir conhecimentos
que responderão às seguintes necessidades:
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54

• A necessidade de levar em conta a invisibilidade da vida cotidiana. De fato, o


cotidiano sempre nos escapa porque é muito familiar ou apresenta contradições
que o tornam difícil de ser enfrentado. A pesquisa interpretativa permite um
distanciamento que torna estranho aquilo que é familiar, explicita aquilo que é
implícito e onde o lugar comum se torna problemático.
• A necessidade de compreender as situações particulares por meio de uma
documentação baseada nos detalhes concretos da vida prática.
• A necessidade de considerar as significações que os acontecimentos tomam para
as pessoas de um determinado meio. Acontecimentos que parecem idênticos
podem ter significações diferentes segundo os ambientes.
• A necessidade de compreender, de forma comparativa, diferentes níveis de
uma mesma organização social. A compreensão de uma organização estudada
no nível local pode ser ampliada pelo seu relacionamento com os elementos
pertencentes a um nível de realidade mais ampla, permitindo assim identificar
suas condições “contextuais” de existência. A pesquisa interpretativa é capaz
de perceber a organização particular do ambiente, ao mesmo tempo em que
percebe a realidade das pressões exteriores exercidas sobre essa organização.
Os dois níveis de organização devem interagir teórica e empiricamente.
• A necessidade de compreender uma organização local para além de suas
condições particulares de existência, comparando essa organização com outras
entidades locais semelhantes.
A definição do termo “qualitativo” assinala o caráter de proximidade entre o
pesquisador e os sujeitos da pesquisa centrada sobre a construção de sentido. Essa
proximidade manifesta-se tanto sobre o plano físico, isto é, o campo de estudo, lugar
de interação com as pessoas, como sobre o plano simbólico, ou seja, a linguagem
empregada pelo pesquisador quando se dirige às pessoas do ambiente. Essa
proximidade representa a “tradição de pesquisa qualitativa”.
Essa orientação de pesquisa tenta se aproximar o mais possível do mundo interior,
das representações e da intencionalidade dos atores humanos engajados nas trocas
simbólicas como eles o são nas ciências humanas e sociais.
55

Dois grandes riscos aparecem. Primeiro, a elaboração redutora da complexidade


do tema; segundo, o controle sobre a subjetividade do pesquisador. Atualmente, a
pesquisa qualitativa é tão reconhecida quanto a pesquisa quantitativa, porém ela sofre
uma restrição maior, pois o registro e a análise dos dados exigem uma comunicação
muito mais complexa. Na pesquisa qualitativa, a necessidade de comunicar e de
fazer compreender a complexidade do fenômeno estudado conduz a:

• reduzir o número de dimensões a serem consideradas;

• atenuar ou mesmo anular as contradições e os hiatos entre as dimensões que


farão crer ao leitor que o pesquisador não compreendeu o caso;

• introduzir uma coerência, uma estrutura, pois é na exposição de uma nova


organização dos fatos que reside a explicação;

• linearizar, isto é, expor um seguido do outro os acontecimentos que se


apresentaram simultaneamente;

• apurar sob forma de um raciocínio simples com um número limitado de


movimentos os resultados de uma longa série de compromissos e de cálculos
complexos com um grande número de movimentos.

Em conseqüência, assim que a pesquisa é comunicada, a representação elaborada


não é mais que uma ficção reduzida ao comunicável, com o risco de ser reduzida a
um retrato mal desenhado.

No caso do controle da subjetividade do pesquisador, o desafio é ainda maior, pois


ela é reforçada a partir do “reencontro intersubjetivo” que serve tanto de meio
quanto de mobilizador da pesquisa qualitativa. Como exemplo dessa questão,
citamos a pesquisa realizada por Silva (2002). O autor busca compreender, por meio
de uma pesquisa participante, a paixão do torcedor por um time de futebol – que,
curiosamente, é seu próprio time “do coração”. O objeto desvela a subjetividade do
próprio pesquisador. Contudo, não existe simetria, apenas posições complementares
em que a subjetividade do pesquisador ocupa o lugar dominante. O risco que se
corre é que a seleção de elementos que o pesquisador efetua na fala do sujeito
confirme mais o pesquisador do que o(s) depoente(s).
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56

Um dos critérios de rigor metodológico é a fidedignidade aos dados, evitando


acrescentar ruídos e informações ao quadro investigado (Quino, 1997, p. 237).

2.1.3 A questão dos critérios na pesquisa qualitativa

Vários autores tratam particularmente da definição de normas a partir das quais


podem ser considerados os valores do conhecimento obtido por meio de uma
pesquisa cujos postulados e procedimentos sejam qualitativos. A questão dos
critérios de cientificidade aplicada às metodologias de pesquisa qualitativa é um
campo complexo que sob nenhuma hipótese pode ser negligenciado.

Segundo Miles e Huberman (1984), o importante é:

• a clarificação dos critérios utilizados;

• a operacionalização desses critérios no processo da pesquisa;

• a explicitação da operacionalização dos critérios nos relatórios de pesquisa, isto é,


a “documentação” sistemática dos procedimentos utilizados pelo pesquisador.

Assim, é necessário que as sucessivas ações realizadas no decorrer da coleta de dados,


da análise e da interpretação sejam explicitadas nos relatórios de pesquisa. Esse
cuidado relaciona-se com os critérios de validade, de triangulação, de objetividade,
57

de fidedignidade e com a sua aplicação. Por uma questão didática, esses critérios
podem ser apontados separadamente para efeito de análise, porém no processo da
pesquisa eles aparecerão como indicadores do rigor metodológico. Você sabe em
que consiste cada um desses critérios?

Critério de validade

O cuidado com a validade do estudo é a primeira exigência que se impõe ao


pesquisador. A validade destaca o problema de saber se o pesquisador observa
verdadeiramente aquilo que ele julga observar. Ou seja, o pesquisador cuida para
que seus dados correspondam estreitamente àquilo que eles pretendem representar,
de uma maneira adequada e autêntica.

Van der Maren (1996) utiliza a expressão coerência programática para designar
a validade interna de uma pesquisa. Essa coerência define-se como uma resposta
ao problema da lógica do argumento ou da demonstração, ligando entre elas os
diferentes componentes de uma pesquisa, indo da formulação de intenções e de
metas da pesquisa, passando pela constituição, pela análise e pelo tratamento
dos dados até a interpretação e a verificação dos resultados.

Colocar mal a pergunta é a maior fonte de erros de validade. Para evitá-los, é


necessário diversificar as técnicas de coleta de dados utilizadas num processo
de pesquisa qualitativa. Isto é o que se denomina triangulação, outro critério
metodológico importante.

Critério de triangulação

Denomina-se triangulação o procedimento de uma validação instrumental feita


por meio de uma confrontação de dados recolhidos a partir de uma variedade de
estratégias. O conceito de triangulação é também estendido à idéia de validação
teórica pela confrontação das inferências feitas a propósito de um problema, seja
entre vários pesquisadores, seja entre os pesquisadores e os sujeitos pesquisados.
58
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Essencialmente, a triangulação supõe confirmar um resultado demonstrando que


medidas independentes que realizamos vão na mesma direção, ou, pelo menos,
não as contradizem (Huberman e Miles,1991).

