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Centro Ecumênico de Estudos Religiosos Superiores do Estado do Maranhão

CEERSEMA

Hildenia Mendes dos Santos

O LÚDICO NA APRENDIZAGEM
JOGOS NA EDUCAÇÃO

MATA ROMA - MA
2018
HILDENIA MENDES DOS SANTOS

O LÚDICO NA APRENDIZAGEM
JOGOS NA EDUCAÇÃO

Monografia de Conclusão de Curso


de Graduação em opedagogia
apresentada ao CEERSEMA
Orientador: Prof. Bernarda Ramos

MATA ROMA - MA
2018
S236l

Dedico este trabalho primeiramente a Deus,


pois sem ele nada seria possível, a minha
família pela compreensão em todos os
momentos desta caminhada, e a todos que
contribuíram diretamente e indiretamente
com o meu progresso profissional.
AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por me dar força e coragem nesta caminhada. A minha


família pelas palavras de incentivo e ter acreditado na minha capacidade.
EPÍGRAFE

Como professor devo saber que sem


a curiosidade que me move que me
inquieta, que me insere na busca, não
aprendo nem ensino. (FREIRE, 1996)
RESUMO:

Este trabalho tem por objetivo refletir sob O Lúdico no Processo de


Aprendizagem, tendo como resultado de uma pesquisa bibliográfica, uma vez que os
jogos e brincadeiras são excelentes oportunidades de mediação entre o prazer e o
conhecimento historicamente constituído, já que o lúdico é eminentemente cultural,
avaliando seus limites e possibilidades no processo de aprendizagem. Brincar na
infância é o meio pelo qual a criança vai organizando suas experiências,
descobrindo e recriando seus sentimentos e pensamentos a respeito do mundo, dos
objetos e das pessoas com as quais convive. Sendo assim, quanto mais variável for
a brincadeira, mais elementos serão oferecidos para o desenvolvimento mental e
emocional da criança.
Portanto, a ludicidade ajuda no aprimoramento da educação, pode ser
crítica e criativa, de acordo com a demanda e a realidade da sala de aula e, junto ao
educador desenvolve possibilidades que permitem aos educandos a experimentar
situações que interferem no ensino, bem como a importância de um educador
mediando esta relação de ensino aprendizagem com a ludicidade.

PALAVRA-CHAVE: Lúdico; aprendizagem; educação; cultural.


ABSTRACT

This work aims to reflect on the Playful Learning Process, resulting in a


literature, since the games and activities are excellent opportunities for mediation
between pleasure and knowledge historically constituted, since the play is eminently
cultural, evaluating its limits and possibilities in the learning process. Play in
childhood is the means by which the child willorganize their experiences, discovering
and recreating their feelings andthoughts about the world of objects and people that
live. Thus, the morevariable is a joke, more elements will be offered to the mental
and emotional development of children.
Therefore, the playfulness helps in improving the education can be critical
and creative, according to the demand and the reality of the classroom and, with the
teacher develops opportunities that allow students to experience situations that
interfere with learning, as well as the importancean educator mediating this
relationship of teaching and learning withplayfulness.

KEYWORD: Playful; learning; education; culture.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................10

1. CAPÍTULO I: A LUDICIDADE NA EDUCAÇÃO ...............................12


1.1 Jogo, brinquedo e brincadeira .........................................................17
1.2 O lúdico e a cultura regional ............................................................23
1.3 Ludoteca o lugar dos sonhos ...........................................................30

2. CAPÍTULO II: O JOGO E A PEDAGOGIA DO MOVIMENTO NA


EDUCAÇÃO
BÁSICA ............................................................................36
2.1 O jogo e a aprendizagem .................................................................43
2.2 A classificação dos jogos .................................................................49
2.3 As características do jogo ................................................................54

CONSIDERAÇÕES
FINAIS ...................................................................60

REFERÊNCIAS .....................................................................................62
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INTRODUÇÃO

O presente trabalho foi desenvolvido para analisar as contribuições do


lúdico para o processo de ensino aprendizagem, estabelecendo os limites entro o
brincar e o aprender. É, portanto um desafio para quem deseja construir
aprendizagens e estratégicas educacionais, levando-se em conta essa evolução
pela qual trafegam educador e educando.
Conforme a criança vai evoluindo em seu brincar, a criança vai passando
dos jogos imaginários para os jogos em que se apresentam regras. Assim o brincar
passa a ser um fator de conscientização de papeis sociais, inclusive os de
estratificação de poder e de normas.
O lúdico é um assunto bastante abrangente, que vem sendo estudado e
discutido desde a antiguidade pelos filósofos e estudiosos que viveram antes da era
cristã, pois acreditamos que todo ser humano já vinha em sua essência com uma
inclinação para a diversão e para os jogos, o que explicava, de certa forma, alguns
costumes de povos primitivos em suas atividades de dança, caça, pesa e lutas,
como sendo aspectos de divertimento e prazer natural.
Entende-se que o jogo é um facilitador da aprendizagem, é bem mais
desenvolvido por teóricos e pedagogos do que há algum tempo, até mesmo pela
preocupação cada vez maior em estar aliando o ensino a metodologias que
garantam eficazes resultados na educação; e por se tratar de algo, dinâmico,
exigindo um certo cuidado e saber no seu planejamento execução.
Cury (2003), em suas considerações em torno da educação, afirma que
“Bons professores possuem metodologia, professores fascinantes possuem
sensibilidade”. Não adianta ser só didático, trabalhar jogos de cunho pedagógico
precisa-se ir muito além das teorias, até porque os jovens de hoje, dentro de um
mundo globalizado, onde a informação vem principalmente de forma instantânea,
não pensam da mesma forma que os do passado, ou seja, o tempo todo ocorre um
processamento intenso de dados e informações.
Sendo assim, cabe ao professor mediar o processo de ensino
aprendizagem de jogos e esportes, que será mais consistente quanto maior for as
possibilidades de interação das crianças com as regras, gestos, espaço, material,
seus pares e o “mundo” ao seu redor. Uma intervenção qualificada pode ajudar os
11

estudantes a se aproximarem deste objeto de conhecimento, que é o jogo. Neste


sentido é importante destacar as concepções de VYGOTSKY (1989) que afirma que,
quando a criança brinca, modifica seus hábitos e comportamento usuais, mostrando-
se mais e em maior grandeza.

No brinquedo, é como se ele fosse maior do que é na


realidade. Como no foco de uma lente de aumento, o
brinquedo contém todas as tendências do
desenvolvimento sob forma condensada, sendo ele
mesmo uma grande fonte de desenvolvimento. Apesar da
relação brinquedo – desenvolvimento pode ser
comparada à relação instrução – desenvolvimento, o
brinquedo fornece ampla estrutura básica para mudanças
das necessidades e da consciência. (VYGOTSKY, 1989.
p. 117)

Cabe destacar neste contexto, que o lúdico pode ser utilizado como
elemento mediador da relação adulto e criança. Assim, a inclusão de brinquedos e
brincadeiras como parte integrante de métodos e procedimentos educativos devem
ser constantes na ação de planejamento e regência realizada pelo professor
responsável pela sala de aula.
12

CAPÍTULO I: A LUDICIDADE NA EDUCAÇÃO

A ludicidade embora seja um conteúdo estudado pavorosamente na


atualidade pelos diversos profissionais da área de educação não é um assunto tão
novo quanto parece. Nos primórdios do século XX, a sócia-antropologia dava os
seus primeiros passos na compreensão do que é ser lúdico, apesar de estudado e
discutido por uma diversidade de autores, definir o conceito de ludicidade torna-se
uma prática bastante difícil devido a diversidade de experiências e procedimentos
que aparecem com esta nomenclatura.
Ao analisarmos etimologicamente a palavra lúdico, que vem do latim ludos,
ludere, observamos a abrangência que a mesma nos demonstra. Huizinga (1999)
traz um campo de significação extremamente vasto, utilizando o termo lúdico na
abrangência dos jogos infantis, da recreação, das competições, das representações
litúrgicas, teatrais, e dos jogos de azar. Foi ele o integrador do conceito de jogo com
o de cultura em sua perspectiva histórica – educacional, que sua vez buscou
compreender até que ponto estes estavam correlacionados com o caráter lúdico.
Este historiador holandês, em seu livro Homo Ludens, mostra a presença
extremamente ativa de certo fator lúdico em todos os processos culturais, visto que
o impulso social do espírito de competição lúdica e muito mais antigo que a cultura,
afirmação esta demonstrada pelo importante lugar que as competições, habilidades,
força e perseverança tiveram e ainda tem na cultura social, seja ela puramente para
o divertimento ou até mesmo em seu próprio ritual.
O lúdico traz um interessante aspecto relacionado à sua existência, a
medida que não é retratado apenas como um fenômeno do ser hominal, mas como
um fenômeno de toda e qualquer espécie animal, pois a sua caracterização não
pode ser realizada como algo puramente fisiológico ou biológico, ela transcende ao
racionalmente consistente, algo palpável e de conceito altamente definido, na
demonstração do “instinto” do princípio ativo fica em total evidência, pois a medida
que encerramos na atividade lúdica um sentido de sua realização fica implícito a
presença de um elemento não material em sua própria essência.
A não materialidade existente em sua essência e pontuada pela
manifestação do sentimento em sua realização, não sendo possível negar o pode da
fascinação e a intensidade em que ocorre a sua prática. Quando observamos
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referentes ao ato lúdico é fácil encontrar alguns questionamentos utilizados pela


