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pneumologia

Gripe ou resfriado? Sinusite ou rinite?

Hisbello S. Campos
Médico do Instituto Fernandes Figueira — FIOCRUZ. Mestre e doutor em Pneumologia pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Resumo Summary
Resfriado comum e gripe são habitual- Common cold and flu are usually con-
mente confundidos, principalmente se o fused, especially if the cold is more in-
resfriado for mais intenso. Coriza é rotulada tense. Many times, coryza is labeled as
tanto como alergia como sinusite. Os proces- being allergy or sinusitis. The inflamma-
sos inflamatórios das vias aéreas superiores tion of the upper airways involved in these
envolvidos nessas entidades clínicas conju- clinical entities combine common factors,
gam fatores comuns, embora tenham etio- although they have different etiologies.
logias diferentes. Graças a isso, diagnósticos As a result, misdiagnosis generates inade-
equivocados geram tratamento inadequado, quate treatment, usually with unnecessary
geralmente com emprego desnecessário de use of antibiotics. The common cold and
antibióticos. O resfriado comum e a gripe the flu (influenza) are viral infections of the
(influenza) são infecções virais do trato respi- respiratory tract, as well as most cases of
ratório, assim como a maioria das rinossinu- rhinosinusitis. On the other hand, rhinitis
sites. Já a rinite é, em sua maior parte, mani- is, most of the time, a manifestation of re-
festação da atopia respiratória. spiratory atopy.

Introdução A rinite, por definição, é o processo infla- Unitermos: Resfriado


“Estou com gripe há mais de um mês!”, matório da mucosa nasal. Os sintomas mais comum; gripe;
“Vivo com sinusite!”, “Tenho sinusite crônica!” comuns são coriza, congestão nasal e gote- rinossinusite; rinite.
— são afirmações que escutamos diariamente jamento pós-nasal. A inalação de alérgenos
nos consultórios médicos. Para a população costuma ser a causa mais comum (rinite alér- Keywords: Common
geral, resfriado e gripe são sinônimos; rinite gica), mas a rinite também pode ser produto cold; influenza;
crônica é sinusite. Entretanto, na maior parte de infecções virais, bacterianas ou fúngicas, rhinosinusitis; rhinitis.
das vezes, a “gripe” é, na verdade, um res- assim como da inalação de irritantes respi-
friado e a sinusite, uma rinite alérgica. Como ratórios ou de fatores hormonais. A sinusite
as abordagens terapêuticas são diferentes, o é, habitualmente, uma inflamação dos seios
diagnóstico diferencial é fundamental. paranasais associada a processos infecciosos
A gripe, também chamada de influenza (virais, bacterianos ou fúngicos), alérgicos ou
(ou “flu” em língua inglesa), é uma infecção irritativos. Frequentemente, a sinusite está
viral do trato respiratório causada pelo vírus associada à rinite, asma, bronquite, amigda-
influenza, que se manifesta por febre alta, lite e faringite.
calafrios, dor de garganta, cefaleia, coriza, Vistas em conjunto, as infecções virais res-
fraqueza, dor muscular e, por vezes, diarreia. piratórias adquiridas na comunidade acome-
Doença autolimitada, é menos frequente tem a população durante todo o ano, mas al-
que o resfriado, que é uma infecção viral do gumas têm sazonalidade marcante em climas
trato respiratório superior (nariz e garganta) temperados. Incluem diferentes etiologias:
caracterizada por coriza e congestão nasal, picornavírus, adenovírus, coronavírus e ou-
espirros ou tosse, olhos lacrimejantes e febre tros. Tanto podem ser assintomáticas como
usualmente baixa. induzir quadros graves, particularmente nos