Critério de objetividade

A objetividade é um conceito amplo que caracteriza, em geral, o procedimento de


racionalização científica que recorre à observação, à experimentação, à medida,
de maneira que ultrapasse a sensibilidade subjetiva individual do pesquisador para
alcançar um princípio de universalidade. No caso da pesquisa qualitativa, esse
critério não terá as mesmas características. No entanto, a objetividade do estudo
não poderá ser negligenciada. Segundo Laville e Dionne (1996), objetividade é
uma atitude intelectual que visa considerar a realidade do objeto, controlando ao
máximo, pela operação nomeada objetivação, as preconcepções do pesquisador.
Por sua vez, a objetivação é a operação pela qual o pesquisador torna consciente,
para ele e para os outros, as coordenadas de seu problema de pesquisa e a
perspectiva na qual o aborda.

Critério de fidedignidade

A fidedignidade repousa, essencialmente, sobre os procedimentos de observação


cuja descrição deve ser explicitada no estudo. Ela não se apóia diretamente sobre
os dados, mas sobre as técnicas e os instrumentos utilizados. A validade supõe a
fidedignidade, mas não o inverso. O critério de fidedignidade refere-se à escala
segundo a qual o resultado é independente das circunstâncias acidentais da pesquisa,
isto quer dizer que o critério de validade remete à escala segundo a qual o resultado
é corretamente interpretado.

O registro que será retido como dado deve ser uma aproximação do real que
resulte da comparação, do cruzamento ou da triangulação de vários registros parciais
apreendidos de pontos de vista diferentes ou com registradores diferentes.

Por último, resta comentar os critérios que estão na ordem das opções ético-
filosóficas do pesquisador, mas que fazem parte do quadro da validade de uma boa
pesquisa, como você verá a seguir.
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Critérios de ordem social e de pertinência socioprofissional

Nos critérios de ordem social, a relação entre a validade de uma pesquisa qualitativa
e o respeito de certos princípios éticos reveste-se de uma grande importância: a
responsabilidade ética e a preocupação científica devem andar juntas numa pesquisa
de campo. Desde o início, o pesquisador deve explicitar aos sujeitos os propósitos
da pesquisa, as atividades que pretende realizar e mesmo as tarefas ou os riscos que
podem implicar sua participação na pesquisa.

O pesquisador deve proteger tanto quanto possível os sujeitos pesquisados,


particularmente os participantes que considera vulneráveis, contra os riscos
psicológicos ou sociais que antevê, o embaraço ou o risco de sanções administrativas.
Para ser bem-sucedido, ele deve reunir o máximo de informações sobre o ambiente,
a fim de avaliar os riscos que os sujeitos envolvidos podem incorrer. É também
prudente preparar uma proteção rigorosa das informações, especialmente nos casos
em que o anonimato será preservado.

Existem muitos meios de estabelecer e de manter uma relação de confiança e de


colaboração com os sujeitos durante a pesquisa. Os textos de metodologia apontam
o seguinte:

• A confiabilidade: enquanto está no campo, o pesquisador não deverá jamais


formular comentários perto dos sujeitos que fazem parte de sua amostra em
relação ao que observa.

• A implicação: o pesquisador deverá tentar envolver os depoentes diretamente na


pesquisa como colaboradores, a fim de formular adequadamente as questões de
pesquisa e coleta de dados.

• A clareza: se o pesquisador pretende inspirar confiança aos sujeitos implicados,


deve ter uma idéia clara das questões principais que guiam a pesquisa, assim
como os procedimentos a serem utilizados para recolher os dados relativos às
suas dúvidas.
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60

Em relação ao critério de pertinência socioprofissional, é possível afirmar que a


pesquisa qualitativa deve levar em conta as exigências do objeto de pesquisa, ou seja,
das situações profissionais e das pessoas que o vivem –tanto no plano da forma de
agir como no da implicação dos resultados da pesquisa.

Muitas vezes, é em nome de certa concepção de validade que as pesquisas


produzem um conjunto de conhecimentos sistemáticos, sem relação com as
necessidades e as atividades dos atores, dos lugares e dos acontecimentos. A
preocupação com a validade deve, portanto, se exercer às vezes em função do
contexto científico e social da pesquisa. As questões de validade constroem-se no
cotidiano, na práxis.

Todos esses critérios precisam ser observados a partir das regras estabelecidas para a
metodologia da pesquisa científica, como veremos no próximo tópico.

2.2 As regras do jogo


Ao construir a pesquisa na área de ciências humanas e sociais, deparamos com
algumas interrogações. A primeira é: o que é realmente um método científico?

Todas as ciências caracterizam-se pela utilização de métodos científicos, mas nem


todos os ramos de estudo que empregam esses métodos são ciências. A utilização
de métodos científicos não é da alçada exclusiva da ciência, mas, como esclarecem
Marconi e Lakatos (2000), não há ciência sem o emprego de métodos científicos.

Porém, os modos de funcionamento da pesquisa científica foram modificados ao


longo do tempo e à medida que ocorreu a democratização dos saberes. Atualmente,
ela é uma codificação das práticas consideradas como válidas para os pesquisadores
experientes de um determinado campo de saber. Dito de outra forma, ela é uma
estruturação das regras do jogo que os adversários estabelecem respeitar nos seus
discursos, bem como as contestações por meio das quais a pesquisa científica irá
se desenvolver.
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De acordo com Marconi e Lakatos (2000, p. 46), existem várias definições e


conceitos de método. A partir da análise de vários conceitos, assim o definem:
“O método é o conjunto das atividades sistemáticas e racionais que, com maior
segurança e economia, permite alcançar o objetivo – conhecimentos válidos e
verdadeiros – traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando
as decisões do cientista”.

Podemos afirmar que um método de pesquisa é um conjunto de operações


sistemática e racionalmente organizadas, que tem por fim estabelecer relação lógica
ou causal (conexões) de forma consistente. Como já foi explicitado no item 1.3,
essas questões determinam:

• a maneira de colocar o problema: o quê?

• a intenção, a meta, o objetivo da pesquisa: para quê?

• as técnicas de constituição do material e sua validação: como?

• as técnicas de tratamento transformando dados em resultados;

• os procedimentos de interpretação dos resultados e suas verificações;

• a justificativa das diferentes escolhas.

Realizado esse percurso, estaremos diante de uma pergunta muito mais


embaraçosa: como conseguir trabalhar metodicamente meu objeto de interesse?
As produções científicas de maior qualidade são resultado de uma preparação
minuciosa de estruturação do objeto de estudo e de planejamento das etapas de
demonstração e validação de novos saberes, da validade interna, da consistência
programática.
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62

Considerando a concepção atual do método, conforme Bunge (citado por


Marconi e Lakatos, 2000), entre outros autores, o método científico é escopo
teórico-metodológico da investigação, que alcança seus objetivos quando cumpre
as seguintes etapas:
• descobrimento do problema ou lacuna no conhecimento;
• colocação (ou recolocação) precisa do problema;
• busca de conhecimentos ou instrumentos relevantes para resolver o
problema;
• tentativa de solução com os meios encontrados;
• invenção de novas hipóteses, teorias ou técnicas ou produção de dados
empíricos para resolver o problema;
• obtenção de solução exata ou aproximada;
• Investigação das conseqüências da solução obtida;
• confronto dos prognósticos obtidos com a teoria e a informação empírica
disponível;
• correção de hipóteses e procedimentos e começo de um novo ciclo de
investigação (quando for o caso).