maioria em seus estudos, onde buscam respostas superficiais acerca da
compreensão de questões lúdicas, tais como: o que é o jogo em si mesmo? O que
ele significa para seus jogadores?
Visando encontrar respostas para estes questionamentos, os
pesquisadores utilizam métodos quantitativos das ciências experimentais, sem antes
disso prestarem atenção em seu caráter profundamente estético, deixam de lado a
característica fundamental do jogo como: o que há de realmente de divertido no
jogo? Por que o jogador se deixa absorver inteiramente por sua paixão? Por que
uma multidão pode ser levada ao delírio por um jogo de futebol? Por que a criança,
e até mesmo o bebê, grita quando sente prazer?
Quando adentramos nestas questões mais profundas é que poderemos
compreender a origem do ato lúdico, visto que se a intensidade da atividade lúdica e
o poder do jogo em fascinar não podem ser explicadas por uma análise biológica,
esta falta de resultado nos traz o esclarecimento que a própria essência é a
característica primordial do jogo.
Há grande desacordo nas tentativas de definições biológicas acerca do
lúdico. Muitos definem suas origens e fundamentos como um meio de descarga das
energias vitais em demasia, outros o caracterizava como satisfação de seus instintos
de imitação, ou até mesmo como necessidade de distensão, perpassando pela
crença que o ato lúdico era um mecanismo de preparação para as atividades sérias
que a vida irá lhe exigir até a idéia de ser ele uma atividade de autocontrole, ou até
mesmo como um impulso inato exercer determinada faculdade ou desejo de
dominação sentida pelos competidores.
Uma forte e esclarecedora citação trazida por Huizinga (1999) nos leva
uma fonte reflexão acerca de todas as tentativas de definições acerca do lúdico,
“O mais simples raciocínio nos indica que a natureza poderia, igualmente,
ter oferecido a suas criaturas todas essas úteis funções de descarga de energia
excessiva, de distenção após um esforço, de preparação para as exigências da vida,
de compreensão de desejos insatisfeitos, etc.; sob a forma de exercícios puramente
mecânico. Mas não, ele nos deu a tensão, a alegria, e o divertimento do jogo”.
O lúdico em seu nível mais amplo, ultrapassa a esfera da vida humana,
sendo impossível ele ter algum fundamento em qualquer elemento racional, pois se
racionalizamos a sua existência estaríamos deixando de lado o que ocorre de
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fenômeno altamente lúdico em um cão ao encontrar o seu dono após um longo dia
sem o ver, ou até mesmo um gato ao se envolver com o seu novelo de lã. A sua
existência não está relacionada a um determinado grau de racionalização nem muito
menos a níveis de civilização ou concepção de universo, de forma a não possuir um
termo geral que o defina.
Luckesi (1998) traz a compreensão de ludicidade em uma perspectiva mais
abrangente, implicando em um “fazer” humano mais amplo do que “divertimento” por
não dizer somente a presença de jogos e brincadeiras, mas também um sentimento,
atitude do sujeito participante, que se refere a um prazer de celebração em função
do envolvimento genuíno com a atividade.
A essência da função lúdica referenciada no jogar é uma grande
propulsora da diversão, da aprendizagem, do prazer e até mesmo segundo Vygotsky
(1998), do desprazer, digo isto pela medida que se processa algumas atividades em
trazer a tona determinados desconfortos que não são encarados de forma tão
prazerosas, sendo considerado por muitos como algo não divertido.
Se tratarmos o divertimento como zombarias, então a atividade jamais será
lúdica, pois estes dois termos não possuem o mesmo significado. O divertimento
não está caracterizado por agressão e ou intolerância, desqualificação e exclusão,
não sendo consideradas atividades lúdicas aquelas que expõem os seus
participantes ao ridículo e ou objeto de piadas, só podendo dar qualificação a
atividade de lúdica ou não lúdica a depender da experiência de quem dela participa.
A atividade lúdica não é, necessariamente, divertida, ela pode ser divertida
e não lúdica, divertida e lúdica, e não divertida e lúdica. Esta separação meramente
didática, visto que embora o fator divertimento não apareça no ponto de vista do
visível, ele estará vigente em seu intimo pelo simples fato do divertimento ser uma
representação da sua essência, e sua essência é lúdica, e é nela onde se processa
a vivência plena de experiências.
“... a ludicidade é redefinida como uma experiência interna decorrente do
envolvimento intenso, pleno e integral dos seres humanos nos acontecimentos, que
pode existir em qualquer atividade humana, brincadeiras, jogos, trabalhos,
midiatizada por este sentimento de entrega e ação”. (Ramos, 2003)
Portanto, a ludicidade neste campo da essência, por acreditar que o ato de
brincar e o de jogar e inerente ao ente humano. Sabiamente Huizinga (1999) traz
uma grande reflexão onde retrata a idéia de que reconhecer jogo é forçosamente,
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reconhecer o espírito, pois o jogo, seja qual for a sua essência, não é material.
Sendo totalmente contrário ao determinismo de um mundo regido por força cegas.
A brincadeira, os jogos, o brinquedo, enfim o que tiver contido no campo de
abrangência lúdica, como já foi dito, manifesta sentimento de prazer, felicidade e
alegria, e concomitante a estes vem o sorriso que é tido em nossa sociedade como
o símbolo de não – seriedade, de modo a relacioná – lá com atividade lúdica.
Neste sentido, Huizinga (1999) em seu estudo ao afirmar que a atividade
lúdica pode ser encontrada em todas as ações do homem, ele descreve o jogo como
elemento cultural, apontando – lhe dentre tantas outras esta características da não
seriedade. Para tal, a sua compreensão se faz de extrema importância para não
termenarmos generalizado o lúdico como algo “não sério”.
Haja vista que o jogo de xadrez, uma partida de voleibol, ou até mesmo
uma partida de futebol é possível constatar que os seus jogadores não expressam
em seu contexto de atuação nenhuma característica de risco, devido a sua prática
seja considerada como algo extremamente sério.
Vale, portanto, esclarecer a questão do caráter “não – sério” apontado
como elemento lúdico, visto que esta colocação não está relacionada ao ato de não
haver seriedade no lúdico, Kishimato (2003) diz que quando se exerce a função
lúdica em sua essência se faz ela de forma bastante compenetrada, portanto esta
falta de seriedade está afeita ao cômico, ao risco que o acompanha na maioria das
vezes, se contrapondo ao trabalho, considerado por ele como atividade séria.
Por ser uma atividade séria e estar disponível a todos sem descriminação
de sexo, cor, raça, gênero ou muito menos de classificação biológica, merece uma
melhor atenção na sua utilização enquanto prática de ensino onde favorece a
apreensão do real, envolvendo o imaginário e o símbolo, através da utilização ou
não do uso de regras com estruturas formais.
A atividade lúdica, de acordo com Bahia (2006), deve consistir em uma
forma da criança descobrir o mundo, explorar e se relacionar, visto que em seu
mundo de descoberta, de explosão motora, de exploração do espaço, constrói e
socializa o conhecimento. A sua utilização nos ambientes de aprendizagem é motivo
de vários estudos na atualidade, pois é através da identificação do que é realmente
um ato lúdico e a sua diferenciação que é possível caminhar com mais clareza, visto
que a sua utilização nas práticas de ensino continua escassa, ou quando não raro,
utilizadas de forma errônea, em que seus professores se apropriam do jogo, ditando
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suas regras e violentando a naturalidade de sua criação e a exteriorização da sua


essência.
Ao se deparar com dificuldade a medida que o educando vai
estabelecendo métodos de solucionar problemas e exauri seu grau de dificuldade,
ele acaba por se inserir nos processos trazidos por Piaget (1990) quando se fala de
organização e adaptação no foco ensino-aprendizagem. Em seu primeiro momento
o educando se organiza como ser vivo, determinado para encontrar sua meta.
Inserido em um tempo e espaço, a ponto de fazer as suas trocas, o
educando, à medida que vão sendo impostas mudanças constantes, vai buscando
adaptar-se de forma a envolver-se em dois aspecto integrados; o de assimilação e o
de acomodação. Para este autor não há um novo conhecimento sem que haja em
seu ser algo estruturado anteriormente, de forma a intermediar a sua passagem para
a acomodação que ocorre a medida que suas questões cognitivas se modificam em
função do meio dando-se a transformação, e em conseqüência a reorganização
dessa estrutura mental.
Portanto, ao adentrarmos na essência da atividade lúdica, no ato lúdico ou
no processo de formação lúdica, podemos discuti-lo em um campo epistemológico
em todos as suas diferenças, mas uma coisa ela possuirá na integra: a singularidade
referenciada aos jogos, brinquedos e brincadeiras, enfim, conteúdos lúdicos que
possibilitam a criança a exploração e ao conhecimento do mundo e das relações que
a cercam, dando também suporte a elaboração de frustrações, desprazeres que são
trazidos com a percepção que nem sempre seus desejos podem ser satisfeitos,
sendo estes um dos meios que favorecem aos educando construírem sua
individualidade, auxiliando –o a tornar-se um ser autônomo e compreender, por fim,
a dinâmica da vida.

1.1 Jogo, brinquedo e brincadeira

De acordo com o que foi citado anteriormente, posso afirmar que o lúdico é
uma atividade que engloba um campo altamente vasto no que se refere a
abrangência de seus estudos.
Neste subtítulo tratarei de esclarecer questões referenciadas nos termos
que mais importa acerca de uma prática lúdica que é compreensão do jogo, do
brinquedo e da brincadeira, abarcando a sua conceituação e importância de modo a
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esclarecer as suas diferenças e o poder de sua utilização nos ambientes de ensino,


sejam qual for.
Quando se tenta definir o jogo com um conceito fechado nos coloca em
uma situação altamente arriscada, visto que cada um pode analisar do modo que o
entende, gerando, portanto diferentes conceitos. Se pedirmos para pensarem neste
exato momento sobre exemplos de jogos, temos certeza que uma diversidade deles
passará em sua mente, podendo ser eles em diferentes aspectos, podem ter
pensado em jogos como amarelinha, jogos com bola, dominó, jogo da velha, brincar
de “casinha”, jogos políticos. Muito embora estes possuam a mesma denominação,
cada um possui a sua especificidade.
Uma das educadoras que buscam em seus estudos trazer à tona a
diferença de conceituação destes conteúdos lúdicos aqui no Brasil é Kishimoto
(2003), onde afirma que os termos entre jogo, brinquedo e brincadeira ainda são
empregado de forma indistinta, demonstrando um nível um tanto baixo de
conceituação deste campo.
Então, vos pergunto, qual é a diferença entre jogo e brinquedo? Qual a
relação entre o jogo e brincadeira? Qual a comunicação existente entre brincadeira e
o brinquedo? Para desatar este nó, este amontoado de significações, trago algumas
reflexões acerca destes mediadores pedagógicos a fim de disponibilizar maior
clareza neste campo.
O jogo pode ser visto como:
 O resultado de um sistema linguístico que funciona dentro de um
contexto social;
 Um sistema de regras;
 Um objeto.
Neste primeiro significado tratamos o jogo como um sistema linguístico
devido a dependência linguística de cada contexto social que o mesmo se insere. As
línguas exigem respeito de uma variedade de regras que não estão referenciadas
com a ordem de mundo, sua origem não é compreender a realidade mas sim
manipulá-la simbolicamente pelos desejos da vida cotidiana. Portanto o jogo neste
âmbito não é particular de nenhuma ciência, mas ao seu uso cotidiano.
O jogo assume uma característica desenvolvida por todo o seu contexto
sócio-histórico, de forma a assumir imagem, sentido e símbolo que cada povo,
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sociedade e cultura lhe atribui, nos demonstrando que ele modifica-se em função do
meio cultural e da época em que o sujeito está inserido. Na atualidade, podemos
observar a quantidade de espadas plásticas espalhadas pelas lojas de brinquedo. A
tempos remotos a espada era um instrumento de bastante utilidade no que se refere
a necessidade de defesa, passando de arma para brinquedo, comprovando a
construção da imagem do símbolo pelos valores e modo de vida expressos pela
linguagem.
Já no segundo caso, lhe é dada a idéia de um sistema de regras que
possui um conjunto seqüencial que especifica sua determinada modalidade. O jogo
de futsal e o handebol são realizados na mesma quadra, no mesmo ambiente, o que
vai diferenciá-las é a diferença de suas regras explicitas. São regras do jogo que vai
determinar esta diferença, mesmo quando utilizado o mesmo material e espaço, o
objeto bola e o espaço quadra serão os mesmos, mas as estruturas seqüenciais nos
permite caracterizar a diferenciação de cada jogo.
Para finalizar esta compreensão da triplicidade de visões acerca do jogo,
trago-o no ponto de vista de um objeto devido à necessidade dele, muitas vezes,
necessitar-se materializar para realmente acontecer e ser possível a sua execução,
a exemplo como poderíamos caracterizar uma partida de futebol sem bola, ou
melhor o jogo de xadrez sem peças, só apenas o tabuleiro. Para caracterizar a sua
realidade, faz-se necessária a sua materialização em referência ao ser objeto e ao
conjunto de regras que o fará acontecer.
Já que tratamos do jogo como um objeto, então adentramos desde já na
compreensão do brinquedo, não por já está fechada toda nossa conceituação
acerca do jogo, mas por ser um brinquedo fortalecedor de sua compreensão.
O brinquedo em sua essência propõe adentrar em um mundo imaginário
tanto da criança, quando do adulto, digo os dois por serem eles os criadores do
objeto lúdico. O fabricante ou o sujeito que constrói introduz neles a imagem que
varia de acordo com a sua cultura. A imagem da infância é vista com a expressão de
inocência, de candura moral associada a sua natureza primitiva, o homem a
reconstrói por meio de dois processos: um associada a um conceito de valores e
aspirações de uma sociedade, e do outro lado é dependente das suas percepções,
estas incorporadas pelas memórias de seu tempo de criança.
Este processo deixa claro que a imagem da infância reflete o contexto atual
e que ela é carregada por uma visão idealizada do passado do adulto, de forma a
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deixar expressa no brinquedo o mundo de sua infância com seus valores, modos de
pensar e de agir, adquirindo corpo e caracterização ao brinquedo como um objeto de
representação e manuseio do seu povo, referenciada em suas ideologias.
Claparéde (1956) procura conceituar pedagogicamente a brincadeira, para
este autor o jogo infantil desempenha papel importante como motor do auto-
desenvolvimento, e em conseqüência, método natural de educação e instrumento de
educação. Para tal surge o uso do brinquedo/jogo educativo com fins pedagógicos
fazendo com que educadores e psicólogos passem a pensar na relevância deste
instrumento de ensino-aprendizagem.
Ao consideramos que a criança da educação infantil, em seu processo de
aprendizado, deixa aflorar todo o seu aspecto intuitivo e passa a ter noções
espontâneas, te pergunto: neste processo de interação entre ela, o brinquedo e o
meio no qual está inserido, será beneficiada pela utilização do brinquedo? Todas as
suas potencialidades, sejam ela de cunho cognitivo, afetivo, corporal e de
interatividade social serão apreendidas pela utilização do brinquedo?
Não queremos fazer do brinquedo o salvador de todas as dificuldades
encontradas nas salas de aula e em ambientes de aprendizagem, nem muito menos
afirmar que este é o único meio de adentrarmos em uma melhor estratégia de
ensino, mas sim, demonstrar que usa utilização e significado é muito mais profundo
do que se tem visto.
Haja vista que o ser humano é dotado de múltiplas inteligências, e que
segundo Kishimoto (2003, p.36) para ser possível um melhor aproveitamento em
seu processo de aprendizado devemos possibilitar às crianças atividades que
fomentem uma ação intencional (afetiva), a construção de representações mentais
(cognitiva), a manipulação de objetos e desempenho de ações sensório motoras
(físico), e as trocas nas interações (social).
Sabemos que, ao trazermos o lúdico, neste aspecto educacional, nos
referimos ao jogo, brinquedo e a brincadeira, e que as ações lúdicas podem ser
vividas e criadas intencionalmente pelo homem, observamos que é possível o
brinquedo ter seu papel de importância na construção de saberes, daí então
partiremos para compreendermos o que é brinquedo, e brinquedo educativo.
Ao utilizar o brinquedo no campo educativo com o objeto de mediar a
maximização da construção de conhecimentos fomentando o ensino-aprendizado, é
possível observar que este mecanismo passa a ter um papel de maior importância,
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visto ser do lúdico a capacidade de iniciação e ação ativa e motivadora. Embora o


