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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

DEPARTAMENTO DE DOCUMENTAÇÃO,
JURISPRUDÊNCIA E DIVULGAÇAO

SERVIÇO DE DIVULGAÇÃO

REVISTA
TRIMESTRAL
DE
JURISPRUDÊNCIA

Volume 158* (Páginas 1 a 366) Outubro de 1996


Departamento de Documentação, Jurisprudência e Divulgação:
Diretora: Marlene Freitas Rodrigues Alves

Serviço de Divulgação:
Diretora: Maria do Socorro da Costa Alencar

Divisão de Edições:
Diretora: Almeria Machado Godoi

Seção de Controle e Distribuição:


Supervisora: Maria Elena Alves

Revista Trimestral de Jurisprudência/Supremo Tribunal


Federal, Serviço de Divulgação. N. 1 (abr./jun.
1957)- . Brasília : STF, SD : Imprensa
Nacional, 1957-

Trimestral.
1. Jurisprudência - Periódico. 2. Direito-Jurisprudên-
cia. I. Brasil. Supremo Tribunal Federal.

CDD 340.6

Distribuição:
Imprensa Nacional
SIG, Quadra 6, lote 800
70.604-900, Brasília-DF
Fone: (061): 313-9400
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Ministro José Paulo SEPÚLVEDA PERTENCE (17-5-89), Presidente


Ministro José CELSO DE MELLO Filho (17-8-89), Vice-Presidente
Ministro José Carlos MOREIRA ALVES (20-6-75)
Ministro José NÉRI DA SILVEIRA (12-9-81)
Ministro SYDNEY SANCHES (31-8-84)
Ministro Luiz OCTAVIO Pires e Albuquerque GALLOTTI (20-11-84)
Ministro CARLOS Mário da Silva 'VEELOSO (13-6-90)
Ministro MARCO AURÉLIO Mendes de Farias Mello (13-6-90)
Ministro ILMAR Nascimento GALVÃO (26-6-91)
Ministro José FRANCISCO REZEK (21-5-92)
Ministro MAURÍCIO José CORRÊA (15-12-94)
COMISSÃO DE REGIMENTO

Ministro MOREIRA ALVES


Ministro CARLOS VELLOSO
Ministro MAURÍCIO CORREA
Ministro FRANCISCO REZEK, Suplente
COMISSÃO DE JURISPRUDÊNCIA

Ministro OCTAVIO GALLOTTI


Ministro CELSO DE MELLO
Ministro MARCO AURÉLIO
COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO

Ministro NÉRI DA SILVEIRA


Ministro ILMAR GALVÃO
Ministro MAURÍCIO CORRÊA
COMISSÃO DE COORDENAÇÃO

Ministro SYDNEY SANCHES


Ministro CARLOS VELLOSO
Ministro FRANCISCO REZEK
PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

Doutor GERALDO BRINDEIRO


COMPOSIÇÃO DAS TURMAS

Primeira Turma
Ministro José Carlos MOREIRA ALVES, Presidente
Ministro SYDNEY SANCHES
Ministro Luiz OCTAVIO Pires e Albuquerque GALLOTTI
Ministro José CELSO DE MELLO Filho
Ministro ILMAR Nascimento GALVÃO
Segunda Turma

Ministro José NÉRI DA SILVEIRA, Presidente


Ministro CARLOS Mário da Silva VFI LOSO
Ministro MARCO AURÉLIO Mendes de Farias Mello
Ministro José FRANCISCO REZEK
Ministro MAURÍCIO José CORRÊA
SUMÁRIO

Pág.
ACÓRDÃOS 1
ÍNDICE ALFABÉTICO I
ÍNDICE NUMÉRICO XXI
ACÓRDÃOS
RECLAMAÇÃO N° 374 — SC
(Tribunal Pleno)

Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves


Reclamante: Câmara de Vereadores do Município de Forquilhinha —Recla-
mado: Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina
Reclamação. Ação direta de inconstitucionalidade proposta,
perante Tribunal estadual, com base em afronta a dispositivo constitu-
cional estadual e a dispositivo constitucional federal.
Reclamação julgada procedente, em parte, para trancar a
ação direta de inconstitucionalidade quanto à causa petendi relativa à
afronta à Constituição Federal, devendo, pois, o Tribunal reclamado
julgá-la apenas no tocante à causa petendi referente à alegaria violação à
Constituição Estadual, causa petendi esta para a qual é ele competente
(artigo 125, § 2°, da Constituição Federal).
ACÓRDÃO que a julgava procedente in totum e decla-
rava extinta a ação direta que tramita na-
Vistos, relatados e discutidos estes au- quele Tribunal.
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- Brasília, 9 de março de 1994 — Octa-
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- vio Gallotti, Presidente —Moreira Alves,
formidade da ata do julgamento e das notas Relator.
taquigráficas, por maioria de votos, em jul-
gar procedente, em parte, a reclamação,
para trancar a ação direta de inconstitucio- RELATÓRIO
nalidade, em causa, com relação ao artigo
2° da Constituição Federal, devendo o Tri- O Sr. Ministro Moreira Alves (Rela-
bunal de Justiça do Estado de Santa Cata- tor): Assim expõe e aprecia a presente re-
rina prosseguir no julgamento com referên- clamação o parecer da Procuradoria-Geral
cia à alegaria violação da Constituição Es- da República, de autoria do Dr. Moacir
tadual. Vencido o Ministro Carlos Veiloso Antonio Machado da Silva:
4 R.T.J. — 158

«A Câmara de Vereadores do Muni- zo de 5 (cinco) dias para o seu forneci-


cípio de Forquilhinha — SC, ajuíza Re- mento.»
clamação, visando a preservar a compe- Nas informações (fl. 39), o Exmo. Sr.
tência do Supremo Tribunal Federal, Presidente eto Tribunal de Justiça de
pretensamente usurpada pelo Órgão Es- Santa Catarina esclarece que deferiu a
pecial do Tribunal de Justiça do Estado liminar na ação direta, por julgar presen-
de Santa Catarina, que, em ação direta te os pressupostos indispensáveis à sua
de inconstitucionalidade, suspendeu li- concessão, o fumus boni iuris e o peri-
minarmente dispositivo da Lei Orgânica culum in mora.
do município, que permitiria ingerência
do Legislativo em área reservada à com- Com vista dos autos (fl. 37), entende
petência do Executivo, afrontando o a Procuradoria-Geral da República que
princípio da independência e harmonia não deve ser acolhida a reclamação.
entre os Poderes. A petição inicial da ação direta de
Sustenta a Reclamante, em síntese, inconstitucionalidade aponta a incom-
que o constituinte federal não previu a patibilidade do parágrafo único do art.
possibilidade de propositura de ação di- 16 da Lei Orgânica do Município de
reta de inconstitucionalidade de lei mu- Forquilhinha com o art. 2° da Constitui-
nicipal por afronta à Constituição Fede- ção Federal e com o art. 32 da Constitui-
ral, nem mesmo perante o Supremo Tri- ção do Estado de Santa Catarina, que
bunal Federal, a quem cabe a sua guarda, apresentam o mesmo teor (fls. 10-16).
nos termos do art. 102, de modo que a Trata-se, portanto, de ação direta de
admissibilidade pelo Órgão Especial do inconstitucionalidade de lei municipal
Tribunal de Justiça de Santa Catarina da em face de preceito da Constituição Es-
proposta pelo Prefeito Municipal de tadual, que reproduz norma da Consti-
Forquilhinha caracterizaria usurpação tuição Federal, de observância obrigató-
da competência da Suprema Corte. ria pelos Estados-membros.
O eminente Relator, Ministro Mo- No julgamento da Reclamação n°
reira Alves, deixou de acolher o pedido 383-3/SP, que tratava de caso similar, o
de suspensão do processo, em despacho Supremo Tribunal Federal admitiu a
com o seguinte teor (fl. 33): competência do Tribunal de Justiça do
Estado, em acórdão assim ementado:
«Tendo em vista o decidido na Re-
clamação n° 383, e a circunstância de «Reclamação com fundamento na
que, no caso, a ação direta de inconsti- preservação da competência do Supre-
tucionalidade é proposta em face da mo Tribunal Federal. Ação direta de
Constituição Estadual, invocando-se, inconstitucionalidade proposta perante
inclusive, a violação ao artigo 32 desta, Tribunal de Justiça na qual se impugna
deixo de determinar a suspensão do pro- Lei municipal sob a alegação de ofensa
cesso impugnado, cujo andamento, a dispositivos constitucionais estaduais
aliás, não poderá causar dano irrepará- que reproduzem dispositivos constitu-
vel em face do ajuizamento da presente cionais federais de observância obriga-
reclamação. tória pelos Estados. Eficácia jurídica
desses dispositivos constitucionais esta-
De outra parte, reitere-se, por telex, duais. Jurisdição constitucional dos Es-
o pedido de informações, marcando pra- tados-membros.
R.T.J. — 158 5

— Admissão da propositura da ação o Tribunal de Justiça local, com possi-


direta de inconstitucionalidade perante bilidade de recurso extraordinário se a
o Tribunal de Justiça local, com possi- interpretação da norma constitucional
bilidade de recurso extraordinário se a estadual, que reproduz a norma consti-
interpretação da norma constitucional tucional federal de observância obriga-
estadual, que reproduz a norma consti- tória pelos Estados, contrariar o sentido
tucional federal de observância obriga- e o alcance desta
tória pelos Estados, contrariar o sentido Reclamação conhecida, mas julgada
e o alcance desta. improcedente.» (Fl. 45)
Reclamação conhecida, mas julgada No caso, porém, há uma peculiaridade:
improcedente.» a ação direta de inconstitucionalidade em
À vista do precedente parecer é no causa se funda, também, no artigo 2° da
sentido da improcedência da ação.» Constituição Federal, o que implica dizer
(Fls. 43/45) que essa ação foi proposta sob o fundamen-
É o relatório. to de afronta não só à Constituição Esta-
dual, mas também à Constituição Federal.
VOTO Configura-se, pois, parcialmente, a hi-
O Sr. Ministro Moreira Alves (Rela- pótese a que aludi na parte final do voto
tor): 1. Do exame dos autos, verifica-se que que, como relator, proferi na aludida Re-
a ação direta de inconstitucionalidade em clamação n° 383, verbis:
causa foi proposta com base na alegada «Só excepcionalissimamente, e em
afronta ao princípio da separação de Pode- face objetivamente dessa causa peten-
res, invocando-se o artigo 32 da Constitui- di, é que este Tribunal, como sucede
ção Estadual e o artigo 2° da Constituição com a ação de inconstitucionalidade de
Federal que aquele reproduz. lei municipal em face da Constituição
Ora, no julgamento da Reclamação n° Federal, poderá trancar a ação para pre-
383, esta Corte firmou o entendimento que servar sua competência de guardião da
assim está sintetizado na ementa do acór- Constituição Federal.»
dão então prolatado: 2. Assim sendo, julgo procedente, em
«Reclamação com fundamento na parte, a presente reclamação, para trancar a
preservação da competência do Supre- ação direta de inconstitucionalidade quanto
mo Tribunal Federal. A Ação Direta de à causa petendi relativa à afronta à Cons-
Inconstitucionalidade proposta perante tituição Federal, devendo, pois, o Tribunal
Tribunal de Justiça na qual se impugna reclamado julgá-la apenas no tocante à
Lei municipal sob a alegação de ofensa causa petendi referente à alegada violação
a dispositivos constitucionais estaduais à Constituição Estadual, causa petendi
que reproduzem dispositivos constitu- esta para a qual é ele competente (artigo
cionais federais de observância obriga- 125, § 2°, da Constituição Federal).
tória pelos Estados. Eficácia jurídica VOTO
desses dispositivos constitucionais esta-
duais. Jurisdição constitucional dos Es- O Sr.Mintstro Carlos Venoso: Sr. Pre-
tados-membros. sidente, no julgamento da Reclamação n°
— Admissão da propositura da ação 383-SP, sustentei a tese no sentido de que,
direta de inconstitucionalidade perante se a ação direta, proposta no Tribunal de
6 R.T.J. — 158

Justiça, ataca dispositivo de lei municipal EXTRATO DA ATA


em face da Constituição Estadual que re- Rcl 374 — SC — Rel.: Ministro Morei-
produz norma da Constituição Federal, a ra Alves. Recite.: Câmara de Vereadores do
ação não pode prosseguir, dado que inexis- Município de Forquilhinha (Adv.: Wemer
te o controle in abstrato da lei municipal Backes). Recldo.: Órgão Especial do Tri-
frente à Constituição Federal. bunal de Justiça do Estado de Santa Cata-
Reportando-me ao voto que proferi na rina.
citada Reclamação n° 383-SP, peço licença Decisão: Por maioria de votos, o Tribu-
ao Sr. Ministro Relator para dar pela pro- nal julgou procedente, em parte, a reclama-
cedência total da Reclamação. Procedente ção, para trancar a ação direta de inconsti-
a Reclamação, julgo, de logo, extinta a ação tucionalidade, em causa, com relação ao
direta, objeto da mesma reclamação. art. 2° da Constituição Federal, devendo o
Tribunal de Justiça do Estado de Santa
VOTO Catarina prosseguir no julgamento com re-
ferência à alegada violação da Constituição
Estadual. Vencido o Ministro Carlos Vel-
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
loso que a julgava procedente «in totum» e
Senhor Presidente, na Reclamação n° 383, declarava extinta a ação direta que tramita
o meu voto, em linhas gerais, coincidiu naquele Tribunal. Votou o Presidente.
com o que acaba de recordar o eminente
Ministro Carlos Velloso. Não obstante cui- Presidência do Senhor Ministro Octavio
da-se, no caso, de matéria em que entendo Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
deva manter-se a uniformidade da jurispru- Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
dência do Tribunal para evitar até decisões Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlve-
interlocutórias discrepantes. da Pertence, Celso de Mello, Carlos Vello-
so, Marco Aurélio, Ilmar Gaivão e Francis-
Si et in quantum e com a ressalva de
co Rezek. Procurador-Geral da República,
minha opinião pessoal em contrário, acom-
Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
panho o eminente Relator e julgo proceden-
te a reclamação, com as vênias do Ministro Brasília, 9 de março de 1994 — Luiz
Carlos Velloso. Tomimatsu, Secretário.

MANDADO DE INJUNÇÃO N° 444 — MG


(Questão de Ordem)
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches
Impetrantes: José Abílio Pato Guimarães e outros — Impetrado: Presidente
da República
Direito Constitucional e Processual Civil.
Mandado de Injunção.
Servidores autárquicos. Escola Superior de Agricultura de
Lavras — ESAL (autarquia federal sediada em Lavras, Minas Gerais).
Aposentadoria especial.
R.T.J. — 158 7

Atividades insalubres. Artigos 5°, inc. LXXI, e 40, § 1°, da


Constituição Federal.
O § 1° do art. 40 da Cl? apenas faculta ao legislador,
mediante lei complementar, estabelecer exceções ao disposto no inciso
III,a e c, ou seja, instituir outras hipóteses de aposentadoria especial, no
caso de exercício de atividades consideradas penosas, insalubres ou
perigosas.
Tratando-se de mera faculdade conferida ao legislador,
que ainda não a exercitou, não há direito constitucional já criado, e cujo
exercício esteja dependendo de norma regulamentadora.
Descabimento do Mandado de Injunção, por falta de
possibilidade jurídica do pedido, em face do disposto no inc. LXXI do
art. 5° da CF, segundo o qual somente é de ser concedido mandado de
injunção, quando a falta de norma regulamentadora torne inviável o
exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.
Mandado de Injunção não conhecido. Votação unânime.
ACÓRDÃO 2. A manifestação, então exarada, en-
contra-se reproduzida às fls. 108/117, in
Vistos, relatados e discutidos estes au- verbis:
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- «Artigo 40, § 1°, da Constituição Fe-
formidade da ata do julgamento e das notas deral. Aposentadoria especial. Falta de
taquigráficas, por unanimidade de votos, norma regulamentadora.
em, resolvendo questão de ordem suscitada
pelo Relator, não conhecer do mandado de O Conselho Nacional de Técnicos
injunção, por falta de possibilidade jurídica em Radiologia, autarquia federal, im-
do pedido. petra o presente mandado de injunção
coletivo em favor de seus associados,
Brasflia, 29 de setembro de 1994 — Técnicos em Radiologia e Auxiliares,
Octavio Gallotti, Presidente — Sydney contra o Presidente da República, o
Sanches, Relator. Congresso Nacional e o Presidente da
Fundação Hospitalar do Distrito Fe-
RELATÓRIO deral, objetivando a implementação da
norma contida no § 1° do artigo 40 da
(Questão de Ordem) Constituição Federal.
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela- 2. O caput do aludido dispositivo
tor): 1. O Exmo. Sr. Procurador - Geral da constitucional dispõe sobre a aposenta-
República Dr. Aristides Junqueira Alva- doria do servidor público, e seu § 1°
renga, no parecer de fl. 107, reportou-se ao prescreve que «Lei complementar po-
que havia apresentado nos autos do Man- derá estabelecer exceções ao disposto
dado de Injunção n° 425, impetrado pelo no inciso111,a e c, no caso de exercício
Conselho Nacional de Técnicos em Radio- de atividades consideradas penosas,
logia. insalubres ou perigosas.»
8 R.T.J. — 158

As alíneas a e c do inciso III, tuição Federal, ao dispor que a maté-


citadas, prevêem aposentadoria volun- ria em questão seria regulamentada
tária com proventos integrais, aos trinta por Lei Complementar, não fixou
e cinco anos de serviço, se homem, e aos para que tal providência se ultimas-
trinta, se mulher; e, com proventos pro- se».
porcionais, aos trinta anos de serviço, se Esclareceu, ainda, aquela Autori-
homem, e aos vinte e cinco, se mulher. dade que se encontra em tramitação na
O Impetrante, alegando que os Câmara dos Deputados, já aprovado
Técnicos em Radiologia e Auxiliares pelo Senado Federal, o Projeto de Lei
sempre tiveram os seus locais de traba- Complementar n° 224, de 1989, do Se-
lho considerados insalubres, entende nado, de autoria do Senador Carlos
que têm eles direito à aposentadoria es- Chiarelli (Projeto de Lei Complemen-
pecial, com vinte e cinco anos de tempo tar n° 246, na Câmara dos Deputados),
de serviço. que «Estabelece condições para a apo-
Requer, por fim, o Impetrante: sentadoria especial dos servidores pú-
blicos civis da União, Estados, Muni-
va) que sejam as Autoridades cípios e do Distrito Federal, bem
Impetradas consideradas em estado como dos trabalhadores regidos pela
de mora, e em conseqüência, adote CLT, conforme o disposto, respecti-
um prazo curto, de no mákimo 90 vamente, no 1° do art. 40 e no inciso
dias, as providências legislativas que II do art. 202, da Constituição Fe-
se impõem para o cumprimento da deral».
obrigação de legislar editando por lei Estão anexados a esse projeto de
complementar o direito dos filiados lei os de n° 77/89 (Deputado Gonzaga
da Impetrante no mesmo parâmetro Patriota); 144/89 (Deputado Ismael
com os celetistas do INSS, na for- Wanderley); 212/89 (Deputado Adyl-
ma da Lei n° 8.212/91, na linha do son Motta); 249/90 (Deputado Francis-
precedente do MI 232-RJ, in DJ co Amaral); 258/90 (Deputado Hélio
16-8-91; Rosas); 18/91 (Deputado Jurandyr Pai-
b) que caso as Autoridades Impe- xão); 37/91 (Deputado Geraldo Alcici-
tradas não façam a lei complementar min Filho); 49/91 (Deputado Marcelo
no prazo determinado por esse Tribu- Barbieri); 51/91 (Deputado Dercio
nal, que fique garantido aos Técnicos Knop), e 53/91 (Deputado Hugo Biehl).
em Radiologia e auxiliares, filiados O Senhor Presidente da Repúbli-
da Impetrante, o exercício do direito ca transmitiu as informações elaboradas
de se aposentarem aos 25 anos por pela Advocacia-Geral da União (fls.
tempo de serviço, em face das nor- 199/210), pela Secretaria da Adminis-
mas pretéritas à Constituição de tração Federal (fls. 211/215) e pelo Mi-
1988, porque recepcionadas por ela.» nistério do Trabalho (fls. 216/223).
(Grifos do original). Aquele mais alto órgão de con-
Foram solicitadas informações sulta jurídica do Poder Executivo assim
aos Impetrados (fls. 154, 156 e 158). concluiu a respeito da presente injun-
7. O Presidente do Congresso Na- ção:
cional prestou suas informações (fls. «8. Vê-se no processo que se for-
160/161), esclarecendo que «a Consti- mou para subsidiar as presentes in-
R.T.J. — 158 9

formações sobre a matéria aventada Sua atividade precípua não é


pelo Conselho Nacional de Técnicos a de defender seus associados em
em Radiologia, a existência de dois juízo, a não ser que disponha de au-
pronunciamentos de caráter jurídico. torização legal para assim proceder,
O primeiro deles, oriundo do órgão e sim a de promover a regulamenta-
jurídico do Ministério do Trabalho, ção, a fiscalização e defesa da classe,
aborda o tema sob o ângulo da carên- estritamente no que concerne aos as-
cia da pretensão, argüindo, com pectos profissionais.
muita propriedade, sobre a legitima-
Desse modo, endossando a
tio ad causam e substituição pro-
tese esposada no aludido parecer, en-
cessual, concluindo pela improce-
tendo, preliminarmente, que a ma-
dência do remedium juris por falta
téria versada na ação proposta so-
de legitimação da autarquia corpo-
mente poderá ser acolhido se se apre-
rativa para agir. Esta a preliminar a
sentar como induvidosa, límpida, a
qual se deve aderir, uma vez que a
legitimação para agir, isto é, se pos-
substituição processual acha-se in-
suir o Conselho autorização legal
timamente ligada à sobredita condi-
para comparecer em juízo como
ção da ação e ocorre quando alguém
substituto processual (veja-se, a
está legitimado para agir em juízo,
propósito, os arts. 3° e 6° do Código
em nome próprio, como autor ou réu,
de Processo Civil sobre interesse e
ou para a defesa do direito de outrem.
legitimidade para agir).
A toda evidência, não se justi- No que tange ao estudo ofe-
fica uma autarquia corporativa to- recido como adminículo às presen-
mar lugar na representação judicial tes informações pela Secretaria da
quando, na verdade, a entidade sindi- Administração Federal da Presi-
cal (representante da categoria) é, in- dência da República, consubstancia-
dubitavelmente, a titular do interesse do na Nota n° 12 ASJUR/SAF, de
de seus associados.
1-9-1993, tenho a acrescentar que o
Como bem salientado no Pa- Mandado de Injunção possui suas li-
recer CJ/MTb/n° 200/93, «Inexiste mitações no seu campo de incidência
no caso (ora em debate) a figura da e não se deve pensar — como bem
substituição processual, uma vez que salientou o Prof. Celso Agricola
o impetrante não satisfaz a exigência Barbi em estudo publicado na obra
legal para sê-lo. A legislação trazida «Mandados de Segurança e Injun-
a confronto e mais a parte doutrinária ção», Saraiva: 1990:396 — citando,
falam da necessidade de preceito le- inclusive, o Min. Athos Gusmão
gal autorizativo de substituição, o Carneiro, «que é panacéia capaz
que não se comprova existir.» de curar todos os males jurídicos.»
E, ademais, o impetrante não é Lecionando sobre essas limi-
nenhuma agremiação ou associação, tações práticas ao campo do referido
como se pretende, porém, uma autar- mandamus, aduz o ilustre civilista
quia criada pela Lei n° 7.394, de 29 de Minas Gerais:
de outubro de 1985, (veja-se o art. «A função jurisdicional tem li-
12), bem como, na conformidade do mitações naturais na sua ativida-
art. 1° do seu Regimento Interno. de, o que a leva a não poder satis-
10 R.T.J. — 158

fazer a todos os direitos que sejam o presente mandamus extrapola os


reclamados. Basta que a comple- limites estabelecidos no Estatuto
xidade exigida para a proteção de Fundamental vigente (art. 5°, inciso
um direito seja tal que, na prática, LXXI); e fazendo coro com as argu-
o juiz não possa chegar a um re- mentações produzidas no Parecer
sultado eficaz e no tempo ade- CJ/MTb/n° 200/93 e na Nota AS-
quado.» JUR/SAF, que passam a integrar es-
Pelo que se pode inferir dos ensi- tas informações, entendo que a via
namentos acima produzidos, não eleita se me afigura inidônea, incom-
basta ao magistrado pretender com- possível, portanto, com a finalidade
pelir, o Excelentíssimo Senhor Pre- do instrumento jurídico utilizado
sidente da República e o Congresso para pretender adimplir, tanto o Che-
Nacional a editar Lei Complementar fe do Poder Executivo como o Con-
como pretende a impetrante. A com- gresso Nacional, para editar Lei
plexidade de dados necessários à fei- Complementar, cuja edição não tem
o caráter de imposição na confor-
tura da Lei Complementar é de gran-
de monta, principalmente, se se levar r
midade do § do art. 40, da Consti-
tuição da República.»
em conta que o seu público-alvo é,
também, enorme. A Fundação Hospitalar do Dis-
15. Postula-se sobre suposto di- trito Federal prestou suas informações
reito, que o preceito constitucional (fls. 226/228), esclarecendo ser parte
não tem o cunho da obrigatorieda- ilegítima para a ação «eis que dela não
de: «Lei Complementar poderá es- se exige, nem se pode exigir, qualquer
tabelecer exceções ao disposto no in- ação ou omissão, relativamente a edi-
ciso III, a e c, no caso de exercício de ção de Lei Complementar ou Ordiná-
atividades consideradas penosas, in- ria, cabendo-lhe cumprir, tão-somen-
salubres ou perigosas» (art. 40, § 1° te, o que a lei determina».
da CF/88). Com efeito, cabe alegar a ilegiti-
Ora, visivelmente, percebe-se que midade ativa ad causam do Impetrante
o Mandado de Injunção não tem o para propor o mandado de injunção,
escopo de ordenar ato concreto de pois «não se justifica uma autarquia
satisfação de um pretenso direito, ja- corporativa tomar lugar na represen-
mais poderá ser elencado entre aque- tação judicial quando, na verdade, a
les direitos efetiva e explicitamente entidade sindical (representante da
considerados pela Carta Política; es- categoria) é indubitavelmente, a titu-
tes sim, estão sujeitos a esse meio lar do interesse de seus associados».
formal destinado a compelir aos ór-
gãos e instituições estatais que des- 14. Como bem ressaltou o Senhor
cumprirem (por inércia ou omissão) Ministro Celso de Mello no MI n° 408-1
o dever constitucionalmente prescri- (Medida Liminar), «Só dispõem de le-
to, de editar normas regulamenta- gitimidade ativa ad causam, para
doras. efeito de impetração do mandado de
injunção, aqueles a quem houver sido
atribuída, pela Constituição Federal,
17. Sem delongar-me, e em con- a titularidade de direitos, garantias e
clusão, acho-me convencido de que prerrogativas, cujo exercício esteja
R.T.J. — 158 11

sendo obstado por uma situação de não se submete à competência originária


lacuna técnica que, configurada pela do Supremo Tribunal Federal.
ausência de norma regulamentadora, 20. Pelo exposto, o Ministério Pú-
seja exclusivamente imputável ao Es- blico Federal opina pelo não conheci-
tado.» mento do presente mandado de injun-
No caso, nem mesmo os Técni- ção.»
cos em Radiologia e Auxiliares detêm 3. Trago, agora, os autos à considera-
legitimidade ativa para o mandado de ção do E. Plenário, para exame das ques-
injunção, pelo fato de também não se- tões de ordem, suscitadas pelo Ministério
rem titulares de direito constitucional- Público Federal.
mente assegurado, cujo exercício se tor-
na inviável pela falta de norma regula- É o relatório.
mentadora. VOTO
Isto porque, tratando-se de nor-
ma constitucional facultativa, a contida O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela-
no § 1° do artigo 40 da Constituição tor): 1. Ao julgar, nesta mesma data, o
Federal, não impõe a mesma uma obri- Mandado de Injunção n° 425-1/400, impe-
gação. Como bem assevera José Afonso trado pelo Conselho Nacional de Técnicos
da Silva, em sua obra «Aplicabilidade em Radiologia, com o mesmo objeto, o
das Normas Constitucionais», RT, 2° Plenário do Tribunal, em decisão unânime,
Edição, 1982, página 117, as normas prestigiando meu voto de Relator, não co-
facultativas ou permissivas «limitam- nheceu do pedido, porque o § 1° do art. 4°
se a dar ao legislador ordinário a pos- da Constituição Federal, no qual se baseara
sibilidade de instituir ou regular a aquela e se baseia também a presente impe-
situação nelas delineadas.» tração, não impõe ao legislador, mas, sim,
apenas lhe faculta, a elaboração de lei com-
Assim, a iniciativa da lei de que plementar que estabeleça exceções ao dis-
se trata está vinculada ao poder discri- posto no inciso
cionário do legislador. III, letras a e c, do mesmo
artigo, no caso de exercício de atividades
Preliminarmente, ainda, convém consideradas penosas, insalubres ou peri-
alegar, também, a ilegitimidade passiva gosas.»
do Congresso Nacional para a ação, ten- 2. No voto, que então proferi, destaquei:
do em vista que é privativa do Chefe do
Governo a iniciativa da lei complemen- Todas as preliminares suscitadas
tar de que trata o § I° do artigo 40 da no parecer da Procuradoria-Geral da Re-
Constituição Federal, por força do dis- pública, uma vez acolhidas, conduzem
posto em seu artigo 61, § 1°, inciso II, à extinção do processo, sem exame do
alínea a. Assim, o Congresso Nacional mérito, e, técnica adotada, de longa data,
não pode ser invocado como pólo passi- no Supremo Tribunal Federal, ao não
vo da relação processual. conhecimento de pedido de mandado de
injunção.
19. Por outro lado, a impetração é
dirigida, ainda, contra o Presidente da 2. Uma delas, porém, precede a to-
Fundação Hospitalar do Distrito Fede- das, qual seja a relativa à possibilidade
ral, que, por não se incluir dentre a au- jurídica do pedido.
toridade e órgãos relacionados no artigo É que se o pedido for juridicamente
102, inciso I, alínea g, da Carta Federal, impossível, ninguém poderá formá-lo,
12 R.T.J. —158

não se precisando cogitar, nessa hipóte- Não cria direito, cujo exercício dependa
se, sobre se o autor da ação tem ou não de atividade normativa regulamenta-
legitimidade ativa para a propositura, dora.
nem sobre se os réus têm ou não legiti- E o mandado de injunção, mesmo em
midade passiva, para, nessa qualidade, a tese, só pode ser concedido, se «a falta
ela se sujeitarem no processo. de norma regulamentadora» tornar in-
Na verdade, o pedido é, a meu ver, viável o exercício dos direitos e liberda-
juridicamente impossível, pois, se não de constitucionais e das prerrogativas
pode ser formulado pelo autor (Conse- inerentes à nacionalidade, à soberania e
lho Nacional de Técnicos em Radiolo- à cidadania», como estabelece o inciso
gia), também não pode ser apresentado, LXXI do art. 5° da Constituição Federal.
por outrem, ou seja, por quaisquer ser- Ora, se o que falta, no caso, não é
vidores, inclusive os próprios TécnicoF a norma regulamentadora do exercício
em Radiologia. Ou por outras pessoas. de um direito já criado, mas, sim, a
Com efeito, dispõe o art. 40 da própria norma criadora do direito, já que
Constituição Federal: o § 1° do art. 40 apenas a permitiu,
facultativamente, ou melhor, não impôs,
«Art. 40 — O servidor será apo-
então o mandado de injunção, como im-
sentado:
petrado, não tem possibilidade jurídica,
•-• não só para o autor, como para os pró-
III — voluntariamente: prios Técnicos em Radiologia, ou para
quaisquer servidores, mesmo os que já
a) — aos trinta e cinco anos de ser- exerçam «atividades consideradas pe-
viço, se homem, e aos trinta, se mulher, nosas, insalubres ou perigosas».
com proventos integrais;
A esse propósito, assinalou, com
propriedade, o parecer da Procuradoria-
c) — aos trinta anos de serviço, se Geral da República, às fls. 245/246,
homem, e aos vinte e cinco, se mulher, itens 15, 16 e 17:
com proventos proporcionais a esse «15. No caso, nem mesmo os Técni-
tempo; cos em Radiologia e Auxiliares detêm
legitimidade ativa para o mandado de
injunção, pelo fato de também não se-
E o § 1° acrescenta: «Lei Comple- rem titulares de direito constitucional-
mentar poderá estabelecer exceções mente assegurado, cujo exercício se tor-
ao disposto no inciso III, a e c, no caso na inviável pela falta de norma regula-
de exercício de atividades consideradas mentadora.
penosas, insalubres ou perigosas.»
16. Isto porque, tratando-se de nor-
5. Já se vê, pois, que o § 1° do art. 40 ma constitucional facultativa, a contida
da Constituição Federal não cria, desde no § 1° do artigo 40 da Constituição
logo, qualquer direito para os servidores Federal, não impõe a mesma uma obri-
que exerçam «atividades consideradas gação. Como bem assevera José Afonso
penosas, insalubres ou perigosas.» da Silva, em sua obra «Aplicabilidade
Apenas permite que a Lei Comple- das Normas Constitucionais», RT,
mentar o faça. Faculta a atuação discri- Edição, 1982, página 117, as normas
cionária do legislador. Não a impõe. facultativas ou permissivas «limitam-se
R.T.J. — 158 13

a dar ao legislador ordinário a possibili- tão ora suscitada na presente sede injuncio-
dade de instituir ou regular a situação nal.
nelas delineadas.» As razões que fundamentaram a minha
17. Assim, a iniciativa da lei de que decisão permitem-me acompanhar, sem
se trata está vinculada ao poder discri- ressalvas, o pronunciamento do Relator,
cionário do legislador.» Min. Sydney Sanches.
Acrescento que, em situação asse- A norma constitucional em questão pos-
melhada, o eminente Ministro Celso de sui o seguinte conteúdo material, verbis:
Meio, negou trânsito ao Mandado de «Art. 40 — O servidor será apo-
Injunção n° 463-3/MG, impetrado por sentado:
servidor público já aposentado, visando
à edição da mesma Lei Complementar
aqui reclamada, a fim de que lhe pudesse III — voluntariamente:
ser concedida aposentadoria especial,
pelo desempenho de atividade insalu- a) aos trinta e cinco anos de serviço,
bre. se homem, e aos trinta, se mulher, com
proventos integrais;
Isto posto, acolhendo, desde logo,
a 1' preliminar do parecer da Procurado-
ria-Geral da República não conheço do c) aos trinta anos de serviço, se ho-
pedido de mandado de injunção, por mem, e aos vinte e cinco, se mulher, com
falta de possibilidade jurídica do pedi- proventos proporcionais a esse tempo;
do, no caso.»
No caso dos autos não se trata de § 1° Lei Complementar poderá es-
técnicos em radiologia, mas de servidores tabelecer exceções ao disposto no inciso
da Escola Superior de Agricultura — III, a e c, no caso de exercício de ativi-
ESAL (autarquia federal sediada em La- dades consideradas penosas, insalubres
vras, Minas Gerais), que alegam exercer ou perigosas.» (grifei)
atividades insalubres.
O preceito inscrito no art. 40, § 1°, da
De qualquer maneira a conclusão há de Carta Política não consubstancia ordem de
ser a mesma, pois também se trata de inter- legislar. Contempla, meramente, simples
pretar o disposto no art. 40, § 1°, da Cons- faculdade deferida ao legislador comum,
tituição Federal, em face do que estabelece que, em função de um juizo de oportunida-
o inciso LXXI do art. 5°, ao tratar do man- de e conveniência que lhe é privativo, po-
dado de injunção. derá estabelecer exceções ao regime geral
Isto posto, adotando os fundamentos das aposentadorias previsto no art. 40,
deduzidos no mencionado precedente de da Constituição. Nesse sentido é o magis-
hoje, também aqui não conheço do pedido, tério de Maria Sylvia Zanella Di Pietro
por falta de possibilidade jurídica. («Direito Administrativo», pág. 325,
1990, Atlas).
VOTO Essa norma, destinada exclusivamente
aos órgãos estatais incumbidos da forma-
O Sr. Ministro Celso de Meio: Ao ção das leis, permite-lhes, a partir de uma
proferir decisão, como Relator, no MI n° atividade discricionária, o estabeleci-
463-MG, tive o ensejo de apreciar a ques- mento de derrogações ao regime jurídico da
14 R.T.J. — 158

aposentação, sem que nela se contenha a texto constitucional, não lhes assiste pre-
veiculação de qualquer direito instituído tensão alguma de ver realizada pelo Estado
em favor daqueles que exerçam atividades a prestação legislativa que ora postulam.
penosas, insalubres ou perigosas. Ademais, é preciso ter presente que o
Na realidade, e tal como precedente- direito à legislação só pode ser invocado
mente salientado, o conteúdo dessa norma pelo particular quando também existir,
e a finalidade a que ela se destina permitem correlatamente imposta pelo próprio
afirmar a impossibilidade de invocação da texto constitucional, a previsão do dever
tutela jurisdicional pela via do mandado de estatal de emanar normas legais. Isso signi-
injunção, que só tem pertinência e aplica- fica que o direito individual à atividade
bilidade nas hipóteses em que o preceito da legislativa do Estado apenas se evidencia
Constituição outorga, desde logo, o pró- naquelas estritas hipóteses em que o de-
prio direito material que vem a ser vindica- sempenho da função instauradora da ordem
do pelos impetrantes. normativa reflete, por efeito de determi-
Não constitui demasia assinalar — na nação constitucional, uma obrigação jurí-
dica indeclinável.
linha da orientação jurisprudencial desta
Corte (RTJ 134/15, Rel. Min. Sepúlveda Torna-se essencial, desse modo, para
Pertence; MI 200, Rel. Min. Octavio Gal- que possa atuar a norma pertinente à figura
lotti; MI 245, Rel. MM. Sepúlveda Per- do mandado de injunção, que se estabeleça
tence) — que só dispõe de legitimidade a necessária correlação entre a imposição
ativa ad causam, para efeito de impetração constitucional de legislar e o direito pú-
do mandado de injunção, aquele a quem blico subjetivo à legislação, de tal forma
houver sido atribuída in abstracto, pela que, ausente a obrigação jurídica de emanar
própria Constituição, a titularidade de di- provimentos legislativos — o que se dá
reitos, garantias e prerrogativas cujo exer- quando a Constituição contempla, como no
cício esteja sendo causalmente obstado por caso, mera faculdade discricionária de le-
uma situação de vacum juris, imputável gislar —, não se toma possível imputar
ao Estado e objetivamente configurada pela comportamento moroso ao Estado.
ausência de norma regulamentadora (RTJ A eventual inércia do Poder Público,
140/339-340, Rel. MM Celso de Mello). que deixa de exercer a faculdade de legis-
No caso presente, constata-se que a lar, não o faz incidir em situação configu-
Constituição não conferiu originariamente radora de inadimplemento de uma presta-
a nenhum servidor público o direito à apo- ção legislativa cuja concretização sequer
sentadoria especial pelo exercício de ativi- lhe foi exigida. Sem imposição constitucio-
dades perigosas, insalubres ou penosas. O nal legiferante, toma-se inviável qualquer
preceito invocado pelos impetrantes limi- cogitação em tomo da mora estatal no de-
tou-se, simplesmente, a autorizar o legisla- sempenho do encargo de legislar.
dor comum a estabelecer, querendo, as O que, no entanto, apresenta-se como
hipóteses de concessão desse benefício juridicamente relevante na espécie é a cir-
funcional, não havendo como reconhecer cunstância de que a norma inscrita no art.
ao servidor público a titularidade do direito 40, § 1°, da Constituição não assegurou ao
reclamado. servidor público, ainda que exercente de
Não titularizando os impetrantes qual- atividades perigosas, insalubres ou peno-
quer situação subjetiva de vantagem, que sas, qualquer direito público subjetivo à
possa ser inferida diretamente do próprio obtenção da aposentadoria especial. Esse
R.T.J. — 158 15

preceito da Carta Política — como já assi- público («Direito Administrativo», pág.


nalado — simplesmente permite que o Es- 157, 3° ed., 1993, Saraiva).
tado, mediante lei complementar, e se as- Feitas essas considerações, acompanho
sim julgar oportuno e conveniente, veicule o voto do em. Relator, não conhecendo da
regras exorbitantes do regime constitucio- presente ação injuncional.
nal comum pertinente às aposentadorias.
É o meu voto.
Esse, em essência, é o real sentido da
norma em questão, que foi promulgada EXTRATO DA ATA
para legitimar a estipulação de condições
especiais de aposentadoria, em termos a MI 444 (Questão de Ordem) — MG —
serem avaliados, discricionariamente, pelo Rel.: Min. Sydney Sanches. Imptes.: José
legislador comum. Abilio Pato Guimarães e outros (Advs.:
Alexandre Christo Aleixo e outro). Impdo.:
Não é, pois, o servidor público, ao con- Presidente da República
trário do que pretendem os impetrantes, o
verdadeiro destinatário dessa prescrição Decisão: Apresentado o feito em mesa,
constitucional, que, em última análise, ob- julgamento foi adiado em virtude do
jetiva ensejar ao legislador comum, desde adiantado da hora. Plenário, 10-8-94.
que formalmente provocado pelo Chefe do Decisão: Apresentado o feito em mesa,
Poder Executivo da União (CF, art. 61, § julgamento foi adiado em virtude do
1°, II, c), um campo mais dilatado de atua- adiantado da hora. Plenário, 17-8-94.
ção normativa em tema de aposentadorias Decisão: Apresentado o feito em mesa,
funcionais. julgamento foi adiado em virtude do
Daí, a observação de Manoel Gonçal- adiantado da hora. Plenário, 31-8-94.
ves Ferreira Filho, ao tratar, precisamen- Decisão: Por votação unânime, o Tribu-
te, do art. 40, § 1°, da Carta Política, verbis: nal, resolvendo questão de ordem suscitada
«O seu ponto central está em que a pelo Relator, não conheceu do mandado de
Constituição autoriza a redução do tem- injunção, por falta de possibilidade jurídica
po de serviço exigido para a aposenta- do pedido. Votou o Presidente. Ausente,
doria voluntária, ou do limite de idade ocasionalmente, o Ministro Sepúlveda Per-
fixado para a aposentadoria compulsó- tence.
ria (art. 40), em razão da natureza do Presidência do Senhor Ministro Octavio
serviço.» («Comentários à Constitui- Galloti. Presentes à Sessão os Senhores
ção Brasileira», vol. 1/269, 1990, Sa- Ministros Néri da Silveira, Sydney San-
raiva) ches, Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence,
Celso de Mello, Carlos Velloso, limar Gai-
Perfilha igual orientação Diógenes vão e Francisco Rezek. Ausentes, justifica-
Gasparini, para quem a norma constitucio- damente, os Senhores Ministros Moreira
nal em questão existe para autorizar o legis- Alves e Marco Aurélio.
lador comum a introduzir exceções derro-
gatórios no preceito da Carta Federal que Vice-Procurador-Geral da República,
contempla, em seu art. 40, III, as regras Dr. Moacir Antonio Machado da Silva.
concernentes ao tempo de aquisição do di- Brasília, 29 de setembro de 1994 —
reito à aposentadoria voluntária no serviço Luiz Tomimatsu, Secretário.
16 R.T.J. — 158

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 465 — DF


(Tribunal Pleno)

Relator p/o acórdão: O Sr. Ministro limar Gaivão


Requerente: Governador do Estado da Paraíba — Requeridos: Governador
do Estado da Paraíba e Assembléia Legislativa do Estado da Paraíba
Artigos 32, parágrafo único, e 136, VII, da Constituição Esta-
dual e Leis Complementares números 4 e 5, de 8-1-1991, do Estado da
Paraíba, que estabeleceram vinculação e isonomia de vencimentos entre
as carreiras do Ministério Público, dos advogados de oficio e dos procura-
dores do Estado. Alegado conflito com os arts. 37, XIII, e 39, § 1°, da
Constituição Federal.
Alegação insustentável, relativamente ao primeiro dispositi-
vo indicado, da Carta Estadual, que se limita a reproduzir o art. 39, § 1°,
da Constituição Federal.
Inconstitucionalidade manifesta dos demais, por configura-
rem a hipótese de vinculação proibida, prevista no art. 37, XIII, da
referida Carta, já que o art. 39, parágrafo único, não conferiu isonomia
automática de vencimentos entre os cargos da carreira do Ministério
Público e os das demais carreiras em referência.
Procedência parcial da ação.

ACÓRDÃO RELATÓRIO

Vistos, relatados e discutidos estes au- O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- tor): Trata-se de ação direta de inconstitu-
bunal Federal, por seu Tribunal Pleno, na cionalidade, com pedido de medida caute-
conformidade da ata do julgamento e das lar, ajuizada, com fundamento no art. 103,
notas taquigráficas, por maioria de votos, item V, da Constituição, pelo Governador
em julgar procedente, em parte, a ação, para do Estado da Paraíba, argüindo a inconsti-
declarar a inconstitucionalidade do art. tucionalidade dos arts. 32, parágrafo único,
136, item VII, da Constituição do Estado e 136, item VII, ambos da Constituição do
da Paraíba, bem como das Leis Comple-
aludido Estado, bem assim das Leis Com-
mentares n°s 4 e 5, ambas de 8-1-91, do
plementares es 4 e 5, ambas de 8-1-1991,
mesmo Estado, vencidos os Ministros Re-
arts. 1° e seguintes, «que estabeleceram
lator, Francisco Rezek, Marco Aurélio e
Carlos Velloso, que a julgavam «in totum» vinculação e isonomia de vencimentos en-
improcedente. Votou o Presidente. tre as carreiras do Ministério Público e dos
Advogados de Ofício, integrantes do Gru-
Brasília, 17 de junho de 1993 — Octa- po Assistência Judiciária (LC n° 4) e do
vio Gallotti, Presidente — limar Gaivão, Ministério Público e Procuradores do Esta-
Relator p/o acórdão do (LC 05).»
R.T.J. — 158 17

Alega o requerente que as equivalências aludidas leis transborda os limites cons-


e equiparações de que cuidam os mencio- titucionais, sendo abusivas e ilegais, ca-
nados diplomas estão em conflito com os recedoras de suprimentos jurídicos que
arts. 37, item XIII, e 39, § 1°, da Constitui- lhes dê a mais remota guarida. Os reco-
ção Federal, tendo em vista não se tratar de nhecimentos de igualdades de atribui-
cargos de atribuições iguais ou assemelha- ções por assemelhações de atividades
das, sendo inadmissível, em conseqüência, entre os que integram o Ministério Pú-
a vinculação de vencimentos. blico e os advogados de ofício e procu-
Registra a inicial o aspecto da vedação radores do Estado, vez que as funções
constitucional sobre equivalências e são diversas, e tanto as são, que a atual
equiparações, asseverando o requerente, às Constituição federal, tratou de discipli-
fls. 3/4: nar cada carreira em separado e em se-
ções distintas, e cada qual tem suas leis
«Tais atos e definições atentam mais orgânicas estaduais ou federais, mos-
que dispositivos legais da lei maior, os trando atribuições, organizações e fun-
quais preconizam sobre os mesmos, ve- ções diversas.»
dando equivalências e equiparações que
não sejam entre atividades similares ou Adiante, anota o Chefe do Executivo
correlatas, o que não se adequa in casu, paraibano, «que cada uma das atividades,
a matéria objeto da presente demanda, as quais pretendem os legisladores esta-
vez que as atribuições que se pretende duais equiparar, guardam suas característi-
atrelar para uma interpretação igualitá- cas e peculiaridades próprias e inerentes às
ria, são distintas e díspares. O Ministério suas atividades, sendo notoriamente desi-
Público, dentro do seu honroso mister guais suas atribuições, ademais, o disposi-
de fiscalizar a lei e representar a socie- tivo constitucional é de uma clareza felina,
dade à luz das atribuições que lhe são não se admitindo interpretação analógica,
conferidas pela lei maior nos seus dis- extensiva ou ampliativa ou por último, de
positivos e normas, quais sejam, aquelas privilégios de carreiras antagônicas em seu
predispostas no artigo 127 e seguintes mister.» (fl. 6).
e que, inclusive, o transforma em Insti- Apreciando o pedido de cautelas, deci-
tuição autônoma e representativa da so- diu o Plenário, em sessão de 9-5-1991, por
ciedade, e em nome dela, com poderes unanimidade, deferir, em parte, a súplica,
para zelar pelo efetivo respeito dos Po- estando o mesto assim ementado (fl. 50):
deres Públicos e dos serviços de rele-
vância pública, não se assemelha, em «Ação Direta de Inconstitucionalida-
nenhuma forma ou ótica, a atividade do de. Medida Cautelas. Constituição do
advogado de ofício ou aqueles que for- Estado da Paraíba, art. 136, VII; Leis
mam os quadros da Procuradoria-Geral complementares n°s 4 e 5, ambas de
do Estado. São atividades amplas e to- 8-1-1991, do mesmo Estado. Vincula-
talmente distintas, e a Constituição ape- ção e isonomia de vencimentos entre as
nas prevê a eqüidade de vencimentos carreiras do Ministério Público, Advo-
sob o prisma da similitude das atribui- gados de Ofício e Procuradores do Esta-
ções ou do mesmo poder. Não estando do. Precedentes do STF, concedendo
inseridos nestas características os advo- liminar para suspender normas seme-
gados e procuradores do Estado da Pa- lhantes de outros Estados. Relevância
raíba e os membros do Ministério Públi- dos fundamentos do pedido e conve-
co, posto que o reconhecimento pelas niência de se-deferir a cautelas, até se
18 R.T.J. — 158

fixe o entendimento das normas consti- ele ser concedido na ausência da norma
tucionais em torno das denominadas complementar regulamentadora, que a
carreiras jurídicas, a que se refere o art. clareza bem explícita dos seus conceitos
135 da Constituição Federal, em con- retire do arbítrio tão comum aos exege-
fronto com os preceitos dos arts. 39, tas de ocasião a interpretação interessei-
parágrafo 1°, e 37, XIII, da mesma Carta ra da regra inovadora, suscetível de, por
Maior. Medida liminar deferida para demagógica aplicação, ferir de morte a
suspender, até o julgamento final da capacidade remuneratória do Estado.
ação, a vigência dos dispositivos indica- São estas, Excelência, as informa-
dos da Constituição do Estado da Paraí- ções que o Governo do Estado da Paraí-
ba. Quanto ao art. 32, parágrafo único, ba tem a emitir sobre o assunto, supli-
da Carta Política paraibana, objeto da cando que, afinal, Vossa Excelência e o
inicial, corresponde a norma da Consti- Colendo Supremo Tribunal Federal
tuição Federal (art. 39, parágrafo 1°), o declarem a inconstitucionalidade das
que não autoriza sua suspensão.» leis complementares referidas e do inci-
Solicitadas informações às autoridades so VII, do artigo 136, da Constituição da
requeridas, prestou-as, apenas, o Senhor Paraíba, como requerido na petição
Governador do Estado da Paraíba, por in- preambular.»
termédio da Procuradoria-Geral do Estado Não vindo aos autos as informações so-
(fls. 53/54), nas quais, após tecer conside- licitadas pelo Ofício n° 49/P, de 15-5-1991,
rações acerca da situação financeira em que à Assembléia Legislativa do Estado da Pa-
se encontra aquela Unidade da Federação, raíba, foi o processo com vistas aos Drs.
asseverou (fl. 54): Advogado-Geral da União e Procurador-
«Assim, dentro desse quadro de difi- Geral da República.
culdades imensas, Senhor Ministro, é No parecer de fls. 57/63, manifestou-se
natural que o atual governo da Paraíba o Dr. Advogado-Geral da União no sentido
discorde da isonomia adotada — fórmu- de que fosse julgada improcedente a ADIn.
la justa de homogeneização salarial em À sua vez, opinou a Procuradoria-Geral da
países de economia equilibrada e prós- República, no parecer de fls. 64/76, pela
pera. Mas, não no Brasil atual. Não em parcial procedência da ação, declarando-se
Estados como a Paraíba, em situação a «inconstitucionalidade do inciso VII do
espasmódica de decomposição econô- art. 136 da Constituição do Estado da Pa-
mica e ruína financeira iminente. raíba, bem como dos dispositivos das Leis
Além do mais, a isonomia concedida Complementares Estaduais n°s 4 e 5, am-
nas leis impugnadas fere no âmago — bas de 8 de janeiro de 1991.
segundo nos parece — a compreensão É o relatório, do qual a Secretaria distri-
do que seja «igualdade» ou «semelhan- buirá cópia aos Senhores Ministros.
ça» de atividades ou exercício no servi-
ço público, como exatamente impõe o VOTO
art. 37, parágrafo único, da vigente carta
constitucional. O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela-
De fato, referindo-se o caput do dis- tor): Quanto ao art. 32, parágrafo único, da
positivo citado à obrigatoriedade da Constituição paraibana, a ação não proce-
«existência de lei» («a lei assegurará») de, como bem anotou o parecer da Procu-
propiciadora de tal benefício, não pode radoria-Geral da República, à fl. 69, «pois,
R.T.J. — 158 19

conforme destacado na própria decisão li- mas de Direito Político e Constitucional»,


minar, de fl. 47, o dispositivo reproduz ed. Forense, págs. 242/243, verbis:
norma da própria Constituição Federal (art. «Observe-se, porém, que não se trata
39, 1°)». de funções auxiliares mas de funções
2. O art. 36, VII, da Constituição do essenciais, vale dizer, tão imprescindí-
Estado da Paraíba, estipula «remuneração veis quanto as demais reguladas no mes-
correspondente a vencimento, adicionais, mo Título IV, da Organização dos Po-
vantagens pecuniárias e estatutárias, em ní- deres.
veis não inferiores aos de quaisquer das Essa essencialidade à Justiça, ressal-
carreiras referidas nos arts. 93, 127 e se- te-se, não se deve entender que seja re-
guintes, e 135, da Constituição Federal, ferente apenas à ação do Poder Judiciá-
observada a devida correspondência das rio, ou seja, à «Justiça» no estrito senti-
classes e entrâncias». do orgânico, referida especificamente à
A Lei Complementar n° 4, de 8-1-1991, função jurisdicional do Estado, mas, na
dispõe sobre isonomia de vencimentos, no verdade, estendida à ação de todos os
que tange à correspondência entre as car- Poderes do Estado, enquanto digam res-
reiras do Ministério Público e dos Advoga- peito à legalidade e à legitimidade. Está
dos de Ofício — integrantes do Grupo de entendida a «Justiça», portanto, no seu
Assistência Judiciária. A Lei Complemen- sentido mais amplo, como a finalidade
tar n° 5, de 8-1-1991, disciplina a isonomia última do Estado Democrático de Direi-
de vencimentos entre as carreiras do Minis- to, sem nenhum qualificativo parciali-
tério Público e da Procuradoria-Geral do zante que possa restringir o âmbito de
Estado. atuação da advocacia geral dos interes-
ses constitucionalmente garantidos.
Questionam-se esses dispositivos, em
face dos arts. 37, XIII, e 39, § 1°, da Cons- A essencialidade deve entender-se,
tituição Federal. assim, como dirigida à totalidade das
instituições que atuam no Estado, tanto
Matéria idêntica foi examinada pelo as propriamente estatais quanto as de
Plenário, no julgamento da ADIn n°171, de vigência na sociedade.
Minas Gerais.
Como se verá a seguir, no cerne des-
Na oportunidade, cinco dos membros sas funções essenciais à Justiça, está a
desta Corte decidiram no sentido de se defesa intransigente das múltiplas varie-
compreenderem no âmbito do art. 135 da dades de interesses que o homem desen-
Constituição as carreiras do Ministério Pú- volve, individual ou coletivamente,
blico, dos Procuradores de Estado e dos dentro ou fora do Estado, mas que ne-
Defensores Públicos. São as carreiras de- cessitam e necessitarão sempre de pro-
nominadas «funções essenciais à Justiça» teção: do Estado, pelo Estado, para o
(Constituição, Título IV, Capítulo IV). Estado e até contra o Estado. São, em
Nessa linha de entendimento votei. Des- conseqüência, tipos variados de minis-
taco do pronunciamento que fiz, na oca- térios da advocacia dos interesses.»
sião, o se segue, onde, também, aludi à A Lei Magna regula, nas três Seções
lição do ilustre Professor Diogo de Figuei- do Capítulo IV em referência, o que se
redo Moleira Neto, em ensaio de mereci- tem denominado de procuraturas cons-
mento científico, publicado, em 1991, em titucionais, como em magnífico traba-
sua obra «Constituição e Revisão — Te- lho as examinou o ilustre Professor Dio-
20 R.T.J. — 158

go de Figueiredo Moreira Neto, consi- que lhe corresponde é a advocacia dos


derando as categorias de interesses de- necessitados e a procuratura que a tem a
fendidos e a constitucionalização dos seu cargo é a Defensoria Pública, fe-
Órgãos para sua atuação. Anota, nesse deral, distrital federal e estadual (art.
sentido, que cada uma de tais procuratu- 134, da CF)» (In Rev. da Procuradoria-
ras exerce «atribuições consultivas e Geral do Estado de São Paulo, vol. 36,
postulatórias, todas bem definidas nos pág. 24).
arts. 127, 129, 131, 132, 133 e 134, da
Constituição». E acrescenta: «O primei- Referindo-se, em particular, às De-
ro conjunto de interesses abrange, basi- fensorias Públicas, acentua José Afon-
camente, dois importantes subconjun- so da Silva, à vista do novo sistema
tos: os interesses difusos da defesa da constitucional: «Os Estados não têm a
ordem jurídica e do regime democrático faculdade de escolher se instituem e
e os interesses sociais e individuais in- mantêm, ou não, a Defensoria Pública.
disponíveis (art. 127, caput, da Consti- Trata-se de instituição já estabelecida
tuição), detalhados em rol de funções para eles na Constituição Federal, sujei-
(art. 129 da CF), em relação aberta, pois ta até mesmo a normas gerais a serem
pode ser acrescida de outras funções prescritas em lei complementar federal
desde que compatíveis com a finalidade para a sua organização em cada Estado,
institucional (art. 129, IX). Para esse em cargos de carreira, providos, na clas-
conjunto, a função essencial à justiça se inicial, mediante concurso público de
que lhe corresponde é a advocacia da provas e títulos, assegurada a seus inte-
sociedade, e a procuratura que a tem a grantes (...) a garantia da inamovibilida-
seu cargo é o Ministério Público, em de e vedado o exercício da advocacia
seus ramos federais, distrital federal e fora das atribuições institucionais». Em
estaduais. O segundo conjunto de inte- prosseguimento, anota: «Não satisfaz
resses são os interesses públicos, assim aos ditames do art. 134 a simples criação
entendidos os estabelecidos em lei e co- ou manutenção de Procuradoria de As-
metidos ao Estado, em seus desdobra- sistência Judiciária, subordinada à Pro-
mentos políticos (União, Estados e Dis- curadoria-Geral ou à Advocacia-Geral.
trito Federal). Para esse conjunto, a fun- A Constituição considera a Defensoria
ção essencial à justiça que lhe corres- Pública uma instituição essencial à fun-
ponde é a advocacia de Estado (art. 131, ção jurisdicional, destinada à orientação
para a União, e 132, para os Estados e jurídica e à defesa, em todos os graus,
Distrito Federal) e as procuraturas que a dos necessitados, na forma do art. 5°,
têm a seu cargo são a Advocacia-Geral item LXXIV. Se é uma instituição e
da União (órgão coletivo) e os Procura- ainda sujeita a normas gerais de lei com-
dores dos Estados e do Distrito Federal plementar federal, a toda evidência, não
(Órgãos singulares). O terceiro conjunto pode ser órgão subordinado ou parte de
de interesses são individuais, coletivos outra instituição, que não ao próprio Es-
e até difusos, mas todos qualificados tado. (...)». (in Curso de Direito Consti-
pela insuficiência de recursos daqueles tucional Positivo, 5' ed., págs. 533/534).
que devam os queiram defendê-los: são
os interesses dos necessitados (art. 5°, Celso Ribeiro Bastos, discorrendo
LXXIV, da Constituição). Para esse sobre o mesmo tema, com base na Cons-
conjunto, a função essencial à justiça tituição de 1988, observa:
R.T.J. — 158 21

«Não se sabe, ainda, qual a colo- Pública (CF, art. 131, § 1°, e parágrafo
ração que assumirá a Defensoria Pú- único, do art. 134).
blica nos Estados, pois que a matéria
depende do que vier a ser estipulado De outra parte, é certo, as três procu-
pelas normas gerais a que se refere o raturas «não defendem interesses hie-
parágrafo único do art. 134. rarquizados entre si», anotando, com in-
teira propriedade, o ilustre Professor
O que é certo é que se excluem Diogo de Figueiredo Moreira Neto, no
outras modalidades de assistência ju- trabalho citado, pág. 26: «Nenhum inte-
rídica aos necessitados que não seja resse tem supremacia absoluta sobre os
a da própria defensoria pública. demais: a prevalência de um interesse
qualquer, público, difuso, coletivo ou
Esta detém, com exclusividade, a mesmo individual, depende da natureza
função de orientar juridicamente e de de cada relação. Não se justifica, tam-
defender, em todos os graus, os ne- pouco, sob essa óptica, nem que se dis-
cessitados. Impõe-se, portanto, a crimine, em termos de prerrogativas e
criação da defensoria pública, tanto garantias, seja a advocacia privada da
no âmbito federal, quanto no esta- advocacia pública e, nesta, que se discri-
dual» (op. cit., págs. 245/246). mine funcionalmente qualquer das pro-
curaturas públicas. Ao contrário: o aper-
No que respeita à organização das feiçoamento institucional das funções
Defensorias Públicas, compreendo, por essenciais à justiça há de seguir a linha
igual, que devem ser entidades com au- apontada pelos princípios dessumidos
tonomia, em relação ao Ministério Pú- do ordenamento constitucional, de
blico e à Procuradoria-Geral do Estado, modo a que se obtenha o máximo de
ambas instituições também essenciais à prestância na afirmação de um Estado
função jurisdicional, nos termos da de Justiça». Em outro passo, dentre os
Constituição, cada qual, todavia, com princípios comuns às funções essenciais
atribuições específicas. A Defensoria à Justiça que entende resultarem do tex-
Pública, no patrocínio de direitos de ne- to constitucional, aponta o Professor
cessitados, poderá, ad exemplum, mo- Diogo de Figueiredo a igualdade, que
ver ação contra o Estado, intervindo, «decorre da inexistência de hierarquia
então, a Procuradoria respectiva, na de- entre os interesses cometidos a cada
fesa da pessoa jurídica de direito públi- uma das funções essenciais à Justiça; a
co. Pode a Defensoria Pública defender igual importância das funções determi-
réu em ação cível movida pelo Estado, na a igualdade constitucional das procu-
ou em ações penais patrocinadas pelo raturas que as desempenham» (op. cit.,
Ministério Público. Distintos os domí- pág. 27).
nios de sua atuação, convém sejam ór-
gãos, entre si, não dependentes, na pers- Compreendo, da mesma maneira,
pectiva da hierarquia administrativa. que as carreiras constitucionalmente
Exato é que ambas, a Procuradoria e a previstas, a que incumbe o desempenho
Defensoria, hão de ter, nos Estados, su- das funções essenciais à Justiça, estão,
bordinação hierárquica ao Chefe do Po- de igual modo, abrangidas na norma do
der Executivo, tal como se desenha o art. 135, da Constituição, que se inseriu
modelo federal, no que concerne à Ad- no fecho do Capítulo IV de seu Título
vocacia-Geral da União e à Defensoria IV, com esta redação:
22 R.T.J. — 158

«Art. 135. Às carreiras disci- que se inseriu o dispositivo em apreço,


plinadas neste Título aplicam-se o quer à vista dos conteúdos ocupacionais
princípio do art. 37, XII, e o art. 39, dos cargos em confronto, atuando seus
§ 1°.» agentes, na liça judiciária, em igualdade
formal e efetiva, esta proveniente das
Para os efeitos do art. 135, não há qualificações profissionais de todos os
elementos, na Constituição, a afastar os ocupantes das carreiras citadas, em que
cargos do Ministério Público daqueles o ingresso se dá por concurso público e
da Advocacia de Estado e da Defensoria cada qual, com exclusividade, impedido
Pública, disciplinados no mesmo Capí- de exercer a advocacia privada, assume
tulo, cada qual com a incumbência da no processo posição equiparada, ou
defesa de interesses relevantes, sem hie-
como autor, ou representante do autor
rarquia de uns sobre outros. Não impede
ou do réu, desempenhando, além disso,
considerar assemelhados esses cargos,
extrajudicialmente, cada um, em âmbito
aos efeitos da isonomia do art. 39, § 1°,
da Lei Magna de 1988, que o art. 135 consultivo, funções igualmente relevan-
manda cumprir, a circunstância de a tes. O aspecto material ou de conteúdo
Constituição, de maneira explícita, ha- das atividades desses profissionais do
ver arrolado, em seu texto, com mais direito não autoriza afastar o caráter de
amplitude, garantias institucionais ao «cargos assemelhados», e é destes que
Ministério Público, assim como inscri- também trata a isonomia do art. 39, § 1°,
tas nos parágrafos 1° e 2° do art. 127 e da Constituição, em cujo conceito não
no parágrafo 5° e incisos, do art. 128 da se inclui, necessariamente, o pressupos-
Constituição, notadamente quanto à ini- to da identidade, observadas apenas as
ciativa de certas leis. Excluídas do regi- peculiaridades de cada qual».
me jurídico único dos servidores públi- Senhor Presidente. Nessa oportunidade,
cos essas carreiras, não marca ponto na linha de tal entendimento, afastei a in-
contrário à isonomia de vencimentos o constitucionalidade dos dispositivos da
fato de se regerem por normas orgânicas Constituição e da lei mineiras que estavam,
especificas, sendo certo que, entre si, então, em debate e onde também se discutia
não hão de divergir substancialmente. quanto à isonomia entre as carreiras jurídi-
Aos objetivos da isonomia prevista no cas.
art. 39, § 1°, da Lei Maior, desses aspec-
tos institucionais não se há de cogitar, Mantenho essa compreensão, no caso
nem é de trazê-los, à evidência, para os concreto. Os dispositivos cuidam exata-
fins de discriminar qualquer das três mente da isonomia entre o Ministério Pú-
carreiras em exame, quanto à aplicação blico e a Defensoria Pública, — aqui, na
do art. 135, que é norma especial desti- primeira lei estadual, chamada Advocacia
nada a regular vencimentos. O que con- de Ofício, a que corresponde a Defensoria
ta, na espécie, por primeiro, é haver a Pública, — e, na outra lei, entre o MP e os
norma do art. 135, de explícito, defini- Procuradores do Estado.
do, concretamente, a extensão do prin-
cípio isonômico do art. 39, § 1°, às car- As leis do Estado da Paraíba, que estão
reiras jurídicas, dentre elas, não se po- sendo impugnadas, estabelecem, em sínte-
dendo excluir qualquer das três, relati- se, uma correspondência entre os padrões
vas às funções essenciais à Justiça, já do Ministério Público e dessas duas carrei-
porque situadas no mesmo Capítulo em ras.
R.T.J. — 158 23

Do exposto, na conformidade do voto como índice de reajustamento automáti-


que proferi na ADIn n° 171, com a devida co, como o salário, arrecadação, etc.) e
vênia, persistindo em seus fundamentos, equiparação (igualação de cargos de
dou pela improcedência da ação. atribuições desiguais) para o efeito de re-
Entendo que a equivalência das carrei- muneração, salvo paridade e isonomia.
ras jurídicas há de se fazer entre as três Assim, é que dispôs, no art. 37, inci-
carreiras que são funções essenciais à Jus- sos XI, XII e XIII, e, ainda, no art. 39, §
tiça, e elas estão, destarte, na compreensão I°, verbis:
do art. 135 da Constituição. art. 37.
VOTO XI — a lei fixará o limite máxi-
mo e a relação de valores entre a
O Sr. Ministro Francisco Rezek: Pen- maior e a menor remuneração dos
so haver entendido que o Ministro Néri da servidores públicos, observados,
Silveira prestigia, desta vez, o mesmo pon- como limites máximos e no âmbito
to de vista que resultou minoritário naquele dos respectivos poderes, os valores
precedente de Minas Gerais, onde também percebidos como remuneração, em
fiquei em minoria. Não seria eu a pronun- espécie, a qualquer título, por mem-
ciar o primeiro voto dissidente. bros do Congresso Nacional, Minis-
Acompanho o eminente relator, julgan- tros de Estado e Ministros do Supre-
do improcedente a ação. mo Tribunal Federal e seus corres-
pondentes nos Estados, no Distrito
VOTO Federal e nos Territórios, e, nos Mu-
nicípios, os valores percebidos como
O Sn Ministro limar Gaivão: Senhor remuneração, em espécie, pelo Pre-
Presidente, ao votar, como relator, na ADIn feito;
n° 171, ação análoga à presente, afirmei: XII — os vencimentos dos car-
«A Constituição Federal, ao estatuir gos do Poder Legislativo e do Poder
disposições gerais para organização da Judiciário não poderão ser superiores
administração pública direta, indireta ou aos pagos pelo Poder Executivo;
fundacional, dos Poderes da União, dos XIII — é vedada a vinculação
Estados, do Distrito Federal e dos Mu- ou equiparação de vencimentos, para
nicípios, no Capítulo VII, do seu Título o efeito de remuneração do pessoal do
III (Da Organização do Estado), estabe- serviço público, ressalvado o dispos-
leceu teto para remuneração dos servi- to no inciso anterior e no art. 39, § 1°;
dores públicos, no âmbitó de cada Po-
der; paridade entre cargos de atribuições Art. 39.
ou assemelhados, de Poderes diversos, § 1° — A lei assegurará, aos ser-
tomados, como parâmetro, os venci- vidores da administração direta, iso-
mentos pagos pelo Poder Executivo; e nomia de vencimentos para cargos de
isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhados
atribuições iguais ou assemelhados, do do mesmo Poder ou entre servidores
mesmo Poder. Ao mesmo tempo, proi- dos Poderes Executivo, Legislativo e
biu vinculação (subordinação de um Judiciário, ressalvadas as vantagens
cargo a outro, dentro ou fora do mesmo de caráter individual e as relativas à
Poder, ou a qualquer fator que funcione natureza ou ao local de trabalho.»
24 R.T.J. — 158

No art. 39, § I°, está consagrada a Significa, por conseguinte, que as


isonomia geral, que compreende a iso- carreiras em referência, conquanto dis-
nomia propriamente dita (entre cargos ciplinadas na própria Constituição, não
do mesmo Poder) e a paridade isonômi- estão excluídas da limitação imposta
ca (cargos de Poderes diversos), as quais pelo princípio excogitado. A despeito,
consubstanciam princípio por efeito do pois, de estarem protegidas pelo princí-
qual deverão ser contemplados, com a pio da paridade remuneratória dos ser-
mesma remuneração, os cargos de atri- vidores dos três Poderes, estão jungidos
buições iguais e os cargos assemelha- ao teto representado pelos vencimentos
dos. pagos pelo Poder Executivo.
No último artigo do Título IV (art. De outra parte, mandou a norma do
135), dispôs a nova Carta, in verbis: art. 135 aplicar às ditas carreiras o art.
39, § 1°, que, como se viu, cuida não
«Art. 135. Às carreiras disci- apenas da paridade isonômica, de que já
plinadas neste Título aplicam-se o se falou acima, mas também, especial-
princípio do art. 37, XII, e o art. 39, mente, da isonomia propriamente dita,
§ 1°.» consistente na igualdade de vencimen-
tos para cargos de atribuições iguais ou
O referido Título IV cuida da «Orga- assemelhados, do mesmo Poder.
nização dos Poderes», estende-se do art.
44 ao 135, e abrange os Poderes Legis- Não está dito, no dispositivo ora en-
lativo (Capítulo I, arts. 44 a 75), Execu- focado, em absoluto, que os cargos das
tivo (Capítulo II, arts. 76 a 91) e Judiciá- ditas carreiras são assemelhados, vale
rio (Capítulo III, arts. 92 a 126), e as dizer, parecidos, entre si, nem, muito
Funções Essenciais à Justiça (Capítulo menos, que devem ser considerados as-
IV, arts. 127 a 135). semelhados, isto é, equiparados, para
efeito de paridade remuneratória. Aliás,
Em toda a sua extensão, só chega a se a Constituição, no dispositivo em
disciplinar carreiras nos dois últimos ca- apreço, tivesse o propósito de asseme-
pítulos. São elas: a dos Magistrados, a lhar cargos e carreiras, é porque asseme-
dos Membros do Ministério Público, a lhação não havia entre estes. Conse-
dos Advogados da União, a dos Procu- qüentemente, estar-se-ia diante de nor-
radores dos Estados e a dos Defensores ma excepcionadora do princípio da não
Públicos. equiparação, do art. 37, XIII. Acontece
Impende examinar, portanto, qual o que, segundo elementar regra de herme-
alcance, em relação a essas carreiras, nêutica, as exceções não se presumem,
dos efeitos da norma acima transcrita. havendo de resultar inconfundíveis do
texto da lei, a qual, ademais, como é por
Como já se viu, o art. 37, XII, consa- demais sabido, não admitirá exegese ex-
gra o princípio de que os vencimentos tensiva, mas restrita. Efeito, portanto, de
pagos pelo Poder Executivo servem de tamanha latitude, não se poderia retirar
teto para os vencimentos dos cargos dos de norma que, não obstante desprovida
demais Poderes. Diz, portanto, com a de técnica redacional apurada, aponta
paridade, isto é, com a isonomia de ven- nitidamente em outra direção.
cimentos para cargos de atribuições
iguais ou assemelhados de Poderes di- Na verdade, a Carta de 1988, quando
versos. teve o propósito de ladear a regra do art.
R.T.J. — 158 25

37, XIII, fé-lo de modo direto e claro, Veja-se que, quanto aos membros do
como é exemplo patente a norma do art. Ministério Público, sequer lhes esten-
73, § 3°, que estendeu aos Ministros do deu a Constituição o regime de remune-
Tribunal de Contas da União «as mes- ração dos magistrados, previsto no refe-
mas garantias, prerrogativas, impedi- rido art. 93, V, embora o tivesse feito no
mentos, vencimentos e vantagens dos respeitante aos regimes de promoção
Ministros do Superior Tribunal de Jus- (inc. II) e de aposentadoria (VI), confor-
tiça», não bastando, pois, argumentar me previsto no art. 129, § 4°.
com a remissão que o art. 135 faz ao art. A mesma coisa é de dizer-se relativa-
39, par. 1°, para concluir-se que as car- mente à norma do art. 241, que dispõe,
reiras mencionadas no primeiro tiveram verbis:
seus vencimentos equiparados.
Tendo em vista a óbvia subordinação «Art. 241. Aos delegados de
lógica do § 1°, em questão, à norma do polícia de carreira aplica-se o princí-
caput do art. 39, que — inserido em pio do art. 39, § 1°, correspondente às
outro Título (o III, que trata da Organi- carreiras disciplinadas no art. 135
zação do Estado), em seção específica desta Constituição.»
dedicada aos «Servidores Públicos Com efeito, se resultou demonstra-
—, ordena a instituição, pelos entes do, pelo raciocínio acima desenvolvido,
políticos, de «regime jurídico único e que, do texto do art. 135, não se pode
planos de carreira para os servidores da recolher a interpretação de haverem sido
administração pública», quis o legisla- equiparadas as carreiras nele indicadas,
dor, tão-somente, deixar estreme de dú- é curial que, pela mesma razão, não há
vida, que as carreiras disciplinadas na vislumbrar-se equiparação automática
própria Carta, também elas, estão jungi- dos integrantes da carreira de Delegados
das aos princípios da paridade, parago- de Polícia com os Magistrados, Mem-
nada pela remuneração paga pelo Poder bros do Ministério Público, Procurado-
Executivo, e da isonomia propriamente res Judiciais, inclusive os da União, e
dita. Não há ver, aí, qualquer redundân- Defensores Públicos. O entendimento
cia capaz de afastar essa interpretação, que, aqui, de igual modo, se impõe, é o
porquanto, uma coisa é a Constituição de que aos Delegados de Polícia tam-
mandar organizar planos de carreira bém se aplicam os princípios da parida-
pata os servidores da administração pú- de e da isonomia previstos no referido
blica, com observância dos princípios art. 39, § 1°, observadas, obviamente, no
da paridade e da isonomia; outra coisa é que couberem, as regras aplicáveis às
a própria Carta organizar carreiras fun- carreiras apontadas no art. 135. Reforça
cionais, quando também lhe era dado o entendimento exposto, a circunstância
dispor especificamente sobre os respec- de a carreira de Delegados de Polícia
tivos regimes de remuneração, faculda- não haver sido sequer incluída entre
de de que, todavia, não se utilizou, senão aquelas cujas funções foram considera-
no concernente à carreira de magistra- das «essenciais à Justiça», inexistindo
dos (art. 93, V), remetendo as demais razão para que, por via de interpretação
para o regime do referido art. 39, § 1°, abrangente, de todo descabida na espé-
próprio dos servidores públicos em ge- cie, se retire do mencionado art. 241
ral, cujos planos de carreira foram con- uma equiparação ainda mais esdrúxula
fiados ao legislador ordinário. e desafinada.
26 R.T.J. — 158

No art. 39, § 1°, como já restou assen- acima alvitrado, ao elaborar os disposi-
tado, está consagrada a isonomia geral, tivos impugnados na inicial, a partir do
consubstanciadora de princípio em ra- art. 273 da Constituição mineira. Reme-
zão do qual deverão ser contemplados, more-se-lhe o texto:
com a mesma remuneração, os cargos de «Art. 273. Para cumprimento
atribuições iguais e os cargos asse- do disposto no art. 131, é assegurada
melhados. isonomia de remuneração entre os
Trata-se de norma dirigida ao legis- cargos finais das carreiras do Minis-
lador, como declarado em seu próprio tério Público, de Procurador do Esta-
texto. Serve-lhe de baliza, na missão que do, de Procurador da Fazenda Esta-
é de sua exclusividade, de eleger os cri- dual, de Defensor Público e de Dele-
térios identificadores dos cargos de atri- gado de Policia, observada a diferen-
buições iguais e dos cargos assemelha- ça não excedente a dez por cento de
dos, para fins de remuneração. Age ele, uma para outra classe das respectivas
nesse mister, com inteira discricionarie- carreiras.»
dade.
Conquanto faça menção à isonomia,
Conforme adverte o eminente Minis- o que estabeleceu o dispositivo sob en-
tro Xavier de Albuquerque, no valioso foque foi uma equiparação das carreiras
memorial oferecido, tais critérios são indicadas, aliada a uma vinculação dos
virtualmente inumeráveis, não havendo respectivos cargos, como não deixa dú-
rol, que deles se faça, que se possa con- vida a instituição de uma gradação per-
siderar completo e exauriente. centual de salários por categoria funcio-
Por isso, encontra-se o Poder Judi- nal.
ciário, em princípio, tolhido de subme- Registre-se que a Assembléia Legis-
ter a seu controle os critérios que o le- lativa, para elaborar a Carta estadual,
gislador utilizou, para convencer-se de não foi investida senão de poder consti-
que determinado cargo atende aos pres- tuinte derivado, a ser exercido, no caso
supostos do tratamento isonômico. Res- específico em tela, nos estritos limites
salvam-se, apenas, eventuais situações da delegação contida no art. 11 do
em que se veja diante de quadro nítido ADCT/88, como já reiteradamente as-
de ultrapassagem dos limites da discri- sentado pelo STF, vale dizer, com ob-
cionariedade e de flagrante invasão dos servância dos princípios da Constitui-
domínios do arbítrio com configuração ção Federal delegante, entre os quais se
de hipótese de equiparação pura e sim- insere, como já reiteradamente assenta-
ples, onde o descabimento de isonomia do nesta Corte, o da proibição das vin-
se mostra patente. culações e equiparações de cargos pú-
Daí ser imperioso ao legislador agir blicos, para fim de remuneração.
de molde a deixar bem claro que não foi Mas, se assim não fosse, bastaria,
movido pelo propósito de equiparar ou para a declaração de invalidade do texto
de vincular cargos, mas de dispensar- apreciado a circunstância de regular ele
lhes tratamento igualitário ou partidário, matéria inteiramente estranha ao texto
em face da identidade de atribuições ou da Constituição. Na verdade a Consti-
de sua assemelhação. tuição «institui as vigas mestras do Es-
Um exame dos autos demonstra não tado, efetua a repartição das funções
haver o legislador procedido do modo estatais entre os Poderes, proclama os
R.T.J. — 158 27

direitos e garantias fundamentais do ci- O art. 6° da Lei n° 9.769/89 e seu


dadão, delimita os direitos políticos, fir- parágrafo único, de sua vez dispõem:
ma os princípios gerais da ordem econô-
«Art. 6°. A remuneração dos
mica. E, enfim, um corpo de normas que
integrantes da carreira de Delegado
se ocupa das questões macroestruturais,
de Polícia, prevista nas Leis n" 6.499,
da anatomia do Estado» (cf. Walter Pau-
de 4 de dezembro de 1974, e n° 8.582,
lo Sabella e Ruy Alberto Gatto, In «Iso- de 22 de junho de 1984, correspon-
nomia de Vencimentos entre as Carrei-
dera, a partir de 1° de julho de 1989,
ras Jurídicas», Rev. do TCESP), consti-
a 85% (oitenta e cinco por cento) da
tuindo verdadeira depreciação de sua remuneração dos membros do Mi-
magnitude a suposição de que pudesse
nistério Público, e a 100 (cem por
o constituinte estadual ocupar-se de cento) da mesma remuneração, a par-
questões de somenos, como a fixação de tir de 1° de dezembro de 1989.
vencimentos de cargos públicos. Para
esse mister, não lhe foram delegados Parágrafo único. A correspon-
poderes no referido art. 11, do dência de classes do Ministério Pú-
ADCT/88. blico e de Delegado de Polícia, para
Acresce, no caso, a circunstância de efeito deste artigo, obedecerá à se-
estar-se diante de norma para cuja ela- guinte ordem:
boração se fazia imprescindível a inicia- 1 — Promotor de Justiça de En-
tiva do Chefe do Ministério Público es- trância inicial — Delegado de Polí-
tadual, na parte que lhe toca (art. 127, § cia I;
2°) e do Chefe do Poder Executivo,
quanto ao mais (art. 61, § 1°, 11, a, da CF). 2 — (...)»
A inconstitucionalidade do texto, Ressalta aos olhos, que se está, por
portanto, não é só de ordem material, igual, diante de dispositivos infringen-
senão também formal. tes do princípio vedatório da vinculação
e da equiparação de cargos, para efeito
Anote-se, a propósito, que entendi- de vencimentos. A própria técnica de
mento em sentido contrário conduziria redação utilizada o demonstra, quando
ao absurdo de admitir-se que a iniciati- apenas se indica, como vencimentos dos
va, acima aludida, já reconhecida por Delegados de Polícia, os previstos em
esta Corte ao Ministério Público, de pro- lei para os membros do Ministério Pú-
por as leis relativas à remuneração dos blico, observada, inclusive, a mesma es-
seus membros, compreenderia, tam- cala por categoria, de tal modo que, daí
bém, a remuneração dos membros das em diante, indefinidamente, os respecti-
Procuradorias dos Estados, dos mem- vos valores serão automaticamente re-
bros das Defensorias Públicas e, tam- vistos, em idêntica proporção, sempre
bém, dos integrantes das carreiras de que forem reajustados ou aumentados
Delegados de Polícia. Resultaria, por os vencimentos dos membros do Par-
conseguinte, na supressão da iniciativa quet. Mais rematado exemplo de equi-
que, para tanto, foi expressamente reser- paração não se poderia exibir.»
vada pelo Texto Federal, no art. 61, § 1°, Trata-se de argumentos que têm inteira
II, a, ao Chefe do Poder Executivo. aplicação ao presente caso, onde se atacam,
O mesmo é de dizer-se no que diz por igual, leis que, como afronta à Consti-
respeito à magistratura. tuição, pretendem estabelecer vinculação,
28 R.T.J. — 158

para efeitos remuneratórios, entre certas VOTO


carreiras jurídicas e a carreira do Ministério O Sr Ministro Paulo Brossard: Neste
Público. sentido foi o meu voto, Senhor Presidente,
Registre-se, por derradeiro, que o STF, quando do julgamento da ADIn n° 171, e é
no precedente invocado, assentou entendi- o meu voto no presente julgamento, com a
mento no sentido da inconstitucionalidade vênia que peço ao eminente Relator e aos
dessa vinculação. que o acompanharam.
Ante o exposto, meu voto, com a devida VOTO
vênia do eminente Relator, é pela parcial O Sr. Ministro Sydney Sanches: Sr.
procedência da ação, nos termos do parecer Presidente, integrei a maioria no julgamen-
da douta Procuradoria-Geral da República. to da Ação Direta de Inconstitucionalidade
n° 171 — MG. Mantenho a orientação en-
tão adotada, e por isso peço vênia ao Sr.
VOTO (Medida Liminar) Ministro-Relator e aos que o acompanham,
para julgar procedente, em parte, a ação,
nos termos do parecer da Procuradoria-Ge-
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Se- ral da República.
nhor Presidente, também assento que o dis-
posto no artigo 135 da Constituição Federal VOTO (Medida Liminar)
não alcança a magistratura, em face às pe- O Sr. Ministro Moreira Alves: Tam-
culiaridades inerentes a esta. Todavia, não bém eu, Sr. Presidente, não apenas pelo fato
posso desconhecer que as atividades desen- de ter sido um dos votos vencedores no
volvidas pelos membros do Ministério Pú- caso anterior, mas porque entendo que pro-
blico — e em alguns Estados o Ministério ximamente, com a mesma composição, em
Público continua englobando a Defensoria se tratando de ação direta de inconstitucio-
Pública — aproximam-se daquelas ineren- nalidade, é difícil que esta Corte julgue, ora
tes aos Procuradores do Estado e aos advo- constitucional, ora julgue inconstitucional,
gados de ofício. normas que são rigorosamente iguais.
Se se retirar o Ministério Público da Assim, com a devida vênia, acompanho
abrangência do artigo 135, consideradas a o primeiro voto dissidente, que é do Sr.
semelhança dos cargos e a aproximação das Ministro limar Gaivão.
atividades desenvolvidas, restarão, apenas,
quanto à isonomia, os Defensores e Procu- VOTO
radores do Estado e creio que este não é o
sentido do artigo em comento. O Sr. Ministro Octavio Gallotti (Pre-
sidente): Srs. Ministros, também eu guardo
Por maior que seja a relevância dos ser- coerência com a decisão do Tribunal na
viços desenvolvidos pelo Ministério Públi- Ação Direta de Inconstitucionalidade n°
co, não posso colocar o órgão no mesmo 171 — e com o meu próprio voto naquela
patamar da magistratura. assentada, que foi um dos vencedores —,
Por isso, mantenho o voto proferido na para acompanhar o voto do eminente Mi-
ação direta de inconstitucionalidade men- nistro filmar Gaivão.
cionada pelo nobre Relator e o acompanho, Julgo, pois, em parte, procedente a ação,
julgando improcedente o pedido formulado nos termos do parecer da douta Procurado-
nesta ação. ria-Geral da República.
R.T.J. — 158 29

EXTRATO DA ATA lator, Francisco Rezek, Marco Aurélio e


ADIn 465 — DF — Rel.: Min. Néri da Carlos Valioso, que a julgavam «in totum»
Silveira. Reqte.: Governador do Estado da improcedente. Votou o Presidente. Relator
Paraíba (Adv.: Luiz da Costa A. Bronzea- para o acórdão o Ministro limar Gaivão.
do). Reqdos.: Governador do Estado da Presidência do Senhor Ministro Octavio
Paraíba e Assembléia Legislativa do Esta- Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
do da Paraíba. Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlve-
Decisão: Por maioria de votos, o Tribu-
nal julgou procedente, em parte, a ação, da Pertence, Celso de Mello, Carlos Valio-
so, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francis-
para declarar a inconstitucionalidade do
co Rezek. Procurador-Geral da República,
art. 136, item VII, da Constituição do Esta-
Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
do da Paraíba, bem como das Leis Comple-
mentares n°s 4 e 5, ambas de 8-1-91, do Brasília, 17 de junho de 1993 — Luiz
mesmo Estado, vencidos, os Ministros Re- Tomimatsu, Secretário.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 577 — RJ


(Tribunal Pleno)
(Med. Caut. na RTJ 138/70)

Relator: O Sr. Ministro Octavio Gallotti


Requerente: Procurador-Geral da República — Requerido: Tribunal Regio-
nal Federal da 2' Região
Por não se achar configurado o suposto direito adquirido em
que buscou apoio o ato normativo, declara-se inconstitucional, com
efeitos ex tunc, a decisão administrativa do Tribunal Regional Federal
da Segunda Região, que atribuiu, a todos os servidores da Justiça Federal
daquela circunscrição, reajuste de 84,32%, sobre os respectivos venci-
mentos.

ACÓRDÃO mento do percentual de 84,32% a todos os


servidores e juízes da Justiça Federal.
Vistos, relatados e discutidos estes au- Brasília, 25 de outubro de 1995 — Se-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- púlveda Pertence, Presidente — Octavio
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- Gallotti, Relator.
formidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, à unanimidade de votos, jul- RELATÓRIO
gar procedente a ação e declarar a incons-
titucionalidade da Decisão Administrativa O Sr. Ministro Octavio Gallotti: Cui-
do Tribunal Regional Federal da 2' Região, da-se de ação direta onde se argúi a incons-
tomada em sessão ordinária do Pleno, rea- titucionalidade de Decisão Administrativa
lizada em 2-5-91 (Ata ni" 8), na parte em que do Tribunal Regional Federal da Segunda
edita norma de ordem genérica de paga- Região, tomada em sessão ordinária do Ple-
30 R.T.J. — 158

no, realizada em 2 de maio de 1991 (Ata n° Barata, que limitavam os cálculos aos
8), que determinou... valores necessários ao pagamento das
liminares.» (fls. 2/3).
«o pagamento, a partir de janeiro
de 1992, do reajuste de 84,32%, rela- Ressalta, o Requerente, o caráter norma-
tivo à variação do IPC de março de tivo do ato impugnado e a sua incompatibi-
1990, extinto pela Medida Provisória lidade com o disposto nos artigos 37, X e
n° 154, de 15-3-90, convertida na Lei 96, II, b, e ainda nos artigos 5°, XXXVI, 37,
n° 8.030, de 12-4-90, com a inclusão XV e 95, III, todos da Constituição Fe-
do cálculo dos recursos suficientes a deral.
esse pagamento na Proposta Orça- Examinando questão de ordem suscita-
mentária relativa ao exercício de da pelo então Relator, eminente Ministro
1992» (transcrito da inicial à fl. 2). Sepillveda Pertence, bem como a liminar
requerida pelo Procurador-Geral da Repú-
Eis o teor da citada Decisão Administra- blica, este Plenário, por votação unânime,
tiva: em sessão de 18 de setembro de 1991:
«Posteriormente, o Senhor Presiden- não conheceu da ação, no ponto
te pronunciou-se a respeito do percen- em que impugna a determinação do Tri-
tual de 84,32%, objeto de Medidas Li- bunal Regional Federal da 2' Região, no
minares deferidas por Juízes Federais sentido do cumprimento de medidas li-
vinculados ao Tribunal, matéria já sub- minares já deferidas;
metida à apreciação do Conselho de Ad-
ministração em 30-11-90, quando deter- conheceu da ação, quanto ao
minou-se o encaminhamento dos pro- mais;
cessos administrativos dessa natureza c) deferiu a medida cautelar para
ao Egrégio Conselho da Justiça Federal, suspender a norma contida na ordem
solicitando abertura de crédito especial genérica de «pagamento do percentual
ou suplementar para o atendimento das de 84,32% a todos os servidores da Jus-
requisições. Informou, ainda, estarem
retornando ao Tribunal os processos que
r
tiça Federal da Região, inclusive Juí-
zes e Desembargadores». Votou o pre-
haviam sido remetidos àquele Órgão, sidente.» (fl. 30).
sob a alegação de não haver verba. Em
seguida, propôs que se incluísse, na pre- As informações de fls. 39/40 sustentam
visão orçamentária para o exercício de que o Tribunal Regional não concedeu o
1992, a ser levada a efeito no mês de aumento de 84,32%. Limitou-se à previsão
maio, o pagamento das liminares conce- administrativa, necessária ao atendimento
didas. Após discussão do assunto, o Tri- de futura decisão que viesse a reconhecer o
bunal decidiu, por maioria, determinar a direito questionado.
inclusão, na Proposta Orçamentária, do Às fls. 59/66, por atribuir, à decisão
cálculo referente a recursos suficientes impugnada, a índole de ato concreto (não
ao pagamento do percentual de 84,32%, de ato normativo), pede o ilustre Subprocu-
a todos os servidores da Justiça Federal rador-Geral da República, então no exercí-
da 2' Região, inclusive Juízes e Desem- cio da função prevista no § 3° do art. 103
bargadores, a ser efetuado a partir de da Constituição, «seja declarada a inadmis-
janeiro de 1992. Vencidos os Desem- sibilidade da ação direta formulada tendo
bargadores Federais Ney Valadares, em vista a notória inidoneidade do objeto»
Clelio Erthal, Valmir Peçanha e Paulo (fls. 65/6).
R.T.J. — 158 31

Após resumir a controvérsia, opina, às prio mês de abril de 1990. Entretanto, a


fls. 70/5, o eminente Vice-Procurador-Ge- Medida Provisória n° 154, de 15-3-90,
ral Moacir Antonio Machadd da Silva: convertida na Lei n° 8.030, de 12-4-90,
No mérito, a Decisão Administrativa revogou aquele diploma, estabelecendo
impugnada não pode ser justificada em novo critério de reajustamento a partir
face das normas constitucionais de ga- de abril, antes, portanto, do implemento
rantia do direito adquirido e da irreduti- do requisito essencial ao pr6prio surgi-
bilidade de vencimentos (CF, arts. 5°, mento daquele direito ao reajuste, ou
XXXVI, 37, XV, e 95, Dl). seja, o efetivo exercício do cargo no mês
considerado.
No julgamento do Mandado de Segu-
rança n° 21.216-1-DF, em 5-12-90, Re- Antes do mês em que deveria ser
lator o eminente Ministro Octavio Gal- aplicado o reajuste, não tinham os servi-
lotti, o Supremo Tribunal Federal, apre- dores nenhum direito subordinado a ter-
ciando a controvérsia, decidiu (DJ de mo ou condição, mas simples expectati-
28-6-91, pág. 8905): va de direito, porque se achava pendente
situação de fato, erigida em elemento
«Mandado de Segurança contra essencial ao próprio surgimento do di-
ato omissivo do Presidente do Supre- reito.
mo Tribunal Federal, em virtude do
Por isso mesmo, no julgamento do
qual ficaram privados os impetran-
Mandado de Segurança n° 21.216-1-DF,
tes, funcionários da Secretaria da
assinalou o eminente Relator, Ministro
Corte do reajuste de 84,32% sobre os
Octavio Gallotti:
seus vencimentos, a decorrer da apli-
cação da Lei n° 7.830, de 28-9-89. «Na espécie em julgamento, basta
reconhecer efeito imediato à Medida
Revogada esta pela Medida Pro- Provisória n° 154, de 16 de março de
visória n° 154, de 16-3-90 (converti- 1990 (convertida na Lei n° 8.030/90),
da na Lei n° 8.030/90), antes de que para que possa ela alcançar, validá-
se houvessem consumados os fatos mente, o resultado que, só a partir de
idôneos à aquisição do direito ao rea- 1° de abril seguinte, teria vindo a
juste previsto para 1-4-91, não cabe, produzir-se.
no caso a invocação da garantia pre-
vista no art. 5°, XXXVI, da Consti- Retroatividade haveria, aí sim,
tuição.» quando a remuneração correspon-
dente a dias já trabalhados (ainda que
E, com efeito, no regime da Lei n° não efetivamente paga) houvesse
7.830, de 1989, a variação do IPC era sido atingida por lei superveniente, o
tomada como referência para a deter- que não é o caso dos autos.
minação do percentual de reajuste no
mês subseqüente ou no último mês do Não há falar, portanto, em ofensa
trimestre, conforme o caso, mas o direi- a direito adquirido, tampouco em
to ao reajustamento só se surgia no mês desfazimento de situação definitiva-
relativo ao efetivo exercício do cargo. mente constituída. A revogação pre-
cedeu a própria aquisição e não so-
Dessa forma, o direito ao percentual
mente o exercício do direito.
de 84,32% só se constituiria se o critério
de reajuste mensal previsto na Lei n° Para a aquisição do direito, ou
7.830, de 1989, ainda subsistisse no pró- seja, para o ingresso deste no preteri-
32 R.T.J. — 158

so patrimônio do titular, seria mister «A própria referência feita pelos


que, antes da revogação, se houves- impetrantes à cláusula da irredutibi-
sem reunido e consumado todos os lidade só se justificaria se ato estatal
elementos, isto é, os fatos idôneos houvesse, editado em face de situa-
sua constituição ou produção. Ou ção jurídica definitivamente consoli-
seja, no caso concreto, que algum dada, a afetar, de modo a reduzi-la, a
serviço houvesse sido prestado, sob remuneração efetiva e regularmente
a égide de lei anterior. Tal, porém, por eles já percebida. por isso mes-
não chegou a suceder, eis que não mo, esta Corte proclamou inaplicá-
havia principiado, ainda, o mês de vel o princípio constitucional da irre-
abril, quando tolhidos os efeitos da dutibilidade de vencimentos, «que
lei revogada, os quais, só a partir veda a redução do que se tem», na-
daquele mês, viriam a produzir-se. quelas hipóteses em que se discute —
tal como ocorre na espécie — «... a
O que, portanto, se frustrou, não negativa de concessão do que nunca
passava de expectativa de continui- se teve» (RTJ 104/808, Rel. Min.
dade do critério ou regime da fixação Moreira Alves). Sempre se reconhe-
de remuneração futura, e isso o Su- ceu — e a decisão proferida pela E.
premo Tribunal, repetida e uniforme- 2' Turma desta Corte no RE n°
mente, tem-se recusado a admitir 105.789-MG, Rel. Min. Carlos Ma-
como direito adquirido, mesmo em deira, bem exprime essa orientação
favor de funcionários protegidos — que constitui objeto da garantia
pela irredutibilidade (como antes os constitucional da irredutibilidade de
magistrados e agora os servidores em vencimentos, bem assim da cláusula
geral).» assecuratória da intangibilidade das
situações jurídicas constituídas, «... o
Não se configurou ofensa à garantia direito que já nasceu», e que não
da irredutibilidade dos vencimentos, pode, em conseqüência, ser afetado
porque ela se refere aos vencimentos já ou mesmo suprimido por ato super-
integrados no patrimônio jurídico do_ veniente do Estado (RTJ 118/300).
funcionário, não podendo ser invocada
para preservar remuneração simples- Se o reajuste vindicado pelos ora
mente esperada, cujo direito ainda não impetrantes não se incorporou ao seu
se constituíra. patrimônio jurídico, porque inter-
rompido, em seu ciclo de formação,
A garantia da irredutibilidade de ven-
como salientado, o processo de cons-
cimentos, segundo a iterativa jurispru-
tituição de uma específica relação ju-
dência do Supremo Tribunal Federal, rídica (cuja criação ter-se-ia concre-
protege os vencimentos já integrados no tizado não fosse a derrogação da le-
patrimônio jurídico do respectivo titu- gislação de política salarial invocada
lar, e não a simples expectativa de como suporte da pretensão aqui de-
direito. duzida), não há como imputar à Pre-
No julgamento do citado Mandado sidência desta Corte — que não po-
de Segurança n° 21.216-1-DF, aderindo, deria agir senão com estrita obser-
também nesse aspecto, ao voto do emi- vância da lei — o descumprimento
nente Relator, salientou o eminente Mi- de qualquer postulado constitucional
nistro Celso de Mello: ou de qualquer comando legal. Afi-
R.T.J. — 158 33

nal, só se protege, pela garantia da No restante, tem este Plenário reconhe-


irredutibilidade, aquilo que, a título cido, em reiteradas decisões, tanto prelimi-
de vencimentos, o servidor já vinha narmente, o caráter normativo do ato,
percebendo (RTJ 112/768, Rel. Min. como, no mérito, a sua inconstitucionalida-
Alfredo Buzaid). Daí, a sempre re- de perante os artigos 5°, XXXVI e 96, II, b
lembrada decisão do eminente Min. da Carta Federal, por não se haver configu-
Evandro Uns, em julgamento de que rado o suposto direito adquirido dos bene-
foi relator e onde se assentou, no que ficiários, a receber as importâncias questio-
concerne ao tema em debate, que «O nadas.
que a irredutibilidade veda é a dimi-
nuição por lei posterior, dos venci- Veja-se, para exemplificar, o decidido
mentos que o juiz, em exercício antes nas Ações Diretas n° 666 e n° 683, respec-
de sua vigência, estivesse receben- tivamente relatadas pelos eminentes Minis-
do» (RTJ 45/355). tros Moreira Alves e Marco Aurélio:
Na ausência de direito adquirido ao «Ementa: — Ação direta de incons-
reajuste de 84,32%, a Resolução Nor- titucionalidade.
mativa terminou por atribuir aumento de A preliminar de não-conheci-
vencimentos sem lei autorizativa, sendo mento da presente ação direta de incons-
incompatível com o disposto no art. 96, titucionalidade por não configurar a re-
II, alínea b, da Constituição Federal. solução atacada ato normativo já foi en-
Em face do exposto, o parecer é no frentada e decidida no julgamento do
sentido da procedência da ação, declara- referendum do despacho que deferiu a
da a inconstitucionalidade da Resolução medida liminar.
Administrativa proferida pelo Tribunal
No mérito, afastada a ocorrência
Regional Federal da 2• Região, tomada
de direito adquirido, e inexistindo ofen-
em Sessão Ordinária do Tribunal Pleno
sa ao princípio constitucional da irredu-
realizada no dia 2 de maio de 1991 (Ata
tibilidade de vencimentos, a resolução
n° 8), na parte em que deferiu aos servi-
normativa em tansa terminou por con-
dores e magistrados do Tribunal o paga-
ceder aumento de vencimentos sem lei
mento do reajuste de 84,32%, com a
que o autorizasse, sendo, pois, incompa-
inclusão no cálculo dos recursos sufi-
tível com o disposto na segunda parte da
cientes -a esse pagamento na Proposta
alínea b do inciso II do artigo 96 da
Orçamentária relativa ao exercício de
Constituição Federal.
1992.» (fls. 70/5).
É o relatório, do qual serão distribuídas Ação que se julga procedente para
cópias aos Senhores Ministros. declarar a inconstitucionalidade da reso-
lução administrativa do Tribunal Regio-
VOTO nal Eleitoral do Estado de Pernambuco,
tomada em sessão ordinária de seu Ple-
O Sr. Ministro Octavio Gallotti (Rela- nário, realizada em 12 de dezembro de
tor): Da parte da ação em que se impugna 1991, e que, ao julgar o processo admi-
a determinação do cumprimento de medi- nistrativo 686/91 — classe XVII, deter-
das judiciais indeferidas, não conheceu este minou o pagamento do reajuste de
Plenário, ao resolver a questão de ordem 84,32% relativo à variação do IPC de
discutida na sessão de 18 de setembro de março de 1990, extinto pela Medida
1991 (fl. 30). Provisória n° 154, de 15-3-90, converti-
34 R.T.J. — 158

da em Lei n° 8.030, de 12-4-90.» (DJ de gião, em sessão ordinária de 2 de maio de


1°40-93) 1991 (Ata n° 8), quanto à norma genérica
de «pagamento do percentual de 84,32% a
«Ação direta de inconstitucionali- todos os servidores da Justiça Federal da-
dade — Objeto —Resolução de órgão quela Região, inclusive Juízes e Desembar-
do Poder Judiciário — Normativida- gadores».
de —Reajuste de vencimentos do mês
de abril de 1990 — índice inflacioná- EXTRATO DA ATA
rio do período de 15 de fevereiro a 15 ADIn 577 — RJ — Rel.: Min. Octavio
de março de 1990. Ganha contornos Gallotti. Reqte.: Procurador-Geral da Re-
normativos decisão de tribunal que, pre- pública. Reqdo.: Tribunal Regional Fede-
sente alteração na política de revisão
geral de vencimentos perpetrada em
r
ral da Região.
data anterior ao mês alusivo ao das re- Decisão: Por votação unânime, o Tribu-
munerações, determina a observância nal julgou procedente a ação e declarou a
de índice resultante de legislação revo- inconstitucionalidade da Decisão Adminis-
gada, fazendo-o de forma linear, ou seja, trativa do Tribunal Regional Federal da 2'
em relação a todo corpo de servidores. Região, tomada em sessão ordinária do Ple-
É o caso do ato de tribunal no que im- no, realizada em 2-5-91 (Ata n° 8), na parte
plicou abandono da legislação em vigor em que edita norma de ordem genérica de
na data da aquisição com direito aos pagamento do percentual de 84,32% a to-
vencimentos — Medida Provisória n° dos os servidores da Justiça Federal da r
154/90, transformada na Lei n° 8.030/90, Região, inclusive Juízes e Desembargado-
e dispôs sobre a aplicação de índice que, res. Votou o Presidente.
à época, carecia de sustentação legal. Presidência do Senhor Ministro Sepúl-
Descabe confundir período a ser pesqui- veda Pertence. Presentes à Sessão os Se-
sado para efeito de fixação do índice nhores Ministros Moreira Alves, Néri da
inflacionário com a aquisição do direito Silveira, Sydney Sanches, Octavio Gallotti,
em si à percepção dos vencimentos de- Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco Au-
vidamente corrigidos.» (DJ de 3-9-93) rélio, Francisco Rezek e Maurício Corrêa.
Assim sendo, na parte em que conheci- Ausente, justificadamente, o Senhor
da, julgo procedente a ação, para declarar Ministro ninar Gaivão. Procurador-Geral
inconstitucional, com efeitos ex tunc, a da República, Dr. Geraldo Brindeiro.
decisão administrativa proferida pelo Tri- Brasília, 25 de outubro de 1995 — Luiz
bunal Regional Federal da Segunda Re- Tomimatsu, Secretário.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 733 — MG


(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
Requerente: Procurador-Geral da República — Requeridos: Governador do
Estado de Minas Gerais e Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais
1. Ação direta de inconstitucionalidade: lei de criação de Mu-
nicípio: idoneidade.
R.T.J. — 158 35

Ainda que não seja em si mesma uma norma jurídica, mas


ato com fonna de lei, que outorga status municipal a uma comunidade
territorial, a criação de Município, pela generalidade dos efeitos que
irradia, é um dado inovador, com força prospectiva, do complexo nor-
mativo em que se insere a nova entidade politica: por isso, a validade da
lei criadora, em face da Lei Fundamental, pode ser questionada por ação
direta de inconstitucionalidade.
Ação direta de inconstitucionalidade: interesse processual
de agir.
O interesse de agir, se é categoria a que se queira atribuir
pertinência ao processo objetivo de controle abstrato de normas, nele, há
de reduzir-se à existência e a vigência ou subsistência de efeitos da lei
questionada, bastantes a caracterizar a necessidade da declaração de sua
inconstitucionafidade.
Município: criação em ano de eleições municipais: não
incidência do art. 16 da Constituição Federal.
No contexto normativo do art. 16, CF — que impõe a vacatio
de um ano às leis que o alterem —, processo eleitoral é parte de um
sistema de normas mais extenso, o Direito Eleitoral, matéria reservada
privativamente à competência legislativa da União; logo, no sistema da
Constituição de 1988 — onde as normas gerais de alçada complementar,
e a lei específica de criação de municípios foi confiada aos Estados o
exercício dessa competência estadual explícita manifestamente não alte-
ra o processo eleitoral, que é coisa diversa e integralmente da competên-
cia legislativa federal.
Município: criação: plebiscito: âmbito da consulta popular.
O interesse jurídico do Município-mãe na preservação de sua
integridade territorial e populacional e da unidade histórico-cultural do
seu ambiente urbano cessa com a verificação dos pressupostos objetivos,
sem a concorrência dos quais não é lícita sequer a realização do plebis-
cito; reunidos, porém, esses pressupostos e autorizado o plebiscito pela
Assembléia Legislativa, diretamente interessada no objeto da consulta
popular é apenas a população da área desmembranda, única portanto,
a participar dela.
Composta a área de Município projetado de diversos distri-
tos, o resultado positivo do plebiscito depende da apuração, em cada um
deles, do quorum de comparecimento e da manifestação afirmativa
majoritária.
Município: criação: plebiscito: competência da Justiça
Eleitoral.
Sob a Constituição de 1988 —não obstante o retorno à órbita
da ordem estadual da fixação de requisitos substanciais à criação de
municípios e do processo da decisão política de criá-los, confiada à
36 R.T.J. — 158

Assembléia Legislativa —, é corrente o entendimento de que foi recebido


o direito anterior, no ponto em que outorgou à Justiça Eleitoral compe-
tência para administrar a consulta plebiscitária, apurar e proclamar, o
seu resultado positivo ou negativo (v.g., ADIn 542, 27-6-91, Néri da
Silveira): proclamado pelo TRE o resultado negativo da consulta, a
decisão — preclusa no âmbito da Justiça Eleitoral —, tem eficácia
definitiva e vinculante da Assembléia Legislativa, impedindo a criação
do Município projetado, sob pena de inconstitucionalidade por usurpa-
ção da competência judiciária.

ACÓRDÃO 3. A fundamentar a argüição, acolhe


o em. Procurador-Geral os termos da
Vistos, relatados e discutidos estes au- representação do il. Procurador-Chefe
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- da Procuradoria da República em
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- Minas, José Carlos Pimenta, que aduz
formidade da ata do julgamento e das notas (fl. 4):
taquigráficas, por unanimidade de votos, «Segundo entendimento do Co-
em rejeitar as preliminares de inépcia da lendo Supremo Tribunal Federal
inicial, de impossibilidade jurídica do pe- manifestado ao conceder as medidas
dido e de falta de interesse de agir. No cautelares supensivas dos efeitos de
mérito, por maioria de votos, o Tribunal leis dos Estados do Paraná (ADIn n°
julgou procedente, em parte a ação, para 704-1-PR) e do Maranhão (ADIn n°
declarar apenas a inconstitucionalidade da 718-1-DF, proposta por V. Exa.), são
Lei Estadual n° 10.703. inconstitucionais as normas que
Brasília, 17 de junho de 1992 —Sydney criem municípios no ano de realiza-
Sanches, Presidente — Sepúlveda Per- ção de eleições municipais, como é o
tence, Relator. de 1992, porque violam o disposto no
art. 16 da Constituição da República.
RELATÓRIO Nesse ponto, o 1° do art. 5° da Lei
Complementar n° 19/91 limitou-se a
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: estabelecer que o projeto de lei rela-
Assim relatei o caso, ao submeter ao Plená- tivo à criação, incorporação, fusão e
rio, em 20-5-92, o pedido de suspensão desmembramento de municípios
cautelar das leis impugnadas: «tramitará entre o 15° (décimo quin-
«O Senhor Procurador-Geral da Re- to) e o 6° (sexto) mês anterior ao das
pública ajuiza ação direta de inconstitu- eleições municipais». Daí o desres-
cionalidade das Leis estaduais n°s peito ao princípio da anterioridade
10.703 e 10.704, do Estado de Minas consagrado no art. 16 da Carta
Gerais, com pedido de suspensão caute- Magna.
lar de sua vigência. Releva notar, ainda, que as con-
2. As leis questionadas criaram, a sultas plebliscitárias visando à eman-
primeira — Lei n° 10.703/92 — treze, e cipação dos distritos constantes das
a segunda — Lei n° 10.704/92 — trinta referidas leis foram procedidas ape-
e três novos municípios no Estado de nas no âmbito das localidades inte-
Minas. ressadas em sua autonomia (art. 3°;
R.T.J. — 158 37

2° do art. 5°-, e parágrafo único do art. do das localidades candidatas à fu-


15 da Lei Complementar n° 19/91). são, considerado globalmente, ou
No magistério do Professor José seja, metade mais um dos sufrágios
Afonso da Silva, tendo o constituin- favoráveis apurados entre o eleitora-
te utilizado a expressão «popula- do dos dois ou mais distritos, soma-
ções», no plural, ao redigir a norma do.
do 4° do art. 18 da Constituição Fe- Inaplicável restou, portanto, a
deral, previu a necessidade de con- norma do 3° do art. 5° da Lei Com-
sulta da área a ser desmembrada e da plementar n° 19/91, que prevê o ar-
área de que se desmembra (Cfr. quivamento do processo e a vedação
«Curso de Direito Constitucional Po- de sua instauração na mesma legisla-
sitivo»; 5° edição; Editora Revista tura, em caso de inviabilização do
dos Tribunais; SP; 1988; pág. 409). plebiscito, pela não consecução do
Quanto ao quorum para delibera- quorum legal na votação».
ção, nas consultas plebiscitarias, exi-
giu o 2° do art. 1° da Lei Complemen- A inicial pede a suspensão liminar
tar n° 19/91 a maioria absoluta dos da vigência das leis questionadas, «por-
votos dos respectivos eleitores alista- que, ao lado do fumus boni buris, con-
dos. Assim, tendo em vista a deter- corre o periculum In mora, tendo em
minação contida em seu art. 15, e a vista que a criação dos municípios pro-
consideração de que, no caso de fu- vocará alteração irreversível do proces-
são de distritos, populações direta- so eleitoral» (fl. 3).
mente interessadas são as residentes Para exame do pedido cautelar,
nos distritos objeto da fusão (2° do submeto o caso ao Plenário.»
art. 5°), o Tribunal Regional Eleitoral
de Minas Gerais, ao disciplinar o ple- Acolhendo meu voto, o Tribunal de-
biscito, requereu, para validade das feriu, em parte, o pedido cautelar, para sus-
deliberações, fosse alcançada a pender a vigência da Lei est. n° 10.703,
maioria absoluta entre os eleitores de negando-a quanto à Lei est. n° 10.704/92,
cada localidade candidata à fusão, de do Estado de Minas.
forma isolada (art. 37 da Resolução Prestou informações à Assembléia
n° 464/91, e art. 37 da Resolução n° Legislativa (fls. 99/131), acompanhadas de
470/91). farta documentação (fls. 132/617), aduzin-
No tocante às consultas plebisci- do, em síntese, que:
tárias pertinentes aos municípios a criação de Municípios no ano de
criados pela Lei n° 7.203/1992, o eleições não altera o processo eleitoral;
quorum assim apurado, de forma
populações diretamente interessadas
destacada, não foi alcançado. Daí a
a cuja manifestação plebiscitária o art. 18,
não homologação dos resultados res- 4°, CF, subordina a criação de Municípios,
pectivos, pelo TRE-MG. dão apenas as da área emancipada, não as
Mesmo assim, a Assembléia Le- do território remanescente do Município-
gislativa do Estado resolveu emanci- mãe, conforme já se firmara na jurispru-
par tais distritos, ao fundamento de dência sob o regime anterior (Rp 1 269,
que suficiente a manifestação favorá- Néri da Silveira, DJ 18-12-67), que não
vel da maioria absoluta do eleitora- sofreu, no particular, alteração substancial,
38 R.T.J. —158

como tem afumado o Tribunal Superior


Eleitoral (Rev. TSE, v. 1, n. 2/98). Pretende a Assembléia Legislativa
que a edição da Lei n° 10.703, em que, não obstante a forma de lei, a criação
particular, não violou nenhum dispositivo de Município é ato de efeito concreto, des-
constitucional, ao menos, diretamente; pido, pois, dos caracteres de generalidade e
abstração dos atos normativos sujeitos à
que as leis de criação de Municípios ação direta.
são leis de efeitos concretos, despidas de
abstração e generalidade e, como tal, insus- A questão é interessante e, não fosse
ceptíveis de controle na via da ação direta a urgência da decisão do caso, as razões do
de inconstitucionalidade. meu convencimento em contrário reclama-
riam maior desenvolvimento.
De sua vez, as informações do Se-
nhor Governador do Estado de Minas sus- O certo, porém, é que, há décadas, e
citam preliminares de inépcia da petição sem discrepâncias, o Tribunal tem admiti-
inicial e de carência da ação, por falta de do a viabilidade da antiga representação e
interesse processual e, no mérito, seguem a da atual ação direta de inconstitucionalida-
de para o controle da constitucionalidade
linha dos argumentos expendidos pela As-
das leis de criação de municípios.
sembléia Legislativa (fl. 619).
E a jurisprudência, penso é correta.
Na mesma trilha, a defesa da Advo-
cacia-Geral da União (fl. 632). Certo, a criação de um novo municí-
pio não é, em si mesma, uma norma jurídi-
Finalmente, o Ministério Público,
ca: vale dizer pela outorga do status muni-
em parecer da lavra do il. Suprocurador-
cipal a uma dada comunidade territorial e
Geral Antônio Fernando Barros e Silva de
nisso aparentemente se esgota.
Souza opina pela procedência parcial da
ação, para declarar a inconstitucionalidade Só aparentemente, porém. O status
da Lei est. n° 10.703/92, acolhendo, para de município concedido a determinada co-
tanto, a fundamentação do acórdão relativo munidade territorial cria uma nova ordem
ao pedido cautelar. jurídica parcial, personalizada na nova en-
tidade que institui, cuja existência será
A Assembléia Legislativa e o Gover-
pressuposto e demarcará os limites do âm-
nador do Estado, dada a urgência do caso,
bito de validade das normas que o compo-
à vista do processo eleitoral em curso, re-
rão, ao mesmo tempo em que afetam a
quereram a dispensa da publicação da pau-
esfera de validade do ordenamento do qual
ta, com o que se pôs de acordo o Senhor
se hajam desmembrado a comunidade e o
Procurador-Geral.
território emancipados e as relações de am-
É o relatório, do qual se distribuirão bos —o antigo e o novo município —, com
cópias aos Senhores Ministros. a União e o Estado-membro, a que perten-
çam: assim, pela generalidade dos efeitos
normativos que irradia, a criação do muni-
VOTO (PRELIMINAR) cípio não é ato que se esgote em si mesmo,
mas dado inovador, com força prospectiva,
de todo o complexo normativo em que se
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: insere.
As informações suscitam questões prelimi-
nares de que não cogitou a decisão cautelar. 8. Rejeito, pois, a primeira preliminar.
R.T.J. — 158 39

II leis de criação de municípios. E a jurispru-


Rejeito, igualmente, as preliminares dência, segundo penso, é correta.
aventadas pelas informações da Procurado- Os predicados que se reclamam, de ge-
ria-Geral do Estado e encaminhadas pelo neralidade e abstração, são categorias ati-
Governador, que, de resto, no que tem de nentes às normas de conduta, relativas, a
inteligíveis, confundem-se com o mérito. generalidade, ao universo dos destinatários
A petição inicial não é inepta. Saber da norma; a outra, a abstração, à indetermi-
se procede ou não a inconstitucionalidade nação do número de condutas hipotetica-
argüida não diz com a higidez lógica da mente reguladas na proposição jurídica
petição que a afirma e lhe pede a declara- (Bobbio).
ção, mas, sim, com a procedência do pe- A meu ver, dificilmente se podem apli-
dido. car tais categorias a outro tipo de normas
11. De sua vez, interesse processual de de direito — derivadas, no ordenamento
agir, se é categoria a que se queria atribuir jurídico, da sua peculiaridade, remarcada
pertinência ao processo objetivo de contro- por Kelsen, de ser uma ordem que regula a
le abstrato de normas, nele, há de reduzir-se sua própria criação: são aquelas que, na
à existência e à vigência ou subsistência de terminologia de Bobbio, se chamariam nor-
efeitos da lei questionada, e tudo isso, no mas de estrutura ou de competência e que
caso, é incontestável. podem, muitas vezes, ser absolutamente
individuais. É, pensar, num exemplo de
VOTO laboratório, na Constituição de um Estado
de monarquia absoluta, que, em teoria, se
pode reduzir a uma única norma referente
(Sobre preliminar de impossibilidade
a um único indivíduo: «Será válido, no
jurídica do pedido)
ordenamento, aquilo que for decretado
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence como tal pelo soberano.»
(Relato* Senhor Presidente, as informa- A criação dos municípios, é certo, não
ções suscitam questões preliminares de que é, em si mesmo, uma norma jurídica de
não cogitou a decisão cautelar. conduta: é, apenas, a outorga de status
Pretende a Assembléia Legislativa que, municipal a uma dada comunidade territo-
não obstante a forma de lei, a criação de rial. Nisso, aparentemente, se esgota. Só
município é um ato de efeito concreto, des- aparentemente, porém. É, na verdade, uma
pido, pois, dos caracteres de generalidade e norma que altera elemento integrante da
abstração dos atos normativos sujeitos à estrutura do Estado. O status de município
ação direta. concedido a determinada comunidade ter-
ritorialmente demarcada cria uma nova or-
A questão é interessante e, não fosse a
dem jurídica parcial, personalizada na nova
urgência da decisão do caso, as razões do
entidade política que institui, cuja existên-
meu convencimento em contrário reclama-
cia será pressuposto e demarcará os limites
riam maior aprofundamento. do âmbito de validade das normas, que o
O certo, porém, é que, há décadas, sem comporão; ao mesmo tempo em que afeta
discrepância, o Tribunal tem admitido a a esfera de validade do ordenamento muni-
viabilidade da antiga representação e da cipal, do qual se hajam desmembrado a
atual ação direta de inconstitucionalidade comunidade e o território emancipados, e
para o controle da constitucionalidade das as relações de ambos — o antigo e o novo
40 R.T.J. — 158

município — com a União e o Estado- de agir na ação direta sempre que haja uma
membro a que pertencem. lei, uma norma existente, e vigente — ou,
Assim, pela generalidade dos efeitos segundo o máximo da concessão a que
normativos que irradia, a criação do muni- chegou a jurisprudência do Tribunal, que,
cípio não é ato que se esgote em si mesmo, embora não vigente, tenha produzido efei-
mas dado inovador, com força prospectiva, tos: se há essa realidade jurídica, para des-
de todo o complexo normativo em que se fazê-la por vício de inconstitucionalidade,
insere. há sempre utilidade e necessidade da ação
direta, no que se consubstancia o interesse
Com essas breves considerações — que processual.
procurei desenvolver em outra oportunida-
de —, rejeito, pois, a primeira preliminar. Rejeito as preliminares de inépcia e de
falta de interesse de agir.
VOTO
VOTO
(S/prel. de inépcia da inicial
e de falta de interesse de agir) O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
(Relator): Sr. Presidente, no mérito, as in-
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence formações e arrazoados produzidos não
(Relator): Rejeito igualmente as prelimina- abalaram a convicção que formara, à pri-
res aventadas pelas informações da Procu- meira delibação da causa, expressa no voto
radoria-Geral do Estado, encaminhadas condutor do acórdão sobre o pedido cau-
pelo Senhor Governador, que, de resto, no telar.
que têm de inteligíveis, confundem-se com
o mérito. Improcedem os dois fundamentos co-
muns da pretendida inconstitucionalidade
A petição inicial realmente não é inepta. de ambas as leis impugnadas. Disse naque-
Saber se procede ou não a inconstituciona- la oportunidade, a propósito da alegada
lidade argüida não diz com a higidez lógica. ofensa ao art. 16 da Constituição:
da petição — que afirma a inconstituciona-
lidade e lhe pede a declaração —, mas, sim, «Segundo o art. 16 da Constituição
com a procedência do pedido. Federal, 'a lei que alterar o processo
eleitoral só entrará em vigor um ano
De sua vez, interesse processual de agir, após a sua promulgação'».
se é categoria a que se queira atribuir qual-
quer pertinência ao processo objetivo do Nada tem o preceito a ver com a
controle abstrato de normas, nele há de criação de municípios.
reduzir-se à existência e à vigência, ou, O surgimento de novos municípios,
pelo menos, à subsistência de efeitos da lei na medida em que acarreta a realização
questionada. E tudo isso, no caso, é incon- nele de eleições municipais próprias, in-
testável. terfere no processo eleitoral, enquanto
Em longa dissertação, sustenta-se que fato histórico em desenvolvimento.
só estão em jogo interesses políticos das Por isso, a lei que o regula preocu-
comunidades envolvidas, com reflexos pou-se de evitar que a superveniência de
eleitorais, e que não haveria nenhum inte- novos municípios, quando já em curso
resse jurídico a proteger, etc. Mas, se se o processo eleitoral deste ano viesse a
quer transpor, para o processo objetivo do tumultuar o calendário, fazendo-o cami-
controle abstrato, as categorias das condi- nhar para trás, reabrindo fases supera-
ções de ação do processo civil, há interesse das. Nesse sentido, depois de fixar em
R.T.J. — 158 41

3-10-92 o dia das próximas eleições mu- Logo, no sistema da Constituição de


nicipais, estatuiu a Lei n° 8.214/91: 88 — onde as normas gerais de alçada
art. 1° (...) complementar, e a lei específica de cria-
ção de municípios foi confiada aos Es-
§ 1°. Na mesma data serão realiza- tados —, o exercício dessa competência
das eleições para Prefeito, Vice-Prefeito estadual explícita manifestamente não
e Vereadores nos Municípios que ve- altera o processo eleitoral, que é coisa
nham a ser criados até 1° de maio de diversa e integralmente da competência
1992.» legislativa federal.
No art. 16 CF, que é norma secundá-
ria, ou de sobredireito, relativa à vigên- O já mencionado art. 1°, § 1°, da
cia das leis que o alterem — processo Lei 8.214/91 respeitou exemplarmente
eleitoral tem o significado de ordena- a discriminação constitucional entre es-
mento jurídico das eleições, de conjunto sas duas áreas inconfundíveis de com-
normativo constitucional que as disci- petência, por isso, entregue cada uma a
pline. entidade política diversa: não proibiu a
criação de municípios a qualquer época
Na ADIn 354, 24-9-90, Octavio Gal- — tema de competência estadual —,
lotti e no RE 129.392, 20-2-91, Bros- mas apenas fixou a data-limite à realiza-
sard, ambos decididos por seis votos ção de eleições, no corrente ano, nos
contra cinco, dividiu-se o Plenário do municípios que nele se viessem a criar
Tribunal sobre a maior ou menor com- — questão de direito eleitoral.
preensão, da expressão processo eleito-
ral, no contexto do art. 16 da Constitui- Finalmente, equivoca-se o represen-
ção. tante no invocar, em favor do seu argu-
mento, a decisão que, na ADIn 704, do
Dada a interferência, na fundamenta-
Paraná, concedeu a liminar.
ção de alguns dos votos vencedores, de
considerações diversas, não se colheu, A LC est. n° 62/92 — nela questio-
naqueles julgamentos, definição explí- nada, reabrira, no Estado do Paraná, pra-
cita da maioria da Corte a favor da com- zo já encerrado, em 31-12-92, para a
preensão mais abrangente — sustentada criação de novos municípios, conforme
pelos cinco votos vencidos —, ou mais a legislação local anterior: donde a invo-
restrita — conforme alguns dos votos cação, na ação direta do Governador do
vencedores —, do conceito constitucio- Estado, da garantia do direito adquirido
nal de processo eleitoral. dos municípios antigos à respectiva in-
Não obstante, um ponto, de resto, tegridade territorial até o próximo perío-
óbvio, parece ter ficado induvidosamen- do aberto a novos desmembramentos.
te acertado: no art. 16 CF, processo elei- Em Minas Gerais, não houve reaber-
toral é conjunto normativo parcial — tura de prazo: a LC est. n° 19/91, que é
maior ou menor, não importa — de um de 17-7-91, é que prescreveu, no art. 5°,
sistema de normas mais extenso, o direi- § 1° (fi. 17), que eo projeto de lei relativo
to eleitoral. à criação (...) de municípios tramitará no
E esse último, o direito eleitoral, des- período compreendido entre o 15° (...) e
de a Constituição de 34 (art. 5°, XIX, f) o 6° (...) mês anterior ao das eleições
é matéria reservada privativamente à municipais», no curso do qual se edita-
União. ram as leis ora questionadas.
42 R.T.J. —158

O segundo fundamento diz com a pre- sentido de que a população a ser consultada
tendida necessidade de que a consulta às era a da área desmembranda, da área cuja
populações interessadas, determinada no população aspira a autonomia municipal.
art. 18, § 4°, como pressuposto à criação de Lembro o caso em que o tema foi enfren-
municípios, deveria abranger não apenas o tado, especificamente: a RP n° 1.269, de 30
eleitorado da área a desmembrar, mas, tam- de outubro de 1985, relator o eminente
bém, o da área do território remanescente Ministro Néri da Silveira, com a seguinte
do Município-mãe, segundo o hermafrodi- ementa:
tismo constitucional, que se consagrou.
«Representação. Argüição de in-
Ao repelir a relevância da tese no julga- constitucionalidade da Lei n° 839, de
mento cautelar, limitei-me a anotar: 13-5-1985, do Estado do Rio de Janeiro,
«Segue-se, na fundamentação da de- que criou o município de Arraial do
manda, a alegação de que, por força do Cabo, desmembrando-o do município
art. 18, § 4°, CF, a consulta prévia às de Cabo Frio, RJ. Constituição Federal,
populações interessadas, que ali se de- art. 14. Lei Complementar n° 1, de 1967,
termina para a criação de municípios, modificada pela Lei Complementar n°
teria de compreender não apenas a das 32, de 1977, arts. 3° e 5°. Não se reserva
áreas emancipandas, mas também a do qualquer espaço à legislação estadual
território remanescente do Município- para dispor sobre a consulta plebiscitá-
mãe. ria. Nela não se incluem as populações
A tese — não obstante o respaldo de do Município-mãe, residentes fora da
autores de tomo —, já foi repelida pelo respectiva área a desmembrar-se. Tam-
Tribunal, sob a ordem constitucional vi- bém não se exige consulta prévia à Câ-
gente, ao menos como bastante a reco- mara Municipal do município de ori-
mendar a suspensão cautelar das leis gem, ou sua aprovação, para criar, com
estaduais em contrário (ADIn 478, Vel- área dele desmembrada, o novo municí-
loso — vencido — 9-5-91), que tem por pio. No caso concreto, não há inconsti-
si a jurisprudência assentada do Tribu- tucionalidade da Lei impugnada, em
nal Superior Eleitoral (v.g., MS 1.479, virtude de a consulta plebiscitária não se
Boda, 14-5-91).» haver estendido à população de todo o
Município de Cabo Frio, mas, apenas, à
Agora, no julgamento definitivo, Sr. do Distrito de Arraial do Cabo, que
Presidente, embora a urgência solicitada constituía a área emancipanda. Tam-
pelas partes, com razão, não me haja per- bém, não invalida a Lei estadual citada
mitido desenvolver melhor o meu raciocí- o fato de a Câmara Municipal de Cabo
nio, entendo que é de manter-se a orienta- Frio não ter sido consultada, em termos
ção firmada sob a ordem constitucional de aprovação da criação do novo Muni-
anterior. cípio. Quanto ao art. 7°, da Lei flumi-
É certo que o art. 18, § 4°, deu alento aos nense n° 839/1985, a representação é de
defensores da tese contrária, quando se re- ser tida como prejudicada, em face de
fere a «populações diretamente interes- sua revogação pela Lei n° 876/1985, do
sadas». Essa forma verbal, no entanto, já mesmo Estado, sem que do dispositivo
era utilizada, não na Constituição, mas na remanescesse qualquer efeito. Inconsti-
Lei Complementar n° 1, e, não obstante, a tucional é, entretanto, o art. 4°, da Lei
jurisprudência do Tribunal, sob a vigência estadual n° 839/1985, em face do art.
da Carta de 69, manteve-se invariável no 144, § 5°, da Constituição Federal, por
R.T.J. — 158 43

vício de iniciativa, ao criar desde logo, de diversos distritos, de diversas localida-


«comarca própria», para o novo Muni- des sem autonomia que se pretenda fundir
cípio, nos termos do Código de Organi- num município único.
zação e Divisão Judiciárias do Estado,
Não nego, Sr. Presidente, a realidade do
sem proposta do Tribunal de Justiça do interesse do Município-mãe na preserva-
referido Estado. Representação, assim,
ção da sua integridade territorial, popula-
procedente, apenas, em parte, declaran-
cional e, como diz a Constituição, da sua
do-se inconstitucional o art. 4° mencio- unidade histórico-cultural no ambiente ur-
nado, estando, também, em parte, preju-
dicada, quanto ao art. r, revogado. No
que concerne aos demais dispositivos, a
bano. Mas tudo isso, a mim me parece que
constituem pressupostos objetivos, de ca-
ráter negativo, presente os quais não é dado
representação é improcedente.» sequer fazer o plebiscito. E a identificação
Não dou, Sr. Presidente, maior relevo, destes pressupostos de admissibilidade da
de fato, à utilização, no plural, de «popula- emancipação — chamemo-los assim —
ções diretamente interessadas» para deli- são objetivos; até aí vai o interesse do Mu-
mitar o universo da população, a título da nicípio matriz e a possibilidade de defen-
participação no plebiscito. der-se, por todas as vias adequadas, contra
De início — e o argumento é do Profes- a abertura indevida do processo de criação
sor José Nilo de Castro (Direito Municipal do município.
Positivo) —, verifica-se que, para a criação Mas, uma vez verificado que, à proposta
de Estado que não se sujeita a requisitos de desmembramento de determinada co-
objetivos predeterminados, a Constituição munidade territorial, não se podem opor a
continua a contentar-se, literalmente, com falta de pressupostos positivos ou a presen-
a consulta à população diretamente interes- ça de pressupostos negativos da criação
sada (art. 18, § 3°) — assim, no singular, projetada, o que testa, como diretamente
sendo difícil de conceber-se que se tenha interessada, é só a população da área des-
querido exigir, para o desmembramento de membranda. É com relação ao status do
um Município, mais do que se exige para a cidadão da área a desmembrar, que será
divisão de um Estado-membro. afetado pela criação, ou não, do município
Mas há mais: a fórmula plural usada no novo, é ele que deixará a sua vinculação
4° se explica porque nela se regulam várias político-administrativa com o velho muni-
formas de criação de municípios novos, cípio, para converter-se em cidadão de ou-
algumas das quais envolvendo, essencial- tro município, sujeito às suas leis e ao seus
mente, mais de uma comunidade diferen- poderes.
ciada e interessada. Basta pensar na incor- Permaneço, assim, na convicção — já
poração, na qual um município preexisten- reafirmada, não aqui, senão em sede limi-
te é incorporado a outro, ou na hipótese nar, mas no Tribunal Superior Eleitoral —,
mais evidente da fusão em que dois muni- de que o plebiscito não deve envolver a
cípios preexistentes perderão a sua identi- população do município do qual se preten-
dade para a criação de um 'único município da desmembrar a área.
novo.
Esses dois são os fundamentos comuns
Nesse caso, não há como negar que am- às duas leis; rejeitando-os de logo, julgo
bas as populações têm que ser consultadas, improcedente a ação contra a Lei n° 10.704,
para não avançar no terceiro ponto de mé- em relação à qual nenhuma outra impugna-
rito desta ação direta, que é a da hipótese ção se apresentou.
44 R.T.J. — 158

Examino, agora, o terceiro ponto, ati- No caso, comprovam os autos que o


nente apenas a uma das leis impugnadas, a TRE proclamara a inexistência de quo-
Lei 10.703, que em razão dele, teve a sua rum na resposta afirmativa de nove ple-
vigência cautelarmente suspensa. biscitos e que pendia de julgamento o
resultado de quatro outros (fls. 18/24);
Disse, a propósito, no voto liminar: ademais, a decisão negativa, atinente
«Finalmente, aduz a provocação en- aos nove primeiros, foi considerada pre-
dossada pelo Senhor Procurador-Geral, clusa pelo Tribunal: não obstante, a Lei
a Lei Estadual n° 10.703/92 criou muni- 10.703/92 criou os treze municípios».
cípios com base em plebiscitos a que o No caso, explico o que ocorreu: o Tribu-
TRE negara homologação, dado que nal — na linguagem que se vem utilizando
não se obtivera maioria absoluta de res- — negou homologação a nove e converteu
postas afirmativas nos distritos emanei- em diligência quatro outros plebiscitos
pandos, isoladamente considerados. pelo mesmo problema: falta de quorum de
A representação não explicita clara- comparecimento em algum dos distritos
mente se divisa aí alguma violação da envolvidos. Dessa decisão não houve re-
Constituição Federal. curso nem contra ele se impetrou mandado
de segurança, como se tem admitido. Pos-
Não obstante, estou em que essa é a teriormente, houve uma representação ino-
única questão constitucional relevante, minada de interessados, a que o Tribunal
das três suscitadas. negou conhecimento, por entender que a
A questão se desdobra em dois pris- sua decisão era susceptível de impugnação
mas diversos, ambos ponderáveis. pelos meios adequados, mas, não impugna-
da, o ponto se fizera precluso.
O primeiro é o do desrespeito à com-
petência da Justiça Eleitoral. Não obstante isso, a Assembléia, enten-
dendo que o Tribunal invadira a sua com-
No sistema da Constituição de 88 — petência, ao decidir a questão de direito
não obstante o retorno à órbita da ordem sobre se o quorum deveria ser apurado em
estadual da fixação de requisitos subs- cada distrito envolvido isoladamente con-
tanciais à criação de municípios e do siderado, ou no conjunto dos distritos inte-
processo da decisão política de criá-los, ressados, editou a lei criando os treze mu-
confiada à Assembléia Legislativa —, é nicípios.
corrente o entendimento de que foi rece-
No julgamento liminar, prossegui:
bido o direito anterior, no ponto em que
outorgou à Justiça Eleitoral competên- «Por outro lado, quanto à questão
cia para administrar a consulta plebisci- substancial — apuração conjunta ou
tária, apurar e proclamar, o seu resultado isolada do plebiscito em mais de um
positivo ou negativo (v.g., ADIn 542, distrito, relativo à criação de um único
27-6-91, Néri da Silveira). município —, o critério do TRE/MG de
apuração separada em cada distrito, foi
Ora, sendo de sua competência, apu- endossado, no rumoroso Caso Búzios
rar o plebiscito e proclamar-lhe o resul- (MS n° 1.501, Américo Luz, 6-2-92),
tado, parece inequívoco que a proclama- pelo Tribunal Superior Eleitoral.
ção da Justiça Eleitoral tem eficácia de-
finitiva e vinculante do Legislativo es- 29. Certo, o caso envolvia também
tadual. questões de direito local».
R.T.J. — 158 45

30. No meu voto-vista, contudo, que pode opor-se — e nessa linha parece
compôs a maioria, tive a oportunidade situar-se o raciocínio de sustentação do
de sustentar que a apuração conjunta ato impugnado —, que o distrito, mera
não era a mais adequada à concretização divisão administrativa do município,
dos ditames do art. 18, § 4°, da Consti- não tem personalidade jurídica, de
tuição Federal. modo a que ao seu eleitorado se pudesse
31.. Assinalei, então. reconhecer identidade política própria
«A Lei Fundamental, art. 18, § 4°, Esto modus in rebus. Enquanto in-
exige «consulta prévia, mediante plebis- tegrado ao município a criatura dele
cito, às populações diretamente interes- (CF, art. 30, IV), é certo que o distrito é
sadas » não apenas para a criação stricto mera circunscrição territorial para fins
sensu de municípios, pela chamada administrativos e o seu eleitorado não
emancipação de distritos, mas também, passa de parcela, juridicamente indistin-
além de qualquer modalidade de des- ta, do eleitorado municipal.
membramento, para a fusão ou a incor- A mim me parece, contudo, que, no
poração de municípios preexistentes. processo de criação de município, quan-
E, para todas essas hipóteses, impõe do a área do distrito sirva de demarcação
«consulta às populações diretamente in- da área emancipanda, não o distrito, mas
teressadas»: assim, no plural, forma ver- o eleitorado distrital se diferencia e ga-
bal que tem gerado inconclusa polêmica nha identidade própria como órgão co-
doutrinária sobre a necessidade ou não letivo de manifestação da vontade da
de consulta à população de todo o mu- população diretamente interessada.
nicípio-mãe, em caso de criação de mu- Se assim é, quando se trata de eman-
nicípio novo por desmembramento par- cipação de um único distrito, não vejo
cial do seu território (v.g., pela resposta como negar a mesma identidade política
afirmativa, Geraldo Ataliba, RDP 75/62 à população de cada um deles, quando
e RDP 98/102; em sentido contrário, se cuida de somá-los para a formação do
José Nilo de Castro, Direito Municipal território de um município novo.
Positivo, Del Rey, pág. 46). Ademais, em tema onde a Constitui-
O que é incontroverso, no entanto, e ção Federal primou por dar relevo à
a ninguém ocorreria sustentar o contrá- manifestação plebiscitária, dissolver,
rio nas hipóteses flagrantes da fusão de em um único eleitorado, os cidadãos de
municípios diversos ou da incorporação distritos diversos, de modo a impor à
de um município a outro, que a consulta população de um a vontade do outro, é
às distintas «populações diretamente in- artifício que, freqüentemente, dissimu-
teressadas» há de fazer-se separadamen- lará fraude às inspirações de democracia
te, guardando cada qual, no plebiscito a direta a que, no particular, se rendeu a
sua identidade política em relação às Constituição.
demais, sob pena de dissimular-se, sob De fato. Na formação de município
as formas constitucionais admissíveis, a novo pela junção de distritos diversos, o
inadmissível anexação de um município caráter de verdadeira emancipação polí-
pela vontade unilateral da população de tica, na realidade, só se ajusta à popula-
outro. ção daquele em que se situará a futura
À aplicação do mesmo critério a hi- sede municipal; para o outro ou os de-
pótese de distritos diversos, é certo, mais o de que realmente se trata é de
46 R.T.J. — 158

uma «emancipação» do município-mãe, De qualquer sorte, no caso, há outro


que simultaneamente se traduz na incor- fundamento — que me parece mais que
poração, com o mesmo status de distri- bastante —, ao qual volto. Não há dúvida,
to, ao novo município autônomo: notou- a meu ver, de que a Lei Complementar n°
o, com precisão, a d. Procuradoria-Ge- 1, no que atribuiu à Justiça Eleitoral com-
ral, em seu parecer. petência para realizar o plebiscito, para ad-
Se assim é, esse interesse da popula- ministrar o plebiscito em todo o seu con-
junto, o seu processo, foi recebida pela
ção de um distrito na simples conversão
em distrito de outro município, mantido ordem vigente. Nada tem esse problema a
ver com o se ter deslocado, do âmbito da
o mesmo status de subordinação, evi-
União para o dos Estados-membros, a fixa-
dentemente não se confunde com o in-
ção dos outros pressupostos da criação de
teresse do eleitorado daquele que se pre-
Municípios e da verificação deles, além da
tende converter em sede a nova entidade
autônoma». decisão política de criar, que sempre esteve
na órbita dos Estados.
Desse modo, estou em que, à vista da O plebiscito é forma explícita de exercí-
terceira questão suscitada na ação direta
cio da cidadania, como resulta do art. 14 da
— que lhe é exclusiva —, é plausível a Constituição; e a competência federal é
afirmação da inconstitucionalidade da privativa para regular esse exercício (CF,
Lei Estadual n° 10.703/92, o primeiro
art. 22, XIII).
dos diplomas questionados».
De tal modo que o deslocamento da
Refleti novamente sobre o tema, à luz competência para o Estado de outros aspec-
dos argumentos trazidos em contrário pelas tos envolvidos no processo de criação de
informações e do respaldo que teve, a mi- Municípios, não ilide a subsistência da
nha posição liminar, no parecer final da competência da União para disciplinar a
douta Procuradoria-Geral da República. respeito.
Persisti, porém, no meu convencimento. O
que não admito é o disfarce, a título de Ora, admitido que caiba à Justiça Elei-
emancipação, da anexação de um distrito a toral realizar, administrar o Município, en-
outro, sobretudo quando a participação do tendo patentemente improcedente a argu-
primeiro é necessária para o preenchimento mentação, trazida em contrário, de que o
das condições objetivas da criação do mu- papel da Justiça Eleitoral se reduziria à
nicípio projetado. operação material do plebiscito.
Veja-se, o caso, amplamente noticiado, Chega-se, em uma das peças dos autos,
da criação do Município de Búzios. O Dis- a falar que a Assembléia seria mera como-
trito de Armação dos Búzios teria todas as datária das instalações e das umas da Justi-
condições para se emancipar, menos uma: ça Eleitoral, cujo dever cessaria no forneci-
sua área seccionaria o território de Cabo mento do espelho aritmético dos votos apu-
Frio, se a ele não se somasse um pequeno rados. A meu ver, a direção de plebiscito,
distrito rural de Cabo Frio, de característi- assim como a das eleições — confiadas
cas culturais inteiramente diversas, cuja ambas à Justiça Eleitoral — compreende
população resiste a essa mudança de subor- não apenas a administração material da
dinação para deixar de ser distrito de Cabo consulta e a apuração numérica dos votos,
Frio e passar a ser distrito de Armação de mas, envolve todas as decisões necessárias
Búzios. à proclamação do resultado.
R.T.J. — 158 47

Certo, se não se entende, como entendo tra lei que apontou o prazo, em si, para essa
eu, que a exigência de apuração isolada em criação, se não me falha a memória, a Lei
cada distrito dimana da própria Constitui- n° 1.991.
ção Federal, a questão se reduziria à inter-
pretação do direito local. Isso não impede,
Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
Consideraria o problema, se essencial à
porém, que a decisão a respeito incumba à
conclusão do meu voto. Nesse ponto, que é
Justiça Eleitoral. Nada impede, no sistema
comum à impugnação de ambas as leis,
brasileiro, que uma Justiça federal aplique
realmente, a defesa da Assembléia Legisla-
direito local ou vice-versa.
tiva percebeu a questão e a suscitou, de que
Se errou, no caso, o TRE — o que supo- então inconstitucional seria a lei comple-
nho para argumentar — na interpretação da mentar e não a leis de criação dos municí-
lei complementar mineira sobre o tema, é pios. De todo o modo, contudo, subsistiria
problema a ser decidido pela Justiça Elei- ainda, comum às duas leis criadoras ques-
toral mesma. E, como demonstrado, quan- tionadas, outro fundamento, o que não in-
do se repeliu a representação, a matéria se duziria, portanto, à inépcia da petição ini-
tomou preclusa no âmbito da Justiça Elei- cial: ainda que se desprezasse, pois, esse
toral. Ora, preclusa a matéria do resultado segundo fundamento, o outro — que não
de determinado plebiscito, creio que é do houve a consulta à população do Municí-
próprio sistema constitucional que resulta pio-mãe — também atingiria ambos diplo-
a impossibilidade de a Assembléia impor, mas.
neste ponto, o seu juízo ao do Tribunal
Regional Eleitoral. Sr. Ministro Marco Aurélio: De
qualquer forma, o Tribunal já assentou que
Compreendo a angústia dos grupos in- estamos diante de atos normativos.
teressados nas emancipações, aos quais
atendi, hoje, com esse voto atropelado, ape- Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
nas para não deixar inconcluso este proces- Existindo, ou não, a lei complementar, se-
so, o que importaria impedir as eleições do gundo a tese da petição inicial, a criação de
corrente ano, ainda que o Plenário viesse a município neste ano afetaria o art. 16 da
decidir contrário a minha opinião. Constituição.
Mas, Sr. Presidente, não vejo alternativa O Sr. Ministro Moreira Alves: Mas aí
senão — na linha, de certo modo preanun- teríamos que declarar inconstitucional inci-
ciada no voto liminar —, a de julgar proce- dentemente a lei complementar.
dente, em parte, a ação direta, para declarar
inconstitucional a Lei n° 10.703: é o meu Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
voto. Como a criação tem forma de lei, suposta a
procedência de invocação do art. 16, ela
VOTO seria inconstitucional, independente da
existência ou não da lei complementar. De
O Sr. Ministro Marco Aurélio: A esta qualquer maneira, a certo, repito, é que a
altura, Senhor Presidente, tenho até mesmo preliminar suscitada não levaria a resulta-
dúvidas, muito embora já haja ocorrido a dos diversos, porque, ainda com relação à
proclamação quanto à viabilidade da ação impugnação global das duas leis, subsisti-
direta de inconstitucionalidade, no que ata- ria sempre um fundamento, esse inequivo-
ca apenas as leis que criaram os municí- camente de inconstitucionalidade direta e
pios, isto por não se proceder, nesta ação, suficiente, que é a tese da consulta ao Mu-
de idêntica forma, relativamente àquela ou- nicípio-mãe.
48 R.T.J. — 158

O Sr. Ministro Moreira Alves: A de- atacados conflitam como que se contém no
claração seria incidente, e só seria feita, art. 16 da Lei Básica Federal.
mesmo em ação in abstrato, quando neces- A matéria seguinte, relativa à consulta
sária. às populações interessadas, cheguei a en-
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: frentá-la em determinado processo em que
No mérito, o terceiro, fundamento, que é se questionava a concessão, ou não, de
exclusivo da Lei n° 10.703, é que me parece cautelar. Creio que é a primeira vez que
decisivo. voto no julgamento de fundo de uma ação
direta de inconstitucionalidade. Devo evo-
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor luir, Senhor Presidente, porque convencido
Presidente, muito embora a matéria já este- do contrário do que assentara anterior-
ja suplantada, vejo que não me fiz entender. mente.
A dúvida que me assaltou diz respeito à
natureza, em si, dos atos atacados nesta O § 4° do artigo 18, dispõe:
ação direta de inconstitucionalidade. Se são «A criação, a incorporação, a fusão e
atos realmente normativos, a partir da cir- o desmembramento de Municípios pre-
cunstância de se ter a respaldar esses atos a servarão a continuidade e a unidade his-
própria lei complementar, no que autorizou tórico-cultural do ambiente urbano, far-
a criação dos municípios. Contudo, esta se-ão por lei estadual, obedecidos os
questão está superada, porque houve a pro- requisitos previstos em lei complemen-
clamação, e aderi ao voto do Ministro-Re- tar estadual, e dependerão — vem a
lator, tendo em vista até mesmo a jurispru- parte que está em questão — de consulta
dência da Corte. prévia, mediante plebiscito, — e aí te-
mos uma expressão com sentido pró-
Na hipótese, houve, no ano alusivo às prio, com alcance próprio — às popula-
eleições, a criação, por desmembramento, ções diretamente interessadas.»
de municípios. Indaga-se: essa criação não
repercute no processo eleitoral, que nor- Indaga-se: a população da área que, uma
malmente ocorreria caso permanecessent vez feito o desmembramento, será a área
os municípios com a área geográfica primi- remanescente, não é diretamente interessa-
tiva e com os próprios eleitores? Senhor da nesse desmembramento? A meu ver,
Presidente, confiro ao art. 16 da Constitui- sim. Não se tem como população interessa-
ção Federal, no que preceitua que «a lei que da apenas a da área a ser desmembrada,
alterar o processo eleitoral só entrará em devendo-se considerar, também, a popula-
vigor um ano após sua promulgação», um ção que remanescerá.
alcance maior. Tenho a lei referida no arti- Peço vênia, Senhor Presidente, para, no
go como qualquer diploma que, de alguma caso, concluir de forma diversa do voto do
forma, repercuta no processo eleitoral. E, nobre Ministro-Relator. A consulta há de
no caso, se ocorre o desmembramento de se fazer, consideradas as populações das
determinado município, a meu ver, aí, ten- áreas envolvidas e não apenas à população
do em vista esse sentido lato, a repercussão da área a ser desmembrada. Este é o senti-
é evidente. Considerados não só os eleito- do, no meu ponto de vista, do § 4° do artigo
res, em si, como também os candidatos e a 18 da Constituição Federal, e tenho presen-
performance desses candidatos frente aos te que o objetivo maior do preceito não é
mesmos eleitores, há uma repercussão. pulverizar os municípios, não é incentivar
Nesta parte, peço vênia ao nobre Ministro- a multiplicação de municípios, mas atender
Relator, para concluir que os dois diplomas à vontade soberana dos eleitores, das popu-
— 158 49

lações desses municípios. Não posso des- do eleitorado municipal, parecem-me


prezar parte dessas populações. relevantes. O advérbio «diretamente»,
Por isso, concluo, quanto à Lei n° posto no parág. 4° do art. 18 da Consti-
10.703/92, acompanhando S. Exa., o Mi- tuição, numa interpretação literal do re-
nistro Relator, pela procedência do pedido ferido texto, pode, na verdade, conduzir
formulado nesta ação direta de inconstitu- à interpretação preconizada no parág. 3°
cionalidade, declarando a inconstituciona- do art. 1° da Lei Compl. n° 651/90 do
lidade dos dois diplomas. Estado de São Paulo. A interpretação
literal, entretanto, não é interpretação,
VOTO mas «mero pressuposto de interpreta-
ção» como lembram os representantes.
O Sr Ministro Carlos Velloso: Sr. Pre-
Em linha de princípio, o interesse na
sidente, no que toca à Lei n° 10.703, a que incorporação, fusão ou desmembramen-
cria treze municípios, desatendendo-se de-
to de município é de todos os munícipes,
cisão do Tribunal Regional Eleitoral, estou
por isso que «há uma unidade, um todo,
inteiramente de acordo com o Sr. Ministro
em cuja preservação, manutenção e até
Relator. Dou pela inconstitucionalidade da
citada Lei n° 10.703, tal como faz o Sr. desenvolvimento há interesse de todos e
Ministro Relator. de cada cidadão», como acentuado na
representação, mesmo porque a Consti-
No que toca à Lei n° 10.704, o eminente tuição Federal estabelece que a criação,
Ministro Relator rejeitou a argüição de in- a incorporação, a fusão e o desmembra-
constitucionalidade. Peço licença para, mento «preservarão a continuidade e a
nesta parte, divergir. Aliás, S. Exa. mencio- unidade histórico-cultural do ambiente
nou voto que proferi na ADIn 478-SP, onde urbano». Ora, essa continuidade e essa
sustentei, em sede de cautelar, que as «po- unidade histórico-cultural não há de in-
pulações diretamente interessadas», que teressar apenas à população da área
participarão do plebiscito, são todos os mu- emancipada, mas a todos os que habitam
nícipes, ou o conjunto total do eleitorado o território do município. Assim parece
municipal. Disse eu, então, na ADIn 478- ser, em linha de princípio.»
SP, voto proferido em sede de cautelar e,
devo esclarecer, voto vencido, que o advér- Assim me parece ser, Sr. Presidente, e
bio «diretamente» posto no parág. 4° do isto justifica o tratamento diferenciado que
art. 18 da Constituição, numa interpretação a Constituição emprestou à criação de Es-
literal do referido texto, pode, data venia, tados e de Municípios.
na verdade, conduzir à interpretação preco-
nizada pelo Sr. Ministro Relator. No que toca à criação de Estados-Mem-
bros, o parág. 3°; do art. 18, da Constituição
Naquela oportunidade, examinávamos Federal, estabelece:
dispositivo da Lei Complementar 651/90,
do Estado de São Paulo, que exigia a con- «Os Estados podem incorporar-se
sulta, apenas, dos munícipes da região a ser entre si, subdividir-se ou desmembrar-
emancipada. Então, disse eu: se para se anexarem a outros, ou forma-
«Os fundamentos da inicial, que con- rem novos Estados ou Territórios Fede-
duzem ao entendimento no sentido de rais, mediante aprovação da população
que «populações diretamente interessa- diretamente interessada, através de ple-
das», que participarão do plebiscito, são biscito, e do Congresso Nacional, por lei
todos os munícipes, ou o conjunto total complementar.»
50 R.T.J. — 158

Registro: «da população diretamente in- ambiente urbano são pressupostos da ad-
teressada.» missibilidade da consulta prévia e, conse-
No que toca à criação de Municípios, a qüentemente, à validade mesma do plebis-
Constituição dispôs diferentemente, no pa- cito. Se a emancipação projetada afeta a
rág. 4° do mesmo artigo 18: continuidade geográfica ou mesmo a uni-
dade histórico-cultural, o Município-mãe
«Parág. 4° — A criação, a incorpo- pode se opor por todas as vias processuais
ração, a fusão e o desmembramento de adequadas à própria realização do plebisci-
Municípios preservarão a continuidade to ou, realizado este, à sua validade. Mas,
e a unidade histórico-cultural do am- uma vez demonstrada pela comunidade,
biente urbano, far-se-ão por lei estadual, que se quer emancipar, que reúne os pres-
obedecidos os requisitos previstos em supostos positivos estabelecidos na lei
lei complementar estadual, e depende- complementar e que não se lhe pode opor
rão de consulta prévia, mediante plebis- esses impeditivos da emancipação, então,
cito, às populações diretamente interes- «população diretamente interessada» já
sadas.»
não o será a do Município-mãe: aí, admis-
Verifica-se, portanto, que a Constitui- sível em tese, a criação do município, con-
ção deu tratamento diferenciado à criação tra, ou a favor dela, se manifestará aquela
de Estados e à criação de Municípios. É população que diretamente será atingida,
que, no tocante à criação de Municípios, a porque deixará de ser integrada a um deter-
Constituição deixa expresso que hão de ser minado município para vincular-se àquele
preservadas «a continuidade e a unidade a ser criado. Só assina, de resto, se explica
histórico-cultural do ambiente urbano». a existência do interesse direto, inovação
Daí a necessidade de ser consultada a po- da Constituição de 88.
pulação de todo o Município e não apenas O Sr. Ministro Carlos Venoso: O ar-
a população da área a ser desmembrada. gumento de V.Exa., Sr. Ministro Sepúlve-
Bem por isso a Constituição deixou expres- da Pertence, é respeitabilíssimo, é consis-
so, no parág. 4°, do art. 18, que a consulta, tente. O voto de V.Exa. contém uma densi-
mediante plebiscito, seria feita «às popula- dade de argumentos jurídicos impressio-
ções diretamente interessadas» e não, como nante, mas me permito perseverar no enten-
fez, referentemente à criação de Estados, à dimento; e vou acrescentar um outro argu-
«população diretamente interessada.» mento: sou homem do interior de Minas.
Quer dizer, no parág. 3°, população está no No meu Município natal, quando houve
singular, já no parág. 4°. lemos «popula- desmembramento, sentimos na carne o pro-
ções.» blema. Dou um argumento a mais: investi-
mentos são feitos nos distritos com o im-
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence posto arrecadado de todos os munícipes. É
(Relator): V. Exa me permite, apenas para natural, portanto, que esses munícipes se-
enfatizar o ponto em que já toquei no meu jam chamados a opinar no plebiscito.
voto, oue tive de improvisar pelas razões de
urgência que expliquei. Sr. Presidente, com essas brevíssimas
considerações, peço licença ao Sr. Ministro
O argumento de V.Exa. é inteligente. Relator para dar pela inconstitucionalida-
Parece-me, porém, que, no contexto do pa- de, também, da Lei n° 10.704. No que toca
rág. 4° do art. 18, essa preservação da con- à Lei n° 10.703, já deixei expresso que
tinuidade e da unidade histórico-cultural do acompanho S. Exa., o Sr. Ministro Relator.
R.T.J. — 158 51

VOTO Essa expressão constitucional tem sen-


tido restrito, pois limita-se, na dimensão
O Sr. Ministro Celso de Mello: A cria- subjetiva em que se projeta, ao conjunto
ção de Municípios no próprio ano das elei-
dos cidadãos domiciliados na área des-
ções não constitui alteração do processo
membranda ou no território emancipando.
eleitoral, a cuja noção conceitua] — não
obstante a latitude que lhe conferi no julga- Isso significa que o plebiscito deve ter,
mento da ADIn n° 354-2-DF — revela-se por sujeitos ativos, no processo de institu-
estranha a institucionalização desses entes cionalização dos novos entes municipais,
dotados de capacidade política que com- apenas aqueles eleitores que residam na
põem a estrutura jurídica do Estado Fe- área territorial cuja elevação ao status po-
deral. lítico-jurídico de Município é pretendida.
Não se impõe, em conseqüência, nesse con-
A mens subjacente à norma positivada texto, que se consulte toda a população do
no art. 16 da Constituição Federal, que Município a que pertence a área emanci-
consagrou o princípio da anterioridade da panda.
lei eleitoral, não se projeta e nem guarda
relação de pertinência com o processo de Daí a observação de Pontes de Miran-
criação das unidades federadas municipais. da, cujo magistério adverte que
«As populações locais que se têm de
A essência desse princípio — advertem manifestar quanto à criação do Municí-
Manoel Gonçalves Ferreira Filho («Co- pio são as populações que têm voto e
mentários à Constituição Brasileira de teriam de votar no território do futuro
1988», vol. 1/134, 1990, Saraiva), Pinto Município» (Comentários à Consti-
Ferreira («Comentários à Constituição tuição de 1967, com a Emenda n° 1, de
Brasileira», vol. 1/317, 1989, Saraiva), 1969», tomo 11/326-327, 2' ed., 1970,
José Cretella Jr. («Comentários à Consti- R1).
tuição Brasileira de 1988», vol. 11/1123,
1989, Forense) e Celso Ribeiro Bastos Essa tem sido, por igual — e como
(Comentários à Constituição do Brasil», ressaltado pelo eminente Relator — a
vol. 2/596-597, 1989, Saraiva) — reside, orientação firmada pelo Supremo Tribunal
fundamentalmente, no seu caráter mora- Federal na matéria (RTJ 60/27 — 69/13 —
lizador, que impede modificações abruptas 86/59 — 86/64 — 95/18).
ou casuísticas no processo eleitoral, assim A jurisprudência desta Corte acentua
entendida a sucessão ordenada e causal das que não se incluem, na consulta plebisci-
fases referentes à «apresentação das candi- tária, as populações da entidade municipal
daturas, organização e realização do escru- matricial (o denominado «Município-
tínio e contencioso eleitoral» (José Afonso mãe»), residentes fora da área territorial
da Silva, «Curso de Direito Constitucional emancipanda ou desmembrandr.
Positivo», págs. 326/328, 5° ed., 1989, Ri).
«Não se reserva qualquer espaço à
De outro lado, é de registrar que consti- legislação estadual para dispor sobre a
tui pressuposto essencial do processo de consulta plebiscitária. Nela não se in-
criação de Municípios — dentre os vários cluem as populações do Município-
outros requisitos estipulados pelo art. 18, mãe, residentes fora da respectiva área a
par. 4°, da Constituição Federal — a con- desmembrar-se. Também não se exige
sulta plebiscitária dirigida às populações consulta prévia à Câmara Municipal do
diretamente interessadas. município de origem, ou sua aprovação,
52 R.T.J. — 158

para criar, com área dele desmembra- Com estas considerações, e tendo pre-
da, o novo município.» (Rp n° 1.269-7- sentes os fundamentos do erudito voto pro-
RJ, Rel. Min Néri da Silveira, DJ de ferido pelo eminente Relator, acompanho
18-12-87). S. Exa., para declarar a inconstitucionalida-
de, tão-somente, da Lei n° 10.703/92 do
Outro aspecto de sumo relevo envolve o
Estado de Minas Gerais.
reconhecimento de que não compete à As-
sembléia Legislativa impor a sua vontade à É o meu voto.
Justiça Eleitoral na direção, supervisão e
proclamação dos resultados emergentes da VOTO
consulta plebiscitária. O Sr. Ministro Octavio Gallotti: Sr.
O plebiscito — enquanto instrumento Presidente, quando vigorava o art. 14 da
de participação popular no processo de ins- Constituição de 1967, que já mencionava
titucionalização dos Municípios — traduz no plural essa palavra «populações», sem
matéria intimamente vinculada à prática da que ali se contivessem o adjetivo e o advér-
cidadania e ao exercício dos direitos políti- bio, «diretamente interessadas» (art. 18, §
cos, que configuram categorias temáticas 4°, da Carta de 1988), já considerava, a
constitucionalmente reservadas à discipli- jurisprudência do Supremo Tribunal Fede-
na normativa da União, afetas, no âmbito ral, que só a população do distrito desmem-
dessa pessoa estatal, e no que concerne ao brado deveria ser convocada ao plebiscito.
processo de sua concretização, à competên- Com a nova Constituição, que acrescen-
cia exclusiva da Justiça Eleitoral. tou essa expressão «diretamente interessa-
das», parece-me, Sr. Presidente, que o acer-
Não cabe à Assembléia Legislativa, nes- to dessa jurisprudência ficou ainda mais
se contexto, superpor-se ou substituir-se à evidente, porque população diretamente in-
própria Justiça Eleitoral, para, com eviden- teressada só pode ser, penso eu, aquela do
te usurpação da competência constitucio- distrito, de cujo desmembramento se cogi-
nal desse órgão do Poder Judiciário da ta. Indiretamente interessada seria a do mu-
União, reconhecer, como satisfatórios, re- nicípio matriz.
sultados emergentes da consulta plebiscitá-
ria que, por não haverem alcançado o quo- Então, com essas considerações, em vir-
rum imposto pela lei, deixaram de ser ho- tude das quais já votei no mesmo sentido
mologados pela única instituição estatal do eminente Relator, quando juiz do Tribu-
investida dessa prerrogativa — a Justiça nal Superior Eleitoral, acompanho o voto
Eleitoral. de S. Exa.