A partir dessas considerações básicas, mais uma questão se impõe: qual o tipo de
pesquisa mais adequado para o campo do lazer?
Justamente por falta de modelos estratégicos para a realização de pesquisas
sobre este tema é que temos sempre muitas dúvidas sobre qual opção seguir,
como coletar os dados, como interpretá-los, de que forma garantir critérios
para construir um conhecimento a partir de uma situação em que eu sou parte
integrante do processo.
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A escolha metodológica é complexa, pois cada tipo de pesquisa tem seus limites e
toda opção implicará sempre renúncias. As escolhas são limitadas e uma alternativa
é sempre uma das possibilidades, um dos olhares, e nunca detentora da validade
absoluta, pois são várias as opções de pesquisa.

2.3 Tipos de pesquisa


Para abordar os tipos de pesquisa, existem diferentes parâmetros para classificá-las.
Denker (2003) explica que a tipologia da pesquisa pode ser subdividida de acordo
com os campos de atividade humana ou setores do conhecimento; segundo a
utilização dos resultados; a natureza ou procedência dos dados; a extensão dos
campos de estudo; os métodos de análise; o nível de interpretação, etc.
Neste texto não adotaremos nenhuma classificação específica, pois nossa opção
é apresentar alguns tipos de pesquisa geralmente desenvolvidos nos estudos
realizados no campo do lazer no Brasil para que você conheça algumas possibilidades
metodológicas. Como não temos a pretensão de esgotar o assunto, esperamos que
você também aprofunde conhecimentos sobre as possibilidades de pesquisa, busque
outros exemplos de estudos no campo do lazer e complemente, posteriormente, o
levantamento aqui esboçado.
Pesquisa bibliográfica
Essa metodologia consiste em realizar um trabalho de investigação, procurando
analisar os resultados de experiências de pesquisa e as teorias que foram
desenvolvidas por diferentes autores que possuem proximidade com o tema
escolhido. O pesquisador desenvolve o problema de pesquisa a partir dessa
exploração minuciosa do tema e procura estabelecer um diálogo entre suas
proposições e o conteúdo da literatura utilizada.
A pesquisa abrange toda a bibliografia publicada em relação ao tema de estudo,
tais como boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses. Alguns
autores consideram que a pesquisa bibliográfica compreende, além dessas obras,
informações fornecidas pelos meios de comunicação orais (rádio, gravações em fita
64
64

magnética) e audiovisuais (filmes e programas de TV). De acordo com Marconi e


Lakatos (2002, p. 71), a finalidade da pesquisa bibliográfica é “colocar o pesquisador
em contato direto com tudo o que foi escrito, dito ou filmado sobre determinado
assunto, inclusive conferências seguidas de debates que tenham sido transcritos de
alguma forma, quer publicadas ou gravadas”.
As principais características, os limites e as possibilidades da pesquisa bibliográfica
podem ser assim resumidas:
• Desenvolvida a partir de material bibliográfico já elaborado.
• Pode ser parte integrante de qualquer outra pesquisa, sendo utilizada para auxiliar
a construção do marco teórico.
• Permite grande amplitude e economia de tempo.
• Sua principal limitação é a possibilidade de reprodução das falhas presentes nas
fontes consultadas. Para reduzir a possibilidade de erro, o pesquisador precisa
analisar a forma como os dados foram coletados pelo autor, confrontando-os
com outras obras.
Os resultados da pesquisa bibliográfica apontam para o conhecimento sobre
diferentes abordagens de um tema ao longo do tempo, ou ainda para a identificação
das relações e dos vínculos entre processos de construção, resultados e aplicações
do conhecimento.
A pesquisa bibliográfica não significa uma simples repetição do que já foi dito ou
escrito sobre determinado assunto, pois propicia a análise de um tema a partir de
um novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras (Marconi e
Lakatos, 2002). Esse tipo de pesquisa é bastante recorrente no campo de estudos
do lazer. É recomendável para pesquisadores que estão iniciando suas buscas na
área e ainda não têm experiência com a pesquisa científica.

Pesquisa documental

Independentemente dos procedimentos metodológicos desenvolvidos, toda


pesquisa implica o levantamento de dados de variadas fontes. Esse levantamento de
65

dados, que é o primeiro passo de qualquer pesquisa científica, geralmente é feito por
meio da pesquisa bibliográfica e/ou da pesquisa documental.
A pesquisa documental tem como característica básica o fato de que a fonte de
coleta de dados está restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que
se denomina “fonte primária”. Dados secundários (obtidos de livros, revistas,
jornais, etc.) não se confundem com documentos, pois já foram trabalhados. O
documento é a “matéria-prima” de que o pesquisador dispõe para fazer suas análises
e interpretações.

Dessa forma, a pesquisa documental utiliza, como fonte de dados, materiais que
ainda não receberam tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados,
tais como documentos conservados em arquivos de instituições públicas, privadas
ou particulares (atas, leis, ofícios, relatórios, correspondências, diários, programas,
registros, etc.) e até mesmo dados estatísticos; objetos, fotografias e documentação
por imagem (compreendendo gravuras, estampas, desenhos, pinturas, etc.).

A pesquisa documental geralmente é desenvolvida em combinação com a pesquisa


bibliográfica ou outro tipo de pesquisa, como você poderá verificar no exemplo que
se segue.

Mendonça Jr. (2004) realizou uma pesquisa bibliográfica e documental: a primeira,


efetuada a partir de um levantamento bibliográfico realizado no Sistema de Bibliotecas
da Universidade Metodista de Piracicaba; a segunda, utilizando o método de estudo
de caso. A instituição escolhida foi o Serviço Social da Indústria (Sesi), e, como
procedimento de amostragem, o autor desenvolveu o não-probabilístico, intencional,
por acessibilidade, utilizando a técnica de análise de conteúdo para tratamento dos
dados. Tendo como objetivo analisar o documento Política e diretrizes de ação do
Sesi no campo do lazer, o estudo procurou verificar se há indicativos da superação do
conformismo pela participação.

Pesquisa de campo

A pesquisa de campo é utilizada com o objetivo de obter informações e/ou


conhecimentos acerca de um problema e descobrir novos fenômenos ou as
66
66

relações entre eles. Requer um intenso trabalho de pesquisa bibliográfica e não deve
ser confundida com uma simples coleta de dados, que corresponde a uma etapa de
suas fases específicas. Assim, a pesquisa de campo demanda a busca de informações
e dados necessários ao alcance de objetivos preestabelecidos, que discriminam
adequadamente o que deverá ser coletado, registrado e analisado (Marconi e
Lakatos, 2002).