brinquedo esteja diretamente neste contexto ligado ao lúdico faz-se necessário que
façamos algumas considerações referentes à sua função e educativa.
Na função lúdica o brinquedo proporciona e propicia diversão, prazer e ate
desprezar quando é escolhido voluntariamente. Diferentemente da função educativa
onde o brinquedo ensina qualquer coisa que complete o indivíduo em seu saber, em
seu processo de apreensão do mundo, gerando uma maior amplitude em seus
conhecimentos.
São estes os fatores cruciais que separa a função lúdica do brinquedo e da
função educativa. Quando uma criança manipula em sala de aula um brinquedo que
possui características de formas geométricas de forma a analisar as suas diferenças
e este o fazer de forma livre, repleta de prazer em seu deleito no manusear, a
função lúdica e educativa está presente, no entanto se a criança ao relacionar-se
com o brinquedo prefere empilhar uma peça sobre a outra construindo uma
montanha sem fazer a relação com as formas geométricas presente, estará
claramente à função lúdica em destaque com a utilização do imaginário infantil,
sendo geradas outras habilidades como criatividade, coordenação motora, a
espacialidade, de forma a propor um aperfeiçoamento em outras qualidades, menos
no que estava proposto que era identificar as diferentes formas geométricas.
Na sua utilização, embora forneça grande riqueza em suas possibilidades
de apreensão do conhecimento, nunca teremos certeza se a construção do
conhecimento almejado pelo educador será realmente conquistada pelo educando,
contudo a função pedagógica poderá funcionar como mais um disponibilizador caso
garanta na sua idealização critérios como: organização de espaço, disponibilidade
de materiais e parceria do professor no brincar.
Concordando com Piaget (1971) quando ele traz a idéia de que quando a
criança brinca, assimila o mundo, podemos afirmar que a sua prática é altamente
necessária para o seu bom viver com aprendizagem e o desenvolvimento, é na
brincadeira que a criança vive as suas situações de perigo, de aflição, de realização,
de imaginações simbólicas.
É através da brincadeira que ela entra em contato com a realidade,
principalmente quando esta fica mais difícil de ser compreendida. Quando está
brincando, a criança recria a sua realidade, ludicamente, combinando-a de modo
compensar os aspectos que não são facilmente assimiláveis, construindo uma ponte
21

do significado simbólico dos objetos para a investigação ativas de suas verdadeiras


funções particulares.
A situação imaginária, demonstração do seu significado simbólico, e a sua
ação favorecidas a partir do brincar e é a partir dela que as crianças são ensinadas a
dirigir o seu comportamento pela percepção dos objetos, pela experiência que a
mesma passa e principalmente pelo significado que a mesma possui. Sendo
também um forte fator para o desenvolvimento da linguagem, favorecendo
gradativamente o aumento do seu vocabulário lingüístico e o motor através do que
interage socialmente e sistematiza as suas próprias experiências.
É brincando que a criança aprende a fazer uma diversidade de coisas, e dá
melhor forma possível por conta própria, sem interferência de nenhum adulto. Neste
aspecto, a criança passa a acreditar em sua capacidade de auto realizar, dando a
mesma um grande incentivo a buscar saídas para as dificuldades que por ventura
venham a se manifestar em seu viver.
“O jogo, da mesma forma que o brinquedo e a brincadeira, trás as mesmas
características limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente concedidas,
mas absolutamente obrigatórias, dotada de um fim em si mesmo, acompanhada de
um sentimento de tensão e de alegria, e de uma consciência de ser diferente da vida
cotidiana”.
Portanto, ao adentrarmos neste aspecto, percebemos esta grande
similaridade em ambos aspectos (jogo, brinquedo, brincadeira) mas se, de fato
dermos maior atenção ao que já suscitamos observamos que seus sentidos embora
residam na essência lúdica do prazer, seus significados podem ser analisados
individualmente.
Segundo KISHIMOTO (2003), “[...] brinquedo será entendido sempre como
objeto, suporte da brincadeira, a brincadeira como a descrição de um conduta
estruturada, com regras e jogo infantil para designar tanto o objeto e as regras do
jogo da criança”. Traçamos estas definições por acreditarmos serem mais completas
paras as suas referidas diversidades, embora seja possível encontrarmos na
atualidade outros modelos conceituais para estas ações lúdicas.
Nesta conceituação fica bastante claro o diferencial existente em cada um,
onde o brinquedo é dado como um objeto que poderá ter sentido tanto individual,
quanto social desde seu processo de construção, dando suporte a brincadeira
quanto ao jogo.
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A brincadeira tende a descrever todo um conjunto de conduta que tem


como fator primordial á capacidade dela se auto-gerir através de sua estruturação,
seja ela simbólica; de cunho cultural e de construção, caracterizada como uma
atividade conceituada que se torna real no momento em a mesma se processa, de
um plano ilusório ao real.
Já o jogo tende a ser um ato mais complexo em seu contexto, porém a sua
definição se faz pela soma destes dois fatores, tanto no brinquedo como da
brincadeira e sua característica primordial é a presença de regras determinadas
pelos seus jogadores ou por uma cultura já estabelecida onde necessita de suportes
ou não dos brinquedos e de regas já anteriormente estabelecidas.
Contudo,o que há de mais precioso no campo educacional é saber dosar,
ou melhor, encontrar o equilíbrio entre a função lúdica e a função educativa, papel
principal do jogo educativo, entretanto o seu desequilíbrio provoca duas situações
distintas: quando se prioriza o lúdico não há mais ensino e quando se prioriza o
educativo há apenas o jogo. Quando este equilíbrio não é encontrado o brinquedo
deixa de ser brinquedo e passa a ser material didático ou pedagógico, o mesmo
acontece com o jogo que perde a sua função de propiciar prazer em favor da
aprendizagem.

1.2 O lúdico e a cultura regional

Cada cultura tem maneiras diferenciadas de ver as crianças, de educá-las


e de tratá-las, esta maneira personalizada de se educar vem primeiramente por toda
uma construção histórica referenciada a todo o processo evolutivo humano. Todo o
ser humano tem em seu cotidiano marcas causadas pela heterogeneidade e pela
presença de valores hierárquicos que dão sentido as imagens culturais construídas
em cada época.
As imagens que se perpetuam no decorrer dos tempos de determinada
região são construída por personagens inseridos em seu próprio contexto, vindo
muito mais de informações, valores e preconceitos oriundos da vida cotidiana, do
que por imagens de concepções psicológicas de natureza científica. A
involuntariedade do homem de participar da vida cotidiana com todos os seus
aspectos de sua individualidade de personalidade favorece abrangentemente para a
forma que se estabelece a cultura da região.
23

As ideias e ações adquiridas pelas crianças provêm da família, do seu


circulo de relacionamentos, do currículo apresentado pela escola, das ideias
discutidas em classe, de um mundo social, que a mesma esta inserida, de forma a
incluir todo e qualquer aspecto que a mesma possa ter contato. No que se refere
aos conteúdos escolares que possuem representações simbólicas, recebem,
geralmente, grande influência do currículo estabelecido pela escola e dos seus
professores. Os conteúdos vinculados durante as brincadeiras infantis bem como os
seus temas, os materiais utilizados para brincar, as oportunidades para as
interações sociais, geralmente tendem a estar diretamente relacionadas ao seu
momento histórico.
Diante deste aglomerado de questões que conduzem a esta compreensão
diferenciada de individuo para individuo, questionamos: podemos afirmar que os
jogos educativos e lúdicos terão a mesma eficiência na sua prática em locais que
possuem culturas destoantes? É possível encontrar meios que possibilitem a
identificação de atividade de maior aproveitamento? Para tal, discorreremos sobre
estas indagações para elucidarmos as possíveis respostas. Não queremos por fim
fechar estas indagações, mais sim compreendê-las.
Por o ato lúdico está presente em toda e qualquer cultura, destacamos que
o conteúdo de muitos deles foram gerados a partir de fatos, valores ou situações
que se passaram em momento de escravização, de colonização, de industrialização
e pelo contato feito na miscigenação de raças, de modo a se sustentar até os dias
atuais. Estes jogos são considerados por nossos estudos como jogos regionais,
folclóricos e tradicionais, nomenclatura esta que nos acompanhará por todo este
subtítulo.
Compreender a origem real e o significado dos jogos tradicionais infantis
requer a investigação das raízes responsáveis pelo seu surgimento. Os diversos
estudos clássicos sempre destacaram que a origem brasileira vem de três raças: a
vermelha, a negra e a branca, e que a miscigenação ocorrida no processo de
colonização foi um grande provedor para a grande variedade cultural lúdica existente
e perpetuada ao decorrer dos anos.
Ao longo desse processo, as atividades lúdicas tomaram nova cara, não
sendo possível isolar um único radical para definirmos posturas lúdicas neste
avanço épico. Para termos uma compreensão mais original acerca da ludicidade
brasileira precisamos entrar em um campo primário de estudo. Como a história
24

retrata o índio como os primeiros habitantes das terras brasileiras, então que
comecemos por ele, o grande contribuinte para o folclore brasileiro.
A dança, por ser considerada um ato lúdico, teve grande influência na
cultura indígena, nela os índios imitavam uma diversidade de animais que se
misturavam em seus contos e perduravam por toda memória social da infância
através de cantiga culturais e de cunho religiosos. Outro fator contribuinte para esta
cultura e a construção de brinquedos feitos de barro cozido, representando animais
e gente (sendo que este predominava em sua utilização no sexo feminino), suas
atividades tiveram grande reflexo na nossa cultua portanto merecem ser discutidos
um pouco mais para esclarecer a sua manifestação enquanto cultura.
Estes brinquedos oferecidos para as crianças indígenas não tinha apenas
características de simples brinquedos, pois, em muitas tribos, eram utilizadas como
objetos de adoração. Em alguns estudos feitos no norte do Brasil realizados por
Koch-Grunberg (1979 apud Kishimoto 1993) as tribos indígenas não possuem
bonecas com formas humanas, pois ao oferecê-las em forma de louça para
indiazinhas, elas não aceitam como brinquedos, quando elas as enxergavam logo
chamavam as bonecas de tupama que significa “santo”, passando a utilizá-la como
instrumento de adoração.
Embora a boneca de barro não tenha sido transferida para a cultura
brasileira, ficando apenas a de pano, talvez de origem africana, o gosto pelos
animais ficou claramente expressos na nossa cultura, visto que podemos encontrar
facilmente em nossas feirinhas ou em mercados animais feitos de barro, argila,
porcelana ou aqueles construídos de plástico, produzidos em larga escala por
fábricas de brinquedos.
Vale a pena pontuarmos um fator de extrema importância quando nos
referimos às tribos indígenas em suas atividades lúdicas infantis, pois ela não esta
afeita somente as suas crianças, os seus jogos fazem parte de formas de conduta
de toda tribo, uma vez que seus adultos também realizam as mesmas atividades
infantis. Podemos observar isto com maior clareza na colocação de Kishimoto (1993
p.72).
“Adultos e crianças dançam, cantam, imitam animais, cultivam suas
atividades e trabalham para a sua subsistência. As brincadeiras não pertencem ao
reduto infantil. Os adultos também brincam de peteca e de jogo de fio e imitam
animais. Não se pode falar de jogos típicos de crianças indígenas. Existem jogos
25