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extremos etários. Na maior parte das vezes, sistema imune, comprometendo a função
o diagnóstico e o tratamento são feitos sem a neutrofílica e reduzindo o estresse oxidativo,
identificação etiológica, e o prognóstico é fa- o que propicia sustentabilidade à infecção
vorável. Entretanto, em portadores de com- bacteriana (4). Esses efeitos prejudiciais não
prometimento imune (p. ex., diabéticos, leu- são atributos da concomitância de infecções
cêmicos e transplantados de células-tronco) virais e bacterianas, podendo ocorrer ao final
essas infecções apresentam risco elevado de de um processo viral prévio ou mesmo de-
progressão para infecção do trato respirató- pois da recuperação completa de uma gripe
rio inferior, com sinais clínicos e radiológicos (5, 6). Além disso, a replicação viral intracelu-
de pneumonia, falência respiratória e morte. lar na superfície epitelial e a ação dos meca-
nismos de defesa imune desarranjam a orga-
Infecções do trato respiratório nização celular e expõem a membrana basal,
superior facilitando a penetração das bactérias (7).
As vias aéreas superiores, particularmente Há indícios de que os vírus influenza e pa-
a nasofaringe, são local de moradia de uma rainfluenza aumentem a adesão bacteriana
grande comunidade de comensais e patóge- nas células do trato respiratório por outros
nos potenciais (p. ex., Streptococcus pneu- mecanismos além dos citados acima. Por
moniae, Haemophilus influenzae, Moraxella essa outra via, a neuraminidase (NA) produ-
catarrhalis e Staphylococcus aureus). Numa zida por ambos criaria um ponto de entrada
situação de equilíbrio, há interação e siner- nas células do hospedeiro pela clivagem de
gismo entre as diferentes espécies que com- resíduos de ácidos siálicos, o que exporia
põem essa parcela do microbioma humano, receptores bacterianos na superfície do tra-
com papel benéfico para o hospedeiro. Os to respiratório superior (8). O vírus sincicial
microrganismos comensais interagem com respiratório (RSV), que não produz NA, tam-
os potencialmente patogênicos prevenindo bém dispõe de mecanismos adicionais, pro-
doenças através de mecanismos inibitórios vavelmente através da regulação de outros
de expansão e colonização, modulação imu- receptores (ICAM-1 e PAFr), que facilitam a
ne e estimulação da função de barreira da superinfecção bacteriana (9). Esse conjunto
mucosa (1). Entretanto, distúrbios no equilí- de mecanismos constitui a base para uma
brio dessa microbiota, causados por vírus ou ocorrência clínica frequente no cenário das
bactérias na maior parte das vezes, resultam infecções respiratórias: uma infecção viral ser
em doenças. sucedida por outra bacteriana. Entretanto,
Os diferentes mecanismos de interação há indícios de que o contrário também pode
entre vírus e bactérias representam fator rele- ocorrer: infecções bacterianas podem predis-
vante na patogênese das infecções respirató- por uma infecção viral consecutiva (10, 11).
rias. Processos interativos, através dos quais Diversos estudos vêm procurando definir se
a infecção viral predispõe para infecções isso se deve ao desequilíbrio na microbiota
bacterianas secundárias, e vice-versa, ocor- das vias aéreas superiores ou a mecanismos
rem na superfície epitelial do trato respirató- específicos.
rio, que é a primeira linha de defesa contra as
Pontos-chave: invasões bacterianas. Os vírus respiratórios Resfriado ou gripe?
facilitam a aderência bacteriana, tornando o O resfriado comum é uma infecção das
> Os diferentes mecanismos de
epitélio respiratório mais suscetível à colo- vias aéreas superiores, causada por vírus —
interação entre vírus e bactérias
nização bacteriana (2). A presença do vírus rinovírus (RV). É um dos problemas de saúde
representam fator relevante
na célula infectada modifica a expressão de mais comuns nos ambulatórios, especialmen-
na patogênese das infecções
peptídeos antimicrobianos (defensinas) se- te nos períodos de inverno. O RV pertence
respiratórias;
cretados na mucosa respiratória, que têm à família dos picornavírus, que é dividida
> Os vírus respiratórios facilitam papel chave na resposta imune inata contra em três espécies: RV-A, B e C (compreen-
a aderência bacteriana.; bactérias patogênicas (3). Ao mesmo tempo dem mais de 100 sorotipos descritos). Em
em que a infecção viral induz a expressão de mais de 90% das vezes, os sorotipos A e B
> Eles tornam o epitélio moléculas de adesão, aumentando o recru- são os agentes causais (12) e o sorotipo C
respiratório mais suscetível à tamento e a ativação de células imunes pró- vem sendo objeto de particular interesse nas
colonização bacteriana. -inflamatórias, também afeta diretamente o exacerbações virais da asma (13). Costumam