A pesquisa de campo pode ser desenvolvida a partir de diversas estratégias, como


você poderá observar a seguir:

Pesquisa exploratória

Visa proporcionar maior familiaridade com o problema estudado, ou uma nova


forma de considerá-lo. Seu planejamento é flexível, por considerar aspectos variados
do problema e, geralmente, envolve técnicas como levantamento bibliográfico,
entrevistas com pessoas que tenham experiência com o problema e análise de
exemplos que facilitem a compreensão. Pode ser também utilizada nas fases iniciais
da pesquisa (formulação do problema, revisão de literatura, levantamento de
hipóteses, etc.).

A pesquisa exploratória consiste em buscar elementos que visam a uma


compreensão geral das características apresentadas pelo objeto de pesquisa. Esse
procedimento é escolhido quando o pesquisador não está muito familiarizado com
o objeto estudado, sendo um trabalho de investigação que propicia descobertas.
Para alcançar os objetivos citados, o pesquisador deve, em um primeiro momento,
efetuar um levantamento criterioso dos estudos anteriores sobre o tema para, em
seguida, planejar uma estratégia de estudo que possibilite uma espécie de sondagem
a respeito do tema/problema.

Esse tipo de pesquisa também vem sendo desenvolvido na área do lazer. Gomes
(2004) realizou uma pesquisa exploratório-descritiva que objetivou identificar e
analisar as dissertações e as teses sobre lazer defendidas no Brasil no período de
1970 a 1995. A autora procurou configurar a produção científica desenvolvida no
âmbito do lazer a partir de sua caracterização geral, disciplinar e temática; descrever
67

as referências bibliográficas das teses relacionadas ao lazer turístico, identificando as


bases documentais que fundamentaram essas pesquisas; mapear o posicionamento
teórico dos autores (em termos de conceitos adotados, teorias envolvidas, autores
citados, etc.) e reconstituir historicamente a produção literária na área, tanto em
âmbito nacional como internacional. Considerando todas as dissertações e as teses
brasileiras como universo da pesquisa, a autora selecionou uma amostra intencional,
escolhendo dissertações, teses e teses de livre-docência nas quais o lazer constituía
o tema principal.

Por possuir um caráter mais descritivo, normalmente quando esta modalidade de


pesquisa é utilizada de forma isolada não permite uma elucidação dos motivos e das
causas relacionados a determinada característica. Sendo assim, é muito comum que
a pesquisa exploratória se constitua no “primeiro passo” para o desenvolvimento de
um trabalho que tem um grau maior de aprofundamento, como, por exemplo, um
estudo de caso.

Estudo de caso

O estudo de caso é uma pesquisa que apresenta um grau elevado de


aprofundamento em relação ao objeto selecionado para análise. Pode ser para
estudar uma metodologia empregada por um profissional, o comportamento de
usuários em determinado contexto, um acontecimento específico, dentre outros.
Por se tratar de um estudo detalhado, muitas vezes é necessária uma combinação
de várias técnicas para o recolhimento de dados de forma que possibilite uma análise
satisfatória. Isso depende exclusivamente dos objetivos propostos pelo pesquisador.
Entre essas técnicas podem ser citadas: entrevista, coleta de depoimentos, grupo
focal, observação, acesso a documentos.

O conhecimento teórico do tema, a análise de trabalhos que seguiram a mesma


linha proposta e um contato prévio com o objeto de pesquisa facilitam a escolha
da(s) técnica(s) mais adequada(s) para efetivação do estudo. Uma limitação desse
tipo de pesquisa diz respeito à impossibilidade de generalização dos resultados. Cada
“caso” estudado apresenta suas peculiaridades, que não devem ser ignoradas para a
realização de análises comparativas.
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68

Fases do estudo de caso:


1) Delimitação da unidade-caso (pessoa, família, comunidade, conjunto de
processos, cultura): é uma construção intelectual arbitrária; é difícil determinar
a quantidade de informações necessárias; busca-se a seleção de casos variados:
típicos, extremos, marginais.

2) Coleta de dados: uso de procedimentos variados.

3) Análise e interpretação dos dados: é importante tentar-se utilizar categorias


analíticas derivadas de teorias amplamente aceitas, evitando-se interpretações
baseadas em julgamentos implícitos e “pré-conceitos”.

4) Redação do relatório: deve indicar como foram coletados os dados e a vinculação


da interpretação a teorias. Deve-se buscar a concisão possível.

Principais características do estudo de caso:


• Estudo profundo e exaustivo de indivíduos, grupos, organizações ou situações,
permitindo o conhecimento aprofundado de processos e relações sociais.
• Recomendado para temas pouco estudados, pois permite a construção de
hipóteses ou a recolocação de problemas (pesquisa exploratória).
• Flexível, mas não permite generalizações.
• Exige maior experiência do pesquisador.
• Pode envolver observação, entrevista, história de vida, exame de documentos
e outras técnicas (que serão discutidas no próximo tópico).

Vejamos um exemplo: Amaral (2003) realizou um estudo de caso no município de


Porto Alegre tomando por base o ano 2000. A autora procurou compreender como
ocorria a participação da população na formulação das políticas públicas de lazer na
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cidade de Porto Alegre, identificando as possibilidades e os limites dessa participação.


Os dados foram coletados por meio de observações, questionários, entrevistas e
análise de documentos. A autora optou por usar a técnica de triangulação na análise
dos dados, procurando promover um diálogo entre teoria e realidade e entre as
diferentes fontes de pesquisa.

Muitas vezes, o estudo de caso representa uma etapa específica da pesquisa


etnográfica, uma outra interessante possibilidade de pesquisa. Você sabe em que
ela consiste?

Pesquisa etnográfica

A etnografia é um esquema de pesquisa desenvolvido pelos antropólogos para


estudar a cultura e a sociedade. Etimologicamente, etnografia significa “descrição
cultural”. Para os antropólogos, o termo tem dois sentidos: um conjunto de técnicas
que eles usam para coletar dados sobre os valores, os hábitos, as crenças, as
práticas e os comportamentos de um grupo social; e um relato escrito resultante do
emprego dessas técnicas como atesta André (2002).

Se o foco de interesse dos etnógrafos é a descrição da cultura (práticas, hábitos,


crenças, valores, linguagens, significados – Magnani, 2002) de um grupo social, a
preocupação central dos estudiosos é com o processo. Segundo André (2002),
para que isso aconteça é necessária uma longa permanência do pesquisador em
campo, o contato com outras culturas e o uso de amplas categorias sociais na
análise dos dados. Nem sempre isso é possível, portanto o que se tem feito é uma
adaptação da etnografia a outros campos de conhecimento. Nessas adaptações,
o foco permanece na escolha de técnicas de pesquisa que tradicionalmente são
associadas à etnografia, ou seja, a observação participante, a entrevista intensiva e a
análise de documentos.

Existem polêmicas sobre essa adaptação: uma das questões para a qual os
etnometodólogos sensibilizaram os investigadores não constitui exclusivamente um
empreendimento científico; pode ser mais bem entendido como “uma realização
prática” (Bogdan e Biklen, 1997).
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70

Etnologia: Ramo da antropologia que estuda a cultura das chamadas sociedades


tradicionais. Relaciona-se com a antropologia cultural, dedicada à discussão das
características culturais do homem, como costumes, crenças, comportamentos,
organização social, etc.

