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CAPÍTULO 1

O SURGIMENTO DA PSICOLOGIA:
BREVE HISTÓRICO
Jussara Moreira Pilão

introdução

o tema aqui contemplado não é novo. Muitos outros pes-


quisadores já o apresentaram, trazendo diferentes formas de
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compreensão sobre o assunto, alguns gerando polêmicas que vi-


vificam o estudo.
No entanto, acreditamos que a retomada do tema tem valor
pela interveniência de outro sujeito-reflexivo além do contexto
em que situa esse novo estudo, pelas suas formas peculiares de
elaborar e reelaborar um conhecimento.
Se o que está acontecendo hoje no campo da psicologia é
uma construção a partir do que aconteceu no passado – e é
crível essa hipótese – nada mais coerente do que se fazer uma
reflexão histórica e entender quais as relações dessa ciência
com a Educação.
É sabido que muitos pesquisadores escolhem variadas
linhas de estudo: só para se ter uma ideia, alguns seguem a li-
nha behaviorista ou, ao contrário, dedicam-se a estudar as fun-
ções cognitivistas em meio a tantas outras vertentes. o único
ponto em comum, que é consenso entre os estudiosos, é, sem
dúvida, o da constituição histórica do conhecimento a que
se dedica aprofundar. Concordamos com Schultz e Schultz
(2011, p. 2), quando afirmam que “a única linha de trabalho
que une essas áreas e esses tratamentos distintos para formar
um contexto coerente é a história, ou seja, a evolução da psi-
cologia ao longo do tempo (...)”.

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Jussara Moreira Pilão

Assim, o entendimento da Psicologia em nossos dias passa


pelo entendimento de sua história. As atuais tendências, os con-
flitos, as contribuições, os dilemas e as perspectivas futuras são
importantes para contextualizar uma área do conhecimento.
Portanto, a evolução dos estudos em Psicologia está relacio-
nada à evolução mais geral das sociedades humanas, em sua di-
namicidade e heterogeneidade, ou seja, na própria situação de
constante movimento.
Quanto ao ensino, baseia-se no fato de que um processo de
formação – seja ele em Psicologia ou não – ocorre geralmente
de acordo com a concepção que se tem sobre a área do conhe-
cimento que se propõe estudar e ensinar; aprender e apreender.
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Essas concepções têm a ver com modos de vida em cada tempo


e espaço, gerando princípios filosóficos, éticos e metodológicos
que orientam teorias científicas e práticas profissionais.
Então, uma retrospectiva histórica das principais contribui-
ções da Psicologia pode auxiliar na compreensão das suas rela-
ções com a Educação, uma vez que o entendimento da Psicologia
passa necessariamente pela sua constituição em um determinado
contexto histórico.
Ainda que sintética, a relevância da retrospectiva histórica
pode ser atribuída, entre outros fatores, à importância da cons-
ciência histórica sobre as explicações dos comportamentos hu-
manos que inúmeros estudiosos (sejam filósofos, psicólogos ou
educadores) atribuíram ou atribuem a uma ciência.
Muitas escolas de pensamento desenvolveram-se ao longo da
história da Psicologia. Cada uma delas surgiu em contextos espe-
cíficos, com maneiras diferenciadas de conceber seu objeto. Mas
não se pode deixar de considerar que uma nova forma de pensar
acaba por utilizar a anterior como modelo, como base, seja para
dar-lhe continuidade, seja para contrapô-la.

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Psicologia da Educação: Múltiplas Abordagens

1. Aspectos históricos da constitui-


ção da Psicologia como área de co-
nhecimento

No que se refere à Psicologia, vamos dividir seus estudos


em dois grandes momentos: o primeiro trata de uma Psicolo-
gia ainda subliminar, que necessita de interpretação pessoal que
denominamos de pré-científica; o segundo aborda os estudos e
pesquisas da área que chamamos de Psicologia científica.
Já na Grécia Antiga, existiam textos que sinalizavam uma
Psicologia, e aspectos desse estudo também aparecem durante a
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Idade Média e o Renascimento (SCHULTZ; SCHULTZ, 2011;


