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PORTUGUÊS 11º Ano CADERNO 3

CAMINHOS DO ROMANTISMO Camilo Castelo Branco | Amor de Perdição

SÍNTESE DOS CONTEÚDOS

Sugestão biográfica (Simão e narrador) e construção do herói romântico


A novela foi escrita em quinze dias, enquanto o autor estava preso na Cadeia da
Relação do Porto. Aí, Camilo encontrou o registo da condenação ao degredo de um tio,
Simão Botelho. A partir deste facto, o autor criou uma história onde cruza ficção e
algumas notas biográficas.
Assim, se compreende o título Amor de Perdição e o subtítulo Memórias de uma
Família.
Na obra, coexistem o narrador-autor (narrador autodiegético), percetível na
Introdução, em momentos pontuais dos capítulos XII, XIII e na Conclusão, e o narrador-
produtor de ficção (narrador heterodiegético).
Ao longo da obra, o protagonista é caracterizado como herói romântico: no
início, é apresentado como um jovem forte, solitário, rebelde e irrefletido; por influência
do poder transfigurador do amor, Simão modifica-se, mas, porque se sente injustiçado,
quando mata Baltasar e é condenado ao degredo, acaba por se revoltar contra a família
e contra a sociedade.

Quanto à focalização, é possível encontrar:


✓focalização externa: referência a acontecimentos, situações, cartas, descrição de
espaços e de personagens;
✓focalização omnisciente: transmissão dos pensamentos e das ideias das
personagens;
✓focalização interventiva: presença de opiniões e de comentários do narrador e
apelo à sensibilidade do leitor.
A obra como crónica de mudança social
Aspetos criticados em Amor de Perdição:
✓a aristocracia como símbolo de uma sociedade retrógrada e decadente
materializada na oposição preconceituosa das famílias de Teresa e Simão ao amor,
conduzindo-os à morte;
a podridão da vida conventual: o convento de Viseu é descrito como um mundo de
intrigas e de vícios, de maldade e de falsas virtudes;
✓a prepotência e arbitrariedade da justiça, visível na demonstração da influência e
do poder do pai de Simão quando este é aconselhado a fugir pelas autoridades;
✓a corrupção no exército presente na interferência de Domingos Botelho no caso do
filho Manuel Botelho.

Relações entre personagens


Simão Botelho é jovem bonito e viril. É o típico herói romântico: rebelde, intempestivo,
solitário, transformado pelo amor. É uma pessoa digna e honrada, corajosa e
determinada, que acredita no amor eterno.
Teresa Albuquerque é jovem bonita, de origem aristocrática e rica. É apaixonada por
Simão, muito sensível e acredita no amor eterno. Tem personalidade forte e
determinada – recusa casar com Baltasar –, revelando a sua coragem – mantém a sua
vontade, enfrentando a tirania do pai.
De origem popular, Mariana é jovem e bonita (mais bonita do que Teresa),
desembaraçada e decidida. Acredita no amor eterno e é apaixonada por Simão,
revelando-se abnegada e sofredora – ama Simão e acompanha-o sempre, mesmo
sabendo que o jovem ama Teresa, suicidando-se quando Simão morre.
Revela-se uma personagem forte e determinada.
João da Cruz é uma personagem do povo, um castiço rude e violento, mas muito
corajoso, grato e bondoso. É amigo de Simão.
Baltasar é orgulhoso, prepotente, insensível e arrogante. Mesmo sabendo que Teresa
ama Simão, decide levar o seu desejo de a desposar avante.
Tadeu de Albuquerque e Domingos Botelho são orgulhosos, preconceituosos,
prepotentes e inflexíveis, revelando- se insensíveis ao amor arrebatado de Teresa e
Simão, cedendo perante todas as convenções sociais.
Amor-paixão
O amor em Amor de Perdição é sofrimento. Teresa e Simão vivem um amor
impossível e proibido, no entanto, apesar dos obstáculos impostos pela família, não
desistem da sua felicidade. As adversidades parecem até dar-lhes mais força para
lutarem pelos seus objetivos.
Como creem no amor eterno, encaram a morte/transcendência como superação
das dificuldades da vida, achando que encontrarão nela a felicidade que não
conseguiram alcançar em vida. A morte é encarada como salvação e única saída para o
sofrimento que vivem, ou seja, para Simão e Teresa só a morte permitirá a concretização
do seu amor.
Nas cartas que os dois apaixonados trocam pode encontrar-se o
desenvolvimento do conceito de amor eterno.
Para além de estas funcionarem como o verdadeiro diálogo entre os amantes,
cumprem outras funções:
✓são um meio de comunicação entre os amantes;
✓traduzem uma transgressão em relação às normas impostas;
✓completam a caracterização das personagens, evidenciando a sua dimensão de
heróis românticos;
✓relatam acontecimentos;
✓refletem as memórias dos apaixonados;
✓comunicam decisões;
✓veiculam promessas e sentimentos;
✓revelam projetos;
✓expressam apelos e desabafos;
✓constituem momentos de prosa poética.
Estrutura da obra
A obra é composta por Introdução, vinte capítulos e Conclusão e pode resumir-se na
seguinte sentença: “Amou, perdeu-se e morreu amando”.
AMOU PERDEU-SE MORREU AMANDO
Simão, apesar dos Na sequência desta paixão arrebatadora, Condenado ao degredo, Simão
ódios familiares que Simão é expulso de casa dos seus pais e acaba por morrer durante a
separam as famílias acaba por matar Baltasar, primo e viagem, depois de ter
Botelho e pretendente de Teresa, que estava conhecimento da morte da sua
Albuquerque, encerrada num convento, pois não amada.
apaixona-se por aceitava o casamento com Baltasar que o Os dois apaixonados acreditam
Teresa. pai lhe pretendia impor. no amor eterno e, por este
motivo, veem na morte a
possibilidade de uma união que
não conseguiram obter em vida.