Algumas características da pesquisa etnográfica:


• princípio da interação constante entre o pesquisador e o objeto pesquisado, o
que define, que o pesquisador é o instrumento principal na coleta e na analise
dos dados;
• ênfase no processo, naquilo que está ocorrendo, e não no produto ou nos
resultados finais;
• preocupação com o significado, com a maneira própria com que as pessoas vêem
a si mesmas, suas experiências e o mundo que as cerca. O pesquisador deve
tentar apreender e retratar essa visão pessoal dos participantes;
• envolvimento com o trabalho de campo. O pesquisador aproxima-se de pessoas,
situações, locais, eventos, mantendo com eles um contato direto e prolongado;
• descrição e indução de situações, pessoas, ambientes, depoimentos. O
pesquisador faz uso de uma grande quantidade de dados descritivos que são por
ele reconstruídos em forma de palavras ou transcrições literais;
• formulação de hipóteses, conceitos, abstrações, teorias e não sua testagem. Faz
uso de um plano de trabalho aberto e flexível, em que os focos da investigação vão
sendo revistos; as técnicas de coleta, reavaliadas; os instrumentos, reformulados;
e os fundamentos teóricos, repensados.
O que esse tipo de pesquisa de campo visa é a descoberta de novos conceitos,
novas relações, novas formas de entendimento da realidade.
Procurando compreender os “Jogos jogados com bola de gude: a atração e o fascínio
que marcam os seus atuais e ex-jogadores”, Fonseca (2004) realizou uma pesquisa
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qualitativa com abordagem etnográfica interpretativa. As formas de abordagem ao


tema foram concretizadas por meio de: observação dos jogos de bola de gude de
crianças e adolescentes e de entrevistas por meio da técnica de análise do discurso.

Pesquisa participante e pesquisa-ação

A pesquisa participante é uma modalidade científica relativamente recente que


mantém uma postura crítica ante o modelo positivista, concebendo e fazendo
ciência a partir de uma perspectiva político-social. De acordo com Brandão (1990),
na pesquisa participante, pesquisadores e pesquisados, ainda que tenham situações
e tarefas diferentes, são sujeitos de um mesmo trabalho comum. Tem, como
meta, propiciar um conhecimento mais profundo da realidade, participar desse
conhecimento e dele tomar posse. Assim, observa-se o empenho do pesquisador
em produzir conhecimentos a partir da participação e da cooperação de todos os
envolvidos na situação pesquisada.

O pesquisador procura fazer parte do contexto e, para isso, estabelece relações


comunicativas com as pessoas ou grupos da situação investigada, no intuito de
conseguir interagir melhor com o grupo. Assim, o pesquisador busca participar do
contexto investigado, identificando-se com valores e comportamentos em busca
de aceitação.

Seu objetivo é obter conhecimento mais profundo do grupo, que tem ciência da
finalidade, dos objetivos e da identidade do pesquisador. Permite a observação das
ações no momento em que ocorrem e oferece uma visão dinâmica dos processos
de interação no grupo, devendo-se cuidar para não perder a objetividade, um dos
critérios que deve ser almejado.

De maneira semelhante à pesquisa participante, a pesquisa-ação pressupõe a


inserção num determinado ambiente que se pretende investigar. De acordo com
Thiollent (1986, p.14),

“Pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e


realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema
coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou
problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo.”
72
72

Além disso, devemos considerar que a pesquisa-ação não é apenas uma orientação
de ação emancipatória e voltada para grupos sociais das classes populares. É uma
estratégia de pesquisa em situação real, na qual os pesquisadores intervêm de
forma consciente e intencional e os participantes desempenham um papel ativo
no processo.

O planejamento de uma pesquisa-ação é dotado de uma flexibilidade considerável,


não seguindo uma série de fases ordenadas de forma rígida, não precisando seguir,
necessariamente, a ordem proposta para os passos definidos por Thiollent (1986).

Caso você tenha interesse em conhecer os passos (ou momentos) propostos para
a pesquisa-ação, consulte Thiollent (1986) e Kurt Lewin (1990).

Muitas são as criticas dirigidas à pesquisa-ação e, dada a sua complexidade, até o


momento não foram identificadas muitas investigações dessa natureza no campo do
lazer. Entretanto, citamos como exemplo a pesquisa de Almeida (2003), que teve
como objetivo analisar o lazer na reclusão e a possibilidade de intervenção pautada
na reflexão crítica. A partir da metodologia da pesquisa-ação, o autor observou
as atividades desenvolvidas pelos presidiários da Penitenciária de Campinas-SP
e, concomitantemente, realizou intervenções privilegiando o lazer como tema
gerador, com o intuito de estimular a realização de ações práticas, proporcionando
a reflexão sobre o espaço, a posição como sujeito, o corpo e a possibilidade de
transformação.

Poderíamos citar outros tipos de pesquisa, mas, neste momento, apresentamos


essas possibilidades como exemplos de estudos na área do lazer. Lembramos que
a escolha da estratégia de pesquisa dependerá do problema a ser estudado, bem
como dos objetivos e da viabilidade do estudo (em termos de tempo, recursos, etc.).
Além disso, diferentes estratégias podem ser utilizadas em uma mesma pesquisa,
como evidenciaram muitos dos estudos citados para exemplificar.
73

2.4 A coleta de dados


São diversas as formas e a dinâmica dos objetos e das práticas de pesquisa que dão
à metodologia vida e dinamismo, explicitam suas complexidades e suas contradições,
mas também sua consistência programática. O ato de pesquisar requer que o
pesquisador trabalhe sobre uma situação, sobre um objeto, sobre um saber-fazer
repleto de significados vividos, que são carregados de desejos, de sonhos, de
sentidos e de símbolos. Assim, a escolha das técnicas utilizadas na fase de coleta de
dados está condicionada ao problema da pesquisa. Se vou optar pela entrevista ou
pelo questionário, depende do meu objeto.

Mesmo que nos exemplos apontados no tópico anterior você já possa ter
identificado algumas estratégias para a coleta de dados, trataremos dessa questão
para facilitar sua compreensão e ajudá-lo nas suas escolhas, considerando os
tópicos a seguir.

Observação

A observação é um instrumento de coleta de dados muito utilizado para estudar o


comportamento de pessoas que se encontram em determinada situação. A partir
do tema relacionado ao problema de pesquisa, o observador define as pessoas e
escolhe o local onde estas estejam na situação que se pretende analisar.

O estudo sobre o uso de um espaço de lazer pode ser realizado a partir da


observação do público que o freqüenta para desenvolver suas experiências de
lazer. A partir dessa delimitação, o pesquisador dedica parte de seu tempo dando
atenção aos acontecimentos que ocorrem no contexto escolhido. O investigador
pode adotar duas posturas diferenciadas: a de observador não participante ou a
de observador participante. A escolha de qual postura será adotada deve levar em
conta a necessidade de recolher dados, que é o objetivo deste procedimento.