Não se justificava, portanto, o compor- VOTO


tamento da Assembléia Legislativa que —
desvestida de qualquer competência insti- O Sr. Ministro Néri da Silveira: Sr.
tucional para esse efeito — desconsiderou, Presidente. Estou de inteiro acordo com o
ilegitimamente, o pronunciamento da Jus- voto do eminente Má. Sepúlveda Per-
tiça Eleitoral que entendeu não satisfeita, tence.
no que concerne aos Municípios criados No que concerne à competência do
pela Lei n° 10.703, de 27-4-92, do Estado TRE, a matéria já foi enfrentada por esta
de Minas Gerais, a exigência de ordem Corte, não faz muito, quando, em sede de
jurídico-legal essencial à válida exteriori- cautelar, se afirmou que, no regime da
zação da vontade popular. Constituição de 1988, o Tribunal Regional
R.T.J. — 158 53

Eleitoral continuava com competência para se vem repetindo no Rio Grande do Sul: a
presidir ao plebiscito destinado à criação de disputa, pela emancipação de Ana Rech, com
município e, também, para decidir a respei- Caxias do Sul. Em Ana Rech, ocorreu a mani-
to dos resultados do plebiscito. Recordo festação de quase 90% da população, em ple-
que se tratava de ação direta de inconstitu- biscito, no sentido da emancipação desse dis-
cionalidade de lei do Estado do Rio de trito importante, que possui todas as condições
Janeiro, em que se criava forma de controle para constituir um município, sem dúvida
do plebiscito, por via diversa da prevista na alguma. Por último, tem sido invocado esse
Lei Complementar n° 1. Assim sendo, aspecto novo, qual seja, resultaria com o
acompanho o Senhor Ministro Relator na município de Ana Rech uma descontinui-
declaração de inconstitucionalidade da Lei dade no ambiente urbano, inclusive porque
10.703, que cria 13 municípios e desatende o próprio transporte urbano de Caxias do
à decisão do Tribunal Regional Eleitoral. Sul deveria cortar área territorial do novo
Por igual, acompanho o ilustre Ministro município, em ordem a atingir outros distri-
Relator na parte em que S. Exa. afirma que tos que continuariam integrados a Caxias do
a consulta plebiscitaria há de se fazer ape- Sul. De outra parte, aquele núcleo urbano
nas às populações das áreas que, em princí- estaria intimamente ligado à história e à
pio, deverão compor o novo município. Essas cultura da região que compõe o município
são as populações interessadas no desmem- de Caxias do Sul.
bramento e não a população de todo o muni- Portanto, cuida-se, aí, de questão distin-
cípio. Imagine-se situação em que se preten- ta, que nada tem a ver com o plebiscito e
da —como já ocorreu, não faz muito, no Rio pode ser considerada, autonomamente, em
de Janeiro e também em Porto Alegre, — relação à consulta plebiscitaria. Cabe, mes-
desmembramento de área urbana para com- mo depois de se realizar o plebiscito, com
por um novo município e toda a população resultado favorável, à Assembléia Legisla-
da capital haja de se pronunciar. O que se faz tiva decidir, definitivamente, se cria, ou
mister é que a área desmembranda seja per- não, o município. Se deliberar, positivamen-
feitamente delimitada; isso é imprescindível. te, promulga a lei de criação do Município.
Então, a população que se compreende nessa Certo está que essa lei pode ser impugnada
área, que está para se desmembrar, é a popu- em ação direta de inconstitucionalidade, exa-
lação interessada no desmembramento. tamente porque o novo município não aten-
O requisito novo — que não constava da deu a esse pressuposto constitucional da
legislação anterior —, quanto a ser resguar- preservação da continuidade e da unidade
dada a identidade, ut art. 18, § 4°, da CF, histórico-cultural do ambiente urbano.
com a preservação da «continuidade e da Dessa maneira, também, recordando
unidade histórico-cultural do ambiente ur- precedentes da Corte, na Representação n°
bano», é, sem dúvida, com a devida vênia, 1.269 e na ADIn 478, acompanho o voto do
requisito de ordem objetiva, pressuposto eminente Ministro Relator.
objetivo que deve ser considerado pela As-
sembléia Legislativa, no momento em que VOTO
delibera sobre a autorização, ou não, para o O Sr. Ministro Moreira Alves: Sr. Pre-
plebiscito com vistas à criação do municí- sidente, com a devida vênia dos que enten-
pio. Ela pode, preliminarmente, entender dem em contrário, acompanho o eminente
que não está satisfeito esse requisito para Relator, também dando pela procedência
os efeitos do desmembramento da área. parcial da ação direta de inconstitucionali-
Isto, aliás, tem sido invocado num caso que dade.
54 R.T.J. — 158

VOTO o Presidente. No mérito, por maioria de


O Sr. Ministro Sydney Sanches (Pre- votos, o Tribunal julgou procedente, em
sidente): Também eu, com a devida vênia parte, a ação, para declarar apenas a incons-
dos Ministros Marco Aurélio e Carlos Vel- titucionalidade da Lei Estadual n° 10.703,
loso, julgo procedente, em parte, a ação, vencidos, parcialmente, os Ministros Mar-
para declarar a inconstitucionalidade da Lei co Aurélio e Carlos Velloso, que a julga-
n° 10.703, nos termos dos votos que profe- vam procedente «in totum», isto é, para
riram os Ministros Sepúlveda Pertence e os declarar a inconstitucionalidade, também,
que o seguiram. da Lei Estadual n° 10.704. Votou o Presi-
dente. Dispensada a publicação da pauta
em face da urgência, com a anuência do
EXTRATO DA ATA
requerente e do Procurador-Geral da Repú-
blica.
ADIn 733 — MG — Rel.: Min.: Sepúl-
veda Pertence. Reqte.: Procurador-Geral da Presidência do Senhor Ministro Sydney
República. ReAdos.: Governador do Estado Sanches. Presentes à Sessão os Senhores
de Minas Gerais e Assembléia Legislativa Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
do Estado de Minas Gerais (Advs.: Luís Octavio Gallotti, Paulo Brossard, Sepúlve-
Antônio Prazeres Lopes, João Nogueira de da Pertence, Celso de Mello, Carlos Vello-
Rezende e Francisco Deiró Couto Borges). so, Marco Aurélio, limar Gaivão e Francis-
co Rezek. Procurador-Geral da República,
Decisão: Por votação unânime, o Tribu-
Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
nal rejeitou as preliminares de inépcia da
inicial, de impossibilidade jurídica do pe- Brasilia, 17 de junho de 1992 — Luiz
dido e de falta de interesse de agir. Votou Tomimatsu, Secretário.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 996 — DF


(Medida Cautelar)
(Tribunal Pleno)

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello


Requerente: Governador do Estado de São Paulo — Requerido: Presidente
da República
AD1n. Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC).
Decreto Federal n° 861/93. Conflito de legalidade. limites do poder regu-
lamentar. Ação direta não conhecida
— Se a interpretação administrativa da lei, que vier a con-
substanciar-se em decreto executivo, divergir do sentido e do conteúdo
da norma legal que o ato secundário pretendeu regulamentar, quer
porque tenha este se projetado ultra legem, quer porque tenha permane-
cido cifra legem, quer, ainda, porque tenha investido contra legem, a
questão caracterizará, sempre, típica crise de legalidade, e não de incons-
R.T.J. — 158 55

titucionalidade, a inviabilizar, em conseqüência, a utilização do mecanis-


mo processual da fiscalização normativa abstrata.
— O eventual extravasamento, pelo ato regulamentar, dos
limites a que materialmente deve estar adstrito poderá configurar insu-
bordinação executiva aos comandos da lei. Mesmo que,a partir desse vício
jurídico, se possa vislumbrar, num desdobramento ulterior, uma poten-
cial violação da Carta Magna, ainda assim estar-se-si em face de uma
situação de inconstitucionalidade reflexa ou oblíqua, cuja apreciação não
se revela possível em sede jurisdicional concentrada.

ACÓRDÃO «Referido Decreto, todavia é repleto


de inconstitucionalidade sob dúplice
Vistos, relatados e discutidos estes au- aspecto.
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- Em um primeiro enfoque porque,
formidade da ata do julgamento e das notas com a implantação do mencionado
taquigráficas, por unanimidade de votos, SNDC, os artigos do regulamento em
em não conhecer da ação, ficando, em con- análise, que serão indicados oportuna-
seqüência, prejudicado o requerimento de mente, não respeitaram a competência
medida cautelar. legislativa predeterminada na Constitui-
ção da República (art. 24, V e VIII), pela
Brasília, 11 de março de 1994 — Octa- qual os Estados e o Distrito Federal po-
vio Gallotti, Presidente Celso de Mello, dem legislar e, portanto, regulamentar,
Relator. sobre (i) 'produção e consumo' e (ii)
RELATÓRIO 'responsabilidade por danos ao meio
O Sr. Ministro Celso de Mello: O Go- ambiente, ao consumidor, a bens e di-
vernador do Estado de São Paulo ajuíza reitos de valor artístico, estético, histó-
ação direta de inconstitucional idade im- rico, turístico e paisagístico'.
pugnando preceitos inscritos no Decreto Sob segundo prisma de análise, tal
Federal n° 861, de 9 de julho de 1993, que decreto-regulamentar pode, também,
«dispõe sobre a organização do Sistema ser taxado de inconstitucional por ino-
Nacional de Defesa do Consumidor-SNDC var a ordem jurídica originariamente, ao
e estabelece as normas gerais de aplicação arrepio do art. 84, IV, da Carta Magna
das sanções administrativas, e dá outras e, via de conseqüência, macular seus
providências». arts. 5°, II, e art. 37, caput. Esse vício é
Tendo sido requerida a suspensão cau- de percepção imediata ao ser constatada
telar da eficácia dos dispositivos impugna- a criação de 'tipos administrativos' en-
dos, submeto o pedido de medida liminar sejadores da aplicação de sanções admi-
ao Plenário do Supremo Tribunal Federal. nistrativas, sem que o Código do Con-
sumidor — norma regulamentada —
É o relatório. identifique, como tais, quais os compor-
VOTO tamentos passíveis de sancionamento.»
O Sr. Ministro Celso de Mello (Rela- (fl. 3)
tor): O Governador do Estado de São Pau- O Autor, ao deduzir os fundamentos de
lo, ao impugnar o Decreto n° 861/93, argu- sua pretensão, salienta, inicialmente —
menta que, verbis: «em um primeiro enfoque» —, que, na
56 R.T.J. — 158

implantação do Sistema Nacional de Defe- ordem a impregnar de invalidade constitu-


sa do Consumidor, o ato regulamentar em cional a produção normativa consubstan-
questão desrespeitou as regras da Consti- ciada nos diplomas legais que foram mera-
tuição Federal pertinentes à competência mente regulamentados pelo ato ora impug-
legislativa concorrente em matéria de con- nado.
sumo e de definição da responsabilidade Vê-se, daí, que, uma vez desrespeita-
por danos ao consumidor. dos os limites jurídicos impostos à União
Sustenta-se que o sistema constitucional Federal em tema de competência concor-
de condomínio legislativo, ao permitir ao rente pela Constituição da República, o
Estado-membro o exercício autônomo de vício de inconstitucionalidade afetaria a
sua atividade normativa sobre os temas ob- própria lei (Pontes de Miranda, <Comen-
jeto da repartição comum de competências, tários à Constituição de 1967, com a Emen-
também outorgou a essa unidade federada da n° 1, de 1969», tomo II/169-170, r ed.,
o decorrente poder de regulamentar, na es- 1970, RT).
fera de suas atribuições administrativas, O Autor, contudo, não impugna a lei
aquilo que foi expressamente incluído no nacional, limitando-se, em sua argüição, a
âmbito da competência legislativa esta- meramente questionar a constitucionalida-
dual. de do decreto presidencial que a regula-
Registre-se, desde logo, que o decreto mentou.
em questão, além de validamente regula- Nesse contexto, toma-se evidente o dm-
mentar legislação nacional veiculadora de
cabimento da ação direta quando a preten-
normas gerais sobre as matérias em ques- dida inconstitucionalidade do ato regula-
tão, não impede que o Estado-membro, mentar, que é meramente ancilar e secun-
fundado no título jurídico de sua autonomia dário, representa uma derivação e um efei-
constitucional, edite prescrições regula-
to conseqüencial de eventual ilegitimidade
mentares, limitadas, estas sim, ao âmbito constitucional da própria lei em sua condi-
da legislação de integração, de aplicação ou ção jurídica de ato normativo primário e
de execução que se insere — tendo presente principal.
o sistema de competência legislativa con-
corrente— na esfera de atribuições norffia- Impunha-se ao Autor, portanto, impug-
tivas dessa unidade da Federação. nar, se fosse o caso, a própria lei objeto da
questionada regulamentação, pois, no ato
As premissas em que se funda a preten-
legislativo, residiria, originariamente, o
são de inconstitucionalidade ora deduzida
vício da inconstitucionalidade.
pelo Autor conduzem, necessariamente, à
análise prévia da superação, ou não, pela Ressalta claro do pedido, portanto, que
legislação nacional editada pela União Fe- a alegada incompatibilidade vertical das
deral, dos limites predeterminados na Carta normas regulamentares ora impugnadas
da República para o exercício da competên- em face da Constituição Federal supõe,
cia concorrente em tema de normas gerais. para efeito de sua constatação, o prévio
contraste com o próprio Código de Defesa
Sendo assim, a inobservância desses li-
do Consumidor (Lei n° 8.078/90) e com a
mites — que reduzem a atuação normativa
Lei n° 8.656/93.
da União, restringindo-a apenas à veicula-
ção de diretrizes ou de normas gerais —, A questão jurídica posta nestes autos
acaso configurada, seria diretamente impu- situa-se, pois, no simples plano da legali-
tável ao próprio legislador nacional, em dade, o que retira das normas questionadas
R.T.J. — 158 57

a qualidade de objeto idôneo para o contro- belecidos na lei a que as espécies regula-
le normativo abstrato perante o Supremo mentares se referem, verbis:
Tribunal Federal. «A jurisprudência do Supremo Tri-
A ação direta de inconstitucionalidade bunal Federal tem-se orientado no sen-
não se revela instrumento hábil ao controle tido de repelir a possibilidade de con-
da validade de atos normativos de caráter trole jurisdicional de constitucionalida-
infralegal, quando cotejados estes em face de, por via de ação, nas situações em que
da lei sob cuja égide foram editados, ainda a impugnação in abstracto incide sobre
que, num desdobramento ulterior, se esta- atos que, inobstante veiculadores de
beleça, mediante prévia aferição da inob- conteúdo normativo, ostentam caráter
servância dessa mesma lei, o confronto meramente ancilar ou secundário, em
conseqüente com a Constituição Federal. função das leis (...) a que aderem e cujo
texto pretendem regulamentar. Em tais
O desrespeito à lei não pode funda- casos, o eventual extravasamento dos
mentar, pois, um juízo de inconstitucio- limites impostos pela lei (...) caracteri-
nalidade. A inconstitucionalidade que au- zará situação de mera ilegalidade, ina-
toriza o exercício do controle concentrado preciável em sede de controle concen-
é apenas aquela decorrente da incompatibi- trado de constitucionalidade.
lidade frontal e direta com o Texto Maior.
Assim é que esta Corte, já no ordenamento Crises de legalidade, que irrompem
constitucional anterior, proclamava, ver- no âmbito do sistema de direito positivo,
bis: caracterizadas por inobservância, pela
autoridade administrativa, do seu dever
«Representação de inconstitucio- jurídico de subordinação normativa à
nalidade. Conflito entre o Regulamento lei, revelam-se, por sua natureza mes-
e a Lei. Descabimento. ma, insuscetíveis do controle jurisdicio-
(...) conflito entre disposições do de- nal concentrado, cuja finalidade exclu-
creto com essas leis não se alça ao nível siva restringe-o, tão-somente, à aferição
da violação a normas da Constituição, de situações configuradoras de incons-
configurando apenas ilegalidade, a ser titucionalidade. » (ADIn 365-DF-
examinada nos casos concretos e não na AgRg, Rel. Min. Celso de Mello)
via da ação direta de declaração de in- No mesmo sentido, cf., ainda as deci-
constitucionalidade de leis. sões proferidas por este Supremo Tribunal
Representação não conhecida.» Federal na ADIn 311, Rel. Min. Carlos
Velloso; na ADIn 531-AgRg, Rel. Min.
Celso de Mello; e na ADIn 536, Rel. Min.
(RF' 1.266-DF, Rel. Min. Carlos Velloso, v.g.
Carlos Madeira)
Se a interpretação administrativa da lei,
Sob a égide da vigente Constituição de que vier a consubstanciar-se em decreto
1988, esta Corte — reiterando a sua executivo, divergir do sentido e do conteú-
orientação jurisprudencial — tem recu- do da norma legal que o ato secundário
sado a instauração do controle normativo pretendeu regulamentar, quer porque tenha
abstrato de atos de índole infralegal cujo este se projetado ultra legem, quer porque
alegado vício de inconstitucionalidade re- tenha permanecido citra legem, quer, ain-
clame a prévia e necessária verificação do da, porque tenha investido contra legem, a
extravasamento dos limites jurídicos esta- questão caracterizará, sempre, típica crise
58 R.T.J. — 158

de legalidade, e não de inconstitucionalida- No caso, o ato regulamentar limitou-se,


de, a inviabilizar, em conseqüência, a utili- dentro do círculo de atuação fixado pela
zação do mecanismo processual da fiscali- lei, a especificar descrições normativas
zação normativa abstrata. abstratamente veiculadas no próprio Códi-
O eventual abuso no exercício do poder go de Defesa do Consumidor (Lei n°
regulamentar não tem a virtude de conferir 8.078/90, arts. 9°; 10; 12, § 1°; 13; 14, § 1°;
ao decreto questionado a natureza de ato 18; 30; 31; 35; 37; 39; 40; 41; 51; 52; etc.).
autônomo, de modo a autorizar o seu con- Não se pode desconhecer, de outro lado,
fronto direto com o texto da Constituição. que o Código de Defesa do Consumidor e
O conflito de prescrições consubstan- a Lei n° 8.656/93, que o alterou, estabele-
ciadas em mero decreto com o teor de uma ceram as diretrizes gerais concernentes à
norma legal não se alça, por si só, ao nível instituição de um Sistema Nacional de De-
da vulneração direta do texto constitucio- fesa do Consumidor, disciplinando, inclu-
nal. Essa antinomia, acaso configurada, tra- sive, mediante expressa garantia da ampli-
duzirá, em face da relação de imediatidade tude de defesa, a ordem ritual do procedi-
que o ato administrativo deve manter com mento administrativo destinado a apurar,
a lei que lhe constitui o pressuposto de no campo de tutela ao consumidor, infra-
validade e de eficácia, situação tipificadora ções às normas relativas à produção, indus-
de comportamento ilegal do Poder Público, trialização, distribuição e consumo de pro-
insuscetível de exame em sede de jurisdi- dutos e serviços.
ção constitucional concentrada.
A disciplina desse procedimento admi-
A análise do decreto regulamentar ora nistrativo, cuja instituição inquestionavel-
impugnado poderá, até, evidenciar possí- mente deriva de previsão legal (Lei n°
veis desvios de legalidade, se confrontado 8.078/90, art. 55; Lei n° 8.656/93, art. 2°),
com o sistema normativo instaurado pela deve ser entendida e interpretada na pers-
Lei n° 8.078/90 e pela Lei n° 8.656/93. pectiva do caráter nacional do sistema de
Mesmo a questionada criação de «tipos tutela dos direitos e interesses dos consu-
administrativos», ensejadores da aplicação midores, tal como este foi delineado e con-
de sanções administrativas, deve ser consi- cebido pela própria legislação emanada da
derada em face das Leis IN 8.078/90 e União com fundamento no art. 24, I (nor-
8.656/93, que, ao delimitarem o âmbito da mas sobre direito econômico), V (discipli-
proteção jurídica dispensada ao consumi- na jurídica do consumo) e VIII (regras
dor, definiram os comportamentos empre- tutelares concernentes ao consumidor), da
sariais que, concretizando práticas abusi- Constituição.
vas ou procedimentos enganosos, justifi-
Eventual conflito hierárquico-normati-
cam a imposição das punições previamente
vo com a Constituição, se houver, resulta-
relacionadas no art. 56 do Código de Defe-
rá, pois, de vícios a serem identificados no
sa do Consumidor.
próprio ato legislativo. Só por repercus-
Assim, eventual atuação ultra vires do são — vale dizer, por via indireta, reflexa
Chefe do Executivo no exercício de seu ou oblíqua — é que se poderá vislumbrar,
poder regulamentar traduzirá — tendo pre- no regulamento em questão, possível eiva
sentes as limitações jurídicas postas pelo de inconstitucionalidade. Esta, contudo,
diploma legal — conduta administrativa acaso configurada, certamente não resulta-
eivada de mera ilegalidade. rá, originariamente, do próprio ato regula-
R.T.J.— 158 59

mentar, mas, sim, se for o caso, da lei em ou técnica porventura nela existentes,
si mesma considerada. sendo plenamente legítimas as regras
Tenho para mim que o Presidente da destinadas à consecução dos objetivos
República, ao editar o regulamento em visados pelo legislador. Essa é uma exi-
questão, pretendeu conferir maior efetivi- gência conatural à atividade administra-
dade aos mandamentos inscritos nas Leis tiva, e correspondente à dinâmica do
nos 8.078/90 e 8.656/93, disciplinando, me- Direito.»
diante regramento específico, fundado nas O eventual extravasamento, pelo ato re-
normas gerais consubstanciadas nos diplo- gulamentar, dos limites a que materialmen-
mas legislativos referidos, o sistema de de- te deve estar adstrito poderá configurar in-
fesa e proteção dos direitos do consumidor. subordinação executiva aos comandos da
É preciso ter presente, neste ponto, que, lei. Mesmo que, a partir desse vício jurídi-
não obstante a função regulamentar esteja co, se possa vislumbrar, num desdobra-
sujeita aos condicionamentos normativos mento ulterior, uma potencial violação da
impostos imediatamente pela lei, o Poder Carta Magna, ainda assim estar-se-á em
Executivo, ao desempenhar concretamente face de uma situação de inconstitucionali-
a sua competência regulamentar, não se dade reflexa ou oblíqua, cuja apreciação
reduz à condição de mero órgão de repro- não se revela possível em sede jurisdicional
dução do conteúdo material do ato legisla- concentrada.
tivo a que se vincula. Sendo assim, não há como admitir a
Há que se reconhecer ao Executivo, des- instauração da jurisdição constitucional
se modo, um círculo de livre regramento da concentrada quando o objeto da impugna-
matéria, não obstante sujeite-se o exercício ção in abstracto não constituir, como na
da competência regulamentar atribuída ao hipótese destes autos, ato normativo reves-
Chefe desse Poder às imposições subordi- tido da qualificação exigida, para o controle
nantes da lei. concentrado de constitucionalidade, pela ju-
risprudência do Supremo Tribunal Federal
Daí, a advertência do saudoso Ministro (RTJ 138/436, Rel. Min. Celso de Mello).
Carlos Medeiros Silva, no sentido de que,
verbis: Tendo presentes as razões expostas, não
conheço desta ação direta, restando preju-
«A função do Regulamento não é dicada, em conseqüência, a apreciação da
reproduzir, copiando-os literalmente, os medida liminar.
termos da lei. Seria um ato inútil, se
É o meu voto.
assim fosse entendido. Deve, ao contrá-
rio, evidenciar e tornar explícito tudo EXTRATO DA ATA
aquilo que a lei encerra. Assim, se uma
faculdade, ou atribuição, está implícita ADIn 996 (Medida Cautelar) — DF —
no texto legal, o regulamento não exor- Rel.: Min. Celso de Mello. Reqte.: Gover-
bitará se lhe der forma articulada e ex- nador do Estado de São Paulo. Reqdo.:
plícita.» (RDA 33/457) Presidente da República.
Igual orientação perfilha o eminente Decisão: Apresentado o feito em mesa,
professor Miguel Reale, para quem: o julgamento foi adiado em virtude do
«Os regulamentos têm por fim tornar adiantado da hora. Plenário, 3-3-94.
possível a execução ou aplicação da lei, Decisão: Por votação unânime, o Tribu-
preenchendo lacunas de ordem prática nal não conheceu da ação, ficando, em con-
60 R.T.J. — 158

seqüência, prejudicado o requerimento de Francisco Rezek. Ausentes, justificada-


medida cautelar. Votou o Presidente. mente, os Senhores Ministros Sepúlveda
Pertence e Carlos Velloso. Procurador-Ge-
Presidência do Senhor Ministro Octavio ral da República, Dr. Aristides Junqueira
Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores Alvarenga.
Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
Sydney Sanches, Paulo Brossard, Celso de Brasília, 11 de março de 1994 — Luiz
Mello, Marco Aurélio, limar Gaivão e Tomimatsu, Secretário.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 1.030 — SC


(Medida Cautelar)
(Tribunal Pleno)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Requerente: Procurador-Geral da República — Requeridos: Governador do
Estado de Santa Catarina e Assembléia Legislativa do Estado de Santa Catarina
Constitucional. Servidor público. Concurso público. Ingresso.
Normas infraconstitucionais que estabelecem forma de
investidura em carreira diversa daquela para a qual o servidor público
ingressou por concurso: inconstitucionalidade.
Suspensão da eficácia de normas da Lei Complementar n°
81, de 10-3-93, do Estado de Santa Catarina.

ACÓRDÃO Brasília, 25 de fevereiro de 1994 —


Octavio Gallotti, Presidente — Carlos
Vistos, relatados e discutidos estes au- Velloso, Relator.
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
RELATÓRIO
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con-
formidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, deferir O Sr. Ministro Carlos Venoso: O Pro-
o pedido de medida cautelar, para suspen- curador-Geral da República, fundado no
der, até a decisão final da ação, os efeitos art. 103, VI, da Constituição Federal, pro-
das expressões «Escrivão de Exatoria» e põe ação direta de inconstitucionalidade
«Fiscal de Mercadorias em Trânsito», res- das expressões Escrivão de Exatoria e
pectivos níveis e referências, constantes do Fiscal de Mercadorias em Trânsito, res-
Grupo Operacional «Ocupações de Fisca- pectivos níveis e referências, constantes do
lização e Arrecadação — OFA» do Anexo Grupo Operacional Ocupações de Fiscali-
I; dos itens 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 do Anexo II zação e Arrecadação — OFA do Anexo
— 55; 5 e 6 do Anexo II — 56», todos da I; dos itens 1, 2, 3, 4, 5, 6, e 7 do Anexo II
Lei Complementar n° 081, de 10-3-93, do — 55; 5 e 6 do Anexo II — 56; todos da
Estado de Santa Catarina. Ausente ocasio- Lei Complementar n° 81, de 10-3-93, do
nalmente, o Ministro Sydney Sanches. Estado de Santa Catarina, que estabelece
R.T.J. — 158 61

diretrizes para elaboração, implantação e ção tributária, mediante lançamento de


administração do Plano de Cargos e Venci- oficio por notificação fiscal, no desem-
mentos do Pessoal Civil da Administração penho das atribuições arroladas;
direta, autarquias e fundações do Poder
Executivo. Anexo-II-56
São as seguintes as normas impugnadas: Denominação do Cargo: Fiscal de Mer-
cadorias em Trânsito.
«Anexo I
(••.)
Grupo Operacional — Ocupações de Fiscalizar o lançamento e recolhi-
Fiscalização e Arrecadação mento dos seguintes tributos estaduais:
Cargo — Escrivão de Exatoria 1 Ní- IPVA, ITCMD, contribuições de me-
vel 12 13 Referência AI lhoria e taxas;
Fiscal de Mercadorias em Trân- Executar, exclusivamente em re-
sito I Nível 13 14 Referência AJ lação às microernpresas, as atribuições
discriminadas nos itens 1 a 25, da fun-
Anexo 11-55 ção de Fiscal de Tributos Estaduais.»
(fls. 2/4)
Denominação do Cargo: Escri-
vão de Exatoria O autor, atendendo à solicitação do
SINDIFISCO — Sindicato dos Fiscais da
Fiscalizar o lançamento e recebi- Fazenda do Estado de Santa Catarina, alega
mento de ICMS e o cumprimento de que os referidos dispositivos contrariam os
obrigações tributárias, principal e ne- arts. 37, I e II, da Carta Magna, argumen-
cessárias, em relação a mercadorias em tando, ainda, que a Lei Complementar n°
trânsito, que estejam sendo ou que te- 81, ora impugnada:
nham acabado de ser transportadas, en-
quanto não descarregadas do veículo a) Derrogou duas leis estaduais, ambas
transportador; datadas de 18-4-91:
Emitir termos para verificação Lei n° 8.246, que alterou a classifi-
fiscal; cação e escolaridade dos Fiscais de Merca-
dorias em Trânsito e enquadrou, nessa mes-
Realizar plantão em postos fis- ma categoria, os antigos Inspetores-Auxi-
cais, conforme escala preestabelecida; liares de Fiscalização de Mercadorias em
Realizar plantão volante ou em Trânsito, sem concurso; e a
postos fixos, conforme escala pré-esta- Lei n" 8.248, que atribuiu novas fun-
belecida; ções às categorias funcionais do Grupo Fis-
Fiscalizar o lançamento e recolhi- calização e Arrecadação;
mento de Imposto sobre a Propriedade b) classificou Escrivães de Exatoria e
de Veículos Automotores — IPVA; Fiscais de Mercadorias em trânsito em ní-
Apreender mercadorias, nas hipó- veis e referências salariais referentes a car-
teses da legislação tributária, no desem- reiras de nível superior;
penho das atribuições arroladas; c) atribuiu aos Fiscais de Mercadorias
7. Efetuar a Constituição de crédito em Trânsito funções privativas dos Fiscais
tributário, bem como a imposição de de Tributos Estaduais, e aos Escrivães de
multa por descumprimento de obriga- Exatoria, funções privativas dos Fiscais de
62 R.T.J. — 158

Mercadorias em Trânsito, muito embora o calização dos tributos estaduais, bem como
ingresso em cada uma delas tenha sido prejuízos de incerta reparação ao erário
efetivado através de concursos distintos; público, o autor requer a sua suspensão
está em desacordo com o Manual de liminar.
Especificação e Descrição de Cargos, apro- É o relatório.
vado pelo Decreto n° 27.950/85, o qual
dispõe que o «Fiscal de Tributos Estaduais VOTO
desempenha atividade de nível superior,
de natureza técnico-contábil, envolvendo O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela-
serviços de fiscalização dos tributos esta- tor): Segundo sustenta o Procurador-Geral
duais. Já os Fiscais de Mercadorias em da República, as normas impugnadas, além
Trânsito exercem atividade de nível médio, de classificar Escrivães de Exatoria e Fis-
de natureza operacional, abrangendo servi- cais de Mercadorias em Trânsito em níveis
ços específicos de fiscalização e controle e referências salariais referentes a carreiras
de mercadorias em trânsito. E, finalmen- de nível superior, atribuem aos Fiscais de
te, o Escrivão de Exatoria desempenha Mercadorias em Trânsito funções privati-
também atividade de nível médio, de natu- vas dos Fiscais de Tributos Estaduais, e aos
reza operacional, compreendendo serviços Escrivães de Exatoria, funções privativas
específicos de escrituração da receita e des- dos Fiscais de Mercadorias em Trânsito.
pesa da arrecadação tributária do Estado»; Todavia, o ingresso em cada uma daquelas
promove unificação de carreiras que, carreiras efetivou-se mediante concursos
embora se reconheça que a tendência legis- distintos, que exigiram conhecimentos es-
lativa atual seja nesse sentido, na prática, pecíficos e níveis de escolaridade diversos:
porém, as funções de fiscalização de tribu- o Fiscal de Tributos Estaduais desempenha
tos, fiscalização e controle de mercadorias atividade de nível superior, enquanto os
em trânsito e escrituração não podem ser Fiscais de Mercadorias em Trânsito exer-
agrupadas em uma só carreira, por exigi- cem atividade de nível médio. Finalmente,
rem escolaridade e qualificação técnica o Escrivão de Exatoria desempenha tam-
bém atividade de nível médio. Assim, os
diversas;
dispositivos impugnados, agrupando,
fere o art. 37, II, da Constituição Fe- numa só carreira, as carreiras mencionadas,
deral, que subordina a investidura em cargo violaram o art. 37, II, da Constituição, que
público, à aprovação em concurso público, subordina a investidura em cargo público à
vedada a transposição de cargos que, na aprovação em concurso público. No caso,
opinião de Celso Antônio Bandeira de Mel- estaria havendo investidura mediante
lo, «corresponde a uma burla manifesta do transformação de carreiras de nível médio
concurso público»; em carreiras de nível superior, com altera-
contraria a jurisprudência da Supre- ção das atribuições.
ma Corte que, na ADIn n° 231-RJ, Relator Posta assim a questão, forçoso é reco-
o eminente Ministro Moreira Alves, firmou nhecer a relevância do fundamento da ini-
o entendimento de que não é mais possível cial, a indicar a conveniência da suspensão
o provimento de cargos públicos por meio dos dispositivos impugnados, tendo em
de ascensão, transferência ou aproveita- vista o decidido por esta Corte na ADIn
mento. 231-RJ, Relator o Sr. Ministro Moreira Al-
Considerando que as normas atacadas ves. É que as normas impugnadas, a meu
estão criando transtornos ao sistema de fis- ver, pelo menos ao primeiro exame, estabe-
R.T.J. — 158 63

lecem forma de admissão em carreira di- ções de Fiscalização e Arrecadação —


versa daquela para a qual o servidor público OEA» do Anexo I; dos itens 1, 2, 3, 4, 5, 6
ingressou por concurso. e 7 do Mexo II — 55; 5 e 6 do Anexo II —
Impõe-se, portanto, a suspensão da efi- 56», todos da Lei Complementar n° 81, de
cácia dos dispositivos legais impugnados. 10-3-93, do Estado de Santa Catarina. Vo-
tou o Presidente. Ausente, ocasionalmente, o
Do exposto, defiro a media cautelar e Ministro Sydney Sanches. Procurador-Geral
suspendo a eficácia dos dispositivos legais da República, Dr. Antonio Fernando Barros
impugnados. e Silva de Souza, na ausência ocasional do
EXTRATO DA ATA Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.

ADIn 1.030 (Medida Cautelar) — SC — Presidência do Senhor Ministro Octavio


Rel.: Min. Carlos Velos°. Reqte.: Procurador- Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
Geral da República. Reqdos.: Governador Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
do Estado de Santa Catarina e Assembléia Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlve-
Legislativa do Estado de Santa Catarina. da Pertence, Carlos Velloso, Marco Auré-
lio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Au-
Decisão: Por votação unânime, o Tribu- sente, justificadamente, o Senhor Minis-
nal deferiu o pedido de medida cautelar, tro Celso de Mello. Procurador-Geral da
para suspender, até a decisão final da ação,
República, Dr. Aristides Junqueira Alva-
os efeitos das expressões «Escrivão de
renga.
Exatoria» e «Fiscal de Mercadorias em
Trânsito», respectivos níveis e referências, Brasília, 25 de fevereiro de 1994 —
constantes do Grupo Operacional «Ocupa- Luiz Tomimatsu, Secretário.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 1.047 — AL


(Medida Cautelar)
(Tribunal Pleno)

Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence


Requerente: Procurador-Geral da República — Requerida: Assembléia Le-
gislativa do Estado de Alagoas
Notariado e registros públicos: razoabilidade da alegação da
reserva à competência legislativa da União para dispor a respeito (CF,
arts. 22, XXV, e 236, § 1°); privatização de serventias anteriormente
oficializadas: difícil conciliação com o art. 32 ADCT (ADIn 126, Gallotti,
Lex 169/48); caráter público dos serviços notariais e de registro, persis-
tente sob o art. 236 CF (RE 141.347, Pertence, Lex 168/344); investidura
de interinos e substitutos na titularidade de serventias, independente-
mente de concurso público: inconstitucionalidade já declarada de nor-
mas similares (ADIn 126, Gallotti, RTJ 169/48): plausibilidade, por tudo
isso, da argüição de inconstitucionalidade do art. 30 ADCT de Alagoas:
suspensão cautelar deferida.
64 R.T.J. — 158

ACÓRDÃO vados em concurso público de provas e


Vistos, relatados e discutidos estes au- títulos, obedecida a rigorosa ordem de
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- classificação, obrigatória a participação,
bunal Federal, na conformidade da ata do na comissão examinadora, de um Juiz
julgamento e das notas taquigráficas, por de Direito, de um membro do Ministério
unanimidade de votos, em deferir o pedido Público e de um representante da OAB-
de medida liminar, para suspender, até de- AL, além de membros do Colégio No-
cisão final da ação, a eficácia do art. 30 e tarial e Registrai;
seus incisos, do Ato das Disposições Cons- IV — asseguramento de direito à
titucionais Transitórias da Constituição do nomeação aos candidatos aprovados no
Estado de Alagoas. concurso público realizado pelo Poder
Brasília, 25 de março de 1994 — Octa- Judiciário, para titulares dos serviços
vio Gallotti, Presidente — Semilveda Per- notariais e registro, de direito à nomea-
tence, Relator. ção;
RELATÓRIO V — reconhecimento da condi-
ção de delegados do Poder Público, para
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O os fins de exercício de funções notariais
Sr. Procurador-Geral da República propõe e registrais, a quanto as estejam inteira-
ação direta de inconstitucionalidade, com mente desempenhando há pelo menos
pedido de suspensão cautelar, do art. 30 do três anos, e, na vacância, aos atuais no-
ADCT promulgado com a Constituição do tários e registradores substitutos;
Estado de Alagoas, de 5-10-89, que tem o
seguinte teor (fl. 20): VI — organização e funciona-
mento do Colégio Notarial e de Registro
«Art. 30 — Os serviços notariais e na conformidade do regimento que ex-
de registro, até que entre em vigor a lei pedir».
de que trata o art. 236 da Constituição
Federal, serão exercidos com observân- A propositura da ação atendeu à pro-
cia aos seguintes princípios: vocação do Sr. Desembargador Presidente,
I — manutenção das atuais ser- em cumprimento à deliberação do Tribunal
ventias notariais e de registro existentes de Justiça daquele Estado (fl. 6/13).
no Estado, com a denominação de «ser- Sustentam a petição inicial e a repre-
viços notariais e de registro», exercidos, sentação que a motivou que os preceitos
em caráter privado, por delegação do questionados são incompatíveis com o art.
Poder Executivo; 236, § 1°, da Constituição da República, e
II — organização, disciplina e o art. 32 das suas Disposições Transitórias.
fiscalização administrativa dos serviços 4. Postula-se a suspensão cautelar do
exercidos pelo Colégio Notarial e Re- texto argüido de inconstitucional, «tendo
gistra], passando a constituir serviço pú- em vista que o Governador do Estado,
blico que fica desde logo instituído e com fundamento nas normas impugna-
composto pelos titulares dos serviços das, desfez atos do Presidente do Tribu-
notariais e de registro; nal de Justiça, transformando serventia
IB — nomeação dos titulares dos oficializada em não oficializada ou de
serviços notariais e de registro pelo Co- caráter privado, ferindo frontalmente a
légio Notarial e Registral, dentre apro- competência outorgada ao Poder Judi-
R.T.J. — 158 65

ciário para organizar os seus serviços ção de Rondônia, «por tornar privado o
auxiliares». exercício de serventias, sem observância
5. Para a decisão liminar requerida, tra- do requisito temporal do art. 32 do
go o feito à Mesa do Plenário. ADCT da República...» (Lex 169/48).
É o relatório. De igual modo, nos incisos II e III, a
organização de um Colégio Notarial e Re-
VOTO gistral — corporação de classe erigida em
serviço público desvinculado da estrutura
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence dos poderes do Estado — com amplos po-
(Relator): É inequívoca a relevância, sob deres de provimento, disciplina e fiscaliza-
vários prismas, da argüição de inconstitu- ção das serventias, à primeira vista, nem se
cionalidade deduzida. conforma à natureza pública dos serviços
notariais e de registro — não afetada, mas,
De início, a disposição transitória
antes, confirmada pela previsão constitu-
pretende reger a matéria «até que entre em
cional de sua delegação (cf. STF, RE
vigor a lei de que trata o art. 236 da 141.347, 1° Turma, 11-2-92, Pertence, Lex
Constituição Federal»: sucede que o tema 168/344) — nem se afina com a outorga ao
— atinente aos registros públicos (CF, art.
Poder Judiciário, no art. 236, § 1°, da Cons-
22, XXV) e às atividades e ao regime e
tituição, do poder de fiscalização das suas
fiscalização dos serviços notariais e de re- atividades.
gistro (CF, art. 236, § 1°) —, parece incluir-
se no âmbito da competência legislativa Finalmente, o preceito do inciso V —
reservada privativamente à União, o que, se que reconhece a «condição de delegados
é correto, elidiria a pretensão de o Estado, do Poder Público, para fins do exercício
na falta da lei federal, dispor provisoria- das funções notariais e registrais, a
mente a respeito, poder supletivo que só se quantos as estejam interinamente de-
legitima no campo da competência concor- sempenhando há pelo menos três anos e,
rente (CF, art. 24, § 3°). na vacância, aos atuais notários e regis-
De sua vez, o inciso I da disposição
tradores substitutos» vale pela investidu-
ra dos seus beneficiários, sem concurso
transitória atacada — no qual se determina público, na titularidade das serventias. Su-
a «manutenção das atuais serventias no- cede que normas locais similares têm sido
tariais e de registro existentes no Estado declaradas inconstitucionais em decisão
com a denominação de 'serviços nota- definitiva (ADIn 126, 29-8-91, Gallotti,
riais e de registro', exercidas, em caráter Lex 169/48, sobre o art. 236, in tine, da
privado, por delegação do Poder Execu- Constituição de Rondônia) ou cautelar-
tivo» — é de conciliação difícil, ao menos mente suspensa (v.g., ADIn 552 — RJ,
no que tange às serventias anteriormente 15-8-91, Gallotti, referendando despacho
oficializadas, com o art. 32 do ADCT fede- do em. Ministro Marco Aurélio, RTJ
ral, que as exclui do regime de exercício 137/590; ADIn 690, 26-2-92, Gallotti, RTJ
«em caráter privado, por delegação do 141/82), em confronto com a regra geral do
Poder Público», previsto no art. 236 da art. 37, II, e a disposição específica do art.
Constituição da República. 236, § 3°, da Constituição Federal, onde se
4. Daí que na ADIn 126, 29-9-91, sob preceitua que «o ingresso na atividade
a relatoria de V. Exa., Sr. Presidente Gal- notarial e do registro depende de concur-
lotti, o Tribunal, por unanimidade, decla- so público de provas e títulos» e, para
rou inconstitucional o art. 266 da Constitui- evitar protelações, não permite «que qual-
66 R.T.J. — 158

quer serventia fique vaga, sem abertura direta, a vigência do art. 30 do Ato das
de concurso de provimento ou de remo- Disposições Transitórias do Estado de Ala-
ção, por mais de seis meses». goas: é o meu voto.
Restam os incisos IV e VI do ques-
tionado art. 30 das Disposições Transitó- EXTRATO DA ATA
rias de Alagoas, contra os quais, isolada-
mente, não se divisam sinais de invalidez. ADIn 1.047 (Medida Cautelar) — AL
Mas, o inciso IV — que preserva o — Rel.: Min. Sepúlveda Pertence. Reqte.:
direito à nomeação dos candidatos aprova- Procurador-Geral da República. Reqda.:
dos no concurso público realizado pelo Po- Assembléia Legislativa do Estado de Ala-
der Judiciário para a titularidade das ser- goas.
ventias —, perde sua razão na medida em
que se suspenda a vigência do inciso II, que Decisão: Por votação unânime, o Tribu-
transfere ao Colégio Notarial e Registrai o nal deferiu o pedido de medida liminar,
poder de provimento delas. para suspender, até a decisão final da ação,
a eficácia do art. 30 e seus incisos, do Ato
Também o inciso VI — que delega das Disposições Constitucionais Transitó-
ao seu regimento a disciplina da organiza- rias da Constituição do Estado de Alagoas.
ção e do funcionamento do Colégio —, se Votou o Presidente.
toma sem sentido, se suspensa a norma de
instituição do organismo corporativo. Presidência do Senhor Ministro Octavio
À patente plausibilidade desta ar- Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
güição de ilegitimidade constitucional, Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
soma-se, para aconselhar a medida caute- Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, Celso
lar, a prova de que o Governo do Estado se de Mello, Carlos Velloso, Marco Aurélio,
tem servido dos preceitos questionados, limar Gaivão e Francisco Rezek. Ausente,
particularmente, para privatizar serventias justificadamente, o Ministro Sydney San-
oficializadas (fl. 26) ou efetivar interinos, ches. Procurador-Geral da República, Dr.
na titularidade delas. Aristides Junqueira Alvarenga.
11. Defiro, pois, a cautelar requerida e Brasília, 25 de março de 1994 — Luiz
suspendo, até decisão definitiva da ação Tomimatsu, Secretário.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 1.244 — SP


(Medida Cautelar)
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira
Requerente: Procurador-Geral da República — Requerido: Tribunal Regio-
nal do Trabalho da 15° Região
Ação direta de inconstitucionalidade. Medida cautelar. Deli-
beração Administrativa do TRT — 15' Região, tomada em sessão do
Órgão Especial a 7-12-1994, no Processo GDG n° 581/1994, que concedeu
aos magistrados, inclusive Juízes Classistas, bem como aos funcionários
R.T.J. — 158 67

vinculados ao referido Tribunal, o percentual de 10,94%, corresponden-


te à diferença entre o resultado da conversão da URV em reais, «com
base no dia 20-4-1994 e o obtido na operação de conversão com base no
dia 30 do mesmo mês e ano». 2. Alegação de ofensa aos arts. 96, II, letra
b, 169 e 62, parágrafo único, da Constituição. 3. Relevância dos funda-
mentos do pedido. Conveniência de suspender o ato normativo impug-
nado. 4. Medida cautelar deferida, para suspender, até o julgamento
final da ação, a eficácia da Deliberação Administrativa do TRT — 15'
Região, acima mencionada.
ACÓRDÃO Aponta-se, na representação do Procu-
rador-Geral da Justiça do Trabalho, acolhi-
Vistos, relatados e discutidos estes au- da pela inicial, incompatibilidade da Deli-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- beração Administrativa impugnada com os
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- arts. 96, II, b, e 169, da Constituição.
formidade da ata do julgamento e das notas A inicial assim se fundamenta, às fls. 3:
taquigráficas, à unanimidade de votos, de-
ferir o pedido de medida liminar para sus- «3. A Deliberação Administrativa
pender, até a decisão final da ação, a eficá- sobre a qual recai a pecha de inconstitu-
cia da Decisão Administrativa do Tribunal cionalidade tem inequívoco caráter nor-
Regional do Trabalho da 15* Região, toma- mativo, porque é estendida a todos os
da no Processo GDG n" 581/94. Magistrados, Juízes Classistas e servi-
dores do Tribunal Regional do Trabalho
Brasília, 29 de março de 1995 — Sepúl-
da 15' Região, expondo-se, em conse-
veda Pertence, Vice-Presidente — Néri qüência, ao controle abstrato de consti-
da Silveira, Relator. tucionalidade, de leis e atos normativos,
por via da ação direta prevista no art.
RELATÓRIO 103 da Constituição Federal.
A Medida Provisória n° 434, de
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- 27-2-94, interpretada no sentido de que
tor): O Dr. Procurador-Geral da República a concessão dos vencimentos dos mem-
aforou ação direta de inconstitucionalida- bros do Poder Judiciário deveria ser fei-
de, da Deliberação Administrativa do TRT- ta com base no dia do efetivo pagamen-
15* Região, tomada em sessão do Órgão to, perdeu a eficácia desde a edição,
Especial a 7-12-1994, no Processo GDG n° porque não foi convertida em lei no
581/94, que concedeu aos «magistrados da prazo de trinta dias, a partir de sua pu-
Justiça do Trabalho, inclusive Juízes Clas- blicação.
sistas, bem como aos funcionários vincula-
dos ao mesmo Tribunal, a partir de abril de Sobreveio, então, a Medida Pro-
1994, o reajuste de 10,94% (dez vírgula visória n° 457, de 29-3-94, convertida na
noventa e quatro por cento), corresponden- Lei n° 8.880, de 27-5-94, que determi-
te à diferença entre o resultado da conver- nou a conversão dos vencimentos em
são da URV — Unidade Real de Valor — geral, inclusive dos membros do Poder
em reais, com base no dia 20 de abril de Judiciário e do Ministério Público da
1994 e o obtido na operação de conversão União, com base na URV em 1° de mar-
com base no dia 30 do mesmo mês e ano». ço de 1994.
68 R.T.J. — 158

Relativamente à diferença obser- que determinou a conversão dos vencimen-


vada nos vencimentos dos membros do tos em geral, com base na URV em 10-3-
Poder Judiciário no mês de março de 1994. O Decreto Legislativo n° 17/94, com
1994, o Decreto Legislativo n° 17/94, apoio na parte final do parágrafo único do
editado em cumprimento à parte final art. 62 da Constituição, converteu a dife-
do parágrafo único do art. 62 da Cons- rença, observada nos vencimentos dos
tituição Federal converteu-a em abono, membros do Poder Judiciário, no mês de
restritivo a esse mês, sem repercussão março de 1994, em abono, restritivo a esse
nos vencimentos dos magistrados nos mês, sem repercussão nos vencimentos dos
meses subseqüentes. magistrados nos meses subseqüentes.
Dessa forma, a Deliberação Ad- Dessa maneira, são relevantes os funda-
ministrativa impugnada, ao conceder mentos da inicial ao invocar ofensa, pelo
aumento de 10,94% (dez vírgula noven- ato normativo impugnado, aos arts. 96, II,
ta e quatro por cento) aos Magistrados, b, e 62, parágrafo único, parte final, da
Juízes Classistas e servidores do Tribu- Constituição.
nal Regional do Trabalho da 15' Região, Presente se faz também razão de conve-
com fundamento nos princípios da iso- niência para suspender-se, desde logo, a
nomia e da irredutibilidade de venci- eficácia do ato normativo em exame. Con-
mentos, afronta o parágrafo único do art. traria, sem dúvida, aos interesses maiores do
62 da Constituição Federal, porque con- Poder Judiciário, decisão administrativa de
feriu eficácia permanente à Medida Pro- uma Corte, sobre matéria da natureza da pre-
visória n°434, de 1994, e usurpou a com- sente, adotada sem guardar conformidade
petência exclusiva do Congresso Nacio- com a orientação dos Tribunais Superiores.
nal, de disciplinar as relações jurídicas
decorrentes das medidas provisórias não Do exposto, defiro a medida liminar re-
convertidas em lei. É ainda inconciliável querida e suspendo, até o julgamento final
com os arts. 96, H, b, e 169 da Constitui- da ação, a eficácia da Deliberação Admi-
ção Federal, que exigiu lei para a conces- nistrativa do TRT-15' Região, no Processo
são de aumento de vencimentos aos ma- GDG n° 581/94, da aludida Corte.
gistrados e servidores públicos dos servi- VOTO
ços administrativos dos Tribunais.» O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor
Pleiteia o requerente medida cautelar, Presidente, poderíamos até cogitar do pre-
«porque o pagamento dos vencimentos juízo do pedido de concessão de liminar,
com o reajuste de 10,94% no âmbito do quanto à magistratura, já que é notório que
Tribunal Regional do Trabalho da 15' Re- houve, em virtude da equivalência de ven-
gião, causa lesão ao erário público federal». cimentos a partir de 1° de fevereiro, obser-
vância de valores nominais, absolutos. Há,
Submeto o feito ao Plenário.
todavia, a questão referente aos servidores.
É o relatório.
Acompanho o Ministro Relator, defe-
VOTO rindo a liminar para suspender a eficácia do
dispositivo atacado.
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela-
tor): Não convertida em lei a Medida EXTRATO DA ATA
Provisória n° 434/1994, perdeu eficácia
desde a edição. Sobreveio a MP n° 457, de ADIn 1.244 (Medida Cautelar) — SP —
29-3-1994, convertida na Lei n° 8.880/94, Rel.: Min. Néri da Silveira. Regre.: Procu-
R.T.J. — 158 69

rador-Geral da República — Reqdo.: Tri- Presidência do Senhor Ministro Octa-


bunal Regional do Trabalho da 15" Região. vio Gallotti. Presentes à Sessão os Senho-
res Ministros Moreira Alves, Néri da Sil-
Decisão: Por votação unânime, o Tribunal veira, Sydney Sanches, Sepúlveda Per-
deferiu o pedido de medida liminar para sus- tence, Celso de Mello, Carlos Velloso,
pender, até a decisão final da ação, a eficácia da Marco Aurélio, limar Galvão, Francisco
Decisão Administrativa do Tribunal Regional Rezek e Maurício Corrêa. Procurador-
do Trabalho da 15' Região, tomada no Proces- Geral da República, Dr. Aristides Jun-
so GDG n° 581/94. Votou o Presidente. Re- queira Alvarenga.
sidiu o julgamento o Ministro Sepúlveda Per-
tence, Vice-Presidente, na ausência ocasional Brasília, 29 de março de 1995 — Luiz
do Ministro Octavio Gallotti, Presidente. Tomimatsu, Secretário.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N e 1.251 — MG


(Medida Cautelar)
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello
Requerente. Procurador-Geral da República — Requeridos: Governador do
Estado de Minas Gerais e Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais
Ação direta de inconstitucionalidade — Lei estadual que per-
mite a integração de servidor público no quadro de pessoal do Tribunal de
Contas, independentemente de concurso — Irrelevância de achar-se o
servidor à disposição desse órgão público em determinado período —
Alegação de ofensa ao art. 37, A da Carta Federal — Plausibilidade
jurídica — Conveniência — Medida cautelar deferida.
O provimento efetivo em cargo público situado na estrutura
administrativa de qualquer dos Poderes ou órgãos do Estado supõe, para
efeito de regular investidura do servidor público, a prévia aprovação deste
em concurso público de provas ou de provas e títulos. Precedentes do STF.
O postulado constitucional inscrito no art. 37,1I, da Carta
Política, ao dar concreção e efetividade ao princípio da isonomia, impõe
que o ingresso no serviço público sempre se dê, ressalvada a investidura
em cargos de provimento em comissão, mediante prévia aprovação em
concurso público de provas ou de provas e títulos.
ACÓRDÃO em deferir o pedido de medida liminar para
suspender, até a decisão final da ação, a
eficácia do art. 3° da Lei n° 11.816, de
Vistos, relatados e discutidos estes au-
26-1-95, do Estado de Minas Gerais.
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- Brasília, 30 de junho de 1995 — Sepúl-
formidade da ata do julgamento e das notas veda Pertence, Presidente — Celso de
taquigráficas, por unanimidade de votos, Mello, Relator.
70 R.T.J. — 158

RELATÓRIO Para apreciação do pedido, submeto o


feito ao Plenário da Corte.
O Sr. Ministro Celso de Mello: O Pro-
curador-Geral da República ajuíza ação di- É o relatório.
reta de inconstitucionalidade, com pedido
de liminar, impugnando o art. 3° da Lei n° VOTO
11.816, de 26 de janeiro de 1995, do Estado
de Minas Gerais, que tem o seguinte con- O Sr. Ministro Celso de Mello (Rela-
teúdo normativo: tor): A presente ação direta tem por objeto
«Lei n° 11.816, de 26 de janeiro de norma inscrita no art. 3°, da Lei n°
1995. 11.816/95, do Estado de Minas Gerais, que
viabilizou, independentemente de prévia
Dispõe sobre a tabela de índices apli- aprovação em concurso público de provas,
cáveis aos padrões de vencimentos dos ou de provas e títulos, a integração de ser-
servidores do Quadro de Pessoal, inclu- vidores públicos estaduais no Quadro Es-
sive dos inativos, e dos integrantes do pecial de Pessoal do Tribunal de Contas
Quadro Especial de Pessoal do Tribunal daquela unidade da Federação, desde que
de Contas do Estado de Minas Gerais e — embora funcionalmente estranhos a esse
dá outras providências. órgão administrativo — estivessem à dis-
posição da Corte de Contas em data de
30-11-94.
Art. 3° — O servidor público es- O Procurador-Geral da República,
tadual à disposição do Tribunal de Con- para fundamentar a sua pretensão de in-
tas em 30 de novembro de 1994 poderá constitucionalidade, sustenta que a nor-
requerer sua integração ao Quadro Es- ma impugnada teria vulnerado as prescri-
pecial de Pessoal do referido Tribunal, ções consubstanciadas no art. 37, II, da
no prazo de 30 (trinta) dias contados da Constituição Federal, permitindo que se
data da publicação desta Lei.» burlasse o postulado constitucional que,
Argúi o Autor a inconstitucionalidade ao dar concreção e efetividade ao princí-
pio da isonomia, impõe que o ingresso no
desse dispositivo legal em face da «incom-
serviço público sempre se dê, ressalvada
patibilidade do dispositivo acima transcrito a investidura em cargos de provimento
com o art. 37, II, da Constituição Federal» em comissão, mediante prévia aprova-
(fl. 3), que condiciona a investidura em ção em concurso público de provas ou de
cargo ou em emprego público à prévia provas e títulos.
aprovação de seu titular em concurso públi-
co de provas ou de provas e títulos, expres- A norma ora questionada, no entanto,
samente ressalvadas «as nomeações para autoriza o servidor público estadual — ante
cargo em comissão declarado em lei de uma circunstância de ordem meramente
livre nomeação e exoneração» (Art. 37, II, temporal (achar-se à disposição do Tribu-
in fine). nal de Contas do Estado de Minas Gerais
em 30 de novembro de 1994) — a «reque-
Requer, por fim, a concessão de medida rer sua integração ao Quadro Especial de
cautelar, para suspensão liminar da eficácia Pessoal do referido Tribunal, no prazo de
da norma impugnada, até o julgamento fi- 30 (trinta) dias contado da data da publica-
nal da ação. ção desta Lei».
R.T.J. — 158 71

O conteúdo dessa norma faz instaurar a concessão da medida cautelar ora pos-
uma anômala situação funcional que, por tulada.
referir-se a cargos de provimento em ca- Isto posto, defiro a suspensão de eficá-
ráter efetivo, estaria a transgredir o pos- cia da norma inscrita no art. 3° da Lei n°
tulado constitucional do concurso públi- 11.816, de 26-1-95, do Estado de Minas
co, na medida em que permite que servi- Gerais, até final julgamento da presente
dores administrativos meramente coloca- ação direta.
dos à disposição do Tribunal de Contas
do Estado venham, mediante ato de sua É o meu voto.
própria vontade, a integrar-se, definiti-
EXTRATO DA ATA
vamente, no Quadro Especial de Pessoal
daquele órgão de controle externo da ati- ADIn 1251 (Medida Cautelar) — MG
vidade financeira e orçamentária do Po- — Rel.: Min. Celso de Mello. Reqte.: Pro-
der Público. curador-Geral da República. Reqdos.: Go-
A aplicação da regra consubstanciada vernador do Estado de Minas Gerais e As-
no art. 3° da Lei em questão ensejaria, sembléia Legislativa do Estado de Minas
desse modo, o ingresso, nos quadros admi- Gerais
nistrativos do Tribunal de Contas do Esta- Decisão: Apresentado o feito em mesa,
do, de servidores públicos não concursa- julgamento foi adiado em virtude do
dos. adiantado da hora. Plenário, 8-6-95.
É de ressaltar que a jurisprudência do Decisão: Apresentado o feito em mesa,
Supremo Tribunal Federal não tem transi- julgamento foi adiado em virtude do
gido quanto à necessidade de observância, adiantado da hora. Plenário, 29-6-95.
sempre indeclinável, do postulado consti- Decisão: Por votação unânime, o Tribu-
tucional do concurso público (ADIn nal deferiu o pedido de medida liminar para
181-RS, Rel. Min. Celso de Mello; ADIn suspender, até a decisão final da ação, a
289-CE, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; eficácia do art. 3° da Lei n° 11.816, de
ADIn 362-AL, Rel. Min. Célio Boda; 26-1-95, do Estado de Minas Gerais. Votou
ADIn 766, Rel. Min. Celso de Mello; Presidente. Ausente, ocasionalmente, o
ADIn 837, Rel. Min. Moreira Alves; Ministro Moreira Alves.
ADIn 1.203-PI, Rel. Min. Celso de Mello;
ADIn 1.222-AL, Rel. Min. Sydney San- Presidência do Senhor Ministro Sepúlve-
ches; ADIn 1.230-DF, Rel. Min. limar da Pertence. Presentes à Sessão os Senhores
Ministros Moreira Alves, Sydney Sanches,
Gaivão, v.g.).
Octavio Gallotti, Celso de Meio, Carlos
Concorrem, na espécie, os pressupostos Velloso, Marco Aurélio, Ilmar Gaivão,
inerentes à plausibilidade jurídica do pedi- Francisco Rezek e Maurício Corrêa. Au-
do e à ocorrência do periculum in mora, sente, justificadamente, o Senhor Ministro
circunstâncias estas que, associadas a Néri da Silveira. Procurador-Geral da Re-
razões de conveniência fundadas na ne- pública, Dr. Geraldo Brindeiro.
cessidade de preservar a ordem jurídi- Brasília, 30 de junho de 1995 — Luiz
co-administrativa local, bem justificam Tomimatsu, Secretário.
72 R.T.J. — 158

MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.274 — DF


(Tribunal Pleno)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Impetrantes: Leandro Bertoli, Indústria e Comércio Ltda. e outros — Impe-
trado: Presidente da República
Constitucional. Processual civil. Mandado de segurança Ato
normativo. Decreto com efeito normativo: não cabimento da segurança.
Decreto n° 99.547, de 25-9-90.
Se o decreto é, materialmente, ato administrativo, assim
de efeitos concretos, cabe contra ele mandado de segurança. Todavia, se
o decreto tem efeito normativo, genérico, por isso mesmo sem operativi-
dade imediata, necessitando, para a sua individualização, da expedição
de ato administrativo, contra ele não cabe mandado de segurança.
(Súmula 266).
Mandado de segurança não conhecido.

ACÓRDÃO pectiva exploração da vegetação nativa da


Mata Atlântica».
Vistos', relatados e discutidos estes au- Dizem os impetrantes que são titulares
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- de licenças para exploração florestal seleti-
bunal Federal em Sessão Plenária, na con- va, obtidas do extinto IBDF, sucedido pelo
formidade da ata do julgamento e das notas IBAMA — Instituto Brasileiro do Meio
taquigráficas, por decisão unânime, não co- Ambiente e dos Recursos Naturais Re-
nhecer do mandado de segurança. Ausen- nováveis.
tes, ocasionalmente, os Ministros Francis-
co Rezek e Octavio Gallotti, Presidente. Sustentam que «este ato probitivo, ema-
nado da Autoridade impetrada, afeta con-
Brasília, 10 de fevereiro de 1994 — cretamente e desconstitui o direito líquido
Paulo Brossard, Presidente — Carlos e certo dos impetrantes de utilizarem suas
Venoso, Relator. florestas, com a agravante de que a Admi-
nistração Pública, através da expedição das
RELATÓRIO regulares e legais licenças, já havia reco-
nhecido como operante e eficaz o direito
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Lean- dos impetrantes». E esse direito líquido e
dro Bertoli — Indústria e Comércio certo encontra amparo específico no art.
Ltda., Madeiras Verde Vale Ltda., Ir- 225, § 4°, da Constituição vigente, que au-
mãos Odebrecht Ltda., Udo Beltramini toriza a exploração das florestas nacionais,
— Indústria e Comércio de Madeiras inclusive a Mata Atlântica, «na forma da
Ltda., Stoltenberg Irmãos S.A. e Possa- lei». O ato atacado está «também eivado de
mai & Cia. Ltda. impetram mandado de vício formal, uma vez consagrada a compe-
segurança contra ato do Exmo. Sr. Presi- tência legislativa em matéria florestal no
dente da República, representado pelo De- art. 24, VI, Constituição da República, tor-
creto n° 99.547, de 25-9-90, que proibiu, nando inconstitucional qualquer discipli-
«por tempo indeterminado, o corte e a res- namento através de Decreto».
- 158 73

Postulam, por fim, a concessão da segu- ventias do foro judicial, mandou respei-
rança «para garantir aos impetrantes o di- tar os direitos de seus servidores.
reito de executarem as explorações flores-
tais de acordo com as licenças já deferi- III
das e concedidas pela administração Pú-
blica...». Tomando a Mata Atlântica — entre
outras grandes florestas — patrimônio
Sem liminar, foram solicitadas informa- nacional, a Constituição deu sentido
ções ao Exmo. Sr. Presidente da República, novo ao Código Florestal. Este, inter-
que as prestou às fls. 107/109, esclare- pretado conforme àquela, faculta ao Po-
cendo: der Público proibir a exploração da
«De início, releva notar que as licen- Mata Atlântica, já tão perigosamente re-
ças obtidas pelas impetrantes são ante- duzida.
riores à Constituição de 1988, e regidos Deste Código — Lei n°4.771, a rigor
por um Código Florestal que falava em — repontam proibições de índole vária,
florestas privadas. cuja compreensão sistemática avaliza o
A nova Constituição, todavia, cons- decreto sob discussão.
titui a Mata Atlântica como patrimônio Como exemplo, o parágrafo único do
nacional — contra que, logicamente, artigo 5°, que proíbe qualquer forma de
não faz sentido algum evocar tal ou qual exploração dos recursos naturais nos
direito adquirido, já que essa categoria Parques Nacionais, Estaduais e Munici-
jurídica jamais prevalece, quando coli- pais, combinado com o artigo 14 — a,
dente com a Lei Maior. que permite ao Poder Público prescrever
normas que atendam às peculiaridades
Daí não haver, data venia, definiti- locais.
vidade na licença que a Administração
concedeu, de modo idôneo —como idô- Proibindo a exploração por tempo
nea também era, logicamente, a explo- indeterminado, o decreto atualizou o
ração feita pelas empresas —, visto que Código Florestal à vista da Constitui-
significativa mudança jurídica suce- ção. Esta, ao falar de utilização na forma
deu após tal outorga, conducente à ne- da lei, permitiu a recepção daquele Es-
gação do direito de propriedade sobre tatuto — que, por imprevisão dessa me-
uma floresta que, agora, é patrimônio dida constitucional protetora da Mata
nacional. Atlântica, há de ser recebido com esse
cuidado, mas cuja interpretação siste-
Óbvio que, nesse rumo, tampouco mática termina por alcançar os propó-
operaria efeito o argumento do ato jurí- sitos tutelares que a Constituição deu
dico perfeito, pois este também não en- às florestas arroladas no seu artigo 225
contra resguardo ante a aparição de Tex- — 4°.
to Constitucional que se revele contrário
ao ali estatuído. IV
Se, frente a um tema novo, a Consti-
tuição resolvesse salvaguardar qualquer De resto, o argumento de que a Cons-
situação subjetiva, o faria expressamen- tituição permite a utilização das flores-
te, como no artigo 31 do ADCT, que, tas na forma da lei é um desvio de pers-
determinando sejam estatizadas as ser- pectiva.
74 R.T.J. —158

A Mata Atlântica, a Floresta Amazô- A douta Procuradoria-Geral da Repúbli-


nica brasileira, a Sena do Mar, o Panta- ca, oficiando às fls. 116/122, através de
nal e a Zona Costeira são patrimônio parecer da Subprocuradora-Geral em exer-
nacional e sua utilização será feita na cício Maria da Glória Ferreira Tamer, opina
forma da lei. Certo. Mas — também diz pela denegação da segurança, por entender
a Constituição — essa utilização far- que, «como se trata de autorização, o ato
se-á dentro de condições que assegu- administrativo que permitiu aos impetran-
rem a preservação do meio ambiente, tes o exercício de exploração de madeira
inclusive quanto ao uso dos recursos nativa na Floresta Atlântica, com especifi-
naturais. cação da área a ser explorada e o volume da
madeira a ser extraída, é fora de dúvida que
Logo, indisputável que a utilização
tal ato poderia ser revogado por motivo de
não é permitida livremente, mas à base
interesse público, sem ofensa ao direito
do restritivo critério da preservação. adquirido e sem qualquer desrespeito ao ato
Parece claro, portanto, que uma in- jurídico perfeito». Ressalta, ainda, que «o
terpretação a contrario sensu aponta ato revogatório, indubitavelmente, con-
para a proibição da utilização da Mata substancia uma limitação administrativa,
Atlântica, se sua preservação está em configurativa da intervenção do Estado
risco. na propriedade, para condicionar o uso da
propriedade privada ao bem-estar da so-
Fato incontroverso, público e notó- ciedade». Conclui o parecer que «é per-
rio, que a Mata Atlântica é, hoje, ínfima feitamente legítima a superveniência do
parcela de uma outrora vastíssima flo- Decreto n° 99.547/90, que importou na
resta. Há movimentos que existem ex- supressão das autorizações concedidas
clusivamente para advertir de sua extin- pelo ex-IBDF, face ao interesse que esta-
ção e tentar preservá-la. va a exigir providências enérgicas para
Da forma que a impetração argumen- evitar a extinção da Mata Atlântica. Exis-
ta, o Poder Público estaria impossibili- te aí um interesse público relevante que
tado de envidar esforços contra o fim da deve preponderar sobre o interesse mera-
Mata Atlântica, pois sua exploração es- mente privado».
taria constitucionalmente garantida. É o relatório.
Não. Essa interpretação, hostil ao bom
senso, abstrai a evidência de que, para VOTO
utilizar a Mata Atlântica, é preciso que
ela exista — e, para tanto, necessário
que se suspenda, por algum tempo, sua O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela-
exploração. tor): O mandado de segurança, impetrado
por empresas que exploram madeira, tem
por objeto o Decreto n° 99.547, de 25-9-90,
V do Sr. Presidente da República, que dispõe
sobre a vedação do corte e da respectiva
exploração da vegetação nativa da Mata
Inexistindo direito líquido e certo — Atlântica. As impetrantes sustentam que
pois contrário à Constituição —e ausen- são titulares de licenças para exploração
te qualquer ilegalidade do decreto, o florestal seletiva, obtidas do ex-IBDF, su-
writ parece rumar ao indeferimento.» cedido pelo Instituto Brasileiro do Meio
(Fls. 107/109) Ambiente e dos Recursos Naturais Reno-
R.T.J. — 158 75

váveis — IBAMA. Acontece, sustentam, diante do que estabelece o Código Flores-


que o citado Decreto n° 99.547, de 1990, tal, no ponto em que disciplina a utilização
ofendeu direito líquido e certo das impe- das florestas, teria incorrido — fala-se em
trantes. tese — em ilegalidade e não em inconstitu-
Preliminarmente, examino a questão cionalidade. O Supremo Tribunal, entre-
frente ao verbete da Súmula n° 266 a dizer tanto, não acolheu esse entendimento, pelo
que não cabe mandado de segurança contra que conheceu da ação e indeferiu a medida
lei em tese. liminar.
Quando do julgamento do MS n° Posta assim a questão, força é concluir
21.126-DF, de que fui relator — RTJ pelo não cabimento da segurança, dado que
133/1126 — sustentei que, se o decreto objetiva desconstituir norma em tese, o que
presidencial consubstancia ato administra- não é admissivel (Súmula 266).
tivo, assim de efeitos concretos, cabe con- Do exposto, não conheço do mandado
tra ele o mandado de segurança. Todavia, de segurança.
se o decreto tem efeito normativo, genéri-
co, por isso mesmo sem operatividade ime- EXTRATO DA ATA
diata, necessitando, para a sua individuali-
zação, da expedição de ato administrativo,
então, contra ele não cabe mandado de se- MS 21.274 — SC — Rel.: Min. Carlos
gurança, já que, admiti-lo, seria admitir a Velloso. Imptes.: Leandro Bertoli — In-
segurança contra lei em tese, o que é repe- dústria e Comércio Ltda. e outros (Advs.:
lido pela doutrina e pela jurisprudência Armando Heringer e outro). Impdo.: Presi-
(Súmula n° 266). Essa a tese que sustento, dente da República.
de longa data, em trabalhos doutrinários, Decisão: Por votação unânime, o Tribu-
como se pode ver da palestra que proferi, nal não conheceu do mandado de seguran-
subordinada ao tema <Mandado de Segu- ça. Votou o Presidente. Ausentes, ocasio-
rança», publicada na RDP 55-56/333, 334. nalmente, os Ministros Francisco Rezek e
No caso, o Decreto n° 99.547, de 1990, Octavio Gallotti, Presidente. Presidiu o jul-
objeto da ação, não me parece de efeitos gamento o Ministro Paulo Brossard, Vice-
concretos, assim ato administrativo. Ele Presidente.
exige, para a sua individualização, a expe-
Presidência do Senhor Ministro Octavio
dição de ato administrativo. E tanto tem ele
Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
efeito normativo, a regular, indiscrimina-
Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
damente, a atividade de corte e de explora-
Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlve-
ção da vegetação nativa da Mata Atlântica,
da Pertence, Carlos Velloso, Marco Auré-
que é ele objeto da ADIn n° 487-DF, Rela-
lio, limar Gaivão e Francisco Rezek. Au-
tor o Sr. Ministro Octavio Gallotti, tendo
sente, justificadamente, o Ministro Celso
sido denegada a liminar. Quer dizer,o Su-
de Mello. Procurador-Geral da República,
premo Tribunal Federal conheceu da ação
Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
direta de inconstitucionalidade proposta
contra o citado decreto. Na oportunidade, Brasília, 10 de fevereiro de 1994 —
fiquei vencido, sustentando que o decreto, Luiz Tomimatsu, Secretário.
76 R.T.J. — 158

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.336 (AgRg) — DF


(Tribunal Pleno)

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio


Agravantes: Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de
Educação e Cultura —CNTEEC e outros —Agravados: União Federal e Sindicato Nacional
dos Docentes das Instituições de Ensino Superior — ANDES — Sindicato Nacional
Recurso — Princípio da fungibilidade. Muito embora o Códi-
go de Processo Civil de 1973 não contenha regra idêntica à do Código de
Processo Civil de 1939 — artigo 810 — admite-se que nele esteja impli-
citamente admitido o princípio da fungibilidade.
Recurso — Mandado de segurança — Decisão denegatória.
Ordinário x Extraordinário. Na hipótese de decisão denegatória da segu-
rança, prolatada pelo Superior Tribunal de Justiça, o recurso cabível é
o ordinário, a teor do disposto na alínea a do inciso II do artigo 102 da
Constituição Federal. Interposto o recurso extraordinário, descabe a
conversão. Precedentes: Recurso em Mandado de Segurança n° 21.498-
DF, julgado na Primeira Turma, relatado pelo Ministro Moreira Alves,
cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça de 02 de outubro de 1992;
recurso em Mandado de Segurança n° 21.481-DF, relatado perante a
Primeira Turma pelo Ministro Moreira Alves, cujo acórdão foi publica-
do no Diário da Justiça de 1° de julho de 1992; agravo regimental em
Agravo de Instrumento n° 145.553-PI, relatado perante a Primeira
Turma pelo Ministro Limar Gaivão, cujo acórdão foi publicado no Diário
da Justiça de 26 de fevereiro de 1993; agravo regimental em Agravo de
Instrumento n° 144.895-SE, relatado perante a Primeira Turma pelo
Ministro limar Gaivão, cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça
de 20 de novembro de 1992 e recurso em Mandado de Segurança n°
21.079, relatado perante o Tribunal Pleno pelo Ministro Moreira Alves,
cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça de 25 de maio de 1990.
Recurso — Fungibilidade — Erro grosseiro — Conversão —
Propriedade. Somente cabe a conversão quando a jurisprudência sobre
a adequação do recurso mostra-se oscilante.
Recurso — Juízo primeiro de admissibilidade — Conversão —
Alcance. A decisão do Juízo primeiro de admissibilidade não vincula, ao
que nela se contém, especialmente quanto à conversão do recurso —
extraordinário em ordinário — o órgão competente para julgá-lo.

ACÓRDÃO taquigráficas, por maioria de votos, em ne-


gar provimento ao agravo regimental.
Vistos, relatados e discutidos estes au-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- Brasilia,31 de agosto de 1994 — Octa-
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- vio Gallotti, Presidente — Marco Auré-
formidade da ata do julgamento e das notas lio, Relator.
R.T.J. — 158 77

RELATÓRIO representação processual somente se


O Sr. Ministro Marco Aurélio: Ao mostra regular quanto à primeira Recor-
recurso interposto neguei seguimento, rente. No mérito, o parecer é pela con-
apresentando, na oportunidade, como rela- firmação da decisão atacada.
tório, o seguinte: As Agravantes, mediante a peça de fo-
O egrégio Superior Tribunal de Jus- lhas 627 a 639, que somente enaltece a
tiça concluiu pela denegação da segu- atuação profissional da respectiva subscri-
rança, assentando que o registro do Sin- tora, Dra. Mansa Schutzer DeI Nem Polet-
dicato Nacional dos Docentes das Insti- ti, sustentam, em síntese, que o princípio da
tuições de Ensino Superior — ANDES fungibilidade é inerente ao Código de Pro-
não implicou transgressão ao princípio cesso Civil, transcrevendo precedentes
da unicidade sindical (folhas 481 a 541). nesse sentido. Ressaltam que apenas não
cabe a observância de tal procedimento
Os Recorrentes interpuseram o re- quando se trata de erro grosseiro, devendo
curso extraordinário de folhas 544 a ser perquirido, tão-só, sob tal óptica, o pra-
577, evocando o enquadramento da hi- zo e a pertinência da matéria veiculada.
pótese no permissivo da alínea «a» do Argumentam que se sobrepõe à forma a
inciso III do artigo 102 da Constituição questão de fundo e que o direito ao recurso
Federal. O que decidido vulnera, segun- ordinário nas hipóteses de denegação da
do o sustentado, o princípio da unicida- segurança consubstancia direito subjetivo
de sindical consagrado no inciso II do previsto na própria Lei Básica. A partir da
artigo 8° da Carta. A União Federal e o premissa de que quem pode o mais, pode o
Sindicato Nacional dos Docentes das menos, asseveram a viabilidade da conver-
Instituições de Ensino Superior — AN- são levada a efeito, pelo Juízo primeiro de
DES apresentaram contra-razões, apon- admissibilidade. Resumindo, nas razões do
tando, o Sindicato, o não-cabimento do agravo aponta-se que:
extraordinário em face à regra da alínea
a do dispositivo constitucional citado, O erro mostrou-se perfeitamente es-
além de argumentar que a interposição cusável;
de recurso outro que não o correto atraiu A hipótese revelada no verbete 272
a preclusão maior, não se podendo per- que integra a Súmula desta Corte é exata-
quirir a observância do princípio da fun- mente contrária à percebida quando da pro-
gibilidade. Aludiu também ao teor do lação da decisão atacada;
verbete n° 322 que integra a Súmula da
jurisprudência predominante desta Cor- O recurso extraordinário foi protoco-
te (folhas 584 a 607). lizado no prazo previsto para o remédio
O juízo primeiro de admissibilidade legal cabível — o ordinário;
converteu o extraordinário em ordinário Tem-se, no caso, direito adquirido à
e determinou a remessa dos autos a este admissibilidade do recurso extraordinário
Tribunal (folha 609). O Ministério Pú- como ordinário, em face de expressa prote-
blico, na pena abalizada da ilustre Sub- ção constitucional;
procuradora-Geral da República, Dra.
Odília Peneira da Luz Oliveira, preco- e) Em momento algum ocorreu preclu-
niza o não-conhecimento do recurso, re- são no tocante ao tema, já que o Presidente
futando a pertinência do princípio da do Tribunal de origem converteu o recurso
fungibilidade. Aduziu, também, que a extraordinário em recurso ordinário em
78 R.T.J. —158

mandado de segurança, admitindo-o como visto para as hipóteses em que se tenha


tal; julgado causa em única ou última ins-
1) Mostra-se injustificável impedir a tância e se faça presente um dos pressu-
apreciação do mérito de um recurso se, na postos mencionados na alínea «a» do
data da publicação do acórdão, a parte tinha inciso JII do artigo 102 da Lei Básica
direito a ele. Federal. A decisão denegatória da segu-
rança não é única, nem foi prolatada em
Com as razões do agravo regimental última instância. Dir-se-á da possibili-
vieram aos autos os precedentes de folhas dade de o recurso extraordinário inter-
640 a 690, oriundos do Superior Tribunal posto ser tomado como o ordinário,
de Justiça. como fez o Juízo primeiro de admissibi-
Recebi estes autos para exame em 30 de lidade. Não obstante, esta Corte, à luz do
abril de 1992, declarando, em 4 do mês Código de Processo Civil de 1939, em
seguinte, nada haver a reconsiderar e deter- que se previa no artigo 810, expressa-
minando a expedição de papeleta para a mente, que a parte não seria prejudicada
submissão do inconformismo a este Cole- pela interposição de um recurso por ou-
giado. tro, exceto no caso de má-fé ou erro
É o relatório. grosseiro, o que não acontece no tocante
à Lei Instrumental de 1973, editou o
VOTO verbete 272 no seguinte sentido:
«Não se admite como ordinário
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Rela- recurso extraordinário de decisão
tor): Inicialmente, consigno que a represen- denegatória de mandado de segu-
tação processual somente mostra-se regu- rança».
lar quanto à Confederação dos Trabalhado-
res em Estabelecimentos de Educação e A fortiori, se o atual Código de Pro-
Cultura — CNTEEC (folha 27). Relativa- cesso Civil apenas contempla implicita-
mente às Federações mencionadas na ini- mente o princípio da fungibilidade, ou-
cial, a ilustre subscritora do recurso não tro enfoque não pode merecer a matéria.
possui, nos autos, poderes para representá- Por outro lado, vale ressaltar que a alte-
las. Assim, apenas conheço do agravo regi- ração da nomenclatura dos recursos fei-
mental no que concerne à aludida Confede- ta pelo Superior Tribunal de Justiça não
ração. vincula a atuação de qualquer órgão do
Supremo Tribunal Federal, já que, tendo
No mais, o pleito formulado pelas Agra- sido positiva a decisão quanto ao trânsi-
vantes esbarra na jurisprudência sedimen- to do recurso, não ocorreu, quanto a ela,
tada desta Corte. Valho-me, para negar a preclusão maior.
acolhida ao pedido de reforma da decisão,
do que tive oportunidade de assentar quan- A jurisprudência desta corte é reiterada
do neguei seguimento ao recurso: no sentido da decisão atacada:
Inegavelmente, a decisão proferida — 'Mandado de Segurança. Militar.
pelo Superior Tribunal de Justiça, mos- Reserva Remunerada. Prescrição.
trou-se recorrível mediante recurso or- — Conversão do Recurso Extraor-
dinário. É que importou na denegação dinário em Ordinário admitida apenas
da segurança, o que revela a improprie- quanto aos recorrentes com relação aos
dade de cogitar-se, de imediato, do ca- quais o Mandado de Segurança não foi
bimento do extraordinário, já que pre- conhecido, uma vez que, com relação
R.T.J. — 158 79

aos que tiveram a segurança denegada, missibilidade que inexistem em manda-


cabimento do Recurso Ordinário é do de segurança não conhecido.»
expresso, ocorrendo, assim, erro gros- (Recurso em Mandado de Segurança
seiro a impedir a mesma conversão. n° 21.481-DF, relatado perante a Pri-
Estando a pretensão dos impe- meira Turma pelo Ministro Moreira
trantes, antes mesmo da impetração do Alves, cuja decisão, unânime, foi publi-
Mandado de Segurança, prescrita, não é cada no Diário da Justiça de 1° de julho
possível revivê-la por meio deste. Re- de 1992)
curso Ordinário conhecido em parte, e «Cabimento de Recurso. Decisão de-
nela não provido.» negatória de mandado de segurança pro-
Recurso em Mandado de Segurança ferida originariamente por tribunal esta-
n° 21.498-DF, relatado pelo Ministro dual. Recurso ordinário. CF, art. 105,
Moreira Alves, perante a Primeira Tur- Pedido alternativo de conversão do ex-
ma, cuja decisão, unânime, foi publica- traordinário.
da no Diário da Justiça de 2 de outubro Tendo sido a segurança denegada
de 1992). originariamente pelo Tribunal de Justi-
ça Estadual, cabível era o Recurso Ordi-
«Mandado de segurança denegado nário. A interposição de Recurso Ex-
originariamente por Tribunal Superior. traordinário, mesmo que a causa esteja
Recurso cabível (artigo 102, II, a, da adstrita a questões constitucionais, é
Constituição). inadmissível e configura evidente erro
grosseiro.
Tendo sido a segurança denegada,
Incabível a postulação alternativa de
cabível contra ela era o recurso ordiná-
conversão do recurso extraordinário em
rio, nos expressos termos do artigo 102,
ordinário e na remessa do mesmo para o
II, a, da Constituição Federal. Ora, mais Superior Tribunal de Justiça. Inescusá-
de três anos depois da promulgação des-
vel o erro grosseiro, não há como apli-
sa Carta Magna, impõe-se que se tenha
car-se o princípio da fungibilidade.»
como erro grosseiro, a impedir a conver-
são do recurso extraordinário em ordi- (Agravo Regimental em Agravo de
nário, a interposição daquele recurso Instrumento n° 145.553-PI, relatado pe-
por este rante a Primeira Turma pelo Ministro
Untar Gaivão, cuja decisão, unânime,
Por outro lado, não é admissivel foi publicada no Diário da Justiça de
a interposição alternativa de recursos, 26 de fevereiro de 1993).»
máxime quando é indubitável o cabi-
mento de um deles, a impedir essa alter- «Recurso Extraordinário. Impugna-
natividade tácita (conversão ex officio) ção contra decisão que denegou origina-
ou expressa (conversão por pedido alter- riamente mandado de segurança: inad-
nativo), uma vez que inadmissível a missibilidade.
conversão de recursos quando há erro Em se cuidando de mandado de se-
grosseiro na interposição de um deles, gurança decidido em única instância por
como ocorre no caso concreto em que o tribunal estadual, o recurso cabível, in-
recurso interposto foi o extraordinário, dependentemente de versar ou não ma-
que levou a recorrida a defender-se téria constitucional, é o ordinário, para
com base nos pressupostos de sua ad- o Superior Tribunal de Justiça, de acor-
80 R.T.J. —158

do com o Artigo 105, II, b, da Constitui- dado de segurança proferida em única ins-
ção Federal. Agravo regimental impro- tância pelo Superior Tribunal de Justiça.
vido.» (Agravo Regimental no Agravo
de Instrumento n° 144.895-SE, relatado O que deve ser observado, na conversão,
perante a Primeira Turma, pelo Ministro é se o recurso foi apresentado no prazo do
limar Gaivão, cuja decisão, unânime, recurso a ser substituído, do recurso pró-
foi publicada no Diário da Justiça de prio. Se isso ocorreu, não me parece razoá-
20 de novembro de 1992). vel deixar de efetivar a conversão. O con-
«— Licitação. Concessão de Man- trário é que não seria possível, vale dizer,
dado de Segurança. Recurso Ordinário. não seria possível a conversão de um recur-
so ordinário em recurso extraordinário. É
— Tendo sido deferido o mandado que este tem pressupostos outros, certo que
de segurança, não cabe o Recurso Ordi- o pressuposto do recurso ordinário é apenas
nário a que alude o Artigo 102, II, a, da a sucumbência. Bem por isto, a conversão
Constituição Federal, o qual só é admis- do extraordinário em ordinário é perfeita-
sível quando denegatória a decisão
mente possível.
proferida no Mandado.
Por outro lado, não há que se preten- Não se pode perder de vista, Sr. Presi-
der, no caso, a fungibilidade do Recurso dente, o caráter instrumental do processo.
Ordinário em Extraordinário, não só
pela evidente ocorrência de erro grossei- Por outro lado, creio que não seria pos-
ro na interposição de um pelo outro, mas sível a afirmativa da ocorrência de erro
também porque o Recurso Ordinário in- grosseiro. Essa conceituação, aliás, é muito
terposto se limita as questões infracons- subjetiva e deveria ser evitada. No caso,
titucionais que estão fora do âmbito do certo é que o recurso ordinário foi criado
Recurso Extraordinário, que é adstrito a pela Constituição de 1988. Quando inter-
questões constitucionais. posto o recurso, em 1990, a Constituição
tinha menos de dois anos de vigência.
Recurso Ordinário não conhecido.»
Recurso em Mandado de Segurinça O que penso, Sr. Presidente, é que os
n° 21.079, relatado perante o Plenário Tribunais deveriam abandonar, na conver-
pelo Ministro Moreira Alves, cuja de- são dos recursos, o requisito do erro gros-
cisão, unânime, foi publicada no Diário seiro, tendo em vista, conforme falamos,
da Justiça de 25 de maio de 1990). que o conceito de erro grosseiro é muito
É o meu voto. subjetivo. O que deve ser considerado é se
foram atendidos os pressupostos próprios
do recurso e este foi interposto no prazo
VOTO
legal. Isto tendo ocorrido, em obséquio ao
caráter instrumental do processo, faça-se a
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sr. Pre- conversão. O mais, nada mais é senão a
sidente, peço licença para divergir. Tenho intelectualização do processo, com prejuí-
sustentado a possibilidade da conversão do zo para a Justiça, da qual o processo é mero
recurso extraordinário em recurso ordiná- instrumento.
rio. Na verdade, a Constituição Federal, no
art. 102, II, a, estabelece que, no caso, o Com essas breves considerações, com a
recurso cabível é o recurso ordinário, dado vênia do eminente Relator, admito a con-
que se trata de decisão denegatória de man- versão do extraordinário em ordinário.
R.T.J. — 158 81

VOTO n° 11, 1990, Saraiva), cujo magistério in-


O Sr. Ministro Celso de Mello: As clui, na compreensão das decisões denega-
decisões denegatórias do writ mandamen- tórias da ação de segurança, o_ também as
tal, quando proferidas em instância originá- que extinguem o processo sem apreciar o
ria pelos Tribunais Superiores da União, mérito».
comportam, unicamente, impugnação re- O fato inquestionável neste caso é que o
cursal que, dirigida ao Supremo Tribunal Tribunal a quo, ao julgar a ação de manda-
Federal, ativará, nos termos da Constitui- do de segurança, emitiu provimento juris-
ção, o exercício, por esta Corte, de sua dicional evidentemente denegatório da
inderrogável competência recursal ordi- concessão do writ constitucional. Nesse
nária. contexto, evidenciava-se cabível um único
Dentro do quadro normativo delineado recurso: o recurso ordinário constitucional,
pela Lei Fundamental da República, o re- que não poderia ser substituído pelo apelo
curso cabível contra decisão denegatória extremo, eis que, nesse tema, é absoluta a
de mandado de segurança proferida em indisponibilidade das formas recursais.
única instância por Tribunal Superior da De outro lado, cumpre assinalar que,
União é, somente, o recurso ordinário, mesmo que o thema decidendum envolva
interponível, nos termos do art. 102, II, a, matéria constitucional, ainda assim o meio
da Carta Política, para esta Suprema Corte. de impugnação adequado nas hipóteses de
O recurso ordinário em questão, de ín- denegação originária do mandado de segu-
dole eminentemente constitucional, não rança por Tribunal Superior da União con-
pode ser substituído por outro — no caso, tinuará sendo o recurso ordinário.
o extraordinário —, sob pena de grave
ofensa ao que dispõe, em tema de compe- O regime de interposição dessa modali-
tência recursal, a Constituição da Repú- dade recursal ordinária define-se em fun-
blica. ção do caráter negativo do pronunciamen-
to jurisdicional em sede originária de man-
A locução constitucional — «quando dado de segurança, e não em razão da na-
denegatória a decisão» — tem sentido tureza das categorias temáticas versadas na
amplo, pois não só compreende as decisões decisão denegatória do writ (RT 7121307-
dos Tribunais que, apreciando o meritum 313, Rel. Min. Celso de Mello).
amue, indeferem o pedido de mandado de
segurança, como também abrange aquelas Isso significa que, tratando-se de deci-
que, sem julgamento do mérito, operam a são denegatória de mandado de segurança
extinção anómala do processo (RTJ proferida por Tribunal Superior da União
132/718, Rel. Min. Celso de Mello). em única instância, terá pertinência, sem-
O significado dessa expressão, que se
pre, o recurso ordinário, a ser interposto
revela comum tanto às ações de habeas
para o Supremo Tribunal Federal, mes-
mo que se tenha instaurado controvérsia de
corpus quanto às de mandado de segu- índole constitucional no âmbito do proces-
rança (RTJ 72/51 — RHC 59.538, rel.
so mandamental.
Min. Rafael Mayer, 1 * Turma, DJ de
12-4-82), foi bem definido, no plano dou- Cumpre registrar, neste ponto, o auto-
trinário, pelo eminente Professor e Minis- rizado magistério de Celso Agrícola
tro Sálvio de Figueiredo Teixeira, do Su- Barbi que, ao versar o tema do recurso
perior Tribunal de Justiça («Mandado de ordinário em mandado de segurança, assi-
Segurança e de Injunção», pág. 119, item nalou, verbis:
82 R.T.J. — 158

«Outra questão a examinar é o cabi- «Ementa: Recurso extraordinário.


mento do recurso ordinário, quando a Impugnação contra decisão que dene-
decisão denegatória contrariar dispositi- gou originariamente mandado de se-
vo da Constituição, ou tiver declarado a gurança: inadmissibilidade.
inconstitucionalidade de tratado ou lei Em se cuidando de mandado de se-
federal, ou julgado válida lei ou ato de gurança decidido em única instância por
governo estadual, contestado em face da tribunal estadual, o recurso cabível, in-
Constituição. Cabe indagar se o recurso dependentemente de versar ou não
não será o extraordinário, para o Supre- matéria constitucional, é o ordinário,
mo Tribunal Federal, com base no art. para o Superior Tribunal de Justiça, de
102, III, da Constituição. acordo com o art. 105, II, b, da Consti-
Para solucionar a questão, convém tuição Federal.
lembrar que o entendimento tradicional
Agravo regimental improvido.» (Ag
é de que o recurso extraordinário só é
144.895-4 (AgRg), Rel. Min. limar
cabível contra decisões finais, isto é, que
não comportam mais recursos ordiná- Gaivão, P Turma, DJ de 20-11-92)
rios nos tribunais inferiores. Nessa linha Impõe-se uma observação final: a juris-
de pensamento, acórdãos passíveis de dição constitucional do Supremo Tribunal
recurso de embargos infringentes não Federal — não obstante a magnitude de que
eram considerados finais, e, por isso, ela se reveste no contexto da organização
não ensejavam recurso extraordinário. dos Poderes da República — não pode ser
Na atual Constituição, deve-se apli- exercida com inobservância das rígidas
car o mesmo princípio, segundo o qual prescrições normativas que, estabelecidas
o acesso ao Supremo Tribunal Federal pela Lei Fundamental, condicionam e re-
pelo recurso extraordinário só é permi- gem a atividade jurisdicional do Estado,
tido após o esgotamento das vias ordi- notadamente quando o comportamento
nárias. Assim, se o mandado de segu- processual da parte recorrente evidencia,
rança foi denegado e na decisão ocor- como no caso, procedimento claramente
re alguma das hipóteses do art. 102, tipificador de erro grosseiro e inescusá-
III, da Constituição, ainda assim o vel.
recurso é o ordinário (...).» (Revista Impende registrar, neste ponto, que se
de Processo, vol. 59/25-26 — grifei) revela inaplicável ao caso o princípio da
Esse também tem sido o entendimento fungibilidade dos recursos, o qual, embora
manifestado pela jurisprudência do Supre- subsistente em nosso sistema processual
mo Tribunal Federal: (RTJ 120/458), não atua nas hipóteses de
erro grosseiro.
«Em se cuidando de mandado de se-
gurança denegado, em única instância, Cumpre destacar que o magistério juris-
por Tribunal Estadual, o recurso cabí- prudencial dos Tribunais sempre recusou
vel, sem distinção sobre versar ou não aplicabilidade ao princípio da fungibilida-
matéria constitucional, passou a ser o de recursal naquelas hipóteses em que a
ordinário, para o Superior Tribunal de errônea interposição de um recurso por ou-
Justiça, nos termos do art. 105, II, b, da tro não se justificasse em face de preceito
Constituição em vigor.» (RTJ 128/953, normativo expresso indicativo de outra es-
Rel. Min. Octavio Gallotti, Pleno — pécie recursal juridicamente cabível e pro-
grifei) cessualmente adequada (RF 148/176 —
R.T.J. — 158 83

RF 148/179 — RF 163/215 — RT 489/105 quei, entretanto, que já se constituiu juris-


— RP 1/196 — RP 1/210 — RP 4/393). prudência no sentido de considerar erro
Idêntica é a orientação da doutrina, que, grosseiro a interposição de recurso diverso
do que, para o caso, esteja previsto na
ao admitir o recurso indiferente, consagra
Constituição.
a fungibilidade recursal como uma das
mais expressivas projeções do princípio da Se para as decisões denegatórias de
instrumentalidade das formas no âmbito da mandado de segurança, em instância única,
teoria do processo, desde que não se confi- o recurso que a Constituição prevê é o
gure hipótese reveladora de erro grosseiro ordinário, formou-se esse entendimento de
ou de má-fé da parte recorrente (Milton que interposto outro qualquer recurso, ain-
Sanseverino, «Fungibilidade dos Recur- da que mais difícil à parte, há de se consi-
sos», in Revista de Processo, vol. 25/181; derar, aí, a existência de erro grosseiro e,
José Frederico Marques, «Manual de como tal, insuscetível de invocar-se o prin-
Direito Processual Civil», vol. III/128, cípio da fungibilidade, para processá-lo
item n° 606, 1975, Saraiva; Moacyr Ama- como recurso ordinário, mais fácil à parte,
ral Santos, «Primeiras Linhas de Direito no lugar do mais difícil.
Processual Civil», vol. 3/82, 1979, Sarai- Acompanho, destarte, o eminente Mi-
va; Sérgio Bermudes, «Comentários ao nistro-Relator, negando provimento ao
Código de Processo Civil», vol. VII/44, item agravo.
n° 26-A, 2' ed., 1977, RT, inter plures).
Concluo o meu voto, Sr. Presidente. EXTRATO DA ATA
Tendo presentes as razões expostas e
considerando a ocorrência, na espécie, de RMS 21.336 (AgRg) — DF — Rel.:
inquestionável situação caracterizadora de Min. Marco Aurélio. Agtes.: Confederação
erro grosseiro, peço vênia para negar pro- Nacional dos Trabalhadores em Estabele-
vimento ao agravo ora interposto. cimentos de Educação e Cultura —
É o meu voto. CNTEEC e outros (Adv.: Marisa Schutzer
Del Nem Poletti). Agdos.: União Federal e
VOTO Sindicato Nacional dos Docentes das Insti-
tuições de Ensino Superior — ANDES —
Sindicato Nacional (Advs.: Roberto de Fi-
O Sr- Ministro Néri da Silveira: Sr. gueiredo Caldas e outros).
Presidente. O recurso extraordinário, em
que a parte deve demonstrar a satisfação Decisão: A Turma, por unanimidade,
dos requisitos previstos na Constituição por proposta do Ministro Paulo Brossard,
para o cabimento do apelo extremo, é, sem determinou a remessa dos autos ao Plenário
dúvida, mais oneroso ao recorrente, pois para exame da subsistência da Súmula 272,
poderia valer-se do recurso ordinário, que em face da nova ordem constitucional. Au-
é de efeito devolutivo sem maior discussão sente, justificadamente, o Ministro Fran-
quanto a pressupostos específicos de ad- cisco Rezek. 2' Turma, 26-5-92.
missibilidade. Assim se procedia no senti- Decisão: Por maioria de votos, o Tribu-
do de determinar o processamento, como nal negou provimento ao agravo regimen-
recurso ordinário, de eventual recurso ex- tal, vencido o Ministro Carlos Velloso, que
traordinário interposto, sem necessidade lhe dava provimento. Votou o Presidente.
do despacho de admissibilidade. Verifi- Impedido o Ministro limar Gaivão.
84 R.T.J. — 158

Presidência do Senhor Ministro Octa- e Francisco Rezek. Procurador-Geral da


vio Galloti. Presentes à Sessão os Senho- República, Dr. Aristides Junqueira Alva-
res Ministros Moreira Alves, Néri da Sil- renga.
veira, Sydney Sanches, Paulo Brossard,
Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Car- Brasília, 31 de agosto de 1994 — Luiz
los Velloso, Marco Aurélio, Ilmar Galvão Tomimatsu, Secretário.

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.491 (AgRg) — DF


(Segunda Turma)
(RMS na RTJ 143/880)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Agravante: Paulo de Tarso dos Santos Siqueira — Agravado: Ministro da
Agricultura e Reforma Agrária
Constitucional. Processual Civil. Competência originária:
STF e STJ. Recurso ordinário. CF, art. 105, I, b; art. 102, II, a.
Mandado de segurança contra ato praticado por Minis-
tro de Estado: competência originária do STJ (CF, art. 102, I, b), com
recurso ordinário para o STF, se denegatória a decisão (CF, art. 102,
II, a).
«Exceção de incompetência» do STF, oposta pelo impe-
trante da segurança denegada pelo STJ, para julgar o recurso ordinário
constitucional (CF, art. 102, II, a), evidentemente despropositada, pelo
que negou-se-lhe trânsito, improvido, pela Turma, o agravo regimental.
III. Agravo regimental não provido.

ACÓRDÃO RELATÓRIO

O Sr. Ministro Carlos Velloso: Publi-


Vistos, relatados e discutidos estes au- cado o acórdão que negou provimento ao
tos, acordam os Ministros do Supremo recurso ordinário interposto pelo impetran-
Tribunal Federal em Segunda Turma, na te, Paulo de Tarso dos Santos Siqueira,
conformidade da ata do julgamento e das este, pela petição de fls. 160/161, interpôs
notas taquigráficas, por decisão unâni- «exceção de incompetência» do Supremo
me, negar provimento ao agravo regi- Tribunal Federal «para se pronunciar sobre
mental, nos termos do voto do Ministro qualquer matéria de mérito no feito», ao
Relator. mesmo tempo em que interpõe embargos
de declaração, exceção a que neguei segui-
Brasília, 8 de fevereiro de 1994 —Néri mento.
da Silveira, Presidente — Carlos Velloso,
Relator. Assim a decisão agravada:
R.T.J. — 158 85

«Trata-se de mandado de segurança são. Diz que aquele Ministro relator «ex-
impetrado contra ato do Ministro de Es- cluiu o Senhor Presidente da República da
tado da Agricultura e Reforma Agrária, relação processual sem verificar que o Sr.
que, segundo o impetrante, o demitiu, Ministro (da Agricultura) era, nada mais
sem justa causa. A segurança foi impe- que delegado do Mandatário Supremo da
trado perante o Egrégio Superior Tribu- Nação...» e que aquele Ministro relator que
nal de Justiça, que dela não conheceu, veio a ser nomeado para o cargo de Minis-
por entender que o writ foi ajuizado tro de Estado da Justiça, «amigo que era do
após transcorrido o prazo do art. 18 da Exmo. Sr. Pres. da Rep. conforme preceitua
Lei n° 1.533/51 (decadência do direito à o artigo 135, caput, incisos: I, IV e V do
impetração). Inconformado com a deci- CPC não se valeu oportunamente do parág.
são, o impetrante, em causa própria, in- ún. do mesmo artigo retrocitado, tal suspei-
terpôs recurso ordinário para esta Corte, ção alcança, sem dúvidas a turma toda por
que negou provimento ao apelo (fls. ter havido votos em separados». Depois de
150/158). O Supremo Tribunal Federal, dizer que «o relator, DD., ex-Ministro desta
portanto, não decidiu a causa originaria- Corte Suprema: no que tange ao MS n°
mente, dado que a competência originá- 21.224-1 incidiu em suspeição é nulo o
ria, neste caso, é do Superior Tribunal aresto...» e que «a Súmula 430 está preju-
de Justiça. No STJ, repita-se, o writ foi dicada pela 346, 429 e 510 do STF», requer
aforado. O STJ não conheceu da segu- seja dado provimento ao presente recurso,
rança, porque foi ela aforada após o para ver «reconhecida incompetência desta
transcurso do prazo de 120 dias do art. Excelsa Corte conhecer do mérito mas tão-
18 da Lei n° 1.533/51. Interposto o re- somente a tempestividade, c/consta dos
curso ordinário constitucional para o Embargos Declaratórios».
STF (CF, art. 102, II, a), foi o apelo É o relatório.
improvido.
Posta assim a questão, verifica-se VOTO
que a «exceção de incompetência»
oposta não passa de um despautério. O Sr. Ministro Carlos Venoso (Rela-
tor): A decisão que originou o presente
Do exposto, indefiro o requerido. Pu- agravo regimental, às fls. 182/183, tem o
blique-se. Após, julgado o recurso de seguinte teor:
embargos de declaração.»
«Vistos. Publicado o acórdão que ne-
Publicada a decisão, interpôs Paulo de gou provimento ao recurso ordinário in-
Tarso dos Santos Siqueira agravo regimen-
terposto pelo impetrante, Paulo de Tarso
tal (fls. 186/190), afirmando que pretende,
dos Santos Siqueira, este, pela petição
com a interposição desse recurso, levar o
de fls. 160/161, interpõe «exceção de
feito ao Plenário desta Corte, «visto que a
incompetência» do Supremo Tribunal
incompetência é do Tribunal e não turma
Federal «para se pronunciar sobre qual-
ou órgão qualquer...».
quer matéria de mérito no feito», ao
Em petição confusa, em que o recorrente tempo em que interpõe embargos de
se reporta ao Mandado de Segurança n° declaração. Sustenta que o Supremo
21.224-1, impetrado anteriormente, de que Tribunal não é competente para conhe-
foi relator o então Ministro Célio Borja, cer e julgar «no mérito Mandado de
afirma que esse mandamus foi requerido Segurança contra ato de Ministros de
116 dias após a publicação do ato de demis- Estado». (Sic). Ressalta que o Supremo
86 R.T.J. — 158

Tribunal Federal, julgando o MS n° Do exposto, indefiro o requerido. Pu-


21.224-1 (AgRg)-DF, Relator o Sr. Mi- blique-se. Após, julgado o recurso de
nistro Célio Borja, decidiu que, tratan- embargos de declaração.» (fl. 182)
do-se de mandado de segurança contra Preliminarmente, há de ser retificado
ato de Ministro de Estado, não tem o um equívoco constante da decisão agrava-
STF competência originária. Assim,
da. E que o impetrante não está advogando
conclui: em causa própria. O advogado do impe-
`Desta arte espera o excipiente trante é o Sr. Alcibíades Siqueira, que jun-
que o STF se dê por incompetente, tou aos autos, por determinação minha, có-
apreciando tão-somente a tempesti- pia xerox de sua carteira de identidade fun-
vidade geradora da decadência do di- cional expedida pela OAB-DF e OAB-RJ
reito. Remetendo os autos ao V. Sup. (fls. 195/196).
T. de Jst. para julgamento de Mérito. Feita a retificação do equívoco, estou
Requer-se V. a Douta PGR.» (sic). em que a decisão agravada é de ser mantida.
Posto isto, decido. O que acontece é que o Supremo Tribu-
Trata-se de mandado de segurança nal Federal decidiu não ter competência
impetrado contra ato do Ministro de Es- para julgar, originariamente, o MS n°
tado da Agricultura e Reforma Agrária, 21.224-DF, de que foi Relator o eminente
que, segundo o impetrante, o demitiu, Ministro Célio Boda, porque o ato impug-
sem justa causa. A segurança foi impe- nado fora praticado por Ministro de Estado.
trada perante o Egrégio Superior Tribu- Neste caso, a competência originária é do
nal de Justiça, que dela não conheceu, STJ (CF, art. 105, I, h). O ora agravante,
por entender que o writ foi ajuizado diante da decisão, impetrou a segurança
após transcorrido o prazo do art. 18 da perante o STJ, que dela não conheceu, por
Lei n° 1.533/51 (decadência do direito à intempestividade. O impetrante, ora agra-
impetração). Inconformado com a deci- vante, interpôs o recurso ordinário consti-
são, o impetrante, em causa própria, in- tucional para o STF, na forma do disposto
terpôs recurso ordinário para esta Corte, no art. 102, II, a. O Supremo Tribunal,
que negou provimento ao apelo (fls. julgando referido recurso, ao mesmo negou
150/158). O Supremo Tribunal Federal, provimento, vale dizer, confirmou a deci-
portanto, não decidiu a causa originaria- são do STJ (fls. 150/158). Não ocorre, é
mente, dado que a competência originá- bem de ver, a alegada incompetência do
ria, neste caso, é do Superior Tribunal Supremo Tribunal Federal, não passando a
de Justiça. No STJ, repita-se, o writ foi «exceção de incompetência», oposta pelo
aforado. O STJ não conheceu da segu- ora agravante, de um despautério. Devem
rança, porque foi ela aforada após o ser repelidas, de outro lado, as gratuitas
transcurso do prazo de 120 dias do art. agressões dirigidas ao eminente Ministro
18 da Lei n° 1.533/51. Interposto o re- Célio Borja, que foi relator do citado MS
curso ordinário constitucional para o 21.224-DF. Verificando o eminente Rela-
STF (CF, art. 102, II, a), foi o apelo tor, que o ato fora praticado pelo Ministro
improvido. de Estado, simplesmente reconheceu a in-
Posta assim a questão, verifica-se competência originária do Supremo Tribu-
que a «exceção de incompetência» nal, decisão que foi confirmada pelo Plená-
oposta não passa de um despautério. rio (fls. 170/173). Cópias das razões de fls.
R.T.J. — 158 87

160/161, da decisão de fls. 182/183, das Santos Siqueira (Adv.: Alcibiades Siquei-
ralhes de fls. 186/190, da petição de fl. 194, ra). Agdo.: Ministro da Agricultura e Re-
e dos documentos de fls. 195/196, deverão forma Agrária.
ser encaminhadas à Ordem dos Advogados Decisão: Por unanimidade, a Turma ne-
do Brasil, Seção do Distrito Federal, para gou provimento ao agravo regimental, nos
os devidos fins. termos do voto do Ministro Relator.
Do exposto, nego provimento ao agravo Presidência do Senhor Ministro Néri da
regimental, determinando que sejam reme- Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
tidas, ao Sr. Presidente da OAB, Seção do Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso,
Distrito Federal, as cópias acima indicadas. Marco Aurélio e Francisco Rezek. Subpro-
EXTRATO DA ATA curador-Geral da República, o Dr. Cláudio
Lemos Fonteles.
RMS 21.491 (AgRg) — DF — Rel.: Mia Brasília, 8 de fevereiro de 1994 —José
Carlos Velloso. Agte.: Paulo de Tarso dos Wilson Aragão, Secretário.

MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.635 — PE


Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso
Impetrante: João Lopes Filho — Impetrado: Presidente da República
Constitucional. Administrativo. Funcionário. Demissão. Pro-
cedimento administrativo. Cerceamento de defesa Lei n° 8.112/90, art.
132, XIII e art. 117, IX.
Sindicância e procedimento administrativo disciplinar:
distinção, certo que aquela é, de regra, medida preparatória deste (Lei
n° 8.112/90, artigos 143, 145, 154).
Inocorrência de prova no sentido da ocorrência de cercea-
mento de defesa.
M. Mandado de Segurança indeferido.
ACÓRDÃO RELATÓRIO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata-
acordam os Ministros do Supremo Tribunal se de mandado de segurança impetrado
Federal, em Sessão Plenária, na conformida- por João Lopes Filho, contra ato do Se-
de da ata do julgamento e das notas taquigrá- nhor Presidente da República, que o demi-
ficas, por decisão unânime, indeferir o pedido tiu do cargo de Médico Veterinário do
de mandado de segurança. Ausente, ocasio- Ministério da Agricultura e Reforma
nalmente, o Ministro Binar Gaivão. Agrária por ter-se valido do cargo em pro-
veito de terceiros, em detrimento da digni-
Brasília, 10 de fevereiro de 1994 — dade da função pública, com fundamento
Octavio Gallotti, Presidente — Carlos no art. 132, MIL c/c art. 117, IX, da Lei n°
Velloso, Relator. 8.112/90.
88 R.T.J. — 158

Alega o impetrante que, funcionário fe- não era favorável à demissão do acusa-
deral há 23 anos, foi intimado a responder do/impetrante».
a um processo administrativo, instaurado Requer, por fim, seja reintegrado no car-
para apurar várias irregularidades que teria go de que foi demitido, até que lhe seja
praticado no exercício da função de Diretor assegurada ampla defesa no processo ad-
Federal do Ministério da Agricultura, pe- ministrativo disciplinar, e que lhe seja for-
rante a Diretoria, para o qual havia sido necida cópia autêntica do referido pro-
nomeado há menos de cinco meses. Diz cesso.
que as acusações que pesavam contra ele
eram infundadas, feitas por pessoas que Sem liminar, as declarações foram pres-
tinham contra ele ressentimento, em razão tadas às fls. 34/42, em que se ressalta que
de sua atuação no sentido de moralizar o «o processo disciplinar foi submetido à
Serviço de Inspeção Federal. A instauração apreciação do Departamento de Recursos
do processo administrativo foi precedido Humanos da Secretaria da Administração
de uma sindicância, em que pessoas foram Federal, que emitiu parecer favorável às
ouvidas e diligências foram feitas, sem a conclusões do relatório supra citado», e
participação do ora impetrante ou de seu que, «da mesma forma manifestou-se a
advogado, com ofensa ao princípio do con- Consultoria Jurídica do Ministério, antes
da edição do ato de demissão do impetran-
traditório. Argüiu, por isso, a suspeição dos
te». Salientam, ainda, as informações que,
membros da comissão, o que não foi apre-
contrariamente ao que afama o impetrante,
ciado em.nenhuma instância da tramitação
foi-lhe «concedido o mais amplo direito de
do processo, por entender que as provas defesa e ao contraditório, conforme faz
colhidas na fase da sindicância deveriam prova as cópias das principais peças do
ser repetidas no processo com a sua pre- processo administrativo, fornecidas pelo
sença ou de seu advogado. Sustenta ter Ministério da Agricultura, do Abasteci-
ocorrido cerceamento de defesa, já que na mento e da Reforma Agrária...».
defesa que apresentou no processo admi-
nistrativo requereu várias providências, O Ministério Público Federal oficiou às
não atendidas, como sejam: a) nova 'histo- fls. 111/113, opinando pela denegação da
ria nos matadouros, feita por outra comis- segurança, por entender que «não há nos
são; b) audiência das testemunhas ouvidas autos prova nenhuma do alegado cercea-
na sindicância, agora com a sua presença mento de defesa, caracterizado por não te-
ou de seu advogado; c) audiência de pelo rem sido repetidas as provas colhidas no
menos uma das duas testemunhas que indi- curso da sindicância», mesmo porque não
cou, exatamente o atual diretor que o subs- existe previsão quanto a essa repetição (Lei
tituiu, Luiz Gonzaga de Matos Oliveira n° 8.112/90, art. 154, caput) nem o impe-
Filho; d) cópia de peças do processo. trante fez prova de que a requereu e que o
indeferimento fora imotivado. No tocante à
Ressalta o impetrante que nunca sofreu argüição de suspeição da Comissão, o im-
qualquer punição em sua vida funcional e petrante atribui a ela a competência de jul-
que «um dos membros da mencionada co- gar, que ela não tem. Também nesse caso,
missão, em voto em separado, discordando o impetrante não apresentou prova de que
dos outros membros deixava bem claro que a Comissão não se tenha conduzido com
as possíveis irregularidades (em verdade independência e imparcialidade. Lembra o
inexistentes) não eram de culpa do impe- parecer que a sindicância não tem caráter
trante, e sim que era muito antigas, e que contraditório, «não se justificando a parti-
R.T.J. — 158 89

cipação do acusado, figura que ainda não tivo disciplinar (Lei n° 8.112/90, art. 143).
surgiu». Não tem, por isso, o impetrante Quer dizer, a sindicância tem por escopo
direito liquido e certo «à reiteração dos atos confirmar a ocorrência da irregularidade, o
desse procedimento, precedida da reinte- seu autor, se isto se confirmar, instaura-se,
gração no cargo do qual foi demitido». então, o processo administrativo discipli-
No tocante à requisição de cópia dos nar, (Lei nc. 8.112/90, art. 145, III), certo
autos do processo, entende que a postula- que da sindicância poderá resultar o arqui-
ção não se justifica, por não ter o impetrante vamento do processo — na verdade a sua
feito prova da impossibilidade «de acesso não instauração (Lei n° 8.112/90, art. 145,
aos autos por motivo imputável à Adminis- I) — ou a aplicação de penalidade de ad-
tração Pública (art. 6°, parágrafo único, da vertência ou suspensão de até trinta dias
Lei n° 1.533, de 31 de dezembro de 1951); (Lei n's 8.112/90, art. 145, II). No caso, da
pelo contrário, os documentos de fls. sindicância resultou a instauração do
104/106 demonstram que tal acesso lhe foi processo disciplinar (Lei 8.112/90, art.
facultado, por extração das peças que dese- 145, lin.
jasse». Não há, na lei, a exigência de serem
É o relatório. repetidas, no procedimento administrativo
disciplinar, as provas colhidas na sindicân-
VOTO cia. O que a lei estabelece é que os autos da
sindicância integrarão o procedimento dis-
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela- ciplinar, como peça informativa da instru-
tor): A impetração visa a nulidade do ato do ção, nada mais (Lei na 8.112/90, art. 154).
Sr. Presidente da República que demitiu o O fato, portanto, de não terem sido repeti-
impetrante do serviço público, por valer-se das, no procedimento administrativo, as
do cargo para lograr proveito de outrem, em provas colhidas na sindicância, não carac-
detrimento da dignidade da função públi- terizaria cerceamento de defesa, convindo
ca, ato praticado com base no art. 132, XIII, registrar, de outro lado, que o impetrante
c.c. com o art. 117, IX, da Lei n" 8.112, de não trouxe para os autos qualquer prova no
11-12-90. sentido de que requerera a repetição das
Sustenta ter ocorrido, no procedimento provas e que a Comissão indeferira, imoti-
administrativo disciplinar, cerceamento de vadamente, a sua pretensão. No ponto, as
sua defesa, cerceamento de defesa que se informações esclarecem que o impetrante
caracterizaria: a) por não terem sido repe- defendeu-se amplamente, tendo produzido
tidas as provas colhidas no curso da sindi- provas, inclusive prova testemunhal (fl. 37,
cância, sem sua presença nem a de seu fl. 42, fl. 51, fls. 54/72).
advogado (fls. 5/6); b) pela falta de exame
da alegada suspeição da Comissão que con- A alegada suspeição da Comissão, por
duziu o procedimento disciplinar. motivo de parcialidade, não tem, na verda-
de, a extensão preconizada. Escreve, a pro-
Abrindo o debate, registro que o proce- pósito, a Subprocuradora-Geral afilia da
dimento administrativo disciplinar instau- Luz Oliveira, no parecer que ofereceu pela
ra-se de regra, após realização de sindicân- Procuradoria-Geral da República:
cia. Esta é, na verdade, um procedimento
preparatório daquele. A autoridade, tendo «Quanto à alegada suspeição da Co-
ciência de irregularidade no serviço públi- missão, por motivo de parcialidade, é
co, promove a sua apuração imediata, me- certo que o impetrante atribui a esse
diante sindicância ou processo administra- órgão uma competência que não tem: a
90 R.T.I. — 158

de julgar. É verdade que lhe cabe con- existe parcialidade; é mera fantasia de
duzir o procedimento com independên- defesa;
cia e imparcialidade (art. 150 da Lei n° d) Nada procede, enfim das alega-
8.112, de 11 de dezembro de 1990), mas ções formuladas, de ordem processual.»
nada se prova em contrário, no caso. (fls. 61/62)
Também é certo que a Comissão, à qual
a defesa é dirigida, ainda que o julga- Ressalvo ao impetrante, no que toca ao
mento não seja atribuição sua, exami- tema do cerceamento de defesa, entretanto,
nou a questão suscitada pelo impetrante as vias ordinárias, onde poderá fazer prova
(fls. 61/62).» (fl. 112). do que alega.
No ponto, houve alegação de parcialida- Do exposto, com a ressalva acima, inde-
de da Comissão, mera alegação com base firo o writ.
em elementos subjetivos, pelo fato de a VOTO
Comissão, certamente pelo que apurou na
sindicância, ter feito certas afirmativas em O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor
detrimento do impetrante (fls. 48/49). A Presidente, vou retratar o que percebi do
Comissão, no seu relatório, deu resposta à caso, para não incidir em equívoco
alegação: Pelas premissas lançadas pelo nobre Re-
«Em princípio, pode-se reportar o lator, houve a sindicância e as provas nela
leitor às mesmas considerações de or- colhidas não foram repetidas, quando do
dem processual tecidas por esta Comis- processo administrativo disciplinar pro-
são quando da análise da defesa de Ade- priamente dito. Por sua vez, o envolvido
mar da Rocha Torres, entretanto, cum- também não requereu essa repetição. Ocor-
pre, ainda, mais algumas observações: re que se chegou a um parecer positivo
quanto à transgressão disciplinar não com
A Comissão não julga, apenas base naqueles elementos contidos no pro-
apura, conclui e propõe a autoridade cesso de sindicância,mas com esteio em
instauradora-julgadora; logo, quem não prova feita pela Administração Pública,
julga não tem como prejulgar; relativamente à participação dos Impe-
A indicação, em seus termos, trantes.
constitui o que a Comissão apurou e Corretas estas premissas, acompanho o
concluiu pelo até então apurado, é peça voto do Senhor Ministro Relator, indeferin-
acusatória, e, como tal, deve acusar; o do o mandado de segurança, porque, se o
patrono do indiciado confunde acusa- pronunciamento que deu ensejo à punição
ção com julgamento; estivesse fundamentado apenas nas provas
colhidas unilateralmente, não teria a menor
c) Não se verifica a parcialidade da
dúvida em declarar o vício do processo
Comissão, como alega a defesa. Na ver-
administrativo disciplinar.
dade, todos os atos da Comissão segui-
ram as formalidades legais. A Comissão VOTO
acusou (indicação — confundida pela
Parte com julgamento), abriu prazo re- O Sr. Ministro Moreira Alves: Sr. Pre-
gular para defesa, atendeu solicitações sidente, também acompanho o Sr. Ministro
da parte, garantiu o exercício do direito Relator, porque, à semelhança do que
de defesa em toda sua amplitude; onde ocorre no processo penal com referência à
está a parcialidade? na acusação? não investigação policial, o mesmo sucede, em
R.T.J. — 158 91

se tratando de inquérito administrativo, Decisão: Por votação unânime, o Tribu-


quanto à sindicância que o antecede, que é nal indeferiu o pedido de mandado de se-
apenas peça informativa da instrução do gurança. Votou o Presidente. Ausente, oca-
inquérito, não havendo exigência legal de, sionalmente, o Ministro Ilmar Gaivão.
neste, serem reproduzidas as provas colhi-
Presidência do Senhor Ministro Octavio
das naquele, sem ser o requerimento de sua
Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
repetição indeferido, sem motivação corre-
Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
ta, pela comissão de inquérito.
Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlve-
Indefiro, portanto, a segurança. da Pertence, Carlos Velloso, Marco Auré-
lio, Ilmar Gaivão e Francisco Rezek. Au-
EXTRATO DA ATA sente, justificadamente, o Ministro Celso
de Mello. Procurador-Geral da República,
MS 21.635 — PE — Rel.: Min. Carlos Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
Velloso. Impte.: João Lopes Filho (Adv.:
Paulo de Tarso Almeida Saihg). Impdo.: Brasília, 10 de fevereiro de 1994 —
Presidente da República. Luiz Tomimatsu, Secretário.

MANDADO DE SEGURANÇA N • 21.683 — Ri


(Tribunal Pleno)

Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves


Impetrantes: Edalva Araujo Teixeira e outros — Impetrados: Tribunal de
Contas da União e Presidente da Fundação Legião Brasileira de Assistência
Mandado de segurança. Legitimidade passiva ad causam.
Incompetência.
— Ao concluir, recentemente, o julgamento do Mandado de
Segurança n° 21.462, o Plenário desta Corte firmou o entendimento de
que as recomendações do Tribunal de Contas à autoridade administra-
tiva, feitas em conversão de julgamento de legalidade de aposentadoria
em diligência, não obrigam esta a rever o ato administrativo de concessão
de aposentadoria para ajustá-lo a tais recomendações, razão por que, se
a autoridade administrativa os rever para fazer esse ajuste, não está ela
atuando como mera executadora material das recomendações do Tribu-
nal de Contas, mas, sim, é a autoridade que responde pela prática do ato
administrativo de ajuste. Conseqüentemente, a autoridade coatora não
é o Tribunal de Contas, mas a autoridade administrativa, razão por que
aquele não tem legitimidade passiva para figurar como coator em man-
dado de segurança contra o ato de ajuste por parte da autoridade
administrativa, que, esta sim, tem tal legitimidade passiva ad causam.
— Exclusão do Tribunal de Contas da União da presente
relação processual, por não ser ele legitimado passivo ad causam.
92 R.T.J. — 158

— Incompetência do Supremo Tribunal Federal para julgar


originariamente mandado de segurança contra a Presidente da Legião
Brasileira de Assistência (art. 102, I, d, da Constituição Federal).
Mandado de segurança não conhecido, determinando-se a
remessa dos autos à Seção Judiciária da Justiça Federal no Distrito
Federal.

ACÓRDÃO conto parcelado das importâncias já


pagas.
Vistos, relatados e discutidos estes au- Insurgem-se, também, contra porta-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- ria da Presidência da LBA, que deu
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- cumprimento a tal deliberação.
formidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade de votos, Afirmando que tais vantagens são
em não conhecer do pedido de mandado de compatíveis com o novo ordenamento,
segurança com relação ao Tribunal de Con- alegam os impetrantes que, mesmo na
tas da União e determinar a remessa dos vigência da Lei n° 8.112, de 11 de de-
autos à Seção Judiciária da Justiça Federal zembro de 1990, continuaram a receber
do Distrito Federal, competente para o julga- as gratificações em causa, que se haviam
mento do pedido, quanto ao Presidente da incorporado à remuneração por força de
Fundação Legião Brasileira de Assistência. decisões administrativas. Por isso, as
deliberações aqui impugnadas ofendem
Brasília, 11 de março de 1994 — Octa- direito adquirido e os princípios da iso-
vio Gallotti, Presidente —Moreira Abres, nomia e da irredutibilidade de venci-
Relator. mentos.
RELATÓRIO Indeferida a liminar, foram prestadas
informações.
O Sr. Ministro Moreira Alves (Rela-
tor): Assim expõe e aprecia o presente man-
dado de segurança o parecer da Procurado-
ria-Geral da República, de autoria da Dra. O mandado de segurança não com-
Odília Ferreira da Luz Oliveira: porta conhecimento quanto à impetrante
«Edalva Araujo Teixeira e outras Denize Padrão de Campos, que não
77 pessoas, qualificadas como servido- comprovou a qualidade lie servidora da
res ativos ou inativos da Fundação Le- entidade (fls. 116/137), ou seja, a titula-
gião Brasileira de Assistência — LBA ridade de direito líquido e certo ferido
ou, ainda, pensionistas de ex-servidores, por ato dos impetrados.
impetram mandado de segurança contra A Presidente da LBA, nas informa-
deliberação do Tribunal de Contas da ções, aponta sua ilegitimidade para figu-
União que, em procedimento de registro rar no feito. Esta preliminar não proce-
de aposentadorias, recomendou o corte de, pois, ainda que o ato de sua autoria
de certas vantagens financeiras obtidas seja mero cumprimento de decisão do
sob o anterior regime da legislação tra- Tribunal de Contas da União (como me
balhista e incompatíveis com o novo parece ser), deve-se levar em conta o
regime estatutário, determinando o des- fato de que eventual ordem de restabe-
R.T.J. — 158 93

lecimento das vantagens deverá ser di- IV


rigida a ela e não à Presidência da Corte Em face do exposto, opino:
de Contas, à qual apenas se poderá de-
terminar que efetue o registro das apo- pelo não-conhecimento do man-
sentadorias dos impetrantes atingidos dado de segurança quanto à impetrante
pela recusa. Denize Padrão de Campos;
pela denegação relativamente aos
Iu demais impetrantes, ante a legalidade
dos atos impugnados e a inexistência de
direito ao que pedem.» (fls. 169/171)
No mérito, é certo que a mudança de Em face de petição de Denize Padrão
regime jurídico impede a manutenção Campos, que juntou contracheque para de-
de vantagens previstas no anterior, monstrar sua qualidade de servidora da Le-
quando não consagradas no novo. Os gião Brasileira de Assistência, abri nova
direitos, deveres e vantagens dos servi- vista à Procuradoria-Geral da República,
dores públicos devem estar, necessaria- que, por seu eminente titular, assim voltou
mente, previstos em lei; portanto, extin- a manifestar-se:
to o regime que os consagrava, eles tam-
bém se extinguem. Não há como manter «O Ministério Público Federal,
vivo (ou ressuscitar) algo que desapare- tendo em vista o r. despacho de fls. 176,
ceu do mundo jurídico (para os servido- vem se manifestar no sentido de que o
res públicos federais arrolados no art. documento juntado, serodiamente, pela
243 da Lei n° 8.112/90). impetrante Denize Padrão Campos, à
fls. 175, pode ter o condão de ilidir a
A partir do ingresso no novo regi- preliminar de ilegitimidade ativa, levan-
me, por força de lei, os servidores pas- tada no parecer anterior deste órgão do
saram a ter direito apenas às vantagens Ministério Público, permanecendo, en-
nele previstas e nas condições por ele tretanto, inatacável o mérito, objeto de
dispostas. Não há direito adquirido à análise do mesmo parecer, cuja ratifica-
manutenção de regime jurídico que não ção, por isso, se impõe.» (fl. 178)
mais vigora e nem à cumulação das É o relatório.
vantagens nele tratadas com as instituí-
das pelo novo ordenamento. Eventuais VOTO
decisões administrativas e judiciais
proferidas com base nas previsões do
antigo regime perdem a eficácia com o O Sr. Ministro Moreira Alves (Rela-
desaparecimento deste. tos): 1. Ao concluir, recentemente, o julga-
mento do Mandado de Segurança n°
Por sua vez, a irredutibilidade de 21.462, o Plenário desta Corte fumou o
vencimentos não assegura ao servidor a entendimento de que as recomendações do
percepção de vantagens ilegais. Tribunal de Contas à autoridade adminis-
Também não socorre os impetrantes trativa, feitas em conversão de julgamento
a invocação do princípio da isonomia de legalidade de aposentadoria em diligên-
com o objetivo de assegurar-lhes vanta- cia, não obrigam esta a rever o ato adminis-
gens que os demais servidores não têm trativo de concessão de aposentadoria para
nem podem ter, exatamente porque não ajustá-lo a tais recomendações, razão por-
previstas nas leis pertinentes. que, se a autoridade administrativa os rever
94 R.T.J. — 158

para fazer esse ajuste, não está ela atuando jurídica do ato, a evitar a medida
como mera executadora material das reco- radical da recusa de registro da apo-
mendações do Tribunal de Contas, mas, sentadoria concedida.
sim, é a autoridade que responde pela prá- Mais do que mero poder implíci-
tica do ato administrativo de ajuste. Conse- to, essa atribuição decorre de norma
qüentemente, a autoridade coatora não é o expressa de competência que, inscri-
Tribunal de Contas, mas a autoridade ad- ta no artigo 71, IX, da Constituição,
ministrativa, razão por que aquele não tem autoriza o Tribunal de Contas da
legitimidade passiva para figurar como União a 'assinar prazo para que o
coator em mandado de segurança contra o órgão ou entidade adote as providên-
ato de ajuste por parte da autoridade admi- cias necessárias ao exato cumpri-
nistrativa, que, esta sim, tem tal legitimida- mento da lei, se verificada a ilegali-
de passiva ad causam. dade'.
No voto que proferi no julgamento desse Se, no entanto, o órgão de que
Mandado de Segurança 21.462, e que se proveio o ato juridicamente viciado
tornou vencedor, salientei: — agindo nos limites de sua esfera
«Examinando a questão preliminar de competência — recusar-se a dar
de saber se pode, ou não, o Tribunal de execução à diligência ordenada pelo
Contas da União converter em diligên- Tribunal de Contas da União, reafir-
cia o julgamento, para fins de registro, mando, desse modo, o seu entendi-
da legalidade da concessão, a fim de mento quanto à plena legalidade da
determinar que o órgão concedente da concessão da aposentadoria, ensejar-
aposentadoria a altere em um ou em se-á, então, à Corte de Contas, o exer-
alguns pontos, o eminente relator, acen- cício de sua competência constitu-
tuando que a atual Constituição ampliou cional, cabendo-lhe ordenar, ou não,
os poderes do referido Tribunal, susten- o registro do ato de inativação'.
ta que essa conversão do julgamento em Com a devida vênia, não me parece
diligência é possível, embora possa o que essa colocação se coadune com o
órgão administrativo a que tal determi- texto constitucional.
nação se dirige recusar-se a cumpri-la.
A propósito, diz o eminente relator: Observo, em primeiro lugar, que, no
tocante à apreciação, para fins de regis-
'Nada impede, contudo, que o tro, da legalidade da concessão de apo-
Tribunal de Contas da União — es- sentadoria, não houve nenhuma modifi-
pecialmente ante a ampliação do es- cação nos poderes do Tribunal de Con-
paço institucional de sua atuação fis- tas da União, tendo em vista a Emenda
calizadora — determine, em consta- Constitucional n° 1/69 (com a modifica-
tando a ocorrência de vício de legali- ção introduzida pela Emenda Constitu-
dade no ato concessivo da aposenta- cional n° 7/77) e a atual Constituição.
doria, que se proceda à correção do Com efeito, já o parágrafo 5° do artigo
defeito jurídico verificado. 72 da Emenda Constitucional n° 1/69
Essa providência, ordenada pelo preceituava:
Tribunal de Contas da União, desti- `§ 5°. O Tribunal, de ofício ou
na-se, a partir da possibilidade que se mediante provocação do Ministério
enseje ao órgão administrativo de sa- Público ou das auditorias financeiras
nar os vícios que infirmam a validade e orçamentárias e demais órgãos au-
R.T.J. — 158 95

xiliares, se verificar a ilegalidade de Lei Orgânica do Tribunal de Contas (Lei


qualquer despesa, inclusive as decor- n° 8.443, de 16 de julho de 1992) deter-
rentes de contratos, deverá: mina em seu artigo 40, que disciplina o
assinar prazo razoável para processo concernente aos atos sujeitos a
que o órgão da administração pública registro:
adote as providências necessárias ao 'Art. 40. O Relator presidirá a
exato cumprimento da lei; instrução do processo, determinan-
sustar, se não atendido, a exe- do, mediante despacho singular, por
cução do ato impugnado, exceto em sua ação própria e direta, ou por pro-
relação a contrato; vocação do órgão de instrução ou do
Ministério Público junto ao Tribunal,
a adoção das providências considera-
E, no parágrafo 7° (com a modifica- das necessárias ao saneamento dos
ção introduzida pela Emenda Constitu- autos, fixando prazo, na forma esta-
cional n° 7/77), estabelecia: belecida no Regimento Interno, para
7°. O Tribunal de Contas o atendimento das diligências, após
apreciará, para fins de registro, a le- o que submeterá o feito ao Plenário
galidade das concessões iniciais de ou à Câmara respectiva para decisão
aposentadorias, reformas e pensões, de mérito.'
independendo de sua apreciação as
melhorias posteriores.' O saneamento do processo (a Lei
alude a saneamento dos autos) se fará
A atual Constituição, no seu artigo pelo relator, ao passo que a decisão de
71, III, IX e X, na parte concernente à mérito, para fins de registro, é da com-
concessão de aposentadorias, continua a petência, conforme o caso, do Plenário
preceituar que compete ao Tribunal de ou da Câmara.
Contas da União:
É claro que, submetido o processo a
'III — apreciar, para fins de re- julgamento da Câmara ou do Plenário,
gistro, a legalidade... das concessões pode um ou outro convertê-lo em dili-
de aposentadorias, reformas e pen- gência. Conversão do julgamento em
sões, ressalvadas as melhorias poste- diligência, como a própna expressão in-
riores que não alterem o fundamento dica, implica interrupção do julgamento
legal do ato concessório; para que, por meio da diligência em que
ele foi convertido, melhor se instrua o
IX — assinar prazo para que o processo, a fim de que se recomece,
órgão ou entidade adote as providên- posteriormente, o curso do julgamento e
cias necessárias ao exato cumpri- se chegue à decisão em que ele culmina.
mento da lei, se verificada ilegali- O que, com a devida vênia, não tem
dade; sentido é a admissão de uma conversão
do julgamento em diligência, para que,
X — sustar, se não atendido, a antes de concluído o julgamento da ile-
execução do ato impugnado, ' galidade da concessão da aposentadoria,
Como se vê, a apreciação, para fins se determine ao órgão administrativo,
de registro, da concessão de aposenta- que é o competente único para conceder
doria é, na verdade, um julgamento ad- a aposentadoria, que altere os termos
ministrativo. Por isso mesmo, a atual dessa concessão, uma vez que tal deter-
96 R.T.J. — 158

minação não é evidentemente ato de sentadoria em causa é reencetado pelo


instrução, nem é ato de execução da Tribunal de Contas que, inclusive, não
decisão, que ainda não se proferiu, da está sujeito à deliberação dessa conver-
legalidade, ou não, da concessão da apo- são, podendo, por mudança de compo-
sentadoria. Por isso mesmo, o eminente sição ou até pelo reconhecimento de seu
relator, apesar de aludir ao inciso IX do erro, retratar-se até o final do julgamen-
artigo 71 da atual Constituição (`assinar to. Mais. Conversão de julgamento em
prazo para que o órgão ou entidade ado- diligência, por ser ato para melhor ins-
te as providências necessárias ao exato trução do processo, e, portanto, do inte-
cumprimento da lei, se verificada ilega- resse exclusivo do Tribunal, não dá mar-
lidade'), inciso esse que está intima- gem o recurso, ao contrário do que su-
mente ligado ao que se lhe segue (` X- cede com a decisão final, mesmo no
sustar, se não atendido, a execução do âmbito da jurisdição administrativa do
ato impugnado,...'), entende que o órgão Tribunal de Contas. Fica, pois, a pessoa
administrativo a que se dirige essa de- interessada sem a possibilidade de re-
terminação de modificar os termos em correr por meio do pedido de reexame
que foi concedida a aposentadoria não que é o recurso administrativo cabível
está obrigado a fazê-lo, podendo recusar- contra as decisões denegatórias de regis-
se a proceder à alteração determinada. tro, e recurso com efeito suspensivo (ar-
tigo 48 da Lei n° 8.443/92). E, com isso,
A meu ver, no entanto, não pode o se sobrecarrega o Poder Judiciário uma
Tribunal de Contas da União no julga- vez que ao interessado só resta socorrer-
mento dessa legalidade, que é uno e não se dele, para que não se alterem provi-
dividido em partes estanques, fazer de- soriamente — e assim mesmo se lhe for
terminações de alteração da concessão concedido liminar — os termos de con-
de aposentadoria, sem ter concluído tal cessão de sua aposentadoria.
julgamento, e fazê-las por meio de dili-
gência que susta o próprio curso do jul- Ainda quando se entenda que os in-
gamento e que visa, não à melhor instru- cisos IX e X do artigo 71 da atual Cons-
ção do processo, mas a atuar esdruxula- tituição dizem respeito a esses julga-
mente como a execução de uma decisão mentos para fins de registro, é evidente
parcial conetiva sem forma nem figura que, por serem atos de execução, só
de direito. Com efeito, a determinação a poderão ser aplicados depois do julga-
que alude o inciso IX do artigo 71 da mento de ilegalidade, que, assim, admi-
atual Constituição, se não for atendida, tirá o registro, se corrigida a concessão
acarreta a conseqüência a que se refere no que tem de ilegal, ou, se não atendida
o inciso X do mesmo artigo: a sustação a determinação a que alude o inciso IX,
do ato impugnado. Ora, se o julgamento, dará margem à sustação da aposentado-
com a conversão em diligência, se inter- ria, como disposto no inciso X.»
rompe — o que implica dizer que não se 2. No caso, o Tribunal de Contas da
concluiu com a decisão em que ele cul- União converteu o julgamento da legalida-
mina —, é óbvio que não se pode sustar de da aposentadoria dos ora impetrantes em
a concessão da aposentadoria que ainda diligência, e posteriormente retornando os
não foi declarada ilegal. E tanto é assim autos àquela Corte de Contas com pedido
que, atendida, ou não, a determinação de reconsideração formulado pelo Presi-
consubstanciada nessa pseudo-diligên- dente da Legião Brasileira de Assistência,
cia, o julgamento da legalidade da apo- resolveu ele, após acolher parcialmente
R.T.J. — 158 97

esse pedido, converter novamente o julga- distribuído o presente mandado de segu-


mento em diligência, para, na parte que é rança o julgue como entender de direito.
atacada neste mandado de segurança,
«8.2. determinar a restituição dos VOTO (PRELIMINAR)
autos ao órgão de origem, em diligência,
para ser revista a parcela da `vantagem O Sr. Ministro Celso de Mello: O Ple-
pessoal', cujo cálculo deve ajustar-se, no do Supremo Tribunal Federal, ao julgar
em 12-12-1990, a importância corres- o MS n° 21.466-DF, de que Ni Relator,
pondente a 1% (um por cento) do ven- deixou assentado que as diligências reco-
cimento, para cada ano de efetivo exer- mendadas pelo Tribunal de Contas da
cício, sujeitando-se, o valor que for en- União, não sendo de execução compulsó-
contrado, aos reajustes lineares devidos ria, apresentam-se desvestidas de qualquer
a partir da citada data; caráter vinculante.
8.3. recomendar a imediata suspen- Essa decisão plenária consta de acórdão
são do pagamento de gratificações e assim ementado:
vantagens (v. g. Gratificação de Aniver- «(...) Constatada a ocorrência de ví-
sário, Horas Extras incorporadas), in- cio de legalidade (...), torna-se lícito ao
compatíveis com o Regime Jurídico Tribunal de Contas da União — espe-
Único, tanto para servidores ativos cialmente ante a ampliação do espaço
como inativos» (fi. 158) institucional de sua atuação fiscalizado-
Tratando-se, pois, de determinações em ra — recomendar ao órgão ou entidade
conversão de julgamento em diligência, e competente que adote as medidas neces-
não estando a autoridade administrativa sárias ao exato cumprimento da lei, evi-
obrigada a acatá-las, a Presidente da Legião tando, desse modo, a medida radical da
Brasileira de Assistência, ao acolhê-las, recusa de registro.
baixando a Portaria n° 1.197/92, é a autori- Se o órgão de que proveio o ato juri-
dade que, neste mandado de segurança, tem dicamente viciado, agindo nos limites
legitimidade passiva ad causam. de sua esfera de atribuições, recusar-se
Assim, excluo da presente relação pro- a dar execução à diligência recomenda-
cessual o Tribunal de Contas da União, por da pelo Tribunal de Contas da União
não ser ele legitimado passivo ad causam. (...), caberá à Corte de Contas, então,
pronunciar-se, definitivamente, sobre a
Por outro lado, sendo a legitimada efetivação do registro.» (MS 21.466,
passiva ad causam a Presidente da Legião rel. Min. Celso de Mello, julg. em
Brasileira de Assistência, não está ela arro- 19-5-93)
lada entre as autoridades a que se refere a
letra d do inciso I do art. 102 da Constitui- Sendo assim, e tendo presente essa
ção Federal, razão por que é incompetente orientação jurisprudencial firmada pelo
esta Corte para julgar o presente mandado Supremo Tribunal Federal, acompanho o
de segurança. voto do em. Relator.
É o meu voto.
Em face do exposto, não conheço deste
mandado de segurança por incompetência VOTO (PRELIMINAR)
deste Tribunal, e determino a remessa dos
autos à Seção Judiciária da Justiça Federal no O Sr. Ministro Néri da Silveira: Sr.
Distrito Federal, para que o Dr. Juiz a que for Presidente. Fiquei vencido no julgamento
98 R.T.J. — 158

do Mandado de Segurança n° 21.462, de Decisão: Por votação unânime, o Tribu-


que fui Relator. No ensejo, a Corte firmou nal não conheceu do pedido de mandado de
entendimento, quanto à matéria ora em segurança com relação ao Tribunal de Con-
exame, na linha do voto do ora ilustre Mi- tas da União; determinou a remessa dos autos
nistro-Relator. à Seção Judiciária da Justiça Federal do Dis-
Ressalvo, assim, meu ponto de vista ex- trito Federal, competente para o julgamento
ternado no julgamento aludido, e, seguindo do pedido, quanto ao Presidente da Funda-
a orientação da Corte, acompanho S. Exa., ção Legião Brasileira de Assistência.
não conhecendo, preliminarmente, do pedi- Presidência do Senhor Ministro Octavio
do, quanto ao Tribunal de Contas da União. Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
Sydney Sanches, Paulo Brossard, Celso de
EXTRATO DA ATA Mello, Mamo Aurélio, limar Gaivão e Fran-
cisco Rezek. Ausentes, justificadamente, os
Senhores Ministros Sepúlveda Pertence e
MS 21.683 — RJ — Rel.: Min. Moreira Carlos Velloso. Procurador-Geral da Repú-
Alves. Imptes.: Malva Araujo Teixeira e ou- blica, Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
tros (Adv.: Abdo Jorge Couri Raad). Impdos.:
Tribunal de Contas da União e Presidente da Brasília, 11 de março de 1994 — Luiz
Fundação Legião Brasileira de Assistência. Tomimatsu, Secretário.

