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A BANALIZAÇÃO DOS DANOS MORAIS NO DIREITO BRASILEIRO

CONTEMPORÂNEO

Gean Gonçalves dos Santos.


Advogado; Pós-graduando em Direito Civil e Direito Processual Civil pelo Instituto
Goiano de Direito; Goiânia, Goiás. E-mail: geangoncalves.escritorio@gmail.com.

RESUMO

O presente trabalho tem como escopo abordar os danos morais na atualidade do


judiciário brasileiro e os fatores que estão contribuindo para a banalização do instituto,
como a multiplicidade de ações judiciais, decisões inconsistentes e a falta de critérios
eficientes na quantificação dos danos. Além disso, destaca a necessidade de
reavaliação e aprimoramento das abordagens legais e jurisprudenciais para preservar
a eficácia e a relevância do instituto. A pesquisa se deu através da análise e leitura de
doutrinas, jurisprudências e acórdãos nacionais.

Palavras-chave: dano moral; dano extrapatrimonial; banalização; fixação; teoria da


readequação inflacionária dos danos morais.

1. INTRODUÇÃO

Vivemos em um mundo onde os valores estão se perdendo gradativamente


e, com isso, o número de demandas que chegam ao judiciário para tratar acerca de
supostos danos morais, não para de subir.

Em que pese essa crescente no número de processos, ao que parece, os


critérios para fixação dos danos morais pararam no tempo, seguindo parâmetros
antigos que não servem mais como base para fixação de indenização decorrente de
dano extrapatrimonial.

1
Os danos morais adquiriram uma relevância ainda maior nas últimas décadas.
A aceleração dos meios de comunicação e a mudança nos padrões sociais têm
influenciado diretamente na dinâmica das relações interpessoais.

Nesse contexto, afrontas à dignidade, honra e intimidade passaram a ocorrer


com maior frequência, exigindo uma reflexão mais profunda sobre a eficácia dos
mecanismos de reparação existentes.

Entretanto, observa-se um fenômeno paradoxal: enquanto a sociedade


enfrenta um aumento na exposição a situações que podem gerar danos morais, há
uma percepção de que a banalização desses danos pode estar ocorrendo.

A banalização dos casos de ofensa moral pode desencadear consequências


preocupantes, como a desvalorização da gravidade desses prejuízos e a diminuição
da eficácia dos mecanismos legais de reparação. Neste contexto, é essencial
investigar as causas e as manifestações dessa banalização dos danos morais no
ordenamento jurídico brasileiro.

A compreensão das raízes desse fenômeno permitirá não apenas uma análise
crítica do estado atual, mas também o desenvolvimento de propostas e soluções que
visem preservar a integridade moral dos indivíduos e fortalecer a eficácia do sistema
jurídico diante dessas questões.

Ao longo deste artigo, serão abordados aspectos históricos, sociais,


legislativos e jurisprudenciais relacionados à banalização dos danos morais, visando
contribuir para uma compreensão mais abrangente dessa problemática e fornecer
soluções para a reflexão sobre possíveis ajustes e aprimoramentos no tratamento
jurídico dessas questões no contexto brasileiro contemporâneo.

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2. HISTÓRIA DOS DANOS MORAIS E ASCENSÃO DO TEMA NO BRASIL

A noção de danos morais tem raízes históricas profundas e evoluiu ao longo


do tempo, refletindo mudanças nas sociedades e nos sistemas legais.

No século XX, houve um aumento substancial nos casos relacionados a


danos morais, particularmente à medida que as sociedades se tornaram mais
conscientes da importância do respeito à dignidade humana. Casos notórios, como
difamação, invasão de privacidade, assédio moral e discriminação, deram origem a
decisões judiciais que reconheciam a compensação por danos morais.

O desenvolvimento dos danos morais nas leis modernas frequentemente está


associado à evolução das sociedades ocidentais e à influência do direito civil. O
movimento dos direitos civis e a ampliação do reconhecimento dos direitos individuais
desempenharam um papel significativo na aceitação mais ampla dos danos morais
como uma categoria legítima.