Na observação não participante, o investigador se comporta como um expectador


das pessoas, do local e do tema. Ou seja, ele “assiste” às cenas que ocorrem sem
qualquer participação. Já na observação participante, o investigador interage de
alguma forma com o contexto analisado: as conversas com as pessoas, a participação
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74

em brincadeiras e a contribuição para a realização de alguma atividade são exemplos


de participações que podem ser exercidas pelo pesquisador.
É importante destacar a necessidade de conduzir de forma sistemática toda a
observação sem se deixar levar por receitas prévias. O estudo prévio de observações
realizadas por outros pesquisadores pode contribuir para evitar dispersão ou mesmo
enganos do investigador iniciante. O registro rotineiro das observações efetuadas
deve ser precedido de um roteiro dos itens a serem observados, como também
deve contemplar a anotação de situações e/ou acontecimentos inesperados.

No entanto, a observação direta feita pelo pesquisador tem seus limites. O mundo
social que ele examina por um determinado período de tempo tem continuidade,
seus registros e memórias podem apresentar lacunas e, muitas vezes, seus valores
e paradigmas se conformam à interpretação dos registros efetuados. A realização de
uma boa observação e a interpretação dos registros efetuados deve observar alguns
princípios da pesquisa sociológica, quais sejam: as pessoas não são necessariamente
o que elas dizem ou fazem nem fazem ou dizem o que elas necessariamente são;
a interpretação dos registros coletados durante uma observação iniciou-se desde
o momento da elaboração do roteiro de itens, ou melhor, a partir do referencial
teórico do pesquisador. Outra característica de uma boa observação é a apresentação
criteriosa de situações ou acontecimentos novos, inesperados ao referencial teórico
do pesquisador.

O estudo de Queirós (2000), por exemplo, buscou compreender e interpretar


os interesses, os valores e os significados da e na participação dos descendentes
de alemães na 11a Oktoberfest, de Marechal Cândido Rondon, PR, por meio de
uma análise sociocultural. O estudo compreendeu uma combinação de pesquisa
bibliográfica com as pesquisas documental e exploratória, privilegiando, como técnica
de coleta de dados, a observação participante e entrevistas estruturadas, além de
testemunhos orais de organizadores, trabalhadores, turistas e participantes locais.

Entrevista

Entrevista é uma conversa intencional, que tem como objetivo o recolhimento


de informações a respeito de um assunto determinado. O entrevistador conduz a
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conversa para estimular a(s) pessoa(s) a falarem a respeito do tema de seu interesse.
O entrevistado contribui com o relato de suas experiências, opiniões a respeito do
assunto proposto ou em relação a algum acontecimento específico.

A necessidade de seguir um roteiro é dependente do objetivo do estudo. A entrevista


estruturada exige a elaboração de um roteiro prévio, que tem por finalidade
recolher dados a partir de perguntas específicas. Na entrevista não estruturada, o
entrevistador introduz determinado assunto e deixa que o(s) entrevistado(s) fale(m)
livremente, sem que haja o cumprimento de um roteiro preestabelecido. Uma
outra possibilidade é promover a entrevista semi-estruturada, em que o pesquisador
estabelece um roteiro prévio, porém flexível. Embora sejam feitas perguntas
específicas, o entrevistado possui um espaço para falar livremente, e o pesquisador
pode elaborar questões não previstas inicialmente, mas que podem ser importantes
para a compreensão de seu problema de pesquisa.

As entrevistas não estruturadas podem contribuir com informações que não


haviam sido sequer imaginadas pelo observador, mas pode ocorrer o desvio do
assunto proposto, em razão do grau de liberdade desse procedimento. Embora as
estruturadas se restrinjam ao que foi proposto, podem ser utilizadas para análises
comparativas, pois o roteiro seguido permite a análise de respostas dadas para as
mesmas perguntas. Quando é possível realizar mais de uma entrevista com um
sujeito, é comum que gradativamente elas passem de não estruturadas a estruturadas.
Inicialmente, realiza-se uma sondagem, para depois aprofundar e obter informações
mais específicas.

A entrevista não tem um caráter questionador, ou seja, independentemente


da opinião do entrevistado, este precisa ser respeitado. É importante que o
entrevistado se sinta à vontade para falar o que pensa e esteja seguro de que
as informações sejam confidenciais e utilizadas apenas na pesquisa. Ao realizar
a pesquisa, é importante preparar, previamente, um Termo de Consentimento,
para que o entrevistado autorize a publicação das informações fornecidas pela
entrevista. Sua utilização é recomendada quando o número de entrevistas a serem
efetuadas é mais reduzido (esse número depende das condições de realização do
estudo disponíveis para o pesquisador), ou quando a(s) pessoa(s) entrevistada(s)
76
76

detêm informações/experiências novas, ou, ainda, quando o(s) entrevistado(s) são


portadores de sentidos ou significados diversos sobre o tema de estudo.

Para um pesquisador iniciante, a entrevista com questões abertas contribui para


checar seus pressupostos iniciais, elaborados no decorrer da revisão de literatura,
confrontar diferentes respostas sobre uma mesma questão e conhecer experiências
diversas sobre o objeto da pesquisa. A análise de questões abertas é mais
complexa, pois permite uma variedade de respostas, que em algumas situações
não correspondem ao que foi solicitado pela pergunta. Após a(s) entrevista(s), o
pesquisador deverá elaborar um inventário das respostas, que servirá de base para
a análise posterior. Elaborar um roteiro prévio com questões abertas apresenta duas
vantagens essenciais: possibilita identificar as práticas, as concepções e os referenciais
próprios dos entrevistados sobre o tema e também oferece maiores perspectivas
de comparação de informações correlacionadas, além do registro das diferenças de
opinião sobre o assunto.

Por outro lado, corre-se o risco maior de as informações recolhidas estarem


dispersas ou mesmo serem inúteis para as preocupações da pesquisa. A forma de
elaboração das questões e sua ordenação no roteiro são importantes para evitar
esse viés. Na atualidade, a gravação da entrevista é preferível à coleta de respostas
por escrito. Muitas vezes o(s) entrevistado(s) dispõe(m) de pouco tempo ou
baixa motivação para responder por escrito. Nas gravações, o pesquisador
deve atentar para inflexões de voz, evasivas ou silêncios ocorridos na entrevista.
Essas situações também fazem parte da resposta. A atitude do pesquisador no
decorrer da entrevista tem conseqüências importantes, pois ele pode influenciar
a qualidade das respostas apresentadas. É necessário explicar claramente ao
entrevistado quais os objetivos do conjunto de perguntas a serem formuladas
e se ele concorda em respondê-las, tendo em vista que serão gravadas. Em
seguida, apresentar pausadamente as questões aguardando, atentamente, que a
resposta seja complementada para passar à pergunta seguinte. Evite interromper
o entrevistado e, quando necessário, somente para esclarecimento de dúvidas
específicas, procurando fazê-lo de forma que se interfira o mínimo possível na
elaboração da resposta.
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Tendo como ponto de partida de análise o muro de escalada do Grupo de