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.859 — DF


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence


Recorrente: Geraldo Santiago de Abreu — Recorrida: União Federal
Proventos de aposentadoria: sujeição ao teto do art. 37,
XI, CF, cuja extensão à remuneração dos inativos o art. 17 ADCT faz
induvidosa.
Vencimentos e proventos: teto do art. 37, XI, CF: cui-
dando-se de servidores ativos ou de inativos do Poder Executivo, o limite
constitucional dos seus vencimentos e proventos é a remuneração em
espécie dos Ministros de Estado, não, a dos Ministros do Supremo
Tribunal Federal; e a eventual diferença entre a dos primeiros e a dos
últimos — contrariando a regra da equivalência dos tetos (STF, ADIn
14, Borja, RTJ 130/475) —, configuraria inconstitucionalidade por
omissão relativa, que não admite suprimento judicial (cf. ADIn 529, mc,
16-9-91, Pertence, Lex 175/90).
Teto de vencimentos e proventos (CF, art. 37, XI): para
tal efeito, a remuneração dos Ministros de Estado é aquela atribuída ao
cargo por decreto legislativo (CF, art. 49, VIII), não que, mediante
opção, perceba efetivamente algum dos seus titulares, em razão de ser
parlamentar ou servidor público efetivo.
R.T.J. — 158 99

ACÓRDÃO dera, «para atendimento de despesas fun-


Vistos, relatados e discutidos estes autos, cionais, em caráter transitório, importância
acordam os Ministros da Primeira Turma do mensal correspondente a 100 vezes o Maior
Supremo Tribunal Federal, na conformidade Valor de Referência — e o DL n° 2.371/87
da ata do julgamento e das notas taquigráfi- — que reajustou aquela vantagem em
cas, por unanimidade de votos, em negar pro- 32,2%, e fixou em 222 o percentual de sua
vimento ao recurso em mandado de segurança. representação.
Brasília, 24 de maio de 1994 — Morei- Invoca finalmente o direito adquiri-
ra Alves, Presidente — Septilveda Per- do e a irredutibilidade dos salários, que se
tence, Relator. estende à remuneração dos servidores.
RELATÓRIO O Superior Tribunal de Justiça indefe-
riu a segurança, assim ementado o acórdão,
da lavra do em. Ministro José Dantas, que se
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O fundou emparecer da il. Subprocuradora-Ge-
impetrante é Auditor Fiscal do Tesouro ral Delza C. Rocha, no qual se lê (fl. 105):
Nacional aposentado, e impetra segurança
contra a dedução, dos seus proventos, da «O art. 17, do ADCT, bem expressa
parcela que, segundo as autoridades coato- a equivalência entre as expressões «re-
ras, neles excede à remuneração em espécie muneração» e «proventos», verbis:
dos Ministros de Estado.
«Os vencimentos, a remuneração,
Sustenta, inicialmente, que a regra as vantagens e os adicionais, bem
do art. 37, XI, CF, não incide sobre proven- como os proventos de aposentadoria
tos da inatividade. que estejam sendo percebidos em de-
De qualquer sorte, dado a relação de sacordo com a Constituição serão
equivalência entre os tetos constitucionais imediatamente reduzidos aos limites
dos três poderes, afirmada pelo Supremo Tri- dela decorrentes, não se admitindo,
bunal, à base da conjugação entre os arts. 37, neste caso, invocação de direito ad-
XI e 39, § 1°, o limite de vencimentos a quirido ou percepção de excesso a
considerar seria a remuneração dos Ministros qualquer título».
desta Corte, consideravelmente superiores,
ao tempo, à dos Ministros de Estado. Vê-se, pois, que o dispositivo consti-
4. Aduz mais que a aplicabilidade do tucional transitório guarda perfeita con-
art. 37, XI, dependeria de regulamentação sonância com o dispositivo inserto no
legal, à qual não corresponde o art. 42 da art. 37, inciso XXI, da CF, sendo forço-
Lei n° 8.112/90, que apenas reproduziu o so concluir que o limite máximo de re-
teor da norma constitucional. Essa regula- muneração abrange tanto os servidores
mentação, assevera, é imprescindível, entre ativos quanto aos inativos, o que leva a
outras razões, para definir o que se há de ter concluir que o legislador não teve inten-
como o total da remuneração em espécie ção de excluir, do limite de teto, os
dos Ministros de Estado, inclusive, quan- proventos auferidos pelos servidores
do, sendo congressistas, optem pela dos aposentados.
parlamentares ou, sendo servidores públi- O teto de remuneração dos servido-
cos, pela do cargo efetivo. Afirma vigente, res públicos está previsto e estabelecido
para a composição da remuneração dos Mi- em norma constitucional. Assim sendo,
nistros, a Lei n° 7.374/85 — que lhe conce- a supremacia e a rigidez da norma cons-
100 R.T.J. — 158

titucional impõe que qualquer legisla- teto de remuneração as vantagens pre-


ção ordinária com ela se coadune. vistas nos incs. II e VII, do art. 61, que
Por outro lado, não cabe invocação são: gratificação natalina; adicional por
de direito adquirido, nem de irredutibi- tempo de serviço; adicional pelo exerci-
lidade de vencimentos. A proteção que cio de atividades insalubres, perigosas
a Constituição proporciona os chama- ou penosas; adicional por serviço ex-
dos direitos adquiridos contrapõe-se traordinário; adicional noturno e adi-
apenas face à legislação infraconstitu- cional de férias.
cional, e nunca contra a própria Consti- E assim o faz porque são parcelas
tuição. Também não há que se invocar asseguradas constitucionalmente —
o princípio da irredutibilidade de venci- umas face a aplicação do disposto no art.
mentos, visto que o abate deduzido nos 7°, e outras (adicional por tempo de ser-
proventos dos impetrantes é resultado viço) por ter a Constituição Federal no
do próprio comando constitucional, na § 1°, do art. 39), assegurado aos servido-
conformidade da precitada norma inser- res as parcelas percebidas em caráter
ta no art. 17, do ADCT. individual.
Rebata-se ainda os argumentos cola- O princípio da isonomia de venci-
cionados pelos impetrantes, no sentido mentos também não encontra lugar para
de que o disposto no artigo 37, inciso sua aplicação no presente caso. Não
XXI, da CF seja norma de eficácia con- convence o argumento dos impetrantes
tida, porquanto não se pode prescindir de que os vencimentos dos Ministros de
de norma que o explicite. Estado devem ser igualados com os dos
Esclarece a Lei n° 8.112/90 que «ne- Ministros do Supremo Tribunal Federal
nhum servidor poderá perceber, men- e dos Membros do Congresso Nacional
salmente, a título de remuneração, im- para, a partir dai, contarem com um teto
portância superior à soma dos valores mais elevado.
percebidos como remuneração, em es- Os impetrantes são servidores apo-
pécie, a qualquer título, no âmbito dos sentados de órgão pertencente ao Poder
respectivos Poderes, pelos Ministros Executivo. Dessa forma, não podem
de Estado, por Membros do Congresso eles tomar como paradigma a remunera-
Nacional e Ministros do Supremo Tri- ção máxima percebida por membro de
bunal Federal. Parágrafo único. Ex- outro poder, conquanto o teto máximo a
cluem-se do teto de remuneração as ser observado como limite de remunera-
vantagens previstas no incisos II a VII ção deve se situar no âmbito de cada
do art. 61». Poder.»
Este artigo dá cumprimento, na lei, O recurso ordinário insiste nas alega-
ao disposto do inc. XXI, do art. 37, da ções iniciais (fl. 115).
Constituição Federal. A própria lei cui-
da de conceituar a remuneração como Ofereceu contra-razões o il. Procura-
sendo «o vencimento do cargo efetivo, dor-Geral da União (fl. 133).
acrescido das vantagens pecuniárias 9. O parecer da Procuradoria-Geral, da
permanentes estabelecidas em lei» (art. il. Subprocuradora-Geral Maria da Glória
41, da Lei n° 8.112/90). O parágrafo Tamer, é pelo desprovimento do recurso.
único, do art. 42, da Lei n° 8.112/90,
exclui, entretanto, da incidência do É o relatório.
R.T.J. — 158 101

VOTO esse último não a aplicassse ao caso,


O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: O dada a particularidade já referida.
caso é idêntico ao RMS 21.946, de que fui De minha parte, embora me alinhan-
relator, julgado nesta sessão, quando se lhe do com os votos vencidos, deixei ex-
negou provimento. presso que teria dúvidas em acompanhar
2. Meu voto foi o seguinte: o entendimento do relator originário —
«A primeira questão é se os proven- fundado, embora na distinção elemen-
tos da inatividade sujeitam-se aos tetos tar, mas literal, entre vencimentos e pro-
impostos pelo art. 37, XI, da Constitui- ventos —, se se tratasse de vincular os
ção. proventos do servidor, não aos venci-
mentos do cargo em que se aposentara,
Problema similar veio à tona na mas aos vencimentos ou proventos de
ADIn 139, 31-10-91, Lex 168/19, rela- outro: «o caso, porém — conclui — é
tor para o acórdão o em. Ministro Marco singular. Trata-se de servidores que
Aurélio, quando se discutiu a aplicabili- não têm vencimentos. Então, estabe-
dade a proventos do inciso XIII do mes- leceu-se um critério absolutamente
mo art. 37, que veda «a vinculação ou razoável, para o cálculo de seus pro-
equiparação de vencimentos». ventos. Cuida-se, ademais, de vincu-
O Tribunal se dividiu a propósito, lação transitória para disciplinar si-
mas a peculiaridade do caso — a dispo- tuação residual.»
sição transitória questionada da Consti- Aqui, na espécie, não há peculiarida-
tuição fluminense, cuidava de proventos
des a frisar. E, em linha de princípio, não
de serventuários remunerados por cus-
logro divisar nenhuma explicação ra-
tas e os fixava em percentual dos do juiz zoável para erigir um estímulo a mais à
da comarca —, não permite apurar com aposentadoria, mercê da liberação dos
nitidez a existência de maioria de votos proventos de limitação constitucional
em favor de alguma das repostas à inda- imposta à remuneração do servidor que
gação em tese.
permanece em atividade.
Assim, a impertinência aos proven-
tos do limite foi afumada, em termos Certo, não se desconhece a diversi-
inequívocos, pelo relator originário, o dade da conceituação entre proventos e
em. Ministro Aldir Passarinho, a que vencimentos, que anima a interpretação
aderiram, sem reservas, os ems. Minis- literal a que se apegam os recorrentes.
tros Paulo Brossard e alio Borja, e Mas, como entendeu o acórdão re-
mais, no particular, o próprio Ministro
corrido, a mim também se afigurou de-
Marco Aurélio, que só concluiu pela
cisivo que o art. 17 ADCT, alcança não
procedência da ação sob o fundamento
só «os vencimentos, vantagens e adi-
de inconstitucionalidade formal do pre-
cionais», mas também «os proventos
ceito, no que foi acompanhado pelo em.
de aposentadoria que estejam sendo
Ministro Velloso.
percebidos em desacordo com a Cons-
No pólo oposto, pela extensão aos tituição serão imediatamente reduzi-
proventos da vedação literalmente cir- dos aos limites dela decorrentes, não
cunscrita a vencimentos, situaram-se os se admitindo, neste caso, a invocação
ems. Ministros Néri da Silveira, Morei- de direito adquirido ou percepção de
ra Alves, Sanches e Gallotti, embora excesso a qualquer título.»
102 R.T.J. — 158

A regra transitória vale por irrecusá- nossa jurisprudência exclui do cotejo


vel interpretação autêntica da norma com o limite constitucional as parcelas
permanente, cuja interpretação se discu- da remuneração do servidor correspon-
te: a alusão expressa a proventos, no dentes às vantagens de caráter indivi-
contexto do art. 17 ADCT, desvela — dual, entre as quais se compreendem a
sob pena de fazer-se inútil —o que ficou gratificação por tempo de serviço e o
implícito no art. 37, XI, da Constituição, salário-família.
ou seja, que o teto ali referido literal- Não tenho, contudo, neste processo,
mente apenas à remuneração da ativida- como acolher o parecer e deferir parcial-
de alcance também a da inatividade. mente a ordem.
Improcedem também os demais ar- Nem os impetrantes afirmam que tais
gumentos dos impetrantes. verbas hajam sido consideradas na apu-
Inativos do Poder Executivo, os seus ração do excesso descontado; nem o
proventos tem por limite constitucional evidenciam os contra-cheques que ins-
a remuneração dos Ministros de Estado truem a inicial.
e, não, a dos Ministros do Supremo Tri- Cuida-se, na verdade, de questão
bunal. É verdade que segundo o enten- alheia ao objeto do processo e que, se for
dimento da Corte, deveriam eles equiva- o caso, os impetrantes poderão suscitar
ler-se. Se, no entanto, não o eram, a mediante ação própria.
inconstitucionalidade por omissão rela-
Nesses termos, nego provimento ao
tiva do decreto legislativo que haja esta-
belecido a dos Ministros de Estado abai- recurso: é o meu voto.»
xo dos vencimentos fixados em lei para Assim, nos mesmos termos do anterior,
os do Supremo Tribunal Federal não o meu voto nega provimento ao recurso.
admite correção judicial (cf. ADIn 529,
med. cautelar, 16-9-91, Pertence, Lex EXTRATO DA ATA
175/90). RMS 21.859 —DF —Rel.: Min. Sepúl-
De sua vez, dispensa demonstração veda Pertence. Recte.: Geraldo Santiago de
que a remuneração dos Ministros de Esta- Abreu (Advs.: Cláudio da Rocha Santos e
do é a atribuída ao cargo por decreto legis- outro). Recda.: União Federal (Advs.: Ad-
lativo (CF, art. 49, VIII), não aquela que, vogado-Geral da União e outro).
mediante opção, perceba efetivamente al- Decisão: A Turma negou provimento ao
gum dos seus titulares, em razão de ser recurso em mandado de segurança. Unânime.
parlamentar ou servidor público efetivo.»
Presidência do Senhor Ministro Moreira
No caso precedente, opinara o Minis- Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
tério Público Federal pelo provimento par- nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Per-
cial do recurso, a fim de excluir parcelas da tence e limar Gaivão. Ausente, justifica-
remuneração do impetrante a ser cotejada d amente, o Sr. Ministro Celso de Mello.
com o teto. Subprocurador-Geral da República, o Dr.
A propósito, acentuei: Arthur de Castilho Neto.
«Finalmente, é certo, como anota o Brasília, 24 de maio de 1994 — Ricar-
parecer da Procuradoria-Geral, que a do Dias Duarte, Secretário.
R.T.J. — 158 103

MANDADO DE SEGURANÇA N° 21.881 (AgRg) — DF


(Tribunal Pleno)

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello


Agravantes: Confederação Nacional da Indústria e outros — Agravado:
Presidente da República
Mandado de segurança — Ato em tese — Inexistência de
controle normativo abstrato de legalidade — writ não conhecido.
Os atos estatais de conteúdo normativo não se expõem ao
controle jurisdicional pela via do mandado de segurança, porque inca-
pazes de afetar, de modo direto e imediato, situações jurídicas conso-
lidadas.
O remédio constitucional do mandado de segurança não
pode ser utilizado como instrumento de controle normativo abstrato de
legalidade dos atos regulamentares.
ACÓRDÃO a criar e manter o Serviço Social do
Transporte — SEST e o Serviço Nacio-
Vistos, relatados e discutidos estes au- nal de Aprendizagem do Transporte —
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- SENAT — destinando-lhes à manuten-
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- ção as contribuições antes recolhidas
formidade da ata do julgamento e das notas das 'empresas de transporte rodoviá-
taquigráficas, por unanimidade de votos, rio' ao SESI e ao SENAI, administrados
em negar provimento ao agravo regimen- pela Confederação Nacional da Indús-
tal. tria.
Brasília, 3 de março de 1994 —Octavio Ocorre, sustenta a inicial, que, ao
Gallotti, Presidente — Celso de Mello, regulamentar dita lei, violando-a, o de-
Relator.
creto questionado, no art. ?,§ 1°, 'equi-
RELATÓRIO para à empresa de transporte aquelas
que, não tendo essa atividade como
O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata- principal ou preponderante, reali-
se de Mandado de Segurança a que foi zam-no em proveito próprio', para o
recusado trânsito nesta Suprema Corte pelo fim de destinar aos SEST e ao SENAT
em. Min. Sepúlveda Pertence, que, no também as contribuições das últimas e
exercício eventual da Presidência (RISTF, incidentes sobre a 'remuneração paga
art. 37, I ), proferiu a seguinte decisão (fls. pelo estabelecimento contribuinte aos
92/93), verbis: seus empregados diretamente envol-
vidos na atividade de transporte' (art.
«Cuida-se de mandado de segurança 2°, § 1°).
com pedido liminar contra o Dec.
1.007/93, baixado pelo Senhor Presi- Donde, a impetração da segurança
dente da República. para, liminarmente, suspender-lhes o
A Lei 8.706, de 14-9-93, autorizou a efeito e, a final, 'anular o disposto nos
Confederação Nacional dos Transportes §§ 1° e 2° do Decreto n" 1.007...'.
104 R.T.J. — 158

Sem embargo da plausibilidade da fica como ato em tese, eis que dele derivam
fundamentação de mérito, a via proces- efeitos concretos e imediatos, aptos a pro-
sual e o pedido são, data venia, de ma- vocarem lesão ao direito dos ora recorren-
nifesta inadequação. tes.
Sabidamente, não se presta o manda- Ouvida, a douta Procuradoria-Geral da
do de segurança para impugnar a valida- República pronunciou-se pelo bnprovi-
de de normas abstratas, salvo quando, mento do presente agravo, em parecer as-
por si só, a vigência delas alcançar direta sim ementado (fl. 108), verbis:
e imediatamente o pretendido direito «Ementa: Súmula 266: adequada se
subjetivo do impetrante, sem necessida- faz sua invocação, para considerar im-
de da intermediação de ato concreto que própria a via processual eleita, em se
as aplica. tratando de Mandado de Segurança im-
Daí, a jurisprudência consolidada na petrado contra o Decreto n° 1.007/93,
Súmula 266 — 'Não cabe mandado de que regulamentou a Lei n° 8.706/93, se
segurança contra lei em tese' — que, a instituição dos 'procedimentos ope-
como já se notou, é um corolário inafas- racionais para arrecadar as contri-
tável da inserção do interesse processual buições devidas' fez-se através de Or-
do autor entre as condições da ação. dem de Serviço, de n° 105/94, baixada
pela Diretora de Arrecadação e Fiscali-
Ora, no caso, o que se impugna — zação do Instituto Nacional do Seguro
como se se tratasse de verdadeira ação Social — INSS. Incompetência originá-
direta de ilegalidade de regulamento — ria do STF: art. 102, I, d, da CF. Agravo
é a validade de normas abstratas, que só Regimental insuscetível de provimen-
prejudicarão os impetrantes na medida to.»
em que o INSS deixe de entregar-lhes
as contribuições questionadas para des- Não me havendo convencido das razões
tiná-las aos novos serviços criados pela deduzidas pelos ora agravantes (fls.
Confederação Nacional dos Transpor- 95/102), submeto o presente recurso à apre-
tes. ciação do Pleno deste Tribunal.
Por outro lado, não incumbindo a É o relatório.
entrega do produto da arrecadação das
contribuições ao Presidente da Repúbli- VOTO
ca, mas ao INSS, jamais incumbiria ao
O Sr. Ministro Celso de Mello (Rela-
Supremo Tribunal Federal o conheci- tor): Os ora recorrentes impetraram o writ
mento originário de pedido preventivo mandamental contra o Decreto n° 1.007/93
destinado a obstar a execução dos pre- que, editado pelo Presidente da República,
ceitos cuja validade se contesta. teve por finalidade regulamentar a Lei n°
Por tudo isso, reputando inequívoca 8.706/93, que dispôs sobre a criação do
a carência da ação, nego seguimento ao Serviço Social do Transporte-SEST e do
mandado de segurança e julgo prejudi- Serviço Nacional de Aprendizagem do
cado o requerimento liminar.» Transporte-SENAT (fl. 81).
Os impetrantes, inconformados com Tenho para mim, na linha da decisão
esse ato decisório, interpuseram o presente proferida pelo em. Ministro Sepúlveda
recurso de agravo, sustentando, em essên- Pertence, que o ato questionado na presen-
cia, que o decreto impugnado não se quali- te sede mandamental subsume-se, em seu
R.T.J. — 158 105

perfil tipológico, à categoria jurídica dos «Os próprios Agravantes, contudo,


atos em tese. incumbiram-se de trazer, para os autos,
notícia da expedição da Ordem de Ser-
A análise do conteúdo do decreto presi-
viço n° 105, de 10 de janeiro de 1994,
dencial em questão bem evidencia o caráter
pela Diretora de Arrecadação e Fisca-
abstrato das normas nele inscritas cuja
lização do Instituto Nacional de Seguro
atuação está a depender, para efeito de sua Social — INSS (fl. 101), ato que está
efetiva aplicabilidade, de um momento de assim posto:
ulterior concreção, representado pela ado-
ção de medidas administrativas que pos- 'A Diretora de Arrecadação e Fis-
sam, estas sim, instaurar a situação de calização, no uso das atribuições que
ofensa ao direito subjetivo alegado pelos lhe confere o artigo 175, inciso RI do
ora agravantes. Regimento Interno do Instituto Nacio-
nal do Seguro Social —INSS, aprovado
Daí, a procedente advertência contida pela Podaria MPS n° 458, de 24 de
no ato decisório impugnado nesta sede re- setembro de 1992, considerando o dis-
cursal (fls. 92/93), verbis: posto o § 1° do artigo 79 da Lei n°
8.706/93, considerando a necessidade
«Ora, no caso, o que se impugna — de orientar o contribuinte da forma
como se se tratasse de verdadeira ação como efetuar o recolhimento das contri-
direta de ilegalidade de regulamento — buições previstas nos incisos I e R do art.
é a validade de normas abstratas, que s6
prejudicarão os impetrantes na medida
r da Lei 8.706/93, resolve fixar os pro-
cedimentos operacionais para arreca-
em que o INSS deixe de entregar-lhes as dar as contribuições devidas ao Servi-
contribuições questionadas para desti- ço Social do Transporte — SEST e ao
ná-las aos novos serviços criados pela Serviço Nacional de Aprendizagem do
Confederação Nacional dos Transpor- Transporte — SENAT. (Fls. 101/102)
tes.
É o quanto basta, certamente, para ficar
Por outro lado, não incumbindo a evidenciado que nem a Lei n° 8.706, de 14
entrega do produto da arrecadação das de setembro de 1993, nem o seu regula-
contribuições ao Presidente da Repúbli- mento — o Decreto n° 1.007, de 13 de
ca, mas ao INSS, jamais incumbiria ao dezembro de 1993, este o ato impugnado
Supremo Tribunal Federal o conheci- pela impetração —, constituíram:
mento originário de pedido preventivo `... normas concretas que, por si sós,
destinado a obstar a execução dos pre- infringem direta e imediatamente o di-
ceitos cuja validade se contesta.» reito subjetivo dos impetrantes.' (fl. 98)
O Ministério Público Federal, ao acen- Ao contrário, a edição da Ordem de
tuar o descabimento da ação mandamental Serviço n° 105, de 10 de janeiro de 1994,
neste caso, tendo presente a natureza de ato pela Diretora de Arrecadação e Fiscali-
em tese do decreto presidencial impugna- zação do Instituto Nacional de Seguro
do, salientou, em parecer da ilustre Subpro- Social — INSS, com o objetivo de ins-
curadora-Geral, Dra. Anadyr de Mendon- tituir 'procedimentos operacionais
ça Rodrigues, aprovado pelo em. Procura- para arrecadar as contribuições devi-
dor-Geral da República, Dr. Aristides das ao Serviço Social do Transporte —
Junqueira Alvarenga, que (fls. 113/115), SEST e ao Serviço Nacional de Apren-
verbis: dizagem do Transporte — SENAT'
106 R.T.J. — 158

101), está a demonstrar, abundantemen- O remédio constitucional do mandado


te, que, antes de sua vinda ao mundo de segurança não pode ser utilizado, sob
jurídico, tanto a Lei n° 8.706, de 14 de pena de grave disfunção jurídico-proces-
setembro de 1993, como o Decreto n° sual e de comprometimento de sua alta
1.007, de 13 de dezembro de 1993, eram finalidade institucional, como instrumento
dotados da natureza de normas em tese. de controle normativo abstrato de legalida-
Sendo essas as circunstâncias da es- de dos atos regulamentares.
pécie, adequada se fez a invocação da Esse sistema de tutela concentrada da
Súmula 266 (Não cabe mandado de legalidade inexiste em nosso ordenamento
segurança contra lei em tese') e, ipso jurídico, o qual, ao contrário do modelo
facto, patente a incompetência originá- consagrado pela Constituição de Portugal,
ria do Supremo Tribunal Federal para não prevê a possibilidade de fiscalização
processar e julgar este Mandado de Se- in abstracto da mera legalidade de normas
gurança, a teor do disposto no art. 102, jurídicas secundárias.
1, d, da Constituição Federal.
Assim sendo, tendo presentes as razões
O parecer é, por conseguinte, de que expostas, e considerando, ainda, o parecer
o Agravo Regimental não comporta da douta Procuradoria-Geral da República,
provimento.» nego provimento a este recurso.
Não constitui demasia assinalar, neste
ponto, que não se expõem ao controle ju- É o meu voto.
risdicional, pela via do mandado de segu-
rança, os atos — como o impugnado nesta EXTRATO DA ATA
sede — cujo coeficiente de generalidade
MS 21.881 (AgRg) — DF —Rel.: Min.
abstrata revela-se insuficiente para confe-
Celso de Mello. Agtes.: Confederação Na-
rir-lhes, desde logo, eficácia lesiva capaz
cional da Indústria e outros (Advs.: José
de afetar situações jurídicas consolidadas.
Batista de Oliveira Júnior e outros). Agdo.:
As regras em questão traduzem um ato Presidente da República.
em tese, cujo grau de normatividade e de
generalidade abstrata impede, consoante Decisão: Por votação unânime, o Tribu-
diretriz jurisprudencial firmada por esta nal negou provimento ao agravo regimental.
Corte, a válida utilização do remédio cons-
Presidência do Senhor Ministro Octavio
titucional em causa (Súmula 266/STF).
Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
Normas em tese — que se qualificam Ministros Néri da Silveira, Paulo Brossard,
como tais em função do seu tríplice atributo Sepúlveda Pertence, Celso de Mello, Car-
de generalidade, impessoalidade e abstra- los Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão
ção — não se submetem ao controle do e Francisco Rezek. Ausentes, justificada-
Poder Judiciário em sede de processo man- mente, os Senhores Ministros Moreira Al-
damental (Hely Lopes Meirelles, «Manda- ves e Sydney Sanches. Vice-Procurador-
do de Segurança, Ação Popular, Ação Civil Geral da República, Dr. Moacir Antonio
Pública, Mandado de Injunção e Habeas Machado da Silva.
Data», pág. 17, 13' ed., 1989, RT; Alfredo
Buzaid, «Do Mandado de Segurança», vol. Brasília, 3 de março de 1994 — Luiz
I/126-129, itens es 65/66, 1989, Saraiva). Tomimatsu, Secretário.
R.T.J. — 158 107

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA hl" 21.960 — DF


(Segunda Turma)

Relator p/o acórdão: O Sr. Ministro Maurício Conta


Recorrente: Raul de Souza Silveira — Recorrida: União Federal
Recurso ordinário em mandado de segurança. Portaria n°
529/92 do Ministro da Fazenda: liquidação extrajudicial de companhia de
seguros (Decreto-Lei n° 73/66) e indisponibilidade dos bens do diretor
presidente (art. 2' da Lei n° 5.627/70). Ato que atinge interesses da compa-
nhia e do acionista: legitimidade ativado acionista para impetrar seguran-
ça (art. 109 da Lei das Sociedades Anônimas — Lei n° 6.404/76 — e art.
5°, XXXV, da Constituição).
O acionista que se opõe à ordem de liquidação extrajudi-
cial de sociedade seguradora em defesa de seus interesses pessoais, não
pleiteia em nome próprio direito alheio, mas direito próprio, não ocor-
rendo a hipótese de substituição processual não prevista em lei. Inapli-
cabilidade do art. 6° do Código de Processo Civil.
No caso, o impetrante-recorrente não postula direitos na
condição de acionista, como previsto no art. 109 da Lei das Sociedades
Anônimas, mas direitos patrimoniais próprios, o que lhe confere mani-
festa legitimidade ativa para a causa. Se existisse norma que vedasse seu
acesso ao Judiciário, seria de indiscutível inconstitucionalidade.
3. Recurso conhecido e provido para, afastada a ilegitimida-
de ad causam do recorrente, determinar que o Tribunal a quo prossiga
no julgamento do mandado de segurança, como entender de direito.
ACÓRDÃO RELATÓRIO

O Sr. Ministro Francisco Rezek: O ora


Vistos, relatados e discutidos estes au- recorrente impetrou, na qualidade de acio-
tos, acordam os Ministros componentes da nista minoritário da Nova York Companhia
Segunda Turma do Supremo Tribunal Fe- de Seguros, mandado de segurança no Su-
deral, na conformidade da ata do julgamen- perior Tribunal de Justiça (STJ) contra ato
to e das notas taquigráficas, por maioria de do Ministro de Estado da Economia, Fa-
votos, dar provimento ao recurso para, zenda e Planejamento: a Portaria n°529/92,
afastada a ilegitimidade ativa «ad causam» de 14 de julho de 1992, que decretou a
do impetrante e recorrente, determinar liquidação extrajudicial daquela sociedade
prossiga o Tribunal «a quo» no julgamento seguradora, além da Resolução n° 014/92
do mandado de segurança como entender do Conselho Nacional de Seguros Privados
de direito. (CNSP) que cassou a autorização a ela con-
cedida para operar em seguros privados.
Brasília, 12 de setembro de 1995 —
Néri da Silveira, Presidente — Maurício O STJ, em julgamento da Primeira Se-
Corrêa, Relator p/ o acórdão. ção, não conheceu do writ por estimar que
108 R.T.J. — 158

faltava ao impetrante legitimidade ativa ad tanto, todos os meios, processos ou ações


causam. O acórdão foi assim resumido são admitidos à vista do que dispõe o § 2°
pelo relator, Ministro José de Jesus Filho: do art. 109.
«Liquidação extrajudicial. Socieda- O Ministério Público Federal opina pelo
de de Seguro. Ilegitimidade ativa ad não provimento do recurso.
causam de acionista nos termos do art. É o relatório.
109 da Lei n° 6.404/76 para suspender
os efeitos da Portaria do Ministro da VOTO
Fazenda que decretou a liquidação ex-
trajudicial de Sociedade de Seguro. O Sr. Ministro Francisco Rezek (Re-
lator): Leio, em síntese, o que diz a Subpro-
Mandado de segurança não conheci- curadora-Geral Anadyr de Mendonça Ro-
do.» (Fl. 331). drigues, em nome do Parquet Federal:
A tal decisão foi oposto o presente re- «... o art. 109 da Lei n° 6.404, de
curso ordinário. 1976, garantiu aos acionistas foi — en-
Diz o recorrente que «a cassação da quanto existente a sociedade, obvia-
carta-patente e a determinação da liquida- mente — o exercício dos direitos de:
ção provocam, ao mesmo tempo, a extinção 8.1. 'I — participar dos lucros so-
da sociedade e a extinção dos direitos dos ciais':
acionistas como tais. Dessa forma, ao plei-
8.2. 'II — participar do acervo da
tear contra ato causador de tais efeitos, com
companhia, em caso de liquidação';
a finalidade de cassá-lo, não estará o sócio
postulando, senão reflexamente, direito da 8.3. — fiscalizar, na forma pre-
sociedade: estará, isso sim, invocando seu vista nesta Lei, a gestão dos negócios
próprio direito, de continuar sócio de uma sociais';
sociedade, erradamente atingida em sua so- 8.4. 'IV — preferência para subs-
brevivência, eis que não divisa, no ato coa- crição de ações, partes beneficiárias
tor, fundamento jurídico plausível para dar conversíveis em ações, debêntures
termo à affectio societatis.» (Fl. 337) conversíveis em ações e bônus de subs-
Argumenta que não está a pleitear, em crição, observado o disposto nos arts.
nome próprio, direito alheio, tal como con- 171 e 172';
signou a decisão recorrida. Sob sua ótica, o 8.5. 'V — retirar-se da sociedade
parágrafo 2° do art. 1° da Lei n° 1.533/51 nos casos previstos nesta Lei».
combinado com o art. 6° in fine do Códi- Veja-se que nenhum dos direitos as-
go de Processo o titulariam a postular em sim assegurados aos acionistas poderá
juízo. ser exercitado, se inexistir a sociedade,
Pondera, ainda, que o acórdão recorrido, porquanto, então, não haverá:
ao mencionar o art. 109 da lei das S.A. para 9.1. Lucros sociais, a ratear;
afastar eventual direito do acionista à pre-
sente ação judicial, abstraiu o fato de que o 9.2. Companhia, a liquidar;
rol de direitos daquela norma não é limita- 9.3. Negócios, cuja gestão possa
tivo. ser fiscalizada;
Destaca, por fim, que o primeiro direito 9.4. Ações, partes beneficiárias
reconhecido aos acionistas é o de participar ou debêntures, para cuja subscrição
dos lucros sociais (art. 109-1) e que, para possa haver preferência;
R.T.J. — 158 109

9.5. Sociedade, da qual se possa acionista pelo diploma legal invocado é


retirar o acionista. para proteger aqueles direitos nomina-
dos no artigo 109. Pela leitura atenta das
Note-se, sob outro ângulo, que se- alentadas razões da petição exordial,
quer quando cogitou da liquidação da bem assim do não menos alentado me-
sociedade — procedimento gerador de modal, não encontrei qualquer lesão
sua extinção —, cuidou a Lei n° 6.404, concreta ao patrimônio do autor a justi-
de 1976, de outorgar legitimidade ao ficar o cabimento do remédio heróico.
acionista para se lhe opor, pois, em tal Ademais não demonstrou ele qual o pre-
caso, só lhe assegurou participar 'do juízo que lhe advinha do ato atacado,
acervo da companhia'. juntando inclusive prova documental.
É o quanto basta, quer parecer, para Diante dessas considerações do direito
ficar evidenciado que a Lei n° 6.404, de postulado resulta claro o que dispõe o
1976, não atribuiu ao acionista o direito digesto processual.
de continuar sócio, especialmente se o 'Para propor ou contestar ação é
exercício desse direito pressupõe a fa- necessário ter interesse e legitimi-
culdade de impedir seja a sociedade dade.'
liquidada, pelos meios legais.
A par disso complementa o art. 6°:
Ora, é desse 'direito de continuar
sócio — que não lhe assiste — que o 'Ninguém poderá pleitear em
Recorrente, como acionista, extrai o in- nome próprio, direito alheio, salvo
teresse de agir, para se legitimar 3 im- quando autorizado por lei.'
petração do Mandado de Segurança. Por conseguinte, o que se verifica em
Como o 'direito de continuar sócio' todo o petitório é que o impetrante plei-
não se encontra entre aqueles outorga- teia em nome próprio direito alheio pois,
dos ao acionista, pela Lei n° 6.404, de não demonstrou de forma inequívoca o
1976, faltou, mesmo, ao Recorrente, le- seu interesse no caso, o que resulta em
gitimidade para impetrar o mandado manifesta ilegitimidade ativa ad cau-
de segurança e, pois, estava dotado de sam.» (Fl. 311)
razão o V. Acórdão recorrido». (Fls. Tais as circunstâncias, resta-me seguir o
364/366) alvitre do Ministério Público Federal e ne-
Entendo, com o Ministério Público Fe- gar provimento ao recurso.
deral, que não há, no rol dos direitos con- É como voto.
feridos ao acionista, em decorrência de sua
VOTO (ADITAMENTO AO VOTO)
condição de sócio — ou qualidade de acio-
nista, como diz a Lei das S.A. (artigo 126) O Sr. Ministro Francisco Rezek (Re-
— o «direito de continuar sócio». Parece- lator): Quero ponderar que a referência ex-
me, assim, correta a decisão do Superior pressa a uma falta de legítimo interesse
Tribunal de Justiça. Colho do voto do pareceu-me menos feliz do que a restante
relator, Ministro José de Jesus Filho, o linha de argumentação do acórdão recorri-
seguinte: do. Uma das inúmeras manifestações do
«É princípio corrente de direito que denodo e do talento com que a defesa do
os sócios ou acionistas não se confun- impetrante se houve, neste caso, foi a tese,
dem com a sociedade de que fazem par- agora de novo suscitada da tribuna, de que
te. Sendo assim o direito conferido ao esse interesse no destino da sociedade é
110 R.T.J. — 158

patente. O prejuízo que para o acionista e entendeu que, sendo a companhia consti-
pode resultar de um fenômeno como o que tuída no Canadá, e tendo, enquanto pessoa
os autos espelham é também algo irrecusá- jurídica de direito privado, a regência do
vel. A questão, todavia, é outra. E quero, direito canadense, não havia legitimidade
neste ponto, valorizar o núcleo do acórdão postulatória em seus acionistas belgas (em-
recorrido: a tese de que aqueles direitos bora fossem eles, todos, capitalistas bel-
concedidos pela lei ao acionista individual- gas).
mente considerado — ao acionista minori-
tário, sobretudo — são direitos exercitáveis VOTO (VISTA)
contra a sociedade. É aquilo em nome de
quê ele tem ação contra a sociedade se por O Sr. Ministro Maurício Corrêa: Sr.
ela, de algum modo, em virtude de uma de- Presidente, a mim me parece estranho que
cisão majoritária qualquer, se sente lesado. um sócio minoritário não tenha legitimida-
O que se pretende aqui é exercer contra de para postular em juízo, ainda mais quan-
o governo, contra a autoridade pública e seu do se sabe que esse acionista já ocupara o
ato de intervenção, essa ação em nome de cargo de direção da empresa e em decorrên-
um direito não da sociedade, mas do acio- cia teve seus bens bloqueados. Só por isso
nista minoritário, daquele que detém ações parece-me abrir-se espaço para o reconhe-
da companhia cuja liquidação extrajudicial cimento dessa legitimidade.
foi decretada. Contudo, vou preferir pedir vista para
O que pensa a companhia, não se sabe. um exame mais apurado.
Qual a reação coletiva, não se sabe. Qual a
reação majoritária, não se tem como ava- EXTRATO DA ATA
liar. Não estão excluídas do horizonte do
possível, em situações assim, aquelas hipó- RMS 21.960 — DF — Rel.: MM. Fran-
teses em que, por algum singular motivo, a cisco Rezek. Recte.: Raul de Souza Silveira
companhia posta em liquidação judicial (Advs.: Sergio Ferraz e outros). Recda.:
não estima que deva reagir contra a decisão União Federal (Adv.: Advogado-Geral da
governamental. Pergunto-me, nesse caso, União).
como se poderia justificar para o sócio mi-
noritário a prerrogativa do protesto em juí- Decisão: Após o voto do Sr. Ministro
zo, com mandado de segurança, contra Relator negando provimento ao Recurso
aquilo a que a própria sociedade liqüidanda em Mandado de Segurança, o julgamento
não alvitrou reação. foi adiado em virtude do pedido de vista
formulado pelo Ministro Maurício Corrêa.
Penso, de outro lado, que alguns ele- Falou pela recorrente o Dr. Sérgio Ferraz.
mentos da teoria geral do direito nos im- Impedido o Sr. Ministro Carlos Velloso.
põem essa distinção que o acórdão recorri-
do patrocinou, entre a pessoa jurídica de Presidência do Senhor Ministro Néri da
direito privado, a sociedade por ações, e a Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
pessoa de cada um dos seus acionistas. Ministros Carlos Velloso, Marco Aurélio,
Temos até no contencioso internacional Francisco Rezek e Maurício Corrêa. Sub-
exemplos conhecidos de ênfase sobre essa procurador-Geral da República, o Dr. Mar-
distinção. No romper da década de 70 a dem Costa Pinto.
Corte Internacional de Justiça julgou o caso Brasília, 4 de abril de 1995 — Wagner
da «Barcelona Traction Light and Power» Amorim Madoz, Secretário.
R.T.J. — 158 111

VOTO (VISTA) civil do artigo 3°, «para propor e contes-


O Sr. Ministro Mauricio Corrêa: Sr. tar ação é necessário ter interesse e legi-
Presidente, trago o meu voto, a propósito timidade», e como se cuida de sociedade
do pedido de vista que então formulara, em processo de liquidação, sendo o liqui-
após a leitura do relatório e do voto do em. dante o seu único representante legal, seria,
Ministro Francisco Rezek, em assentada pas- igualmente de se aplicar, no caso, ao impe-
sada em que os autos estiveram em mesa. trante, a norma do artigo 6°, daquele mes-
Creio se imponha seja feita ligeira me- mo diploma processual, pois «ninguém
mória dos fatos, para uma melhor com- poderá pleitear, em nome próprio, direi-
preensão de sua extensão. Por portaria as- to alheio, salvo quando autorizado por
sinada pelo então Ministro de Estado da lei.» Impende desse resultado concluir, es-
Economia, Fazenda e Planejamento, Dr. tar agindo o impetrante para pleitear direito
Marcflio Marques Moreira (fl. 289), datada da sociedade e não especificamente dele,
de 14 de julho de 1992, fora decretada a ou de outrem, jamais próprio.
Liquidação Extrajudicial da Nova York Inconformado o recorrente manifesta
Companhia de Seguros, com fundamento sua irresignação, enfatizando que em ne-
no artigo 90, alíneas a e b, do artigo 96, do nhum momento ingressou em juízo para
Decreto-Lei n° 73/66. defender direitos que não fossem os seus,
Inconformado com o ato, Raul de Sousa pessoais, intrinsecamente subjetivos, face
Silveira, acionista da companhia, que então à sua condição de sócio minoritário, que
exercera, cumulativamente, os cargos de quer defender a sobrevivência da socieda-
seu Diretor Presidente e Presidente do Con- de, porque afinal, sendo acionista, tem ine-
selho de Administração, respectivamente, quívoco interesse nos resultados do negó-
ajuizou mandado de segurança, que por cio da empresa de que é acionista, e princi-
tratar de autoridade ministerial, foi aforado palmente pela circunstância de haver sido
perante o Eg. Superior Tribunal de Justiça, o seu principal gestor, quando da declara-
ali sendo distribuído ao em. Ministro José ção que dissolveu a seguradora.
de Jesus Filho, integrante da 1' Seção Judi- Arrematando que o acórdão recorrido
ciária daquela Alta Corte de Justiça. laborou em equívoco, sintetiza e peça re-
Por maioria de votos, a Col. 1* Seção não cursal, verbis:
conheceu do writ, estando assim reduzido «I) a uma, o ato coator, determinan-
o acórdão: te que é da cessação do funcionamento
«Liquidação extrajudicial. Socieda- da sociedade seguradora, ataca de mor-
de de Seguro. Ilegitimidade ativa ad te o direito do Impetrante participar
causam de acionista nos termos do arti- dos resultados da empresa (Lei n°
go 109 da Lei n° 6.404/76 para suspen- 6.404/76, art. 109, I);
der os efeitos da Portaria do Ministro da II) a duas, Diretor Presidente que
Fazenda que decretou a liquidação ex- era o Impetrante, da sociedade liquidada
trajudicial de Sociedade de Seguro. (o que é incontroverso nos autos), tem
Mandado de Segurança não conheci- ex vi do artigo 2°, da Lei n° 5.627, de
do.» 1 - 12 - 70, todos os seus bens colocados
As razões do voto condutor e as daque- sob regime de absoluta indisponibili-
les que o acompanharam sustentam-se na dade.
ilegitimidade ad causam para a postula- Que prejuízo patrimonial pode ser
ção, porque segundo a regra processual maior do que este?»
112 R.T.J. —158

Neste Tribunal, o ilustre Ministro Fran- n° 6.404/76, sobre os direitos essen-


cisco Rezek, com base nos fundamentos do ciais do acionista determinando que
parecer da Subprocuradoria-Geral da Re- nem o estatuto social nem a assembléia
pública, Dra. Anadyr de Mendonça Rodri- geral poderão privar o acionista dos di-
gues, de fls. 357/366, e em sintonia com o reitos de:
conteúdo do voto do Relator, conclui: I — participar dos lucros so-
«penso que o desfecho dado ao processo, ciais;
com a precipitação do fim à conta da
ilegitimidade ativa do acionista impe- II—participar do acordo da
trante, foi um desfecho correto, e meu Companhia em caso de liquidação;
voto, como disse, é pelo desprovimento III — fiscalizar, na forma prevista
do recurso ordinário». nesta Lei, a gestão dos negócios sociais;
Prossigo eu. Atento ao mandamento IV — preferência para subscrição
constitucional que assegura a todos o direi- de ações, partes beneficiárias e bônus de
to de ver eventual lesão a direito individual subscrição, observado o disposto nos
apreciado pelo Poder Judiciário, pareceu- arts. 171 e 172;
me que, verificando questionar-se nos au- V — retirar-se da sociedade nos
tos direito do acionista e principal gestor da casos previstos em lei;
empresa liquidada, e bastantemente por
§ I° — As ações de cada classe
isso, se a teor do ato administrativo que põe
conferirão iguais direitos aos seus titu-
em indisponibilidade bens de um certo
acionista, à luz da garantia fundamental lares;
inscrita no inciso XXXV, do artigo 5°, da § 2° — Os meios, processos ou
Lei Maior, segundo a qual «a lei não ex- ações que a lei confere ao acionista para
cluirá da apreciação do Poder Judiciário assegurar os seus direitos não podem ser
lesão ou ameaça a direito», se não se elididos pelo estatuto ou pela assem-
estaria cometendo violação de magna gran- bléia geral.
deza constitucional indissociável do atribu- Esses direitos chamados essenciais
to da cidadania?! • são conferidos a qualquer acionista e são
Eis a questão que me fez ponderar e interrogáveis segundo doutrinadores.
refletir sobre o acórdão que não conheceu Valendo-se do uso do instrumental do
do pedido mandamental, partindo de pre- processo judicial, valho-me da expres-
ceito infamatório da legitimado ad cau- são empregada no memorial que me
chegou às mãos, utilizou o impetrante o
mandamus para suspender os efeitos
Para uma melhor compreensão do tema, do ato de liquidação da Seguradora. O
permito-me ler o inteiro teor do voto con- direito de natureza instrumental ora
dutor, assim posto: exercido pelo acionista impetrante, no
«O impetrante, com a liquidação ex- magistério do Juiz Federal Hugo de Bri-
trajudicial decretada pelo Ministro de to Machado tem por fim assegurar a
Estado, da Economia, Fazenda e Plane- efetividade dos direitos patrimoniais.
jamento, invocando a sua condição de Há de ser exercido na forma prevista em
acionista pretende a suspensão dos efei- lei, isto é, o acionista não pode a pretexto
tos da portaria ministerial por ter sido o de exercer o seu direito de fiscalizar a
ato praticado, segundo ele, sem o devido questão dos negócios sociais, agir indi-
processo legal. Dispõe o art. 109 da Lei vidual e diretamente, examinando livros
R.T.J. — 158 113

e documentos da sociedade (R. Fac. de como indubitável a procedência da argu-


Direito, Fortaleza, 24(2) pág. 39). É mentação, pois sociedade dissolvida, ainda
princípio corrente de direito que os só- que seja por ato do príncipe, é sociedade em
cios ou acionistas não se confundem liquidação, que deixa de possuir a capaci-
com a sociedade de que fazem parte. dade de sua autogestão, deslocando tais
Sendo assim o direito conferido ao acio- faculdades ao agente estatal que passa a
nista pelo diploma legal invocado é para administrar o acervo, do ativo e passivo,
proteger aqueles direitos nominados no para a composição final, no universo das
artigo 109. Pela leitura atenta das alen- relações da empresa liquidanda.
tadas razões da petição exordial, bem
assim do não menos alentado memorial, Mas este não é o cerne da questão, pois
não encontrei qualquer lesão concreta que a pretensão não se ajusta na tipicidade
ao património do autor a justificar o das expressões do citado artigo 109, do
cabimento do remédio heróico. Ade- Decreto-Lei n° 73/76, para ajustar-se a ou-
mais não demonstrou ele qual o prejuízo tra ordem de argumentação. O direito do
que se advinha do ato atacado, juntando recorrente não tem a sua gênese na discus-
inclusive prova documental. Diante des- são temática a envolver os direitos do acio-
sas considerações do direito postulado nista, sit et in quantum, ou seja, quando
resulta claro o que dispõe o digesto pro- viva a sociedade, mas precipuamente na
cessual. atipicidade de sua prerrogativa para discu-
tir, e de sua subjetividade para postular o
«Para propor ou contestar ação é ne- seu direito, que se subtrai da condição de
cessário ter interesse e legitimidade». A acionista ou de presumível credor da
par disso complementa o art. 6°, «Nin- massa, partindo-se da lógica do acórdão
guém poderá pleitear em nome próprio, recorrido, de não reconhecer ao recorrente,
direito alheio, salvo quando autorizado no elenco das prerrogativas dos acionistas
por lei». ali elencados, se ele pode ou não ter negada
Por conseguinte, o que se verifica em a jurisdição para o feito, ora em grau de
todo o petitório é que o impetrante plei- recurso.
teia em nome próprio direito alheio pois,
Entendido o raciocínio posto no acór-
não demonstrou de forma inequívoca o
dão, resultaria a aplicação da regra proces-
seu interesse no caso, o que resulta em
sual de que «para propor ou contestar
manifesta ilegitimidade ativa ad cau-
ação é necessário ter interesse e legitimi-
sam.
dade». Ora, não existindo mais a socieda-
Pelo exposto, preliminarmente, não de, decorrente daquele princípio que a ins-
conheço da impetração. tituiu da affectio societatis, é como, neste
É o meu voto» (fls. 310/311). sentido, já se lhe tivesse certificado o óbito.
E nesse caso até o de cujus também tem
Como se extrai do acórdão recorrido, direitos, sobre as relações de direito com
que exterioriza o pensamento da maioria, terceiros em face do espólio a ser adminis-
pelo voto do relator, falta ao impetrante trado.
legitimidade ad causam para a postulação,
em resumo, porque não se qualifica o autor O recorrente seria carecedor da ação por
como acionista da sociedade em processo faltar-lhe condição processual de postula-
de liquidação, por força da decisão gover- ção, tanto mais que devendo estar em juí-
namental. Partindo-se dessa assertiva, e zo, quem deveria fazê-lo seria o represen-
apenas para argumentar, poderia admitir-se tante legal da entidade governamental en-
114 R.T.J. — 158

carregada da política dos seguros, e não um «Do pedido de liminar. Excelentís-


sócio, que tendo perdido esta condição por simo Sr. Dr. Ministro Presidente: consi-
não mais existir a sociedade, de que era derando que ficou demonstrado, robus-
acionista. tamente, infringência aberta aos incisos
Repito, mas esta não é a questão que XIV, XIX, XXI, XXII, LIV e LV, do
ressume do pleito do recorrente. Sua pre- artigo 5° da Constituição Federal, bem
sença nos autos não tem o condão de plei- assim aos artigos 31 e 32, inciso IX, 33,
tear nada, absolutamente nada, a respeito seus incisos e § 1° e art. 90, todos do
dos seus direitos enquanto acionista, mas Decreto-Lei n° 73/66; considerando, ao
sim na condição de ex-acionista, de uma lado de tudo isso, que o processo de
seguradora da qual era o principal respon- cassação da autorização e subseqüente
sável, e que teve cessado o seu funciona- liquidação da sociedade seguradora le-
mento. Resultando, em conseqüência, a ile- sam efetiva e irreversivelmente os di-
gitimidade para a ação, a prevalecer o en- reitos patrimoniais do Impetrante, por-
tendimento esposado no voto condutor. que se encontra em curso o procedimen-
to de realização do ativo da Seguradora,
Mesmo dissolvida a seguradora, man- com venda imediata e irreversível de
tém ela a sua personalidade jurídica, quer seus direitos (docs. n° 15 e 16), requer a
se trate de extinção voluntária ou compul- Vossa Excelência, etc...»
sória como é a dos autos (art. 207, da Lei Inequívoca é a fundamentação do pedi-
n° 6.404/76). Terminada a liquidação, ha- do. O que se postula aqui, não é direito de
vendo ativo remanescente para ser rateado outrem, senão do próprio recorrente, que
entre os acionistas, também não seria esta tem manifesto interesse de agir, e se faz
uma das modalidades de seu direito de agir referência à sociedade é que dela não se
pelo interesse até mesmo na própria liqui- pode desligar, no instante em que, na nar-
dação? Creio que sim. ração dos fatos para a fundamentação de
Acrescente-se a este óbice um seguinte, seus direitos, haveria, forçosamente, por
quanto ao recorrente, a vedar-lhe o acesso írrito se ao contrário não se lhe reconheces-
à prestação jurisdicional reclamada, por in- se a exposição pormenorizada dos fatos, de
cidir na hipótese, a outra norma adjetiva, abordar as relações entre o acionista, ou do
contida no artigo 6°, da Lei Processual Ci- próprio Presidente, e o acervo da massa
vil, que interceptaria a pretensão, pois em liquidação, que intenta desfazer com o
«ninguém poderá pleitear em nome pró- ajuizamento da segurança. Nada mais do
prio, direito alheio, salvo quando autori- que isto.
zado por lei». Mesmo como acionista na dicção do
E a dedução que se depreende da con- acórdão não se asseguraria ao recorrente a
via judicial, na medida em que o artigo 109,
clusão a que alvitrou a decisão recorrida,
da Lei das Sociedades Anônimas, especifi-
outra seguramente não poderá ser a de estar
a impetração em busca de direito de ou- ca claramente os direitos dos acionistas, já
trem, c não a de seu próprio, ou seja, direito referidos anteriormente na transcrição do
subjetivo do recorrente. voto do em. Ministro José de Jesus Filho, e
que em nenhuma parte desse elenco, e em
Também não é esta, concludente e defi- nenhum outro lugar, sinaliza a obstaculiza-
nitivamente, a causa de pedir, que é explí- ção de o acionista, não detentor de poder de
cita e clara na exordial. Está expressa às administração — somente o liquidante o
páginas 21/22, pode fazer —, de pleitear em juízo. Com
R.T.J. — 158 115

este enfoque não conheceu o Tribunal o processuais para o ajuizamento de sua irre-
remédio heróico, evidentemente sem aden- signação, cuja premissa não é correta,
trar o mérito. como exsurge daquela mencionada nor-
Reconheça-se, desde já, haver-se lavra- ma.
do equívoco quanto à conclusão a que se A pergunta lógica que daí se obtém é a
destinou o mencionado acórdão. Em ne- de que o ato — que indiscutivelmente é
nhum momento, quer na petição inicial, traumático e excepcional, da dissolução de
quer nas outras intervenções do recorrente, uma sociedade como a que integra o recor-
em momento algum, deixou ele de afirmar rente —, jamais poderá ser discutido em
a natureza concreta da res deducta, ou seja, juízo, prevalecendo o certo ou errado da
de que se valia do Judiciário para questio- potestatividade da decisão ministerial.
nar a inconstitucionalidade e ilegalidade da
portaria ministerial para ensejar o restabe- Sim, pois hoje, quem tem lekithnidade
lecimento da patente da seguradora, pois se processual para questionar o ato, será exa-
inquinado de vício ou erro o edito governa- tamente o emissário do Ministro de Estado,
mental, como sustenta, reativada a socieda- que acumulando a qualificação de Minis-
de, e em condições de pleno funcionamen- tro, também preside o Conselho Nacional
to, restar-lhe-ia a participação em seus di- de Seguros Privados — CNSP, que indica-
videndos, que é o que estimula organiza= ra para gerenciar a liquidação, pessoa de
rem-se as pessoas entre si, para que em se sua estreita confiança, aliás funcionário
agrupando de modo associativo em um aposentado da Susep! Jamais vai desobede-
mesmo negócio, e cujo objetivo subjacente cer a ordem de quem o nomeou, sob pena
é o lucro, se espera advenha do capital de perder o bom salário que recebe dos
empregado. cofres da empresa, como liquidante oficial,
e que se constata dos autos.
Da leitura atenta que fiz, quer da Lei n°
6.404, de 15 de dezembro de 1976 — que Com todas as vênias que me merece a
dispõe sobre as sociedades por ações —, decisão atacada, parece-me falsa a premis-
quer no Decreto-Lei n° 73/76, que trata da sa concludente em que se ateve. A questão
política de seguros —, nada encontrei, ab- de fundo, básica, nodal, não é a de saber se
solutamente nada encontrei, inclusive em o recorrente é detentor ou não dos pressu-
suas modificações, algo que dissesse que o postos para o processo, com supedâneo na
acionista minoritário não possa recorrer à ausência de norma positiva das leis que
justiça, fora dos limites de seu artigo 109 regulam a matéria, para legitimar o pleito
(Lei n° 6.404/76) e de sua exegese que nele do recorrente. A meu ver, segundo a siste-
se define, na defesa dos direitos do acionis- mática de nosso ordenamento constitucio-
ta, segundo os quais, nessas hipóteses, pode nal, nada impede, senão encoraja quem, em
ele se valer legitimamente da prestação ju- situação como a que retrata os autos, veja-
risdicional a que tem direito. se impedido de pleitear a reparação de um
E se norma, nesse sentido existisse, es- ato, que ele, somente ele o acionista, tem
taria contaminada com o vício da inconsti- condições de exercitar.
tucionalidade. E mais do que isto, sendo o Presidente
A interpretação, a meu ver, desse enun- da Diretoria e Presidente do Conselho de
ciado de classificação dos direitos do acio- Administração, por ocasião da intervenção,
nista, impõe-se ao evidente resultado de não é admissivel que, com tudo isso, este
que o recorrente não reúne os pressupostos acionista, na plenitude de seus direitos de
116 R.T.J. — 158

cidadania, depare-se com a negativa de Clássico no Direito Comercial, Vivante


prestação jurisdicional a que tem direito? exerceu profunda influência na montagem
Com os seus bens postos em indisponi- de nossas instituições de direito comercial,
bilidade, por decisão administrativa, será em homenagem freqüente que lhe prestam
que, mesmo assim, não pode provar seu Waldemar Ferreira, Miranda Valverde,
direito, sua inocência, ou pelo menos, a ter Cunha Peixoto, João Eunápio Borges e tan-
uma decisão ainda que seja contrária ao tos outros tratadistas versados em Direito
que pede? Comercial, em suas obras, sobre o que dele
herdamos neste campo do direito.
Não registram os autos que haja inqué- Observe-se, por exemplo, dois vetustos
rito policial ou ação penal contra o recor- arestos, que já àquela época, definiam os
rente, apesar de o tempo decorrido entre a encargos do liquidante:
data da portaria de cessação das atividades
da seguradora até o presente momento, «O liquidante de uma sociedade anô-
apesar de já terem-se vencidos alguns anos. nima pode acionar conjuntamente vá-
O direito de recorrer ao judiciário não im- rios acionistas para obrigá-los a inte-
pede o autor do mais grave dos crimes gralizar as ações que subscreveram» (Ac.
hediondos de vir ao Supremo Tribunal Fe- do Trib. de Justiça de São Paulo na ApeL
deral, por exemplo, em habeas corpus, n° 12.816, rel. Des. Simiano de Souza, in
para dizer que está sofrendo constrangi- Rev. dos Tribs., S. Paulo, 1924, 52/400).
mento. (In Cunha Peixoto, «Sociedade por
Ações», ed. Saraiva 4°, págs. 314/315).
Ao recorrente não foi possível, até este
instante, que sequer seja-lhe reconhecido o «A sociedade anônima tem ação
direito a esta prerrogativa constitucional, executiva contra os acionistas, para
de ver a sua qualificação de acionista mi- compeli-los a integralizarem as ações
noritário, sujeita, pelo menos, ao direito à que hajam subscrito, salvo disposição
jurisdição, que como se viu, foi-lhe negada estatutária em contrário, que preva-
face a alegada inexistência da legitimatio lece» (Ac. do Supremo Tribunal Federal
ad causam. n° 15.161, rel. Min. Aníbal Freire, in
Rev. Forense, Rio de Janeiro, 1950,
Césare Vivante, em sua clássica obra 128/404, ob. cit. 2° vol., págs 387/388).
«Instituições de Direito Comercial», a res-
A vigente lei de sociedades anônimas,
peito das dissoluções e liquidações, já men-
modernizada apenas com a entronização de
cionava, muitos anos atrás que,
novos institutos que surgiram com a evolu-
«a função dos administradores, que ção do mundo econômico, ainda, na essên-
exerciam ativamente o comércio, é cia, é a repetição do velho projeto de Mi-
substituída, como vimos relativamente randa Valverde, particularmente quando
à sociedade em nome coletivo, pela dos dela tratou o Decreto-Lei n° 2.627, de 26 de
liquidatários, que não podem empreen- setembro de 1940, com as alterações da Lei
der novas operações, mas devem esfor- n° 4.728, de 14 de julho de 1965 — a
çar-se solicitamente em cobrar os crédi- chamada Lei do Mercado de Capitais. Em
tos, a fim de pagar os débitos à medida todas elas repetindo-se na verdade, quanto
que se vão vencendo, a converter em aos deveres e obrigações do liquidante, o
dinheiro o patrimônio social» (ob. cit., que preceitua o velho Código Comercial
tradução J. Alves de Sá, Editora A. M. em seu artigo 345 — impondo ao liquidan-
Teixeira & Cia. Ltda., pág. 108, Lisboa). te, as responsabilidades do administrador
R.T.J. — 158 117

—isto tanto na liquidação judicial como na O recorrente não pode ter as portas do
extrajudicial ou na voluntária proposta pela Judiciário fechadas. Na petição arrolam vá-
Assembléia de Acionistas ou quanto à ori- rias inconstitucionalidades que teriam
ginária de ato oficial — dentre elas a de ocorrido em virtude da portaria ministerial.
ajuizar ações executivas para o cumpri- Não sei se procede ou não procedeo mérito.
mento de obrigação de subscrições de Cuido-me apenas da preliminar de conhe-
ações. Obrigação, inclusive, como antes cimento. E o faço seguro de que, se lei
salientei, decorrente também do Decreto- houvesse que impedisse o requerente de
Lei n° 73/76, que o liquidante promoverá buscar a reparação de um direito perante o
contra o recorrente, caso não tenha integra- Poder Judiciário, no mínimo esta lei seria
lizado as suas ações. inconstitucional. A Constituição Federal,
que a despeito de seus defeitos, mereceu do
Este diploma, que autoriza a liquidação
mundo civilizado os maiores elogios na
e de que se valeu o Ministro de Estado para
parte relativa aos direitos e garantias in-
o seu ato, curiosamente é o mesmo que
determina ao liquidante que cobre do acio-
dividuais, inexoravelmente, em seu inciso
XXXV, do artigo 5°, não marginaliza o
nista que não integralizou as suas ações,
recorrente ao sagrado direito de ver a sua
que o faça. Confira-se:
pretensão examinada.
«Art. 99 — Além dos poderes ge- As duas primeiras Constituições repu-
rais de administração, a Susep ficará blicanas não explicitaram as garantias indi-
investida de poderes especiais para re- viduais, o que teria levado Rui Barbosa a
presentar a Sociedade Seguradora liqui- extrair da teoria da separação dos Poderes,
danda, ativa e passivamente, em juízo a afirmação de que
ou fora dele, podendo:
«na ordem jurídica de nossos tempos
a) propor e contestar ações, inclusi- não se há mister de para cada hipótese,
ve para integralização de capital pelos encontrarmos especificamente consa-
acionistas (...).» grada a faculdade legal de manter o di-
reito mediante ações judiciárias adequa-
Observe-se que brutal paradoxo. A lei das. A toda violação de um direito res-
exige que o liquidante execute o acionista ponde sempre uma ação correlativa, in-
que não integralizou o seu capital em ações, dependentemente de lei especial que a
mas ao contrário, o acionista não tem direi- outorgue» (In o direito do Amazonas,
to a nada, nem mesmo sequer a perguntar vol. 1, pág. 377, citado por Alcino Pinto
aos juízes se a cassação do funcionamento Falcão em «Comentários à Constitui-
da sociedade de que faça parte, se tem ele ção», 1° vol., Ed. Jur. Freitas Bastos,
ou não direito a questioná-la, porque senão pág. 253).
ele, ninguém o faria!
Somente a partir da Constituição de
Que se dirá do enunciado de Ulpiano, 1946, foi insculpida a regra do artigo 141,
«se quid universitati debetur, singulis § 4°, assecuratória de que a lei não poderá
non debetur, nec quod debet universita- excluir qualquer lesão de direito individual,
tis, singuli debent» (In Digesto, 3, 4, 7, § como prerrogativa do judiciário. Enuncia-
1°), ou seja, se alguma coisa é devida à do novo no nosso ordenamento constitu-
liquidação, não o é aos acionistas, e o que cional, uma vez que a Constituição de
a sociedade deve, não é devido pelos acio- 1937, evidentemente, ao tema nada se refe-
nistas. riu e parcimoniosamente, por incrível que
118 R.T.J. —158

pareça, somente a do Império o fez, estabe- Sampaio Dória, também em seu livro
lecendo o seu artigo 179, n° XII que «será «Direito Constitucional», 3° edição, 1°
mantida a independência do Poder Judi- Tomo, da Companhia Editora Nacional,
cial. Nenhuma autoridade poderá evo- pág. 109, não é menos contundente:
car as causas pendentes, sustá-las ou fa- «O mesmo, na sociedade de capitais.
zer reviver os processos findos». Acionista nenhum pode ter o direito ex-
Comentando o artigo 141, § 4°, da Cons- clusivo, só porque tal se presuma, de
tituição de 1946, o Ministro Temístocles impor sua vontade aos co-associados.
Cavalcante, na sua «Constituição Federal Os lucros da empresa, ou a falência so-
Comentada», vol. III, José Konfino Editor, cial interessam o patrimônio de todos os
pág. 76, adverte: acionistas: ou vão eles embolsar divi-
dendos, ou perder as ações. Uma ou
«Mas essa intervenção judicial, na outra conseqüência, à parte a sorte, ou o
proteção dos direitos e garantias indivi- azar dependerá dos diretores que a so-
duais, não exclui o juiz da obrigação de ciedade tiver. Logo, a todos os acionis-
considerar também as razões e os moti- tas há de caber a organização, direção e
vos dos atos, reconhecendo assim, im- administração da empresa, através, em-
plicitamente a necessidade do uso do bora, dos representantes que elejam. Im-
poder discricionário, por motivo de in- por um deles sua vontade onipotente aos
teresse público. outros seria contra as leis naturais da
associação, e, pois, ato ilegítimo. Seria
É que também o exercício desse po- receber uns as conseqüências dos que
der se verifica ou se legitima em benefí- outros tenham feito, e, pois, violação à
cio da proteção dos direitos, a fim de lei necessária da responsabilidade.»
manter-se o seu justo equilíbrio.
Dissertando sobre o inciso XXXV, do
Não há, portanto, muitas vezes, vio- artigo 5°, da atual Constituição, salienta
lação ao direito pelo fato do uso do Alcino Pinto Falcão,
poder discricionário porque o seu exer- «de minha parte, sustento que o inciso
cício legítimo e adequado se concilia, em comentário não apenas veda a exclu-
perfeitamente, com a proteção daqueles são da apreciação da lesão de direito
direitos. pelo Poder Judiciário, mas também lei
que implique numa procrastinação arbi-
A questão apresenta mais complexa, trária da apreciação; uma ou outra serão
quando o ato é daqueles que se avizi- inconstitucionais. Em princípio não há
nham das questões políticas, isto é, das diferença entre justitia denegata vel
questões atribuídas especificamente a protracta, raciocínio que mais se refor-
qualquer dos poderes. E assim que, mes- ça se se atentar em que basta, pelo inciso
mo os atos políticos em sua natureza, a ameaça ao direito (postulação preven-
podem ser corrigidos pelo poder judi- tiva, pois, que ficará empachada, se to-
ciário, naquilo que possa atingir, em leradas dilações ao recurso via judiciá-
seus efeitos, direitos individuais; será ria)». (Ob. cit. págs. 255)
menos o ato, em si, que os efeitos atin-
gidos pelo exame judicial. E o poder Aduz, ainda o comentarista, salientando
judiciário não deve temer em assegurar que
essa proteção, sob pena de renunciar à «o texto atual tem uma redação digna de
sua função específica.» encômios e corrigiu uma indevida res-
R.T.J. — 158 119

trição (protelatória), que injunção auto- sob dois prismas: (1) como interdição ao
ritária fizera inserir no § 4°, do art. 153 juiz de fazer distinção entre situações
da Constituição em vigor durante o re- iguais, ao aplicar a lei; (2) como interdi-
gime castrense, exigindo que fossem, ção ao legislador de editar leis que pos-
previamente exauridas as vias adminis- sibilitem tratamento desigual a situa-
trativas. Pelo atual inciso, essa corrup- ções iguais ou tratamento igual a situa-
ção do princípio do livre acesso ao Po- ções desiguais por parte da justiça;»
derJudiciário não mais subsiste e trouxe e mais adiante, à pág. 223, agrega:
novidade: basta a plausibilidade da
ameaça ao direito, não mais se exigindo «A outra forma de Inconstitucionali-
a ocorrência da lesão consumada. E pro- dade revela-se em se impor obrigação,
teção não só para o indivíduo, pessoa dever, ônus, sanção ou qualquer sacrifí-
física, como para a pessoa jurídica, de cio a pessoas ou grupos de pessoas, dis-
que faça parte, como parece evidente, já criminando-se em face de outros na
que os direitos subjetivos tanto podem mesma situação que, assim, permanece-
ter como titular aquele ou esta, não ha- ram em condições mais favoráveis. O
vendo motivo honesto e sério para dar o ato é inconstitucional por fazer discrimi-
recurso a um e negar o outro.» (Ob. cit. nação não autorizada entre pessoas em
págs. 255/256) situação de igualdade. Mas aqui, ao con-
trário, a solução da desigualdade de tra-
José Afonso da Silva, no seu consagrado
tamento não está em estender a situação
«Curso de Direito Constitucional Positi-
jurídica detrimentosa a todos, pois não
vo», Malheiros Editores, 10° edição, 1994,
é constitucionalmente admissível impor
pág. 213, esclarece:
constrangimentos por essa via. Aqui a
«A concepção de que o princípio da solução está na declaração de inconsti-
igualdade perante a lei se dirige prima- tucionalidade do ato discriminatório em
riamente ao legislador avulta a impor- relação a quantos solicitarem ao Poder
tância da igualdade jurisdicional. Pois, Judiciário, cabendo também a ação dire-
se o princípio se dirigisse apenas ao ta de inconstitucionalidade por qualquer
aplicador da lei, bastaria a este repetir o das pessoas indicadas no art. 103.»
princípio da legalidade; o da igualdade
estaria também salvo. No sentido da Em magnífica monografia sob o título
concepção exposta, que é a correta e «O Direito Constitucional à Jurisdição»,
pacificamente aceita, o princípio da publicada em as Garantias do Cidadão
igualdade consubstancia uma limitação na Justiça», Editora Saraiva, 1993, págs.
ao legislador, que, sendo violada, im- 31/51, Cármen Lúcia Antunes Rocha, de-
porta na inconstitucionalidade da lei, em senvolve admirável avaliação sobre o tema,
termos que especificaremos mais adian- que transcrevo, da página 33, o seguinte
te. Constitui, por outro lado, uma regra trecho:
de interpretação para o juiz, que deverá «Sem o controle jurisdicional, todos
sempre dar à lei o entendimento que não os agravos às liberdades permanecem
crie condições. A igualdade perante o no limbo político e jurídico das impuni-
juiz decorre, pois, da igualdade perante dades. Todas as manifestações da liber-
a lei, como garantia constitucional in- dade, todas as formas de seu exercício
dissoluvelmente ligada à democracia. O asseguradas de nada valem sem o res-
princípio da igualdade jurisdicional ou pectivo controle jurisdicional. A liber-
perante o juiz apresenta-se, portanto, dade sem a garantia do pleno exercício
120 R.T.I. — 158

do direito à jurisdição é falaciosa, não Não concebo entender, segundo o orde-


beneficia o indivíduo, pois não passa de namento constitucional vigente, que um
ilusão do direito, o que sempre gera o acionista de poucas ações não possa plei-
acomodamento estéril e a desesperança tear seus direitos perante o Poder Judiciá-
na resistência justa e necessária. Não é rio. O contrário seria um absurdo inominá-
por acaso que os regimes políticos anti- vel. O recorrente na exordial invoca vários
democráticos iniciam as suas artes e ma- dispositivos constitucionais que assegura-
nhas políticas pela subtração ou pelo riam o seu direito, tais como os incisos
tolhimento do direito à jurisdição. E que XVI, XIX, XXI, LIV e LV do artigo 5° da
sem este direito plenamente assegurado Constituição Federal
e exercitável o espaço para as estripulias Para mim, nenhuma violação é mais gra-
dos ditadores é mais vasto e o descon- ve do que a que nega o cumprimento do
trole de seus comportamentos confere- preceito do inciso XXXV da Lei Maior,
lhes a segurança de que eles se vêem assecuratória da apreciação da lesão de di-
necessariamente de continuar no poder. reito poder ser examinada pelo Poder Judi-
O direito à jurisdição, ao garantir todos ciário.
os direitos, especialmente aqueles con- Se norma existisse que vedasse esse
siderados fundamentais, conforme a se- acesso, claro que seria de indiscutível in-
gurança jurídica mais eficaz ao indiví- constitucionalidade. E porque o acórdão
duo e ao cidadão, gerando, paralelamen- recorrido, na verdade, negou foi essa prer-
te preocupação dos eventuais titulares rogativa do recorrente, ao dizer que o sócio
de cargos públicos com a sociedade e menor não tem legitimidade para estar em
com os limites legais a que se encontram juízo, peço vênia ao em. Ministro Francisco
sujeitos.» Rezek, de quem sempre busco lições, para
desta feita, dele divergir, conhecendo do
E à página 47, acrescenta: recurso e lhe dando provimento para o fim
de determinar a remessa dos autos à instân-
«Este direito constitucional à jurisdi- cia a quo para que prossiga no julgamento
ção assegura todos os direitos reconhe- da impetração, como entender de direito.
cidos, declarados, constituídos e garan-
tidos no sistema jurídico e configura, EXTRATO DA ATA
paralelamente, dever inarredável do Es-
tado. Cuida-se de direito fundamental RMS 21.960 — DF — Rel.: Min. Fran-
ativo, que impulsiona a entidade estatal cisco Rezek. Recte.: Raul de Souza Silveira
a prestá-lo, ou seja, a fazer, a agir, rápida (Advs.: Sérgio Ferraz e outros). Recda.:
e eficazmente, tão logo para a sua pres- União Federal (Adv.: Advogado-Geral da
tação seja provocado pela sociedade, in- União).
dividualmente ou por meio de coletivi- Decisão: Após o voto do Sr. Ministro
dades, nos termos das normas vigentes Relator negando provimento ao recurso e
sobre a matéria. Não há democracia pos- do Sr. Ministro Maurício Corrêa conhecen-
sível, nos dias atuais, sem a plena e do do recurso e lhe dando provimento para
eficiente garantia do direito à jurisdição. que o Tribunal «a quo» prossiga no julga-
É esse o direito que assegura a eficácia mento como entender de direito, o julga-
plena dos direitos constitucionais fun- mento foi adiado em virtude do pedido de
damentais nos momentos de conflito à vista formulado pelo Sr. Ministro Marco
sua aplicação e realização. Aurélio.
R.T.J. — 158 121

Presidência do Senhor Ministro Néri da alcançar irreversivelmente o patrimônio


Silveira. Presentes às Sessão os Senhores destes. A seguir, no fecho do mandado de
Ministros Marco Aurélio, Francisco Rezek segurança, salientou-se, mais uma vez, que,
e Maurício Corrêa. Ausente, justificada- no caso, tinha-se como atingido o próprio
mente, o Sr. Ministro Carlos Velloso. Sub- patrimônio.
procurador-Geral da República, o Dr. Senhor Presidente, a matéria atinente ao
Cláudio Lemos Ponteies. sistema nacional de seguros privados faz-
Brasília, 22 de agosto de 1995 — Wag- se disciplinada via decreto-lei — Decreto-
ner Amorim Madoz, Secretário. Lei no 73, de 21 de novembro de 1966. Tal
VOTO (VISTA) Diploma, na parte concernente à liquida-
ção, é suficientemente claro quanto às con-
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor seqüências da liquidação. Dispõe que, uma
Presidente, a ementa do acórdão impugna- vez procedida a liquidação, ocorre, como é
do, mediante o recurso ordinário ora em natural, o afastamento daqueles que diri-
exame, da lavra do Ministro José de Jesus gem a empresa, cuja representação em juí-
Filho, é suficientemente clara: zo passa a estar a cargo da SUSEP —
«Liquidação extrajudicial. Socieda- Superintendência de Seguros. Isso está no
de de Seguro. Ilegitimidade ativa ad artigo 99:
causam de acionista nos termos do arti- «Além dos poderes gerais de admi-
go 109 da Lei 6.404/76 para suspender nistração, a SUSEP ficará investida de
os efeitos da Portaria do Ministro da poderes especiais para representar a So-
Fazenda que decretou a liquidação ex- ciedade Seguradora liquidanda, ativa e
trajudicial de Sociedade de Seguro. passivamente.»
Mandado de segurança não conhe- A sociedade, portanto, perde a possibi-
cido.» lidade de gerir negócios e de credenciar
No caso, concluiu-se ser o Impetrante advogado para defendê-la em juízo.
carecedor da ação mandamental. Dá-se uma representação legal que dis-
O Impetrante, acionista, era Diretor- pensa, portanto, o instrumento de mandato
Presidente e Presidente do Conselho de que é a procuração. Mais adiante cogita-se
Administração da empresa liquidanda, e da compensação de crédito pelo Instituto de
articulou, na inicial, a transgressão do de- Resseguros do Brasil, com o valor das
vido processo, no que decretada essa liqui- ações efetivamente realizadas pela socieda-
dação sem o atendimento de certas forma- de seguradora liquidanda, chegando-se ao
lidades. Aludiu à qualidade de acionista e envolvimento do patrimônio do acionista.
fez ver que, na espécie, teve alcançado o Mais adiante, há preceito prevendo que
próprio patrimônio. a SUSEP terá direito à comissão de cinco
Assiste ao Impetrante o direito líquido e por cento sobre o ativo apurado nos traba-
certo de pedir essa segurança, de requerer lhos de liquidação. E aqui cuida-se dos
a concessão de medida liminar contra os bens da sociedade, em relação aos quais há
atos praticados, até porque o processo de de se reconhecer, por parte dos acionistas,
liquidação resulta na realização do ativo, um interesse quanto à intangibilidade. Não
dos bens da Seguradora, e no pagamento pára aí o Diploma, Senhor Presidente. O
dos credores, tudo sob a direção da Supe- artigo 109 versa sobre a responsabilidade
rintendência de Seguros Privados, sem in- de diretores, administradores, gerentes e
terferência dos acionistas, fatos capazes de fiscais das sociedades seguradoras, rever
122 R.T.J. — 158

lando o preceito que eles responderão soli- sentando a legitimidade ad causam do im-
dariamente — e, portanto, relativamente à petrante Raul de Souza Silveira e, com isso,
dívida única, sendo responsáveis pela tota- reformando o acórdão proferido pelo Supe-
lidade — é isso que significa a solidarieda- rior Tribunal de Justiça, para que, retoman-
de — pelos prejuízos causados a terceiros, do os autos, prossiga na apreciação do man-
inclusive aos seus acionistas, em conse- dado de segurança, afastado o óbice indi-
qüência do descumprimento de leis, nor- cado.
mas e instruções referentes às operações de
VOTO
seguro, co-seguro, resseguro ou retroces-
são, e em especial, pela falta de constitui- O Sr. Ministro Néri da Silveira (Pre-
ção das reservas obrigatórias. sidente): Dúvida efetivamente poderia sub-
Indago: diante desse contexto normati- sistir, quanto à legitimidade de outro qual-
vo, como afastar, como fez a Corte de ori- quer acionista, que não detivesse na empre-
gem, o interesse jurídico do Impetrante-ad- sa submetida à liquidação a posição de
ministrador, já que poderá ter os bens al- comando mantida pelo impetrante, na
cançados para satisfação de possíveis cre- oportunidade, presidente da Seguradora e
dores e também acionistas? Não vejo também de seu Conselho de Administra-
como, Senhor Presidente, caminhar-se nes- ção. Com o decreto de liquidação da enti-
se sentido. Para mim, com a devida vênia dade, sua administração passou a fazer-se
do Ministro-Relator que nega provimento pela SUSEP, nos termos do art. 99 do
ao ordinário, é olvidar o devido processo Decreto-Lei 7.366, vale dizer, afastados
legal. É deixar a parte que, em tese, está foram os administradores da empresa. A
prejudicada — não estou analisando o tema impugnação a esse ato de intervenção do
de fundo — sem o acesso ao Judiciário. É Estado na entidade, e, ainda, ao decreto de
colocar em plano secundário as garantias sua liquidação, somente poderia ser efeti-
constitucionais dos incisos XXXV e LV do vamente realizada por quem vinha repre-
artigo 5° da Carta de 1988. sentando os interesses da empresa atingida
pelo ato do Estado; do contrário, o ato de
Não trouxe voto escrito, porque a parte liquidação ficaria, em linha de princípio,
doutrinária foi muito bem explorada pelo insusceptível de ser trazido ao controle ju-
Ministro Maurício Corrêa, no tocante à tese dicial. Dir-se-á que a administração era rui-
que também sustento, como também foi nosa e por isso a liquidação se fez necessá-
muito bem explorada pelo Ministro Fran- ria. Mas precisamente isso é que os admi-
cisco Rezek, ao referendar, ao endossar a nistradores, não conformes com o ato ofi-
decisão do Superior Tribunal de Justiça que cial, querem ver discutido em Juízo.
resultou na declaração da carência da ação
mandamental. Apenas procurei realçar, Compreendo, assim, que o mandado de
para uma reflexão, o teor do Decreto-Lei segurança, impetrado contra o ato de liqui-
que rege o assunto, no que revela, clara- dação pelo então presidente da empresa e
mente, a responsabilidade dos diretores, de seu Conselho de Administração, foi re-
administradores e gerentes. E o Impetrante querido por quem estava para tanto legiti-
era Presidente da Seguradora e também do mado. Em primeiro lugar, porque afastado
Conselho de Administração. da gestão da empresa; em segundo lugar,
porque o decreto de liquidação o atinge,
Voto, com a vênia do Ministro Francis- bem como a todos os administradores, de
co Rezek, no sentido do pronunciamento uma forma direta, no que conceme, inclu-
do Ministro Maurício Corrêa, ou seja, as- sive, a seus bens, que ficam indisponíveis
R.T.J. — 158 123

durante a gestão relativa à liquidação da EXTRATO DA ATA


empresa e podem, até, ser comprometidos
por eventual co-responsabilidade, com to- RMS 21.960 —DF —Rel.: Min. Francis-
das as conseqüências passivas reveladas co Rezek. Recte.: Raul de Souza Silveira
pela liquidação. (Advs.: Sérgio Perfaze outros). Recda.: União
Federal (Adv.: Advogado-Geral da União).
Penso, nessa linha de visualização da
súplica, que, ao presidente de entidade sub- Decisão: Por maioria, a Turma, deu pro-
metida a liquidação, há de ser reconhecida vimento ao recurso para, afastada a ilegitimi-
legitimação ativa, a fim de defender os atos dade ativa «ad ornaram» do impetrante e re-
por ele praticados e a entidade presidida, corrente, determinar prossiga o Tribunal «a
quando se atacar o ato de intervenção. Se no quo» no julgamento do mandado de seguran-
mérito procede, ou não, é exatamente o que ça como entender de direito, vencido o Sr.
cabe ser decidido. Ministro Francisco Rezek (Relator) que ne-
gava provimento ao recurso. Relator para o
Último a votar, com essas brevíssimas acórdão o Sr. Ministro Maurício Corrêa.
considerações e reconhecendo a legitimidade
ativa do impretrante à ação de segurança, dou Presidência do Senhor Ministro Néri da
provimento ao recurso para, cassado o acór- Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
dão recorrido, prossiga a Corte, a quo no Ministros Carlos Venoso, Marco Aurélio,
exame do presente mandado de segurança. Francisco Rezek e Mauricio Corrêa. Sub-
procurador-Geral da República, o Dr.
Acompanho, destarte, os votos dos emi- Mardem Costa Pinto.
nentes Ministros Maurício Cont e Marco
Aurélio, com a vênia do eminente Ministro Brasília, 12 de setembro de 1995 —
Relator. Wagner Amorim Madoz, Secreto.

MANDADO DE SEGURANÇA Isr 21969 — DF


(Medida Liminar)
(Tribunal Pleno)
Relator: O Sr. Ministro limar Gaivão
Impetrantes: SINDILEGIS — Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo
Federal e do Tribunal de Contas da União — Impetrado: Presidente da República
Administrativo. Mandado de segurança coletivo. Ato pelo qual
o Presidente da República teria determinado a retenção de parcela corres-
pondente a 10,9% do valor dos vencimentos dos servidores filiados ao
Impetrante, já creditados em conta-corrente, no Banco do Brasil.
Liminar parcialmente deferida, para o fim de ser providen-
ciado, pela autoridade impetrada, o imediato depósito — no Banco do
Brasil, em contas especiais sujeitas a correção monetária, abertas em
nome da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Tribunal de
Contas da União, e mantidas à ordem do Supremo Tribunal Federal, até
final julgamento — dos montantes retirados das contas bancárias per-
tencentes aos servidores de cada um dos mencionados órgãos.
124 R.T.J. — 158

ACÓRDÃO dispositivo que lhe reserva competência


Vistos, relatados e discutidos estes au- para fixar a remuneração dos cargos de seu
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- quadro de pessoal.
bunal Federal, por seu Tribunal Pleno, na Pediu fossem determinadas ao impetra-
conformidade da ata do julgamento e das do «as providências cabíveis no sentido de
notas taquigráficas, por maioria de votos, efetuar de imediato o pagamento integral
em deferir parcialmente a medida liminar, dos valores constantes dos respectivos bi-
para determinar o imediato depósito — no lhetes de pagamento, sob as penas da lei».
Banco do Brasil S.A., em contas especiais Requereu mais seja oficiado aos Presiden-
sujeitas à correção monetária, abertas em tes do Senado, da Câmara e do Tribunal de
nome da Câmara dos Deputados, do Sena- Contas da União, dando-lhes ciência de que
do Federal e do Tribunal de Contas da a decisão do Tribunal tem caráter preventi-
União, e mantidas à ordem do Supremo vo em relação às duas primeiras institui-
Tribunal Federal, até final julgamento — ções e conetivo em relação à terceira.
dos montantes retirados das contas bancá-
rias pertencentes aos servidores de cada um A inicial veio acompanhada, a título de
dos órgãos atingidos pelo ato impugnado. ilustração, de cópia de extrato da conta do
Vencido o Ministro Marco Aurélio, que, servidor Pacífico M. da Costa e do respec-
também a deferia, em maior extensão, ou tivo contra-cheque, além de recortes de jor-
seja, para imediato crédito dos valores es- nais que noticiaram o fato.
tornados nas contas individuais dos servi- Houve, ainda, requerimento de liminar,
dores. Votou o Presidente. que considerei de bom alvitre trazer à apre-
Brasília, 28 de março de 1994 — Octa- ciação do Plenário, em questão de ordem.
vio Gallotti, Presidente — limar Gaivão, É o relatório.
Relator.
VOTO
RELATÓRIO
O Sr. Ministro limar Gaivão (Rela- O Sr. Ministro limar Gaivão (Rela-
tor): Senhor Presidente, os fatos descritos
tor): O Sindicato dos Servidores do Poder
na inicial tornaram-se de conhecimento ge-
Legislativo Federal e do Tribunal de Con-
ral, em face da grande divulgação alcança-
tas da União — SINDILEGIS impetra
da na imprensa.
mandado de segurança contra o Presidente
da República, alegando, em resumo, que o As duas Casas do Congresso, primeira-
Ministro da Fazenda, agindo por expressa mente, e, logo depois, o Tribunal de Contas
ordem de S. Exa., por meio do Aviso n° da União, diante do dever que lhes impunha
336, quando já se achavam creditados em a MP n° 434/94, de editarem as tabelas, em
conta-corrente, no Banco do Brasil, os ven- URV, dos vencimentos e vantagens dos
cimentos dos ditos servidores, do mês de seus respectivos órgãos e servidores, o fi-
março corrente, determinou, sem decisão zeram tomando por base de conversão a
judicial que o autorizasse, a retenção de medida da remuneração dos últimos 4 me-
parcela correspondente ao 10,9% do res- ses, considerada a data do respectivo dia de
pectivo valor, interferindo, com tal atitude, pagamento, não cabendo, aqui, agora, aqui-
na independência do Poder Legislativo, ra- latar do acerto ou não do critério utilizado,
dicada no art. 2° da Constituição Federal, já não obstante a questão já tenha sido decidi-
que o impediu de exercer as atribuições da afirmativamente pelo STF, em sede ad-
constitucionais previstas no art. 52, XIII, ministrativa.
R.T.J. — 158 125

Elaborada a folha dos vencimentos de dessa competência, notadamente em face


março corrente e requisitados os recursos de norma por ele próprio elaborada; com
orçamentários necessários, foram-lhe estes exclusão dos órgãos do Poder Judiciário,
repassados, regularmente e de forma inte- cuja função precípua, e que, justamente,
gral, pelas autoridades do Ministério da caracteriza o estado de direito, cuja preser-
Fazenda, mediante ordem bancária expedi- vação incumbe a todos, é ditar a última
da contra o Banco do Brasil. palavra em matéria de interpretação da lei
Já havia sido processado, pelo Banco do e da própria Constituição.
Brasil, o pagamento do pessoal dos men- Em segundo lugar, não se pode negar
cionados órgãos, mediante créditos dos res- que a determinação em causa sujeitou os
pectivos valores líquidos na conta corrente ditos servidores ao constrangimento, não
individual de cada servidor, quando sobre- menos considerável, de, em caso de con-
veio ordem da autoridade impetrada, trans- cessão da segurança, somente virem a obter
mitida ao Banco pelo Ministro da Fazenda, a reposição da parcela subtraída de seus
expressa no sentido da retenção de parcela vencimentos mediante demorados trâmites
correspondente a 10,96% dos valores líqui- judiciais, dentre os quais não se pode ter,
dos creditados, a qual foi executada, de de logo, por excluídos os infindáveis pre-
pronto, pelo Banco do Brasil, mediante es- catórios.
torno dos lançamentos, com simultâneo re-
gistro de novo crédito, por valor correspon- Estão presentes, portanto, os pressupos-
dente a 89,04% da quantia estornada. tos legais autorizadores de medida liminar.
É contra essa ordem que investe a impe- Creio, entretanto, Senhor Presidente,
tração, calcada nos incs. VI e X do art. 7° que, para a cautela reclamada, não se mos-
da Constituição, que consagram os princí- tra indispensável repor, de logo, à disposi-
pios vedadores da redução e retenção de ção dos servidores prejudicados, os valores
salários. retirados de suas contas, providência que,
O fato, descrito como está na inicial, em tese, exporia a Fazenda Nacional, por
retrata exemplo consumado de exorbitân- sua vez, a risco também despido de pronta
cia no exercício do poder público. Na ver- reparação, na hipótese de denegação da
dade, ali se desenha inusitado quadro com- segurança.
posto de inesperada ordem, unilateralmen- Tenho, portanto, como medida capaz de
te dada por autoridade sem função jurisdi- resguardar-lhes o direito, sem o inconve-
cional, para retirada, das contas de corren- niente apontado, a expedição de ordem no
tistas bancários, de recursos a elas regular- sentido de ser providenciado, pela autori-
mente carreadas por quem de direito, e que dade impetrada, o imediato depósito — no
já integravam o patrimônio dos respectivos Banco do Brasil, em contas especiais sujei-
titulares. Evidente, portanto, diante dele, a tas a correção monetária, abertas em nome
relevância do fundamento da impetração. da Câmara dos Deputados, do Senado Fe-
Por outro lado, é de reconhecer que a deral e do Tribunal de Contas da União, e
medida impugnada expôs os servidores, mantidas à ordem do Supremo Tribunal
num primeiro plano, a risco de difícil, se- Federal, até final julgamento — dos mon-
não impossível reparação, submetendo-os tantes retirados das contas bancárias per-
à perspectiva de terem os seus direitos ar- tencentes aos servidores de cada um dos
bitrados, com pretensão de definitividade, mencionados órgãos, atingidos pelo ato im-
por órgão constitucionalmente despido pugnado.
126 R.T.J. — 158

Para o fim explicitado, meu voto é no dos brasileiros que foram seduzidos por
sentido de deferir parcialmente a liminar uma tese forjada, oportunista e demagó-
requerida. gica.
VOTO A raridade do caso se manifesta até em
detalhes singulares como, em contraste
O Sr. Ministro Francisco Rezek: So- com a importância que a decisão tem para
bre o aspecto de bom direito da tese que o governo, a ausência de qualquer repre-
embasa o pedido de segurança, pouco há sentante do Poder Executivo nesta sala...
que dizer. O relator acaba de nos lembrar Perguntei-me se a raridade destas cir-
as circunstâncias, a natureza e o conteúdo cunstâncias e os aspectos gravíssimos da
do aparato normativo que está agora em situação criada justificariam, acaso, uma
mesa.
reforma da jurisprudência do Tribunal, no
Sabemos, entretanto, que os pressupos- sentido de que diferenças salariais contro-
tos da concessão, ainda que parcial, de me- vertidas não se devem pagar liminarmente,
dida cautelar, são dois: com o aspecto de visto que dinheiros salariais têm natureza
bom direito da tese há de coexistir a con- alimentar e, uma vez pagos, são irrecuperá-
vicção de que algo deve fazer-se desde logo veis.
para que depois, no desfecho do mandado
de segurança, não se veja consolidado um Concluí que o desfecho a ser dado ao
quadro irremediável. juízo liminar é aquele que agora propõe o
Ministro Relator. Não temos como contes-
Neste particular, estamos diante de cir- tar a firmeza do aspecto de bom direito da
cunstâncias raras. Estamos diante de um tese da impetração Não deveríamos, con-
caso absolutamente único na história da tudo, a meu sentir, romper com velha juris-
República; na história da convivência entre prudência indicativa de que dinheiros as-
as instituições republicanas. sim contestados não devem liminarmente
Aquilo que o mandado de segurança traz ser pagos.
à mesa do Supremo e à sua análise, em juízo O relator, entretanto, lembra o fator in-
liminar, é o desdobramento de um fenôme- flacionário; lembra que tais valores, de na-
no que não conhece precedentes; de um tureza salarial, deveriam ser garantidos
oceano de equívocos, determinados no mí- contra os efeitos da inflação. E preconiza
nimo pela inadvertência, quando não pelo não o pagamento, mas a preservação de tais
propósito premeditado de causar desgaste somas em contas remuneradas, sob a res-
injusto e grosseiro à instituição judiciária. ponsabilidade das instituições públicas que
Criou-se, com leviandade e perfídia, os detinham antes que um gesto extraordi-
uma situação de equívoco que só a partir da nário do Executivo dali os deslocasse.
última quarta-feira começa a sofrer coneti-
Um dia, outros aspectos desta questão
vo. A verdade transparece nos últimos dias,
e aflora com grande evidência nas publica- jurídica e de tudo que a circunda hão de
aflorar na sua integralidade, e os conhece-
ções semanais do dia de ontem, sobretudo.
Mas quem expõe aos brasileiros a verdade rão todos.
é, neste momento ainda, tão-só a imprensa Penso que o mais penoso, na sessão de
escrita, quando o engodo foi levado aos hoje, é o fantástico esforço que se impõe
ares do país pela comunicação televisiva. O para nos convencermos de que não é este,
número daqueles que agora percebem a ainda, o momento de dizer, à margem da
verdade real é bem mais estreito do que o estrita questão jurídica considerada, todas
R.T.J. — 158 127

as verdades que em momento oportuno se- na verdade, de uma decisão interlocutória.


rão ditas com clareza e, possivelmente, não Já que ao Relator está delegada a atividade
por nós. — prolação no campo monocrático de uma
Meu voto acompanha o do Ministro Re- decisão concedendo ou indeferindo a limi-
lator, deferindo em parte a medida liminar. nar — há de se admitir o cabimento de
recurso, o agravo regimental, para o Cole-
VOTO (Medida Liminar) giado. Feita esta observação, passo ao exa-
me do caso concreto.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor A competência do Supremo Tribunal
Presidente, faço, inicialmente, um registro,
Federal para julgar este mandado de segu-
para reflexão do Colegiado, quanto à tese
que venho sustentando, tendo em vista o
rança, a meu ver, decorre da circunstância
de que o ato final foi praticado tendo em
mandado de segurança e a concessão ou
vista ordem emanada do Excelentíssimo
indeferimento de liminar. Senhor Presidente da República. Mediante
Todos sabemos que, em se tratando de o Aviso n° 336, de 21 de março de 1994,
mandado de segurança impetrado no âmbi- subscrito pelo Ministro de Estado da Fa-
to de Tribunal, o Relator atua por delega- zenda, foi dirigida ao Presidente do Banco
ção, competindo-lhe apreciar o pedido de do Brasil S/A a seguinte ordem:
concessão de liminar. E o que está previsto
em nosso Regimento Interno no art. 203: «De ordem do Excelentíssimo Se-
nhor Presidente da República, determi-
«O Relator mandará notificar a auto- no a V. Sa., em relação às ordens bancá-
ridade coatora para prestar informações rias emitidas pelo Senado Federal, ór-
no prazo previsto em lei. gãos do Poder Judiciário, Tribunal de
§ 1° — Quando relevante o funda- Contas da União e Ministério Público
mento e do ato impugnado puder resul- Federal, relativas aos pagamentos das
tar a ineficácia da medida, caso deferida, folhas salariais de março de 1994, acatar
o relator determinar-lhe-á a suspensão, os respectivos valores deduzidos de
salvo nos casos vedados em lei.» 10.94%, creditando a diferença na Con-
A Corte tem admitido a devolução da ta C das unidades emitentes para poste-
prática desse ato, situado na competência rior recolhimento à Conta Única do Te-
do Relator, ao Plenário. Portanto, o Pleno souro Nacional.»
acaba emitindo entendimento sobre a pro- Portanto, o quadro revelado nestes autos
cedência, ou não, do pedido de liminar. Por resultou, certo ou errado, com extravasa-
conseguinte, examina pela vez primeira a mento, ou não, de uma ordem emanada do
liminar, pinçando, é certo, o caso concreto Excelentíssimo Senhor Presidente da Re-
pela repercussão que possua, e isto ocorre pública, praticando o Presidente do Banco
considerada a livre discrição do Relator, do Brasil S/A um ato que compreendo
que não está compelido a emprestar a um como de execução. Há de se atentar, na
certo mandado de segurança tratamento espécie, para o princípio da economia pro-
discrepante do normalmente adotado. cessual. Exige-se, no caso, o máximo de
Creio que esse fato é conducente a ca- eficácia da lei com o mínimo de atuação
minhar-se, algum dia, para a constatação da judicante. Creio que não cumpre à Corte
realidade. Uma medida liminar não se cir- pronunciar-se sobre tema jurídico, dos
cunscreve, em si, ao campo de um mero mais controvertidos, que não está colocado
despacho, tem alcance outro, cuidando-se, na impetração. Refiro-me ao fato que ense-
128 R.T.J. — 158

ja, relativamente às datas, a conversão do terial no que concerne aos lançamentos fei-
vencimento em Unidade Real de Valor. tos.
Não cabe aqui, especialmente, na aprecia- Relativamente ao alcance da medida a
ção preliminar deste mandado de seguran-
ser deferida, tenho que a natureza jurídica
ça, quando se analisa a necessidade da con- da liminar, no mandado de segurança, é
cessão, ou não, de liminar, definir-se o acauteladora. Visa a evitar prejuízos maio-
acerto ou desacerto dos enfoques que têm res para o Impetrante. Todavia, essa liminar
sido veiculados pela imprensa escrita e fa- difere substancialmente das passíveis de
lada. A questão que se coloca ao exame do serem deferidas em demandas cautelares,
Tribunal é única. É saber-se da intangibili- porque, a teor do próprio artigo 7° da Lei n°
dade das contas correntes dos substituídos
1.533/51, embora sujeita a uma condição
pelo Sindicato-impetrante.
resolutiva — a denegação da segurança —
Quanto não ao sinal do bom direito, mas tem caráter satisfatório e, para usar uma
ao bom direito em si, subscrevo os enfo- expressão do Desembargador Hamilton de
ques já dados à matéria pelos eminentes Moraes e Barros, caráter «satisfativo». O
que ocorre segundo a melhor doutrina —
Ministros limar Gaivão e Francisco Rezek.
Calmon de Passos, Celso Agrícola Barbi e
Não houve correção de um erro material Coqueijo Costa — é que, com a liminar,
notado quando dos créditos dos valores, antecipa-se, provisoriamente, a entrega da
mas um estorno ocorrido por instrução. prestação jurisdicional.
Indaga-se: instrução daquele que tinha em
patrimônio, tinha na respectiva conta cor- Senhor Presidente, a atividade jurisdi-
rente, o crédito como devidamente realiza- cional há de ser necessária, há de ser útil.
do? Não! Estorno que decorreu de instru- Presente a extensão conferida à liminar
ção de terceiro. O inciso LIV do artigo 5° pelo nobre Ministro Relator, transferindo
da Constituição Federal é categórico ao da conta do Tesouro Nacional para uma
revelar que ninguém será privado da liber- conta, também no Banco do Brasil, os va-
dade ou de seus bens sem o devido processo lores estornados — conta que passaria a
estar à disposição do Juízo competente para
legal. O que houve foi a retirada de contas
julgamento deste mandado de segurança,
correntes — inobservando-se a intangibili- que é inegavelmente o Supremo Tribunal
dade dessas contas e considerado ato de Federal —, não vislumbro os dois predica-
terceiro — de um crédito já efetuado. Em dos inerentes à atuação judicante. Ainda
relação ao risco, temos que atentar para a que se despreze o fato de o mandado de
origem desses valores, que estão ligados ao segurança não ter contornos preparatórios,
campo alimentar. Presumem-se que sejam ao reverso do que acontece normalmente
indispensáveis à subsistência própria dos com a demanda cautelar, não me parece que
correntistas substituídos pelo Sindicato- haja risco maior em deixar-se o total dos
impetrante e das respectivas famílias. Sob valores estornados onde ele hoje está: não
o ângulo individual e, também, sob o cole- acredito que se possa, a esta altura, cogitar
tivo, presentes os interesses da sociedade, de uma segurança maior para o Impetrante,
a segurança jurídica que é um dos apaná- mais precisamente para os substituídos
gios da vida gregária, tenho como existente pelo Impetrante, para os correntistas, com
o risco. Foi olvidada, repito, a intangibili- a mera transferência desses valores, do erá-
dade das contas correntes no que não pode- rio, para uma conta especial. Não receio a
riam ser tocadas, a menos que se estivesse quebra da União; não posso receá-la e nin-
diante de um erro, um flagrante erro ma- guém melhor do que a União para vir,
R.T.J. — 158 129

posteriormente, a honrar o provimento fi- impetrante, concedo a liminar, para suspen-


nal, caso favorável ao Impetrante, neste der a eficácia do ato formalizado mediante
mandado de segurança. O argumento ven- o Aviso do Ministro de Estado da Fazenda
tilado de, com isto, evitar-se o precatório n° 336, datado de 21 de março, assinado
peca pela base. Creio que se o Tribunal no pelo Ministro Fernando Henrique Cardoso
campo da simples liminar pode afastá-lo, e dirigido ao Presidente do Banco do Bra-
com maior razão poderá fazê-lo ao conce- sil, Dr. Alcir Augustinho Callíari, no que
der em definitivo a segurança. executado como tendo o alcance de autori-
Assim, peço vênia ao Senhor Ministro zar o estorno de parte de crédito de natureza
Relator para conferir à liminar a extensão alimentar, feito na conta dos substituídos
que lhe é própria, segundo o disposto no pelo Sindicato-impetrante, implicando a
artigo 7° da Lei n° 1.533, de 1951. Preceitua concessão o retorno das referidas contas ao
—e temos a repetição dele em nosso Regi- estado anterior.
mento Interno — que o Relator, no caso, É como voto na espécie dos autos, com
verificando que do ato praticado pode sur- a devida vênia dos Senhores Ministros Re-
gir prejuízo imediato para o impetrante, lator e Francisco Rezek, ressaltando que
poderá determinar que se suspenda o ato não vejo na simples transferência do mon-
que deu motivo ao pedido, e esse ato, em tante da conta do Tesouro Nacional para
última análise, é o revelado pelo Aviso do uma conta à disposição desta Corte, ren-
Ministério da Fazenda, de n° 336. Ora, se a dendo juros e correção monetária, a utilida-
atuação não leva a colocação das partes à de que deve nortear a concessão da limi-
mesma posição, mas favorece uma delas, o nar.
impetrante, com a antecipação provisória
da prestação jurisdicional, temos que con- VOTO
cluir que a suspensão conduz, necessaria-
mente, ao statu quo ante, o que implica
O Sr. Ministro Carlos Vdloso: Sr. Pre-
sidente, não me incluo entre aqueles que
dizer que as contas devem retornar à intan-
sustentam que não se pode conceder medi-
gibilidade que a elas é própria.
da liminar satisfativa. Casos há em que é
Senhor Presidente, sempre cito um tre- possível essa concessão e eu próprio, por
cho de Calamandrei, no que observou que mais de uma vez, já concedi liminar, em
«há mais coragem em ser justo, parecendo mandado de segurança, com tal sentido. É
injusto, do que em ser injusto para salva- possível a concessão de medida liminar
guardar as aparências de justiça». Frisando satisfativa quando existir, por exemplo,
ainda uma vez que, aqui, não estou direta- possibilidade de perecimento do direito.
mente a discutir o ato emanado do Excelen- Isto ocorrendo, deve ser concedida a medi-
tíssimo Senhor Presidente da República, ou da liminar, até com antecipação do julga-
seja, o enfoque dado à Medida Provisória mento da causa. Assim procedi, no antigo
n° 434 quanto à data a ser observada na Tribunal Federal de Recursos, que tive a
conversão dos vencimentos em Unidade honra de integrar, quando determinei a li-
Real de Valor, e que estou me defrontando beração do jornal «O Pasquim», que fora
com um ato de execução que, à primeira apreendido por ato do Ministro de Estado
vista, teria até mesmo extravasado o que se da Justiça. Naquele caso, ou se deferia a
contém no Aviso n° 336, pois este se fez liminar, deferindo-se, praticamente, por
direcionado a um crédito a menor, e não a antecipação, a segurança, ou seria ela inde-
um estorno a ser levado a efeito nas contas ferida, indeferindo-se, praticamente, por
correntes dos substituídos pelo Sindicato- antecipação, o writ. É que, não deferida a
130 R.T.J. —158

liminar, se concedido o writ a concessão acauteladora de direitos, apresenta razoabi-


seria inócua, dado que ninguém leria um lidade.
jornal com dois ou três meses de atraso. Com essas brevíssimas considerações,
Naquela oportunidade, invocando o juiz breves porque estamos, ainda, no juízo da
Frankfurter — «é preferível errar em favor cautelar, peço licença ao Sr. Ministro Mar-
da liberdade do que errar contra a liberda- co Aurélio para, na linha do voto do Sr.
de» — concedi a medida liminar satisfati- Ministro Relator, deferir a medida liminar
va. A decisão teve grande repercussão. para o fim de serem as importâncias retidas,
Tendo sido requerida, ao Presidente do Su- ou que foram retiradas das contas bancárias
premo Tribunal, a sua suspensão, o emi- dos servidores, postas em contas especiais,
nente Ministro Néri da Silveira, então na sujeitas à correção monetária, em nome da
presidência, indeferiu o pedido. Câmara dos Deputados, do Senado Federal
O caso ora sob julgamento, entretanto, e do Tribunal de Contas da União, à ordem
não apresenta peculiaridade capaz de auto- do Supremo Tribunal Federal.
rizar o deferimento de liminar satisfativa, É como voto.
vale dizer, para que o pagamento se faça,
VOTO
de imediato, liminarmente. É que, se con-
cedido o mandado de segurança, não resul- O Sr. Ministro Celso de Mello: A res-
tará este inócuo, nem o direito perecerá. A tauração da ordem democrática no Brasil
regra, aliás, é a não concessão de liminar não foi capaz de neutralizar a arrogância de
para o pagamento de diferenças de venci- algumas figuras de Estado que, posiciona-
mentos. Assim, com a vênia sempre devida das no Poder Executivo federal, e parecen-
ao eminente Ministro Marco Aurélio, que do demonstrar conspícua ignorância sobre
acabou de votar, concedendo a liminar para a hierarquia inerente ao sistema jurídico
que o pagamento da diferença de venci- instituído no País, pretendem sustentar,
mentos se efetive, de logo, penso que isto com o reforço primário de pronunciamen-
não seria possível, no caso, ou que a liminar tos grosseiros à Magistratura nacional, que
não poderia ser deferida, com tal extensão uma simples e ordinária medida provisória
tem mais força e autoridade normativas do
De outro lado, também penso, Sr. Presi- que princípios superiores consagrados pela
dente, que não posso sujeitar os servidores, própria Constituição da República (arts.
de cujas contas bancárias foi a diferença 96, II, b; art. 99, caput, e art. 168, p.
retirada por ato do Ministro de Estado. exemplo).
agindo em cumprimento de ordem do Pre-
sidente da República, aos percalços, que Essa censurável, distorcida e preocu-
são bastante conhecidos de quem milita no pante visão do processo político-institucio-
foro, da execução por precatório — preca- nal torna evidente que ainda há um resíduo
tório ainda, infelizmente, não indexado — de indisfarçável autoritarismo que, despo-
no caso de a segurança ser deferida, certo jado de qualquer coeficiente de legitimida-
que, no caso, é patente o fumus boni juris de, busca extrair da força e da ameaça o seu
ou a relevância dos fundamentos sobre os único e irracional argumento e título de
quais se apóia a impetração. Reconheço, sustentação.
ademais, nas parcelas pleiteadas, caráter de É preciso advertir tais setores, certa-
crédito de natureza alimentícia. Por isto, mente nostálgicos de recente e ominoso
penso que a liminar, nos termos em que período histórico que afetou e aniquilou o
concedida pelo Sr. Ministro Relator, é regime das liberdades públicas em nosso
R.T.J. — 158 131

País, que o Poder Judiciário não está sujeito obstante os efeitos perversos e as gravfssi-
aos desígnios daqueles que, insistindo em mas conseqüências que desse comporta-
submeter o império da Constituição à von- mento emergem.
tade unipessoal do Presidente da Repúbli-
ca, expressa em simples medida provisória, Aqueles que, há 30 anos atrás, golpea-
pretendem ser, por um gesto irrefletido de ram as instituições em 1964, derrubaram
autoproclamação política, os curadores do um governo legitimamente escolhido pelo
regime, sem que, para tanto, lhes assista, voto popular e, em assim procedendo, in-
nesse anômalo sistema de condomínio de terromperam arbitrariamente o processo
poder, qualquer parcela de legitimidade ju- constitucional no Brasil devem saber, onde
rídico-institucional. quer que hoje se encontrem, que essa nódoa
destaca, ad perpetuam rei memoriam, a
Os magistrados devem obediência ex- sua responsabilidade histórica na instaura-
clusiva à Constituição. Sendo assim, torna- ção e na sustentação de um nefando regime
se inaceitável qualquer tentativa de sub- autoritário que institucionalizou, a partir de
missão da Magistratura — enquanto legíti- 1968, com fundamento no AI-5 — verda-
ma expressão do poder civil — a uma nova deiro codinome do arbítrio ilimitado — um
forma de estratocracia que parece pulsar sistema político que tomou viáveis práticas
nas linhas e entrelinhas das mensagens e brutais que vieram a ser rejeitadas pela
declarações ameaçadoras que, há uma se- consciência ético-jurídica do Povo brasilei-
mana atrás, foram divulgadas pelos meios ro e das nações civilizadas.
de comunicação social.
É preciso ressaltar que a experiência
O Brasil não aceita modelos políticos de concreta a que se submeteu o Brasil no
inspiração autoritária, qualquer que seja a período de vigência do regime de exceção
denominação que se lhes dê: regime cívi- (1964/1985) constitui, para esta e para as
co-militar, ou regime de arbítrio, ou regime próximas gerações, marcante advertência
de exceção, eis que todos, sem distinção, que não pode ser ignorada: as intervenções
constituindo sistemas marginais de poder, pretorianas ou militares no domínio políti-
igualam-se nos gestos de atrevimento, de co-institucional — do pretorianismo oli-
insolência oficial e de sistemático desres- gárquico ao pretorianismo de massas, pas-
peito às liberdades e ao postulado essencial sando pelo pretorianismo radical — têm
da legitimidade democrática. representado momentos de grave inflexão
As crises políticas devem solucionar-se no processo de desenvolvimento e de con-
dentro do quadro normativo delineado pelo solidação das liberdades. Pronunciamentos
ordenamento constitucional, com os instru- militares, quando efetivados e tomados vi-
mentos jurídicos nele previstos e com fun- toriosos, tendem, necessariamente, na lógi-
damento exclusivo na rule of law. ca do regime supressor das liberdades que
se lhes segue, a diminuir (ou a virtualmente
Preconizar a dissolução do Congresso
eliminar) o espaço institucional reservado
Nacional, ou a antecipação das eleições
ao dissenso, limitando, desse modo, com
parlamentares ou, ainda, a destituição dos danos irreversíveis ao sistema democráti-
Ministros do Supremo Tribunal Federal,
co, a possibilidade de expansão da ativida-
tudo isso exprime uma clara incitação à de política e livre da cidadania.
desordem civil, que traduz o gesto acintoso
daqueles para quem a destruição do sistema As notas, declarações e manifestos que
constitucional representa o exercício banal foram divulgados apresentam-se, dentro
de,um ato de inconseqüente rebeldia, não desse contexto, como graves sinais premo-
132 R.T.J. — 158

nitórios que devem estimular, com o uso Mais sério do que isso, pretender impor
responsável dos instrumentos propiciados a vontade presidencial, negando prepoten-
pelo sistema jurídico em vigor, a imediata temente ao Judiciário, a partir de interpre-
reação do corpo social, com o objetivo de tações abstrusas e equivocadas, a possibili-
evitar que, erigindo-se membros de deter- dade de aplicar postulados da mais elevada
minado estamento corporativo, à condição estatura normativa, que encontram funda-
de guardiães exclusivos da ordem, venham mento na própria Constituição da Repúbli-
eles, no desempenho de um papel que lhes ca, significa praticar, na dimensão em que
têm recusado as formações sociais demo- se projeta o nosso sistema de direito posi-
cráticas, a atuar como árbitros únicos dos tivo, um ilícito constitucional, com grave
conflitos políticos, sociais e institucionais. subversão da hierarquia jurídica.
O texto constitucional, Sr. Presidente, Somente pessoas desatentas ao fato de
não deve expor-se a manipulações exegéti- que vivemos sob um regime constitucional
cas que somente visem a propiciar interpre- de poderes limitados, que se mostrem in-
tações jurídicas destinadas a satisfazer a fensas a qualquer compromisso com a or-
conveniência dos planos e dos projetos do dem jurídica consagrada pela Constituição
Poder Executivo. A Constituição não é — que representa, no seio das sociedades
mera lex privata. O Estado não pode inter- politicamente organizadas, o único parâ-
pretá-la somente pro domo sua. Ela repre- metro subordinante de todas as ações esta-
senta, na abrangência do seu subordinante tais — seriam capazes de desrespeitar os
domínio normativo, o instrumento de defi- fundamentos em que se assenta, com toda
nição das relações institucionais entre os a plenitude de sua legitimidade, o Estado
Poderes da República e o manto protetor democrático de direito.
das liberdades públicas em face do caráter
expansivo da atuação do poder estatal. Pretensões remuneratórias não podem e
não devem ser utilizadas por quaisquer cor-
Interpretações facciosas da Constitui- porações como instrumento de pressão so-
ção, que somente considerem, como pers- bre o poder civil, especialmente quando
pectiva única do intérprete, a visão dos acompanhadas de ensaios explícitos de do-
interesses institucionais do Poder Executi- loso confronto institucional.
vo, deslegitimam-se por si próprias, em
face da natureza de que se reveste o texto A interpretação de uma medida provisó-
constitucional, vocacionado — enquanto ria não pode limitar-se à análise isolada e
obra de compromisso resultante do consen- gramatical do seu texto. A hermenêutica —
so da comunhão nacional — a tornar efeti- a boa e competente hermenêutica — impõe
vos, na prática concreta das instituições, os que a exegese dos atos do Poder Público
postulados do pluralismo político, da livre seja feita de modo sistêmico. A interpreta-
circulação de idéias, das liberdades públi- ção compatibilizadora de uma medida pro-
cas e da divisão funcional do Poder. visória, que tenha por finalidade ajustar o
sentido desse ato legislativo à positividade
Recusar a supremacia da Constituição, subordinante do modelo consagrado pela
para, sobre ela, fazer prevalecer o direito própria Constituição, representa um dos
ordinário (como as normas constantes de momentos mais expressivos da experiência
lei ou de medida provisória), significa rom- jurídica, na medida em que busca preservar
per a normalidade jurídica do Estado demo- a espécie legislativa inferior a partir de uma
crático de direito. leitura que confira precedência, sempre
R.T.J. — 158 133

necessária, às regras ditadas superiormente rem-se declarações finalisticamente ade-


pela Lei Fundamental do Estado. quadas às conveniências político-adminis-
A autonomia institucional e financeira trativas daqueles que, no exercício do po-
do Poder Judiciário, do Poder Legislativo, der, vêm a proferi-las. Pelo segundo desses
do Ministério Público e do Tribunal de instrumentos de expansão arbitrária e ilegí-
Contas da União e o princípio da separação tima do poder — a utilização política da
de poderes (Cl?, art. 2°) — que represen- noção de inimigo objetivo —, estigmati-
tam, na configuração jurídica do nosso mo- zam-se com o labéu de pessoas divorciadas
delo político, postulados de extração cons- dos elevados interesses do Estado e da co-
titucional — justificam e legitimam, bem munhão social todos os que eventualmente
por isso, a deliberação tomada por essas discordem e não se ajustem aos parâmetros
Instituições em sede administrativa. da verdade oficial.
Tenho para mim, Sr. Presidente, que
Este processo, Sr. Presidente, tem um
esse é apenas um dos aspectos mais sérios
significado transcendental no plano de nos- da questão com que ora nos deparamos.
sas instituições republicanas. Mais do que
a denúncia de um ato de arbítrio, este pro- Autoridades executivas, incompreensi-
cesso — pelo qual se busca a restauração velmente deslembradas de que o processo
da ordem jurídica lesada e ferida pela ação de definição do texto constitucional e do
do Poder Executivo —propõe a solução de ordenamento jurídico em geral traduz prer-
um dilema político-institucional extrema- rogativa de poder inerente ao Judiciário,
mente grave, pois, entre a luta pela preser- além de constituir o domínio natural de
vação dos fundamentos que dão consistên- atuação dos juízes e Tribunais, pretendem
cia ao Estado de Direito e o consciente monopolizar uma função jurídica que foi
desrespeito à fórmula que consagra a or- outorgada à Magistratura e, mais grave do
dem democrática em nosso País, não tem que isso, buscam impor a esta Suprema
esta Suprema Corte outra opção ético-jurí- Corte um estado de inqualificável submis-
dica senão a de sustentar e a de fazer impor são em matéria de interpretação das leis e
a vontade soberana que, de modo inques- da Constituição, visando a interditar-lhe,
tionavelmente legítimo, emana da própria pela censura atrevida, o exercício de uma
Constituição. competência que lhe foi atribuída no qua-
Os fatos subjacentes a este processo e a dro normativo em que se delineia o princí-
manipulação interpretativa e deformante pio da separação de poderes.
que lhes dispensaram autoridades executi- A hegemonia das interpretações judi-
vas relembram-me a advertência da pensa- ciais constitui efeito co-natural e consubs-
dora alemã Hannah Arendt, para quem a tancial ao próprio sistema de poderes limi-
inversão da fórmula democrática e a sub- tados que deriva do texto estabelecido pela
versão dos valores constitucionais — que Lei Fundamental da República.
sempre conduzem à instituição da ordem
autoritária — apóiam-se em dois instru- A Constituição e as leis — todos os
mentos de poder (a) o uso ideológico e sabemos — nada mais são do que a sua
institucional da mentira e (b) a utilização própria interpretação. No poder de inter-
do conceito de inimigo objetivo. Pelo pri- pretar o ordenamento jurídico reside a mag-
meiro desses instrumentos — o uso ideo- na prerrogativa judicial de estabelecer o
lógico da mentira —deforma-se a verdade alcance e de definir o sentido da vontade
para, a partir desse processo, exterioriza- normativa proclamada pelo Estado.
134 R.T.J. — 158

Eventual interpretação desfavorável das Os poderes do Executivo, em nosso sis-


normas jurídicas não pode ser invocada tema constitucional, são —tanto quanto os
como ato ofensivo ao princípio constitucio- do Legislativo e do Judiciário — essencial-
nal da legalidade e, muito menos, como mente definidos e limitados. «E a Consti-
gesto incompatível com o valor ético-jurí- tuição foi feita» — adverte a doutrina
dico da moralidade, especialmente quando (Hugo L. Black, «Crença na Constitui-
se tem em conta a necessidade de fazer ção», pág. 39, 1970, Forense) — «para que
prevalecer, no processo de indagação do esses limites não sejam mal interpretados
ordenamento normativo, postulados de ir- ou esquecidos».
recusável hierarquia, como o são aqueles Uma Constituição escrita — advirta-se
que derivam da própria Constituição da — não configura mera peça jurídica, nem
República. representa simples estrutura de normativi-
dade e nem pode caracterizar um irrelevan-
O Poder Executivo não pode pretender
te acidente histórico na vida dos Povos e
que dele, unicamente, emanem as legíti-
das Nações. A Constituição reflete um do-
mas interpretações da Constituição e das
cumento político-jurídico da maior impor-
leis. Esse não é o domínio institucional do
tância, sob cujo império protegem-se as
Executivo e nem essa constitui, no plano de
liberdades e impede-se a opressão governa-
nossa organização jurídica, a atividade pre-
mental, que deriva, como no caso em aná-
ponderante desse órgão do Estado.
lise, de abuso e da usurpação de poder.
Interpretações regalistas da Constitui- Não pretendo, Sr. Presidente, que ações
ção e das leis — que visem a produzir executivas — como a que ora é denunciada
exegeses servilmente ajustadas à visão e à pela entidade impetrante — estimulem a
conveniência exclusivas do Poder Executi- Presidência da República a gestos mais ou-
vo — representariam clara subversão da sados e insólitos contra os demais Poderes
vontade inscrita no texto de nossa Lei Fun- do Estado, o Ministério Público e o Tribu-
damental e ensejariam, a partir da temerária nal de Contas da União, que caracterizam,
aceitação da soberania interpretativa mani- a meu juízo pessoal, clara e típica insurgên-
festada pela Presidência da República e por cia contra a ordem constitucional estabe-
suas adjacências institucionais, a deforma- lecida.
ção do sistema de discriminação de poderes Ordens autoritárias, praticadas com
fixado, de modo legítimo e incontrastável, abuso de poder, em conflito com a autono-
pela Assembléia Nacional Constituinte. mia assegurada pela Lei Fundamental do
País a determinadas instituições da Repú-
A recusa legítima dos demais Poderes
da República, que não aceitam incursões blica, podem gerar — e geram com certe-
normativas e administrativas impróprias do za — a deliqüescência do regime democrá-
tico, desagregando-lhe as estruturas políti-
Executivo em sua esfera de autonomia ins-
cas, defraudando o seu sistema jurídico e
titucional — especialmente porque o des-
descaracterizando-o naquilo que de mais
respeito a essa autonomia implica ilícita
essencial nele existe: o respeito incondicio-
transgressão, pela Presidência da Repúbli-
nal e a submissão plena da autoridade ao
ca e pelos agentes que lhe são subordina-
império da Constituição.
dos, ao próprio texto da Constituição —,
traduz comportamento que guarda relação Gestos de insubordinação executiva à
de fidelidade com o postulado da divisão Constituição, ordenados pelo Chefe de Es-
funcional do Poder. tado e estimulados por determinados esta-
R.T.J. — 158 135

mentos corporativos, tornarão perigosa- de Contas da União está claramente vincu-


mente atuais as palavras candentes de Ruy lado às prescrições normativos consubstan-
Barbosa que, dirigindo-se a este Supremo ciadas no art. 168 da Constituição.
Tribunal Federal, em 23-4-1892, em ação
judicial contra atos abusivos praticados Essa norma contempla uma típica ga-
pela Presidência da República, proclamou, rantia instrumental, assecuratória da auto-
verbis: nomia financeira das instituições nela refe-
ridas.
«Não há mais justiça; porque o go-
verno a absorveu. Não há mais proces- O preceito inscrito no art. 168 da Cons-
so; porque o governo o tranca. Não há tituição reveste-sede caráter tutelar, conce-
mais defesa; porque o governo a recusa. bido que foi — e esta Suprema Corte assim
Não há mais código penal; porque o já o proclamou no julgamento do MS n°
arbítrio do governo o substitui. Não há 21.291-8 (AgRg), Questão de Ordem, rel.
mais Congresso; porque o governo é o Min. Celso de Mello, Pleno, julg. em
senhor da liberdade dos deputados (...). 12-4-91 — para impedir o Executivo de
O governo... o governo, o oceano de causar, em desfavor do Judiciário, do Le-
arbítrio, em cuja soberania se despe- gislativo e do Ministério Público, um esta-
nham todos os poderes, se afogam todas do de subordinação financeira que compro-
as liberdades, se dispersam todas as leis. metesse, pela gestão arbitrária do orça-
Anarquia vaga, incomensurável, tene- mento — ou, até mesmo, pela injusta recu-
brosa como os pesadelos das noites de sa de liberar os recursos nele e nas leis
crime.» («O Estado de Sítio», pág. 87, consignadas —, a própria independência
1892, Rio, Companhia Impressora). político-jurídica daquelas Instituições.
O ato presidencial denunciado pelo im- Não obstante essa prerrogativa de poder
petrante neste mandado de segurança refle- tenha sido assegurada às Instituições em
te, na ousadia do gesto que o caracterizou, questão — Poder Legislativo, Ministério
uma ofensa tanto à autonomia das institui- Público, Poder Judiciário e, por extensão,
ções envolvidas quanto à posição jurídica ao Tribunal de Contas da União —, mesmo
dos seus próprios servidores, eis que o es- assim foi ela gravemente ignorada pelo
torno arbitrário que foi determinado — e Executivo que, ao descumpri-la, compro-
servilmente executado — desrespeitou o meteu gravemente a esfera de autonomia
ordenamento positivo brasileiro de alto a dessas instituições e lesou o princípio
baixo, começando pelas normas legais e dogmático da separação de poderes.
administrativas que regem as relações de-
correntes do depósito bancário, culminan- O estorno posteriormente efetivado e a
do com a agressão a postulados constantes indevida retenção de crédito já lançado —
do próprio texto constitucional, sob cuja motivo da impetração deste mandado de
égide estabeleceu-se um círculo juridica- segurança —representaram, na progressão
mente indevassável à ação do Poder Exe- das ações ilegítimas do Poder Executivo, o
cutivo, mas que, não obstante isso, veio a exaurimento do gesto de anterior ilicitude
ser rompido unilateralmente por órgãos da constitucional praticado, sem qualquer pre-
Administração Federal. cedente em nossa história republicana, pela
Presidência da República.
O cronograma de desembolso dos ór-
gãos do Poder Legislativo, do Poder Judi- Devo concluir o meu voto, Sr. Presi-
ciário, do Ministério Público e do Tribunal dente.
136 R.T.J. — 158

Vislumbro — na linha do pronuncia- finitivo? Não posso transformar o mandado


mento do em. Relator e com as exatas con- de segurança, mais precisamente a liminar
siderações feitas por S. Exa. em seu douto que lhe é própria, em simples medida pre-
voto — a configuração, na espécie em jul- paratória e o farei se deixar as partes, com
gamento, do fumas boni juris, a atestar, de a concessão, em situação idêntica, conside-
modo veemente, a clara e irrecusável plau- rada a extensão da liminar. A norma espe-
sibilidade jurídica da tese sustentada pela cífica — artigo 7° da Lei n° 1.533 autoriza
entidade sindical impetrante do presente a suspensão preliminar do ato impugnado
mandado de segurança coletivo. e isto leva, a resultado único, que é a volta
Concorre, igualmente, tal como de- ao estado fálico e jurídico que se lhe ante-
monstrado pelo voto do em. Min. Relator, cedeu.
o pressuposto essencial do periculum in Faço este registro para não parecer que
mora. estou discrepando do que assentado, até
Assim sendo, Sr. Presidente, com estas aqui, pelo Supremo Tribunal Federal.
considerações —mas fundamentalmente VOTO (Medida Liminar)
apoiando-me no jurídico pronuncia-
mento do em. Relator —, e tendo em vista O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
a orientação fumada pela jurisprudência Senhor Presidente, cuida-se de julgamento
desta Suprema Corte, que nega ordinaria- liminar que o eminente Relator, dadas as
mente caráter satisfativo às medidas caute- circunstâncias notórias que cercaram o
lares em mandado de segurança, peço vênia caso, considerou prudente trazer ao Plená-
para conceder a medida liminar na mesma rio. Por isso, serei breve.
extensão com que deferida por Sua Exce- Quero apenas, ao começar meu voto,
lência. dizer que a questão subjacente à crise, cria-
Nesse sentido é o meu voto. da por esta ou aquela razão, sendo ela uma
questão jurídica de interpretação da Cons-
VOTO (Medida Liminar)
tituição e das leis, chega ao seu leito natural
Aditamento com este processo e com esta assentada de
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor julgamento, na sede própria do Supremo
Presidente, apenas uma observação- meu Tribunal Federal
voto, a meu ver, não conflita com a juris- A questão de fundo, a rigor, não está em
prudência da Corte. É que não tenho como causa: saber se é devida ou não a parcela de
envolvidos, nesta impetração, vencimen- vencimentos decorrente da opção pela data
tos, mas créditos realizados nas contas cor- do efetivo pagamento dos servidores do
rentes dos substituídos pelo Sindicato-im- Legislativo, para a conversão em Unidades
petrante. Assim, excluo a pertinência do Reais de Valor, URVs, dos valores nomi-
disposto nos artigos 5° e r, respectivamen- nais de vencimentos dos últimos quatro
te das Leis es 4.348/64 e 5.021/66. meses, a comporem a média determinada
Quanto a prevenir a satisfação imediata na Medida Provisória n° 434.
de uma futura sentença concessiva neste As circunstâncias que antecederam o
mandado de segurança, entendo que a tanto julgamento impelem-me, no entanto, em
não conduzirá o simples fato de conceder- uma só palavra, a dizer que, na questão de
se a liminar nos termos propostos pelo Re- fundo, às razões do Sindicato impetrante
lator. Se em tal campo isto é possível, o que não se pode negar superlativa razoabili-
se dirá relativamente a um provimento de- dade.
R.T.J. — 158 137

Que a conversão, na data do efetivo cruzeiros reais, para um novo acerto ex-
pagamento, no caso dos servidores do Po- presso em URV.
der Legislativo, considerado o art. 168 da
A regra básica que se está propondo
Constituição, decorre do sistema global da
é a da conversão usando a média dos
Medida Provisória n° 434, de 27-2-94, a
valores reais dos salários que são defi-
mim me bastaria que seja esse o conteúdo
nidos pelo efetivo recebimento nos últi-
da decisão que, embora no âmbito próprio
de sua administração, o Supremo Tribunal mos quatro meses, no objetivo de man-
Federal tomou: esse corpo de cidadãos que ter o poder de compra médio do salário
somos nós, a quem já se disse tocar a dolo- do trabalhador. O poder de compra do
rosa responsabilidade de, se for o caso, salário é de fato aquele que o salário tem
errar por último, ainda cabe — e queiram no momento em que é recebido e em que
as Parcas que continue a tocar — a respon- pode efetivamente ser gasto. Por isso se
sabilidade de interpretar definitivamente a está definindo como base para a conver-
Constituição e as leis desta República. são dos salários de cruzeiros reais para
URV, a média aritmética dos valores
Mas não me furto à tentação de docu- dos salários na data dos quatro últimos
mentar que essa leitura sistemática da Me- pagamentos, convertidos cada um deles
dida Provisória n°434, subjacente à decisão em URV pelo valor de conversão nesta
administrativa do Supremo Tribunal e das data. Desta forma fica assegurada a ma-
Casas do Congresso Nacional, é também a nutenção do poder de compra dos salá-
inteligência que dela extraíram os Minis- rios para todos.
tros de Estado que encaminharam o texto à
edição do Senhor Presidente da República. A conversão dos salários para URV
Como têm notado diversos e ilustres parla- será efetiva, tanto para os trabalhadores
mentares, isso é o que decorre nitidamente com regime salarial ditado pela CLT,
dos §§ 46 e 48, da Exposição de Motivos quanto para os funcionários públicos. A
com a qual os Senhores Ministros da Fa- conversão para URV dos salários do
zenda, do Trabalho, do Estado Maior das funcionalismo contribuirá para a estabi-
Forças Armadas, da Justiça, da Previdência lização da folha de pagamentos e do
Social, da Secretaria da Administração Fe- poder de compra dos servidores, redu-
deral e da Secretaria de Planejamento, Or- zindo, conseqüentemente, as oscilações
çamento e Coordenação da Presidência da nos recursos de caixa do tesouro nacio-
República propuseram ao Presidente da nal».
República a edição da Medida Provisória. Creio que o momento não exige outros
Leio-os: comentários. O que está em causa, verda-
«A fase que se está inaugurando a deiramente, e já se enfatizou bastante o
partir desta Medida Provisória, se desti- ponto, é o ato coator, a ordem presidencial
na a implementar uma reforma monetá- transmitida pelo Senhor Ministro da Fazen-
ria e não uma mudança no regime sala- da para retirar numerário já creditado na
rial. Todas as alterações que estamos conta corrente dos servidores, de parcela
propondo neste campo se restringem a que se entende indevida, em razão de dis-
regular a mudança do padrão monetário cordância quanto à data da conversão ado-
e deve ser neutro no tocante à renda. tada. E esse exercício menu própria, das
Trata-se, portanto, de estabelecer as próprias razões, creio que a ordem jurídica
condições básicas para a conversão dos não suporta. Tal a verdade, de fato espan-
salários que até hoje estão pactuados em tosa, não ficaria longe de chegar à solução
138 R.T.J. —158

provisoriamente satisfativa do voto do Se- dicionais, de umas e outras pode divergir-


nhor Ministro Marco Aurélio. se e de algumas se pode recorrer para o
próprio Tribunal, uma vez que outro supe-
A rigor não creio que se aplique à espé- rior não existe.
cie, independentemente do juízo sobre a
sua constitucionalidade, em qualquer caso, O que se viu, no entanto, a respeito da
os arts. 5° da Lei n° 4.348, de 1964, nem o interpretação que o STF deu acerca de um
art. 1° do § 4° da Lei n° 5.021, de 1966, que parágrafo de um artigo de uma MP, de n°
vedam a concessão de liminares em man- 434, medida que, por ser provisória, ainda
dados de segurança tendentes a obter paga- não é lei, embora produza efeitos legais, si
mento de vencimentos, aumento ou con- et in quantum, efeitos que podem desva-
cessão de vantagens funcionais. necer-se, tanto na hipótese de sua rejeição,
como de sua não aprovação em tempo há-
Não se trata aqui de assegurar o paga- bil, foi a agressão ao STF pelos autores da
mento de vencimentos, que já se efetivara MP. Ao mesmo tempo, este Tribunal foi
com o crédito em conta corrente, quando o alvo de tenaz campanha publicitária nunca
ato coator mandou deles estornar determi- jamais vista entre nós contra uma Corte de
nado percentual. Justiça, particularmente contra a mais alta
Apenas uma circunstância leva-me a delas, que Rui Barbosa queria fosse «tão
adotar, por hora, a solução do eminente alta como a coma dos reis e tão pura como
Relator. E que a parcela questionada é de a coroa dos santos».
pouco mais de dez por cento da remunera- O STF, réu do crime de hermenêutica,
ção dos servidores representados pelo sin- foi apontado à execração pública porque,
dicato impetrante (proximidade dos dez em causa própria e fora da lei (sic), teria
por cento que permitiu que a crise fosse aumentado os seus ganhos, o que é falso,
rotulada, entre jocosa e humilhantemente, pois se limitou a evitar sofressem perdas na
de «a guerra da gorjeta»): a pequena signi- conversão. Este o crime hediondo do Su-
ficação da parte discutida não me permite premo, do Congresso Nacional e do Tribu-
dar-lhe características de alimentos inadiá- nal de Contas.
veis para, de logo, determinar o seu retorno Mas não ficou aí o Poder que detém o
às contas de que retiradas. Por isso entendi erário e a força; interferiu na conta bancária
solução hábil e bastante a proposta, pelo de servidores para delas retirar o que lhes
eminente Relator, de uma liminar tipica- pertencia e não podia ser bolido, sem ciên-
mente acautelatória que possa, quando da cia nem aquiescência dos respectivos titu-
decisão definitiva — se favorável como a lares-correntistas.
relevância da fundamentação permite ante-
ver, com grande probabilidade — evitar o É contra essa ordem do Chefe do Poder
suplício das formas usuais de execução Executivo, veiculada pelo professor seu
contra a Fazenda Pública. Ministro da Fazenda e executada pelo pre-
sidente do Banco do Brasil, que o impetran-
Acompanho o eminente Relator. te pede a segurança do seu direito violado,
VOTO bem como a liminar acautelatória, dado o
preenchimento de seus requisitos, e consi-
O Sr. Ministro Paulo Brossard: A des- deradas as inauditas circunstâncias da si-
peito da natural autoridade das decisões do tuação criada.
STF em matéria jurídica, mesmo quando Em mais de cem anos de existência
em resoluções administrativas e não juris- como tribunal da federação, o STF foi ofen-
R.T.J. — 158 139

dido mais de uma vez, e desses agravos Avizinha-se o dia em que, por força de
guarda cicatrizes inapagáveis. A 10 de lei, terei de deixar esta Casa ilustre. Não
agosto de 1893, o então Vice-Presidente no imaginava, até ontem, que antes de despe-
exercício da presidência informava ao Tri- dir-me dela, teria o dissabor que experi-
bunal, por meio de seu Ministro da Guerra, mento. Tenho me recordado de fato ocorri-
que deixaria de cumprir parte da ordem de do ao tempo em que a desordem institucio-
habeas corpus, concedida pelo STF, a des- nal degradava o Brasil; pelo Professor Paul
peito de ameaçado de dissolução; e a 25 de B astid, da Faculdade de Direito da Univer-
julho do ano seguinte, desta vez por inter- sidade de Paris, fora convidado para expor
médio do Ministro da Justiça; dava notícia a evolução constitucional de nosso país,
semelhante a propósito de outro habeas bem como as linhas fundamentais da Cons-
corpus. A 24 de fevereiro de 1911, no tituição Brasileira, como preâmbulo ao seu
quadriênio que haveria de celebrizar-se, texto no Corpus Constitutionnelle, que se
entre outras façanhas, pelo bombardeio da editava em Bruxelas, com as constituições
Bahia e de Manaus, pelo morticínio da Ilha de todos os países que as têm, na língua
das Cobras e pelos honores do «Satélite», original e em francês. Depois de ter aceito
o Ministro da Justiça comunicava ao STF o honroso convite, dele declinei, para não
que o governo não daria cumprimento à ter de exibir a indecência dos chamados
ordem de habeas corpus que aquele emi- atos institucionais, e desse modo não vi
tira em favor do Conselho Municipal do meu nome associado ao magno empreendi-
Rio de Janeiro. Com o andar do tempo, na mento em obra de circulação universal. De
evolução do país e de suas instituições, certa forma, o fato se repete. Daqui a dois
esses fatos se converteram em obscenida- dias, na quarta-feira, deveria encontrar-me
des históricas. Foi preciso que chegasse o com outros colegas desta Casa e do Institu-
ano de 1939 para que, a 5 de setembro, to Internacional de Direito Público e Em-
quando a guerra começava a incendiar o presarial com o Presidente da Suprema
mundo, um Decreto-Lei, de n° 1.564, cas- Corte dos Estados Unidos da América, em
sasse um acórdão unânime do STF. Jamais Washington. Seria um encontro particu-
se vira isto; nunca mais se viu isto; mas, é larmente interessante. O pudor me fez
de convir-se, os que praticaram essa infâ- cancelar a viagem para não sofrer a humi-
mia eram os mesmos que demitiam, aposen- lhação de ver e ser visto pelo Chief-Jus-
tavam, exilavam, prendiam, torturavam e tice de uma nação que se orgulha de ter
matavam em seus cárceres. Antes, em 1931, dado ao mundo o modelo da sua Cone
o poder de fato instituído confiscou seis dos Suprema, intérprete final dos direitos do
ministros do STF e em 1968 três foram dele homem e o juiz definitivo dos conflitos
excomungados; ainda bem que, eri ambas as entre os poderes.
ocasiões, em 31 e em 68, os agentes da vio-
lência estavam divorciados da ordem jurídica É com profundo desgosto e tristeza ain-
e investidos do arbítrio sem peias. da maior que enfrento o presente MS. A
situação que o motivou não tem anteceden-
Por isto, o mais chocante está no fato de tes em nossa história judiciária; a liminar,
os lamentáveis sucessos de 1994 terem ocor- que venha a ser concedida, em nada conflita
rido em plena normalidade e pouco depois de com anteriores decisões denegatórias de
vencido o longo período de anomalia institu- cautelar, por esta ou aquela razão pela
cional, que custou sangue e lágrimas, peno- simples razão de que o quadro que se abre
sos e ingentes esforços no sentido da recu- à apreciação do STF difere de quanto até
peração da dignidade nacional. hoje se lhe deparou.
140 R.T.J. — 158