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circular na população durante todo o ano, e mas mais frequentes são rinorreia e obstru-
seu período de incubação é estimado em 1,9 ção nasal. A tosse é pouco comum e resulta A rinossinusite (RS) é
dia (14). da irritação da orofaringe pela drenagem outra afecção comum
Quando não comprometem asmáticos, posterior dos seios da face ou da infecção do trato respiratório
os sintomas do resfriado comum estão limi- direta das grandes vias aéreas. Quando o superior. Particularmente
tados ao trato respiratório superior. Rinor- comprometimento dos seios da face desa- em adultos, pode ser
reia e obstrução nasal são os proeminentes, parece sem intervenção, fica evidente a etio- muito difícil distingui-la
e estão associados à resposta inflamatória logia viral. Entretanto, se a inflamação está do resfriado comum.
neutrofílica combinada ao aumento da per- associada à obstrução dos óstios, o resultado Habitualmente, a RS é
meabilidade vascular e da secreção de muco. é um cenário de estagnação de secreções, causada por vírus e os
Diferentemente de outros vírus respiratórios queda do pH e da tensão de oxigênio, com sintomas mais frequentes
(influenzae e sincicial respiratório), o RV não comprometimento dos mecanismos de de- são rinorreia e obstrução
destrói a barreira epitelial das vias aéreas. Há fesa, favorável ao crescimento bacteriano. nasal. A tosse é pouco
divergência na literatura sobre a possibilida- Raramente, a RS é limitada a um único seio, comum e resulta da
de de colonização assintomática por cepas pois, na maioria das vezes, a doença envol- irritação da orofaringe
menos virulentas desse vírus. Na ausência de ve primariamente o complexo óstio-meatal. pela drenagem posterior
efeito citopatológico direto, é possível que Costuma ser classificada em aguda, subagu- dos seios da face ou
a natureza e a extensão da resposta imune da, aguda recorrente e crônica. da infecção direta das
ao RV sejam os determinantes dos sintomas, Diversos fatores podem estar envolvidos
grandes vias aéreas.
e não a gravidade ou o dano anatomopato- na predisposição da RS crônica:
lógico causado pela infecção. A tosse aguda
é um sintoma comum nos resfriados. O uso 1. Fatores locais que gerem obstrução me-
de antitussígenos não deve ser recomenda- cânica do complexo óstio-meatal, tais
do, já que não há eficácia comprovada e eles como desvio de septo, edema de mucosa
podem gerar efeitos indesejáveis nas doses (rinite alérgica e infecções), pólipos, cor-
habituais. A tosse subaguda pós-viral geral- pos estranhos e tampões.
mente representa uma resposta inflamatória 2. Comprometimento da função ciliar pela
prolongada, e também não responde a anti- inspiração de ar frio/seco, uso crônico de
tussígenos. A tosse crônica pode ser produ- fármacos (descongestionantes tópicos),
to do gotejamento pós-nasal ou de refluxo atresia coanal, hábito de nadar em águas
gastroesofágico. O tratamento é puramente contaminadas e/ou infecções dentárias na
sintomático e não há indicação de antibióti- arcada superior.
co. Corticosteroides orais ou inalatórios, anti- 3. Condições sistêmicas que enfraqueçam
-histamínicos, codeína e inalação de vapor as defesas imunes, tais como desnutrição,
d’água não têm valor, particularmente em diabetes descompensado, uso crônico de
crianças. Nesse grupo etário, o emprego de corticosteroides, quimioterapia, imuno-
sulfato de zinco e extrato de Pelargonium deficiências (IgG e IgA) e disfunções que
sidoides pode ser vantajoso. Em adultos, alterem as secreções exócrinas (p. ex., mu-
pseudoefedrina, brometo de ipratrópio ina- coviscidose e doença dos cílios imóveis).
lável e vitamina C costumam ser usados, mas
têm efeito modesto sobre a gravidade e du- A rinossinusite será discutida com maiores
ração dos sintomas. Anti-inflamatórios não detalhes mais adiante, já que é frequente-
esteroidais e algumas preparações com ervas mente confundida com rinite.
(p. ex., Equinacea purpúrea) podem melho- A gripe (influenza, flu) mata milhares de
rar os sintomas. A ingesta profilática de alho pessoas anualmente. É uma afecção viral
pode reduzir a frequência de resfriados em aguda do trato respiratório que pode ocorrer
adultos, mas não tem efeito sobre a duração durante todo o ano, porém é mais frequente
dos sintomas (15). no outono e inverno. O vírus da gripe per-
A rinossinusite (RS) é outra afecção co- tence à família Orthomyxoviridae, que com-
mum do trato respiratório superior. Parti- preende os vírus influenza A, B e C, os quais
cularmente em adultos, pode ser muito difícil comprometem aves e mamíferos. Duas proteí-
distingui-la do resfriado comum. Habitual- nas da cápsula viral são empregadas para clas-
mente, a RS é causada por vírus e os sinto- sificar o vírus influenza: 1. hemaglutinina (H),