dos indígenas e o significado do jogo é distinto de outras culturas, nas quais


crianças destacam-se do mundo adulto”.
Esta é mais uma prova viva que é no contexto social que a criança vivencia
seus determinados momentos lúdicos, de modo a se perpetuarem por longos e
longos períodos e em diferentes populações, misturando-se momento a momento.
Esta representação que a relação humana possibilita é a principal origem de toda
esta universalidade de valores presentes em uma sociedade, trazidos pelo folclore
de cada pais, região, povo, vila, dentre outras, contudo as especulações acerca de
algumas hipóteses da origem do folclore em sua diversidade fazem mergulharmos
em um campo “saboroso” de se conhecer. Trazemos, portanto, as possíveis
hipóteses que se funcionam como mecanismos que mantêm vivos os nossos jogos
tradicionais e o nosso folclore.
Primeiramente, trazemos a hipótese de que o folclore se instala e perdura
nas histórias que se originam na humanidade primitiva e todas as raças conservam-
nas através de suas migrações passando de família para família através dos
tempos. Uma outra idéia é que em tempos passados existia um contato direto entre
as diferentes raças humanas, de forma a interagirem entre si, esta ocorrência torna-
se motivo pelo qual devemos agradecer por ele favorecer a transmissão dos contos
de uma tribo a outra.
A última hipótese é que há tal semelhança entre mentalidade de diversas
raças durante a fase primitiva de seu desenvolvimento, que elas podem ter
inventado ao mesmo tempo as histórias independentemente uma das outras, fruto
da pura imaginação.
Ao observar estas hipóteses, fica bastante claro a dificuldade que reside
em precisar as contribuições específicas que as mesmas obtiveram na descoberta
da instalação dos jogos infantis atuais, mas em contraposição é possível observar
em alguns casos, principalmente em contextos que existe predomínio de algumas
etnias, a possibilidade de encontrarmos as origens de algumas brincadeiras
referenciadas no folclore de seus povos.
Quando nos referimos ao Brasil, encontrarmos uma influência tamanha dos
portugueses, pois foram eles os nossos primeiros colonizadores, disponibilizadores
de nosso contato com a civilização européia e a instaladores dos versos, parlendas
e adivinhações como Lobisomem, a Moura – Encantada, a Maria Sabida, dentre
26

seus acervos de estórias de Bruxas e Fadas, sonho de aviso, oração forte, entre
outros.
Algumas lendas divulgadas pelos povos portugueses são fortes
influenciadoras para a construção e perpetuação das brincadeiras infantis e exemplo
trazemos algumas: o jogo da bola de gude (palavra esta que também possui um
outro significado, ex: biloca) onde o papão transfere-se da lenda para o jogo. Em sua
regra cava-se três buracos formando um triângulo com uns dois ou três metros de
distância em suas laterais, o jogador deverá acertar as barrocas de forma a dar três
voltas, o jogador que conseguir virá o papão e ganha o poder de matar os seus
adversários.
Em Porto Alegre é bem provável que o nome da bruxa dado ao pegador
em uma das brincadeiras de pique tenha relação com as lendas folclóricas. O que
há de interessante nesta brincadeira, é que nos chama atenção é que ela está
inserida em grande parte do território brasileiro com uma variedade enorme de
nomes, como: o próprio pega-pega, tica-tica, triscou-pegou, picula, ou tantos outros
que não tenha sido citado. O que nos remete a idéia de que o folclore tenha
influencia nesta brincadeira e que o seu pegador, nesta região, é chamado de bruxa
e só será salvo pelo seu de transformar o seu substituto em bruxa também.
A sua regra é constituída em sua maioria pelo mesmo padrão onde se
escolhe quem será o pegador, ou bruxa no caso de Porto Alegre e outras regiões, e
após uma contagem ou um sinal, regra esta estabelecida pelos seus participantes,
deverá correr atrás de todo o resto dos integrantes da brincadeira, quando a bruxa
tocar com a mãe em alguém este deve gritar bruxa (peguei) e ai este passa a ser a
nova bruxa (pegador).
Uma diversidade de brincadeiras e jogos podem ser identificados
facilmente como atividades constituintes da cultura tradicional, em qualquer região
que se vá em nosso território brasileiro veremos nossas crianças brincando de
cantigas de roda, ou com pipas, piões, bolas dentre outros que estão entranhadas
na vida cotidiana de seu povo.
Muitos dos nossos jogos também são resgatados de um acervo negro, em
pleno reduto de concentração africana escrava. Regiões produtoras de cana-de-
açúcar constituídas por suas casas de engenho, senzalas e casarões, habitadas por
patrões e escravos, diga-se de passagem muito mais por escravos, mucamas e
moleques do que pela família dos senhores de engenho.
27

As miscigenações de culturas estabelecidas pelos diferentes costumes


destes povos influenciavam marcantemente a formação da cultura regional.
Podemos observar dos mais marcantes costumes fomentadores desta miscigenação
era a figura da ama negra que embalava os sinhozinhos e sinhazinhas no berço e os
ensinavam as suas primeiras palavras.
Esta influência não ficava só associada ao nascimento, ou ao primeiros
anos de vida, outro grande influenciador era o hábito de colocar a disposição dos
filhos dos senhores de engenho um ou mais moleques, filhos de negros e escravos
do mesmo sexo com idades aproximadas para servirem de companheiros para
brincadeiras. Quando os meninos brancos, filhos dos patrões, queriam brincar de
algo era só chamar os moleques (filhos dos escravos), estes estavam sempre a
disposição dos meninos de engenho.
As brincadeiras culturais também são de forte expressão do processo
social que a sua população se encontra, podemos afirmar esta concepção quando
vemos Kishimoto (1993) trazer a tona em uma de suas abras uma das brincadeiras
que mais expressavam a relação de dominação do sistema de escravidão. Ela tinha
como título “leva-pancada”, dado pelos meninos brancos, onde os filhos dos
escravos nas brincadeiras viravam boi de carro, cavalos de montaria, burros, dentre
outras brincadeiras, de modo as travessuras aumentarem cada vez mais.
Contudo, esta aproximação trazia grandes benefícios para o processo de
formação infantil. Embora ficasse restrita apenas a primeira infância, os meninos
escravos juntamente com os seus sinhozinhos aproveitavam estes momentos para
as mais diversas brincadeiras, de modo as travessuras aumentarem cada vez mais.
Na segunda infância, dos cinco aos dez anos, os garotos ficavam soltos
por todos os arredores da casa, montando a cavalo, nadando nos rios, conhecendo
as brincadeiras mais inusitadas em todo espaço, muitas vezes acobertada pelos
próprios moleques, mas ao chega aos sete anos os sinhozinhos tinha sua infância
cortada pela cobrança de torná-los homens, com toda um aparato aristocrata,
preparando-o para a elite intelectualista do pais, com valorização para formação de
doutores, administradores e políticos fortalecido por toda corte, com tudo um regime
educativo. Devido a esta cobrança, o meio da segunda infância tornava-se um
mundo sombrio, com ares de adulto, eliminando a sua infância e obrigando-as a se
comportarem com maturidade, tanto em suas posturas, quanto nos trajes, deixando
a caracterização das diabruras pelo estereótipo de meninos bons.
28

O que podemos ver de positivo neste aspecto é que muito embora tenham
enfrentado toda esta rigidez, os amplos espaços de exploração que os mesmo
dispunham e a companhia dos moleques negros naquele período proporcionou um
quadro favorável para a manifestação de toda a cultura infantil, fator este
estimulante para o aumento de repertório lúdico das crianças.
Esta disponibilidade de espaço é encarada, na atualidade, como um
precursor para o desenvolvimento motor, cognitivo e moral da criança, e quando se
atrela espaço e ludicidade, juntamente com o que a de mais vivo em seu viver, que é
sua cultura, a criança tende a adentrar cada vez mais em um campo mais real,
dando ao seu ser uma educação de corpo inteiro.
Muito embora na atualidade seja possível observar grande diferença em
suas classes sociais, costumes e culturas como determinantes dos diversos padrões
de conduta humana, fica, em nós, uma grande satisfação ao presenciarmos em todo
é qualquer meio algo em comum, o ato de ser lúdico, independente destes fatores
externos.
Quando se estar a ludicar, o ser que joga, que se brinca, se despe de todas
as diferenças que possam existir referentes aos preconceitos ou as classificações
sociais, pois o negro que joga bolinha de gude na essência do jogar, não difere do
branco que joga, o que vai contar neste aspecto é a qualidade do jogar.
Muito embora as brincadeiras tendam a passar por evoluções decorrentes
do processo histórico da humanidade, as suas raízes estarão sempre referenciadas
as suas origens e ao seu passado, de modo que a cultura regional deva ser
trabalhada e disponibilizada a todos, como uma propulsora de conhecimentos e
disponibilizadora de prazer e da alegria.
Enfim, cada região possui, culturalmente, determinadas brincadeiras
diferenciadas de regiões para regiões, mas que em todas elas os jogos e
brincadeiras se manifestam de forma bastante expressa no viver humano, e em
especial na infância, visto que é da criança a busca do jogo, pois é pelo jogo que a
criança se revela, demonstrando as suas inclinações tanto negativas quanto
positivas, dando, a partir daí, respaldo para que o educador tenha a capacidade de
intervir em sua formação dando ao seu educando uma capacidade de
discernimento.

1.3 Ludoteca, o lugar dos sonhos


29

No Brasil, têm seu ponto inicial nos anos 80, apesar de causar grande
encantamento no despertar desta nova idéia, encontrou dificuldades em sua
sobrevivência, tanto no campo econômico como também para se impor como
instituição reconhecida e valorizada a nível educacional.
A ludoteca tem como principal objetivo proporcionar estímulos para que a
criança possa brincar livremente, onde possa realizar todos os seus anseios frente a
sua imaginação, onde ela possa construir um repertório motor auto-regulado por
suas escolhas, dentro de um ambiente delimitado, ela não tem como atividade
principal o empréstimo de brinquedos, mas a disponibilização dos mesmos para a
sua diversão.
Na contextualização social brasileira, a disponibilidade à cultura do brincar
assumiu, através da brinquedoteca, características próprias direcionadas a atender
da melhor forma possível as crianças do nosso país. Para tal, foi sofrendo a cada
momento transformações que ajudaria neste processo de aprimoramento como:
atuação dos profissionais da área de educação preocupados com a felicidade e com
o desenvolvimento emocional, social e intelectual das crianças.
Diante de todo este processo seu papel dentro do campo educacional
cresceu a ponto dela ser considerada como um agente de mudança do ponto de
vista educacional. Ela é a valorização da atividade lúdica das crianças e
provocadora de reflexões em pais e educadores acerca de sua importância.
Cunha (1997) traz uma enumeração de principais finalidades que devem
ser estabelecidas por uma brinquedoteca na elaboração de seus objetivos.
 Proporcionar um espaço onde a criança possa brincar sossegada, sem
cobranças e sem sentir que está atrapalhando ou perdendo tempo;
 Estimular o desenvolvimento de uma vida interior rica e da capacidade de
concentrar a atenção;
 Estimular a operatividade das crianças;
 Favorecer o equilíbrio emocional;
 Dar oportunidade a expansão de potencialidades;
 Desenvolver a inteligência, a criatividade e sociabilidade;
 Proporcionar o acesso a um número maior de brinquedos, de experiências e
de descobertas;
30

 Dar oportunidades para que aprenda a jogar e a participar;


 Incentivar a valorização do brinquedo como atividade geradora de
desenvolvimento intelectual, emocional e social;
 Enriquecer o relacionamento entre suas crianças e sua famílias;
 Valorizar os sentimentos afetivos e cultivar a sensibilidade.

A sua principal implicação educacional é a valorização da atividade lúdica,


que tem como conseqüência o respeito às necessidades afetivas da criança de
forma a promover o seu respeito e diminuir a opressão do sistema educacional que
trás um ranço extremamente rígido.
Existe, na atualidade, uma grande preocupação em encontrar novas
estratégias de ensino de criticas metodológicas e pesquisas científicas, podemos
observar vários reflexos a nível acadêmico, onde já se fazem sentir a importância da
utilização da brinquedoteca e as suas contradições enquanto recurso para a
aprendizagem.
O processo de busca nos apresenta vários erros e quem não tem coragem
de errar dá um passo novo, e prefere trilhar por caminhos que já foram trilhados. E
então, trilhar por caminhos que já foram trilhados não valem a pena? Citar e analisar
o que já foi dito não favorecem?
Acredito ser de grande importância nos basearmos por caminhos
desvendados por outros, mas isto é muito pouco para aqueles que acreditam em
novas possibilidades, só os que ousam de forma prudente encontram novos
caminhos para seus objetivos. Contudo, é necessário pensar com a própria cabeça,
ousar a mudar de idéia quando se chega a uma conclusão e se descobre que esta é
mais eficiente do que a de antes.
O paradigma da ludoteca vem representar um novo sistema de aprender a
aprender, pois para seus estudiosos a medida que se contempla os seus
fenômenos, chega a ser uma estrutura geradora de teoria, produzindo pensamento e
explicação e para aqueles que se divertem no ato de estar a desfrutar deste espaço
tendem a descobrir e redescobrir o significado da sua ação.
A ludoteca é o espaço para brincar, muitas vezes não é preciso
acrescentar mais objetivos, é preciso valorizar a ação da criança que brinca,
31

transcendendo o visível a ponto de perceber a seriedade do fenômeno, pois é neste


momento onde a criatividade se manifesta.
“A escola pode ensinar, a psicopedagogia pode cuidar dos problemas de
aprendizagem, a psicologia pode resolver problemas emocionais, a família pode
educar, mas a brinquedoteca precisa preservar um espaço para a criatividade, para
a vida afetiva parta para o cultivo da sensibilidade; um espaço para a nutrição da
alma deste ser humano criança, que preserva sua integridade, através do exercício
do respeito a sua condição do ser em formação.” (Cunha, 1997)
Este cultivo da sensibilidade e da criatividade são indispensáveis para uma
formação integra do ser humano e para ser experimentar a sua plena realização. A
ludoteca é o espaço onde permite e propicia condições para que ocorra a
manifestação da criatividade e da sensibilidade, mas para tal é necessário a escolha
de seus profissionais, pois estes deverão ser conscientes que as crianças são
criadoras do futuro e livres para descobrirem novos significados em respostas as
novas experiências.
A evolução do ser humano está diretamente relacionada ao seu nível de
consciência e é papel também da educação ter dever de provocar a expansão do
potencial das crianças não só a nível cognitivo, mas também a nível de consciência.
O brinquedo representa uma diversidade de realidades, a representação significa
dizer que existe algo presente no lugar de algo e que será ele responsável por
substituir ou responder. O brinquedo, ao ser dado a uma criança, funciona como um
mecanismo que a coloca na presença de reproduções, pois é ela uma
representação de tudo que existe no universo, na natureza, no cotidiano e nas
construções humanas, desde o real ao imaginável.
Apesar da realidade, quando representada, incorporar modificações no
tamanho, na forma, nos traços simples ou estilizados quando é representada pelo
brinquedo, ela incorporará também um imaginário pré-existente, seja por si ou por
televisão, seriados, desenhos animados, ficções científica não deverá ser
transportado este mesmo pensamento com relação a criança / homem.
Em muitas culturas, por terem formas diferenciadas de visualizar a criança,
algumas tendem a ter uma concepção de criança como um homem em miniatura,
nos revelando uma visão negativa, por ser elas seres inacabados, sem nada
específico e original. Será esta postura uma atitude correta? Cabe-nos a reflexão.
32

