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ATIA TIIS
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Fotomontagem/Eu9ênio Hirsch
Capa: MaurÍcio Silva/SuelY Maia

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A TII POESIA

ALCIDES PINTO
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COMPOSTO IMPRESSO NA
EDITORA E GRÀFICA LOURENÇO FILHO LTDA.
Rua Senador Pompêu, 2OO3 - Telefone: 226'4515
OBRAS DO AUTOR
POESIA
Aãtoloqia dos Poetas da Nova Geração. Prefácio de Álvaro Moreira,
Rio,- Pongetti, 1950. (De parceria com Raimundo Araujo e
Ciro Colares).
Antologia: A Moderna Poesia Brasileira. Prefácio de Aníbal Machado,
Rio, Pongetti, 1951.
Nocões de Pôesia & Arte. Rio, Pongetti , 1952-
Pequeno Caderno de Palavras. Rio, Pongetti, 1953.
Cantos de Lúcifer. Rio, Pongetti, 1954.
As Pontes. Rio, Pongetti,1955.
A llha dos Patrupachas. Rio, Liv. São José, 1960.
Os Catadores aé gri. la. ed., Rio, Leitura, 1966,2a. ed., Edições
Urubu, Fortaleza, 1977 . PROÊMIO
Concerto. Estrutura-Vistral-Gráfica. Rio, Edição do Autor. 1965.
Ciclo Único. Rio, MEC. Serviço de Documentação, 1964.
Cantos de Lúcifer (Poemas Reunidos), Rio, GRD. 1966.
As Águas Novas. Fortaleza, Editora Henriqueta Galeno,-- 1.975.
O Acãraú: Biografia do Rio. Fortaleza, Editora Henriqueta Galeno,
't979.
ROMANCE:
Entre o Sexo: A loucura/A morte" Rio. Gráf ica Record Editora, 1 968'
Manifesto Traído" Fortaleza, Editora Lourenço Filho, 1979.
TR!!-OGIA DA MALDIÇAO:
0 Dragão. Rio, 1a. ed. GRD, 2a. ed, O Cruzeiro, Rio, 1968. 'l
Os Veides Abr-rtrês da Colina. Rio, Cia. Editora ,Americana, 974.
João Pinto de Maria (Biografia de um Louco). Rio. Editora Ameri-
cana, 1974"
TRILOGIA TEMPO DOS MOBTOS:
EstaÇão da Morte. Rio, José Álvaro Editor, 1968.
O Eáigma. Fortaleza, lrnprensa Universitária da UFC, 1974.
O Son-ho. Fortaleza, Éditora Henriqueta Galeno, 1974"
NOVE!-A:
O Criador de Demônios. Rio, GRD, 1963.
CONTO:
Editor de lnsônia. Rio, Leitr"rra, 1965.
TEATRO:
Equinócio. Fortaleza, Editora Henriqueta Galeno, 1973 (Encellad.a
no Teatro José de Alencar pela Comédia Cearense, em 19771'
ENSAIO:
Comunicação: lngredientes - Repercussão. Fortaleza. lmprensa
Universitária da UFC. 1976.
FONTE DE CONSULTA:
José Lemos Monteiro - O Universo Mí(s)tico de José Alcides Pinto'
F-ortaleza, lmp;ensa UniversitáÍia da UFC, 1979.
CRITICA LITERARIA:
PolÍtica da Artd (inédito)
OS AMANTES
Ela não sabe que a €strela Vásper
lnÍlui nas almas lascivo ardor:
o.re, na sem causa, no tempo anllgo
A estreia Vésper chamou-sê - Amor.

A estrela Vésper produz na§ virgens


Estranho incêndio, vulcão fatal:
Oler seja Íreira - do Cristo Íilha,
Orer seja antiga pagã vesral.
Junqueira Freire, " A F reir a"
lnspirações do claustro.

Poeta, de que estranha aurora vens pr$edido?


Eu te trago o outono do cometa.
O peixe azul da praia. O rutílio marinho
O Atlântico. O coral dos olhos da sereia.
E o Hemisfério Setentrional.
O Poeta: Ouem fala?
,4 Amante: A Amante.
O Poeta: Ouço sons de guttarra.
A Amante: Eu, uma estranha música.
O Poeta: De onde?
A Amante: Ouem será?
O Poeta: Vem da noite
A Amante: Au das estrelas.
O Poeta: Ê um som infínito.
A Amante"' lnfinitantente infinito.
O Poeta: Talvez o tro de um grito.
A Amante: É um som" Não é um ecct"
O Poeta: Um eco sem o eco.
A Amante: Como o silêncio do grito"
O Poeta: O grito do Leviatã no oceana.
A ,\mante: Oue a flor da espuma recolhe.
O Poeta: Tua boa sangra.
A Amante: Eeija-me"
O Poeta: Agora?

7
I
Satã: Agora dissolve-te no carvão da noite.
A Amante: Já.
O Poeta: Mostra-me os seios. A Morte: É verdade. Já não tenho o que fazer aqui'
A Amante: Aí os tens. Satã: São tardas as horas.
O Poeta: Castos e formosos A Morte: São tardas as horas.
(O eco de Satã e o da Morte repercutem no espaÇo vazio)
A Amante: A ti segredados-
O Poeta: Sinto veneno no sangue.
A Amante: Eu, vamPiro na alma-
O Poeta: Ouero mordê-los.
A Amante: Faze-o.
O Poeta: Vou devorá-los com meus afiados caninos.
A Amante: Faze-o.
O Poeta: Teu sangue tem o sabor do vinho quente'
A Amante: Embriaga-te.
O Poeta: Estou louco. Deliro.
A Amante: Estás Possesso.
O Poeta: Tu foste minha Perdição.
A Amante: Perdão. Eu também sufoco.
O Poeta: um ataúde. Sinto-me arrebatado.
A Amante: Entremos os dois.
O Poeta: Frha a tampa.
A Amante: Aiuda'me.
O Poeta: Não posso.
A Amante: Por quê?
O Poeta: Por causa de teus olhos. Erilham como os astros.
A Amante: Airanca-os.
O Poeta: Estás lutca?
A Amante: E, como tu, Possessa.
(Satã entra em cena sutil como um fantasma)-
§ptã: Eu vim celebrar teu himeneu.
A Amante: Pois antes fxha a tampa do ataúde.
(A morte entrando em cena sutil como Satil.
A Morte: Srtã, sou tua serva fiel. i

§rltã: Pode cobri-los com teu crepe fúnebre


I

A fitlorte: A eternidade iá pes sobre eles.

I i I
Ia. PARTE

ORACULO DE DELFOS

1
Nasci ooeta! sou rei - na esÍera deste orgulho
De ser força criadora e universal poder:
Oue grandeza haverá que compense do asbt'rlho
-O que á taça do Eleito é defeso beberT !

Carlos Gondim -- Poemas do Cárcsre.


LouvoR E MALDTÇÃo Ro PoETA
ARTUR EDUARDO BENEVIDES

CANTO I
Eu te saúdo, ó lt/lenestrel legítimo.
Pajem e Profeta. Lira de Orfeu.
Costela do Atlântico. Gigante Adamastor.
Visão do cego Homero. Amor de Dulcinéia.
Luz mineral das pedras. Cometa desconhecido.
Anatomia do vento. Astronomia.
Piloto náutico. lVlastaréu do Navio da Noite.