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responsável pela adesão do vírus na célula sintomas da SG, acrescidos de dispneia e/ou
do hospedeiro; e 2. neuraminidase (N), que saturação de oxigênio < 95% em ar ambien-
insere o material genético do vírus na célula te; desconforto respiratório ou aumento da
infectada. Os números após as letras H e N frequência respiratória, piora das condições
especificam a cepa à qual pertence o vírus de base e hipotensão. Há diversas ferra-
(H1N1, H2N2 e H3N2). mentas diagnósticas que podem ser usadas
Entre humanos, a gripe é transmitida, prin- na influenza, desde os métodos virológicos
cipalmente, pela tosse e pelos espirros, mas clássicos até os kits de diagnóstico molecular,
também pode ser transmitida por saliva e se- dotados de sensibilidade e especificidade al-
creções nasais, bem como pelas fezes de aves tas. O isolamento viral em material biológi-
e outros mamíferos infectados. A maior parte co ainda é um instrumento importante para
das variedades do vírus influenza pode ser a caracterização do vírus e definição de sua
neutralizada por desinfetantes e detergentes. suscetibilidade aos antivirais. Como as técni-
A gripe se espalha pelo mundo sob a forma cas de cultura viral necessitam de carga viral
de epidemias (que matam milhares de pes- significativa no material examinado e não
soas anualmente) e pandemias (que podem permitem resultado imediato, vêm sendo
matar milhões de pessoas). No século XX, três substituídas por testes moleculares. A soro-
pandemias causadas por novas variedades do logia não é um método diagnóstico útil, já
vírus mataram milhões de pessoas. Habitu- que os anticorpos contra o vírus influenza só
almente, as novas formas virais resultam da aparecem após cerca de duas semanas, com
transmissão para humanos de variantes do ví- pico da quarta à sétima semana (16), e são
rus influenza existentes em espécies animais. necessárias duas amostras de sangue: uma
As pandemias serão abordadas mais adiante. na fase aguda e outra na convalescença (com
O risco de transmissão situa-se entre 24 pelo menos duas semanas de intervalo). Se
horas antes do início dos sintomas e três houver diferença igual ou maior a quatro ve-
dias após o término da febre. O período de zes, está feito o diagnóstico (17). Os testes de
incubação dura de um a quatro dias. Os sin- detecção rápida do antígeno viral em mate-
tomas mais comuns são calafrios, febre, dor rial de orofaringe são instrumentos diagnós-
de garganta, rinorreia, mialgias, artralgia, ticos simples, de baixo custo e alta especifi-
cefaleia, tosse seca, fadiga e mal-estar. Pode cidade. Por essa razão, são muito utilizados
haver, também, diarreia, vômitos, rouquidão durante epidemias ou pandemias. Sua maior
e hiperemia conjuntival. As queixas respirató- limitação está ligada à grande variação de
rias, exceto a tosse, ficam mais evidentes com sensibilidade (20% a 90%), que depende de
a progressão da doença e mantêm-se por diversos fatores: coleta, estocagem e trans-
três a quatro dias após o desaparecimento porte do material colhido; tipo de material;
da febre. A tosse pode durar algumas sema- meio de semeadura e grau de adesão às re-
nas. Em geral, os sintomas da gripe (exceto comendações para execução do teste (18).
a tosse, a fadiga e o mal-estar) desaparecem Os métodos moleculares de diagnóstico vêm
em uma semana, mas podem surgir compli- cada vez mais sendo aceitos como padrão
Pontos-chave: cações, como sinusite, otite, piora de comor- ouro para a detecção do vírus influenza. A
bidades crônicas (p. ex., asma, insuficiência maior parte deles usa a técnica de amplifica-
> Entre humanos, a gripe é
cardíaca, diabetes) e pneumonia bacteriana ção do PCR; possibilitam o resultado rapida-
transmitida, principalmente,
ou por outros vírus. Particularmente em crian- mente e têm sensibilidade significativamente
pela tosse e pelos espirros;
ças, idosos e imunocomprometidos, há risco maior que a dos métodos baseados em cul-
> Também pode ser transmitida de causar pneumonia fatal. tura do vírus. Atualmente estão sendo estu-
por saliva e secreções nasais, Na suspeita diagnóstica de gripe, é preci- dados outros métodos moleculares que não
bem como pelas fezes de aves so diferenciá-la da síndrome gripal (SG) e da se baseiam na amplificação do PCR e sim na
e outros mamíferos infectados; síndrome respiratória aguda grave (SRAG). amplificação da sequência de ácidos nuclei-
Na primeira, o paciente apresenta febre de cos ou da alça isotérmica (19, 20).
> A maior parte das variedades início súbito, acompanhada de tosse ou dor A vacinação é o melhor método de pre-
do vírus influenza pode ser de garganta e, pelo menos, cefaleia e mialgia venção da gripe, mas, a partir do momento
neutralizada por desinfetantes e ou artralgia, na ausência de outro diagnóstico em que o indivíduo tem as manifestações
detergentes. específico. Na SRAG observam-se os mesmos clínicas da doença, precisa ser medicado.