PALMER, 2005; BROZEK; MASSINI, 1998; GOODWIN,
2005). Desse modo, embora a Psicologia tenha iniciado sua ca-
minhada verdadeiramente científica somente em fins do século
XIX, não é errado afirmar que ela pode (e deve) ser observada
desde a Antiguidade, a partir de formas específicas de se pensar
o homem em sua relação com o mundo e com o conhecimento:
porque indagações a respeito de suas atitudes, seus pensamentos
ou sentimentos estão sempre presentes nas reflexões humanas.
A Psicologia foi sendo produzida ao longo dos séculos, in-
tegrada a outras áreas do conhecimento e a interesses diversos,
muito antes de adquirir autonomia e status científicos. As preo-
cupações com as questões psicológicas não são recentes: desde a
era pré-socrática já se notavam inclinações para definir o homem
em relação ao mundo por meio de suas percepções (PALMER,
2005). Mas, nesse período, as questões presentes giravam mais
em torno da existência do mundo; os pensadores que antece-
deram Sócrates se perguntavam se o homem via um mundo já
existente. A partir de Sócrates (469-399 a.C.), autores admitem
que a Psicologia começa a ganhar consistência. A preocupação
de Sócrates nesse aspecto era com o limite entre o homem e o
animal irracional. Para ele, a principal característica do homem

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Jussara Moreira Pilão

era a razão. Via a razão como essência humana. Pode-se dizer que
é com Sócrates que têm início as teorias da consciência. Den-
tre seus postulados, o que podemos relacionar a algum indício
de preocupação com a “Psicologia da Educação” é a defesa da
maiêutica, ou seja, o “parto” das ideias (PESSANHA, 1999).
Em Sócrates, a Psicologia, a Psicologia da Educação e a Educa-
ção são inseparáveis (PILÃO, 2002). Ele legitima a Psicologia ao
afirmar “conhece-te a ti mesmo”, que é, ao mesmo tempo, a base
de uma Psicologia e um princípio pedagógico.
Segundo Platão (427-344 a.C.), a cabeça concentra a alma hu-
mana que, no entanto, era concebida por ele como separada do res-
tante do corpo e assim, para toda criança, deveria ser dado o direito
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de aprender a pensar e, para tanto, teria de participar desde cedo do


estudo sobre como alcançar as ideias (PESSANHA, 1979).
Aristóteles (284-322 a.C.), por sua vez, acreditava que a alma
e o corpo não podiam ser dissociados. Pensava que a psiché era
o princípio ativo da vida, uma vez que tudo que nasce cresce,
alimenta-se, reproduz-se e possui alma. Pode-se atribuir a ele o
primeiro estudo das diferenças entre a razão, a percepção e as
sensações. Esse estudo originou o tratado que ficou conhecido
como “De anima”. Nele, tem início uma trajetória em direção à
Psicologia com preocupações evidentes acerca da educação em
sentido mais amplo (PESSANHA, 1978).
De modo muito geral, ao serem observados os principais
pensamentos gerados na Antiguidade, é possível identificar o ho-
mem como um ser pensado abstratamente, ou seja, que ele seria
eminentemente passivo diante da complexidade do cosmo.
A Idade Média foi marcada pelo domínio da Igreja Católica.
Assim, como aborda Palmer (2005), o conhecimento em geral
estava relacionado ao conhecimento religioso. Alguns dos prin-
cipais representantes do pensamento dessa época foram Santo
Agostinho (354-430) e São Tomás de Aquino (1225-1274).
Santo Agostinho tem suas bases em Platão. Para ele, assim
como para Platão, existia estreita relação entre corpo e alma.

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Psicologia da Educação: Múltiplas Abordagens

Essa última era a manifestação divina do homem físico. A alma,


diferentemente do corpo, foi considerada por Santo Agostinho
imortal e um elo de ligação entre o homem e Deus. São Tomás
de Aquino por sua vez, adere aos conhecimentos aristotélicos.
Tinha profunda preocupação com a distinção entre a essência e a
existência. A busca da perfeição pelo homem era a própria busca
de Deus. Como um fiel religioso de seu tempo, São Tomás de
Aquino, garantia o monopólio da Igreja no estudo do psiquismo
humano (PALMER, 2005; GOODWIN, 2005).
Na Era Cristã, o homem estava subordinado a uma ordem
divina, em que a moral apresentava-se fundamentada em Deus.
Portanto, a visão de mundo, que na Antiguidade era cosmocên-
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trica, passa a ser teocêntrica, porque a verdade encontrava-se, se-