Perdido na borrasca de teus poemas elegíacos.


Oráculo de Delfos. l-lorus da cor do bronze
a vigiar com o olho ancestral do Ícone
o carvão que a noite esconde
em secretos elitros. Bastão do pastor
a pastorear nuvens, brisas, Íantasmas, mitos.

Canto a alquimia de teus versos ludtcos


* sintbolo astral rle tnercÚrrio e otrtrr-rs nretais
corno o metilenct É,r os l;ases em combustão com a lua il
rie teus setenta ícJolos inÍernais.
E na pauta da Viola de Andarílho
vejo-te, como Satã, a erquer-se ern brilhrl.

Cantor dos ancestrais, das eras priscas,


mercacior visionário cle ilusões,
quebras os amuletos e os Íettches
dos deuses da fé impura dos pagãos.
Ouem sabe mais que tu louvar os milos
e a magia dos cultos infinitos?

15
Entanto, é na ciência que te nutres. Oue venha a tempestade do mar e os perigos que venham
Ô natureza das cousasl Ô almas castas da Nova Ierra, a gentil espécie, alheia
de monjes que perpassam em teus poemas à língua que falas e aos costumes e danos.
como fantasmas de pó e de mãos vastas. És o sol do Ocidente em sua fulva ardentia,
Cantor da morte e do amor vesano brasão dos Ouatro Reinos de glôria e primazia.
bem sabes que a ventura é puro engano.
E mais terás se quiseres, Palas a teus pés.
CANTO II Deusas para te servir. N/linerva e AÍrodite.
E o gênio de Fídias e o Partenon inteiro
Aparta-te destes Cantos, mulher dúctil e guerreira de dôricas colunatas e ouro marchetado.
alma de veneno letal, sangue corrosivo Oue majestade imensa! Oue magnífico tesouro!
de inflamável minério, que escorre como lavas. Prosternadas a téus pés. sonham as sÍlfides do Douro.
Ouem te disse, Satã, que minha alma está enferma
como podre vegetal coberto de tubérculos? Ô páriat Ô Andarilhot Nauta e Argonauta.
Tu sonhaste, talvez, com as chagas de Lázaro. Em teu Pégaso de fogo atravessas os hemisférios.
Certamente foi isso. Tu sonhaste, talvez. E de Andrômeda trazes os" diamantes mais puros
para o cetro de Alexandre aos feitos gloriosos.
Ergue-te, Poeta, sol das Hespéridesl Alma de paladino dos antigos guerreiros
E com teu terçado de sete pontas agudíssimas tens a força e a coragem dos vice-reis primeiros...
como os dardos do sol-poente, crava-o sem piedade
no peito desse Íncubo anjo descaído. Corno SaÍo inventaste a poesia.
Augusto Poeta, na solidão dos viajantes Seu campo magnético. Seu doce acorde azul.
de teus poemas tácitos, carregados de mitos, E o teu peregrinar com Sófocles e Ésquilo.
desÍralda a bandeira de teu Navio da Noite E as altas sapiências. E o pensamento eterno
e singra, como as três naus, os desconhecidos do mundo em devenir.
oceanos de ventos vorazes e feros albatrozes. Rosa-dos-ventos submissa aos teus anelos.
Ô marinha solidão dos elos e Dardanelos.
De Carlos, Rei de França, e de Joana camponesa
herdaste fé e coragem, e o afortunado estro Sabes de cor o código de Harnurabi. As leis draconianas
de Ovídio, supremo cantor de um novo Olimpo. Conheces os exércitos de Aníbal e sua estranha Íigura.
'Estás
Na ode de Anacreonte e na lira de Orfeu sempre a bordo e a estibordo, como um velho Leviatã
amarraste os possanteslbraços de Prometeu. que não se cansa de olhar os horizontes de chumbo.
A epistemologia - luz da História, e o relevo da Terra
mostram-te que o homem viveu, e vive, a Íazer guerra.

16 17
Eís teu arnotr, iá cPe o quer6-
Distanciação dos Cantos
(Diálogo com Satã) Esta horrÍvel cawÍna?
chorarrru por ela?
r{nãoé unrla hlla Ínrmagenrm? }-[á pou'ucor não
polegares'
Satã, eu estou clamando por meu amor. Atííea ao \remto, §affi, otl dísollve-a entre os
Por teu amor? Onde andará?
Frimeiro EPílogo
Solto no vento.
No vento? princípio'
ô Rei e Pr,íncipe dás Trevas' Razão de meu
No vento.
O vento está sujo da baba dos humanos. Estro do meu estro- Louvor e maldição'
Do suor dos mortos. Ouero um Cênto, Satã, de glória e mais dorido
Pois limpa-o, para que eu o reconheça. gue a coragem do herôi fer:ido a quatro lanças'
mais altivo
Amor dos mortais? . . . Pelos infernos! Uma inspir4ão sem timite, um brado
l\4as hei de fazê'lo. para louvar o meu melhor amigo'
Oue facas cluanto antes. Sufoco.
Dize-me, apenas. IVas não me rogues. Poeta meu, das musas Prometldo'
Peço-te, se assim () qurjrcs, lão-s,)mHrtlr... PálicJo d,eÍensor de Tróias [es$rrgentes'
Descendente de Fleis' Cavaleiro ao
luar'
Tão-somente basta.
Guerreador de nuvens' Guardião de castetos'
Teu orgulho é execrável.
Mão que apascenta os segredos e a ira de
Netuno'
Oual o dos mortais.
És desprez ível.
Apraz"me o insulto. Segundo e Derradeiro EPílogo

Ouando o Íazes?
Pelos infer nos! Não insistas. Ouem mais souber, aumente ou se acrescente'
O amor é a propria vida. Aqui me planto eu' E glórias selam dadas
aos grandes pores-do-sol e às castas
madrugadas
Enganas-te. O arnor é como a morte.
Não importa. Orrero que limpes o vento. Festitui-mo por onde Passa o gesto do Poeta'
lnta«:to? Aqui me planto eu. Na rima' Na grlrna'
Perfeito. No caÀto. No manto. Na Ílauta' Na Ílama'
Pe:los infcrrros! O r;trr: lli rlt; 1rr:t [eilr) rlest(] rnundo? Nas florestas, aguardareÍ as proÍecias'
Só o amor. Outros. estou certo, nada aguardarão
maos'
[Vlais uma vet lt', í]n(liuliis
T E os dias passarão molemente por entre as nossas
Oue existe, enlão1
ÍVinha eternidade.
Prosterno-me ante Irr;t satrr-'rlorra. Como antes não pensei.

r9
18
I

2a. PARTE

REVELAÇÃO DO MlrO OU
ENTRECHO AO CORVO DE ALLAN POE

il
A

Chagas Vasconcelos
- líder do povo.


a

Erguete, ó luzl - estrela para o povo,


Paraor tiranos - lúgubre com€ta.

- Castro Alves. "Adeus, meu Canto". Or Escravos.

- Byron. Childo llarold.

l
A PEOUENA VARREDORA

Varre, menina, este lixo da rua.


Varre pelas calçadas afora. Varre este chão sujo de poeira.
Varre o escarro, o excremento, o pus do leproso, o esperma do louco
Varre o vômito do bêbado;a Ouarta-doenÇa - varre para as ruas.
Tu não sabeq o que isso signif ica. Nías continua varrendo.
E é bom que não saibas jamais.

