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Fibrose Quística: um olhar sobre a doença, os seus efeitos e incidência

Ana Gonçalves, Ana Teixeira, Carolina Areias, Diana Faria

Resumo
Neste trabalho propusemo-nos a investigar sobre os efeitos da Fibrose Quística
no corpo humano e a sua incidência, utilizando, para isso, documentos científicos em
suporte electrónico. Esta pesquisa levou-nos a compreender que a Fibrose Quística é a
doença genética mais prevalente na raça caucasiana, com uma esperança média de
vida entre os 42 e os 50 anos. É uma doença autossómica recessiva e multissistémica
com um vasto espetro de gravidade, provocada por uma mutação no gene da proteína
CFTR. O diagnóstico é neonatal e o tratamento é essencialmente sintomático visto que
ainda não há cura.

Palavras-chave: Fibrose Quística, mutação génica, proteína CFTR, doença.

Introdução
A Fibrose Quística é uma doença autossómica recessiva e multissistémica,
originada por mutações no gene da proteína “cystic fibrosis transmembrane regulator”
(CFTR) no braço longo do cromossoma 7 (Amorim, 2020). Selecionámos este tema
porque ficámos sensibilizadas com o caso da Constança Braddell, uma jovem
portuguesa que sofria desta doença e que teve um papel bastante ativo no apelo à
aprovação do medicamento Kaftrio em Portugal pelo Infarmed, mas que acabou por
falecer aos 24 anos. Com este trabalho pretendemos, portanto, explorar
detalhadamente aspectos relativos à doença como a sua causa, quadro clínico,
tratamento e dados estatísticos relevantes, de modo a perceber como esta afeta o
corpo humano.
Fundamentação
Originada por mutações no gene da proteína CFTR (Fig. 1) (sendo a mutação
F508del a mais prevalente), a Fibrose Quística é uma doença autossómica recessiva
(Fig. 2) que afeta vários sistemas do corpo humano, afetando com particular gravidade
o sistema respiratório. A proteína CFTR integra a membrana celular, atuando como
canal iónico para o bicarbonato e como reguladora de outros canais como o de cloro e
o de sódio. Localiza-se no epitélio respiratório, pancreático, biliar, intestinal,
reprodutivo e glândulas sudoríparas. É responsável também pela regulação do volume
de líquido das superfícies das vias respiratórias. Portanto, o defeito no gene CFTR afeta
a produção da proteína (Fig. 3), o que causa dificuldades ao transporte iónico e,
consequentemente, implicações na regulação do volume de líquido das superfícies das
vias respiratórias. Assim, o mecanismo de autolimpeza das vias aéreas torna-se menos
eficiente (Amorim, 2020).

Figura 1 – Formação da proteína CFTR (modificado de (Amorim, 2020)).

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Figura 2 – Transmissão do gene da doença (Sociedade Brasileira Pneumologia, 2019).

Figura 3 – Regulador da CFTR normal e anormal (modificado de (Michael J. Stephen, 2018)).

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Diagnóstico
Apesar de na maior parte dos casos a doença só se manifestar a partir da
adolescência ou já em idade adulta, em Portugal o rastreio é neonatal desde 2013.
Realiza-se através da pesquisa da tripsina imunorreativa (TIR) no teste do pezinho,
feito entre o 3.º e o 6.º dia de vida. Outro método de diagnóstico é o teste do suor,
que consiste em proceder à estimulação iontoforética, ou seja, à colocação de dois
discos com pilocarpina no antebraço durante cinco minutos. Posteriormente, faz-se a
recolha do suor e o doseamento do cloro. Uma prova positiva corresponde a um valor
de cloro maior que 60mmol/L, sendo que duas provas positivas indicam o diagnóstico
positivo. Também se pode proceder a um estudo genético através da pesquisa do
painel de mutações mais comuns na população em estudo e da sequenciação
completa do gene CFTR. O diagnóstico obtém-se pela identificação de duas mutações
em ambos os alelos causadores de doença (Amorim, 2020).
O diagnóstico precoce acarreta menos stress para a família do que um
diagnóstico tardio. Além disso, quando associado a um tratamento precoce, permite
reduzir as lesões pulmonares na infância, a carga de cuidados para a família e pode
aumentar a esperança de vida da pessoa (Damasceno, 2010).

Quadro Clínico
Por ser uma doença multissistémica, a Fibrose Quística afeta os vários sistemas
do corpo humano com diversificados sintomas. Ao nível do sistema respiratório,
provoca: congestão nasal; pansinusite crónica; polipose nasal; infecção pulmonar
crónica; bronquiectasias; insuficiência respiratória; hemoptises e pneumotórax.
Relativamente ao sistema digestivo, causa: insuficiência pancreática exócrina; má
absorção dos líquidos/esteatorreia; hipovitaminose; pancreatite aguda; íleo meconial
ao nascimento; obstipação; oclusão intestinal; doença de refluxo gastroesofágico;
cirrose biliar focal e, tardiamente, diabetes relacionada com a Fibrose Quística. O
sistema excretor sofre de perda de sal, desidratação e alcalose metabólica crónica. Por
fim, o sistema reprodutor é afectado por uma elevada taxa de infertilidade e, nos
homens, ausência bilateral congénita dos canais deferentes (Amorim, 2020).