gundo os pensadores dessa época, também fora do homem – não
no cosmo, mas sim em Deus.
Para compreender o homem e educá-lo, só integrando-o
a Deus. Muitos textos desse período evidenciam essa preocu-
pação, tendo um eixo que podemos denominar teopsicológico
(FREITAS, 2002).
Mais tarde, a transição do Feudalismo para o Capitalismo
veio em decorrência de profundas transformações econômicas e
socioculturais e, dentre elas, pode-se destacar a valorização do
homem; uma nova forma de organização econômica e social; e
significativos avanços nas artes, nas tecnologias e nas ciências. Só
para ilustrar, em 1543 Copérnico postulava que a Terra não era o
centro do universo e, em 1610, Galileu demonstrava, empirica-
mente, as primeiras experiências da Física moderna. Na Filosofia,
Descartes (1596-1659) introduziu os conceitos de “reflexo” e de
“consciência” em seus tratados teóricos, considerando a existên-
cia da matéria e da alma como substâncias distintas, contrapostas
e independentes. A consciência era chamada por ele de “cogito”
e essa foi sua mais expressiva colaboração para o que se poderia
identificar como Psicologia (DESCARTES, 1999). A autocons-
ciência humana foi preocupação presente nessa área. As especula-

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Jussara Moreira Pilão

ções e os estudos sobre o homem, seu significado, seu pensamento


e seus comportamentos perpassam esse período, constituindo-se
um verdadeiro embrião para as preocupações com a subjetivida-
de humana e seus consequentes (PILÃO, 2002).
Assim, Espinoza (1632-1677) buscou, com sua obra, supe-
rar o dualismo de Descartes (corpo-alma). Para esse autor, a alma
era a ideia do corpo. Sua visão sobre o ser do homem era natu-
ralista e, dessa forma, o homem consistia em um modo finito da
substância infinita que, constantemente, está submetido às leis
da natureza. Ele afirmava que a Psicologia deveria compreender
as ações humanas; considerava que a mente era constituída de
uma associação de ideias que seguiam leis fixas, como a geome-
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tria. A Psicologia estava sob a submissão dessas leis rígidas e sob a


objetividade da matemática (DESCARTES,1999).
Vale destacar que a grande contribuição da obra de Espinoza
foi postular o monismo de duplo aspecto, em contraposição ao
dualismo interacionista de Descartes, que dará base a diferentes
concepções da Psicologia em Educação, influenciando teóricos
os mais diversos (HUENEMANN, 2010).
Sob esses referenciais, começa a ser delineada a era científica
da Psicologia. A era Moderna (ou o Renascimento) marcou uma
nova visão na qual o homem passou a ser visto como o centro do
conhecimento; como tendo amplas possibilidades de dominar a
natureza para o seu próprio benefício e fazer escolhas. A moral
estava, então, fundamentada no homem; sua visão passa a ser
antropocêntrica, negando definitivamente o pensamento aris-
totélico. A verdade encontrava-se na razão, na relação homem-
-mundo, sujeito-objeto.
Vale ressaltar que a era pré-científica da Psicologia – produto
da própria história do homem em suas relações e indagações, desde
os povos da Grécia Antiga até a Era Moderna – evidencia a grande
preocupação com a origem e o respectivo significado do homem e
com esse homem em relação ao mundo que o cerca. Essa preocu-
pação reflete-se nos estudos filosóficos, na arte, na literatura e na