Concedo a liminar pleiteada, nos termos Acompanho o voto do Relator, deferin-


do voto do eminente Ministro Relator, bem do, em parte, a liminar.
lembrado da advertência de Rui, nos dias
iniciais da República — o poder não enfra- VOTO
quece a justiça «desatendendo-a; enfraque-
ce-a, dobrando-a». O Sr. Ministro Néri da Silveira: Sr.
Presidente. O Sindicato dos Servidores do
Poder Legislativo Federal e do Tribunal de
VOTO Contas da União — SINDILEGIS, com
apoio no art. 5°, LXX, letra b, da Constitui-
O Sr. Ministro Sydney Sanches: Sr. ção, impetra mandado de segurança coleti-
Presidente, considero relevantes os funda- vo contra ato do Senhor Presidente da Re-
mentos jurídicos da petição inicial, que pública consubstanciado no Aviso n° 336-
procuram demonstrar a ilegalidade do ato MF, de 21-3-1994, que, por sua determina-
praticado, consistente em se retirar, das ção, expediu o Senhor Ministro da Fazenda
contas dos servidores, parcela que esta Cor- ao Presidente do Banco do Brasil S.A., no
te, em decisão administrativa, considerou sentido de que as ordens bancárias emitidas
devida, interpretando a Constituição e a lei. pelo Senado Federal, pelos órgãos do Poder
Tenho, pois, por preenchido, o requisito da Judiciário, pelo Tribunal de Contas da
plausibilidade jurídica da ação. União e pelo Ministério Público, referentes
Quanto ao perlculum in mora, entendo às folhas de pagamento do respectivo pes-
que se não for colocada, a quantia Corres- soal, alusivas ao mês de março de 1994,
pondente, à disposição dos órgãos compe- sejam liquidadas com a dedução de 10,94%
tentes — e no caso do Supremo Tribunal dos valores nelas previstos. Pelo aviso n°
Federal — sempre se poderá temer por algo 350, de 23-3-1994, aditou-se o Aviso n°
parecido com o ato já praticado pela auto- 336/1994, com idêntica determinação,
ridade apontada como coatora e o recebi- quanto ao pessoal e folha de pagamento da
mento das quantias só se viabilizaria, então, Câmara dos Deputados.
através de precatórios, que têm suas vicis- Alega-se, na inicial, que houve interfe-
situdes bastante conhecidas. rência incabível do Poder Executivo em
Quanto as aspecto lembrado pelo Minis- assunto de competência constitucional-
tro Marco Aurélio, penso também que a mente definida de outro Poder, o que agride
medida liminar pode ser satisfativa em cir- os arts. 2°, 52, XIII, 49, XI, da Constituição.
cunstâncias que evidenciem que outra efi- Pleiteia o impetrante «a concessão, em
cácia não consiga ter. E o Ministro Carlos caráter liminar, de ordem judicial, «deter-
Velloso lembrou a hipótese do perecimento minando ao Excelentíssimo Senhor Presi-
do direito. Tenho, pois, como admissível, dente da República para que tome as provi-
em casos excepcionais, o caráter satisfativo dências cabíveis no sentido de efetuar, de
da medida liminar. imediato, o pagamento integral dos valores
Vejo, porém, que o eminente Relator constantes dos respectivos bilhetes de pa-
encontrou solução que acautela o direito gamentos, sob as penas da lei; pois presen-
dos impetrantes e não implica satisfação tes, inquestionavelmente, o ftunus boni ju-
praticamente definitiva do crédito que se ris e o periculum in mora.»
sustenta. Creio que é uma atitude prudente, A Constituição, no art. 49, XI, preceitua
que tem apoio na jurisprudência, e que, a que é da competência exclusiva do Con-
meu ver, deve ser acompanhada. gresso Nacional «zelar pela preservação de
R.T.J. — 158 141

sua competência legislativa em face da atri- eficácia e do necessário respeito que há de


buição normativa dos outros Poderes. No merecer, quer dos particulares quer dos
art. 51, IV, a Lei Magna estipula que com- dignitários do poder, não resta espaço legí-
pete privativamente à Câmara dos Deputa- timo a opor-lhe razões de conveniência di-
dos «dispor sobre sua organização, funcio- tadas pela conjuntura, pela realidade de
namento, polícia, criação, transformação fatos presentes, por vezes, suscetíveis de
ou extinção de cargos, empregos e funções rápida mutação, ou de parâmetros concebi-
de seus serviços e fixação da respectiva dos na antevisão de planos de ação políti-
remuneração, observados os parâmetros co-administrativa, em ordem a ser despre-
estabelecidos na lei de diretrizes orçamen- zado qualquer de seus preceitos. Consoante
tárias. No art. 52, XIII, idêntica norma a Lei acentuou, admiravelmente, o ex-Presidente
Maior prevê quanto ao Senado Federal. De da Corte Constitucional alemã Konrad
referência ao Tribunal de Contas da União. Hesse: «Todos os interesses momentâneos
o art. 73 do Estatuto Supremo estabelece — ainda quando realizados — não logram
que terá quadro próprio de pessoal e juris- compensar o incalculável ganho resultante
dição em todo o território nacional, exer- do comprovado respeito à Constituição, so-
cendo, no que couber, as atribuições previs- bretudo naquelas situações em que a sua
tas no art. 96, onde ser regula a competên- observância revela-se incômoda» (in «A
cia privativa dos tribunais, na forma discri- Força Normativa da Constituição», tradu-
minada em seus incisos e alíneas. ção de Gilmar Ferreira Mendes, ed. Sérgio
2. A Constituição, no art. 2°, ao definir Antonio Fabris, pág. 21). Noutro passo,
os princípios fundamentais da ordem cons- observa: «Quem se mostra disposto a sacri-
titucional brasileira, estipula que são Pode- ficar um interesse, em favor da preservação
res da União, independentes e harmônicos de um princípio constitucional, fortalece o
entre si, o Legislativo, o Executivo e o respeito à•Constituição e garante um bem
Judiciário. No particular, é possível afirmar da vida indispensável à essência do Estado,
que, desde o último quartel do século mormente do Estado democrático» (op.
XVIII, com as Revoluções americana e cit., pág. 22).
francesa, na esteira do pensamento liberal
que ganhou curso, a concepção de uma Escreveu, em lição perene, Thomas
ordem constitucional não prescinde de dois Coolley: «A Constituição não desaparece
componentes: separação de poderes e ga- nunca ante tratado ou ato algum; nem muda
rantia de direitos. O famoso artigo 16, da com o tempo, nem em teoria se dobra à
Declaração dos Direitos do Homem e do força das circunstâncias. Pode ser reforma-
Cidadão, de 1789, da Revolução Francesa, da de acordo com o que a respeito ela
já assentava: oToute societé dans laquelle la própria dispõe; mas enquanto subsiste em
garantie des droits n' est pas assurée, ni la seu todo, ela é «uma lei para os govemantes
séparation des pouvoirs determinéee, n' a e para os governados, tanto na guerra como
point de constitution.» Na lição de Burdeau, na paz e, com o escudo de sua proteção
a constituição foi, historicamente, no Ociden- ampara todas as classes sociais, em todos
te, um instrumento de limitação do poder. os tempos e quaisquer circunstâncias».
Nessa linha, em face da normatividade Portanto, os seus princípios não podem ser
maior da Constituição, enquanto é ela o postos de lado sob o pretexto de que assim
fundamento e o primado de toda a ordem convém para fazer frente a uma suposta
jurídica e das instituições políticas, e diante necessidade criada pelas grandes crises:
de sua constante e indisputável vocação à «Nenhuma doutrina capaz das mais pani-
142 R.T.J. — 158

ciosas conseqüências, jamais engendrou o Um deles é a faculdade de interpretar o direito


espírito humano como aquela, segundo a em vigor, seja a Constituição, as leis do Con-
qual qualquer de suas disposições pode ser gresso ou os precedentes judiciais, com uma
suspensa em virtude das grandes exigên- autoridade que obriga, constitucionalmente,
cias governamentais. Tal doutrina conduz ambos os ramos do governo» (in «A Consti-
diretamente, ou à anarquia ou ao despotis- tuição Norte-americana e seu significado
mo; a teoria da necessidade, em que se atual», tradução de Leda Boechat Rodrigues,
baseia, é falsa, porque o governo tem, na págs. 162/163). Já assinalava, antes de 1803,
Constituição, todos os poderes necessários um dos redatores do Federalist, Hamilton, no
à preservação da sua existência, como fe- n° 78: «A interpretação das leis é função
lizmente provou com o resultado obtido própria e peculiar dos Tribunais. Uma Cons-
contra o grande esforço feito para abater- tituição é, de fato, e deve ser considerada
lhe a justa autoridade» (in Princípios Ge- pelos Juízes como uma lei fundamental. Per-
rais de Direito Constitucional dos Estados tence-lhes, assim, determinar o seu sentido,
Unidos da América do Norte, trad. Alcides bem como o de qualquer lei particular votada
Cruz, 1909, em conformidade com a 3' ed. pelo Legislativo, e, no caso de haver diferen.
inglesa, Rev. dos Tribs., pág. 32). ças irreconciliáveis entre as duas, preferir a
vontade do povo declarada na Constituição à
3. De outra parte, no sistema da Carta do legislador, expressa na lei».
Política de 1988, mantendo-se a tradição de
nosso constitucionalismo republicano e 4. Foi na concepção desse sistema que
presidencialista, de mais de um século, o se criou o. Supremo Tribunal Federal, como
ensinamento de Cooley tem plena atualida- órgão de cúpula do Poder Judiciário brasi-
de (op. cit., págs 165/166): «Os diversos leiro republicano, instalado a 28 de feverei
departamentos governamentais são iguais ro de 1891, sucedendo o extinto Supremo
Tribunal de Justiça, do Império, que se
em dignidade e em autoridade, que é coor-
implantara em 1828. Em realidade, desde o
denada, não podendo nenhum deles subme- advento do regime de 1891, reconheceu-se-
ter a outro a sua jurisdição, nem o privar de lhe a função precípua de guarda da Consti-
qualquer porção de seu poder constitucio- tuição, ora conferida, em regra expressa, no
nal», anotando, ainda, quanto ao Judiciário: art. 102 da Lei Magna de 1988. «Sentinela
«Mas o poder judiciário é a autoridade su- da Constituição e da liberdade», nos mol-
prema na interpretação da Constituição e na des do modelo americano, definiu-o o sau-
interpretação das leis, e as suas interpreta- doso Ministro Aliomar Baleeiro.
ções devem ser aceitas e observadas pelos
outros departamentos. Isto é o que resulta Na linha dessa função institucional, já
da natureza da sua jurisdição; as questões secular, cumpre-lhe, assim, ao dirimir con-
de interpretação surgidas nas controvérsias trovérsias, de forma terminativa, enunciar,
legais e resolvidas pelos tribunais, uma vez no curso do tempo, o sentido e o alcance
resolvidas, têm estes autoridade para fazer dos dispositivos da Lei Maior, compreen-
efetivas as suas resoluções». Não é diversa dendo-se, aí, por isso mesmo, a competên-
a lição de Edward S. Corwin, acerca do cia de definir os exatos limites dos poderes
mesmo sistema americano, que nos serviu que a Constituição quer investidos o Con-
de modelo, ao escrever: «Como os poderes gresso, o Governo e os Tribunais, a União,
«legislativo» e «executivo», sob a Consti- os Estados, o Distrito Federal e os Municí-
tuição, o «poder judiciário» também impli- pios, bem como os precisos conteúdos dos
ca certos atributos incidentais ou 'inerentes'. direitos e garantias fundamentais, dos prin-
— 158 143

cípios regentes da ordem social, da ordem De outra parte, ao Supremo Tribunal


econômica e financeira e de quaisquer pre- Federal, aplica-se a nota exata de Wil-
ceitos fundamentais do ordenamento bási- loughby («A Suprema Corte dos Estados
co da Nação. Em tal perspectiva, desempe- Unidos», pág. 33), acerca do papel da Corte
nha o Supremo Tribunal Federal o múnus Suprema americana: «O mais poderoso dos
eminente de árbitro dos conflitos entre os freios, no garantir as relações regulares en-
Poderes, ou entre a União e os Estados- tre o poder federal e os poderes dos estados
membros, ou destes entre si, numa autênti- e ainda entre os próprios ramos do poder
ca função de poder moderador. Expressivo, federal, tem sido inquestionavelmente a
no particular, o registro de Seabra Fagun- Corte Suprema. No mecanismo da Repú-
des: «Com relação ao Supremo Tribunal blica o seu papel tem sido «o da roda mes-
Federal, o exercício de função política não tra». A Constituição, no exercício de sua
se dá na rotina de suas atividades, senão supremacia a respeito de todos esses pode-
quando chamado ele, na aplicação da Cons- res, a todos lhes pôs limites, e o instrumento
tituição da República, a manifestar-se so- para efetuar essa limitação tem sido a Corte
bre a validade de leis e atos executivos em Suprema como intérprete do direito consti-
face de princípios constitucionais basilares, tucional».
como os que dizem com a significação do
regime federativo, com a independência e O bom funcionamento das instituições
harmonia dos poderes do Estado, com a democráticas plasmadas na Carta Política
definição e a proteção dos direitos indivi- há de encontrar, dessa sorte, no Supremo
duais (ou em expressão mais abrangedora Tribunal Federal, pelos instrumentos pró-
dos direitos públicos subjetivos do indiví- prios, o poder competente para dirimir, ter-
duo), com as conceituações da segurança minativamente, segundo a Constituição, os
nacional e da ordem econômica etc... Ao conflitos, inclusive os que possam even-
manifestar-se, em qualquer dessas maté- tualmente perturbar a indispensável har-
rias, como árbitro do que é a Constituição, monia entre os membros da Federação ou
o seu desempenho é político. Porque a de seus Poderes Políticos, sem a qual, a
Lei Maior será aquilo no conteúdo e na experiência histórica está a ensinar, não se
extensão que os seus crestos declarem alcançam os interesses superiores da Repú-
que é» (apud «As Funções Políticas no blica, nem os objetivos maiores e impes-
STF,» Arquivos do Ministério da Jus- soais do bem comum. É o Supremo Tribu-
tiça, n° 157, págs. 30 - 31). Nessa mesma nal Federal, dessa maneira, o Tribunal da
linha, a nota de Mauro Cappelletti: «O Constituição e o Tribunal da Federação,
controle judicial de constitucionalidade pois esta, naquela, se define, exaustiva-
das leis sempre é destinado, por sua pró- mente, e são de natureza constitucional as
pria natureza, a ter também uma colora- decisões sobre conflitos entre seus mem-
ção política mais ou menos evidente, bros. Julgado da Corte Suprema, a esse
mais ou menos acentuada, vale dizer, a respeito, representa, outrossim, o exercício
comportar uma ativa e criativa interven- de sua prerrogativa eminente e incontrastá-
ção das Cortes investidas daquela função vel de guarda da Constituição, que, dessa
de controle, na dialética das forças polí- forma, é interpretada, e, na decisão defini-
ticas do Estado» (in «O Controle Judi- tiva, se revelam seu comando e espírito. Se
cial de Constitucionalidade das Leis no o Supremo Tribunal Federal declara in-
Direito Comparado,» ed. Sérgio Fabris, constitucional uma norma ou um ato de
Porto Alegre, 1984, pág. 144). outro Poder, ou mesmo de um Tribunal,
144 R.T.J. — 158

manifesta-se, no aresto, de forma termina- menos exato é que, se frustradas as tentati-


tiva, o sentido das regras constitucionais vas de solução na conformidade dos cami-
trazidas a confronto. O que, em realidade, nhos inspirados no princípio da harmonia
se dá, aí, é o funcionamento da ordem fun- entre os Poderes, a via adequada, segundo
damental e a definição dos limites dos po- a Constituição, é o procedimento perante o
deres que a Constituição estabelece para o Judiciário.
Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Está na Constituição, art. 102, I, letra d,
Não pode haver, destarte, lugar a qualquer que compete ao Supremo Tribunal Federal
perturbação das instituições, quando o Ju- processar e julgar, originariamente, o man-
diciário, por intermédio da Corte Suprema, dado de segurança contra atos do Presiden-
no exercício de sua competência, proclama, te da República, das Mesas da Câmara dos
acerca do tema discutido, o lineamento Deputados e do Senado Federal, do Tribu-
constitucional; ao contrário, tornada defini- nal de Contas da União, do Procurador-Ge-
tiva a decisão, os que dela destinatários hão ral da República e do próprio Supremo
de emprestar-lhe pontual cumprimento, Tribunal Federal.
como índice da normalidade própria da
convivência democrática, que se reflete no Se se cuida de ato normativo das Casas
harmônico convívio dos Poderes indepen- do Congresso Nacional, do Supremo Tri-
dentes, os quais, na Constituição, encon- bunal Federal ou de qualquer Tribunal, do
tram a sede de sua legitimidade e os limites Tribunal de Contas da União ou do Procu-
das competências. rador-Geral da República, que se alegue em
desconformidade com a Lei Magna, está,
Por sua natureza, o que se contém na também, na Constituição, art. 102, I, letra
decisão judicial definitiva, notadamente da a, combinado com o art. 103, I, que ao
Corte Suprema da Nação, constitui, em Presidente da República caberá ação direta
uma ordem jurídica democrática, comando de inconstitucionalidade para impugnar
incontrastável, tornando-se, pois, fora de esse ato dos outros Poderes ou órgãos indi-
propósito qualquer indagação ou perplexi- cados. Se outra for a providência judicial
dade sobre se a autoridade executiva ou cabível, legitimado, por igual, estará, sem-
legislativa, de qualquer nível ou hierarquia, pre, o Poder Executivo para se opor à efi-
cumprirá o que ficou decidido. Diante da cácia de ato de outro Poder, ou órgão que,
decisão judicial definitiva, não cabe opção não estando a ele hierarquicamente subme-
dos que lhe são destinatários — quer se tido, goze assim de autonomia administra-
cuide de particulares, quer de detentores de tiva e financeira, na forma da Constituição.
poder, —no sentido do acatamento ou não
O que a Lei Maior da República, entre-
do julgado. De contrário, será o império do
tanto, não autoriza, a qualquer dignitário do
arbítrio e não o funcionamento do Estado
Poder Executivo, inclusive o Presidente da
Democrático de Direito, conforme definido
República, ou de qualquer dos outros Po-
na Constituição.» deres, é intervir, sem forma nem figura de
5. Se é certo, de outra parte, que o Poder juízo, no âmbito de competência privativa
Executivo pode discordar de atos de natu- de Poder diverso ou dos órgãos que dispo-
reza administrativa, dos órgãos do Poder nham, conforme a Constituição, de autono-
Legislativo ou do Poder Judiciário, que mia administrativa e financeira. A convi-
tenham, imediata ou mediatamente, refle- vência dos Poderes independentes, segun-
xos sobre seu âmbito de atuação ou nos do os princípios da Constituição, é impera-
assuntos de sua esfera de competência, não tivo da normalidade no funcionamento das
R.T.J. — 158 145

instituições políticas, em Estado de Direito por esses Poderes e órgãos, no exercício de


democrático. sua competência privativa, à vista do dis-
6. São, destarte, relevantíssimos os fun- posto no parágrafo 8° do art. 21 da Medida
damentos do presente mandado de segu- Provisória n° 434, de 27/2/1994, tendo em
rança. conta o art. 168 da Constituição e os funda-
mentos de direito então adotados. Não ca-
Com efeito, os fatos descritos na inicial beria, dentro do sistema da Constituição, ao
compõem a queixa do impetrante no senti- Poder Executivo desrespeitar o princípio
do de haver o Senhor Presidente da Repú- de independência dos outros Poderes, pri-
blica determinado, por intermédio do Mi-
vando parcialmente de eficácia atos prati-
nistro da Fazenda, ao Banco do Brasil S.A.,
cados no desempenho de competência
procedimento administrativo que impli-
constitucional, pois, a tanto, significou a
cou, inequivocamente, à primeira vista, em
intervenção, sem explícito assento no rol de determinação presidencial impugnada no
competências previstas no art. 84 da Lei mandamus. Se compreendia o Chefe do
Magna da República, em atos privativos Poder Executivo que esses atos eram in-
dos outros Poderes e de órgãos, que pos- constitucionais ou ilegais, os caminhos a
suem autonomia administrativa e financei- seguir estão previstos na Constituição, in-
ra, coarctando-lhes, ex marte, parcela de clusive contra o ato do próprio Supremo
sua eficácia jurídica. Cuida-se de ordens Tribunal Federal, onde, por certo, mercê
bancárias emitidas pelos outros Poderes e das tradições seculares de isenção e sereni-
órgãos mencionados, referentes a folhas de dade dos julgamentos da Corte e a fidelida-
pagamento do respectivo pessoal, alusivas de histórica de seus juízes a essas tradições
ao mês de março de 1994, cuja administra- augustas, encontraria a decisão jurídica ca-
ção, por isso mesmo, não incumbe ao Poder bível, ditada pelo saber, pela honra e pela
Executivo. No ato impugnado, ordenou-se consciência dos membros deste venerando
a dedução de 10,94% dos valores nelas Tribunal, que tem sabido cumprir seu dever
consignados, o que veio, efetivamente, a para com a Pátria e o povo brasileiro, com
operar-se, de forma direta ou por via refle- independência e altivez, sem preocupação
xa, sobre as contas correntes dos servidores de agradar ou desagradar a quem quer que
dos referidos órgãos. Disso dá exata conta, seja. Se o STF dispôs normativamente so-
em alguns casos, o estorno da importância bre a aplicação da Medida Provisória 434,
já depositada, por força das ordens bancá- fê-1 o em razão da competência prevista na
rias, e a realização de novo depósito, já Constituição (art. 96) a que está vinculado,
agora, com a dedução determinada — não o mesmo sucedendo com o Legislativo, os
pelos Poderes independentes e órgãos au- demais tribunais e órgãos Com autonomia
tônomos que haviam emitido as ordens administrativa e financeira previstos no pa-
bancárias, mas, sim, pelo Chefe do Poder rágrafo 8° do art. 21 da M. P. 434/1994.
Executivo; e, em outros casos, o depósito
já se fez, nas contas dos servidores, dedu- 7. Relevantíssimos, assim, os funda-
zida a parcela mencionada de 10,94%. mentos do pedido, concorre, no caso, tam-
bém, o requisito do periclitam in mora.
Releva observar, além disso, que os va- Não obstante a natureza salarial dos valores
lores constantes das folhas de pagamento retirados das contas correntes dos servido-
dos servidores dos Poderes e órgãos em res, ou nelas não depositados, trata-se de
referência haviam sido calculados com prestação jurisdicional a ser dada, em man-
base em atos normativos legítimos editados dado de segurança. Invocável poderá fazer-
146 R.T.J. — 158

se, aqui, a Lei n°5.021, de 9/6/1966. Se vier VOTO (Medida Liminar)


a ser deferido o mandado de segurança, o O Sr. Ministro Moreira Alves: Sr. Pre-
pagamento da parcela aludida poderá sujei- sidente, em se tratando de estorno de quan-
tar-se a forma que retarde sua liquidação, tia a respeito de cuja legalidade da per-
com irreparável dano aos servidores, que cepção esta Corte já se manifestou, embora
precisa ser acautelado. em decisão de natureza administrativa, não
há dúvida de que é relevante a fundamen-
Inviável a concessão de medida liminar, tação jurídica do pedido de liminar.
com efeito satisfativo, não caberá, desde
logo, determinar o depósito dos valores Por outro lado, como bem demonstrou
retirados das contas correntes, para pronto o eminente relator, há o perleulum in
pagamento. A decisão final no mandado de mora que se apresenta até pela circunstân-
segurança, se favorável, é que garantirá o cia de que, se concedida a segurança, a
definitivo pagamento da parcela deduzida reposição dessas quantias retiradas dos
a que se fez acima referência. vencimentos estará sujeita a demorados
trâmites judiciais, inclusive a expedição de
Não poderão, entretanto, os servidores precatório.
do Senado Federal, da Câmara dos Depu-
tados e do Tribunal de Contas da União, Assim, Sr. Presidente, com a devida vê-
destinatários do pedido inicial, sofrer o nia do eminente Ministro Marco Aurélio,
dano ainda maior, pela demora na entrega adoto a solução encontrada pelo ilustre Re-
do que lhes seria devido. Faz-se, pois, ne- lator, razão por que meu voto é também
cessário o depósito dos montantes dos va- pelo deferimento parcial da liminar.
lores deduzidos das contas correntes dos VOTO (Medida Liminar)
servidores, ou nelas não depositados, em
contas especiais remuneradas, em nome de O Sr. Ministro Octavio Gallotti
cada um dos órgãos referidos, à ordem (Presidente): Também considero caracteri-
deste Tribunal. zado o fumo do bom direito, em primeiro
8. Do exposto, defiro, em parte, a me- lugar, com referência à questão de fundo
dida liminar para determinar que o Chefe unanimemente decidida pelo Supremo Tri-
do Poder Executivo Federal adote as provi- bunal, em sede administrativa, perante a
dências necessárias no sentido de serem lacuna que se verificava na medida provi-
depositados os montantes referentes aos sória em causa, e integrada por meio de
valores deduzidos das contas correntes dos construção inspirada no texto constitucio-
servidores da Câmara dos Deputados, do nal, art. 168, perfeitamente coerente com a
Senado Federal e do Tribunal de Contas da finalidade das normas aplicáveis, de sim-
União, — ou nelas não depositados, em ples conversão monetária, sem implicarem
virtude da determinação impugnada, — aumento, nem diminuição intrínseca de va-
montantes esses relativos à dedução de lores salariais, como aliás, enfática e repe-
10,94% sobre os seus vencimentos líquidos tidamente proclamado pelas autoridades
concernentes ao mês de março de 1994, — responsáveis pela elaboração do novo pla-
em contas especiais, em nome dos órgãos no econômico e pela exposição de motivos
indicados acima e à ordem do Supremo que acompanhou a medida provisória, cuja
Tribunal Federal, até o julgamento final sinceridade só agora vem a ser desmentida,
deste mandado de segurança, com garantia por alguns de seus próprios signatários.
de atualização monetária pelo índice das Considero, também, verificada a serie-
cadernetas de poupança. dade da fundamentação jurídica do pedido,
R.T.J. — 158 147

em relação ao objeto imediato e direto do Banco do Brasil S.A., em contas especiais


mandado de segurança, ou seja, a inaceitá- sujeitas à correção monetária, abertas em
vel retirada, por ordem do PoderExecutivo, nome da Câmara dos Deputados, do Sena-
de quantias já depositadas, por iniciativa do do Federal e do Tribunal de Contas da
Senado Federal, da Câmara dos Deputados União, e mantidas à ordem do Supremo
ou do Tribunal de Contas da União, a cré- Tribunal Federal, até final julgamento —,
dito efetivo das contas bancárias particula- dos montantes retirados das contas bancá-
res de cada um dos servidores, rias, pertencentes aos servidores de cada
Estando, igualmente, demonstrada, pelo um dos órgãos atingidos pelo ato impugna-
eminente Rel ator, a ocorrência do perigoda do. Vencido o Ministro Marco Aurélio,
demora, acompanho o voto de S. Exa. para que, também a deferia, em maior extensão,
deferir, em parte, e rios mesmos termos, a ou seja, para imediato crédito dos valores
medida liminar. estornados nas contas individuais dos ser-
vidores. Votou o Presidente.
EXTRATO DA ATA
MS 21969 (Medida Liminar) -- DF Presidência do Senhor Ministro Octavio
-- Rei: Min. Limar Gaivão. Imptes.: Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
SINDILEGIS -Sindicato dos Servidores Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
do Poder Legislativo Federal e do Tribunal Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepalve-
de Contas da União (Advs.:. Jorge Alberto da Pertence, Celso de Mello, Carlos Valio-
Pilar Bandarra e outro). Impilo.: Presidente so, Marco Aurélio, Ilmar Gaivão e Francis-
da República. co Rezek. Procurador-Geral da República,
Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
Decisão: Por maioria de votos, o Tribu-
nal deferiu parcialmente a medida liminar, Brasília, 28 de março de 1994 — Luiz
para determinar o imediato depósito no Tomimatsu, Secretário.

HABEAS CORPUS N'' 70.627 — PA


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches


Paciente.: Ricardo Antonio Diniz da Conceição — Impetrante: Guaracy da
Silva Freitas — Coator: Tribunal Regional Federal da 1 • Região
Direito Constitucional, Penal e Processual Penal.
Jurisdição. Competência.
Justiça Federal. Justiça Estadual.
Tráfico internacional de entorpecentes.
Artigo 109, V e IX da CF e art. 27 da Lei n° 6.368, de
21-10-1976.
1. Em se tratando de tráfico internacional de entorpecente,
a jurisdição criminal é atribuída, em princípio, a Juiz federal, em face
do disposto nos incisos V e IX do art. 109 da Constituição Federal.
148 R.T.J. — 158

Se o lugar em que tiver sido praticado o delito for muni-


cípio que não seja sede de vara da Justiça Federal, o processo e julga-
mento caberão à Justiça estadual, com recurso, hoje, para o Tribunal
Regional Federal (v. art. 27 da Lei n° 6.368, de 21-10-1976 e art. 108, inc.
II, da CF).
A jurisdição prestada, nessa hipótese, por Juiz estadual é,
também, jurisdição federal, embora excepcional.
E sua competência territorial é relativa, não excluindo, em
caráter absoluto, a do Juiz federal com jurisdição na circunscrição
judiciária.
Sendo este último incompetente apenas relativamente (e
não absolutamente), essa incompetência induz a nulidade relativa, que
não argüida oportunamente, mediante «exceção de incompetência de
juízo» (art. 95, H, do C. P. Penal), fica sanada, pela preclusão.
Nulidade absoluta não caracterizada. Nulidade relativa
sanada.
6. HC conhecido, mas indeferido.

ACÓRDÃO guiria para os Estados Unidos e Europa,


a fim de ser comercializada.
Vistos, relatados e discutidos estes au-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- A substância entorpecente perten-
bunal Federal, por sua Primeira Turma, na cia ao paciente e outros companheiros,
conformidade da ata do julgamento e das os quais foram presos e, a bordo do
notas taquigráficas, por unanimidade de barco «Bubalus», ancorado no cais do
votos, em conhecer do pedido de «habeas porto de Monte Alegre-PA, autuados
coreus», mas indeferi-lo. em flagrante.
Brasília, 13 de outubro de 1994 — Mo- Denunciados pelo D. Procurador
reira Alves, Presidente — Sydney San- da República perante a 2' Vara da Seção
ches, Relator. Judiciária da Justiça Federal em Belém-
PA, o paciente foi condenado a oito anos
RELATÓRIO de reclusão e multa.
O Sr. Ministro Sydney Sanches: 1. 0 Apelou para o egrégio Tribunal
ilustre Subprocurador-Geral da República Regional Federal da 1° Região, cuja
Dr. Mardem Costa Pinto, assim resumiu Quarta Turma, por unanimidade, negou
a hipótese a fls. 121/122, itens 1 a 6, inclu- provimento ao recurso.
sive: Seu advogado, Dr. Guaracy da
«Ricardo Antonio Diniz da Con- Silva Freitas, impetrou em seu benefício
ceição é proprietário do barco Ven- o presente habeas corpus sob o funda-
cedor», na qual foram encontrados e mento de que o processo através do qual
apreendidos cerca de 130 quilos de co- o paciente foi condenado padece do ví-
caína pura, apanhada em Santarém-PA, cio da nulidade em vista da incompetên-
para ser levada para o Suriname, onde cia da Justiça Federal, nos termos do
parte da droga seria vendida e parte se- art. 27, da Lei n° 6.368/76, que diz ser
R.T.J. — 158 149

competente a Justiça Estadual quando o em nome de Ricardo Antônio Diniz da


local onde deve ser instaurado o proces- Conceição, bem como se o acórdão que
so não for sede de Vara Federal. julgou tal recurso, interposto, segundo
6. Requer a concessão da ordem, consta de fls. 112/118, em nome apenas
para ver declarado nulo o processo, ex- de José Antônio Ferreira de Macedo,
pedindo-se o alvará de soltura em favor transitou, ou não, em julgado.
do paciente.» Publique-se.»
Em seguida, opinou o douto repre- Vieram, então, para os autos as infor-
sentante do Ministério Público Federal mações e documentos de fls. 134/186, rei-
pelo indeferimento do pedido, (fl. 122, item terando o Ministério Público Federal o pa-
7, a fl. 126, item 25, inclusive) ficando essa recer pelo indeferimento (ti. 188).
manifestação assim resumida na ementa de À fl. 189 proferi novo despacho, in
fl. 121: verbis:
«Ementa: Tráfico internacional de «Oficie-se novamente à Presidência
entorpecentes. Competência da Justiça do Tribunal Regional Federal da 1' Re-
Federal, seja em face do art. 109, V, da gião, para que informe se foi interposto
Constituição Federal, por se tratar de agravo de instrumento, para o Superior
crime previsto em convenção interna- Tribunal de Justiça, por Ricardo Antô-
cional, e da Súmula n° 522, seja em face nio Diniz da Conceição, contra a decisão
do art. 109, IX, da Constituição Federal, que indeferiu o processamento de seu
que somente ressalva a competência da Recurso Especial (fl. 185).
Justiça Militar.
Em caso positivo, qual o desfecho do
— Irrelevante o tipo e as caracterís- Agravo.»
ticas da embarcação, desde que desem-
penhe convenientemente a atividade de 6. Informou, então, o Presidente do Tri-
tráfico internacional.» bunal Regional Federal da 1' Região que
não houve, de parte do ora paciente, a in-
À fl. 128, como relator, despachei: terposição do agravo de instrumento (fl.
«1. Em face do que consta de fl. 75, 193).
oficie-se à E. Presidência do Tribunal É o relatório.
Regional Federal da 1° Região, solici-
tando-se-lhe o envio de cópias dos re- VOTO
cursos especiais interpostos contra o
acórdão proferido na Apelação Crimi- O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela-
nal n° 92.01.09825-1-PA (fls. 77/109), tor): 1. O presente pedido de habeas cor-
bem como das decisões presidenciais pus foi ajuizado a 6 de agosto de 1993,
que os admitiram ou não, com informa- contra o acórdão do Tribunal Regional Fe-
ção sobre eventual interposição de deral da 1° Região, que negou provimento
agravo de instrumento e respectivo des- à apelação do ora paciente (fls. 2 e 8).
fecho. 2 Sucede que esse julgado foi mantido,
2. Diante, também, do que consta de pelo E. Superior Tribunal de Justiça, ao
fls. 75 e 110, oficie-se à E. Presidência julgar, dias depois, ou seja, em data de 18
do Superior Tribunal de Justiça, para de agosto de 1993, o recurso especial inter-
que informe se o Recurso Especial n° posto pelo co - réu José Antonio Ferreira
31.059 — Pará foi interposto, também, de Macedo, quando deixou assentado na
150 R.T.J. —158

ementa, no ponto que aqui interessa (fl. É certo que o julgado do Superior
137): Tribunal de Justiça foi proferido em recur-
«Constitucional e Penal. Tráfico so especial interposto pelo co-réu José
ilícito de substância entorpecente com Antonio Ferreira de Macedo, e não
implicações internacionais. Fato não pelo ora paciente, que se conformou com o
acontecido em comarca que não é indeferimento do que interpusera, deixando
sede de Vara da Justiça Federal e nem de agravar de instrumento (fls. 189, 191 e
onde os réus tinham domicílio. Com- 193).
petência da Justiça Federal. De qualquer maneira, a decisão do Su-
perior Tribunal de Justiça afeta a todos os
L Denúncia fincada nos arts. 12, 14 co-réus, pois manteve a competência da
e 18, I, da Lei n° 6.368/76 relativa a Vara da Justiça Federal de Belém, que a
apreensão de um barco, em águas terri- todos condenou. Inclusive o ora paciente.
toriais brasileiras, transportando apre-
ciável quantidade de cocaína com pas- Sendo assim, o aresto que deve ser
sagem pelo Suriname e destinada aos impugnado com a impetração de habeas
Estados Unidos da América do Norte e corpus, perante esta Corte, não é mais o do
países da Europa, com prisões em fla- Tribunal Regional Federal da 1' Região,
grante de estrangeiro e brasileiros, re- mas, sim, o do Superior Tribunal de Justiça,
clama a competência da Justiça Federal no julgamento do Recurso Especial n°
porque os réus não residiam na comarca 31.059, que, aliás, transitou em julgado (v.
de onde partiu a embarcação e por tra- fls. 137/143 e 134).
tar-se de crime previsto em Convenção 7. Isto posto, não conheço do pedido,
Internacional (CF, art. 109, V, e IX c/c ressalvando ao paciente a possibilidade de
o § 3°), sem vez o disposto no art. 27 da renovar a impetração, perante esta Corte,
chamada Lei de Tóxicos. mas impugnando o acórdão do Superior
Divergência jurisprudencial não Tribunal de Justiça.
provada, pois o recorrente não demons- VOTO (RETIFICAÇÃO
trou as circunstâncias que assemelham
S/PRFLEMINAR)
ou identificam os casos confrontados.
Recurso especial não conheci- O Sr. Ministro Sydney Banhes (Rela-
do.» tor): Sr. Presidente, pareceu-me, de início,
que, tendo o Superior Tribunal de Justiça
Há apenas uma imprecisão na emen- mantido, em recurso especial, o acórdão
ta, ao dizer «fato não acontecido», quando do Tribunal Regional Federal da 1' Região
o certo é «fato acontecido em comarca que (ora impugnado), que considerara compe-
não é sede de Vara da Justiça Federal» (fl. tente a Justiça Federal para o processo e
137). julgamento da ação penal, cuja sentença
Mas, como se vê da ementa e do condenatória confirmou, essa decisão (do
próprio teor do julgado, o Superior Tribu- STJ) afetava o co-réu, ora paciente, pro-
nal de Justiça, doze dias depois da impetra- cessado e julgado pela mesma Justiça e
ção de habeas corpus perante esta Corte, condenado pela mesma sentença.
examinou a questão aqui suscitada e man- E por isso votei, preliminarmente, pelo
teve o acórdão do Tribunal Regional Fe- não conhecimento do habeas corpus, já
deral da 1' Região, que é o ora impugnado que atacado deveria ter sido, então, não
(v. fls. 137, 2 e 8). mais o acórdão regional, mas, sim, o do
R.T.J. — 158 151

Superior Tribunal de Justiça. Até porque bia, trazida com a ajuda de um colom-
havia o risco, em tese, de o Supremo Tri- biano, Ramiro Cruz Mina e seria levada
bunal Federal reconhecer a competência da para o Suriname e de lá para os Estados
Justiça estadual e, então, conceder o ha- Unidos e Europa, o que demonstra a
beas corpus, anulando o acórdão regional competência da Justiça Federal.
e a sentença que confirmou, subsistindo, Ademais, nesta atividade de trafi-
por outro lado, .o acórdão do STJ, negando cância internacional, ressalte-se a im-
essa anulação, por considerar competente a portância do uso do barco «O Vence-
Justiça Federal. dor», de propriedade do paciente.
Após os votos dos eminentes Ministros Com aquele barco, apanharam a
Sepalveda Pertence e Ihnar Gaivão con- cocaína em Santarém-PA, onde chegara
venci-me do desacerto de minha posição em uma embarcação conhecida na re-
inicial. gião por «voadeira», e zarparam com
Como salientou o primeiro, «o caso, é destino ao Suriname.
certo, gera alguma perplexidade, derivada
A substância foi apreendida na-
da alternativa, que a orientação jurispru- quele barco, bem escondida entre duas
dencial consagrou, entre o habeas corpus paredes de madeira habilmente cons-
para o STF ou o recurso especial para o truídas para despistar policiais menos
STJ, contra a mesma decisão. Mas, a opção atentos.
de um co-réu pelo recurso especial, que lhe
resultou desfavorável, não pode obstar a O crime foi consumado a bordo
utilização pelo outro da via do habeas cor- de um navio, o que também define a
pus, sobretudo, enquanto se reputar que competência da Justiça Federal para
este último é da competência do Tribunal processar e julgar o feito, nos termos do
da mais alta hierarquia». art. 109, inciso IX, da Constituição Fe-
deral.
Na mesma linha foi o voto do eminente
Ministro limar Gaivão, que focalizou o 13. Vicente Greco Filho, in «Tóxi-
art. 580 do CPP e convenceu-me de que o cos, Prevenção-Repressão», Ed. Sarai-
acórdão do STJ, desfavorável ao co-réu, va, 1987, pág. 83, comentando o art. 12
não poderia afetar o ora paciente. da Lei n° 6.338/76, preleciona:
Reconsiderando, pois, meu voto preli- «Ação física: São 18 os verbos do
minar, conheço, agora, do pedido. caput que exprimem as formas de
conduta punível e que são os núcleos
VOTO (S/MÉRITO) do tipo, algumas permanentes, como
guardar, ter em depósito, trazer con-
O Sr- Ministro Sydney Sanches (Rela- sigo e expor a venda, e as demais
tor): 1. Superada a questão preliminar, no instantâneas».
mérito, indefiro o pedido.
2. Quanto a esse ponto, é esta a funda- E, na pág. 88, explica:
mentação contida no parecer do Ministério «Consumação e tentativa. Como
Público Federal, a partir de fls. 122, item 8, vimos, consuma-se o delito com a
a fls. 126, item 25, inclusive, in verbis: prática de uma das ações previstas no
«8. Os autos trazem a prova indubi- tipo. Alguns atos de execução, even-
tável de que se tratava de «tráfico inter- tualmente caracterizadores de tenta-
nacional», pois a droga veio da Coram- tiva são, por si mesmos, condutas
152 R.T.J. — 158

igualmente puníveis, daí ser difícil a como «única ressalva», a competência


existência da forma tentada». da Justiça Militar.
Os envolvidos no processo ori- Além disso, como bem ressaltou
ginal importaram, tinham em depósito, o MM. Juiz prolator da sentença conde-
guardavam e transportavam substâncias natória, às págs. 114 e 115:
entorpecentes, usando o barco «O Ven-
cedor», onde o crime se consumou. «A competência estadual, como
Irrelevante o tipo, o tamanho e as visto, em tal hipótese, é concorrente,
demais características da embarcação, isto é, delegada ou supletiva, não su-
primindo, destarte, a competência
porque aquela cumpria eficientemente a
finalidade à qual estava destinada na constitucional da Justiça Federal que
se espraia por todo o território físico
ocasião, qual seja, o transporte de cocaí-
na para o exterior, mais precisamente do Estado da Federação onde está
instalada a respectiva Seção Judiciá-
para o Suriname.
ria. Como se não bastasse esse argu-
O Doutor Aristides Junqueira Al- mento exceptivo, em favor da Justiça
varenga, atual Procurador-Geral da Repú- Federal, tem-se que a cocaína, proce-
blica, na sua obra «A Competência Crimi- dente da Colômbia, destinava-se
nal da Justiça Federal de Primeira Instân- para os Estados Unidos com trânsito
cia», Ed. Saraiva, 1978, pág. 99, explica: pelo Pará e Suriname, a bordo da
«Não importa o tamanho do navio embarcação trazida por alienígenas,
ou aeronave, em cujo interior o crime o que de certa forma também impul-
foi praticado, embora o emprego do siona a vis atractiva (art. 109, IX, da
termo «navio» já exclua as embarca- Constituição Federal)».
ções de pequeno calado, impróprias
para a navegação em alto-mar, nem E Valdir Znick, em «Comentá-
se a navegação é marítima, fluvial, ou rios à Lei de Entorpecente», 2° Ed., Fo-
lacustre. O que se deve considerar, rense, Rio, 1987, pág. 243, comentando
repita-se, é a implicação internacio- o referido art. 27, diz:
nal, que estará sempre presente. nos
«Trata-se aqui, evidentemente, de
crimes cometidos a bordo de navios e
uma competência delegada, eis que
aeronaves estrangeiros. Ou a bordo
para estes crimes, competente a Jus-
de embarcações nacionais, quando
tiça Federal (art. 125 da Constituição
em viagem internacional, ou prestes a
Federal)».
realizá-la, se fatos delituosos envol-
verem pessoas alienígenas». 21. Esta competência supletiva, de-
Não pode prevalecer o disposto legada, ou excepcional, como julgou a
no art. 27 da Lei n° 6.368/76, porque, em Suprema Corte, no HC 67.735, transcri-
vista da implicação internacional e o to pelo paciente às páginas 5 e 6, criada
cometimento da infração à bordo de um pelo art. 27, da Lei 6.368/76, tinha o
barco, a competência é da Justiça Fede- escopo de facilitar a repressão ao tráfico
ral, por força do disposto no art. 109, de entorpecentes e a conseqüente puni-
incisos V e IX, da Constituição Federal, ção dos culpados, porque tanto a Justiça
dispositivos esses que, além de ser no como a Polícia dos Estados estavam me-
contexto da hierarquia das leis superior lhor estruturadas e aparelhadas para
ao citado art. 27, apresenta o segundo, obstar o nefando mister.
R.T.J. — 158 153

No caso presente, não se verifi- incompetência absoluta, mas de nulidade


cou grande dificuldade para as autorida- relativa, por incompetência relativa.
des da área federal, porque a Polícia
Nulidade relativa, que ficou sanada, à
Federal já estava atenta, acompanhando
falta de oportuna argüição, mediante exce-
os movimentos do barco «O Vencedor», ção de incompetência, como previsto no
as atividades do seu proprietário e com-
art. 95, inciso II, do C. P. Penal (exceção de
panheiros, a preparação em Belém (sede
incompetência de juízo).
de Vara Federal), com a contratação de
tripulantes e compra de mercadorias Há na inicial afirmação do impetrante
para disfarce. Foram autuados por dele- no sentido de que «desde as alegações pre-
gada da Polícia Federal, v. fls. 46/41, o liminares» protestou «pela incompetência
Digno Procurador da República ofere- do foro federal» (fl. 3). Mas não há prova
ceu a denúncia, (fls. 41/46) e o MM. Juiz alguma a respeito.
se considerou competente e julgou, nada Ademais, embora a questão tenha sido
ocorrendo no aspecto prático, que justi- enfrentada e repelida pelo TRF (fls. 8/40),
ficasse, ou que tornasse necessária a in- o paciente conformou-se com o indeferi-
terveniência da área estadual. mento de seu recurso especial para o STJ
Não se pode também dizer que (fl. 193), deixando definitivamente preclu-
houve prejuízo para a defesa dos proces- sa a questão.
sados e condenados.
4. Isto posto, indefiro o pedido.
De qualquer forma, há de prevale-
cer a competência da Justiça Federal, nos VOTO
termos do art. 109, incisos V e IX, da Carta O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
Magna, sendo certo que este último dispo- Senhor Presidente, dado o período que atra-
sitivo somente ressalva a competência da vesso de acúmulo de funções no Tribunal
Justiça Militar, e que obviamente se so- Eleitoral, talvez não possa estar presente à
brepõe ao preceito infraconstitucional do futura sessão que dará continuidade ao exa-
art. 27 da Lei n° 6.368116. me deste caso.
Ante o exposto, opinamos no
Adianto o meu.
sentido que seja conhecido o presente
habeas corpus mas, no mérito, seja de- A solução do voto do em. Relator, a meu
negada a ordem». ver, com todas as vênias, implica paradoxal
3. Na verdade, a jurisdição prestada pe- extensão ao co-réu de uma decisão desfa-
los Juízes estaduais, em comarca onde não vorável ao outro.
haja Vara da Justiça Federal, é, também, O caso, é certo, gera alguma perplexida-
jurisdição federal, embora excepcional. De de, derivada da alternativa, que a orienta-
sorte que a competência do Juiz estadual do ção jurisprudencial consagrou, entre o ha-
local em que se deu a prisão em flagrante beas corpus para o STF ou o recurso espe-
(no município de Monte Alegre-Pará, em cial para o STJ, contra a mesma decisão.
território de comarca cujo nome se ignora) Mas, a opção de um co-réu pelo recurso
(Prainha? Santarém — v. fl. 2) é competên- especial, que lhe resultou desfavorável, não
cia relativa. E não absoluta. Assim, tendo pode obstar a utilização pelo outro da via
sido o feito processado e julgado por Juiz do habeas corpos, sobretudo, enquanto se
Federal de Belém do Pará, não se caracte- reputar que este último é da competência
rizou hipótese de nulidade absoluta, por do Tribunal da mais alta hierarquia.
154 R.T.J. — 158

Quando oportuno, fundamentarei me- so, posto que a decisão em causa, do Supe-
lhor o meu voto, mas, no caso, com a vênia rior Tribunal de Justiça, sem trazer qual-
do eminente Relator, de logo, conheço do quer benefício ao paciente, na verdade, só
habeas corpus. o pode prejudicar, como, v.g., no impossi-
VOTO (VISTA) bilitar a obtenção, em revisão criminal, de
novo pronunciamento do Tribunal Regio-
O Sr. Ministro Limar Gaivão: Trata- nal Federal, por sua vez impugnável peran-
se de habeas corpus impetrado em favor te o mesmo Superior Tribunal de Justiça,
de Ricardo Antônio Diniz da Conceição, por meio de recurso especial.
contra acórdão do Tribunal Regional Fe- Incide, aí, o princípio ne reformado in
deral da P Região, confirmatório de sen-
peius que resguarda o acusado de qualquer
tença do Juiz Federal do Estado do Pará,
gravame em seu status libertada, não resul-
que condenou o paciente pelos crimes de
tante de iniciativa do órgão acusador, exceto
tráfico internacional de drogas e associa-
nas hipóteses expressamente previstas em lei,
ção para tal fim, não obstante ocorrido o
donde haver o Supremo Tribunal Federal
crime em local que não é sede de Vara da
assentado, na Súmula n° 160, ser «nula a
Justiça Federal, onde é competente para o
decisão do Tribunal que acolhe, contra o réu,
feito o Juiz estadual da respectiva Comar-
nulidade não argüida no recurso de acusação,
ca, como previsto no art. 27 da Lei n°
ressalvados os casos de recurso de oficio.»
6.368/76.
Essa orientação, aliás, foi decisiva
O eminente Relator, Ministro Sydney
Sanches, votou pelo não-conhecimento, para a concessão de habeas corpus, em
recentes julgamentos, em que esta Tur-
tendo em vista haver a referida Corte nega-
ma em sede de recurso da defesa, anulou
do provimento a recurso especial impetra-
prisão preventiva decretada em substitui-
do, pelo mesmo fundamento, por um dos
ção a prisão em flagrante maculada pelo
co-réus, contra a decisão impugnada pelo
excesso de prazo (HC 70.308, Relator
impetrante.
Ministro Sepúlveda Pertence e HC
Dele discordou, entretanto, o eminente 70.632, Relator Ministro limar Gaivão).
Ministro Sepúlveda Pertence, que conhe-
ceu do pedido, ao entendimento de não ser A situação não é diferente, em se tratan-
possível considerar estendidos ao paciente do, como se trata, de matéria de competên-
os efeitos da decisão do Superior Tribunal cia, mormente no presente caso, em que se
de Justiça. está diante de questão de competência me-
ramente territorial (lugar da infração), em
Face à relevância da matéria, pedi vista que o Juiz estadual concorrente aparece ao
dos autos. lado do Juiz Federal investido, por igual,
Com a vênia do eminente Relator uma em competência federal, nos termos do art.
das condicionantes da aplicação da norma 109, § 3°, da CF/88.
do art. 580 do CPP, no entendimento do Assim, com a devida vênia do eminente
Supremo Tribunal Federal, é que, obvia- Relator, meu voto acompanha o do eminen-
mente, a decisão relativa a um dos co-réus te Ministro Sepúlveda Pertence.
repercuta favoravelmente na situação jurí-
dica do outro (HC n° 69.013, Relator Mi- EXTRATO DA ATA
nistro Celso de Mello). HC 70.627 — PA — Rei.: Min. Sydney
No caso em tela, esse pressuposto está Sanches. Pacte.: Ricardo Antonio Diniz da
ausente, verificando-se, na verdade, o aves- Conceição. Impte.: Guaracy da Silva Frei-
— 158 155

tas. Coator: Tribunal Regional Federal da «habeas corpus», e da reconsideração do


1' Região. voto do Sr. Ministro Relator, também dele
Decisão: Após os votos dos Ministros conhecendo, a Turma conheceu do pedido,
Sydney Sanches, Relator, não conhecendo, mas o indeferiu. Unânime.
preliminarmente, do pedido de «habeas Presidência do Senhor Ministro Moreira
corpus», e Sepúlveda Pertence, dele conhe- Alves. Presentes-a-Sesão os Senhores Mi-
cendo, o julgamento foi adiado em virtude nistros Sydney Sanches, SepúlvedaPerten-
do pedido de vista do Ministro limar Gai- ce, Celso de Mello e Ilmar Gaivão. Subpro-
vão. Falou pelo paciente o Dr. Guaracy da curador-Geral da República, Dr. Miguel
Silva Freitas. l a Turma, 23-8-94. Frauzino Pereira.
Decisão: Após o voto vista do Sr. Minis- Biasília, 13 de setembro de 1994 —
tro limar Gaivão, conhecendo do pedido de Ricardo Dias Duarte, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 70.734 — SP


(Segunda Tunna)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Paciente e Impetrante: Benedito Jairo do Nascimento — Coator: Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo •
I. Constitucional. Habeas corpus CF, art. 105, II, a
IL Penal. Processual penal Questões novas. Nulidade do pro-
cesso. Impedimento. Exame de prova: Impossibilidade.
Por conter questões novas, que não foram postas ao exame
do Tribunal de Justiça, o habeas corpus não pode ser conhecido, sob pena
de supressão de instância. Competência do Tribunal de Justiça.
Habeas corpus impetrado contra decisão de Tribunal de
Justiça que indeferiu ordem requerida pelo réu. Competência do Supe-
rior Tribunal de Justiça, por se tratar de impetração originária substi-
tutiva de recurso ordinário.
O fato de o juiz haver participado do julgamento de
habeas corpus impetrado não implica estar impedido para o julgamento
do pedido de revisão criminal.
O exame do conjunto probatório não se compatibiliza
com a natureza sumaríssima do writ.
V. HC conhecido, em parte e, na parte conhecida, indefe-
rido.
156 R.T.J. — 158

ACÓRDÃO corpus impetrados antes votaram nova-


Vistos, relatados e discutidos estes au- mente, sem se declararem suspeitos;
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- que o juiz ofendeu as testemunhas de
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- defesa;
formidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, conhe- que sua filha foi ouvida sem a pre-
cer, em parte, do «habeas corpus» e, nessa sença de curador e foi induzida pelo juiz a
parte, o indeferir. Também, por unanimida- depor contra o paciente;
de, determinar a remessa dos autos ao Su- f) que a sentença não levou em conta os
perior Tribunal de Justiça para julgar, como antecedentes criminais do paciente.
entender de direito, o pedido no que se O eminente Vice-Presidente do Tribu-
refere a sua competência, bem como, a nal de Justiça do Estado de São Paulo pres-
seguir, fazer a devolução dos autos ao Tri- tou informações (fls. 46/51), esclarecendo,
bunal de Justiça do Estado de São Paulo em resumo:
para decidir a outra parte do pedido que se
enquadra em sua competência, tudo na con- que o paciente, preso em 26-12-88,
formidade do voto do Ministro Relator. foi denunciado e, após o recebimento da
denúncia e a instrução criminal, com obe-
Brasília, 14 de dezembro de 1993 — diência ao contraditório e à ampla defesa,
Néri da Silveira, Presidente — Carlos foi condenado a três anos de reclusão e
Velloso, Relator. cinqüenta dias-multa, como incurso no art.
RELATÓRIO 12, caput, c/c o art. 38 e parágrafos da Lei
n° 6.368/76. Não houve recurso contra essa
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata- decisão;
se de habeas corpus impetrado por Bene- que o paciente impetrou dois habeas
dito Jairo do Nascimento, em seu próprio corpus perante o Supremo Tribunal Fede-
benefício, em que alega haver sido conde- ral e cinco perante o Tribunal de Justiça,
nado pelo Juízo da Terceira Vara Criminal sendo que estes últimos foram indeferidos;
da Capital a três anos de reclusão e multa, que também o pedido de revisão cri-
por infração ao art. 12, caput, c/c o art. 38 minal ajuizado pelo paciente, em que pre-
e parágrafos da Lei de Tóxicos, mas que o tendia a desclassificação do crime de tráfi-
processo apresenta inúmeras irregularida- co de drogas para o de porte, foi indeferido;
des, razão por que pede a anulação da ação
penal. que no presente habeas corpus o
paciente renova a argumentação dos pedi-
Em longa petição, demonstra o paciente dos anteriores, sendo certo que sua preten-
pretender o reexame das provas constantes são é o reexame dos julgados anteriores
dos autos e aponta a existência das seguin- com base nas provas existentes nos autos.
tes irregularidades:
A Procuradoria-Geral da República, ofi-
que houve erro na aplicação da ciando às fls. 81/83, pelo parecer do ilustre
pena; Subprocurador-Geral Claudio Lemos Fon-
que não foram juntados aos autos os teles, opina pelo não conhecimento do pe-
seus antecedentes criminais; dido.
c) que seu pedido de revisão foi preju- Argumentou que, conforme se pode ve-
dicado, porque três Desembargadores que rificar, pela leitura das informações presta-
já haviam atuado em julgamento de habeas das pela autoridade apontada coatora, a nu-
R.T.J. — 158 157

lidade suscitada pelo paciente — erro na sua filha menor foi ouvida sem a
aplicação da pena—já foi apreciada pelo presença de curador e teria sido induzida
HC 78.323-3, impetrado perante o Tribunal pelo juiz a depor contra o ora paciente;
de Justiça do Estado de São Paulo, pelo
a defesa teria agido com displicência;
que, contra tal decisão, caberia recurso or-
dinário em habeas corpos para o Superior f) seu pedido de revisão teria sido pre-
Tribunal de Justiça (CF, art. 105, II, a). judicado porque três desembargadores que
No que toca à afirmação de que seriam participaram anteriormente do julgamento
suspeitos os desembargadores que julga- de habeas corpus por ele impetrados pe-
ram a revisão criminal, ela é totalmente rante o Tribunal de Justiça, votaram tam-
improcedente, uma vez que os desembar- bém no pedido de revisão.
gadores que participaram do julgamento de O Ministério Público Federal opina pelo
alguns habeas corpus não estão impedidos não conhecimento do pedido: a uma, por-
de julgar outros recursos apresentados pelo que, conforme consta das informações (fl.
réu. 48), a nulidade alegada pelo réu em razão
Conclui o parecer que as demais alega- de erro na fixação da pena, foi apreciada
ções do ora paciente não foram enfrentadas pelo Tribunal de Justiça do Estado de São
pelo Tribunal estadual, o que torna a Supre- Paulo e, nos termos do estatuído no art.
ma Corte incompetente para apreciá-las, 105, II, a, da Constituição, contra tal deci-
sob pena de supressão de instância. são caberia recurso ordinário para o Supe-
rior Tribunal de Justiça. A duas, porque a
É o relatório. afirmação de que os desembargadores que
julgaram a revisão são suspeitos, por terem
VOTO julgado, antes, habeas corpus impetrados
pelo réu, é totalmente improcedente, dado
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela- que se confunde suspeição e impedimento
tor): O réu encontra-se preso por ter sido e que a situação descrita nos autos não é a
condenado a três anos de reclusão e multa, mesma prevista no art. 252, II e IR, do CPP.
pelo Juízo da Terceira Vara Criminal da A três, porque as demais alegações ainda
Capital de São Paulo, pelo crime de tráfico não foram enfrentadas pelo Tribunal de
de drogas (Lei n° 6.368/76, art. 12). Justiça, pelo que o Supremo Tribunal é
Além de desejar que esta Corte reexami- incompetente para apreciá-las, sob pena de
ne a prova, alega que o processo apresenta supressão de instância.
inúmeras irregularidades. Pleiteia, por isso, Está correto o entendimento.
a anulação da ação penal que resultou na
sua condenação. As questões novas, que não foram pos-
tas ao exame do Tribunal de Justiça do
Tais irregularidades teriam sido as se- Estado de São Paulo — a folha de antece-
guintes: dentes não foi juntada aos autos, o juiz teria
Inexistência da folha de seus antece- ofendido as testemunhas, a filha menor do
dentes criminais nos autos do processo; paciente teria prestado declarações sem que
estivesse presente o curador e que o juiz a
erro na fixação da pena, já que era
teria induzido a depor contra o pai e, final-
reincidente e o juiz o apenou como se pri-
mente, que houve negligência da defesa —
mário fosse; não poderão ser conhecidas, agora, sob
c) o juiz ofendeu as testemunhas; pena de supressão de uma instância. Foi
158 R.T.J. — 158

nesse sentido o decidido por esta Turma no assim, na parte em que postula o reexame
HC 68.857-SP, por mim relatado. da prova.
Nesta parte, portanto, os autos deverão Determino a remessa dos autos ao Eg.
ser remetidos ao Tribunal de Justiça de São Superior Tribunal de Justiça, para aprecia-
Paulo. ção e julgamento da alegação referente a
Consta das informações (fls. 46/51) que erro na aplicação da pena. Após, os autos
a 2' Câmara Criminal do Tribunal de Justi- deverão ser encaminhados ao Eg. Tribunal
ça de São Paulo, apreciando o HC 78.323, de Justiça do Estado de São Paulo, para
impetrado pelo ora paciente, em que este apreciação e julgamento das questões no-
sustentou a existência de erro na fixação da vas.
pena, denegou a ordem. É o voto.
Contra tal decisão, poderia o paciente
interpor recurso ordinário para o Superior VOTO
Tribunal de Justiça (CF, art. 105, II, a).
Tem-se, no ponto, pois, impetração origi- O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor
nária substitutiva de recurso ordinário. Presidente, em primeiro plano, ressalvo o
Quer dizer, a competência para o julgamen- entendimento pessoal quanto à competên-
to deste habeas corpus, nesta parte, é do cia para julgar as matérias indicadas pelo
Egrégio Superior Tribunal de Justiça. nobre Relator. Os integrantes dos Tribunais
Examinamos, agora, as questões que de Justiça estão submetidos, como desem-
bargadores, à jurisdição direta, nos crimes
podemos conhecer.
comuns e de responsabilidade, do Superior
Sustenta o paciente que o seu pedido de Tribunal de Justiça, o que atrai a pertinên-
revisão foi prejudicado porque três desem- cia da alínea c do inciso Ido artigo 105 da.
bargadores que participaram do julgamen- Carta de 1988. Todavia, este não é o enfo- •
to de habeas corpus por ele impetrados, que predominante na Corte, razão pela
anteriormente, votaram no processo de re- qual, diante do que decidido na reclamação
visão, sem se declarar suspeitos. n° 314, do Distrito Federal, relatada pelo
Não procede o alegado. Ministro Moreira Alves, em que fiquei ven-
cido, juntamente com os Ministros Carlos
Confunde-se, na verdade, bem registra Velloso, limar Gaivão e Celso de Mello,
o parecer da Procuradoria-Geral da Repú- conheço, na parte indicada por S. Exa., o
blica, suspeição e impedimento, certo, en- pedido formulado.
tretanto, que o caso de que tratani estes
autos não configura nenhuma das situações No mais, acompanho-o não só denegan-
previstas no art. 252, II e III, CPP. do a segurança, nessa parte, como também
determinando a remessa dos autos ao Supe-
A outra alegação —o pretendido reexa- rior Tribunal de Justiça, para que proceda
me da prova — não é possível nos estreitos ao julgamento do pedido, considerando o
limites do habeas corpus, conforme temos que já apreciado pelo Tribunal de Justiça
decidido, iterativamente. no âmbito de medida de idêntica natureza,
Do exposto, indefiro o writ na parte em no âmbito de habeas corpus, e, posterior-
que o impetrante sustenta a nulidade do mente, a baixa dos autos ao Tribunal de
processo, por terem três desembargadores, Justiça, a fim de que examine a matéria que
que votaram nos pedidos de habeas cor- se mostra nova e empolgada, pela vez pri-
pus, votado na revisão criminal e, bem meira, em benefício do Paciente.
R.T.J. — 158 159

EXTRATO DA ATA bunal de Justiça do Estado de São Paulo


HC 70.734 — SP — Rel.: Min. Carlos para decidir a outra parte do pedido que se
Velloso. Pacte.: Benedito Jairo do Nasci- enquadra em sua competência, tudo na con-
mento. [rapte.: O mesmo. Coator: Tribunal formidade do voto do Ministro Relator.
de Justiça do Estado de São Paulo. Presidência do Senhor Ministro Néri da
Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
Decisão: Por unanimidade, a Turma co-
nheceu, em parte, do «habeas corpus» e, Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso
e Mamo Aurélio. Ausente, justificadamen-
nessa parte, o indeferiu. Também, por una-
te, o Senhor Ministro Francisco Rezek.
nimidade, determinou a remessa dos autos
Subprocurador-Geral da República, o Dr.
ao Superior Tribunal de Justiça para julgar,
Francisco José Teixeira de Oliveira.
como entender de direito, o pedido que se
refere a sua competência, bem como, a Brasília, 14 de dezembro de 1993 —
seguir, fazer a devolução dos autos ao Tri- José Wilson Aragão, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 70.808 — RS


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Paciente: Arildo António Berté — Impetrante: João Gheller Neto — Coator:
Tribunal de Alçada do Estado do Rio Grande do Sul
Penal. Processual Penal. Habeas corpus. Competência Banco
do Brasil. Sociedade de Economia Mista
Compete à Justiça comum estadual o processo e o julga-
mento de crime praticado contra o Banco do Brasil.
HC indeferido.

ACÓRDÃO de Arildo Antônio Berté, em que se alega


que o paciente foi condenado pelo Juízo da
Vistos, relatados e discutidos estes au- Comarca de Tenente Portela — RS, a seis
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- anos e nove meses de reclusão e multa,
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- como incurso nas penas do art. 157, § 2°, I,
formidade da ata do julgamento e das notas II e 111, do Código Penal, por ter, no dia
taquigráficas, por decisão unânime, indefe- 28-9-90, com dois outros, armados de re-
rir o «habeas corpus». vólver e espingarda, subtraído vários talões
Brasília, 23 de novembro de 1993 — de cheques e Cr$ 115.000,00, pertencentes
Néri da Silveira, Presidente — Carlos ao Banco do Brasil S.A., sentença que foi
Venoso, Relator. confirmada pelo Egrégio Tribunal de Alça-
da Criminal do Estado do Rio Grande do
RELATÓRIO Sul, mas que é inquestionável a ilegalidade
do acórdão, porque foi condenado por juízo
O Sr. Ministro Carlos Venoso: Trata- incompetente, já que, a teor do art. 109, IV,
se de habeas corpus impetrado em favor da Constituição, compete aos juízes fe-
160 R.T.J. — 158

derais processar e julgar as infrações penais ilegalidade da condenação, por ter sido jul-
em detrimento de bens, serviços ou interes- gado por juízo incompetente, dado que, nos
ses da União ou de entidades autárquicas termos do art. 109, IV, da Constituição, com-
ou empresas públicas. pete à Justiça Federal processar e julgar as
Transcreve o impetrante jurisprudência infrações penais em detrimento de bens, ser-
dos Tribunais Superiores sobre as questões viços ou interesses da União ou de suas enti-
debatidas na inicial, afirmando que o pa- dades autárquicas ou empresas públicas.
ciente está sofrendo constrangimento ilegal Não tem razão o paciente.
porque está na iminência de ser preso em É que o Banco do Brasil é uma socieda-
razão de uma sentença condenatória nula, de de economia mista e, como tal, o proces-
pelo que pede a concessão da ordem, para so e o julgamento dos crimes contra ele
que seja expedido em favor do paciente praticados são da competência da Justiça
«um salvo-conduto, para que ele não seja comum estadual, de acordo com a jurispru-
preso em virtude dos fatos aqui narrados». dência da Suprema Corte (Embargos de
Oficiando às fls. 43/44, o Ministério Divergência no RE 77.721-PR, RTJ
Público Federal, pelo parecer do ilustre 74/447, e CJ 4.853-PB, RTJ 49/78).
Subprocurador-Geral Mudem Costa Pin- Do exposto, indefiro o writ.
to, opina no sentido do conhecimento e
denegação da ordem, ao argumento de que, EXTRATO DA ATA
de acordo com a jurisprudência desta Cor- HC 70.808 —RS — ReL: Min. Carlos Vel-
te (RTJ 74/447 e 49/78), por ser o Banco loso. Pacte.: Arildo Antônio Berté. Impte.:
do Brasil uma sociedade de economia mis- João Gheller Neto. Coator: Tribunal de Al-
ta, não há falar-se em ofensa a bens, servi- çada do Estado do Rio Grande do Sul.
ços ou interesses da União Federal. Decisão: Por unanimidade, a Turma in-
É o relatório. deferiu o «habeas corpus».
VOTO Presidência do Senhor Ministro Néri da
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela- Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
tor): O réu, condenado pelo Juízo da Co- Ministros Carlos Velloso e Marco Aurélio.
marca de Tenente Portela —RS, a seis-anos Ausentes, justificadamente, os Senhores
e nove meses de reclusão e multa, como Ministros Paulo Brossard e Francisco Re-
incurso nas penas do art. 157, § 2°, I, II e zek. Subprocurador-Geral da República, o
UI, do Código Penal, decisão que foi man- Dr. Francisco José Teixeira de Oliveira.
tida pelo Tribunal de Alçada Criminal do Brasília, 23 de novembro de 1993 —
Estado do Rio Grande do Sul, sustenta a José Wilson Aragão, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 70.847 — SP


(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches
Paciente: Sérgio Antonio Piovesan — Impetrante: Alberto Zacharias Toron
— Coator: Superior Tribunal de Justiça
Direito Processual Penal.
Habeas carpas. Apelação em liberdade. Art. 594 do C. P. Penal.
R.T.J. — 158 161

Bons antecedentes.
I. Não basta a tempestividade da apelação, para que esta
seja admitida, se o beneficio de apelar em liberdade foi denegado na
sentença condenatória, com base no art. 594 do C. P. Penal, e o apelante
não se apresentou à prisão, no prazo legal de interposição do recurso.
Se o réu, além de indiciado em vários inquéritos policiais
e denunciado em processos criminais, com desfecho favorável (arquiva-
mento, absolvição, extinção de punibilidade), já sofreu condenação (an-
terior ao novo delito) por crime contra o patrimônio (receptação), com
trânsito em julgado, não pode ser considerado como de bons anteceden-
tes, para o efeito do beneficio de apelar em liberdade.
HC indeferido.

ACÓRDÃO Trata-se de habeas corpus impetra-


do por Alberto Zacharias Toron, em be-
Vistos, relatados e discutidos estes au- nefício de Sérgio Antonio Piovesan,
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- apontando como autoridade coatora o
bunal Federal, por sua Primeira Turma, na Superior Tribunal de Justiça, e, alegan-
conformidade da ata do julgamento e das do e requerendo o seguinte:
notas taquigráficas, por maioria de votos,
em indeferir o pedido de «habeas corpus» o paciente foi processado pe-
e determinar a devolução dos autos à ori- rante o Juízo Federal da 3' Vara Cri-
gem. Vencidos os Srs. Ministros Sepúlveda minal em São Paulo por infração ao
Pertence e Celso de Mello que o deferiam disposto no art. 334, § 1°, do Código
de ofício. Penal e, ao final, foi condenado à
pena de três anos de reclusão a ser
Brasília, 29 de novembro de 1994 — cumprida em regime fechado, sem o
Moreira Alves, Presidente — Sydney direito de recorrer em liberdade devi-
Sanches, Relator. do a seus maus antecedentes (doc. 1,
RELATÓRIO fls. 34);
contra essa decisão, impetrou-
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela- se habeas corpus perante o Tribunal
tor): 1. O ilustre Subprocurador-Geral da
Regional Federal da 3' Região que,
República Dr. Mardem Costa Pinto, no
no entanto, veio a ser indeferida, por
parecer de fls. 191/194, resumiu a hipótese
se entender que a interposição do
e, em seguida, opinou, nos termos seguin-
apelo fora intempestiva e que era
tes:
defeso ao paciente dirigir-se dire-
«Ementa: 1. Prazo da apelação da tamente ao Tribunal sem que se fi-
sentença condenatória. Conta-se a zesse antes qualquer pedido a autori-
partir da última intimação, não im- dade então apontada como crr.tora
portando a quem tenha sido feita. (doc. 2);
Direito de apelar solto. Não o c) interposto o Recurso de ha-
detém quem possui maus anteceden- beas corpus, perante o Superior Tri-
tes. Art. 594 do CPP. bunal de Justiça, este negou-lhe pro-
Pedido indeferido. vimento, por maioria de votos, enten-
162 R.T.J. — 158

dendo que os péssimos antecedentes Com efeito, o juiz na sentença


do réu justificavam a necessidade de condenatória negou expressamente o di-
seu prévio recolhimento para apelar reito de apelar em liberdade, devido aos
(doc. 3-A); maus antecedentes do acusado. O art.
d) por fim, requer o reconheci- 594 do Código de Processo Penal é claro
mento da tempestividade do apelo quando exige a primarirdade e os bons
interposto perante o Juiz Federal da antecedentes para que não ocorra a pri-
V Vara Criminal em São Paulo e a são, que é efeito de sentença penal con-
concessão do direito de apelar em denatória.
liberdade, considerando inaplicável Da leitura da folha de anteceden-
o art. 594 do CPP em face da Cons- tes (fl. 153), percebe-se tranqüilamente
tituição Federal de 1988. que estes não podem ser considerados
O presente habeas corpus deve como bons. Existem duas condenações,
ser conhecido e concedido, em parte. sendo que em uma ocorreu a extinção da
punibilidade. Assim, o paciente não
É que, como foi explicitado na pode apelar em liberdade. E o que enten-
inicial, o paciente foi intimado da sen- de o STF:
tença condenatória em 25-4-91 e o então
patrono da causa protocolou o Recurso «Ementa: Recurso de habeas
de Apelação em 29-4-91, portanto den- corpos. Réu que não possui bons
tro do prazo. Não importa que o advo- antecedentes assim reconhecidos na
gado tenha sido intimado da decisão sentença condenatória não tem direi-
antes do sentenciado, pois é a última to a apelar em liberdade. Art. 594 do
intimação feita que vale para a conta- CPP. O tempo decorrido não torna
gem do prazo recursal e não a intimação penalmente irrelevante os anteceden-
ao defensor. É o que entende a Suprema tes do réu. RHC improvido.» — STF
Corte: — HC 67.290-6-SP — Rel. Min.
Célio Borja — DJ 21-4-89 — pág.
«Ementa: 1. Penal. Habeas cor- 5856.
pus. Sentença condenatória. Intima-
ção da sentença condenatória ao ad- Por outro lado, como bem frisou
vogado e intimação da sentença con- o ilustre Ministro Anselmo Santiago,
denatória em dias diversos. em seu voto, os antecedentes segundo a
moderna doutrina englobam a vida pre-
Dia em que começou a fluir o gressa do acusado Fazer vistas grossas
prazo para apelar. É irrelevante a or- ao envolvimento do réu em numerosos
dem em que sejam feitas essas inti- inquéritos policiais e não reconhecer
mações, desde que se assegure o pra- maus antecedentes é cometer injustiça e
zo recursal a contar da última. Prece- colocar no mesmo patamar o acusado
dentes do Supremo Tribunal Federal. que nunca se viu às voltas com o apare-
Habeas corpos deferido.» — lho policial. Existe persistência delituo-
STF — HC 59.919-MG — Rel. sa, visto que em pelo menos dois proces-
Min. Alfredo Buzaid — DJ 6-8-82 sos o paciente foi condenado, devendo
— pág. 7348. ser mantida a decisão do Superior Tri-
4. Quanto ao pedido para o senten- bunal de Justiça.
ciado apelar em liberdade, a ordem deve Também improcede a alegação de
ser denegada. que o art. 594 do CPP estaria revogado
R.T.J. — 158 163

pela Constituição Federal de 1988, a 211/220), apresentando o impetrante, em


qual consagra o princípio da presunção seguida, as de fls. 223/244.
de inocência. E o que se entende da À fl. 246, em data de 21-10-1994,
simples leitura de decisão do Supremo determinei o desentranhamento de peças
sobre o assunto:
estranhas aos autos, para encaminhamento
«Ementa: Habeas corpus. Li- ao relator do processo respectivo.
berdade provisória. Art. 5°, item A 25-10-1994, enviei os autos à
LXVI, da Constituição Federal. Mesa, para julgamento, mas, antes que este
ocorresse, novas cópias foram, em adita-
O disposto no item LVII, do art. mento, enviadas pela Presidência do Supe-
5° da Carta Política de 1988, ao de- rior Tribunal de Justiça (fls. 251/257),
clarar que «ninguém será considera- renovando-se a conclusão em data de
do culpado até o trânsito em julgado 25-10-1994.
de sentença penal condenatória» não
significa que o réu condenado não A 21 de novembro de 1994, renovei
possa ser recolhido à prisão, antes o encaminhamento dos autos à Mesa.
daquela fase, salvo nos casos em que Essas explicações são dadas, em face
a legislação ordinária expressamente da alegada demora no julgamento, ficando
lhe assegure a liberdade provisória, o esclarecido, ainda, que os autos do proces-
que decorre do disposto em outros so, em que proferida a sentença condenató-
preceitos da Carta Magna, tais como ria, se encontram em apenso (P. 8277192
os itens LIV, LXI e LXVI, do mesmo — 3° Vara).
artigo 5°.» — STF — HC 68.037-2-
RI — Rel. Min. Aldir Passarinho É o relatório.
—DJ 21-5-93 — pág. 9766/9767.
VOTO
9. Pelo exposto, somos pelo conhe-
cimento e concessão da ordem, apenas O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela-
para declarar a tempestividade da Ape- tor): 1. Está correto o parecer do Ministério
lação.» Público Federal, no ponto em que sustenta
À fl. 196, como relator, proferi o a tempestividade da apelação.
seguinte despacho: É que, como se vê dos autos principais,
«1. Solicite-se, à E. Presidência do da sentença condenatória foi o advogado do
Superior Tribunal de Justiça, cópia do paciente intimado em data de 9-4-1991 (fl.
acórdão que rejeitou os Embargos De- 153).
claratórios no RHC n° 2.631-9-SP (fls. Mas a intimação do réu só ocorreu a 25
161/162 e 172), com informações sobre de abril de 1991, por carta precatória (fl.
eventual trânsito em julgado. 188v°).
2. Requisitem-se, para exame, ao E a apelação protocolou-se em cartório
MM. Juiz da 3' Vara da Justiça Federal, a 29 de abril de 1991 (fl. 155), dentro,
em São Paulo, os autos do processo da ainda, portanto, do prazo legal de cinco dias
Ação Penal n° 8277192 (fls. 28/34).» (art. 593 do Código de Processo Penal), já
A cópia do acórdão e a informação que este, conforme a jurisprudência da
sobre o trânsito em julgado só vieram para Corte, só tem curso, depois da última inti-
os autos a 5 de setembro de 1994 (fls. mação.
164 R.T.J. — 158

Sucede que não basta a tempestivida- tes ou atenuantes genéricas e causas de


de da apelação, para que, necessariamente, aumento ou de diminuição.
tenha de ser conhecida pelo Tribunal ad Levei em consideração na fixação da
quem. pena os péssimos antecedentes do réu
Com efeito, uma vez denegado o bene- (fls. 79/81), sobretudo na persistência
fício de apelar em liberdade, em face do delituosa do descaminho, a quantidade
disposto no art. 594 do Código de Processo expressiva das mercadorias apreendi-
Penal, a apelação só poderá ser admitida, das, com grave dano ao Erário Público,
processada e conhecida, se o réu, no prazo o fato de ter procurado inculpar o irmão
legal para sua interposição, estiver recolhi- em juízo.
do à prisão. A sanção será cumprida em regime
Isso, no caso, não aconteceu, pois o réu fechado, à vista das circunstâncias
somente foi preso em data de 18 de julho apontadas e por se afigurar mais adequa-
de 1991 (fl. 205/? dos autos principais), do, In casu, à reeducação do sentencia-
quando o prazo legal se iniciou e se encer- do, no sentido de demovê-lo da ativida-
rou em abril de 1991, como ficou dito. de criminosa.
Assim, no caso, o habeas corpus só Os antecedentes e a pena aplicada
poderá ser deferido, se o paciente tiver o impedem qualquer benefício.
direito de apelar em liberdade, pois, nesse Após o trânsito em julgado desta,
caso, a apelação terá sido tempestiva e, lance-se o nome do réu no rol dos cul-
então, haverá de ser processada. pados e oficie-se à Receita Federal em
4. Na sentença de 1° grau, o MM. Juiz, Ribeirão, para dar destinação legal às
após examinar as provas dos autos, fez as mercadorias.
seguintes considerações finais (fls. O réu, por seus antecedentes, não
149/150): merece os favores do art 594 do Código
«Tem-se, pois, que o réu, voluntária de Processo Penal.
e conscientemente, expunha à venda e Expeça-se mandado de prisão.
tinha em depósito, com finalidade co-
mercial, mercadorias estrangeiras, que Custas, ex vi legis.
sabia serem produto de introdução clan- P.R.I.O.
destina no país, à vista da situação irre-
gular delas. Perfez, portanto, objetiva e São Paulo, 28 de novembro de 1990
subjetivamente, o tipo de artigo 334, § — André Nabarrete Neto, Juiz Fe-
1°, letra c, do Código Penal. deral.»
5. Acrescento que o digno Magistrado
Isto posto e o que mais consta dos
indeferiu o processamento da apelação, não
autos, julgo procedente a ação penal mo-
por considerá-la intempestiva, mas porque
vida pela Justiça Pública e condeno a
o réu não se apresentou à prisão, no prazo
Sérgio Antonio Piovesan, qualificado
nos autos, como incurso nas penas do de sua interposição.
art. 334, § 1° , letra c, do Código Penal. É o que se vê de fl. 211 (sempre dos
autos principais), in verbis:
Fixo-lhe a pena-base privativa de li-
berdade em 3 (três) anos de reclusão, a «2. Indefiro o processamento da
qual torno definitiva, ausentes agravan- apelação de fl. 155. Não há prova de que
R.T.J. — 158 165

o réu, durante o prazo recursal, estivesse 7.4. Inquérito Policial n° 26/87, da De-
recolhido à prisão.» legacia de Polícia Federal de São José do
O MM. Juiz recusou ao réu o benefí- Rio Preto, iniciado a 26-1-1987, por fato
cio de apelar em liberdade, com base no ocorrido a 27-1-87, consistente em crime
próprio art. 594 do Código de Processo previsto no art. 334 do Código Penal (con-
Penal, que o prevê, quando aquele for pri- trabando ou descaminho) (fl. 79). Esse in-
mário e de bons antecedentes, assim reco- quérito deu causa ao Processo n°10.752/87
nhecido na sentença condenatória. (ou 8277192), da 3° Vara da Justiça Federal
de São Paulo, no qual foi condenado a três
Quanto aos antecedentes, referiu-se, anos de reclusão, sem direito de apelar em
como desabonadores, aos documentos de liberdade, exatamente na sentença im-
fls. 79/81 (v. fl. 150). pugnada pela apelação, que, coma presente
impetração, se pretende ver julgada (fls. 79
Tais documentos referem-se aos se- e 80 dos autos principais, e fls. 2/166,
guintes Inquéritos Policiais e Processos 224/244, destes autos de Habeas Corpos).
Criminais:
7.5. Inquérito Policial n° 182/87, da
7.1. Inquérito n° 36/77, da Delegacia Delegacia de Polícia Federal de São José
de Polícia de São Carlos-SP, iniciado a do Rio Preto, iniciado a 25-9-1987, por fato
1-2-1977, por fato ocorrido a 9-1-1977, e ocorrido a 9-6-1987, consistente em crime
relativo a crime previsto no art. 331 do previsto no art. 334 do Código Penal (con-
Código Penal (desacato) (fl. 79). Esse in- trabando ou descaminho) (fato posterior ao
quérito deu causa ao Processo n°340/77, da que agora se encontra sub judice) (fl. 80).
Vara Criminal e de Menores de São Carlos, Com relação ao desfecho desse inquérito e
no qual foi absolvido, em data de 2-10- de eventual Processo, não há notícia nos
1978, com trânsito em julgado (v. fl. 80). autos, exceto uma informação do próprio
7.2. Inquérito 63/80, da Delegacia paciente, ainda nos autos do Inquérito Po-
de Polícia de São Carlos, iniciado a licial 26/87 (fl. 55 v°), datada 30-6-1987,
21-3-1980, relativo a fato ocorrido a no sentido de que estava sendo processado
1°-12-1979, sendo vítima F. Monteiro (fl. perante a Justiça Federal (fl. 55 v°). É pro-
79). Esse inquérito deu causa ao Processo vável que, por isso, o MM. Juiz, na senten-
n° 543/80, da Vara Criminal e de Menores ça ora indiretamente impugnada, se referiu
de São Carlos, no qual foi condenado, por à «persistência delituosa do descaminho»,
sentença de 30-6-1983, por crime previs- quando aludiu aos antecedentes do réu (fl.
to no art. 180 do C. Penal (receptação) 150).
(fl. 81). 7.6. Inquérito Policial n° 22/88, da De-
legacia de Polícia Federal de São José do
7.3. Inquérito 65/86, da 2' Delegacia de
Rio Preto, iniciado a 26-2-1988, por fato
Polícia de São Carlos, iniciado a 26.2.1987,
ocorrido a 15-1-1988, consistente emaime
por fato ocorrido a 3-1-1986, consistente
de contrabando ou descaminho (art. 334 do
em crime previsto no art. 129 do Código Código Penal), posterior, igualmente, ao
Penal (lesão corporal dolosa), praticado
que redundou na condenação ora sub judi-
contra Eloi Bernardes do Amaral (fl. 79). ce, e a respeito do qual também não há
Esse inquérito deu causa ao Processo
referência sobre o desfecho (fl. 80).
514/86, da Vara Criminal e de Menores de
São Carlos, no qual foi absolvido em data 7.7. Inquérito Policial n° 19/81, de que
de 11.6.1987 (fl. 81). resultou o Processo n° 948/82, da 2' Vara
166 R.T.J. — 158

da Justiça Federal, com desfecho desco- Remanesce, pois, a sentença, na re-


nhecido (fl. 81). cusa do benefício de apelação em liberda-
de, em face dos próprios termos do art. 594
7.8. Inquérito Policial n° 63/80, resul-
do Código de Processo Penal.
tante do processo 63/80, no qual, por deci-
são do Tribunal de Alçada Criminal, em É de se concluir, portanto, que o
grau de Apelação, foi declarada extinta a habeas corpus não deve ser concedido,
punibilidade pela prescrição da pretensão pois a apelação, embora tempestiva, foi
punitiva (fl. 81). interposta sem que o réu, no prazo legal de
sua interposição, estivesse recolhido à pri-
Como se vê, o MM. Juiz teve como são.
maus antecedentes do réu seu envolvimen-
13. Por todas essas ra7Fles, indefiro o
to em inúmeros inquéritos policiais e pro-
pedido, determinando o retomo dos autos
cessos criminais, em alguns dos quais re-
principais ao Juízo de origem.
sultou absolvido, noutro teve declarada ex-
tinta a punibilidade e em outros mais foi VOTO
processado criminalmente, também por
crime de contrabando ou descaminho, mas O Sr. Ministro Celso de Mello: Peço
com desfecho ignorado. vênia para dissentir do eminente Relator,
pois entendo, na linha de diversas decisões
Mas levou em conta, também, o digno que já proferi nesta Suprema Corte (RT
Magistrado uma condenação por crime de 690/390 — RT 698/452-454, v.g.), que a
receptação, por sentença datada de 30 de mera sujeição de alguém a simples investi-
junho de 1983 (fl. 81), anterior, portanto, gações policiais ou a persecuções criminais
aos fatos aqui considerados, ocorridos a 26 instauradas em juízo não basta — ante a
de janeiro de 1987 (fl. 4 dos autos princi- inexistência de condenação penal transita-
pais). da em julgado —para justificar a afirmação
É de se admitir que tal condenação haja de que o réu não possui bons antecedentes.
transitado em julgado, pois o impetrante Na realidade, a simples existência de
não comprovou a existência de acórdão que situações processuais ainda não definidas
a tenha reformado. Nem mesmo fez alega- revela-se insuficiente para legitimar a recu-
ção nesse sentido. sa jurisdicional de determinados benefícios
legais que só podem ser negados àqueles
E também não se pode confundir o que já sofreram condenação penal irra-
Inquérito Policial n° 63/80 e o Processo n° corrível.
3.908/59, em que houve extinção da puni-
bilidade em grau de apelação (fl. 80), com O magistério doutrinário (Damásio E.
o Inquérito 63/80 e Processo 543/80, em de Jesus, «Código Penal Anotado», pág.
que houve a condenação por receptação, 151, 4" ed., 1994, Saraiva; Celso Delman-
em data de 30-6-1983, antes dos fatos ora to, «Código Penal Comentado», pág. 89,
sub judice, ocorridos em 26-1-1987 (fls. 4). 3' ed., 1991, Renovar, v.g.) — atento à
presunção constitucional de não-culpabili-
10. Ora, em tais circunstâncias, já não dade proclamada pelo art. 5°, LVII, da Car-
se pode afirmar, com segurança, que o pa- ta Política — adverte, com apoio na juris-
ciente tem bons antecedentes. Até porque prudência dos Tribunais (RT 418/286 —
não comprovou o impetrante que a conde- RT 422/307 — RT 572/391 — RT
nação por receptação já não subsista. Aliás, 586/338), que processos penais em curso,
sequer fez alegação a respeito. inquéritos policiais em andamento e, até
R.T.J. — 158 167

mesmo, condenações criminais ainda su- Sempre considerei que vários inquéritos
jeitas a recurso não podem ser considera- policiais já demonstram que a pessoa não
dos, enquanto episódios processuais susce- tem bons antecedentes, como esta Corte já
tíveis de pronunciamento judicial absolu- decidiu várias vezes.
tório, como elementos evidenciadores dos Ademais, neste caso, o eminente Relator
maus antecedentes do réu. salientou que há uma condenação. Assim,
É por essa razão que o Supremo Tribu- acompanho S. Exa.
nal Federal, por esta Colenda Primeira EXTRATO DA ATA
Turma, já decidiu, por unãnime votação,
que «Não podem repercutir contra o réu HC 70.847 — SP — Rel.: Min. Sydney
situações jurídico-processuais ainda não Sanches. Pacte.: Sérgio Antonio Piovesan.
definidas por decisão irrecorrível do Poder Impte.: Alberto Zacharias Toron. Coator:
Judiciário, especialmente naquelas hipóte- Superior Tribunal de Justiça.
ses de inexistência de título penal condena- Decisão: Por maioria de votos, a Turma
tório definitivamente constituído» (RTJ indeferiu o pedido de «habeas corpus» e
139/885, Rel. Min. Celso de Mello). determinou a devolução dos autos à ori-
Assim sendo, com estas considerações, gem. Vencidos os Srs. Ministros Sepúlveda
concedo ao ora paciente, de ofício, a ordem Pertence e Celso de Mello que o deferiam,
de habeas corpus, reconhecendo-lhe o di- de ofício. Falou pelo paciente o Dr. Alberto
reito à prestação da fiança criminal, para que, Zacharias Toron.
em sendo ela regularmente prestada, possa o Presidência do Senhor Ministro Morei-
réu condenado recorrer em liberdade. ra Alves. Presentes à Sessão os Senhores
É o meu voto. Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda
Pertence, Celso de Mello e Ilmar Gaivão.
VOTO Subprocurador-Geral da República, Dr.
Geraldo Brindeiro.
O Sr. Ministro Moreira Alves (Presiden- Brasília, 29 de novembro de 1994 —
te): Com a devida vênia, indefiro o pedido. Ricardo Dias Duarte, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 70.860 — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Paciente: Loudegar Scavuzzi — Impetrante: Neuza dos Santos — Coator:
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Penal. Processual Penal. Habeas corpus. Documentação não
autenticada Inocorrência de nulidade.
I — Nulidade que, se existente, deveria ter sido argüida no
momento processual adequado.
— HC indeferido.
168 R.T.J. — 158

ACÓRDÃO ficou suficientemente demonstrado


Vistos, relatados e discutidos estes au- nos autos o acerto da fixação da pena acima
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- do mínimo legal, em face dos antecedentes
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- e do grau de culpa do ora paciente;
formidade da ata do julgamento e das notas a prova emprestada a que se referiu
taquigráficas, por decisão unânime, indefe- na impetração foi obtida em Juízo, quando
rir o «habeas corpus». foi dado ao réu amplo direito de defesa,
Brasília, 14 de dezembro de 1993 — com observância do contraditório;
Néri da Silveira, Presidente — Carlos conforme acentuou o Procurador de
Velloso, Relator. Justiça, ficou demonstrado nos autos o in-
teresse do réu em tumultuar o andamento
RELATÓRIO do processo, mediante pedido de adiamen-
to do julgamento e de sucessivas e intermi-
O Sr. Ministro Carlos Venoso: Trata- náveis petições, insistindo, sempre, em fa-
se de habeas corpus impetrado em favor zer passar a idéia de que não poderia ser
de Loudegar Scavuzzi, em que se alega condenado, já que havia sido absolvido em
que o paciente foi condenado, pelo Juízo da casos semelhantes. Também o Desembar-
Ir Vara Criminal da Capital de São Paulo, gador relator da apelação do réu ressaltou
a quatro anos de reclusão, por infração ao o objetivo de tumultuar o processo por par-
art. 297 do Código Penal, sentença que foi te da defesa;
confirmada pela Terceira Câmara Criminal
do Tribunal de Justiça do Estado de São o processo que resultou na condena-
Paulo, mas que o processo é nulo porque a ção do réu teve tramitação normal e, na
documentação juntada aos autos não foi au- dosimetria da pena, o juiz atentou para o
tenticada, inclusive o documento apontado disposto no art. 42 do Código vigente à
como falso, que deu origem à ação penal, época dos fatos. Salientou o magistrado
razão por que requer a concessão da ordem. que anises, Loudegar e Thomaz, donos
de péssimos antecedentes, inúmeras vezes
Sustenta também que o paciente não condenados em outros autos, fizeram por
poderia ser condenado por haver sido ab- merecer pena exasperada. Mostraram pos-
solvido em outros casos semelhantes. suir personalidade indesmerávelmente
Requisitadas informações, foram elas voltada para o crime e agiram de maneira
prestadas pelo eminente Vice-Presidente do ousada ao fraudar execuções penais».
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São A Procuradoria-Geral da República, ofi-
Paulo, em que esclarece, em síntese, que: ciando às fls. 96/98, pelo parecer do ilustre
a) condenado, juntamente com diver- Subprocurador-Geral Claudio Lemos Fon-
sos outros réus, ao cumprimento da pena de teles, opina pelo indeferimento do pedido,
quatro anos de reclusão, como incurso no por entender que as alegadas nulidades não
art. 297 do Código Penal, o paciente recor- ocorreram e que, no tocante aos documen-
reu, argüindo, em preliminar, a nulidade da tos juntados aos autos sem autenticação,
sentença, por falta de fundamentação na nenhum prejuízo houve para o ora paciente,
aplicação da pena acima do mínimo legal, conforme ressaltado no acórdão impugna-
e, ainda, porque a condenação teria se do. Ademais, poderia ter sido argüida pelo
apoiado em prova representada por cópias paciente a falsidade da documentação, me-
não autenticadas. No mérito, alegou a falta diante incidente próprio, conforme previsto
de provas para a condenação; nos arts. 145 a 148 do CPP.
R.T.I. — 158 169

Registra, por último, o parecer que «a paciente e, a teor do art. 563 do CPP, «ne-
intenção do paciente de iludir o magistrado nhum ato será declarado nulo, se da nulida-
com a juntada de acórdão falso nos autos de de não resultou prejuízo para a acusação ou
Processo de Execução restou devidamente para a defesa».
comprovada», sendo irrelevante se esse do- A esse propósito, Ada Pellegrini Grino-
cumento está ou não autenticado nos autos. ver, Antônio Scarance Fernandes e Antô-
É o relatório. nio Magalhães Gomes Filho, no livro «As
VOTO Nulidades no Processo Penal», fl. 24, res-
saltam, ao analisar a teoria do prejuízo, «a
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela- viga-mestra do sistema de nulidades»:
tor): O ora paciente foi condenado a quatro
anos de reclusão pelo Juízo da 12' Vara «A decretação da nulidade implica
Criminal da Capital de São Paulo, como perda da atividade processual já realizada,
incurso nas penas do art. 297 do Código transtornos ao juiz e demora na prestação
Penal. Alega, no entanto, que o processo é jurisdicional almejada, não sendo razoá-
nulo, por ter sido juntada aos autos docu- vel, dessa forma, que a simples possibili-
mentação não autenticada, inclusive o do- dade de prejuízo dê lugar à aplicação da
cumento apontado como falso e que origi- sanção; o dano deve ser concreto e efeti-
nou a ação penal, afirmando, ainda, que não vamente demonstrado em cada situação,»
poderia ser condenado, porque havia sido Também irrelevante a circunstância de
absolvido em casos semelhantes. haver sido o ora paciente absolvido em outros
A sentença foi confirmada pela Terceira casos semelhantes, visto que, como se pode
Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do verificar da sentença de fls. 68/78 e do acór-
Estado de São Paulo. dão de fls. 86/92, está definida sua participa-
ção no crime de que tratam estes autos.
O writ é de ser indeferido, como bem
opina o Ministério Público. Do exposto, indefiro o writ.
É que, conforme acentuou o acórdão EXTRATO DA ATA
impugnado, «a juntada de xerocópias não HC 70.860 — SP — Rel.: Min. Car-
autenticadas de declarações e documentos los Velloso. Pacte.: Loudegar Scavuzzi.
relativos a outros processos, não caracteri- Impte.: Neuza dos Santos. Coator: Tribu-
zou, de forma alguma, cerceamento de de- nal de Justiça do Estado de São Paulo.
fesa, mesmo porque, também aqui, nada
argüiu qualquer deles nem comprovou a Decisão: Por unanimidade, a Turma in-
ilegitimidade de referidos documentos». deferiu o «habeas corpus».
Atento ao disposto no art. 145 do CPP, Presidência do Senhor Ministro Néri da
deveria o paciente, no momento processual Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
adequado, ter argüido a falsidade dos docu- Ministros Paulo Brossard, Carlos Venoso
mentos questionados, demonstrando a e Marco Aurélio. Ausente, justificadamen-
existência de prejuízo para a defesa. O pa- te, o Senhor Ministro Francisco Rezek.
ciente, todavia, assim não procedeu. Subprocurador-Geral da República, o Dr.
Francisco José Teixeira de Oliveira.
É evidente, pelo exame dos autos, que a
não autenticação dos documentos juntados, Brasília, 14 de dezembro de 1993 —
por cópia, não implicou prejuízo para o José Wilson Aragão, Secretário.
170 R.T.J. — 158

HABEAS CORPUS N° 70.870 — RJ


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches


Paciente: Carlos Roberto Ramos — Impetrante: Liamar Leal Gonçalves —
Coator: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro
Direito Penal e Processual Penal.
Coisa julgada. Duplicidade de condenações pelo mesmo fato
delituoso. Nulidade. Habeas corpos.
Se havia coisa julgada condenatória para ambos os réus,
em processo concluído anteriormente, nenhum deles poderia ser conde-
nado novamente pelos mesmos crimes.
Acolhendo a exceção de coisa julgada, apresentada por
um deles, de modo a desconstituir a nova condenação, que a violou,
deveria o Tribunal, prolator do acórdão, ter estendido esse efeito ao ora
paciente.
Não o tendo feito, incidiu em constrangimento ilegal, que
se sana com a concessão de habeas corpos, para anulação da nova
condenação e trancamento definitivo do processo em que proferida.
HC deferido.

ACÓRDÃO mo, relativo ao writ em epígrafe, aí


impetrado em favor de Carlos Roberto
Vistos, relatados e discutidos estes au- Ramos, tenho a honra de informar a
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- Vossa Excelência o quanto se segue:
bunal Federal, por sua Primeira Turma, na
conformidade da ata do julgamento e das 1. O ora paciente e Cauby Guedes
notas taquigráficas, por unanimidade de Pinheiro foram processados perante os
votos, em deferir o pedido de «habeas cor- Juízos das 4' e 5' Varas Criminais de
pus», nos termos do voto do Relator. Niterói pela prática do delito previsto no
Brasília, 23 de agosto de 1994 — Mo- art. 171, caput do Cód. Penal (Proc. n°
reira Alves, Presidente — Sydney San- 11.474), e, ainda, o mesmo ilícito em
ches, Relator. concurso formal (Proc. n° 4.421), por-
que, na qualidade de sócio (o 2°) e ge-
RELATÓRIO rente de vendas (o 1°) da «Juventur
Intercâmbio e Viagens Ltda.», vende-
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela- ram, em 15-6-87, a Alcino Pereira da
tor): 1. O ilustre Juiz Alfredo José Mari- Silva Neto, o direito de uso de uma linha
nho Filho, Presidente do E. Tribunal de telefônica, e entre maio e agosto do mes-
Alçada Criminal do Estado do Rio de Ja- mo ano, efetuaram dita transação com
neiro, ao prestar as informações de fls. Maria Leonor Negreiro Vilar Novo,
43/45, esclareceu: Marcos Antonio Gonçalves Pereira,
«Em atenção aos termos do Ofício n° Edwiges Ramos, Jovelina Luciana
1425/R, datado de 9 de novembro 616- Zalden, Leda Purcino de Vasconcelos,
R.T.J. — 158 171

Maria das Graças Gomes Ramos, Nil- argüida, absolvê-lo, eis que o delito em
cea de Azevedo, Mario Kazunori Ta- que foi lesado Alcino Pereira da Silva,
bata, bacio Tavares Araripe, Ernes- processado separadamente, ocorreu em
to Felipe de Mello, Gilson Batista 15-6-87, ou seja, no mesmo período em
Friandi e Maria José de Mello Corte, que ocorreram os praticados contra os
recebendo desta última um aparelho tele- demais (entre maio e agosto de 1987), o
fônico e dos demais diversas importâncias que o colocaria dentre os abrangidos pelo
em dinheiro, sem, entretanto providenciar concurso ideal já apenado no outro feito.
a respectiva instalação e transferência. Apreciando requerimentos for-
2. No feito distribuído à 4' Vara Cri- mulados pelo ilustre impetrante, de ex-
minal foram condenados a 2 (dois) anos tensão, ao paciente, do referido julgado,
de reclusão e multa de 24 (vinte e qua- proferido em embargos de declaração, e
tro) dias-multa, negado o sursis (senten- pedido de reconsideração, assim despa-
ça de 15-7-91) e naquele em curso na 5° chou o lustrado Juiz Jorge Uchoa, Pre-
Vara Criminal receberam, fixado o regi- sidente do Órgão Julgador referido e
me fechado para ambos: Relator, em virtude de redistribuição:
o paciente: 2 (dois) anos, 1 (um) (Não há o que deferir, posto que
mês e 15 (quinze) dias de reclusão e 18 a decisão transitou em julgado, defe-
(dezoito) dias-multa de menor valor ridos ao réu outros caminhos para
unitário; alcançar seu objetivo, como por
Cauby: 2 (dois) anos e 6 (seis) exemplo o habeas corpusx. (fl. 229);
meses de reclusão e 22 (vinte e dois) e «Não existe na sistemática proces-
dias-multa de menor valor unitário (sen- sual a pretendida revisão de decisão
tença de 2-11-88). e o recurso possível seria o de embar-
gos de declaração, não interposto. A
3. Apelou Cauby Guedes Pinheiro e, extensão requerida também não pode
julgando a Apelação n° 38.542 (Proc. da ser dada pelo Relator, que não tem
5' Vara Criminal), a Egrégia Terceira poder para alterar as decisões do Ór-
Câmara desta Corte, à unanimidade, gão julgador» (fl. 232).
sendo Relator o douto hoje Desembar-
gador Weber Martins Batista, confir- Seguem em anexo cópias das
mou a sentença com a qual conforma-se mais significativas peças do processado,
o paciente (acórdão de 28-11-89); e, a permanecendo o signatário atento a pos-
Colenda Primeira Câmara, também por síveis ulteriores determinações.»
votação uniforme, em cresto relatado 2. O douto Subprocurador-Geral da Re-
pelo ilustrado Juiz Franklin Belfort de pública, em exercício, Edson Oliveira de
Oliveira Neto, de igual modo, negou Almeida, no parecer de fls. 93/95, opinou
provimento ao recurso do ora paciente, pelo deferimento do pedido.
não havendo Cauby recorrido dessa É o relatório.
condenação — processo da 4' Vara Cri-
minal (acórdão de 16-9-92). VOTO
4. A mesma E. Primeira Câmara, O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela-
julgando embargos opostos pelo co-réu tor): 1. É este o inteiro teor do parecer do
Cauby, acolheu-os unanimemente, para Ministério Público Federal (flb. 93/95):
julgando procedente a exceção de coisa <<1. Carlos Roberto Ramos, ora pa-
julgada autuada em apenso e por ele ciente, e Cauby Guedes Pinheiro fo-
172 R.T.J. — 158

ram condenados nas 4' e 5' Varas Cri- não fazer parte do acórdão a exceção
minais de Niterói como incursos no art. de coisa julgada.» (Fl. 61).
171 do Código Penal (Processos n°s Diante disso, a defesa do ora
11.474 e 4.421, respectivamente). paciente protocolou pedido de exten-
A sentença da 5° Vara Criminal, são, a fim de ser reconhecida a coisa
da qual recorreu apenas Cauby Guedes julgada também em favor de Carlos
Pinheiro, foi confirmada em 28-11-89 Roberto Ramos (fls. 62/3).
pela eg. Terceira Câmara Criminal do
Tribunal de Alçada do Estado do Rio de Esse requerimento foi indefe-
Janeiro (fl. 83). rido pelo Juiz Relator, que também
negou pedido de reconsideração, in
Por outro lado, a eg. Primeira Câ- verbis:
mara, em 16-9-92, negou provimento ao
apelo de Carlos Roberto Ramos contra «Não há o que deferir, posto que
a sentença da 4° Vara Criminal (fl. 56). a decisão transitou em julgado, defe-
4. Entretanto, a mesma Primeira Câ- ridos ao réu outros caminhos para
mara do Tribunal de Alçada Criminal do alcançar seu objetivo, como por
RJ acolheu os embargos de declaração exemplo o habeas corpos.» (Fl. 66)
opostos pelo co-réu Cauby Guedes Pi- «Não existe na sistemática pro-
nheiro, reconhecendo a coisa julgada em cessual a pretendida revisão de deci-
favor deste, ao argumento de que, pelos são e o recurso possível seria o de
mesmos fatos, o embargante já fora con- embargos de declaração, não inter-
denado anteriormente na 5' Vara Criminal posto. A extensão requerida também
de Niterói (Processo n° 4.421): não pode ser dada pelo Relator, que
«Damos acolhimentos aos embar- não tem poder para alterar as deci-
gos, eis que de fato, como se verifica sões do órgão Julgador.» (Fl. 69)
pela exceção de coisa julgada em A coação, como se vê, é do pró-
apenso, o aludido Processo 4.421 prio colegiado e não apenas decorrente
versa sobre a venda pela Joventur dos despachos do relator. Com efeito,
Intercâmbio e Viagens Ltda., a diver- idênticas as situações dos cá-réus, a co-
sos lesados no período de maio a lenda Câmara julgadora, ao acolher a
agosto de 1987, em que o embargante exceção de coisa julgada formulada por
foi condenado por infringência do um deles, deveria ter estendido essa de-
art. 171 c/c o art. 71, do C. Penal, cisão ao outro. Não o fazendo negou
enquanto que a venda realizada pela vigência ao art. 580 do Código de Pro-
mesma empresa ao queixoso Alcino cesso Penal.
Pereira da Silva Neto foi feita dentro Pelo exposto, opino pelo deferi-
do mesmo período, ou seja, em 15-6- mento da ordem para estender ao pa-
87, conforme documento de fls. 7/10. ciente a decisão tomada nos Embargos
Somos, por isto, pelo acolhimento de Declaração na Apelação Criminal n°
dos presentes embargos para, corri- 45.266/92.»
gindo a omissão verificada no pro- 2. Acolho o parecer do Ministério Pú-
cesso, alterar a conclusão do acór- blico Federal, em face dos documentos tra-
dão, para o fim de absolver o embar- zidos para os autos, seja com a impetração,
gante, por manifesto erro material em seja com as informações do ilustre Presi-
R.T.J. — 158 173

dente do E. Tribunal de Alçada Criminal do EXTRATO DA ATA


Estado do Rio de Janeiro.
3. Com efeito, se havia coisa julgada HC 70.870 —RJ —Rel.: Min.: Sydney
condenatória para ambos os réus, em pro- Sanches. Pacte.: Carlos Roberto Ramos.
cesso concluído anteriormente, nenhum Impte.: Liamar Leal Gonçalves. Coator:
deles poderia ser condenado novamente Tribunal de Alçada Criminal do Estado do
pelos mesmos crimes, praticados contra as Rio de Janeiro
mesmas vítimas.
Decisão: A Turma deferiu o pedido de
Acolhendo a exceção de coisa julgada, «habeas corpus», nos termos do voto do
apresentada por um deles, de modo a des- Relator. Unânime.
constituir a nova condenação, que a violou,
Presidência do Senhor Ministro Moreira
deveria o Tribunal ter estendido esse efeito
Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
ao ora paciente. nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
Não o tendo feito, incidiu em constran- ce, Celso de Mello e limar Gaivão. Subpro-
gimento ilegal, que se sana com a conces- curador-Geral da República o Dr. Geraldo
são do presente habeas corpus, nos termos Brindeiro.
do parecer do Ministério Público Federal. Brasília, 23 de agosto de 1994 —Ricar-
Nesse sentido é meu voto. do Dias Duarte, Secreto.

HABEAS CORPUS N° 70.899 — SP


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence


Paciente e Impetrante: loiro de Souza — Coator: Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo
Sentença condenatória: fixação da pena pelo método trifási-
co: consideração como agravantes, não só da reincidência, que o é, mas
também dos antecedentes do réu, que são critério para a determinação
da pena-base: nulidade, no ponto, da decisão.
ACÓRDÃO Brasília, 22 de março de 1994 — Mo-
reira Alves, Presidente —Sepúlveda Per-
tence, Relator.
Vistos, relatados e discutidos estes au-
tos, acordam os Ministros da Primeira Tur- RELATÓRIO
ma do Supremo Tribunal Federal, na con-
formidade da ata do julgamento e das notas O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
taquigráficas, por unanimidade de votos, O il. Subprocurador-Geral da República
em deferir, em parte, o pedido de «habeas Mordem Costa Pinto, no parecer, resumiu
corpus». com precisão o caso e opinou pelo indefe-
174 R.T.J. — 158

rimento da ordem, nos seguintes termos zão dos péssimos antecedentes do pa-
(fls. 62/3): ciente e, em seguida, estabelecer novo
«Jairo de Souza, juntamente com ou- aumento em virtude da reincidência es-
tras pessoas, após prisão em flagrante e pecífica, que é uma das agravantes pre-
o devido processo, foi condenado a cin- vistas no art. 61, inciso I, em obediência
co anos de reclusão e multa, pela MM" às regras do art. 68, ambos do código já
Juíza da Comarca de Suzano-SP, por citado.
infração ao art. 12, caput, da Lei n° Aquilo que seria erro do mencionado
6.368/76. Tribunal, em não computar a dupla cir-
O egrégio Tribunal de Justiça de São cunstância, e que ensejaria um duplo
Paulo houve por bem acolher em parte aumento, converteu-se em vantagem
sua apelação, reduzindo a apenação para para o paciente, que teve a pena-base
quatro anos de reclusão. fixada no mínimo legal, apesar dos
maus antecedentes, seguindo-se apenas
Insatisfeito, o paciente impetrou em o regular aumento em face da reincidên-
seu próprio favor o presente habeas cia, não podendo assim falar em cons-
corpus, alegando vício na fixação da trangimento ilegal a ser sanado pela via
pena, porque, segundo ele, a pena-base do habeas corpos».
foi fixada em três anos, aumentada de
um terço, «considerando-se os antece- É o relatório.
dentes e a reincidência num s6 momen- VOTO
to» (sic, fl. 9).
Diz que «a lei é clara e específica O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
nesse sentido de que não pode haver (Relator): Não obstante a inteligência com
uma mesclagem posto que os antece- que deduzida, a argumentação do parecer
dentes compõem o art. 59 e a reincidên- do Ministério Público não pode ser aco-
cia faz parte do art. 61, portanto, total- lhida.
mente distintos. Por tal motivo não pode É certo que a pena-base foi fixada no
o julgador distinguir onde a própria lei mínimo legal do art. 12 da Lei de Entorpe-
não distingue» (fl. 3). centes, quando poderia ter sido exacerbada
Aguarda a concessão do mandamos à consideração dos maus antecedentes do
com a declaração de nulidade da senten- paciente.
ça, para que outra seja proferida de acor- Sucede que, no ponto, à falta de re-
do com as determinações legais. curso da acusação, a fixação da pena-base
Entendemos que o presente habeas ficou coberta pela preclusão.
corpus deve ser conhecido, mas dene- O que se devolveu, portanto, ao juízo
gada a ordem. da apelação, no ponto, foi o que se somara
É certo que o Tribunal englobou os à pena-base, no momento da incidência de
aspectos da reincidência específica e circunstâncias agravantes.
maus antecedentes para aumentar a Certo, o Tribunal reduziu o acrésci-
pena-base, mas o equívoco redundou mo, que a sentença fixara em dois, para um
em vantagem para o paciente (fl. 57). ano de reclusão.
Com efeito, se tivesse observado o 6. Ao fazê-lo, porém, o acórdão, na
disposto no art. 59 do Código Penal, mesma linha da sentença, imputou a exa-
teria que aumentar a pena-base, em ra- cerbação, a um só tempo, à reincidência (fl.
R.T.J. — 158 175

174) e aos «péssimos antecedentes apre- da à correspondente redução do acréscimo


sentados pelo réu» (fls. 175/176). imposto: é o meu voto.
Ora, esses últimos — os anteceden- EXTRATO DA ATA
tes — diversamente da reincidência, não
são circunstâncias agravantes, mas dado a HC 70.899 — SP -- Rel.: Min. Sepúl-
ponderar na pena-base, que, entretanto, no veda Pertence. Pacte. e Impte.: Jairo de
caso, a preclusão tornou irrelevante. Souza. Coator: Tribunal de Justiça do Es-
tado de São Paulo.
Desse modo, se no segundo momen- Decisão: A Turma deferiu, em parte, o
to da aplicação da pena, das duas agravan- pedido de «habeas corpus», nos termos do
tes referidas uma não o é, há de concluir-se voto do Relator. Unânime.
que, de sua exclusão, teria decorrido menor
acréscimo à pena-base, que, então, se teria Presidência do Senhor Ministro Moreira
de lastrear em uma só circunstância legal Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
da exacerbação, a reincidência. nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
ce, Celso de Mello e Ilmar Gaivão. Subpro-
9. Defiro, em parte, o habeas corpus curador-Geral da República, Dr. Arthur de
para cassar, no ponto, o acórdão, a fim de Castilho Neto.
que, mantida a pena-base e considerando- Brasília, 22 de março de 1994 — Ricar-
se exclusivamente a reincidência, se proce- do Dias Duarte, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 70.965 — RJ


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Paciente: José Ivan da Silva — Impetrante: Jorge de Araújo Labre — Coator:
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro
Penal. Processual penal. Habeas corpus. Sentença de pro-
núncia.
A sentença de pronúncia é decisão sobre a admissibilidade
da acusação. Por isso, constitui juízo fundado de suspeita e não juízo de
certeza que se exige para a condenação.
STF, HC n° S5333 - SP,DJ de 15-9-78.
HC indeferido.
ACÓRDÃO taquigráficas, por decisão unânime, indefe-
rir o «habeas corpus».
Vistos, relatados e discutidos estes au-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- Brasilia, 8 de fevereiro de 1994 —Néri
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- da Silveira, Presidente — Carlos Velloso,
formidade da ata do julgamento e das notas Relator.
176 R.T.J. — 158

RELATÓRIO ral opina pelo indeferimento da ordem, ar-


O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata- gumentando que, na fase da pronúncia, vi-
se de habeas corpus impetrado em favor gora o princípio do in dubio pio societate.
de José Ivan da Silva, em que se pretende Quanto à questão da imparcialidade dos
desconstituir o acórdão proferido pela jurados, observa o parecer que se trata de
Egrégia Quarta Câmara Criminal do Tribu- matéria controvertida que não pode ser exa-
nal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, minada na via do habeas corpus.
que, negando provimento ao recurso em É o relatório.
sentido estrito interposto pelo ora paciente,
manteve a sentença de pronúncia lavrada VOTO
pela Quarta Vara Criminal da Comarca de
Duque de Caxias, submetendo-o a julga- O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela-
mento pelo júri popular. tor): Pronunciado, juntamente com dois ou-
Sustenta o impetrante, em síntese, que a tros co-réus, nas penas dos arts. 121 (duas
fragilidade da prova constante dos autos vezes) e 155, c/c art. 29, todos do Código
não poderia ensejar a sentença de pronún- Penal, para ser submetido a julgamento
cia e manifesta o receio de não ser julgado pelo Tribunal do Júri, o ora paciente inter-
com imparcialidade pelo corpo de jurados pôs recurso em sentido estrito, perante o
de Duque de Caxias. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro, cuja Quarta Câmara Criminal, à
De maneira confusa, e depois de longas unanimidade, negou provimento ao recur-
considerações, requer o impetrante a anu- so, ressaltando no acórdão que se tratava
lação da sentença de pronúncia e a redistri- «... de crime verdadeiramente hediondo,
buição do processo para uma das Varas onde as duas vítimas, depois de seqüestra-
Criminais privativas do júri da Comarca da das, foram covardemente fuziladas por ele-
Capital do Estado do Rio de Janeiro. mentos da mais alta periculosidade, que
O eminente Desembargador Presidente agiam em quadrilha....».
do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado Irresignado, interpõe o paciente habeas
do Rio de Janeiro prestou informações (fls. corpus junto a esta Corte, alegando que a
27/28), afirmando que o pedido deduzido prova produzida na fase instrutória é por
na inicial não pode ser apreciado sem um demais frágil para ensejar a sentença de
exame aprofundado da prova, o que não pronúncia e que receia que o corpo de jura-
cabe nos estreitos limites do habeas cor- dos de Duque de Caxias-RJ não o julgue
pus. Ressalta que a pronúncia, como «... com imparcialidade.
mero juízo de admissibilidade da acusação,
não comporta a certeza propalada pelo im- O writ é de ser indeferido, como bem
petrante, eis que somente apreciável pelo opina o Ministério Público.
tribunal do júri». No tocante à preocupação É que, conforme acentuado no acórdão
manifestada pelo impetrante relativamente proferido no recurso em sentido estrito, não
à imparcialidade dos jurados, observa que se discutia ali «... a certeza exigida para a
a lei processual assegura ao paciente os condenação, mas sim a fundada suspeita
mecanismos capazes de garantir-lhe um para levá-lo ao Júri», e que, no caso, essa
julgamento isento. suspeita chegava «quase que à certeza so-
Oficiando às fls. 35/37, pelo parecer do bre a autoria».
ilustre Subprocurador-Geral Edson Olivei- O parecer do Ministério Público trans-
ra de Almeida, o Ministério Público Fede- creve a esse propósito a ementa do HC
R.T.J. — 158 177

55.333-SP, relator o saudoso Ministro Lei- No tocante à suspeita de parcialidade


tão de Abreu, verbis: dos jurados da comarca do delito, observa,
com acerto, o parecer que se trata de ques-
«A sentença de pronúncia, como de- tão controvertida, que não pode ser discu-
cisão sobre a admissibilidade da acusa- tida na via estreita do habeas corpus. Ade-
ção, constitui juízo fundado de suspeita, mais, a legislação processual põe à dispo-
não o juízo de certeza que se exige para sição do paciente meios de garantir um
a condenação.» julgamento imparcial.
Do exposto, indefiro o writ.
José Frederico Marques, também citado
pelo ilustre Subprocurador-Geral Edson EXTRATO DA ATA
Oliveira de Almeida, leciona que «impõe-
se a pronúncia quando certa a existência do HC 70.965 — RJ — Rel.: Min. Carlos
crime e provável a sua autoria» («A Insti- Velloso. Pacte.: José Ivan da Silva. Impte.:
tuição do Júri». São Paulo, Saraiva, 1963, Jorge de Araújo Labre. Coator: Tribunal de
v 1 pág 224). Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Decisão: Por unanimidade, a Turma in-
Aliás, a jurisprudência desta Corte se deferiu o «habeas corpus».
firmou no sentido de que não é necessária
a prova incontroversa do crime para que o Presidência do Senhor Ministro Néri da
réu seja pronunciado, bastando, para tanto, Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
que o juiz esteja convencido da sua exis- Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso,
tência (RTJ 63/476). Se houve dúvida, Marco Aurélio e Francisco Rezek. Subpro-
pronuncia-se (RT 523/377, 503/328, curador-Geral da República, o Dr. Cláudio
522/361, 518/393 e 500/302) (Damásio de Lemos Fonteles.
Jesus, in «Código de Processo Penal Ano- Brasília, 8 de fevereiro de 1994 — José
tado», pág. 248). Wilson Aragão, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 70.980 — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Paciente e Impetrante: Paulo dos Santos — Coator: Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo
Penal. Processual penal. Tráfico de entorpecentes. Crime pra-
ticado no interior de estabelecimento penal. Qualificadora do art. 18, IV,
da Lei n° 6.368/76. Revisão criminal: participação de juiz que tomou parte
no julgamento da apelação: inocorrência de nulidade. Prova: exame.
I. Impossibilidade de exclusão da qualificadora do art. 18,
IV, da Lei n° 6.368/76, dado que o argumento da impetração tem arrimo
em erro de publicação da lei, o que foi corrigido com a sua republicação,
no DO de 29-11-76.
178 R.T.I. — 158

II. Participação, no julgamento da revisão, como vogal, de


juiz que foi o relator do acórdão da apelação: inocorrência de nulidade
(CPP, art. 625).
HL Exame aprofundado da prova: impossibilidade no pro-
cesso do habeas corpus.
IV. HC indeferido.

ACÓRDÃO tou informações às fls. 15/19, esclarecen-


do, em síntese:
Vistos, relatados e discutidos estes au-
que o paciente «foi denunciado por
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- infração ao art. 12, caput, c/c art. 18, inc.
IV, da Lei n° 6.368, de 1976. Vencida a
formidade da ata do julgamento e das notas
instrução criminal com amplitude de defe-
taquigráficas, por decisão unânime, indefe-
sa e obediência ao contraditório, houve en-
rir o «habeas corpus».
trega da prestação jurisdicional, sendo con-
Brasflia, 8 de fevereiro de 1994 — Néri denado ao cumprimento da pena de 4 anos
da Silveira, Presidente — Carlos Velloso, e 1 mês de reclusão, em regime fechado, e
Relator. 50 dias-multa no piso mínimo, como esta-
belecido pelo art 38 da Lei de Tóxicos»;
RELATÓRIO
que consta da sentença que «a prova
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Paulo acusatória foi coesa, robusta, demonstran-
dos Santos, condenado a quatro anos e um do como foi apreendido o vasto material
mês de reclusão e multa pelo Juízo da 14" entorpecente, parte em poder de Eduardo
Vara Criminal de São Paulo, como incurso que o havia adquirido do co-réu e o restante
no art. 12, caput, c/c art. 18, IV, da Lei n° com Paulo, em suas dependências, deven-
6.368/76, crime cometido no interior da do a ação prosperar» e que «a agravante de
Penitenciária do Estado de São Paulo, onde local, Casa de Detenção de São Paulo, está
cumpria penas em processos criminais di- patente nos autos, devendo prosperar. Para
versos, impetra habeas corpus, em seu fins de artigo 59 do Código Penal, Eduardo
próprio benefício, pleiteando a concessão é primário e Paulo não o é, pelo que acres-
da ordem para declarar a nulidade da r. cento à pena final deste, um mês»;
sentença, que teria sido proferida com
afronta ao art. 93, IX, da Constituição, de- que o paciente recorreu da sentença
terminando-se que outra fosse proferida. condenatória, tendo a Quarta Câmara Cri-
minal negado provimento ao apelo. Não
Sustenta o impetrante que não cabe, no houve recurso, transitando em julgado o
caso, a aplicação da majorante do item IV acórdão;
do art. 18 da Lei n° 6.368/76 e que teria
havido erro na fixação da pena base e no que o paciente ingressou com pedido
critério utilizado para fixar o montante da revisional, indeferido por unanimidade
pena. Manifesta sua irresignação por ter o pelo Terceiro Grupo de Câmaras Crimi-
relator da apelação participado, como vo- nais;
gal, do julgamento da revisão criminal. e) que, em alguns pontos da impetra-
O eminente Vice-Presidente do Tribu- ção o paciente invoca o reexame de provas,
nal de Justiça do Estado de São Paulo pres- finalidade a que não se presta o remédio
R.T.J. — 158 179

heróico do babas corpus, como tem en- Juízo, negando qualquer participação nos
tendido a Suprema Corte. fatos, e atribuiu a acusação à perseguição
Oficiando às fls. 62/69, a Procuradoria- dos funcionários da Penitenciária. Afirmou
Geral da República, pelo parecer do ilustre que os depoimentos das testemunhas de
Subprocurador-Geral Edson Oliveira de acusação apresentam divergências, sendo
Almeida, opina pelo indeferimento da or- certo que uma delas é mal vista entre a
dem. Argumenta que, ao contrário do que população carcerária.
afirma o paciente, «de acordo com a reda- Ingressou, ainda, com pedido de revisão
ção correta da lei, a majorante incide nos criminal, em que pleiteava a absolvição em
crimes praticados nas imediações ou no razão da deficiência de provas quanto à
interior de estabelecimentos penais, sem existência do crime. Também por votação
distinção de áreas». Conforme consta do unânime, o Terceiro Grupo de Câmaras
acórdão da apelação, «o paciente foi apena- Criminais indeferiu o pedido.
do com brandura, tendo sido inclusive be-
neficiado por um pequeno erro de técnica», No presente habeas corpus, pede o pa-
certo que a pena final deveria ser de quatro ciente a concessão da ordem para obter a
anos, um mês e dez dias e não de quatro declaração da nulidade da sentença, porque
anos e um mês. Inexiste, por outro lado, não cabe, no caso, a aplicação da majorante
nulidade, por ter o relator da apelação par- do item IV do art. 18 da Lei n° 6.368/76;
ticipado do julgamento da revisão criminal, que a testemunha Manoel Alves dos Santos
como vogal. Observa, finalmente, o pare- deveria ter sido inquirida com cautela e
cer, que o paciente, levantando a suspeição advertida sobre as conseqüências do falso
do testemunho de Manoel Alves dos Santos testemunho; que teria havido erro na fixa-
pretende o reexame de prova, inviável em ção da pena-base e no critério utilizado para
sede de habeas corpus. fixar o montante da pena e que o relator da
apelação não poderia ter participado do
É o relatório. julgamento da revisão criminal.
VOTO Oficiando nos autos, assim se manifes-
tou a Procuradoria-Geral da República no
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela- parecer lavrado pelo ilustre Subprocura-
tor): O paciente foi condenado a quatro
dor-Geral Edson Oliveira de Almeida:
anos e um mês de reclusão e multa pelo
Juízo da 14' Vara Criminal da Capital de
São Paulo, por infração ao art. 12, caput,
c/c art. 18, IV, da Lei n° 6.368/76. O delito O pedido não procede.
foi cometido no interior da Penitenciária do A impetração, pretende excluir a
Estado de São Paulo, onde o paciente cum- figura qualificada do artigo 18, IV, da
pre pena em virtude de condenação em Lei n°6.368/76, apega-se a um erro na
processos criminais diversos. Preso quan- publicação da referida lei, consistente
do acabava de vender certa quantidade de na supressão de uma vírgula, o qual
substância entorpecente a um agente de conduziria à conclusão de que a majo-
segurança penitenciária, no interior de sua rante só teria incidência nos crimes
cela, foi autuado em flagrante, juntamente «praticados em locais de trabalho cole-
com o funcionário. tivo de estabelecimentos penais», ex-
Inconformado, recorreu da sentença cluindo conseqüentemente os crimes
condenatória, alegando que se retratara em ocorridos no interior das celas.
180 R.T.J. — 158

Todavia, esse erro foi corrigido com '0 peticionário estava recolhido,
republicação da lei e a inclusão da vír- no dia, hora e local indicados na de-
gula faltante (Diário Oficial de 29-11-76). núncia, à Casa de Detenção, cum-
Assim, de acordo com a redação correta prindo penas que lhe haviam sido
da lei, a majorante incide nos crimes aplicadas, em processos criminais di-
praticados nas imediações ou no interior versos, quando adentraram seu xa-
de estabelecimentos penais, sem distin- drez, dentro do qual se encontrava
ção de áreas. Eduardo Aparecido Machado da Sil-
va, agente de segurança penitenciá-
Como observa o acórdão da ape- ria, alguns funcionários da seguran-
lação o paciente foi apenado com bran- ça, que terão encontrado com o cole-
dura, sendo inclusive beneficiado por ga um papelote contendo cocaína e
pequeno lapso de técnica. A pena-base com o ora peticionário outros oito (8)
foi fixada no mínimo do art. 12, três (3) papelotes iguais, com a mesma dro-
anos e agravada de um (1) mês pela ga, além de uma porção da erva co-
reincidência. A majorante do art. 18, IV, nhecida por maconha.
também fixada no mínimo de 1/3, inci-
diu sobre a pena mínima do delito, sem Sabendo-se, no ato, que ele ven-
que fosse considerado aumento de um dera ao agente Eduardo Aparecido
mês. Assim, a pena final ficou em quatro aquele invólucro que estava em suas
(4) anos e um (1) mês, e não quatro (4) mãos e que os demais estavam desti-
anos, um (1) mês e dez (10) dias, como nados ao comércio, os dois foram de
seria o correto. pronto levados à presença da autori-
dade competente, que ordenou a au-
Por outro lado, não há nulidade no tuação em flagrante dos dois envol-
fato de o relator da apelação ter partici- vidos. E os dois, no ato, prestaram
pado da votação da revisão criminal, na confissões indisfarçadas. O agente,
condição de vogal. Segundo o art. 625 dizendo-se adquirente de um 'pape-
do CPP, os desembargadores que atua- lote' e ele, peticionário, o vendedor,
ram na apelação estão impedidos de pelo que iriam responder a processo
concorrer à distribuição para relator, por, respectivamente, porte para uso
não ficando, porém, impedidos de parti- próprio e tráfico, assim sendo no fi-
ciparem do julgamento da revisão cri- nal condenados.
minal.
Em juízo, disseram-se inocentes,
6. Finalmente o habeas corpus não ajuntando o peticionário que a con-
é o meio apropriado para proceder o fissão extrajudicial fora produzida
reexame da prova, por conta de uma mediante castigos físicos e que o au-
suposta suspeição do testemunho de xiliar de chefia Manoel Alves dos
Manoel Alves dos Santos. Segundo a Santos, por ele conhecido como
tese da defesa, Manoel Alves dos San- `Mané Galinha', o perseguia.
tos, Chefe da Segurança, teria forjado a
apreensão do entorpecente para perse- Este, por seu turno, vindo a juízo,
guir o paciente. Essa tese não tem apoio confirmou o quanto dissera à primei-
na prova dos autos, como bem examina- ra hora, para deixar claro que não
do na revisão criminal, cuja conclusões, inventara os fatos.
a seguir transcrita, não podem ser rea- Entre o que disse em juízo, meses
preciadas neste writ: depois de depor no auto de prisão em
R.T.J. — 158 181

flagrante e o que deixara consignado A condenação, pois, tendo apoio


neste, há pequenas diferenças, mas na prova, deve perdurar, em seu mé-
em pontos de nenhuma relevância, rito não se podendo tocar no âmbito
importando, para complicar a situa- deste recurso, em que o erro ou a
ção do peticionário, que, nas linhas injustiça devem, para o sucesso apa-
de mais significação de sua palavra, recer com translucidez inequívoca.'
não se consegue vislumbrar contradi-
ção alguma. Não se pode atinar com os 7. Pelo exposto, opino pelo indeferi-
motivos pelos quais os agentes peni- mento da ordem.» (fls. 66/69)
tenciários iriam mentir, não propria- Correto o parecer, que dispensa acrésci-
mente a dano do peticionário, mas es- mos, motivo por que, adotando-o, em todos
pecialmente para comprometimento os seus termos, indefiro o writ.
de um seu colega, o co-acusado de
porte para uso próprio de substância EXTRATO DA ATA
entorpecente, Eduardo Aparecido.
HC 70.980 — SP — Rel.: Min. Carlos
Seria isso maldosidade demasia- Velloso. Pacte.: Paulo dos Santos. Impte.:
da e verdadeiramente surpreendente, O mesmo. Coator: Tribunal de Justiça do
que de ordinário não se verifica. Estado de São Paulo.
Houve depoimentos de alguns Decisão: Por unanimidade, a Turma in-
presos, espelhando manifesta ten- deferiu o «habeas corpus».
dência a bem do peticionário, seu
companheiro de infortúnio. Palavras Presidência do Senhor Ministro Néri da
marcadas pelo estigma da parcialida- Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
de desmedida e que, assim mesmo, não Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso,
se harmonizaram entre si e muito me- Marco Aurélio e Francisco Rezelc Subpro-
nos na comparação com a própria ver- curador-Geral da República, o Dr. Cláudio
são que ele pôs em juízo, tudo como Lemos Fonteles.
ficou bem assinalado nos autos em Brasflia, 8 de fevereiro de 1994 — José
apenso, desde a decisão monocrática. Wilson Aragão, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 71.050 — PR


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves


Paciente e Impetrante: Luiz Oliveira da Silva — Coator: Tribunal de Alçada
do Estado do Paraná
Habeas corpus. Coação atribuída a Vice-Presidente do Tri-
bunal de Alçada. Incompetência do Supremo Tribunal Federal. Compe-
tência do Superior Tribunal de Justiça.
— Como decidiu esta Primeira Turma no HC n't 68.655, de
que fui relator, «apesar de o juiz de Tribunal de Alçada ser autoridade
182 R.T.J. —158

que não está arrolada entre as a que alude o artigo 105,1, a, da Consti-
tuição Federal, outra solução não há, para manter-se a coerência do
sistema de competência concernente ao habeas corpus, senão a de, por
construção, atribuir-se, também nessa hipótese, competência ao Supe-
rior Tribunal de Justiça para o processamento e julgamento originários
de habeas corpus em que figure como coator juiz de Tribunal de Alçada.
Habeas corpus que não se conhece por ser esta Corte incom-
petente para julgá-lo, determinando-se a remessa dos autos ao Superior
Tribunal de Justiça que é o competente.

ACÓRDÃO tado, obtendo provimento para a decre-


tação da nulidade do processo a partir da
Vistos, relatados e discutidos estes au- citação editalícia (fls. 5/8);
tos, acordam os Ministros da Primeira Tur- diante dessa decisão, solicitou em
ma do Supremo Tribunal Federal, na con- seguida o impetrante e paciente, perante
formidade da ata do julgamento e das notas o mesmo Tribunal, fosse determinada a
taquigráficas, por unanimidade de votos, expedição do competente alvará de sol-
«em não conhecer do pedido de habeas tura (fls. 29/30);
corpus, e determinar a remessa dos autos ao
Superior Tribunal de Justiça». esse pedido foi indeferido pelo
Vice-Presidente do Tribunal de Alçada
Brasília, 15 de março de 1994 — Mo- sob o argumento de que o acórdão em
reira Alves, Presidente e Relator. questão não determinou a soltura do pa-
ciente (fl. 31);
RELATÓRIO
e) requer a concessão da ordem para
O Sr. Ministro Moreira Alves: Assim que seja expedido o respectivo alvará de
expõe e aprecia o presente habeas corpos soltura.
o parecer da Procuradoria-Geral da Repúbli- O presente habeas corpus não deve
ca, de autoria do Dr. Mardem Costa Pinto: ser conhecido.
«Trata-sede habeas corpus impetra- É que se existe coação, esta deve ser
do por Luiz Oliveira da Silva, em seu atribuída ao Vice-Presidente do Tribu-
próprio benefício, apontando como au- nal, que, em decisão isolada, indeferiu o
toridade coatora o Tribunal de Alçada pedido formulado pelo impetrante. Por-
Criminal do Estado do Paraná, alegando tanto, falece competência à Suprema
e requerendo o seguinte: Corte, pertencendo, a mesma, ao Supe-
o impetrante e paciente foi conde- rior Tribunal de Justiça. Este é o enten-
nado pelo Juiz da única Vara Criminal dimento pacífico do Supremo Tribunal
da comarca de Andirá-PR a cumprir a Federal, verbis:
pena de quatro anos, quatro meses e «Ementa: Habeas corpus.
quinze dias de reclusão, por infringência — Trata-se de coação que se im-
do artigo 171, caput, c.c. os arts. 71 e puta ao Exmo. Sr. Vice-Presidente
29, todos do Código Penal; do Tribunal de Alçada Criminal do
inconformado com a decisão, o Estado de São Paulo, sendo, pois,
paciente impetrou habeas corpus, pe- competente para julgar originaria-
rante o Tribunal de Alçada daquele es- mente o presente habeas corpos o
- 158 183

Superior Tribunal de Justiça (art. 105, pus, senão a de, por construção, atribuir-se,
I, a e c, da Constituição Federal). também nessa hipótese, competência ao
Habeas corpus não conhecido, Superior Tribunal de Justiça para o proces-
determinando-se a remessa dos autos samento e julgamento originários de ha-
ao Superior Tribunal de Justiça.» beas corpus em que figure como coator
(HC 70.465-4/SP, Rel. Min. Morei- juiz de Tribunal de Alçada.
ra Alves, DJ 24-9-93, pág. 19557). 2. Em face do exposto, não conheço do
Pelo exposto, somos pelo não conhe- presente habeas corpus, por ser esta Corte
cimento da ordem e remessa dos autos incompetente para julgá-lo, e determino a
ao Superior Tribunal de Justiça. remessa dos autos ao Superior Tribunal de
Justiça que é o competente.
É o parecer.» (fls. 33/35)
EXTRATO DA ATA
É o relatório.
VOTO HC 71.050 —PR —Rel.: Min. Moreira
Alves. Pacte.: Luiz Oliveira da Silva. Imp-
O Sr. Ministro Moreira Alves (Rela- te.: O mesmo. Coator: Tribunal de Alçada
tor): 1. Como bem salienta o parecer da do Estado do Paraná.
Procuradoria-Geral da República, se coa-
ção existe, parte ela da decisão do Vice- Decisão: A Turma não conheceu do pe-
Presidente do Tribunal de Alçada que inde- dido de «habeas corpus», determinando a
feriu o pedido formulado pelo paciente-im- remessa dos autos ao Superior Tribunal de
petrante. Justiça. Unânime.
Ora, como decidiu esta Primeira Turma Presidência do Senhor Ministro Moreira
no Habeas Corpus 68.655, de que fui Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
relator, «apesar de o juiz de Tribunal de nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
Alçada ser autoridade que não está arrolada ce, Celso de Mello e filmar Gaivão. Subpro-
entre as a que alude o artigo 105, I, a, da curador-Geral da República, Dr. Arthur de
Constituição Federal, outra solução não há, Castilho Neto.
para manter-se a coerência do sistema de Brasília, 15 de março de 1994 — Ri-
competência concernente ao habeas cor- cardo Dias Duarte, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 71.167 — SP


(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches
Paciente e Impetrante: Claudemir Donizete de Oliveira — Coator: Tribunal
de Alçada Criminal do Estado de São Paulo
Direito Processual Penal.
Habeas corpus. Nulidades.

Ausência de réu preso (em outra comarca) a audiência de


instrução.
Reexame de provas.
184 R.T.J. — 158

A ausência de réu preso (em outra comarca) a audiência


de instrução, porque não requisitada sua apresentação, pode, em tese,
configurar nulidade relativa, que, porém, fica sanada, se não argüida
oportunamente, ou se não demonstrado prejuízo.
Precedentes.
Não é o habeas corpus o instrumento processual adequado
para se provocar o reexame das provas em que se apoiou a condenação.
3. Habeas Comas indeferido.

ACÓRDÃO apesar de se encontrar preso. Aduz, ain-


da, insuficiência do conjunto probatório
Vistos, relatados e discutidos estes au- que embasou a condenação.
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- Cabe-me, a propósito e em atenção
bunal Federal, por sua Primeira Turma, na ao ofício de Vossa Excelência, transmi-
conformidade da ata do julgamento e das tir os esclarecimentos que seguem.
notas taquigráficas, por unanimidade de
votos, em indeferir o pedido de «habeas Por fatos ocorridos em 8 de dezem-
corpos». bro de 1988, foram o paciente e outro
co-réu denunciados, perante o MM. Juí-
Brasília, 4 de outubro de 1994 — Mo- zo da E. Segunda Vara Criminal da Co-
reira Alves, Presidente — Sydney San- marca de Rio Claro, como incursos no
ches, Relator. art. 157, § 2°, I e II, do Código Penal
RELATÓRIO (doc. n° 2), com base nos elementos
colhidos na fase indiciária (doc n° 3).
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela- Recebida a denúncia (doc. n° 4) e
tor): 1. O ilustre Juiz Hélio de Freitas, interrogado o co-réu (doc. n° 5), foram
Presidente do E. Tribunal de Alçada Crimi- juntarias as certidões criminais e a folha
nal de São Paulo, ao prestar as informações de antecedentes do impetrante e pacien-
de fls. 23/25, esclareceu: te (doc. n° 6), sendo, então, expedida
«Tenho a honra de acusar o recebi- carta precatória para citação r interroga-
mento do Ofício n° 129/R, através do tório deste (doc. n° 7).
qual são solicitadas informações para a Através da carta precatória, em 18 de
instrução do Habeas Corpus o° 71.167- agosto de 1989, foram ouvidas, pelo
7/130, em que é impetrante e paciente MM. Juízo da Primeira Vara Criminal
Claudemir Donizete de Oliveira, que da Comarca de Araras, três das testemu-
usa outros nomes (doc. n° 1). nhas arroladas na denúncia, ausentes o
Alega o impetrante e paciente, em impetrante e paciente e seu advogado,
síntese, estar sofrendo constrangimento sendo-lhe nomeado defensor «ad hoc» o
ilegal, em virtude de ter sido condenado Bel. Fábio Fachini (doc. n° 8). No MM.
em processo manifestamente nulo Juízo deprecante, foi redesignada a au-
(Ação Penal n° 1.333-A/88, da E. Se- diência marcada, em virtude do não
gunda Vara Criminal da Comarca de comparecimento do acusado (doc. n° 9).
Rio Claro). Argúi, para tanto, cercea- Após a renúncia do defensor do im-
mento de defesa, eis que não fora requi- petrante e paciente (doc. n° 10), foi este
sitado para acompanhar a instrução, intimado, na Penitenciária do Estado, a
R.T.J. — 158 185

constituir novo patrono (doc. n° 11), argüição oportuna e prova concreta de


procedendo-se, a final, a nomeação de prejuízo para a defesa.
defensor ativo e expedido ofício para a — Incabível, no âmbito estreito do
sua requisição (doc n° 12). writ, a reapreciação dos fatos ou a aná-
Efetivadas novas e infrutíferas tenta- lise aprofundada da prova, para dizer da
tivas de realização de audiências, devi- justiça ou injustiça da condenação.»
do à ausência do impetrante e paciente É o relatório.
(doc. n° 13), esta foi concluída, sem ele,
apesar de devidamente requisitado (doc. VOTO
n° 14).
Oferecidas as alegações finais (doc O Sr. Ministro Sydney Sanehes (Rela-
n° 15), sobreveio, em 21 de janeiro de tor): 1. É o seguinte o inteiro teor do parecer
1992, sentença condenatória, que ape- do Ministério Público Federal (fls.
nou o impetrante e paciente a 11 anos e 179/182):
6 meses de reclusão e 24 dias-multa, por «Cl audemir Donizete de Oliveira foi
infringência ao art. 157, 2°, I e II, do denunciado como incurso nas sanções
Código Penal (doc. n° 16). do art 157, § 2°, incisos 1e II, do Código
Inconformada, apelou a defesa (doc Penal, perante o MM Juiz da 2* Vara
n° 17) tendo a E. Décima Primeira Câ- Criminal de Rio Claro-SP, que o conde-
mara desta Corte, por votação unânime, nou a onze anos, seis meses e vinte dias
dado provimento parcial ao recurso para de reclusão.
reduzir as penas a 6 anos, 2 meses e 20 Dando provimento parcial ao ape-
dias de reclusão e ao pagamento de 13 lo, o egrégio Tribunal de Alçada Crimi-
dias-multa (doc. n° 18). A ven. decisão nal de São Paulo reduziu a pena para seis
restou irrecorrida (doc. n° 19). anos, dois meses e vinte dias de reclu-
Informo, ainda, que o impetrante e são.
paciente impetrou, nesta Corte, o «Ha- Impetrou o presente Habeas cor-
beas Corpus» n° 243.344/8, que a E. pus requerendo a concessão da ordem
Décima Segunda Câmara, à unanimida- para anular a sentença condenatória e o
de, não conheceu (doc. n° 20). v. ac6rdão, com a expedição do alvará
Por derradeiro, esclareço que não de soltura, com base nas seguintes nuli-
consta nos assentamentos da Secretaria dades processuais:
desta Corte, pedido revisional formula- ausência de prova da sua par-
do em favor do paciente referente a esta ticipação no delito, havendo somente
Ação Penal (doc. n° 21).» a palavra do co-réu, pois não foi re-
2. No parecer de fls. 179/182, opinou o conhecido pela vítima, nem pelas
ilustre Subprocurador-Geral da República testemunhas e não se promoveu a
Dr. Mardem Costa Pinto pelo indeferi- necessária acareação;
mento do pedido, ficando essa manifesta- apesar de preso em Limeira-
ção assim resumida na ementa de fls. 179: SP, onde foi interrogado através de
«Ementa: Desnecessária a presença Carta Precatória, não foi requisitado
do acusado à audiência das testemu- para participar das audiências das
nhas, se tem defensor nomeado e atuan- testemunhas, o que seria de grande
te. Nulidade relativa, sanada à falta de importância e se constituiu em cer-
186 R.T.J. — 158

ceamento de defesa, com evidente ção satisfatória de defesa dativa. Pre-


prejuízo. juízo indemonstrado, a tornar perti-
Entendemos que o presente ha- nente o Enunciado n° 523 da Súmula
beas corpus deve ser conhecido, mas do STF. Habeas corpus indeferido.»
denegada a ordem. — HC 69.951-1/SP — Rel. Má.
Francisco Rezek — DJ 26-3-93 —
Algumas testemunhas foram ouvi- pág. 5006.
das em Araras-SP, através de Carta Pre-
catória, com nomeação de defensor ad No momento oportuno das alega-
hoc para o impetrante, fls. 118/132. ções finais, a defesa não argüiu as nuli-
dades ora enfocadas, omitindo-se tam-
O advogado indicado, alegando bém nas razões de apelação, estando
não ter sido constituído pelo impetrante, sanada eventual nulidade também por
não aceitou a indicação, requerendo a falta de prova de prejuízo, conforme
intimação do impetrante para constituir decidiu o Excelso Pretório:
outro (fl. 126), o que foi feito (fl. 127),
sem manifestação (fl. 130), com a con- «Ementa: Ausência de réu pre-
seqüente nomeação de defensor dativo, so, à audiência de testemunhas e da
na pessoa do Dr. Mário Akamine (fl. vítima.
131). Nulidade relativa, cuja pronúncia
Prosseguiu-se a instrução, com a dependeria de oportuna argüição e de
oitiva de outras testemunhas e o impe- demonstração de prejuízo, o que, no
trante foi requisitado por três vezes e caso, não ocorreu.
não compareceu, sendo certo que estava Pedido indeferido.» 69.309-
preso em outra comarca, atuando em sua 1/SP — Rel. Min. Octavio
defesa o defensor nomeado (ver fls. 132, ti — DJ 7-8-92 — pág. 11780.
133, 138 e 140/143), não se configuran-
do nulidade como já decidiu o Supremo Quanto às demais razões ventila-
Tribunal Federal: das, relativamente à falta de prova da
participação do impetrante na prática do
1— crime, o mesmo Pretório Excelso enten-
2 — A requisição com o conse- de como incabível o exame de provas,
qüente deslocamento de réu preso no âmbito estreito do writ:
para outra comarca, é matéria já ven- «Ementa: Processual Penal. Pe-
cida pela jurisprudência da Suprema nal. Habeas corpus. Exame de pro-
Corte, como desnecessária, desde va.
que presente o seu defensor.
I — Não cabe, em sede de
3 — ...» — RHC 114-SP — Rel. Habeas corpos, a reapreciação de
Min. José Cândido — DJ 4-9-89 — fatos ou o reexame aprofundado da
pág. 14044. prova.
«Ementa: ... Cerceamento de II — HC indeferido.» — HC
defesa ... 70.049-7/PR — Rel. Min. Marco
I— Aurélio — DJ 7-5-93 — pág. 8331.
II — Cerceamento de defesa. A «Ementa: Habeas corpus inde-
alegação de prejuízo não se abona ferido, por implicar, a pretensão, ree-
nos autos, de onde reponta articula- x ame de prova, em profundidade in-
R.TJ. — 158 187

compatível com o âmbito do remédio Nulidades inexistentes. Habeas cor-


utilizado.* — HC 69.703-8/SP — pus indeferido.»
Rel. Min. Octavio Gallotti — DJ Quanto à matéria de fato, que ense-
4-6-93 — pág. 11012. jou a condenação, não é possível, no âmbito
10. Por estas razões, opinamos no estreito do babeas corpos, o reexame das
sentido de que seja conhecido o presente provas colhidas nos autos e esmiuçadas na
Habeas corpus mas, no mérito, seja sentença e no acórdão que a confirmou (fls.
denegada a ordem. 7/8 e 9/12).
Acolho o douto parecer. Isto posto, indefiro o pedido.
Além do precedente ali referido, de EXTRATO DA ATA
que foi relator o eminente Ministro Octa-
vio Gallotti (HC n° 69.309), outro, mais HC 71.167 — SP — Rel.: Min. Sydney
recente, desta mesma Turma, relatado pelo Sanches. Pacte.: Claudemir Donizete de Oli-
eminente Ministro limar Gaivão, pode ser veira. Impte.: O mesmo. Coator: Tribunal de
aqui mencionado (DJ de 9-9-1994, Emen- Alçada Criminal do Estado de São Paulo.
tário n° 1.757-2): Decisão: A Turma indeferiu o pedido de
«habeas corpus». Unânime.
«Penal. Habeas corpus. Nulidade.
Ausência de prejuízo. Presidência do Senhor Ministro Moreira
Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
A ausência do acusado aos atos de nistros Sydney Sanches, Celso de Mello e
instrução criminal, por estar preso em co- limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o
marca diversa, não implica a anulação do Senhor Ministro Sepúlveda Pertence . Sub-
processo se não foi arguida a nulidade no procurador-Geral da República, Dr. Geral-
momento oportuno, nem demonstrado do Brindeiro.
objetivamente o prejuízo. Precedentes.
Brasília, 4 de outubro de 1994 —Ricar-
do Dias Duarte, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 71.905 — SP


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches


Paciente: Luiz Paulo Tucci —Impetrante: Frederico Cesar Chama —Coator:
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Direito Penal e Processual Penal.
Habeas corpus.
Extensão de benefício a co-réu (art. 580 do Código de Proces-
so Penal).
Se o Tribunal local, ao negar a existência de um dos crimes,
o de quadrilha, beneficiou o então apelante, omitindo-se quanto à exten-
188 R.T.J. — 158

são do beneficio ao co-réu, este pode requerê-la ao próprio órgão julga-


dor da apelação, mediante simples petição, que deverá apreciá-la com o
exame dos autos, requisitando-os, se for necessário.
Não é caso, desde logo, de se impetrar habeas corpus ao STF,
contra a omissão do julgado, quando esta ainda pode ser sanada pelo
Tribunal competente.
HC não conhecido, com a ressalva do meio adequado.

ACÓRDÃO Sustenta o impetrante a ocorrên-


cia de constrangimento ilegal eis que o
Vistos, relatados e discutidos estes au- TJ/SP ao examinar a apelação interposta
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- pelo co-réu Carlindo Lima Veiga não
bunal Federal, por sua Primeira Turma, na estendeu ao paciente os benefícios cons-
conformidade da ata do julgamento e das tantes de tal decisão.
notas taquigráficas, por unanimidade de vo-
Cuidemos do alegado!
tos, em não conhecer do pedido de «habeas
corpus», nos temos do voto do Relator. 4. Leia-se trecho das informações
prestadas pelo E. Tribunal de Justiça de
Brasília, 22 de novembro de 1994 — São Paulo, verbis:
Moreira Alves, Presidente — Sydney
Sanches, Relator. «O paciente, Vander Augusto Car-
valho, Antônio Carlos Lopes e Car-
RELATÓRIO lindo Lima Veiga foram denuncia-
dos perante o Juízo de Direito da 2
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela- Vara da Comarca de Itapecerica da
tor): O ilustre Subprocurador-Geral da Re- Serra, nos autos de Ação Penal n°
pública Dr. Claudio Lemos Fonteles, no 45/92, como incursos nos arts. 155, §
parecer de tis. 83/86, resumiu a hipótese e, 4°, incisos III e IV, e 288, c.c. os arts.
em seguida, opinou, nos termos seguintes: 29 e 69, do Código Penal. Atribui
«Ementa: também a denúncia à Dercídio Inácio
Ferreira a prática dos crimes defini-
O Colegiado Estadual não
dos nos arts. 288 e 319, c.c. os arts.
pode ser tido como autoridade coa-
29 e 69, citado diploma legal. Resta-
tora. ram todos condenados, sendo o pa-
O paciente ainda não formulou ciente e Vander às penas de sete anos
pedido ao TJ/SP de extensão do jul- de reclusão e multa (quatro anos pelo
gamento, pelo que não pode obtê-lo furto e três anos pelo bando ou qua-
originariamente da Suprema Corte. drilha), Carlindo e Antônio às penas
3. Pelo não conhecimento. de quatro anos e seis meses de reclu-
são e multa (dois anos e seis meses
Excelentíssimo Senhor Ministro Re- pelo furto e dois anos pelo bando ou
lator: quadrilha) e, finalmente, Dercídio às
1. Cuida-se de habeas corpus im- penas de três anos de reclusão (pelo
petrado por Frederico César Chama em bando ou quadrilha) e seis meses de
favor de Luiz Paulo Tucci visando a detenção e multa (pela prevarica-
desconstituição do v. acórdão de fls. ção). Estabeleceu o MM. Juiz o regi-
74180. me fechado para o desconto das pe-
R.T.J. — 158 189

nas privativas de liberdade, sem di- omissão do acórdão pode ser sana-
reito a recurso em liberdade. Apela- da mediante petição do interessado
ram Dercídio e Carlindo. A Egrégia ao órgão julgador, não gerando pre-
Primeira Câmara Criminal deste Tri- clusão contra quem não é parte no
bunal proveu em partes os recursos recurso a falta de embargos declara-
para, em relação ao primeiro, anular tórios.
o processo a partir da denúncia, in- 2. De qualquer sorte, recusando-
clusive, e, no tocante ao segundo, se o Tribunal a quo a supri-la, por
para absolvê-lo do crime do art. 228, entender cessada a jurisdição, con-
do Código Penal, ficando as suas pe- ceder-se habeas corpus, para defe-
nas reduzidas a dois anos e seis meses rir a extensão, fazendo cessar a ile-
de reclusão e treze dias-multa, mantido galidade substantivado na omissão
o regime fechado, nos termos do v. denunciada e não corrigida.» (v.:
acórdão cuja cópia segue inclusa. HC 69.402-1-RI, Rel. Min. Sepúlve-
A prisão preventiva do paciente e da Pertence, DJ, 21-8-92, pág. 12785
dos demais denunciados foi decreta- — grifamos)
da quando do recebimento da denún- Como se vê, o TI/SP não pode ser
cia. O paciente não foi localizado e, tido como autoridade coatora eis que o
por isso, citado por edital, correu o ora paciente não formulou perante
feito à sua revelia. Uma vez proferida aquela Corte pedido de extensão do jul-
a sentença condenatória, determinou gamento.
o MM. Juiz o desmembramento do
processo em relação ao paciente e Bem demonstrado, na decisão do
aos co-réus Vander e Antônio Car- C. Supremo Tribunal Federal, que o
los, que não se recolheram à prisão constrangimento ilegal só ocorre diante
para apelar, e a intimação de todos da recusa do Tribunal em promover a
por edital. A sentença condenatória extensão do julgamento da apelação a
transitou em julgado para o paciente, co-réu não recorrente, o que não se tem
Vander e Antônio Carlos. na espécie, como acima esclarecido.
Não há, pois, ato de ilegal cons-
trangimento que propicie a concessão da
Cumpre esclarecer que o paciente ordem.
não peticionou a este Tribunal pedin- Do exposto, opina o MPF pelo
do a extensão do julgado.» (v.: fls. não conhecimento do pedido, devendo
39/40) o paciente formular o pedido de exten-
5. A Suprema Corte já enfrentou são do julgamento diretamente ao E.
tema análogo, tendo a E. I' Turma, em TJ/SP.»
votação unânime, decidido aí, verbis: É o relatório.
«Ementa: Recurso criminal: ex- VOTO
tensão da decisão favorável ao co-réu
não recorrente (C. Pr. Penal, art. O Sr. Ministro Sydney Sambes (Mo-
580): procedimento. tor): 1. Acolho o parecer do Ministério
1. Reunidos os pressupostos da Público Federal.
extensão ao não apelante do provi- 2. Na verdade, a alegada omissão do
mento da apelação do co-réu, a acórdão pode ser sanada pelo próprio órgão
190 R.T.J. —158

judiciário que o proferiu, mediante simples Impte.: Frederico Cesar Chama. Coator:
petição do interessado, requisitando-se os Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
autos principais, se ainda não se encontra-
rem no Tribunal (o julgado é datado de Decisão: A Turma não conheceu do pe-
4-4-1994). (Fl. 80). dido de «habeas corpus». Unânime.
3. Isto posto, não conheço do pedido de
habeas corpus, mas ressalvo ao paciente a Presidência do Senhor Ministro Moreira
possibilidade de requerer à 1' Câmara Cri- Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
minal do Tribunal de Justiça do Estado de nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
São Paulo, prolatora do acórdão impugna- ce, Celso de Mello e limar Gaivão. Subpro-
do, a extensão do benefício pleiteado. curador-Geral da República, o Dr. Geraldo
Brindeiro.
EXTRATO DA ATA
HC 71.905 — SP — Rel.: Min. Syd- Brasília, 22 de novembro de 1994 —
ney Sanches. Pacte.: Luiz Paulo Tucci. Ricardo Dias Duarte, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 72.114 — SP


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches


Paciente e Impetrante: José Antônio Dona — Coator: Tribunal de Alçada
Criminal do Estado de São Paulo
Direito Penal e Processual Penal.
Fundamentação da condenação e da dosimetria penal.
Alegações de nulidade.
Estando, ao contrário do alegado na impetração, satisfato-
riamente fundamentados os acórdãos da apelação e da revisão, seja
quanto à condenação, seja quanto à fixação da pena, é de se repelir a
alegação de nulidades, a esse respeito, denegando-se o writ.
HC indeferido.