Escalada Esportiva da Unicamp, o estudo de Marinho (2001) investigou as relações
estabelecidas na escalada esportiva em ambientes artificiais. Privilegiando uma
abordagem sociocultural, o estudo foi desenvolvido, complementarmente, entre
pesquisa bibliográfica e pesquisa empírica, com a utilização de entrevistas semi-
estruturadas e observação participante como recursos para obtenção dos dados.
Questionário
Também abordaremos este tema de forma simples, pois o espaço é relativamente
pequeno para o detalhamento dessa questão. A sugestão é que se procure na
literatura resposta mais aprofundada, de acordo com a necessidade de cada tema de
pesquisa. Segundo Laville e Dionne (1999), para saber a opinião da população sobre
uma determinada escolha da sociedade como a da preservação dos programas
sociais, é preciso, evidentemente, interrogá-la. Talvez não a população inteira, mas
uma amostra suficiente, constituída com os cuidados requeridos para assegurar sua
representatividade. Para tal investimento, são necessários instrumentos, compatíveis
com as necessidades da investigação, tais como os questionários.
O questionário é considerado uma técnica de observação direta pelo fato de
estabelecer um contato efetivo com as pessoas implicadas no problema investigado.
No entanto, possui peculiaridades que devem ser observadas para que o pesquisador
possa atingir seus objetivos.
Para interrogar indivíduos que compõem uma determinada amostra, é possível
definir o tipo de amostragem que será utilizada: a amostragem probabilística (sorteio
dos indivíduos dando chance igual para todos), amostragem por quotas (seleção
de um número de indivíduos proporcional à importância das categorias que eles
representam no conjunto) e a amostragem por aglomerados (seleção aleatória de
indivíduos e aplicação do questionário a cada um deles e às pessoas que estão ao
seu redor ou que eles indicam). De acordo com Thiollent (1986), no plano do rigor
estatístico só a amostragem probabilística garante a representatividade.
Questionários e entrevistas são considerados complementares. Como regra geral,
pratica-se a entrevista não diretiva em estudo piloto para determinar a formulação
do questionário, isto é, o processo denominado de validação ou pré-teste. Em
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78

seguida, se a forma for validada ou tiver de sofrer alterações, o questionário será


distribuído por um meio acessível, seja via correios ou outra forma.
A aplicação dos questionários obedece a regras diferentes das regras das entrevistas
abertas. Sendo padronizado, tem a vantagem de alcançar um número maior de
pessoas, uma vez que responderam sem a necessidade da presença do entrevistador,
mas sempre garantindo a representatividade no universo da pesquisa.

Um outro fator fundamental está relacionado à questão da linguagem e à ordem


das questões, pois esses cuidados revestem-se de muita importância quando se
interrogam pessoas. Geralmente, faz-se um esforço para propor a formulação
mais imparcial possível e ordenar as questões no intuito de minimizar os efeitos
de umas sobre as outras. Assim como os interrogados colocam a si mesmos as
perguntas, deve-se presumir que eles compreendem seu sentido. Dessa maneira,
é fundamental que as questões sejam claras, garantindo que os interrogados as
interpretem como o pesquisador planejou. Ao trabalhar os dados, é fácil perceber
(pelas respostas) se houve entendimento do sentido, mas isso não assegura a
uniformidade das interpretações, que podem ser distintas.

Para exemplificar: Riede e Bramante (2003) realizaram um estudo com o objetivo


de identificar os fatores críticos de sucesso nos processos de gestão praticados nas
Associações Atléticas Banco do Brasil (AABBs). O estudo combinou as pesquisas
bibliográfica, documental e exploratória de campo por meio de um trabalho de
coleta de dados com a aplicação de questionários. Os sujeitos da pesquisa foram
superintendentes e gerentes do Banco do Brasil em 15 cidades com e sem AABBs,
conselheiros e presidentes de AABBs, associados e não associados.

Na etapa de tratamento dos dados, o pesquisador terá de construir categorias e


analisar as respostas dos sujeitos. Trataremos dessa questão a seguir.

2.5 A análise e a interpretação dos dados


Tanto na literatura quanto na prática da pesquisa, a análise dos dados nem sempre
recebeu a atenção necessária. Poderíamos dizer que isso acontece na pesquisa
79

qualitativa justamente para não se correr o risco de um receituário que possa cercear
a liberdade do pesquisador.

Mas a análise de dados é o processo de busca e de organização sistemático das


transcrições de entrevistas, de notas de campo e de outros materiais que foram
sendo acumulados com o objetivo de aumentar sua própria compreensão desses
mesmos dados e de lhe permitir apresentar aos outros aquilo que encontrou. Dito
de forma mais simples, é a hora de reunir a teoria com os dados coletados por
meio das entrevistas, dos questionários ou das observações que você realizou e que
precisam ser organizados e compreendidos.

Segundo Bogdan e Biklen (1994), a análise envolve o trabalho com os dados,


sua organização, divisão em unidades manipuláveis, síntese, procura de padrões,
descoberta dos aspectos importantes e suas decisões.

A tarefa analítica, ou seja, a tarefa de interpretar e tornar compreensíveis os materiais


recolhidos, parece ser monumental quando alguém se envolve num primeiro
projeto de investigação. Uma boa dica para o pesquisador não se perder na hora
de reunir todo esse material e tomar decisões sobre eles é ensaiar a análise logo
após realizar cada entrevista ou questionário, fazer as anotações de cada documento,
garimpando as principais idéias. Deve-se analisar comparativamente as diferentes
respostas, as idéias novas que aparecem, o que confirma e o que rejeita as hipóteses
iniciais, o que esses dados levam a pensar de maneira mais ampla. Este momento
exige muito tempo de reflexão e dedicação para se tirar o máximo de idéias de cada
resposta, de cada leitura.

Existem muitos estilos diferentes de investigação qualitativa e uma variedade de


maneiras de trabalhar e analisar os dados. É o ponto em que se percebe com mais
nitidez o estilo do pesquisador: seu conhecimento teórico, sua criatividade para
analisar cada dado e seu bom-senso para descartar as informações desnecessárias.
Garantindo os critérios de rigor, o pesquisador irá retomar suas hipóteses, seu
quadro teórico, os conceitos rastreados e explicitar toda a sua criatividade.
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Busque livros de metodologia de pesquisa e procure complementar esta discussão


sobre a análise de dados identificando algumas possibilidades sugeridas pelos
autores.

2.6 O ponto de chegada: conclusão da pesquisa


Para que as conclusões de sua pesquisa não sejam banais, você deve refletir para
além dos dados obtidos e analisados, deve se arriscar e teorizar, retomar o trabalho
de reflexão especulativa, conceitual, e confrontá-lo com os resultados que você
encontrou. Dessa forma, garante-se a dimensão de originalidade do trabalho,
mesmo que seja numa produção modesta.

O que importa é que o resultado seja aceito como um avanço, que possa servir de
meta para uma contestação posterior, que se constituirá em um outro avanço e não
somente um retorno ao ponto de partida. Essas regras da pesquisa são as normas
que asseguram o rigor metodológico do estudo e, assim como a ética da atividade
científica, independe da abordagem adotada (qualitativa ou quantitativa).

Ao concluir seu trabalho, este precisa ser sistematizado a partir da revisão de


toda a sua monografia, revendo a lógica do estudo, a coerência e a coesão das
idéias trabalhadas. Assim, é necessário explicitar informações sobre a forma de
planejamento e execução da pesquisa, análise e interpretação dos dados e principais
conclusões e recomendações.