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As altas taxas de mutação no genoma do sinas) vem sendo estudado. Outra linha de
vírus influenza geram diversidade antigêni- pesquisa envolve o emprego de peptídeos Atualmente, o tratamento
ca e novos subtipos virais, possibilitando o importantes nas defesas imunes (p. ex., de- mais usado tem como
escape das vacinas e a resistência aos anti- fensinas e catelicidinas), visando tornar mais alvo a neuraminidase
virais. Por essa razão, há necessidade de de- efetivas as respostas imunes contra os vírus. (NA) viral, empregando o
senvolvimento constante de novos fármacos Globalmente, os novos fármacos em estu- oseltamivir ou o zanamivir.
e estratégias de prevenção, bem como de do estão assim direcionados: 1. contra alvos O primeiro é usado na
identificação de novos alvos terapêuticos. virais (NA, HA, proteína N e subunidades dose de 75mg duas vezes
Anteriormente, a amantadina e a rimantadina RdRP), ou contra fatores do hospedeiro es- ao dia, por cinco dias
(inibidores da proteína M2 do vírus influenza) senciais para a replicação viral; 2. com vistas (adultos). Profilaticamente
eram dois fármacos muito empregados no a potencializar as defesas imunes (15). é empregado na dose
tratamento da gripe. Como só atuam sobre de 75mg uma vez ao dia,
o influenza A, são efetivas apenas se admi- Pandemias de gripe por pelo menos 10 dias,
nistradas na fase inicial do processo viral. As Inicialmente, apresentam-se os conceitos podendo chegar a seis
taxas de resistência viral são altas, e seu uso de endemia, epidemia e pandemia: meses de uso durante
vem sendo abandonado. Atualmente, o tra- endemias ou epidemias.
tamento mais usado tem como alvo a neu- Endemia — Doença localizada numa deter-
raminidase (NA) viral, empregando o oselta- minada região, com causa local. P. ex.: febre
mivir ou o zanamivir. O primeiro é usado na amarela na Amazônia.
dose de 75mg duas vezes ao dia, por cinco
dias (adultos). Profilaticamente é empregado Epidemia — Doença infecciosa e transmissí-
na dose de 75mg uma vez ao dia, por pelo vel que ocorre numa comunidade ou região
menos 10 dias, podendo chegar a seis me- e pode se espalhar entre pessoas de outras
ses de uso durante endemias ou epidemias. regiões.
Os efeitos adversos podem incluir náuseas,
vômitos, diarreia, dor abdominal, cefaleia e Pandemia — Epidemia de grandes propor-
distúrbios neuropsiquiátricos (delírio e auto- ções que se espalha por um ou mais conti-
agressão física). O zanamivir é mais efetivo nentes ou por todo o mundo, causando mui-
que o oseltamivir e é administrado apenas tas mortes.
pela via inalatória, na dose de 10mg duas ve-
zes ao dia, por cinco dias (adultos e crianças A gripe se espalha pelo mundo em epi-
maiores que sete anos). Se usado profilati- demias que podem resultar em pandemias,
camente, deve ser administrado na dose de causando milhares a milhões de mortes. Os
10mg uma vez ao dia, por 10 dias (21). registros de pandemias de gripe indicam que
Outros inibidores da NA vêm sendo de- a primeira, provavelmente, tenha começado
senvolvidos e estudados. Dentre eles, o lani- na Ásia, em 1580, e se espalhado pela Áfri-
namivir parece ser promissor. Outro que vem ca, Europa e América do Norte. Entre 1729
sendo estudado é o favipiravir, que deve ser e 1733, uma nova pandemia se originou na
usado pela via intravenosa e pode ser par- Rússia, avançando pela Europa e de lá para
ticularmente útil na presença de resistência todo o mundo. Ainda no mesmo século hou-
viral ao oseltamivir ou na impossibilidade de ve uma segunda pandemia originada na Chi-
uso do zanamivir (p. ex., presença de asma). na, em 1781, que comprometeu também a
Ao mesmo tempo, inibidores da hemagluti- Rússia, toda a Europa e o resto do mundo.
nina (H) viral também vêm sendo estudados, No século seguinte, entre 1830 e 1833, uma
mas ainda não há certeza se serão incluídos nova pandemia, com origem na China, se
no arsenal terapêutico. Nesse grupo incluem- alastrou para as Filipinas, Índia, Indonésia,
-se o peptídeo NDFRKST e a fludase. Com a Rússia e restante da Europa, de onde atingiu
compreensão de que a resposta inflamatória os Estados Unidos. Em 1889 surgiu a gripe
hiperativa é a principal causa do comprome- asiática em Bukhara, na Rússia. De lá atingiu
timento sistêmico nas infecções virais, o em- a América do Norte, América do Sul, Índia
prego de anti-inflamatórios (corticosteroides, e Austrália. Era causada pelo vírus influenza
anticorpos monoclonais, antagonistas de subtipo H2N2 e sua taxa de mortalidade foi
citocinas, estatinas e análogos das esfingo- elevada (22).

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Em 1918 surgiu a gripe espanhola (assim mente, disseminou-se pelos EUA e, a se-
denominada, apesar de originada nos EUA, guir, pela Europa e Oceania. Até junho do
sendo levada à Europa pelas tropas america- mesmo ano havia comprometido mais de
nas mobilizadas na Primeira Guerra Mundial), 75 países, em vários continentes. O agen-
que atingiu a Europa, China e Índia e afetou te etiológico foi identificado como o vírus
50% da população mundial, matando milhões influenza A subtipo H1N1. Ele era diferente
de pessoas. Estima-se que 80% das mortes do H1N1 humano, que circulava há alguns
no exército norte-americano naquela guer- anos, por conter material genético dos vírus
ra foram causadas por essa gripe. No Brasil, humanos, de aves e de suínos. Inicialmente
aonde chegou por via marítima, em setembro foi chamada de gripe suína e, posteriormen-
de 1918, atingiu as cidades de Salvador, Re- te, de gripe A. Os sinais clínicos incluíam
cife e Rio de Janeiro e chegou à Amazônia. mialgia e dor articular, irritação ocular e co-
Estima-se que tenha causado cerca de 300 riza. Responsável pela morte de mais de 18
mil mortes em nosso país, incluindo o então mil pessoas, foi considerada terminada em
Presidente da República, Rodrigues Alves, em agosto de 2010.
1919. Causada pelo vírus tipo H1N1 e apesar Pelo exposto acima, fica claro que pan-
de muito violenta (nos primeiros seis meses demias de gripe são um problema grave
matou entre 25 e 50 milhões de pessoas), de Saúde Pública. Por isso, há acompanha-
durou menos que as antecessoras (18 meses) mento constante dos surtos virais em todo
(23). Foi seguida pela gripe asiática (1957-58), o mundo, visando identificar o surgimento
causada pelo H2N2 e originada na China, de de novas espécies virais que possam ser
onde foi para os EUA. Lá, foi responsável os agentes causais de novas pandemias.
por cerca de 70 mil mortes. Dez anos depois Acende-se a “luz vermelha” quando vírus
(1968) surgiu a gripe de Hong Kong, de onde responsáveis por gripe em aves ou em ou-
partiu para o Vietnã, e de lá para os EUA, tros animais passam a causar doença em
levada pelos soldados que lutaram naquele humanos, caracterizada por quadros clínicos
país. Alcançou a Europa, a América do Sul e a atípicos. Os fatores envolvidos na transmis-
África do Sul no ano seguinte. A gripe suína, são da influenza ainda não estão totalmente
que teve como origem os vírus que habitual- esclarecidos. Há evidências de que todas
mente infectam porcos, surgiu em 1976 nos as formas de contágio (gotículas e aeros-
EUA, mas foi contida e não se disseminou. sol gerados pelo espirro/tosse e contato)
Foi causada pelo subtipo do vírus influenza A têm papel importante, mas a contribuição
H1N1 (24). de fatores ambientais, como temperatura e
Resumidamente, no decorrer do século umidade, ainda é incerta. As respostas para
XX houve três pandemias de gripe: a espa- essas questões orientarão a definição de
nhola (1918 e 1919), a asiática (1957 a 1963) estratégias mais efetivas na contenção de
e a de Hong Kong (1968 a 1970). Entre elas, futuras epidemias de influenza.
Pontos-chave: causadas pelo surgimento de novas espécies Desde o início de 2013, uma espécie
entre humanos, observam-se duas diferenças de vírus influenza aviário (H7N9), que tem
> Pandemias de gripe são
fundamentais: causado gripe em humanos na China, vem
um problema grave de Saúde
sendo acompanhada com atenção. Está de-
Pública;
1. Foram causadas por subtipos diferentes monstrado que esse novo vírus resulta de
> Há acompanhamento do vírus: H1N1 na gripe espanhola, H2N2 mutação genética do vírus H7N9 clássico
constante dos surtos virais na asiática e H3N2 na de Hong Kong. em patos, e que tem potencial elevado de
em todo o mundo, visando 2. A virulência desses subtipos não foi a mes- causar doença em mamíferos (25). A presen-
identificar o surgimento de ma: a gripe espanhola provocou pelo me- ça desse vírus em humanos ainda não foi
novas espécies virais; nos 50 milhões de óbitos, contra 1-1,5 mi- descrita em outro lugar, mas as medidas de
lhão da asiática e cerca de 1 milhão da de prevenção (evitar contato com aves doentes
> Acende-se a “luz vermelha” Hong Kong. e emprego de oseltamivir em pessoas ex-
quando vírus responsáveis por postas com fatores de risco — p. ex., diabe-
gripe em aves ou em outros A primeira pandemia do século atual foi tes) já foram adotadas. Ainda não há vacina
animais passam a causar resultado de um surto de gripe suína origi- disponível contra esse vírus, mas o processo
doença em humanos. nado no México, em março de 2009. Inicial- de produção já foi iniciado.