No Brasil, um marco importante na ascensão dos danos morais foi o Código


Civil de 1916. Embora não utilizasse explicitamente o termo “danos morais”, a redação
do código1 tratava do ressarcimento por danos que não envolvessem apenas
prejuízos materiais, abrindo espaço para a compensação de danos à esfera moral e
outros interesses imateriais.

Todavia, foi com a promulgação da Constituição Federal de 1988 que houve


uma crescente conscientização sobre a importância da proteção da dignidade humana
e da integridade emocional. Esta, com a redação dos incisos V e X do art. 5º, introduziu
uma série de princípios e direitos fundamentais, estabelecendo as bases para o
reconhecimento dos danos morais como uma categoria jurídica relevante.

Assim dispõe o artigo e seus incisos:

1
Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou
causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.
3
Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
[...]
V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenização por dano material, moral ou à imagem;
[...]
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação.

Sobre o tema, Venosa observa:

Durante muito tempo, discutiu-se se o dano exclusivamente moral, isto é,


aquele sem repercussão patrimonial, deveria ser indenizado. Nessa questão,
havia um aspecto interessante: a doutrina nacional majoritária,
acompanhando o direito comparado, defendia a indenização do dano moral,
com inúmeros e respeitáveis seguidores, enquanto a jurisprudência, em
descompasso, liderada pelo Supremo Tribunal Federal, negava essa
possibilidade. De uma postura que negava peremptoriamente a possibilidade
de indenização por danos morais, inicialmente adotada pelo Supremo
Tribunal Federal, esse Pretório passou a admitir danos morais que tivessem
repercussão patrimonial até a promulgação da Constituição de 1988, que
finalmente estabeleceu o texto legal que os tribunais e a maioria da doutrina
reclamavam. (SÍLVIO DE SALVO VENOSA. 2004. p.249).

Desta forma, os danos morais foram ganhando ascensão no sistema jurídico


brasileiro, de modo que o tema, atualmente, já está pacificado, tratando-se de tema
corriqueiro nos tribunais do país.

3. CONCEITUAÇÃO DOS DANOS MORAIS

Nos primórdios, o conceito de dano moral fundava-se única e exclusivamente


no abalo/sofrimento psicológico e/ou emocional vivenciado por uma pessoa em
determinada situação.

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Trata-se, portanto, da “dor em sentido amplo, englobando os sentimentos
negativos, como a tristeza, angústia, amargura, vergonha, humilhação. É a dor moral
ou o sofrimento do indivíduo” (ANDRÉ GUSTAVO C. DE ANDRADE, p. 146).

De forma descomplicada, trata-se do dano decorrente de uma situação que


causou à pessoa um sentimento de sofrimento, vexame ou humilhação, atingindo a
sua saúde mental, sua dignidade e sua honra.

Antônio Jeová assim conceitua os danos morais:

Enquanto no dano patrimonial o ofendido experimento um prejuízo que é


apreciado de forma pecuniária, aparecendo em seu bolso o menoscabo, o
dano moral também acarreta um prejuízo. Porém, é valorado sob ótica não
pecuniária, porque o dano moral resulta da lesão de um interesse espiritual
que está relacionado com a intangibilidade da pessoa humana. O que
configura o dano moral é aquela alteração no bem-estar psicofísico do
indivíduo. Se do ato de outra pessoa resultar alteração desfavorável, aquela
dor profunda que causa modificações no estado anímico, aí está o início da
busca do dano moral. (ANTÔNIO JEOVÁ SANTOS, 2001, p. 100).

Na jurisprudência, o Resp n.º 844.736 de 2009 explica de forma bem clara o


que o dano moral deve ser reputado como a dor, vexame, sofrimento ou humilhação
que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do
indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar.