ACÓRDÃO Brasília, 3 de março de 1995 — Morei-


ra Alves, Presidente — Sydney Sanches,
Vistos, relatados e discutidos estes au- Relator.
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, por sua Primeira Turma, na RELATÓRIO
conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela-
votos, em indeferir o pedido de «habeas tor): 1. O ilustre Juiz Hélio de Freitas,
corpus». Presidente do E. Tribunal de Alçada Crina-
R.T.J. — 158 191

nal de São Paulo, ao prestar as informações unânime, deu parcial provimento, tão-
de fls. 31/32, esclareceu: somente, para afastar a sanção pecuniá-
«Alega o impetrante e paciente, em ria (Doc. n° 11). O ven. acórdão restou
síntese, estar sofrendo constrangimento irrecorrido (Doc. n° 12).
ilegal, em virtude de ter sido condenado Informo, finalmente, que o impetrante e
por sentença manifestamente nula. Ar- paciente aforou, nesta Corte, a Revisão Cri-
güi, para tanto, a insuficiente fundamen- minal n° 227.056/1, indeferida, sem discre-
tação e errônea dosimetria da pena que pância de votos, pelo E. Quarto Grupo de
lhe fora aplicada (Ação Penal n°229/85, Câmara (Doc. n° 13).»
da E. Segunda Vara Criminal da Comar- 2. O Ministério Público Federal, em pa-
ca de Andradina). Aduz, ainda, o fato recer do ilustre Subprocurador-Geral da
desta Corte não ter reconhecido tal eiva República Dr. Claudio Lemos Fonteles,
quando do julgamento da Revisão Cri- opinou pelo indeferimento do pedido, fi-
minal n° 227.056/1. cando sua manifestação assim resumida na
Cabe-me, a propósito e em atenção ementa de fl. 165:
ao ofício de Vossa Excelência, transmi- «Ementa:
tir os esclarecimentos que seguem.
Decisão colegiada devidamente
Por fatos ocorridos em 25 de agosto fundamentada quanto aos critérios da
de 1984, foram o impetrante e paciente condenação e da dosimetria da pena.
e outro co-réu denunciados, perante o
Pelo indeferimento.»
MM. Juízo da E. Segunda Vara Crimi-
nal da Comarca de Andradina, como É o relatório.
incursos no art. 171, caput, c.c. o art. 29,
VOTO
ambos do Código Penal (Doc. n°1), com
base nos elementos colhidos na fase in- O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela-
diciária (Doc. n° 2). tor): 1. É este o inteiro teor do parecer do
Recebida a denúncia (Doc. n°3), vie- Ministério Público Federal (fls. 165/168):
ram aos autos as certidões criminais e a «1. Cuida-se de habeas corpus im-
folha de antecedentes do impetrante e petrado, em benefício próprio, por José
paciente (Doc. n" 4), procedendo-se, en- Antônio Doná alegando, em síntese, que
tão, ao seu interrogatório (Doc. n° 5). a decisão condenatória de 1° grau é nula
Realizada a instrução, decretou-se a eis que insuficiente a sua fundamenta-
revelia do impetrante e paciente (Doc. ção e errônea a dosimetria da pena.
n° 6), sendo, a seguir, oferecidas as ale- Aduz, ainda, o fato do TA-
gações finais (Doc. n° 7). CRIM/SP não ter reconhecido tais nuli-
Em 7 de março de 1989, sobreveio dades quando do julgamento da Apela-
sentença condenatória, que apenou o ção n° 613.763/5 e da Revisão n°
impetrante e paciente a 2 anos e 6 meses 227.056/1.
de reclusão e 15 dias-multa, por infrin- Sem razão o impetrante.
gência ao art. 171, caput, c.c. o art. 29, 4. A decisão de 1° grau, já superada
ambos do Código Penal (Doc. n° 9). pelas decisões de fls. 139/142 e
Inconformada, interpôs a defesa ape- 156/161, embasou-se no farto conjunto
lação (Doc. n° 10), que a E. Terceira probatório constante dos autos e a fixa-
Câmara deste Tribunal, por votação ção da pena levou em consideração os
192 R.T.J. — 158

maus antecedentes do ora paciente (v.: Apenas a multa é que deve ser
fls. 120/124). revista, pois deve prevalecer a lei
5. O E. Tribunal de Alçada Criminal vigente à época dos fatos. Assim,
do Estado de São Paulo, no julgamento José deve receber Cr$ 5.000,00 por
da apelação criminal interposta pelos sua personalidade e Antônio Cr$
réus, decidiu, verbis: 1.000,00 por ser primário.
«A condenação não pode ser afas- Estabelecidos estes montantes, há
tada, eis que é robusta a prova de que se reconhecer inexeqüibilidade
responsabilidade dos apelantes. por falta de padrão monetário em ra-
zão das sucessivas reformas econô-
O veículo adquirido mediante o micas.
meio fraudulento foi apreendido em
poder de José (fl. 7), o qual não ex- O regime fixado para cumpri-
plicou na primeira oportunidade em mento de pena carcerária de José
que foi ouvido o motivo de estar na está adequado às demais condena-
posse do carro, já que teria sido mero ções que lhe foram impostas.
corretor (fls. 33 e 96v°). Acordam, pelo exposto, em Ter-
Antônio, por sua vez admitiu a ceira Câmara do Tribunal de Alçada,
participação no golpe (fls. 11 e em período de férias forenses, por
104v°). votação unânime, dar provimento
parcial aos apelos de José Antônio
'O laudo grafotécnico de fls. 42/44 Doná e Antônio Jesus Vioto para o
deita por terra a versão de José. fun de afastar as penas pecuniárias
Já a testemunha ouvida a fls. 120 que lhe foram impostas.» (v.: fls.
atesta a presença de Antônio no dia 140/142 — grifamos)
do acontecido, inclusive entregando Como se vê, os fundamentos pos-
seu cheque para a realização do pseu- tos da presente impetração foram exaus-
do-negócio. tivamente analisados pelo acórdão retro
Por fim, a vítima relata a partici- transcrito.
pação ativa dos dois agentes, bem Com a formulação posterior de
como a recuperação de seu bem sem pedido revisional, a Corte Estadual en-
o toca-fitas e com dois pneus troca- frentou novamente tais fundamentos.
dos (fl. 121). Leia-se, verbis:
Diante de tal contexto, a conde- «4. Não é exato que a r. sentença,
nação era de rigor. embora de concisão pouco recomen-
Não se pode falar em pequeno dável, esteja desprovida de funda-
prejuízo diante do estado em que foi mentação.
recuperado o bem, inclusive pela fal- Erro crasso é confundir uma coisa
ta de seus documentos originais. com a outra, não se perdendo de vista
O réu José ostenta nove conde- que o v. acórdão contém detalhada
nações definitivas (fls. 223, 246v° e análise de todo o contexto probató-
302/303) o que ampara o aumento rio.
adotado pelo magistrado de pri- Nem mesmo quanto à pena, cuja
meiro grau, ou seja, de 2 meses por exacerbação foi justificada pelos
condenação, o que é bem razoável. péssimos antecedentes do peticiona-
R.T.J. — 158 193

rio, reveladores da sua disposição de exacerbação da pena acima do mínimo


infringir a lei (r. sentença, fl. 309), legal.
tanto que «ostenta nove condenações Razão não há, portanto, para a
definitivas (fls. 223, 246v. e concessão da ordem.
302/303), o que ampara o aumento
adotado pelo magistrado de primeiro Pelo indeferimento.»
grau, ou seja, de 2 meses por conde- 2. Acolhendo integralmente o parecer,
nação, o que é bem razoável» (v. que demonstrou estarem satisfatoriamente
acórdão, fl. 395). fundamentados os acórdãos da apelação e
Mais a mais, e como se tem deci- da revisão, seja quanto à condenação, seja
dido, «estando a dosimetria penal quanto à fixação da pena, indefiro o pedido
isenta de erro de fato ou de direito, de habeas corpus.
nada mais sendo que reflexo do cri- EXTRATO DA ATA
tério valorativo do julgador, não há
causa ou fundamento legal bastante HC 72.114 — SP --- Rel.: Min. Sydney
para que venha a ser alterada em sede Sanches. Pacte.: José Antônio Dona. Imp-
revisional» —Julgados do TACRIM te.: O mesmo. Coator: Tribunal de Alçada
87/429, 76/52, 60/35, 59/42. Cf. voto Criminal do Estado de São Paulo.
do Juiz Barbosa de Almeida, Relator
da Revisão 191.528-9 — Manilha, Decisão: A Turma indeferiu o pedido de
julgada pelo 5° Grupo. Vide, ainda, «habeas corpus». Unânime.
Rev. Criminal 212.454-3 — S. Pau- Presidência do Senhor Ministro Moreira
lo, 5° Grupo, v. u. Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
Ante o exposto, indefere-se o pe- ce, Celso de Mello e Ilmar Gaivão. Subpro-
dido.» (v.: fls. 159/160). curador-Geral da República, Dr. Miguel
8. As decisões já mencionadas não Frauzino Pereira.
merecem reforma eis que devidamente Brasília, 3 de março de 1995 —Ricardo
fundamentado o juízo condenatório e a Dias Duarte, Secretário.

HABEAS CORPUS N ° 72.578 — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Maurício Corrêa


Paciente e Impetrante: Eudécio Benedito Zumbianchi — Coator: Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo
Habeas corpus. Progressão de regime prisional: requisitos.
As penas privativas de liberdade são executadas de modo
progressivo, segundo o mérito do sentenciado (CP, art. 33, 2").
O mérito — requisito subjetivo — deve ser apreciado
motivada mente pelo Juiz das Execuções Criminais para conceder, ou
negar, a progressão para regime menos rigoroso (LEP, art. 112).
194 R.T.J. — 158

Progressão negada pelo Juiz, por decisão fundamentada,


na forma da lei, e confirmada pelo Tribunal, porque, mesmo satisfeitos
os requisitos objetivos, o paciente foi considerado de periculosidade
inconciliável com as regras do regime intermediário.
O rito especial e sumário do habeas corpus não se compa-
dece com o exame do mérito do sentenciado, para efeito de promoção de
regime prisional.
5. Habeas corpus conhecido, mas indeferido.

ACÓRDÃO quaisquer crimes. Pede seja concedida a


promoção para o regime semi-aberto (fl.
Vistos, relatados e discutidos estes au- 12). Junta documentos (fls. 14/18).
tos, acordam os Ministros componentes da
Segunda Turma do Supremo Tirbunal Fe- Vêm aos autos as informações pres-
deral, na conformidade da ata do julgamen- tadas pelo 2° Vice-Presidente do Tribunal
to e das notas taquigráficas, por unanimi- coator (fl. 29), acompanhadas de documen-
dade de votos, indeferir o «habeas corpus». tos (fls. 30/34):
Brasília, 19 de setembro de 1995 — Manifesta-se o Ministério Público
Néri da Silveira, Presidente — Mauricio Federal opinando pelo indeferimento da
Corrêa, Relator. ordem em parecer assim fundamentado, in
verbis (fls. 37/39):
RELATÓRIO
«3. Não é possível discutir na via
O Sr. Ministro Mauricio Corrêa: Tra- restrita do habeas corpus o preenchi-
ta-se de habeas corpus impetrado pelo pa- mento dos requisitos subjetivos para o
ciente, onde afirma que está sofrendo coa- benefício pleiteado, considerados au-
ção ilegal por ato da Primeira Câmara Cri- sentes pelo MM. Juiz da Execução Pe-
minal do Tribunal de Justiça do Estado de nal, que afirmou ser o paciente portador
São Paulo, praticado ao negar provimento de periculosidade inconciliável com as
a agravo que interpôs contra a decisão do regras do regime intermediário (fl. 31).
Juiz de Direito da Vara das Execuções Cri-
minais da Capital, que indeferiu seu pedido 4. A presença de laudo pericial favo-
de progressão para o regime semi-aberto. rável não impressiona pois, como bem
Alega falta de justa causa para o indeferi- lembrado pelo r. acórdão da lavra do
mento da progressão porque foram cumpri- Des. Jarbas Mazzoni, «com pena tão
das as exigências do art. 112 da LEP, inclu- longa e tendo cometido crimes graves,
sive exame criminológico favorável e mé- não se pode privilegiar em demasia o
rito pessoal; alega, também, que o indefe- exame criminológico, que representa,
rimento tem por base aspectos não previs- apenas, um instrumento de auxílio do
tos na lei, como a gravidade do crime e a Juiz, sem vinculá-lo às suas conclusões.
severa pena aplicada, mas que pela gravi- Assim, a autoridade judiciária não fica
dade do crime já foi punido com longa adstrita às opiniões ou presunções esta-
pena; alega, finalmente, que os crimes fo- belecidas no trabalho pericial, podendo
ram praticados há mais de 20 anos, na decidir contrariamente a elas sempre
vigência da lei anterior, que possibilitava a que julgar conveniente em nome do in-
progressão de regime aos condenados por teresse maior, que é o social».
R.T.I. — 158 195

4. Tais as circunstâncias, não se vis- No caso dos autos, as objeções e res-


lumbra constrangimento ilegal, mere- trições encontradas na decisão que pro-
cendo ser confirmado o v. acórdão do feri em 4-4-90 (fl. 35, em cópia) suge-
Tribunal de Justiça ...» rem, ainda, periculosidade inconciliável
É o relatório. com as regras do regime intermediário,
o que implica na permanência do sen-
tenciado no atual estágio, submetendo-
VOTO se a nova análise. Ressalte-se, ao derra-
deiro, que em casos como o dos autos
O Sr. Ministro Maurício Corrêa (Re- não se poderá considerar uma evolução
latar): Diz o § 2° do art. 33 do Código Penal aferida em poucos meses ou anos, mas
que «as penas privativas de liberdade deve- sim um quadro favorável que assim se
rão ser executadas em forma progressiva, apresente por um longo período de tem-
segundo o mérito do condenado» e o art. po, o qual entende-se ainda não cumpri-
112 da Lei de Execução Penal (Lei n° do.»
7.210, de 11-7-84) regulamenta a progres-
são do regime prisional nos seguintes ter- 2.1. Da referida decisão anterior do Juiz
mos, in verbis: da Execução colho os seguintes excertos,
in verbis (fls. 30):
«Art. 112. A pena privativa de li-
berdade será executada em forma pro- «Absolutamente fora de qualquer co-
gressiva, com a transferência para o re- gitação se apresenta a concessão, ao sen-
gime menos rigoroso, a ser determinada tenciado, da pleiteada progressão.
pelo juiz, quando o preso tiver cumprido Com efeito, não se observa qualquer
ao menos um sexto da pena no regime indício de merecimento que possa ser
anterior e seu mérito indicar a progres- trazido à liça em termos de beneficio.
são. Autor de crimes dos mais graves que
Parágrafo único. A decisão será um homem pode cometer, Eudécio so-
motivada e precedida de parecer da Co- mente não passará o resto de seus dias
missão Técnica de Classificação e do atrás das grandes porque beneficiado
exame criminológico quando neces- com vários favores legais, especialmen-
sário.» te a unificação de penas.
2. Vê-se que a par dos requisitos obje- Nem mesmo no cárcere seu instinto
tivos necessários à progressão de regime, a violento arrefeceu; recentemente, veio a
lei estabelece um de natureza subjetiva, praticar três homicídios — dois consu-
relativo ao mérito do condenado, a ser apre- mados e um tentado, todos qualificados,
ciado motivadamente pelo Juiz das Execu- contra companheiros seus de presídio.
ções Criminais, que assim se manifestou no Ainda que se leve em conta as pon-
caso concreto, in verbis (fl. 31): derações da zeloza defensoria —incum-
«Sabe-se que no regime semi-aberto bida da tarefa ingrata, reconheça-se, não
são adotadas medidas de pouca restrição há como enxergar, em Eudécio, qual-
corporal — v.g. a possibilidade de tra- quer virtude que possa habilitá-lo a uma
balho externo, as saídas temporárias, progressão.
etc. —, compatíveis tão-somente com Precisará evoluir, e muito, para co-
aqueles que tenham externado disposi- meçar a pensar em obter benefícios pri-
ção de não frustar a execução da pena. sionais».
196 R.T.J. —158

Esta decisão foi confirmada pelo Tri- exigências do art. 112, da LEI', eis que o
bunal coator em toda a sua extensão, o qual requisito subjetivo — relativo ao mereci-
fez alguns acréscimos, além do já citado no mento — e sujeito à livre apreciação do
parecer do Ministério Público Federal, in Juiz, não foi reconhecido em decisão que
verbis (fls. 32/34): está motivada na forma da lei.
«É certo que o agravante já cumpriu, 4.1 Segue-se que o rito especial e sumá-
com bom comportamento, em regime rio do habeas corpus não se compadece
fechado, mais de um sexto da pena de com o exame do mérito do sentenciado, para
42 anos de reclusão, que lhe foi imposta, o efeito de promoção de regime prisional.
por crimes de latrocínio, roubo qualifi- Isto posto e acolhendo o parecer do
cado e homicídio, sendo-lhe favorável o Ministério Público Federal, conheço do pe-
exame criminológico. dido, mas indefiro a ordem impetrada.
Todavia, o agravante praticou crimes Por se tratar de paciente preso e sem
que encontram natural repulsa no seio advogado constituído nos autos, determino
da sociedade, estando o término da pena à Secretaria que se lhe envie cópia desta
previsto para setembro de 2016. decisão.
... em se tratando de sentenciado que EXTRATO DA ATA
cometeu crimes graves, recomendável
maior dose de cautela quanto à inclusão em HC 72.578 — SP — Rel.: Min. Maurí-
sistemas mais brandos, principalmente cio Corrêa. Pacte.: Eudécio Benedito Zum-
em regime semi-aberto, onde as restrições bianchi. Impte.: o mesmo. Coator: Tribunal
à liberdade corporal são mais fracas do de Justiça do Estado de São Paulo.
que aquelas econtradas no atual regime.
Decisão: Por unanimidade, a Turma in-
deferiu o «habeas corpus».
Nestas condições, ao menos por ora, Presidência do Senhor Ministro Néri da
deve permanecer em regime mais seve- Silveira. Presentes à Sessão os Ministros Car-
ro; nenhum reparo comportando a deci- los Velloso, Marco Aurélio, Francisco Rezek
são guerreada, fica mantida por seus pró- e Maurício Corres Subprocurador-Geral da
prios e bem deduzidos fundamentos.» República, o Dr. Mardem Costa Pinto.
Verifico que, contrariamente ao que Brasília, 19 de setembro de 1995 —
alega o paciente, não foram atendidas todas Wagner Amorim Madoz, Secretário.

HABEAS CORPUS N° 72.805 — SP


(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Maurício Corrêa
Paciente e Impetrante: José Cicero Dantas — Coator: Tribunal de Alçada
Criminal do Estado de São Paulo
Habeas corpus. Crimes da mesma espécie: práticas sucessivas;
continuidade delitiva: penas: unificação.
1. Crimes de roubo qualificado pelo concurso de agentes e
emprego de arma, perpetrados sucessivas vezes por quem faz hábito da
R.T.J. — 158 197

ação delitiva como meio de vida, não configuram crime continuado para
efeito de unificação das penas.
2. Habeas Corpus indeferido.

ACÓRDÃO 17' Vara Criminal/SP — condenado a 6


(seis) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias
Vistos, relatados e discutidos estes au- de reclusão, fato ocorrido no dia 22-5-77;
tos, acordam os Ministros componentes da 8°) Processo n° 1.031/77 — 30' Vara Cri-
Segunda Turma do Supremo Tribunal Fe- minal/SP — condenado a 6 (seis) anos, 7
deral, na conformidade da ata do julgamen- (sete) meses e 2 (dois) dias de reclusão,
to e das notas taquigráficas, por unanimi- crime praticado no dia 25-5-77.
dade de votos, indeferir o «habeas empas».
Portanto, o total das penas é de 62 (ses-
Brasília, 3 de outubro de 1995 — Néri senta e dois) anos, 6 (seis) meses e 12
da Silveira, Presidente — Maurício Cor- (doze) dias de reclusão.
rêa, Relator.
Alega o impetrante e paciente fazer jus
RELATÓRIO à unificação das penas, a teor do art. 71 do
Código Penal, porquanto os crimes por ele
O Sr. Ministro Maurício Corrêa: Cui- praticados são da mesma espécie e, pelas
da-se de habeas corpus impetrado pelo condições de tempo, lugar, maneira de exe-
próprio paciente, objetivando a unificação cução e outras semelhantes, configura-se o
das penas que lhe foram impostas em oito crime continuado.
processos, como incurso nas sanções do
art. 157, § 2°, 1 e II, do Código Penal, a Solicitadas as informações, prestou-as o
saber: 1°) Processo n° 1.347/77 — 17' Vara Exmo. Sr. Desembargador-Presidente do
Criminal/SP — condenado a 8 (oito) anos Tribunal de Alçada Criminal do Estado de
de reclusão, por crime praticado no dia São Paulo, apontado como autoridade coa-
8-3-77; 2°) Processo n° 1.414/77 — 19' tora, esclarecendo que: a) por petição de
Vara Criminal/SP — condenado a 6 (seis) 24-9-86, o impetrante e paciente requereu,
anos de reclusão, por fato ocorrido no dia perante o Juízo da Vara de Execuções Cri-
8-3-77, portanto, no mesmo dia; 3°) Proces- minais da Comarca de São Paulo, a unifi-
so n° 1.157/77 -- 4' Vara Criminal/Santo cação das reprimendas aflitivas que lhe fo-
André/SP — condenado a 6 (seis) anos, 2 ram aplicadas em sete ações penais, sendo-
(dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, lhe indeferido o pedido, em 15-1-87; b)
por delito cometido no dia 14-3-77; 4°) inconformado, interpôs agravo em execu-
Processo n° 1.429/77 — 17' Vara Crimi- ção, porém, mantida a decisão pelo Juiz de
nal/SP — condenado a 16 (dezesseis) anos Primeiro Grau, a Quinta Câmara do Tribu-
de reclusão, fato ocorrido no dia 24-3-77; nal de Alçada Criminal deu provimento ao
5°) Processo n° 1.167/77 — 20' Vara Cri- recurso para unificar as penas em dois gru-
minal/SP — condenado a 7 (sete) anos, 3 pos, resultando em 33 (trinta e três) anos,
(três) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, 10 (dez) meses e 19 (dezenove) dias de
delito praticado no dia 28-3-77; 6°) Proces- reclusão, cujo acórdão transitou em julgado
so n° 1.305/77 — 15' Vara Criminal/SP — em 17-10-88; c) o impetrante e paciente
condenado a 6 (seis) anos, 2 (dois) meses e requereu Revisão Criminal, que se encon-
20 (vinte) dias de reclusão, fato ocorrido no tra em fase de requisição dos autos da Exe-
dia 20-5-77; 7°) Processo n° 1.090/77 — cução.
198 R.T.J. — 158

Oficiando às fls. 152/155, o Ministério e 19 (dezenove) dias, como resultante da


Público Federal, em parecer da lavra do unificação das penas relativas à primeira
ilustre Subprocurador-Geral em exercício, série de delitos cometidos em março/87,
Dr. Edson Oliveira de Almeida, opina pelo (24 anos), somada à unificação das penas
indeferimento da ordem. relativas à segunda série de crimes perpe-
É o relatório. trados em maio/77 (9 anos, 10 meses e 19
dias).
VOTO Ao meu ver, o tempo decorrido entre a
primeira e a segunda série de crimes prati-
O Sr. Ministro Maurício Corrêa (Re- cados não autoriza que se os compreenda
lator): Percebe-se que os crimes pelos quais como uma só ação delitiva continuada, para
o impetrante e paciente está condenado fo- ensejar a pretendida unificação das penas.
ram cometidos em duas séries distintas, Como assevera o douto representante do
cada uma das quais em lapso temporal in- Ministério Público Federal, «na verdade,
ferior a um mês. A primeira série, os ocor- nem a unificação em dois grupos se poderia
ridos nos dias 8, 14, 24 e 28 de março de admitir, pois a jurisprudência predominan-
1977, relativos aos processos n°s 1.347/77 te do Supremo Tribunal Federal se orienta
17° Vara Criminal/SP, 1.414/77 — 19' no sentido de não admitir a unificação de
Vara CriminallSP, 1.157/77 —4° Vara Cri- penas nos casos de mera reiteração crimi-
minal/Santo André/SP, 1.429/77 — 17° nosa, por quem, faz do crime de roubo meio
Vara Criminal/SP, e 1.167/77 — 20° Vara de vida.»
Criminal/SP. Na segunda série estão os
E acrescenta a seguinte ementa:
perpetrados nos dias 20, 22 e 25 de maio de
1977, relativos aos processos n°s 1.305/77 «Habeas corpus — crime de
15° Vara Criminal/SP, 1.090/77 — 17' roubo — condenações penais di-
Vara Criminal/SP, e 1.031/77 — 30' Vara versas por práticas sucessivas —
Criminal/SP. pretendido reconhecimento do
Esses delitos foram cometidos na co- nexo de continuidade delitiva —
marca da Capital, exceto um, na de Santo inocorrência —mera reiteração de
André; todos da mesma espécie (roubos crimes — ordem denegada.
qualificados pelo concurso de agentes e
emprego de arma), tendo sido perpetrados Prática reiterada e habitual do cri-
contra empresas comerciais locais, obser- me de roubo por delinqüentes contu-
vando-se que para o concurso de agentes, o mazes, reunidos em quadrilha, ou
ora impetrante e paciente valeu-se de com- não, que dela fazem, mediante com-
parsas comuns. portamento individual ou coletivo,
uma atividade delitiva. O assaltante
É certo que alguns decisórios dos nossos que assim procede não pode fazer jus
tribunais têm admitido o prazo de um mês ao benefício derivado do reconheci-
para o reconhecimento do liame da conti- mento da ficção jurídica do crime
nuidade. continuado. A mera reiteração no cri-
Outro não foi o critério que orientou o me que se não confunde e nem se
acórdão da Quinta Câmara do Tribunal a reduz, por si só, a noção de delito
quo, ao dar provimento ao agravo interpos- continuado. Traduz eloqüente atesta-
to pela defesa, reduzindo o total das penas ção do elevado grau de temibilidade
para 33 (trinta e três) anos, 10 (dez) meses social daquele que a pratica.
R.T.J. — 158 199

O reconhecimento do crime con- Diante do exposto, conheço do pedido


tinuado — que faz afastar a incidên- de habeas corpus, mas o indefiro.
cia da regra do cúmulo material das
É o meu voto.
penas. Reveste-se de caráter excepcio-
nal, devendo, para os efeitos jurídicos-
EXTRATO DA ATA
penais dele resultantes, ficar plena-
mente configurado em todos os ele-
mentos e pressupostos que lhe com- HC 72.805 — SP — Rel.: Min. Maurí-
põem o perfil legal e a noção concei- cio Corrêa. Pacte.: José Cicero Dantas.
tuai. (HC 68.124-DF, rel. Min. Celso Impte.: O mesmo. Coator: Tribunal de Al-
de Mello, DJ 8-3-91, pág. 2201). çada Criminal do Estado de São Paulo.
Decisão: Por unanimidade, a Turma in-
No mesmo sentido: HC 68.626-SP, deferiu o «habeas corrais.»
rel. Min. Célio Borja, RTJ 137(2):
764, ago. 1991; HC 69.059-SP, rel. Presidência do Senhor Ministro Néri da
Min. Néri da Silveira, RTJ 143(3): Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
883, mar. 1993; HC 69.381-SP, rd. Ministros Marco Aurélio, Francisco Rezek
Min. Paulo Brossard, RTJ 145(2): 569, e Maurício Corrêa. Ausente, justificada-
ago. 1993; HC 69.899-SP, rel. Min. mente, o Senhor Ministro Carlos Velloso.
Néri da Silveira, DJ 6-5-94, pág. Subprocurador-Geral da República, o Dr.
10846; HC 70.019-SP, rel. Min. Paulo Cláudio Lemos Fonteles.
Brossard, DJ 19-12-94 (apenas para Brasilia, 3 de outubro de 1995 — Wag-
citar os arestos mais recentes).» ner Amorim Madoz, Secretário.

HABEAS CORPUS N" 72925 — RS


(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Maurício Corrêa
Paciente: Darlan da Silva Adriano —Impetrante: Paulo Diedrich de Lavigne
— Coator: Tribunal Militar do Estado do Rio Grande do Sul

Habeas corpus. Justiça Militar Estadual. Processo penal mili-


tar. Inquérito policial militar: arquivamento. Ação penal: Trancamento.

Na Justiça Militar o Juiz-Corregedor, após a reaprecia-


ção do inquérito, poderá opor-se à decisão do Juiz-Auditor que determi-
nou o seu arquivamento a pedido do Promotor de Justiça.

Não caracteriza constrangimento ilegal a decisão da Corte


Castrense que, entendendo existentes indícios de crime e de sua autoria,
acolhe a representação do Juiz-Corregedor, remetendo os autos ao Procu-
rador-Geral da Justiça Militar, para os fins previstos no art. 397 do CPPM.
200 R.T.J. —158

Havendo fato criminoso em tese, nada justifica trancar-se


a ação penal antes da conclusão do exame instrutório que possibilita
elucidar, pelo conjunto probatório, a inocência ou não do acusado e se o
mesmo agiu ou não no estrito cumprimento de seu dever legal.
Habeas Carpas indeferido.
ACÓRDÃO realmente se verificou, encontrando-se o
paciente já denunciado.
Vistos, relatados e discutidos estes au- Alegando que houve error in judicando
tos, acordam os Ministros componentes da e afronta à Súmula 524 desta Corte, pede
Segunda Turma do Supremo Tribunal Fe- o impetrante o trancamento da ação penal.
deral, na conformidade da ata do julgamen-
to e das notas taquigráficas, por unanimi- Prestadas as informações, sustenta o
dade de votos, indeferir o «habeas corpus». Juiz-Presidente do TJMRS, às fls. 26/27,
que ao contrário do que ocorre na Justiça
Brasília, 19 de setembro de 1995 — Comum, na Justiça Militar o inquérito só se
Nérl da Silveira, Presidente — Maurício toma definitivo após a reapreciação do caso
Corrêa, Relator. pelo Juiz-Corregedor. E que, designado ou-
tro Promotor, entendera este em denunciar
RELATÓRIO o paciente e seus companheiros de patrulha
com fulcro no artigo 209, § 1° c/c o artigo
53, todos do CPM, encontrando-se o
O Sr. Ministro Maurício Corrêa: Cui-
da-se de impetração em favor de paciente r
feito em tramitação na Auditoria Militar
de Porto Alegre, e já designado o dia
que no dia 25 de fevereiro de 1993, na
companhia de colegas de farda, em policia- 28-12-1995 para a audiência de inquirição
mento ostensivo, durante o período carna- da vítima e das demais testemunhas arrola-
valesco, ao longo da Avenida Augusto de das pela acusação.
Carvalho, em Porto Alegre, teria espancado Às fls. 34/36, em parecer do ilustre Sub-
Marco Aurélio de Oliveira. procurador-Geral, Dr. Edson Oliveira de
O órgão do Ministério Público junto à 2' Almeida, manifesta-se o MPF pelo indefe-
Auditoria Militar, reconhecendo existir a rimento da ordem.
excludente de criminalidade do estrito É o relatório.
cumprimento do dever legal, propôs o ar-
quivamento do inquérito, que foi deferido VOTO
pelo Juiz Auditor. O Sr. Ministro Mauricio Corrêa (Re-
Inconformado com o arquivamento, o lator): Na Correição Parcial n° 744/94 (fls.
Juiz-Corregedor representou ao Tribunal 28/30), assim colocou a questão o acórdão
Militar do Estado, com base no artigo 498, impugnado: «Em face do que foi apurado
alínea b, do CPPM, contra a decisão que no procedimento investigatório, há vee-
mandou arquivar o inquérito, determinan- mentes indícios de que o fato típico, basea-
do a seguir à Corte Castrense, se oficiasse do no inegável abuso cometido, vem retra-
ao Procurador-Geral da Justiça Militar, no tado no próprio acontecimento decorrente
sentido de reexaminar a matéria, que, a da intervenção policial, e a vítima, diante
juízo daquela Corte, pareceu reunir condi- da ação dos PMs, acabou sofrendo séria
ções para o oferecimento de denúncia, que contusão abdominal, com perigo de vida,
R.T.J. — 158 201

cujos ferimentos foram identificados pelo Por tais razões, conheço do presente ha-
laudo de exame de corpo de delito como beas corpus, mas o indefiro.
provenientes de instrumento contundente».
Como se vê, até aqui, há mais do que VOTO
fundamento para a abertura da ação penal.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor
Como salientado pelo MPF «a tese do Presidente, pelo menos em duas oportuni-
impetrante não se coaduna com a natureza dades, o Tribunal, defrontando-se com a
subjetivamente complexa do ato de arqui- regra inserta no artigo 498 do Código de
vamento de inquéritos na Justiça Militar» Processo Penal Militar, assentou que a re-
(Código de Processo Penal Militar, art. presentação nele prevista aplica-se também
498, b; Lei n° 8.457/92 — Organização no âmbito dos tribunais militares estaduais.
Judiciária Militar — art. 14, I, c). Refiro-me ao Habeas Corpus n° 61.301,
Senhor Presidente, esta Corte já apre- relatado pelo Ministro Alfredo Buzaid, e ao
ciou a matéria, sendo paradigmas da hipó- Habeas Corpus n° 61.416, da relatoria do
tese dos autos, dentre outros, os arestos Senhor Ministro Francisco Rezek.
relatados pelo Mim Sepúlveda Pertence Portanto, há interpretação da Corte
nos HC 68.739-DF (DJU 25-10-91, pág. quanto aos preceitos dos artigos 397 e 498
15029) e HC 68.739-3 (EDEc1)-DF (DJU do Código de Processo Penal Miltiar.
7-2-92, pág. 73718), resultando este último
no seguinte: Concluiu-se que a representação é pos-
sível, ainda que não se trate de processo da
«Inquérito policial militar: arquiva- competência originária do Superior Tribu-
mento: aplicação da Súmula 524, que nal Militar.
pressupõe prévia adequação dos seus
termos ao C. Pr. Penal Militar. Voto em sentido harmônico com esse
entendimento.
O arquivamento do inquérito, na lei
processual militar, só se aperfeiçoa de- Se é certo que, em face ao teor do artigo
pois de exaurido o prazo para a apresen- 397, proposto o arquivamento do inquérito,
tação do Corregedor (CPPM, art. 498, § pode o juiz com ele concordar, ou não,
1°) ou, oferecida essa, com a decisão do sendo que, em caso negativo, deve remeter
STM que a indeferir ou com o novo os autos ao Procurador-Geral, e, em caso
despacho do Juiz que, insistindo o Pro- positivo, deve proceder ao arquivamento,
curador-Geral, determinar o arquiva- não menos correto é que essa norma é com-
mento: só a partir daí caberá cogitar, plementada, na dicção da própria Corte,
segundo a orientação da Súmula 524, pelo texto da alínea b do artigo 498, inseri-
da exigência de novas provas para auto- do no mesmo Código,
rizar a ação penal.» Quanto ao que articulado na petição de
Nada justifica, por hora, trancar-se a habeas corpus, tenho como impossível o
ação penal antes da conclusão do exame exame. O que se aponta é que não teria
instrutório que possibilitará elucidar, atra- ocorrido o arquivamento do inquérito sem
vés do conjunto probatório, a inocência ou uma justificativa plausível. O tema exige a
não, se agiu, ou não, no estrito cumprimen- análise de prova, o que é inviável na via
to de seu dever legal o paciente. É, pois, eleita.
prematura qualquer deliberação que vise Por isso, acompanho o Relator, dene-
obstaculizar o andamento do processo. gando a ordem.
202 R.T.J. —158

EXTRATO DA ATA Presidência do Senhor Ministro Néri da


HC 72.925 — RS — Rel.: Min. Maurí- Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
cio Corrêa. Pacte.: Darlan da Silva Adria- Ministros Carlos Velloso, Marco Aurélio,
no. Impte.: Paulo Diedrich de Lavigne. Francisco Rezek e Maurício Corrêa. Sub-
Coator: Tribunal Militar do Estado do Rio procurador-Geral da República, o Dr. Mar-
Grande do Sul. dem Costa Pinto.
Decisão: Por unanimidade, a Turma in- Brasilia, 19 de setembro de 1995 —
deferiu o «habeas corpus». Wagner Amorim Madoz, Secretário.

RECURSO EXTROARDINÁRIO N° 130.013 — RS


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Recorrente: Navegação Frota Esperança Ltda. — Recorrido: Unibanco Lea-
sing S/A — Arrendamento Mercantil
Constitucional. Anistia. Correção monetária. Leasing. ADCT
à CF/88, art. 47.
1. O leasing envolve locação de bens móveis. Por não consti-
tuir o leasing, juridicamente, uni contrato de mútuo, não se lhe aplica a
anistia prevista no art. 47 do ADCT.
II. RE não conhecido.

ACÓRDÃO til, julgados improcedentes pela sentença


de fls. 113/117.
Vistos, relatados e discutidos estes au- A Quarta Câmara Cível do Tribunal de
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- Alçada do Estado, por unanimidade, negou
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- provimento à apelação das embargantes.
formidade da ata do julgamento e das notas Entendeu o aresto de fls. 140/143 que: a) o
taquigráficas, por decisão unânime, não co- contrato de leasing, por ter natureza jurídi-
nhecer do recurso extraordinário. ca diversa do mero mútuo, não pode ser
contemplado com o benefício do art. 47 do
Brasília, 22 de fevereiro de 1994 —
ADCT; b) «a invocação da teoria da impre-
Néri da Silveira, Presidente — Carlos visão decorrente da perda do poder aquisi-
Velloso, Relator. tivo não vinga, consoante é iterativo e; c) a
alegação de cumulação de comissão de per-
RELATÓRIO manência e correção monetária ou desta e
daquela com juros, havida por ilegal, ou
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata- não se deu, porque não demonstrada, ou
se de embargos opostos por Navegação não é ilegal.
Frota Esperança Ltda. e Adalberto Jung
Filho à execução que lhes move Unibanco Inconformados os apelantes interpõem
Leasing S/A — Arrendamento Mercan- recurso extraordinário, com fundamento no
R.T.J. — 158 203

art. 102, III, a, da Constituição Federal, sivo Constitucional), a deduzir alegação


alegando violação ao art. 47 do ADCT. de vulneração ao art. 47 do ADCT, pre-
Sustentam que «a norma constitucional não tendendo, ao buscar apoio em ensina-
limitou e/ou excluiu contratos de leasing mentos doutrinários de alguns autores,
do beneffcio da anistia, e na medida em que demonstrar que o contrato de leasing ou
tal decorre de iniciativa do acórdão —mui- arrendamento mercantil envolveria ba-
to embora admita tratar-se de um tipo de sicamente uma operação de financia-
financiamento e, por via de conseqüência, mento, e como tal estaria o arrendatário
de um empréstimo — não há meios e mo- ao abrigo da isenção de correção mone-
dos de entender-se a decisão que não como tária prevista no citado dispositivo cons-
resultado de flagrante violação do texto titucional.
constitucional».
O recurso não merece prosperar.
Admitido o recurso na origem, subiram O E. Tribunal a quo, ao decidir como
os autos. decidiu, não contrariou o art. 47 do
O ilustre Subprocurador-Geral da Repú- ADCT, antes lhe conferindo a mais
blica, em substituição, Paulo de Tarso Braz acertada interpretação. Diga-se o que
Lucas, oficiando às fls. 164/166 opina pelo quiser a respeito da natureza jurídica do
não conhecimento do recurso. contrato de leasing, mas o mínimo que
pode ser digerido como aceitável ou ver-
É o relatório. dadeiro é que ele se assemelha ou tem
elementos assemelhados aos do contra-
VOTO
to de mútuo ou empréstimo. E isto não
O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela- parece suficiente para permitir a aplica-
tor): A Procuradoria-Geral da República, ção do referido dispositivo constitucio-
no parecer de fls. 164/166, lavrado pelo nal, beneficiando quem não foi por ele
ilustre Subprocurador-Geral Paulo de Tar- contemplado.
so Braz Lucas, assim deslindou a contro- No dispositivo em exame, alude-
vérsia: se a quaisquer empréstimos concedidos
«1. Trata-se de recurso extraordiná- por instituições financeiras, não haven-
rio interposto pela empresa Navegação do como dilargar o seu sentido para
Frota Esperança Ltda. em face do r. abranger contratos outros, que, como o
acórdão de fls. 136/143, pelo qual a leasing, quando muito, têm uma causa
Quarta Câmara Cível do Tribunal de assemelhada à do contrato de mútuo,
Alçada do Estado do Rio Grande do Sul, mas diferem essencialmente deste, ao
ao negar provimento à apelação da ora ponto de receberem um tratamento le-
recorrente, confirmou a sentença (fls. gislativo específico que em muitos as-
113/117) que julgou improcedentes os pectos é mais benéfico para as partes
seus embargos à execução, movida esta contratantes, pelo menos no ponto de
pela empresa Unibanco Leasing S/A — vista fiscal.
Arrendamento Mercantil. 5. E não se venha buscar apoio no
2. Tendo nos referidos embargos e método teleológico de interpretação, o
nas razões de apelação suscitado diver- qual de qualquer modo em nada favore-
sas questões, limitou-se a recorrente, na ceria a tese sustentada pela agravante. O
petição de interposição do recurso em fim da norma em comento não foi o de
exame (fundado na alínea a do Permis- beneficiar indiscriminadamente pes-
204 R.T.J. — 158

soas ou empresas com débitos de qual- Está correto o parecer.


quer natureza para com instituições fi-
nanceiras. E por isso é que tratou o Ao decidir o AG n° 147.553-SC, regis-
Constituinte de definir limites bem es- trei que, quando integrava o Superior Tri-
treitos capazes de permitir a identifica- bunal de Justiça, no julgamento do REsp n°
ção dos reais beneficiários. Aliás, embo- 61-SP (DJ de 4-12-89), manifestei o enten-
ra de importância primordial, o método dimento no sentido de que a sociedade que
mencionado não dispensa uma certa pratica o leasing não faz nenhum emprés-
cautela, de modo a que não venha servir timo de dinheiro. O que ocorre, na operação
de instrumento espúrio daqueles que, de leasing, é a cessão de equipamento me-
muitas vezes esquecendo que o Direito diante uma certa remuneração, com a opção
é basicamente uma ciência dogmática, de compra no final do contrato. Em termos
procuram atingir resultados claramente econômicos, pode-se afirmar que o ele-
inconciliáveis com a norma, tal como mento desse contrato — o contrato de mú-
expressa gramaticalmente. É Carlos tuo — está presente no leasing; em termos
Maximiliano que, com sua habitual pro- jurídicos, entretanto, o elemento que pre-
ficiência, adverte (Herméutica e Aplica- domina é o da locação: cessão de equipa-
ção do Direito, 91 ed., Rio de Janeiro, mento, do bem, mediante o pagamento de
Forense, 1979, pág. 151): um aluguel. No RE n° 106.047-SP, Relator
'O fim não revela, por si só, os o Sr. Ministro Rafael Mayer, a l'' Turma
meios que os autores das expressões não destoou desse entendimento (RTJ
de Direito puseram em ação para o 116/811), vale dizer, do entendimento no
realizar; serve entretanto, para fazer sentido de que o leasing envolve locação
melhor compreendê-los e desenvol- de bens móveis. Sendo assim, por não cons-
vê-los em suas minúcias. Por conse- tituir o leasing, em termos jurídicos, um
guinte, não basta determinar a finali- contrato de mútuo, não se lhe aplica a anis-
dade prática da norma, a fim de re- tia prevista no art. 47 do ADCT, tal como
constituir o seu verdadeiro conteúdo; decidiu o acórdão recorrido.
cumpre verificar se o legislador, em
outras disposições, já revelou prefe- Do exposto, não conheço do recurso.
rência por um meio, ao invés de ou-
tro, para atingir o objetivo colimado; EXTRATO DA ATA
se isto não aconteceu, deve-se dar a
primazia ao meio mais adequado RE 130.013 — RS — Rel.: Min. Carlos
para atingir aquele fim de modo ple- Velloso. Recte.: Navegação Frota Esperan-
no, completo, integral. Não se deve ça Ltda. (Adv.: Valério Valter de Oliveira
ficar aquém, nem passar além do es- Ramos). Recdo.: Unibanco 1 Pasing S/A —
copo referido; o espírito da norma há Arrendamento Mercantil (Adv.: Elvio Cas-
de ser entendido de modo que o pre- tiglia de Souza)
ceito atinja completamente o objeti-
vo para o qual a mesma foi feita, Decisão: Por unanimidade, a Turma não
porém dentro da letra dos dispositi- conheceu do recurso extraordinário.
vos. Respeita-se esta, e concilia-se Presidência do Senhor Ministro Néri da
com o fim...'. Silveira. Presentes à Sessão, os Senhores
6. Pelo exposto, somos pelo não co- Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso,
nhecimento do recurso.» (fls. 164/166) Marco Aurélio e Francisco Rezek. Subpro-
R.T.J.— 158 205

curador-Geral da República, o Dr. Francis- Brasília, 22 de fevereiro de 1994 — José


co José Teixeira de Oliveira. Wilson Aragão, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 134.297 — SP


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello


Recorrente: Estado de São Paulo — Recorridos: Paulo Ferreira Ramos e
cônjuge
Recurso extraordinário — Estação ecológica — Reserva flo-
restal na Serra do Mar — Patrimônio Nacional (CF, art. 225, § 4°) —
Limitação administrativa que afeta o conteúdo econômico do direito de
propriedade — Direito do proprietário à indenização — Dever estatal de
ressarcir os prejuízos de ordem patrimonial sofridos pelo particular — RE
não conhecido.
Incumbe ao Poder Público o dever constitucional de pro-
teger a flora e de adotar as necessárias medidas que visem a coibir
práticas lesivas ao equilíbrio ambiental. Esse encargo, contudo, não
exonera o Estado de obrigação de indenizar os proprietários cujos imó-
veis venham a ser afetados, em sua potencialidade econômica, pelas
limitações impostas pela Administração Pública.
A proteção jurídica dispensada às coberturas vegetais
que revestem as propriedades imobiliárias não impede que o dominas
venha a promover, dentro dos limites autorizados pelo Código Florestal,
o adequado e racional aproveitamento econômico das árvores nelas
existentes. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e dos Tribu-
nais em geral, tendo presente a garantia constitucional que protege o
direito de propriedade, firmou-se no sentido de proclamar a plena
indenizabilidade das matas e revestimentos florestais que recobrem áreas
dominiais privadas objeto de apossamento estatal ou sujeitas a restrições
administrativas impostas pelo Poder Público. Precedentes.
A circunstância de o Estado dispor de competência para
criar reservas florestais não lhe confere, só por si — considerando-se os
princípios que tutelam, em nosso sistema normativo, o direito de pro-
priedade —, a prerrogativa de subtrair-se ao pagamento de indenização
compensatória ao particular, quando a atividade pública, decorrente do
exercício de atribuições em tema de direito florestal, impedir ou afetar a
válida exploração econômica do imóvel por seu proprietário.
A norma inscrita no art. 225, 4°, da Constituição deve
ser interpretada de modo harmonioso com o sistema jurídico consagrado
pelo ordenamento fundamental, notadamente com a cláusula que, pro-
206 R.T.J. — 158

clamada pelo art. 5°, XXII, da Carta Política, garante e assegura o direito
de propriedade em todas as suas projeções, inclusive aquela concernente
à compensação financeira devida pelo Poder Público ao proprietário
atingido por atos imputáveis à atividade estatal.
O preceito consubstanciado no art. 225, 4°, da Carta da
República, além de não haver convertido em bens públicos os imóveis
particulares abrangidos pelas florestas e pelas matas nele referidas
(Mata Atlântica, Serra do Mar, Floresta Amazônica brasileira), também
não impede a utilização,pelos próprios particulares, dos recursos naturais
existentes naquelas áreas que estejam sujeitas ao domínio privado, desde
que observadas as prescrições legais e respeitadas as condições necessá-
rias à preservação ambiental.
A ordem constitucional dispensa tutela efetiva ao direito
de propriedade (CF/88, art. 5°, XXII). Essa proteção outorgada pela Lei
Fundamental da República estende-se, na abrangência normativa de sua
incidência tutelar, ao reconhecimento, em favor do dominus, da garantia
de compensação financeira, sempre que o Estado, mediante atividade que
lhe seja juridicamente imputável, atingir o direito de propriedade em seu
conteúdo econômico, ainda que o imóvel particular afetado pela ação do
Poder Público esteja localizado em qualquer das áreas referidas no art.
225, 4°, da Constituição.
Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado: a
consagração constitucional de um típico direito de terceira geração (CF,
art. 225, caput).

ACÓRDÃO efeito de ato formal do Poder Público


estadual, à criação da Estação Ecológica
Vistos, relatados e discutidos estes au- Juréia-Itatins.
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Primeira Turma, na con- O acórdão ora impugnado (fls. 879/885)
formidade da ata do julgamento e das notas ao negar provimento ao recurso deduzido
taquigráficas, por unanimidade de votos, pelo Estado de São Paulo, asseverou, ver-
em não conhecer do recurso extraordinário. bis:
Brasília, 13 de junho de 1995 —Morei- «Inicialmente, deve ser examinada a
ra Alves, Presidente — Celso de Mello, primeira questão que emerge dos ele-
Relator. mentos contidos nestes autos, qual seja
a da indenizabilidade ou não das matas
RELATÓRIO que recobrem a área apossada pela Fa-
zenda do Estado.
O Sr. Ministro Celso de Mello: O Es-
tado de São Paulo recorre extraordinaria- O Relator deste Acórdão já teve a
mente de decisão que, proferida pelo Tri- oportunidade de manifestar-se a respei-
bunal de Justiça do Estado de São Paulo, to do problema, quando relatou outro
condenou essa pessoa estatal ao pagamento julgado, como integrante da E. 16' Câ-
de indenização aos proprietários de imóvel mara Civil, desta Corte (RJTJESP, vol.
rural abrangido por área destinada, por 90/196), asseverando, então:
R.T.J. — 158 207

`Ficou bem elucidado que a inde- Por todos esses motivos é mantido o
nizabilidade, na hipótese, transmu- valor indenizatório contido na sentença
daria a mera restrição administrativa,
consubstanciada na proibição de
derrubada de mata, em verdadeiro
confisco, gerando servidão pública A afirmativa da ré impugnante, no
de caráter negativo, o que é inadmis- sentido de a nova Constituição da Repú-
sível. Isso porque, nada obstante blica, ao tratar da proteção ambiental,
aquela restrição, o certo é que o ter introduzido profundas alterações no
aproveitamento econômico dessa direito positivo, de tal forma que procla-
mata, com outras finalidades, não é mou a inexigibilidade de qualquer inde-
vedado. nização pelos atos administrativos de
intervenção na propriedade privada com
É induvidoso, ademais, que a pro- objetivos ecológicos, na verdade não
teção dispensada pela lei a essas ma- encontra ressonância na própria Lei
tas, no que concerne à sua preserva- Maior, a qual, como suas antecessoras,
ção, reflete, diretamente, a utilidade continua a dar proteção ao direito de
de que se revestem, com evidente propriedade, atendida a sua função so-
expressão econômica, que se acres- cial e, nos casos de desapropriação, res-
centa ao valor da terra nua guardada a justa e prévia indenização
em dinheiro, ressalvados os casos pre-
vistos constitucionalmente (incisos
Daí, ser iniludível que a terra que
XXII, XXIII e XXIV).
possua esse acessório (art. 43, inciso
I, do CC) terá um valor bem maior do E a citação do art. 225, de seu § 1°,
que aquelas outras que não o osten- inciso VIII, e de seu § 4°, para justificar
tem, pelo que, inquestionavelmente, que as terras situadas na Serra do Mar,
se impõe a respectiva indenização, na por constituírem patrimônio nacional,
hipótese de ocorrer o ato expropria- não podem ser indenizadas, é inócua e
tório.' sem fundamento, pois que tais preceitos
não dizem, em absoluto, tal coisa, bas-
tando, para que assim se conclua, a sim-
Apenas e em síntese, pode-se asseve- ples leitura dos respectivos trechos.
rar que, da análise do Código Florestal, Realmente, depois de afirmar, em
feita com todo o cuidado pela sentença, seu caput, que todos têm direito ao meio
depreende-se que os autores jamais po- ambiente ecologicamente equilibrado,
deriam abater todas as árvores ao mes- prescreve o citado art. 225, em seu pa-
mo tempo, ainda que em zona de incli- rágrafo único e inciso VII, que incumbe
nação inferior a 25 graus, só podendo ao Poder Público, para assegurar a efe-
fazê-lo na base de 50%, sendo obrigados tividade desse direito, 'proteger a fauna
a manter íntegra a outra metade. Não e a flora, vedadas, na forma da lei, as
podendo cortar toda a vegetação, mas, práticas que coloquem em risco sua fun-
apenas, metade dela, é óbvio que seu ção ecológica, provoquem a extinção de
lucro não seria nunca total, isto é, cor- espécies ou submetam os animais a
respondente à totalidade das matas, au- crueldade'. E, em seu parágrafo 4° dis-
ferindo, tão-somente, o referente a 50%, põe que 'A Floresta Amazônica brasilei-
no máximo. ra, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o
208 R.T.J. — 158

Pantanal Mato-grossense e a Zona Cos- Isto é, para o v. Acórdão é inócuo


teira são patrimônio nacional, e sua uti- (sic) o conteúdo do art. 225, especial-
lização far-se-á, na forma da lei, dentro mente, seu parágrafo 4°!
de condições que assegurem a preserva- Assim decidindo, o v. Acórdão re-
ção do meio ambiente, inclusive quanto corrido obviamente, contrariou disposi-
ao uso dos recursos naturais'. tivo constitucional, segundo se passa a
Ora, com todo o respeito, não se vê demonstrar.
como tirar dos dispositivos supra a ila-
ção extraída pela ré, para asseverar que
as terras localizadas na Serra do Mar não De seu texto cristalino se insere que
podem ser indenizadas, em caso de de- a Mata Atlântica e a Serra do Mar, são
sapropriação ou de apossamento admi- bens de uso comum do povo, consti-
nistrativo. tuindo patrimônio nacional, cuja utili-
zação obedecerá as limitações impostas
Dessa maneira, os argumentos já uti- pela lei ordinária, inclusive e sobretudo,
lizados no item 1°, deste Julgado, quan- quanto ao uso dos recursos naturais.
do vigente a anterior Constituição, per-
manecem válidos e íntegros à luz da
nova Lei Magna» As terras descritas na inicial situam-
se na Serra do Mar, constituindo parte
Inconformado com a decisão proferida da Mata Atlântica.
pelo Tribunal a quo, sustenta o ora recor-
rente (fls. 837/902), em síntese, que: São portanto, patrimônio nacional,
classificados como bem de uso comum
«Trata-se de ação ordinária de inde- do povo, totalmente indisponíveis, isto
nização, fundada na alegação de prejuií- é, fora do comércio.
zos que teriam sido infligidos ao imóvel
descrito na inicial por ter sido transfor-
mado em reserva florestal. A propriedade deve exercer função
social.
O imóvel em foco se localiza s em
Zona Costeira, cuidando-se de Mata Desmatar, na Serra do Mar, constitui
Atlântica, parte integrante da Serra do atividade flagrantemente anti-social.
Mar. Logo, o direito de propriedade, na
O v. Acórdão recorrido rejeitou a Serra do Mar, nasce e se exerce com o
defesa da recorrente segundo a qual as impedimento à atividade de desmatar.
restrições impostas ao imóvel dos recor- Ou, por outra, a restrição ao desmate é
ridos, consubstanciam mera limitação inerente a esse direito.
administrativa, em decorrência do dis- É a única interpretação dos incisos
posto pelo art. 225, seus incisos e pará- XXII e XXIII do art. 5° da Constituição
grafos da Constituição Federal. Federal que os harmoniza com o art.
225, seus incisos e parágrafos, da mes-
Consignou o v. Acórdão que o novo
ma Carta Magna, em especial, o pará-
texto constitucional não ampara o enten-
grafo 4°.
dimento da recorrente, permanecendo
válidos os mesmos argumentos existen- Com efeito, não se pode extrair do
tes ao tempo da Constituição anterior! art. 225, parágrafo 4°, a conclusão de
R.T.J. — 158 209

que o legislador constituinte extinguiu o O Tribunal a quo, tendo presente a cir-


direito de propriedade, na Serra do Mar. cunstância de que a exploração econômica
do imóvel em questão resultou inviabiliza-
da pelos atos estaduais de instituição da
A recorrente reafirma sua tese de que Estação Ecológica Juréia-Iratins — e ante
o art. 225, seus incisos e parágrafos da a conseqüente impossibilidade de os pro-
Constituição Federal não extinguiu o prietários continuarem a utilizar a área
direito de propriedade na Serra do Mar. rural para a extração de madeira — procla-
Apenas instituiu limitação administrati- mou a obrigação estatal de proceder à
va em virtude da qual esse direito, na- reparação civil do dano patrimonial causa-
quela região e nas demais contempla- do diretamente pela atividade do Poder Pú-
das, é restrito, exercendo-se na obser- blico.
vância das limitações constantes de lei
Os ora recorridos são proprietários de
ordinária.
um imóvel situado no Município e Comar-
Tais limitações administrativas, sem ca de Iguape.
embargo de sua amplitude, não ensejam Com a edição da Lei paulista n°
qualquer indenização, até porque o di- 5.649/87, e como já salientado, criou-se,
reito de propriedade, na Serra do Mar, já nos Municípios de Perdbe, Iguape, Mira-
nasceu assim, diminuto, descabendo catu e Itariri, a Estação Ecológica Juréia-
exigir indenização a pretexto de que ele Itatins, destinada a assegurar a integridade
não enseja maior atividade.» dos ecossistemas e das fauna e flora exis-
O Ministério Público Federal, em pare- tentes na área territorial em questão.
cer da lavra da ilustre Subprocuradora-Ge- Esse imóvel, abrangido pela área de pre-
ral, Dra. Maria da Glória Ferreira Ta- servação ecológica, sofreu graves restri-
mer, manifestou-se pelo conhecimento e ções de ordem jurídico-administrativa que
provimento do presente recurso, em pare- simplesmente inviabilizaram a exploração
cer assim ementado (fls. 940), verbis: econômica, por seus titulares, dos recursos
ação de indenização. Reserva flo- naturais nele existentes.
restal na Serra do Mar. Patrimônio A maior evidência do claro esvazia-
Nacional. Art. 225, § 4°, da CF de 1988. mento do conteúdo econômico da proprie-
Parecer pelo provimento do recurso.» dade em causa reside na circusntância de
É o relatório. que os ora recorridos, pretendendo implan-
tar cultura de cacau com aproveitamento
VOTO dos recursos naturais existentes na área —
consoante recomendações constantes de
O Sr. Ministro Celso de Mello (Rela- estudo de viabilidade econômica que fize-
tor): Trata-se de recurso extraordinário in- ram realizar (fls. 17/49) — foram obstados
terposto pelo Estado de São Paulo contra na implementação e execução desse projeto
acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça por efeito de formal recusa administrativa
local que condenou o ora recorrente a inde- manifestada pelo Coordenador Estadual da
nizar os proprietários de imóvel rural afe- Pesquisa de Recursos Naturais.
tado, em sua essência econômica, por atos Essa autoridade administrativa indefe-
do Poder Público estadual, dos quais deri- riu o pedido de remoção parcial da cober-
vou a criação da Estação Ecológica Juréia- tura vegetal existente no imóvel dos recor-
Itatins. ridos precisamente pelo fato de essa área
210 R.T.J. — 158

achar-se «abrangida pela Estação Ecológi- Daí, ser iniludível que a terra que
ca de Juréia-Itatins» (fl. 51). possua esse acessório (art. 43, inciso
Com tal deliberação administrativa, I, do CC) terá um valor bem maior do
frustrou-se, por completo, a possibilidade que aquelas outras que não o osten-
da adequada exploração econômica dos re- tem, pelo que, inquestionavelmente,
cursos naturais existentes na propriedade se impõe a respectiva indenização, na
dos ora recorridos. hipótese de ocorrer o ato expropria-
tório.'
O Eg. Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo, ao manter a sentença que con- No Decisório em questão, foram fei-
denou o Estado de São Paulo a ressarcir os tas referências a outros Arestos proferi-
prejuízos causados aos ora recorridos, dei- dos nesta Casa de Justiça, todos seguin-
xou consignado, em acórdão de que foi do a mesma orientação. Assim, por
Relator o eminente Desembargador Mariz exemplo, o da 10* Câmara Civil, prola-
de Oliveira, que (fls. 879/885), verbis: tado nos Embargos Infringentes n°
29.066-2/SP, do qual foi Relator o Emi-
«Inicialmente, deve ser examinada a
nente Desembargador Carlos Ortiz, hoje
primeira questão que emerge dos ele-
com assento nesta 12' Câmara. Também
mentos contidos nestes autos, qual seja
aqueles relatados pelo Ilustre Desem-
a da indenizabilidade ou não das matas
bargador Álvaro Lazzarini (Apelação
que recobrem a área apossada pela Fa-
Cível 63.491 e RT 522/151). A eles
zenda do Estado.
são acrescidos os aludidos neste proces-
O Relator deste Acórdão já teve a so, igualmente na esteira da diretriz ju-
oportunidade de manifestar-se a respei- risprudencial acima indicada.
to do problema, quando relatou outro
julgado, como integrante da E. 16' Câ-
mara Civil, desta Corte (RJTJESP, vol. Apenas e em síntese, pode-se asseverar
90/196), asseverando, então: que, da análise do Código Florestal, feita
com todo o cuidado pela sentença, depreen-
`Ficou bem elucidado que a inde- de-se que os autores jamais poderiam aba-
nizabilidade, na hipótese, transmu- ter todas as árvores ao mesmo tempo, ainda
daria, a mera restrição administrati- que em zona de inclinação inferior a 25
va, consubstanciada na proibição de graus, só podendo fazê-lo na base de 50%,
derrubada de mata, em verdadeiro sendo obrigados a manter íntegra a outra
confisco, gerando servidão pública metade. Não podendo cortar toda a vegeta-
de caráter negativo, o que é inadmis- ção, mas, apenas, metade dela, é óbvio que
sível. Isso porque, nada obstante seu lucro não seria nunca total, isto é, cor-
aquela restrição, o certo é que o apro- respondente à totalidade das matas, auferi-
veitamento econômico dessa mata, do, tão-somente, o referente a 50%, no má-
com outras finalidades, não é vedado. ximo.
É induvidoso, ademais, que a pro- Por todos esses motivos é mantido o
teção dispensada pela lei a essas ma- valor indenizatório contido na sentença
tas, no que concerne à sua preserva-
ção, reflete, diretamente, a utilidade
de que se revestem, com evidente
expressão econômica, que se acres- A afirmativa da ré impugnante, no
centa ao valor da terra nua. sentido de a nova Constituição da Repú-
R.T.J. — 158 211

blica, ao tratar da proteção ambiental, Ora, com todo o respeito, não se vê


ter introduzido profundas alterações no como tirar dos dispositivos supra a ila-
direito positivo, de tal forma que procla- ção extraída pela ré, para asseverar que
mou a inexigibilidade de qualquer inde- as terras localizadas na Sena do Mar não
nização pelos atos administrativos de podem ser indenizadas, em caso de de-
intervenção na propriedade privada com sapropriação ou de apossamento admi-
objetivos ecológicos, na verdade não nistrativo.
encontra ressonância na própria Lei Dessa maneira, os argumentos já uti-
Maior, a qual, como suas antecessoras, lizados no item 1°, deste Julgado, quan-
continua a dar proteção ao direito de do vigente a anterior Constituição, per-
propriedade, atendida a sua função so- manecem válidos e íntegros à luz da
cial e, nos casos de desapropriação, res- nova Lei Magna.»
guardada a justa e prévia indenização
em dinheiro, ressalvados os casos pre- Tenho por incensurável o pronuncia-
vistos constitucionalmente (incisos mento jurisdicional questionado na presen-
XXII, XXIII e XXIV). te sede recursal extraordinária.
E a citação do artigo 225, de seu § 1°, Entendo que o dever constitucional que
inciso VIU, e de seu § 4°, para justificar incumbe ao Poder Público de proteger a
que as terras situadas na Serra do Mar, flora e de adotar as medidas que visem a
por constituírem patrimônio nacional, coibir práticas lesivas ao equilíbrio am-
não podem ser indenizadas, é inócua e biental não exonera o Estado da obrigação
sem fundamento, pois que tais preceitos de indenizar os proprietários cujos imóveis
não dizem, em absoluto, tal coisa, bas- venham a ser afetados, em sua potenciali-
tanto, para que assim se conclua, a sim- dade econômica, pelas limitações impostas
ples leitura dos respectivos trechos. pela Administração Pública.
Na realidade, atos de desapropriação, ou
Realmente, depois de afirmar, em de apossamento administrativo, ou, como
seu caput, que todos têm direito ao meio na espécie, de imposição de restrições di-
ambiente ecologicamente equilibrado, tadas pela lei e por atos de índole adminis-
prescreve o citado artigo 225, em seu trativa obrigam o Estado a ressarcir os
parágrafo único e inciso VII, que incum- prejuízos que se originem da atividade pú-
be ao Poder Público, para assegurar a blica, quando esta importar — como no
efetividade desse direito, 'proteger a caso efetivamente importou — em esva-
fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, ziamento do conteúdo econômico do direi-
as práticas que coloquem em risco sua to de propriedade.
função ecológica, provoquem a extin-
ção de espécies ou submetam os animais A proteção jurídica dispensada às cober-
a crueldade'. E, em seu parágrafo 4° turas vegetais que revestem as proprieda-
dispõe que 'A Floresta Amazônica bra- des imobiliárias não impede que os titula-
sileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, res destas venham a promover, dentro dos
o Pantanal Mato-grossense e a Zona limites autorizados pelo próprio Código
Costeira são patrimônio nacional, e sua Florestal, o adequado e racional aproveita-
utilização far-se-á, na forma da lei, den- mento econômico das árvores nelas exis-
tro de condições que assegurem a pre- tentes.
servação do meio ambiente, inclusive E foi, precisamente, o que reconheceu
quanto ao uso dos recursos naturais'. o acórdão ora recorrido, que proclamou,
212 R.T.J. — 158

com inteira fidelidade à garantia constitu- deiras na área sujeita à sua titularidade do-
cional que protege o direito de propriedade, minial.
a plena indenizabilidade das matas que A circunstância de o Código Florestal
recobrem áreas dominiais privadas objeto (Lei n° 4.771/65) definir como bens de
de apossamento estatal ou sujeitas a res- interesse comum tanto as florestas existen-
trições administrativas impostas pelo Po- tes no território nacional quanto as demais
der Público: formas úteis de vegetação que revestem as
4..) a inindenizabilidade, na hipóte- áreas por elas ocupadas não impede que se
se, transmudaria a mera restrição admi- reconheça a obrigação de o Poder Público
nistrativa, consubstanciada na proibição indenizar o proprietário do solo naquelas
de derrubada de mata, em verdadeiro hipóteses em que as limitações administra-
confisco, gerando servidão pública de tivas, suprimindo ou reduzindo a possibili-
caráter negativo, o que é inadmissível. dade de exploração dos recursos naturais da
Isso porque, nada obstante aquela restri- terra, venham a virtualmente esterilizar, em
ção, o certo é que o aproveitamento eco- seu conteúdo essencial, o direito de pro-
nômico dessa mata, com outras finalida- priedade.
de, não é vedado. Daí porque, e como já precedentemente
É induvidoso, ademais, que a prote- enfatizado, não há como aceitar, na linha
ção dispensada pela lei a essas matas, no do magistério jurisprudencial desta Supre-
que concerne à sua preservação, reflete, ma Corte (RTJ 108/1314, Rel. MM. Fran-
diretamente, a utilidade de que se reves- cisco Rezek), o reconhecimento de que as
tem, com evidente expressão econômi- coberturas florestais e os revestimentos ve-
ca, que se acrescenta ao valor da terra getais qualifiquem-se como fatores econo-
nua. micamente neutros na definição do justo
valor da indenização patrimonial devida
Daí, ser iniludível que a terra que
pelo Estado.
possua esse acessório (art. 43, inciso I,
do CC) terá um valor bem maior do que Não se pode desconhecer que a cobertu-
aquelas outras que não o ostentem, pelo ra florestal que reveste os imóveis possui
que, inquestionavelmente, se impõe a indiscutível expressão econômica, impon-
respectiva indenização, na hipótese de do ao Poder Público, em conseqüência,
ocorrer o ato expropriatório.» (fls. sempre que da atividade administrativa re-
879/880) sultar afetada a possibilidade de exploração
racional das matas, o dever de indenizar o
O acórdão impugnado na presente sede
dominus quanto ao valor patrimonial por
recursal extraordinária ajusta-se, no ponto,
estas representado (RT 431/141 — RT
à jurisprudência do Supremo Tribunal Fe-
583/278 — RT 590/106 — RT 591/96).
deral que, em sucessivos pronunciamen-
tos, firmou orientação no sentido de reco- A circunstância de o Estado dispor de
nhecer, sempre em obséquio ao postula- competência para criar reservas florestais
do constitucional que tutela o direito de não lhe confere, só por si — considerando-
propriedade, a plena ressarcibilidade dos se os princípios que, em nosso sistema nor-
prejuízos materiais decorrentes das limita- mativo, tutelam o direito de propriedade —
ções administrativas que, por efeito causal a prerrogativa de subtrair-se ao pagamento
direto, impeçam — tal como no caso de indenização patrimonial ao particular,
ocorreu — a atividade econômica do par- quando a atividade pública, decorrente do
ticular, inibido de explorar o corte de ma- exercício de atribuições em tema de direito
R.T.J. — 158 213

florestal, impedir ou afetar a válida e racio- págs. 131/132, 1988, Companhia das Le-
nal exploração econômica do imóvel por tras).
seu proprietário.
A proteção da flora e a conseqüente
Daí o pronunciamento irrepreensível do vedação de práticas que coloquem em risco
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a sua função ecológica projetam-se como
nesta matéria, acentuando que «Não se fornias instrumentais destinadas a conferir
nega ao Estado o direito de constituir reser- efetividade ao direito em questão.
vas florestais em seu território. Deve negar-
se, todavia, o poder de constituí-las gratui- O dever que constitucionalmente in-
tamente, à custa da propriedade particular cumbe ao Poder Público de fazer respeitar
de alguns proprietários» (RT 522/151). a integridade do patrimônio ambiental não
o dispensa, contudo, quando necessária a
O Estado de São Paulo sustenta, ainda, intervenção administrativa na esfera domi-
a partir das regras inscritas no art. 225, § 1°, nial privada, de ressarcir os prejuízos ma-
inciso VII, e § 4°, da Carta Política, que o teriais que, derivando de eventual esvazia-
novo ordenamento constitucional promul- mento do conteúdo econômico do direito
gado em 1988 introduziu profundas altera- de propriedade, afetem a situação jurídica
ções no sistema de direito positivo brasilei- de terceiros.
ro, consagrando a inexigibilidade de qual-
quer indenização pelos atos administrati- É certo que a Serra do Mar — local em
vos de intervenção estatal na esfera domi- que situado o imóvel pertencente aos ora
nial privada, desde que, praticados com recorridos — constitui patrimônio nacio-
finalidade de proteção ambiental, venham nal, devendo a sua utilização fazer-se, na
a incidir em imóveis situados na Serra do forma da lei, consoante prescreve o art.
Mar (fl. 900). 225, § 4° da Carta Política, dentro de
condições que assegurem a preservação do
Não assiste, também neste ponto, qual- meio ambiente, notamente quanto ao uso
quer razão ao recorrente, eis que o acolhi- dos recursos naturais.
mento da tese ora sustentada implicaria
virtual nulificação do direito de proprieda- A norma constitucional em questão,
de, com todas as graves conseqüências ju- além de não haver operado em favor do
rídicas que desse fato adviriam. Poder Público qualquer transmissão domi-
nial dos imóveis localizados nas áreas nela
Os preceitos inscritos no art. 225 da referidas, também não impede, desde que
Carta Política traduzem a consagração observadas as prescrições fixadas em lei e
constitucional, em nosso sistema de direito respeitadas as condições necessárias à pre-
positivo, de uma das mais expressivas prer- servação ambiental, a utilização, pelos
rogativas asseguradas às formações sociais particulares, dos recursos naturais exis-
contemporâneas. tentes nos imóveis sujeitos ao domínio pri-
Essa prerrogativa consiste no reconhe- vado, não obstante estejam estes situados
cimento de que todos têm direito ao meio na Serra do Mar, ou na Floresta Amazônica
ambiente ecologicamente equilibrado. Brasileira, ou na Mata Atlântica, ou no
Pantanal Mato-Grossense, ou, ainda, na
Trata-se de um típico direito de terceira
Zona Costeira.
geração que assiste, de modo subjetiva-
mente indeterminado, a todos os que Cumpre ter presente, bem por isso, o
compõem o grupo social (Celso Lafer, «A sempre douto magistério expendido pelo
reconstrução dos Direitos Humanos», Prof. Miguel Reale sobre a matéria em
214 R.T.J. — 158

questão («Temas de Direito Positivo», oferecida (...), encontramo-la no art. 20


págs. 216/223, 1992, RT), verbis: que enumera taxativamente os bens da
«`§ 4° — A Floresta Amazônica União, fazendo-o de maneira minuncio-
brasileira, a Mata Atlântica, a Serra sa e precisa.
do Mar, o Pantanal Mato-Grossense Se há expressa referência, v.g., a 'ter-
e a Zona Costeira são patrimônio na- renos de marinha e seus acrescidos', aos
cional, e sua utilização far-se-á, na 'potenciais de energia hidráulica', ou
forma da lei, dentro de condições que aos 'recursos minerais, inclusive do
assegurem a preservação do meio subsolo', nenhuma referência é feita às
ambiente, inclusive quanto ao uso florestas de que trata o § 4° do art. 225,
dos recursos naturais.' sinal de que pertencem à União tão-so-
Da leitura desse dispositivo legal de- mente as florestas que cobrem as terras
preende-se desde logo que a Assembléia de sua propriedade.
Nacional Constituinte declarou que:
entre outras, a Mata Atlântica A expressão 'patrimônio nacional',
é um 'patrimônio nacional', empregada no § 4° do art. 225 da Cons-
cuja utilização econômica não tituição Federal, tem sentido figurado,
é proibida, mas realizável na forma não significando, absolutamente, que as
áreas particulares abrangidas pelas flo-
da lei,
restas e matas nele enumeradas tenham
respeitadas condições que as- sido convertidas em bens públicos da
segurem a preservação do meio am- União...»
biente,
A análise do conteúdo normativo cons-
e salvaguardado o uso dos re- tante do preceito inscrito no art. 225, § 4°,
cursos naturais. da Carta Federal, de outro lado, permite
Cada um desses mandamentos, e to- constatar que, nele, inexiste qualquer regra
dos em seu conjunto, permitem-nos que, revestida de eficácia exonerativa, de-
compreender em sua real significação e sobrigue o Estado de indenizar os particu-
plenitude qual o objetivo social que se lares em situações específicas de danos pa-
visa atingir, como condição de preserva- trimoniais causalmente imputáveis à ativi-
ção do 'meio ambiente', título do Capí- dade do Poder Público em sede de tutela
tulo VI do Título VIII de nossa Carta ambiental.
Magna relativo à ordem social. É de ter presente, neste ponto, que, sen-
do de índole comum o direito à preserva-
Não creio que o termo 'patrimônio ção da integridade ambiental, não se
nacional', no invocado § 4°, seja empre- pode impor apenas aos proprietários de
gado em sentido jurídico importando na áreas localizadas na Sena do Mar — que
supressão das propriedades privadas venham a sofrer as conseqüências deriva-
existentes, antes de 5 de outubro de das das limitações administrativas inciden-
1988, na gigantesca área coberta pelas tes sobre os seus imóveis — os ônus con-
cernentes à concretização, pelo Estado, de
Florestas Amazônica, do Pantanal, etc.
seu dever jurídico-social de velar pela con-
servação, em beneficio de todos, de um
Demonstração inconcussa de que é meio ambiente ecologicamente equili-
simplesmente cerebrina a interpretação brado
R.T.J. — 158 215

Por tal razão, as normas inscritas no art. particular e a instituição de zonas de


225 da Constituição hão de ser interpreta- preservação ambiental, deve ser distri-
das de modo harmonioso com o sistema buído igualmente entre todos os benefi-
jurídico consagrado pelo ordenamento fun- ciários — a comunidade, em geral —,
damental, notadamente com a cláusula que, com respeito ao direito de propriedade,
proclamada pelo art 5° XXII, da Carta do mesmo modo resguardado pelo texto
Política, garante e assegura o direito de constitucional.»
propriedade em todas as suas projeções, A obrigação imposta ao Poder Público
inclusive aquela concernente à compensa- de conferir efetividade ao direito dos gru-
ção financeira devida pelo Poder Público pos sociais ao meio ambiente ecologica-
ao proprietário atingido por atos imputá- mente equilibrado, muito embora de extra-
veis à atividade estatal. ção constitucional, não pode ser invocada
Sendo assim — e tal como destacou o pela Administração Pública como causa de
Ministério Público Federal em douto pare- exoneração do seu dever de indenizar
cer da ilustre Subprocuradora-Geral da Re- aqueles que, como os ora recorridos, ex-
pública, Dra. Anadyr de Mendonça Ro- pondo-se à ação desenvolvida pelo Gover-
drigues, em causa onde se controvertia so- no na defesa do patrimônio ambiental, ve-
bre o mesmo tema (RE n° 140.224-SP) —, nham a sofrer prejuízos materiais de ordem
impõe-se ter presente, na análise da matéria econômica resultantes da criação, pelo Es-
em discussão, que, verbis: tado, de reservas florestais.
«De fato, é indiscutível que, como A ordem constitucional dispensa tutela
alega o Recorrente, a propriedade aten- efetiva ao direito de propriedade (CF/8S,
derá a sua função social (art. 5°, XXIII, art. 5°, XXII). Essa proteção outorgada pela
da Constituição Federal) e que o art. Lei Fundamental da República estende-se,
225, § 4°, da Carta Magna dispôs: na abrangência normativa de sua incidência
tutelar, ao reconhecimento, em favor do
'A Floresta Amazônica brasileira,
a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o
dominas, da garantia de compensação
Pantanal Mato-Grossense e a Zona
financeira, sempre que o Estado, mediante
atividade que lhe seja juridicamente impu-
Costeira são patrimônio nacional, e
tável, atingir o direito de propriedade em
sua utilização far-se-á, na forma da
seu conteúdo econômico, ainda que o imó-
lei, dentro de condições que assegu-
rem a preservação do meio ambiente, vel particular afetado pela ação do Poder
Público esteja localizado em qualquer das
inclusive quanto ao uso dos recursos
áreas referidas no art. 225, § 4°, da Consti-
naturais.
tuição.
Afigura-se correto sustentar, no en- Impende ressaltar, portanto, que o Poder
tanto, que tais disposições constitucio- Público ficará sujeito a indenizar o pro-
nais hão de merecer aplicação harmôni- prietário do bem atingido pela instituição
ca com outra garantia, também instituí- da reserva florestal, se, em decorrência de
da pela Lei Maior, qual seja aquela in- sua ação administrativa, o dominus vier a
serta em seu art. 5°, XXII: sofrer prejuízos de ordem patrimonial.
'é garantido o direito de proprieda- A instituição de reserva florestal —com
de:' as conseqüentes limitações de ordem admi-
Bem por isso, o custo, que acarretam nistrativa dela decorrentes — e desde que
a outorga de função social à propriedade as restrições estatais se revelem prejudi-
216 R.T.J. - 158

ciais ao imóvel abrangido pela área de pro- gação de indenizar o proprietário do bem
teção ambiental, não pode justificar a re- atingido pela ação do Poder Público.
cusa do Estado ao pagamento de justa Esse entendimento tem prevalecido,
compensação patrimonial pelos danos re-
por exemplo, quando se analisam as con-
sultantes do esvaziamento econômico ou da seqüências eventualmente lesivas à pro-
depreciação do valor econômico do bem. priedade privada decorrentes da utilização
A criação de reservas florestais, como estatal do instituto jurídico-constitucional
instrumento de preservação do meio am- do tombamento (Celso Antônio Bandeira
biente, ainda que motivada pela inafastável de Mello, «Curso de Direito Administra-
função social que se revela inerente à pro- tivo», pág. 363, item n° 35, Q ed., 1993,
priedade, não pode e nem deve ser vista Malheiros; Ruy Cime Lima, Revista de
como efeito de uma ação administrativa Direito Público, vol. 5/26; José Cretella
arbitrária ou inconseqüente. Pelo contrário, Júnior, «Tratado do Domínio Público»,
a ação do Poder Público, no domínio da pág. 451, item n° 208, 1984, Forense; Hely
proteção ecológica, há de ser compreendi- Lopes Meirelles, «Direito Administrati-
da como um meio essencial à tutela de vo Brasileiro», pág. 485, 17* ed., 1992,
valores maiores, de transcendência social, Malheiros; Diógenes Gasparini, «Direito
destinados a favorecer, em última análise, os Administrativo», pág. 298, 1989, Saraiva;
superiores interesses da própria coletividade. Pinto Ferreira, «Comentários à Consti-
Essa asserção — ao menos enquanto tuição Brasileira», vol. 7/172, 1995, Sa-
subsistir o sistema consagrado em nosso raiva; Paulo Affonso Leme Machado,
texto constitucional —impõe que se repu- «Ação Civil Pública e Tombamento»,
die qualquer solução que, tal como a preco- pág. 68, 1986, RT; Maria Sylvia Zanella
nizada pelo Estado ora recorrente, importe Di Pietro, «Direito Administrativo», pág.
em negação ou em injusto sacrifício do 114, 1990, Atlas; Lúcia Valle Figueiredo,
«Curso de Direito Administrativo», pág.
direito de propriedade.
Sendo assim, a criação de reservas flo-
r
200, item n° 6, ed., 1995, Malheiros;
Fernando Andrade Oliveira, «Limita-
restais e a inclusão, nelas, de imóveis sujei- ções Administrativas à Propriedade Pri-
tos à esfera dominial privada não poridem vada Imobiliária», pág. 236, item n° 32.1,
revestir-se de caráter confiscatório, impon- 1982, Forense; Caio Mário da Silva Pe-
do-se reconhecer, em conseqüência, mas reira, RDA 65/315; Carlos Medeiros Sil-
essencialmente em obséquio ao princípio va, RDA 67/248).
constitucional que tutela o direito de pro-
priedade, o dever estatal de proceder a uma Impõe-se registrar, finalmente, a abso-
necessária e justa compensação reparatória luta soberania do pronunciamento jurisdi-
dos danos ocasionados. cional impugnado nesta sede recursal ex-
traordinária, no ponto em que examinou a
Impende ressaltar, bem por isso, que a matéria de fato subjacente às conclusões
doutrina e a jurisprudência dos Tribunais que levaram o Tribunal a quo a proferir o
têm sempre enfatizado que a instituição de acórdão em questão, reconhecendo a ocor-
limitações administrativas, quando inci- rência de sensível esvaziamento econômi-
dam sobre as diversas faculdades jurídicas co do direito de propriedade dos particula-
em que se pluraliza o domínio, comprome- res ora recorridos.
tendo e afetando a própria substância
econômica do direito de propriedade, Essa circunstância — que assume indis-
impõe ao poder estatal a ineliminável obri- cutível relevo de ordem jurídico-proces-
R.T.J. — 158 217

suai — impede que se insinue, na via do juge (Advs.: Juvenal Campos de Azevedo
apelo extremo, qualquer ensaio de redis- Canto, José Marcelo Braga Nascimento e
cussão em torno das premissas fáticas em outro).
que se apoiou a decisão emanada do Tribu- Decisão: A Turma não conheceu do re-
nal de Justiça do Estado de São Paulo (Sú- curso extraordinário. Unânime. Falou pe-
mula 279/STF). los recorridos o Dr. Juvenal Campos de
Sendo assim, e tendo presentes as razões Azevedo Canto.
que venho de expor, não conheço do pre-
sente recurso. Presidência do Senhor Ministro Moreira
Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
É o meu voto. nistros Sydney Sanches, Octavio Gallotti e
Celso de Mello. Ausente, justificadamente,
EXTRATO DA ATA o Sr. Ministro limar Gaivão. Subprocura-
RE 134.297 — SP — Rel.: Min. Celso dor-Geral da República, Dr. Miguel Frau-
de Mello. Recte.: Estado de São Paulo. zino Pereira.
(Advs.: Maria José Vieira Gonçalves e ou- Brasília, 13 de junho de 1995 — Ricar-
tros). Recdos.: Paulo Ferreira Ramos e cón- do Dias Duarte, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 135.632 — SP


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Octavio Gallotti


Recorrente: Estado de São Paulo — Recorridos: Jair Cordeiro e outros
O teto estabelecido pelo § 4" do art. 13 da Constituição de
1967 (Emenda n° 1-69), ou seja, a remuneração dos postos e gradua-
ções correspondentes do Exército, abrange não apenas o valor do
soldo, mas, compreensivamente, as vantagens conferidas aos policiais
militares.
ACÓRDÃO RELATÓRIO

Vistos, relatados e discutidos estes au- O Sr. Ministro Octavio Gallotti:


tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- Acha-se assim resumida a questão no pare-
bunal Federal, em Primeira Turma, na con- cer da ilustre Subprocuradora-Geral da Re-
pública Anadyr de Mendonça Rodri-
formidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, à unanimidade de votos, co-
gues, que servirá de Relatório:
nhecer, em parte do recurso extraordinário «O Recurso Extraordinário foi inter-
e, nessa parte, dar-lhe provimento. posto em 29 de outubro de 1987, com
fundamento nas alíneas a e d do permis-
Brasília, 31 de outubro de 1995 — Mo- sivo constitucional, fazendo alegação de
reira Alves, Presidente — Octavio Gallot- ofensa aos artigos 6°, 13, § 4°, 116 e 153,
ti, Relator. § 2°, da Emenda n" 1, de 1969, 480 a 482
218 R.T.J. —158

do Código de Processo Civil e 24 do sões alegadas em relação aos arts. 8°,


Decreto-Lei n° 667, de 1969, bem como XVII, V, 13, IX, § 4° e 153, § 3° da
de discrepância do julgado frente à Sú- Constituição Federal, não violado o
mula 339, a par de fazer argüição de princípio da isonomia. Também não
relevância da questão federal (não apre- se trata de elevação de vencimentos
ciada, segundo fl. 34 dos autos apensos). (Súmula 339), mas de simples reco-
Nos autos apensos, do Ag. n° nhecimento do que é devido. E não
126.784-4-SP, o Exmo. Sr. Ministro Re- há razão para não aplicar-se aos po-
lator, na esteira do decidido por essa liciais-militares o art. 92, VIII, da
Excelsa Corte no julgamento do RE Constituição Paulista, de aplicação
117 320-Q-0., houve por bem prover o uniforme para todos os servidores.
Agravo e determinar que, na origem, se Os honorários de 10% sobre a conde-
facultasse ao Recorrente o desdobra- nação, são bem alentados não com-
mento do apelo (fl. 219), mas o interes- portando majoração. Subsistam no
sado não se manifestou (certidão de fl. percentual dado sobre o que se apurar
214), com o que o Exmo. Sr. Ministro na liquidação.» (Fl. 168)
Relator considerou preclusas as ques- 5. A inconformação extraordinária,
tões infraconstitucionais (fl. 244). no que tange ao tema prequestionado,
O tema alusivo ao art. 13, § 4°, do assim se sustenta:
texto constitucional anterior está pre- «Atendendo ao disposto no art.
qüestionado, porque ventilado no V. 13, § 4° da Constituição Federal foi
Acórdão recorrido (fls. 168/168v) — ao editado o Decreto-Lei federal n°
qual não se opuseram Embargos de De- 667/69 que, disciplinando a organi-
claração —, o mesmo não acontecendo zação das polícias armadas esta-
com as restantes questões constitucio- duais, determinou em seu art. 24: «os
nais suscitadas, motivo por que se fazem direitos, vencimentos, vantagens e
invocáveis, no que lhes pertine, as Sú- regalias dos Policiais Militares cons-
mulas 282 e 356. tarão de legislação especial de cada
4. Eis a solução conferida à espécie unidade da Federação, não sendo
pelo E. Tribunal a quo: permitidas condições superiores às
que, por lei ou regulamento, foram
«Acordam, em Sexta Câmara Ci- atribuídas ao pessoal das Forças Ar-
vil do Tribunal de Justiça, por vota- madas».
ção unânime, negar provimento aos
recursos. Atual Lei Complementar n° 255/81
que, atualmente regulamenta venci-
E assim se decide, adotado o rela-
mentos e as vantagens dos milicianos
tório de fls. 126/127, a fim de que
revalorizando os padrões dos em ní-
subsista por seus fundamentos a r.
vel máximo, atentou para as diretri-
decisão recorrida, que, concedendo zes traçadas pelo constituinte, fazen-
aos autores, policiais-militares, a in-
do menção expressa à fixação dos
cidência recíproca do RETP e adicio-
vencimentos com restrições fede-
nais temporais, deu ao feito a solução
rais.
adequada aos fatos apurados e ao
direito aplicável. A jurisprudência é Assim, se a legislação especial, ao
reiterada e uniforme no sentido da estabelecer o regime de vencimentos
decisão recorrida, inavistáveis as le- e vantagens dos policiais, fixou-os
R.T.J. — 158 219

no limite máximo permitido, resulta Precedentes do STF.» (RE 114.635-


inexorável que qualquer alteração no 4-SP, Rel. Min. Sydney Sanches, in
sistema retribuitório por ela instituí- DJ de 11-3-88, pág. 4748).
do, pela ampliação da base do cálculo
«Polícia Militar do Estado de São
da vantagem, acarretará a majoração Paulo.
proibida.
Recálculo de vencimentos, para
Indiscutível assim que o V. Acór- incidência recíproca da gratificação
dão recorrido, majorando a base do de regime especial de trabalho poli-
cálculo dos vencimentos e vantagens cial e dos adicionais por tempo de
pecuniárias propiciando um aumento serviço (qüinqüênios), inclusive a 6'
de seus valores, afrontou o disposto parte.
nos artigos 13, § 4°, da Constituição
Federal e art. 24 do Decreto-Lei fe- Procedência da ação nas instân-
deral n° 667/69, gerando aumento de cias ordinárias.
vencimentos para os recorridos supe- Recurso extraordinário conheci-
riores àqueles estabelecidos para do e provido, em parte, para que se
igual posto e graduação do Exército. excluam da condenação as parcelas
que excederem a remuneração fixada
Por essa razão que recente julga- para os postos e graduações corres-
mento o C. Supremo Tribunal Fede- pondentes no Exército (parágrafo 4°
ral conheceu e deu parcial provimen- do art. 13 da Constituição Federal).
to ao RE n° 104.218.» (Fls. 176/177). Precedentes do STF.» (RE 116.766-
1-SP, Rel. Min. Sydney Sanches, in
6. Tudo posto, é de se ver que, diante DJ de 16-9-88, pág. 23320)
do prequestionamento do tema alusivo
ao art. 13, § 4°, da Emenda if 1, de 1969, 7. O parecer é, por conseguinte, de
faz-se invocável o decidido por essa Su- que o Recurso Extraordinário comporta
prema Corte nos seguintes casos prece- conhecimento e provimento, em parte.»
dentes específicos: (Fls. 276/280).
É o relatório.
«Polícia Militar do Estado de São
Paulo. Recálculo de vencimentos, VOTO
para incidência recíproca da gratifi-
cação de regime especial de trabalho O Sr. Ministro Octavio Gallotti (Rela-
policial e dos adicionais por tempo tor): Tenho, como propõe o Ministério Pú-
de serviço (qüinqüênios), inclusive a blico, que mereça o recurso prosperar, no
6' parte. único ponto em que dotado do indispensá-
vel prequestionamento, ou seja, no tocante
Procedência da ação nas instân- à alegação de contrariedade ao disposto no
cias ordinárias. Recurso extraordiná- § 4° do art. 13 da Constituição de 1967
rio conhecido e provido para que se (Emenda a° 1-69).
excluam da condenação as parcelas Abrange, o teto estabelecido nesse dis-
que excederem a remuneração fixada positivo (isto é, a remuneração fixada para
para os postos e graduações corres- os postos ou graduações correspondentes
pondentes no Exército (parágrafo 4° do Exército), não apenas o soldo, mas,
do art. 13 da Constituição Federal). compreensivamente, as vantagens reco-
220 R.T.J. —158

nhecidas aos Policiais Militares, cujo regi- EXTRATO DA ATA


me de cálculo foi o objeto do acórdão re-
corrido. Veja-se o acórdão desta Primeira RE 135.632 — SP — Rel.: Min. Octavio
Turma no Recurso Extraordinário n° Gallotti. Recte.: Estado de São Paulo
120.268, que tive a oportunidade de relatar: (Adva.: Dulcinéa A. Macedo Duailibi).
«O teto de remuneração (correspon- Recdos.: Jair Cordeiro e outros (Adv.: Jo-
dente à fixada para as Forças Armadas), sias de Abrel Pires).
estabelecido pelo § 4° do art. 13 da
Constituição de 1967, compreende não Decisão: A turma conheceu, em parte,
só o soldo do posto ou graduação dos do recurso extraordinário e, nessa parte, lhe
policiais militares, mas o próprio regime deu provimento, nos termos do voto do
de cálculo das vantagens percentuais, Relator. Unânime. Ausente, ocasionalmen-
que lhe são conferidas pela lei estadual. te, o Sr. Ministro Sydney Sanches.
Precedentes do Supremo Tribunal:
RREE 109.866, 114.635 e 116.766.» Presidência do Senhor Ministro Moreira
(RE 120.268, RTJ 148/885). Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
nistros Sydney Sanches, Octavio Gallotti e
Conheço, em parte, do recurso e, nessa limar Gaivão. Ausente, justificadamente, o
parte, dou-lhe provimento, para que, efe- Senhor Ministro Celso de Mello. Subpro-
tuado o cálculo da remuneração dos recor- curador-Geral da República, Dr. Fávila Ri-
ridos, não exceda ele, de forma alguma, o beiro.
que é pago aos militares do Exército, obser-
vada a correspondência dos postos ou gra- Brasília, 31 de outubro de 1995 — Ri-
duações, como se apurar na execução. cardo Dias Duarte, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 141.627 — MG


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello


Recorrente: ADSERVIS — Administração de Serviços Internos Ltda. —
Recorrida: União Federal
Recurso extraordinário — Programa de Integração Social
(PIS) — Contribuição social —Matéria que não se compreende no âmbito
das finanças públicas — CF/69, art. 55 (Numerus Clausus) — Inconsti-
tucionalidade formal do Decreto-Lei n° 2.445/88 e do Decreto-Lei n°
2.449/88 — Recurso conhecido e provido.
— O Supremo Tribunal Federal, na vigência do ordenamen-
to fundamental anterior, ao qualificar o PIS como contribuição social,
recusou-lhe natureza tributária (RTJ 120/1190). Com isso, excluiu a
possibilidade juridico-constinicional de essa exação — que também não
se subsumia à noção de finanças públicas — ser veiculada mediante
decreto-lei, especialmente ante a taxatividade de que se revestia o rol
inscrito no art. 55 da Carta Federal de 1969.
R.T.J. — 158 221

ACÓRDÃO A pretensão recursal deduzida revela-se


Vistos, relatados e discutidos estes au- plenamente acolhível.
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- A postulação ora manifestada ajusta-se
bunal Federal, em Primeira Turma, na con- integralmente à orientação jurisprudencial
formidade da ata do julgamento e das notas fumada pelo Supremo Tribunal Federal na
taquigráficas, por unanimidade de votos, análise do tema. O STF, ao julgar o RE
em conhecer do recurso e lhe dar provi- 148.754, Rel. p/o acórdão Ministro Fran-
mento. cisco Rezek, proclamou, na sessão Plenária
de 24-6-93, a ilegitimidade constitucional
Brasília, 13 de setembro de 1994 — das espécies legislativas em questão.
Moreira Alves, Presidente — Celso de
Relator. Esta Corte, na vigência do ordenamen-
to fundamental anterior, ao qualificar o
PIS como contribuição social e recusar-lhe
RELATÓRIO natureza tributária (RTJ 120/1190), ex-
cluiu a possibilidade jurídico-constitucio-
O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata- nal de essa exação — que também não se
se de recurso extraordinário interposto por subsumia à noção de finanças públicas —
empresa contribuinte que deseja ver reco- ser veiculada mediante decreto-lei, espe-
nhecido o seu direito de não proceder ao cialmente ante a taxatividade de que se
recolhimento das contribuições devidas ao revestia o rol inscrito no art. 55 da Carta
Programa de Integração Social (PIS), sob Federal de 1969.
alegação de inconstitucionalidade formal Assim sendo, e considerando a incons-
do Decreto-Lei n° 2.445/88 e do Decreto- titucionalidade formal dos Decretos-Leis
Lei n° 2.449/88. n°s 2.445/88 e 2.449/88 em face da ordem
O Tribunal Regional Federal a quo, ao normativa sob a qual foram editados (Carta
proferir a decisão impugnada nesta sede Política de 1969), impõem-se o conheci-
recursal extraordinária, reconheceu a plena mento e o provimento do presente recurso
legitimidade constitucional dos atos legis- extraordinário, para o efeito de, reconheci-
lativos em questão. da a inconstitucionalidade dos decretos-
leis em questão, acolher a pretensão recur-
O presente recurso extraordinário foi sal manifestada pela empresa contribuinte.
admitido na origem. Regularmente proces-
sado, o apelo extremo subiu a esta Corte. É o meu voto.
É o relatório.
EXTRATO DA ATA
VOTO
RE 141.627 — MG — Rel.: Min. Celso
O Sr. Ministro Celso de Meio (Rela- de Mello. Recte.: ADSERVIS — Adminis-
tor): Insurge-se a parte recorrente, na con- tração de Serviços Internos Ltda. (Advs.:
dição de contribuinte, contra acórdão do Faical Baracat e outros). Recda.: União
Tribunal a quo no ponto em que este reco-
Federal.
nheceu a validade jurídica dos Decretos-
Leis ifs 2.445/88 e 2.449/88, disciplinado- Decisão: A Turma conheceu do recurso
res do recolhimento da contribuição para o e lhe deu provimento, nus termos do voto
Programa de Integração Social — PIS. do Relator. Unânime. Ausente, ocasional-
222 R.T.J. — 158

mente, o Senhor Ministro Sepúlveda Per- ce, Celso de Mello e limar Gaivão. Subpro-
tence. curador-Geral da República, Dr. Miguel
Frauzino Pereira.
Presidência do Senhor Ministro Moreira
Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi- Brasília, 13 de setembro de 1994 —
nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten- Ricardo Dias Duarte, Secretário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 143.711 (AgRg) — PR


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Agravante: Ingo Zom — Agravada: PROMEPAR — Produtos Médicos do
Paraná S/A
Constitucional. Mandado de segurança Decisão denegatória.
Recurso ordinário. CF, art. 105, H, b.
Mandado de segurança não conhecido pelo Tribunal de
Justiça, decisão proferida em única instância: cabimento de recurso
ordinário para o STJ. Não cabimento de recurso extraordinário dessa
decisão, dado não ser esta decisão final. Súmula 281.
Agravo não provido.

ACÓRDÃO sendo cabível agravo regimental. O recurso


extraordinário fundamenta-se no art. 102,
Vistos, relatados e discutidos estes au- III, a, da Constituição, argumentando que
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- o acórdão ofendeu o art. 5°, XXII, LIV, LV
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- e LXIX, da mesma Carta.
formidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por decisão unânime, negar Sustenta o agravante que o recurso in-
provimento ao agravo regimental. terposto contra o acórdão proferido em úni-
Brasília, 23 de novembro de 1993 — ca e última instância, pelo Órgão Especial
Reá da Silveira, Presidente — Carlos do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná,
Venoso, Relator. deveria ter sido recebido, processado e jul-
gado como recurso ordinário. Para tanto,
RELATÓRIO traz à colação a decisão proferida no MS
21.112-PR, Rel. Min. Celso de Mello, DJ
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata- de 29-5-90, na qual teria sido reconhecido
se de agravo regimental contra decisão que o direito à interposição do recurso ordi-
negou seguimento ao agravo de instrumen- nário.
to da decisão denegatória do processamen-
to de recurso extraordinário interposto de Ademais, o direito ao recurso incluiria a
acórdão que não conhecera do writ, dado obrigatoriedade, de ordem pública, de ser a
que seria jurisdicional o ato impugnado, causa examinada e julgada no mérito pelo
R.T.J. — 158 223

Tribunal ad quem, sob pena de violação do Acrescento: da decisão do Tribunal de


art. 5°, XXXV, LV e § 1°, da Lei Maior. Justiça seria cabível o recurso ordinário
Finalmente, para o agravante, a única constitucional, para o Superior Tribunal de
possibilidade de exame, em segundo grau Justiça (CF, art. 105, II, b). A decisão im-
de jurisdição, seria o acolhimento e julga- pugnada, pois, porque sujeita a recurso or-
mento do recurso oferecido, como ordiná- dinário, não comportava o recurso extraor-
rio, visto que os princípios da recorribilida- dinário (Súmula 281).
de das decisões judiciais e fungibilidade
O que é surpreendente é que o agravante
recursal foram-lhe negados.
isto reconhece, nas razões do agravo regi-
É o relatório. mental. Vale dizer, nas razões do agravo
regimental, reconhece que do acórdão do
VOTO Tribunal de Justiça, que não conheceu da
segurança, cabia o recurso ordinário. Quer,
O Sr. Ministro Carlos Venoso (Rela- então, agora, que o Supremo Tribunal Fe-
tor): O ora agravante apresentou mandado deral decida pela fungibilidade do recurso
de segurança contra ato do relator em outro especial. Evidentemente que essa questão
mandado de segurança. O Tribunal não — questão nova — não devia ser posta
conheceu do writ, assim ementado o acór- aqui, dado que não tem pertinência com o
dão- recurso extraordinário que interpôs.
«Mandado de segurança. Interposi- Nego provimento ao agravo.
ção em relação a ato de relator, praticado
em outro mandamus, contra quem nes-
te não figura como parte. Não se tratan- EXTRATO DA ATA
do de ato administrativo, mas jurisdicio-
nal, descabe sua impugnação por via do Ag 143.711 (AgRg) —PR —Rel.: Min.
mandado de segurança, mesmo porque Carlos Velloso. Agte.: Ingo Zom (Advs.:
cabível, na espécie, o agravo regimental Roberto Eduardo Knabb e outros). Agda.:
(cf. CF, arts. 102, I, d, e 105, I, b; CE, PROMEPAR — Produtos Médicos do Pa-
art. 101, VII, b; RI, art. 247). raná S/A (Advs.: Blas Gomm Filho e ou-
Impetração não conhecida.» (Fl. tros).
246).
Decisão: Por unanimidade, a Turma ne-
O impetrante, então, interpôs recurso gou provimento ao agravo regimental.
especial (fls. 256/284) e recurso extraordi-
nário (fls. 410/417). No RE, com base no Presidência do Senhor Ministro Néri da
art. 102, 111, a, sustentou-se ofensa ao art. Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
5°, incisos XXII, LIV, LV e LXIX, da Ministros Carlos Velloso e Marco Aurélio.
Constituição. Inadmitido o RE, foi inter- Ausentes, justificadamente, os Senhores
posto o agravo de instrumento, ao qual Ministros Paulo Brossard e Francisco Re-
neguei trânsito. Daí o presente agravo regi- zek. Subprocurador-Geral da República, o
mental. Dr. Francisco José Teixeira de Oliveira.
Mantenho a decisão agravada, por seus Brasflia, 23 de novembro de 1993 —
fundamentos. José Wilson Aragão, Secretário.
224 R.T.J. — 158

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 146.740 (EDc1) — MG


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Maurício Corrêa


Embargante: União Federal — Embargado: Santiago e Companhia Ltda.
Embargos de declaração em recurso extraordinário. Falta de
preparo. Inobservância de pressuposto essencial de recorribilidade. Deser-
ção. Intimação para a prática do ato processual que cumpria ao recorrente.
Marco inicial do prazo para efetivação das despesas processuais. Inexis-
tência do ato jurisdicional. Inércia não imputável à parte. Deserção não
configurada. Omissão quanto à fixação dos honorários advocatícios. Pro-
cedência da alegação.
O artigo 59, I e parágrafo 1°, do RISTF, preceitua que
nenhum recurso subirá ao Supremo Tribunal Federal, salvo caso de
isenção, sem a prova do respectivo preparo e do pagamento das despesas
de remessa e retorno, no prazo legal; que o pagamento das despesas
processuais de recurso interposto perante outros tribunais, far-se-á
junto às suas Secretarias e no prazo previsto na lei processual.
Ainda que silente a Lei n° 8.038/90 sobre a necessidade de
preparo do recurso extraordinário e o prazo para sua efetivação, por
aplicação analógica dos arts. 59, 3°, e 107 do Regimento Interno desta
Corte, persiste a exigência do pagamento das despesas recursais, no
prazo de 10 (dez) dias a contar da efetiva e formal intimação da parte
para esse mister, sendo dispensável que deste ato processual — a intima-
ção — conste o valor das custas, não só porque é esse fixado em tabela
publicada pelo Supremo Tribunal Federal e porque desse pode tomar
conhecimento a parte, no ato de cumprir a exigência. A intimação para
efetuá-lo é exigível. Inexjstindo essa, incabível a pena de deserção. Ale-
gação improcedente.
Embargos de declaração rejeitados.
ACÓRDÃO RELATÓRIO

O Sr. Ministro Maurício Corrêa: A


Vistos, relatados e discutidos estes au- União Federal interpõe os presentes em-
tos, acordam os Ministros componentes da bargos de declaração, com efeitos modifi-
Segunda Turma do Supremo Tribunal Fe- cativos, sob a afirmação de estar omisso o
deral, na conformidade da ata do julgamen- acórdão proferido nos autos do Recurso
to e das notas taquigráficas, por unanimi- Extraordinário (fls.).
dade de votos, rejeitar os embargos de de-
claração. Esclarece a embargante que o Presiden-
te do Tribunal Regional a quo admitiu o
Brasília, 15 de setembro de 1995 — recurso extraordinário, conforme atesta a
Néri da Silveira, Presidente — Maurício certidão constante dos autos, mas, deixan-
Corrêa, Relator. do escoar o prazo de 10 dias para efetivação
R.T.J. — 158 225

do preparo, a recorrente deixou de efetuar digo de Processo Civil. Inaplicação da


o mesmo, como certificado pela secretaria regra do art. 519 do Código de Processo
daquela Corte. Desta forma, sustenta a em- Civil, que diz respeito, tão-só, às apela-
bargante, o recurso extraordinário deveria ções. Agravo regimental improvido.»
ter sido declarado deserto. (AgRag n° 76.845 — STF, 2" Turma —
Esclarece, ainda, que a recorrente-em- RTJ 91/856)
bargada foi validamente intimada para o Por esta razão, espera sejam recebidos
preparo do recurso extraordinário e, uma os embargos de declaração, suprida omis-
vez decorrido o prazo legal de dez dias, são apontada e desconstituído o acórdão
precluiu seu direito recursal. E que, mesmo embargado, vez que, ante a ausência do
não tendo sido declarada a deserção pelo preparo, o extraordinário não poderia ser
Presidente do Tribunal Regional, em razão conhecido.
da falta de preparo, o recurso não poderia É o relatório.
ser conhecido pelo Supremo Tribunal Fe-
deral (art. 65 do RISTF). VOTO
Sustenta a embargante que a exigência
do tempestivo recolhimento do preparo não O Sr. Ministro Mauricio Corrêa: Im-
é mero formalismo, mas cumprimento dos procedem as alegações da União Federal.
pressupostos objetivos de recorribilidade, Preceitua o Regimento Interno do Supremo
ínsitos ao «Due Process of Law». Que, com Tribunal Federal, em seu art. 59, § 1°, que
efeito, a Fazenda Nacional pugna pela obe- «nenhum recurso subirá ao Supremo Tri-
diência às normas procedimentais, inclusi- bunal Federal, salvo caso de isenção, sem
ve o tempestivo recolhimento do preparo, a prova do respectivo preparo e do paga-
certa de que seu cumprimento garantirá a mento das despesas de remessa e retomo,
necessária segurança às relações jurídicas no prazo legal». Todavia, a teor do disposto
dos jurisdicionados. no art. 59, I, do RISTF, far-se-á o preparo
Por fim, para demonstrar o alcance da de recurso interposto perante outros Tribu-
importância do preparo, traz à colação pre- nais, junto às suas Secretarias e no prazo
cedentes jurisprudenciais firmados pelas previsto na lei processual. Ocorre que a lei
Turmas desta Corte: aplicável à época da interposição do ex-
traordinário — Lei n° 8.038/90, que revo-
«Ementa: Recurso extraordinário. gou as disposições do Código de Processo
Preparo. Deserção. Art. 59, I, do Civil no tocante ao recurso extraordiná-
RISTF e arts. 545 c/c 543, do CPC. rio — não cogitou das despesas de preparo
Incorre em deserção o recurso extraor- recursal nem do prazo para a sua efetiva-
dinário se o preparo respectivo não é ção. Entretanto, por aplicação analógica do
feito, no Tribunal de origem, no prazo art. 107 do RISTF, esta Corte tem entendi-
de dez dias a contar da publicação do do que persiste a exigência do preparo e que
despacho que o admite. Recurso ex- esse deva ser efetivado no prazo de 10 dias.
traordinário não conhecido, por deser- Mas, a partir de quando? Entende a União
to.» (RE n° 101.588 — STF, 1' Turma Federal que o prazo há de ser contado a
—RTJ 111/429). partir do despacho que admite o extraordi-
«Ementa: Prazo de preparo do re- nário. Ora, carece de fundamentação a as-
curso extraordinário. Conta- se da pu- sertiva. Umayez que o Regimento Interno
blicação do despacho de admissão do desta Corte, em seu art. 59, I, remete a
apelo extraordinário — art. 545 do C6- controvérsia a lei processual, e esta é silente
226 R.T.J. — 158

quer quanto à exigência do preparo, quer <4. A meu ver, tem razão o Sr.
quanto ao prazo para sua efetivação, para Ministro Octavio Gallotti ao obser-
deslinde da questão há de se aplicar, tam- var que, tendo havido revogação ex-
bém por analogia, como ocorreu na hipóte- pressa dos artigos 541 a 546 do Có-
se da exigência do preparo (art. 107, digo de Processo Civil pela parte fi-
RISTF), o disposto no art. 59, § 3°, do nal do artigo 44 da Lei n° 8.038/90,
RISTF, que preceitua: não há que indagar-se da incompati-
«No Supremo Tribunal Federal, a bilidade, ou não, entre aqueles dispo-
conta será feita no prazo improrrogável sitivos e os desta Lei.
de três dias, pela Secretaria, correndo, 2. Sucede porém, que, quanto ao
da intimação, o prazo para preparo.» preparo do recurso extraordinário —
que é a questão versada neste proces-
Assim, o preparo do recurso há de ser
so administrativo —, decorre ele do
efetivado no prazo de 10 dias, contados da
princípio geral contido no artigo 19
intimação da conta, e não do despacho que
admite o extraordinário, sendo desnecessá- do CPC que continua em vigor, esta-
rio que dela conste o valor das despesas belecendo o artigo 545 da mesma
processuais, vez que a tabela de custas do codificação apenas as normas para a
sua realização, no que dizia respeito
STF contém valores fixos.
ao Tribunal perante o qual seria ele
Não consta dos autos tenham sido as feito (o Tribunal a quo), ao prazo em
embargadas intimadas para o preparo. que deveria realizar-se (10 dias) e à
Logo, quanto à deserção, tenho-a por não abrangência das custas devidas.
configurada. Ao tempo da interposição do Ora, essas normas — com exce-
recurso extraordinário, o preparo somente ção da relativa ao prazo de 10 dias —
era feito mediante a intimação da parte para se encontram também no parágrafo
a prática desse ato, fluindo, a partir de único do artigo 57 (que dispõe sobre
então, o prazo de 10 (dez) dias para sua a abrangência do preparo) e no inciso
efetivação. Aliás, no que diz respeito ao I do artigo 59 (o Tribunal perante o
prazo para efetuar o preparo e a necessida- qual será ele feito) do Regimento
de de intimação da parte para cumprir seu Interno desta Corte, que, tendo força
mister, o eminente Ministro Octavio Gal- de lei pelo sistema constitucional an-
lotti, relator do Agravo Regimental n° terior à atual Carta Magna, foi por
148.475-SP (RTJ 147/1010-1012), assim esta recebido com tal força, ainda que
dirimiu a questão: tenha perdido o Supremo Tribunal
«O prazo para o preparo de recurso Federal sua competência para legis-
extraordinário não é matéria a ser regu- lar sobre o processo dos feitos que
lada pelo Tribunal a quo, mas pela lei lhe competiam julgar. Por outro lado,
processual e pelo Regimento Interno do não foram elas expressamente revo-
Supremo Tribunal, cujo art. 107 está gadas, nem o foram tacitamente, um-
merecer aplicação analógica à espécie vez que não são incompatíveis con
em julgamento. E o que demonstra o as novas normas sobre recurso ex-
parecer emitido pelo eminente Ministro traordinário, as quais, de outra parte,
Moreira Alves, na qualidade de Presi- não são exaurientes da disciplina
dente da Comissão de Regimento e deste, já que se omitem quanto ao
aprovado pelo Presidente do Supremo pagamento das despesas dele decor-
Tribunal, em 26 de novembro de 1990: rentes, e que devem ser providas pelo
R.T.J. — 158 227

interessado, segundo dispõe o artigo Ministros Marco Aurélio e Octavio


19 do CPC. Gallotti.
Conseqüentemente, persiste a
obrigação do preparo do recurso ex-
Quanto ao valor das custas, é dispen-
traordinário com base nos referidos
sável sua indicação na chamada para
dispositivos do nosso Regimento In-
o preparo, não só porque é fixada em
terno, independentemente da revoga-
tabela publicada pelo Supremo Tribunal
ção expressa dos artigos 541 a 546 do
e como porque dele pode tomar conhe-
CPC, revogação essa que trouxe ape-
cimento a parte, no ato de cumprir a
nas um problema: o de saber-se qual
exigência.
o prazo para o pagamento deste pre-
paro, certo como é que o inciso I do Nego provimento ao agravo regi-
artigo 59 do Regimento Interno desta mental.»
Corte aludia ao «prazo previsto na lei Vê-se, então, é dispensável a indicação
processual», e este — que era de 10 do valor do preparo do recurso extraordiná-
dias segundo o artigo 545 do CPC — rio na intimação, porque esse é fixado em
deixou de existir com a revogação tabela pelo Supremo Tribunal Federal, mas
expressa deste dispositivo. a intimação para efetuá-lo é exigível,
para indicar a ação processual a ser cumpri-
Na falta presente de lei processual da, o ônus a ser satisfeito, ou seja, o preparo
que estabeleça o prazo para esse pre- do recurso extraordinário. Eis a jurispru-
paro, e tendo em vista que o de 5 dência desta Corte.
(cinco) dias previsto pelo inciso II do
artigo 110 do nosso Regimento Inter- «Ementa: Fixou-se a jurisprudência
no para «qualquer outro ato» para o do Supremo Tribunal Federal no sentido
qual não tenha sido fixado prazo s6 de bastar a intimação para o pagamento
diz respeito aos com relação aos das custas, quando estas já são conheci-
quais o Regimento é omisso, e não das e pré-fixadas em lei local, para o
aos que decorram de omissão a outra preparo dos recursos, e decretação da
legislação (como é o caso do inciso deserção em não sendo elas pagas.
I, parte final, do artigo 59), parece- Alegação de ofensa ao art. 519 do
me que essa lacuna resultante da re- CPC.
vogação do artigo 545 do CPC pode-
rá ser suprida pela aplicação analógi- A inteligência lógica do dispositivo
ca do artigo 107 do mencionado Re- não vislumbra nela a exigência de que a
gimento o qual reza: intimação deva conter, como da essên-
cia do ato, o montante das custas —
«Art. 107 — os prazos para Precedentes: RE 84.947-SP, 2* Turma e
o preparo que deva ser feito no RE 89.844-PR, 1' Tunna —RTJ 85/933
Supremo Tribunal Federal é de e 91/1122.
dez dias».
Com esse acréscimo, que é in- E, ao contrário do que asseverado pela
dispensável para a completa resolu- União Federal, não consta dos autos te-
ção da questão objeto desse processo nham as embargadas, então recorrentes,
administrativo, concordo com a con- sido formalmente intimadas para as despe-
clusão dos pareceres dos eminentes sas processuais. Portanto, se não foram in-
228 R.T.J. — 158

finadas, incabível a pena de deserção, vez EXTRATO DA ATA


que essa é uma conseqüência de ordem RE 146.740 (Mel) — MG — Rel.:
processual imputável à inércia da parte re- Min. Maurício Corrêa Embte.: União Fe-
corrente, o que, de fato, não ocorreu. deral (Adv.: PFN — Waldemar Cláudio de
Então, sendo certo que, por aplicação Carvalho). Embdo.: Santiago e Companhia
Ltda. (Advs.: Luiz Alberto Bettiol e ou-
analógica do art. 107 do Regimento Interno
desta Corte, o preparo do recurso extraor- tros).
dinário há de ser efetivado no prazo de 10 Decisão: Por unanimidade, a Turma re-
dias; que, por aplicação analógica do art. jeitou os embargos de declaração.
59, § 3°, do RISTF, esse prazo tem como Presidência do Senhor Ministro Néri da
marco de sua fluência a efetiva intimação Silveira Presentes à Sessão os Senhores
da parte para o seu mister; e porque não Ministros Marco Aurélio e Maurício Cor-
consta dos autos a intimação da parte inte- rêa. Ausentes, justificadamente, os Senho-
ressada para efetivá-lo, refuto a alegada res Ministros Carlos Velloso e Francisco
pena de deserção propugnada pela União Rezek. Subprocurador-Geral da República,
Federal. o Dr. Mardem Costa Pinto.
Ante o exposto, conheço dos embargos Brasília, 15 de setembro de 1995 —
de declaração, mas os rejeito. Wagner Amorim Madoz, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 146.749 — DF


(Tribunal Pleno)

Relator p/ o acórdão: O Sr. Ministro Moreira Alves


Recorrente: União Federal — Recorridos: Aladia Ribeiro e outros
Suspensão, em 7-4-88, pelo artigo 1°, capta, do Decreto n°
2.425/88, dos reajustes, pela Unidade de Referência de Preços (URP), dos
vencimentos de abril e maio de 1988.
A jurisprudência desta Corte se firmou no sentido de que
não há direito adquirido a vencimentos de funcionários públicos, nem
direito adquirido a regimento jurídico instituído por lei. Precedentes do
STF.
Conseqüentemente, diploma legal novo, que reduza venci-
mentos (inclusive vantagens), se aplica de imediato, ainda que no mês em
curso, pois alcança o período de tempo posterior à sua vigência, dado que
não há, no caso, direito adquirido.
No caso, sendo de aplicação imediata o artigo 1°, capta,
do Decreto-Lei n° 2.425/88, e estabelecendo ele, apenas, que o reajuste
mensal previsto no artigo 8° do Decreto-Lei n° 2.335/87 não se aplicaria
nos meses de abril e maio de 1988 (o que implica dizer que ele não
determinou a redução dos vencimentos a que os servidores já faziam jus,
R.T.J. — 158 229

mas apenas estabeleceu que aquele reajuste não seria aplicado nos
referidos meses), os funcionários têm direito apenas ao reajuste, calcu-
lado pelo sistema do artigo 8°, § 1°, do Decreto-Lei n° 2.335, com relação
aos dias do mês de abril anteriores ao da publicação desse Decreto-Lei
(ou seja, os sete primeiros dias do mês de abril de 1988, uma vez que o
referido artigo 1°, caput, entrou em vigor no dia oito de abril de 1988,
data em que foi publicada, pois não sofreu alteração na republicação feita
no dia onze do mesmo mês), bem como ao de igual valor, não cumulati-
vamente, no mês de maio seguinte.
Recurso extraordinário conhecido e, em parte, provido.
ACÓRDÃO A sentença de fls. 41/52 julgou proce-
dente o pedido.
Vistos, relatados e discutidos estes au-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- A Segunda Turma do Tribunal Regional
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con- Federal da 1' Região, por unanimidade,
formidade da ata do julgamento e das notas negou provimento à apelação da União
taquigráficas, por unanimidade de votos, Federal e à remessa oficial, em acórdão
em conhecer do recurso extraordinário e, assim ementado:
por maioria de votos, lhe dar provimento Constitucional e administrativo.
em parte, para julgar em parte procedente a Suspensão das URPs de abril e maio
ação, nos termos do voto proferido pelo de 1988. Decreto-Lei n° 2.425/88. In-
Ministro Moreira Alves. Vencidos os Mi- constitucionalidade.
nistros Relator e Marco Aurélio, que tam-
bém conheciam do recurso, mas lhe nega- I. O Plenário desta Corte, na assenta-
vam provimento. da de 16-5-91, declarou inconstitucional
o Decreto-Lei n° 2.425, de 7-4-88, que
Brasília, 24 de fevereiro de 1994 — suspendeu o pagamento das URPs nos
Octavio Gallotti, Presidente — Moreira meses de abril e maio de 1988, à consi-
Alves, Relator p/ o acórdão. deração de que não poderia fazê-lo,
àquela data, porque o direito a tais
RELATÓRIO reajustes já se incorporara ao patrimô-
nio dos servidores, desde 1°-3-1988, em
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Aladia decorrência do término do trimestre
Ribeiro e outros ajuizaram ação ordinária aquisitivo (dezembro de 1987, janeiro
contra a União Federal, pleiteando a apli- e fevereiro de 1988), ocorrido em
cação do Decreto-Lei n° 2.335/87, que as- 29-2-1988.
segurou aos trabalhadores, a título de ante-
cipação, reajuste mensal dos salários em H. Apelação e Remessa Oficial des-
proporção idêntica à variação da Unidade providas.»
de Referência de Preços — URP. Susten- O inteiro teor da citada decisão plenária
tam ser inconstitucional o Decreto-Lei n°
foi juntada nos autos.
2.425/88 e requerem a condenação da ré ao
pagamento dos prejuízos causados com a Inconformada, a União Federal inter-
suspensão da incidência da URP nos meses põe recurso extraordinário, fundado no art.
de abril e de maio, com juros e correção 102, III, a e b, da Constituição Federal.
monetária. Alega, em síntese, que:
230 R.T.J. — 158

«a decisão recorrida deu aos temas VOTO


do direito adquirido e do ato jurídico per- Ementa: Constitucional. URP. Servi-
feito (EC n° 1/69, art. 153, § 3°, e CF, art. dor Público. Reajuste de vencimentos:
5°, XXXVI) interpretação incompatível suspensão. Decreto-Lei n° 2.425/88. Di-
com a previsão constitucional, confundin- reito adquirido. Inconstitucionalida-
do tais princípios com o conceito de expec- de. DL n° 2.335, de 12-6-87.
tativa de direito»;
Constituição de 1967, art. 153, § 3°;
«quando o Decreto-Lei n° 2.425/88 Constituição de 1988, art. 5°, XXXVI.
foi editado, em 7-4-88, não se havia, ainda,
completado o período aquisitivo do direito Suspensão do pagamento da URP
a vencimentos do mês de abril e, muito quando já adquirido o direito à sua per-
menos, do mês de maio»; cepção. Violência a direito adquirido.
Inconstitucionalidade.
«no dia 7-4-88 não se podia falar de
direito adquirido a vencimentos do mês de RE não conhecido.
abril e do mês de maio. Quando muito
haveria mera expectativa de direito a esses O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela-
vencimentos, desde que houvesse presta- tor): O DL n° 2.335, de 12-6-87, instituiu a
ção de serviços durante esse período, sendo Unidade de Referência de Preços — URP
que o pagamento se daria de acordo com a — para fins de reajuste de preços e salários
lei vigente na época em que se consumasse (artigo 3°), estabelecendo que ela seria de-
o pressuposto de fato (exercício laborai) terminada pela média mensal da variação
que desse direito à remuneração respecti- do IPC ocorrida no trimestre imediatamen-
va»; te anterior. Essa média seria aplicada a cada
mês do trimestre subseqüente pelo seu va-
«o decreto-lei não atingiu, pois, si- lor fixo (art. 3°, § 1°). Noutras palavras,
tuação consumada, mas relações jurídicas estabelecia a norma legal que a URP, deter-
ainda em desenvolvimento e futuras»; minada pela média de um trimestre, recom-
poria perdas salariais no trimestre seguin-
e) «em resumo, não importa a simples
te. A URP substituiu o «gatilho salarial»
verificação da variação da URP segundo a
que era disciplinado pelo DL n° 2.284, de
lei anterior (elemento econômico). O que é
10-3-86.
relevante, isto sim é que, por ocasião da
integração do elemento laborai, o mês sub- O referido DL n° 2.335/87 assegurou
seqüente de que trata o artigo do Decreto- aos trabalhadores em geral, bem assim aos
Lei n° 2.333/87, a lei determinante do rea- servidores civis e militares da União e de
juste não mais estava em vigor». suas autarquias, o reajuste dos salários e
vencimentos, em proporção idêntica à va-
Admitido o recurso na origem, subiram
riação da URP (art. 8°, § 1°).
os autos.
Pela Portaria n° 120/88, do Ministro da
O ilustre Subprocurador-Geral da Repú-
Fazenda, foi fixado o percentual de 16,19%
blica Arthur de Castilho Neto, oficiando às
para o reajuste dos salários e vencimentos
fls. 146/147, opina pelo provimento parcial
dos servidores no trimestre relativo aos me-
do recurso para afastar tão somente a apli-
ses de março, abril e maio/88. Quer dizer,
cação do reajuste relativo ao mês de maio
no trimestre relativo aos meses dez/87, ja-
de 1988.
neiro e fevereiro de 1988, a URP fora de
É o relatório. 16,19%.
R.T.J. — 158 231

Sobreveio, então, o DL n° 2.425, de O direito ao reajuste mensal de


7-4-88, que suspendeu a aplicação do per- vencimentos pela Unidade de Refe-
centual de 16,19% nos meses de abril e rência de Preços — URP acha-se
maio de 1988. A suspensão operou-se da submetido a um período trimestral de
seguinte forma: para os servidores, a partir aquisição durante o qual existe, tão-
de abril de 1988; para os magistrados, a somente, expectativa de direito.
partir de maio de 1988.
Findo, entretanto, o trimestre e
Posteriorrnente, o DL n" 2.353/88 e a Lei havendo variação do índice de Pre-
n°7.686/88 restabeleceram o pagamento da ços ao Consumidor, nasce o direito
URP de abril/88 (servidores) e de maio/88 ao aludido reajuste, em percentual
(magistrados), mas sem efeito retroativo fixo para os três meses imediatamen-
aos meses da suspensão. Resultou, então, o te posteriores, que passa a integrar o
não pagamento da URP nos períodos de património do funcionário público
abril/88 e outubro/88 (servidores) e de como direito adquirido, intocável e
maio/88 a outubro/88 (magistrados). resguardado por princípio constitu-
cional expresso. (Constituição Fede-
Restabelecida a aplicação da URP, a
ral de 1967, art. 153, § 3°; Constitui-
Portaria n° 354, de 30-XI-88, fixou o per-
ção Federal de 1988, art. 5°, item
centual de 26,05% relativo ao trimestre setem-
XXXVI.)
bro a novembro/88, a ser pago no trimestre
subseqüente, dez/88 a fevereiro/89. Quando o art. 1°, caput, do
Examinamos, aqui, apenas a URP rela- Decreto-Lei n° 2.425/88, suspendeu,
em 7-4-1988, os reajustes, pela Uni-
tiva ao trimestre dezembro/87 a feverei-
dade de Referência de Preços —
ro/88, a ser paga no trimestre março a maio
URP, dos vencimentos de abril e
de 1988, fixada em 16,19%, cujo pagamen-
maio de 1988, não mais poderia
to foi suspenso pelo DL n" 2.425, de 7-4-88.
fazê-lo porque o direito a tais reajus-
O acórdão do Tribunal Regional Federal tes já se incorporara ao patrimônio do
da 14 Região, tomado na argüição de in- funcionário público (direito adquiri-
constitucionalidade na AC n° 89.01.00619- do) desde 1°-3-1988 em decorrência
7-MG, Relator o eminente Juiz Catão Al- do término do trimestre aquisitivo
ves, decidiu pela inconstitucionalidade do (dezembro de 1987, janeiro e feverei-
art. 1°, caput, do DL n° 2.425/88, que sus- ro de 1988), ocorrido em 29-2-1988,
pendeu o pagamento da URP, reconhecen- sendo ato jurídico perfeito.
do em favor dos servidores o direito adqui-
3. Inconstitucionalidade do art.
rido.
1°, caput, do Decreto-Lei n° 2.425/88,
O acórdão está assim ementado: reconhecida.»
Destaco do voto do eminente Juiz Catão
«Funcionário público — Rea- Alves:
justes de vencimentos pela Unida-
de de Referência de Preços — Sis-
temática — Suspensão pelo Decre- 4. Nota-se, portanto, que o direito ao
to-Lei n° 2.425/88 — Ilegitimidade reajuste mensal de salários e vencimen-
— Direito adquirido e ato jurídico tos pela Unidade de Referência de Pre-
perfeito existentes — Inconstitu- ços — URP achava-se submetido a um
cionalidade reconhecida. período trimestral de aquisição, durante
232 R.T.J. — 158

o qual existia, tão-somente, expectativa pela Unidade de Referência de Preços


de direito, mesmo porque, se não hou- — URP, como demonstrado, era adqui-
vesse variação do Indice de Preços ao rido para todo o trimestre e possuía pres-
Consumidor no trimestre, não haveria supostos diversos, o que era reconhe-
como se falar em reajuste pela Unidade cido pela própria Apelante ao expedir,
de Referência de Preços — URP. Findo periodicamente, Portarias, estabelecen-
o trimestre, entretanto, havendo varia- do o percentual fixo para o trimestre
ção do Índice de Preços ao Consumidor, subseqüente ao atinente ao período
nascia o direito ao reajuste discutido, em aquisitivo.
percentual fixo para os três meses ime- 9. Nessa ordem de idéias, o funcio-
diatamente posteriores, que passava a nário só receberia os vencimentos de
integrar o patrimônio dos trabalhadores abril e maio se, efetivamente, trabalhas-
como direito adquirido.» se e em valor que poderia, até mesmo,
ser reduzido durante o mês respectivo.
«(...) Todavia, desenvolvido o trabalho, os
vencimentos teriam, obrigatoriamente,
No caso, diversamente do que ale- que ser pagos com os reajustes pela Uni-
gam a Apelante e o Ministério Público dade de Referência de Preços — URP
Federal, quando o art. 1°, caput, do De- previstos para os meses supracitados,
creto-Lei n° 2.425/88 suspendeu, em cujo direito fora adquirido no trimestre
7-4-88, os reajustes, pela Unidade de anterior, ou seja, no período de dezem-
Referência de Preços — URP, dos ven- bro de 1987 a fevereiro de 1988 (Decre-
cimentos de abril e maio de 1988, não to-Lei n° 2.335/87, art. 3°, § 1°) e, por-
mais poderia fazê-lo porque o direito tanto, já estava incorporado ao respecti-
aos reajustes já se incorporara ao patri- vo patrimônio.»
mônio dos Apelados desde 1°-3-1988
em decorrência do término do trimes- O acórdão do Regional Federal, ao dar
tre aquisitivo (dezembro de 1987, ja- pela inconstitucionalidade do art. 1° do DL
neiro e fevereiro de 1988), ocorrido em n° 2.425/88, procedeu com acerto.
29-2-1988, sendo ato jurídico perfeito. Por ocasião do julgamento da ADIn n°
(Itens, 4 e 5 supra). 694-DF, em que se examinou a constitucio-
Na realidade, a Apelante e o Mi- nalidade da Resolução Administrativa n°
nistério Público Federal estão a confun- 32, de 9-10-91, do Egrégio Superior Tribu-
dir direito a salário com direito a rea- nal Militar, que autorizou o pagamento das
juste; aquele sempre dependente de parcelas remanescentes da URP de feverei-
prestação de serviço; este obtido por ro de 1989 (26,05%), no período de feve-
todo o trimestre como resultado do im- reiro/89 a outubro/89, proferi o seguinte
plemento de condições fálico-temporais voto:
ocorridas em trimestre anterior. «Trata-se de ação direta de inconsti-
8. De outro lado, a tese de que o tucionalidade ajuizada pelo Procurador-
direito aos reajustes seria parte acessória Geral da República, na qual é argüida a
das remunerações dos meses discutidos inconstitucionalidade da Resolução Ad-
e, portanto, nasceria juntamente com ministrativa n° 32, de 9-10-91, do Egré-
elas, concessa venia, não merece guari- gio Superior Tribunal Militar, que auto-
da porque, se o direito aos vencimentos rizou o pagamento das parcelas rema-
nascia mês a mês, o direito aos reajustes nescentes da URP de fevereiro de 1989
R.T.J. — 158 233

(26,05%), no período de fevereiro/89 do IPC, assim a URP de setembro, ou-


a outubro/89. Argúi-se a incompatibili- tubro e novembro de 1988, foi determi-
dade da referida Resolução com o dis- nada em 26,05%. Na forma do estabele-
posto nos artigos 37, X, 96,11, b, 5°, cido no DL n° 2.335/87, art. 3°, § 1°,
XXXVI, 37, XV e 95, RI, da Constitui- seria aplicada no trimestre dezembro/88
ção Federal. a fevereiro/89, para o fim de recompor
Na sessão do dia 24-6-93, o eminente as perdas salariais. Registre-se: para o
Ministro Marco Aurélio, Relator, vo- fim de recompor as perdas salariais, tor-
tou no sentido da procedência da ação, nar real o salário, e não para o fim de
pelo que declarou a inconstitucionalida- efetivar aumento salarial.
de da Resolução n° 32, de 9-10-91, do Quando já vencido o trimestre de
Superior Tribunal Militar. determinação da URP — o trimestre
Pedi vista dos autos e os trago, a fim relativo aos meses setembro, outubro
de retomarmos o julgamento da ação. e novembro de 1988 — foi editada a
Medida Provisória n° 32, de 15-1-89,
Passo a votar. que foi convertida na Lei n° 7.730, de
O DL n° 2.335, de 12-6-87, instituiu 31-1-89, que revogou o DL n° 2.335, de
a Unidade de Referência de Preços — 1987 (art. 38), revogando o sistema
URP — para fms de reajuste de preços URP. A Lei n° 7.730, de 31-1-89, revo-
e salários (art. 3°), estabelecendo que ela gando o sistema URP, determinou o
seria determinada pela média mensal da congelamento de preços e salários e ins-
variação do IPC ocorrida no trimestre tituiu outro critério de reajustamento.
imediatamente anterior. Essa média se- Quanto ao mês de fevereiro de 1989, os
ria aplicada a cada mês do trimestre vencimentos deveriam ser reajustados
subseqüente pelo seu valor fixo (art. 3°, em 26,05%, como o foram nos meses de
§ 1°). Noutras palavras, estabelecia a dezembro/88, e janeiro/89. Todavia,
norma legal que a URP, determinada não tiveram qualquer atualização. Quer
pela média de um trimestre, recomporia dizer, foram reduzidos.
perdas salariais no trimestre seguinte.
Noutras palavras, vencido o período
O referido DL n° 2.335/87 assegurou aquisitivo do direito à reposição — o
aos trabalhadores em geral, bem assim trimestre relativo aos meses de setem-
aos servidores civis e militares da União bro, outubro e novembro de 1988 —
e de suas autarquias, o reajuste dos salá- estando os servidores no gozo do direito
rios e vencimentos, em proporção idên- à reposição, sobreveio a citada Lei n°
tica à variação da URP (art. 8°, § 1°). 7.730, de 31-1-89, que revogou a URP.
Com base no disposto no art. 15, V, Não custa repetir que a lei nova, Lei n°
do citado DL n° 2.335/87, o Ministro da 7.730, de 31-1-89, não trouxe compen-
Fazenda editou a Portaria GM-MF n" sação pela perda salarial já ocorrida. Na
354, de 30-11-88, fixando o índice verdade, pelo art. 5° da Lei n° 7.730, de
26,05% para o reajuste mensal dos ven- 31-1-89, apenas foi determinado que se
cimentos no trimestre relativo aos me- observasse o valor médio real de 1988,
ses de dezembro/88 a fevereiro/89. fazendo-se o congelamento de preços e
salários.
Quer dizer, no trimestre relativo aos
meses de setembro, outubro e novembro A norma de congelamento, entretan-
de 1988, a média aritmética da variação to, não poderia suprimir a parcela de
234 R.T.J. — 158

reposição do valor real de 1988, que fora mir o pagamento da parcela de recom-
previamente assegurada, para incidir em posição salarial, no mês de fevereiro de
fevereiro de 1989. Suprimindo a referi- 1989. Deveria respeitar o valor real do
da parcela de reposição, violou o direito salário ou vencimento. Com proprieda-
adquirido e reduziu vencimentos dos de, escreveu o Ministro Dias Trindade,
servidores, praticando ofensa, de uma só do Superior Tribunal de Justiça, no voto
vez, a dois princípios constitucionais: o que proferiu a respeito do tema, naquela
do direito adquirido, inscrito no art. 5°, Corte, por cópia às fls. 34/36:
XXXVI, e o da irredutibilidade dos ven- «Ç..)
cimentos, consagrado no art. 37, XV, da
Constituição. Ora essa norma de congelamento
não poderia abstrair a parcela de re-
Sustenta a Procuradoria-Geral da Re- posição do valor real de 1988, previa-
pública, no parecer de fls. 70/78, que, mente assegurada, para incidir em
«na espécie, o direito ao reajuste de fevereiro de 1989, antes, ao contrá-
26,05%, no mês de fevereiro, só se cons- rio, recomenda à preservação desse
tituiria se o Dec.-Lei n° 2.335, de 1987, mesmo valor real.
ainda subsistisse no próprio mês de fe-
vereiro de 1989.» E tanto é assim, que lei de dezem-
bro de 1989, que possibilitou a incor-
Equivoca-se, data venia, o parecer. poração da URP, segundo o cálculo
O direito à reposição surgiu com a do trimestre setembro/novembro de
ocorrência da inflação no trimestre rela- 1988, embutido no reajustamento
tivo aos meses de setembro, outubro e previsto para novembro de 1989,
novembro/88, vale dizer, com a perda para o pessoal do Poder Executivo,
salarial ocorrida no citado trimestre, fa- implicitamente admitiu a supressão
zendo-se a reposição no trimestre se- irregular do pagamento da parcela na
guinte, dezembro/88 a fevereiro/89. Es- remuneração de fevereiro de 1989.
tando o servidor trabalhando em feve- Essa Lei n° 7.923, de 12 de de-
reiro de 1989, deveria receber a recom- zembro de 1989, diz com todas as
posição. Trabalhar no mês de feverei- letras que o percentual indicado inci-
ro/89 não é condição de nascimento do diria, a partir de novembro desse ano,
direito, mas condição de recebimento da «a título de reposição salarial», como
recomposição, que viria com o seu salá- tal adquirida desde a edição do ato
rio de fevereiro/89. O parecer, data ve- que definiu a média da variação do
nia, confunde condição de nascimento IPC, no trimestre mencionado — se-
do direito à reposição com condição de tembro/novembro de 1988 — e para
recebimento dessa mesma recomposi- aplicação no seguinte — dezembro
ção 0 fato criador do direito, assim o de 1988/fevereiro de 1989.
fato jurígeno, foi a perda salarial ocorri-
da no trimestre mencionado, relativo Só que dita reposição se fez ape-
aos meses setembro, outubro e novem- nas a partir de novembro de 1989,
bro/88. A lei nova foi editada quando já sem considerar a sua incidência des-
ocorrido o fato jurígeno, foi editada de fevereiro, como devido.»
quando ocorriam os pagamentos da re- No julgamento do MS n° 21.216-DF,
composição salarial. A norma de conge- em 5-12-90, Relator o Ministro Octa-
lamento não poderia, na verdade, supri- vio Gallotti, a propósito do reajuste de
R.T.J. — 158 235

84,32% suprimido pelo chamado «Pla- já ocorrera a variação do IPC, de


no Conon», a tese jurídica debatida foi 15-2-90 a 15-3-90, conforme divul-
semelhante a que está sob julgamento gado pelo IBGE, cumprindo ao em-
(RTJ 134/1112). Proferi, então, voto que, pregador o pagamento, no mês se-
embora vencido, na companhia honrosa guinte, ou no mês de abril. Porque,
dos Ministros Sepúlveda Pertence e vale repetir, a Medida Provisória
Paulo Brossard, não estou convencido 154, que entrou em vigor no dia
do desacerto dos seus termos. Disse eu: 16-3-90, encontrou condição aper-
«Sr. Presidente, ao que ouvi e feiçoada, fato gerador do direito já
apreendi, a Lei n° 7.830, de 28-9-89, ocorrido, por inteiro.
estabeleceu, no art. 1°, que os venci- A partir de 16-3-90, a lei nova
mentos dos servidores seriam reajus- alterou a regra, deixou de considerar
tados, trimestralmente, em percen- o fato atrás mencionado como capaz
mal igual à variação acumulada do de dar nascimento a direito subjetivo.
IPC, verificada nos três meses ante- A lei nova, entretanto, vale para o
riores, deduzidas as antecipações do futuro, não pode retroagir (Constitui-
art. 2°, dando-se o primeiro reajuste ção, art. 5°, XXXVI).
trimestral em outubro de 1989. O
artigo 2° estatuiu, a seu turno, que A partir de abril de 1990, desde
que os servidores trabalhassem, vale
sempre que a variação do IPC verifi-
dizer, desde que realizassem a condi-
cada no mês anterior fosse superior a
ção para o recebimento do reajuste,
cinco por cento, os estipêndios dos
reajuste a que fizeram jus no dia
servidores seriam reajustados, a títu-
15-3-90, deveriam recebê-lo, porque
lo de antecipação, pelo percentual
é necessário distinguir a condição ou
correspondente a este excedente (Lei
o fato que deu nascimento ao direito
n° 7.830/89, arts. 1° e 2°). A Lei n°
ao reajuste da condição para recebi-
7.974, de 22-12-89 também dispôs a
mento deste: a condição escolhida
respeito do tema. A Lei n° 7.730, de
pela lei para dar nascimento ao direi-
31-1-89, art. 10, determinou que «O
to, ou o fato gerador deste, é a varia-
IPC, a partir de março de 1989, será
ção do IPC calculada na forma do art.
calculado com base na média dos
10 da Lei n° 7.730, de 31-1-89, veri-
preços apurados entre o início da Ti
ficada no dia 15-3-90; a condição
(segunda) quinzena do mês anterior
para o recebimento do reajuste,
e o término da I° (primeira) quinzena
direito ao reajuste adquirido no dia
do mês de referência.»
15-3-90, é ter o servidor trabalhado
Posta assim a questão, Senhor no mês de abril de 1990, trabalhado
Presidente, verifica-se que quando ou ter continuado vinculado ao em-
veio a lume a MP n° 154, de 15-3-90, prego.
publicada no DO de 16-3-90, que
acabou se convertendo na Lei n° Do exposto, apesar de compreen-
8.030, de 12-4-90, a condição esco- der a extensão desta decisão, desde
lhida pela lei para dar nascimento ao que ocorrido o fato gerador do direito
direito subjetivo dos servidores, ou o subjetivo, não posso deixar de deferir
acontecimento que a lei elegeu para o mandado de segurança, com a vê-
dar nascimento ao direito ao reajus- nia do eminente Ministro Relator.
te, já ocorrera, por inteiro, vale dizer, Defiro o writ.»
236 R.T.J. — 158

A lei nova, Lei n° 7.730, de 31-1-89, direito adquirido que a Constituição preté-
é violadora, portanto, do princípio cons- rita consagrava no art. 153, § 3°, e que a
titucional do direito adquirido inscrito Constituição promulgada a 5 de outubro de
no art. 5°, XXXVI, da Constituição. 1988 inscreve no seu art. 5°, XXXVI.
Há mais. Do exposto, não conheço do recurso.
A lei nova, Lei n° 7.730, de 31-1-89, EXTRATO DA ATA
viola, também, o princípio constitucio-
nal da irredutibilidade de vencimentos RE 146.749 — DF — Rel.: Min. Carlos
dos servidores consagrado no art. 37, Venoso. Arrete.: União Federal. Recdos.:
XV, da Lei Maior. Aladia Ribeiro e outros (Adv.: Benedito
É que o vencimento do servidor, em Oliveira Brauna).
dezembro de 1988 e janeiro de 1989, Decisão: Depois do voto cio Relator, não
estava fixado, por lei, com a recomposi- conhecendo do recurso, o julgamento foi
ção salarial. Suprimida, a partir de feve- adiado em virtude do pedido de vista dos
reiro/89, a dita recomposição salarial, autos, formulado pelo Ministro Moreira
houve, inegavelmente, redução de ven- Alves.
cimentos. Exemplifiquemos com os Presidência do Senhor Ministro Octavio
vencimentos dos magistrados, que são, Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
também, irredutíveis: o salário do ma- Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
gistrado, em julho/93 é de cinqüenta mil Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Car-
cruzeiros reais. Se o magistrado conti- los Velloso, Marco Aurélio, limar Gaivão
nuar no exercício do seu cargo nos me-
e Francisco Rezelc Ausentes, justificada-
ses seguintes, não poderá receber menos mente, os Senhores Ministros Paulo Bros-
do que recebeu em julho/93. O mesmo sard e Celso de Mello. Procurador-Geral da
exemplo pode ser figurado em relação República, Dr. Aristides Junqueira Alva-
aos vencimentos dos membros do Mi-
renga.
nistério Público Federal, como em rela-
ção aos vencimentos de qualquer servi- Brasília, 6 de outubro de 1993 — Luiz
dor público. Lei nenhuma poderá redu- Tomimatsu, Secretário.
zir esse vencimento, não sendo compa- VOTO (EM PEDIDO DE VISTA)
tível com a Constituição o argumento no
sentido de que uma lei poderia reduzir O Sr. Ministro Moreira Alves: I. A
esse vencimento para o futuro. questão jurídica concernente à presente
Do exposto, com a vênia do eminente ação diz respeito a saber-se se está, ou não,
Ministro Relator, meu voto é no sentido correta a declaração de inconstitucionalida-
de julgar improcedente a ação direta de de, incidenter tantum, do artigo 1°, caput,
inconstitucionalidade. do Decreto-Lei n° 2.425/88, reconhecida
Aqui, não há falar no princípio da irre- pelo Plenário do Tribunal Regional Federal
dutibilidade de vencimentos, dado que essa da 1° Região, com base na seguinte funda-
garantia, que era concedida aos magistra- mentação:
dos, somente foi estendida aos servidores, «Quando o art. 1°, caput, do Decreto
de modo geral, com a Constituição de 1988, n° 2.425/88, suspendeu, em 7-4-1988,
art. 37, XV. No caso, a suspensão do paga- os reajustes, pela Unidade de Referência
mento do URP deu-se em abril de 1988. A de Preços — URP, dos vencimentos de
suspensão violou, no caso, o princípio do abril e maio de 1988, não mais poderia
R.T.I. — 158 237

fazê-lo porque o direito a tais reajustes Abreu), 24.362 (1' Turma, 2-12-54, Min.
já se incorporara ao patrimônio do fun- Ribeiro da Costa), 130.213 (1' Turma,
cionário público (direito adquirido) des- 23-4-93, Min. limar Gaivão), 116.683 (1'
de 1°-3-1988 em decorrência do término Turma, 13-3-92, Min. Celso de Mello) e
do trimestre aquisitivo (dezembro de MS 21.086 (Plenário, 30-10-92, Min. Mo-
1987, janeiro e fevereiro de 1988) ocor- reira Alves).
rido em 29-2-1988, sendo ato jurídico Conseqüentemente, diploma legal
perfeito». novo, que reduza vencimentos (inclusive
O eminente relator, em seu voto, não vantagens), se aplica de imediato, ainda
conhece do presente recurso extraordiná- que no mês em curso, pois alcança o perío-
rio, por entender que o acórdão recorrido do de tempo posterior à sua vigência, dado
corretamente deu pela inconstitucionalida- que não há direito adquirido a vencimentos,
de acima referida. nem direito adquirido a regime jurídico de
constituição de vencimentos. Em se tratan-
2. Com a devida vênia, divirjo do en- do de aplicação imediata da norma legal,
tendimento de S. Exa. não alcança ela, evidentemente, os venci-
É jurisprudência antiga desta corte a de mentos já pagos, ou os devidos pro labore
que não há direito adquirido a vencimentos facto.
de funcionários públicos (no caso, trata-se Por outro lado, não há como sustentar-se
de funcionários estatutários), nem direito que esses princípios se aplicam ao direito a
adquirido a regime jurídico instituído por vencimentos e não ao direito a reajuste
lei. Quanto à inexistência de direito adqui- decorrente de correção monetária. Reajuste
rido a vencimentos de funcionários públi- por causa de correção monetária nada mais
cos — que, por isso mesmo, antes que a é do que a atualização da expressão mone-
atual Constituição lhes estendesse a garan- tária dos vencimentos, e, se estes podem ser
tia da irredutibilidade, podiam ser reduzi- reduzidos para o futuro é óbvio que podem
dos a qualquer tempo —, cito, a título me- sê-lo com a sua expressão monetária atua-
ramente exemplificativo, os julgamentos lizada ou não.
proferidos nos RREE 59.389 (RTJ 43,
Ademais, inexistindo direito adquirido
543/544, Min. Cândido Mota Filho),
também a regime jurídico, o pretendido
66.989 (RTJ 52, 128/129, Min. Eloy da
direito ao reajuste com base no regime es-
Rocha), 73.644 (RTJ 67, 779/780, Mim
tabelecido pelo Decreto-Lei n° 2.335/87,
Djaci Falcão), 76.402 (RTJ 71, 786/789,
para que se aplique a todo o mês de abril e
Min. Barros Monteiro), 79.725 (RTJ 81,
ao mês de maio de 1988, importa em pre-
115/118) e RE 81.509 (RTJ 81, 131/136).
tender a existência — que esta Corte não
E, no tocante à inexistência de direito ad-
admite — de direito adquirido ao regime
quirido a regime jurídico instituído por lei,
invoco, também a título ilustrativo, as de- jurídico desse reajuste.
cisões prolatadas nos RREE 99.955 (2° No caso, sendo de aplicação imediata o
Turma, 7-2-86, Min. Carlos Madeira), RE artigo 1°, caput, do Decreto-Lei n°
99.594 (2* Turma, 9-12-83, Min. Francisco 2.425/88, e estabelecendo ele, apenas, que
Rezek), RE 99.522 (2° Turma, 20-5-83, o reajuste mensal previsto no artigo 8° do
Min. Moreira Alves), 92.638 (2' Turma, Decreto-Lei n° 2.335/87 não se aplicaria
12-8-80, Min. Moreira Alves), 92.566 (2° nos meses de abril e maio de 1988 (o que
Turma, 12-8-80, Min. Moreira Alves), implica dizer que ele não determinou a
90.781 (2' turma, 16-9-80, Min. Leitão de redução dos vencimentos a que os servido-
238 R.T.J. - 158

res já faziam jus, mas apenas estabeleceu ver direito adquirido ao reajuste relativo
que aquele reajuste não seria aplicado nos aos dias do mês de abril, transcorridos
referidos meses), os funcionários têm direi- antes da data da publicação do Decreto-
to apenas ao reajuste, calculado pelo siste- Lei n° 2.425, de 7-4-1988. Ficaram ven-
ma do artigo 8°, § 1°, do Decreto-Lei n° cidos os Ministros Ilmar Gaivão, Carlos
2.335, com relação aos dias do mês de abril Velloso e Celso de Mello, que reconhe-
anteriores ao da publicação desse Decreto- ciam a existência de direito adquirido ao
Lei (ou seja, os sete primeiros dias do mês reajuste relativo a todo o mês de abril, o
de abril de 1988, uma vez que o referido art. qual se incorporaria aos vencimentos
caput, entrou em vigor no dia oito de dos meses de maio, junho e julho se-
abril de 1988, data em que foi publicada, guintes. Quanto ao reajuste de venci-
pois não sofreu alteração na republicação mentos dos Ministros da Corte, pela
feita no dia onze do mesmo mês), bem aplicação da URP, no mesmo período, o
como ao de igual valor, não cumulativa- Tribunal, por votação unânime, consi-
mente, no mês de maio seguinte. derou-o indevido, em face do disposto
Nesse sentido, aliás, esta Corte — usan- no art. 4°, do mesmo diploma.»
do impropriamente a expressão direito ad- 3. Em face do exposto, conheço do pre-
quirido (na verdade, trata-se de incidência sente recurso pela letra b do inciso III do
da lei anterior antes da entrada em vigor da artigo 102 da Constituição, e lhe dou pro-
lei nova de aplicação imediata) e não se vimento em parte, para julgar procedente,
tendo dado conta de que o Decreto-Lei n° em parte a ação ordinária proposta, uma
2.425, embora datado de 7-4-1988, foi pu- vez que os ora recorridos, não obstante
blicado a 11 do citado mês — decidiu em afastada a declaração de inconstitucionali-
sessão administrativa de 14 de outubro de dade do artigo 1°, caput, do Decreto-Lei n°
1991, como consta da ata que transcrevo na 2.425/88, fazem jus às parcelas devidas nos
parte que importa a este caso: termos deste voto, nos meses de abril e de
aos quatorze dias do mês de outu- maio de 1988, não cumulativamente, mas
bro de 1991, em sessão administrativa, corrigidos monetariamente desde a data em
presentes os Ministros Sydney Sanches que eram devidos até o seu efetivo paga-
(Presidente), Moreira Alves, Néri da mento. Havendo sucumbência recíproca e
Silveira, Octavio Gallotti, Célio Borja, aproximada, as custas serão divididas entre
Paulo Brossard, Sepúlveda Pertence, o ora recorrente e os ora recorridos, caben-
Celso de Mello, Carlos Velloso, Marco do a um e outros o pagamento dos honorá-
Aurélio e Ilmar Gaivão, e, havendo o rios de seus advogados.
Ministro Marco Aurélio declarado sus-
peição, o Tribunal, apreciando o Proces- VOTO (CONFIRMAÇÃO)
so n° 014995-1, deliberou autorizar o
pagamento, aos servidores do Quadro O Sr. Ministro Carlos Venoso (Rela-
Permanente da Secretaria, pela aplica- tor): Sr. Presidente, o que verificamos é que
ção da URP, do valor correspondente a a lei estabeleceu um período ou um certo
7/30 (sete-trinta avos) de 16,19% sobre espaço de tempo no qual, se ocorrente in-
os vencimentos dos meses de abril, flação, nasceria para o servidor o direito à
maio, junho e julho de 1988, não cumu- recomposição das perdas dela decorrentes.
lativamente, corrigidos monetariamente Para isto, o Ministro de Estado da Fazenda,
desde a data em que devidos, até o efe- mediante portaria, fixaria o percentual que
tivo pagamento. A maioria entendeu ha- recomporia as tais perdas.
R.T.J. — 158 239

Vencido o trimestre estabelecido pela Itália e na França, o florescimento da dou-


lei e tendo ocorrido inflação dentro desse trina estatutária, com os seus consectários
trimestre, assim tendo ocorrido o fato que favoráveis ao Estado e um deles, o princi-
a lei escolheu para dar nascimento ao direi- pal deles, talvez, é este: a inocorrência de
to do servidor, sobreveio, entretanto, lei direito adquirido. No Brasil, entretanto,
nova, que impediu a recomposição salarial, isto não pode ser proclamado, ortodoxa-
assim inviabilizando o exercício do direito mente. É que, não custa relembrar, direito
do servidor. adquirido, aqui, está em nível constitucio-
Ora, Sr. Presidente, ficou muito claro: o nal. A Constituição, no art. 5°, XXXVI,
fato que a lei escolheu para dar nascimento estabelece, simplesmente, que a lei não
ao direito do servidor ou dos trabalhadores prejudicará o direito adquirido, o ato
em geral, ocorreu, por inteiro. Então, direi- jurídico perfeito e a coisa julgada. Não
to adquirido há, no caso. há nenhuma ressalva Não existe, no final
da disposição inscrita no citado inc.
Sei que há corrente doutrinária e juris- XXXVI, a frase salvo na relação estatu-
prudencial a proclamarem a inexistência de tária.
direito adquirido na relação estatutária. Di-
virjo dessa corrente. Quero, Sr. Presidente, Assim, Sr. Presidente, a doutrina estatu-
com o maior respeito, opor respeitosa di- tária, com os seus consectários, que teve
vergência aos que sustentam, ortodoxa- notável florescimento na Itália e na França
mente, a tese de inexistência de direito ad- —e curioso é que o seu maior florescimen-
quirido na relação estatutária. to foi mesmo no tempo ou sob a inspiração
do fascismo — não pode ser acolhida em
O eminente Ministro Moreira Alves todos os seus termos na ordem jurídica
disse, há pouco, que padecemos do mal de brasileira.
ler doutrina estrangeira e aplicá-la, no Bra-
sil, sem verificar se essa doutrina está de No caso, os servidores públicos e os
acordo ou não com o nosso sistema consti- trabalhadores adquiriram o direito à recom-
tucional. posição salarial, porque o fato que a lei
escolheu para dar nascimento ao direito
É correta a advertência, que tem aplica- ocorreu por inteiro. Não há falar, portanto,
ção, no caso sob exame. em expectativa de direito. Negar o direito
Direito adquirido, Sr. Presidente, na or- aos servidores públicos e aos trabalhadores
dem jurídica brasileira, tem status consti- de modo geral, é data venia, fazer tabula
tucional. Registrei, em trabalho que escrevi rasa da norma constitucional.
a respeito do tema, que o princípio da irre- Com estas breves considerações, opo-
troatividade da lei, que está associado ao do nho respeitosa divergência aos que pensam
direito adquirido, é tradicional no constitu- de forma contrária e reitero o voto que
cionalismo brasileiro, a partir da Constitui- proferi, com a vênia do Sr. Ministro Mo-
ção Política do Império. Somente na Carta reira Alves.
Política de 1937 é que, compreensivelmen-
te, a matéria não foi tratada em nível cons- VOTO
titucional («Temas de Dir. Público», Del
Rey Editora, cap. 9, pág. 291). Isto não O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor
ocorre, entretanto, nem na Itália nem na Presidente, afirmei que, no tocante ao re-
França. Nestes, direito adquirido não tem sultado, comungo com o Senhor Ministro
status constitucional, mas de direito co- Carlos Velloso. Continuo convencido de
mum. Por isso mesmo, foi possível, na que não cabe a dualidade; não se há de
240 R.T.J. —158

cogitar, quanto a uma mesma situação jurí- resguardar-se determinado direito indivi-
dica, do reajuste dos primeiros sete dias do dual protegido por pouco mais que a lei da
mês, portanto, sete dias que não teriam sido inércia, pouco mais que a assertiva de que
apanhados pela Lei Nova, e a ausência des- algo deve subsistir porque preexistia.
se mesmo reajuste no tocante aos demais Não tenho simpatia alguma por regimes
dias, a revelarem, ambos, um vencimento autoritários. Mas sempre estimei que den-
mensal. tre as propostas da escola socialista — aca-
Acompanho S. Exa. votando no sentido so compartilhadas pelos juristas que deram
do conhecimento do recurso, mas lhe ne- apoio filosófico ao fascismo —, a da pros-
gando provimento. crição do direito adquirido, em nome do
interesse comum, que o Estado deve pre-
VOTO servar e patrocinar, figura entre as menos
O Sr. Ministro Francisco Rezek: Se- abomináveis.
rei, como de hábito, muito breve, mas que- Mas tudo isso não tem diretamente a ver
ro introduzir meu voto com um brevíssimo com a questão que está em jogo, e que
comentário sobre o chamado princípio do acaba de ser enriquecida com esse amplo
direito adquirido, como visto um pouco debate.
além do domínio da nossa ordem jurídica.
Sou sensível — diante da lástima que
Durante muitos anos —entre as décadas costuma ser a realidade retributiva da fun-
de 20 e de 70 praticamente —, sempre que ção pública — aos argumentos que o Mi-
se mencionava no plano internacional o nistro relator desenvolveu com brilho. Mas
princípio do direito adquirido, no empenho tenho o dever de ser coerente com algo que
de deduzir os princípios gerais do Direito se sedimentou na jurisprudência desta
das Gentes à base da convergência de prin- Casa, a um tempo em que eu aqui já estava,
cípios admitidos pelos diversos sistemas e que continua a parecer-me perfeitamen-
nacionais, era a escola soviética que protes- te razoável.
tava com maior veemência, por estimar que
não fazia sentido, fora de contextos estrita- O direito adquirido entre nós tem esta-
mente capitalistas, brandir-se semelhante tura constitucional, no sentido de que é o
norma e pretender-se consagrá-la como constituinte quem não quer que o legislador
princípio geral. ordinário o desconsidere. Esta questão, po-
rém, é de todo estranha à outra: a de saber
É certo que os regimes totalitários de o que constitui, para nós, direito adquirido.
direita, na Europa da primeira metade do
século, assumiram — embora com menor Assentamos, ao longo de anos, que na
energia e mais discreto embasamento dou- relação entre o Estado —regente da função
trinário — posição idêntica. pública — e aqueles que a exercem não é
possível invocar a regra do direito adquiri-
São inúmeros os pecados filosóficos e
do no que concerne ao regime de trabalho.
operacionais dos regimes totalitários, mas
Não tenho agora como admitir que, antes
confesso que a mim não me parece que este que a Constituição de 1988 alterasse par-
seja um deles, ou um dos mais graves.
cialmente o quadro normativo pertinente,
Como idéia, não me parece odiosa, não me
parece grosseiramente absurda a de que o
seja possível identificar direito adquirido
àquilo que na espécie se pretende.
interesse coletivo, traduzido pelo Estado
legislador, não deveria deixar de impor-se Vou pedir vênia, nessas circunstâncias,
de modo completo, sob o argumento de para retomar aquilo que tive ocasião de
R.TJ. — 158 241

dizer em outras ocasiões sobre o tema. Peço VOTO (RETIFICAÇÃO)


vênia aos eminentes relatores, Ministros O Sr. Ministro Carlos Venoso (Rela-
Marco Aurélio e Carlos Velloso, para tor): Sr. Presidente, retifico o meu voto, não
acompanhar o voto do Ministro Moreira conhecendo do recurso com base na alínea
Alves. a; mas no tocante à alínea b, dele conheço,
negando-lhe provimento.
VOTO
VOTO
O Sr. Ministro Binar Gaivão: Senhor O Sr. Ministro Celso de Mello: A ju-
Presidente, eu também peço vênia ao emi- risprudência do Supremo Tribunal Federal,
nente Relator para colocar-me de acordo ao discutir o tema da existência, ou não, de
com o voto do eminente Ministro Moreira direito adquirido em matéria de vencimen-
Alves. tos e ao analisar a questão da irredutibilida-
Prestigio, por essa forma, orientação de da remuneração paga aos agentes esta-
que foi assentada pelo Supremo Tribunal tais, tem-se orientado na linha do pronun-
Federal em processo administrativo de in- ciamento constante do voto ora proferido
teresse dos servidores da Casa, em cujo pelo em. Min. Moreira Alves, que reco-
julgamento, aliás, restei parcialmente ven- nhece a plena alterabilidade do regime ju-
cido, conforme foi recordado pelo eminen- tídico a que os servidores públicos estão
te Ministro Moreira Alves. sujeitos nas suas relações estatutárias com
o Estado (RTJ 104/808 — RTJ 105/671
Assim, dou provimento em parte ao re- — RTJ 111/835 — RTJ 118/300 — RTJ
curso. 127/742 —RTJ 137/398).
Assim sendo, Sr. Presidente, e tendo em
VOTO (CONFIRMAÇÃO) vista, ainda, a deliberação tomada em Ses-
são Administrativa pelo Supremo Tribunal
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor Federal sobre a matéria em exame, peço
Presidente, apenas para revelar a dificulda- vênia, não obstante os doutos votos dos em.
de que tenho em acompanhar o eminente Ministros Marco Aurélio e Carlos Vello-
Ministro Moreira Alves. É que o salário do so, para, com estas breves considerações,
servidor é mensal e, a cogitar-se de direito acompanhar os fundamentos do voto pro-
ao reajuste, o percentual respectivo há de ferido pelo em. Ministro Moreira Alves, e,
incidir sobre esse salário como um todo. desse modo, conhecer e dar provimento
Não consigo conciliar o fato de se ter o em parte ao presente recurso extraordi-
pagamento dos primeiros sete dias com nário.
base no salário reajustado e, no mesmo É o meu voto.
mês, a satisfação dos vinte e três dias se-
guintes com base no salário sem esse rea- VOTO
juste.
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence:
Por isso, mantenho o voto e, sob o ân- Senhor Presidente, no julgamento do Man-
gulo do direito adquirido, comungo com o dado de Segurança n° 21.216, relativo ao
eminente Ministro Carlos Velloso. Enten- chamado Plano Coltor, fiquei vencido na
do que o fato de se estar diante de uma companhia dos eminentes Ministros Carlos
hipótese a envolver o regime estatutário Velloso e Paulo Brossard. Mas, no meu
não afasta a garantia constitucional. voto, ao contrário do Ministro Carlos Veio-
242 R.T.J. — 158

so, deixei claro que não o fundava no prin- trabalho; basta pensar no aumento intercor-
cípio do direito adquirido, e sim no da rente desses vencimentos, na exoneração
irredutibilidade de vencimentos que a ou na demissão do servidor, onde o cálculo
Constituição de 88 estendera a todos os dos vencimentos devido se fará pro rata,
servidores públicos. em razão dos dias trabalhados.
Entendia, então, que o momento da in- Por isso, lamento não poder acompa-
cidência do princípio da irredutibilidade de nhar os votos dos eminentes Relatores e,
vencimentos é aquele da fixação do venci- persistindo na opinião que sustentou o meu
mento, pouco importando que esta fixação voto da sessão administrativa, acompanho
se faça mediante expressão nominal de uma o do Senhor Ministro Moreira Alves.
quantia monetária ou pela incidência de
regra de reajuste automático, conforme a VOTO
inflação apurada em determinado período.
Sr. Ministro Paulo Brossard: Se-
Disso, com todas as vênias, continuo con- nhor Presidente, com a vênia dos Ministros
vencido. Marco Aurélio e Carlos Velloso, acompa-
Sucede que o caso concreto há de ser nho o voto do eminente Ministro Moreira
visto à luz do regime constitucional decaí- Alves e dos que o seguiram.
do: o da Carta de 69, onde essa irredutibi- VOTO
lidade de vencimentos não era assegurada
aos servidores públicos. Sr. Ministro Sydney Sanches: Sr.
Por isso, na sessão administrativa de 14 Presidente, não está em discussão, neste
de outubro de 1991, a diferença entre o meu prorpcso, o princípio da irredutibilidade de
voto caso indêntico ao presente, porque vencimentos dos funcionários públicos, es-
também atinente ao Decreto-Lei n° 2.425 tabelecido pela Constituição de 1988, por-
de 88 — no qual votei com a maioria, que a lei em questão é anterior a ela. De
porque inexistente, então, o princípio cons- acordo com a jurisprudência do Supremo
titucional da irredutibilidade de vencimen- Tribunal Federal, não se reconhecia e nem
tos dos servidores em geral — no caso se reconhece, até hoje, direito adquirido a
subseqüente relativo ao chamado «Plano vencimentos futuros ou a futuros reajustes
Verão», de janeiro de 1989, quando já vi- de vencimentos ou, ainda, a regime jurídico
gente a irredutibilidade de vencimentos. futuro.
Explicito, assim, apenas as razões do Atento a essa jurisprudência e principal-
meu voto na decisão administrativa que, mente ao que ficou deliberado na decisão
com todas as vênias, não tenho motivos administrativa referida no voto do Sr. Mi-
novos para alterar agora. nistro Moreira Alves, acompanho o voto
de S. Exa. e dos que o seguiram, com a
Impressionou-me, é certo, o argumento devida vênia dos que dissentem.
hoje trazido pelo eminente Ministro Marco
Aurélio no sentido de ser o salário mensal VOTO
e não diário; mas, salvo engano meu, o
argumento não tem a força pretendida. Há Sr. Ministro Néri da Silveira: Sr.
várias situações em que, embora fixado, em Presidente. Os debates que se desenvolve-
regra, como mensal, o vencimento sofre as ram nesta assentada não são diversos dos
conseqüências da alteração da lei que os que a Corte enfrentou em sessão adminis-
regula, no curso de um período mensal de trativa de 14 de outubro de 1991, quando,
R.T.J. — 158 243

também, houve divergência na compreen- Decisão: Por votação unânime, o Tribu-


são da matéria em exame. Filiei-me à cor- nal conheceu do recurso extraordinário e,
rente que reconheceu o direito tão-só de- por maioria de votos, lhe deu provimento
corrente da incidência da norma revogada em parte, para julgar em parte procedente a
quanto aos sete primeiros dias do mês de ação, nos termos do voto proferido pelo
abril. A matéria foi amplamente recordada Ministro Moreira Alves. Vencidos os Mi-
no voto do ilustre Ministro Moreira Alves. nistros Relator e Marco Aurélio, que tam-
Dispenso-me, assim, de outras considera- bém conheciam do recurso, mas lhe nega-
ções, pondo-me na linha dessa orientação vam provimento. Votou o Presidente. Reti-
que se consolidou na Corte, quando exami- ficou o seu voto anteriormente proferido o
nou a matéria, relativamente ao pagamento Ministro Carlos Velloso. Relator para o
devido aos servidores de sua Secretaria. acórdão o Ministro Moreira Alves.
Meu voto, pois, conhece do recurso e lhe
dá parcial provimento, tal como o fez o Presidência do Senhor Ministro Octavio
Senhor Ministro Moreira Alves, com a Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
vênia dos Srs. Ministros Carlos Velloso e Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
Marco Aurélio. Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlve-
da Pertence, Celso de Mello, Carlos Vello-
EXTRATO DA ATA so, Marco Aurélio, Ilmar Gaivão e Francis-
co Rezek. Procurador-Geral da República,
RE 146.749 — DF — Rel.: Min. Carlos Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
Velloso. Recte.: União Federal. Recdos.:
Al adia Ribeiro e outros (Adv.: Benedito Brasília, 24 de fevereiro de 1994 —
Oliveira Brauna). Luiz Tomimatsu, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 148.510 — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio


Recorrente: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Recorrido:
Arlindo Bega
Aposentadoria — Tempo de serviço — Rural e Urbana —
Somatório. A regra da reciprocidade prevista no 2° do artigo 202 da
Constituição Federal é restrita ao tempo de contribuição na administra-
ção pública e na atividade privada. A referência às espécies rural e
urbana informa a abrangência nesta última. A seguridade social com a
universalidade da cobertura e do atendimento, bem como a alcançar a
uniformização e equivalência dos benefícios e serviços às populações
urbanas e rurais resulta do teor do artigo 194, submetendo-se tais
princípios ao que previsto nos artigos 195, § 5°, e 59, os dois primeiros
do corpo permanente da Lei Básica Federal e o último das Disposições
244 R.T.J. — 158

Transitórias. A aposentadoria na atividade urbana mediante junção do


tempo de serviço rural somente é devida a partir de 5 de abril de 1991,
isto por força do disposto no artigo 145 da Lei n° 8.213, de 1991, e na Lei
n° 8.212/91, no que implicaram a modificação, estritamente legal, do
quadro decorrente da Consolidação das Leis da Previdência Social —
Decreto n° 89.312, de 23 de janeiro de 1984.