Em análise a criança enquanto um ser em desenvolvimento não pode ser


caracterizada como um homem em miniatura, mas também é desumano considerá-
la como um individuo sem nenhuma especificidade e originalidade. Uma das
grandes bandeiras levantadas a partir do século XVIII e defender a idéia de ser a
criança um ser possuidor de uma especificidade infantil, de natureza própria que
deve ser desenvolvida.
Este desenvolvimento através do brinquedo consiste em perceber que a
infância expressa nele próprio o que contém no mundo real, repleto de valores,
modos de pensar e agir e que a sua construção é constituída pelo adulto a medida
que a sua criação está referida em contexto de aspirações e valores de uma
sociedade dependente de percepções próprias, de adultos que trazem incorporado
em seu ser memórias de seu tempo de criança.
Frobel (1912) apud Kishimoto (1997 p.27) concebe o brincar como
atividade livre e espontânea, responsável pelo desenvolvimento físico, moral,
cognitivo e os dons ou brinquedos como objetos subsidiam as atividades infantis.
Este filósofo em sua teoria metafísica pressupõe que o brincar permite o
estabelecimento de relações entre os objetos do mundo cultural e a natureza,
unificados pelo mundo espiritual, foi ele o responsável pela introdução de brinquedos
e brincadeiras no jardim de infância.
Seus programas permitiam a inclusão de atividades orientadas e livres
através da utilização de brinquedos e brincadeiras, usava alguns objetos
geométricos, o qual denominava de dons, representados por bolas, cones, cilindros,
cubos, recorte de papéis, dobraduras, palitos, dentre outros materiais que pudessem
ser utilizados para a realização de atividades orientadas ou livres.
Em estudos mais recentes nos Estados Unidos foi demonstrado que as
creches surgem ainda no século XIX no período da guerra civil devido o Movimento
de Assentamento das Famílias, movimento causado pelo aumento de pobres
urbanos, fruto dos deslocamentos sócias causados pelo processo de
industrialização, urbanização e intensa migração dando-se portanto a implantação
dos Jardins de Infância para o acolhimento das crianças consideradas pobres,
diferenciados daqueles de família do elite. Neste período, acreditava-se que a
criança aprendia melhor brincando, mas que só poderia ser considerada educação
se esta atividade fosse supervisionada.
33

Esta prática no Brasil se deu de forma bastante semelhante na década de


70, onde os jardins de infância e os institutos de atendimento infantil começaram a
atuar como fruto dos movimentos sociais. Com o passar do tempo se acentuaram e,
com ela, os questionamentos acerca da natureza destas instituições, colocavam em
destaque o brincar como proposta para educar as crianças em idade pré-escolar,
nomenclatura esta utilizada para chamar as crianças que ainda não estavam
alfabetizadas.
Neste período as creches preocupadas em uma educação higiênica,
emocional e física passam a discutir propostas para se educar em novas bases,
algumas instituições passam a adotar propostas conteudísticas, outras começam a
formar grupos de estudo para compreender a natureza de um trabalho educativo
referenciado no brincar e outras adotam o brincar livre sem material, método este
caracterizado como utópico, por não disponibilizar materiais e espaço para a
implementação das brincadeiras.
O brinquedo, neste mesmo período, passa a ter ação secundário nas salas
de aula, onde possui papel meramente decorativo, distante da mão e da função de
suporte motor que o mesmo oferece, deixando de funcionar como um estímulo para
a exploração do ambiente, este que por sinal passa a ficar amontoado de mesas e
cadeiras em que se desenvolve atividades coletivas, consideradas pedagógicas,
sobrando pouco espaço inclusive para a possibilidade do brincar.
Na década de 80 o Brasil começa a dar atenção ao brincar infantil, e com
valorização do brinquedo começa a ser construída as brinquedotecas escolares,
forçando as instituições de educação infantis, tradicionalmente de orientação
conteudista, sanitárias e higienistas, a repensarem a importância da brincadeira e do
brinquedo nestas idades.
Muitas instituições infantis, na atualidade, distanciam-se da prática utilitária
real da brinquedoteca, onde as constroem para substituir a falta de brinquedos e de
materiais para desenvolver as atividades nas aulas pré-escolares, mascarando as
suas irresponsabilidades, colocando-a como uma instituição que proporciona o
lúdico como algo, dissociado da função educativa, distante das funções da
brincadeira como uma proposta educativa, tendo a sua criação como meio de sanar
as dificuldades e manter a orientação conteudista.
No momento em que os educadores acordarem para a importância das
atividades lúdicas no processo de desenvolvimento humano e a necessidade de
34

criação de espaços lúdicos para uma nova forma concreta e inovadora maneira de
pensar o fazer pedagógico, pois se pensamos o jogo como uma necessidade
humana que se desenvolve em todas as idades e diversidades, se faz necessário
cada vez mais o estudo deste fenômeno.
CAPÍTULO II: O JOGO E A PEDAGOGIA DO MOVIMENTO NA
EDUCAÇÃO BÁSICA

Para falar da pedagogia do movimento, é necessário esclarecer um pouco


na história da educação física no que se refere ás influencias que a mesma recebeu
e fomentou na prática da corporalidade educacional.
A educação física incorpora mudanças específicas, determinadas pelo
significado social que a mesma vem em diferentes momentos históricos, que
determinaram as suas tendências e concepções didático-pedagógicas, tendo como
principais áreas de influência: a médica, a militar, a biopsicossocial e esportiva.
Conforme mostra Castellani Filho (1998) e Guiraldelli Junior (1988) a
educação física assumiu diferentes posicionamentos, funções com tendências
militaristas, higiênicas, de biologização e de psicopedagogização. Ligadas
inicialmente à áreas médica, os programas de educação física procuravam objetivar
em primeiro plano, indivíduos “fortes” e “enrijecidos” tendo como base uma
preocupação ortopédica, de caráter morfogênico e postural.
Estes mesmo autores observam que para dar suporte a esta idéia eram
utilizados os métodos de ginástica do século XVIII, visando uma postura correta e
uma boa aparência física, surgindo dai a principal meta dos programas de educação
física. Com este entendimento fica claro para os estudiosos da áreas, que apesar da
fragilidade em termos educacionais, esse processo de “medicalização” da educação
física continua ainda representando alguma repercussão.
Com a implantação do Estado Novo na década de 30, vem a influência da
política, que reforma o setor educacional em sua diversidade de conteúdos
curriculares. Com estas modificações, surge nos programas de educação física
escolar uma tendência militar, que passa a privilegiar também a eugenia da raça, de
forma que os indivíduos menos capazes fisicamente sejam excluídos de seus
programas. Para tal, os professores de educação física passam a utilizar como
35

método de ensino, ou melhor, como filosofia de ensino uma prática “militarista”,


institucionalizando um papel de pouca importância educativa na estrutura escolar.
Na década de 40, período em que chegava ao fim a II Guerra Mundial,
surge a tendência biopsicossocial inspirada no discurso liberal da escola-nova, que
de forma bastante discreta oportunizou a educação física a ingressar no movimento
pedagógico, tendência esta que definida com bastante exaltação um caráter
educacional mais efetivo, consolidando a educação física como disciplina junto ás
instituições educacionais. Ela passa a fazer parte da grade curricular e possuir ideias
pedagógicas em sua estruturação de ensino, sendo reconhecida como um dos
meios de educação por ser acreditado que educados não são apenas aqueles
considerados cultos nas esferas cognitivas e afetiva, mas também no campo físico,
oportunizou que seus professores começassem a substituir as concepções
mecanicistas de suas práticas.
Algumas equipes esportivas nacionais no início da década de 70 obtiveram
bons resultados em competições internacionais, isto faz com que acreditemos ser
este motivo influenciador do esporte como atividade de grande importância na
educação física escolar, fazendo com que seus professores quase que
exclusivamente voltasse as suas atenções para as vantagens da prática esportiva,
sendo usado como o intuito de oferecer estímulos que levassem o educando a
alcançar os critérios de desempenho atlético. Esta tendência era embasada na idéia
de que um país desenvolvido deveria ser necessariamente competitivo no âmbito
esportivo, cabendo a escola contribuir na formação dos atletas através incentivo à
prática esportiva.
Outro fato de bastante importância é a criação dos cursos de bacharelado
na década de 80, já que seus cursos só existiam habilitação em licenciatura. Este
fato se dá pela necessidade de aperfeiçoamento por parte do profissional de
educação física, que até o momento, dedicava-se quase na sua totalidade ao
magistério e que através deste afa em busca do corpo perfeito abre um novo campo
de atuação para seus profissionais fora da área escolar. Ocorre, portanto, um
acirramento das discussões acerca das diversas possibilidades da profissão e vários
estudos a respeito da formação do profissional de educação física começam a ser
desenvolvidos.
Neste período, começa também a ocorrer grande crítica a hegemonia do
esporte como modelo de educação e principalmente a prática esportiva no âmbito
36

escolar para as séries iniciais do ensino fundamental (1ª a 4ª série) onde era
considerada uma precocidade para este egresso na área desportiva. Fator que teve
grande influência dos profissionais formados na área, pois, inicialmente, não era
obrigatório a formação em educação física para ministrar as aulas, mas os que eram
formados e trabalhavam com estas turmas tinham sua prática pedagógica
concentrada no ensino dos esportes no modelo de competição.
Com a chegada da legislação (BRASIL, 1980) da educação física
estabelecida pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), ficou proibida a
introdução do aluno no aprendizado dos esportes na forma de iniciação à
competição para as séries inicias do ensino fundamental, sendo esta metodologia
autorizada nas aulas a partir da 5ª série.
Nesta mesma década, surgem as novas perspectivas educacionais
advindas do momento político e social do Brasil sendo este um ponto culminante das
propostas de ensino da educação física escolar que com o passar dos anos começa
a adquirir formas mais coesas em sua formação enquanto método. Both (2002): trás
em seus estudos os considerados mais importantes que contribuíram e contribuem
para o movimento corporal, dentre eles está a Desenvolvimentista, a Cítico-
emancipadora, a Crítico superadora e a construtivista, contudo optaremos por não
apontar esta última por não compreendê-la como método, pois segundo Rosa (2002,
p. 48) “Os teóricos construtivistas não tem, em princípio, como preocupação
científica pensar no pólo ensino e sim o pólo aprendizagem”.
“A proposta desenvolvimentista no Brasil teve como um dos principais
divulgadores desta prática Go Tani, que visa em toda a sua construção e estudos da
educação física o movimento humano, ele aborda em seus estudos o domínio do
comportamento humano, os seus aspectos biológicos, o desenvolvimento motor e
cognitivo e suas implicações na atividade motora, podendo ser resumindo em
fundamentações acerca do crescimento, desenvolvimento e aprendizagem motora”.
(Tani, 1988).
Para este, devemos compreender os três domínios do comportamento
humano que é:
 O cognitivo, onde faz parte das operações mentais como descoberta ou
reconhecimento da informação, a retenção ou armazenamento da
informação, a geração de informação a partir de certos dados e a tomada de
decisão ou feitura de julgamento acerca da informação.
37