Atualmente, a conceituação do instituto ampliou-se, passando a alcançar,


além da noção de abalo/sofrimento psíquico ou emocional, a lesão a qualquer bem
extrapatrimonial juridicamente tutelado.

A respeito, Francisco Amaral leciona:

O direito brasileiro considera dano moral o que decorre da lesão de bem


jurídico não patrimonial, compreendendo os bens objeto dos direitos da
personalidade, os direitos políticos e sociais, e os direitos ou situações
jurídicas de família.
5
[...]
O dano moral ou extrapatrimonial compreende, portanto, o dano resultante
da lesão de direitos extrapatrimoniais da pessoa, como são os direitos
subjetivos à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e também direito à
saúde, este um direito social, e ainda os direitos políticos, sociais e de
família. (AMARAL, 2018, p. 957).

A 4ª Turma do STJ, cujo relator Luis Felipe Salomão, proferiu decisão que
reconheceu e aceitou as duas principais correntes doutrinárias contemporâneas sobre
o dano moral. Trata-se do REsp 1.245.550; vejamos:

A atual Constituição Federal deu ao homem lugar de destaque entre suas


previsões. Realçou seus direitos e fez deles o fio condutor de todos os ramos
jurídicos. A dignidade humana pode ser considerada, assim, um direito
constitucional subjetivo, essência de todos os direitos personalíssimos e o
ataque àquele direito é o que se convencionou chamar dano moral. Portanto,
dano moral é todo prejuízo que o sujeito de direito vem a sofrer por meio de
violação a bem jurídico específico. É toda ofensa aos valores da pessoa
humana, capaz de atingir os componentes da personalidade e do prestígio
social. O dano moral não se revela na dor, no padecimento, que são, na
verdade, sua consequência, seu resultado. O dano é fato que antecede os
sentimentos de aflição e angústia experimentados pela vítima, não estando
necessariamente vinculado a alguma reação psíquica da vítima. Em
situações nas quais a vítima não é passível de detrimento anímico, como
ocorre com doentes mentais, a configuração do dano moral é absoluta e
perfeitamente possível, tendo em vista que, como ser humano, aquelas
pessoas são igualmente detentoras de um conjunto de bens integrantes da
personalidade.

Tal atualização na conceituação do dano moral é que permite hoje aos


tribunais do país o reconhecimento de dano moral em diversas outras esferas que
não ao abalo psicológico, tais como o dano temporal (teoria do desvio produtivo do
consumidor), o dano existencial, o dano estético, dentre outros.

Forte na doutrina e jurisprudência acima mencionadas, podemos concluir,


portanto, que o dano moral consiste em qualquer ato que ofenda os valores

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fundamentais da pessoa, tendo o potencial de afetar aspectos essenciais de sua
identidade e reputação social, além do seu estado psíquico.

4. PROBLEMÁTICA ATUAL ACERCA DOS DANOS MORAIS

4.1. A PLURALIDADE DE AÇÕES E O SURGIMENTO DA TEORIA DO MERO


ABORRECIMENTO

A abrangência da conceituação dos danos morais, fez com que o judiciário


fosse abalroado com diversas demandas infundadas visando apenas o caráter
pecuniário dos danos morais, sem buscar, de fato, a justiça.

Essa crescente desacelerada, buscando apenas o caráter financeiro dos


danos morais, corroborou para a criação de uma jurisprudência defensiva, de modo a
coibir o protocolo de diversas ações sem nexo; trata-se da tese do mero
aborrecimento.

O conceito de "mero aborrecimento" refere-se à ideia de que nem todo


dissabor, inconveniente ou irritação na vida cotidiana é passível de ser considerado
como dano moral.

A teoria destaca a necessidade de que o desconforto experimentado seja mais


do que simplesmente irritante, sendo preciso atingir um grau de intensidade que
transcenda a normalidade das contrariedades do dia a dia. Em outras palavras, nem
toda contrariedade ou dissabor mínimos são considerados passíveis de indenização
por danos morais.