ACÓRDÃO ção cabendo à previdência efetuar a com-


pensação financeira entre os regimes. No
Vistos, relatados e discutidos estes au- que tange ao segundo, deixou assentado
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- que o que nele se contém apenas revela
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- assinatura de prazo para que o Congresso
formidade da ata do julgamento e das notas Nacional formule novos planos e projetos
taquigráficas, por unanimidade de votos, relativos à organização da seguridade so-
em conhecer do recurso e lhe dar parcial cial e às respectivas fontes de custeio (fo-
provimento, nos termos do voto do Rela- lhas 52 a 57).
tor.
O recurso extraordinário foi interposto
Brasília, 31 de outubro de 1994 — Néri
com alegada base na alínea a do inciso III
da Silveira, Presidente — Marco Aurélio,
Relator. do artigo 102 da Carta. Ressalta-se a vio-
lência ao § 5° do artigo 195 da Constituição
Federal. Segundo as razões apresentadas, o
RELATÓRIO
artigo 54 do Regulamento dos Benefícios
da Previdência Social — Decreto n°
O Sr. Ministro Marco Aurélio: acór- 83.080/79, apenas cuida do cômputo do
dão impugnado mediante este extraordiná- período em que prestados serviços em ati-
rio consigna que o cômputo recíproco do vidade abrangida pela previdência social
tempo de contribuição na administração urbana, não alcançando a área rural. De
pública e na atividade privada, rural e urba- qualquer sorte, não teria o Recorrido com-
na, para efeito de aposentadoria, não está provado sequer o tempo que pretendeu ver
sujeito à edição de lei, de vez que a parte computado. Alude-se, mais à circunstância
final do § 2° do artigo 202 da Carta refere-se de o legislador constituinte haver condicio-
apenas a critérios para a compensação fi- nado a incidência dos novos dispositivos
nanceira entre os diversos sistemas de pre- constitucionais à elaboração do plano de
vidência social. Aludiu o órgão julgador ao custeio da previdência social, a ser efetiva-
fato de a legislação previdenciária vir evo- do mediante lei ordinária — artigo 59 do
luindo na direção de um sistema nacional Ato das Disposições Constitucionais Tran-
único de proteção social ainda não alcança- sitórias. Destarte, de acordo com o Recor-
do. Rechaçou a possibilidade de se cogitar rente, impossível é falar-se em aplicação
de afronta aos artigos 195, § 5°, do corpo automática da regra do § 2° do artigo 202.
permanente e 59 do Ato das Disposições Discorre-se sobre o alcance da Lei n°
Constitucionais Transitórias da Carta de 8.213/91, pleiteando-se o conhecimento do
1988. Quanto ao primeiro, ressaltou que a recurso para, reformada a decisão proferi-
legislação de regência dos benefícios perti- da, julgar-se improcedente o pedido inicial
nentes aos trabalhadores rurais e urbanos ou, se assim não se entender, ser fixado o
prevê os recursos necessários à implanta- termo inicial da obrigação em 5 de abril de
R.T.J. — 158 245

1991, data do início dos efeitos da Lei n° 1991, cujos efeitos pecuniários retroagiram
8.213/91 (folhas 59 a 64). a 5 de abril daquele ano. Daí a cabível
O Recorrido não apresentou razões de reforma do que decidido para fixar-se,
contrariedade — certidão de folha 66. como termo inicial da aposentadoria, a data
de 5 de abril de 1991.
Às folhas 68 e 69 está a decisão do Juízo
É o relatório.
primeiro de admissibilidade que implicou
determinação do processamento do ex-
VOTO
traordinário. Nela, alude-se aos artigos
195, § 5°, da Constituição Federal e 59 do
Ato das Disposições Constitucionais Tran- O Sr. Ministro Marco Aurélio (Rela-
sitórias. tar): Os pressupostos gerais de recorribili-
dade foram atendidos pela Autarquia. O
Os autos foram remetidos em 2 de junho
acórdão que se pretende alvejar mediante
de 1992 à Procuradoria Geral da República.
este extraordinário foi publicado no Diário
O Recorrido requereu expedição de carta
de sentença, razão pela qual foram requisi- de 29 de outubro de 1991 — terça-feira
tados. Retornando ao Orgão, mereceu o (folha 58) — sendo que a pmtocolação do
pronunciamento de folhas 77 e 78 que, em recurso ocorreu em 22 de novembro de
síntese, é no sentido de que o § 2° do artigo 1991 — sexta-feira (folha 590) — e, por-
202 da Lei Máxima não autoriza a conta- tanto, dentro do prazo em dobro a que tem
gem recíproca do tempo de contribuição jus a Autarquia. Quanto à representação
em atividade privada urbana e rural, mas processual, o recurso ora em fase de apre-
apenas o tempo de contribuição no serviço ciação está subscrito por Procurador Autár-
público de um lado e, de outro, o de em quico. Cabe o exame do pressuposto de
atividade privada urbana ou rural. Segundo recorribilidade específico — o mau trato à
a óptica da Subprocuradora-Geral da Repú- Carta, no que formulado pedido no sentido
blica, Dra. Odflia Ferreira da Luz Oliveira, de declarar-se a improcedência do que rei-
a hipótese é diversa, pois admitiu-se o so- vindicado pelo Recorrido ou, se assim não
matório do tempo de contribuição como se concluir, de fixar-se o benefício previ-
trabalhador rural e como trabalhador urba- denciário considerado, como termo inicial,
no, para efeito de aposentadoria em ativi- a data de 5 de abril de 1991, prevista no
dade privada. A Autarquia não teria atenta- artigo 145 da Lei n° 8.213/91.
do para este dado. Argumenta-se, mais, que
a norma do artigo 59 do Ato das Disposi- Realmente, não se pode assentar que o
ções Constitucionais Transitórias é estra- § 2° do artigo 202 do Diploma Maior en-
nha à controvérsia, mas que, pela infringên- cerra, em si, a contagem recíproca do tem-
cia ao § 5° do artigo 195 da Carta, o recurso po de serviço na atividade privada rural e
merece conhecimento. Consoante o pare- urbana O que preceitua o citado parágrafo
cer, no regime pretérito, a previdência ur- é a comunicação do tempo de contribuição
bana e rural consubstanciavam sistemas es- na administração pública e na atividade
tanques. A unificação decorreu do preceito privada, pouco importando que nessa jun-
do artigo 194, inciso II, e do artigo 202, ção e no tocante a esta última haja a duali-
inciso II, da Carta que, no entanto, remetem dade do tempo de contribuição — rural e
à lei. A vantagem está sujeita à fonte de urbana. O dispositivo constitucional disci-
custeio, que somente veio a ser criado com plina, ao remeter à lei no que concerne à
a edição da Lei n° 8.213, de 24 de julho de compensação financeira dos sistemas, a
246 R.T.J. — 158

contagem recíproca do tempo de serviço pondente às atividades de qualquer das ca-


público e privado, não alcançando, em si, a tegorias de segurados de que trata o artigo
junção das espécies deste último — rural e 11 da citada Lei, mesmo que anterior à
urbana. Não obstante, a comunicação de- perda da qualidade de segurado, o tempo de
corre da norma inserta no artigo 194 da Lei serviço do segurado trabalhador rural, an-
Básica Federal quanto à seguridade social terior à data da vigência do Diploma, a ser
como um todo. O parágrafo único desse computado independentemente do recolhi-
artigo preceitua como objetivos da seguri- mento das contribuições a ele correspon-
dade social a universalidade da cobertura e dentes, exceto para efeito de carência, confor-
do atendimento, bem como a uniformidade me dispuser o regulamento. Pelo citado artigo
e equivalência dos benefícios e serviços às 11, considera-se segurado tanto aquele que
populações urbanas e rurais. Inegavelmen- presta serviço de natureza urbana quanto ru-
te, a previsão veio à bolha com a Carta de ral — inciso I, alínea a. Portanto, este recurso
1988 e, por isso mesmo, ficou jungida à está a merecer conhecimento, no que resta-
norma do artigo 59 do Ato das Disposições ram desprezadas as normas dos artigos 195,
Constitucionais Transitórias e, destarte, à § 5°, e 59, respectivamente do corpo perma-
nova disciplina da organização da seguri- nente da Carta e do Ato das Disposições
dade social e implantação dos planos de Constitucionais Transitórias. Acolho o pedi-
custeio e benefícios, fato a atrair a incidên- do sucessivo de reforma do acórdão proferi-
cia da regra geral do artigo 195, § 5°, do do, para fixar como termo inicial do benefício
corpo permanente da Lei Máxima de 1988, a data de 5 de abril de 1991, prevista, de resto,
que, repetindo preceito da Carta pretérita, no artigo 145 da Lei n° 8.213/91.
estabelece que nenhum benefício ou servi- É como voto.
ço da seguridade social poderá ser criado,
majorado ou estendido sem a correspon- EXTRATO DA ATA
dente fonte de custeio total. Englobando o
pedido formulado pelo Recorrido o soma- RE 148.510 — SP — Rel.: Min. Marco
tório dos tempos em que prestou serviços Aurélio. Recte.: Instituto Nacional do Se-
na atividade rural e na atividade urbana, guro Social — INSS (Adv.: Angela Apare-
para aposentar-se nesta última, há de se ter cida Campedelli). Recdo.: Adindo Bega
em conta que a ordem jurídica anterior aos (Adv.: Jorge Paulete Varrei).
novos planos de custeio e benefícios, inse- Decisão: Por unanimidade, a Turma co-
ridos com as Leis n°s 8.212/91 e 8.213/91, nheceu do recurso e lhe deu parcial provi-
não contemplava a contagem, para aposen- mento, nos termos do voto do Relator.
tadoria no âmbito da previdência social
urbana, do tempo de serviço rural. Confira- Presidência do Senhor Ministro Néri da
se com o teor dos artigos 4°, 33, § 3°, alínea Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
a do Decreto mediante o qual restou apro- Ministros Carlos Velloso e Marco Aurélio.
vada a Consolidação das Leis da Previdên- Ausente, justificadamente, o Senhor Mi-
cia Social, de n° 89.212, de 23 de janeiro nistro Francisco Rezek. Subprocurador-
de 1984. Já o artigo 55 da Lei n° 8.213/91 Geral da República, o Dr. Antonio Fernan-
preceitua que o tempo de serviço será com- do Barros e Silva de Souza.
provado na forma estabelecida no regula- Brasilia, 31 de outubro de 1994 — José
mento, compreendendo, além do cones- Wilson Aragão, Secretário.
1

R.T.J. — 158 247

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 150.358 — MT


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves


Recorrente: União Federal — Recorrida: Sadia Mato Grosso S/A
Contribuição social instituída pela Lei n° 7.689/88.
— O Plenário desta Corte, ao julgar, o RE 146.733, de que
fui relator, decidiu, por unanimidade de votos, que a contribuição social,
instituída pela Lei n° 7.689/88, sobre o lucro das pessoas jurídicas é
constitucional, não podendo, porém, incidir sobre o lucro apurado no
período-base encerrado em 31 de dezembro de 1988, dado o princípio
constitucional da anterioridade que foi violado por seu artigo 8°, que
determinou essa incidência, e que, por isso, foi tido como inconstitu-
cional.
Recurso extraordinário conhecido e, em parte, provido, para
manter a declaração de inconstitucionalidade da Lei n° 7.689/88 apenas
no tocante ao artigo 8° (e, portanto, quanto ao lucro apurado no balanço
encerrado em 31-12-88), e determinar que, afastada a declaração de
inconstitucionalidade dos artigos 1°, 2° e 3° da referida Lei, prossiga o
Tribunal a quo no exame da remessa oficial no concernente à inconsti-
tucionalidade da Lei n° 7.856/89, questão essa que deixou de ficar preju-
dicada.
ACÓRDÃO A sentença de primeiro grau concedeu a
segurança por entender inconstitucional a
Vistos, relatados e discutidos estes au- instituição dessa contribuição pela Lei n°
tos, acordam os Ministros da Primeira Tur- 7.689/88. Foi ela confirmada pelo acórdão
ma do Supremo Tribunal Federal, na con- ora recorrido, cuja ementa é esta:
formidade da ata do julgamento e das notas «Constitucional e tributário. Lei n°
taquigráficas, por unanimidade de votos, 7.689, de 15-12-88, instituidora da
conhecer do recurso e lhe dar parcial pro- contribuição social sobre o lucro das
vimento. empresas. Inconstitucionalidade.
Brasília, 8 de março de 1994 — Morei- Declarada a inconstitucionalidade da
ra Alves, Presidente e Relator. exação pelo Plenário desta Corte (AI na
AMS n° 89.01.13614-7/MG), nega-se pro-
RELATÓRIO vimento à remessa e ao apelo.
Sentença confirmada.» (Fl. 224)
O Sr. Ministro Moreira Alves: Trata-
se de mandado de segurança preventivo,' Interposto recurso extraordinário com
referente ao lucro apurado no período de base na letra b do inciso III do artigo 102
1°-1-89 a 31-12-89, no qual se alega a in- da Constituição, foi ele admitido pelo des-
constitucionalidade da contribuição social pacho a fls. 243/245.
instituída pela Lei n° 7.689/88, bem como A fls. 249, assim se manifesta a Procu-
a da Lei n° 7.856/89. radoria-Geral da República:
248 R.T.J. —158

«Trata-se de Recurso Extraordinário 2. Em face do exposto, conheço do pre-


interposto contra decisão que julgou in- sente recurso extraordinário pela letra b do
constitucional a Lei n° 7.689/88. inciso III do artigo 102 da Constituição
O Supremo Tribunal Federal em prece- Federal, e lhe dou provimento em parte,
dentes (RE 138.284-PA e 146.733-SP), já para manter a declaração de inconstitucio-
reconheceu a constitucionalidade daquela nalidade da Lei n° 7.689/88 apenas no to-
Lei, exceto quanto ao seu artigo 8° (ref. ao cante ao artigo 8°(e, portanto, quanto ao lucro
período-base de 1988). apurado no balanço encerrado em 31-12-88),
e determinar que, afastada a declaração de
Invocando o precedente, opino pelo pro- inconstitucionalidade dos artigos 1°, 2° e 3°
vimento, em parte, do recurso.» da referida Lei, prossiga o Tribunal a quo no
É o relatório. exame da remessa oficial no concernente à
inconstitucionalidade da Lei n° 7.856/89,
VOTO questão essa que deixou de ficar prejudicada.
O Sr. Ministro Moreira Alves (Rela-
tor): 1. O Plenário desta Corte, ao julgar o EXTRATO DA ATA
RE 146.733, de que fui relator, decidiu, por RE 150.358 — MT — Rel.: Min. Mo-
unanimidade de votos, que a contribuição reira Alves. Recte.: União Federal (Adv.:
social instituída pela Lei n° 7.689/88, sobre Procuradoria da Fazenda Nacional). Rec-
o lucro das pessoas jurídicas é constitucio- da.: Sadia Mato Grosso S/A (Advs.: Sandra
nal, não podendo, porém, incidir sobre o Cristina F. F. de Oliveira e outros).
lucro apurado no período-base encerrado
Decisão: A Turma conheceu do recurso
em 31 de dezembro de 1988, dado o prin-
e lhe deu parcial provimento, nos termos do
cípio constitucional da anterioridade que
voto do Relator. Unânime.
foi violado por seu artigo 8°, que determi-
nou essa incidência, e que, por isso, foi tido Presidência-do Senhor Ministro Moreira
como inconstitucional. Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
No caso, o acórdão recorrido declarou nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
inconstitucional a própria instituição. da ce, Celso de Mello e limar Gaivão. Subpro-
contribuição social em causa pela Lei n° curador-Geral da República, Dr. Antônio
Fernando Barros e Silva de Souza.
7.689/88, divergindo, assim, da jurispru-
dência desta Corte na extensão dessa decla- Brasília, 8 de março de 1994 —Ricardo
ração de inconstitucionalidade. Dias Duarte, Secretário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 150.654 (AgRg) — SC


(Segunda Turma)

Relator: O Sr.Ministro Paulo Brossard


Agravante: Ministério Público Federal — Agravados: Instituto Nacional do
Seguro Social — INSS e José Silvino Fernandes
Agravo Regimental em Agravo de Instrumento. Previdenciá-
rio. Beneficio acidenta rio. Reajustamento. Competência.
R.T.J. — 158 249

As ações acidentárias têm como foro competente a Justiça


Comum, a teor do disposto no art. 109, I, da CF, que as excluiu da
competência da Justiça Federal.
Reajuste de beneficio acidentário. Competência da Justiça
estadual não elidida.
Precedentes.
Agravo Regimental a que se nega provimento.
ACÓRDÃO benefício acidentário. O recurso ex-
traordinário fundamenta-se no art. 102,
Vistos, relatados e discutidos estes au- RI, a, da Constituição Federal, argu-
tos, acordam os Ministros componentes da mentando que o julgado a quo ofendeu
Segunda Turma do Supremo Tribunal Fe- ao art. 109, I, da mesma Carta.
deral, por maioria de votos e na conformi- Entende a decisão agravada que a
dade da ata do julgamento e das notas ta- pretendida revisão de benefício conce-
quigráficas, negar provimento ao agravo dido pela Justiça Comum, originária de
regimental. Vencido o Ministro Marco Au- acidente de trabalho, somente deve ser
rélio que dava provimento, para processar apreciada pela mesma esfera da Justiça
o recurso extraordinário. Também, por que o concedeu, inexistindo, pois, ofen-
maioria, contra o voto do Ministro Marco sa ao mencionado dispositivo constitu-
Aurélio, a Turma recusou proposta no sen- cional.
tido de afetar a matéria ao exame do Ple-
nário. Está correta a decisão. No julgamen-
to do RE 127.619-3-CE (RTJ 133/1352),
Brasília, 22 de fevereiro de 1994 — ficou assentado que as «ações acidentá-
Néri da Silveira, Presidente — Paulo rias são da competência da Justiça co-
Brossard, Relator. mum estadual, ex vi do disposto no art.
109, I, da Constituição Federal». Assim,
RELATÓRIO
o simples fato de tratar-se de ação que
O Sr. Ministro Paulo Brossard: Insur- persegue o reajuste de beneficio, bene-
ge-se o recorrente contra o despacho que ficio esse oriundo de acidente de traba-
proferi negando seguimento a agravo de lho, não tem o condão de elidir compe-
instrumento de decisão que negou o pro- tência constitucional da Justiça esta-
cessamento do recurso extraordinário in- dual.
terposto contra acórdão que fixou a compe- Ante o exposto, com base no art. 21,
tência da Justiça Comum para processar e § 1°, do RISTF, nego seguimento ao
julgar os litígios relativos a reajuste de be- agravo.»
nefício acidentário. Eis a decisão dissen- O recorrente, em sua minuta, após con-
tida: siderar que não há dúvida de que as causas
«Trata-se de agravo de instrumento decorrentes de acidente de trabalho, embo-
de decisão que negou o processamento ra envolvam pretensão de natureza previ-
do recurso extraordinário interposto de denciária, estão excluídas da competência
acórdão que decidiu pela competência da Justiça Federal, sustenta que a exclusão
da Justiça Comum para processar e jul- desta competência se circunscreve exclusi-
gar os litígios relativos a reajuste de vamente às ações em que a causa de pedir
250 R.T.J. —158

e o pedido sejam de natureza acidentária. A controvérsia acerca da competência


Todavia, na causa em que surgiu o conflito para apreciar questões concernentes a be-
de competência submetido ao Tribunal a nefícios acidentários já mereceu o crivo
quo não se deduziu pretensão acidentaria, desta Corte no julgamento do RE 127.619-
na medida em que inexiste lide a respeito 3-CE (RTJ 133/1352), quando se firmou o
do evento (acidente do trabalho) gerador entendimento de que as ações acidentárias
do benefício previsto na Lei de Acidentes têm como foro competente a Justiça co-
de Trabalho, nem a respeito do próprio tia, a teor do disposto no art. 109, I, da
benefício . A lide diz respeito apenas aos Constituição Federal, que as excluiu, ex-
índices de reajustamento ou atualização do pressamente, da competência da Justiça Fe-
benefício. Assim, como não há qualquer deral.
traço diferencial entre o critério de reajus- Assim, o simples fato de tratar-se de
tamento dos benefícios decorrentes de aci- ação que persegue o reajuste de benefício,
dente de trabalho e o dos demais benefícios beneficio oriundo de acidente de trabalho,
previdenciários, inexiste razão que justifi- não tem o condão de elidir a competência
que a caracterização como acidentária da constitucional da Justiça estadual (Ag n°
ação em que se discute exclusivamente a 149.363-1-SC, Relator Ministro Carlos
respeito do referido critério. Portanto, so- Venoso, DJU de 18-3-93).
mente quando a alteração do valor do bene-
ficio acidentário tiver como fundamento a Ante o exposto, nego provimento ao
revisão do próprio benefício, em decorrên- agravo regimental.
cia da evolução das seqüelas produzidas
pelo acidente de trabalho é que se poderá VOTO (PROPOSTA DE
identificar a ação revisional como aciden- REMESSA AO PLENO)
taria.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Vou
Com esses argumentos, requer seja dado pedir vênia, Senhor Presidente, ao nobre
provimento ao agravo regimental para que, Relator para divergir de S. Exa., na esteira
reformada a decisão de fls., seja provido o de inúmeras decisões mediante as quais
agravo de instrumento. tenho determinado o processamento de ex-
É o relatório. traordinários.
O que temos, na espécie? Temos no
7 VOTO
inciso I do artigo 109 da Carta uma regra
geral, na primeira parte desse dispositivo,
O Sr. Ministro Paulo Brossard (Rela-
tor): Sustenta o recorrente que na causa em indicadora de que:
que surgiu o conflito de competência sub- «Art. 109 — Aos juízes federais
metido ao Tribunal a quo não se deduziu compete processar e julgar:
pretensão acidentária, na medida em que I — as causas em que a União, en-
inexiste lide a respeito do evento (acidente
tidade autárquica ou empresa pública
de trabalho) gerador do benefício previsto
federal forem interessadas na condição
na Lei de Acidentes de Trabalho, nem a
de autoras, rés, assistentes ou oponen-
respeito do próprio benefício. Que a lide
tes...»
diz respeito apenas a índices de reajusta-
mento ou atualização do beneficio e, as- Este é o primeiro comando constitucio-
sim, inexiste razão que justifique sua carac- nal. Revela, portanto, a vala comum alusiva
terização como acidentária. à competência dos «juízes federais», desde
R.T.J. — 158 251

que envolvidas uma dessas pessoas men- Voto, em primeiro lugar, neste último
cionadas no preceito. sentido, para que tenhamos já o recurso
O segundo dispositivo consagra a exce- extraordinário e, aí sim, o deslocarmos para
ção, a correr à conta do julgamento de o Plenário.
processos que digam respeito a «falência», VOTO
«acidentes de trabalho», a envolver re-
pito — «acidentes de trabalho», ou seja, o O Sr. Ministro Néri da Silveira (Pre-
evento que é o nexo de causalidade, a sidente): Também tenho entendido que a
desaguar em um benefício, bem como as matéria relativa à competência da Justiça
sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Comum para as causas acidentárias com-
Trabalho. preende, não só o julgamento do pleito em
Indaga-se: se não está em questão aci- que se alega a existência de acidente de
dente, em si, de trabalho, a discussão sobre trabalho, mas, por igual, todas as conse-
o nexo de causalidade, sobre um acidente qüências dessa decisão, qual seja, a fixação
ou uma doença profissional, mas a simples do benefício e seus reajustamentos futuros.
indexação de um beneficio já reconhecido Ao julgar procedente a causa acidentária, a
Justiça estadual fixa, desde logo, o valor do
por provimento judicial da Justiça compe-
benefício.
tente, cabe à Justiça Comum o julgamento
dessa lide? Ao primeiro exame, Senhor Pois bem, quando se vem a discutir so-
Presidente, penso que não; de início, enten- bre o reajuste desse benefício, acerca de
do que não se faz presente, na espécie, uma critério ou base de cálculo, penso que a
lide a abranger acidente de trabalho, que questão não refoge, também, do domínio da
seria, como é pacífico, da competência da Justiça Comum; não se desloca para o âm-
Justiça Comum. O que temos, na verdade, bito da Justiça Federal. A Constituição quis
é um benefício, muito embora decorrente excluir da competência da Justiça Federal
de acidente de trabalho, em relação ao qual as demandas acidentárias. Compreendo
se discute a reposição do poder aquisitivo que, na espécie, se cuida de demanda aci-
da moeda. A competência, portanto, mere- dentária, pois o reajuste do benefício pende
ce ser melhor discutida no bojo de um de considerações em tomo de aspectos da
recurso extraordinário, com audição da própria causa levados à fixação do bene-
Procuradoria-Geral da República. fício.
O nobre Relator apontou que há uma Compreendo que a decisão monocrática
decisão monocrática do Ministro Carlos ora agravada segue uma linha que, segundo
Velloso. Na primeira vez que me defrontei os termos da Constituição, é a correta; e,
com a matéria, fiz uma pesquisa para saber assim, meu voto é no sentido de negar
Oa existência de pronunciamento de Cole- provimento ao agravo regimental.
giado desta Corte, e confesso, talvez por
VOTO (Aditamento ao Pedido
falha própria, que não encontrei precedente de Remessa dos Autos ao Pleno)
a respeito. Como são inúmeros os proces-
sos versando sobre o tema, creio ser acon- O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor
selhável o deslocamento destes autos para Presidente, o precedente mencionado, da
o Plenário, a fim de que edite o precedente lavra também do Ministro Carlos Velloso,
a ser observado pelas Turmas ou, então, a meu ver versou sobre o tema que seria a
que seja dado provimento ao agravo inter- recorribilidade não para o Tribunal de Jus-
posto para a subida do extraordinário. tiça, mas para o Tribunal Regional Federal,
252 R.T.J. — 158

muito embora julgado em primeiro grau a vino Fernandes (Adv.: Sérgio Mendonça
lide acidentária — aqui sim acidentária — Costa).
pela Justiça comum, pelo Juízo Comum.
Então, a meu ver, esses são os primeiros Decisão: Por maioria de votos, a Turma
negou provimento ao agravo regimental.
agravos específicos sobre a controvérsia
que enfrentamos e, repito, não levantei pre- Vencido o Ministro Marco Aurélio que
dava provimento, para processar o recurso
cedente do Tribunal, nem mesmo no campo
monocrático, sobre a questão. Por isso é extraordinário. Também, por maioria, con-
tra o voto do Ministro Marco Aurélio, a
que ousei pretender sobrecarregar um pou-
Turma recusou proposta no sentido de afe-
co mais o Pleno com a proposta de remessa
do processo, pois há matéria que precisa ser tar a matéria ao exame do Plenário.
elucidada, de uma vez por todas, pelo Co- Presidência do Senhor Ministro Néri da
legiado Maior. Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
EXTRATO DA ATA Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso,
Marco Aurélio e Francisco Rezek. Subpro-
Ag 150.654 (AgRg) — SC — Rel.: Má curador-Geral da República, o Dr. Francis-
Paulo Brossard. Agte.: Ministério Públi- co José Teixeira de Oliveira.
co Federal. P Agdo.: Instituto Nacional de
Seguro Social —INSS (Advs.: Ruy R. P. Brasília, 22 de fevereiro de 1994 —José
da Cunha e outros). 2° Agdo.: José Sil- Wilson Aragão, Secretário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 151.485 (AgRg) — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira


Agravante: Dynacast do Brasil Ltda. — Agravado: Estado de São Paulo
Recurso extraordinário inadmitido. Formação deficiente do
agravo de instrumento. Traslado incompleto. Ausência de peça que
comprove a tempestividade do recurso extraordinário. Aplicação da
Súmula n° 288.2. A prova de que o recurso extraordinário cujo proces-
samento se pretende, e objeto de juízo negativo de admissibilidade na
Corte a quo, é tempestivo constitui sempre elemento indispensável, no
julgamento de agravo de instrumento contra o despacho que não admitiu
o apelo derradeiro. De um lado, porque, se o traslado estiver devidamen-
te instruído, pode-se, desde logo, julgar o recurso extraordinário, sendo
sempre o juízo sobre a tempestividade do apelo um prius ao exame do
mérito. De outra parte, saber se o recurso extraordinário é tempestivo
constitui, em qualquer hipótese, preliminar não só ao exame do mérito,
mas dos próprios pressupostos específicos para o processamento do
recurso extraordinário, inadmitido pelo Presidente da Corte a quo,
notadamente quando, no despacho agravado, não se afirmou ser o
recurso tempestivo. Incumbe, ademais, ao Tribunal ad quem, em qual-
R.T.J. — 158 253

quer hipótese, o exame da tempestividade do recurso que há de julgar.


3. Destina-se o agravo de instrumento, na espécie, ao exame do cabimen-
to, ou não, do recurso extraordinário interposto, cuja não admissão
ocorreu por despacho do Presidente do Tribunal a quo. Não devolve ele
à apreciação do STF apenas os fundamentos da não-admissão, mas,
também, de forma ampla, o exame dos requisitos do cabimento da
irresignação extrema. 4. A tempestividade do recurso extraordinário é
pressuposto de ordem pública de seu cabimento, podendo, destarte,
verificar-se de oficio. Cumpre, assim, exista no traslado peça que torne
possível essa aferição. 5. Hipótese em que a inexistência desse elemento
no traslado conduz à aplicação da Súmula n° 288.6. Agravo Regimental
desprovido.
ACÓRDÃO dência do STF, referida adequadamente no
parecer mencionado.
Vistos, relatados e discutidos estes au- 3. Do exposto, com base no art. 38, da
tos, acordam os Ministros da Segunda Tur- Lei n° 8.038, de 28 de maio de 1990, com-
ma do Supremo Tribunal Federal, na con- binado com o art. 21, § 1°, do RISTE, e em
formidade da ata do julgamento e das notas consonância com o parecer da Procurado-
taquigráficas, por maioria, conhecer do re- ria-Geral da República, nego seguimento
curso e lhe negar provimento, nos termos ao agravo.»
do voto do Relator.
Publicado o despacho, interpôs a Dyna-
Brasília, 20 de junho de 1995 — Néri cast do Brasil Ltda. o agravo de fls.
da Silveira, Presidente e Relator. 153/160.
RELATÓRIO Em suas razões, sustenta a Agravante,
em síntese, a reforma da decisão, ao argu-
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- mento de que a certidão de publicação do
tor): Apreciando o Agravo de Instrumento acórdão do Tribunal a quo «não é peça
n" 01514851/040, proferi o seguinte despa- essencial à decisão da controvérsia, pos-
cho (fl. 148): to que a verificação da tempestividade
do recurso extraordinário interposto
«Despacho: Vistos. O parecer da pela ora agravante, já foi apreciada
Procuradoria-Geral da República bem quando do despacho que indeferiu o re-
anotou a falta, no traslado, de peça es- curso extraordinário proferido pelo
sencial à decisão da controvérsia, qual Exmo. Sr. Desembargador Vice-Presi-
seja, a certidão de publicação do acór- dente Sylvio do Amaral do E. Tribunal
dão do Tribunal a quo. Inexistente essa
peça não há nos autos elemento básico
de Justiça.»
à verificação da tempestividade do re- Aduz, ainda, que, comprovada a tem-
curso extraordinário interposto pela pestividade do apelo extremo, a certidão de
agravante, cujo seguimento veio a ser publicação do acórdão do Tribunal a quo
indeferido pelo ilustre Presidente da toma-se peça dispensável, não impondo o
Corte de origem. art. 544, § 1°, do CPC, a sua indicação e
2. Incide, assim, na espécie, a Súmula respectivo traslado.
n". 288, em conformidade com a jurispru- É o relatório.
254 R.T.J. — 158

VOTO definição de um dos pressupostos recursais


objetivos de maior significação: a própria
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- tempestividade do apelo extremo.»
tor): A prova de que o recurso extraordiná-
rio cujo processamento se pretende, e obje- No mesmo sentido, recente despacho do
to de juízo negativo de admissibilidade na ilustre Ministro Celso de Mello no Ag.
Corte a quo, é tempestivo constitui sempre 158.391-6-DF. Dessa decisão monocráti-
elemento indispensável, no julgamento de ca, destaco os seguintes passos:
agravo de instrumento contra o despacho «Impõe-se ressaltar que o agravo de
que não admitiu o apelo derradeiro. De um instrumento interposto contra ato veicu-
lado, porque, se o traslado estiver devida- lador do juízo negativo de admissibili-
mente instruído, pode-se, desde logo, jul- dade do apelo extremo tem por finalida-
gar o recurso extraordinário, sendo sempre de, por única rmalidade, viabilizar a
o juízo sobre a tempestividade do apelo um aferição, por esta Suprema Corte, das
prius ao exame do mérito. De outra parte, condições de admissibilidade do re-
saber se o recurso extraordinário é tempes- curso extraordinário, exaurindo-se, em
tivo constitui, em qualquer hipótese, preli- conseqüência, no exame exclusivo des-
minar não só ao exame do mérito, mas dos ses requisitos mínimos, a especifica
próprios pressupostos específicos para o função jurídico-processual para a qual
processamento do recurso extraordinário, foi aquele recurso concebido. Daí a pre-
inadmitido pelo Presidente da Corte a quo, cisa observação feita pelo em. Min. Se-
notadamente quando, no despacho agrava- púlveda Pertence que, na condição de
do, não se afirmou ser o recurso tempesti- relator, fez consignar que «... o agravo
vo. Incumbe, ademais, ao Tribunal ad de instrumento contra a denegação de
quem, em qualquer hipótese, o exame da recurso extraordinário só devolve ao
tempestividade do recurso que há de julgar. STF a questão de admissibilidade des-
Nesse sentido, decidiu a Primeira Turma, a te» (Pet 944-SP).
24-5-1990, relator o Ministro Celso de
Na realidade, o thema decidendum
Mello, no AgRg no Ag 133.647-RJ, de cuja
ementa do acórdão destaco: «Agravo regi- que se projeta na apreciação de agravo
mental. Súmula n° 288. Deficiente forma- de instrumento concerne, especifica-
ção do instrumento de agravo. Traslado mente, à análise dos fundamentos em
incompleto. Ausência de peça comprobató- que se apóia o juízo negativo de admis-
sibilidade que incidiu sobre o recurso
ria da tempestividade do recurso extraordi-
extraordinário deduzido pela parte agra-
nário. Caráter essencial da peça faltante.
vante, tanto que a esta se impõe o dever
Pretendida complementação no Supremo
de questionar, em sede de agravo, não o
Tribunal. Impossibilidade. Agravo regi-
mental improvido» (RTJ 131/1403). Tam- conteúdo do acórdão impugnado pela
bém a 25-5-1990, a mesma Turma, no via do apelo extremo, mas, exclusiva-
Ag 125.465 (AgRg)-SP, relator o Minis- mente, as razões que levaram a Presi-
tro Celso de Mello, reafirmou (RTJ dência do Tribunal a quo a recusar
132/1345): «A prova da oportuna interpo- trânsito a esta especial modalidade de
sição do recurso extraordinário, cujo pro- impugnação recursal (RTJ 126/864,
cessamento deixou de ser admitido na ins- Rel. Min. Francisco Rezek — RTJ
tância a quo, deve ser necessariamente pro- 133/485, Rel. Min. Célio Borja).
duzida pelo agravante quando da formação Note-se, pois, que o agravo de instru-
do traslado. Trata-se de peça essencial à mento, na hipótese de recusa de proces-
R.T.J. — 158 255

sarnento do recurso extraordinário, pos- quando, por eventual intempestividade


sui conteúdo temático próprio e espe- do recurso extraordinário obstado na
cífico, de tal modo que nele se justifica origem, já se consumou o trânsito em
o exercício, pelo Supremo Tribunal julgado do acórdão impugnado pela via
Federal, do seu incontrastável poder de do apelo extremo.
verificação dos pressupostos — de to- Daí — e tal como acentuado pela
dos os pressupostos — inerentes ao douta Procuradoria-Geral da República
apelo extremo, dentre os quais avulta, — a necessidade de a parte agravante
por sua extrema relevância, aquele con- instruir, sempre, o traslado com cópia
cernente ao requisito da tempestividade. da certidão de publicação do acórdão
O controle da tempestividade do ape- recorrido, a fim de, com essa peça essen-
lo extremo — precisamente por cons- cial à análise de um dos requisitos de
tituir pressuposto recursal de ordem admissibilidade do recurso extraordiná-
pública — revela-se matéria suscetível rio, viabilizar o controle, pelo Supremo
até mesmo de conhecimento ex officio Tribunal Federal, do pressuposto legal
por este Tribunal, independendo, em da tempestividade inerente ao recurso
conseqüência, de qualquer formal pro- extraordinário.
vocação dos sujeitos da relação proces- A jurisprudência desta Suprema Cor-
sual (Nelson Nery Júnior, «Princípios te tem proclamado que é do agravante o
Fundamentais — Teoria Geral dos Re- ônus de fiscalizar a formação do instru-
cursos», p. 52, 1990, RT; José Carlos mento (RTJ 87/855). A omissão no
Barbosa Moreira, «Comentários ao cumprimento dessa obrigação jurídico-
Código de Processo Civil», vol. V/235, processual conduz, na linha da orienta-
item n° 146, &L ed., 1993, Forense). ção jurisprudencial firmada pelo STF,
Essa é a razão pela qual o traslado deve ao improvimento do agravo de instru-
também consubstanciar a demonstração mento interposto.
inequívoca da plena tempestividade do Cumpre destacar, finalmente, que o
recurso extraordinário, eis que é ao pro- entendimento ora exposto no presente
cessamento do apelo extremo — devi- ato decisório tem sido prestigiado por
damente satisfeitos todos os pressupos- decisões monocráticas proferidas pelos
tos inerentes à sua admissibilidade —
eminentes Ministros Moreira Alves
que se destina, em última análise, a uti-
lização do agravo de instrumento.
(Ag 162.554-SP, p. ex.) e Néri da Sil-
veira (Ag 162.654-PR, v.g.).
Não se pode desconsiderar no exame
Incide, pois, na espécie, a Súmula
do tema em questão a advertência desta
Suprema Corte no sentido de que a in-
288 do Supremo Tribunal Federal.»
tempestiva interposição do recurso não Nesse sentido, decidiu a Primeira Tur-
impede e nem afasta, enquanto fenô- ma, em sessão desta data, no Ag (AgRg)
meno processual inevitável, o trânsito 149.722-1, relator o Senhor Ministro Mo-
em julgado da decisão tardiamente im- reira Alves, tão-só contra o voto do ilustre
pugnada: «A interposição extemporâ- Ministro Sydney Sanches. No voto de Re-
nea de recurso não elide o trânsito já lator, o ilustre Ministro Moreira Alves ob-
consumado» (RTJ 112/989). servou:
Nada justifica, portanto, o acolhi- «Ora, destinando-se o agravo de ins-
mento do agravo de instrumento, se e trumento de tal natureza ao exame do
256 R.T.J. — 158

cabimento, ou não, do recurso extraor- do de ofício, como sucede com o pres-


dinário interposto e não-admitido na suposto de admissibilidade do próprio
origem, não devolve ele à apreciação agravo de instrumento.»
desta Corte o exame restrito das razões De qualquer sorte, na espécie, não fosse
de não-admissão invocadas pela Presi- a falta desse documento tido por indispen-
dência do Tribunal a quo, mas, ao con- sável, ainda assim o agravo de instrumento
trário, lhe devolve o exame amplo dos não mereceria provimento.
requisitos desse cabimento.
Bem registrou o despacho presidencial
Por isso, e a título meramente exem- agravado, à fl. 92, que o acórdão recorrido
plificativo, e é esse o entendimento pa- «não focalizou os dispositivos apontados
cífico desta Corte dado o fim a que se como violados e não foram interpostos em-
destina esse agravo de instrumento, ain- bargos declaratórios para suprimento de
da quando o despacho de não-admissão eventual omissão». Incidem, destarte, as
do recurso extraordinário na origem não Súmulas 282 e 356. O mandado de segu-
se baseie na falta de prequestionamento rança foi tido como contra lei em tese,
da questão constitucional, pode o relator afirmando a Corte a quo a agravante care-
do agravo de instrumento neste Tribunal cedora da ação mandamental. Não houve,
basear-se na falta desse requisito de ca- assim, exame do mérito. Ora, no recurso
bimento do recurso extraordinário, para extraordinário, invoca-se ofensa ao art. 5°,
negar seguimento ao agravo. incisos XXXV e LXIX da Constituição.
A tempestividade do recurso extraor- Não só não foram prequestionados, como
dinário é pressuposto de ordem pública por afirmar a ofensa a direito adquirido se
de seu cabimento, e, em razão disso, faria mister o julgamento do mérito da im-
deve ser verificada de ofício, sendo, por- petração, o que se teve por inviável diante
tanto, necessário que exista, no traslado, dos termos do pedido. Não caberia, por
a peça que possibilite essa aferição, ou igual, ver, aí, vulneração a norma maior que
seja, a certidão da publicação do acór- dispõe sobre o mandado de segurança, de
dão recorrido (inclusive a do de embar- qualquer forma, não negada pelo cresto.
gos declaratórios, se houver) no Diário Do exposto, nego seguimento ao agravo
da Justiça, à semelhança, aliás, da ne- regimental.
cessidade de constar do traslado a certi-
dão de intimação do despacho agravado, VOTO
que se exige para a verificação da obser-
vância do mesmo pressuposto com rela- O Sr. Ministro Mauricio Corrêa: Sr.
ção ao próprio agravo, independente- Presidente, essa questão já foi abordada na
mente de controvérsia a respeito da tem- assentada em que se discutiu, pela primeira
pestividade deste. Querer-se distinguir a vez, em termos de uma definição da 'Turma.
hipótese em que, no agravo de instru- Quando assumi a cadeira aqui no Supremo
mento, se discute a tempestividade do Tribunal Federal já encontrei decisões, por
recurso extraordinário daquela em que unanimidade, que indicavam essa exigên-
se silencia a esse respeito, para exigir-se cia. Meu antecessor, por exemplo, Relator
na primeira a certidão de publicação do do Agravo Regimental em Agravo de Ins-
acórdão como peça essencial e na se- trumento n° 146.704, desta Turma, já en-
gunda não, só teria sentido se esse pres- tendia assim, quer dizer, a exigência da
suposto de admissibilidade do recurso cópia da publicação da certidão. Posterior-
extraordinário não devesse ser examina- mente tomei conhecimento do Agravo de
R.T.J. — 158 257

Instrumento n° 125.465, Relator Ministro à publicação do acórdão, objeto do recurso


Celso de Mello, a que V. Exa. fez referên- extraordinário. Essa é a questão.
cia, e o Agravo de Instrumento no 133.647, É certo que a matéria, entretanto, tem
também Relator o Sr. Ministro Celso de sido ponderada e examinada por todos os
Mello. Além desses agravos, julgados por componentes da Corte, desde algum tem-
unanimidade, vários foram os despachos po, com destaque, particularmente, desde
monocráticos que endossavam essa tese. quando a Procuradoria-Geral da República
De modo que, tendo desde o início tem invocado, em parecer, a necessidade
acompanhado essa corrente aqui no Supre- desse documento, e, assim, a aplicação da
mo Tribunal Federal, não vejo como mudar Súmula 288, em faltando no traslado a
neste instante. Assim, acompanho V. Exa. certidão em referência.
não dando provimento a esses agravos.
De outra parte, além de a matéria ser do
QUESTÃO DE ORDEM amplo conhecimento dos membros da Cor-
te, há um volume grande de agravos que
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor precisam ser decididos pelos Relatores. A
Presidente, a tese que V. Ex • anunciou pro- Primeira Turma examinou longamente, na
clamada pela Primeira Turma envolve, em primeira parte da sessão de hoje, conforme
si, milhares de processos. Considerado esse me comunicou seu ilustre Presidente, o Se-
fato, tenho para mim que deveria ser levada nhor Ministro Moreira Alves, quaestio ju-
ao Plenário para ser debatida no Colegiado ris, em feito de que S. Exa. foi Relator e
Maior, com a participação conjunta dos decidiu no sentido de negar provimento ao
onze integrantes do Supremo Tribunal Fe- agravo regimental, tão-só, contra o voto do
deral. Seria o recomendável, e, por isso Sr. Ministro Sydney Sanches, que conside-
mesmo, proponho a V. Ex' que submeta à rava dispensável essa certidão e não aplica-
Turma o deslocamento desses agravos para va a Súmula 288, se omisso o traslado
o Plenário. É a questão de ordem que colo- quanto ao documento.
co, fazendo-o com o objetivo único, repito, Dessa maneira, a matéria é amplamente
de ver a matéria dissecada pelos onze Mi- conhecida, acrescendo notar que o Pleno
nistros do Supremo Tribunal Federal, está com a pauta realmente saturada. Have-
atuando em conjunto, em assentada única. ria necessidade de levar tema como este
VOTO (SOBRE QUESTÃO para debate no Plenário, se as duas Turmas
estão decidindo a controvérsia, com unida-
DE ORDEM)
de de conhecimento dos aspectos jurídicos
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- da espécie? Com efeito, a questão é uma só:
tor): Na condição de Relator e consideran- saber se a certidão de publicação do acór-
do a questão de ordem posta pelo eminente dão é peça indispensável ou não na consti-
Ministro Marco Aurélio, antes de ouvir os tuição do traslado em agravo de instrumen-
ilustres Ministros sobre a proposta de S. to, à vista do disposto na Súmula 288.
Exa., permito-me fazer duas ponderações Penso que, estando todos os membros
em torno da matéria. desta Turma também devidamente infor-
De fato, não se pode dizer que não se mados sobre a matéria e havendo uma das
cuide de tema importante, pois concerne a Turmas já firmado orientação, é dispensá-
uma definição da Corte quanto à necessida- vel remeter-se o feito ao Pleno, eis que,
de ou não de o traslado do agravo de instru- desde logo, esta Turma, por igual, pode
mento vir instruído com certidão referente adotar a orientação que tiver por correta.
258 R.T.J. — 158

Se, porventura, for discordante da orienta- No caso, pode-se prescindir da remessa,


ção da Primeira Turma, aí sim, penso que tendo em vista que a Primeira Turma já
seria indispensável que a matéria mereces- decidiu a questão.
se debate pelo Plenário, com todos os mem- Levando em consideração o grande nú-
bros do Tribunal. mero de processos na secretaria dos gabi-
Do exposto , vou me permitir não aco- netes, peço licença ao Sr. Ministro Marco
lher a questão de ordem formulada pelo Aurélio e acompanho o pronunciamento
ilustre Ministro Marco Aurélio e, assim, de V. Exa.
não ver necessidade de remeter-se ao Ple-
VOTO
nário, para apreciação, o agravo regimen-
tal, ora em julgamento. O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor
Presidente, antes de adentrar o exame da
VOTO (VOTO S/QUESTÃO
matéria, considerada a dogmática, farei um
DE ORDEM) registro em meu voto.
O Sr. Ministro Maurício Corrêa: Sr. Após a Carta de 1988, surgiram dúvidas
Presidente, o Ministro Marco Aurélio vai sobre a necessidade, ou não, da remessa de
me permitir, com toda sinceridade, fazer- todo e qualquer processo, da competência
lhe um elogio de corpo presente. Tenho por do Supremo Tribunal Federal, à Procurado-
S. Exa. uma admiração muito grande, so- ria Geral da República. Esta Corte, deve-
bretudo pelo seu poder de criatividade, pois mos reconhecer, está dividida. Alguns Mi-
tantas e tantas têm sido as decisões que se nistros entendem que certos casos não de-
converteram em casos que são padrões para vem ser remetidos automaticamente ao Mi-
nós. Mas, neste caso, vou pedir vênia a S. nistério Público, e outros concluem de for-
Exa. para não acompanhá-lo nesse ponto, ma diversa.
em face da decisão já tomada pela Primeira
Turma e pela evidência constatada até aqui Daí por que chegaram ao Ministério Pú-
blico centenas e, diria mesmo, milhares de
— já prenuncia a maioria. Não vejo neces-
agravos. Um certo Procurador percebeu,
sidade, portanto, que o Pleno se pronuncie
nesses agravos de instrumento, estar faltan-
sobre uma questão que está superada pela
do um peça essencial e, à mercê de parecer
Súmula.
padrão, devolveu, da noite para o dia, ao
De modo que, com a devida vênia que Supremo Tribunal Federal, os feitos outro-
sua S. Exa. merece, acompanho o eminente ra remetidos. Examinando minuciosamen-
Presidente a respeito da solução da questão te esses agravos, descobriu o Órgão do
de ordem. Ministério Público que, na formação dos
instrumentos, inexistia peça que asseverou
VOTO (S/QUESTÃO DE ORDEM)
essencial à análise cabível. Data venia, a
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sr. Pre- meu ver, esse enfoque, — para mim inusi-
sidente, sou avesso à remessa de processos tado — não encontra agasalho na ordem
ao Plenário, dado que acabam não sendo constitucional. É o que pretendo deix.
julgados com a presteza necessária. Tenho consignado no voto que vou proferir, diver-
processos no Plenário, inclusive com pedi- gindo de V. Exa. e dos eminentes Ministros
dos de vista, com votos prontos, sem pos- Maurício Corrêa e Francisco Rezek.
sibilidade de julgá-los. Sou, por isso, par- Até 13 de fevereiro de 1995, a formação
cimonioso com relação à remessa de feitos do instrumento esteve regida primordial-
ao Tribunal Pleno. mente pelo artigo 523 do Código de Pro-
R.T.J. — 158 259

cesso Civil de 1973 — o Código Buzaid. O negar trânsito a esse recurso em duas li-
parágrafo único desse artigo preceituava, nhas, dizendo da extemporaneidade, da ul-
quanto aos agravos da competência, tam- trapassagem do prazo de quinze dias ou do
bém, do Supremo Tribunal Federal, que prazo em dobro, assinado à Fazenda Públi-
«serão obrigatoriamente trasladadas a deci- ca, Ministério Público, e pessoas jurídicas
são agravada, a certidão da respectiva inti- de direito público que gozam dessa prerro-
mação» • para conhecimento da decisão gativa. Não posso enquadrar a peça como
atacada na via do agravo, ou seja, indispen- obrigatória, diante do disposto no parágra-
sável à definição da oportunidade do agra- fo único do artigo 523 do Código de Pro-
vo, e não do recurso extraordinário — «e a cesso Civil, e, menos ainda, como essencial
procuração outorgada ao advogado do a dirimir-se qualquer questão. Ao apreciar
agravante». Esse rol não pode ser enqua- o agravo, o Relator não julga o recurso
drado como exaustivo, pois controvérsias a exatraordinário, que sequer subiu a esta
que esteja ligada peça diversa pode vir con- Corte. O exame do agravo de instrumento
duzida no agravo de instrumento. é uma fase que precede a análise e o julga-
Por isso mesmo, esta Corte editou o ver- mento, propriamente ditos, do recurso ex-
bete de n° 288, com o seguinte teor, com- traordinário. Provendo-se o agravo, então é
pondo a Súmula da jurisprudência predo- possível, reautuando-se o processo, julgar-
minante: se o recurso nos próprios autos.
«Nega-se provimento a agravo para A reforma introduzida há pouco e que
subida de recurso extraordinário, quan- passou viger a partir de 13 de fevereiro de
do faltar no traslado o despacho agrava- 1995, implicou o elastecimento do rol das
do...» peças a serem trasladadas. Mediante o § 1°
do artigo 544 — reintroduzido no Código
— também exigido pelo parágrafo de Processo Civil pela Lei n° 8.950, de 13
único do artigo 523 do Código de Processo de dezembro de 1994 —, tem-se que, sob
Civil — pena de não-conhecimento do agravo, é
«...a decisão recorrida, a petição de preciso constar do instrumento «cópia do
recurso extraordinário ou qualquer peça acórdão recorrido, da petição de interposi-
essencial à compreensão da controvér- ção do recurso denegado (...)», ou seja,
sia.» cópia do recurso extraordinário, «das con-
tra-razões (...)». Quer dizer, o agravante
Teríamos, no caso, como que um adita- tem de providenciar a formação do instru-
mento decorrente de uma interpretação te- mento com peças que interessam ao agra-
leológica do parágrafo único do citado ar- vo. E continua, em seu rigor, esse parágra-
tigo. fo: «da decisão agravada, da certidão da
Ora, se não está em questão a oportuni- respectiva intimação (...)», isto é, para ciên-
dade do recurso extraordinário, podemos cia da decisão atacada mediante o agravo
assentar que a certidão de intimação para a de instrumento, «das procurações outorga-
ciência do acórdão atacado mediante esse das aos advogados do agravante e do agra-
recurso é uma peça, a vir no agravo de vado».
instrumento, essencial à compreensão da Houve aumento do prazo para interpo-
lide, se ela é inexistente, e se milita, a favor sição do agravo de instrumento — de cinco
do agravante, a presunção de tempestivida- para dez dias. A fim de evitar a problemá-
de do recurso extraordinário? Seria muito tica concernente à responsabilidade, pela
fácil, ao Presidente da Corte de origem, deficiência do instrumento, pela ausência
260 R.T.J. — 158

de traslado dessa ou daquela peça, explici- observando-se, daí em diante, o proce-


tou-se que as cópias são apresentadas pelo dimento relativo a esse recurso.»
próprio agravante, que não mais as indica No caso de apreciação de plano e ime-
para que a secretaria do órgão providencie diata do extraordinário, não cabe converter
o traslado. Todavia, não se inseriu no § 1° o agravo, mediante reautuação em extraor-
do artigo 544, como peça essencial, a cer- dinário, para implementar-se o julgamento
tidão de intimação para ciência do acórdão deste.
impugnado via extraordinário. Exigiu-se o
traslado da certidão atinente à intimação O preceito alberga a hipótese de não ter
para conhecimento do ato impugnado me- havido controvérsia sobre a tempestividade
diante o agravo, que é coisa diversa. do extraordinário e, por isso, inexistir, nos
autos do agravo, a certidão de intimação,
Ao se estabelecer como peças essenciais para ciência do que impugnado na via do
as contra-razões e, também, a procuração extraordinário.
outorgada pelo agravado, dentre as demais Senhor Presidente, se não me defronto
peças, o único objetivo é a agilização do quer com peça obrigatória, sob o ângulo
processo, a celeridade e economia proces- legal, quer com peça indispensável à reso-
suais, o máximo de eficácia da lei com o lução, no julgamento do agravo, de certa
mínimo de atividade judicante, e assim re- demanda, se tenho como ausente no agravo
sume-se o que se entende como economia qualquer discussão sobre a tempestividade
e celeridade processuais. do extraordinário, não posso dizer que a
certidão, referente à intimação do acórdão
A razão de ser da exigência não é outra é uma peça essencial. E assim, devo obser-
senão a possibilidade do julgamento do var um princípio muito caro às sociedades
extraordinário nos próprios autos do agra- democráticas, que é o princípio da legalida-
vo de instrumento. E aí segue-se um precei- de: ninguém está compelido a fazer ou dei-
to que fornece bastante luz para o desfecho xar de fazer alguma coisa, senão em virtude
seguro da controvérsia com a qual estamos de lei. Como assentarmos, então — sem
nos defrontando neste momento, sem que embargo do grande número de processos,
se caminhe para a transformação do Judi- da avalanche de processos que vem sendo
ciário em uma caixa de surpresas; sem se suportado pela Procuradoria Geral da Re-
deixar centenas de advogados na situação pública e do esforço hercúleo pelo Supre-
constrangedora de serem tidos por negli- mo Tribunal Federal —, o caráter indispen-
gentes, desidiosos, porque não providen- sável dessa certidão? Não vejo como, por
ciaram o traslado de uma certa peça. A melhor que seja o intento de quem se de-
demonstrar que é possível — a mais não fronta com a matéria, exigir-se a peça.
poder — não haver no agravo de instru-
mento peça relativa ao recurso extraordiná- E não é só. Impor a certidão de intima-
rio, vem-nos o artigo 544, § 3° do Código ção para ciência do aresto atacado via ex-
de Processo Civil, do seguinte teor: traordinário, quando inexistente controvér-
sia sobre a oportunidade deste, com inegá-
«Na hipótese de provimento do agra- vel surpresa para o agravante, é obstaculi-
vo, se o instrumento contiver os elemen- zar o acesso a esta Corte, com infração à
tos necessários ao julgamento do mérito garantia do inciso XXXV do artigo 5° da
do recurso especial» —o § 4° transporta Carta de 1988. Sim, o acesso assegurado
para o extraordinário a mesma regra — não se restringe à viabilização da entrada
«o relator determinará sua conversão, da inicial no Protocolo do Órgão Judiciário.
R.T.J. — 158 261

Estende-se à tramitação regular do proces- Senhor Presidente, provejo o agravo re-


so e esta decorre da observância à legisla- gimental, a fun de determinar a subida do
ção instrumental, sem introdução de crité- extraordinário. É como voto na espécie.
rio que lhe seja estranho, como é o relativo
à exigência em comento. VOTO
Senhor Presidente, sinto-me até numa
situação muito confortável. Não estou na O Sr. Ministro Carlos Venoso: Sr. Pre-
pele desses advogados que serão surpreen- sidente, impressionou-me o argumento no
didos com a decisão que ora se delineia. sentido de que os advogados seriam sur-
Felizmente estou do lado de cá do cancelo, peendidos com a decisão que acolhesse o
a julgar. Todavia, devo fazê-lo de acordo parecer da Procuradoria-Geral da Repúbli-
com minha formação humanística e profis- ca. É que não foi alegada a intempestivida-
sional. Ninguém tem sido mais rigoroso de do recurso extraordinário, por quem
quanto aos pressupostos de recorribilidade quer que seja. Ora, exigir, agora, a certidão
do que eu. Entrementes, jamais imaginei, de intimação do acórdão recorrido, para se
como os demais integrantes da Corte nes- negar trânsito ao agravo, seria inusitado.
ses muitos anos, o que descoberto por um Ademais, a questão de o recurso ter sido
Procurador da República incumbido de ofi- apresentado tempestivamente ou não, po-
ciar nas centenas, nos milhares de agravos, deria ser examinada nos autos do recurso
remetidos ao Ministério Público Federal. extraordinário, se mandado processar o
RE. Noutras palavras, se, por acaso, fosse
Peço vênia, destarte, a V. Exa, aos Mi- provido o agravo, subindo os autos, seria
nistros Maurício Corrêa e Francisco Rezek possível o exame da tempestividade do re-
para concluir de maneira oposta; para pro- curso, sem nenhum prejuízo para as partes.
ver os agravos regimentais. E se propus
anteriormente o envio da matéria ao Pleno A exigência, portanto, agora, da certi-
é que levei em conta a repercussão do caso dão de intimação do acórdão que originou
e o fato de que já notei, na Corte, desloca- o RE, consubstancia formalismo exagera-
mento de processos ao Pleno sobre tema em do, formalismo desnecessário.
que as duas Turmas, a uma só voz, vinham Sr. Presidente, peço licença a V.Exa. e
decidindo a respeito. Refiro-me à auto- aos eminentes Ministros Corrêa e Rezek
aplicabilidade dos §§ 5° e 6° do artigo 201 para dar provimento aos agravos regimen-
da Constituição Federal. Todos estamos tais.
lembrados que, tanto esta Turma, quanto a
Primeira Turma vinham posicionando-se EXTRATO DA ATA
pela auto-aplicabilidade. A Primeira, mes-
mo assim, sensível às preocupações da Pre-
Ag 151.485 (AgRg) — SP —Rel.: Min.
vidência Social, deslocou um caso para o
Pleno, que reafirmou o que já vinha sendo Néri da Silveira. Agte.: Dynacast do Brasil
proclamado pelas Turmas. Almejava ver Ltda. (Advs.: Celso Botello de Moraes e
outros). Agdo.: Estado de São Paulo
submetida a questão ao Plenário, em vista
(Advs.: Magali Jurema Abdo e outros).
da necessidade de uma discussão em con-
junto e, também, da adoção de tese passível Decisão: Preliminarmente, a Turma re-
de conduzir as ressalvas nos órgãos fracio- cusou afetar ao Plenário o julgamento do
nados da Corte, o que não ocorrerá, ao agravo regimental, vencido o Sr. Min. Mar-
menos de minha parte, em face de somente co Aurélio que propôs a remessa. No méri-
se ter pronunciamentos isolados. to, a Turma negou provimento ao agravo
262 R.T.J. — 158

regimental, vencidos os Srs. Ministros Car- Francisco Rezek e Maurício Corrêa. Sub-
los Velloso e Marco Aurélio. procurador-Geral da República, o Dr. Mar-
dem Costa Pinto.
Presidência do Senhor Ministro Néri da
Silveira. Presentes à Sessão os Senhores Brasília, 20 de junho de 1995 — Wag-
Ministros Carlos Velloso, Marco Aurélio, ner Amorim Madoz, Secretário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 152.214 (EDcI-AgRg) — GO


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio


Embargante: Roberval Luiz Pavan — Embargado: Banco do Brasil S/A
Recurso — Prequestionamento — Configuração. O preques-
tionamento não resulta da circunstância de a matéria haver sido empol-
gada pela parte recorrente. A configuração do instituto pressupõe debate
e decisão prévios pela Corte de origem, ou seja, emissão de juízo explicito
sobre o tema. O procedimento tem como escopo o cotejo indispensável a
que se diga do enquadramento do recurso extraordinário no permissivo
constitucional e, se o Tribunal a quo não adotou entendimento explícito
a respeito do fato jurigeno veiculado nas razões recursais, inviabilizada
fica a conclusão sobre a violência ao preceito evocado pelo recorrente.
ACÓRDÃO veiculada na petição da demanda consigna-
tária, na impugnação à contestação, na sen-
Vistos, relatados e discutidos estes au- tença do Juízo, na apelação cível, no acór-
tos, 'mordam os Ministros do Supremo Tri- dão recorrido e, por último, no recurso ex-
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- traordinário. Cita precedentes de minha la-
formidade da ata do julgamento e das notas vra sobre o alcance do instituto «preques-
taquigráficas, por unanimidade de votos, tionamento» — Agravo de Instrumento a°
em rejeitar os embargos de declaração. 135.902 (AgRg)-SP, com acórdão publica-
Brasília, 14 de novembro de 1994 — do na Revista de Jurisprudência n° 135,
Néri da Silveira, Presidente — Marco páginas 1251 a 1253 — e reproduz, com
Aurélio, Relator. pormenores, o julgamento da Ação Direta
de Inconstitucionalidade n° 493, em que,
RELATÓRIO realmente, quedei vencido. Estes autos vie-
ram-me conclusos para apreciação dos de-
O Sr. Ministro Marco Aurélio: O claratórios de 1° de março de 1994, sendo
acórdão embargado revela a inviabilidade liberados no dia 15 imediato (folha 403).
do extraordinário, porquanto o tema nele É o relatório.
versado não foi objeto de debate e decisão
prévios. Com os presentes embargos decla- VOTO
ratórios, Roberval Luiz Pavan sustenta a
existência de obscuridade, dúvida e contra- O Sr. Ministro Marco Aurélio (Rela-
dição, salientando que a matéria restara tor): Na interposição dos declaratórios fo-
R.T.J. — 158 263

ram observados os pressupostos de recorri- os nefastos efeitos da espiral inflacionária.


bilidade que lhe são próprios. O documento Discorreu-se sobre o princípio do respeito
de folha 93 comprova a regularidade da ao que contratado, nada se cogitando quan-
representação processual, sendo que, pu- to à natureza, em si, do índice a ser consi-
blicado o acórdão embargado no Diário de derado. Lei-se, para melhor convicção, o
4 de fevereiro de 1994 — sexta-feira (folha teor do acórdão de folhas 282 a 284, espe-
269) — deu-se a manifestação do incon- cialmente o voto que o fundamentou:
formismo em 11 imediato — sexta-feira
(folha 370). «Recurso próprio e interposto na
atempação legal e porque processualiza-
No mais, não se tem no acórdão embar- do de forma regular, dele conheço.
gado qualquer dos vícios empolgados nes-
tes declaratórios. Eis como fundamentei o Questão simplista e porque já incor-
voto condutor do julgamento: porada no cotidiano desta Corte de Jus-
tiça, não merece maiores considerações
Quanto à matéria de fundo, há de se para se chegar à certeza do acerto do
ter presente que a atuação em sede ex- julgamento da instância singela.
traordinária faz-se a partir da moldura
fálica delineada pela Corte de origem. De toda a jurisprudência colacionada
Perquire-se o enquadramento, ou não, na veneranda sentença do primeiro grau
do extraordinário em um dos permissi- merecem atenção aquelas de fls.
vos constitucionais considerando-se os 173/174 (Ap. Cível n° 26.356 de que foi
fundamentos da decisão atacada. Daí a relator o eminente Des. Jalles Ferreira
existência do instituto referente aos ex- da Costa), 175 (Ap. Cível n° 23.464 —
traordinários, e somente a estes, que é o Rel. o Des. Lafaiete Silveira) e 181 (AI
prequestionamento, cuja razão de ser n° 6.132 — Rel ator o Des. Mauro Cam-
está na necessidade de proceder-se a pos) porque tratam respectivamente dos
cotejo para assentar-se a viabilidade, ou temas: fixação de taxas de juros, sua
não, do extraordinário. Na espécie, a capitalização e correção monetária, te-
Corte de origem não adentrou a questão mas afetos à presente perlenga.
referente ao fator de indexação monetá- Cumpre salientar que contrato é coi-
ria. Apenas disse da necessidade de em- sa que se faz livremente e uma vez
prestar-se, ao que contratado pelas par- celebrado deve ser cumprido como
tes, a valia indispensável à segurança pactuado.
dos negócios jurídicos. De tal circuns-
tância resulta a impossibilidade de se ter É o repisado princípio: pacta sunt
como infringidos os dispositivos consti- servanda.
tucionais evocados pelo Agravante. Por Ora, se o apelante contratou livre-
estes motivos nego acolhida ao pedido mente, deve cumprir o que pactuou.
formulado neste regimental.
Temos ciência e consciência de que
Ainda que se pudesse rever o que deci- a política agrícola do país é, por demais,
dido, mesmo assim não se teria o reconhe- escorchante contra o agricultor.
cimento da procedência do que articulado
pelo Embargante. No provimento da Corte Em contrapartida, é preciso que se
de origem, impugnado mediante o extraor- reconheça, também, que o sistema fi-
dinário, em momento algum elucidou-se nanceiro não pode ser tido como o vilão
sequer o índice a ser observado para afastar da história.
264 R.T.J. — 158

Se empresta dinheiro, tem direito ao EXTRATO DA ATA


pagamento na mesma proporção que Ag 152.214 (EDcI-AgRg) — GO —
emprestou. Rel.: Min. Marco Aurélio. Embte.: Rober-
val Luiz Pavan (Advs.: Adilson Ramos e
O mecanismo hoje tido como efi-
outros). Embdo.: Banco do Brasil S/A
ciente para evitar a corrosão do valor
(Advs.: Izaias Batista de Araújo e ou-
nominal do dinheiro ainda é a correção
tros).
monetária que muda de nome ao sabor
das conveniências governistas, mas Decisão: Por unanimidade, a Turma re-
mantém-se presente em nossa sistemá- jeitou os embargos de declaração.
tica financeira. Presidência do Senhor Ministro Néri da
Ao teor destas considerações, meu Silveira. Presentes à sessão os Senhores
voto é no sentido de se conhecer da Ministros Marco Aurélio. Ausentes, justi-
apelação, porém para desprovê-la, man- ficadamente, os Senhores Ministros Carlos
tida a sentença por seus próprios funda- Velloso e Francisco Rezek. Compareceu
mentos». para completar «quorum», o Senhor Minis-
tro limar Gaivão.
Rejeito estes declaratórios.
Brasília, 14 de setembro de 1994 —
É O meu voto. Wagner Amorim Madoz, Secretário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 152.805 (AgRg-EDcI) — SP


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello


Embargante: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Embargado:
Aparecido Abrão
Embargos de declaração — Inocorrência dos pressupostos de
embargabilidade (CPC, art. 535; RISTE, art. 337) — Inexistência de
omissão, contradição, obscuridade ou dúvida no acórdão embargado —
Embargos rejeitados.
Os embargos de declaração não devem revestir-se de caráter
infringente. A maior elasticidade que se lhes reconhece, excepcionalmen-
te, em casos de erro material evidente ou de manifesta nulidade do
acórdão (RTJ 89/548 — RTJ 94/1167 —RTJ 103/1210 — RTJ 114/351),
não justifica — sob pena de grave disfunção jurídico-processual dessa
modalidade de recurso — a sua inadequada utilização com o propósito
de questionar a correção do julgado e obter, em conseqüência, a descons-
tituição do ato decisório.

ACÓRDÃO bunal Federal, em Primeira Turma, na con-


formidade da ata do julgamento e das notas
Vistos, relatados e discutidos estes au- taquigráficas, por unanimidade de votos,
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- em rejeitar os embargos de declaração.
R.T.J. — 158 265

Brasília, 19 de outubro de 1993 — criação, majoração ou extensão de ou-


Moreira Alves, Presidente — Celso de tros benefícios ou serviços da segurida-
Mello, Relator. de social.
RELATÓRIO A aplicabilidade do conteúdo norma-
tivo do art. 201, §§ 5° e 6°, da Constitui-
O Sr. Ministro Celso de Mello: Cuida- ção, por revelar-se plena, imediata e in-
se de embargos de declaração tempestiva- tegral, não depende, por isso mesmo,
mente opostos a acórdão da Primeira Tur- da indicação de qualquer específica fon-
ma do Supremo Tribunal Federal, que foi te de custeio.»
assim ementado (fl. 79): O embargante, ao imputar omissão ao
«Ementa: Constitucional — Pre- acórdão proferido, aduziu, em petição pa-
videnciário — Valor mínimo do be- dronizada, as seguintes razões recursais
neficio — Fonte de custeio — CF, (fls. 83/84), verbis:
art. 195, § 5° — Aplicabilidade «A omissão do Acórdão ora embar-
imediata da norma inscrita no art. gado:
201, ü* 5° e 6°, da Carta Política —
Precedentes — Agravo regimental Com a devida vênia Ínclito Julgador,
improvido. o venerando Acórdão ora embargado
comporta aclaramento, até mesmo com
A jurisprudência de ambas as efeitos modificativos do julgado, ante os
Turmas do Supremo Tribunal Federal motivos legais e regimentais retro-assi-
firmou-se, de modo unânime e unifor- nalados (incisos I e II do art. 535 do CPC
me, no sentido da auto-aplicabilidade e arts. 337 e 338 do RISTF).
das normas inscritas no art. 201, §§ 5° e
6°, da Constituição da República. A doutrina não favorece a tese da
auto-aplicabilidade dos pertinentes dis-
A garantia jurídico-previdenciá- positivos constitucionais, não estando
ria outorgada pelo art. 201, §§ 5° e 6°, da também pacificado o entendimento en-
Carta Federal deriva de norma provida tre os Egrégios Tribunais Regionais Fe-
de eficácia plena e revestida de aplica- derais.
bilidade direta, imediata e integral. Esse
preceito da Lei Fundamental qualifica- Fundamentalmente, importa, data
se como estrutura jurídica dotada de su- maxima venia, é que a discussão dos
ficiente densidade normativa, a tomar autos, envolve correlação de dispositi-
prescindível qualquer mediação legis- vos constitucionais e legais cuja apre-
lativa concretizadora do comando nele ciação se traduz em conseqüência ne-
positivado. cessária e inerente à própria elucida-
ção da causa: — conjugação dos arts.
Essa norma constitucional — por não 201, caput (Previdência Social, na mo-
reclamar a interpositio legislatoris — dalidade de Seguro Social: — presta-
opera, em plenitude, no plano jurídico, ção c/c contraprestação), §§ 5° e 6°, 195,
todas as suas conseqüências e virtuali- § 5° da Constituição Federal, art. 59 do
dades eficaciais. ADCT, como art. 20 da Lei n° 8.212, de
A exigência inscrita no art. 195, 24-7-91, arts. 33, 40 e 145 da Lei n°
§ 5°, da Carta Política traduz comando 8.213, de 24-7-91 (leis instituidoras dos
que tem, por destinatário exclusivo, o planos de custeio e benefício da seguri-
próprio legislador, no que se refere à dade social, respectivamente).
266 R.T.J. —158

Assim, ainda com a devida vênia do Não procedem as alegações deduzidas


Ínclito Julgador, como conseqüência pelo embargante, eis que, na espécie, não
necessária e inafastável da apreciação se acha configurada qualquer omissão que
de mesma matéria, haveria de ser exa- pudesse ser considerada processualmente
minada, particularmente, a constitucio- suprível por intermédio desta via recursal.
nalidade do art. 145 da Lei n° 8.213, de
24-7-91, em virtude do qual, em conso- O acórdão questionado, ao referir-se es-
nância também com o art. 59 do ADCT, pecificamente sobre a questão da inconsti-
os efeitos de dita lei retroagirão a tucionalidade de dispositivos da Lei n°
5-4-91. Desnecessário dizer que, so- 8.213/91, deixou assentado a impossibili-
mente se reconhecida a inconstituciona- dade de apreciar esse tema jurídico por
lidade do multicitado dispositivo legal absoluta ausência de prequestionamento.
(art. 145 da Lei n° 8.213/91, poderia
convalescer o eminente decisum ora Na realidade, o que pretende a entidade
embargado. autárquica recorrente é trazer, uma vez
mais, para exame deste Tribunal, matéria
Ademais, por força também do dis- que já foi apreciada pelo Plenário do STF
posto no art. 11, I, do RISTF, demais (RE 159.413-6, rel. Min. Moreira Alves,
normas regimentais atinentes, trata-se julg. em 22-9-93), em decisão que se limi-
de matéria que deveria ser alçada ao
tou a confirmar, por unanimidade, a orien-
Pleno dessa Suprema Corte.
tação jurisprudencial anteriormente fixada
Nos pontos, retro, data maxima ve- pelas Turmas desta Corte, no sentido da
nia, residem não só omissão como forte auto-aplicabilidade das regras inscritas no
dúvida que propiciam os embargos ora art. 201, §§ 5° e 6° da Carta Política.
opostos.»
A via recursal dos embargos declarató-
Por não me haver convencido das razões rios — especialmente quando inocorrentes
apresentadas, e tendo presente o que dispõe os pressupostos que justificam a sua ade-
o § 2° do art. 337 do RISTF, submeto os quada utilização — não pode conduzir, sob
presentes embargos declaratórios à apre-
pena de grave disfunção jurídico-proces-
ciação desta Eg. Primeira Turma.
sual dessa modalidade de recurso, à reno-
É o relatório. vação de um julgamento que se efetivou de
maneira regular e cujo acórdão não se res-
sente de qualquer dos vícios da obscuri-
VOTO
dade, da omissão, da dúvida ou da contra-
dição.
O Sr. Ministro Celso de Mello (Rela- A decisão ora recorrida apreciou, com
tor): O Instituto Nacional do Seguro Social plena exatidão e em toda a sua inteireza, a
— INSS postula, com a interposição destes pretensão recursal deduzida pelo embar-
embargos declaratórios, o suprimento de gante. Nenhum ponto restou desconsidera-
uma inexistente omissão no acórdão im- do; nenhuma questão permaneceu sem so-
pugnado, o qual reconheceu, na linha da lução; nenhuma tese deixou de ser apre-
jurisprudência firmada no tema pelo Supre- ciada.
mo Tribunal Federal, a auto-aplicabilida-
de das normas inscritas no art. 201, §§ 5° e As diversas quaestiones juris suscita-
6°, da Constituição Federal. das constituíram, em suma, objeto de explí-
R.T.J. — 158 267

cito pronunciamento jurisdicional contido De qualquer maneira, porém, Sr. Presi-


na decisão ora embargada. dente, mesmo que os temas suscitados pelo
Ainda que se reconheça que o Supremo ora embargante tivessem sido regularmen-
Tribunal Federal tem conferido, «excep- te prequestionados ou justificassem a utili-
cionalmente, maior elasticidade aos embar- zação da via recursal extraordinária, ainda
gos declaratórios, em face da circunstância assim não seria acolhível a pretensão por
de não caber outro recurso de suas deci- ele ora deduzida, especialmente após o de-
sões» (RTJ 89/548 —RTJ 94/1167 —RTJ finitivo pronunciamento emanado do Ple-
103/1210 — RTJ 114/351), admitindo, em nário do Supremo Tribunal Federal ao en-
conseqüência, o uso dessa modalidade re- sejo do julgamento do RE 159.413-6.
cursal em casos de erro material evidente
Assim sendo, e considerando, notada-
ou de manifesta nulidade do acórdão em-
bargado — situações de todo inocorren- mente, o caráter infringente atribuído aos
tes na espécie —, impõe-se advertir que a presentes embargos de declaração — que
jurisprudência desta Corte tem ressaltado visam, na realidade, a um novo julgamento
que o recurso em questão não se justifica da causa —, e tendo em vista, ainda, a
quando o intuito do embargante evidencia inocorrência dos pressupostos legais de
a sua pretensão de obter, em sede absolu- embargabilidade a que se referem o CPC
tamente inadequada, o reconhecimento (art. 535) e o RISTF (art. 337), rejeito o
do erro ou do desacerto do julgado: recurso ora manifestado pelo INSS.
«Embargos declaratórios só se desti- É o meu voto.
nam a possibilitar a eliminação de obs-
curidade, dúvida, contradição ou omis-
são do acórdão embargado (art. 337 do EXTRATO DA ATA
RISTF), não o reconhecimento de erro
de julgamento. Ag 152.805 (AgRg-EDc1) — SP —
Rel.: Min. Celso de Mello. Embte.: Institu-
E como, no caso, é esse reconheci- to Nacional do Seguro Social — INSS
mento que neles se reclama, com a con- (Advs.: Vilma Westmann Anderlini e ou-
seqüente reforma do acórdão, ficam eles tros). Embdo.: Aparecido Abrão (Adva.:
rejeitados.» (RTJ 134/836, rel. Min. Maria das Merces Aguiar Verdelho).
Sydney Sanches)
«Embargos declaratórios. Inexistên- Decisão: A Turma rejeitou os embargos
cia de omissão, contradição, obscurida- de declaração, nos termos do voto do Rela-
de ou dúvida, no acórdão embargado tor. Unânime.
(art. 337 do RISTF). Presidência do Senhor Ministro Moreira
Embargos rejeitados. Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
O que pretenderam os embargantes ce, Celso de Mello e limar Gaivão. Subpro-
foi sustentar o desacerto do julgado e curador-Geral da República, Dr. Antonio
obter sua desconstituição. A isso não se Fernando Barros e Silva de Souza.
prestam, porém, os embargos declarató-
rios.» (RTJ 134/1296, rel. Min. Sydney Brasilia, 19 de outubro de 1993 — Ri-
Sanches) cardo Dias Duarte, Secretário.
268 R.T.J. — 158

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 152.837 (AgRg) — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso


Agravante: União Federal — Agravada: Autolatina Brasil S/A
Constitucional. Processual civil. Recurso extraordinário e re-
curso especial. Matéria constitucional e matéria infraconstitucional. Fun-
damento constitucional bastante e suficiente.
Recurso extraordinário interposto de decisão do STJ, que
não conheceu de recurso especial, dado que o acórdão do Tribunal de 2°
grau assentou-se em fundamento constitucional e infraconstitucional,
certo que o fundamento constitucional utilizado é bastante e suficiente
para manter o acórdão do 2° grau. Não tendo havido recurso extraordi-
nário deste último (o RE foi indeferido e resultou irrecorrida a decisão
indeferitória), a matéria constitucional precluiu preclusão máxima —
o que inibe o conhecimento do recurso especial.
RE interposto da decisão do STJ inadmitido. Agravo não
provido.

ACÓRDÃO extraordinário fundamenta-se no art. 102,


III, a, da Constituição, argumentando que
Vistos, relatados e discutidos estes au- o acórdão ofendeu o art. 105, III, c, da
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- mesma Carta.
bunal Federal em Segunda Turma, na con- Insurge-se a agravante afirmando que a
formidade da ata do julgamento e das notas hipótese dos autos seria diversa daquela
taquigráficas, por decisão unânime, negar contida no Ag 145.589 (AgRg)-RJ, Rel.
provimento ao agravo regimental. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 9-9-93.
Brasília, 23 de novembro de 1993 — Aqui, entretanto, não existiria matéria
Néri da Silveira, Presidente — Carlos constitucional em questão, apenas conflito
Velloso, Relator. sobre hermenêutica e aplicação de normas
infraconstitucionais e seus limites em ma-
RELATÓRIO téria tributária de isenção.
O Sr. Ministro Carlos Venoso: Trata- Ademais, se o STJ deixar de apreciar as
se de agravo regimental contra decisão que questões postas a debate no recurso espe-
negou seguimento ao agravo de instrumen- cial, negada ficaria a autoridade das normas
to da decisão denegatória do processamen- contidas nos arts. 97, 111 e 176, do CTN,
to de recurso extraordinário interposto de o que romperia o prévio esgotamento da
acórdão do STJ que não conhecera do re- discussão infraconstitucional.
curso especial, dado que o fundamento É o relatório.
constitucional, utilizado pelo acórdão do
Tribunal de 2° grau, bastante e suficiente VOTO
para a decisão da causa, não fora atacado O Sr. Ministro Carlos Velloso (Rela-
por recurso extraordinário, pelo que teria tor): a decisão recorrida, ora sob exame,
sido apanhado pela preclusão. O recurso tem o seguinte teor:
R.T.J. — 158 269

«O acórdão do Tribunal de 2° grau versa da que já tiver sido resolvida pela


assentou-se em fundamento constitu- instância ordinária.» E mais: «Ademais,
cional e infraconstitucional. Por isso, o na hipótese, que é a do caso — em que
Superior Tribunal de Justiça não co- a solução da questão constitucional, na
nheceu do recurso especial, dado que instância ordinária, constitui fundamen-
o fundamento constitucional, utiliza- to bastante da decisão da causa e não foi
do pelo acórdão do Tribunal de 2° impugnada mediante recurso extraordi-
grau, bastante e suficiente para a deci- nário, antes que a preclusão da matéria,
são da causa, não foi atacado por re- é a coisa julgada que inibe o conheci-
curso extraordinário, pelo que foi apa- mento do recurso especial.» (Julg. de
nhado pela preclusão. 2-9-93)
Daí o RE, com base no art. 102, III, Do exposto, mantenho a decisão
a, da Constituição, sustentando-se ofen- agravada. Em conseqüência, nego se-
sa ao art. 105, III, c, da mesma Carta, guimento ao agravo.» (fl. 92)
argumentando-se que o STJ deixou de A decisão é de ser mantida, por seus
exercitar a função ali indicada, qual fundamentos.
seja a de unificar a jurisprudência. A
decisão do eminente Presidente do É que, conforme vimos, o acórdão do
STJ inadmitiu o RE, ao argumento bá- Tribunal de 2° grau assentou-se em funda-
sico de que a recorrente, ao se confor- mento constitucional e infraconstitucional.
mar com o despacho de inadmissão do O fundamento constitucional é bastante e
seu recurso extraordinário, interposto suficiente para manter o acórdão. Todavia,
no Tribunal de 2° grau, perdeu a opor- não foi ele atacado mediante recurso ex-
tunidade de ver o assunto discutido no traordinário, dado que este foi indeferido e
STF. Agora, somente por via oblíqua resultou irrecorrida a decisão que inadmitiu
a questão poderia ser reagida, o que o recurso extraordinário. A matéria consti-
não seria possível. tucional, por isso mesmo, precluiu, tendo
recorrido, na verdade, preclusão máxima,
A decisão é de ser mantida. O acór- que inibe o conhecimento do recurso espe-
dão do Tribunal Regional Federal, que cial.
decidiu a questão na instância de apela-
ção, utilizou fundamento constitucional VOTO
bastante e suficiente para mantê-lo.
Tendo havido recurso especial, apenas O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor
(o RE foi indeferido e resultou irrecor- Presidente, ainda tenho vários processos
rida a decisão indeferitória), a matéria sobre a materia: recursos extraordinários
constitucional precluiu. Julgando o Ag que encaminhei à Procuradoria-Geral da
n° 145.589-RJ, Relator Ministro Sepúl- República, porque vinha sustentando que,
veda Pertence, o Plenário decidiu que, segundo a nossa ordem processual comum,
«do sistema constitucional vigente, que não se pode cogitar de coisa julgada, em si,
prevê o cabimento simultâneo de recur- quanto a fundamentos — artigo 469 do
so extraordinário e de recurso especial Código de Processo Civil. Todavia, o tema
contra o mesmo acórdão dos tribunais foi ao Plenário e concluiu-se que, estando
de segundo grau, decorre que da decisão o acórdão impugnado mediante o especial
do STJ, no recurso especial, só se admi- alicerçado, embora quanto à mesma con-
tirá recurso extraordinário se a questão trovérsia, relativamente ao mesmo direito
constitucional objeto do último for di- resistido, em fundamento estritamente le-
270 R.T.J. — 158

gal e constitucional — e deixando a parte e homenageio a jurisprudência, acompa-


de interpor o recurso extraordinário, ou nhando o Relator e negando provimento ao
negando-se processamento a esse recurso, agravo regimental.
não se protocolando o agravo de instru- EXTRATO DA ATA
mento — fica prejudicado o especial.
Ag 152.837 (AgRg) — SP —Rel.: Min.
Indaga-se: à mesma conclusão chegar-
Carlos Velloso. Agte.: União Federal
se-á na hipótese inversa, ou seja, em que
(Adva.: Procuradoria da Fazenda Nacio-
interposto apenas o extraordinário ou inad- nal). Agda.: Autolatina Brasil S/A (Advs.:
mitido o especial, se não protocolado o Ruben Toledo Damião e outros).
agravo?
Decisão: Por unanimidade, a Turma ne-
Senhor Presidente, continuo convenci-
gou provimento ao agravo regimental.
do de que, ultrapassada a barreira do conhe-
cimento do especial, tendo em vista o dis- Presidência do Senhor Ministro Néri da
posto no inciso III do artigo 105 da Carta, Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
o Superior Tribunal de Justiça, como qual- Ministros Carlos Velloso e Marco Aurélio.
quer outro órgão investido do ofício judi- Ausentes, justificadamente, os Senhores
cante, julga a lide, podendo e devendo, Ministros Paulo Brossard e Francisco Re-
inclusive, exercer o controle difuso. zek. Subprocurador-Geral da República, o
Contudo, não é esse o entendimento pre- Dr. Francisco José Teixeira de Oliveira.
dominante. Atuando em órgão fracionado, Brasília, 23 de novembro de 1993 —
coloco a visão pessoal em plano secundário José Wilson Aragão, Secretário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 153.868 (EDd-AgRg) — SP


(Primeira Turma)
(AgRg na RTJ n° 150/924)

Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches


Embargante: Carlos Roberto Micelli — Embargado: Primeiro Tribunal de
Alçada Civil do Estado de São Paulo
Direito Processual Civil.
Embargos Declaratórios.
Não sustentando o embargante a existência de qualquer
omissão, obscuridade, dúvida, ambigüidade ou contradição, no acórdão
embargado, que devesse ser sanada ou suprida, mas, sim, que incidiu em
erro de julgamento, os embargos declaratórios são rejeitados, pois estes
não se prestam à correção da alegada espécie de erro.
ACÓRDÃO conformidade da ata do julgamento e das
notas taquigráficas, por unanimidade de
Vistos, relatados e discutidos estes au- votos, em rejeitar os embargos de declara-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- ção em agravo regimental em agravo de
bunal Federal, por sua Primeira Turma, na instrumento.
R.T.J. — 158 271

Brasília, 3 de março de 1995 — Morei- contradição legal e recebendo a presen-


ra Alves, Presidente — Sydney Sanches, te como embargos de declaração como
Relator. define o artigo 535 e seguintes do
CPC.
RELATÓRIO
3°. Devemos conhecimento do pre-
o Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela- cedente mencionado por V. Exa. no r.
tor): 1. Trata-se de embargos declaratórios acórdão, mas, data venia, gostaríamos
opostos a acórdão da 1' Turma, de que fui de juntar o v. acórdão que demonstra
relator, assim ementado à fl. 128: pelo instituto da teleologia uma visão
«Ementa: Recurso. Fax. Embargos jurídico/social de maneira mais ampla a
declaratórios opostos a decisão de Rela- sensibilidade em contornar certos for-
tor de Agravo de Instrumento, no Supre- malismos pela própria realidade da
mo Tribunal Federal. Conversão dos matéria em apreciação por este órgão
embargos em agravo regimental. Não máximo do Judiciário brasileiro.
conhecimento deste, porém, por intem- 4° Data venia, sabemos de antemão
pestivo. que V. Exa. trilhou uma carreira brilhan-
O recurso pode ser interposto, no Su- te em nosso Judiciário e particularmente
premo Tribunal Federal, mediante fax, acompanhei através de matérias inseri-
mas a petição original deve ser apresen- das nas revistas Visão, Veja e Isto é o
tada à Secretaria do Tribunal, no prazo seu trabalho honrado, culto e permeado
legal, sob pena de ser considerado in- de sólida formação moral e ética, por-
tempestivo. Precedentes. tanto, confiamos com toda serenidade
Agravo regimental não conhecido.» em sua capacidade de decisão e sem
dúvida irá acolher o nosso pedido e ve-
2. Nos embargos, alega e pleiteia o em- rificar a importância de todos os nossos
bargante o seguinte (fls. 133/135): esforços para que venham, simplesmen-
«1°. No dia 3 de dezembro 1993 foi te, ler, meditar e tomar uma decisão
publicado na imprensa oficial o v. acór- eficaz sobre a matéria controvertida
dão que não conheceu o nosso Embar- existente em nossa petição. Não pode
gos de Declaração e nem a sua transfor- ser postergado, realmente, a especial
mação em Agravo Regimental, por não importância a perquirição da verdade
ter sido enviada a petição original, mas, material, em que se consubstancia o
tão-somente o fac-simile, embora, en- dado mais relevante do fundamento do
viamos em tempo hábil através da Em- due process of law.
presa de Correios, tomando-se uma sur-
presa não ter chegado ao seu destino. Isto posto, aguardamos que V. Exa.
venha aceitar a petição original e modi-
2°. Assim, para não haver uma de- ficar o r. acórdão utilizando da regra de
negação de justiça por não ter sido ouro, Não faças aos outros o que não
juntado o original em tempo hábil e queres que te façam a ti, que formulada
sendo matéria de relevância judicial (in- positivamente, se traduz pelo princípio
ciso III do artigo 125 do CPC), com de justiça: devemos tratar os outros tal
todo respeito e acatamento estamos en- como gostaríamos de ser tratados.
viando novamente os originais e reque-
remos a V. Exa. que venha aceitar e Nestes termos, com os documentos
haver a modificação do r. decisório por que a instruem, p. deferimento.
272 R.T.J. — 158

De Araraquara p/Brasflia, 8 dezem- Aliás, é firme a jurisprudência do


bro 1993 Plenário da Corte, no mesmo sentido do
acórdão embargado.
as.) Carlos Roberto Micelli
Rejeito, pois, os embargos.
OAB-SP n° 39.102
EXTRATO DA ATA
CPF 594212078/15.»
Ag 153.868 (EDcl-AgRg) — SP —
É o relatório. Rel.: Min. Sydney Sanches. Embte.: Carlos
Roberto Micelli (Adv.: O mesmo). Emb-
VOTO do.: Primeiro Tribunal de Alçada Civil do
Estado de São Paulo.
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela- Decisão: A Turma rejeitou os embargos
tor): 1. Como se vê da transcrição dos ter- de declaração em agravo regimental em
mos dos embargos declaratórios, não sus- agravo de instrumento. Unânime.
tenta o embargante a existência de qualquer Presidência do Senhor Ministro Moreira
omissão, obscuridade, dúvida, ambigüida- Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
de ou contradição, no acórdão embargado, nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
que devesse ser sanada ou suprida, mas, ce, Celso de Mello e limar Gaivão. Subpro-
sim, que este incidiu em erro de julga- curador-Geral da República, Dr. Miguel
mento. Franzino Pereira.
A esse propósito não se prestam os em- Brasília, 3 de março de 1995 —Ricardo
bargos declaratórios (art. 337 do RISTF). Dias Duarte, Secretário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 158.180 (AgRg) — RO


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Sydney Sanches


Agravantes: Mário Fernando Emanoel Borla Gonçalves Braga e cônjuge —
Agravada: Borla Bianca Ferdinanda Vincenza Brasilina
Direito Processual Civil. Regimento Interno do STF.
Agravo Regimental. Desnecessidade de inclusão em pauta
(art. 83, III, do RISTF) e descabimento de sustentação oral (art. 131,
2°).
Recurso extraordinário.
Tema constitucional (art. 229 da CF) não prequestionado
(Súmulas 282 e 356).
Matéria de fato, que não pode ser revista, pelo STF, em
RE, mediante interpretação de provas (Súmula 279).
Insuficiência do instrumento de Agravo (Súmula 288).
R.T.J. — 158 273

Alegação de ofensa ao art. 229 da Constituição Federal,


que se considera indemonstrada, por haver o acórdão recorrido, no
interesse das crianças, e com base nas provas e no direito infraconstitu-
cional, concluído que os agravantes não têm condições de cumprir o
dever previsto no dispositivo.
Hipótese, ademais, em que os recorrentes, na instância de
origem, tardiamente suscitaram questões constitucionais em embargos
declaratórios (artigos 226, § 4°, e 229 da CF), mas acabaram se confor-
mando com sua rejeição pelo relator, em decisão monocrática, que não
configura decisão de Tribunal, impugnável mediante RE (art. 102, III,
da CF).
7. Acórdão recorrido que se limita a interpretar provas e a
aplicar normas de legislação infraconstitucional (principalmente o Esta-
tuto da Criança e do Adolescente), ainda que eventualmente lhe dê
interpretação incorreta (só corrigível pelo STJ, em Recurso Especial),
não acarreta ofensa direta à Constituição, que possa ser coibida pelo
STF, em Recurso Extraordinário.
Agravo Regimental improvido.

ACÓRDÃO 2. Eis o inteiro teor dessa decisão (fls.


271/272):
Vistos, relatados e discutidos estes au-
«O ilustre Subprocurador-Geral da
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
República, em substituição, Dr. Paulo
bunal Federal, por sua Primeira Turma, na
de Tarso Braz Lucas, no parecer de fls.
conformidade da ata do julgamento e das
247/249, resumiu a hipótese e, em se-
notas taquigráficas, por unanimidade de
guida, opinou, nos termos seguintes:
votos, em, preliminarmente, indeferir o re-
querimento do agravante no sentido de ser «Ementa: Agravo de instrumento
intimado do julgamento do agravo e de ser Recurso extraordinário — Direito
assegurado, nele, a sustentação oral. E, no civil — Guarda de menores — Litígio
mérito, negar provimento ao agravo regi- entre respectivos pais e avó paterna
mental. Estatuto da Criança e do Adoles-
Brasília, 3 de março de 1995 — Morei- cente — Contrariedade ao art. 229 da
ra Alves, Presidente — Sydney Sanches, Carta Magna em vigor — Falta de
Relator. prequestionamento — Causa cujo
desfecho exigiu exame aprofundado
RELATÓRIO de provas — Incidência das Súmulas
279, 282 e 356-STF — Parecer pelo
improvimento do agravo.
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela-
tor): 1. Trata-se de agravo regimental inter- I. Trata-se de agravo de instrumento
posto contra decisão que proferi a fls. interposto por Mário Fernando Emanoel
271/2, negando seguimento ao agravo de Borla Gonçalves Braga e Eliane de Fá-
instrumento, oposto ao indeferimento do tima Saraiva Gadelha em face do r. des-
recurso extraordinário, na instância de ori- pacho reproduzido às fls. 216/217, pelo
gem. qual o Exmo. Sr. Presidente do Tribunal
274 R.T.J. — 158

de Justiça de Rondônia negou segui- fantes — Observância dos princí-


mento ao recurso extraordinário que pios tutelares do Estatuto da
eles (v. fls. 149/152), com arrimo na Criança e do Adolescente — Con-
alínea a do permissivo constitucional, veniência e interesse público —
formalizaram contra o aresto que se en- Agravo acolhido e provido.
contra às fls. 237/242. Constatada a omissão dos pais, a
O processo teve origem no pedido quem se atribui comportamento
de guarda dos menores Mário Fernando comprometedor à dignidade, desen-
Gadelha Braga e Marco Aurélio Gade- volvimento psicológico, segurança
lha Gonçalves Braga, que Borla Bianca física e equilíbrio emocional dos me-
Ferdinanda Vicenza Brasilina, avó pa- nores é de se deferir suas guardas à
terna destes e que se declara viúva e avó, cujas condições de melhor
residente em Copacabana, na cidade do orientá-los são evidentes. Conve-
Rio de Janeiro-RJ, formulou, pessoal- niência observada por inteligência
mente, sem assistência de advogado, pe- dos princípios do Estatuto da Criança
rante o Juízo da Infância e da Juventude e do Adolescente.»
de Porto Velho-RO, sob alegação, em
síntese, de que os citados menores vi- Daí alegarem eles, no recurso ex-
vem em ambiente familiar inadequado, traordinário, contraried ade ao art. 229
sem assistência material e relegados da Carta Magna em vigor, na parte em
muitas vezes ao abandono ou expostos que este dispõe sobre o dever que têm os
a constantes riscos de má formação mo- pais de assistir, criar e educar os filhos
ral e espiritual, tendo em vista as cenas menores.
de violência de que seus pais, ora agra- Tal recurso, porém, por não
vante, seriam contumazes protagonis- preencher os seus requisitos de admissi-
tas, ao ponto de poderem ser qualifica- bilidade, não tinha mesmo como ser ad-
dos como constantes freqüentadores de mitido. Ora, além do fundamento adota-
delegacias policiais. do no despacho impugnado se mostrar
válido, pois o dispositivo constitucional
Os agravantes foram vencedores que se aponta como vulnerado não pos-
em primeiro grau de jurisdição (senten- sui, de fato, a ratio pretendida, a verda-
ça-fls. 219/225) e em sede de apelação de é que a pretensão recursal dos agra-
(acórdão-fls. 226/234), mas quedaram vantes encontra obstáculo intransponí-
vencidos após o julgamento dos embar- vel nos enunciados das Súmulas n°s 282
gos infringentes patrocinados pela ora e 356 desse Pretório Excelso. É indiscu-
agravada, do qual resultou o aresto hos- tível, e isto até uma rápida leitura pode
tilizado, cuja ementa foi assim formu- confirmar, que o acórdão recorrido, de
lada: um lado, não tratou da questão constitu-
«Cível — Embargos infringen- cional em causa, e os ora agravantes, de
tes — Guarda de menores — Ale-
outro, nada fizeram para suprir-lhe
gação de abandono e convivência eventual omissão, mediante embargos
perigosa por negligência e conduta de declaração.
irrecomendável dos pais — Guar- 6. Aliás, não é ocioso assinalar que
da pretendida pela avó em defesa o E. Tribunal a quo, para decidir a cau-
do desenvolvimento, segurança fí- sa, inspirando-se unicamente no Estatu-
sica e equilíbrio emocional dos in- to da Criança e do Adolescente, teve que
R.T.J. — 158 275

proceder a aprofundado exame de fatos de Declaração, o qual se acha nos Autos,


e provas, o que igualmente inviabiliza o uma vez que a questão sempre enfocada
processamento do RE, nos exatos ter- diz respeito ao direito/dever que tem os
mos da Súmula 279-STF. pais de cuidar dos próprios filhos, situa-
7. Pelo exposto, somos pelo impro- ção essa abrigada na Constituição Fede-
vimento do agravo.» ral em vigor.
2. Adotando a exposição, a funda- Apresentado nessa Suprema Corte
mentação e a conclusão do parecer do de Justiça o Agravo de Instrumento foi
Ministério Público federal e valendo- o mesmo encaminhado para o órgão do
me do disposto no § 1° do art. 21 do Ministério Público que, em parecer da
RISTF e no art. 38 da Lei n° 8.038 de lavra de S. Exa., o Dr. Paulo de Tarso
28-5-1990, nego seguimento ao agravo. Braz Lucas, culminou por opinar pela
improcedência, o que foi acatado por V.
Publique-se. Intimem-se. Exa.
Brasília, 16 de março de 1994. Para chegar a essa decisão, V. Exa.
Ministro Sydney Sanches, Relator.» em seu despacho diz:
3. Inconformado, o recorrente interpôs «Ora, além do despacho digo,
agravo regimental, alegando e pleiteando o além do fundamento adotado no des-
seguinte (fls. 274/276): pacho se mostrar válido, pois o dis-
positivo constitucional que se aponta
«Dos Fatos como vulnerado não possui, de fato,
a ratio pretendida, a verdade é que a
Os ora Agravantes tiveram contra si, pretensão recursal dos agravantes en-
ajuizada na Vara da Infância e da Juven- contra obstáculo intransponível nos
tude, da Comarca de Porto Velho, no enunciados das Súmulas 282 e 356
Estado de Rondônia, por iniciativa da desse pretório excelso.
Agravada, a senhor Borla Bianca Ferdi-
nanda Vincenza Brasilina, Ação de É indiscutível, e isso até uma rá-
Guarda, pertinente aos filhos dos ora pida leitura pode confirmar, que o
Agravantes, os menores Mário Fernan- acórdão recorrido, de um lado, não
do Gadelha Braga e Marco Aurélio Ga- tratou da questão constitucional em
delha Gonçalves Braga. causa, e os ora Agravantes, de outro,
nada fizeram para suprir-lhe a even-
Derrotada, sucessivamente, na pri- tual omissão, mediante Embargos de
meira instância e, em grau de apelação, Declaração.
a ora Agravada obteve vitória em Em-
bargos Infringentes, razão pela qual, os Aliás, não é ocioso assinalar que
ora agravantes interpuzeram o compe- o egrégio Tribunal a quo, para deci-
tente Recurso Extraordinário, visto que dir a causa, inspirando-se unicamen-
o acórdão do Egrégio Tribunal de Justi- te no Estatuto da Criança e do Ado-
ça do Estado de Rondônia infringiu dis- lescente, teve que proceder a apro-
positivo constitucional. fundado exame de fatos e provas, o
que igualmente inviabiliza o proces-
Inadmitido o Recurso Extraordiná-
samento do RE, nos exatos termos da
rio, foi apresentado hl tempore, o com-
Súmula 279, do STF.»
petente Agravo de Instrumento, não sem
antes haver sido apresentado o Embargo Senhor Ministro:
276 R.T.J. —158

O despacho de V. Exa., que se las- pais e filhos a autoridade de um es-


treia no parecer do Ilustre membro do tranho, senão quando razões podero-
Ministério Público, destaca, como im- sas aconselharem essa medida...»
pecilhos à pretensão dos ora Agravantes Como já se disse, o dever constitu-
o seguinte: cional dos pais, relativamente à pessoa
O dispositivo invocado — artigo 229 dos filhos, tem a ver com o Pátrio Poder
da Constituição Federal, não possui a e não tem outro entendimento, senão o
ratio pretendida. esposado pelos ora Agravantes.
Ora, esse entendimento não é ver- Dos Enunciados Sumulares
dadeiro pois, não apenas está clara- V. Exa. aponta outros óbices à pre-
mente expresso na Constituição Fe- tensão dos ora Agravantes, como por
deral, como, também, é o entendi- exemplo, os enunciados das Súmulas
mento de juristas da maior nomeada, 282 e 356, ambas dessa Egrégia Corte
pois é poder/dever inerente ao pátrio de Justiça, cujos textos são os seguintes:
poder que deve exercer o pai e a mãe,
sobre a pessoa dos filhos. «É inadmissível o recurso ex-
traordinário, quando não ventilada,
É por essa razão que, De Plácido e na decisão recorrida, a questão fede-
Silva nos ensina: ral»
«O dever jurídico, dependa ou não «O ponto omisso da decisão, so-
da vontade Humana, estabelece sem- bre o qual não foram opostos Embar-
pre um vinculam juris, de que se gos Declaratórios, não pode ser obje-
gera a necessidade jurídica de ser to de recurso extraordinário por faltar
cumprido aquilo a que se é obrigado» o requisito do prequestionamento»
(Vocabulário Jurídico, volume II,
pág. 523) Senhor Ministro:
O Código Civil Brasileiro, de há As Súmulas mencionadas não se
muito trata da questão, nos seguintes aplicam ao presente caso, uma vez que
termos: os ora Agravantes satisfizeram as exi-
gências referenciadas, quer colocando,
«Os filhos legítimos, os legitimados,
desde o princípio a questão constitucio-
os legalmente reconhecidos e os adoti-
nal, quer apresentando os Embargos de
vos estão sujeitos ao pátrio poder, en- Declaração, que foram rechaçados pelo
quanto menores» Tribunal de Justiça do Estado de Ron-
É, o insigne Clovis Bevilaqua, diz: dônia, de maneira esdrúxula.
«O pátrio poder não é, no sistema Não se trata de reexame de provas, o
do Código, um instituto privativo da que já foi feito, à exaustão, quer em
família legítima. primeira instância, quer em grau de ape-
É a organização da Autoridade lação, não sendo o caso, portanto, de
protetora dos pais, durante a menori- aplicar-se a Súmula 279, como referido
dade dos filhos. no despacho de V. Exa.
Todos os filhos necessitam da vi- Expostas essas razões, os Agravantes
gilância carinhosa dos pais, e a socie- requerem.
dade, no interesse de sua própria con- Reconsidere, V. Exa, o despacho
solidação, não deve interpor entre exarado, para admitir o Recurso Ex-
R.T.J. — 158 277

traordinário ou, assim não entendendo, do julgamento. E indefiro tais pedidos, em


submeta-o ao julgamento do plenário, face do disposto nos artigos 83, III, e 131,
conforme estabelece o parágrafo segun- § 2°, do RISTF.
do do artigo 317, do Regimento Interno 2. É este o inteiro teor do parecer do
dessa Corte de Justiça. ilustre Subprocurador-Geral da República
Nestes Termos, Dr. Paulo de Tarso Braz Lucas, pelo im-
Pede Deferimento; provimento do agravo regimental (fls.
317/319):
Nestes Termos,
«1. Mário Fernando Emanuel Bor-
Pede Deferimento.
la Gonçalves Braga e cônjuge interpu-
Porto Velho p/Brasflia, 31-3-1994. seram o agravo regimental de fls.
as.) Dr. Francisco das Chagas Ara- 274/276 em face do r. despacho de fls.
gão.» 271/272, pelo qual o Exmo. Sr. Min.
Sydney Sanches, adotando a exposição,
O agravo veio instruído com os do- a fundamentação e a conclusão do pare-
cumentos de fls. 277/279.
cer desta Procuradoria-Geral da Re-
Novas petições, com documentos, pública (n° 1773-BL/94), negou segui-
foram apresentados, depois, pelo agravante mento ao agravo de instrumento que
(fls. 281/296, 302/306, 310 e 313), razão eles haviam formalizado com o objetivo
pela qual, ad cautelam, determinei mani- de obter o processamento de seu recurso
festação do Ministério Público federal so- extraordinário.
bre o agravo regimental (fl. 315), que assim
Impugnando os fundamentos do
se resumiu na ementa de fls. 317:
parecer, adotados pelo despacho agra-
«Ementa: Agravo regimental — vado, os agravantes insistem na alega-
AI — RE — Direito civil — Guarda ção de contrariedade ao art. 229 da Carta
de menores — Litígio entre respecti- Magna em vigor, aduzindo que o dever
vos pais e avó paterna — Estatuto da constitucional dos pais, relativamente à
Criança e do Adolescente —Alegação pessoa.
de contrariedade ao art. 229 da Carta
Magna em vigor — Falta de preques- Quanto à aplicação das Súmulas
tionamento — Causa cujo desfecho 279, 282 e 356, alegaram o seguinte:
exigiu exame aprofundado de provas «As Súmulas mencionadas não se
— Juntada tardia de peças essenciais aplicam ao presente caso, uma vez
à formação do instrumento — Inci- que os ora Agravantes satisfizeram
dência das Súmulas 279, 282, 288 e as exigências referenciadas, quer co-
356 — Parecer pelo improvimento do locando, desde o princípio a questão
agravo.» constitucional, quer apresentando os
É o relatório. Embargos de Declaração, que foram
rechaçados pelo Tribunal de Justiça
VOTO do Estado de Rondônia, de maneira
esdrúxula.
O Sr. Ministro Sydney Sanches (Rela-
tor): 1. Submeto à consideração da Turma Não se trata de reexame de pro-
o requerimento de que seja permitida ao vas, o que já foi feito, à exaustão,
agravante a sustentação oral e de que seja, quer em primeira instância, quer em
para tal fim, intimado da data da realização grau de apelação, não sendo o caso,
278 R.T.J. — 158

portanto, de aplicar-se a Súmula 279, conhecimento dos termos do primei-


como referido no despacho de V. ro para julgar a admissibilidade do
Exa.» recurso extraordinário: se, in con-
Em que pese os esforços dos agra- creto, o que se julgou nos embargos
vantes, o presente agravo regimental de declaração é relevante ou não, é
deve ser improvido, mantendo-se o des- juízo que compete ao tribunal, não,
pacho impugnado em todos os seus ter- data venia, à agravante.»
mos. Em primeiro lugar, deve ser ressal- Por outro lado, quanto à incidên-
tado que as peças de fls. 258 e 259/264, cia da Súmula 279-STF, basta conside-
indicativas da oposição dos embargos rar, para fulminar as objeções dos agra-
de declaração e do seu indeferimento, só vantes a respeito, que o aresto objeto do
foram juntadas aos autos quando estes recurso extraordinário decidiu contra-
já se encontravam nesse Pretório Excel- riamente à sua pretensão tendo em vista
so, não se prestando, portanto, para o a «omissão dos pais, a quem se atribui
fim de afastar a incidência das Súmulas comportamento comprometedor à dig-
282 e 356. No particular, passa a ser nidade, desenvolvimento psicológico,
aplicável a Súmula 288, com o seguinte segurança física e equilíbrio emocional
enunciado: dos menores» (v. peça de fl. 237), con-
«Nega-se provimento a agravo clusão que só pode ser infirmada por
para subida de recurso extraordiná- esse Colendo Tribunal mediante reexa-
rio, quando faltar no traslado o des- me de provas, o que é sabidamente in-
pacho agravado, a decisão recorrida, viável em sede de recurso extraordi-
a petição de recurso extraordinário nário.
ou qualquer peça essencial à com-
preensão da controvérsia.» Por último, a falta de razoabilida-
de da alegação de contrariedade ao art.
E não há como contornar o obstá- 229 da Carta Magna em vigor se revela
culo resultante desta Súmula, pois este facilmente pela leitura da seguinte pas-
Colendo Tribunal tem entendimento fir- sagem do despacho do ilustre Presidente
me no sentido de que compete ao agra- do E Tribunal a quo (fl. 217):
vante o dever de vigilância na formação
do instrumento do agravo, não suprin-
do a sua omissão a juntada ulterior, já «O recorrente não demonstrou de
no Supremo, de peça que seja essencial que forma o acórdão local dissentiu
a esse fim (RTJ 115/739, 132/1.345, da Constituição, o que essa estabele-
131/1.403 e STF-RT 514/270 e 667/214). ce é que os pais têm o dever e obri-
E convém ainda ter em mente a decisão gação de cuidar de seus filhos, isto,
prolatada no aresto publicado na STF- entretanto, não quer dizer que quan-
RT 667/255, onde se proclamou o se- do os pais não têm as qualidades
guinte: necessárias para cumprir suas obri-
«Opostos embargos declaratórios gações, não possa o poder competen-
sobre o tema reagitado no recurso te, observada a legislação infracons-
extraordinário, o acórdão que os titucional, retirar-lhes a guarda dan-
apreciou, embora para rejeitá-los, se do a ascendente em melhores condi-
integra à fundamentação da decisão ções de assistir, criar e educar as
recorrida, sendo essencial, pois, o crianças.»
R.T.J. — 158 279

8. Pelo exposto, opinamos pelo im- cuidar dos seus filhos, entretanto, não
provimento do presente agravo regi- quer dizer que quando os pais não têm
mental.» as qualidades necessárias para cumprir
Adoto os fundamentos da decisão suas obrigações, não possa o poder com-
agravada (fls. 271/272) e desse parecer do petente, observada a legislação infra-
Ministério Público federal (317/319), para constitucional, retirar-lhes a guarda,
negar provimento ao agravo regimental. dando a ascendente em melhores con-
dições de assistir, criar e educar as
Apenas acrescento que os agravantes crianças.»
também não comprovaram o teor de sua
apelação e dos embargos infringentes, de Por fim, o que fez o acórdão recorri-
modo a permitir que se saiba se o tema do foi interpretar legislação infraconstitu-
constitucional do art. 229 (da Constituição cional (principalmente o Estatuto da Crian-
Federal) havia sido abordado em qualquer ça e do Adolescente).
desses recursos. Ou seja, de modo a se E não admite pacífica jurisprudência
poder verificar se havia omissão, mesmo, desta Corte a alegação de ofensa indireta à
dos acórdãos que os julgaram, pois se a Constituição Federal, por má interpretação
omissão foi da própria parte, ao não venti- de legislação infraconstitucional.
lar a questão, então nem os embargos de-
Por todas essas razões e pelo mais
claratórios se prestariam a sua reparação
que ficou dito na decisão ora agravada e no
(Súmula 288).
parecer do Ministério Público federal, nego
E, mesmo tendo apresentado embar- provimento ao agravo regimental.
gos declaratórios, cujo teor somente veio
para os presentes autos, quando se encon- EXTRATO DA ATA
travam nesta instância, já com parecer da Ag 158.180 (AgRg) —RO —Rel.: Min.
Procuradoria Geral da República (fls. Sydney Sanches. Agtes.: Mário Fernando
260/264) e, além disso, tardiamente susci- Emanoel Borla Gonçalves Braga e cônjuge
tando questões constitucionais (artigos (Adv.: Francisco das Chagas Aragão). Agda.:
226, § 4°, e 229 da Constituição Federal), Borla Bianca Ferdinanda Vincen7a Brasili-
acabaram se conformando com o não se- na (Advs.: Pedro Soares Vieira e outro).
guimento dos embargos, por decisão do Decisão: Preliminarmente, a Turma in-
relator (fls. 258 e 284), de sorte que tam- deferiu o requerimento do recorrente no
bém não há acórdão sobre eles. sentido de ser intimado do julgamento do
Não se trata, pois, de decisão de última agravo e de ser assegurado, nele, a susten-
instância, contra a qual, sim, se admite re- tação oral. No mérito, negou provimento ao
curso extraordinário para esta Corte (art. agravo. Unânime.
102, BI, da Constituição Federal). Presidência do Senhor Ministro Moreira
De resto, como salientou a decisão Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
presidencial, que indeferiu o processamen- nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
to do RE (fl. 217): ce, Celso de Mello e Limar Gaivão. Subpro-
«O recorrente não demonstrou de curador-Geral da República, Dr. Miguel
que forma o acórdão local dissentiu da Frauzino Pereira.
Constituição. O que esta estabelece é Brasília, 3 de março de 1995 —Ricardo
que os pais têm o dever e obrigação de Dias Duarte, Secretário.
280 R.T.J. — 158

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 159.230 — PB


(Tribunal Pleno)

Relator: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence


Recorrente: Ministério Público Federal —Recorrido: Ronaldo José da Cunha
Lima
Governador de Estado: processo por crime comum: competên-
cia originária do Superior Tribunal de Justiça que não implica a inconsti-
tucionalidade da exigência pela Constituição Estadual da autorização
prévia da Assembléia Legislativa.
I — A transferência para o STJ da competência originária
para o processo por crime comum contra os Governadores, ao invés de
elidi-la, reforça a constitucionalidade da exigência da autorização da
Assembléia Legislativa para a sua instauração: se, no modelo federal, a
exigência da autorização da Câmara dos Deputados para o processo
contra o Presidente da República finca raízes no princípio da indepen-
dência dos poderes centrais, à mesma inspiração se soma o dogma da
autonomia do Estado-membro perante a União, quando se cuida de
confiar a própria subsistência do mandato do Governador do primeiro
a um órgão judiciário federal.
lI — A necessidade da autorização prévia da Assembléia
Legislativa não traz o risco, quando negadas, de propiciar a impunidade
dos delitos dos Governadores: a denegação traduz simples obstáculo
temporário ao curso de ação penal, que implica, enquanto durar, a
suspensão do fluxo do prazo prescricional.

ACÓRDÃO vernador do Estado da Paraíba, o relator,


em. Ministro José Dantas, proferiu o se-
Vistos, relatados e discutidos est' au- guinte despacho (v. 2/fl. 35):
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
«Não obstante a dúvida da constitu-
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con-
cionalidade do dispositivo, levantada
formidade da ata do julgamento e das notas
pelos querelantes sobre o art. 88 da
taquigráficas, por unanimidade de votos,
Constituição do Estado da Paraíba,
em conhecer do recurso, mas negar-lhe cumpra-se a norma, solicitando-se da
provimento. Assembléia Legislativa daquele Estado
Brasília, 28 de março de 1994 — Octa- a devida autorização para a instauração
vio Gallotti, Presidente — Sepúlveda Per- da ação penal privada de que se trata —
tence, Relator. CE, art. 54, I, c.c. o art. 88, a.