 O afetivo-social e motor, que faz parte dos sentimentos e emoções adquiridos


pelo processo de aprendizagem.
 O domínio motor, em que fazem parte dos movimentos, sendo visto em
muitos estudos como domínio psicomotor em função do grande envolvimento
do aspecto mental, ou cognitivo na maioria dos movimentos.
Tendo como base estes domínios devemos observar que as modificações
ocorridas pelas faixas etárias em cada uma de suas fases tem estreita relação com
o seu desenvolvimento seja no campo físico, psíquico e social, de forma que seja
possível orientar mais concisamente os educandos para uma vida adulta melhor ou
“normal” em referencia as suas potencialidades orgânicas. Os movimentos é a
principal fonte geradora de vida, pois é por causa deles que provamos,
principalmente pela interação com o meio ambiente, e são de grande importância
biológica, psicológica, social, cultural e evolutiva.
“O desenvolvimento motor é um processo contínuo e demorado e, pelo fato
das mudanças mais acentuadas ocorrerem nos primeiros anos de vida, existe a
tendência de ser considerado como o estudo da criança. É necessário enfocar a
criança, pois, enquanto são necessários cerca de vinte anos para o organismo se
tornar maduro, autoridades em desenvolvimentos da criança concordam que os
primeiros anos de vida, do nascimento aos seis anos, são anos cruciais para o
indivíduo.” (TANI, 1988, p.65).
Com esta afirmação, podemos perceber que o estudo deste assunto é de
extrema importância na compreensão deste fenômeno, dando um grande suporte
para a ordenação e sequenciação na construção de habilidades e saberes que
sejam dispostos a serem trabalhados, saberes estes que estarão presentes em toda
a vida do indivíduo. Segundo Hottinger (1980 apud TANI, 1988, p.65), as
experiências que a criança tem durante este período determinarão, em grande
extensão, que tipo de adulto a pessoa se tornará. O ser humano é, também, produto
e produtor do meio no qual está inserido, logo, uma cultura que disponibilize um
maior desenvolvimento motor tornará os seus indivíduos com maiores habilidades
motoras.
Seguindo outro rumo de conteúdo , surge a proposta crítico-emancipadora,
criada por um grupo de orientação marxista da educação física brasileira da década
de 80, teve como principal trabalho apresentado o Coletivo de Autores (1992)
escrito conjuntamente por: Carmem Lúcia Soares, Celi Neuza, Zulke Tafarel,
38

Elizabeth Varjal, Lino Castelani Filho, Micheli Ortega Escobar e Valter Bracht. A
proposta trazida por estes autores é apresentada pelo PCN de educação Física.
É observado com grande clareza que o objetivo principal desta proposta é
ter a expressão corporal como uma forma de linguagem. Linguagem esta que
deverá ser analisada através de todo o seu contesto social, buscando por uma
reflexão pedagógica dar subsídios para a compreensão da criatura humana,formada
por seu contexto passado,demonstrando que tudo é provisório e inesgotável dentro
da história da humanidade.
As atividades objetivadas por esta corrente são os jogos, esportes,
ginástica, dança dentre outras atividades que possuam característica de atividades
corporais neste contexto ou temas com o mesmo objetivo, sendo esta conceituação
da prática pedagógica da educação física escolar cujo seu currículo, palavra esta
originária do latim curriculum que significa caminhada, se apodera de ordenar a
reflexão pedagógica do aluno de forma a pensar a realidade social desenvolvendo
determinada lógica.

[...] os ciclos não se organizam por etapas. Os alunos podem lidar com
diferentes ciclos ao mesmo tempo, dependendo do(s) dado(s) que esteja(m)
sendo tratado(s). Ao introduzir o modelo dos ciclos, sem abandonar a
referência às séries, busca-se construir pouco a pouco as condições para
que o atual sistema de seriação seja totalmente superado”. (COLETIVO DE
AUTORES, 1992, p. 34).

Com esta colocação podemos identificar que para tal metodologia a


seriação não é uma grande saída para a prática pedagógica da educação física ,
portanto passamos a propor a introdução dos ciclos como forma de tratar os
conteúdos simultaneamente, respeitando a capacidade de assimilação e
compreensão dos assuntos a serem abordados.
Os ciclos são divulgados em quatro: O primeiro que vai pré-escola até a 3ª
série, este é considerado como o de organização da identidade dos dados da
realidade, é nele que o educando encontra-se na atualidade, difusa e misturada,
momento da experiência sensível, e cabendo ao educador formar sistemas que
auxiliem ao educando, o saber, acerca da relação entre as coisas, identificar as
semelhanças e diferenças.
O segundo vai da 4ª à 6ª série, denominado como ampliação da
sistematização do conhecimento, neste ciclo o educando vai adquirindo a
39

consciência de sua atividade mental, colocando a realidade em contraposição com


suas ideias sobre esta mesma realidade, começando a fazer as relações complexas,
nexos representados no conceito e no real.
O terceiro ciclo vai da 7ª série à 8ª série chamado ciclo da ampliação da
sistematização do conhecimento, a partir desta fase é que o educando passa a
ampliar as referencias conceituais de seu pensamento, tomando consciência de toda
parte teórica através de toda uma operação mental construída anteriormente em sua
imaginação para que em seguida possa atingir a expressão discursiva, dando saltos
qualitativos quando realiza a identificação dos dados através do pensamento teórico.
O quarto ciclo se dá na 1º, 2ª e 3ª série do Ensino Médio. É o ciclo de
aprofundamento da sistematização do conhecimento, onde a partir de então ele
passa a fazer uma relação espacial com o objetivo permitindo-lhe refletir sobre ele
independente do pseudoconceito do senso comum. O educando começa a fazer
relação, aprofundamento, reflexões sobre determinados objetos adentrando ao
mundo científico de forma que possa perceber, compreender e explicar as suas
propriedades.
Demonstrando, desta forma, um modelo de ensino a ser aplicado
embasado em valores referenciados à cultura corporal, corroborando a prática
pedagógica na sua história enquanto indivíduo vivificador e vivente do contexto
social presente, inserido em uma sociedade onde deve possuir o papel de um ser
consciente e crítico reflexivo acerca de seu papel para com o meio do qual é parte
integrante.
Uma outra proposta utilizada por muitos que primam em ter a educação
física em comum com outras disciplinas e utilizar esportes e a crítico-emancipadora.
Esta tem como criador o professor Eleonor Kunz, dando ênfase na questão da
comunicação, onde é acreditado que o educando deve ser exposto a situações
comunicativas, pois é através da mesma que ele vai se apropriar de sua capacidade
de discutir, pensar, analisar e compreender determinados assuntos, possibilidades e
ações à sua volta.
Para proporcionar a liberdade corporal, Kunz afirma que o educando
deverá ser visto como um ser humano sem dissociação entre corpo e mente onde
seus conhecimentos são adquiridos através do movimento humano, em suas
experiências vividas no meio em que está inserido, de forma que seja possível o
40

educador ser apenas um mediador da aprendizagem, onde jamais será considerado


o dono da verdade.
Para alicerçar esta idéia: Kunz aborda algumas estratégias de ensino
mencionadas por Brandl Neto estas a seguir:
O Discente deverá explorar e experimentar possibilidades, de forma direta,
de movimentos, de objetos e de comunicação; 2) O aluno deverá transcender limites
através da apresentação de situações-problemas as quais deverá executar e propor
soluções, porém, pela linguagem ou demonstração, deverá saber expor, de forma
clara, o que experimentou e aprendeu; 3) O Aluno deverá transcender limites
criados, a partir da forma anteriormente apresentada. BRANDL NETO, 200, p. 102.)
Sua preocupação maior é relacionar o tratamento dado ao conteúdo
esporte como um conhecimento pedagogicamente transmitido na escola pela
educação, principalmente como será a sua aplicação nas aulas, visto o histórico que
acompanha a prática esportiva nos anos anteriores, para este autor criador deste
modelo de educação o educador deve a todo momento saber onde quer chegar,
está sempre se questionando sob as condições e de que forma o esporte deve e
pode ser praticado na escola, para tal ele trás alguns questionamentos que devem
ser feitos.

Assim, os aspectos que devem ser criticamente questionados no esporte,


atualmente, são: o rendimento (Para qual rendimento?), a representação
(institucional [clube escola], estadual, nacional), o esporte do tempo livre (as
influencias que vem sofrendo) e o comércio e o consumo no esporte e seus
efeitos. (KUNZ, 2004 p.25).

Para tal, esta preocupação está sendo colocada em questionamento


devido a grande preocupação com a formação da identidade da criança, que sofre
influência de uma diversidade de fatores, sendo eles da indústria cultural e dos
meios de comunicação e ou por instituições com poder ideológico, através de seus
interesses, desejos e necessidades, deixando-o distante da tomada de consciência
individual. Digo individual por não estar afeita a uma idéia suplantada por outros,
mais sim pela capacidade de refletir acerca do que realmente o individuo tem como
ideologia.
Esta proposta pretende através de suas reflexões atingir as relações
práticas do esporte, onde ele não precise ser tematizado de forma tradicional,
visando o rendimento, a ideologia transgressora à própria educação, mas que ela
41

possa servir ao desenvolvimento do aluno em relação a determinadas competências


necessárias para a formação do indivíduo livre e emancipado.
2.1 O jogo e aprendizagem

No crescimento humano, o indivíduo vai se diferenciando por um


mecanismo complexo em que a combinação de fatores biológicos, psicológicos e
sociais produzem nele transformações qualitativas, envolvendo aprendizagens,
expandindo e aprofundando as experiências individuais.
Muitos autores vêm discutindo a relação entre desenvolvimento e
aprendizagem. Piaget afirma que a aprendizagem depende do nível de
desenvolvimento já alcançado pela criança, onde a construção do conhecimento é
entendida como resultante de adaptações da criança ao meio, envolvendo dois
mecanismos reguladores: a assimilação, através do qual a criança exercita os
esquemas já construídos, entra em contato, recebe e interage com os dados novos,
e a acomodação, pela qual ela se apropria desses dados, incorpora-os e transforma
seus esquemas inicias de assimilação, construindo assim o seu conhecimento.
Para Vigotsky, esta relação se da pela sócio-interação, o desenvolvimento
das funções psíquicas da criança com a aprendizagem apropriando-se do
conhecimento produzindo pela humanidade e a relação que estabelecem com o
meio social.
Em Wallon, o desenvolvimento acontece em uma tripla interação: fatores
sociais, biológicos e psíquicos, destacando nesse as funções afetivas. Ao estudar as
relações do ser humano com o ambiente ele concebe a emoção como a primeira
manifestação social que possibilita a comunicação da criança com o seu meio.
Portanto, as relações que se estabelecem entre eles demonstram que o
desenvolvimento e a aprendizagem estão relacionados na educação da criança.
Para tal apresentarei neste capítulo o jogo como um propulsor da aprendizagem por
ser ele um ato que em sua intencionalidade e curiosidade resultam no processo
criativo para modificar, imaginariamente, a realidade e o presente. Ele satisfaz a
necessidade das crianças, especialmente a necessidade de “ação”.
Para entender o avanço da criança no seu desenvolvimento, devemos
perceber quais as modificações, tendências e incentivos que a colocam em ação. O
brincar deste modo aparece como um aspecto dominante na infância, ele nos faz
crer que o jogo funciona como “fator de desenvolvimento” por através dele ser
42

possível estimular a criança no exercício do pensamento, desvinculando-o das


situações reais a ponrto de levá-lo a agir independente do que ela vê.
Quando a criança joga, ela opera com o significado das duas ações, o que
faz desenvolver a sua vontade e ao mesmo tempo tornar-se consciente das suas
escolhas e decisões. Por isso, o jogo apresenta-se como elemento básico para a
mudança das necessidades, da consciência e do comportamento moral da criança.
Ela tem maneiras diferentes de pensar, ver e sentir e que o aprendizado tem a lhe
oferecer, advindo de uma experiência que sobrepõe às lições verbais.
A moralidade foi mais um dos temas abordados por Piaget em seu livro
Juízo Moral. Nesta obra ele escolhe um campo muito peculiar da atividade humana,
campo este de grande importância para o nosso estudo: que é o jogo das regras.
Toda moral consiste num sistema de regras e a essência de toda
moralidade deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire por estas regras.
(Piaget, 1977)
Para este autor os jogos coletivos de regras são paradigmáticos para a
moralidade humana. Podendo ser visualizado em pelo menos três razões,
primeiramente ela representa uma atividade individual regulada por certas normas
que, embora geralmente herdadas das gerações anteriores, podem ser modificadas
pelos membros de cada grupo de jogadores, explicitando a condição de “legislador”
por cada um deles. Em segundo lugar, embora tais normas não tenham em si um
caráter moral, o respeito a elas devido é sim moral. É, em último plano, o respeito
provem de mútuos acordos entre os jogadores, e não da mera aceitação de regras e
normas impostas por autoridades estranhas à comunidade de jogadores.
Com estas razões, Piaget adentrou no estudo do jogo a ponto de pesquisar
a prática e a consciência das suas regras, dividindo a evolução da prática e da
consciência em três etapas.
Caracterizada como a etapa onde a criança de até cinco anos de idade não
seguem regras coletivas, a anomia habita este mundo na medida em que uma
criança se interessa pelas bolinhas de gude, não para participarem de uma atividade
coletiva, mais para satisfazer os seus interesses motores.
A heteronomia, segunda etapa encontrada nas crianças de novo e dez
anos, é observada pelo interesse em participar de atividade coletivas e regradas. A
criança nesta fase não tem a compreensão de onde as regras surgiram, podendo vir
de “senhores” ou até mesmo de “Deus”, todavia a sua modificação mesmo que
43