Varre, menina, esta rua, esta rua, esta rua,


mais comprida do que tua al4a, mais vasta do que o mundo.
Esta rua onde moras, onde vives, onde trabalhas,
sem saber porque varres; sem saber a Ouarta-doenÇa o que significa.
E é bom que não saibas jamais.

Ah, se pudesses usar um vestido mais longo


em vez destes molambos rotos de tuas vestes.
Um lenço arrancado a teus trapos para evitar a poeira
que sobe ao teu rostinho pálido e te veda o nariz.
Pois são tantos os micróbios que se agitam no ar
quando tanges a vassoura com tamanha leveza
tal o pássaro que se alça ao morno vento da tarde
ou como o animal no campo se refaz de seu tropismo.
Tu não sabes a beleza que teu rosto ressuma.
E é bom que não saibas jamais.

21
ÍVlas nãopodes. És uma menina da rua, suja como a poeira, com tanta graÇa e miséria este instrumento doméstico
pobre como estes retalhos de papéis inúteis, tão leve e braixo como uma asa ferida que se arrasta tremendo
com borrões que nada dizem, escrita que nada fala, que a cada impulso do corpo mais sangra em sua Íuga.
antes, objetos de tanta estima e imensos cuidados Tu não sabes por que esta asa está sempre presente a teu
pois encerravam a ciência do comércio, a mecânica prática caminho,
e obsessiva dos homens de negocio E é bom que não saibas jamais.
e se constituíam documentos mais preciosos do que o ouro.
No entanto, tu empurras agora para as satjetas lVais leve f ica tua vassoura quanto esta asa te aparece
esse triunfo catalogado numa ordem rígida, embora ferida e sangrando ela te protege contra as desgraças
sem saber o que isso ontem significava para o orgulho do homem do mundo.
E é bom que não saibas jamais. Como a mãe que não tiveste;como minha alma doente
vela por ti ao pé de teu'leito oprobioso.
E nem sequer suspeitas que esta asa anônima e peregrina
Ouantos carimbos impressos, quantas rubricas conÍeridas, aquece com seu halo de luz e suas rémiges de seda
mais vivos, estes papéis, que moedas cunhadas teu corpo Íranzino e delicado qual uma pétala de rosa.
com a face do lmperador e os brasões of iciais' Porquanto tempo ainda, pequena varredora, tu não sabes.
Agora, com os vermes do esgoto, estabelecem outro comércio E é bom que não saibas jamais.
mais amplo que o dos homens e mais duradouro em sua espécie
Pequena varredora, isto, tu ôão sabias. Varre este vento em circulo que te penetra o corpo.
E é bom que não saibas jamais. Varre-o para distante este monstro gelado
encharcado da umidade da chuva e pesado em seu elemento.
Ele pode te constipar os pulmões já afetados da poeira das ruas.
Varre, menina, para a rua, a consciência coletiva, Ah, e o que é feito de ti, pequena varredora,
nesses entulhos de papéis rasgados - colunas de altas somas se a mãe que não tiveste não se encontrar em tua vigília"
subtraídas da sombra de cada homem que passa com seu ramo Se a minha alma enferma não se achar ao pé de teu leito.
de negocio Se a asa ferida com seu anio estiverem ausentes de tuas costas.
sem saber que tu ós a herdeira de tamanha fortuna. E nem sabes que isto possa te acontecer um dla.
lsto (também) tu não sabias. E é bom que não saibas jamais.
E é bom que não saibas jamais.
Varre, pequena varredora, a cozinha desta casa.
Varre, pequena varredora, a Írente tlesta casa. Varre suas laterais, seus focos de anofel inos venenosos.
Varre a escória do mundo. Varre suas latrinas, suas alcovas, suas salas, a biblioteca
Varre os ditadores, a Jr"rstiça odiosa. O prelado ocioso
Varre o sujo de teus pés, só tu sabes tanger

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Varrepor cima do muro a hera que o limo cresta. Tu, pequena varredora, de sainha curta
Varredebaixo das escadas; varre a aranha do sótão. atada à cintura, qual uma boneca,
Varreo caruncho grudado no portal. não sabes quanto encanto teu corpo desprende nesta chuva
Varreo copiar, o quarto das bonecas. de poeira.
Varrea dispensa, o caixão de farinha, o depósito de cereais. E é bom que não saibas jamais.
Varreas lagartas mortas do jardim; varre o portão principal.
Sem saber por que tanto sujo se acumula. Pequena varredora, teu gracioso olhar
E é bom que não saibas jamais. desperta o ciúme da laranjeira e Íaz com gue seus botões
se desprendam dos ramos.
Varre, pequena varredora, o frouxel do pombal. A doce música das ravinas da lua sustém suas notas diluídas.
Varre o quintal, o chiqueiro dos porcos, a merda da galinha. O som isócrono da flauta, o grito aflito das harpas eólias,
Varre o estrume, a placenta da vaca, o dejeto do urinol. perto de teus ritmos perdem-se no olvido.
Varre tudo o que estiver à tua frente, com tua doce cabeleira Oh, princesa do lixot Oh, vestal! Oh, sÍlfide!
voltada para os ombros * este ouro raro, perdido, Flor que recolhe o lixo em seus perfumados pistilos.
que ninguém vê, como as escotilhas do sol. O rouxinol e o sabiá cessam o seu trinado
E nem sabes que este minério excita a ambição dos abastados. quando tu passas bailando com tua vassoura
E é bom que não saibas jamais. empurrando o lixo para o corpo acéfalo do mundo.
E nem sabes quanto isso fere a minha alma.
Varre, menina da rua, as baratas, o rato morto, o pelo do gato E é bom que não saibas jamais.
no borralho
Varre o cuspo na parede, a mancha de mijo no assoalho. Varre, em torno de ti, pequena varredora^
Varre a casca do ovo, o resto podre da banana. Enxuga, com teus trapos, o suor que escorre de teu pescoÇo
Varre a peste, a Íebre, a Doença de Chagas. lívido.
Varre o osso, o besouro, o forro do fluxo menstrual. Varre as moscas que se emaranham em teus cabelos.
Varre o pó da caveira, o histerismo da louca, o cinismo do Varre o lixo infecto que te envolve o corpo.
pároco. Sem cansaço, varres o dia inteiro, todo uma estação.
Varres tanta sujeirâ sem saber por quê. Não falta lixo nessa calçada, nessa rua, nessa cidade,
E é bom que não saibas jamais. que tu não tenhas varrido, com tua rude vassoura.
Tua vida, tua alma, teus sonhos,
Ô menina dos pés graciosos e gestos translúcidos de bailarina, não passam de um monturo de lixo.
com teu instrumento rude de trabalho bailas pelas calçadasi Entanto, és bela como urn cacho florido.
indiÍerente a tudo que te cerca e à minha angústia. Vésper da tarde. E nem sabes que és portadora de tanta
Ô menina dos olhos grandes e apartados, claros e vigilantes ventura.
à mais sutil ondulação do grão de poeira. E é bom que não saibas jamais.

tl 31

i :..
Pequena varredora, enquanto tu varres, um velho de bigodão
selvagem
I
do alto dos seus setenta anos essa idade provecta
- -
te observa, em silêncio, e do arco de seu peito se desprende
um gemido.
É um poeta, abre um livro, lê ao acaso um trecho do Childe
Harold.
E nem sabias que alguém estava à tua espreita.
E é bom que não saibas jamais.