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Psicologia da Educação: Múltiplas Abordagens

religião, constituindo e consolidando conhecimentos a partir do


senso comum até chegar a elaborações lógicas, articuladas e, mais
tarde, à verificação empírica (GOODWIN, 2005).
Já em meados do século XVIII, a Psicologia promove seus
primeiros ensaios científicos independentes. Mas não se pode ne-
gar que a produção da sua autonomia como ciência teve como
sustentação as ideias de filósofos que mostraram preocupação e
trataram de questões que, tipicamente, vão constituir o campo
da Psicologia e que são relacionadas à subjetividade humana ou
ao comportamento do homem em situações diversas. A transi-
toriedade entre pré-ciência e ciência perdurou até meados do
século XIX, quando a Psicologia ainda era tida como um ramo
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da filosofia, mas então já incorporando elementos de explicação


objetiva e embasada em dados externos ao homem.
Schultz e Schultz (2011), ao estudarem as origens da Psi-
cologia, mostram as várias possibilidades e dizem que foi só a
partir do século XIX, que ela se torna independente, com “(...)
métodos de pesquisa distintos e fundamentação teórica. Embora
seja verdade, como já observamos, que os filósofos (...) se preocu-
pavam com problemas que ainda hoje são de interesse geral (...)”
(SCHULTZ; SCHULTZ, 2011, p. 4). Embora de maneiras di-
versas e muito distintas das que sabemos hoje, uma vez que eram
filósofos e não psicólogos.
A Psicologia vai tornando-se científica à medida que começa
a se desprender da Filosofia e a apresentar-se como campo autô-
nomo. Dentre os fatos significativos que marcam esse momento,
podemos destacar discussões e demarcações quanto à definição
do objeto de estudo (comportamento, vida psíquica, consciên-
cia); quanto à delimitação do campo de estudo; quanto aos mé-
todos específicos de estudo; e quanto à formulação de teorias
específicas para essa classe de estudos.
Weber (1705-1778) é um desses demarcadores, explican-
do o psíquico a partir das sensações visuais e táteis. Em seus
ensaios, Herbart (1776-1841) também já procurava por leis

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Jussara Moreira Pilão

científicas da Psicologia. Seu princípio básico era a experiência


e ele tentou aplicar conhecimentos matemáticos ao estudo da
vida psíquica; teve grandes preocupações em aplicar também os
conhecimentos da Psicologia à Educação; e defendia a forma-
ção do caráter de maneira estruturada, que orientaria o com-
portamento do homem para a vida social. Segundo esse autor,
o indivíduo teria condições de construir, por si só, um caráter
sadio, equilibrado e coerente. O papel da Psicologia para ele
era, em última instância, o de apontar os meios necessários para
que os objetivos da Pedagogia fossem alcançados pela filosofia
moral (SCHULTZ; SCHULTZ, 2011).
Vale citar ainda Fechner (1832-1920), que amplia o pensa-
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mento de Weber implementando um método aos estudos dos


domínios visuais e táteis, chegando ao estudo da percepção. Pon-
to importante de seu pensamento foi a formulação da Lei de
Fechner-Weber (1860), baseada nos estudos da relação entre es-
tímulo e sensação (SCHULTZ; SCHULTZ, 2011).
Alguns estudos de suma importância contribuem, no século
XIX, para o avanço na área do conhecimento do ser humano e
provocam também a aceleração da aceitação da Psicologia como
área de conhecimento científico. Esses estudos são referentes à
Neurologia e à Neuroanatomia. Teorias sobre o sistema nervo-
so central, além de estudos sobre os mecanismos e o funciona-
mento do cérebro, foram decisivos para a comprovação de que
o pensamento, as percepções e os sentimentos humanos eram
produtos desse sistema.
Admite-se que a Psicologia Científica tenha nascido na Ale-
manha e crescido rapidamente nos Estados Unidos. Dentre os
seus principais representantes, em fins do século XIX, destacam-
-se, além de Weber e Fechner, Wilhelm Wundt, Edward B. Ti-
tchener e William James. Os dois últimos trabalharam juntos na
Universidade de Leipzig, na Alemanha, onde Wilhelm Wundt
(1832-1926) funda o primeiro laboratório psicológico para ex-
perimentos em Psicofisiologia, em 1879. Ele é considerado, por

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Psicologia da Educação: Múltiplas Abordagens

isso, o pai da Psicologia Científica (PALMER, 2005; SCHULTZ;