RELATÓRIO É que, sobre o tema, predomina neste


Eg. Tribunal a orientação da normalida-
O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: de constitucional de semelhante regra
Em ação penal privada proposta no STJ das Constituições dos Estados (e.g., A.
contra Ronaldo José da Cunha Lima, Go- Reg. na A. Penal 27-BA).»
R.T.J. — 158 281

O Ministério Público interpôs agravo Estado, a Constituição Federal não repe-


regimental (v. 2/fl. 43), ao qual negou pro- te tal sistema, pois defere competência
vimento o Orgão Especial, firmando-se o plena ao Superior Tribunal de Justiça,
voto condutor do Sr. Ministro Dantas em sem sujeição a nenhuma condição de
precedentes daquela Corte, assim ementa- procedibilidade ou juízo político prévio
dos (v. 2/fl. 57): (art. 105, 1)», argumenta a interposição da
oAção Penal Contra Governador de lavra da il. Subprocuradora-Geral da Repú-
Estado. blica Thaís Graeff (fls. 91, 92):
«Certo que, a partir de um critério de
simetria, os Estados-membros podem
Admissibilidade da acusação. Guar- copiar princípios previstos para o mode-
dada pela Constituição Estadual plena lo federal.
simetria com o correspondente disposi-
tivo da Constituição Federal, é de cum- Contudo, o pressuposto básico da
prir-se a norma local que incumbe à adoção do modelo federal, a simetria,
Assembléia Legislativa a prévia admis- não está presente in casu.
são da acusação intentada contra o Go- É que a repartição do juízo da acusa-
vernador do Estado. ção contra o Presidente da República,
Ação Penal no 4-SP, Rel. Min. nos crimes comuns, em juízo político e
José Dantas, Corte Especial, 12-10-89. juízo técnico, tem por finalidade preser-
var o princípio da independência e har-
Governador. Processo Criminal. monia entre poderes (CF, art. 2°).
Lícito estabeleçam as Constituições Ora, no caso dos Governadores, essa
Estaduais que o processo contra gover- necessidade de assegurar o equilíbrio
nador condicione-se a que a acusação entre os Poderes não está presente. A
seja previamente admitida pela assem- Constituição de 1988 retirou o processo
bléia legislativa. e julgamento dos crimes comuns impu-
Constituição Federal, artigos 25 e tados ao chefe do Executivo estadual da
51, I. órbita do Judiciário local. Com isso, fez
desaparecer qualquer argumento em fa-
Constituição do Estado da Bahia, art. vor da simetria com o modelo federal,
107 — Argüição de inconstitucionalida- pois não está em jogo qualquer pertur-
de rejeitada — Ação Penal 27-BA
bação à independência e harmonia entre
(Agravo Regimental), Rel. Min. Eduar-
os Poderes do Estado-membro, uma vez
do Ribeiro, Corte Especial, 13-2-92». que estranha a eles a atuação do Supe-
Ficou vencido o d. Ministro Vicente rior Tribunal de Justiça.
Cernicchiaro. Em resumo, o judicium acusationis
Donde, o RE, a e c, do Ministério Públi- criado pelos artigos 54, I, e 88 da Cons-
co Federal, que, depois de notar que — ao tituição do Estado da Paraíba, sujeitan-
contrário do que sucede com relação ao do a atuação do Superior Tribunal de
processo por crime comum contra o Presi- Justiça à prévia licença da Assembléia
dente da República, cuja instauração se su- Legislativa, não encontra respaldo na
jeitou ao juízo de admissibilidade da acu- Constituição Federal: o sistema dos ar-
sação pela Câmara dos Deputados (CF, art. tigos 51, I e 86 é exclusivo do processo
86 e 51, I) — (para a hipótese dos crimes contra o Presidente da República, e o
comuns cometidos pelo Governador do artigo 25 não dá margem à sua recepção
282 R.T.J. — 158

pelas cartas estaduais, pois inexistente a mento ou, se conhecido, pelo não provi-
necessária simetria. mento do recurso.
Diversa é a conclusão com relação É o relatório.
aos crimes de responsabilidade, onde, aí
sim, o juízo da acusação e o juízo da VOTO
causa estão afetados à Assembléia Le-
gislativa. O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence
No caso concreto, porém, trata-se de (Relator): Dispõe o art. 54, 1, da Constitui-
ação penal por crime comum, em curso ção da Paraíba competir à Assembléia Le-
no Superior Tribunal de Justiça. gislativa «autorizar, por maioria absoluta,
a instauração de processo contra o Gover-
A respeito vale transcrever o seguin- nador, o Vice-Governador e os Secretários
te trecho do parecer do ilustre Subpro- de Estado».
curador-Geral da República Cláudio
Lemos Fonteles: Por sua vez, prescreve o seu art. 88, a,
que, «admitida a acusação contra o Gover-
«Condição de procedibilidade nador do Estado, por maioria absoluta da
não é princípio, mormente porque o Assembléia Legislativa, ressalvada a com-
constituinte de 1988 erigiu expressa- petência do Superior Tribunal Militar, nos
mente o Superior Tribunal de Justiça casos que configurem crime militar, será
como juízo natural dos Governado- ele submetido a julgamento (...) nas infra-
res Estaduais, sem limitações proce- ções penais comuns, perante o Superior
dimentais, de sorte que condicionar, Tribunal de Justiça».
por norma da Constituição Estadual, Ao propor a ADIn 978 contra os §§ 3° e
que tal só se desenvolva após positi- 4° desse art. 88 da mesma Constituição
va deliberação da Assembléia Legis- paraibana, o em. Procurador-Geral da Re-
lativa Estadual é chancelar no Esta- pública — na passagem em que agora se
do-membro a iniciativa em norma de apóia o parecer —, para justificar porque
conteúdo processual, até extrapolan- excluía de argüição o referido art. 88, a,
do os limites do restrito interesse es- valeu-se de passagem do voto que proferi
tadual». na A. Pen 303 (QO), na qual aduzi (RTJ
144/361, 371):
Cita, na mesma linha, voto vencido, em
caso anterior, do em. Ministro Nilson Na- «De minha parte, aceito a premissa
ves e conclui 4ue a decisão recorrida, além da necessidade de autorização (no que
de julgar válidos os arts. 54, 1, e 86, da creio dissentir do em. Ministro Celso de
Constituição da Paraíba, «que conflitam Mello, que, em aparte ao Ministro Mo-
frontalmente com o art. 105, I, da Cons- reira Alves, invocou a opinião de José
tituição», violou ainda os arts. 25, 51, I e Afonso da Silva (Curso Dir. Constitu-
86, da mesma Lei Fundamental. cional Positivo, 5' ed., 1989, pág. 530),
para quem não mais parece possível, nos
Admitido (v. 3/fl. 97), o RE subiu, sem crimes comuns, «definir na Constitui-
contra-razões. ção estadual que a admissibilidade do
Aqui, o parecer do il. Subprocurador- processo depende da autorização da As-
Geral Haroldo da Nóbrega — na trilha de sembléia Legislativa, visto como não é
considerações do em. Procurador-Geral, ao mais um órgão judiciário estadual — o
propor a ADIn 978 — é pelo não conheci- Tribunal de Justiça, como antes — que
R.T.J. — 158 283

detém a competência para o processo e Posteriormente, o Tribunal enfrentou


julgamento desses crimes»). diretamente a questão — RE 153.968,
O raciocínio do autorizado professor 6-10-93, Gaivão —, e a decidiu no mesmo
sentido.
paulista desvela sua fidelidade, mutatis
mutandis, às inspirações da Súmula 3, Esse continua sendo o meu entendimen-
segundo a qual «a imunidade concedida to, não obstante a inteligência com que a
aos deputados estaduais é restrita à Jus- tese contrária vem sustentada neste re-
tiça dos Estados: no longo voto que pro- curso.
feri, em 11-12-91, no Inq. 316, depois No sistema constitucional, o juízo de
de recordar todo o histórico daquele as- admissibilidade da acusação, nos proces-
sento de nossa jurisprudência, busquei sos por crime comum contra o Presidente
demonstrar que, com relação aos parla- da República, guarda, mutatis mutandis,
mentares estaduais, ficou ele superado posição similar ao do instituto da licença
com o art. 27, § 1°, da Constituição. prévia das Casas do Congresso Nacional,
Creio que, embora sem norma ex- para a instauração do processo contra os
pressa, raciocínio similar conduz a deri- seus membros.
var da própria Constituição Federal a No longo voto-vista que proferi no refe-
necessidade de autorização da Assem- rido Inq. 316, mostrei como, nos regimes
bléia Legislativa para, no curso do seu constitucionais precedentes — que silen-
mandato, instaurar ou dar seqüência a ciavam a respeito —, vacilou, sempre divi-
processo contra Governador de Estado dido, o Supremo Tribunal entre os que,
por crimes comuns, não obstante caiba como Hahnemann, postulavam a extensão
a competência a um Tribunal da União. de jure aos Deputados Estaduais das imu-
nidades explicitamente outorgadas aos
Pelo contrário, essa circunstância — membros do Congresso Nacional e aque-
por suas óbvias implicações com a au- les, vitoriosos nas últimas décadas, que fa-
tonomia do Estado-membro —, parece ziam depender a extensão da imitação ex-
reforçar as razões determinantes da su- pressa pelas Constituições locais do mode-
bordinação do processo a juízo político lo federal.
do órgão de representação popular da
unidade federada. Do predomínio da última corrente —
mostrei naquela oportunidade —, derivara
Se, no modelo federal, a exigência da a doutrina da Súmula 3, segundo a qual,
autorização da Câmara dos Deputados porque criadas por norma estadual autôno-
finca raízes no princípio da independên- ma, as imunidades asseguradas aos inte-
cia dos poderes centrais, à mesma inspi- grantes das Assembléias Legislativas eram
ração se soma o dogma da autonomia do imponíveis à Justiça da União.
Estado-membro perante a União, quan- No mesmo caso, reputei superada a Sú-
do se cuida de confiar a própria subsis- mula 3, pelo advento da norma expressa do
tência do mandato do Governador do art. 27, § 2°, da vigente Constituição da
primeiro a um órgão judiciário federal. República, que, ela própria, fez aplicáveis
Convenci-me, assim, do acerto do aos Deputados Estaduais o modelo federal
entendimento firmado a propósito pelo sobre inviolabilidade e imunidades.
Superior Tribunal de Justiça (cf. Rev. Certo, com relação aos Governadores,
STJ 6/17, RT 654/341).» manteve-se em silêncio a Lei Fundamental
284 R.T.J. — 158

de 1988, o que permitiria sustentar que, a É particularmente expressiva dessa


exemplo da hipótese normativa da Súmula orientação a primeira das decisões referidas
3, a exigência do juízo prévio da Assem- — HC 41.296, caso Mauro Borges —, no
bléia Legislativa, — decorrente de norma qual o Tribunal deixou expresso o condi-
local — que fora constitucional, sob os cionamento do processo contra o Governa-
textos fundamentais anteriores, quando o dor do Estado ao juízo de autorização da
seu julgamento por crimes comuns cabia Assembléia Legislativa, ainda quando o
ordinariamente ao Tribunal de Justiça do seu julgamento devesse tocar à Justiça Mi-
Estado —, se fizera incompatível, na Cons- litar da União.
tituição Federal em vigor, com a transfe-
rência da mesma competência penal origi- De minha parte — na linha do voto, já
nária ao Superior Tribunal de Justiça, órgão recordado, na A. Pen 303 — insisto em que
judiciário da União. Essa, a tese do recurso a circunstância de se ter deslocado para o
extraordinário. STJ a competência originária para o pro-
cesso dos Governadores por crimes co-
Dela, porém, não me logrei convencer. muns, antes de enfraquecer, fortalece a ex-
plicação sistemática de sua submissão à
De início, porque — não obstante a pre- autorização da Assembléia Legislativa,
valência desde 1926, a respeito das imuni- pois, para tanto, à que decorre, no plano
dades dos Deputados Estaduais, do enten- horizontal, da independência dos Poderes,
dimento contrário —, a mim pessoalmente soma-se, no plano vertical, o princípio da
sempre me pareceu melhor a tese que, vin- autonomia dos Estados-membros.
culando as garantias do parlamentar ao
princípio basilar da independência dos Po- A propósito é de enfatizar, quando se
deres, dispensava a reprodução, nas Cons- cuida do Governador — e ao contrário do
tituições locais, do modelo federal: repor- que sucede com os Deputados Estaduais
to-me, a propósito, ao mitológico voto ven- —, que a simples instauração do processo
cido, no HC 57.173, 24-10-79, Guerra, do implica a suspensão do exercício do man-
em. e saudoso Ministro Leitão de Abreu dato do Chefe do Executivo: a conseqüên-
(RTJ 95/96, 104). cia drástica faz ociosa a demonstração do
quanto poderia afetar a autonomia do Esta-
Certo, a doutrina extensiva — vitoriosa do-membro a dispensa, para o recebimento
nos primeiros tempos da República — com da denúncia ou da queixa, do juízo da ad-
relação aos Deputados Estaduais, desde missibilidade da casa de representação po-
1926, ficou vencida no Tribunal (cf. meu pular estadual.
voto no Inq. 316).
Finalmente, parece claro, o entendimen-
Curiosamente, no entanto, no que diz to da decisão recorrida não implica a impu-
com o processo contra os Governadores, o nidade dos delitos atribuídos aos Governa-
que sempre dominou na jurisprudência da dores, quando negada pela Assembléia Le-
Corte foi que o modelo federal se impunha gislativa competente, a autorização para o
compulsoriamente aos Estados: mostrou-o, processo: a denegação da licença traduz
no STJ, o primoroso voto condutor do Mi- simples obstáculo temporário ao curso da
nistro José Dantas na A. Pen. 4, referindo ação penal e implica suspensão do fluxo do
diversos precedentes (v.g., STF, HC prazo prescricional.
41.296, Gonçalves, RF 209/270, RTJ
33/590; Rep. 749, RTJ 50/378; Rep. 755, Em conclusão, conheço do RE pela letra
RTJ 52/501; Rep. 759, RTJ 63/583). c, mas, julgando constitucionais as normas
R.T.J. — 158 285

locais questionadas, lhe nego provimento: EXTRATO DA ATA


é o meu voto. RE 159.230 —PB —Rel.: Min. Sepúl-
veda Pertence. Recte.: Ministério Público
VOTO Federal. Recdo.: Ronaldo José da Cunha
Lima
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Sr. Pre- Decisão: Por votação unânime, o Tribu-
sidente, reporto-me ao voto que proferi no nal conheceu do recurso, mas lhe negou
RE 153.968 da Bahia, de que foi Relator o provimento. Votou o Presidente. Ausente,
Sr. Ministro Ilmar Galvão. ocasionalmente, o Ministro Celso de
Na verdade, é legítimo o entendimento Mello.
no sentido de que, observada a simetria, o Presidência do Senhor Ministro Octavio
processo contra o governador deve ser pre- Gallotti. Presentes à Sessão os Senhores
cedido de prévia licença da Assembléia Ministros Moreira Alves, Néri da Silveira,
Legislativa. Todavia, não concedida a li- Sydney Sanches, Paulo Brossard, Sepúlve-
cença, ou enquanto a Assembléia não se da Pertence, Celso de Mello, Carlos Vello-
manifesta, fica suspensa a prescrição. so, Marco Aurélio, limar Galvão e Francis-
Com estas breves considerações, acom- co Rezek. Procurador-Geral da República,
panho o voto do Sr. Ministro Relator, co- Dr. Aristides Junqueira Alvarenga.
nhecendo do recurso, mas negando-lhe Brasília, 28 de março de 1994 — Luiz
provimento. Tomimatsu, Secretário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 159.755 (AgRg) — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio


Agravante: Braswey S/A Indústria e Comércio — Agravado: Aluisio Rodri-
gues Casusão
Recurso — Representação processual. A parte deve atinar
para a necessidade de atendimento ao pressuposto objetivo de recorribi-
lidade que é a regular representação processual, trazendo aos autos
instrumentos de mandato com a firma do subscritor devidamente reco-
nhecida. A certidão do notário portando por fé a harmonia entre a
assinatura lançada e a constante dos registros do cartório consubstancia
formalidade essencial, a teor do disposto nos artigos 1.289, § 3°, do
Código Civil e 38 do Código de Processo Civil. Tratando-se de formação
de instrumento, cumpre à parte não só proceder à indicação das peças
que devam ser trasladadas como também fiscalizar a atuação da secre-
taria — Verbete n° 288 da Súmula da jurisprudência predominante do
Supremo Tribunal Federal. Uma vez negado conhecimento ao agravo
interposto, a interessada, ao protocolizar o regimental, deve fazê-lo
sanando o defeito, sob pena de ficar inviabilizado, também, o conheci-
mento deste último.
286 R.T.J. — 158

ACÓRDÃO 5 de abril de 1994 — terça-feira (folha 38)


Vistos, relatados e discutidos estes au- — deu-se a apresentação deste regimental
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- no dia 11 imediato — segunda-feira (fo-
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- lha 39).
formidade da ata do julgamento e das notas No mais, reitero o que tive oportunidade
taquigráficas, por unanimidade de votos, de consignar quando declarei a inexistência
em negar provimento ao agravo regi- do ato praticado, ressalvando, mais uma
mental. vez, a convicção pessoal que coincide com o
Brasília, 8 de setembro de 1994 — Car- que sustentado nas razões deste regimental:
ias Velloso, Presidente —Marco Aurélio, A responsabilidade na formação do
Relator. instrumento é da parte agravante. Assim
RELATÓRIO revela a jurisprudência predominante
desta Corte — Verbete de n° 288 da
Ó Sr. Ministro Marco Aurélio: Ao Súmula, confirmada pelo Pleno em pro-
enfrentar o agravo de instrumento de inte- posta de revisão quando fiquei vencido
resse da Agravante, consignei a irregulari- na companhia dos Ministros filmar Gai-
dade da representação processual, aduzin- vão, Carlos Velloso e Sepúlveda Perten-
do que esta Corte vinha de reafirmar a ce, isto quanto às peças obrigatórias e
jurisprudência sedimentada no verbete n° aquelas indicadas pela Agravante. Por
288 que integra a Súmula. Com as razões outro lado, «sem instrumento de man-
de folhas 40 a 45, lançadas com inegável dato, o advogado não será admitido a
esmero, aponta-se que, na espécie, o cre- procurar em juízo» (primeira parte do
denciamento fez-se formalizado nos autos caput do artigo 37 do Código de Pro-
principais desde 11 de maio de 1992 e que cesso Civil). A Agravante não se faz
ocorreu a indicação da peça que o estaria a representada por causídico devidamente
revelar, pagando a Agravante as despesas constituído. O subscritor do agravo —
referentes ao traslado. Discorre-se sobre a Dr. Renato Tadeu Rondina Mandalai —
matéria, mencionando-se a melhor doutri- não possui, nos autos, os indispensáveis
na — José Carlos Barbosa Moreira, Sérgio poderes, já que o respectivo nome não
Sahione Fadei e Pontes de Miranda. está dentre os constantes do mandato
de folha 9, não tendo sido trasladado
Recebi os presentes autos para exame substabelecimento.
em 20 de abril de 1994, liberando-os para
apreciação do regimental em 27 imediato Nem se diga pertinente o disposto na
(folha 56). segunda parte do aludido preceito legal.
Há de se ter em conta que a interposição
É o relatório. do recurso não é passível de enquadra-
VOTO mento entre os atos reputados urgentes.
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Rela- É que concorre, sempre, a possibilidade
tor): Na interposição deste agravo foram de o provimento judicial ser contrário
observados os pressupostos de recorribili- aos interesses sustentados no processo,
dade que lhe são próprios. O documento de cabendo à parte precatar-se.
folha 9 habilita o primeiro subscritor da Ressalto que a apreciação dos pressu-
peça a procurar em nome da Agravante. postos de recorribilidade alusivos ao recur-
Quanto à oportunidade, verifica-se que, pu- so ocorre consideradas as peças existentes
blicada a decisão de folha 37 no Diário de nos autos que o revelam. Assim, a circuns-
R.TJ. — 158 287

trincia de, no processo principal, ter-se a EXTRATO DA ATA


regularidade da representação não afasta o
acerto do que decidido, no que repousa no Ag 159.755 (AgRg) — SP —Rel.: Min.
verbete n° 288 que integra a Súmula. A Marco Aurélio. Agte.: Braswey S/A Indús-
jurisprudência nela consubstanciada alcan- tria e Comércio (Advs.: Renato Tadeu Ron-
ça, também, o instrumento de mandato, já dinamandalitti e outros). Agdo.: Aluisio
que, sem ele, o advogado não é admitido Rodrigues Casusão (Adv.: Manoel Carlos
em Juízo, no que tenha como alvo praticar Francisco dos Santos e outros).
ato em nome de terceiro — primeira parte
do caput do artigo 37 do Código de Pro- Decisão: Por unanimidade, a Turma ne-
gou provimento ao agravo regimental.
cesso Civil. A insuficiência assinalada diz
respeito não à compreensão, em si, do mé- Presidência do Senhor Ministro Carlos
rito da controvérsia, mas à preliminar do Velloso. Presentes à Sessão os Senhores
próprio recurso. O verbete foi empolgado Ministros Marco Aurélio e Francisco Re-
em reforço à argumentação lançada e para zek. Ausentes, justificadamente, os Senho-
demonstrar que incumbe à parte sequiosa res Ministros Paulo Brossard e Néri da
de ver o tema conduzido apreciado atentar Silveira, Presidente. Subprocurador-Geral da
para o traslado das peças indispensáveis. República, o Dr. Cláudio Lemos Fonteles.
Nego provimento a este regimental.
Brasília, 8 de setembro de 1994 —José
É o meu voto. Wilson Aragão, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 160.811 — AM


(Primeira Turma)

Relator p/ o acórdão: O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence


Recorrente: Estado do Amazonas — Recorridos: Maria Elizabete Moraes e
outros
Ato administrativo: anulação e revogação.
A administração pode anular, seus próprios atos, quando
inquinados de ilegalidade (Súmula 473): não obstante se, a pretexto de
decretar nulidade, invoca razões de mera conveniência, o que se tem, na
verdade, é revogação, que não pode desconstituir situações jurídicas,
cuja legalidade, aliás, o recurso extraordinário não questiona.
ACÓRDÃO Brasília, 1° de março de 1994 —Morei-
ra Alves, Presidente — Sepúlveda Per-
Vistos, relatados e discutidos estes au- tence, Relator p/o acórdão.
tos, acordam os Ministros da Primeira Tur-
ma do Supremo Tribunal Federal, na con- RELATÓRIO
formidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por maioria de votos, em não O Sr. Ministro limar Gaivão (Rela-
conhecer do recurso. tor): Os recorridos, Auditores Assistentes
288 R.T.J. —158

do Tribunal de Contas do Estado do Ama- tal formalidade nem sequer fora cogitada
zonas, impetraram mandado de segurança pelo julgado, que se limitara a validar mera
contra o referido Órgão por haver suspen- decisão administrativa do Tribunal de Con-
dido a aplicação do reajuste pago no mês tas. Aduziu que, na realidade, a pretensão é
de fevereiro de 1991, no percentual de de vinculação de vencimentos, vedada ex-
81%, decorrente da isonomia de vencimen- pressamente pelo art. 37, XIII, da Lei
tos concedida por decisão administrativa, Maior. Por fim, asseverou que o Supremo
que redundou na paridade de seus venci- Tribunal Federal, em ação direta de incons-
mentos com os dos auditores adjuntos, em titucionalidade, tem concedido liminar re-
10% de diferença a menor. Basearam o futando vinculação dessa espécie.
pedido no princípio da irredutibilidade de Admitidos, na origem, subiram os autos
vencimentos, estendido ao funcionalismo a esta Corte.
pelo art. 37, XV, da Constituição.
A Procuradoria-Geral da República, em
A segurança foi concedida, por maioria parecer do Subprocurador-Geral Dr.
de votos, pelo Tribunal de Justiça, em acór- Arthur de Castilho Neto, opinou pelo pro-
dão sintetizado na ementa seguinte (fl. vimento do recurso, nestes termos (fls.
230): 304/305):
o— Mandado de segurança. «A questão constitucional relativa aos
Retirada de percentual remu- ares. 39, § 1° e 37, XIII, CF, foi suscitada
nerátório concedido a servidor públi- nas informações e nos embargos de de-
co, somente pode ser efetuada depois claração, e a relativa ao due process of
de percorrido o due process of law. law, somente nos embargos, porque so-
mente surgiu com a decisão recorrida.
Segurança deferida, por maio-
ria.» Entendo, pois, que houve o indispen-
sável preqüestionamento.
Os embargos de declaração foram rejei-
tados. Auditores Assistentes do Tribunal de
Contas do Estado requereram a conces-
O Estado do Amazonas interpôs recurso são de isonomia de vencimentos com os
extraordinário, com fundamento no art. auditores assistentes do Tribunal de
102, III, a e c, da Constituição. Sustentou Contas dos Municípios, o que foi conce-
que o acórdão recorrido aplicara equivoca- dido por decisão de fl. 86.
damente os incs. LIV e LV do art. 5° da
Carta Federal, tendo em vista que a anula- Posteriormente essa decisão foi sus-
ção dos atos ilegais pela administração não pensa por outra (fls. 92/93). A motiva-
é precedida de um devido processo legal, ção dessa última, pelo que se lê, teria
com contraditório e ampla defesa, tendo sido a de falta de recursos financeiros
agido a autoridade impetrada nos limites da por parte do Estado e a intenção da Corte
Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal. de Contas em colaborar com a conten-
Em outra linha de argumentação, alegou ção de despesas.
que inexiste direito líquido e certo dos re- Creio eu que poderia fazê-lo, porque
corridos, posto que a isonomia referida no a decisão anterior era totalmente nula.
art. 39, § 1°, da Constituição Federal, que Primeiro, porque aumentou vencimen-
serviu de fundamento ao pedido, é norma tos sem lei formal exigida para tanto
de eficácia limitada, destituída de auto- (art. 61, § 1°, II, letra a, in fine, CF) e,
aplicabilidade, pois depende de lei, e que depois, porque estabeleceu equipara-
R.T.J. — 158 289

ção vedada pela CF (art. 37, XIII). E mentos dos Auditores Assistentes aos dos
poderia fazê-lo sem processo adminis- Auditores Adjuntos — vedada expressa-
trativo. mente pelo art. 37, inc. XIII, da Constitui-
Nem se diga, como se disse na deci- ção Federal e repelida veementemente pela
são recorrida, que houve ofensa ao due jurisprudência desta Casa — ou se foi ela
process of law. Tanto não houve que a concebida de forma afrontosa ao § 1° do art.
Justiça está examinando a pretensão dos 39 da Carta Federal, que prevê que «a lei
recorridos. Por outro lado, na esfera ad- assegurará... isonomia de vencimentos para
ministrativa nada impedia à Adminis- cargos de atribuições iguais ou assemelha-
tração reconhecer a imperiosa necessi- das do mesmo Poder, ou entre servidores
dade de desconstituir seu ato, indepen- dos Poderes Executivo, Legislativo e Judi-
dentemente de processo administrativo, ciário».
particularmente no caso, como o destes Aliás, o aresto atacado não abarcou tais
autos, onde ocorreu flagrante nulidade questões, limitando-se ao argumento de
(Súmula 473 —STF). que o ato de revogação questionado não
Reconhecendo, como reconheceu a fora precedido de processo legal, com con-
decisão recorrida a afronta à cláusula do traditório e ampla defesa, embora não abor-
due process of law, data venia, inter- dado na impetração, a qual se ateve, exclu-
pretou equivocamente e aplicou mal o sivamente, à tese da irredutibilidade de
art. 5°, incisos LIV e LV da CF.» vencimentos. Instado a manifestar-se sobre
as referidas questões, nos embargos de de-
É o relatório. claração, preferiu a Corte rejeitá-los ,apro-
veitando para reforçar, mais uma vez, o
VOTO
fundamento da negativa de vigência dos
O Sr. Ministro limar Gaivão (Rela- incisos LIV e LV do art. 5° da Constituição.
tor): O ato considerado abusivo ao direito No tocante à controvérsia constante dos
dos impetrantes consistiu na suspensão da autos, cumpre notar que a decisão recorri-
«aplicação do reajuste de 81% pago em da, ao asseverar que somente mediante pro-
fevereiro último às categorias de Auditor cesso administrativo, no qual seja assegu-
Adjunto, Auditor Assistente e Procurador rada a defesa dos interessados, seria possí-
Adjunto, isso diante da grave situação fi- vel a anulação ou revogação do reajuste
nanceira do Estado e do objetivo desta Cor- aplicado por vinculação de vencimentos,
te de Contas de colaborar com as medidas vedou à Administração a faculdade de in-
de contenção de despesas da atual adminis- validar seus próprios atos, quando eivados
tração», conforme expressa o ofício dirigi- de nulidade, poder esse que o recorrente diz
do pelo Presidente do Tribunal de Contas coarctado pelo decistun.
ao Secretário de Estado da Economia
(fl. 93). A conclusão do acórdão impugnado, em
relação ao due process of law, carece de
O de que tratou o ato impugnado foi da sustentação, nos termos da Súmula 473,
suspensão dos efeitos da isonomia quanto fundamento do recurso extraordinário.
aos vencimentos dos Auditores Assistentes
e Auditores Adjuntos. Assiste razão ao recorrente em sua pos-
tulação.
Portanto, não cabe aqui apreciar se a
concessão administrativa da isonomia sig- Conheço do recurso e lhe dou provi-
nificou, ou não, uma vinculação de venci- mento.
290 R.T.J. —158

VOTO (PRELIMINAR) EXTRATO DA ATA


O Sr. Ministro Sepúlveda Pertence: RE 160.811 — AM — Rel.: Min. Ilmar
Senhor Presidente, das informações do Gaivão. Recte.: Estado do Amazonas
eminente Relator, concluí que o ato ques- (Advs.: Vanias Batista de Mendonça e ou-
tionado no mandado de segurança não foi tros). Recdos.: Maria Elizabete Moraes e
de anulação, vale dizer, de declaração de outros (Adv.: Gerson Riebisch de Figuei-
invalidade legal do reajuste, mas, expressa- redo).
mente, de suspensão do seu pagamento, Decisão: Por maioria de votos, a Turma
como ato de colaboração do Tribunal de não conheceu do recurso extraordinário.
Contas à administração do Estado do Ama- Vencido o Sr. Ministro limar Gaivão, Re-
zonas. lator, que dele conhecia e dava provimento.
Relator para o acórdão o Sr. Ministro Se-
Isso, contudo, pode ser fundamentação púlveda Pertence.
de revogação de ato administrativo, jamais
de sua anulação. Presidência do Senhor Ministro Moreira
Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
Ora, o recurso extraordinário se funda nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
na doutrina subjacente à Súmula 473, que ce, Celso de Mello e limar Gaivão. Subpro-
valida a anulação de ato administrativo e curador-Geral da República, Dr. Antônio
não a sua revogação. Fernando Barros e Silva de Souza.
Por isso, peço vênia ao eminente Relator Brasília, 1° de março de 1994 — Ricar-
para não conhecer do recurso. do Dias Duarte, Secretário.

EMBARGOS EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 160.811 (AgRg) — AM


(Tribunal Pleno)

Relator: O Sr. Ministro Francisco Rezek.


Agravante: Estado do Amazonas — Agravados: Maria Elizabete Moraes e
outros
Embargos de divergência. Agravo regimental. Ausência de
dissídio de teses jurídicas.
Não têm como prosperar os embargos de divergência que não
firmam a existência de teses jurídicas opostas nos arestos confrontados.

ACÓRDÃO Brasília, 1° de fevereiro de 1996 — Se-


púlveda Pertence, Presidente — Francis-
co Rezek, Relator.
Vistos, relatados e discutidos estes au-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- RELATÓRIO
bunal Federal, em Sessão Plenária, na con-
formidade da ata do julgamento e das notas O Sr. Ministro Francisco Rezek: Dei-
taquigráficas, à unanimidade de votos, em xei de admitir embargos de divergência
negar provimento ao agravo. com este despacho:
R.T.J. — 158 291

43 acórdão a que o Estado do Ama- acórdão embargado, da legalidade do


zonas ora opõe embargos de divergência ato revogado, o que seria impositivo à
foi, depois de acolhidos parcialmente luz do aresto paradigma.
embargos declaratórios para corrigir Não transparece, contudo, do julgado
uma imprecisão de sua ementa, assim trazido a confronto tese antagônica
resumido: àquela fumada no acórdão embargado.
`A administração pode anular O aresto padrão, examinando a moti-
seus próprios atos, quando inquina- vação do ato impugnado, cuidou de hi-
dos de ilegalidade (Súmula 473): pótese típica de nulidade de ato adminis-
não obstante, se, para desfazê-lo, in- trativo: ali em necessária a análise do ato
voca razões de mera conveniência, o revogado para se aferir sua conformida-
que se tem, na verdade, é revogação, de com o ordenamento jurídico. Já o
que não pode desconstituir situações acórdão embargado, atendo-se aos mo-
jurídicas geradas pelo ato revogado, tivos determinantes do ato impugnado,
cuja legalidade, aliás, o autor da re- tratou de tese diversa — aquela enuncia-
vogação não questiona.' da no segundo período da Súmula 473,
Os presentes embargos trazem à co- que é a revogação de ato administrativo.
lação um único acórdão — aquele pro- É ilustrativa, a propósito do tema,
ferido, há mais de 40 anos, no RMS esta passagem do voto vencedor:
1.543, cuja súmula é esta:
`Ato administrativo — Revoga- 'Vinculada a revogação ao seu
ção motivo determinante, se este não a
autoriza, pouco importa indagar da
É facultado à administração pú- correção jurídica do ato revogado.'
blica revogar os seus próprios atos,
quando praticados com infração da Inocorrente a alegada divergência,
lei, pois, só na hipótese de ter sido não admito os presentes embargos.».
esta obedecida, é que deles poderia O Estado do Amazonas agrava regimen-
haver nascido um direito público talmente, sustentando:
subjetivo. Ao pronunciar-se o Judi-
ciário se provocado, sobre a legalida-
de do ato revogador, dirá sempre a A configuração da divergência se en-
palavra final e estenderá o seu exame tremostra na manifestação da Turma re-
ao ato revogado. Se este era legal, corrida em furtar-se ao exame do ato
gerando um direito subjetivo, o Judi- revogado, mesmo sabendo-o ilegal, cir-
ciário o restabelecerá, anulando o ato cunstância que por si autoriza a proce-
revogador. Se, porém, era ilegal, dência dos embargos interpostos.
mantê-lo, apesar disso, só porque a Ao longo de todo este processo, des-
administração o rescindiu, seria fa- de as informações prestadas pela autori-
lhar o Judiciário à sua missão, que é dade coatora, passando pela posição as-
de controle da 'legalidade' dos atos sumida pelo Estado do Amazonas em
administrativos.' todas as fases recursais, pela manifesta-
Afirmando que 'ambos os julgados ção da Procuradoria-Geral da República
trataram da revogação ou da anulação de e ainda pelo voto vencido do relator no
ato administrativo', o embargante situa Recurso Extraordinário, não se deixou
a divergência na falta de exame, pelo em nenhum momento de trazer à baila a
292 R.T.J. — 158

nulidade da decisão concessiva da fala- sua anulação houver sido infração da lei.
da isonomia, sob o pálio dos seguintes Pelo contrário, afirmou ser exata a premis-
fundamentos: 1) inexistência de lei que sa. Todavia, no caso, os motivos determi-
a autorizasse, nos termos da exigência nantes do ato questionado no mandado de
contida no art. 39, parágrafo primeiro e segurança denunciavam hipótese de revo-
art. 169, parágrafo único, II, da Consti- gação e, em tal quadro, era irrelevante in-
tuição Federal; 2) estabelecimento de vestigar a correção jurídica do ato revoga-
vinculação de vencimentos, vedada pela do.
Constituição, em seu art. 37, XIII. O voto do Ministro Sepúlveda Pertence,
Ora, o que mais se debateu tanto no nos embargos declaratórios, bem demons-
Mandado de Segurança, como nos em- tra a fidelidade da decisão às duas proposi-
bargos de declaração e no recurso ex- ções da Súmula 473:
traordinário, foi exato a questão da nu- «O voto que proferi, de improviso, é
lidade da decisão administrativa do Tri- que, acompanhado pela maioria de Tur-
bunal de Contas do Estado concessiva ma, converteu-se na fundamentação do
da equiparação legitima dos Auditores acórdão, peca efetivamente pela conci-
Assistentes deste Tribunal com os Au- são.
ditores Assistentes do Tribunal de Con-
tas dos Municípios e o aumento de ven- Nele não ficou explícito a sua base
cimentos concedidos aos Auditores Ad- teórica, qual seja, a vinculação do ato
juntos daquele Tribunal, sem lei autori- administrativo ao seu motivo determi-
zativa, como, então, a final, decidir esse nante.
Egrégio Tribunal que se trata de mera No caso, como fielmente informado
`revogação de ato administrativo, que pelo relator originário do recurso, o em.
não pode desconstituir situações jurídi- Ministro limar Gaivão, o ato do Tribu-
cas geradas pelo ato revogado.' Como nal de Contas do Estado, questionado no
admitir-se que de um ato reconhecida- mandado de segurança, não se fundou
mente nulo, sob todos os aspectos, possa na nulidade da decisão anterior, restabe-
exsurgir direitos subjetivos? lecida pelo acórdão recorrido, mas, sim,
O Judiciário, in casu, na esteira do em explícitas razões de conveniência.
entendimento esposado, no acórdão tra- Documentou-as, com efeito, o ofício do
zido à colação, deveria pronunciar-se, já Presidente do Tribunal de Contas ao
que foi provocado, sobre a legalidade do Secretário de Economia, Fazenda e Tu-
ato revogador, dizendo sempre a palavra rismo do Estado, nos termos seguintes
final e estendendo seu exame ao ato (fl. 93):
revogado.». Por fim, informamos a V. Exa.
É o relatório. que este Tribunal, em Sessão desta
data, decidiu, mesmo diante da pos-
VOTO sibilidade de recurso por parte dos
interessados na área judicial, suspen-
O Sn Ministro Francisco Rezek (Re- der a aplicação do reajuste de 81%
lator): Preservo o entendimento de que a pago em fevereiro último às catego-
divergência não ficou demonstrada. Em rias de Auditor Adjunto, Auditor As-
momento algum o acórdão da Primeira sistente e Procurador Adjunto, isso
Turma considerou impróprio aferir a vali- diante da grave situação financeira
dade do ato revogado, quando o motivo de do Estado e do objetivo desta Corte
R.T.J.— 158 293

de Contas de colaborar com as medi- No precedente, volto a dizer, fez-se o


das de contenção de despesas da exame da legalidade, porque o ato revoca-
atual Administração.' tório fundara-se em vício jurídico do ato
revogado. Não foi isso, contudo, o que
Esse motivo declarado do ato im- ocorreu na hipótese dos autos.
pugnado basta à sua invalidação: dis-
pensa demonstração que vantagem fun- Nego provimento ao agravo regimental.
cional reconhecida como direito de ser- EXTRATO DA ATA
vidores públicos não pode ser revogada
pelo desejo de quem o reconhecera de ERE 160.811 (AgRg) — AM — Rel.:
colaborar com medidas governamentais Min. Francisco Rezek. Agte.: Estado do
de contenção de despesas. Amazonas (Advs.: Cynthia de Araujo Lima
Lopes, Paulo Lobato Teixeira e outros).
Vinculada a revogação ao seu motivo Agdos.: Maria Elizabete Moraes e outros
determinante, se este não a autoriza, (Adv.: Gerson Riebisch de Figueiredo).
pouco importa indagar da correção jurí- Decisão: Por votação unânime, o Tribu-
dica do ato revogado. nal negou provimento ao agravo. Votou o
Presidente.
Vícios jurídicos do ato revogado, é
claro, tornariam válida a sua anulação, Presidência do Senhor Ministro Sepúl-
não, porém, a revogação, se os motivos veda Pertence. Presentes à Sessão os Se-
dela não a autorizavam. nhores Ministros Moreira Alves, Néri da
Silveira, Sydney Sanches, Celso de Mello,
Sendo essa a tese subjacente à deci- Carlos Velloso, Marco Aurélio, Binar Gai-
são embargada, é manifesto que não vão, Francisco Rezek e Maurício Corrêa.
cabe criticá-la por não se ter ocupado Ausente, justificadamente, o Senhor Mi-
com a aferição da validade do ato revo- nistro Octavio Gallotti. Procurador-Geral
gado: não há omissão na decisão judi- da República, Dr. Geraldo Brindeiro.
cial, se o fundamento nele acolhido pre- Brasília, 1° de fevereiro de 1996 —Luiz
judica a questão da qual não tratou.». Tomimatsu, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 160.860 — PR


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira


Recorrente: Estado do Paraná — Recorridos: Zanarto Levoratto Lins e outros
Recurso extraordinário. Funcionário público. Teto de venci-
mentos. Lei estadual. Constituição, arts. 37, XI e 39, § 1°. 2. Acórdão que
considerou como vantagens não atingidas pelo teto a percepção de
adicionais por tempo de serviço, de gratificação pelo exercício de cargo
em comissão ou função de representação de gabinete, bem assim gratifi-
cação de serviço extraordinário incorporada aos proventos da inativida-
de por força de decisão judicial trânsita em julgado. 3. Recurso extraor-
dinário em que se alega ofensa aos arts. 37, XI, 39, § 1°, da Constituição,
294 R.T.J. — 158

e art. 17 do ADCT de 1988.4. Não constitui objeto de recurso extraordi-


nário a discussão referente à possibilidade de lei estabelecer como teto
dos servidores de um Poder os vencimentos de cargo de cúpula de outro
Poder. 5. Quanto aos adicionais por tempo de serviço, o STF já os definiu
como vantagem de caráter pessoal. ADIn n° 14.6. Não é possível consi-
derar a decisão local em conflito com o art. 39, 1°, da Constituição, ao
reconhecer, na aplicação de lei estadual, o caráter de vantagem pessoal
excluída do teto a gratificação pelo exercício de cargo em comissão ou de
função de representação de gabinete. 7. Não se inclui na parte final do
art. 17 do ADCT de 1988 vantagem que decisão judicial transita em
julgado mandou incorporar aos proventos da inatividade. 8. Recurso
extraordinário não conhecido.

ACÓRDÃO res públicos, ainda que tome como parâme-


tro cargo de outro Poder.
Vistos, relatados e discutidos estes au- Ordem concedida, em parte.»
tos, acordam os Ministros da Segunda Tur-
ma do Supremo Tribunal Federal, na con- No voto condutor do acórdão, o ilustre
formidade da ata do julgamento e das notas Relator, reportando-se aos fundamentos da
taquigráficas, à unanimidade, não conhecer decisão prolatada, pelo mesmo Órgão jul-
do recurso, nos termos do voto do Ministro gador, nos autos do MS n° 11.539-3, asse-
Relator. gurou aos impetrantes «a percepção dos
adicionais por tempo de serviço, sem a
Brasília, 11 de abril de 1995 — Néri da
limitação contida no inciso IV do art. 2° da
Silveira, Presidente e Relator.
Lei n° 9.105/90», «gratificação sobre cargo
RELATÓRIO em comissão que tenham exercido» e «per-
cepção de gratificação de representação de
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- gabinete a que façam jus» (fl. 217), bem
tor): Julgando mandado de segurança im- assim gratificação de serviço extraordiná-
petrado por Zanarto Levoratto Lins e ou- rio «aos impetrantes que tenham obtido tal
tros, o Órgão Especial do Tribunal de Jus- gratificação por decisão judicial, de vez que
tiça do Estado do Paraná, por unanimidade o art. 17 do Ato das Disposições Constitu-
de votos, concedeu a segurança, em parte, cionais Transitórias da Carta Federal dei-
estando o acórdão assim ementado (fls. xou a descoberto apenas o direito adquirido
210/211): e não a res judicata (fl. 218).
«Mandado de segurança. Lei esta- Inconformado com a decisão, interpôs o
dual que limitou os vencimentos dos ser- Estado do Paraná, com apoio no art. 102, item
vidores do Tribunal de Contas à remune- letra a, da Constituição, o recurso extraor-
ração percebida pelos Secretários de Esta- dinário de fls. 225/246, sustentando que o
do. Pretendida violação ao disposto pelo aresto recorrido vulnerou os arts. 37, item XI,
inciso XI do art. 37 da Carta Federal. e 39, § 1°, da Lei Maior, bem assim o art. 17,
Inocorrência. Concessão parcial da segu- do Ato das Disposições Constitucionais
rança, contudo, para assegurar as vanta- Transitórias, da Constituição de 1988.
gens pessoais dos impetrantes. Afirma o recorrente, ao indicar como
Não é inconstitucional a lei estadual que violado o item XI, do art. 37, da Carta
fixa limite para a remuneração de servido- Magna, que o aresto em comento não apli-
R.T.J. — 158 295

cou, no que concerne ao adicional por tem- VOTO


po de serviço, o limite previsto no item IV, O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela-
do art. 2°, da Lei n° 9.105, de 1989, que tor): A espécie foi assim analisada no acór-
apenas excluiu do teto o adicional concedi- dão recorrido, às fls. 214/218, verbis:
do, até o percentual de 35%, ficando o «2. A ação mandamental envolve a
excedente sujeito à limitação prevista no discussão, que não é a primeira, acerca
aludido dispositivo. Assinalando, de outra da legalidade ou «constitucionalidade»
parte, não ser possível considerar como do chamado limitador de vencimentos,
vantagem pessoal parcela que possue cará- conforme se vê de vários julgados de
ter remuneratório, anota o Estado recorren- Mandados de Segurança.
te que a exclusão do teto de gratificações
incidentes sobre cargo em comissão e de Os impetrantes são servidores inati-
representação de gabinete resulta em afron- vos do Tribunal de Contas do Estado, e
ta ao § 1°, do art. 39, da Carta Magna. insurgem-se contra ato de seu Presiden-
Alega-se, afinal, no apelo extremo, que te que mandou aplicar a todos os servi-
ouve violação ao disposto no art. 17, do dores daquela Colenda Corte o disposto
ADCT, da Constituição de 1988, quando o pelo art. 6° da Lei Estadual n° 9.196, de
aresto recorrido reconheceu que está fora 18 de janeiro de 1990, in verbis:
do alcance do teto a gratificação de serviço «Art. 6°. A remuneração men-
extraordinário concedida àqueles impe- sal dos servidores do Tribunal de
trantes mediante decisão judicial com trân- Contas do Estado não poderá exceder
sito em julgado, destacando-se que o aludi- o limite decorrente da Lei n° 9.105,
do dispositivo «veda excessos ao limite de 23 de outubro de 1989, alterada
estabelecido no inciso XI, do art. 37 da pelo art. 3`' da Lei n° 9.161, de 20 de
CF/88, a qualquer título, inclusive de deci- dezembro de 1989.»
são judicial, estabelecendo uma exceção ao
princípio da irredutibilidade de vencimen- O art. 2° da Lei n° 9.105, referida,
tos» (fl. 245). com as alterações introduzidas pela Lei
n° 9.161, assim estabelece:
Indeferido o processamento do recurso «Art. 2°. Para efeitos desta Lei,
extraordinário, pelo despacho de fls. deduzida a parcela de contribuição
262/265, do ilustre Presidente do Tribunal compulsória para entidades previ-
de Justiça do Estado do Paraná, logrou o denciárias, remuneração é a soma
recorrente a subida do apelo extremo a esta dos valores percebidos em espécie, a
Corte, tendo em vista o provimento do qualquer título, em razão do cargo,
Agravo de Instrumento n° 145.564-1/PR, emprego, função, posto ou gradua-
em apenso. ção de caráter efetivo ou transitório,
excluídos:
Contra-razões dos recorridos às fls.
257/259. «I — diárias;
II — décimo terceiro salário;
Oficiando nos autos, opinou a Procura-
III — adicional de férias;
doria-Geral da República, no parecer de fls.
278/289, pelo improvimento do recurso ex- IV — adicional por tempo de
traordinário. serviço até 35% (trinta e cinco por
cento), observado o limite do valor
É o relatório. correspondente a 35% (trinta e cinco
296 R.T.J. — 158

por cento) da remuneração do cargo 3. A questão do chamado «redutor


de Secretário de Estado; salarial» já foi examinada por este Egré-
gio Tribunal em várias oportunidades, o
V — indenização decorrente que facilita, ao menos em parte, o julga-
de rescisão de contratos de trabalho.» mento da presente segurança.
Ao ver dos impetrantes, a norma ini- O primeiro tema a ser analisado no
cialmente transcrita viola o disposto presente caso diz respeito à alegada in-
pelo inciso XI do art. 37 da Carta Fede- constitucionalidade do art. 6° da Lei Es-
ral, e isto porque «a segunda parte do tadual n° 9.196/90, por submeter os ven-
texto ordena que a Lei observe como cimentos dos servidores do Tribunal de
remuneração máxima dos servidores Contas ao limite da remuneração de car-
públicos, «no âmbito dos respectivos go do Poder Executivo.
poderes», a remuneração percebida, a
Não vislumbro a ocorrência de tal
qualquer titulo, por membros do Con-
vício, porém.
gresso Nacional, Ministros de Estado e
Ministros do Supremo Tribunal Federal Diga-se, de início, que o Tribunal de
«e seus correspondentes nos Estados» Contas, como órgão auxiliar do Poder
(fl. 6, grifos do original). Legislativo, que é, nem mesmo está con-
templado com referência expressa pelo
Entendem que o mencionado dispo- inciso XI do art. 37 da Constituição
sitivo. constitucional «não permite que a Federal, invocado pelos impetrantes.
remuneração dos membros de um Poder
sirva de paradigma e limite para os ser- Ademais, o que o referido dispositi-
vidores de outro Poder» (fls. 7/8), daí vo reza é que, «no âmbito dos respecti-
concluindo que a remuneração dos ser- vos poderes», os servidores não poderão
vidores do Tribunal de Contas, por ser perceber remuneração superior à dos
um órgão autônomo, só poderia ter membros do Poder a que pertençam os
como limite o valor da remuneração dos cargos que ocupem. Não diz que os ser-
Conselheiros daquela Corte, mas puma vidores de um Poder não possam ter
o dos Secretários de Estado, integrantes seus vencimentos balizados pela remu-
do Poder Executivo. neração paga a servidores de outro Po-
der, como equivocadamente sustentam
Arrematam pedindo a declaração de os impetrantes.
inconstitucionalidade do art. 6° da Lei n°
Assim, segundo a norma constitucio-
9.196/90, bem assim a concessão da or-
nal em referência, o que é vedado é que
dem «para o fim de: a) ser eliminado o os servidores do Poder Legislativo, por
denominado redutor salarial dos seus
exemplo, — a que o Tribunal de Contas
proventos, restituindo-se-lhes os valo-
está vinculado —, percebam mais do
res que foram descontados ilegalmente
que um deputado estadual. Mas não há
nos meses de janeiro, fevereiro, março e
regra constitucional alguma que impeça
bem assim, nos meses posteriores, até
a limitação dos vencimentos de tais ser-
julgamento final; e b) ser determinado,
vidores à remuneração paga a cargo in-
a partir da concessão do writ, o paga-
tegrante do Poder Executivo.
mento dos proventos (remuneração) dos
impetrantes, sem redução salarial decor- Aliás, o inciso XII do art. 37 da Carta
rente do art. 6° da Lei Estadual n° Federal expressamente estabelece como
9.196/90» (fl. 10, n° 15). limite para a remuneração dos servido-
R.T.J. — 158 297

res públicos os valores pagos aos servi- De outra parte, invalidando o cha-
dores do Poder Executivo, o que afasta, mado direito adquirido (artigo 17, do
por completo, a alegação de inconstitu- Ato das Disposições Constitucionais
cionalidade do art. 6° da Lei Estadual n° Transitórias), nada estabeleceu a Lei
9.196/90. Maior quanto a coisa julgada (artigo
4. Todavia, a constitucionalidade do 5°, XXXVI), que dá segurança e cer-
dispositivo questionado, ora reconheci- teza às relações jurídicas e proscreve
da, não retira dos impetrantes o direito a a retroatividade das leis, de sorte a
percepção de vantagens pessoais, con- permitir o direito de percepção das
forme bem destacou o ilustrado parecer verbas obtidas pela via judicial e,
da douta Procuradoria-Geral da Justiça. pois, não abarcadas pelo referido li-
mitador.
Quanto a este aspecto da postulação,
cabe invocar recente decisão deste Co- Mandamus concedido, em par-
lendo Órgão Especial no Mandado de te.»
Segurança n° 11.539-5, relatado pelo Muito embora não tenham os impe-
eminente Desembargador Oto Spo- trantes destacado, na inicial, pedido es-
nholz, cujo acórdão, datado de 7 de pecífico de concessão da ordem para
fevereiro de 1991, contém a seguinte ressalva das vantagens pessoais afeta-
ementa: das pelo redutor de vencimentos a que
se encontram submetidos, entendo estar
«A regra do artigo 37, inciso XI, tal pretensão contida no pedido maior,
da Constituição da República Fede- tal seja, de total eliminação da incidên-
rativa do Brasil, consagra o princípio cia do referido redutor sobre seus pro-
da paridade de remuneração dos ser- ventos de inatividade (fl. 10, n° 15, a).
vidores públicos, estabelecendo o li-
mite dentro de cada um dos Poderes 5. Isso posto, e adotando os funda-
do Estado, assim como a do artigo mentos do precedente deste Egrégio Ór-
39, parágrafo 1°, assegura a isonomia gão Especial, acima transcrito, voto pela
retributiva para cargos de atribuições concessão parcial da segurança, para o
iguais ou assemelhados do mesmo fim de assegurar aos impetrantes, nos
Poder ou entre servidores de todos os termos dos respectivos atos de aposen-
Poderes. tadoria: a) a percepção dos adicionais
por tempo de serviço, sem a limitação
De conseqüência, lícito é ao Esta- contida no inciso IV do art. 2° da Lei n°
do do Paraná, através da Lei n°9.105, 9.105/90; b) a percepção da gratificação
de 23 de outubro de 1989, modifica- sobre cargo em comissão que tenham
da pela Lei n° 9.361, de 12 de setem- exercido; e c) a percepção de gratifica-
bro de 1990, estabelecer o nominado ção de representação de gabinete a que
limitador de proventos e vencimen- façam jus.
tos, na área do Poder Executivo, o Excluo da concessão a gratificação
qual, por evidente, não pode atingir de serviço extraordinário, pois, como foi
as vantagens de caráter individual e destacado pelo venerando aresto invo-
as relativas à natureza do trabalho, cado como paradigma, tais benefícios
como: os adicionais por tempo de não se enquadram no disposto pela parte
serviço, a gratificação de função de final do § 1° do art. 39 da Constituição
chefia e a representação de gabinete. Federal, «porque não se constituem em
298 R.T.J. —158

«vantagens de caráter individual» ou esse percentual, pode o Secretário de Esta-


«relativas à natureza do trabalho», eis do perceber. Não tenho, entretanto, como
que se integram ao próprio vencimen- suscetível de se estabelecer essa equivalên-
to». Tal qual apontado aresto, porém, cia de percentuais, na aplicação da ressalva
ressalvo a concessão da ordem aos im- do § 1° do art. 39 da Constituição. Na ADIn
petrantes que tenham obtido tal gratifi- n° 14 logrei ensejo de anotar esse ponto,
cação por decisão judicial, de vez que o mas, tão-só, no que concerne ao teto da
art. 17 do Ato das Disposições Consti- magistratura, aos efeitos do art. 93, V, da
tucionais Transitórias da Carta Federal Lei Magna, não para estipular que o percen-
deixou a descoberto apenas o direito tual não pudesse ser superior a 35%, mas
adquirido e não a res judicata, que há apenas para referir que, somadas as parce-
de ser respeitada, portanto.» las de vencimento básico, representação e
O primeiro ponto do acórdão, referente gratificação qüinqüenal de qualquer magis-
à possibilidade de lei estabelecer como teto trado, não pode o total exceder à remunera-
dos servidores de um Poder cargo da cúpula ção de Ministro do STF, com o mesmo
de outro Poder não veio a ser atacado no tempo de serviço e limitados seus qüin-
recurso extraordinário. Os impetrantes qüênios a sete, nos termos do art. 65 da
conformaram-se com os termos do acórdão LOMAN. Na espécie, porém, idêntica dis-
recorrido, dele não interpondo apelo extre- cussão não se propõe. Penso que a parcela
mo, e o Estado não enfrenta essa matéria é vantagem pessoal que o inativo já incor-
em sua irresignação derradeira. Deixo, porou a seus proventos.
pois, à margem a discussão desse tema, Também, no que concerne à gratificação
porque fora dos limites do presente recurso pelo exercício de cargo em comissão ou
extraordinário. representação de gabinete, não vejo como
Recusada a inconstitucionalidade da lei, deixar de reconhecer o caráter de vantagem
pessoal excluída do teto, a teor do § 1° do
restringe-se a discussão, no âmbito deste
art. 39 da Constituição. Quanto à parcela
recurso extraordinário, às verbas remune-
referente ao serviço extraordinário percebi-
ratórias que se excluem do indicado teto- os da em decorrência de decisão judicial com
adicionais por tempo de serviço, sem o trânsito em julgado, entendo como decidiu
limite imposto pela Lei n° 9.105/89; as o aresto, que não é possível fazê-la com-
gratificações pelo exercício de cargo em preendida no teto, com base no art. 17 do
comissão ou de representação de gabinete, ADCT de 1988, ao estipular:
consideradas, no aresto, como vantagens
pessoais, aos efeitos do § 1° do art. 39 da «Art. 17. Os vencimentos, a remu-
Lei Magna de 1988, e ainda o serviço ex- neração, as vantagens e os adicionais,
traordinário pago em virtude de decisão bem como os proventos de aposentado-
ria que estejam sendo percebidos em
judicial.
desacordo com a Constituição serão
Quanto aos adicionais por tempo de ser- imediatamente reduzidos aos limites
viço, o STF já os definiu como vantagem dela decorrentes não se admitindo, neste
de caráter pessoal, ut art. 39, § 1°, da Cons- caso, invocação de direito adquirido ou
tituição, dentre outros, no julgamento da percepção de excesso a qualquer título.»
ADIn n° 14. No caso concreto, o recurso A meu ver, assim o parecer da Procura-
sustenta que do limite não pode ser excluí- doria-Geral da República bem analisou a
do percentual além de 35%, porque, até espécie, às fls. 282/289, verbis:
R.T.J. — 158 299

afirmam o requerente que o aban- belecido na Lei Complementar n°


dono do excesso de 35%, quanto ao 35/79 e em outros artigos da Lei
adicional de tempo de serviço, feito pelo Maior com a exegese do aludido dis-
acórdão do Tribunal a quo, afronta o positivo constitucional.
inciso XI do art. 37. Procedência parcial da ação para
Data nula, a questão foi mal colo- declarar inconstitucionais as expres-
cada. Não se trata de discutir aqui se sões «... e vantagens pessoais (adi-
ofende ou não o disposto na CF a respei- cionais por tempo de serviço) ...»,
to do teto, suprimir a ressalva legal do constante do § 2°, art. 2°, da Lei n°
excesso de 35% relativo ao adicional do 7.721/89.»
tempo de serviço. O que pode ser discu- Diga-se, por oportuno, que, ao anali-
tido, sob esse enfoque, é apenas se o sar o tema, não ficaram os eminentes
«adicional», como vantagem, está ou Ministros, para efeito de aplicação do
não incluído no teto. art. 39, § 1° e 37, XI, da CF, apenas na
Quanto a essa verba, o Supremo Tri- vantagem relativa ao tempo de serviço.
bunal Federal já emitiu pronunciamento Incluíram, ainda, inclusive para efeito
específico na Ação Direta n° 14-DF, de teto, as vantagens pessoais de caráter
relator o eminente Ministro Célio Borja, individual e as relativas à natureza ou
RTJ 130/475, em que se discutiu a cons- local de trabalho, embora essa ressalva
titucionalidade de dispositivo que in- somente constasse do parágrafo 1° do
cluía, para efeito de teto, as vantagens art. 39. Entenderam S. Exas. que o art.
pessoais, entre parênteses e particular- 37, XI, da CF teria de ser interpretado
mente o adicional por tempo de serviço. em conjunto com o outro dispositivo da
Naquela oportunidade, entendeu a Su- Carta.
prema Corte que era inconstitucional a Colho do voto do eminente Ministro
expressão contida no § 2° do artigo 2° da Néri da Silveira, naquela oportunidade,
Lei Federal n° 7.721, de 6 de janeiro de hoje relator do presente recurso, a se-
1989, que nessa linha se orientava. guinte manifestação:
Destaco da ementa do referido acór- «De entender é, destarte, na linha
dão: dessa manifestação do Supremo Tri-
«Ação direta de inconstitucionali- bunal Federal que, em se cuidando de
dade proposta pela Associação dos aplicar a regra do art. 39, § 1°, da Lei
Magistrados Brasileiros. O parágrafo Maior, ressalvam-se, de explícito,
2° do artigo 2° da Lei Federal n° «as vantagens de caráter individual e
7.721, de 6 de janeiro de 1989, quan- as relativas à natureza ou ao local de
do limita os vencimentos dos Magis- trabalho». Ora, de vantagens de cará-
trados do Supremo Tribunal Federal ter individual se trata, na hipótese de
— computados os adicionais por gratificação adicional por tempo de
tempo de serviço — à remuneração serviço, ut art. 65, VIII, da Lei Orgâ-
máxima vigente no Poder Executivo, nica da Magistratura Nacional.
vulnera o art. 39, § 1°, in fine, da Na compreensão do sistema,
Constituição, que sujeita a tal limite cumpre, é certo, entretanto, anotar,
apenas os vencimentos, excluídas as de outra parte, que, se para os efeitos
vantagens pessoais. Compatibilida- do art. 37, XI, combinado com o art.
de do conceito de vencimentos esta- 39, § 1°, ambos da Constituição, não
300 R.T.J. — 158

se hão de considerar «as vantagens Estados, por via legislativa estadual.


de caráter individual», dos membros Cumpre, nessa linha, anotar que, na
do Congresso Nacional, dos Minis- concessão, pelos Estados, dessa van-
tros de Estado e dos Ministros do tagem, há de ser respeitada a norma
Supremo Tribunal Federal, outra do art. 65, § 2°, da Lei Complementar
deve ser a visualização da matéria. n° 35, vedando-se-lhes, dessa manei-
quando se cogita de aplicar o art. 93, ra, apenas, fazê-lo, «em bases limites
V, combinado com o art. 39, § 1°, da superiores» aos fixados no Decreto-
Constituição, em se verificando tra- Lei n° 2.019/83. De outro lado e em
tar de tema diverso, qual seja, teto conseqüência de tais princípios, não
para a remuneração dos magistrados. será possível, na disciplina dessa gra-
Com efeito, neste plano, importa ter tificação, os Estados estipularem re-
presente a proibição de os magistra- gime, segundo o qual, acrescidos os
dos perceberem, «a título nenhum», valores, a ela concernentes, aos ven-
retribuição que exceda a dos Minis- cimentos dos magistrados estaduais,
tros do Supremo Tribunal Federal. — formados estes pela parcela básica
No particular, é de entender que não mais a representação (LOMAN, art.
se conciliaria com a ordem constitu- 65, § 1°), — ultrapasse a soma dos
cional a situação de magistrado, nas vencimentos e gratificação adicional
mesmas condições de tempo de ser- por qüinqüênios (art. 65, VIII) o teto
viço de Ministro do Supremo Tribu- previsto no art. 144, § 4°, in fine, da
nal Federal, que porventura auferisse Constituição Federal. Nesse sentido,
retribuição mais elevada. Nessa li- exemplifico: não será cabível, no pla-
nha, nenhum magistrado, com vinte no estadual, que a lei local ao disci-
e cinco ou trinta e cinco anos de plinar essa vantagem, estabeleça,
serviço público, poderá perceber re- para magistrado com sete qüinqüê-
muneração mais elevada que a de nios de tempo de serviço, a possibi-
Ministro do STF, respectivamente, lidade de, — somado o valor desses
com vinte e cinco ou trinta e cinco qüinqüênios aos vencimentos tam-
anos de serviço. Cogita-se, nessa hi- bém fixados em lei do Estado —
pótese, da existência de um teto que,
perceber quantitativo superior ao que
«a título nenhum», conforme estipu-
corresponde ao total de vencimentos
la a Constituição (art. 93, V, in fine),
e gratificação adicional conferidos a
pode ser excedido, na organização
da escala de vencimentos da magis- um Ministro do Supremo Tribunal
tratura. Federal, no gozo da gratificação rela-
tiva a sete qüinqüênios de tempo de
A respeito desse ponto, já tive en- serviço. Esse, em realidade, a meu
sejo de observar, em voto proferido, ver, o espírito do sistema definido no
a 9-11-83, no julgamento da Repre- art. 144, § 4°, in fine, da Constitui-
sentação n° 1.155-DF (representação ção, conjugado com o art. 65 e seu §
para a interpretação dos arts. 1° e 2°, 2°, da Lei Orgânica da Magistratura
do Decreto-Lei Federal n° 2.019/83): Nacional. Compreendido, desse
«A gratificação prevista no art. 65, modo, o art. 39, § 1°, última parte, da
VIII, da Lei Orgânica da Magistratu- Constituição Federal em face do art.
ra Nacional, poderá, evidentemente, 37, inciso XI, e do art. 93, V, da
ser concedida aos magistrados dos mesma Lei Magna, força é concluir,
R.T.J. — 158 301

efetivamente, que padece de incons- vantagens pessoais e circunstanciais,


titucionalidade o parágrafo 2°, do art. também dos vencimentos a serem com-
2°, da Lei n° 7.721, de 6-1-89, quando parados o Autor retira essas verbas:
insere cláusula segundo a qual as
«vantagens pessoais (adicionais por «120. Sem embargo, repita-se: o
critério para determinar a retribuição
tempo de serviço)» se somam ao ven-
que não pode exceder o teto há de ser
cimento básico e representação para
idêntico ao que foi referido para qua-
os efeitos da relação de equivalência lificar o que se tem de entender como
ou correspondência prevista no art. retribuição «a qualquer título» dos
37, XI, da Constituição — consagra- cargos que servem como referencial-
da no art. 1° do diploma aludido, limite. Ou seja: os valores percebidos
conforme se vê do art. 1° do Projeto por um servidor em conta de adicio-
de Lei então encaminhado pelo STF nal por tempo de serviço ou pela
e da Exposição de Motivos suso prestação de trabalho em locais insa-
transcrita. Também, para os fins do lubres ou em circunstâncias penosas
art. 37, XII, da Lei Maior, importa ou, de qualquer modo, relativos a
ressalvar «as vantagens de caráter in- situações particulares, que não sejam
dividual e as relativas à natureza ou específicas do cargo em si, mas de-
local de trabalho», como consagrado correntes quer de uma situação pes-
no dito art. 39, § 1°, da Constituição. soal do servidor, quer das peculiares
6. Com essas breves anotações, por condições molestas em que tenha de
igual, julgo procedente a ação direta desempenhar sua atividade, não se-
em exame e declaro a inconstitucio- rão detidos pelo teto retributivo a que
nalidade das expressões: «e vanta- alude a Constituição Nisto — regis-
gens pessoais (adicionais por tempo tre-se — revimos o ponto de vista
de serviço)», constantes do parágrafo que havíamos expendido na primeira
2° do artigo 2°, da Lei n° 7.721, de 6 edição deste livro. Repensando o as-
de janeiro de 1989.), sunto e aclarando o verdadeiro alcan-
Não há duvida de que as gratifica- ce da expressão «a qualquer título»,
ções de cargo em comissão e a de repre- tal como agora o fizemos, resultam
sentação de gabinete estão excluídas do conseqüências práticas bastantes dis-
teto, pela exegese feita pela Suprema tintas das que se extrairiam da formu-
Corte, na ADIn 14, dos dispositivos lação dantes efetuada na anterior edi-
constitucionais aqui invocados, mesmo ção.»
porque dizem elas respeito à natureza do José Afonso da Silva, no seu «Curso
trabalho desempenhado (art. 39, § 1°, in de Direito Constitucional Positivo», 6'
fine, CF). edição, RT, refere-se à gratificação de
gabinete, na análise do § 1° do art. 39,
Aliás, a doutrina tende a concluir da CF, que tem sido interpretado em con-
mesma forma. Depois de analisar a si- junto com o inciso XI, da CF (pág. 574):
tuação dos paradigmas para definir o
que seja teto, Celso Antonio Bandeira «É o art. 39, § 1° que determina
de Mello, in «Regime Constitucional que a lei assegurará, aos servidores
dos Servidores da Administração Direta da Administração direta, isonomia
e Indireta», 2' edição, RT, pág 96 ex- de vencimentos (ou seja, tanto no que
cluindo por exemplo do paradigma as tange ao padrão como aos acresci-
302 R.T.J. — 158

mos pecuniários) para cargos (só fala nas o direito adquirido e não a res
em cargo, mas vale também para em- judicata, que há de ser respeitada,
prego e função) de atribuições iguais portanto.»
ou assemelhadas do mesmo Poder ou Há quem sustente, como faz, Celso
entre servidores dos Poderes Execu- Antonio (op. cit. pág. 96/97), que a coi-
tivo, Legislativo e Judiciário, ressal- sa julgada anterior a 1988 não impede a
vadas as vantagens de caráter indivi- redução prevista no art. 17 do ADCT:
dual e as relativas à natureza ou ao
local de trabalho. «Salário-família», «Averbe-se, finalmente, que o art.
p. ex., é vantagem individual, pois é 17 das Disposições Constitucionais
concedido em função de situação fa- Transitórias consigna o seguinte pre-
miliar de cada indivíduo; «gratifica- ceito: «Os vencimentos, a remunera-
ção de representação de gabinete» é ção, as vantagens e os adicionais,
vantagem relativa à natureza do tra- bem como os proventos de aposenta-
balho, «gratificação» a servidor por doria que estejam sendo percebidos
prestar serviço em local afastado de em desacordo com a Constituição se-
sua sede é, como se nota, vantagem rão imediatamente reduzidos aos li-
relativa ao local de trabalho.» mites dela decorrentes, não se admi-
Com relação ao último ponto, ou tindo, neste caso, a invocação de
seja, à alegada afronta ao art. 17 do direito adquirido ou percepção de ex-
ADCT, discute-se, na realidade, se a cesso a qualquer título».
decisão recorrida poderia conceder a or-
Note-se que não será prestante,
dem para assegurar a gratificação de
para tentar reter este plus, quando
serviço extraordinário a quem a tivesse
efetivamente signifique superação
obtido por decisão judicial.
indevida dos aludidos limites consti-
Neste ponto, aliás, assim se pronun- tucionais (avaliada segundo o crité-
ciou o voto condutor: rio retro indicado), a invocação de
direito adquirido ou de outro «qual-
«Excluo da concessão a gratifica- quer título», como o ato jurídico per-
ção de serviço extraordinário, pois, feito ou coisa julgada anteriores à
como foi destacado pelo venerando Constituição de 1988.»
aresto invocado como paradigma,
tais benefícios não se enquadram no Creio eu porém, que em nome da
disposto pela parte final do § P do segurança e da estabilidade jurídica a
art. 39 da Constituição Federal, «por- coisa julgada visa a preservar, que não
que não se constituem em 'vantagens deva ela ser ultrapassada pela redução
de caráter individual' ou 'relativas à prevista naquele dispositivo. Mesmo
natureza do trabalho', eis que se in- porque, a regra geral prevista no Capí-
tegram ao próprio vencimento». Tal tulo I, do Título II, da CF, que enumera
qual o apontado aresto, porém, res- os «Direitos e Garantias Individuais»,
salvo a concessão da ordem aos im- protege a coisa julgada (art. 5°, inciso
petrantes que tenham obtido tal gra- XXXVI) e, assim, qualquer exceção que
tificação por decisão judicial, de vez venha limitar esse exercício deve ser
que o art. 17 do Ato das Disposições estabelecida expressamente no próprio
Constitucionais Transitórias da Car- corpo da Constituição, sob pena de
ta Federal deixou a descoberto ape- ofensa a uma cláusula pétrea (art. 60, §
R.T.J. — 158 303

4°, inciso IV, CF). Com razão, pois, Decisão: Por unanimidade, a Turma não
nesse ponto, o acórdão recorrido.» conheceu do recurso, nos termos do voto
Do exposto, não conheço do recurso do Relator.
extraordinário. Presidência do Senhor Ministro Néri da
Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
EXTRATO DA ATA
Ministros Carlos Velloso e Maurício Cor-
rêa. Ausentes, justificadamente, os Senho-
RE 160.860 —PR —Rel.: Min. Néri da
res Ministros Marco Aurélio e Francisco
Silveira Recte.: Estado do Paraná (Advs.:
Rezek. Subprocurador-Geral da República,
Carlos Frederico Mares de Souza Filho e
o Dr. Cláudio Lemos Fonteles.
outros). Recdos.: Zanarto Levorato Lins e
outros (Adv.: Mauro João Sales de Albu- Brasília, 11 de abril de 1995 — Wagner
querque Maranhão). de Amorim Madoz, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 160.860 (EDcI) — PR


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira


Embargante: Estado do Paraná — Embargado: Zanarto Levorato Lins e
outro s
Recurso extraordinário. Embargos de declaração. Não há
omissão ou contradição no acórdão. Embargos de declaração com natu-
reza infringente do julgado. Sua rejeição.
ACÓRDÃO midade, não conheceu do recurso, estando
o acórdão assim ementado (fl. 313):
Vistos, relatados e discutidos estes au- «— Recurso extraordinário. Fun-
tos, acordam os Ministros da Segunda Tur- cionário público. Teto de vencimentos.
ma do Supremo Tribunal Federal, na con- Lei estadual. Constituição, arts. 37, XI,
formidade da ata do julgamento e das notas 39, § 1°. 2. Acórdão que considerou
taquigráficas, por maioria, rejeitar os em- como vantagens não atingidas pelo teto
bargos de declaração. a percepção de adicionais por tempo de
Brasília, 14 de novembro de 1995 — serviço, de gratificação pelo exercício
Néri da Silveira, Presidente e Relator. de cargo em comissão ou função de
representação de gabinete, bem assim
gratificação de serviço extraordinário
RELATÓRIO incorporada aos proventos da inativida-
de por força de decisão judicial transita
em julgado. 3. Recurso extraordinário
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- em que se alega ofensa aos arts. 37, XI,
tor): Julgando o Recurso Extraordinário n° 39, 1°, da Constituição, e art. 17 do
160.860-9/210, a Segunda Turma, à unani- ADCT de 1988.4. Não constitui objeto
304 R.T.J. — 158

de recurso extraordinário a discussão ao art. 17 do ADCT de 1988, como susten-


referente à possibilidade de lei estabele- ta, para afastar a conclusão do acórdão em-
cer como teto dos servidores de um Po- bargado, quanto a nele não se compreender
der os vencimentos de cargo de cúpula a coisa julgada, não constitui tema a mere-
de outro poder. 5. Quanto aos adicionais cer debate em embargos de declaração.
por tempo de serviço, o STF já os defi- Quanto à parte conclusiva do aresto,
niu como vantagem de caráter pessoal. também os embargos de declaração não
ADIn n° 14.6. Não é possível considerar procedem. Está, à fl. 226, que o recurso
a decisão local em conflito com o art. 39, extraordinário foi interposto com base no
§ 1°, da Constituição, ao reconhecer, na art. 102, III, letra a, da Constituição, apon-
aplicação de lei estadual, o caráter de tando-se, aí, os dispositivos da Lei Magna
vantagem pessoal excluída do teto a gra- que se sustentavam ofendidos.
tificação pelo exercício de cargo em co-
missão ou de função de representação de Ora, nessa hipótese, quando o STF não
gabinete. 7. Não se inclui na parte final acolhe o recurso, conclui-se por seu não
do art. 17 do ADCT de 1988 vantagem conhecimento, conforme é a técnica de jul-
que decisão judicial transita em julgado gamento do recurso extraordinário. Se o
mandou incorporar aos proventos da recurso estivesse baseado na letra b, do
inatividade. Recurso extraordinário não inciso III do art. 102 da Constituição, e não
conhecido.» merecesse acolhida, nessa hipótese, é que
dele se conheceria, porque fundado na letra
Publicado o acórdão, interpõe o Estado b, para desprovê-lo. Dessa maneira, no
do Paraná os embargos de declaração de fls. caso, não há contradição alguma. Rejeito os
315/321. embargos de declaração.
Sustenta o embargante que houve omis-
são no julgado ao não se vislumbrar a inte- EXTRATO DA ATA
gralidade do componente normativo e ex-
cepcional do art. 17, do ADCT. RE 160.860 (EDcl) — PR — Rel.: Min.
Afirma, ainda, haver contradição entre Néri da Silveira. Embte.: Estado do Paraná
o que foi decidido e a parte dispositiva do (Advs.: Júlio Cesar Ribas Boeng e outros).
Embdos.: Zanarto Levorato Lins e outros
referido artigo das Disposições Constitu-
(Adv.: Mauro João Sales de Albuquerque
cionais Transitórias.
Maranhão).
É o relatório.
Decisão: Por unanimidade, a Turma re-
VOTO jeitou os embargos de declaração.
Presidência do Senhor Ministro Néri da
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela-
tor): Os embargos de declaração pretendem Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
rediscutir o mérito da controvérsia, atacan- Ministros Carlos Velloso, Francisco Rezek
do, desse modo, o aresto impugnado, o que e Maurício Corrêa. Ausente, justificada-
lhes empresta caráter nitidamente infrin- mente, o Senhor Ministro Marco Aurélio.
gente do julgado. Para isso, os embargos de Subprocurador-Geral da República o Dr.
declaração não constituem via adequada. Mardem Costa Pinto.
Não há omissão ou contradição no acórdão Brasília, 14 de novembro de 1995 —
Se outra deveria ser a exegese a conferir-se Wagner Amorim Madoz, Secretário.
R.T.J. — 158 305

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 160.871 — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio


Recorrente: Estado de São Paulo — Recorrida: Eduardo' s Park Hotel Limi-
cada
ICM — Fornecimento de alimentação, bebidas e outras mer-
cadorias — Base de cálculo — Abrangência — Serviços prestados — Lei
n° 5.886/87, do Estado de São Paulo — Competência para impor o tributo
— Artigo 24, inciso II, da Constituição Federal anterior e 156, inciso IV,
da atual. O fato de na lei estadual prever-se, com base de incidência, o
valor pago pelo adquirente, sem exclusão do destinado a remunerar os
serviços embutidos, não implica transgressão direta ao preceito consti-
tucional que disciplina a competência dos Municípios para instituir
Imposto sobre Serviços. A circunstância de o Decreto-Lei n° 406/68, de
cunho federal, não contemplar, na listagem a ele anexa, os serviços
prestados pelo fornecimento de alimentação e bebidas por restaurantes,
bares, cafés e estabelecimentos similares afasta, por sua vez, a possibili-
dade de se ter, no caso, a dupla incidência, sendo certo, ainda, que o valor
cobrado fica sujeito apenas ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias
(â 2°), da mesma (orna que a prestação de serviços incluídos sofre
unicamente a incidência do Imposto sobre Serviços, ainda que envolva o
fornecimento de mercadorias (§ 1°).

ACÓRDÃO res. O Colegiado de origem ressaltou que a


Lei n° 5.886/87, do Estado de São Paulo,
Vistos, relatados e discutidos estes au- não criou a base de cálculo do imposto.
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- Com o extraordinário, o Estado aponta
formidade da ata do julgamento e das notas que tal entendimento contraria o teor dos
taquigráficas, por unanimidade de votos, artigos 18, § 1°, 23, inciso II, e 24, inciso
em conhecer do recurso e lhe dar provimen- II, todos da Constituição anterior. Argu-
to, nos termos do voto do Relator. menta que a referida Lei Estadual estabele-
ceu base de cálculo específica para a hipó-
Brasília, 31 de outubro de 1994 — Néri tese de incidência em questão.
da Silveira, Presidente—Marco Aurélio,
Relator. A Recorrida trouxe aos autos as contra-
razões de folhas 128 a 131, buscando de-
RELATÓRIO monstrar que o recurso extraordinário dis-
tancia-se da jurisprudência deste Tribunal.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: O Simultaneamente, foi interposto recurso
acórdão impugnado mediante este extraor- especial, que não mereceu acolhimento no
dinário consigna a inexigibilidade do Im- Superior Tribunal de Justiça — acórdão de
posto sobre Circulação de Mercadorias e folhas 153 a 177.
Serviços, considerado o fornecimento de
alimentação, bebidas e outras mercadorias À folha 205 está o parecer da Procura-
em bares, cafés e estabelecimentos simila- doria-Geral da República, que se reporta à
306 R.T.J. — 158

conclusão desta Turma no julgamento do Quanto à contrariedade ao preceito


Recurso Extraordinário n° 129.877, do Es- do artigo 24 da Constituição de 1969,
tado de São Paulo e cujo acórdão foi publi- verifica-se que a Lei Estadual n°
cado no Diário de 27 de novembro de 1992. 5.886/87, veio a preencher lacuna legis-
É o relatório. lativa quanto à base de cálculo do Im-
posto sobre Circulação de Mercadorias,
VOTO considerado o fornecimento de bebidas
e alimentação por bares, cafés, restau-
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Rela- rantes e similares. A indefinição da Lei
tor): Os pressupostos gerais de recorribili- Estadual n° 440/84 restou suplantada.
dade foram atendidos, cabendo, portanto, o Previu-se a incidência sobre o valor da
exame do específico, indicado como sendo operação, ou seja, o valor total cobrado
o previsto na alínea a do inciso III do artigo do adquirente. O que veiculado no ex-
102 da Constituição Federal. traordinário parte da competência dos
Sob o prisma da Lei n° 5.886/87, do Municípios para instituir o Imposto so-
Estado de São Paulo, como ocorre na hipó- bre Serviços. A teor do dispositivo cons-
tese dos autos, tive oportunidade de con- titucional em comento — inciso II do
signar: artigo 24 — compete aos Municípios
instituir impostos sobre os serviços de
De início, excluo o exame quanto ao qualquer natureza não compreendidos
fato de a base de cálculo do Imposto na competência tributária da União ou
sobre Circulação de Mercadorias não do Estado, definidos em lei complemen-
haver sido definida mediante lei com- tar. Assim, cumpre perquirir se, no caso
plementar. É que, como aduzido na im- concreto, configura-se o desrespeito à
pugnação ao extraordinário e no parecer delimitação da atividade legiferante.
do Ministério Público Federal, o tema
não foi preqüestionado. O acórdão que A Lei n° 5.886/87 não dispõe relati-
se almeja infirmar não contém uma úni- vamente ao Imposto sobre Serviços,
ca linha sobre a matéria, não havendo, mas quanto ao Imposto sobre Circula-
assim, sob tal ângulo, o que cotejar com ção de Mercadorias, frente ao forneci-
os artigos 19, inciso I, e 153, 29, da mento de bebidas e alimentação por ba-
Constituição Federal anterior, para di- res, cafés, restaurantes e estabelecimen-
zer-se da contrariedade alegada. Diz-se tos similares. O fato exclui, por si só, a
preqüestionado o fato jurígeno quando possibilidade de conclusão em tomo
o Órgão julgador haja adotado entendi- da violência direta ao preceito constitu-
mento explícito a respeito, incumbindo cional.
à parte sequiosa de ver o processo guin- Contudo, aponta-se que a base de
dado à sede extraordinária instá-lo à incidência eleita engloba valor relativo
emissão de juízo. Para tanto, a ordem à prestação de serviços, pois o total co-
jurídica prevê recurso próprio — os em- brado ao cliente visa atender, também, a
bargos declaratórios. A inexistência do esta última. No particular, a matéria não
debate e decisão prévios impede a feitu- possui disciplina constitucional. A ri-
ra do cotejo indispensável a que se diga gor, está prevista no Decreto-Lei federal
do atendimento ao pressuposto de recor- n° 406/68, que revela como fato gerador
ribilidade específico. A necessidade de do imposto sobre operações relativas à
proceder-se a este último informa a ra- circulação de mercadorias o forneci-
zão de ser do instituto. mento de alimentação, bebidas e outras
R.T.J. —158 307

mercadorias — artigo 1°, inciso III e, 1988, concluiu de forma favorável ao Esta-
diante da notória dificuldade em sepa- do. Eis a ementa do acórdão:
rar-se os valores correspondentes aos
«Tributário. ICMS. Acórdão do Tri-
serviços, dispõe que «o fornecimento de bunal de Justiça do Estado de São Paulo
mercadorias com prestação de serviços que considerou legítima a exigência do
não especificados na lista fica sujeito ao tributo na operação de fornecimento de
imposto sobre circulação de mercado- alimentos e bebidas consumidas no pró-
rias» — § 2° do artigo 8°. A lista citada prio estabelecimento do contribuinte, de
não contempla a hipótese, o que revela conformidade com a Lei n° 6.374, de 1°
que a Lei Estadual n° 5.886 está em de março de 1989. Alegada afronta aos
harmonia com o preceituado, sendo que arts. 34, §§ 5° e 8°, do ADCT/88; 146,
o benefício alcançado pelos Estados e, III; 150, I; 155, I, B e § 2°, IX e XII; e
assim mesmo, de forma parcial, por- 156, IV, do texto permanente da Carta
quanto os Municípios contam com vinte de 1988.
e cinco por cento do que arrecadado a
título de Imposto sobre Circulação de Alegações improcedentes.
Mercadorias (artigo 158, inciso IV, da Os dispositivos do inc. I, b e do § 2°,
Carta atual), é contrabalançado pelo sis- inc. IX, do art. 155 da CF/88 delimitam
tema legal da reciprocidade. Em relação o campo de incidência do ICMS: opera-
aos serviços constantes da lista, ainda ções relativas à circulação de mercado-
que a envolver fornecimento de merca- rias, como tais também consideradas
dorias, tem-se, tão-só, a incidência do aquelas em que mercadorias forem for-
Imposto sobre Serviços — § 1° do artigo necidas com serviços não compreendi-
8° do Decreto-Lei n° 406/68. O equilí- dos na competência tributária dos Mu-
brio é perfeito e, na verdade, possui nicípios (caso em que o tributo incidirá
contornos práticos. Somente à mercê de sobre o valor total da operação).
inúmeras inconveniências poder-se-ia Já o art. 156, IV, reservou à compe-
implementar a separação do que pago a tência dos Municípios o Imposto sobre
ambos os títulos — serviços e forneci- Serviços de qualquer natureza, (ISS),
mento. não compreendidos no art. 155, I, b,
A prevalecer o enfoque da Recorren- definidos em lei complementar.
te, alcançada será cômoda situação. Pelo Conseqüentemente, o ISS incidirá
fornecimento de alimentação e bebidas, tão-somente sobre serviços de qualquer
ficarão os integrantes da categoria eco- natureza que estejam relacionados na lei
nômica isentos do pagamento quer do complementar, ao passo que o ICMS,
Imposto sobre Circulação de Mercado- além dos serviços de transporte, interes-
rias, quer do Imposto sobre Serviços, tadual e intermunicipal, e de comunica-
face à ausência de previsão na lista do ções, terá por objeto operações relativas
Decreto-Lei mencionado. à circulação de mercadorias, ainda que
as mercadorias sejam acompanhadas de
Recentemente, em 19 de outubro de prestação de serviço, salvo quando o
1993, a egrégia Primeira Turma, defrontan- serviço esteja relacionado em lei com-
do-se com hipótese que versava já então plementar como sujeito a ISS.
sobre a Lei n° 6.374, de 1° de março de Critério de separação de competên-
1989, e respectiva conformação à Carta de cias que não apresenta inovação, por-
308 R.T.J. — 158

quanto já se achava consagrado no art. do conflito quanto à competência para tri-


8°, §§ P e 2°, do Decreto-Lei n° 406/68. butar. Daí o artigo 146, inciso I, da Carta
Precedente da 2' Turma, no RE Federal disciplinar que cabe à lei comple-
129.877-4-SP. mentar dispor sobre conflitos de competên-
O Estado de São Paulo, por meio da cia, em matéria tributária entre a União, os
Lei n° 5.886/87, havia legitimamente Estados, o Distrito Federal e os Municí-
definido, como base de cálculo das ope- pios. Fosse a alínea b do inciso I do artigo
rações em tela, o valor total cobrado do 155 norma exaustiva no tocante à possibi-
adquirente. Fixada, todavia, pela Carta lidade de incidir o ICMS sobre valores que
de 1988, a exigência de que a definição englobem a remuneração da prestação de
desse elemento deveria ser feita por serviços, não haveria motivo para remeter-
meio de lei complementar federal (art. se à lei complementar, quer relativamente
146, III, b), as unidades federadas, en- à definição das hipóteses de incidência do
quanto no aguardo da iniciativa do legis- Imposto sobre Serviços, quer no que con-
lador federal, valendo-se da faculdade cerne aos conflitos de competência, em
prevista no art. 34, § 8°, do ADCT/88, questão tributária, entre Estados e Municí-
regularam provisoriamente a matéria pios. É mister salientar, como consta do
por meio do Convênio n° 66/88. precedente da Primeira Turma, que, na au-
sência da lei complementar de que cogita o
Com apoio no referido documento, Diploma Maior, os Estados acionaram a
editaram os legisladores paulistas a regra do § 8° do artigo 34 do Ato das
nova Lei n° 6.374/89, por meio da qual Disposições Constitucionais Transitórias,
ficou o Estado habilitado à tributação no sentido de que:
das operações em referência, inexistin-
do espaço para argüições de inconstitu- «Se no prazo de 60 dias contados da
cionalidade ou ilegalidade. promulgação da Constituição não for
editada a lei complementar necessária à
Recurso não conhecido» (Relator instituição do imposto de que trata o
Ministro limar Gaivão, Primeira Turma, artigo 155, I, b, os Estados e o Distrito
decisão unânime, acórdão publicado no Federal, mediante convênio celebrado
Diário da Justiça de 12 de novembro nos termos da Lei Complementar n° 24,
de 1993). de 7 de janeiro de 1975, fixarão normas
E assim realmente o é. Se é certo que o para regular provisoriamente a maté-
inciso IV do artigo 156 da Constituição ria».
Federal preceitua competir aos Municípios
instituir imposto sobre serviço de qualquer Foi editado, então, o Convênio n° 66, de
natureza, há de se ter em conta a vinculação 14 de dezembro de 1988, que estabeleceu a
compeendida no inciso: «definidos em lei incidência do ICMS sobre o fornecimento
complementar». Pois bem, além da ressal- de alimentação, bebidas e outras mercado-
va dos serviços contemplados na alínea b rias em bares, cafés e estabelecimentos si-
do inciso I do artigo 165 — de transporte milares, considerado o valor total, ou seja,
interestadual e intermunicipal e de comuni- o atinente às mercadorias, em si, e aos
cação, ainda que as operações e as presta- serviços prestados, posto que, na prática, a
ções se iniciem no exterior —podem surgir separação transparece inviável. Daí o Esta-
situações ambíguas, como a do forneci- do de São Paulo, no ano seguinte ao da
mento de bebidas e alimentação em bares, celebração do Convênio, haver editado a
cafés e estabelecimentos similares, geran- Lei n° 6.374/89, prevendo a incidência do
R.T.J. — 158 309

ICMS. O que se afigura impossível é enten- com o que dispuser lei estadual, no caso
der que, excetuados os serviços menciona- dos territórios, lei federal».
dos na alínea b do inciso I do artigo 155,
Por tudo, já agora com o precedente da
mostra-se impertinente a cobrança do
Primeira Turma, reafirmo o convencimen-
ICMS no tocante a qualquer outro negócio
to a que cheguei quando, sob a égide da lei
jurídico no que envolva, além de mercado-
anterior do Estado de São Paulo — Lei n°
rias, a própria prestação de serviços. E que
5.886/87, disse da incidência do ICMS —
a norma somente cuida de hipóteses em que
Recurso Extraordinário n° 129.877, cuja
os valores em jogo dizem respeito apenas a
ementa foi publicada no Diário de 27 de
serviços, não englobando, como no caso de
novembro de 1992.
alimentação e bebidas, mercadorias e ser-
viços. O caso revela situação típica de con- Destarte, no que a Corte de origem as-
flito entre Estados e Município, abrindo-se sentou a impropriedade constitucional da
ensejo à definição que, na espécie, ocorreu cobrança, vulnerou a Constituição Federal.
com supremacia da circulação, em si, das Conheço deste recurso e o provejo para,
mercadorias, talvez mesmo por envolver o reformando o acórdão proferido, assentar a
valor preponderante. O que não se pode improcedência do pedido formulado pela
agasalhar é a tendência de concluir-se pela Recorrida, ficando restabelecidos os ônus
necessidade de separação dos quantitati- da sucumbência previstos na sentença de
vos, sob pena de bares, restaurantes e esta- folhas 54 a 64.
belecimentos similares, uma vez que não É como voto.
ocorrida a separação, estarem desobrigados
do ICMS e do ISS. Frise-se, mais uma vez, EXTRATO DA ATA
que o referido serviço de fornecimento não
está compreendido no rol daqueles mencio-
nados no Decreto-Lei Federal n° 406/68 RE 160.871 — SP — Rel.: Min. Marco
como ensejadores da incidência do ISS. Tal Aurélio. flecte.: Estado de São Paulo
fato não implica a ausência de participação (Adv.: Eli Roberto Costa Neves Buchala).
dos Municípios. É que, a teor do inciso IV Recdo.: Eduardo's Park Hotel Limitada
do artigo 158 da Constituição Federal, per- (Advs.: Afonso da Costa Manso Filho e
tencem aos Municípios vinte e cinco por outro).
cento do produto da arrecadação do impos- Decisão: Por unanimidade, a Turma co-
to do Estado sobre operação alusivas à cir- nheceu do recurso e lhe deu provimento,
culação de mercadorias e sobre prestações nos termos do voto do Relator.
de serviços de transporte interestadual e Presidência do Senhor Ministro Néri da
intermunicipal e de comunicações, haven- Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
do o crédito consoante definido no parágra- Ministros Carlos Velloso e Marco Aurélio.
fo único naquele artigo: Ausente, justificadamente, o Senhor Mi-
«três quartos no mínimo na propor- nistro Francisco Rezek. Subprocurador-
ção do valor adicionado nas operações Geral da República, o Dr. Antonio Fernan-
relativas às operações de mercadorias e do Barros e Silva de Souza.
nas prestações de serviços realizada em Brasília, 31 de outubro de 1994 — José
seus territórios e um quarto de acordo Wilson Aragão, Secretário.
310 R.T.I. — 158

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 161.122 — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio


Recorrente: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Recorrido:
Manoel Roque Filho
Precatório — Crédito de natureza alimentícia. Na dicção da
ilustrada maioria, em relação à qual continuo guardando reservas, a
norma inserta no artigo 100 da Constituição Federal não exclui do
regime dos precatórios os créditos de natureza alimentícia. 114 de se
observar, apenas, ordem de satisfação que somente os envolva — Ação
Direta de Inconstitucionalidade n° 47-1, relatada pelo Ministro Octavio
Gallotti, cujo acórdão foi publicado no Diário da Justiça de 9 de setembro
de 1991
ACÓRDÃO O Recorrido trouxe aos autos razões de
contrariedade, estando às folhas 132 e 133
Vistos, relatados e discutidos estes au- a decisão de admissibilidade do extraordi-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- nário.
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- O Ministério Público opina no sentido
formidade da ata do julgamento e das notas de se negar seguimento ao recurso extraor-
taquigráficas, por unanimidade de votos,
dinário.
em conhecer do recurso e lhe dar provimen-
to, nos termos do voto do Relator. Recebi os presentes autos para exame
em 22 de setembro de 1994, liberando-os
Brasília, 8 de novembro de 1994 —
Néri da Silveira, Presidente — Marco em 17 do mês seguinte.
Aurllio, Relator É o relatório.

RELATÓRIO VOTO
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Rela-
O Sr. Ministro Marco Aurélio: A Cor- tor): Na interposição do recurso foram
te de origem assentou que a primeira parte atendidos os pressupostos de recorribilida-
do artigo 100 da Constituição Federal ex- de que lhe são inerentes. Está subscrito por
cetua do sistema dos precatórios a satisfa- Procurador Autárquico, não se podendo co-
ção dos créditos de natureza alimentícia. gitar de preparo, em face à norma inserta
Concluiu, assim, que, uma vez procedido no artigo 511 do Código de Processo Civil.
o enquadramento como tal, cabe a satis- Quanto à oportunidade, a peça recursal foi
fação imediata. protocolada no prazo legal.
O Instituto, com a peça de folhas 109 a Relativamente à matéria de fundo, o Ple-
113, subscrita por Procurador Autárquico, nário desta Corte, ao julgar a Ação Direta
procura demonstrar que tal entendimento de Inconstitucionalidade n° 47-1, concluiu
conflito com o preceito constitucional, que também os créditos de natureza ali-
transcrevendo precedentes em abono à mentícia estão sujeitos ao pagamento pela
tese. via do precatório. Na ocasião, fiquei venci-
R.T.J. — 158 311

do, na companhia honrosa dos Ministros É o meu voto.


Carlos Velloso e Sepúlveda Pertence. En-
tendeu-se que, na espécie, cuida-se, tão- EXTRATO DA ATA
somente, da origem própria de atendimen-
to aos precatórios, distinguindo-se entre RE 161.122-SP — Rel.: Min. Marco
débitos da Fazenda em geral e aqueles Aurélio. Recte.: Instituto Nacional do Se-
relativos a prestações alimentícias. guro Social — INSS (Advs.: João Durce e
outros). Acedo.: Manoel Roque Filho
Diante do alcance do artigo 100, defini- (Advs.: Mauro Lúcio Alonso Carneiro e
do pelo Plenário, tenho como enquadrado outros).
este recurso na alínea a do inciso III do
artigo 102 da Lei Básica. O Tribunal a quo, Decisão: Por unanimidade, a Turma co-
ao concluir pelo direito do Recorrido ao nheceu do recurso e lhe deu provimento,
pagamento imediato, olvidou o teor do ar- nos termos do voto do Relator.
tigo 100 em comento. Conheço do recurso Presidência do Senhor Ministro Néri da
interposto e o provejo para, reformando o
Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
acórdão recorrido, assentar que se observa-
Ministros Carlos Velloso, Marco Aurélio e
rá, no caso, a modalidade de pagamento do Francisco Rezek. Subprocurador-Geral da
débito, considerado o valor real, revelada República, o Dr. Mardem Costa Pinto.
pelo precatório, atendida ordem própria
que apenas envolva créditos de natureza Brasília, 8 de novembro de 1994 —Jose
alimentícia. Wilson Aragão, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 161.311 — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira


Recorrentes: Maria Angela da Silva Sordi Marchi e outros — Recorrido:
Estado de São Paulo
Recurso extraordinário. Adicional por tempo de serviço. Lei
estadual. Lei Complementar paulista n° 645/1989. Pretensão a que se
aplique o sistema da lei nova, considerando já incorporados aos venci-
mentos os adicionais por tempo de serviço. 2. Ação julgada improceden-
te. 3. Adotado o novo sistema de cálculo de remuneração com base na
Lei Complementar n° 645/1989 e na Lei n° 6.628/1989, ambas do Estado
de São Paulo, não é possível pretenderem os servidores que sua retribui-
ção, disciplinada pelas leis novas, permaneça, também, vinculada ao
regime de cálculo da legislação anterior, quanto aos adicionais por tempo
de serviço. 4. Constituição Federal art. 37, XV. ADCT de 1988, art. 17.
5. Não há, na espécie, cogitar de direito adquirido a uma certa forma de
cálculo de vantagens funcionais. Relevante é registrar, no caso, que os
adicionais por tempo de serviço continuarão a ser computados, segundo
a forma estipulada na lei nova. 6. Hipótese em que as instâncias ordiná-
312 R.T.J. — 158

rias dirimiram a controvérsia com base, também, na exegese da legisla-


ção local. Súmula n° 280. 7. Inocorrência de ofensa à Constituição
Federal. 8. Recurso extraordinário não conhecido.

ACÓRDÃO processamento o ilustre 3° Vice-Presidente


do Tribunal de Justiça paulista (fl. 302).
Vistos, relatados e discutidos estes au- Oficiando nos autos, opinou a Procura-
tos, acordam os Ministros da Segunda Tur- doria-Geral da República, no parecer de fl.
ma do Supremo Tribunal Federal, na con- 309, pelo não conhecimento do recurso
formidade da ata do julgamento e notas extraordinário.
taquigráficas, por unanimidade, não conhe-
cer do recurso, nos termos do voto do Mi- É o relatório.
nistro Relator.
VOTO
Brasília, 26 de junho de 1995 — Néri
da Silveira, Presidente e Relator. O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela-
tor): Os autores, funcionários estaduais,
RELATÓRIO pertencentes ao Quadro do Magistério do
Estado de São Paulo, possuidores de adi-
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- cionais por tempo de serviço, aforaram de-
tor): Trata-se de recurso extraordinário, in- manda contra o Estado de São Paulo vindi-
terposto por funcionários estaduais, inte- cando seja efetuado seu reenquadramento,
grantes do Quadro do Magistério do Estado <mos termos dos arts. 1° e seguintes das
de São Paulo, com fundamento no art. 102, Disposições Transitórias da Lei Comple-
inciso III, alíneas a e c da Constituição, mentar n° 645/89, mas cumprindo-se os
visando reformar acórdão do Tribunal de ditames constitucionais, insculpidos no art.
Justiça do mencionado Estado (fls. 129 da Constituição Estadual, ou seja, não
282/290). retirando os pontos de adicional por tempo
Sustentam os recorrentes que o aresto de serviço da soma para enquadramento,
em comento, mantendo decisão do juízo uma vez que os mesmos estão incorporados
de primeiro grau, que lhes negou a 'con- aos vencimentos para todos os efeitos le-
cessão de adicional por tempo de serviço, gais, não podendo, pois, serem subtraídos»
já incorporado aos respectivos vencimen- (fl. 18).
tos, ao promover o reenquadramento pre- 2. A ação foi julgada improcedente em
visto na Lei Complementar n° 645, de ambas as instâncias, acentuando-se, no
1989, que instituiu novo sistema de retri- acórdão do colendo Tribunal de Justiça de
buição para as classes do Quadro do Ma- São Paulo (fl. 277), verbis:
gistério paulista, vulnerou o art. 37, inci-
so XIV, da Lei Magna, além de julgar <Como salientado ficou na decisão
válida lei local contestada em face da `segundo as regras do art. 2° das Dispo-
Constituição. sições Transitórias da LC 645/89, o
reenquadramento dos autores na escala
Intimado, manifestou o Estado de São de vencimentos foi feito em quatro eta-
Paulo as contra-razões de fls. 292/300. pas: 1) da referência em que cada um
Ao entendimento de que o recurso ex- deles se encontrava, no primeiro mês de
traordinário preenchia os requisitos indis- vigência da nova lei, subtraíram-se as
pensáveis à admissibilidade, deferiu seu referências relativas ao adicional por
R.T.J. — 158 313

tempo de serviço, a progressão funcio- Com essa mesma preocupação de


nal e a sexta parte; 2) ao valor corres- evitar descalabms no tocante a despesas
pondente à referência assim obtida, so- com pessoal, mediante reações em ca-
mou-se o valor da gratificação de magis- deia, no inciso XIV do art. 37, a Consti-
tério respectiva; 3) o valor resultante tuição Federal vedou taxativamente o
dessa soma foi localizado na escala de cômputo de vantagens sobre vantagens,
vencimentos, observado o grau A e a a incidência recíproca de vantagens, o
referência a ele correspondente; 4) a chamado repique de benefícios que pro-
essa nova referência, finalmente, adicio- duziam um extraordinário efeito multi-
nou-se o número de referências, subtraí- plicador sobre a remuneração.»
das na primeira etapa, correspondentes
a progressão funcional e a sexta parte. 3. Não se caracteriza a alegada ofensa
ao art. 37, XIV, da Constituição Federal,
Sobre o valor correspondente a tal que reza:
reenquadramento, que é o valor do ven-
cimento ou salário do cargo ou função «XIV — Os acréscimos pecuniá-
atividade, incide o adicional por tempo rios percebidos pelo servidor público
de serviço, na base de 5% por qüinqüê- não serão computados, nem acumula-
nio, e, sobre a soma desses dois valores, dos, para fins de concessão de acrésci-
incide a sexta parte. mos ulteriores, sob o mesmo título ou
De resto, pacífico na jurisprudência idêntico fundamento.»
o entendimento de que a incorporação Observou, nesse sentido, o parecer da
aos vencimentos, para todos os efeitos, Procuradoria-Geral da República (fl. 309):
do adicional por tempo de serviço e da
sexta-parte concedidos, agora no art. «Em caso idêntico — o RE 168.744-
129 da CE/89, não implica na aquisição 4/210-SP (Rel. Min. Paulo Brossard),
de direitos sobre a forma de cálculo igualmente envolvendo pretensão de
desses benefícios' .» servidores públicos a terem seus cargos
públicos reenquadrados como determi-
Anotou, ainda, o acórdão, com inteira nado pela Lei Complementar Estadual
procedência (fl. 278):
n° 645, de 1989, «mas sem subtrair os
«Já se disse, em outra oportunidade, adicionais por tempo de serviço, que
que no regime estatutário pode o Estado se encontraram incorporados aos venci-
alterar a forma de remuneração de seus mentos, nos termos do art. 129 da Cons-
funcionários, adequando-se aos seus in- tituição Paulista», — o Ministério Pú-
teresses, valorizando determinados blico Federal emitiu parecer assim
componentes da remuneração em detri- ementado: «Art. 37, XIV, da CF: impe-
mento de outros (como vantagens de- de que prospere a pretensão de obter seja
correntes do tempo de serviço, da pres- a Lei Complementar Paulista n° 645/89
tação de serviço em determinadas con- cumprida não segundo rezam seus ter-
dições, etc.). Pode, também, sem ofensa mos, porém, isso sim, como convém aos
a direitos adquiridos, aumentar ou redu- Autores, ou seja, fazendo-se o enqua-
zir o número de referências, de tabelas, dramento que determinou, «mas sem
aproximar faixas ou afastá-las, adotar subtrair os adicionais por tempo de
percentuais maiores ou menores, tudo serviço». Caso precedente semelhante:
conforme política salarial que lhe pareça RE 167.416-4/210-PR (Rel. Min. limar
mais adequada aos seus interesses. Gaivão), julgado 20-9-94».
314 R.T.J. — 158

Ao Recurso Extraordinário n° 168.744- adicionais sobre adicionais sobre sexta


4-SP, negou seguimento o ilustre Ministro parte sobre salário família e reciproca-
Maurício Corrêa, em despacho publicado mente.
no DJ de 12-6-1995, pág. 17559. Significa dizer que só podem ser per-
Adotado o novo sistema de cálculo da cebidos singelamente, sem acumula-
remuneração com base na Lei Complemen- ções ou repiques de qualquer natureza.
tar n° 645/1989 e na Lei n° 6.628/1989, do Não se somam aos vencimentos para a
Estado de São Paulo, não seria possível, tal constituição de base sobre a qual eles
como pretendem os recorrentes, ainda, per- mesmos incidiram.» (in Curso de Direi-
manecerem, no particular, vinculados ao to Constitucional Positivo, pág. 574).
regime de cálculo da legislação anterior No mesmo sentido, a lição de Adilson
(Lei estadual n° 180/78 e Lei Complemen- Abreu Dallari, in Regime Constitucional
tar n°444/1985), tendo sua retribuição, des- dos Servidores Públicos, RT pág. 62.
se modo, disciplinada pela lei nova mas
sem prejuízo de prosseguir em vigor, quan- Não cabe, no ponto, sequer, falar em
to aos adicionais por tempo de serviço, o eventual afronta ao princípio de irredutibi-
sistema precedente. O acórdão bem de- lidade de vencimentos, em face do art. 17
monstrou que essa postulação incidiria, do ADCT:
ademais, na proibição do art. 37, XIV, da «Os vencimentos, a remuneração, as
Lei Maior. vantagens e os adicionais, bem como os
Com efeito, a Lei n° 6.628/89 estabele- proventos de aposentadoria que estejam
ce, em seu art. 18: sendo percebidas em desacordo com a
adicional por tempo de serviço de Constituição serão imediatamente redu-
que trata o art. 129 da Constituição Es- zidos aos limites dela decorrentes, não
tadual será calculado na base de 5% por se admitindo, neste caso, invocação de
qüinqüênio de serviço, sobre o valor dos direito adquirido de percepção ou exces-
vencimentos, do salário e da remunera- so a qualquer título.»
ção não podendo ser computado nem No particular, é de referir que não há
acumulado para fins de concessão de direito adquirido sequer a forma de cálculo
acréscimos ulteriores, sob o mesmo tí- de vantagens funcionais. Garantido o direi-
tulo ou idêntico fundamento, nos termos to à vantagem, a Lei estipulará a forma por
do inciso XVI, do artigo 115 da Consti- que se dá o cálculo respectivo.
tuição do Estado.» Os percentuais referidos na Lei Comple-
Sobre essa matéria anotou José Afonso mentar n° 556/88, art. 10, § 1°, possuíam a
da Silva: seguinte expressão:
«Os acréscimos pecuniários ao pa- «Art. 10. As vantagens pecuniá-
drão de vencimentos dos servidores pú- rias a que se refere o artigo em questão
blicos são admitidos pela Constituição, anterior são as seguintes:
ainda que deles trate para estabelecer
limites, vedando seu cômputo ou acu-
mulação, para fins de concessão de § 1° O adicional por tempo de ser-
acréscimos ulteriores, sob o mesmo tí- viço a que alude o inciso I, sempre con-
tulo ou idêntico fundamento. É a proibi- cedido a cada período de 5 (cinco) anos
ção dos chamados repição e repiquís- contínuos ou não, terá seu valor calcula-
simo que consistem na incidência de do mediante aplicação, conforme o ml-
R.T.J. — 158 315

mero de qüinqüênios, de um dos seguin- aos funcionários e nem ofendeu o direito


tes índices percentuais sobre o valor dos adquirido», acrescentando: a pretensão
vencimentos ou salário: cria um sistema híbrido, com os autores
1 qüinqüênio .... 5% percebendo as vantagens nos dois sistemas,
não podendo o Judiciário, que não tem
2 qüinqüênios .... 10,25% função legislativa, conceder as vantagens
3 qüinqüênios .... 15,76% pleiteadas.» Certo é que os adicionais fo-
4 qüinqüênios .... 21,55% ram integralmente mantidos, como anota o
acórdão na Apelação Cível n° 188.039-1/4,
5 qüinqüênios .... 27,63% antes aludida, «mas computados em sepa-
6 qüinqüênios .... 34,01% rado e não considerados na obtenção da
referência.».
7 qüinqüênios .... 40,71%
Na apreciação da matéria, releva, ainda,
8 qüinqüênios .... 47,75%»
observar que, dirimida a controvérsia nas
Se se pode reconhecer que se incorpora instâncias ordinárias, com amplo exame
o direito a qüinqüênios, quando já gozados, das normas locais (Constituição paulista,
não cabe ver direito adquirido a forma de art. 129; Lei Complementar n°645/89), não
cálculo dos qüinqüênios. Ora, a Lei Paulis- cabe, em recurso extraordinário, reanalisar
ta n° 6.628, de 27-12-1989, limitou o adi- o conteúdo desses dispositivos para verifi-
cional a 5% por qüinqüênio (art. 18). Logo, car se lhes conferiu exegese correta a Corte
não cabe a incidência de percentual mais mais alta do Estado-membro. Invocável é,
elevado, com base em alegação de direito na espécie, também, a Súmula 280. Em
adquirido a outra forma de cálculo de van- realidade, sem o exame acurado dessa le-
tagem. O art. 18 referido preceitua que o gislação local, não haveria inclusive como
adicional por tempo de serviço não pode ser concluir diferentemente do que decidiu o
computado nem acumulado para fins de acórdão recorrido, quanto a afastar-se, no
concessão de acréscimos ulteriores na linha caso, o denominado «efeito cascata», veda-
do art. 115, XVI, da Carta Paulista de 1989. do pelo art. 37, XIV, da Constituição, e art.
Não há prova nos autos de redução dos 17 do ADCT.
vencimentos, quando da aplicação da Lei
n° 6.628/1989 e mudança da forma de cál- O art. 129 que prevê a incorporação aos
culo dos adicionais por tempo de serviço. vencimentos para todos os efeitos manda
observar o disposto no art. 115, XV, da
4. Relevante é registrar, na espécie, que Constituição paulista, que é mera repetição
os adicionais por tempo de serviço quanto do art. 37, XIV.
à sexta parte continuarão a ser computados,
segundo a forma de cálculo estipulada na Não é possível, efetivamente, tomar
lei nova suso referida. No ponto, não de- como base de cálculo dos novos acrésci-
monstram os autores, sequer, haja sucedi- mos, a título de gratificação adicional, a
do, com a incidência da lei nova, redução retribuição básica aduzida com os acrésci-
do valor da remuneração ou dos proventos mos preexistentes, ou seja, os adicionais
percebidos, à época da implantação da Lei subseqüentes não podem incidir sobre o
Complementar n° 645/1989. Como decidiu vencimento básico e os valores dos adicio-
o colendo Tribunal a quo, na Apelação nais antecedentes, nesse vencimento básico
Cível n° 188.039-1/4, «cumprindo o art. incorporado.
129 da Constituição Estadual, a Lei Com- A Lei Paulista n° 6.628, de 1989, con-
plementar n° 645/89 não trouxe prejuízos forme acentuou a Corte a quo, na Apelação
316 R.T.J. — 158

Cível n° 176.971-1/4, «nada mais fez do cálculo da gratificação por tempo de servi-
que se colocar em harmonia com os dispo- ço de acordo com a legislação pretérita.
sitivos da Constituição Federal e Estadual Acompanho V. Exa. no voto que profe-
de São Paulo no que pertine à sistemática riu. Configurado o cálculo cumulativo da
de cálculo da remuneração do funcionalis- parcela, bem andou a Corte de origem ao
mo, a salvo de qualquer alegação de direito glosá-lo.
adquirido e sem embargo da redutibilidade
dos vencimentos, não tendo, dentro de tal EXTRATO DA ATA
quadro, pertinência alguma a asserção da
impossibilidade de leis complementares RE 161.311 — SP — Rel.: Min. Néri da
serem modificadas por lei de hierarquia Silveira. Rectes.: Maria Angela da Silva
inferior. Sordi Marchi e outros (Advs.: Brasil do
Do exposto, não conheço do recurso Pinhal Pereira Salomão e outros). Recdo.:
extraordinário. Estado de São Paulo (Advs.: Fernando
Wagner Fernandes Marinho e outros).
VOTO (PRELIMINAR)
Decisão: Por unanimidade, a Turma não
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor conheceu do recurso extraordinário.
Presidente, só tive uma dúvida quanto ao
Presidência do Senhor Ministro Néri da
objetivo visado, porque há uma situação no
Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
Estado de São Paulo em que se versa pro-
Ministros Carlos Velloso, Marco Aurélio,
moção, e se pretende considerar, justamen-
Francisco Rezek e Maurício Corrêa. Sub-
te, o patamar alcançado e mantido pelo
procurador-Geral da República, o Dr. Mar-
Estado, como um direito adquirido, para
dem Costa Pinto.
chegar-se a ela. Todavia, V. Exa. explicita
que não é essa a hipótese dos autos. O que Brasília, 26 de junho de 1995 — Wag-
se pleiteia, realmente, é a continuidade do ner Amorim Madoz, Secretário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 161.523 (AgRg) — CE


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio


Agravante: Estado do Ceará — Agravados: José dos Santos e outros
Proventos — Reserva remunerada. Os proventos são calcula-
dos com base na situação concreta do policial militar e, portanto, em
consonância com a ordem jurídica em vigor à época. Supressão de certa
parcela relativamente ao pessoal em atividade não tem o condão de
retroagir a ponto de alcançar situação jurídica já definida. A discrepân-
cia entre os proventos satisfeitos e o que percebido pelo pessoal na ativa
não sofre a glosa, no caso, quer da norma insculpida no 2° do artigo
102 da Constituição Federal de 1969, quer dos preceitos de que cuidam
os artigos 39, § 1°, e 40, § 4°, da atual.
R.T.J. — 158 317

ACÓRDÃO rador do Estado, sendo que a decisão ata-


Vistos, relatados e discutidos estes au- cada teve notícia veiculada no Diário de 2
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- de agosto de 1994 — terça-feira (folha 35)
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- — e a protocolação do recurso no dia 9
formidade da ata do julgamento e das notas imediato — terça-feira (folha 36) — por-
taquigráficas, por unanimidade de votos, tanto, dentro do prazo em dobro a que tem
em negar provimento ao agravo regimen- jus o Estado
tal.
No mérito, valho-me do que tive opor-
Brasília, 14 de novembro de 1994 — tunidade de consignar quando apreciei o
WH da Silveira, Presidente — Marco inconformismo revelado no agravo:
Aurélio, Relator.
O § 2° do artigo 102 da Lei Básica
RELATÓRIO anterior obstaculizava a percepção de
proventos em quantitativo superior à re-
O Sr. Ministro Marco Aurélio: O Es- muneração havida na atividade. Ao que
tado do Ceará, mediante as razões de folhas tudo indica, no caso vertente, os Agra-
37 a 40, insiste em asseverar que o acórdão vados, quando em atividade, vinham
prolatado pela Corte de origem, impugnado percebendo a parcela que se pretende
via o extraordinário, discrepa da norma do excluída, tanto assim que integrou os
§ 2° do artigo 102 da Carta pretérita, bem cálculos feitos para saber-se o valor dos
como dos artigos 39, § 1°, e 40, § 4°, da proventos. Destarte, não guarda perti-
atual. Em síntese, assentou o Tribunal de nência com a hipótese o aludido precei-
Justiça do Estado do Ceará que os Agrava- to. Afastada esta argumentação do Esta-
dos têm direito adquirido à percepção dos do do Ceará, cai por terra a alegação de
proventos da aposentadoria considerada a que se teria admitido como direito inte-
gratificação de representação, extinta após grado ao patrimônio dos Agravados o
a inatividade. Sustenta-se que, a persistir tal concernente à totalidade dos proventos,
entendimento, os inativos perceberão porque a glosa levada a efeito seria fruto
quantia superior à recebida pelo pessoal da da impossibilidade de perceber-se,
ativa. quando inativo, proventos superiores à
Recebi os presentes autos para exame remuneração alcançada em atividade.
em 22 de agosto de 1994, liberando-os para Em face os parárnetros da decisão ataca-
apreciação deste regimental em 14 de outu- da, não há como dizer-se da violência
bro de 1994, tendo sido ultrapassado o pra- aos citados dispositivos constitucionais.
zo regimental de trinta dias em razão da Acrescento que a Corte de origem disse
atividade simultânea desenvolvida nesta da impossibilidade de a situação concreta
Corte e no Tribunal Superior Eleitoral. definida relativamente aos Agravados ser
É o relatório. alcançada por lei que extinguiu a gratifica-
ção em comento. Os Agravados passaram
VOTO para a reserva remunerada quando em vigor
a Lei n° 11.167/86, do Estado do Ceará
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Rela- (folha 14). Por outro lado, não cabe articu-
tor): Na interposição deste agravo foram lar com as normas do § 4° do artigo 40 e do
observados os pressupostos de recorribili- § 1° do artigo 39, ambos da Constituição
dade que lhe são próprios. A petição de Federal em vigor. É que a isonomia busca-
encaminhamento está subscrita por Procu- da em tais dispositivos pressupõe a iguala-
318 R.T.J. — 158

ção de situações, o que não ocorre na hipó- Decisão: Por unanimidade, a Turma ne-
tese dos autos no que, à época em que gou provimento ao agravo regimental.
transferidos para a inatividade, os Agrava-
dos contavam com a citada gratificação, Presidência do Senhor Ministro Néri da
extinta posteriormente. Por tais razões, Silveira. Presente à Sessão o Senhor Minis-
nego provimento a este agravo regimental. tro Marco Aurélio. Ausentes, justificada-
É o meu voto. mente, os Senhores Ministros Carlos Vel-
loso e Francisco Rezek. Compareceu, para
EXTRATO DA ATA complementar o «quorum'», o Senhor Mi-
nistro limar Gaivão. Subprocurador-Geral
Ag 161.523 (AgRg) — CE —Rel.: Min. da República, o Dr. Cláudio Lemos Fonte-
Marco Aurélio. Agte.: Estado do Ceará les.
(Adv.: Stelio Lopes Mendonça Júnior).
Agdos.: José dos Santos e outros (Adv.: Brasília, 14 de novembro de 1994 —
Mauro Carmélio Santos Costa Júnior). José Wilson Aragão, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 162.232 (AgRg) — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Paulo Brossard


Agravante: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Agravado: José
Fernandes Ribas
Previdência Social. Benefício previdenciário. Vinculação
constitucional. Auto-aplicabilidade.
O preceito inserto no art. 201, 00 5° e 6°, da Constituição
Federal é auto-aplicável, porque se qualifica como estrutura jurídica
dotada de suficiente densidade normativa.
O disposto no 0 5° do art. 195 da Constituição Federal não
constitui óbice à sua incidência, vez que é dirigido ao legislador ordiná-
rio, tão-somente no que vincula a criação, majoração ou extensão de
benefício ou serviço da seguridade social à correspondente fonte de
custeio.
Precedentes.
Agravo regimental a que se nega provimento.

ACÓRDÃO formidade da ata do julgamento e das notas


taquigráficas, negar provimento ao agravo
Vistos, relatados e discutidos estes au- regimental.
tos, acordam os Ministros componentes da Brasília, 22 de junho de 1993 — Néri
Segunda Turma do Supremo Tribunal Fe- da Silveira, Presidente — Paulo Bros-
deral, por unanimidade de votos e na con- sard, Relator.
R.T.J. — 158 319

RELATÓRIO 5° somente pode ser interpretada se conju-


O Sr. Ministro Paulo Brossard: Cui- gada com a do art. 59 do ADCT. Portanto,
da-se de agravo regimental interposto con- somente com o advento da Lei n° 8.213/91,
tra decisão denegatória que proferi nos au- que as regulamentou, esses dispositivos
tos do extraordinário, verbis: vieram a ter eficácia plena. E isto porque,
«Trata-se de recurso extraordinário para a fruição do direito garantido pelo
no qual a recorrente sustenta violação preceito constitucional, o legislador consti-
aos arts. 201, e seus parágrafos, e 195, § tuinte fez depender da vontade integrativa
5°, da Constituição Federal, e ao art. 59 do legislador ordinário.
do ADCT, ao argumento de que a majo- Acresce, em apoio a sua tese, que a
ração de benefício previdenciário de- imperatividade do comando contido no §
penderia da criação da respectiva fonte 5°, tanto do artigo 195, quanto do art. 201,
de custeio, e, assim, a norma constitu- da Constituição Federal, cria um liame de
cional inserta no art. 201, §§ 5° e 6°, não dependência da lei regulamentadora, de
tem aplicação imediata. sorte a inexistir qualquer razão jurídica
A questão já foi dirimida pela 2' Tur- para se conferir auto-aplicabilidade a um
ma desta Corte no sentido de que as deles.
regras contidas nos §§ 5° e 6° do artigo Após transcrever jurisprudências dos
201 da Constituição Federal têm aplica- Tribunais Regionais Federais, traz à cola-
ção imediata. O disposto no § 5° do ção o despacho proferido nos autos do
artigo 195 não as condiciona, já que Mandado de Injunção 215-1/RS, Relator
dirigido ao legislador ordinário, no que Ministro Celso de Melo, que assevera ser
vincula a criação, majoração ou exten- diametralmente oposto às decisões exara-
são de benefício ou serviço da segurida- das.
de social à correspondente fonte de cus-
teio total. Requer, a final, seja reconsiderada a de-
cisão proferida.
Precedentes: Ag(AgRg) 148.401-3,
148.309-2, 148.407-2, 148.342-4, É o relatório.
148.455-2, Relator Ministro Marco VOTO
Aurélio, acórdão publicado no DJ de 26
de março de 1993; Ag(AgRg) (Mel) O Sr. Ministro Paulo Brossard (Rela-
148.641-5, 148.643-1, 148.658-0, Rela- tor): A questão acerca da auto-aplicabilida-
tor Ministro Carlos Velloso, julgado em de do art. 201, §§ 5° e 6°, da Constituição
11 de maio de 1993; Ag(AgRg) Federal, já foi dirimida por esta Turma,
152.411-2, 152.407-4, 152.471-6, oportunidade em que se fumou o entendi-
152.394-9, 162.212-2, 152.388-4, Rela- mento no sentido de sua eficácia plena,
tor Ministro Néri da Silveira, julgado visto que esse preceito constitucional qua-
em 14 de maio de 1993. lifica-se como estrutura jurídica dotada de
suficiente densidade normativa, a tomar
Ante o exposto, com base no art. 21, prescindível qualquer mediação legislati-
§ 1°, do RISTF, nego seguimento ao va concretizadora do comando nele positi-
recurso.» vado. Quando a Constituição, em seu § 5°
No agravo regimental interposto, sus- do art. 201, diz que «nenhum benefício que
tenta a recorrente que o entendimento ex- substitua o salário de contribuição ou o
ternado não pode prevalecer, posto que a rendimento de trabalho do segurado terá
norma constitucional inserta no art. 195, § valor mensal inferior ao salário mínimo»
320 R T.J. — 158

estabeleceu um estalão abaixo do qual fica O precedente indicado pelo agravante


vedado descer. Em caso algum. De modo — Mandado de Injunção n° 215-1/RS, Re-
que o legislador, querendo ou não, está lator Min. Celso de Melo — não o socorre
agrilhoado a esse critério certo, definido, em sua tese, vez que aquela decisão não
inquestionável, conhecido, com força pró- apreciou o mérito do writ. Este não foi
pria para imperar e obstar, sem o auxílio de conhecido porque a norma reclamada pelos
lei, que nesta parte é inteiramente desneces- impetrantes — o plano de benefício e de
sária, porque se sabe que nenhum benefí- custeio da Previdência Social — já havia
cio, nenhum, que substitua o salário de sido encaminhada pelo Poder Executivo da
contribuição ou o rendimento de trabalho, União ao Congresso Nacional. Instaurado
nenhum, será inferior a salário mínimo. o necessário processo legislativo, não havia
Portanto, não se concebe a pretensão recur- mais como atribuir ao Estado a inertia
sal que busca condicionar a aplicabilidade agendi vel deliberandi.
do art. 201, §§ 5° e 6°, da Constituição, quer Nego provimento ao agravo regimental.
à edição de lei, quer à implantação progres-
siva dos planos de custeio e de benefício, EXTRATO DA ATA
nos termos fixados pelo art. 59 do ADCT-
CF/88. A norma constitucional suscitada, RE 162.232 (AgRg) — SP —Rel.: Min.
por ser bastante em si, não reclama integra- Paulo Brossard. Agte.: Instituto Nacional
ção legislativa, tendo plena eficácia. do Seguro Social — INSS (Advs.: Vilma
Westmann Anderlini e outros). Agdo.: José
Assim, como têm decidido ambas as Fernandes Ribas (Adv.: Ines Muniz Bar-
Turmas desta Corte, o disposto no § 5° do bosa).
art. 195, da Constituição, não constitui óbi-
Decisão: Por unanimidade, a Turma ne-
ce à incidência das regras dos §§ 5° e 6° do
gou provimento ao agravo regimental.
art. 201, já que dirigido ao legislador ordi-
nário, no que vincula a criação, majoração Presidência do Senhor Ministro Néri da
ou extensão de benefício ou serviço da Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
seguridade social à correspondente fonte Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso,
de custeio (Ag(AgRg) n° 148.258/CS, Marco Aurélio e Francisco Rezek. Subpro-
148.239-7/RS, 148.309-2/SC, 148.005- curador-Geral da República, o Dr. Mardem
1/SC, dentre outros julgados em sessão de Costa Pinto.
9-3-1993, Segunda Turma, Ag (AgRg) Brasília, 22 de junho de 1993 — José
148.456-SC, Primeira Turma). Wilson Aragão, Secretário.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 163.936 (AgRg) — RS


(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Octavio Gallotti
Agravante: Estado do Rio Grande do Sul — Agravados: Paulo Roberto Rosa
dos Santos e outro
Rege-se pelo direito administrativo, compreendido na com-
petência legislativa dos Estados, a obrigação, propriamente dita, da
satisfação de vencimentos e proventos.
R.T.J. — 158 321

Mas, inadimplente o devedor, transforma-se em responsabi-


lidade essa obrigação originária, com novo conteúdo informado pelo
princípio da inteireza do ressarcimento, cuja regência ultrapassa o
campo normativo do direito administrativo, legitimando-se a correção
monetária, pelos critérios do direito comum.

ACÓRDÃO de aplicar o referido preceito — enten-


deu que:
Vistos, relatados e discutidos estes au-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- «Como as vantagens reclamadas
bunal Federal, em Primeira Turma, na con- o tem sido na seara jurisdicional,
formidade da ata do julgamento e das notas cumpre ao Judiciário dispor a respei-
Taquigráficas, à unanimidade de votos, ne- to, e rebusca-se no art. 36 tão-só o
gar provimento ao agravo. princípio constitucional de que os
atrasados devem ser corrigidos. Os
Brasília, 15 de setembro de 1995 — critérios estão vinculados à defasa-
Moreira Alves, Presidente — Octavio gem da moeda. O indicativo constan-
Gallotti, Relator. te do art. 36 se refere à área adminis-
trativa exclusivamente.
RELATÓRIO
Ademais, nosso Estado ainda não
O Sr. Ministro Octavio Gallotti: Eis o possui política salarial definida para
inteiro teor do despacho agravado, da lavra os servidores que vezes conseguem
do eminente Ministro Sepúlveda Perten- em determinada época uma recupe-
ce, então Relator: ração de três ou quatro meses, assim
«Despacho: Insurge-se o RE, a, con- que de um mês para o outro existem
tra acórdão que, liquidação de sentença índices majorativos bem superiores à
que reconhecera o direito dos agravados inflação, e noutros, nenhum cone-
à correção monetária de diferenças de tivo.
vencimentos pagas com atraso pela ad-
ministração, utilizou critério diverso do Isso à evidência não pode servir
estabelecido pelo art. 36, da Constitui- de indicativo do norte para quem tem
ção estadual, verbis: compromisso com critérios de justi-
ça. O Judiciário não pode placitar
«As obrigações pecuniárias dos iniqüidades.
órgãos da administração direta e in-
direta para com os seus servidores Proclama-se, então, que o critério
ativos e inativos ou pensionistas não esposado no art. 36 da Constituição
cumpridas até o último dia do mês da Estadual não indica sobre débitos ad-
aquisição do direito deverão ser li- vindos de condenações judiciais, li-
quidados com valores atualizados mitando-se à esfera administrativa
pelos índices aplicados para a revisão
geral da remuneração dos servidores
públicos do Estado». E a adoção dos índices oficiais da
inflação tem outra vantagem que
2. O aresto recorrido — que teria vem a ser a uniformização dos crité-
ofendido o princípio da autonomia esta- rios, diferentemente do que ocorreria
dual (CF, art. 25, caput e § 1°), ao deixar se vingasse a tese do Estado.
322 R.T.J. — 158

O IGP-M utilizado é o que mais dos Estados, a obrigação, propriamente


se coaduna com a realidade (...)». dita, da satisfação do pagamento dos ven-
3. Não se verifica a alegada ofensa à cimentos e proventos.
autonomia estadual. Com efeito, se a Quando o Estado se torna inadimplente,
sentença exeqüenda reconheceu o direi- transforma-se em responsabilidade essa
to dos agravados à «correção monetá- obrigação originária, com novo conteúdo,
ria sobre os valores pagos em atraso informado pelo princípio da inteireza do
pelo Estado» (fls. 9/12), o critério a ser ressarcimento, cuja regência ultrapassa o
utilizado na apuração do quantum campo normativo do direito administra-
deve, tanto quanto possível, corrigir a tivo.
defasagem da moeda, finalidade a que Aditando, ao fundamento do despacho
evidentemente não se presta a regra lo- agravado, essa breve consideração, nego
cal invocada pelo agravante. provimento ao agravo regimental.
Ante o exposto, nego seguimento ao
agravo.» (fls. 41/2) EXTRATO DA ATA
Insiste, o Estado do Rio Grande do Sul, Ag 163.936 (AgRg) —RS —Rel.: Min.
na tese de que, ao «Poder Central falece Octavio Gallotti. Agte.: Estado do Rio
competência para determinar os índices de Grande do Sul (Advs.: Vera Lúcia Zanette
correção das obrigações devidas por Esta- e outro). Agdos.: Paulo Roberto Rosa dos
dos e Municípios simplesmente porque não Santos e outro (Adv.: Cláudio Lafayette G.
lhes gere as finanças» (fl. 45). Silva).
E mais: que, «aos Estados-membros Decisão: A Turma negou provimento ao
compete dispor a respeito do regime jurídi- agravo. Unânime. Ausente, ocasionalmen-
co a que se submetem os seus servidores e te, o Sr. Ministro Sydney Sanches.
os de suas autarquias» (fl. 46), sendo o Presidência do Senhor Ministro Moreira
cumprimento desse regime, pelo Judiciá- Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
rio, uma imposição do princípio constitu-
nistros Sydney Sanches, Octavio Gallotti e
cional da legalidade. Celso de Mello. Ausente, justificadamente,
É o relatório. o Senhor Ministro limar Gaivão. Subpro-
VOTO curador-Geral da República, o Dr. Wagner
Natal Batista.
O Sr. Ministro Octavio Gallotti (Rela-
tor): Rege-se pelo direito administrativo, Brasília, 15 de setembro de 1995 —
compreendido na competência legislativa Ricardo Dias Duarte, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 167327 (AgRg) — SP


(Primeira Turma)
Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello
Agravante: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Agravado:
Joaquim Sebastião de Moraes
Recurso extraordinário — Instituto Nacional do Seguro Social
— Interposição por advogado que, não ostentando a condição de procu-
rador autárquico, não dispõe, nos autos, do instrumento de mandato
R.T.J. — 158 323

judicial — Necessidade de exibição da procuração — Inaplicabilidade do


art. 13 do Código de Processo Civil ao recurso extraordinário — Ato
recursal inexistente — Recurso extraordinário não conhecido.
O recurso extraordinário interposto por Advogado sem
procuração constitui ato processual juridicamente inexistente.
Não é aplicável ao recurso extraordinário a norma inscri-
ta no art. 13 do Código de Processo Civil, razão pela qual a ausência do
necessário instrumento de mandato judicial legitima, quando imputável
a omissão ao Advogado da parte recorrente, o não-conhecimento do
apelo extremo interposta Precedentes do STF.

ACÓRDÃO de 'procuração outorgada à ilustre


advogada do ora recorrente'.
Vistos, relatados e discutidos estes au-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Primeira Turma, na con- É de se ver, às fls. 32, portanto, que
formidade da ata do julgamento e das notas a Sra. Procuradora signatária do RE,
taquigráficas, por unanimidade de votos, procedeu a revelação do seu status
em negar provimento ao agravo regimental como Procurador, muito embora, não
em recurso extraordinário. tenha havido a menção ao número da
matrícula.
Brasília, 6 de junho de 1995 —Moreira
Alves, Presidente — Celso de Mello, Re-
lator. Daí, exsurge incontroversa a condi-
ção e status da Sra. Procuradora subs-
RELATÓRIO critora do RE, eis que sua representação
se presume, essencialmente, pelo co-
O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata- nhecimento público de seu mandato,
se de agravo regimental tempestivamente pelo de seu título de nomeação para o
interposto contra ato decisório que não co- cargo e pelo seu exercício notório.
nheceu do recurso extraordinário deduzido
pelo INSS, porque inexistente nos autos o
instrumento de mandato judicial outorgado Por não me convencer das razões dedu-
ao procurador que subscreveu a petição zidas pelo INSS submeto o presente recur-
recursal. so de agravo ao julgamento desta Colenda
Turma.
Alega o ora agravante em suas razões
recursais, em síntese, que (fls. 51/54), ver- É o relatório.
bis: VOTO
O Sr. Ministro Celso de Mello (Rela-
Sua representação processual presu-
tor): As razões deduzidas na presente ma-
me-se notória, eis que se baseia no seu
nifestação recursal não conseguiram infir-
status ou título de nomeação para o
mar o ato decisório questionado, eis que a
cargo e no seu exercício.
jurisprudência de ambas as Turmas do Su-
Daí, incabível o fundamento do deci- premo Tribunal Federal tem reiteradamen-
sório de que se verifica, in casa, a falta te proclamado, em situações como a destes
324 R.T.J. — 158

autos, que não é suscetível de conhecimen- como procurador autárquico, hipótese


to a impugnação recursal deduzida por Ad- em que — como já ressaltado — tornar-se-
vogado que não dispunha, no processo, do lhe-ia inexigível a exibição do instrumento
necessário instrumento de mandato judi- de mandato.
cial, nem haja protestado por sua oportuna Esta E. Primeira Turma, ao apreciar re-
apresentação (CPC, art. 37). Nesse senti- centemente a questão sub examine, profe-
do: RE 17&482-SP, Rel. Min. Celso de riu decisão em acórdão assim ementado,
Mello, Primeira Turma; RE 170.572-SP verbis:
(AgRg), Rel. Min. Marco Aurélio, Segun-
da Turma. «Ementa: Recurso Extraordinário
— Interposição por mandatário judi-
A inaplicabilidade da regra inscrita no cial que não dispõe de procuração nos
art. 13 do Código de Processo Civil ao autos — Inaplicabilidade do art. 13
procedimento recursal em curso no Supre- do Código de Processo Civil ao recur-
mo Tribunal Federal, tal como acentuado so extraordinário — Procurador me-
pela jurisprudência desta Corte (RTJ ramente constituído pela entidade au-
132/450, Rel. Min. Paulo Brossard; RE tárquica — Ato processual inexisten-
178.482-SP, Rel. Min. Celso de Mello), te — RE não conhecido.
toma mais intenso o dever da parte recor-
Não é suscetível de conhecimen-
rente de velar pela regularidade e existência
to pelo Supremo Tribunal Federal o re-
formais de sua representação em juízo, eis
curso extraordinário interposto por Ad-
que, em nosso sistema de direito positivo,
vogado que não disponha, no processo,
tem-se por inexistente o recurso deduzido
do necessário instrumento de mandato
por Advogado desprovido de procuração
judicial, nem haja protestado por sua
no processo (CPC, art. 37).
oportuna apresentação (CPC, art. 37).
O presente recurso extraordinário foi Precedentes: RTJ 99/1260 — RTJ
interposto pelo INSS, que é uma autarquia 103/344 — RTJ 103/348 — RTJ
federal. Sendo assim, não há dúvida de que 116/698 — RTJ 121/835 — RTJ
se tornaria dispensável a exibição, pelos 129/1295.
procuradores dessa pessoa administrativa A regra inscrita no art. 13 do CPC
— que ostentem a condição de servidores é inaplicável ao procedimento recursal
autárquicos —, do instrumento de manda- do apelo extremo que já se ache em
to judicial, eis que, tal como enfatizado pela curso no Supremo Tribunal Federal.
jurisprudência dos Tribunais, «Os procura- Precedente: RTJ 132/450.
dores da Fazenda Pública e das autarquias
não necessitam juntar procuração em pro- A eventual existência de procura-
cessos judiciais, por se presumir conhecido ção depositada em Cartório de Vara ju-
o mandato pelo seu título de nomeação» dicial ou em Secretaria de Tribunal in-
(RT 495/86— RT 279/539 — RT 299/362 ferior não exonera o Advogado consti-
RT 370/249). tuído pela parte recorrente, ainda que

seja esta uma entidade de direito públi-
Ocorre, no entanto, que o exame das co, do dever processual de produzir, em
peças processuais não evidencia e nem sede recursal extraordinária, o neces-
permite que delas se possa inferir essa sário instrumento de mandato judicial,
particular condição funcional do Advoga- pois o exame dos pressupostos recursais
do subscritor da petição recursal, que, leal- — notadamente daqueles concernentes
mente, não se qualificou, para esse efeito, à capacidade postulatória das partes —
R.T.J. — 158 325

há de ser efetuado tendo-se presentes os EXTRATO DA ATA


elementos formalmente constantes do
RE 167.327 (AgRg) — SP —Rel.: Min.
processo.» (RE 178.761-SP, Rel. Min.
Celso de Mello. Agte.: Instituto Nacional
Celso de Mello, julg. em 16-8-94). do Seguro Social — INSS (Adv.: Lígia
No mesmo sentido, cf., ainda, outros Maria S. A. Nogueira). Agdo.: Joaquim
pronunciamentos jurisprudenciais desta Sebastião de Morais (Advs.: Gilberto Ro-
Suprema Corte sobre a matéria (RE cha de Andrade e outro).
178.482, Rel. Min. Celso de Mello, DJU
de 25-8-94; RE 180.628, Rel. Min. Celso Decisão: A Turma negou provimento ao
de Mello, DJU de 22-9-94; RE 171.254 agravo regimental em recurso extraordiná-
(AgRg), Rel. Min. Marco Aurélio, julg. rio. Unânime.
em 20-6-94; RE 173.619 (AgRg), Rel.
Min. Marco Aurélio, julg. em 30-6-94). Presidência do Senhor Ministro Moreira
Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
Sendo assim, nos termos da lei e de nistros Sydney Sanches, Octavio Gallotti,
acordo como magistério jurisprudencial do Celso de Mello e limar Gaivão. Subprocu-
Supremo Tribunal Federal (RTJ 132/450 rador-Geral da República, Dr. Miguel
— RTJ 137/461), nego provimento ao Frauzino Pereira.
presente recurso de agravo.
Brasília, 6 de junho de 1995 — Ricardo
É o meu voto. Dias Duarte, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 170.539 — SP


(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Carlos Velloso
Recorrente: Instituto Nacional do Seguro Social —INSS — Recorrido: Luiz
Ferreira da Silva
Constitucional. Previdenciário. Beneficio: revisão na forma do
artigo 58, ADCT.
I — O beneficio do art. 58, ADCT — a constância da
relação entre a quantidade de salários mínimos e o valor do benefício,
observando-se tal critério de atualização até a implantação do plano de
custeio e benefícios referido no art. 59, ADCT — foi estabelecido para o
futuro, ou seja, a partir do sétimo mês da promulgação da Constituição
(ADCT, art. 58, parágrafo único), não comportando aplicação retroativa.
II — RE conhecido, em parte, e provido também em parte.

ACÓRDÃO formidade da ata do julgamento e das notas


taquigráficas, por decisão unânime, conhe-
Vistos, relatados e discutidos estes au- cer, em parte, do recurso e, nessa parte, lhe
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- dar provimento, nos termos do voto do
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- Ministro Relator.
326 R.T.J. — 158

Brasília, 4 de fevereiro de 1994 — Néri Abrindo o debate, acentuo que o Supre-


da Silveira, Presidente — Carlos Venoso, mo Tribunal Federal tem decidido que o
Relator. benefício do art. 58 do ADCT — a constân-
cia da relação entre a quantidade de salários
RELATÓRIO mínimos e o valor do benefício, observan-
do-se tal critério de atualização até a im-
O Sr. Ministro Carlos Velloso: Trata- plantação do plano de custeio e benefícios
se de ação acidentaria, ajuizada por Luiz
Ferreira da Silva, contra o Instituto Na- referido no art. 59 do ADCT — foi estabe-
cional de Previdência Social — JNPS, lecido para o futuro, ou seja, a partir do
tendo a sentença homologado o cálculo da sétimo mês da promulgação da Constitui-
liquidação. ção (ADCT, art. 58, parágrafo único), não
comportando aplicação retroativa (RE
A Oitava Câmara do Segundo Tribunal 137.794-SP, Relator Ministro Octavio Gal-
de Alçada Civil de São Paulo, por unanimi- lotti, DJ de 27-9-91; RE 140.492-SP, Re-
dade, deu provimento parcial ao recurso do lator Ministro Binar Gaivão, DJ de 6-8-93).
autor, mantida a sentença na parte em que
concedeu o benefício a partir de 12-10-84); Ora, no caso, a ação acidentária foi ajui-
observando-se, entretanto, para os cálculos zada anteriomente à promulgação da Cons-
dos benefícios, o Recurso de Revista n° tituição. Sem embargo disso, na forma do
9.859114, em consonância com o art. 58 do disposto no art. 462, CPC, impõe-se a apli-
ADCT da Constituição Federal. cação da regra do art. 58, ADCT, a partir
do mês de abril de 1989, exatamente como
Inconformado, o INSS interpôs recurso previsto no parágrafo único do art. 58,
extraordinário, fundado no art. 102, III, a, ADCT.
da Constituição Federal, alegando que o
acórdão recorrido violou os seguintes dis- Registrou a Procuradoria-Geral da Re-
positivos constitucionais: arts. 5°, caput, pública, no parecer que ofereceu no RE
XXXVI; e 58, parágrafo único, do ADCT, 134.572-SP, que o entendimento sustenta-
ao detemánar a aplicação da equivalência do no parecer não nega ao recorrido o di-
salarial por todo o período do benefício reito ao benefício do art. 58, ADCT. Con-
concedido, inclusive para as parcelas ante- solidado o direito à prestação aqui pleitea-
riores a abril de 1989. da, ao recorrido assistirá pedir, a partir do
momento em que se tomou devido, o men-
Admitido o recurso, subiram os autos. cionado benefício do art. 58, ADCT. Ora,
É o relatório. se o processo tem caráter instrumental, re-
VOTO comenda a economia processual que o be-
nefício seja reconhecido desde logo, na for-
O Sn Ministro Carlos Venoso (Rela- ma estabelecida na norma constitucional.
tor): os dispositivos constitucionais invo-
cados no recurso — arts. 5°, caput, Do exposto, conheço em parte do recur-
XXXVI; e 58, parágrafo único, ADCT — so e dou-lhe provimento parcial.
não foram objeto de discussão, vale dizer, EXTRATO DA ATA
não foram ventilados no acórdão recorrido.
No ponto, portanto, o recurso não pode ser RE 170.539 — SP — Rel: Min. Carlos
conhecido. Velloso. Recte.: Instituto Nacional do Se-
Conheço do recurso, entretanto, no que guro Social — INSS (Advs. Solon José
tange ao art. 58, parágrafo único, do Ramos e outros). Recdo.: Luiz Ferreira da
ADCT. Silva (Adv.: Carlos Cometti).
R.T.J. — 158 327

Decisão: Por unanimidade, a Turma co- e Marco Aurélio. Ausente, justificadamen-


nheceu, em parte, do recurso e, nessa parte, te, o Senhor Ministro Francisco Rezek.
lhe deu provimento, nos termos do voto do Subprocurador-Geral da República, o Dr.
Ministro Relator. Cláudio Lemos Fonteles.
Presidência do Senhor Ministro Néri da
Silveira. Presentes à Sessão os Senhores Brasília, 4 de fevereiro de 1994 — José
Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso Wilson Aragão, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 170906 — DF


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves


Recorrente: União Federal — Recorrido: Hjalmar Luiz de Carvalho Tufves-
son
Recurso extraordinário.
Interpretação de acórdão para a fixação dos limites ob-
jetivos da coisa julgada, a não ser quando manifestamente contrária ao
decidido, é questão que não se alça ao plano constitucional do desrespeito
ao princípio de observância da coisa julgada, mas se restringe ao plano
infraconstitucional, configurando-se, no máximo, ofensa reflexa à Cons-
tituição, o que não dá margem a recurso extraordinário.
Falta de prequestionamento das alegações de ofensa ao
artigo 8° do ADCT bem como ao artigo 5°, LXIX, ambos da Constituição
Federal.
Recurso extraordinário não conhecido.
ACÓRDÃO do Superior Tribunal de Justiça a acolheu
por acórdão onde se lê:
Vistos, relatados e discutidos estes autos, «O Sr. Ministro Garcia Vieira: O
acordam os Ministros da Primeira Turma do Excelentíssimo Senhor Ministro de Es-
Supremo Tribunal Federal, na conformidade tado de Exército (fls. 124/127) autorida-
da ata do julgamento e das notas taquigráfi-
de coatora no Mandado de Segurança n°
cas, por unanimidade de votos, em não co- 287—DF, em atenção ao Ofício n°
nhecer do recurso extraordinário. 2.561—SPS/DP (fl. 122) do Eminentís-
Brasília, 15 de março de 1994 — Mo- simo Ministro Presidente desta Seção,
reira Alves, Presidente e Relator onde comunica concessão da segurança
requerida por Hjalmar Luiz de Carvalho
RELATÓRIO Tufvesson e sua conseqüente promoção
efetiva a Coronel, queixando-se o Impe-
O Sr. Ministro Moreira Alves (Rela- trante «de que o v. acórdão não foi ple-
tor): Julgando incidente de execução em namente cumprido no que tange à van-
mandado de segurança, a Primeira Seção tagem do tempo de serviço, ao paga-
328 R.T.J. — 158

mento do Adicional de Inatividade e da promoções ao posto de Coronel, «com


indenização de Habilitação Militar», ex- as vantagens correspondentes ao posto
põe, então a digna autoridade, após de Oficial Superior, e respectiva conta-
transcrever a ementa do acórdão: gem de tempo de serviço até 05 de ou-
«Discutiu-se na impetração con- tubro de 1988» (fl. 12). O venerando
forme se verifica dos respectivos au- acórdão exeqüendo (fls. 88/97), conce-
tos, tão-somente o direito de promo- deu a segurança para reconhecer ao au-
ção de Tenente-Coronel a Coronel.» tor o direito «... à promoção ao posto a
que teria alcançado, por antiguidade, se
«Nenhuma outra vantagem foi de- permanecesse na ativa até outubro de
ferida pela v. decisão da Primeira 1988» (Ementa de fl. 90), com efeitos
Seção do Egrégio Superior Tribunal financeiros a partir de 5 de outubro de
de Justiça 1988, data da promulgação da vigente
Registra, no ofício, que o preceito Constituição Federal (fls. 90/97). Em
do ADCT, artigo 8° «não mandou nenhum momento se discutiu ou se re-
computar tempo de serviço, tarefa de conheceu direito de contagem de tempo
que se investiu o legislador ordinário de serviço, a proventos calculados sobre
por ocasião da Lei número 6.683, de o soldo correspondente ao posto imedia-
1979...» to, aumento de adicional à indenização
de Habitação Militar de 160%. Mas
«Assim, entende a Administração
nada disso foi discutido ou acolhido
Militar que não cabe alterar o quan-
pelo aresto em execução porque o refe-
tum proveniente de qüinqüênios e de
adicional de inatividade...» rido dispositivo constitucional só asse-
gurou aos anistiados por ele, «as promo-
Por fim, aguarda orientação que pos- ções, na inatividade, ao cargo, emprego,
sa conduzir à Administração no trato da posto ou graduação a que teriam direito
questão em apreço. se estivessem em serviço ativo...» Nada
O despacho de fls. 129 recebe o ex- dispõe sobre contagem de tempo e suas
pediente como incidente da execuçãe e conseqüências. Quisesse o legislador
abre vista ao Ministério Público, que se constitucional contemplar os anistiados
pronuncia às fls. 133/134. com este direito ele o teria feito expres-
O impetrante peticiona às fls. 136/142 samente, como acontece com o seu pró-
esclarecendo seu pedido inicial e cla- prio § 4° que mandou contar, para efeito
mando a atenção para os termos do des- de aposentadoria no serviço público e
pacho de fls. 114/115 e para o fato de se previdência social, os períodos em que,
estar pretendendo é rediscutir matéria por força de atos institucionais, o exer-
julgada e afinal pede o cumprimento cício gratuito de mandato eletivo de ve-
integral do v. acórdão. reador. Esta Egrégia Seção, em nenhum
de seus vários precedentes reconheceu
É o relatório. aos anistiados pelo citado artigo 8°, ca-
VOTO put, do ADCT, o direito à contagem de
tempo de serviço e as demais vantagens
O Sr. Ministro Garcia Vieira (Re- ora reclamados pelo impetrante. Temos
lator): Sr. Presidente — Com invocação reconhecido sempre o direito às promo-
do artigo 8° do Ato das Disposições ções e os efeitos financeiros desta, a
Constitucionais Transitórias, pediu-se partir da promulgação da atual Consti-
R.T.J. — 158 329

tuição (art. 8°, § 1° do ADCT) e nada, Demonstrado, como foi, pelo im-
mais, bastando citar apenas os Manda- petrante, que colegas seus, mais mo-
dos de Segurança Ws 428 do qual fui dernos, obtiveram, antes daquela
relator e 327, 309, 264, 240 e 246 dos data, a promoção, por antiguidade, ao
quais fui relator para os acórdãos. Con- posto de Coronel, não há como dei-
clui-se estar a digna autoridade coatora xar de reconhecer-lhe direito a tal
com razão, ao levantar as dúvidas de fls. promoção que, fatalmente, teria tam-
124/127. O venerando acórdão exe- bém alcançado, pela mesma via, se
qüendo assegurou ao autor apenas a pro- houvesse permanecido em ativida-
moção ao posto de Coronel e os efeitos des».
financeiros desta promoção a partir de O meu voto é no sentido de acompa-
5-10-88 (ADCT, art. 8°, § 1°). nhar o Sr. Ministro Relator.» (fls.
Por isso, 175/179)
Acolho o incidente da execução para Interpostos embargos de declaração, e
deixar claro que ao impetrante foi asse- por maioria de votos, vencidos os Ministros
gurado apenas a promoção na inativida- Garcia Vieira (relator) e Hélio Mosimann
de ao posto de Coronel e os efeitos fi- (voto em pedido de vista), foram eles co-
nanceiros desta, a partir da promulgação nhecidos e recebidos «para anular o acór-
da vigente Constituição Federal. dão proferido no julgamento do incidente
de execução suscitado nos autos, manten-
O &ou° Sr. Ministro Peçonha Mar- do-se, em sua Íntegra, a decisão proferida
fins: Senhor Presidente, neste caso, por no julgamento do mandado de segurança»
se tratar de incidente de execução, voto (fl. 299). Para esclarecimento do alcance da
com o Sr. Ministro-Relator. decisão, transcrevo o relatório desse aresto,
o voto do relator vencido, o voto do relator
O Senhor Ministro Antônio de Pá- para o acórdão — Ministro Peçanha Mar-
duo Ribeiro: Sr. Presidente, estava exa- fins —, o voto do Ministro Demócrito
minando exatamente o voto do Sr. Mi- Reinaldo e a adesão a ele pelo Ministro
nistro-Relator limar Gabião e, real- Peçanha Martins:
mente, o voto de S. Ex• conclui no sen-
tido de conceder a segurança, mas, an- «O Sr. Ministro Garcia Vieira:
tes, deixou explicitado que o fazia, se- Hjalmar Luiz de Carvalho Tufversson
gundo se depreende, diante dos termos embarga de declaração, alegando a exis-
do art. 8° do Ato das Disposições Cons- tência de obscuridade, dúvida, contradi-
titucionais Transitórias. O texto de seu ção e omissão.
voto é expresso: Entende o embargante que no inci-
dente de execução revogou-se a coisa
«Com efeito, havendo o art. 8° do julgada, o ato jurídico perfeito e o direito
ADCT/88 ampliado, no tempo, os adquirido.
efeitos da anistia da EC 26/85, não há O incidente de execução tem origem
como negar-se ao militar beneficiado no Aviso 228/91 do Exmo. Sr. Ministro
por esta, as vantagens acrescentadas do Exército solicitando o reexame do
por aquele, entre estas compreendi- assunto por não aceitar e discordar da
das as promoções ao posto a que teria decisão já transitada, entende haver sur-
direito o militar se estivessem na ati- gido um Tribunal de Exceção em desa-
va em outubro/88. fio ao STJ e ao texto constitucional.
330 RT.J. — 158

Entende o Embargante que a promo- Consta do voto condutor do aresto


ção foi concedida «ao posto a que teria hostilizado que:
alcançado por antiguidade, se permane-
cesse na ativa até outubro de 1988», não «O v. acórdão exeqüendo (fls. 88/97),
havendo como não reconhecer ao Em- concedeu a segurança para reconhecer
bargante o direito de contagem de tempo ao autor o direito à promoção ao
de serviço até outubro de 1988, na forma posto a que teria alcançado, por antigui-
do pedido, com os conseqüentes efeitos dade, se permanecesse na ativa até ou-
sobre o soldo. tubro de 1988» (Ementa de fl. 90), com
efeitos financeiros a partir de 5 de outu-
Diversamente do que se afirma no bro de 1988, data da promulgação da
acórdão os precedentes julgados, nesta vigente Constituição Federal (fls.
Egrégia Seção, foram sempre no sentido 90/97).
de se conceder o tempo de serviço e as
vantagens correspondentes ao posto de Em nenhum momento se discutiu ou
oficial superior, quando os militares se reconheceu direito de contagem de
eram oficiais de carreira, formados pe- tempo de serviço, a proventos calcula-
las Academias Militares (MS 144, 01 e dos sobre o soldo correspondente ao
02). Relevante notar o MS 309, relatado posto imediato, aumento de adicional à
pelo eminente Ministro Garcia Vieira, indenização de Habilitação Militar de
no qual se incluiu a contagem do tempo 160%. Mas nada disso foi discutido ou
de serviço. acolhido pelo aresto em execução por-
Requer o conhecimento e provimen- que o referido dispositivo constitucional
to dos Embargos, declarar nulo, anular só assegurou aos anistiados por ele: «as
de improver o acórdão recorrido do in- promoções, na inatividade, ao cargo,
cidente de Execução, para determinar o emprego, posto ou graduação a que te-
cumprimento da res judicata. riam direito se estivessem em serviço
ativo...» Nada dispõe sobre contagem de
É o relatório. tempo e suas conseqüências.
Voto (Vencido) Quisesse o legislador constitucional
O Sr. Ministro Garcia Vieira (Re- contemplar os anistiados com este direi-
lator): Sr. Presidente: — Não há no v. to ele o teria feito expressamente, como
acórdão embargado nenhuma obscuri- acontece com o seu próprio § 4° que
dade dúvida, contradição ou omissão. mandou contar, para efeito de aposenta-
Consta de sua ementa (fl. 184) que o art. doria no serviço público e previdência
8° do ADCT só assegurou aos anistiados social, os períodos em que, por força de
«as promoções, na inatividade, ao car- atos institucionais, o exercício gratuito
go, emprego, posto ou graduação a que de mandado eletivo de vereador.» (fl.
teriam direito se estivesse em serviço 176).
ativo. A contagem de tempo de serviço Em nenhum momento do v. acórdão
e suas conseqüências não foi contempla- de fls. 90/100 se discutiu ou se reconhe-
da no texto. ceu o pretenso direito de contagem de
Acolhido o incidente de execução tempo de serviço ou à indeniz ação de
para reconhecer ao Impetrante a promo- habilitação militar. Está bem claro pelos
ção na inatividade ao posto de Coronel votos de fls. 90/96 e pela ementa de fls.
e os efeitos financeiros deste.» 100 que só foi reconhecido o direito à
R.T.J. — 158 331

promoção e com efeitos financeiros a da Subprocuradoria-Geral da Repú-


partir da promulgação da Constituição. blica.
O que o embargante está pretenden- Quero informar a V. Exa. que o Sr.
do é dar efeitos modificativos aos em- Ministro Pedro Acioli, em 17 de setem-
bargos e isto evidentemente, não é pos- bro de 1991, recebeu a manifestação
sível. Neste sentido os registros prece- como incidente de execução e indicou
dentes do extinto TRF nos Embargos de como Relator, muito depois de transita-
Declaração nas Apelações Cíveis n°s do em julgado o acórdão; houve relató-
119.768-MG, DJ de 26-5-89, 149.566- rio e o voto.
MT, DJ de 26-6-89, 86.026-DF, DJ de
O Sr. Ministro Hélio Mosimann:
10-10-85, EDRO n° 7.339-RS, DJ de
Sr. Presidente, acredito que isso tudo
23-5-85, EDAERO n° 5.454-PE, DJ de
seja irrelevante; o importante é saber o
30-8-84 e EDEDAG n° 43.980-SP, DJ
que o Tribunal decidiu no mandado de
de 10-5-84, além das decisões de nossa
segurança, qual a extensão da decisão e
Corte Maior no RHCED n° 66.281-RJ,
se o Tribunal concedeu também esses
DJ de 27-10-88 e MSAED n° 20.588-
acessórios.
DF, DJ de 15-4-87.
Rejeito os embargos. Voto
O Sr. Ministro Garcia Vieira: Sr.
Presidente, tenho uma informação para O Sr. Ministro Peçanha Martins:
S. Exa. o Sr. Ministro Demócrito Rei- Senhor Presidente, o Eminente Ministro
naldo: o acórdão foi publicado no dia Hélio Mosimann há pouco referiu-se à
14-5-90 — conforme certidão de fls. decisão unânime e destacou o meu voto.
101, (lê): Não tenho dúvida, pelo que li nos me-
moriais, em afirmar que naquele voto,
«Certifique que o respeitável acór- prolatado no incidente de execução, co-
dão de folha 100 transitou em julgado. meti erro. Isso porque a contradição en-
Brasília, 18 de junho de 1990a. tre tal acórdão e o que decidimos no
mandado de segurança é inafastável.
Antes de transitar em julgado, já ha- Decidimos certo no mandado de segu-
via um ofício assinado pelo Eminente rança, porque o fizemos tendo em mira
Ministro Carlos Velloso, no exercício o que no art. 8° do ADCT se contém,
da presidência, com data de 23 de abril vale dizer: o legislador constitucional
de 1990, mas, após transitado em julga- assegurou as promoções no cargo, em-
do, houve requerimento da parte; o Sr. prego, posto ou graduação em que teria
Ministro Armando Rolemberg fez um direito se estivesse em serviço ativo,
ofício, já no dia 21 de agosto. obedecidos os prazos de permanência
O Sr. Ministro Pedro Acioli expediu em atividade previsto nas leis e regula-
um despacho no dia 6 de abril de 1991, mentos. É que o militar só pode ser
determinando o cumprimento; um outro promovido, de qualquer sorte, após o
ofício do dia 8 de maio de 1991; outro decurso de tempo na função, no posto.
despacho no dia 6 de agosto de 1991; em E para atingir o posto de Coronel, cujo
seguida, despacho do dia 12 de agosto direito lhe reconhecemos, é certo que o
de 1991; novo despacho em 30 de agos- seu paradigma passou um tempo certo
to; logo após um ofício em 3 de setem- no exercício do posto, entre Tenente-
bro de 1991. Houve uma manifestação Coronel e Coronel.
332 R.T.J. — 158