3a. PARTE
EPÍLOGO
POR TACITO: POESIA
Quem guer que habite esta casa,
Qualquer grão-senhor (que a casa é senhorial).
Quem quer que ainda aqui exista dessa real nobreza,
mister * Íaz dar acolhida à pequena varredora.
Por vosso brasão de nobreza, rogo-vos, ó Íantasmasl

Nada responde a este apelo; mas, a lua nova,


gue treme no céu da tarde como um lábio frio
diz que o pássaro da noite que habita a augusta mansão
tomará a pequena varredora aos seus cuidados.
E a menina, de pés graciosos, de olhos apartados e
perscrutadores
não terá mais o gue varrer, senão os pés do mito.

a
A

Eduardo Carrrpos -
romancista e teatrólogo.
Eras tu - liberdade peregrina!
Esposa do porvir - noiva do sol!. . .

- Castro Alves. "Ode aos Dous de iulho".


Espumas Flutuantes.
A MISÉRIA PODEROSA

A miséria erradicada do chão do viaduto


- podre chão semeado de excremento.
O canal com sua boca anastomotica
destila os detritos da miséria ao lado desse chão de 'vermes
onde os abutres disputam a carniça de um feto
cada qual mais Íeroz e avaro em sua conquista.
Oue bruxa expeliu esse monstrengo azulado
que a podricião revolve com suas rodas e o ar repele com
setr Íoqo?
O mar, corn suas crlrcias, sustém seu peso de rrreta:l
diante desse espetáculo oprobioso que a mrséria expõt' itls
elemenlos.
Ele, o Oceano; ele, o Atlântico, malesloso cr(rm(l Aprol,: t:ttt
seu 1rono.
OLrAlexandre, vrtorioso, tttarchartdo a Írerrle tlet 96111 erérc;t1tr
Bárbaro Oceano, corl) seu solo artÍratLtoso, stials tlt.irestas nrarttrltas,
seu reino de almtrantes íantasmas.

Ô nronarcal Trancadt., em tuas altas nruralhas de vetttos


indornáveis
contérn o exército de nobrlíssimt;s cavaletros
guerreiros de elmos brilharrles e esplênrlrtl()s arneses,
pronlos palra o combate ern Iinha de atarlue,
coÍrl ra Éls tempestades de Íogo r 1ue r) ríri{ r rlesencadetir
soi.rre teu dorso, tão cJoce cje ferr'lo, e maisvulnerável que o aÇu
Ouem se expõe à tua fúria sucumbe ao termento de tua carne
e ao vapor de leu sangue letal.

Ô feral grandezal Ouando a espécie humana ruge em seu Cesespercr


tu levantas a pálpebra de chumbo do olho esrluerdo

39
Por mais irado que Netuno se mostre; por mais violento o
como a lampa de um sarcófago
raio desprenda seu fogo,
e te recolhe em teu orgulho nos vulcões de teus abismos
a miséria continuará impassível em seus redutos de lama,
insondáveis.
edificada à margem do oceano e infensa a todas as leis da
Em seguida, volta à lona, e levantas a pálpebra de bronze
natu reza.
do olho direito.
Por amor a Byron:já não tenho memÓria de ter ouvido tal
e vê que a miséria é tão poderosa quanto teus domínios
expressão, ou em que rdioma estrangeiro houvesse alguém
nescru táveis.
i
pronunciado.
E a verdade se confirma:a mlséria é tão poderosa quanto a ira
Por amor (mesmo a Byron), nem em língua Íamiliar eu a
daquele que praticou o primeiro homicÍdio no mundo.
escutar ia.
Novamente mergulhas em teu reino de anf íbios ancestrais
Pois, se me uolto contra o mar, não é por amá-lo, mas para
e te entregas ao sono do minotauro em tuas cavernas
esÍaqueá-lo como faz o amante enciumado"
ou arremetes contra os mastaréus despedaçados das naus
Por amor a Byron ou Shakespeare, confesso iamais teria
encalhadas em teus rochedos de verdes cadáveres submersos.
ouvido tamanho desatino.
Diante de tão odiosa palavra, são suaves as faces de Lúcifer
Dédalo náutico, Titã de ampla cabeleira rasgada ao vento.
Albatroz de asas partidas a vogar errante nos horizontes de chumbo
ou perdido na escuridão dos abismos como N/ílton, o cego,
ou Homero, o bardo maís antigo
que os avoengos rapsodos da Hélade formosa.
Ô Adamastorl Ergue-te com tuas asas de falcão, brilhantes,
e com teu manto de sereia recoberto de corais
investe contra a misória poderosa que ameaÇa devorar o mundo
aquartelada no viaduto à margem do mar-oceano.
Oue profusão de ossos amarelos e crâneos vermelhos!
Que o sol não descubra nem Netuno sonhe
com tamanha miséria erradicada de seus domínios.
Nada poderá modificar o hábito, o modo de viver dessa
miséria incógnita.
Ela existe em cada homern que a rnargem do mar se recolhe"
E como uma peste violenta, urrra chaga, entra em seu coração
por mais impermeável que seja ao mal; por mais refraÍário
que seja à dor,
sua alma há de gemer, como o vulcão rompendo suas milenares
cadeias.

41
40
CANTO SOLITÁRIO só a abandonam quando esta exangue desÍalece
sob as juntas de besta de suas patas broncas.
Este suíno ó como o algoz carcereiro
Oue faz o homem de pé no paredão do dique conduz nas mãos de pesadê-lo seu torniquete invisível
ou escorado no muro da Íábrica - os olhos fixos nas com que tortura o coração do homem e o flagela até a
chaminés? morte.
Oue pensará este homem, do futuro? O todo-poderoso cheÍão industrial
Oue pensará dessa densa á escura coluna negra que aciona a alavanca da ferrugem do poder
que nem o ar quente dissolve nem a tempestade tal como estes infames e ociosos piolhentos burocratas
empurra para as nuvens? que nos altos cargos públicos se empoleiram
Pensa, talvez, no amanhã horizontal e ventres de sapo
nem mais nem menos do que um rio seco
- abutres de garras venenosasgarras comuns desses velhacos
sempre dispostos a lamber as
ou como o vazio de seus passos sem som embusteiros.
que iá não imprimem a sua marca no chão
como a visão do cego não abre caminho para seu corpo. tempo, que todo desvio corrige
lVlas, o
com o rolar anelante e silencioso de suas esferas
De pé, no paredão do dique, ou escorado no muro da fábrica e sua mecânica de rodas mais veloses do que a morte
este homem não fuma, não bebe, não espera um amigo vai ao encontro do homem que faz seu percurso
sua cabeça está povoada de fantasmas. na mesma direção, um tanto atrasado por séculos de cansaço
Fantasmas de gravata e paletó, figuras insignes, vultos que logo desaparecerá quando esses dois horizontes se unirem
importantes que dão ordens severas, que contraem os glória
num só canto uníssono de paz, num só hino de fogo e de
músculos do coração do homem e o punem com suas leis
prostituÍdas em nome da Justiça. feito teus homens?
[Meu País, de que é
(Um grande vazio preenche o cumprimento do seu dever). Eu que tanto teamei cctmcr r-r pai ao íiliro rllais queridtr
Pois a única recompensa ao seu trabalho é a indiferença do o amante à amante mals f rel .