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Gripe ou resfriado? Sinusite ou rinite?

Rinite ou sinusite? processo inflamatório e os sintomas. O pru-


A rinite é uma condição clínica na qual a rido é consequência da irritação do nervo A rinite alérgica (RA),
mucosa nasal está inflamada. Na maior parte trigêmeo na mucosa nasal, causada pela por ser uma condição
das vezes é de causa alérgica ou infeccio- histamina, que gera estimulação parassim- crônica, é frequentemente
sa. Enquanto a rinite alérgica é classificada pática com liberação de acetilcolina. Embo- confundida com sinusite
como perene ou sazonal, a infecciosa pode ra a histamina também aja diretamente nos pelo paciente. Na RA
ser aguda ou crônica. Tanto uma como a vasos da mucosa, produzindo vazamento habitualmente ocorre
outra são caracterizadas por rinorreia, re- plasmático, sua participação na coriza é pe- hipersensibilidade
sultante do processo inflamatório nasal que quena. A maior parte da rinorreia aquosa é nasal, complicada
envolve vasos, edema, infiltração celular e hi- produto da secreção das glândulas nasais. por espirros, prurido,
persecreção. Também existem outras formas O diagnóstico da RA é baseado na pre- rinorreia e congestão. Os
menos comuns de rinite, que não envolvem sença de quatro sintomas (prurido nasal, mecanismos envolvidos na
alergia ou infecção: 1. idiopática; 2. associa- espirros, rinorreia aquosa e congestão/obs- sensibilização da mucosa
da à síndrome eosinofílica (com testes alér- trução nasal) associados à identificação de nasal ainda não estão
gicos negativos); 3. gustativa; 4. hormonal; alérgenos causais. Pode haver prurido ocular totalmente esclarecidos,
5. associada à gravidez; 6. associada ao frio; associado ao nasal. No diagnóstico diferen- mas envolvem fatores
7. psicogênica; 8. associada à idade avan- cial devem ser pesquisados dados de ex- genéticos e produção
posição a produtos irritantes, infecção das aumentada de IgE.
çada e 9. medicamentosa. Esta última pode
estar relacionada ao uso prolongado de sim- vias aéreas superiores, uso tópico regular de
paticomiméticos, vasodilatadores anti-hiper- agentes alfa-adrenérgicos, uso de antagonis-
tensivos, broncodilatadores, antidepressivos tas beta-adrenérgicos, estrogênio ou reserpi-
ou anticoncepcionais. Dentre esses, a causa na. Deve-se investigar, também, a presença
mais comum é o uso abusivo de gotas nasais de alterações anatômicas da nasofaringe,
simpaticomiméticas, para alívio do bloqueio hipertrofia de adenoides e pólipos nasais.
nasal. Irritantes físicos, químicos ou radiação Particularmente em crianças, deve-se estar
também podem causar rinite. atento à presença potencial de corpos estra-
A rinite alérgica (RA), por ser uma condi- nhos. Raramente, neoplasias nasais (papilo-
ção crônica, é frequentemente confundida ma invertido e carcinoma) podem ser causa
com sinusite pelo paciente. Na RA habitu- de rinite.
almente ocorre hipersensibilidade nasal, A RA não é causa de morte, mas pode
complicada por espirros, prurido, rinorreia comprometer a qualidade de vida. O ob-
e congestão. Os mecanismos envolvidos na jetivo do tratamento é aliviar os sintomas e
sensibilização da mucosa nasal ainda não remover o incômodo no dia a dia. A higiene
estão totalmente esclarecidos, mas envol- ambiental é uma das medidas mais impor-
vem fatores genéticos e produção aumenta- tantes, mas afastar o paciente dos alérgenos
da de IgE. Em atópicos, anticorpos da classe do cotidiano não é tarefa fácil. Na residên-
IgE são produzidos na mucosa nasal e nos cia, devem-se evitar móveis estofados reves-
linfonodos regionais, em resposta ao con- tidos com material que permita o acúmulo
tato de alérgenos com a mucosa nasal. Os de poeira, animais domésticos, produtos de
alérgenos mais frequentes são os ácaros (co- limpeza com cheiro forte, perfumes, fumaça
muns na poeira domiciliar), polens, fungos e de tabaco e irritantes respiratórios. O agente
epitélio animal. Nas pessoas sensibilizadas, terapêutico mais efetivo é o corticosteroide
os antígenos inalados passam pelo epitélio nasal. Possui efeito tópico adequado em do-
nasal e se ligam aos mastócitos na membra- ses baixas, absorção reduzida e é rapidamen-
na basal da mucosa, levando à liberação de te degradado, com pouco efeito sistêmico.
mediadores químicos (histamina e leucotrie- Estabilizadores de mastócitos, como o cro-
nos) por essas células. Esses mediadores moglicato dissódico ou antagonistas de re-
provocam as terminações nervosas e os va- ceptores de leucotrienos, têm efeito inferior
sos sanguíneos da mucosa nasal, causando aos corticosteroides (26, 27). Em situações
prurido, espirros, rinorreia e edema, inicial- particulares e agudas, com sintomas inten-
mente. Numa etapa posterior, várias células sos, podem-se usar vasoconstritores tópicos
inflamatórias, incluindo eosinófilos ativados, durante períodos curtos. A imunoalergotera-
infiltram a mucosa nasal, amplificando o pia específica (IATE) pode ser recomendada