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Tratamentos
Durante o período de tempo em que a causa da doença era desconhecida, o
tratamento cingia-se ao tratamento sintomático. Este visa o alívio dos sintomas
através da drenagem de secreções, antibioterapia inalada (no caso de infeção crónica),
tratamento anti-inflamatório e tratamento das exacerbações infeciosas respiratórias.
Posteriormente à descoberta da origem da Fibrose Quística, o tratamento começou a
focar-se também no suporte nutricional e na substituição das enzimas pancreáticas
das vitaminas lipossolúveis (ADEK). Procede-se ainda à terapêutica moduladora da
CFTR que consiste na terapia combinada da abertura do canal CFTR com potenciadores
da proteína e o aumento da quantidade da CFTR nas células, com recurso a corretores
da CFTR (Fig. 4). Este tipo de terapia é o tratamento mais eficaz, no entanto, quando a
doença se encontra num estado avançado, a única opção viável é o transplante, que
pode ser pulmonar, hepático ou renal (este último é necessário quando os rins são
afetados pela toxicidade dos fármacos). Ao tratamento da doença deve-se associar o
tratamento das complicações que esta acarreta, como a osteoporose e a diabetes
(Amorim, 2020).

Figura 4 – Terapêutica modeladora (modificado de (Amorim, 2020)).

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É importante referir que os pacientes com Fibrose internados na unidade de
terapia intensiva são mais suscetíveis à infecção por Pseudomonas aeruginosa, as
Pseudomonas, devido a terem o seu sistema imunitário mais debilitado. O local
afectado pela infecção depende da porta de entrada da bactéria, podendo
desenvolver-se em vários locais anatómicos como pele, tecido subcutâneo, ossos,
orelhas, olhos, trato urinário, pulmões e valvas cardíacas. Os sintomas variam entre
infecções cutâneas e de tecido mole, do trato respiratório e urinário, endocardite
bacteriana aguda e bacteremia (Bush, 2022).

Estatísticas
Através de uma pesquisa por vários documentos e sites, recolhemos diversos
dados estatísticos relativos à doença. Segundo dados de 20 de junho de 2022, há em
Portugal 295 doentes registados com Fibrose Quística, comparativamente com os
35 582 registados em 26 países da Europa. Em Portugal há mais crianças afectadas
pela Fibrose do que adultos, enquanto que na média europeia há mais adultos
afectados, embora em ambos os casos as percentagens sejam muito próximas. Um dos
dados estatísticos onde se verifica maior discrepância é na idade de diagnóstico. Em
Portugal esta é de 1,7 anos, sendo que na Europa é de 3,6 meses. De acordo com as
Figuras 5 e 6, a mutação mais frequente é a F508del, e o mais habitual é o indivíduo
ser homozigótico para a mesma. O grupo etário mais afectado pelas Pseudomonas são
os adultos. Relativamente ao IMC, este costuma apresentar um valor mais baixo do
que o normal.

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Figura 5 – Fibrose Quística (FQ) em Portugal (modificado de (ECFS, 2022)).

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Figura 6 – Fibrose Quística na Europa (modificado de (ECFS, 2022)).

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Conclusão
A Fibrose Quística é uma doença autossómica recessiva provocada por uma
mutação génica no braço longo do cromossoma 7, no gene que codifica a proteína
CFTR. A deficiente produção desta proteína provoca os vários sintomas desta doença
afetando múltiplos sistemas do organismo. Após intensa pesquisa conseguimos
cumprir os objetivos a que nos propusemos, concluindo assim que a doença afeta em
igual número homens e mulheres, não havendo ainda uma cura. No entanto, os
avanços na área da medicina têm vindo a permitir um diagnóstico precoce e um
tratamento que proporciona uma melhor qualidade de vida, dentro do possível.

Bibliografia
Amorim, A. (17 de outubro de 2020). Fibrose Quística. Porto, Porto, Portugal.

Bush, L. M. (01 de abril de 2022). Infecções por Pseudomonas e infecções relacionadas. Obtido
em 23 de 03 de 2023, de MANUAL MSD: https://www.msdmanuals.com/pt-
pt/profissional/doen%C3%A7as-infecciosas/bacilos-gram-
negativos/infec%C3%A7%C3%B5es-por-pseudomonas-e-infec%C3%A7%C3%B5es-
relacionadas

Damasceno, N. (12 de março de 2010). TRIAGEM NEONATAL PARA FIBROSE CÍSTICA. Obtido
em 23 de 03 de 2023, de Sociedade de Pediatria de São Paulo:
https://www.spsp.org.br/2010/03/15/triagem_neonatal_para_fibrose_cistica/

ECFS. (20 de junho de 2022). A Sociedade Europeia de Fibrose Cística. Obtido em 2023 de 03 de
2023, de ECFS PATIENT REGISTRY: https://www.ecfs.eu/sites/default/files/general-
content-images/working-groups/ecfs-patient-registry/Portugal_Poster_ECFSPR.pdf

Michael J. Stephen, M. (01 de junho de 2018). Fibrose Cística e Bronquiectasia Fibrótica Não
Cística. Obtido em 24 de 03 de 2023, de Medicina NET:
https://www.medicinanet.com.br/conteudos/acp-
medicine/7462/fibrose_cistica_e_bronquiectasia_fibrotica_nao_cistica.htm

Sociedade Brasileira Pneumologia. (23 de julho de 2019). Fibrose Cística: veja como é o
diagnóstico e o tratamento. Obtido em 24 de 03 de 2023, de SBPT:
https://sbpt.org.br/portal/publico-geral/fibrose-cistica-diagnostico-tratamento/

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