todo-poderoso, o chefão industrial Eu que sonhei com teu corpo de um tulgor tnclemente
- porco cevado do sangue do operário Como os anéis errantes de teus régios poentes.
que marca sua tísica pulmonar, sua úlcera duodenal, sua Eu que te habitei em meus sonhos e te elegi acima de meu ideal
anemia profunda para te ver guerreiro e invicto como o sol.
no relôgio de ponto do negro mecanismo da morte. Para tanto escudei-me no exemplo de teus herois e mártires'
E que me deste em troca? Esse punhado de sombras sem moléculas,
O su íno cevado das tripas do operário espectro da fome e do medo - fantasmas de si mesmos
é como o gorila vigilante, o morcego casposo, dissidentes.
que jamais se saciam do sangpe de sua vítima Ouve, Brasil, este soluço que não é o de um animal doente

4í2 /|i}
nenl o (Í() vcnlr;;lerrlirlO rtr.rs lrlorais rle rrrrt rnar rle escolhos VELASCO IBARRA
É r-, solrrçr, tla Irrriprra Í,'ii1la, (]onto u rJo riríão íerido
clue jii não sabe rl qrre fazer de srra desqraça t:xtr:rna.
1

No entanto, te ilrn(i, arlr.ir ri.r.trrte: r;r.rrro cstás


porLlue de tr srl alirnunlit Ír)(rlrc()Í.1Çãt.r r1e prtt_,1a
Nr]orreu Velasco lb,arra
que não perdeu a os[)É]ranr:;r rir: ie ver soberarrrr pois que morrer não devia.
não c:r.,rrto rlrr rlrisJrril;t, rTlas (,()ÍTt() uÍn astr(l riissiJ.rarl,r
com o Íísico deteriorado
de rrr.rttcs rlt.- nrarrs ;trcsságt()s e ress()anlt: rJe hrrtos. e a mente mais sã que a minha.
Brasil, ressllgÉ) da mentória de teus heróis
Oue Ouito, que o Equador,
e da íó de tr:trs rnár tires rie olhos de r,'irrza,
chorem a rqorte de seu filho
que outro Íilho igual não tinha,
tão caro à Pátria e ao Povo
nesse Contittente Novo

N/lorreu Velasco, e morreu


pouco antes na Arqenfina
(que a Pátria de San IVartírr
de rnorte está encharcada).
N/lorreu Argentina Corina
Del Plata, sua mulher,
a quem Velasco dissera
da sua vida por ela.

lVlorreuo velho políticc.r


o lÍder do "Velasquisnto"
N4orreu a Pátria com ele
e o poder do dispotismo.

44 45
N/orreu Velasco lbarra N/orreu Velascr-l lbarra,
o enigma do paradígma.
não Íoi o chacal da Espanhre
ou o de Pr)rluqirl que m0rreu.
4

v
Na conquista do poder
sua palavra era a espada, l\ão Íci a hiena de i.-iqanda
a tribuna - sua glória o corvo fei,to de lreva'
e o povo sua vitória. que tresanda, mai,s, a rn,OrtÉ
Embora contraditório ,que os mort, ls que elr ÊÍlr-;r rei
intolerante, arbitrário,
hllorreu Velasco lbarra
era o governo de Ouito
urn iJilarjitr. Srr"rt, r-ItríL:. rur1,.
do Equador, mandatário. r rão i.r lr i :r..;.nr dil rtí)r iti

Salve, p-rors, Vei,§c.r iha' r,a


o detentor. c}o porlirr-,
5
regressou de oiovo à, i-aIr-r,a

Pra rned'i [a,r' ,' rR,O1'],eÍ


Ouem morreu? - Velasco lbarra
um homem só por inteiro.
Não Íoi Fulgêncio Batista
I
um escroque a mais que morreu.
Ouem morreu? - Velasco lbarra
um homem por derradeiro,
advogado, político,
legislador, iornalista.

N/lorreu Velasco lbarra.


É verdade, si m, morreu
aos seus 86 anos
o exílio também sofreu

46
47
CARICATURA DE CHARLIE CHAPLIN E depois nos encontramos em qualquer parte do mundo,
arrastamos nossos sapatos de corda, serltamos
na calçada de um botequim, e pedimos ao homem do povo
Para rrós és o Carlitos, o Charlie Chaplin, diluído em porção que toque seu realejo, conte a sua histÓria,
dervinho, sal e metileno. enquanto cofiamos o blgode e consertarnos Ílôssos sapatos
O comediante diáfano, entre o cristal que atravessa o bigode solidários.
e o peito luzidio, onde nunca faltou um falso buquê de
orqu ídeas atraentes.
O fidalgo (o Monsieux Verdoux), o cavalheiro e o bandido
número um
que cumpri menta uma mulher tendo na mesma mão enluvada
um par de brincos de ouro e um punhal recamado de prata.
Na plástica de teus dedos recobertos de aneis e no colete
hermetica men te fechado
conduzes o segredo feminino e a fraude.
Por isso as mulheres te confundem entre documentos Íalsos
e ciúmes.
Com um olhar diagonal adquires o amor. O carinho minucioso
brinca na ponta dos dedos elegantes.
Enquanto furtas um beijo salta de um seio um cheque que
o prendes entre teus olhos ilacrimáveis.
E há sempre nesse oportuno momento um bobo atrás da porta
que escuta enlevado uma melodia.
Ô Carlitost Um so gosto dos teus vale a pena cruzar as pernas
e atirar para cima o cigarro há pouco iniciado.
Basta o de como caminhas entre bêbedos, nos balcões dos
bares, jogando tua suave bengala.
Já não falo dos requintes nos salões; ninguém como tu
sabe beijar a mão de uma mulher com drinque tão singular.
Ninguém como Iu faz côcegas atrás da orelha do marido
com tamanho disfarce.
Meu amigo Carlitos, ó meu Poeta, o galã inconfundível dos bulevares.
Subo contigo assoviando nos elevadores e deslizamos na valsa em
salão de gala com mulheres belas e fáceis.

N 4€
O ANDARILHO

C andarilho sai pelo longo carninho sem horizonte e sem Pátria,


cOJll Ilrl'i sÓ gifibutO r1O sangue a r:irr,uiat n() ri,r'Fl() rt,terrrr
mals veloz {lLlts rli'i ;lstru (,rrais t.rrrul clue um lollíjtl
corno seir ar r lc r;r,:rrrlr t()rrnento e irnertso desassossego
C anrlarill-ro é urn,;rrlt() qLle czrrlinha sir, corl o tí.)rso dos pés,
s riíTt si'r Ollro O ol rlf () ceÍlou c.levrclr.r aO 6-tt-i rlas distánr:iaS
(il"u das estrelas). Exaiamente corno o lr.ruco ele camrítha
sern se deter, agitando seus trapos desbotados.
O anclarilirl sai 6iel,t trrorta dos Íundos corlo o cão rJe Latarr ,

rlesgraçadt.r Ê st) rrconlpanhilnclo seu r.1r-,nr..r


ambos rnistr;ir,icrs ir larnbcr as srtr;re_cões virtrrosas das Íercias
-- úlceras de venerrosos pistilos -- 4a. PARTE
de onde a abellra suqál o mel e o coiil-.rr ccrrn suas asas eprlétir:a-s
de f risos rie ouro POEMAS SOMBRIOS
paira el)trl as partículas do ilr e eslrc,r o atluilino brco no bel ;ct
qrre ler'e rrlars que r.' rit Jrrdas e o itc:dLriadrr punhal cJo sercr
da,rmarttt; . .