SCHULTZ, 2011; GOODWIN, 2005).
Em seu laboratório, Wundt desenvolve estudos sobre os fe-
nômenos mentais como correspondentes aos fenômenos orgâ-
nicos e cria um método: o introspeccionismo, que visa a explorar
a mente do indivíduo. Com seus estudos, Wundt deu um ver-
dadeiro salto na constituição da Psicologia como ciência. Para
Wundt, a Psicologia era o principal centro de interesse, e a expe-
rimentação, o método de investigação. Parece que esse autor não
mostrava preocupações com a área pedagógica, tampouco com o
desenvolvimento infantil (BRINGMANN; UNGERER, 1998).
Segundo Manacorda (2006), o primeiro pesquisador nessa
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área a se preocupar efetivamente com a área pedagógica pode ter


sido Pavlov, que realizou estudos científicos sobre os processos de
aprendizagem a partir dos reflexos condicionados.
No fim do século XIX e no início do XX, grandes progressos
ocorrem no que tange aos estudos e às descobertas na área da
Psicologia, notoriamente, na Psicologia do Desenvolvimento e
na Psicologia Infantil.
Francis Galton (1822-1911) destaca-se nesse trajeto pelas suas
estimáveis contribuições no que diz respeito aos problemas da he-
rança mental e em estudos sobre as diferenças individuais na capaci-
dade do homem. Foi com Galton que esses assuntos passaram a ser
objetos de estudo necessários na Psicologia: o que antes eram apenas
tentativas isoladas são sistematizados por Galton e, ainda, diferente-
mente de Wundt e Titchener, Galton considera esses estudos partes
integrantes da Psicologia (SCHULTZ; SCHULTZ, 2011).
Ainda de acordo com esses autores, destaca-se também Ja-
mes Mackeen Cattel (1860-1944) como fundador e estudioso
do movimento dos testes psicológicos, mensurando as diferenças
individuais, influenciando a Psicologia com o desenvolvimento e
o uso de testes mentais para medir essas diferenças.
Paralelamente, apresentam-se outros teóricos com estudos
significativos, como Granville Stanley Hall (1844-1924), um dos

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Jussara Moreira Pilão

primeiros psicólogos a dar contribuição importante à Psicologia


Educacional, pregando a crença na evolução de problemas do
desenvolvimento humano. Ele defendia a pesquisa e a necessi-
dade dela mais do que o próprio ensino, tanto que é fundador
de revistas de renome em se tratando de divulgação de estudos
e pesquisas na área da Psicologia, como o American Journal of
Psychology (SCHULTZ; SCHULTZ, 2011).
Já adentrando o século XX, cabe lembrar o papel de Binet,
Terman e Watson. Binet (1857-1911) aparece como organizador
da Psicologia Experimental e elaborador das escalas métricas para
classificar indivíduos por determinação da idade mental; Terman
(1912) acrescenta a esses estudos o conceito de quociente intelec-
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tual; e, finalmente, Watson (1878-1958) fundamenta suas desco-


bertas no conhecimento dos comportamentos humanos, uma vez
que, para ele, era impossível conhecer-se objetivamente a consciên-
cia. É dele a nova proposta aos estudos psicológicos, conhecida até
hoje como behaviorismo e que trata de conhecer o comportamento
humano, e não mais a consciência como até então. Sua proposta
tinha como objetivos centrais prever, controlar, manipular, sele-
cionar e orientar condutas para um processo adaptativo ideal do
indivíduo ao seu meio social (GOODWIN, 2005).
Historicamente pensando e de acordo com Patto (1987), todo
o desencadeamento de teorias, experimentos e modos de conceber
a Psicologia mostram como ela está voltada, teórica e praticamente
falando, para atender aos interesses dominantes da época. Isso equi-
vale a dizer que ela torna-se instrumento da sociedade capitalista,
uma vez que pretende selecionar, orientar e adaptar o indivíduo à
sociedade, visando ao aumento da produtividade. Segundo a auto-
ra, é sobre a égide do avanço do capitalismo e com o surgimento
das máquinas e das fábricas que a Psicologia vai ganhando status de
ciência. Seu perfil, no início do século XXI, está dentro desse con-
texto social com novas necessidades, conflitos, problemas, relações,
modos de vida e busca de soluções e orientações. Por isso mesmo,
ao lado da psicologia de soluções para o comportamento humano