aceito por outros jogadores é considerada “trapaça”, ficando clara a demonstração


da compreensão das regras como algo sagrado e imutável. Muito embora demonstre
este respeito quase que religioso às regras, quando está a jogar, demonstra-se
bastante liberto das mesmas a ponto de muitas vezes modificá-las a seu favor, sem
antes estabelecer alguma consulta ao seu adversário ou parceiro.
Estes dois aspectos podem parecer confusos em sua compreensão, pois
como pode compreender a regra como algo imutável e modificá-la ao mesmo
tempo? Este fenômeno ocorre pela criança não conceber as regras como
necessárias para regular as ações de um grupo e por isso não as segue a risca, e
por não a conceber desta forma atribui-lhes uma origem estranha, desconhecida à
sua atividade.
A última etapa é a autonomia, suas características são completamente
opostas às fases da heteronomia e da anomia, à medida que a sua compreensão
corresponde a concepção adulta do jogo que passa a ocorrer a partir dos onze anos
aproximadamente. Nesta fase, as criança seguem as regras com bastante esmero e
compreendem o seu respeito por ser ele decorrente de um acordo entre os seus
jogadores, nesta etapa eles concebem em si um possível legislador, criador de
novas regras que será submetida à aceitação de seus participantes.
Se for possível perceber todas estas características no jogo, fica clara a
idéia de que podemos através dele encontrar meios para proporcionar aos seus
jogadores a passagem entre seus estágios morais, esta passagem muitas vezes é
estabelecida por um outro fator que se processa em sua realização que é o fator
sociabilizador que ele oferece.
A partir do ato de jogar, a criança começa a descobrir o mundo, explorando
e se relacionando, ela constrói e socializa o conhecimento, na troca de experiências
com outras crianças, permitindo que tarefas e habilidades possam ser executadas
de maneira independente, ou mesmo com ajuda de colegas. Partindo deste
pressuposto. Vygotsky (1998, p.112) caracteriza com grande primor a zona de
desenvolvimento proximal (ZDP), conceituando-o como:
[...] a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma
determinar através da solução independente de problemas, e o nível de
desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a
orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes.
44

Esta idéia será sempre determinada pela relação entre as pré-condições


estabelecidas pelo nível de desenvolvimento prévio dos sujeitos e as suas
probabilidades de aprendizagens conseqüentes. Operar sobre a ZDP possibilita
trabalhar sobre as funções “em desenvolvimento” ainda não plenamente
consolidadas, mas sem necessidade de esperar sua configuração final para
começar uma aprendizagem.
É de grande valor o papel de mediação que o jogo oferece para propiciar
aprendizagens, seja ela em uma brincadeira, no jogo ou pela utilização de algum
brinquedo. No jogo, a discussão das regras favorece a passagem da heteronomia
para a autonomia à medida que a criança vai ampliando as suas percepções sobre
as regras, estas estarão diretamente relacionadas a construção realizada por eles
próprios. A medida que vão jogando e construindo o jogo, a ZDP que vai se
estabelecendo, favorecendo a aqueles que ainda estão na heteronomia a passarem
para autonomia.
Em uma atividade em que o professor busca construir as regras do jogo,
após defini-la, podemos lançar as crianças a seguinte pergunta: todos já entenderam
as regras? E em seguida pedi para que cada um converse sobre as regras com que
está do lado. Este tipo de procedimento além de proporcionar a sócio-interação
entre os seus participantes dará a eles a conotação de legislar o jogar.
Embora o jogo possa ter este papel, nem toda atividade lúdica será
geradora da ZDP como também nem todo aprendizado e ensino o fazem, este
fenômeno só será ocorrido se for oferecido aos educandos meios para tal, de forma
a envolvê-los em graus maiores de consciência das regras. Acredito portanto ser
necessário a utilização de enunciados para a disponibilização deste fenômeno, não
que a ZDP não possa ocorrer sem a sua utilização, mas seu emprego na atividade
deve funcionar como um meio instigador das potencialidades humanas.
Estes enunciados devem funcionar como propulsores do desenvolvimento
e da aprendizagem nas atividades educativas. Quando o educador proporciona um
jogo e ele mesmo cria as regras e a explica, deixar os seus educandos como meros
coadjuvantes deste processo, quando o professor se apropria do jogo não deve ser
para ditar as regras, mas para fazer com que todos se apropriem dessa cultura.
A idéia dos enunciados é trazer à discussão todas as potencialidades que
estiverem a sua disposição. Os enunciados podem ser classificados em verbal e
motor. No verbal, deverá ser sempre questionado as possibilidades de execução das
45

atividades, funcionando como um propulsor de possibilidades de execução de


qualquer atividade. Vejamos os seguintes exemplos:
 A criança ao brincar de jogar bola na cesta podemos perguntar. De que forma
podemos acertar a bola na cesta? Existe outra forma de acertar a bola na
cesta?
 Ao brincar de atravessar a sala de um lado para o outro de um pé só,
podemos utilizar o seguinte enunciado. De que outra forma podemos
atravessar de um lado da sala para o outro? Existe outra maneira?
Esses são apenas alguns de brincadeiras que podemos citar, contudo
podemos fazer o mesmo com atividades já conhecidas como o futebol, podendo
recriá-lo com o seguinte enunciador: é possível jogar futebol de outra forma? Todas
estes enunciados são apenas exemplos para a construção de muitos outros, dando
oportunidade a seus educandos de manifestarem a sua corporalidade a ponto de
cada vez mais contribuírem para a cultura corporal seja ela individual ou coletiva.
O enunciado motor está referenciado diretamente com o movimento
corporal, nele a ação motora de um indivíduo e o propulsor da manifestação de uma
reação, também motora, de outro individuo, sendo realizado através da correlação
existente no movimento. A criança ao brincar de pega-pega no momento em que ela
está a fugir do pegador ela cria uma diversidade de movimentos que lhes
possibilitem não ser pega, esta conduta caracteriza um enunciado pelo revelado
pelo pegador a ponto de proporcionar a quem está a fugir uma resposta motora, este
fenômeno também pode ser apresentado em atividades que trabalhem com o cessar
ou modificar um movimento de deslocamento corporal em um espaço, um grande
exemplo é a capacidade de parar de correr repentinamente, ou de mudar de direção
(esquivar).
A escola é a instituição contemporânea responsável pela sistematização do
conhecimento escolar. É a única que oferece diretamente o ensino de elementos
indispensáveis à sobrevivência no mundo letrado das sociedades modernas, muito
embora seja ela favorecedora da aprendizagem, não é a única, pois este processo
começa muito antes delas freqüentarem a escola, por este motivo Vygotsky (1998 p.
56) enfatiza a importância dos processos de aprendizado, de modo a relacioná-lo ao
desenvolvimento por acreditar ser ele “[...] um aspecto necessário e universal do
processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e
46

especificamente humanas”, formando portanto uma relação dinâmica entre


aprendizagem e desenvolvimento.
Com estas informações o que nós, educadores, faremos com as nossas
práticas de ensino? Quais procedimentos deverão ser tomados? Como poderemos
através do jogo auxiliar este processo de transição? Esta são apenas algumas
duvidas que podem surgir dentre uma diversidade de outras que ainda não foram
pensadas.
É da interação do meio físico com o meio social que o viver se apresenta, e
juntamente a ele o processo de desenvolvimento e aprendizagem. No que se refere
ao ser humano, estes fatores vão se diferenciando desde seu processo de
manutenção, passando por um procedimento complexo em que a combinação de
fatores biológicos e sócias produz nele transformações qualitativas, envolvendo-o de
aprendizagens de vários tipos, a ponto de poder expandir estas do ser humano.

2.2 A classificação dos jogos

Ao adentrarmos no processo de classificação do jogo, não podemos deixar


de referenciá-lo ao seu conceito anteriormente citado, onde nos trás a compreensão
do jogo para designar tanto o objeto e as regras do brincar da criança ou de suas
ações lúdicas.
As brincadeiras e os jogos das crianças funcionam como potencializadores
do desenvolvimento e da aprendizagem, é no brincar e no jogar que as crianças
entram em contato com as suas estruturas mentais, com a sua forma de pensar e
com o conteúdo de seus pensamentos, bem como a sua maneira de agir. Segundo
Ramos (2003), é nelas que as crianças organizam as suas experiências de vida,
bem como a transição que passa da heteronomia para a autonomia através da
prática e da consciência das regras contidas nos jogos e nas brincadeiras.
Em um de seus postulados Piaget (1990), traz a seguinte afirmação: “Não
existe estrutura sem gênese, nem gênese sem estrutura”. Ou seja, nos demonstra a
idéia de que o indivíduo só é capaz de conhecer epistemologicamente o real sentido
do que faz se estiver dotado de condições para tal, de modo a agir sob este
determinado objeto de conhecimento, seja ele material ou cognitivo, podendo a partir
de então inseri-lo em seu sistema de relações.
47

Em muitos de seus conceitos dois são de bastante importância para a


compreensão deste processo de estruturação de conhecimentos, em primeiro vimos
a organização referido a capacidade que o organismo tem de manter-se organizado
enquanto ser vivo, um verdadeiro sistema de regulação individual que se mantêm
em todo o seu contexto de interações e mudanças constantes, que ocorre através
das trocas com o meio e em segundo refere-se a adaptação que é o modo como os
seres vivos fazem essas trocas, mas para que estas trocas ocorram é necessário
que haja uma estrutura anterior já adquirida, para que seja possível aprender uma
mais complexa e transformá-la.
Para que ocorra este processo de adaptação é necessário envolver dois
aspectos bastante integrados, a assimilação e a acomodação, mas que podem ser
até certo ponto compreendidos separadamente. Na assimilação o indivíduo
incorpora em seu ser os eventos, objetos e etc, em forma de pensamento que
constituem as formas de pensamentos que constituem as estruturas mentais já
organizadas, assemelhando deste modo o mundo exterior com o mundo interior. A
medida que a magnificiência cognitiva se modifica em função do meio e deu suas
variações dá-se a acomodação, nome dado a esta transformação que gera um
reorganização da estrutura mental.
A caracterização deste processo de desenvolvimento intelectual é
modelado pelo equilíbrio progressivo entre o mecanismo assimilador e o
acomodador complementar que ocorrem simultaneamente em face aos desafios e
que a vida os empoem.
Neste campo de compreensão, a classificação dos jogos perpassa pela
relação do processo de desenvolvimento caracterizada pelas características próprias
de cada etapa, observando em Piaget (1990) a denominação do jogo como símbolo,
exercício e regras enquanto Vygotsky (1998) distingue-as como atividades de
caráter simbólico e as marcadas por regras externas impostas socialmente, contudo
apesar de possuírem denominações particulares as suas definições se entrelaçam
constantemente.
Para Piaget (1990) os jogos consistem em assimilação funcional, onde
funcionam os exercícios das ações individuais já apreendidas de forma a gerarem
prazer tanto pela situação lúdica em si quanto pelo domínio das ações em si. É daí
que podemos tirar a compreensão de ser o jogo um consolidador dos esquemas
formados e oportunizador de novas consolidações.
48