O arrrlanllrct r:aminlta so. sern Páti ra e seflt i]rnul


E po, ortde ole prassa a Jl,,str se rer)(),.,, e ar:errcJt-. srras impiecJOsas
f oÇui'ir a:,
onde,rS ril.]ttires se alrranrem l,,,lrfu,rrrstÜ,r SUa fe
CLIIOS Çl'rloS de lr0trrtr ailraclarn aO T, ,, lo-Pr;cjt)rO:,at
ComO OS Caflt()S d€'Litr: hir,tl or i írcr ltim.j SenSUal de iLrnil flg,
que Se abr*'no Éclerr e em Íecrrndr, gliÀni;trt Se Élntreqa
ac) seu ar-Íror, (ltre. mai5 í.11 rlLrt ,r t,ui,nít arde l rncr:ndeia o
f rrma men Io

50
... Ai de mim!
Todas as coisas que nasceram, só nasceram pâra morrer
E a carne é uma erva que a morte ceifará.

- Byron. Childe Harold.


RUA DA IMPERATRIZ

Todas as pontes do Recife atravessadas no meu peito.


1l
A rua da lmperatriz é minha mãe e irmã.
As palavras se escondem em horizontes dif íceis
onde desceram estranhos e misteriosos crepúsculos
e surgiram plenilúnios de sonhos e martírios.
O poema se estende na noite inesperada
onde o poeta existiu em substância de cera
e gemeu enlsilêncio de solidões marinhas
o amor que em sal e tédio a morte converteu.
Sem sentido lrazer dentro d'alma esta rua
- rua da lmperatriz __ dif ícil em meus redutos
em cada Íace sangrando uma dor inusitacla
dor de mim mesmo e de ti, na face do impossível.

65
CHUVA E MELANCOLIA
MÃOS INESOUECiVTIS

Ela Íoi como um luar entrê as noites sombrias .


Sobre as sepulturas a chuva silenciosamente caindo
Moacir de Almeida
na memória de tuas mãos brancas como a neve.
À memória de minha irmã Gercy
Nunca morreste, minha irmã, dormes apenas
em secreto silêncio de veludo
de tua alcova, onde a morte estigmatizada
As mãos de minha irrnã eram belíssimas
se escondia por trás de um Cristo oprobioso.
mãos de lírios e de neve. N/lãos pc-rderosas
Nunca morreste, minha irmã, dormes tranqüila
as mãos do luar alvissareiras
no âmago da terra. Carregada perfumadas de algas e de rosas.
de raízes e húmus fecundantes
de vidas, que te levam a novos rumos.
alvissirras de lepida canclri ra
asas de anjo imaculadas
um aroma de palmeiras
pelos brumados seios inoceptes.

, suÉrs rnãos rliziarl adetrses


rindo com doçura inigualável
Íorma cJos cabelos esparqidos.

nca rnais ver-lhe-ei as mãos aladas.


claras, tão meigas, tão qr-rer ídas,
enciosas como as madruqadas.

68
57
OUEM SOLUÇA NA CHUVA? O TEMPO PASSA, O TEMPO PASSA

Ruído nos telhados ou no chão como quem chora. O tempo () lorlpo passa, não tenha pressa'
[)ilssi],
Lamento a gue ninguém escuta como o do morto afogacJo. Deixe o (ltl() lorIl tlt: Íater hoje para amanhã'
Pranto perdido no ar que talvez ache abrrgc-r O de arratthã llara rJePois'
no corpo do fantasma ou no escárnio da caveira. O de depois llara sempre'
Nem urna asa agasalha esse soluço inclemente Porque o l(lrlllx) não lhe servirá para nada'
sob a chuva que cai com seu hálito de fumo e peso de resina. Como a goteira ele pinga' Vasa' Acumula' Escorre'
Para depois perder-se, aquilo que, com tanta
paciência
Este gemido é o de uma alma sem alento.
Coração sem amor morto em sua vida. e cuidado se iuntou'
Levanto-me. É um espectro. Espio-lhe os olhos rle cr'tmplice Portanto, esqueÇa tudo,'como se morto estivesse'
Sonho. Arnor. llusão. Glória' A Pátria não
lhe
fu ror
e não tenho coragem de arrastá-io para meus aposentos. servem para nada.
O espectro insiste em forçar a vidraça da lanela Até a beleza (coisa estranha!) como a ferida do beiio
com suas mãos sem dedos, sem palrl)a, sent c()r. deixará em seu rosto a cicatriz de sua peçonha'
* Entra, decido-me por dar ab,rii;o a esta alnra r.lesgraçada. O tempo passa(solidão), caminhe só e sossegado'
Sem dor, como o Íantasma, ou como se
realmente
E reconheço-me, pleno e fiel, na soiidãcl exlrern.r cle meu
quarto. morto estivesse.
Caminhe sem pressa (e desamparado) r:omo
o cego à
berra do abismo
de cada dia que passa, sempre o mesmo e escuro
em

sua retina.

59
58
rDtiro ANGOISSE

Venho da casa de minha namorada Tenho o meu antro. lntegro-me e dissolvo-me.


ela tem 13 anos e eu 55. Ninguém me encontra ao seu lado,rnem Íico ao lado de alguém
Não obstante - ela diz - a idade não importa nem mesmo quando aí me encontro.
o tempo, como uma bola de vento, se desfaz com um sopro. No antro às vezes me identifico, mas logo me disperso.
Eu gostaria que ela dissesse isso, mas sou eu que o digo. Não me interrogo (pourquoi? )
13 anos! meu Deusl ela não percebe a profundidade do abismo na minha solidão de nervos e raízes
onde a águia faz seu vôo e o abutre choca sua ninhada (parce que 'je ne suis pas moi même)
fedorenta. Fora do antro rne desabito - ostra inexorável
lVas, o amor, não foi feito
para a felicidade do coração humano decepado e indi., Ível, rjeclino e me elnvrr
nem da alma, mas para a saúde do corpo. apalpo o corpo - invólucro clirrturrrtr
O corpo - esse animal de muito sangue nas artérias, rlalrJita cornposiçãrr iJc sal e carbLrreto.
muito desejo na carne, no centro dos ossos e nos nervos.

60 61
SATÃ O FANTASMA

Satã, eu nunca tive um lar que não fosse impuro. Para mim e para o fantasma não existe o sol.
Tu, a todos bafejaste com teu hálito de vinho podre, Só a chuva. A chuva. A chuva.
teu ódio ao idílio e tua inveja ao sonho. Caindo impiedosamente sobre as coisas do mundo.
Pois nunca conseguiste, o velhaco mercador de bruxas Fechando, com seu halo frio, a vegetaÇão dos pensamentos.
domínio sobre meus áureos pensamentos Escura. Negra. Terrível. Abissal.
que não se nutrem de lama podre como os vermes Há, ainda, a ventania, mais fria que o corpo do fantasma
mas do fulgor mais alto das estrelas. que se levanta da noite espectral e caminha solitário
Sim, em verdade, meus lares desÍizeste. nos vastos campos molhados ou fugindo pelas esquinàs das ruas
Entanto, a alma que anima essa matéria vulgar com grande desespero.
é mais forte gue tuas artimanhas, Porque ele nos evita, porque preÍere estar sempre só, não sabemos.
e jamais terás sobre ela o menor domínio Pode ser um de nós despido de nossos próprios elementos,
pois à nossa aliança não esteve presente o arco-íris. esse ser desconhecido e amargo.
Como tu mentes, ó velhaco embusteiro O certo é que ele caminha na_chuva, na noite, e até das estrelas
tens mais piolhos no corpo que nas tranÇas de treva se esconde.
de tua cabeleira. Prefere o cemitério, o refúgio dos mortos, o silêncio pesado
da paz absoluta (e eterna) das campas de mármore,
onde por um instante cisma
no sentido profundo de sua vida imaterial,
tão paralela em tudo à nossa propria vida.
Se é que não somos ele mesmo;se é que ele não é cada um de nós
que nos evadimos para além de nossas muralhas.
Oh, fantasma!, dá-me essa mão sem falange e sem tato
e guia-me a teu secreto esconderijo.
E hás de ver, que amigo encontraste, entre a espécie humana
capaz de compreender tua dor e tua solidão.