E se é certo que nesta Seção, interpre- Federal. Se não posso aqui, neste instan-
tando o dispositivo constitucional, te- te, individuar os casos, me comprometo
mos reconhecido os mais amplos efeitos com V. Exas. a enumerá-los, ao menos
à anistia — recordo-me termos dito que dez, de acórdãos do Supremo Tribunal
a anistia se fez a mais ampla—com base Federal dando tal efeito modificativo
nesta amplitude deferi mandado de se- aos embargos de declaração.
gurança requerido por praças da Mari- O Exmo Sr. Ministro Hélio Mosi-
nha que teriam sido punidos por meios mann (aparte): Eu lhe dispensaria de
regulares, embora, em verdade, porque trazer essas decisões. Conheço várias
participaram da célebre reunião coman- delas. O Supremo Tribunal Federal,
dada pelo Cabo Anselmo. realmente, tem emprestado efeito modi-
A Seção tem proclamado que o man- ficativo de julgado em casos excepcio-
dado de segurança defere a promoção do nalíssimos, pois representa a Corte
requerente ao posto de Coronel com as Maior, a última palavra. Então, se a Su-
vantagens dentre as quais indiscutivel- prema Corte constata um erro grave,
mente está a do tempo de serviço, até evidente, sobre o qual não haja qualquer
porque sabemos que os vencimentos dúvida, ela mesma deve corrigi-lo atra-
base no Brasil, correspondem, não raro, vés desses embargos. O Supremo Tribu-
a apenas uma parcela insignificante da nal Federal só tem conferido efeito mo-
remuneração, mormente quando se trata dificativo em casos excepcionais para
de soldo. Se dermos ao requerente ape- corrigir erro material e diante do equí-
nas os vencimentos do posto, estaremos voco manifesto, o que, no meu entendi-
fazendo não uma isonomia, como deter- mento, data venia, não é o caso.
mina o art. 8°, mas, ao contrário, dando- O Exmo. Sr. Ministre Peçanha
lhe apenas um título que não correspon- Martins: Agradeço o aparte, mas quero
derá à remuneração que vence o seu dizer ao Eminente Ministro Mosimann
paradigma. que este Tribunal tem a última palavra
Votamos à unanimidade um inciden- também no que diz respeito à materia
te de execução. Discutia-se nele o que infraconstitucional. Não posso deixar de
houvéramos decidido no mandado de julgar de acordo com a minha consciên-
segurança, ou seja, na ação, e decidi- cia e, no caso, com o relevo que ele
mos, inclusive com o meu voto, contra merece. Não se trata aqui da decisão de
a coisa julgada. Então, indago aos meus um direito deferido por lei ordinária, de
Eminentes pares: sendo indiscutíveis o um direito consagrado na própria Cons-
direito do requerente e o erro da Seção, tituição, por consenso do povo brasilei-
deveremos mantê-lo obrigando o reque- ro. Em função desse consenso continua-
rente à rescisão dessa decisão? Sem dú- mos a viver em harmonia neste País,
vida nenhuma são inúmeros os casos em fazendo com que os interesses, ainda
que o Supremo Tribunal Federal, em que contrariados, possam ser harmoni-
admitindo erro, tem dado efeito modifi- zados nos Tribunais. É o que estamos
cativo aos embargos de declaração. Er- fazendo e o que fizemos com o reque-
ramos contra nossa própria decisão, en- rente, aplicando-lhe a lei constitucional
tendo eu. Por isso, não vejo porque não no perdão de atos cometidos em passado
possamos emendar esse erro, ainda que recente. Anistiamos vencidos e vence-
em embargos de declaração, com base dores, e ele foi um dos prejudicados.
na jurisprudência do Supremo Tribunal Indago diante da excepcionalidade da
R.T.J. — 158 333

situação pode-se permitir que este Tri- O Exmo. Sr. Ministro Peçanha
bunal, valendo-se inclusive, da jurispru- Martins: Eminente Ministro Mosi-
dência do mais alto Pretório, não possa mann, tive o prazer e a ventura de ler
corrigir o seu erro, ainda que em embar- Voltaire. Confesso que, embora no que
gos? Entendo que sim e, porque assim diz respeito à conduta ética e moral sem-
entendo, corrijo o meu erro anterior, pre a tivesse mantido invariável, no pla-
para, no particular, conhecer dos embar- no do pensamento, no plano das idéias,
gos e modificar o julgado, dentro da estou sempre pronto a aprender e a mo-
melhor interpretação da lei processual, dificar para melhor. E, no caso, não es-
que é exátamente a interpretação que lhe tou rejulgando a causa, mas corrigindo
dá o Tribunal Maior. um erro cometido num incidente de exe-
O Exmo. Sr. Ministro Hélio Mosi- cução do julgado que cumpre manter.
mann: V. Exa. acaba de dizer que houve
ofensa à coisa julgada? Voto
(Esclarecimento)
Exmo. Sr. Ministro Peçanha
Martins: Não. O que disse é que, neste O Sr. Ministro Demócrito Reinal-
caso, sem dúvida nenhuma, chegamos do: Sr. Presidente, gostaria de fazer um
até a ofender o julgado. esclarecimento que é importantíssimo
para salvaguardar o direito da parte im-
O Exmo. Sr. Ministro Hélio Mosi- petrante. E que se continuarmos insis-
mann: Não concordo. Mas, se ofensa tindo nesta decisão e ela transitar em
houve, a forma de reparar é a ação res- julgado a parte ficará prejudicada e não
cisório. poderá promover outra ação reivindi-
Exmo. Sr. Ministro Peçanha cando seu direito. Enquanto que, se
Marfins: Por entender que tenha havido afastarmos esse incidente em seu todo,
erro na execução do julgado, corrijo-o e se amanhã se vier a compreender que
nos embargos, para evitar que, nesta esta questão de tempo de serviço não
situação excepcional, de negação do di- está embutida na decisão primitiva do
reito antes reconhecido, tenha o reque- mandado de segurança, a parte poderá
rente que fazê-lo em outra ação. requerer outro mandado de segurança e
ser beneficiada em relação a este aspec-
O Exmo. Sr. Ministro Hélio Mosi- to, ou promover a ação adequada para
mann: V. Exa. repara com um novo efeito da contagem do seu tempo de
julgamento? serviço.
Exmo. Sr. Ministro Peçanha É como voto.
Marfins: Recebo os embargos sob esses
argumentos que expendi e lhe dou efeito O Exmo. Sr. Ministro Peçanha
modificativo, com amparo na jurispru- Martins (aparte): Adiro inteiramente à
dência do Supremo Tribunal Federal. solução proposta pelo Eminente Minis-
tro Demócrito Reinaldo, porque, inclu-
O Ermo. Sr. Ministro Hélio Mosi- sive, concede todas as honras ao proces-
mann: Decidimos aqui no dia 19 de so. Mas, como é indubitável, do nosso
dezembro último, por unanimidade, o erro no julgamento do incidente de exe-
seguinte: «em sede de embargos decla- cução não há como fugir, e a solução
ratórios não pode haver novo julgamen- arbitrada, sem dúvida, é a processual-
to da causa». mente mais correta: recebermos esses
334 R.T.J. — 158

embargos no incidente de execução, A autoridade coatora instada a dar


para declarar o erro em que incorremos plena execução ao julgado, ofereceu a
e restaurar na sua plenitude a decisão do resposta de fls. 124 a 127, recebidos
mandado de segurança. Esta sim, a de- pelo Sr. Ministro Presidente da Primeira
cisão que há de ser cumprida, nos termos Seção como Incidente de Execução (fl.
em que ela foi posta, ou seja, deferindo 129), diante das ponderações acerca do
ao requerente a promoção a tenente-co- alcance do julgado.
ronel, com os consectários lógicos dessa A Primeira Seção, à unanimidade,
promoção, vale dizer, como todos os acolheu o Incidente de Execução, em
adicionais a que faz jus.» (fls. 271/275, acórdão em que o Ministro Garcia Viei-
283/286, 287 e 289) ra lançou a seguinte ementa (fl. 184):
Interposto recurso extraordinário, não «Anistia — ADCT — art. 8° —
foi ele admitido pelo despacho a fls. incidente na execução — contagem
324/325, verbis:
de tempo de serviço.
«Trata-se de mandado de segurança
impetrado por militar inativo, objetivan- O dispositivo constitucional só
do promoção ao posto de Coronel, com assegurou aos anistiados 'as promo-
base no artigo 8° do ADCT. ções, na atividade, ao cargo, empre-
go, posto ou graduação a que teriam
A Egrégia Primeira Seção, concedeu direito se estivessem em serviço ati-
ao impetrante a promoção pleiteada, em vo'. A contagem de tempo de serviço
acórdão assim redigido (fl. 100): e suas conseqüências não foi contem-
«Administrativo. Militar anis- plada no texto.
tiado pela lei n° 6.688/79 e pela EC Acolhido o incidente de execução
26/85. Nova promoção, pretendida para reconhecer ao impetrante a pro-
com base no art. 8°, do ADCT/88. moção na inatividade ao posto de
Legitimidade. Coronel e os efeitos financeiros
deste.»
Havendo a última norma amplia-
do, no tempo, os efeitos da anistia da Oferecidos embargos de declaração,
EC 26/85, não há como negar-se ao estes foram recebidos para anular o
militar beneficiado por esta, a vanta- acórdão proferido no julgamento do in-
gem acrescentada por aquela, a sa- cidente de Execução suscitados nos au-
ber, a promoção ao posto a que teria tos e restabelecer, em sua íntegra, a de-
alcançado, por antigüidade, se per- cisão proferida no julgamento do Man-
manecesse na ativa até outubro de dado de Segurança (fl. 303).
1988. Irresignada, a União Federal interpõe
recurso extraordinário com fundamento
Segurança concedida.»
na alínea a do permissivo constitucio-
Inobstante a promoção ter sido reali- nal. Alega que se for mantida a decisão
zada na forma do pedido, o impetrante atacada, anulando-se o acórdão originá-
queixou-se de que o v. acórdão não fora rio, estar-se-á ampliando os benefícios
integralmente cumprido, no tocante à concedidos no acórdão com ostensiva
vantagem do tempo de serviço, ao paga- violação à coisa julgada (art. 5°,
mento do Adicional de Inatividade e da XXXVI, CF); concedendo mais do que
indenização de Habilitação Militar. a constituinte admitiu no art. 8° do
R.T.J. — 158 335

ADCT, que só cuida de promoções, ex- para proceder à sua transcrição, reiteran-
travasando os limites do Mandado de do as conclusões ali consignadas:
Segurança, imposto pelo art. 5°, LXIX,
`A controvérsia teve origem, ou se
da Constituição Federal. Afirma, ainda, delineou mais claramente, com o ofício
que as outras vantagens concedidas po-
trasladado para as fls. 47/50, onde o
derão ser objeto de ação própria, ade-
Exm° Ministro de Estado do Exército,
quada para a ampla discussão do as- dirigindo-se ao Exm° Sr. Min. Pedro
sunto. Acioli, então Presidente da 1° Seção do
Tais alegações não podem prosperar, Superior Tribunal de Justiça, ao opor-se
pois os embargos de declaração no inci- ao cumprimento do v. acórdão (fls.
dente de execução foram recebidos por- 33/45) prolatado no Mandado de Segu-
que a decisão relativa ao incidente res- rança n° 287-DF (registro n° 89.131.48-
tringia o alcance da segurança já conce- 6), nos termos pretendidos pelo impe-
dida e transitada em julgado. Esta, a sua trante e ora recorrido, Hjahnar Luiz de
vez, deferiu ao requerente a promoção Carvalho Tufvesson, suscitou dúvidas
pleiteada, com os consectários dessa quanto à extensão do referido julgado.
promoção e com todos os adicionais a Tal iniciativa resultou no r. despacho
que fazia jus.
que se encontra às fls. 51, pelo qual o
Portanto, ausente qualquer violação ilustre Ministro Pedro Acioli suscitou o
do texto constitucional, não admito o «incidente de execução» que, relatado
recurso pelo Exm° Sr. Min. Garcia Vieira, pro-
piciou a prolação do r. acórdão reprodu-
Publique-se.» zido às fls. 62/69, assim ementado:
O recurso, porém, subiu a esta Corte, em «Matéria — ADCT — art. 8° —
virtude do provimento de agravo. incidente na execução — contagem de
A fls. 342 a 346, assim se manifesta a tempo de serviço.
Procuradoria-Geral da República, em pare- O dispositivo constitucional só asse-
cer do Dr. Paulo de Tarso Braz Lucas: gurou aos anistiados as promoções, na
«1. Trata-se de recurso extraordiná- atividade, ao cargo, emprego, posto ou
rio, processado por força de provimento graduação a que teriam direito se esti-
de agravo (v. autos em apenso), que a vessem em serviço ativo. A contagem
União Federal, com fundamento na alí- de tempo de serviço e suas consequên-
nea a do permissivo constitucional, for- cias não foi contemplada no texto.
malizou contra o v. acórdão de fls. Acolhido o incidente de execução
271/303, deduzindo alegação de contra- para reconhecer ao impetrante a promo-
riedade aos incisos XXXVI e LXIX do ção na inatividade ao posto de Coronel
art. 5° da Carta Magna em vigor e ao art. e os efeitos financeiros deste.»
8° do respectivo ADCT.
E daí a oposição de embargos decla-
2. No parecer (n° 1.684/93-BL) exa- ratórios pelo ora agravado (fls. 71/85),
rado nos autos do agravo de instrumen- cujo julgamento pela E. Primeira Seção
to, o próprio mérito do RE foi examina- do Superior Tribunal de Justiça deu en-
do, e supõe-se que o foi em termos ade- sejo ao aresto hostilizado pela União
quados, de modo a dispensar considera- Federal através do recurso extraordiná-
ções adicionais. Por isto, pede-se vênia rio denegado. Em síntese, o referido ór-
336 R.T.J. — 158

gão julgador, ao conhecer e receber os gurança (os benefícios posteriores de-


embargos de declaração por maioria, pendem de outras provas não documen-
tomou sem efeito o acórdão prolatado tais), imposto pelo art. 5°, inciso LXIX,
no incidente de execução, à considera- da CF (proteção dos direitos líquidos e
ção de que, assim, manteria, na sua ín- certos).
tegra, a decisão, já trânsito em julgado, As outras vantagens concedidas, de
proferida por ocasião do julgamento do forma incomum, pela decisão recorrida,
mandado de segurança requerido pelo poderão ser objeto, se o quiser o impe-
agravado. trante, em ação própria, adequada para
O ponto nodal da controvérsia pode a ampla discussão do assunto.»
ser apreendido pela leitura da seguinte Assim não entendeu, porém, o ilustre
passagem do recurso extraordinário. prolator do despacho impugnado, in
«Logo, quanto ao direito de promo- verbis:
ção do Impetrante ao posto de Coronel «Tais alegações não podem prospe-
do Exército, nada há que se discutir, rar, pois os embargos de declaração no
quer à luz do acórdão concessivo do incidente de execução foram recebidos
mandamus, quer à vista do acórdão porque a decisão relativa ao incidente
proferido em decorrência do Incidente restringia o alcance da segurança já con-
de Execução, quer em função do último cedida e transitada em julgado. Esta, a
Acórdão relativo aos Embargos Dela- sua vez, deferiu ao requerente a promo-
ratórres, eis que o segundo em nada ção pleiteada, com os consectários dessa
modificou o primeiro e o terceiro apenas promoção e com todos os adicionais a
veio a reforçar a decisão original no que que fazia jus.
tange ao direito assegurado — promo-
ção do Impetrante no posto de Coronel. Portanto, ausente qualquer violação
do texto constitucional, não admito o
Porém, a decisão ora recorrida, pro- recurso».
cedeu com sutileza tal que modificou
em muito o alcance do mandamus. É Como se pode verificar, portanto, a
que, na discussão da matéria, a Primeira espécie se diferencia daquelas hipóteses
Seção do STJ não se definiu pelas van- em que esse Pretório Excelso tem dado
tagens financeiras decorrentes da pro- interpretação diversa da do Superior
moção ou pela vantagem do tempo de Tribunal de Justiça em tomo do art. 8°
serviço. Ao contrário, no incidente de do ADCT. Na verdade, bem ou mal
execução claramente pronunciou-se formulada, a solução que terá de preva-
contra elas. lecer é a do aresto concessivo de segu-
rança, pois este transitou em julgado.
Conseqüentemente, se for mantida a
decisão atacada, anulando-se o acórdão A partir dessa consideração, pode-se
originário estar-se-á sobretudo amplian- afirmar, desde já, que o r. despacho im-
do os benefícios concedidos no acórdão pugnado não merece qualquer censura
com ostensiva violação à coisa julgada na parte em que repeliu a alegação de
(art. 5°, inciso XXXVI, CF); estar-se-á contrariedade ao art. 5°, inciso LXIX, da
concedendo mais do que a Constituinte Carta Magna e ao art. 8° do ADCT.
admitiu no art. 8° do ADCT (só cuida de O desfecho do agravo deve, assim,
promoções); ou, ainda, estar-se-à extra- depender unicamente do exame da ale-
vasando os limites do Mandado de Se- gação de contrariedade ao art. 5°, inciso
R.T.J. — 158 337

XXXVI, da mesma Constituição. E, no o fim de delimitar-lhe o alcance espe-


particular, não parece tampouco que a cífico.
pretensão recursal da União deva pros- Certo, não afasto a hipótese da des-
perar. E que o aresto recorrido não am- conformidade tão manifesta entre a de-
pliou a extensão do aresto concessivo da cisão a cumprir e a sua pretextada exe-
segurança, mas antes, ao interpretar os cução que esta implique necessariamen-
seus termos, lhe conferiu o seu verda- te na afronta ao conceito mesmo da coi-
deiro alcance. Ora, é no mínimo razoá- sa julgada ou de sua eficácia.
vel o entendimento de que, se a seguran-
ça foi concedida sem ressalvas, ela o foi Seguramente, não é o caso dos autos.
nos termos do pedido. E, in casu, é certo Apega-se o recorrente a ter a sentença
(v. fl. 15) que o impetrante ora recorrido exeqüenda «considerado elisivo o depó-
pediu a segurança «para o fim de promo- sito». A mesma decisão, contudo, defe-
vê-lo ao posto de Coronel, grau hierár- riu 'correção monetária e juros sobre o
quico que teria alcançado, se tivesse per- capital corrigido'. A liquidação, ora
manecido em atividade até a data de questionada, conciliou com razoabilida-
promulgação da nova Constituição, com de os dois pontos do dispositivo. É que
as vantagens correspondentes ao posto o depósito se fizera em setembro de
de oficial Superior, e respectiva conta- 1983, à base do salário do tempo da
gem do tempo de serviço até 5 de outu- despedida, no ano anterior. Donde, o
cálculo homologado, que teve como
bro de 1988». Ou seja, bem ou mal, o
base o saldo entre o valor corrigido de
aresto concessivo deferiu mesmo ao im-
débito, até a data do depósito, e o valor
petrante não só a promoção ao posto de
depositado.
Coronel, como também as vantagens
correspondentes ao Posto de Oficial Su- Por tudo isso, não conheço do recur-
perior e respectiva contagem do tempo so.»
de serviço até 5 de outubro de 1988. Esse também não é o caso dos autos.
Ao julgar o RE 117.991-DF (Rel. Pelo exposto, somos pelo improvi-
Min. Sepúlveda Pertence, RTJ mento do agravo.
133/439), esse Pretório Excelso fixou as 3. Isto posto, pelas mesmas razões,
seguintes diretrizes sobre quais os casos opinamos pelo não conhecimento do
em que é possível a configuração de presente recurso extraordinário.»
questão constitucional envolvendo o
princípio da coisa julgada. Disse então Esclareço, finalmente, que o eminente
o Exm° Sr. Min. Relator, cujo voto foi Ministro limar Gabião está impedido,
acolhido, in verbis: pois foi o relator do mandado de segurança,
cuja decisão deu margem ao incidente de
«Estou em que só quando partir a execução em causa.
decisão recorrida de erro conspícuo É o relatório.
quanto ao conteúdo e à autoridade, em
tese, da coisa julgada, é que se terá ques- VOTO
tão constitucional a resolver em recurso
extraordinário; não, porém, quando, no o Sr. Ministro Moreira Alves (Rela-
curso do processo executório, a decisão tor): 1. Como se vê desse insólito incidente
questionada se houver limitada à inter- de execução em mandado de segurança —
pretação da decisão exeqüenda, com na verdade, houve uma reclamação por
338 R.T.I. — 158

parte do impetrante, era recorrido —, o que acórdão recorrido, faltando-lhe, pois, o in-
se discutiu, nos embargos declaratório com dispensável prequestionamento (Sumula
efeitos modificativos, foi o limite objetivo 282), e isso porque o que se discutiu foi o
da coisa julgada, concluindo-se, por maio- limite objetivo da coisa julgada em concre-
ria devotos —e não importa, agora, se bem to, e não os aspectos materiais e formais
ou mal —, que ela tinha a extensão maior relativos ao mandado de segurança origina-
defendida pelo impetrante da segurança. riamente julgado.
Ora, interpretação de acórdão para a fi- 3. Em face do exposto, não conheço do
xação dos limites objetivos da coisa julga- presente recurso extraordinário.
da, a não ser quando manifestamente con-
trária ao decidido, é questão que não se alça EXTRATO DA ATA
ao plano constitucional do desrespeito ao
princípio de observância da coisa julgada, RE 170.906 — DF —Rel.: Min. Morei-
mas se restringe ao plano infraconstitucio- ra Alves. Recte.: União Federal (Adv.:
nal, configurando-se, no máximo, ofensa AGU-Arthur de Castilho Neto). Recdo.:
reflexa à Constituição, o que não dá mar- Hjalmar Luiz de Carvalho Tufvesson
gem a recurso extraordinário. (Advs.: Inemar Batista Pema Marinho e
outros).
Ademais, no caso, como se verifica do
voto vencedor — e o mesmo ocorre com Decisão: A Turma não conheceu do re-
relação aos demais votos —, essa questão curso extraordinário. Unânime. Impedido o
não foi sequer discutida sob a perspectiva Sr. Ministro limar Gaivão.
do texto constitucional a ela pertinente (ar- Presidência do Senhor Ministro Moreira
tigo 5", XXXVI, da Constitucional Fe- Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
deral). nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
2. Observo, por outro lado, que, no to- ce, Celso de Mello e Binar Gaivão. Subpro-
cante à alegação de ofensa ao artigo 8° do curador-Geral da República, Dr. Arthur de
ADCT bem como ao artigo 5°, LXIX, am- Castilho Neto.
bos da Constituição Federal, não foram as Brasília, 15 de março de 1994 —Ricar-
questões a eles atinentes ventiladas no do Dias Duarte, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRO N° 173.715 — SP


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello


Recorrente: Estado de São Paulo — Recorrida: Pagos Churrascos Gaúchos
Ltda.
Tributário — ICMS — Lei n° 6.374/89, do estado de São
Paulo — Bares e restaurantes — Fornecimento de alimentação, bebidas
e outras mercadorias, incluídos os serviços que lhe sejam inerentes —
Validade jurídico-constitucional, nesse ponto, da lei paulista — Exação
exigível — Recurso extraordinário provido.
R.T.J. — 158 339

— A Lei n° 6.374/89, do Estado de São Paulo, reveste-se de


validade jurídico-constitucional no ponto em que dispõe sobre a tributa-
bilidade, mediante ICMS, das operações referentes ao fornecimento de
alimentação, bebidas e outras mercadorias por qualquer estabelecimen-
to, incluídos os serviços que lhe sejam inerentes. Precedentes.
ACÓRDÃO VOTO

Vistos, relatados e discutidos estes au- O Sr. Ministro Celso de Mello (Rela-
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- tor): A questão que se coloca nestes autos,
bunal Federal, em Primeira Turma, na con- que não é nova nesta Corte, concerne à
formidade da ata do julgamento e das notas validade jurídico-constitucional da Lei n°
taquigráficas, por unanimidade de votos, 6.374/89, do Estado de São Paulo, no ponto
em conhecer do recurso e lhe dar provi- em que dispôs sobre a incidência do ICMS
mento. sobre operações referentes ao fornecimen-
Brasília, 9 de maio de 1995 — Moreira to de alimentação, bebidas e outras merca-
Alves, Presidente — Celso de Meio, Re- dorias por qualquer estabelecimento, in-
lator. cluídos os serviços que lhe sejam inerentes.
O Plenário do Supremo Tribunal Fede-
RELATÓRIO ral, ao julgar o RE 160.007-SP, rel. Min.
Marco Aurélio (DJU de 3-11-94), procla-
O Sr. Ministro Celso de Mello: O Es- mou, na hipótese em questão, a plena
tado de São Paulo recorre extraordinaria- validade constitucional da Lei paulista n°
mente do acórdão do Superior Tribunal 6.374/89, e, desse modo, reconheceu como
de Justiça que, adotando o entendimento legítima a incidência da exação em causa.
de que não é lícito o lançamento do ICMS O Convênio ICM n° 66/88, não obstante
sobre o fornecimento de refeições em bares a provisoriedade do regramento normativo
e restaurantes, deu provimento ao recurso
que veicula, qualifica-se, nos termos do art.
especial da empresa contribuinte nos se- 34, § 8°, do ADCT, como sucedâneo cons-
guintes termos: titucional da lei complementar exigida
«Tributário —ICMS — Forneci- pelo art. 146, III, a, da Carta Política. Daí,
mento de alimentação em bares e res- a exata observação de Hugo de Brito Ma-
taurantes — Competência. chado («Curso de Direito Tributário», pág.
253, 7' ed., 1993, Malheiros), no sentido de
O fornecimento de refeições em ba- que o constituinte federal substituiu a
res e restaurantes, por constituir serviço
lei complementar pelo convênio interesta-
não compreendido no Art. 155, I, b, da
Constituição, está livre de tributação es- dual, para o fim específico de viabilizar a
instituição do ICMS» (grifei).
tadual.» (fl.151)
O presente recurso extraordinário, que O Convênio em questão, enquanto ins-
foi devidamente admitido e processado, trumento normativo de regência provi-
tem por fundamento a alegada violação do
sória da matéria pertinente ao ICMS,
empresta o necessário suporte jurídico à
art. 155, § 2°, IX, b, da Constituição Fede-
questionada ação tributante do Estado, na
ral. medida em que, além de identificar, de
É o relatório. modo adequado, a base de cálculo do im-
340 R.T.J. —158

posto («o valor total da operação, com- item III, da vigente Constituição, não
preendendo o fornecimento da mercadoria institui imposto. Não descreve o seu fato
e a prestação do serviço» — art. 4°, IV), gerador. Não é lei de tributação, mas lei
define a hipótese de incidência do ICMS sobre leis de tributação. Tem a finalida-
nas operações de «fornecimento de alimen- de de promover a unidade nacional, na
tação, bebidas e outras mercadorias, por medida em que, melhor definindo o âm-
qualquer estabelecimento, incluídos os ser- bito do tributo, estreita o campo em que
viços prestados» (art. 2°, VII). há de laborar o legislador ordinário ao
Revela-se destituída de qualquer funda- institui lo.
mento, por sua vez, a objeção daqueles que É induvidoso, portanto, que o fato
sustentam a imprescindibilidade da lei gerador do ICMS é o descrito na lei do
complementar local para efeito de válida Estado, ou do Distrito Federal, que o
instituição, pelo Estado-membro, do institui. A área factual descrita na Cons-
ICMS. Trata-se de tese que, ressalvadas as tituição Federal, e na lei complementar
hipóteses excepcionais previstas no pró- a que se reporta seu art. 146, item III, é
prio texto da Lei Fundamental da Repú- limite que não pode ser ultrapassado
blica, não encontra qualquer apoio em nos- pelo legislador ordinário que institui o
so sistema de direito constitucional positi- tributo.» (op. loc. cit., grifei)
vo, em que o processo de criação dos im-
postos exterioriza-se, instrumentalmente, De outro lado, e no que concerne espe-
em leis meramente ordinárias. Por isso cificamente à definição da base imponivel
mesmo — registra Paulo de Barros Car- da espécie tributária em questão, impende
valho («Curso de Direito Tributário», pág. ressaltar a circunstância de a Lei paulista n°
48, e ed., 1991, Saraiva) —, é a lei ordi- 6.374/89 e o Convênio ICM n° 66/88 guar-
nária «o instrumento por excelência da darem plena conformidade hierárquico-
imposição tributária». normativa com o preceito inscrito no art.
O repreensível magistério de Hugo de 155, § 2°, IX, b, da Carta Política, que
Brito Machado, ilustre Magistrado e Pro- autoriza a incidência do ICMS, uma vez
fessor eminente, bem realça a inconsistên- editada a competente lei ordinária esta-
cia jurídica dessa tese, verbis: dual, «sobre o valor total da operação,
quando mercadorias forem fornecidas com
«Segundo a vigente Constituição Fe- serviços não compreendidos na competên-
deral, cabe à lei complementar estabele- cia tributária dos Municípios.»
cer normas gerais em matéria de legis-
lação tributária, especialmente sobre a Vê-se, pois, que a regra de competência
definição dos fatos geradores dos tribu- impositiva inscrita no art. 155, I, b, da
tos (art 146, item III, alínea a). A lei Constituição — que autoriza o Estado-
complementar, todavia, não é o ins- membro a instituir o ICMS — deve ser
trumento hábil para a instituição do interpretada em função do que também
tributo, a não ser, é claro, naqueles prescreve a norma consubstanciada no art.
casos nos quais a própria Constitui- 155, § 2°, IX, b, do Estatuto Fundamental,
ção determina que o tributo será cria- que legitima a incidência dessa espécie tri-
do por lei complementar, como acon- butária sobre operações relativas à circula-
tece, por exemplo, com o art. 154, item ção jurídica de mercadorias fornecidas
I. Assim, temos de entender que a lei «com serviços não compreendidos na com-
complementar a que se refere o art. 146, petência tributária dos Municípios».
R.TJ. — 158 341

Os serviços exclusivamente tributáveis lei complementar, como exigido pela


pelos Municípios, por intermédio do ISS, Constituição (art. 156, IV), os serviços
acham-se relacionados em lista cuja taxa- envolvidos na operação, prestados por
tividade, constituindo natural conseqüên- cozinheiros, maitres e garçons (...), es-
cia do princípio da legalidade tributária, tão sujeitos a ICMS.» (RE 144.795-
tem sido reconhecida tanto pela doutrina SP, trecho do voto do rel. Min. Bmar
(Ruy Barbosa Nogueira, in RT 482/263; Gaivão — grifei)
Aliomar Baleeiro, «Direito Tributário
Brasileiro», pág. 270, 8* ed., 1976, Foren- Tendo o Supremo Tribunal Federal,
se), quanto pela jurisprudência do Su- desse modo, reconhecido como perfeita-
premo Tribunal Federal (RTJ 68/198 — mente legítima a tributabilidade dessas
RTJ 89/281 — RTJ 97/357 — RDA operações, na forma como instituída pela
118/155), em ordem a justificar a pretensão Lei paulista n° 6.374, não há como a em-
fiscal do Estado-membro no que concerne presa contribuinte pretender subtrair-se à
à instituição e cobrança do ICMS sobre o incidência do imposto. Nesse sentido, cf.,
fornecimento de mercadorias com presta- ainda, pronunciamentos mais recentes da
ção de serviços não discriminados na lista Primeira Turma do Supremo Tribunal Fe-
referida. deral sobre a matéria objetivada na presente
sede recursal (RE 144.795-SP, Rel. Min.
A previsão constante do art. 155, § 2°, limar Gaivão; RE 160.595-SP-AgRg,
IX, b, da Carta Política constitucionalizou Rel. Min. Celso de Meio; RE 163.422-
a norma inscrita no art. r, § 2°, do DL n° SP-AgRg, Rel. Min. Celso de Mello, v.g.).
406/68 que, revestido de força e eficácia
de lei complementar — consoante atesta Assim sendo, e considerando que o en-
a doutrina (Edvaldo Brito, in «Cadernos tendimento consubstanciado no acórdão
de Direito Tributário e Finanças Públicas», recorrido não se encontra em sintonia com
n° 2, Ano 1, pág. 103, item n° 24, 1993 RT; a jurisprudência que se firmou no Supremo
Celso Ribeiro Bastos, Curso de Direito Tribunal Federal nesse tema, conheço e
Financeiro e de Direito Tributário», pág. dou provimento ao presente recurso ex-
272, 1991, Saraiva) —, submete ao âmbito traordinário para, restabelecendo o acórdão
de incidência do tributo estadual em causa do Tribunal de Justiça do Estado de São
o fornecimento de mercadorias com pres- Paulo, julgar improcedentes os embargos
tação de serviços, desde que não especifi- opostos pela empresa contribuinte contra a
cados estes na lista anexa ao decreto-lei execução fiscal movida pela Fazenda Pú-
mencionado. blica estadual.
Daí, a conclusão a que chegou esta Su- É o meu voto.
prema Corte no precedente referido, ver-
bis:
EXTRATO DA ATA
«O fornecimento de alimentação e
bebidas, para consumo no próprio esta-
belecimento, caso de restaurantes, ba- RE 173.715 — SP — Rel.: Min. Celso
res, boates, etc., compreende-se na hipó- de Mello. Recte.: Estado de São Paulo
tese de mercadoria fornecida com pres- (Advs.: Miriam Ptachcovski Sacai e ou-
tação de serviços. Pelo singelo motivo tros). Recdo.: Pagos Churrascos Gaúchos
de que não se acham relacionados em Ltda. (Advs.: Nomando Fonseca e outro).
342 R.T.J. — 158

Decisão: A Turma conheceu do recurso ce, Celso de Mello e limar Gaivão. Subpro-
e lhe deu provimento, nos termos do voto curador-Geral da República, Dr. Miguel
do Relator. Unânime. Franzino Pereira.
Presidência do Senhor Ministro Moreira
Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi- Brasília, 9 de maio de 1995 — Ricardo
nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten- Dias Duarte, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 171938 — AP


(Segunda Turma)
Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio
Recorrente: Francisco de Assis Menezes — Recorrido: Ministério Público
Estadual
Legitimação — Crime contra a honra — Servidor Público.
Descabe interpretar o inciso I do artigo 129 da Constituição Federal
de modo a nele ver albergada a ação penal pública condicionada.
Sendo o direito uma ciência, os institutos, as expressões e os vocábulos
que o compõem têm sentido próprio. Aquela não se confunde com a
ação penal pública, da iniciativa única do Ministério Público. A
colocação da máquina acusadora do Estado ao alcance do servidor
público, no que atingido na honra, não o torna parte ilegítima para
atuar na via direta, porque o maior interessado na defesa da própria
reputação. Não há como interpretar normas componentes da ordem
jurídica de forma contrária aos interesses daquele a que visem a
proteger. Legitimação concorrente admitida.

ACÓRDÃO 104/111), interposto, com fundamento no


art. 102, item III, letra a, da Constituição,
Vistos, relatados e discutidos estes au- por Francisco de Assis Menezes, visando
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri- reformar acórdão do colendo Superior Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- bunal de Justiça, concessivo de ordem de
formidade da ata do julgamento e das notas habeas corpos em favor de Adonias de
taquigráficas, por maioria de votos, contra Freitas Trajano de Souza, que exibe esta
o voto do Relator, em conhecer do recurso ementa (fl. 70):
e lhe dar provimento, para cassar o «habeas
«Processo penaL Habeas corpus.
corpus», reconhecida a legitimidade do Re- Crime de imprensa cometido contra
corrente para propor a ação penal. funcionário público, em razão de suas
Brasflia, 18 de outubro de 1994 — Néri funções. Procede-se mediante ação
da Silveira, Presidente — Marco Aurélio, pública condicionada, e não mediante
Redator p/ o acórdão. ação privada (art. 40, inciso I, letra b,
combinado com o art. 23, inciso II, da
RELATÓRIO Lei n° 5.250/67).
O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- I — Dessume-se do artigo 40,
tor): Trata-sede recurso extraordinário (fls. inciso I, letra b, combinado com o art.
R.T.J. — 158 343

23, inciso II, todos da Lei n° 5.250/67, o ilustre Desembargador-Relator (fls.


que os eventuais crimes a serem apura- 42/43 e fls. 94/95): «Por essas conside-
dos são de ação penal pública condicio- rações, admito em termos a queixa-cri-
nada. Em vista disso, por ser de gênero me, como também, a admite o Ministé-
ação penal pública, por imposição cons- rio Público e, por isso mesmo, apta a ser
titucional, devem ter início por denúncia processada e apreciada» (fl. 108).
de seu titular nato, ou seja, o Ministério
Público — inciso I, do art. 129, da Cons- Pede, afinal, o recorrente a reforma da
tituição, salvo no caso de inércia do decisão do Tribunal a imo, «para, denegan-
Parquet — inciso LIX, do art. 5° da do a ordem de habeas corpus, prosseguir
Constituição. a ação penal contra o paciente, que violou
II — Portanto, in casu, a exigên- a garantia fundamental do recorrente quan-
cia constitucional foi preterida, haja vis- to à sua honra» (fl. 111).
ta que o promovente da presente ação
penal pública não é o seu dominus litis, Contra-razões do Ministério Público às
mas o particular. Igualmente, o paciente fls. 113/117, na qual se manifestou pela
está sofrendo constrangimento ilegal, inadmissão do apelo extremo, «quer por-
pois foi citado para apresentar defesa que a questão agitada é fática», «quer por-
prévia e decretada a sua revelia, fora da
que não se vislumbra farpeio aos preceitos
hipótese legal. constitucionais» (fl. 116).
III — Em assim sendo, por care-
cer o particular de legitimado ad cau- Pelo despacho de fls. 118/119, admitiu
sam para promover a ação penal públi- a subida do recurso extraordinário a este
ca, quer incondicionada, quer condicio- Tribunal o ilustre Vice-Presidente do STJ,
nada, salvo o caso de inércia do Minis- anotando, à fl. 119:
tério Público, concede-se o writ.»
«VI — À luz do que venho de resu-
Sustenta o recorrente, em síntese, que o mir, tenho como certo que se configura
aresto em comento vulnerou os arts. 5°, o desapreço dor. julgado aqui impugna-
itens X, XXXV e LIX, e 129, item I, da Lei do pela garantia constitucional de aces-
Maior, assinalando que «a exigência cons- so à jurisdição, assegurado à própria
titucional não foi preterida», bem assim vítima da ofensa a sua honra (servidor
que o Ministério Público «foi quem não público), desde que o MP não se opôs
usou da prerrogativa constitucional quando ao exercício da ação penal, pois não
instado a fazê-lo» (fl. 108). Acrescentou, emitiu parecer contrário à sua proposi-
mais adiante, o recorrente: tura, enquanto é também certo que não
«Vê-se, então, que não houve prete- denunciou o autor da ofensa. Eviden-
rição da exigência constitucional, mas ciou-se, assim, a inércia do Ministério
«inação» do Ministério Público que, ao Público.»
tomar conhecimento da inicial, apontou Oficiando nos autos, opinou a Procura-
possível omissão do mandato outorga- doria-Geral da República, no parecer de fls.
do. Quanto ao mais, deu parecer pela 125/128, pelo não conhecimento do recur-
<degitimidade in casu, para o ofereci- so ou, se conhecido, pelo seu improvi-
mento da queixa-crime e pelo «prosse- mento.
guimento, nada tendo a aditar» (fls. 40
e 41). A seguir, após relatar, despachou É o relatório.
344 R.T.J. — 158

VOTO do gênero ação penal pública, por impo-


O Sr. Ministro Néri da Silveira (Rela- sição constitucional, devem ter início
tor): O recorrente é Secretário de Justiça e por denúncia do seu titular nato, ou seja,
Segurança Pública do Estado do Amapá. o Ministério Público — inciso I, do art.
Considerando-se ofendido pelo recorrido, ao 129, da Constituição, salvo no caso de
conceder entrevista ao Jornal do Dia de inércia do Parquet — inciso LIX, do
Macapá, edição de 17-11-1992, ajuizou ação art. 5° da Constituição.
penal privada, que está tendo curso. Na con- Nesse sentido tem decidido este Tri-
dição de funcionário público, segundo o bunal, in verbis:
acórdão, não estava legitimado o ora recor-
rente a mover a ação penal contra o autor das «Penal. Crime de imprensa.
declarações publicadas. O voto condutor do Ação penal. Ilegitimidade de parte.
atesto, da lavra do ilustre Ministro Pedro Tratando-se de ofensa irrogada a
Acioli, registra, às fls. 59/62, verbis: funcionário em razão das suas fun-
ções, a ação penal é promovida
«Ressai, da exposição feita acima, pelo Ministério Público, mediante
que as ofensas narradas foram direcio- representação do ofendido, nos
nadas ao Secretário de Justiça e Segu- termos do art. 40, I„ b, caso de inér-
rança Pública do Estado do Amapá, fun- cia do parquet. Recurso conhecido e
cionário público, art. 327, do CP, em improvido» (Resp. &861-PA, Rel.
razão de sua função pública. Ministro Costa Leite, in DJ 19- 8- 91).
E, por outro lado, o art. 40, inciso I, Processual penal. Delito de im-
letra b, da Lei n° 5.250/67, preceitua que: prensa. Ação pública condiciona-
«Art. 40. A ação penal será da. Ação privada subsidiária.
promovida:
1 — Nos delitos dos arts. 20,
I — nos crimes de que tratam os 21 e 22 da lei de imprensa é titular
arts. 20 a 22: da ação o Ministério Público, me-
diante representação do ofendido,
quando este é funcionário público
b) pelo Ministério Público, me- e a ofensa é em razão do exercício
diante representação do ofendido, da função.
nos casos dos n°s II e III, do art. 23;
2 — Quando o titular da ação
O art. 23, inciso II, da lei citada, tem
pede e obtém decisão judicial de
a seguinte redação: arquivamento da representação,
«Art. 23. As penas cominadas não há lugar para a ação privada
nos arts. 20 a 22 aumentam-se de um subsidiária, pois inexistente omis-
terço, se qualquer dos crimes é come- são do Ministério Público» (Resp.
tido: n° 657-SP, Rel. Ministro Dias Trin-
dade, in DJ 6-11-89).
II — contra funcionário público, E, simetricamente, decidida o egré-
em razão de suas funções;» gio Tribunal Federal de Recursos:
Dessume-se dos dispositivos da Lei «Penal e processual penal. Ofen-
de Imprensa que os eventuais crimes a sas endereçadas a funcionário públi-
serem apurados são de ação penal públi- co, em razão da função. Hipótese de
ca condicionada. Em vista disso, por ser ação penal pública condicionada.
R.T.J. — 158 345

Identificação datiloscópica. En- haveria ofensa ao princípio da isonomia


quanto não editada lei definindo as de tratamento, de cunho constitucional.
exceções a r que se refere a parte O funcionário público em relação ao
final do inciso LV1R do art. 5° da particular estaria em posição desvanta-
atual Constituição, prevalece com josa. No caso de não-funcionário, a ação
maior amplitude o novo princípio penal se instaura por simples queixa do
de que o civilmente identificado ofendido. Já em se tratando de ofendido
não será submetido à identificação ocupante de cargo público, a ação seria
criminal. Concessão da ordem ape- _ intentada pelo Ministério Público me-
nas para isentar o paciente da exi- diante representação do funcionário.
gência de identificação datiloscópica
(HC n° 7.520/DF, Rel. Min. Assis Senhor Presidente, peço vênia ao Mi-
Toledo, in DJ 28-11-88). nistro Cernicchiaro para ficar com o
relator.
Dessarte, a exigência constitucional
está sendo preterida, haja vista que o pro- Em se tratando de crime contra a
movente da presente ação penal pública honra de funcionário público por ato
não é o seu dominas lids, mas o particu- praticado ratione officii, a Lei n°
lar. Igualmente o paciente está sofrendo 5.250/67, em seu art. 40, inciso I, alínea
constrangimento ilegal, pois foi citado b, é taxativa; pois fala que a ação penal
para apresentar defesa prévia e decretada será promovida — in verbis — «me-
a sua revelia, fora da hipótese legal. diante representação do ofendido, nos
casos dos incisos II e III, do art. 23». E
Em assim sendo, por carecer o parti- o art. 23, como ressaltou o Ministro
cular do legitimado ad causam para Acioli, é relativo a «funcionário públi-
promover ação penal pública, quer in- co, em razão de suas funções».
condicionada quer condicionada, salvo
o caso de inércia, concedo a ordem para No caso concreto, o ofendido não
que sejam anulados os atos praticados e fez, como manda a lei, a representação.
oferecida a denúncia, pelo órgão titular Foi logo entrando com a queixa, como
da ação penal pública, desde que o ofen- se houvesse omissão por parte do órgão
dido represente para tal mister.» ministerial.
Na mesma linha, o ilustre Ministro Quanto à alegada ofensa à isonomia
Adhemar Maciel (fls. 66/67), nestes termos: de tratamento, tenho para mim que a lei
de regência não briga com a Constitui-
«O relator, o eminente Ministro Pe-
ção. Se o Ministério Público não ingres-
dro Acioli, concedeu o writ. Esteou-se
sar com a ação no prazo legal, caberá ao
na alínea b do inciso I do art. 40 da Lei
próprio ofendido acionar o Judiciá-
n° 5.250/67 e em farta jurisprudência do
rio, tudo nos termos do inciso LIX do
STJ. Em resumo, o queixoso, na quali- art. 5° da Constituição, como bem lem-
dade de Secretário de Estado, não pode-
brou o próprio Ministro Vicente Cer-
ria ter intentado a ação penal. Caberia a
ele, por ser funcionário público, ter, em
nicchiaro.
primeiro lugar, feito representação ao Assim, Senhor Presidente, também
Ministério Público. concedo o writ».
O eminente Ministro Vicente Cer- Foi voto vencido o Senhor Ministro Vi-
nicchiaro, por seu turno, teve outro en- cente Cernicchiaro, que fundamentou seu
tendimento. Ponderou que, no fundo, pronunciamento (fls. 63/64), in verbis:
346 R.T.J. — 158

«Sr. Presidente, ouvi com atenção as que ele não foi ofendido — defender a
doutas ponderações do Eminente Rela- sua honra.
tor. Solicitaria, todavia, respeitosa vênia No caso concreto, houve um desvio
para dissentir. Assim o faço, tendo em — repetindo a expressão — a pureza
vista que, numa pureza técnica, o racio- técnica. Qual a finalidade da representa-
cínio é perfeito. A lei faz perfeita distin- ção? É o ofendido manifestar, de forma
ção quanto à legitimidade para agir: ou solene, que deseja propor a ação penal.
é do Ministério Público incondicionada- Por uma via ou por outra, essa manifes-
mente, ou é do ofendido, ou ocorre a tação chegou ao Ministério Público,
posição intermediária, a chamada ação que, ao invés de oferecer a denúncia ou
pública dependente de representação. fazer o aditamento, ao contrário, pediu
No caso dos autos, tratar-se-ia de ofensa pura e simplesmente o prosseguimento;
dirigida ao servidor público no sentido ou seja, noticiado o Ministério Público
lato do termo; por isso, atrairia o dispos- recusou-se a propor a ação. Entendo,
to no art. 141 do Código Penal, que tem portanto, nasceu, aí, o direito subjetivo
a sua correspondência no art. 40 da Lei do particular solicitar a prestação juris-
de Imprensa, ou seja, a pureza técnica dicional. Caso contrário, o funcionário
solicitaria que o ofendido, no caso, tec- público ficaria diminuído em relação a
nicamente, fizesse a representação ao um particular na preservação da digni-
Ministério Público para que o Parquet dade, da sua honra, da sua reputação —
oferecesse ou não a denúncia. um dos aspectos dos chamados direitos
O problema está gerando atualmente humanos.
a preocupação, inquietação já lançada, Em face dessas considerações, en-
ponderada na Corte Especial do Supe- tendendo que apenas houve uma forma
rior Tribunal de Justiça, qual seja, se o heterodoxa de ser solicitada a prestação
funcionário público para defender a sua jurisdicional, peço vênia a fim de dene-
honra terá que fazer a representação ao gar o habeas corpus.»
Ministério Público. Caso este entenda Ora, reza o art. 129, I, da Constitui-
da inexistência do crime e, por isso, ção:
determine o arquivamento, estaria ele
privado de defender a sua reputação, a «Art. 129. São funções institu-
sua dignidade, o seu decoro, quando o cionais do Ministério Público:
particular, independente do filtro do Mi- I — promover, privativamente,
nistério Público, terá o direito subjetivo a ação penal pública, na forma da
de solicitar a prestação jurisdicional. É lei.»
certo, a Constituição no art. 5° diz que: A seu turno, prevê o art. 5°, LIX, da
uno caso de omissão do Ministério Pú- Constituição:
blico será nascido o direito da ação pe-
nal privada — rectius — ação penal de «LIX — será admitida ação pri-
iniciativa privada». A ação é sempre vada nos crimes de ação pública, se
pública, a iniciativa é que ou é do par- esta não for intentada no prazo le-
quet ou do particular ofendido. Apesar gal.»
da expressão literal da Constituição, se- Pois bem, no caso concreto, afirmou o
ria afetado o princípio da isonomia, caso voto condutor do acórdão recorrido (fl. 61):
o funcionário público não pudesse — «Destarte, a exigência constitucional está
porque o Ministério Público entendeu sendo preterida, haja vista que o promoven-
R.T.J. — 158 347

te da presente ação penal pública não é o «Art. 129. São funções institucio-
seu dominas litis, mas o particular». nais do Ministério Público:
Também o ilustre Ministro Adhemar I — promover, privativamente, a
Maciel acentuou (fl. 67): «No caso concre- ação penal pública, na forma da lei;»
to, o ofendido não fez, como manda a lei, a
Esta especificidade, quanto à atuação do
representação. Foi logo entrando com a
Ministério Público, ligada sem dúvida al-
queixa, como houvesse omissão por parte guma à ação penal pública — repito, públi-
do órgão ministerial».
ca —, e não à ação penal pública condicio-
O acórdão proclamou, desse modo, que nada, mereceu um temperamento quando
não houve representação do ofendido, ora se cuidou das garantias constitucionais,
recorrente. Cuida-se de matéria de fato, in- prevendo o inciso LIX, referido por V.
suscetível de discussão em habeas corpus. Exa.:
Ora, somente caberia discutir em tomo «LIX — será admitida ação priva-
do cabimento da ação privada, se, feita a da nos crimes de ação pública — repito,
representação, o MP não houvesse intenta- ação pública propriamente dita — se
do a ação pública no prazo legal. Não tendo esta não foi intentada no prazo legal;»
havido representação, não há aqui falar em A meu ver, Senhor Presidente, potencia-
ofensa ao art. 5°, LIX, da Lei Maior, pelo lizou-se o teor do inciso I, albergando-se,
acórdão. Também o art. 129, I, da Consti- nesse inciso, uma ação que não é, para mim,
tuição, não foi vulnerado pelo aresto, que, uma ação pública; que não é a ação nele
de expresso, reconheceu haver o ora recor- definida, já que todos sabemos que, para
rente ingressado, diretamente, em Juízo, propor ação pública, o Ministério Público
com queixa-crime, que se vê às fls. 5/13. não depende de qualquer provocação. Tem
É de notar, outrossim, que o Plenário na a titularidade.
Ação Originária n° 191-9-PE, relator o ilus- Assento, Senhor Presidente, logo de iní-
tre Ministro Marco Aurélio, ao receber a cio, que, no caso, inobservou-se a regra do
queixa, no caso objeto do julgamento teve inciso I em comento, no que estendida a
em conta a inércia do Ministério Público, uma situação concreta, que não ensejava a
«deixando de atuar nos prazos fixados nos propositura da ação mencionada nesse dis-
artigos 40, § 1°, da Lei n° 5.250/67 e 46 do positivo.
Código de Processo Penal —de dez e quin-
ze dias respectivamente». — A decisão O que digo é que essa reserva, a inicia-
afirmou que, nessas circunstâncias, «abre- tiva privativa do Ministério Público, até
se oportunidade à propositura da ação sub- mesmo considerando esse vocábulo «pri-
sidiária ou pública, pelo ofendido». vativamente», diz respeito, apenas, à ação
pública propriamente dita, não alcançando,
Do exposto, não conheço do recurso em face a esse predicado revelador da ini-
extraordinário, por não ver configurada ciativa exclusiva do Ministério Público, a
ofensa aos dispositivos maiores apontados ação penal pública condicionada.
no apelo extremo.
Senhor Presidente, como afirmado da
VOTO tribuna pelo ilustre Advogado, citando uma
ementa que redigi, não posso interpretar
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Senhor dispositivos de modo a chegar ao prejuízo,
Presidente, o inciso Ido artigo 129 da Carta justamente, daquela a quem o dispositivo
preceitua: objetiva proteger. Quando se cogita da
348 R.T.J. — 158

atuação do Ministério Público, nesses casos em que o Ministério Público pode ajuizar a
de crime contra a honra de funcionário públi- ação penal independentemente da provoca-
co, coloca-se ao alcance do ofendido a má- ção de quem quer que seja. Ele define a melhor
quina estatal de acusação. Só que esse fato oportunidade para o ajuizamento, a conve-
não é de molde, a meu ver, a afastar a própria niência, a necessidade desse ajuizamento,
defesa da honra pelo ofendido; a afastar o o que não se dá no caso de crime contra a
acesso ao Judiciário, pelo próprio ofendido honra praticado contra funcionário público.
no que previsto como garantia constitucional. Portanto, o preceito está restrito à ação penal
pública, não alcançando a condicionada.
De qualquer forma, Senhor Presidente,
V. Exa. procedeu à leitura da petição inicial Peço vênia, desta para conhecer e pro-
da ação penal e, ao término dessa peça, o ver o pedido formulado neste recurso, a fim
Querelante teve o cuidado de lançar que a de, reformando o acórdão concessivo da or-
petição servia também como representa- dem no babem corpos — o acórdão do Su-
ção, pedindo que fosse ouvido o Ministério perior Tribunal de Justiça — denegar essa
Público. Qual foi a postura do Ministério mesma ordem, tendo o Recorrente como
Público? Endossou-a. parte legítima para a ação penal intentada.
Tenho presente que a representação está EXTRATO DA ATA
sujeita a determinadas formalidades. Apenas
argumento como fecho da inicial, para refor- RE 173. 938 — AP — Rel.: Min. Néri
çar a premissa de meu voto, suficiente que é, da Silveira. Recte.: Francisco de Assis Me-
no sentido de que não temos como ver, no nezes (Mv.: Guaracy da Silva Freitas).
inciso I do artigo 129, agasalhada a hipótese Recdo.: Ministério Público Estadual.
em que o Ministério Público, que tem em Decisão: Após o voto do Ministro Rela-
caráter exclusivo a ação, não pode atuar in- tor não conhecendo do recurso extraordiná-
dependentemente da vontade de um tercei- rio, e do voto do Ministro Marco Aurélio
ro. Quando no inciso I do artigo 129 aludiu- dele conhecendo e lhe dando provimento,
se à titularidade exclusiva da ação, quis-se para cassar o «habeas corpus», o julgamen-
referir à ação pública propriamente dita. E to foi adiado em virtude do pedido de vista
ação pública condicionada não é aquela que do Ministro Paulo Brossard. Ausentes, oca-
está ali, porque não compreendo que se sionalmente, os Ministros Carlos Velloso e
possa ter a atuação como exclusiva, quando Francisco Rezelc Falou pelo recorrente o
condicionada a um procedimento de tercei- Dr. Guaracy da Silva Freitas.
ro. Realmente não compreendo, não consi-
go compreender. Presidência do Senhor Ministro Néri da
Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
Peço vênia, Senhor Presidente, para rea- Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso,
firmar que: primeiro, a Constituição Federal, Marco Aurélio e Francisco Rezelc Subpro-
mesmo no tocante aos funcionários públicos, curador-Geral daRepública, o Dr. Mareiem
que são cidadãos, assegura o direito à preser- Costa Pinto.
vação da própria honra, assegura que, na Brasília, 23 de agosto de 1994 — José
hipótese de lesão a esse bem da vida impor- Wilson Aragão, Secretário.
tantíssimo, que é a honra, fica viabilizado o
acesso à defesa. Segundo, o artigo 129, inciso VOTO (VISTA)
I, combinado com o inciso LIX do rol das
garantias constitucionais, no que prevê a ex- O Sr. Ministro Paulo Brossard: Trago
clusividade, diz respeito àquelas hipóteses hoje meu voto-vista no recurso extraordi-
R.T.J. — 158 349

nário criminal n° 173.938-0, rel. Min. Néri pública condicionada à representação;


da Silveira, por ter recebido os autos so- pediu a anulação do processo ab initio.
mente em 11-10-94. A 6" Turma do Superior Tribunal de
Assim resumo a quaestio juris: em Justiça, por maioria concedeu a ordem
17-11-92, em Macapá, o «Jornal do Dia» em acórdão assim ementado, in verbis:
publicou entrevista do Deputado Estadual «Processo penal. Habeas corpus.
Adonias de Freitas Trajano de Souza acusan- Crime de imprensa cometido contra
do o Secretário de Justiça e Segurança Públi- funcionário público, em razão de suas
ca do Estado do Amapá Francisco de Assis funções. Procede-se mediante ação
Menezes, e também alguns policiais, de estar pública condicionada, e não mediante
sendo subornado pela empresa Sevel para ação privada...
incriminá-lo em roubo de gado; o Secretário I — Dessume-se dos arts. 40, I,
de Estado ofereceu queixa-crime perante o b, combinado com o art. 23, II, todos da
Tribunal de Justiça acusando o Deputado Lei n° 5.250/67, que os eventuais crimes
pela prática dos crimes de calúnia, injúria e a serem apurados são de ação penal pú-
difamação, previstos nos arts. 20 a 22 da Lei blica condicionada. Em vista disso, por
de Ireprensa, e pediu que os autos fossem ser do gênero ação penal pública, por
remetidos ao Ministério Público, acrescen- imposição constitucional, devem ter iní-
tando que a «petição serve também como cio por denúncia de seu titular nato, ou
Representação do Querelante»; ao se pronun- seja, o Ministério Público — inciso Ido
ciar, o Procurador de Justiça ponderou que art. 129 da Constituição, salvo no caso
«há entendimentos, com os quais comungo, de inércia do Parquet — inc. LIX, do
pela legitimidade do funcionário público em art. 5° da Constituição.
oferecer queixa-crime (RT 627 e 630)», II — Portanto, in casu, a exigên-
apontou vício de forma na procuração e re- cia constitucional foi preterida, haja vis-
quereu «a intimação do querelante para curar ta que o promovente da presente ação
a falha» e «após, pelo prosseguimento, nada penal pública não é o seu dominus litis,
tendo a editar»; o Presidente e Relator, De- mas o particular. Igualmente, o paciente
sembargador Honildo Amaral de Mello Cas- está sofrendo constrangimento ilegal,
tro, não acolheu a impugnação do Ministério pois foi citado para apresentar defesa
Público quanto ao mandato e concluiu dizen- prévia e decretada a sua revelia, fora da
do «admito em tennos a queixa-crime, como hipótese legal.
também, a admite o Ministério Público e, por
isso mesmo, apta a ser processada e aprecia- III—Em assim sendo, por care-
da» e determinou a citação do Deputado; cer o particular de legitimado ad cau-
contra esta decisão do Relator o Deputado sam para promover a ação penal públi-
impetrou ordem babeas corpus perante o ca, quer incondicionada, quer condicio-
nada, salvo o caso de inércia do Minis-
Superior Tribunal de Justiça, alegando
tério Público, concede-se o writ.»
estar sofrendo coação ilegal por não ter
sido solicitada autorização do Poder Le- Contra esta decisão do Superior Tribu-
gislativo para a instauração do processo nal de Justiça o Secretário de Estado inter-
e por inobservância do parágrafo único põe recurso extraordinário, com base no
do art. 145 do Código Penal e do art. 25 art. 102, III, a, da Constituição, afirmando
do Código de Processo Penal, por enten- contrariedade aos arts. 5°, caput, X, XXXV
der que para os fatos é exigida ação e LIX, e 129, I, da Constituição. Argúi a
350 R.T.J. — 158

tempestividade do recurso; invoca como em 20-10-93, fl. 103, quando interpôs o


precedente a admissão do RE n° 168.224; extraordinário, fl. 104.
alega que a exigência constitucional não foi
Ainda que não haja decisão a respeito,
preterida, pois ocorreu inação do Ministério entendo que se os autos foram retidos inde-
Público, que não usou a prerrogativa consti- vidamente pelo fiscal da lei durante todo o
tucional quando instado a fazê-lo, tendo dado prazo para o sucumbente recorrer, não era
pela legitimidade da queixa; invoca o voto ele obrigado a ir diariamente ao Tribunal
vencido do Ministro Vicente Cemicchiaro no para saber se os autos já tinham sido devol-
sentido que ((houve uma forma heterodoxa de vidos. Bastava fazer o que fez, ainda que
ser solicitada a prestação jurisdicional» e o não o tenha feito corretamente, pois não
que consta dos votos dos Ministros Octavio denunciou a obstrução judicial: requerer a
Gallotti, Relator, e Sepúlveda Pertence no vista dos autos durante a obstrução imposta
HC n° 68.540-RJ, RTJ 136/651. Pede a refor- pela Subprocuradoria-Geral da República e
ma da decisão. aguardar a publicação da decisão.
2. Senhor Presidente, há uma questão Por esta razão, reconheço a suspensão
preliminar que ainda não foi apreciada, nem do prazo desde a publicação do acórdão, em
no despacho de admissibilidade, nem no pa- 13-9-93, até a publicação da decisão que
recer do Ministério Público, nem no relatório deferiu a vista dos autos, em 6-10-93, nos
e nos doutos votos proferidos: consta à fl. 112 termos do art. 180 do Código de Processo
urna certidão dizendo que «a petição n° Civil, e acolho o recurso extraordinário
83.442, de 20-10-93, à fl. 103, recurso ex- como tempestivo, porque interposto em
traordinário por (sic) Francisco de Assis Me- 20-10-93.
nezes, foi interposta intempestivamente.»
O Superior Tribunal de Justiça con-
Há uma certidão sem assinatura à fl. 71 cedeu a ordem de habeas corpus por dois
dizendo que o acórdão recorrido foi publi- fundamentos: coação ilegal por faltar legi-
cado no DJU de 13-9-93. Embaixo há outra timatio ad causam ao recorrente para pro-
certidão dizendo que os autos foram retira- mover a ação penal pública, condicionada
dos pelo «Dr. Sub» na mesma data, mas foi ou incondicionada, ressalvando a inércia
anulada por carimbo. À fl. 101 consta a do Ministério Público, e outra coação ilegal
mesma certidão dizendo que os autos foram porque o recorrido foi citado para oferecer
retirados pelo mesmo «Dr. Sub» no dia da defesa prévia e teve decretada sua revelia
publicação do acórdão e devolvidos em em ação penal privada, quando deveria res-
28-9-94, no exato dia que venceu o prazo ponder pelos atos praticados em ação penal
de 15 (quinze) dias para a interposição do pública.
recurso extraordinário. Presumo que o «Dr. Como os dois fundamentos têm a mes-
Sub» seja a Subprocuradoria-Geral da Re- ma base, a natureza da ação penal, de onde
pública. parte a coação, tenho como atendida a Sú-
O recorrente pediu vista dos autos mula n° 283, ainda que as razões do recurso
22-9-93 para interpor o recurso, o que foi extraordinário não sejam expressas ao ata-
deferido em 27-9-93 pelo prazo de 5 (cin- car os dois fundamentos.
co) dias, fl. 102. Este despacho foi publica- Os Ministros Néri da Silveira e
do no DJU de 6-10-93, data em que o Marco Aurélio divergem quanto à possi-
recorrente retirou os autos, devolvendo-os bilidade de ser intentada diretamente a ação
R.T.J. — 158 351

penal privada. O Ministro Néri da Silveira sor, como manifestação de garantia indivi-
entende que «só caberia discutir em torno dual concedida pela Constituição, não ha-
do cabimento da ação privada, se, feita a vendo porque discriminar a honra do servi-
representação, o MP não houvesse intenta- dor público, quando atingida em razão das
do a ação pública no prazo legal», pois mão funções que exerce, o qual poderá optar, se
tendo havido representação, não há aqui quiser, pela ação pública condicionada. A
falar em ofensa ao art. 5° LIX, da Lei ação pública, no caso, adiciona um direito
Maior» e também porque «o art. 129, I, da ao servidor, não podendo ser entendida
Constituição, não foi vulnerado pelo ares- como a subtração de outro direito.
ta que, de expresso, reconheceu haver o
9. Isto posto e com a vênia do Ministro
ora recorrente ingressado, diretamente, em
Relator Néri da Silveira, conheço do re-
Juízo, com queixa-crime», e assim enten-
curso extraordinário e lhe dou provimento
dendo não conhece do recurso. O Ministro
por entender que ambas as vias são possí-
Marco Aurélio entende que a expressão
veis após a Constituição, a ação pública,
privativamente utilizada no art. 129, I, da
mediante representação do ofendido, ou a
Constituição, faz com que o dispositivo ação privada, por não ver ofensa aos dispo-
compreenda exclusivamente a ação pública
sitivos constitucionais nele invocados.
não condicionada, não alcançando a ação
pública condicionada, a qual não é, segun-
do entende, uma ação pública no sentido EXTRATO DA ATA
próprio, e, por esta razão, conhece e dá
provimento ao recurso para cassar a ordem
RE 173.938 — AP — Rel.: Min. Néri
de babeas corpus, reconhecendo o recor- da Silveira. Recte.: Francisco de Assis Me-
rente como parte legítima na ação penal nezes (Adv.: Guaracy da Silva Freitas).
intentada. Ausentes na Sessão os Ministros Recdo.: Ministério Público Estadual.
Francisco Rezek e Carlos Velloso.
5. Se a Constituição proclama ser in- Decisão: Por maioria, contra o voto do
violável a honra e acrescenta que fica asse- Relator, a Turma conhecendo do recurso e
gurado o direito à indenização pelo dano lhe deu provimento, para cassar o «habeas
material ou moral decorrente da sua viola- corpus», reconhecida a legitimidade do re-
ção, art. 5°, X, entendo que a ação contra o corrente para propor a ação penal. Não
ofensor não pode ficar nas mãos do Minis- votou o Ministro Carlos Velloso por não ter
tério Público, como dono da ação. assistido ao relatório. Lavrará o acórdão o
Ministro Marco Aurélio.
O servidor ofendido pode valer-se do
favor legal e confiar a defesa da sua honra Presidência do Senhor Ministro Néri da
ao agente do Ministério Público, assim Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
como pode assumi-la pessoalmente, dis- Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso
pensando o favor legal. e Marco Aurélio. Ausente, justificadamen-
Creio que assim concilia-se a legislação te, o Senhor Ministro Francisco Rezek.
anterior e a Constituição a ela posterior. Subprocurador-Geral da República, o Dr.
Haroldo Ferraz da Nóbrega.
7. Concluo, pois, que qualquer pessoa
ofendida em sua honra tem o direito de Brasília, 18 de outubro de 1994 —José
exercer a ação penal privada contra o ofen- Wilson Aragão, Secretário.
352 R.T.J. — 158

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 174.044 — PR


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio


Recorrente: União Federal — Recorrido: Marber Importação e Exportação
de Madeiras Ltda.
Tara de licenciamento de importação — Leis n°s 2.145/53 e
7.690/88 — Inconstitucionalidade. A taxa de licenciamento de importa-
ção, no que previsto como base de cálculo o valor constante da licença,
guia de importação ou documento equivalente e, Slim, o valor da
mercadoria conflita com a regra proibitiva do § 2° do artigo 145 da
Constituição Federal. Dispensável é, na espécie, a identidade absoluta.
Descabe a visão flexível de tomar a taxa como um adicional do imposto
de importação que pode ser majorado pelo Executivo — artigo 153,
inciso I, § 1°, não restando subordinada ao princípio da anterioridade —
artigo 150, 1°, ambos da Carta da República. A segurança jurídica é
conducente a homenagear-se o princípio da realidade, evitando-se que
sutil troca de nomenclatura transforme exação inconstitucional em har-
mônica com a Lei Básica.
ACÓRDÃO equivalente será emitida mediante o paga-
mento de taxa correspondente a 1,8% sobre
Vistos, relatados e discutidos estes autos, o valor constante dos referidos documen-
acordam os Ministros do Supremo Tribunal tos, como ressarcimento dos custos incor-
Federal, em Segunda Turma, na conformida- ridos nos respectivos serviços. Ademais, a
de da ata do julgamento e das notas taquigrá- citada taxa seria devida na emissão de do-
ficas, por unanimidade de votos, em conhecer cumento relativo a qualquer produto, inde-
do recurso, mas lhe negar provimento. pendentemente do regime tributário ou
Brasília, 29 de novembro de 1994 — cambial vigente, da qualidade do importa-
Néri da Silveira, Presidente — Marco dor ou do país de origem da mercadoria. O
Aurélio, Relator. legislador ordinário teria inobservado a re-
gra proibitiva do § 2° do artigo 145 da Carta
RELATÓRIO de 1988, no sentido da impossibilidade de
O Sr. Ministro Marco Aurélio: A Re- as taxas terem base de cálculo específica
corrida impetrou mandado de segurança dos impostos. Argumenta-se, ainda, que o
preventivo, visando a eximir-se do recolhi- monopólio da Carteira de Comércio Exte-
mento da taxa de licenciamento de impor- rior do Banco do Brasil — Cacex, quanto à
tação prevista na Lei n° 7.690, de 15 de atuação reguladora e policiadora das im-
dezembro de 1988, no que, segundo a ini- portações e exportações, estaria a indicar os
cial, restou redefinida a taxa inicialmente contornos de taxa — tributo — de tal co-
criada pela Lei n° 2.145, de 29 de dezembro brança, afastando, assim, a possibilidade de
de 1953. Consoante o sustentado, o artigo se cogitar de preço público. Ao considerar-
1° da Lei n° 7.690/88, ao dar nova redação se o valor do documento, tomara-se de
ao artigo 10 da modificada, dispôs que a empréstimo a mesma base de cálculo do
licença, guia de importação ou documento imposto de importação de que cuida o De-
R.T.J. — 158 353

creto-Lei n° 37/66, bem como o próprio tais premissas, pronunciou-se o Órgão, em


Código Tributário Nacional — artigo 20, peça que acabou não subscrita, pela incons-
inciso I. Citou-se precedente desta Corte titucionalidade da taxa.
sobre a glosa constitucional, salientando-se A segurança foi concedida, conforme
que a base de cálculo da taxa em comento sentença de folhas 53 a 63, e procedeu-se à
mostra-se totalmente divorciada do serviço remessa obrigatória dos autos ao Tribunal
público prestado ao contribuinte. Regional Federal da Quarta Região, que
A liminar foi concedida tendo em conta prolatou o acórdão impugnado mediante o
a plausibilidade do direito evocado e o pe- extraordinário ora em exame, cuja ementa
rigo decorrente da demora da prestação consigna:
jurisdicional (folha 37). 4Constitucional — Tributário —
O Banco do Brasil S.A. manifestou-se, Taxa de licenciamento de importa-
esclarecendo que a Carteira de Comércio ção. Porque afronta o art. 145, § 2°, da
Exterior — Cacex foi substituída pelo De- CF/88, é de se reconhecer a inconstitu-
partamento de Comércio Exterior — De- cionalidade da exigência da taxa de que
cex, Órgão vinculado à Secretaria Nacional trata a Lei n ° 7.6903/88» (folhas 70 a 73).
da Economia, subordinada ao Ministério da O Colegiado remete ao que decidido
Economia, Fazenda e Planejamento, no pelo Plenário na argüição de inconstitucio-
âmbito da administração pública federal. nalidade na apelação no Mandado de Segu-
No caso, o Banco estaria a limitar-se a rança n° 90.04.26115.0-PR, quando restou
cumprir determinação legal, no que proce- salientado que, a partir da Emenda n° 18, de
de à cobrança do que devido e ao recolhi- 1965, a taxa passou a ter um conceito cons-
mento dos valores à conta do Tesouro Na- titucional que impede seja instituída pela
cional, como receita orçamentária da lei ordinária como mero adicional do im-
União, tudo de acordo com o artigo 1° em posto. A repetição da base de cálculo, con-
tela. Daí haver apontado não possuir com- siderada a do imposto de importação, esta-
petência nem legitimidade para defender os ria a revelar um conflito com o § 2° do
interesses da Fazenda. artigo 145 da Carta da República.
Seguiu-se abertura de vista ao Ministé-
rio Público Federal, que se manifestou na Nas razões do extraordinário, a Fazenda
forma da peça de folhas 48 a 52, esclare- Nacional ressalta que, respeitado Decreto-
cendo que a taxa de licenciamento de im- Lei n° 37/66, não se pode, na espécie, cogi-
portação não consubstanciada preço públi- tar da mesma base de cálculo. É que a do
co, já que não fora criada para arrecadar imposto de importação, conforme o artigo
fundos com a finalidade de atender despesa 2° do referido Diploma, estaria alicerçada
devida com a prestação de serviço público na quantidade de mercadoria trazida ao ter-
tendo origem no exercício do poder de po- ritório nacional, enquanto a da taxa, no
4
lícia da União. taxa teria sido criada a valor constante da licença, guia ou docu-
partir do disposto no artigo 22, inciso VIII, mento de importação. Sob o ângulo da qua-
da Constituição em vigor, visando ao exer- lificação como imposto, empolgou a tese
cício do controle cambial de divisas do de que «uma exigência com o nome turis
País. No caso dos autos, somente a capaci- «taxa» que tome por hipótese de incidência
dade para cobrar a taxa teria sido atribuída fato gerador próprio de imposto passa a ter
à Cacex. O procedimento não seria de mol- a natureza jurídica de imposto». As razões
de a afastar a natureza de taxa. A partir de do extraordinário estão calcadas, neste
354 R.T.J. — 158

ponto, no que preceitua o artigo 4°, inciso em tomo do tema, vindo aos autos a infor-
I, do Código Tributário Nacional, segundo mação de folha 125, consoante a qual não
o qual a natureza jurídica específica do há precedente a respeito.
tributo é determinada pelo fato gerador da Recebi os autos para exame em 13 de
respectiva obrigação, sendo irrelevante, setembro de 1994, e os liberei para julga-
para qualificá-la, a denominação e demais mento, afetando o recurso ao Pleno, em 29
características formais adotadas pela lei. de outubro imediato. O prazo regimental de
Daí a impossibilidade de se concluir pela trinta dias restou extrapolado em razão da
inconstitucionalidade. Aplicado o texto sobrecarga de serviço resultante da atuação
constitucional, revela-se que «as taxas que simultânea nesta Corte e no Tribunal Supe-
adotarem base de cálculo próprias de im- rior Eleitoral.
postos não poderão ser cobradas como ta- É o relatório.
xas. Haverão de seguir o regime jurídico
próprio dos impostos». Haverão de seguir VOTO
o regime jurídico próprio dos impostos».
Assim, interpretada a exação como impos- O Sr. Ministro Marco Aurélio: Os
to, ter-se-ia a constitucionalidade, já que pressupostos gerais de recorribilidade es-
recolhido o valor objeto de cobrança ao tão atendidos. O recurso foi formalizado
por Procurador da Fazenda Nacional, sen-
Tesouro Nacional. Por isso, afirma-se que
do que, publicada a decisão no Diário de 3
a exação pode ser interpretada como adi- de março de 1993 — quarta-feira (folha 74),
cional do imposto de importação. É feita deu-se a manifestação do inconformismo no
referência ao voto do Juiz Sílvio Dobro- dia 17 imediato —quarta-feira (folha 75). Por
wolski, prolatado na aludida argüição de outro lado, quanto ao pressuposto específico,
inconstitucionalidade. O erro do legislador, nota-se que a interposição fez-se a partir do
na denominação da espécie tributária, não permissivo da alínea b do inciso Indo artigo
estaria a descaracterizá-la, muito menos a 103 do Diploma Maior. A Corte de origem
tomá-la inconstitucional à taxa de despa- declarou a inconstitucionalidade de lei fede-
cho aduaneiro, que mascarava adicional ao ral. Conheço do recurso.
imposto de importação— verbete de n° 309
que integra a Súmula. Aos autos veio o A teor do artigo 145, inciso II, da Carta
acórdão concernente à argüição de incons- Federal, a União, os Estados, o Distrito
titucionalidade. Federal e os Municípios poderão instituir
taxas, em razão do exercício do poder de
A Recorrida não apresentou razões de polícia, ou pela utilização, efetiva ou poten-
contrariedade, estando a decisão do Presi- cial, de serviços públicos específicos e di-
dente do Tribunal Regional Federal da visíveis, prestados ao contribuinte ou colo-
Quarta Região, admitindo o extraordinário, cados à sua disposição. A leitura do artigo
à folha 115. P da Lei n° 7.690/88 revela que a taxa em
A Procuradoria-Geral da República discussão resulta de uma atividade provo-
emitiu o parecer de folhas 120 a 124, no cada, enquadrando-se, assim, no exercício
sentido do provimento do recurso. Na peça, do poder de polícia atribuído ao Estado,
adotam-se as razões do voto vencido do enquanto atua no âmbito da política de
mencionado Juiz. importação. Conforme ressaltado na ini-
cial, redigida com inegável esmero, a Carta
À folha 125, despachei determinando à Política da República de 1988 é mais explí-
Aisessoria pesquisa sobre a jurisprudência cita para os impostos. A Emenda Constitu-
R.T.J. — 158 355

cional n° 1/69 cogitava da impossibilidade «Ora, a regra de que a taxa não pode
de se tomar como base de cálculo, para ter por base de cálculo ou fato gerador
cobrança de taxas, a que tivesse servido idênticos ao que corresponda ao impos-
para a incidência dos impostos, sugerindo, to, reproduzida nesses termos pelo arti-
assim, uma identidade maior. Já no § 2° do go 77 do Código Tributário Nacional,
artigo 145 alude-se à base de cálculo pró- alcança, sem dúvida alguma, também as
pria dos impostos, afastando-se, portanto, hipóteses em que a base de cálculo da
a alagada igualação. Na espécie dos autos, taxa abrange, além de outros fatores,
o artigo 1° da Lei n° 7.690/88, dando nova aquele que precisamente constitui a base
redação ao artigo 10 da Lei n° 2.145/53, de cálculo do imposto já existente. Para
cuida do pagamento de taxa corresponden- que tenha aplicação a proibição contida
te 1.8% sobre o valor constante da licença, no artigo 77 do Código Tributo Na-
guia de importação, ou documento equiva- cional, não é necessário que as bases de
lente, referindo-se, mais, ao objeto, que cálculo consideradas sejam absoluta-
seria o ressarcimento dos custos incorridos mente idênticas e mera repetição uma da
nos respectivos serviços. Pois bem, tal base outra. Sempre que o critério adotado
de incidência coincide com a do imposto de pelo legislador fiscal para o cálculo da
importação prevista no inciso Ido artigo 20 taxa contenha em si o mesmo critério já
do Código Tributário Nacional — Lei n° utilizado para imposto, estará configu-
5.172, no que preceitua que, quando a alí- rada violação daquela norma geral do
quota seja ad valorem, o preço normal que sistema tributário, ainda que a base de
o produto ou seu similar alcançaria ao tem- cálculo escolhida para a taxa abranja
po da importação, em uma venda em con- ademais outros fatores não considera-
dições de livre concorrência, para entrega dos para o imposto».
no porto ou lugar de entrada do produto no Mais recentemente, a Segunda Turma
país, será a base de cálculo do imposto. Tal fulminou taxa de funcionamento e localiza-
preceito assemelha-se ao do artigo 2° do ção que, considerada cobrança anual, tinha
inciso II do Decreto-Lei n° 37/66, quando como base de cálculo o metro quadrado da
revela como base de cálculo do imposto, área ocupada, ou seja, a mesma do Imposto
em se tratando de aliquota ad valorem, o Predial e Territorial e Urbano, tendo como
preço normal da mercadoria, ou no caso de configurada a infringência ao artigo 18, §
mercadoria vendida em leilão, o preço da 2°, da Constituição Federal e ao artigo 77
arrematação. É inegável que a taxa em co-
do Código Tributário Nacional — Recurso
mento foi prevista tomando de empréstimo
base de cálculo própria do imposto de im- Extraordinário n° 114.245-SP. Outra não
portação, isto é, o valor consignado na li- foi a decisão no Recurso Extraordinário n°
cença, guia de importação ou documento 100.201-SP, relatado pelo Ministro Carlos
equivalente, a refletir o valor mesmo da Madeira. Da mesma forma decidiu-se
mercadoria. É mister frisar que, conforme quando do julgamento do Recurso Extraor-
precedentes mencionados na inicial, dis- dinário n° 92.142-SP, relatado perante o
pensável é que haja absoluta identidade. Pleno pelo Ministro Rafael Mayer, quando
Esta Corte, em composição plenária, ao se teve como inconstitucional taxa de con-
julgar o Recurso Extraordinário n° 66.231- servação de estradas de rodagem do Muni-
SP, em que funcionou como Relator o Mi- cípio de Ibirá — Lei Municipal n° 570/77,
nistro Luiz Gallotti, teve oportunidade de no que se considerou, para mensuração do
concluir que: serviço prestado, área dos imóveis rurais.
356 R.T.J. — 158

Evoca a União a possibilidade de ser bem como a destinação legal do produto de


tomada a exação como adicional do impos- sua arrecadação.
to de importação. Assim não o foi quando Diante de tal quadro, nego provimento
criada. E sabido que, em relação às taxas, a este recurso extraordinário, tendo como
não há a exigência de somente vir a ser inconstitucional, portanto, a exação disci-
majorada por lei ; tampouco, a relativa à plinada pela Lei n° 7.690/88. Confirmo,
anterioridade. O artigo 153, inciso I, com- assim, a decisão prolatada pela Corte de
binado com o § 1°, revela ser facultado ao origem.
Poder Executivo, atendidas as condições e
os limites estabelecidos em lei, alterar as EXTRATO DA ATA
alíquotas do imposto de importação, sendo
que, pelo artigo 150, § 1°, não se aplica ao
imposto de importação, dentre outros, a RE 174.044 — PR — ReL: Min. Marco
vedação de vir a ser cobrado no mesmo Aurélio. Recte.: União Federal (Adv.: PFN
exercício financeiro em que haja sido pu- — Cezar Saldanha Souza Junior). Recda.:
blicada a lei que os instituiu ou aumentou. Marber Importação e Exportação de Ma-
O argumento polivalente desenvolvido nas deiras Ltda. (Adv.: Mario Espedito Os-
razões do extraordinário não merece agasa- trovski).
lho desta Corte, sob pena de grassar a inse-
gurança, emprestando-se rótulos conforme Decisão: Por unanimidade, a Turma co-
as conveniências momentâneas. O tributo nheceu do recurso, mas lhe negou provi-
foi criado como taxa, valendo notar, ainda, mento. Ausente, ocasionalmente, o Minis-
a referência ao fim visado —o controle, em tro Francisco Rezek.
si, das importações — o que atende, até
mesmo, ao princípio da realidade, tal como Presidência do Senhor Ministro Néri da
homenageado pelo artigo 4° do Código Tri- Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
butário, no que registra que a natureza jurí- Ministros Carlos Velloso, Marco Aurélio e
dica específica do tributo é determinada Francisco Rezek. Subprocurador-Geral da
pelo fato gerador da respectiva obrigação, República, o Dr. Mardem Costa Pinto.
sendo irrelevantes a denominação e demais Brasília, 29 de novembro de 1994 —
características formais adotados pela lei, José Wilson Aragão, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 178.473 (AgRg) — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Marco Aurélio


Agravante: Instituto Nacional do Seguro Social — INSS — Agravado: José
Augusto da Silva Neto
Representação processual — Procuradores autárquicos. Tra-
tando-se de autarquia, a representação por procurador do respectivo
quadro funcional independe de instrumento de mandato. Suficiente é a
revelação do status, mencionando-se, tanto quanto possível, o número da
R.T.J. — 158 357

matrícula. Declinada a simples condição de advogado inscrito na Ordem


dos Advogados do Brasil, presume-se a contratação do profissional para
o caso concreto, exigindo-se, aí, a prova do credenciamento — a procu-
ração. Precedentes: Agravos Regimentais n's 173568-7, 173.652-7 e
174.249-7, julgados pela Segunda Turma em 7 de junho de 1994.
ACÓRDÃO nal da advocacia estranho aos quadros do
Instituto, mas por Procurador Autárquico.
Vistos, relatados e discutidos estes au- Conheço do agravo interposto.
tos, acordam os Ministros do Supremo Tri-
bunal Federal, em Segunda Turma, na con- No mais, a subscritora do extraordinário
formidade da ata do julgamento e das notas não se qualificou como Procuradora. Aliás,
taquigráficas, por unanimidade de votos, até aqui, em momento algum veio à balha
procedimento objetivando afastar a presun-
em negar provimento ao agravo regimen- ção gerada pelo fato de apenas haver sido
tal.
indicada, junto à assinatura, a condição de
Brasília, 20 de setembro de 1994 — advogada inscrita na Ordem dos Advoga-
Néri da Silveira, Presidente — Marco dos do Brasil, mencionando-se o número
Aurélio, Relator. respectivo. Daí a insubsistência das razões
deste regimental que, em relação à matéria
RELATÓRIO de fundo, distancia-se da decisão atacada.
É o meu voto.
O Sr. Ministro Marco Aurélio: Este
agravo regimental está dirigido contra a
EXTRATO DA ATA
decisão de folha 160, mediante a qual de-
clarei a irregularidade da representação
processual do Instituto. Sustenta-se que, na RE 178.473 (AgRg) —SP —Rel.: Min.
espécie, a representação baseia-se não em Marco Aurélio. Agte.: Instituto Nacional
instrumento de mandato, mas no próprio do Seguro Social — INSS (Adv.: Marcio
exercício do cargo de Procurador. Alega-se Rabelo Mesquita). Agdo.: José Augusto da
a violação aos artigos 37 e 131 da Consti- Silva Neto (Advs.: Ivani Augusta Furlan
Ferreira e outros).
tuição Federal.
Recebi estes autos para exame em 31 de Decisão: Por unanimidade, a Turma ne-
agosto de 1994 e os liberei em 14 do mês gou provimento ao agravo regimental. Au-
seguinte. sentes, ocasionalmente, os Ministros Car-
los Velloso e Francisco Rezek.
É o relatório.
Presidência do Senhor Ministro Néri da
VOTO Silveira. Presentes à Sessão os Senhores
Ministros Paulo Brossard, Carlos Velloso,
O Sr. Ministro Marco Aurélio (Rela- Marco Aurélio e Francisco Rezek. Subpro-
tor): Na protocolação deste agravo foram curador-Geral da República, o Dr. Cláudio
observados os pressupostos de recorribili- Lemos Fonteles.
dade que lhe são inerentes. A esta altura, Brasília, 20 de setembro de 1994 —
tem-se recurso subscrito não por profissio- José Wilson Aragão, Secretário.
358 R.T.J. — 158

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N° 190.685 — SP


(Primeira Turma)

Relator: O Sr. Ministro Celso de Mello


Recorrente: Instituto Nacional do Seguro Social —INSS —Recorrida: Sônia
Maria Tavares Fernandes
Precatório — Disciplina constitucional — Finalidade — Cré-
dito de natureza alimentícia — Submissão necessária ao regime constitu-
cional dos precatórios — Cl?, art. 100, caput — RE conhecido e provido.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ao inter-
pretar o alcance da norma inscrita no caput do art. 100 da Constituição,
firmou-se no sentido de considerar imprescindível, mesmo tratando-se de
crédito de natureza alimentícia, a expedição de precatório, ainda que
reconhecendo, para efeito de pagamento do débito fazendário, a absoluta
prioridade da prestação de caráter alimentar sobre os créditos ordinários
de índole comum. Precedentes.
O processo de execução por quantia certa contra a Fazen-
da Pública rege-se, nos termos do que prescreve a própria Constituição,
por normas especiais que se estendem a todas as pessoas jurídicas de
direito público interno, inclusive às entidades autárquicas.
O sentido teleológico da norma inscrita no caput do art.
100 da Carta Política — cuja gênese reside, no que concerne aos seus
aspectos essenciais, na Constituição Federal de 1934 (art. 182)— objetiva
viabilizar, na concreção do seu alcance, a submissão incondicional do
Poder Público ao dever de respeitar o princípio que confere preferência
jurídica a quem dispuser de precedência cronológica (prior in tempore,
potior in jure).
ACÓRDÃO reformar acórdão do Tribunal a quo do
qual teria decorrido transgressão ao precei-
Vistos, relatados e discutidos estes autos, to inscrito no caput do art. 100 da Consti-
acordam os Ministros do Supremo Tribunal tuição.
Federal, em Primeira Turma, na conformi- Sustenta-se, nesta sede recursal extraor-
dade da ata do julgamento e das notas taqui- dinária, que o Tribunal recorrido, mesmo
gráficas, por unanimidade de votos, em co- tratando-se de crédito de natureza alimen-
nhecer do recurso e lhe dar provimento. tar, não poderia ter excluído o pagamento
Brasília, 25 de abril de 1995 — Sydney desse débito fazendário do regime consti-
Sanches, Presidente — Celso de Mello, tucional que impõe a expedição de preca-
Relator. tório.
RELATÓRIO Admitido e processado regularmente o
presente recurso, subiram os respectivos
O Sr. Ministro Celso de Mello: Trata- autos a esta Corte.
se de recurso extraordinário que, interposto
por entidade de direito público, objetiva É o relatório.
R.T.J. — 158 359

VOTO patrimoniais por quantia certa contra a Fa-


O Sr. Ministro Celso de Meio (Rela- zenda Pública.
tor): Trata-se de recurso extraordinário in- Não se pode perder de perspectiva que
terposto contra decisão do Tribunal a quo a exigência constitucional de expedição
que, tendo presente a natureza alimentí- do precatório, com a conseqüente obriga-
cia do crédito exeqüendo, entendeu não ção imposta ao Estado de estrita observân-
estar este, para efeito de execução contra a cia da ordem cronológica da apresentação
Fazenda Pública, sujeito ao regime consti- daquele instrumento de requisição judicial
tucional dos precatórios. de pagamento, tem por finalidade impedir
Sustenta-se, nesta sede recursal extraor- favorecimentos pessoais indevidos e frus-
dinária, que o acórdão ora impugnado teria
trar injustas perseguições ditadas por ra-
ofendido a disciplina normativa fixada no zões de caráter político-administrativo.
caput do art. 100 da Constituição da Repú- O sentido teleológico da nomm inscrita
blica. no caput do art. 100 da Carta Política —
cuja gênese reside, no que concerne aos
Tenho para mim, na linha do magistério seus aspectos essenciais, na Constituição
jurisprudencial firmado pelo Supremo Tri- Federal de 1934 (art. 182) — objetiva via-
bunal Federal no exame do preceito cons- bilizar, na concreção do seu alcance, a sub-
titucional em questão, que se revela plena- missão incondicional do Poder Público ao
mente acolhível a pretensão recursal ora dever de respeitar o princípio que confere
deduzida. preferência jurídica a quem dispuser de
Impõe-se registrar, antes de mais nada, precedência cronológica (prior in tempo-
que o processo de execução por quantia re, potior in jure).
certa contra a Fazenda Pública rege-se, nos Esta Suprema Corte, ao interpretar a
termos do que prescreve a própria Cons- regra constitucional que disciplina a expe-
tituição, por normas especiais que se esten- dição de precatórios, claramente nela iden-
dem a todas as pessoas jurídicas de direito tificou a dupla finalidade visada pelo legis-
público interno, inclusive às entidades au- lador constituinte: assegurar a igualdade
tárquicas (RDA 151/189). entre os credores e proclamar a inafastabi-
A disciplina constitucional desse pro- lidade da obrigação do Poder Público de
cesso de execução torna imprescindível a pagar os seus débitos que hajam sido judi-
expedição do precatório, qualquer que cialmente reconhecidos (RTJ 108/463).
seja a natureza do crédito exeqüendo. Não obstante a inovação introduzida
Na realidade, o pagamento das condena- pela Constituição Federal de 1988 — que
ções pecuniárias impostas judicialmente ao com ela buscou prestigiar os créditos de
Poder Público pressupõe a necessária ex- natureza alimentícia —, a jurisprudência
tração do precatório. do Supremo Tribunal Federal, ao interpre-
tar a cláusula normativa inscrita no caput
A imprescindibilidade da utilização do art. 100 da Carta Política, firmou-se no
desse meio instrumental deriva, em qual- sentido de submeter, mesmo as prestações
quer circunstância — ainda que de índole de caráter alimentar, ao regime constitu-
alimentar o débito imputado à entidade cional dos precatórios, ainda que reconhe-
de direito público —, do próprio sistema cendo a possibilidade jurídica de se estabe-
constitucional que rege, no ordenamento lecerem duas ordens distintas de preca-
jurídico vigente no Brasil, as execuções tórios com preferência absoluta dos crédi-
360 R.T.J. — 158

tos de natureza alimentícia (ordem espe- nológica em relação as dívidas de outra


cial) sobre aqueles de caráter meramente natureza.» (RE 155.536-SP, Rel. Min.
comum (ordem geral). Carlos Vdloso, DJIJ 10-6-94)
Isso significa que os precatórios judi- «Não se acham dispensados, do regi-
ciais relativos aos créditos de natureza ali- me de pagamento por meio de precató-
mentícia obedecem a uma ordem cronoló- rios, os créditos de natureza alimentícia,
gica de apresentação que se revela, em face nem contraria o art. 100 da Constituição
de seu caráter autónomo, inteiramente dife- serem eles dispostos em ordem própria,
renciada dos precatórios concernentes aos com prioridade sobre os de natureza ge-
créditos ordinários. ral. Precedente do Supremo Tribunal
A exceção contida no caput do art. 100 Federal: Ação Direta de Inconstitucio-
da Carta Política, portanto, não estabele- nalidade n° 47 (sessão de 22-10-92).»
ceu — ao contrário do que se afirmou no (RTJ 143/289, Rel. Min. Octavio Gal-
acórdão recorrido — a dispensa de expedi- lotti).
ção do precatório para o pagamento dos «Precatório. Crédito de natureza ali-
débitos de natureza alimentar imputados à mentícia. Artigo 100 da Constituição
Fazenda Pública, mas determinou, isso Federal.
sim, uma ordem cronológica específica, A exceção estabelecida pela Consti-
própria e autônoma com relação a tais tuição Federal em favor dos chamados
créditos. créditos de natureza alimentícia não
ase entendimento do preceito constitu- chega ao ponto de abolir, em relação a
cional mencionado resultou acolhido pelo eles, os princípios orçamentários ine-
Plenário do Supremo Tribunal Federal que, rentes à despesa pública, limitando-se
ao julgar a ADIn 47-SP, Relator Ministro apenas a isentá-los da observância da
Octavio Gallotti, decidiu que também os ordem cronológica em relação aos de
créditos de natureza alimentícia, ainda que natureza geral.
submetidos a uma ordem cronológica espe- Precedente do Supremo Tribunal Fe-
cial de pagamento, diferenciada daquela deral: Ação Direta de Inconstitucionali-
referente aos demais débitos da-Fazenda
dade n° 47.
Pública, estão sujeitos ao regime jurídico
dos precatórios. Recurso extraordinário conhecido e
provido.» (RTJ 147/1082, Rel. Mia.
Essa orientação jurisprudencial tem
limar Gaivão)
sido reafirmada por ambas as Turmas do
Supremo Tribunal Federal: «Precatório. Prestações de natureza
«Constitucional. Precatório. Ação alimentícia, art. 100, caput, da Consti-
acidentária. Crédito de natureza ali- tuição Federal.
mentícia. Constituição, artigo 100. I — — O Plenário desta Corte, ao julgar
O Supremo Tribunal Federal, no julga- a Ação Direta de Inconstitucionalidade
mento da ADIn n° 47-SP, ocorrido em 47, decidiu, por maioria de votos, que
22-10-92, decidiu, por maioria de votos, a exceção estabelecida, no art. 100,
que a exceção estabelecida no art. 100, caput, da Constituição Federal, em fa-
caput, da Constituição, em favor dos vor dos denominados créditos de natu-
créditos de natureza alimentícia, não reza alimentícia, não dispensa o preca-
dispensa o precatório, mas se limita a tório, mas se limita a isentá-los da ob-
isentá-los da observância da ordem cro- servância da ordem cronológica em re-
R.TJ. — 158 361

lação às dívidas de outra natureza, por- Recda.: Sonia Maria Tavares Fernandes
ventura mais antigas. (Adv.: Carlos Nakamura).
Recurso extraordinário conhecido e Decisão: A Turma conheceu do recurso
provido.» (RTJ 149/648, Rel. Min. Mo- e lhe deu provimento, nos termos do voto
reira Alves) do Relator. Unânime. Ausente, ocasional-
Tendo presentes as razões expostas, e mente, o Sr. Ministro Moreira Alves, Pre-
considerando que o acórdão recorrido di- sidente. Presidiu o julgamento o Sr. Minis-
verge substancialmente da jurisprudência tro Sydney Sanches.
firmada pelo Supremo Tribunal Federal no
exame do tema em questão, conheço e dou Presidência do Senhor Ministro Moreira
provimento a este recurso extraordinário. Alves. Presentes à Sessão os Senhores Mi-
É o meu voto. nistros Sydney Sanches, Sepúlveda Perten-
ce, Celso de Mello e fintar Gaivão. Subpro-
EXTRATO DA ATA curador-Geral da República, Dr. Miguel
Frauzino Pereira.
RE 190.685 — SP — Rel.: Min. Celso
de Mello. Recte.: Instituto Nacional do Se- Brasfiia, 25 de abril de 1995 — Ricardo
guro Social —INSS (Adv.: Daniel Pulino). Dias Duarte, Secretário.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N" 1914% — SP


(Segunda Turma)

Relator: O Sr. Ministro Maurício Conta


Recorrente: Universidade de São Paulo — USP — Recorridos: Covis
Teixeira e outros
Recurso extraordinário. Servidor público. Direitos oriundos de
contrato individual de trabalho, anterior à Lei n° 8.112/90. Competência
Em se tratando de causas ajuizadas por servidor público
postulando o reconhecimento de direitos oriundos de contrato individual
de trabalho, em momento anterior à Lei 8.112/90, subsiste a plena
competência jurisdicional da Justiça do Trabalho.
Precedentes.
Recurso conhecido e provido, para declarar, no que concerne
aos autores regidos pela CLT, a incompetência da Justiça Comum.

ACÓRDÃO to e das notas taquigráficas, por unanimi-


dade de votos, conhecerdo recurso elhe dar
Vistos, relatados e discutidos estes au- provimento, nos termos do voto do Relator.
tos, acordam os Ministros componentes da Brasília, 26 de setembro de 1995 —
Segunda Turma do Supremo Tribunal Fe- Carlos Velloso, Presidente — Mauricio
deral, na conformidade da ata do julgamen- Corrêa, Relator.
362 R.T.J. — 158

RELATÓRIO Afastada a argüição de incompetên-


O Sr, Ministro Maurício Corrêa: Os cia, tem-se que a ação devia ser julgada
recorridos, servidores públicos pertencen- procedente, em parte, como o foi.
tes aos quadros da USP, regidos pela Con- O gatilho salarial foi instituído por
solidação das Leis do Trabalho, intentaram lei, em âmbito estadual (LC n° 467/86)
ação ordinária contra a Universidade de e tinha de ser pago, na forma prevista,
São Paulo, visando o recebimento de abono pois adotou política salarial semelhante
de 8% (oito por cento) instituído pelo De- àquela instituída pelo Decreto-Lei a°
creto-Lei n° 2.284/86, bem como a corre- 2.284/86.
ção monetária sobre os chamados «gatilhos
salariais» — instituídos por esse diploma É induvidoso que a correção monetá-
legal e estendidos aos servidores estaduais ria deve incidir sobre os pagamentos
pela Lei Complementar n° 467/86 até o feitos com atraso.
advento da Lei Complementar n° 535/88 — Trata-se 4e reparação de danos, pois
que lhes foram pagos com atraso. os vencimentos reajustados automatica-
Julgada parcialmente procedente em mente por força da variação acumulada
primeira instância, ambas as partes apela- do índice de preços ao consumidor
ram, sendo negado provimento aos recur- (IPC) só foram pagos com atrasos, nada
sos. Eis os fundamentos do ares to dissen- impedindo que o prejuízo sofrido pelos
tido: apelados seja reparado com base na va-
«Não prosperam os recursos. riação nominal das OTN's.
1. Inicialmente, o recurso da USP. Não se trata de simples obrigação de
pagamento em dinheiro, nos termos do
Não procede a argüição de incompe- artigo 1.061 do Código Civil, mas de
tência da Justiça Comum, para julgar a ampla restituição daquilo que deixaram
ação, com relação aos servidores contra- os servidores de receber enquanto eram
tados pelo regime da CLT, majorados os índices oficiais balizado-
A pretensão é referente ao pagamen- res da inflação, na forma prevista no
to dos gatilhos salariais, instituídos por artigo 25 da LC n° 467, de 2-7-86.
lei estadual e, como a remuneração des- Aliás, a correção monetária é aplicá-
ses funcionários rege-se por essa mesma vel nas indenizações a cargo da Admi-
lei, como está expresso nos contratos de nistração Pública e Autarquias, para in-
trabalho, continua sendo competente a tegral reparação do dano.
Justiça Estadual.
Não se poderia compreender que a
Assim ficou bem decidido na exce- indenização deixasse de reparar o patri-
ção de incompetência, onde se esclare- mônio do servidor, desfalcado pela des-
ceu que os co-autores relacionados estão valorização da moeda no período que
submetidos ao regime de remuneração medeia entre o ato lesivo e o efetivo
aplicável a todos os servidores da ape- pagamento.
lante, de acordo com a legislação esta-
dual, pois há cláusula expressa no mo- Nega-se, assim, provimento ao re-
delo de contrato adotado pela Universi- curso da USP, mantida a rejeição de
dade. todas as preliminares argüidas na con-
testação.
Por isso, incidente, no caso, a Súmula
n° 123 do TST. 2. Agora, o recurso dos autores.
R.T.J. — 158 363

Insistem no pagamento do abono de referência aos pedidos formulados pelos


8% instituído pelo chamado ((plano cru- autores, cujos contratos de trabalho são
zado». regidos pela Consolidação das Leis do Tra-
Sem razão, contudo, pois o Decreto- balho, preliminar essa refutada pelo Tribu-
Lei n° 2.284/86 é de âmbito federal e, na nal estadual. E, assim, ao decidir pela im-
parte em que fixou critérios para ade- procedência da argüição de incompetência
quação dos vencimentos dos servidores da Justiça Comum para julgar a ação, no
da União e instituiu o abono, não tem que concerne aos servidores regidos pela
aplicação para o Estado, que tem regime CLT, restou vulnerado o artigo 114 da
próprio de remuneração de seus funcio- Constituição Federal cujo texto deixa certo
nários, em razão da própria distribuição que ((compete à Justiça do Trabalho conci-
de competência feita pela Constituição liar e julgar os dissídios individuais e cole-
Federal. tivos entre trabalhadores e empregadores
abrangidos os entes de direito público ex-
Está assegurada ao Estado a compe- terno e da administração pública direta e
tência exclusiva para a organização do indireta dos Municípios, do Distrito Fede-
funcionalismo seu e a fixação de venci- ral, dos Estados e da União».
mentos.
Sustenta, ainda, que a argüição é tem-
Por força dessa prerrogativa, não pestiva, haja vista que este Supremo Tribu-
pode ser aplicado o citado Decreto-Lei nal, por ocasião do julgamento do RE n°
n° 2.284/86, no tocante a vencimentos. 92.634-MA, pacificou o entendimento de
Além do mais, foi editada lei esta- que ((a decisão que rejeita a preliminar de
dual, determinando a forma de conver- incompetência absoluta, no curso do pro-
são de cruzeiros em cruzados, na pro- cesso, não faz coisa julgada, antes de pro-
porção de um por mil (LC tf 467/86) ferida a sentença final. Reexame da preli-
que visivelmente beneficiou o funciona- minar no recurso extraordinário interposto
lismo estadual, em relação ao que dis- contra o acórdão que julgou procedente a
põe o decreto federal. ação. Seu conhecimento e provimento, para
Quanto ao abono criado pelo decreto acolher a incompetência da Justiça Esta-
invocado, não há lei estadual que o tenha dual, visto que os autores são empregados
implantado no âmbito estadual, razão da Fundação Maranhense de Televisão
pela qual teve vigência tão-somente na Educativa, regidos pela CLT.»
esfera federal. Esclarece mais: que os recorridos não
Assim, correta a decisão recorrida, foram admitidos em serviços de caráter
que fica mantida por seus próprios fun- temporário ou contratados para funções de
damentos. natureza técnica especializada, em decor-
rência de lei especial, o que fixaria a com-
Pelo exposto, nega-se provimento petência da Justiça Comum para o deslinde
aos recursos.» da causa. Ao contrário, os recorridos são
Contra essa decisão, interpôs a Univer- contratados pelo regime da CLT, são cele-
sidade de São Paulo recurso extraordinário, tistas puros, integrantes da administração
alegando que a ação foi intentada por ser- descentralizada, a qual, por força da lei está
vidores administrativos sob regimes estatu- obrigada a admitir servidores sob o regime
tários e celetistas. Que, na contestação e no da Consolidação das Leis do Trabalho (De-
recurso de apelação, a USF argüiu exceção creto-Lei Complementar n° 7/69). E, assim
de incompetência ratione materiae, com sendo, descabe apreciar a matéria, como o
364 R.T.J. — 158

fez o aresto recorrido, sob a ótica da Súmu- inicial do artigo 114, caput, da atual
la 123 do TST, que nada tem em comum Constituição.
com a espécie sub judice, vez que, os re- A competência da Justiça Trabalhista
corridos apontados não se submetem a um decorre da existência da relação de tra-
regime especial, criado por lei estadual, balho em que se funda a pretensão, ainda
mas, sim, ao regime próprio definido pela que diga esta respeito a vantagens oriun-
CLT. das de leis estaduais aplicáveis a funcio-
Com esses argumentos, requer seja co- nários estatutários, porquanto só à Jus-
nhecido e provido o extraordinário. tiça do Trabalho 6 que caberá julgar da
pertinência, ou não, da postulação des-
É o relatório. sas vantagens com base no contrato de
trabalho, para dar pela procedência, ou
VOTO não da reclamação trabalhista.
Recurso extraodinário conhecido e
O Sr. Ministro Maurício Corrêa: Ale-
provido.» (RTJ 139/960).
ga a recorrente que o acórdão dissentido, ao
repelir a argüição de incompetência ratio- E do voto proferido pelo relator deste
ne materiae da Justiça Estadual para diri- recurso se abstrai:
mir controvérsia acerca de direitos postula- «Ora, é fato incontroverso o de que
dos por servidores regidos pela CLT, vio- os ora recorridos, embora servidores pú-
lou o artigo 114 da Constituição Federal. blicos, são empregados contratados sob
É bem verdade que a jurisprudência des- o regime da Consolidação das Lei do
ta Corte é fume no sentido de reconhecer a Trabalho.
competência da justiça comum para julgar Assim sendo, e tendo em vista que,
as pretensões de servidores, ajuizadas pos- pelo artigo 114 da atual Constituição,
teriormente à Lei Especial que implantou o «Compete à Justiça do Trabalho conci-
Regime Jurídico Único. Todavia, as lides liar e julgar dissídios individuais e cole-
laborais consolidadas em período anterior tivos entre trabalhadores e empregados,
à instituição do regime único são da com- abrangidos os entes de direito público
petência da Justiça do Trabalho, em casos externo e da administração pública dire-
como o da espécie. ta e indireta dos Municípios, do Distrito
Esta Suprema Corte, em analisando hi- Federal, dos Estados e da União», a essa
Justiça especializada, cabe julgar todos
pótese semelhante à sub judice, sob o en-
os dissídios individuais — como suce-
foque do indigitado artigo 114 do Texto
de, no caso — entre empregado e em-
Constitucional, entendeu pela competência
da Justiça do Trabalho, consoante se infere pregador, ainda que este pertença à ad-
ministração pública indireta, como su-
do RE 130.325-SP, relatado pelo eminente
cede com a Universidade de São Paulo.
Ministro Moreira Alves, in verbis:
Essa competência decorre da existência
«Ementa: Execeção de incompetên- da relação de trabalho em que funda a
cia. Servidor Público estadual contrata- pretensão, ainda que diga esta respeito a
do sob o regime da CLT. Postulação, vantagens oriundas de leis estaduais,
com base na relação empregatícia, de aplicáveis a funcionários estatutários,
vantagens atribuídas a funcionários es- porquanto só à Justiça do Trabalho égua
tatutários. Competência da Justiça do caberá julgar da pertinência, ou não, da
Trabalho, em face do disposto na parte postulação dessas vantagens com base
R.T.J. — 158 365

no contrato de trabalho, para dar pela Ante o exposto, em consonância com a


procedência, ou não, da reclamação tra- jurisprudência desta Corte, dou provimen-
balhista.» to ao recurso e declaro, no que concerne aos
Há que se entender, portanto, que a cir- autores regidos pela CLT, a incompetência
cunstância de virem a ser postulados, em da Justiça Comum para apreciar e julgar a
virtude de relação trabalhista, benefícios causa.
oriundos de lei estadual, de aplicação pró- EXTRATO DA ATA
pria a funcionários públicos, relativamente RE 191.496 — SP —Rel.: Min. Maurí-
a período anterior à implantação do Regime
cio Corrêa. Recte.: Universidade de São
Jurídico Único, não constitui fundamento
Paulo — USP (Advs.: José Alberto Couto
hábil a ensejar o deslocamento da compe-
Maciel e outros). Recdos.: Clovis Teixeira
tência constitucional fixada, porquanto, a
e outros (Adv.: Ricardo Gonzaga Aranha
entender-se assim, estar-se-ia dando efeito
Campos).
retroativo à lei que instituiu o atual regime
único, para abranger fatos pretéritos. Decisão: Por unanimidade, a Turma co-
nheceu do recurso e lhe deu provimento,
Em casos similares, a orientação desta nos termos do voto do Relator.
Corte é no sentido de que, em se tratando
de causas ajuizadas por servidor público Presidência do Senhor Ministro Carlos
postulando o reconhecimento de direitos Velloso. Presentes à Sessão os Senhores
oriundos do contrato individual de traba- Ministros Marco Aurélio, Francisco Rezek
lho, em momento anterior à Lei 8.112/90, e Maurício Corrêa. Ausente, justificada-
subsiste a plena competência jurisdicional mente, o Sr. Ministro Néri da Silveira Sub-
da Justiça do Trabalho (Precedentes: RE procurador-Geral da República, o Dr. Mar-
183.574-SP, rel. Min. Sepúlveda Perten- dem Costa Pinto.
ce, e RE 183.620-RJ, rel. Min. Marco Au- Brasília, 26 de setembro de 1995 —
rélio, decisões monocráticas). Wagner Antorim Madoz, Secretário.
ÍNDICE ALFABÉTICO
A

Trprv Ação de acidente do trabalho (...) Competência. Ag 150.654 (AgRg) RTJ


158/248
Ct Ação direta de inconstitucionalidade (...) Competência. Rcl 374 RTJ 158/3
Ct Ação direta de inconstitucionalidade. Inidoneidade. Lei de criação de muni-
cípio. ADIn 733 RTJ 158/34
Ct Ação direta de inconstitucionalidade. Sistema Nacional de Defesa do Con-
sumidor. Decreto Federal n° 861/93. Conflito de legalidade. Inconstituciona-
lidade reflexa. Descabimento. ADIn 996 (Medida cautelar) RTJ 158/54
PrGr Ação penal (andamento) (...) Inquérito policial militar. HC 72.925 RTJ
158/199
PrPn Ação penal privada. Crime contra a honra. Servidor público. Legitimidade
ativa. RE 173.938 RTJ 158/342
Prev Acionista (...) Mandado de segurança. RMS 21.960 RTJ 158/107
Pn Acórdão criminal. Condenação. Dosimetria penal. Fundamentação suficien-
te. Nulidade inoconente. HC 72.114 RTJ 158/190
Adm ADCT/88, art. 17 (...) Funcionário público. RE 160.860 RTJ 158/293
Ct ADCT/88, art. 47 (...) Correção monetária. RE 130.013 RTJ 158/202
TrPrv ADCT/88, art. 58 (...)Benefício previdenciário. RE 170.539 RTJ 158/325
Ct ADCT da Constituição do Estado de Alagoas, art. 30 (suspensão liminar) (...)
Serventia judicial. ADIn 1.047 (Medida liminar) RTJ 158/63
IV Adi-Aut — ÍNDICE ALFABÉTICO

Adm Adicional por tempo de serviço (...) Servidor público estadual. RE 161.311
RTJ 158/311
Pn Agravante (excesso) (...) Pena. HC 70.899 RTJ 158/173
PrCv Agravo de instrumento. Traslado deficiente. Responsabilidade da parte.
Súmula 288 (aplicação). Ag 158.180 (AgRg) RTJ 158/272 — Ag 159.755
(AgRg) RTJ 158/285
PrCv Agravo de instrumento. Traslado deficiente. Tempestividade (prova). Responsa-
bilidade da parte. Súmula 288 (aplicação). Ag 151.485 (AgRg) RTJ 158/252
PrSTF Agravo regimental. Sustentação oral (descabimento). Pauta de julgamento
(désnecessidade). RISTF/80, arts. 83, III, e 131, parágrafo 2°. Ag 158.180
(AgRg) RTJ 158/272
PrPn Alegação tardia (...) Instrução criminal. HC 71.167 RTJ 158/183
Adm Anulação e revogação (...) Ato administrativo. RE 160.811 RTJ 158/287
PrPn Apelação em liberdade (descabimento) (...) Recurso criminal. HC 70.847 RTJ
158/160
Adm Aplicação do direito comum (...) Servidor público estadual. Ag 163.936
(AgRg) RTJ 158/320
Adm Aposentadoria. Aposentadoria rural e urbana. Contagem de tempo de serviço
(termo inicial). RE 148.510 RTJ 158/243
Adm Aposentadoria (...) Servidor público. RMS 21.859 RTJ 158/98
Ct Aposentadoria especial (...) Servidor público. MI 444 (Questão de ordem)
RTJ 158/6
Adm Aposentadoria rural e urbana (...) Aposentadoria. RE 148.510 RTJ 158/243
PrPn Aproveitamento ao co-réu não recorrente (...) Recurso criminal. HC 70.870
RTJ 158/170
PrGr Arquivamento (...) Inquérito policial militar. HC 72.925 RTJ 158/199
Ct Atividades insalubres (...) Servidor público. MI 444 (Questão de ordem) RTJ
158/6
Adm Ato administrativo. Anulação e revogação. Conveniência da administração.
Súmula 473. RE 160.811 RTJ 158/287
Ct Ato de Ministro de Estado (...)Competé'ncia. RMS 21.491 (AgRg) RTJ 158/84
Adm Ato do Ministro da Fazenda por ordem do Presidente da República (...)
Mandado de segurança coletivo. MS 21.969 (Medida liminar) RTJ 158/123
TrPrv Auto-aplicabilidade (...) Beneficio previdenciiírio. RE 162.232 (AgRg) RTJ
158/ 318
PrPn Autoria do crime (incerteza) (...) Pronúncia. HC 70.965 RTJ 158/175
ÍNDICE ALFABÉTICO — Aut-Com

PrPn Autorização prévia da Assembléia Legislativa (exigência) (...) Governador de


Estado. RE 159.230 RTJ 158/280

Trbt Base de cálculo (...) ICM. RE 160.871 RTJ 158/305


TrPrv Benefício acidento (reajuste) (...) Competência. Ag 150.654 (AgRg) RTJ
158/248
TrPrv Benefício previdenciário. Piso mínimo. Salário mínimo. Auto-aplicabilidade.
Constituição Federal/88, art. 201, parágrafos 5° e 6°. RE 162.232 (AgRg) RTJ
158/318
TrPrv Beneficio previdenciário. Revisão (critério). Inetroatividade. ADCT/88, art.
58. RE 170.539 RTJ 158/325

C
PrCv Caráter infringente (...) Embargo de declaração. Ag 152.805 (AgRg-EDc1)
RTJ 158/264 — Ag 153.868 (EDcI-AgRg) RTJ 158/270 — RE 160.860
(EDc1) RTJ 158/303
Ct Cargo público (provimento) (...) Servidor público. ADIn 1.251 (Medida
cautelar) RTJ 158/69
Adm Carreiras jurídicas (...) Ministério Público. ADIn 465 RTJ 158/16
Pn Circunstância qualificadora (...) Sentença criminal. HC 70.980 RTJ
158/177
Ct Coação de membro de Tribunal de Alçada (...) Competência. HC 71.050 RTJ
158/181
Trbt Cobrança (...)ICMS. RE 173.715 RTJ 158/338
PrPn Código de Processo Penal, art. 580 (...)Recurso criminal. HC 71.905 RTJ 158/187
Pn Coisajulgada. Dupla condenação. Nulidade (ocorrência). HC 70.870 RTJ 158/170
PrCv Coisa julgada. Limites objetivos. Matéria infraconstitucional. Recurso ex-
traordinário (descabimento). RE 170.906 RTJ 158/327
Ct Competência. Ação direta de inconstitucionalidade. Lei municipal em face da
Constituição estadual. Reprodução de dispositivo da Constituição Federal. Rol
374 RTJ 158/3
Ct Competência. «Habeas corpus». ST.I. Coação de membro de Tribunal de
Alçada. HC 71.050 RTJ 158/181
TrPrv Competência. Justiça comum. Ação de acidente do trabalho. Benefício aci-
dentário (reajuste). Ag 150.654 (AgRg) RTJ 158/248
VI Com-Cons — ÍNDICE ALFABÉTICO

PrPn Competência. Justiça comum. Crimes praticados contra Sociedade de Econo-


mia Mista. HC 70.808 RTJ 158/159
Adm Competência. Justiça do trabalho. Servidor público. Contrato de trabalho
anterior à Lei n° 8.112/90. RE 191.496 RTJ 158/361
Ct Competência. STF. Recurso ordinário em mandado de segurança. Ato de
Ministro de Estado. RMS 21.491 (AgRg) RTJ 158/84
Ct Competência. Tráfico internacional de entorpecentes. Justiças federal e esta-
dual. Constituição Federal, art. 109, V e IX. Lei n° 6.368/76, art. 27. HC 70.627
RTJ 158/147
Ct Competência da justiça eleitoral (...) Município. ADIn 733 RTJ 158/34
Ct Competência legislativa. União Federal. Serviços notariais e de registros
públicos. Constituição Federal/88, arts. 22, XXV, e 236, parágrafo único.
ADIn 1.047 (Medida liminar) RTJ 158/63
PrPn Competência originária do STJ (...) Governador de Estado. RE 159.230 RTJ
158/280
Ct Concurso público (...) Servidor público. ADIn 1.030 (Medida cautelar) RTJ
158/60
Ct Concurso público (ausência) (...) Servidor público. ADIn 1.251 (Medida
cautelar) RTJ 158/69
Pn Condenação (...) Acórdão criminal. HC 72.114 RTJ 158/190
PrSTF Configuração (...) Recurso extraordinário. Ag 152.214 (EDcl-AgRg) RTJ
158/262
Ct Conflito de legalidade (...) Ação direta de inconstitucionedidade. ADIn 996
(Medida cautelar) RTJ 158/54
Ct Constituição Federal, art. 109, V e IX (...) Competência. HC 70.627 RTJ
158/147
Ct Constituição Federal/67, art. 13, parágrafo 4° (...) Vencimentos. RE 135.632
RTJ 158/217
Ct Constituição Federal/88, art 16 (não incidência) (...) Município. ADIn 733
RTJ 158/34
Adm Constituição Federal/88, art. 37, XI, e art. 17 do ADCT (...) Servidor público.
RMS 21.859 RTJ 158/98
Ct Constituição Federal/88, art. 40, parágrafo 1° (...) Servidor público. MI 444
(Questão de ordem) RTJ 158/6
Ct Constituição Federal/88, art. 100 (...) Precatório. RE 161.122 RTJ 158/310
—RE 190.685 RTJ 158/358
Ct Constituição Federal/88, art. 102, I, «d» (...) Mandado de segurança. MS
21.683 RTJ 158/91
ÍNDICE ALFABÉTICO — Con-Cri VII

TrPrv Constituição FederaY88, art. 201, parágrafos 5° e 6° (...) Beneficio previden-


ciário. RE 162.232 (AgRg) RTJ 158/318
Adm Constituição FederalJ88, art. 225, parágrafo 4° (...) Reserva florestal. RE
134.297 RTJ 158/205
Ct Constituição Federal/88, arts. 22, XXV, e 236, parágrafo único (...) Compe-
tência legislativa. ADIn 1.047 (Medida liminar) RTJ 158/63
Adm Constituição Federal/88, arts. 37, XI, e 39, parágrafo 1° (ofensa inocorrente)
(...) Funcionário público. RE 160.860 RTJ 158/293
Adm Constituição Federal/88, arts. 135, 241, 37, XIII, e 39, parágrafo 1° (inteligên-
cia) (...) Ministério Público. ADIn 465 RTJ 158/16
Adm Contagem de tempo de serviço (termo inicial) (...)Aposentadoria. RE 148.510
RTJ 158/243
Ct Contrato de «leasing» (...) Correção monetária. RE 130.013 RTJ 158/202
Adm Contrato de trabalho anterior à Lei n° 8.112/90 (...) Competência. RE 191.496
RTJ 158/361
Trbt Contribuição para o Programa de Integração Social (...) PIS. RE 141.627 RTJ
158/220
Trbt Contribuição social. Lucro das pessoas jurídicas. Princípio da irretroatividade
(ofensa). Lei n° 7.689/88, art. 8° (inconstitucionalidade). RE 150.358 RTJ
158/247
Adm Conveniência da administração (...) Ato administrativo. RE 160.811 RTJ
158/287
PrCv Conversão em recurso ordinário (...) Mandado de segurança. RMS 21.336
(AgRg) RTJ 158/76
Ct Correção monetária. Contrato de «leasing». Isenção constitucional.
ADCT/88, art. 47. RE 130.013 RTJ 158/202
Ct Crédito de natureza alimentícia (...) Precatório. RE 161.122 RTJ 158/310 —
RE 190.685 RTJ 158/358
Ct Criação em ano de eleições municipais (...) Município. ADIn 733 RTJ 158/34
Pn Crime cometido no interior de estabelecimento penal (...) Sentença criminal.
HC 70.980 RTJ 158/177
Pn Crime continuado (inocorrência) (...) Pena. HC 72.805 RTJ 158/196
PrPn Crime contra a honra (...) Ação penal privada. RE 173.938 RTJ 158/342
PrPn Crimes praticados contra Sociedade de Economia Mista (...) Competência.
HC 70.808 RTJ 158/159
Pn Critério trifásico (...) Pena. HC 70.899 RTJ 158/173
Dec-Dup — ÍNDICE ALFABÉTICO

O Decisão administrativa do TRF da 2° Região (inconstitucionalidade) (...)


Servidor público. ADIn 577 RTJ 158/29
PrCv Decisão denegatória (...) Mandado de segurança. RMS 21.336 (AgRg) RTJ
158/76
PrPn Decisão favorável (possibilidade de extensão a co-réu) (...) Recurso criminal.
HC 71.905 RTJ 158/187
PrCv Decreto com efeito normativo (...) Mandado de segurança. MS 21.274 RTJ
158/72
Ct Decreto Federal n° 861/93 (...) Ação direta de inconstitucionalidade. ADIn
996 (Medida cautelar) RTJ 158/54
Trbt Decretos-Leis n's 2.445 e 2.449/88 (inconstitucionalidade) (...) PIS. RE
141.627 RTJ 158/220
Ct Deliberação administrativa do TRT da 15° Região (suspensão cautelar) (...)
Vencimentos. ADIn 1.244 (Medida cautelar) RTJ 158/66
Ct Descabimento (...) Ação direta de inconstitucionalidade. ADIn 996 (Medida
cautelar) RTJ 158/54
PrCv Descabimento (...) Mandado de segurança. MS 21.274 RTJ 158/72 — MS
21.881 (AgRg) RTJ 158/103
PrCv Descabimento (...) Recurso extraordinário. Ag 143.711 (AgRg) RTJ
158/222
PrCv Deserção (ausência) (...) Recurso extraordinário. RE 146.740 (EDc1) RTJ
158/224
Adm Direito adquirido (...) Policia militar. Ag 161.523 (AgRg) RTJ 158/316
Adm Direito adquirido (...) Servidor público. RE 146.749 RTJ 158/228
Ct Direito adquirido (inexistência) (...) Servidor público. ADIn 577 RTJ
158/29
Adm Direito de propriedade (...) Reserva florestal. RE 134.297 RTJ 158/205
PrCv Direito inexistente (...) Mandado de infanção. MI 444 (Questão de ordem) RTJ
158/6
Ct Direito inexistente (...) Servidor público. MI 444 (Questão de ordem) RTJ 158/6
PrPn Documentos não autenticados (...) Instrução criminal. HC 70.860 RTJ 158/167
Pn Dosimetria penal (...) Acórdão criminal. HC 72.114 RTJ 158/190
Pn Dupla condenação (...) Coisa julgada. HC 70.870 RTJ 158/170
ÍNDICE ALFABÉTICO — Emb-Gov IX

E
PrCv Embargos de declaração. Omissão inexistente. Caráter infringente. RE
160.860 (Mel) RTJ 158/303
PrCv Embargos de declaração. Pressupostos (inocorrência). Caráter infringente. Ag
152.805 (AgRg-EDc1) RTJ 158/264 —Ag 153.868 (EDcI-AgRg) RTJ 158/270
PrCv Embargos de divergência. Teses jurídicas opostas (inexistência). ERE
160.811 (AgRg) RTJ 158/290
PrCv Erro grosseiro (...) Mandado de segurança. RMS 21.336 (AgRg) RTJ 158n6
PrCv Estatuto da Criança e do Adolescente (...) Recurso extraordinário. Ag
158.180 (AgRg) RTJ 158/272
PrCv Exploração da vegetação nativa da Mata Atlântica (...) Mandado de seguran-
ça. MS 21.274 RTJ 158/72

F
Pn Fixação (...) Pena. HC 70.899 RTJ 158/173
Trbt Fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias (...) ICM. RE
160.871 RTJ 158/305
Trbt Fornecimento de alimentação e bebidas em bares e restaurantes (...) ICMS.
RE 173.715 RTJ 158/338
Adm Funcionário público. Teto de vencimentos. Lei estadual (limites de remune-
ração). Vantagens incorporadas por decisão judicial transita em julgado.
ADCT/88, art. 17. Constituição Federal/88, arts. 37, XI, e 39, parágrafo 1°
(ofensa inocorrente). RE 160.860 RTJ 158/293
Adm Funcionário público (demissão) (...) Processo administrativo. MS 21.635 RTJ
158/87
Ct Fundação Legião Brasileira de Assistência (...) Mandado de segurança. MS
21.683 RTJ 158/91
Pn Fundamentação suficiente (...) Acórdão criminal. HC 72.114 RTJ 158/190
PrCv Fundamento constitucional (Preclusão) (...) Recurso extraordinário. Ag
152.837 (AgRg) RTJ 158/268

G
PrPn Governador de Estado. Processo por crime comum. Competência originária
do STJ. Autorização prévia da Assembléia Legislativa (exigência). RE
159.230 RTJ 158/280
X Gra-Ins — ÍNDICE ALFABÉTICO

Adm Gratificação de representação (extinção posterior) (...) Polícia militar. Ag


161.523 (AgRg) RTJ 158/316
Prev Guarda de menor (... ) Recurso extraordinário. Ag 158.180 (AgRg) RTJ 158/272

H
Ct «Habeas corpus» (...) Competência. HC 71.050 RTJ 158/181
PrPn Habeas empas. Questões novas. Supressão de instância. HC 70.734 RTJ
158/155
PrPn Habeas corpus. Substituição de recurso ordinário. HC 70.734 RTJ
158/155

Trbt /CM. Fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias. Base de


cálculo. Prestação de serviços. Lei n° 5.886/87-SP. RE 160.871 RTJ
158/305
Trbt ICMS. Cobrança. Fornecimento de alimentação e bebidas em bares e restau-
rantes. Lei n° 6.374/89-SP. RE 173.715 RTJ 158/338
PrPn Impedimento inocorrente (...) Revisão criminal. HC 70.734 RTJ
158/155
PrCv Impossibilidade jurídica do pedido (...) Mandado de injunção. MI 444
(Questão de ordem) RTJ 158/6
Adm Inadimplência do Estado (...) Servidor público estadual. Ag 163.936 (AgRg)
RTJ 158/320
Ct Incompetência do STF (...) Mandado de segurança. MS 21.683 RTJ 158/91
Ct Inconstitucionalidade reflexa (...) Ação direta de inconstitucionalidade.
ADIn 996 (Medida cautelar) RTI 158/54
Adm Indenização (...) Reserva florestal. RE 134.297 RTJ 158/205
Ct Índice de 84,32% (...) Servidor público. ADIn 577 RTJ 158/29
PrPn «In dubio pro societate» (...) Pronúncia. HC 70.965 RTJ 158/175
Ct Inidoneidade (...) Ação direta de inconstitucionalidade. ADIn 733 RTJ
158/34
PrGr Inquérito policial militar. Arquivamento. Juiz-corregedor (oposição). Ação
penal (andamento). HC 72.925 RTJ 158/199
PrPn Instrução criminal. Documentos não autenticados. Nulidade inocorrente. HC
70.860 RTJ 158/167
ÍNDICE ALFABÉTICO — Ins-Lei XI

PrPn Instrução criminal Réu preso em outra Comarca. Requisição para audiência
de instrução (falta). Nulidade relativa. Alegação tardia. HC 71.167 RTJ
158/183
PrCv Instrumento de mandato (necessidade) (...) Representação processual. Ag
159.755 (AgRg) RTJ 158/285
Prev Instrumento de mandato (inexigibilidade) (...) Representação processual. RE
167.327 (AgRg) RTJ 158/322 — RE 178.473 (AgRg) RTJ 158/356
Ct Investidura em carreira diversa (...) Servidor público. ADIn 1.030 (Medida
cautelar) RTJ 158/60
TrPrv Irretroatividade (...) Benefício previdenciário. RE 170.539 RTJ 158/325
Ct Isenção constitucional (...) Correção monetária. RE 130.013 RTJ 158/202
Adm bonomia de vencimentos (...) Ministério Público. ADIn 465 RTJ 158/16

J
pitar Juiz-corregedor (oposição) (...) Inquérito policial militar. HC 72.925 RTJ
158/199
PrOr Justiça comum (...) Competência. HC 70.808 RTJ 158/159 — Ag 150.654
(AgRg) RTJ 158/248
Adm Justiça do trabalho (...) Competência RE 191.496 RTJ 158/361
Ct Justiças federal e estadual (...) Competência. HC 70.627 RTJ 158/147

L
PrPn Legitimidade ativa (...) Ação penal privada. RE 173.938 RTJ 158/342
PrCv Legitimidade ativa (...) Mandado de segurança. RMS 21.960 RTJ
158/107
Ct Legitimidade passiva (...) Mandado de segurança MS 21.683 RTJ 158/91
PrCv Lei complementar (falta) (...) Mandado de infanção. MI 444 (Questão de
ordem) RTJ 158/6
Ct Lei complementar (falta) (...) Servidor público. MI 444 (Questão de ordem)
RTJ 158/6
Ct Lei Complementar n° 81/93-SC (suspensão liminar) (...) Servidor público.
ADIn 1.030 (Medida cautelar) RTJ 158/60
Adm Lei Complementar n° 645/89-SP (...) Servidor público estadual. RE 161.311
RTJ 158/311
XII Lei-Man — ÍNDICE ALFABÉTICO

Ct Lei de criação de município (...) Ação direta de inconstitucionalidade. ADIn


733 RTJ 158/34
PrCv Lei em tese (...) Mandado de segurança. MS 21.881 (AgRg) RTJ
158/103
Adm Lei estadual (limites de remuneração) (...) Funcionário público. RE 160.860
RTJ 158/293
Ct Lei municipal em face da Constituição estadual (...) Competência. Rcl 374
RTJ 158/3
Trbt Lei n° 5.886/87-SP (...) ICM. RE 160.871 RTJ 158/305
Pn Lei n° 6.368/76, art. 18, IV (...) Sentença criminal. HC 70.980 RTJ
158/177
Ct Lei n° 6.368/73, art. 27 (...) Competência. HC 70.627 RTJ 158/147
Trbt Lei n° 6.374/89-SP (...) ICMS. RE 173.715 RTJ 158/338
Adm Lei n° 6.628/89-SP (...) Servidor público estadual. RE 161.311 RTJ
158/311
Trbt Lei n° 7.689/88, art. 8° (inconstitucionalidade) (...) Contribuição social. RE
150.358 RTJ 158/247
Ct Lei n° 11.816/95-MG (suspensão cautelar) (...) Servidor público. ADIn 1.251
(Medida cautelar) RTJ 158/69
Trbt Leis n°s 2.145/53 e 7.690/88 (inconstitucionalidade) (...) Taxa de licencia-
mento de importação. RE 174.044 RTJ 158/352
Adm Limitação administrativa (...) Reserva florestal. RE 134.297 RTJ
158/205
Adm Limite constitucional (...) Servidor público. RMS 21.859 RTJ 158/98
PrCv Limites objetivos (...) Coisa julgada. RE 170.906 RTJ 158/327
PrCv Liquidação estrajudicial de sociedade de seguros (...)Mandado de segurança
RMS 21.960 RTJ 158/107
Trbt Lucro das pessoas jurídicas (...) Contribuição social. RE 150.358 RTJ
158/247

M
Ct Magistrados e funcionários do TRT (...) Vencimentos. ADIn 1.244 (Medida
cautelar) RTJ 158/66
PrCv Mandado de injunção. Impossibilidade jurídica do pedido. Lei complementar
(falta). Direito inexistente. MI 444 (Questão de ordem) RTJ 158/6
ÍNDICE ALFABÉTICO — Man-Nul

PrCv Mandado de segurança Decisão denegatória. Recurso extraordinário.


Conversão em recurso ordinário. Erro grosseiro. RMS 21.336 (AgRg) RTJ
158/76
PrCv Mandado de segurança. Descabimento. Decreto com efeito normativo.
Exploração da vegetação nativa da Mata Atlântica. MS 21.274 RTJ 158/72
PrCv Mandado de segurança. Legitimidade ativa. Acionista. Postulação de direitos
patrimoniais próprios. Liquidação estrajudicial de sociedade de seguros. Subs-
tituição processual (inocorrência). RMS 21.960 RTJ 158/107
Ct Mandado de segurança. Legitimidade passiva. Fundação Legião Brasileira
de Assistência. Incompetência do STF. Constituição Federa1/88, art. 102, I,
<d». MS 21.683 RTJ 158/91
PrCv Mandado de segurança. Lei em tese. Descabimento. MS 21.881 (AgRg) RTJ
158/103
Adm Mandado de segurança coletivo. Ato do Ministro da Fazenda por ordem do
Presidente da República. Retenção de parcela de vencimentos. Servidores
filiados ao SINDILEGIS. MS 21.969 (Medida liminar) RTJ 158/123
PrCv Matéria constitucional e infraconstitucional (...) Recurso extraordinário. Ag
152.837 (AgRg) RTJ 158/268
PrCv Matéria infraconstitucional (...) Coisa julgada. RE 170.906 RTJ 158/327
PrCv Matéria infraconstitucional (...) Recurso extraordinário. Ag 158.180 (AgRg)
RTJ 158/272
PrPn Maus antecedentes (...) Recurso criminal. HC 70.847 RTJ 158/160
Adm Ministério Público. Isonomia de vencimentos. Carreiras jurídicas. Constitui-
ção Federa1/88, arts. 135, 241, 37, XIII e 39, parágrafo 1° (inteligência). ADIn
465 RTJ 158/16
Ct Município. Criação em ano de eleições municipais. Plebiscito. Competência
da justiça eleitoral. Constituição Federal/88, art. 16 (não incidência). ADIn
733 RTJ 158/34

N
PrPn Natureza jurídica (...) Sentença de pronúncia HC 70.965 RTJ 158/175
Pn Nulidade (...) Pena. HC 70.899 RTJ 158/173
Pn Nulidade inocorrente (...) Acórdão criminal HC 72.114 RTJ 158/190
prpn Nulidade inocorrente (...) Instrução criminal. HC 70.860 RTJ 158/167
PrPn Nulidade inocorrente (...) Revisão criminal. HC 70.980 RTJ 158/177
Pn Nulidade inocorrente (...) Sentença criminal. HC 70.980 RTJ 158/177
Pn Nulidade (ocorrência) (...) Coisa julgada HC 70.870 RTJ 158/170
XIV Nul-Pre — ÍNDICE ALFABÉTICO

PrPn Nulidade relativa (...) Instrução criminal. HC 71.167 RTJ 158/183

o
Prev Omissão inexistente (...) Embargos de declaração. RE 160.860 (Ene') RTJ
158/303
Ct Ordem cronológica (...)Precatório. RE 161.122 RTJ 158/310 —RE 190.685
RTJ 158/358

P
PrPn Participação de juiz em julgamento de «habeas corpus» (...) Revisão criminal.
HC 70.734 RTJ 158/155
PrSTF Pauta de julgamento (desnecessidade) (...) Agravo regimental. Ag 158.180
(AgRg) RTJ 158/272
Pn Pena. Fixação. Critério trifásico. Agravante (excesso). Nulidade. HC 70.899
RTJ 158/173
Pn Pena. Regime de cumprimento. Progressão (requisitos). HC 72.578 RTJ
158/193
Pn Pena. Unificação de penas. Crime continuado (inocorrência). Reiteração
criminosa (práticas sucessivas). HC 72.805 RTJ 158/196
Trbt PIS. Contribuição para o Programa de Integração Social. Decretos-Leis n°s
2.445 e 2.449/88 (inconstitucionalidade). RE 141.627 RTJ 158/220
TrPrv Piso mínimo (...)Benefício previdenciário. RE 162.232 (AgRg) RTJ 158/318
Ct Plebiscito (...) Município. ADIn 733 RTJ 158/34
Adm Polícia militar. Proventos. Gratificação de representação (extinção posterior).
Direito adquirido. Ag 161.523 (AgRg) RTJ 158/316
O Postos e graduações (...) Vencimentos. RE 135.632 RTJ 158/217
PrCv Postulação de direitos patrimoniais próprios (...) Mandado de segurança.
RMS 21 960 RTJ 158/107
PrCv Prazo (termo inicial) (...) Recurso extraordinário. RE 146.740 (Encl) RTJ
158/224
Ct Precatório. Crédito de natureza alimentícia. Ordem cronológica. Consti-
tuição Federal/88, art. 100. RE 161.122 RTJ 158/310 — RE 190.685 RTJ
158/358
PrCv Preparo (...) Recurso extraordinário. RE 146.740 (EDcI) RTJ 158/224
PrSTF Prequestionamento (...) Recurso extraordinário. Ag 152.214 (EDcl-AgRg)
RTJ 158/262
ÍNDICE ALFABÉTICO — Pre-Rec XV

PrCv Pressupostos (inocorrência) (...) Embargos de declaração. Ag 152.805


(AgRg-EDc1) RTJ 158/264 — Ag 153.868 (EDc1-AgRg) RTJ 158/270
Trbt Prestação de serviços (...) ICM. RE 160.871 RTJ 158/305
Trbt Princípio da irretroatividade (ofensa) (...) Contribuição social. RE 150.358
RTJ 158/247
Adm Processo administrativo. Funcionário público (demissão). Repetição de
provas colhidas na sindicância (desnecessidade). MS 21.635 RTJ 158/87
PrPn Processo por crime comum (...) Governador de Estado. RE 159.230 RTJ
158/280
PrCv Procurador autárquico (...) Representação processual. RE 167.327 (AgRg)
RTJ 158/322 — RE 178.473 (AgRg) RTJ 158/356
Pn Progressão (requisitos) (...) Pena. HC 72.578 RTJ 158/193
prpn Pronúncia. Autoria do crime (incerteza). «In dubio pro societate». HC 70.965
RTJ 158/175
Adm Proventos (...) Polícia militar. Ag 161.523 (AgRg) RTJ 158/316
Adm Proventos (...) Servidor público. RMS 21.859 RTJ 158/98

PrPn Questões novas (...) Habeas corpus. HC 70.734 RTJ 158/155

R
PrCv Recurso (...) Representação processual. Ag 159.755 (AgRg) RTJ 158/285
PrPn Recurso criminal. Apelação em liberdade (descabimento). Maus anteceden-
tes. HC 70.847 RTJ 158/160
PrPn Recurso criminal. Aproveitamento ao co-réu não recorrente. HC 70.870 RTJ
158/170
PrPn Recurso criminal. Decisão favorável (possibilidade de extensão a co-réu).
Código de Processo Penal, art. 580. HC 71.905 RTJ 158/187
PrCv Recurso especial (...) Recurso extraordinário. Ag 152.837 (AgRg) RTJ
158/268
PrCv Recurso extraordinário (...) Mandado de segurança. RMS 21.336 (AgRg)
RTJ 158/76
PrCv Recurso extraordinário. Preparo. Prazo (termo inicial). Deserção (ausência).
RISTF/80, arts. 59, parágrafo 3° e 107. RE 146.740 (EDc1) RTJ 158/224
XVI Rec-Res — ÍNDICE ALFABÉTICO

PrSTF Recurso extraordinário. Prequestionamento. Configuração. Ag 152.214


(EDcI-AgRg) RTJ 158/262
PrCv Recurso extraordinário. Recurso especial. Matéria constitucional e infra-
constitucional. Fundamento constitucional (preclusão). Ag 152.837 (AgRg)
RTJ 158/268
PrCv Recurso extraordinário. Reexame de prova. Matéria infraconstitucional.
Guarda de menor. Estatuto da Criança e do Adolescente. Ag 158.180 (AgRg)
RTJ 158/272
PrCv Recurso extraordinário. Substituição de recurso ordinário. Descabimento.
Ag 143.711 (AgRg) RTJ 158/222
PrCv Recurso extraordinário (descabimento) (...) Coisa julgada. RE 170.906 RTJ
158/327
Ct Recurso ordinário em mandado de segurança (...) Competência. RMS 21.491
(AgRg) RTJ 158/84
PrCv Reexame de prova (...) Recurso extraordinário. Ag 158.180 (AgRg) RTJ
158/272
Pn Regime de cumprimento (...) Pena. HC 72.578 RTJ 158/193
Pn Reiteração criminosa (práticas sucessivas) (...) Pena HC 72.805 RTJ 158/196
PrPn Relator da apelação (participação) (...) Revisão criminal. HC 70.980 RTJ
158/177
Adm Repetição de provas colhidas na sindicância (desnecessidade) (...) Processo
administrativo. MS 21.635 RTJ 158/87
PrCv Representação processual. Procurador autárquico. Instrumento de mandato
(inexigibilidade). RE 167.327 (AgRg) RTJ 158/322 — RE 178.473 (AgRg)
RTJ 158/356
PrCv Representação processual. Recurso. Instrumento de mandado (necessidade).
Ag 159.755 (AgRg) RTJ 158/285
Ct Reprodução de dispositivo da Constituição Federal (...) Competência. Rcl 374
RTJ 158/3
PrPn Requisição para audiência de instrução (falta) (...) Instrução criminal. HC
71.167 RTJ 158/183
Adm Reserva florestal. Serra do Mar. Limitação administrativa. Direito de proprie-
dade. Indenização. Constituição Federal/88, art. 225, parágrafo 4°. RE
134.297 RTJ 158/205
PrSTF Responsabilidade da parte (...) Agravo de instrumento. - Ag 151.485 (AgRg)
RTJ 158/252 — Ag 158.180 (AgRg) RTJ 158/272 — Ag 159.755 (AgRg)
RTJ 158/285
ÍNDICE ALFABÉTICO — Ret-Ser XVII

Adm Retenção de parcela de vencimentos (...) Mandado de segurança coletivo. MS


21.969 (Medida liminar) RTJ 158/123
PrPn Réu preso em outra Comarca (...)Instrução criminal. HC 71.167 RTJ 158/183
PrPn Revisão criminal. Participação de juiz em julgamento de «habeas corpus».
Impedimento inocorrente. HC 70.734 RTJ 158/155
PrPn Revisão criminal. Relator da apelação (participação). Nulidade inocorrente.
HC 70.980 RTJ 158/177
TrPrv Revisão (critério) (...) Benefício prividenciário. RE 170.539 RTJ 158/325
PrCv RISTF/80, arts. 59, parágrafo 3° e 107 (...) Recurso extraordinária RE
146.740 (EDc1) RTJ 158/224
PrSTF RISTF/80, arts. 83, III e 131, parágrafo 2° (...)Agravo regimental. Ag 158.180
(AgRg) RTJ 158/272

TrPrv Salário mínimo (...) Beneficio previdenciário. RE 162.232 (AgRg) RTJ


158/318
Pn Sentença criminal. Tráfico de entorpecentes. Crime cometido no interior de
estabelecimento penal. Circunstância qualificadora. Lei n° 6.368/76, art. 18,
IV. Nulidade inocorrente. HC 70.980 RTJ 158/177
PrPn Sentença de pronúncia. Natureza jurídica. HC 70.965 RTJ 158/175
sidm Serra do Mar (...) Reserva florestal. RE 134.297 RTJ 158/205
Ct Serventiajudicia 1. Substitutos e interinos (efetivação). ADCT da Constituição
do Estado de Alagoas, art. 30 (suspensão liminar). ADIn 1.047 (Medida
liminar) RTJ 158/63
Ct Serviços notariais e de registros públicos (...) Competência legislativa. ADIn
1.047 (Medida liminar) RTJ 158/63
Adm Servidores filiados ao SINDILEGIS (...) Mandado de segurança coletivo. MS
21.969 (Medida liminar) RTJ 158/123
PrPn Servidor público (...) Ação penal privada. RE 173.938 RTJ 158/342
Adm Servidor público. Aposentadoria. Proventos. Limite constitucional. Consti-
tuição Federal/88, art. 37, XI e art. 17 do ADCT. RMS 21.859 RTJ 158/98
Ct Servidor público. Aposentadoria especial. Atividades insalubres. Lei comple-
mentar (falta). Direito inexistente. Constituição Federal/88, art. 40, parágrafo
1°. MI 444 (Questão de ordem) RTJ 158/6
Ct Servidor público. Cargo público (provimento). Concurso público (ausência).
Lei n° 11.816/95-MG (suspensão cautelar). ADIn 1.251 (Medida cautelar)
RTJ 158/69
XVIII Ser-Tax — ÍNDICE ALFABÉTICO

Adm Servidor público (...) Competência. RE 191.496 RTJ 158/361


Ct Servidor público. Concurso público. Investidura em carreira diversa. Lei
Complementar n° 81/93-SC (suspensão liminar). ADIn 1.030 (Medida caute-
lar) RTJ 158/60
Ct Servidor público. Vencimentos (reajuste). Índice de 84,32%. Direito adquiri-
do (inexistência). Decisão administrativa do TRF da 2' Região (inconstitucio-
nalidade). ADIn 577 RTJ 158/29
Adm Servidor público. Vencimentos (reajuste). URP. Direito adquirido. RE
146.749 RTJ 158/228
Adm Servidor público estadual. Vencimentos (cálculo). Adicional por tempo de
serviço. Vinculação à lei anterior (impossibilidade). Lei n° 6.628/89-SP. Lei
Complementar n° 645/89-SP. RE 161.311 RTJ 158/311
Adm Servidor público estadual. Vencimentos (correção monetária). Inadim-
plência do Estado. Aplicação do direito comum. Ag 163.936 (AgRg) RTJ
158/320
Ct Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (...) Ação direta de inconstitu-
cionalidade. ADIn 996 (Medida cautelar) RTJ 158/54
Ct STF (...) Competência. RMS 21.491 (AgRg) RTJ 158/84
Ct STJ (...) Competência. HC 71.050 RTJ 158/181
PrPn Substituição de recurso ordinário (...) Habeas corpus. HC 70.734 RTJ
158/155
PrCv Substituição de recurso ordinário (...) Recurso extraordinário. Ag 143.711
(AgRg) RTJ 158/222
PrCv Substituição processual (inocorrência) (...) Mandado de segurança. RMS
21.960 RTJ 158/107
Ct Substitutos e interinos (efetivação) (...) Serventia judicial. ADIn 1.047 (Me-
dida liminar) RTJ 158/63
PrSTF Súmula 288 (aplicação) (...) Agravo de instrumento. Ag 151.485 (AgRg) RTJ
158/252 —Ag 158.180 (AgRg)RTJ 158/272 —Ag 159.755 (AgRg)RTJ 158/285
Adm Súmula 473 (...) Ato administrativo. RE 160.811 RTJ 158/287
PrPn Supressão de instância (...) Habeas corpus. HC 70.734 RTJ 158/155
PrSTF Sustentação oral (descabimento) (...)Agravo regimental. Ag 158.180 (AgRg)
RTJ 158/272

T
Trbt Taxa de licenciamento de importação. Leis n°s 2.145/53 e 7.690/88 (incons-
titucionalidade). RE 174.044 RTJ 158/352
ÍNDICE ALFABÉTICO — Tem-Ven XIX

prev Tempestividade (prova) (...)Agravo de instrumento. Ag 151.485 (AgRg) RTJ


158/252
prCv Teses jurídicas opostas (inexistência) (...) Embargos de divergência ERE
160.811 (AgRg) RTJ 158/290
Adm Teto de vencimentos (...) Funcionário público. RE 160.860 RTJ 158/293
Pn Tráfico de entorpecentes (...) Sentença criminal. HC 70.980 RTJ 158/177
Ct Tráfico internacional de entorpecentes (...) Competência. HC 70.627 RTJ 158/147
PrSTF Traslado deficiente (...) Agravo de instrumento. Ag 151.485 (AgRg) RTJ
158/252 — Ag 158.180 (AgRg) RTJ 158/272 — Ag 159.755 (AgRg) RTJ
158/285

U
Ct União Federal (...) Competência legislativa. ADIn 1.047 (Medida liminar)
RTJ 158/63
Pn Unificação de penas (...) Pena. HC 72.805 RTJ 158/196
Adm URP (...) Servidor público. RE 146.749 RTJ 158/228
Ct URV (diferença) (...) Vencimentos. ADIn 1.244 (Medida cautelar) RTJ 158/66

C Vantagens correspondentes às conferidas aos policiais militares (...) Venci-


mentos. RE 135.632 RTJ 158/217
Adm Vantagens incorporadas por decisão judicial transita em julgado (...) Funcio-
pariri° público. RE 160.860 RTJ 158/293
Ct Vencimentos. Postos e graduações. Vantagens correspondentes às conferidas
aos policiais militares. Constituição Federal/67,. art. 13, parágrafo 4°. RE
135.632 RTJ 158/217
Ct Vencimentos. URV (diferença). Magistrados e funcionários do TRT. Delibe-
ração administrativa do TRT da 15' Região (suspensão cautelar). ADIn 1.244
(Medida cautelar) RTJ 158/66
Adm Vencimentos (cálculo) (...) Servidor público estadual. RE 161.311 RTJ
158/311
Adm Vencimentos (correção monetária) (...) Servidor público estadual. Ag
163.936 (AgRg) RTJ 158/320
Adm Vencimentos (reajuste) (...) Servidor público. ADIn 577 RTJ 158/29 — RE
146.749 RTJ 158/228
XX Vin-Vin — ÍNDICE ALFABÉTICO

Adm Vinculação à lei anterior (impossibilidade) (...)Servidor público estadual. RE


161.311 RTJ 158/311
ÍNDICE NUMÉRICO
Acórdãos

374 (Rei) Rel. : Min. Moreira Alves 158/3


444 (MI-Questão de ordem) Rel. : Min. Sydney Sanches 158/6
465 (ADIn) Rel. p/ o acórdão: Min. Limar Gaivão 158/16
577 (ADIn) Rel. : Min. Octavio Gallotti 158/29
733 (ADIn) Rel. : Min. Sepúlveda Pertence 158/34
996 (ADIn-Medida cautelar) Rel. : Min. Celso de Meio 158/54
1.030 (ADIn-Medida cautelar) Rel. : Má. Carlos Velloso 158/60
1.047 (ADIn-Medida liminar) Rel. : Min. Sepúlveda Pertence 158/63
1.244 (ADIn-Medida cautelar) Rel. : Min. Néri da Silveira 158/66
1.251 (ADIn-Medida cautelar) Rel. : Min. Celso de Mello 158/69
21.274 (MS) Rel. : Min. Carlos Velloso 158/72
21.336 (RMS-AgRg) Rel. : Min. Marco Aurélio 158/76
21.491 (RMS-AgRg) Rel. : Má. Carlos Velloso 158/84
21.635 (MS) Rel. : Má. Carlos Velloso 158/87
21.683 (MS) Rel. : Má. Moreira Alves 158/91
21.859 (RMS) Rel. : Min. Sepúlveda Pertence 158/98
21.881 (MS-AgRg) Rel. : Min. Celso de Mello 158/103
21.960 (RMS) Rel. p/ o acórdão: Min. Maurício Corrêa 158/107
21.969 (MS-Medida liminar) Rel. : Min. limar Gaivão 158/123
70.627 (HC) Rel.: Min. Sydney Sanches 158/147
70.734 (HC) Rel. : Min. Carlos Velloso 158/155
70.808 (HC) Rel. : Min. Carlos Velloso 158/159
70.847 (HC) Rel.: Min. Sydney Sanches 158/160
70.860 (HC) Rel. : Min. Carlos Velloso 158/167
70.870 (HC) Rel. : Má. Sydney Sanches 158/170
70.899 (HC) Rel. : Min. Sepúlveda Pertence 158/173
XXIV ÍNDICE NUMÉRICO

70.965 (HC) Rel.: Min. Carlos Velloso 158/175


70.980 (HC) Rel.: Min. Carlos Velloso 158/177
71.050 (HC) Rel.: Min. Moreira Alves 158/181
71.167 (HC) Rel.: Min. Sydney Sanches 158/183
71.905 (HC) Rel.: Min. Sydney Sanches 158/187
72.114 (HC) Rel.: Min. Sydney Sanches 158/190
72.578 (HC) Rel.: Min. Maurício Corrêa 158/193
72.805 (HC) Rel.: Min. Maurício Corrêa 158/196
72.925 (HC) Rel.: Min. Maurício Corrêa 158/199
130.013 (RE) Rel.: Min. Carlos Velloso 158/202
134.297 (RE) Rel.: Min. Celso de Mello 158/205
135.632 (RE) Rel.: Min. Octavio Gallotti 158/217
141.627 (RE) Rel.: Min. Celso de Mello 158/220
143.711 (Ag-AgRg) Rel.: Min. Carlos Velloso 158/222
146.740 (RE-EDc1) Rel.: Min. Maurício Corrêa 158/224
146.749 (RE) Rel. p/ o acórdão: Min. Moreira Alves 158/228
148.510 (RE) Rel.: Min. Marco Aurélio 158/243
150.358 (RE) Rel.: Min. Moreira Alves 158/247
150.654 (Ag-AgRg) Rel.: Min. Paulo Brossard 158/248
151.485 (Ag-AgRg) Rel.: Min. Néri da Silveira 158/252
152.214 (Ag-EDcl-AgRg) Rel.: Min. Marco Aurélio 158/262
152.805 (Ag-AgRg-EDc1) Rel.: Min. Celso de Mello 158/264
152.837 (Ag-AgRg) Rel.: Min. Carlos Velloso 158/268
153.868 (Ag-EDcl-AgRg) Rel.: Min. Sydney Sanches 158/270
158.180 (Ag-AgRg) Rel.: Min. Sydney Sanches 158/272
159.230 (RE) Rel.: Min. Sepúlveda Pertence 158/280
159.755 (Ag-AgRg) Rel.: Min. Marco Aurélio 158/285
160.811 (RE) Rel. p/ o acórdão: Min. Sepúlveda Pertence .158/287
160.811 (ERE-AgRg) Rel.: Min. Francisco Rezek 158/290
160.860 (RE) Rel.: Min. Néri da Silveira 158/293
160.860 (RE-EDc1) Rel.: Min. Néri da Silveira 158/303
160.871 (RE) Rel.: Min. Marco Aurélio 158/305
161.122 (RE) Rel.: Min. Marco Aurélio 158/310
161.311 (RE) Rel.: Min. Néri da Silveira 158/311
161.523 (Ag-AgRg) Rel.: Min. Marco Aurélio 158/316
162.232 (RE-AgRg) Rel.: Min. Paulo Brossard 158/318
163.936 (Ag-AgRg) Rel.: Min. Octavio Gallotti 158/320
167.327 (RE-AgRg) Rel.: Min. Celso de Mello 158/322
170.539 (RE) Rel.: Min. Carlos Venoso 158/325
170.906 (RE) Rel.: Min. Moreira Alveá 158/327
173.715 (RE) Rel.: Min. Celso de Mello 158/338
ÍNDICE NUMÉRICO XXV

173.938 (RE) Rel. p/ o acórdão: Má. Marco Aurélio 158/342


174.044 (RE) Rel.: Min. Marco Aurélio 158/352
178.473 (RE-AgRg) Rel.: Min. Marco Aurélio 158/356
190.685 (RE) Rel.: Má. Celso de Mello 158/358
191.496 (RE) Rel.: Mim Maurício Corrêa 158/361

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