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FREIRE É UM EDUCADOR BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO

Depois de 1940, Freire trabalhou como professor de português numa escola


secundária. Em 1947, foi trabalhar no Serviço Social Industrial de Pernambuco.
Depois de trabalhar no Serviço Social Industrial por quase 10 anos, atuou como
professor de português no movimento cultural popular no Brasil, no serviço de
extensão cultural da Universidade do Recife e em atividades de prática educativa
como alfabetização de adultos no Rio Grande do Norte (Brighente; Mesquida, 2016).

Em 1959, Freire doutorou-se com o artigo "Educação Atual no Brasil" e tornou-


se professor de história da educação e filosofia da educação na Universidade do
Recife. Em 1963, aceitou um convite do governo para participar de trabalhos de
alfabetização de adultos no Nordeste do Brasil. Logo, ocorreu um golpe militar no
Brasil. Freire foi preso e forçado a viver no exílio por quase 16 anos (Chiarella, et al.,
2015)

Visitou a Bolívia, o Chile e outros países para participar de projetos de reforma


agrária nesses países e treinar professores e pessoal técnico. Em 1969, Freire
tornou-se pesquisador visitante no Centro para o Estudo de Educação e
Desenvolvimento da Universidade de Harvard. Posteriormente, foi convidado a
trabalhar no Conselho Mundial da Santa Sé, com sede em Genebra (Feichas; Narita,
2016).

Desde o final da década de 1960, Freire tem participado em trabalhos de


alfabetização de adultos em países do Terceiro Mundo, como Tanzânia, Zâmbia,
Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, como consultor da UNESCO. Em 1973, fundou
o Instituto de Ação Cultural em Genebra.

Devido à ampla influência das teorias educacionais e atividades práticas de


Freire, muitas universidades de renome mundial concederam-lhe doutorados
honorários. Após retornar do exílio em 1980, participou ativamente da educação
doméstica e de diversas atividades sociais. Em 1986, Freire recebeu o “Prêmio da
Paz para a Educação” concedido pela UNESCO (De Almeida; Fontenele; Freitas,
2021).
Freire escreveu muitos livros ao longo de sua vida, entre os quais “A Pedagogia
do Oprimido”, publicado em 1970, é seu livro mais influente. O livro foi escrito com
base em seus 16 anos de observação no exílio político e combinado com suas
primeiras atividades educacionais no Brasil (De Godoy Stenico; Paes, 2017).

1. A educação deve partir da subjetividade humana

O pensamento da subjetividade humana é a pedra angular de todo o


pensamento educacional de Freire. Freire destacou que, no processo de mudança
do mundo e da história, é muito ingênuo e simplista negar a subjetividade humana e
sua importância. Deve-se admitir que um mundo sem pessoas é impossível (Costa;
Loureiro, 2017).

No entanto, a subjetividade humana é muitas vezes negada pela injustiça,


exploração, opressão e violência. Portanto, os oprimidos anseiam por liberdade e
justiça e travam uma luta pela restauração da sua humanidade. Ser humano é
participar nas relações com outras pessoas e com o mundo em geral. Os humanos
são diferentes dos animais. Os animais só podem se adaptar ao meio ambiente, mas
os humanos podem participar e mudar o mundo (Brighente; Mesquida, 2016).

Pessoas abstratas separadas do mundo e um mundo sem pessoas não existem.


As pessoas não são de forma alguma abstratas, isoladas, independentes ou ligadas
ao mundo, e o mundo não é de forma alguma uma realidade que não inclua as
pessoas. Os seres humanos são os sujeitos que refletem e agem sobre o mundo
para atingir o propósito de transformar o mundo. A chamada “libertação e liberdade
humana” visa permitir que as pessoas tenham consciência subjetiva e libertem a si
mesmas e aos outros na luta para criticar e transformar o mundo (De Godoy Stenico;
Paes, 2017).

A pedagogia dos oprimidos se expressa como a pedagogia do “povo”. É uma


ferramenta para cultivar e desenvolver a consciência radical dos oprimidos. A
pedagogia dos oprimidos trata da libertação de todas as pessoas, e a libertação não
é uma dádiva nem uma auto-realização, mas um processo interativo (De Almeida;
Fontenele; Freitas, 2021).
2. Substituir “educação baseada em depósitos bancários” por “educação para
levantar problemas”
Freire referiu-se coletivamente à educação antiga como "o conceito bancário de
educação". Nessa educação bancária, o conhecimento é considerado um presente
dado por quem se vê como conhecedor a quem nada sabe. As características
básicas da relação professor-aluno são: o professor fala e os alunos ouvem; o
professor produz e os alunos aceitam; o professor sabe tudo e os alunos não sabem
nada; o professor disciplina e os alunos obedecem à disciplina; o professor age e os
alunos fantasiam sobre a atuação, o professor escolhe. Ensinando o conteúdo, os
alunos aceitam passivamente o conteúdo prescrito, os professores são os sujeitos
do processo de ensino e os alunos são os objetos (Chiarella, et al., 2015)

Na educação de armazenamento bancário, os alunos são "contêineres" ou


"casas de armazenamento", e a tarefa do professor é criar constantemente objetos
de armazenamento e forçar os alunos a aceitá-los e lembrá-los. Quanto mais um
professor empanturra os alunos, o professor é um bom professor; quanto mais os
alunos estão dispostos a serem empanturrados, esses alunos são bons alunos
(Costa, 2016).