62 GI
DOR/TRISTÊZA A ESTRELA PURA
(Poema levantado no consultório do
po€ta Caetano Ximenes Aragão).
À memória de minha mãe
Íúaria do Carmo Pinto.

O Poeta Como as aves e as águas os horizontes escorrem


(Oue também é doutor) silêncios Írios, arrepios, silêncios mortos,
(silêncios talvez remotos)
Tia, prima, irmã ou neta dos mortos familiares e amigos ainda insepultos.
(não importa o parentesco) É que tudo vem da claridatJe sem luz
que o feto hoje é partícula e do mistério de teu olhar agora fechado
de pó, de sal, carbureto, à beleza do mundo e ac-r sonho, ó minha l\rlãe!
e o átomo que desintegra Paiavra leve e triste c()mo o queixurne rJe Lrm pássaro Íericlo.
é igual ao do amuleto. Eu sou o f ilho e o Poeta clue morreu coÍtligo
embora ainda me veja a caminhar sem destirto
A Cliente Na laboriosa ilusão de viver, para quê?
(Suposta tia)
Se os dias vão consumindo nossa vida como os relógios. . .

ÍVrnha hora é a hora da r:strela pura da tarde


Pois tio, primo, parente, que pálida se íixa sobre a ciriade dos rnortos
irmão esquerdo de lado: .
e de sua torre rnais alta vigia os rnonrlrnentos
Doutor que a sina bem disse de cruzes e mármores (lue os tempos eterrrizam.
pra cura dos desgraçados. l E vê-la é ver-te, em teus silêncios, oh, mlnha mãe!
Aqui estou duas horas Descencjo anônima para o âmago mineral da terra
à espera de vosso amparo. ontje os irúmus e as raízes te r:nvr.rlverãr-r
ern seus lençórs de sclrnbras e de podres líquens.
O Poeta Mas eterna e Íestiva como a aurora desponlas
(Oue também é doutor) no coração de teu f ilho, no coração do Poeta,
que sabe cântar hinos de louvor, cantos rje qloria e de paz
Tu mulher, tia, parenta âo srJ[)r'í:)rrí) r:riador cJo urlverso e à eslrela pura.
de um lado so, renegada:
que males soÍres, que sentes
com esse ar de assombrada?
Por acaso alguém morreu
na cruz do Cristo exalçado?

il õ
A Cliente Tia, prima, irmã ou neta
(Suposta tia)
de um lado só renegada.
não sei de droga que a cure
[\rlorreu, sim; morreu José. não sei do sabrer mais nada.
Era o Íilho mais querirlo. Não sou doutor de ciência
[/e cure da dor/tlsteza não vou Írazêla enganada.
(e a forma por ter morrido
me deixa desesperada.
ah, por que não rlorri contiqo!)

O Doutor
(Oue também é poeta)

Não há cura pra tristeza


não há remédio que a afaste
Reze pra Nossa Senhora
peÇa a Divina Trindade,
entregue a Deus srra sina
que é obra da eternidade.

A Cliente
(Suposta tia)

Já li a Bíblia três vezcs


já sei de cor Jerernias.
Já li os [-ivros dos Reis
[Vlacabeus e [Vlalaquias.
Já ti Davi, Satornão,
sei todas as ProÍecias.

O Doutor
(Oue também é Jroetar)

66
67
CANTATA PARA DR. LUIS EDUARDO em alta torre nevada,
que rei cruel de Castela
opôs-se aos amores dela
Teu gesto calmo e oculto
no silêncio de teus passos. Nem gênio nem Íada amiga
E o espaÇo que o corpo ocupa sabe mais onde ela mora.
na dimensão de teus braços. Nem feiticeiro adivinha
Teu pensamento adstrito o príncipe por quem ela chora
ao fado, persegue o mito. So o rei, e seu vigia,
que a pastora noite e dia.
A solidão não te oprime
nem quebra teu ritmo incerto, Por isso teu canto é hLrmilcie
que se faz pelos caminhos teu pensamento mais v.tslu.
dos longes, porém mais perto Como o vento arranca às nr.tvtlrrs
da verdade de teu dla aqui/ali um pedaco.
repleto de poesia. Tu. ao amor não condetritÍ;
as leis. que o destino ordena.
Em pacientes estudos
procuras a teoria Tu, que a lira de Orfeu
que melhor te fale ao íntimo empunhas com grande espanto,
da alta filosofia que sendo poeta sabes
da renúncia de viver das N/lusas o saudoso canto.
sem se exaltar com o saber. lVelhor que 1u tlttent ensirta
as regras da tVedicina?
E assim vais passando o temPo
(e o tempo não Passa leve) [Vlelhor fazes, que a alnta
entre a ventura e o infortúnio abres à desgraça allr*'ia
toda vida é curta e breve. Oue a vida não vale a palma
IVais vale sonhar com o otlro da mão fechada dr-' areia.
de cobiçado tesouro. Bem sabes que a gloria é um gritcr
que se perrJe no inÍinito.
[/lais vale o sombrio encanto
de uma princesa encantada,
encerrada no seu pranto

69
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JOSÉ ALCIDES PTNTO BREVE ROMANCE DO CAVALEIRO
E POETA JOSÉ ALCIDES PINTO
MENSAGEIRO DO REINO DE LÚCIFER
Sons de Rimbaud, canções de Lautréamont
ressoam nos teus gestos vertebrrais.
'Cantas O Enigma e As Aguas Novas com 1. Previsão do Tempo lnterior
o mesmo amor que cantas Satanás,
velho albatroz a que falece o dom És louco.
de habitar as alturas siderais. Completamente louco.
Levas nas mãos a Estrela Vespertina Pastor de palavras apascentas
para Os Verdes Abutres da Colina. a inexlstência das cousas
e teces l

Francisco Carvalho. Perfis - XXIV a nudez rla paz er das cancõr:s


És louco.
Do chão te alças
e podes colher pêssegos
no Íinal das valsas.
Tão louco que não te ergtres
quando Deus é chegado.
E sobes as monlanhas
embriagado.
Arrancas dos pássaros
as penas.
E em estado tle sono
crias
helespontos e poemas.
Sirn, és louco.
Danças
inteiramente nu sob as estrelas.
E quando acabas tenlas escondê-las
num verso teu.
Um dia, enquanto dançavas, perguntaste
"Oue Íere mais?