4.2. O MÉTODO BIFÁSICO PARA A VALORAÇÃO DOS DANOS MORAIS

Superada a problemática acima e reconhecida, de fato, a ocorrência do dano


moral, cabe ao julgador fixar o valor da indenização, o que é um problema na justiça
do país atualmente.

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A fixação dos danos morais deve ser feita de modo a compensar a vítima pelo
abalo vivenciado (caráter compensatório) e também, de punir o causador do dano de
forma que não venha a cometer novamente o mesmo ato (caráter punitivo).

Além disso, o julgador deve se atentar de modo a evitar reparações irrisórias


e, ainda, o enriquecimento sem causa.

Alguns autores dissertam ainda acerca de uma terceira função da indenização


por danos morais, qual seja, a função preventiva. Esta tem o intuito de convencer as
demais pessoas da sociedade a não praticarem o mesmo ato; como uma forma de
lição, para demonstrar que tal ato, caso cometido, será futuramente punido, levando
como base o precedente que ora se forma.

O método adotado pelos tribunais do país para definir o montante das


indenizações por danos morais é o bifásico. Neste, o quantum da indenização é
perquirido em duas fases: 1) análise e comparação com precedentes jurisprudenciais;
e, 2) análise das circunstâncias do caso concreto.

O problema desta fixação está na primeira fase do método supracitado, a


análise e comparação com precedentes de casos análogos.

Tal análise é de suma importância para chegar a uma decisão justa e


igualitária, de modo a tentar uniformizar as decisões judiciais e entregar uma justiça
uniforme para casos semelhantes.

Todavia, tirando essa análise e comparação fática que é feita com os


precedentes jurisprudenciais, é feita também uma análise comparativa no sentido de
valorar os danos morais no mesmo quantum da decisão paradigma anteriormente
firmada. Ocorre que, ao fazer tal análise, os julgadores, em alguns casos, não levam
em consideração o decurso de tempo de uma indenização à outra e, via de
consequência, a atualização monetária que o valor fixado naquela oportunidade
sofreu.

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Em palavras mais simples, o valor de uma indenização imposta no passado,
não corresponde mais ao mesmo valor de uma condenação atual, haja vista o decurso
de tempo e, consequentemente, a correção monetária sofrida por esse valor
decorrente da inflação.

Na tentativa de solucionar o problema acima é que surgiu a teoria da


readequação inflacionária dos danos morais.

4.3. TEORIA DA READEQUAÇÃO INFLACIONÁRIA DOS DANOS MORAIS

A teoria da readequação inflacionária dos danos morais surgiu em novembro


de 2022 no XVI Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor realizado pelo
Brasilcon e sua autoria é da Dra. Thays Curty, no sentido de que, “ao fixar o valor dos
danos morais, a partir de precedente análogos, as decisões judiciais devem
considerar a eventual redução do poder de compra do consumidor ao longo do tempo”.

Em suma, tal teoria diz que as decisões judiciais devem considerar a eventual
redução do poder de compra do consumidor ao longo do tempo, buscando tão
somente que seja aplicada uma recomposição dos parâmetros utilizados para o
arbitramento da indenização.

Esta tese ganha forte relevância mediante análise de julgados recentes em


que as indenizações foram arbitradas mediante parâmetros estabelecidos anos atrás,
embora estejam replicadas em decisões mais recentes.

O tempo é fator de extrema relevância para que as indenizações atuais não


se revelem injustas às vítimas e irrelevantes aos ofensores para que sejam
desrespeitado o caráter didático-pedagógico do dano moral, uma vez que com o
decorrer do tempo o valor das indenizações foi se deteriorando em virtude da
desvalorização da moeda causada pela inflação.

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É inegável a desatualização das condenações por danos morais por meio de
parâmetros antigos, independentemente do valor utilizado como referência, sendo
necessário rebalancear o valor indenizatório já defasado de modo que sejam
atendidos não somente os princípios constitucionais da razoabilidade e
proporcionalidade, mas também a função didático-pedagógica do dano moral, sob
pena deste instituto perder sua função.