Quanto às coisas que os professores dão aos alunos, estão completamente


divorciadas da realidade ou não têm nada a ver com a experiência real dos alunos.
A educação baseada no banco trata as pessoas como seres adaptáveis e operáveis,
dificultando assim o cultivo da consciência crítica e da criatividade dos alunos. Todo
o propósito da educação é fazer com que os alunos acreditem nas mentiras “míticas”
dos seus opressores (Chiarella, et al., 2015).

Porque os opressores não querem que a verdade seja revelada nem que o
mundo seja transformado. Portanto, este tipo de educação do tipo depósito bancário
é uma forma de matar as ideias das pessoas e nega que a aquisição de educação e
conhecimento seja um processo de investigação e crítica contínuas (Costa; Loureiro,
2017).

A fim de lutar pela libertação e liberdade dos oprimidos, a “educação sobre


depósitos bancários” deve ser substituída pelo “conceito problematizador de
educação”. Na educação problematizadora, professores e alunos mantêm uma
relação dialógica, cooperando no processo de percepção do mesmo objeto
cognitivo, fazendo perguntas e buscando respostas para resolver problemas (De
Godoy Stênico; Paes, 2017).

Neste tipo de educação, a contradição entre professores e alunos não existe


mais. Através do diálogo, o professor do aluno e o aluno do professor são
substituídos pela troca de papéis entre professor e aluno. Professores e alunos
trabalham juntos, sendo constantemente desafiados por questões que lhes dizem
respeito e respondendo constantemente aos desafios.

A educação baseada nos bancos esconde os factos sobre como as pessoas


existem no mundo, mistificando a realidade. Enquanto a educação baseada em
problemas assume como missão eliminar a mitologia. A educação baseada nos
bancos resiste ao diálogo, enquanto a educação baseada em problemas trata o
diálogo como o sucesso é indispensável.

Para atividades cognitivas que revelam a realidade; a educação baseada em


bancos considera os alunos como objetos de ajuda, enquanto a educação
problematizadora os torna sujeitos com habilidades de pensamento crítico; a
educação baseada em bancos dificulta o desenvolvimento da criatividade, negando
a missão ontológica e histórica de fazer as pessoas humano, enquanto a educação
problematizadora toma o desenvolvimento da criatividade como pedra angular e
incentiva as pessoas a refletirem verdadeiramente e a agirem sobre a realidade
(Costa; Loureiro, 2017).

Em suma, a teoria e a prática da educação para o armazenamento bancário,


como uma força que conduz à estática e à rigidez, não estabelecem as pessoas
como seres históricos, enquanto a teoria e a prática da educação para a formulação
de problemas tomam a natureza histórica das pessoas como ponto de partida
(Chiarella, et al., 2015).

A educação questionadora afirma que as pessoas estão em constante mudança


e são existências inacabadas e incompletas em uma realidade inacabada. Esta
característica estipula que a educação deve ser uma atividade de desenvolvimento
contínuo. Como prática humanitária e libertadora, a educação problematizadora
transforma professores e alunos em sujeitos do processo educativo (De Godoy
Stênico; Paes, 2017).

3. O diálogo é o cerne da “educação para a resolução de problemas”

Freire considerava o diálogo como a essência da educação que persegue os


objetivos de liberdade e libertação. Ele ressaltou que o diálogo é o método mais
eficaz entre todas as atividades educativas. Não importa o quão “ignorante” alguém
seja, pode-se ver o mundo criticamente em um diálogo com os outros. Cada um tem
o direito de falar à sua maneira e nomear o mundo à sua maneira.

Os seres humanos nascem com o desejo de se comunicarem, e os seres


humanos estabelecem relacionamentos por meio da comunicação necessária. Sem
diálogo não há progresso para a humanidade. Mas criar uma necessidade de
diálogo entre pessoas que foram silenciadas durante séculos pela repressão cultural
dos seus governantes não é uma tarefa fácil. O diálogo iniciado pela elite dominante
é vertical. Nesse tipo de diálogo, espera-se que o educado apenas ouça e obedeça,
o que impede o educado de expressar o que pensa (Costa; Loureiro, 2017).

A conversa deve ser um relacionamento horizontal. Existem condições básicas


para que o diálogo prossiga: amor, humildade, confiança, esperança e criticidade. O
amor é a base do diálogo e do próprio diálogo. Se você não ama o mundo, não ama
a vida, não ama as pessoas, não pode dialogar.