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Gripe ou resfriado? Sinusite ou rinite?

para pacientes com RA que não respondem uma escala analógica visual de 10cm, usada
ao tratamento conservador. Quando feita para responder à pergunta “Quão problemá-
em pacientes cuidadosamente seleciona- ticos são seus sintomas de rinossinusite?”,
dos e aplicada em ambiente equipado para pode ser utilizada com sucesso na prática clí-
contornar reações sistêmicas potenciais, é nica (35). A resposta é marcada numa escala
segura e melhora os sintomas e a qualidade que varia de 0 (não causam problema) a 10
de vida (28). Ainda não está comprovado se (o pior possível). Até 3 a doença seria leve;
a IATE sublingual, que teria menor risco de entre 3 e 7, moderada; maior que 7, grave.
efeitos adversos, é tão eficiente quanto a in- Pontuação superior a 5 está relacionada a
tradérmica (29). Na presença de bloqueio na- comprometimento da qualidade de vida.
sal associado à RA por deformidades nasais Na maior parte das vezes, o diagnóstico
(desvio de septo) ou à nasofaringe (polipose de RS é clínico. Os três sintomas principais
ou adenoide volumosa), pode ser indicado são: 1. congestão nasal, obstrução ou blo-
procedimento cirúrgico, visando melhorar a queio; 2. rinorreia anterior ou posterior pu-
ventilação nasal. rulenta; e 3. dor ou opressão facial. Alguns
Sinusite, por definição, é a inflamação dos autores incluem hiposmia/anosmia entre os
seios da face. Atualmente, prefere-se a deno- sintomas maiores. Os sintomas menores se-
minação rinossinusite, já que a concha nasal riam: cefaleia, dor/pressão nos ouvidos, ha-
média (turbinada) penetra o seio etmoidal, o litose, dor de dente, tosse, febre e fadiga.
que faz com que o comprometimento da ca- O diagnóstico de RS pode ser feito na pre-
vidade nasal também afete os seios da face sença de dois ou mais sintomas maiores ou
na maior parte das vezes. Entretanto, como quando houver um sintoma maior associado
o termo rinossinusite só vem sendo usado há a dois ou mais dos menores (30-34). Em situ-
pouco mais de uma década, o termo sinusite ações particulares pode ser necessário usar
ainda é utilizado como sinônimo, em função métodos diagnósticos complementares.
da tradição. Segundo as diretrizes atuais, a radiografia
Existem diferentes diretrizes com propos- simples dos seios da face não é útil ou cus-
tas de classificação e orientações terapêuti- to-efetiva. A tomografia computadorizada
cas para a rinossinusite (30-34). De modo ge- (TC) não é recomendada de rotina, mas é a
ral, ela pode ser classificada de acordo com melhor opção nos casos mais graves, na sus-
a duração (aguda, subaguda, recorrente e peita de complicações ou de comprometi-
crônica) ou com a gravidade (leve, moderada mento imune, e quando houver perspectiva
ou grave) dos sintomas. Em algumas diretri- de tratamento cirúrgico (30-34). A endosco-
zes ela é classificada como aguda quando a pia nasal, embora não seja essencial para o
sintomatologia dura quatro semanas ou me- diagnóstico, pode ser feita na falta de res-
nos; em outras, quando dura menos de 12 posta ao tratamento empírico. A cultura da
semanas e há resolução completa dos sinto- secreção nasal pode auxiliar na identificação
mas. A rinossinusite subaguda, segundo al- do agente etiológico e seleção da terapia
gumas diretrizes, seria aquela com duração mais adequada. Embora raramente indica-
Pontos-chave: de sintomas entre quatro e 12 semanas; em da, a punção do seio maxilar é considerada
outras, entre quatro e oito semanas. Do mes- padrão para confirmar a presença de pató-
> Na maior parte das vezes, o
mo modo, há diferenças na classificação da genos bacterianos. É feita com inserção de
diagnóstico de RS é clínico;
RS recorrente: quatro episódios de RS aguda agulha calibrosa no seio maxilar, através do
> Segundo as diretrizes atuais, em um ano, sem sintomas persistentes entre meato inferior ou da fossa nasal (36).
a radiografia simples dos os episódios; ou três ou mais episódios por Rotineiramente, as rinossinusites agudas
seios da face não é útil ou ano. Finalmente, a definição de RS crônica são virais e originadas do resfriado comum.
custo-efetiva; varia de acordo com a duração de sintomas Em média, comprometem o adulto entre duas
persistentes: oito a 12 semanas, de acordo e cinco vezes ao ano, dependendo das condi-
> A tomografia com a diretriz (30-34). ções climáticas e ambientais (30). A etiologia
computadorizada (TC) não é A definição da gravidade é uma etapa bacteriana é pouco frequente, mas represen-
recomendada de rotina, mas é fundamental para se estimar a magnitude do ta um desafio para o diagnóstico diferencial,
a melhor opção nos casos mais comprometimento e apontar a opção tera- dado que a apresentação clínica é semelhante
graves. pêutica mais adequada. Há evidências de que à viral. A duração e a gravidade dos sintomas