Diálogos
A função dos diálogos em Amor de Perdição é:
✓ esclarecer situações que envolvem as personagens;
✓ transmitir informações relevantes relativas às opções e atitudes das personagens;
✓ traduzir os sentimentos das personagens;
✓ estabelecer confrontos entre diferentes pontos de vista.

Concentração temporal da ação


Concentração temporal da ação
Os acontecimentos desenrolam-se de forma linear e cronológica, num ritmo
rápido. Os diálogos, a ausência de análises psicológicas, a valorização da ação em
detrimento da reflexão e o discurso epistolar aceleram o processo narrativo.
Na ação, que começa em 1779 e termina em 1807, os acontecimentos sucedem-
se por ordem cronológica. A intriga secundária, referências à vida de Manuel Botelho,
contrasta com os valores apontados na intriga principal.
FICHAS

FORMATIVAS
GRUPO I

Apresenta as tuas respostas de forma bem estruturada.

Lê, atentamente, o seguinte texto.

[…] Na semana adiante, quando soube que o senhor Baltasar (raios o partam!) tinha saído de Viseu, fui
falar com o senhor corregedor, e contei-lhe tudo como se passara. O senhor corregedor esteve a cismar
um pouquinho, e disse-me, e vossa senhoria há de perdoar por eu lhe dizer o que seu pai me disse, tal e
qual.
– Diga.
– Seu pai começou a esfregar o nariz, e disse-me: – “Eu sei o que é isso. Se aquele brejeiro de meu filho
Simão tivesse honra, não olharia para a prima desse assassino. Cuida o patife que eu consentia que meu
filho se ligasse a uma filha de Tadeu de Albuquerque!…” Ainda disse mais coisas que me não lembram;
mas eu fiquei sabendo tudo. Ora aqui tem o que houve. Agora apareceu- me aqui vossa senhoria, e a
noite passada foi a Viseu. Perdoará a minha confiança: mas vossa senhoria foi falar com a tal menina; e
eu estive vai e não vai a segui-lo; mas, como ia meu cunhado, que é homem para três, fiquei descansado.
Ele contou-me um encontro que vossa senhoria teve à porta do quintal da menina. Se lá torna, senhor
Simão, vá preparado para alguma coisa de maior. Eu bem sei que vossa senhoria não é medroso; mas
duma traição ninguém se livra. Se quer que eu vá também, estou às suas ordens; e a clavina que deu
polícia ao almocreve ainda ali está, e dá fogo debaixo de água, como diz o outro. Mas, se vossa senhoria
dá licença que eu lhe diga a minha opinião, o melhor é não andar nessas encamisadas. Se quer casar com
ela, vá pedir a seu pai licença, e deixe o resto cá por minha conta; ponto é que ela queira, que eu, num
abrir e fechar de olhos, atiro com ela para cima duma égua de chupeta, que ali tenho, e o pai e mais o
primo ficam a ver navios.
– Obrigado, meu amigo – disse Simão – aproveitarei os seus bons serviços quando me forem necessários.
Esta noite hei de ir, como fui a noite passada, a Viseu. Se houver novidade, então veremos o que se há
de fazer. Conto com vossemecê, e creia que tem em mim um amigo.
Mestre João da Cruz não replicou. Dali foi examinar mudamente a fecharia da clavina, e entender-se com
o cunhado sobre cautelas necessárias, enquanto descarregava a arma, e a carregava de novo com uns
zagalotes especiais, que ele denominava “amêndoas de pimpões”. Neste intervalo, Mariana, a filha do
ferrador, entrou no sobrado, e disse com meiguice a Simão Botelho:
– Então sempre é certo ir?
– Vou; porque não hei de ir?!
– Pois Nossa Senhora vá na sua companhia – tornou ela, saindo logo para esconder as lágrimas.

Camilo Castelo Branco. Amor de Perdição. 2015. Porto: Porto Editora.

1. Comenta a perspetiva do pai de Simão sobre o seu filho.

2. Compara o posicionamento de Joao da Cruz e de Mariana sobre um possível novo encontro de Simão
com Teresa.

3. Apresenta três traços caracterizadores de Simão, fundamentando a tua resposta com expressões
textuais.
B

4. Escreve uma exposição de cento e trinta palavras a cento e setenta palavras sobre o “Amor de
Perdição como cronica da mudança social”, tendo em conta os seguintes tópicos:
✓ família;
✓igreja;
✓ justiça.

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