Agora que já percorremos o trajeto proposto para a pesquisa científica, construa


o seu projeto de monografia. Siga os seguintes passos:
• Título: procure elaborar uma frase, a mais breve possível, que permita
identificar sua área de estudos e/ou problema de investigação. Caso queira,
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pode complementar o título com uma segunda frase (subtítulo) que delimite
mais o que você pretende estudar.
• Questões problematizadoras: enuncie os desafios do estudo, da investigação
ou da experiência proposta na forma de perguntas, hipóteses a serem
confirmadas ou características particulares que a diferenciam. A escolha
depende do conteúdo de seu estudo.
• Objetivo: redigir duas ou três frases apresentando o que você espera conseguir ao
final desta atividade. Podem ser objetivos relacionados a novos conhecimentos,
ações profissionais ou experiências inovadoras. Lembre-se de que os objetivos
propostos indicam quais os resultados esperados de seu trabalho.
• Justificativa/relevância: você deve buscar responder pelo menos duas das questões
propostas a seguir, além de outras que você julgue pertinentes a partir da leitura
deste livro: Qual a importância desse estudo para sua prática profissional? Que
situações-problema o estudo pode contribuir para solucionar? Que modificações
e que inovações você considera possíveis a partir de seu estudo?
• Pressupostos teóricos: Como seu tema de estudos e/ou questões são tratados
na bibliografia consultada? Como você situa essa discussão na sua prática
profissional? O que você considera pertinente para sua maior compreensão do
problema abordado?
• Procedimentos metodológicos: apresente, de forma sistematizada, quais as
ações necessárias à realização da pesquisa. Informe de modo sucinto quais os
procedimentos de coleta/análise dos dados que você pensa em utilizar.
• Cronograma de atividades: a forma mais usual de cronograma especifica quais
ações serão realizadas em um determinado período. Verifique quanto tempo
você dispõe para concluir seu estudo, que é um pré-requisito para que você
obtenha o título de especialista.
• Referências: registre as referências bibliográficas que você utilizar em sua
pesquisa, listando-as sempre seguindo as normas da ABNT.
82
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Para sintetizar as discussões propostas neste livro, apresentamos o quadro a


seguir (Bogdan e Biklen, 1994, p. 72-74), que ilustra muitos pontos do percurso
detalhado no texto, complementando o assunto e indicando outros elementos
que podem ser aprofundados em livros que tratam de metodologia da pesquisa.

Características das Abordagens Qualitativa e Quantitativa


Qualitativa Quantitativa
Expressões/frases associadas com a abordagem Expressões/frases associadas com a abordagem
- etnógrafo - observação participante - experimental - positivista
- trabalho de campo - fenomenológico - dados quantitativos - fatos sociais
- dados qualitativos - escola de Chicago - perspectiva exterior - estatística
- interação simbólica - documentário - empírica - ética
- perspectiva interior - história de vida
- naturalista - estudo de caso
- etnometodológico - ecológico
- descritivo - émico
Conceitos-chave associados com a abordagem Conceitos-chave associados com a abordagem
- significado - processo - variável - validade
- compreensão de senso - ordem negociada - operacionalização - significância
comum - para todos os propósitos - garantia estatística
- pôr entre parênteses práticos - hipóteses - replicação
- compreensão - construção social - predicação
- vida quotidiana - teoria fundamentada
Afiliação teórica Afiliação teórica
- interação simbólica - cultura - funcionalismo cultural - empirismo lógico
- etnometodologia - idealismo - realismo, positivismo - teoria dos
- fenomenologia - comportamentalismo sistemas
Afiliação acadêmica Afiliação acadêmica
- sociologia - antropologia - psicologia - sociologia
- história - economia - ciência política
Objetivos Objetivos
- desenvolver conceitos - teoria fundamentada - teste de teorias - encontrar relações
sensíveis - desenvolver a - encontrar fatos entre variáveis
- descrever realidades compreensão - descrição estatística - predição
múltiplicas
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Plano Plano
- progressivo, flexível, geral - intuição relativa ao modo - estruturado, predeterminado, - plano detalhado
de avançar formal, específico de trabalho

Elaboração das propostas de investigação Elaboração das propostas de investigação


- breves - parcas em revisão de - externas - longa revisão de
- especulativa literatura - detalhadas e específicas nos literatura
- sugere áreas para as quais - descrição geral da objetivos - escritas antes do
a investigação possa ser abordagem - detalhadas e específicas nos recolhimento de
relevante procedimentos dados
- normalmente escritas após - especificação de
o recolhimento de alguns hipóteses
dados

Dados Dados
- descritivos - fotografias - quantitativos - variáveis
- documentos pessoais - o discurso dos sujeitos - codificação quantificável operacionalizadas
- notas de campo - documentos oficiais e - contagens, medidas - estatísticas
outros

Amostra Amostra
- pequena - amostragem teórica - ampla - seleção aleatória
- não representativa - estratificada - controle
- grupos de controle de variáveis
- precisa extrínsecas

Técnicas ou métodos Técnicas ou métodos


- observação - observação participante - experimentos - quase
- estudo de documentos - entrevista aberta - inquéritos experimentos
vários - entrevista estruturada - observação
estruturada
- conjuntos de
dados
Relação com os sujeitos Relação com os sujeitos
- empatia - contato intenso - circunscrita - distante
- ênfase na confiança - o sujeito como amigo - curta duração - sujeito-
- igualdade - ser natural investigador
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Instrumentos Instrumentos
- gravador (freqüentemente a pessoa - inventários - computadores
- transcrição do investigador é o único - questionários - escalas
instrumento) - índices - resultado de
testes
Análise de dados Análise de dados
- contínua - indução analítica - dedutiva - estatística
- modelos, temas, conceitos - método comparativo - verifica-se após a conclusão
- indutivo constante dos dados
Problemas com o uso da abordagem Problemas com o uso da abordagem
- demorada - os procedimentos não são - controle de outras variáveis - intrusão
- difícil a síntese dos dados estandardizados - reificação - validade
- garantia - dificuldade em estudar
populações de grandes
dimensões
BOGDAN, R.; BIKLEN, S. Investigação qualitativa em educação:, uma introdução à teoria e aos métodos. Porto: Editora Porto, 1994, p. 72-74.

Esperamos ter contribuído para o sucesso de seu projeto de monografia. Lembre-


se: “mono” vem do grego mónos, que significa só, único, isolado; “grafia” também
deriva do grego grapho, gráphein, que quer dizer escrever, descrever, desenhar. Fica
o desafio de que você comece, desde já, a escrever sua monografia!
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Coordenação Geral do Programa

SESI/DN - UniSESI

Joana D’Arc Machado Cerqueira, Especialista - Universidade de Brasília


Coordenadora Geral

Cláudia Martins Ramalho, Especialista - Universidade Federal de Minas Gerais


Gerente de Cultura

Rossana Araújo de Melo e Silva, Bacharel – Faculdades Integradas de Patos


Responsável TécnicaI

Thiago Endres da Silva Gomes, Bacharel – Universidade Católica de Brasília


Responsável Técnico

Coordenação UFMG

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Coordenadora Geral

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Coordenadora pedagógica de meios e mídias

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Coordenador de tutoria

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Coordenador Administrativo

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Secretária Acadêmica

Sistema Confederação Nacional da Indústria

Superintendência de Serviços Compartilhados – SSC


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