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Gripe ou resfriado? Sinusite ou rinite?

são os melhores indicadores clínicos para di- lhora em até duas semanas, deve-se iniciar
ferenciar a etiologia bacteriana da viral. Nas o uso de antibióticos. Nos casos mais graves
formas virais, os sintomas atingem o pico dois esta associação deve começar no sexto dia
a três dias após seu início, declinam gradual- de sintomatologia. O emprego de corticos-
mente a partir do quinto dia e desaparecem teroide oral pode ser benéfico para alívio
entre dez e 14 dias. Quando os sintomas di- da dor. Não há evidências que justifiquem o
ferem desse padrão, ou são mais intensos, uso de descongestionantes tópicos ou orais.
provavelmente a etiologia não é viral. A cor A cor da secreção não é um parâmetro útil
da secreção ou a presença de febre não dife- para indicação de antibiótico, porque está
renciam a etiologia da RS (30-34). relacionada à presença de neutrófilos e não
Considerando que apenas 0,5%-2% das de bactérias.
rinossinusites agudas são de etiologia bac-
teriana, e que está demonstrado que em Conclusão
cerca de 60% há remissão espontânea dos Inegavelmente, as apresentações clínicas
sintomas, recomenda-se apenas hidratação dos diferentes processos inflamatórios das
generosa e tratamento sintomático durante vias aéreas superiores conjugam sintomas co-
os cinco dias iniciais. Nessa janela temporal, muns: coriza, espirro, tosse e secreção nasal
a etiologia viral é a mais provável. Mesmo podem estar presentes em resfriados, gripes e
assim, existem indícios de que há uso in- rinossinusite. Na maior parte das vezes o diag-
devido de antibióticos na maior parte das nóstico é clínico, e a diferenciação entre essas
vezes. Levantamento feito nos EUA (37) e alterações deve levar em consideração dados
no Reino Unido (38) revelou prescrição de como época do ano, antecedentes familiares
antibióticos em 81%-92% dos casos de RS alérgicos, frequência dos episódios sintomá-
aguda. Um critério prático para definir a in- ticos, desencadeantes de sintomas, sintomas
dicação de antibioticoterapia deve conside- gerais, uso habitual de vasoconstritores na-
rar a gravidade e a duração dos sintomas. sais, dentre outros. O elo comum a todos es-
Se os sintomas persistirem ou ficarem mais ses problemas das vias aéreas superiores é, na
intensos após os cinco dias iniciais, casos maior parte das vezes, a etiologia viral. É im-
moderados podem ser tratados apenas com portante manter essa lembrança, para evitar o
corticosteroides nasais. Se não houver me- uso desnecessário de antibióticos.

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is an important mediator of the enhanced susceptibility to encontram na Redação, à disposição dos interessados.

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