Graças à teoria acima é que os danos morais vêm se amoldando à realidade


do país, de modo que os tribunais pátrios já vêm utilizando da teoria para firmar
entendimentos e, consequentemente, fixar uma indenização justa e que atenda os
três parâmetros da indenização por dano moral, o compensatório, o punitivo e o
preventivo.

Vejamos o entendimento firmado pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado


de Goiás em atenção à teoria ora em comento:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO C/C OBRIGAÇÃO


DE FAZER. PRELIMINAR. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO.
INOCORRÊNCIA. RETIRADA DO TRANSFORMADOR DE
PROPRIEDADE RURAL. AUSÊNCIA DE AVISO PRÉVIO. OMISSÃO
INJUSTIFICADA E PROLONGADA NO RESTABELECIMENTO DA
ENERGIA ELÉTRICA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO
MORAL CONFIGURADO. MONTANTE INDENIZATÓRIO ADEQUADO.
SENTENÇA CONFIRMADA. 1. O simples ato de cumprimento da ordem em
antecipação de tutela não implica a perda do objeto da demanda ou a falta
de interesse processual, pois se reveste de provisoriedade e precariedade,
motivo pelo qual é necessário o julgamento do mérito da causa, para definir
se a parte beneficiada, de fato, fazia jus a tal pretensão. 2. A
responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras
de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não
usuários do serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da Constituição
Federal (Tema 130/STF). 3. A interrupção de energia elétrica configura
dano moral se comprovada a retirada arbitrária de transformador de
propriedade rural do consumidor sem aviso prévio ou razão revelante, e
quando injustificada a omissão e atestado o descaso na religação da
energia por período de tempo superior a seis anos, especialmente se
inexistentes motivos ou provas que demonstrem a inviabilidade de uma
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solução imediata ou a curto prazo para o problema. 4. Mantém-se o
montante indenizatório quando arbitrado em valor adequado para
resguardar a compensação à parte lesada, observada a necessária
adequação inflacionária, bem como os critérios da proporcionalidade
e da razoabilidade (Súmula 32/TJGO), na busca de desestimular a
reiteração do ato ilícito e punir o ofensor. APELAÇÃO CÍVEL
CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - AC: 55630259320198090051
GOIÂNIA, Relator: Des(a). DESEMBARGADOR MARCUS DA COSTA
FERREIRA, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ). (Grifado).

Desta feita, tendo em vista os critérios atualmente utilizados para fixação do


quantum a título de danos morais, tem-se que deve ser levado em consideração o
decurso de tempo, a fim de evitar que a fixação da indenização seja defasada em
decorrência da inflação e, via de consequência, não consiga atingir a sua finalidade
compensatória e, principalmente, a punitiva.

4.4. A TRIVIALIZAÇÃO DOS VALORES ARBITRADOS A TÍTULO DE DANOS


MORAIS

Outro problema trazido pela pluralidade de ações visando o caráter monetário


dos danos morais é a incorreta ou baixa valoração do quantum indenizatório; de modo
que, na maioria dos casos, o valor fixado é insuficiente para realmente reparar o dano
sofrido pela vítima e, muito menos, para punir o causador do dano para que não volte
a cometer o mesmo ilícito.

Trazendo para o contexto prático, uma situação que por diversas vezes
ocasiona a propositura de demandas visando a reparação por danos morais é a falha
nos sistemas de segurança de bancos que permitem a ocorrência de fraudes, gerando
prejuízos aos clientes/consumidores, não só de natureza material, mas também, por
óbvio, de natureza moral.

Apenas como exemplo, para explicar aonde se quer chegar com o presente
tópico, vamos utilizar o Banco do Brasil, que por diversas vezes figura como réu
nessas demandas do exemplo acima trazido.