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Psicologia da Educação: Múltiplas Abordagens

e a educação, há também uma psicologia dos dilemas, das angús-


tias e do dialeticismo no desenvolvimento humano. Mas a área da
Educação é, nesse momento, absorvida pela primeira vertente.
Dessa forma, pode-se inferir que a Psicologia surge como área
científica em um momento de grande transição nas situações hu-
manas, graças às novas realidades de trabalho e de convivência
social. De modo geral, predominou nesse período (permanece
até hoje) a interpretação de que era necessária uma ciência que
tivesse condições de diagnosticar as aptidões individuais para as
novas funções sociais que surgiam. Cabia à Psicologia a elabora-
ção de alguns instrumentos que fossem precisos para controlar
e antever as possibilidades e os limites da percepção do homem
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(FREITAS, 2002).
Conforme Freitas (2002), os primeiros conhecimentos cien-
tíficos em Psicologia da Educação devem-se aos resultados da in-
vestigação experimental da Psicologia. O enfoque dos estudos,
no início do desenvolvimento da Psicologia da Educação, deu-se
fundamentalmente na aprendizagem, nas diferenças individuais
e no desenvolvimento, fazendo parte de uma corrente conhecida
como Psicologia Objetivista.

(...) a Psicologia objetivista (...) vê a pessoa como algo que


pode ser observado e compreendido a partir de seus compor-
tamentos exteriores. Tem aí grande importância o ambiente
que a condiciona e a controla mecanicamente. A Educação,
nesse sentido, se reduz à manipulação de estímulos ambien-
tais que levam a respostas desejáveis. (FREITAS, 2002, p. 58)

De um lado, manipulação de comportamentos; de outro,


medidas das capacidades mentais, das atitudes, das aptidões,
dos interesses, etc. A psicometria começa sua construção e ga-
nha grande importância, inclusive para a afirmação da cientifi-
cidade da Psicologia.

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Jussara Moreira Pilão

Esse fato pode ser notado na tendência tecnicista que se de-


senvolve na Educação, em que os testes ganham vulto e passam
a ser utilizados para o planejamento do ensino em sala de aula.
Nessa direção, embora com outra conotação, foram de grande
importância os experimentos de Skinner que, em seus trabalhos
iniciais, via na Educação um processo de alteração de comporta-
mentos por meio de reforços.
Paralelamente à corrente objetivista, outra perspectiva que
se apresentava aos estudos de Psicologia no período foi rotulada
de Subjetivismo.

A Psicologia subjetivista, partindo da concepção de homem


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como ser autônomo e livre, não determinado pelo ambiente


social, vê como função do processo educativo a facilitação
de situações favoráveis ao desenvolvimento pleno do edu-
cando, baseado em suas tendências e predisposições natu-
rais. (FREITAS, 2002, p. 61-2)

Dessa forma, podemos dizer que as correntes subjetivistas en-


caram a possibilidade do conhecimento como anterior à experiên-
cia. O sujeito que conhece é visto em si mesmo, e não no contexto
social, sendo ele o fator decisivo e primordial para a concepção
daquilo que conhece ou quer conhecer. Kant (1724-1804) inves-
tigou a razão no conhecimento humano e acreditava que as ideias
situavam-se na consciência individual. Segundo ele, esse conhe-
cimento ocorre pela sensibilidade em que os objetos são dados e
pelo entendimento com que os objetos são pensados. Esses dois
elementos unem-se e dão ao sujeito a possibilidade de uma cons-
trução individual de conhecimento que, em última instância, está
no sujeito, e não na realidade em si (PALMER, 2005).
Cabe lembrar, ainda na fase pioneira do estabelecimento
da Psicologia como área de ciência, a contribuição de Frans
Brentano (1838-1917). É dele a proposta de um estudo do ato
mental e da noção de intenção. Suas pesquisas centravam-se no
fato de que era preciso diferenciar fenômenos físicos de fenô-

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Psicologia da Educação: Múltiplas Abordagens

menos psíquicos, o que demarca diferencialmente o campo da


Psicologia. Husserl (1859-1938), tendo como ponto de partida
os trabalhos de Brentano, vem acrescentar forças à valorização
do estudo da consciência. É com ele que nasce a corrente fe-
nomenológica existencial que terá longo curso na Psicologia
(SCHULTZ; SCHULTZ, 2011).
Como se pode perceber, a Psicologia constrói-se em dife-
rentes perspectivas, coexistindo, com dominância de uma ou
outra vertente, na dependência do contexto. A busca de uma
definição sobre o objeto da Psicologia veio, pois, oscilando en-
tre bases iminentemente filosóficas com métodos interpretati-
vos e bases científicas calcadas em métodos explicativos, como
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nas ciências naturais.