70 71
Um punhal ou uma noiva amarraste o teu barco à porta de uma igreja e entraste,
morta? " vociferando, para brigar com Deus. Aprisionado pelos
E todos ficaram perturbados. hebreus, explicaste que vinhas dos abismos. Então te
Em seguida ahriste tua porla deram vinhos e viandas. E levaram-te a olhar de suas
e assaste num espeto varandas. E te mostraram a cidade. E gargalhaste até
os crocodilos sagrados. as primeiras horas da eternidade.
A seguir, convolaste núpcias. E estavas bêbado. E a
musa implorou qLre a libertasses do verso. E a lançaste
2. Notícia do Navegante ao espaÇo. E a ferlste com uma flecha. E com um ges-
to súbito colhesteborboletas para o teu repasto.
oh, a poesia nascendo de teus dedos Dou meu testemunho. Vi quando agrediste os convi-
qual leite a brotar de rochas flameyantest dados com uma'taça e depois partiste para beber o
A tua Íé te salvou. E foste mel das madrugadas. Ao regressar, trazias, sobre os
andando sobre o tempo e a esperanÇa. cabelos banhados de ouro, a llha dos Patrupachas.
Í\rlas entre gestos de amor e de esquivanÇa
permaneces no exílio.
E guias caravanas nos desertos. 4. Canto e Partida
Armas guerrilhas sob céus abertos.
Assaltas aldeias. Foges a pé. Sim, és louco. Tão louco
Roubas o leite das cabras do Tibet. que és poeta. Cantas
E páras para saudar o Unicôrnio. os abutres, os gatos, os morcegos,
F desvias o Trópicc.r de Câncer os meninos sepultados sem mortalhas,
E eapricórnio. as prostitutas rnortas a navalhas,
lVlas urn dia clroraste os jogadores de xadrez e os rios.
sobre os muros rJe tua solidão Celebrras em teu verso
quancio rtrn rnenino ceg(.) beijt-rn os anjos, os homens e o Rei,
a tua mão. os canários, os velhos cemitérios
e as portas por onde passarei.
Um dia, com Willy lVompou tu me deixaste
3. Da Prisão e Fuga do !*üoviço e depois gritaste
para tuas namoradas:
És louco. Teus amigos são cavalos alados e dragões "Eu sou aquele
dormindo nas areias. São elÍos, são faúnos, são cen- que come as flores do aniversário!"
tauros. São sílÍirles, gnomos e sereias. Um dia, Então usaste túnicas

72 73
vermelhas. dos homens.
E brilhaste na tua solidão. E sô tu sabes o segredo
E partiste num camelo das navegações. E lês
para a Constelação do Cão nas estrelas a sorte dos que partem.
Plantas rosas nos versos, mas teimas
em colher somente girassóis.
5. Primeira Denunciação lVlontas teu elefante e vais
refazer a tua solidão.
Não sei quando se deu teu encontro com Lúcifer. E quanto ficaste rouco de gritar
lVas é certo que o domesticaste. E o tens na palma para a noiva sozinha na outra margem?
de tua mão. E ele te adora. Tem medo de ti, que Ouantas vezes te acharam desmaiado
podes destruí-lo. l\4as aí tudo seria escrito novamente. sob a paz das auroras e dos montes?
E o Cristo não mais chegaria. E as profecias cairiam
como lágrimas no chão. Por isso, serei obrigado a re-
velar que estás aqui. l-lá muito te procuram. Ouerem 7. Segunda Denunciação
o Canto de Paz que escondeste. E as barcaças que
nunca regressaram. E todos te esperamos. Cremos na És louco. Fugitivo. Andarilho.
tua palavra. Na verdade ainda oculta no verso que Salteador. tVágico. Navegante.
reténs. E no amor que deixaste em cima dos rochedos. Volatim. Jogral. HieroÍante.
Um menino em seu sonho
eis o que és.
6. De Como o Herói Conduz a Esperança Se te puserem num circo
domarás as feras.
Ô solitário pastort Se te largarem na noite
Lanças pedras aos lobos descerás ao inÍerno.
mas te calas Se te soltarem no tempo
pâra ver uma flor. encontrarás num instante
E sabes o endereço o Santo Gral oculto numa Íonte'
das ruas da infância e dos rios Perturbas as nações e ameaÇas
onde moças despiam-sg e nadavam a ordem nos exércitos.
ante o olhar das aves e serpentes. És um vândalo
Escondes as naus em gue vamos partir destruindo o manto dos heróis'
para surpreender os peixes flamejantes Difícil te seguir.
que serão servidos na última ceia Em cada porto soltas a elegia

74 75
e tiras do teu bolso o verbo reflorir. 9. Da Preparação do EPitáfio
E muítos te amam. Seguem-te sorrindo.
lVlas os enganas. E acabas Bem sei : não te conformas com o Pouco
negociando com ladrões. de todos os homens. E bruscas o poema.
E quando eles partern, ris. E tendo em tuas mãos o papel e a pena
Em teu alforje refazes a vida. E nunca está perdida
ficaram salvas as canções. em ti a canção.
Habitas tua sombra e permaneces fiel.
E podes fugir no dorso de um verso.
B. Terceira e Ultima Denunciação Ouanto ao mais é ir vivendo.
E restaurando com amor
Há muito te conheço. Vi-te a dançar com Lúcifer - o o áspero chão. l

anjo negro - (o lírio da revolta). Vi-te a comer cande-


labros nos templos e a soltar gafanlrotos sobre planta-
ções. Vi-te a criar escorpiões e a rasgar de repente as 10. Alegoria
flâmulas de guerra. E com elas enxugavas a face dos
mortos. E desÍazias núpcias e ventos. E soltavas leões Enquanto aguardarr.tos, as nuvens
em acampamentos. E desaÍiavas o teu Bei. E livravas caem sobre ti. E rnorres.
navios das amarras. Transformavas ataúdes em guitar- E penetras feliz rro Feino de Ltjciter
ras. E mandavas que os leprosos saíssem-das cavernas. onde jovens riernônios mastigarrt ern silêncio
Sim, já te conheco. E sabem quem tu és osAnjos, os suas próprias lrevas.
Arcanjos, os Tronos e as Dominações. As tribos anti-
gas e as vastas legiões também te conhecem. Contaste
histórias a príncipes enfermos. Amaste as escravas no Arrur Eduardo Benevides - O Viaiant€ da Solidão,
escuro das tendas. E acompanhaste o povo em mil
rebeliões. Depois suspiravas ao pé de tua Aniada. E-
ajudavas a erguer as novas cídadelas. N/as, à noi1e, nas
janelas, eras trovador. E cantavas então toda a rlágoa
do amor.

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T

OS AMANTES.
t A PEOUENA VARREDORA.
ORÃCULO DE DELFOS.
CANTO SOLITARIO.
CARICATURA DE CHARLIE CHAPLIN.
CHUVA E MELANCOLIA.
O ANDARILHO.
A MISÉRIA PODEROSA.
POR TACITO: POESIA.
MÃOS INESOUECIVEIS.
IDiLIO.
O TEMPO PASSA... O TEMPO PASSA
ouEM soLUÇA NA CHUVA?
A ESTRELA PURA.
ANGOISSE. .

SATÃ.
***

Sons dE Rimbaud, canções de Lautréamont


ressoam nos teus g€stos vsrtobrai§.
Cantas O Enigma e Ar Águar Nover com
o mesmo amor que cantas Satanás.

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