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De acordo com o Relatório Anual2 do Banco do Brasil, o lucro líquido da
instituição no ano de 2022 foi de R$ 31,8 bilhões.

Levando em consideração que a média das indenizações por danos morais


no país gira em torno de R$ 10.000,00 – em um mundo utópico –, tem-se que, para
que o banco pague uma indenização desse porte, são necessários menos de 1 hora
de funcionamento durante o ano. Tal fato chega a beirar o absurdo.

Por essa razão – incorreta e baixa valoração da indenização dos danos morais
– é que o assunto está sendo banalizado.

Está saindo mais barato pagar as indenizações do que investir em um sistema


de segurança melhor para evitar que as situações que ocasionaram a demanda volte
a ocorrer.

Por óbvio que essas instituições irão escolher e preferir pagar as


indenizações, visto que se tratam de empresas que visam o lucro e estão sempre
buscando a opção mais barata.

Desta forma, ante os fatos acima trazidos, tem-se que enquanto não se adotar
uma medida mais dura com relação à fixação dos danos morais, os problemas atuais
que estamos vivendo continuarão a persistir, banalizando o instituto, que é tão
importante para a sociedade, conforme restou demonstrado no presente trabalho, haja
vista que visa garantir direitos fundamentais da população.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Da análise detalhada acerca dos danos morais no Brasil na atualidade, torna-


se evidente a urgência de enfrentar os desafios que contribuem para a banalização
desse instituto.

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https://www.bb.com.br/docs/portal/gesem/RelatorioAnual2022.pdf
12
A pluralidade de ações representa um cenário que exige uma resposta
ponderada do judiciário para evitar a sobrecarga de processos infundados.

A problemática da fixação dos valores indenizatórios, marcada pelo método


bifásico, destaca a necessidade de revisão e readequação inflacionária, assegurando
que as compensações permaneçam justas e proporcionais ao longo do tempo.

A teoria da readequação inflacionária dos danos morais surge como uma


abordagem promissora para lidar com a defasagem dos valores indenizatórios,
proporcionando uma correção monetária que preserve a eficácia do instituto.

Contudo, é fundamental que essa teoria seja aplicada com discernimento,


considerando não apenas a correção econômica, mas também os princípios
constitucionais da razoabilidade, proporcionalidade e a função didático-pedagógica do
dano moral.

Ademais, o atual cenário, em que as indenizações muitas vezes representam


uma fração mínima dos lucros das empresas, compromete a eficácia punitiva e
preventiva do instituto, enfraquecendo sua capacidade de desestimular condutas
ilícitas e proteger efetivamente os direitos fundamentais.

Em síntese, a preservação da relevância e eficácia dos danos morais no


direito brasileiro contemporâneo exige uma abordagem multifacetada. A revisão dos
critérios de fixação, a ponderação na aplicação da teoria da readequação inflacionária
e a conscientização quanto à função social do instituto são passos cruciais para
assegurar que a justiça seja verdadeiramente alcançada, promovendo a dignidade e
integridade dos indivíduos na sociedade.

REFERÊNCIAS

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Disponível em:

13
https://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista24/revista24_143.pdf.
Acesso em: 08/12/2023.

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tese do 'mero aborrecimento'. Disponível em:
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LIMA, André Barreto. Banalização dos processos referentes a danos morais.
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https://www.jusbrasil.com.br/artigos/o-dano-moral-ao-longo-da-historia/445407882.
Acesso em 08/12/2023.

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Sem Autor. O método bifásico para fixação de indenizações por dano moral.
2018. Disponível em:
https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticiasantigas/2018/2018-
10-21_06-56_O-metodo-bifasico-para-fixacao-de-indenizacoes-por-dano-moral.aspx.
Acesso em: 09/12/2023.

Sem autor. Relatório Anual 2022. Disponível em:


https://www.bb.com.br/docs/portal/gesem/RelatorioAnual2022.pdf. Acesso em:
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Atlas, 2015.

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