Se você apenas vê a ignorância dos outros e se vê como dono da verdade e do


conhecimento, não conseguirá chegar às pessoas e não conseguirá parceiros de
diálogo. A confiança e a esperança são ambas a base do diálogo. Sem confiança
nas pessoas, o diálogo transformar-se-á inevitavelmente numa manipulação
paternalista; as pessoas que perderam a esperança não podem participar
verdadeiramente no diálogo. A consciência crítica só pode surgir através do diálogo
crítico (Chiarella, et al., 2015).

O diálogo como núcleo da “educação que levanta problemas” é gerado com


base nas críticas ao ensino tradicional da “educação baseada em depósitos
bancários”. No diálogo, professores e alunos são ambos sujeitos.O ensino é um
processo no qual os alunos, sob a orientação dos professores, vivenciam a realidade
analisando problemas, analisando-os e reconstruindo a realidade. No diálogo, o
conteúdo do diálogo deve basear-se nas experiências existentes dos alunos, e o
diálogo deve estimular a consciência crítica e a criatividade dos alunos (De Godoy
Stênico; Paes, 2017).

4. Características das teorias anti diálogo e da ação dialógica

Freire destacou que a grande tarefa humanitária e histórica dos oprimidos é


libertar-se e ao mesmo tempo libertar os opressores. Portanto, ele não presta
atenção apenas à ação, mas também à teoria (Chiarella, et al., 2015).

A teoria da ação cultural desenvolveu-se a partir de suas origens anti-dialógicas


e dialógicas. O contra-diálogo é uma ferramenta do opressor, o diálogo é uma
ferramenta de libertação. As principais características da teoria da ação antidialógica
são: conquista, divisão, dominação, controle e invasão cultural; enquanto as
características da teoria da ação dialógica são: cooperação, aliança, organização e
síntese cultural.

A primeira característica da ação antidiálogo é a conquista. O propósito das


pessoas que são contra o diálogo na interação com os outros é conquistá-los
gradativamente e por todos os meios. O desejo de conquistar os outros manifesta-se
sempre em ações contra o diálogo. O opressor repreende o povo e mantém-no num
estado passivo e passivo através da conquista (Costa; Loureiro, 2017).

A divisão e a dominação são outra característica fundamental das teorias de


ação dos opressores. A minoria dos opressores mantém a maioria dos oprimidos
numa posição de conquista e subordinação. Para manter o seu domínio, os
opressores mantêm os oprimidos num estado de divisão. Ideias como unidade,
organização e luta são rotuladas como perigosas pelos oprimidos (De Godoy
Stênico; Paes, 2017).

Da perspectiva dos opressores, os seus interesses residem em enfraquecer os


oprimidos, dividi-los ou tornar as diferenças entre eles mais amplas e profundas. Os
opressores acreditam que é extremamente necessário desmantelar os oprimidos
para que se contentem com o status quo.

O controle e a agressão cultural são também características importantes da ação


anti-diálogo. Por um lado, a agressão cultural é um meio para o opressor controlar
os oprimidos; por outro lado, é o resultado do controle do opressor sobre os
oprimidos (Chiarella, et al., 2015).

A cooperação, uma das características da teoria da ação dialógica, só pode ser


alcançada através da comunicação. A colaboração permite que os sujeitos da
conversa direcionem sua atenção para o mundo real. A teoria da ação dialógica
exige que os oprimidos se unam para lutar pela sua própria libertação. Os oprimidos
resistem ao controle e exigem organização.

A teoria da ação dialógica opõe-se ao autoritarismo e à indulgência, enfatizando


a autoridade e a liberdade; defende que sem autoridade não há liberdade e, da
mesma forma, sem liberdade não há autoridade. A síntese da cultura serve à
organização, e o objetivo final da organização é a libertação. Em suma, os oprimidos
devem armar-se com teorias como a cooperação, a aliança, a organização e a
síntese cultural, e usar estas teorias para orientar as ações revolucionárias dos
oprimidos para a liberdade e a libertação.

O mundo deveria estar repleto de um espírito de humanidade, em vez de manter


um status quo que sujeita as pessoas à opressão. Criar um mundo melhor e focar no
desenvolvimento humano e na libertação. Portanto, a educação deve ser
considerada como um meio para os indivíduos obterem a autoafirmação que as
pessoas reais possuem.

Através da educação, as pessoas podem ter uma compreensão correta de si


mesmas e da realidade das suas vidas, e dedicar-se à luta para mudar a realidade.
Tanto os governantes como os governados estão presos nas estruturas sociais
existentes de diferentes maneiras, e ambos precisam de ser libertados (Chiarella, et
al., 2015).

É óbvio que os oprimidos ignoram obviamente os processos sociais e estão num


estado de silêncio culturalmente reprimido. Através da educação, os oprimidos
podem tornar-se criticamente conscientes da sua realidade, redescobrir-se e
participar ativamente na mudança social futura (Feichas; Narita, 2016).

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