É por volta de 1910 que teorias com grandes proximidades à
Psicologia da Educação começam despontar, como a psicologia
da Gestalt, tendo como referenciais os estudos de Köffka (1886-
1941), Wertheimer (1880-1943) e Köhler (1887-1967). Essas
propostas acentuam o valor do sujeito, realçando sua natureza
individual. É importante ressaltar que os gestaltistas considera-
vam e reconheciam a experiência imediata; eles também estabele-
ciam relações dessa experiência com a natureza física e biológica e
contexto sociocultural (SCHULTZ; SCHULTZ, 2011).
Trabalhos surgem contrapondo-se ao mecanicismo associa-
cionista, “(...) opondo-se à manipulação da psicologia da conduta
e ao atomismo psicológico das mensurações de aptidões, impôs-se
na psicologia uma linha humanista” (FREITAS, 2002, p. 61).
Nessa perspectiva, já em meados do século XX, grande im-
pacto é trazido para a Psicologia e para a Psicologia da Educação
pela obra de Carl Rogers (1902-1987), graças à sua teoria da per-
sonalidade que considera o indivíduo como centro do processo
educativo e esse era, segundo Rogers, um recurso facilitador de
autorrealização. Essas ideias originaram-se de sua peculiar pro-
posta de compreensão dos homens, de suas personalidades e de
sua terapia (AUSUBEL; NOVAK; HANESIAN, 1980).

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Jussara Moreira Pilão

Na esteira do desenvolvimento dos estudos sobre as apren-


dizagens humanas, surge a Psicologia Cognitivista. Um dos
nomes mais respeitados no âmbito de pesquisas e relações en-
tre cognição e ensino nesse período, é David Ausubel. Sua
teoria está baseada na aprendizagem significativa, ou seja,
naquela que parte da compreensão e contrapõe-se ao ato de
decorar. Diz Ausubel:

Se eu tivesse que reduzir toda a psicologia educacional a um


único princípio, diria que o fator isolado mais importante
que influencia a aprendizagem é aquilo que o aprendiz já
conhece. Descubra o que ele sabe e baseie nisso os seus ensi-
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namentos. (AUSUBEL; NOVAK; HANESIAN, 1980, p. 8)

Nessa vertente, ao lado de Ausubel, Jerome Bruner é também


nome de destaque. Sua contribuição foi a de construir e estabele-
cer estágios definidos até chegar aos processos ditos maduros ou
adultos. No primeiro, o pensamento está baseado meramente nas
ações e é conhecido como atuante; no segundo, o uso das imagens
passa a ser bastante comum e é conhecido como icônico; o terceiro
inclui a linguagem e toda a sua complexidade e é o estágio sim-
bólico. De acordo com Bruner, o homem desenvolve e utiliza as
características desses estágios por toda a sua existência (BRUNER,
1990). Pelo exposto, é possível inferir que tanto Ausubel quanto
Bruner trabalham no âmbito das preocupações educacionais.
Teorias mais recentes trabalham com a aprendizagem a partir
da interação que os indivíduos estabelecem com o conhecimento,
com outros indivíduos e com o mundo. As abordagens mais im-
portantes dessa nova fase são as elaboradas por Jean Piaget (1896-
1980), Lev Seminovitch Vygotsky (1896-1934) e seus seguidores.
Piaget, abordando o estudo do pensamento infantil, propõe
uma teoria baseada em como a criança forma os conceitos a par-
tir de seu pensamento (PIAGET, 1952; PIAGET; INHELDER,
1976). Segundo Piaget, a criança desenvolve padrões de pensa-

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Psicologia da Educação: Múltiplas Abordagens

mento como consequência da sua maturação, seguindo estágios


de desenvolvimento mais ou menos estáveis.
Vygotsky tem uma visão do desenvolvimento humano cal-
cado no organismo que constrói seu pensamento a partir das re-
lações que o mesmo estabelece com o meio ambiente que, por
sua vez, é histórico e social (DAVIS; OLIVEIRA, 2010). Esses
dois enfoques tiveram repercussões amplas na segunda metade
do século XX.
Podemos dizer que, até a década de 1950, resguardadas as ca-
racterísticas específicas de cada momento, atribui-se à Psicologia
a responsabilidade de encontrar os rumos da Educação. Só a par-
tir da década de 1950 percebe-se que, por mais contribuições que
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a Psicologia pudesse dar à Educação (e sabe-se que são inúmeras


e significativas em termos teóricos), na prática, os resultados al-
mejados não eram cumpridos. Muitos entraves e problemas eram
vivenciados pela Educação e a Psicologia não conseguia, por si
só, resolvê-los como se esperava.
Pelos motivos expostos e diante de várias e diferentes ver-
tentes apresentadas, pode-se afirmar que, nessa década, tem
início uma reflexão a partir das diversidades das pesquisas psi-
cológicas e suas respectivas aplicações na Educação. As difi-
culdades em se encontrar concordâncias entre os estudos até
aquele momento fazem surgir dúvidas sobre as verdadeiras e
efetivas contribuições que a ciência psicológica possa dar à
área educativa. As discussões já iniciadas na década de 1920
(Thorndike, 1874-1949), referentes à Psicologia da
Aprendizagem a partir de estudos sobre o comportamento,
intensificam-se no sentido de questionar até que ponto a psi-
cologia pode ou não contribuir para a Educação.
É por volta dos anos 1950 que temos a contribuição de ou-
tras disciplinas abalando o status da Psicologia nesse campo. Dis-
ciplinas como a Sociologia da Educação e as Teorias Políticas, en-
tre outras, surgem para questionar as responsabilidades de busca
de soluções para a Educação.

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Jussara Moreira Pilão

Crescem as críticas sobre a efetiva contribuição da Psicolo-


gia para a Educação. Paralelamente, na década de 1970, além
das preocupações anteriores – estudo das medidas das diferenças
individuais, da aprendizagem, do crescimento e do desenvolvi-
mento humanos –, busca-se entender a partir da Psicologia Cog-
nitiva, quais as aplicações para a aprendizagem. Intensificam-se
os estudos das relações entre Psicologia da Educação e Psicologia
da Instrução com enfoques na cognição (STERNBERG, 2010).
Mas, as críticas quanto às colaborações da Psicologia para a
educação não são deixadas de lado. Durante os anos 1980, “ques-
tiona-se a utilidade de grande parte da pesquisa educativa, e, no
que concerne à psicologia da educação, põe-se em dúvida sua
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capacidade para fundamentar cientificamente a arte do ensino”


(COLL, 1996, p. 11).
Pelo exposto, percebe-se que a confiança depositada na Psi-
cologia, desde o início do século XX, para a resolução de pro-
blemas da Educação, não se efetiva. Atualmente, vivencia-se um
momento de reflexão sobre os fundamentos da Psicologia da
Educação, tentando identificar alternativas ou novas possibilida-
des, novos rumos para essa ciência.
É importante destacar que essa breve retrospectiva histórica
não teve a intenção de apresentar toda a complexidade histórica
com referência ao conhecimento em Psicologia. Pretendeu-se,
somente, pontuar alguns momentos e algumas abordagens que
se destacaram – e continuam em evidência – no campo da Psico-
logia e da Psicologia da Educação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo exposto, é possível afirmar que a visão da Psicologia, em


sua trajetória histórica, precisa levar em conta a complexidade do
estudo do próprio ser humano em seu contexto histórico-social.
Mas é evidente que ela, por si só, não dá conta de responder a
todas as referentes à complexidade humana.

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Psicologia da Educação: Múltiplas Abordagens

A tarefa da Psicologia e de seus estudiosos continua. Desa-


fios não faltam. Problemas teóricos também não. O ensino dessa
disciplina situa-se neste embate e pesquisar sobre as questões que
nos são colocadas na atualidade, assim como buscar alternativas
viáveis para uma sociedade mais condizente com a nossa realida-
de histórico-social, por meio do entendimento do que ocorreu
no passado e vem ocorrendo no presente, pode ser o caminho
para os estudos e o ensino da Psicologia em nosso meio.

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