Em sua obra ele delineia um sistema de manifestação do jogo desde o 0


aos 13 anos. As características lúdicas aparecem bem cedo, quando a criança ainda
é bebê, no decorrer dos primeiros 18 meses de vida, esta etapa é caracterizada
como período dos jogos de exercício, nesta fase a atividade realizada não possui
nenhum propósito prático, e nela onde se manifesta os primeiros gestos e ações que
se repetem por mero prazer funcional onde a imitação e a repetição estão presentes
a todo o momento como seqüência já estabelecidas de ações e manipulações.
Nesta fase de desenvolvimento, o organismo tende a repetir
funcionalmente e o que se integra à estrutura de seu sistema, sendo produtor de um
prazer pelo domínio gradativo dos movimentos por ele desejado.
A característica marcante nos jogos de exercício nos primeiros anos de
vida é a ação da assimilação, por ser ele um jogo funcional ou repetitivo através de
combinações sem finalidades ou com finalidades e funcional na ação sensório –
motor onde exercita as condutas pelos simples prazer da função da prática motora
ou pela tomada de consciência de seus novos poderes, é neste processo que se
manifesta toda a formação de hábitos que apuram os esquemas, constituidores da
base para futuras operações do intelecto. A característica repetitiva pode ser
delineada pelo ato lingüístico de modo que após ter aprendido a formular perguntas
a criança pode se divertir fazendo perguntas pelo simples prazer de perguntar.
O jogo simbólico é caracterizado pelo aparecimento da capacidade
representativa da criança, onde ocorre simultaneamente com a aquisição da
linguagem a partir do segundo ano de vida, mas que só passa a expressar-se de
forma significativa dos 3 aos 6 anos, é através destes esquemas simbólicos que se
dá a possibilidade de outras atividades lúdicas. É no jogo simbólico ou jogo de
caráter simbólico (faz-de-conta) que a criança é capaz de simbolizar e representar
um objeto ausente, Piaget (1971) diz que quando a criança brinca, ela assimila o
mundo a sua maneira, sem compromisso com a realidade, pois sua interação com
objeto não depende da natureza do objeto, mas sim a função que a criança lhe
atribui.
O jogo simbólico é a demonstração da capacidade de representação de um
objeto por outro, ou até mesmo da utilização da imaginação para a materialização de
seus anseios. É possível observar este fato nas brincadeiras infantis em que
ouvimos as crianças falarem entre elas: “vamos dizer que isso é um cavalo”, fazendo
menção ao cabo de vassoura, ou quando assumem papeis de imaginários como:
49

“sou o médico”, ao brincar de médico, “sou a mãe”, ao brincar de casinha, ou tantos


outros adivinhos da imaginação das crianças como imitar a diversidade de super-
heróis que estão presente em seu cotidiano.
Neste parágrafo acima, é possível observar o jogo simbólico em duas
qualidades, inicialmente na qualidade de solitário onde a criança da significado ao
abjeto que a mesma brinca e a sua evolução para o estágio do jogo simbólico
sóciodramático, onde se manifesta a representação de papeis. O jogo simbólico
individual pode, também, de acordo com momento, passar pela transformação de
solitário para coletivo com a presença de vários participantes. A maior parte de seus
movimentos, fazendo referencia a seus atos complexos, podem anteriormente terem
sido objeto de jogos de exercícios sensório-motor isolado.
Na representação de um objeto por outro, a criança se vale do brinquedo
para se adaptar ao mundo que não compreende; desta forma, ela reintegra os fatos
e passa a representá-los em diferentes situações e assim satisfaz seus desejos,
equilibrando-se afetiva e cognitivamente, pois a medida que há uma dissociação
entre a significante e o significado, as crianças constituem uma atividade real
essencialmente egocêntrica e reforçam a consciência de poderes recentemente
adquiridos pela ampliação fictícia, a ponto de reproduzir as cenas em que ocorre o
risco de derrota ou de dificuldades para que possa, posteriormente, vencê-las.
É nesta fase que podemos observar a passagem do imaginário da situação
concreta para o abstrato, onde não há uma continuidade e sim uma
descontinuidade, para Vygotsky (1984) é praticamente impossível uma criança de 3
anos envolver-se em uma situação imaginária e que só brincando é que será
possível perceber o objeto não da maneira como ele é, mas como desejaria que
fosse.
O jogo simbólico oferece às crianças alguns fatores essenciais para o
desenvolvimento, onde possibilita a ela adquirir a linguagem convencional,
aprendendo a nomear os objetos de acordo ao seu conceito cultural, começa a
trabalhar com as suas imagens mentais, realizando os primeiros passos da
articulação entre ação e pensamento, e a capacidade de trabalhar com símbolos
que é de trabalhar no mundo fictício.
Já no jogo de regras, é perceptível o declínio, é nele a possibilidade da
construção das regras serem transmitidas para a sua compreensão, podendo ser
transmitidas por sua cultura, por seus jogadores ou por escrituras. Não podemos
50

deixar de trazer as de origem espontânea, regras estas criadas no momento da


vivência das atividades, constituindo-se no seu entender como um marco da
passagem das atividades individuais para as atividades socializadas e de
cooperação.
É neste período onde podemos caracterizar a fase mais avançada quando
nos referimos ao desenvolvimento intelectual da criança, período de plena
manifestação do mundo social e cultural que a crianças está inserida, de modo a ser
perceptível as características egocêntricas, possibilitando, neste período, diferenciar
e integrar os seus diversos pontos de vista. Tanto as transmitidas quanto as
espontâneas tem função de desenvolver a motricidade.
Enfim, as regras são para seus jogadores a representação dos limites, do
que é permitido e do que não é permitido, são as regras que regulam a convivência
entre as pessoas. É através das regras que podemos criar a variedade de atividades
lúdicas, recriar todos os jogos de forma a descobrir e redescobrir a diversidade de
meios do brincar, possibilitando a ela vários níveis de dificuldades, a ponto de
determinarmos o grau de exigência, de descontração e coordenação das ideias de
acordo com o tipo de jogo, estabelecido pelos seus jogadores.

2.3 As características dos jogos

Anteriormente à revolução romântica, a concepção de jogo era


estabelecida em três mecanismos para diversificar a qualidade do jogo infantil. Para
podermos compreender todo processo de caracterização do jogo acreditamos ser
necessário conhecer as suas seguintes definições:
 Atividade recreativa;
 Favorecedor dos conteúdos escolares;
 Diagnosticador de personalidades infantis de modo a ajustar o ensino às
necessidades das crianças.
No que se refere a enxergá-la como recreação sua conotação vem com um
pouco do ranço da história greco-romana onde ela aparecia como atividade de
relaxamento necessário para as atividades que exigiam esforços físicos, intelectuais
e escolares. Por um grande período os jogos ficaram limitados a recreação, um dos
51

seus principais fomentadores para esta colocação era a sua caracterização de ser
ele “não-sério” e ser associado ao jogo de azar.
A partir de Renascimento, o jogo passa a servir como divulgador dos
princípios de moral, ética e conteúdos da geografia, história, matemática e outros
vendo o ato lúdico como um mecanismo que favorece o desenvolvimento da
inteligência e facilitadora do estudo, por ela atender de forma completa as
necessidades infantis sendo deste modo caracterizado como mecanismo de
aprendizagem dos conteúdos escolares, se contrapondo ao método pedagógico
vigente (processos verbalistas de ensino auxiliado pela palmatória).
No século XVIII, surge o conhecimento da criança como via de acesso à
origem da humanidade à medida que se observa o poder imitativo que as crianças
possuem. Era suposto que poderia haver uma equivalência entre povos primitivos e
a infância, visto que a infância é considerada a idade do imaginário, à semelhança
dos povos da mitologia, partindo daí a afirmação que o jogo é uma conduta
espontânea. Esta teoria influenciada pelo positivismo trás a tona o poder da seleção
natural das espécies animais que possuem uma grande capacidade de se
adaptarem a novas condições de vida, a conduta lúdica parece neste ponto
incorporar a adaptabilidade dos animais que se tornam mais aptos para a
sobrevivência.
Em pleno século XIX, a psicologia como uma ciência responsável por
estudar a mente humana, passa a buscar meios para avançar em seus estudos, por
conseqüência desta sua busca recebe bastante influencia da biologia, motivo pelo
qual em seus estudos faz bastante transposição dos estudos com animais para os
estudos infantis. Neste período, o jogo é visto como pré-exercício de instintos
herdados, esta conotação cria uma ponte estreita entra a biologia e a psicologia.
O jogo era encarado como uma necessidade biológica por seus estudiosos,
com esta afirmação a psicologia o observa como um ato voluntário, dando respaldo
para os cientistas afirmarem ser o jogo o meio onde o homem manifesta a sua
vontade e a consciência infantil em busca do prazer. Para Claparêde (1956), o jogo
infantil desempenha papel importante como motor do autodesenvolvimento e, em
conseqüência método natural de educação e instrumento de desenvolvimento. O
encarando como um meio de estudar a criança e perceber os seus comportamentos,
de forma através das brincadeiras poderem diagnosticar os problemas da criança.
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Nesta visão fica um tanto quanto difícil ter este fator como determinante
diagnosticador das deficiências encontradas nas crianças por neste modelo não se
estudar as suas especificidades, dificultando assim o ajuste do ensino infantil.
Ao observar os pesquisadores da ludicidade, encontrei com grande
freqüência semelhanças plenas nas discussões sobre a natureza dos jogos, elas
ficam bastante evidentes a medida que começamos a separá-las por suas
qualidades e funções, podemos observar em todo o seu contexto uma grande
familiaridade referenciada na qualificação das funções, muito embora em alguns
casos possuam singularidade em sua conceituação, mas em uma coisa todo se
encontram. A existência de regras em todos os jogos é uma característica marcante,
seja ela explicita como num jogo de damas, amarelinha, pique-esconde ou como
regras implícitas como nas brincadeiras de faz-de-conta, onde o filho brinca de se
fazer passar por médico é cuidar de necessitados.
A liberdade de ação é algo de extrema importância para quem dele está a
usufruir, pois segundo Huizinga (1993) esta é uma das principais características que
o jogo oferece, muito embora existam outras que possuem graus significativos
como: a separação do jogo em limites de espaço e tempo, a incerteza que
predomina, o caráter improdutivo de não criar nem bens e nem riqueza e suas
regras.
Esta característica de ser o jogo um elemento de natureza improdutiva, não
afasta a idéia de ser ele algo não favorável a aquisição de conhecimentos, mas sim
uma observação da sua natureza, pois por ser ele uma atividade voluntária da
criança, com fim em si mesmo, não pode criar nada e não visa um resultado final. O
importante no jogo é o processo em si de brincarem que a criança se impõem,
quando ela brinca não está preocupada em adquirir conhecimentos nem muito
menos em desenvolver determinadas habilidades mentais ou físicas, eis o porque da
incerteza de toda conduta lúdica, pois em um jogo nunca se sabe a direção da ação
do jogador, ação esta dependente dos fatores internos, das motivações pessoais e
de estímulos externos, como também a conduta de outros parceiros.
Esta liberdade de ação nos traz, muitas vezes, questionamentos a respeito
da brincadeira infantil, pois à medida que a observamos podemos constatar que ao
mesmo tempo em que ele diz “não estou brincando”, em alguns segundos
posteriores ela diz está brincando, este comportamento proporciona uma dificuldade
para se realizar um estudo mais aprofundado sobre o jogo, mas este comportamento
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nos trás algo de grande importância que é o fator determinante para a sua entrada e
saída do jogo que é a intenção da criança para com a atividade.
A intencionalidade projetada pela criança será sempre a fonte inspiradora
para a realização e atuação de uma atividade lúdica, seguida por alguns
comportamentos que podem influenciar as características do jogo infantil.
 A não-literalidade: nesta situação a brincadeira caracteriza-se pela situação
em que a realidade interna da criança, predomina a realidade externa de
modo a estabelecer a troca entre o sentido, habitual por um novo. Podemos
observar esta diferença pelo exemplo de uma criança ao imitar outra
chorando.
 A produção de efeito-positivo: a caracterização dos jogos infantis no que se
refere ao efeito positivo é normalmente verificado pelos signos do prazer e da
alegria manifestado pelo sorriso. Quando a criança brinca livremente e se
satisfaz com a brincadeira ela demonstra em seu semblante a ar de
felicidade. Esse entusiasmo trás efeitos positivos ao aspecto corporal, moral e
social.
 Flexibilidade: em uma atividade lúdica, as crianças estão sempre mais
disponíveis para exercitar novas combinações de ideias, até porque o próprio
jogo já possui um certo nível de incerteza, onde as ações tendem a depender
também de fatores externos. Um outro fator de grande importância para este
procedimento é a ausência de pressão do ambiente. É da própria brincadeira
propiciar um clima necessário para a investigação de soluções para os
problemas encontrados no brincar, de modo a proporcionar para as crianças
uma maior flexibilidade.
 Livre-escolha: o jogo só será caracterizado como jogo quando ele for
escolhido por livre e espontânea vontade de que se pretender jogar, caso
contrário será considerado trabalho ou ensino.
 Prioridade no processo do brincar: quando a criança está envolvida no
processo do brincar a sua atenção está concentrada diretamente no brincar,
em sua atividade em si e não no que ela tem por fim. No jogo quando
colocamos em primeiro plano a aquisição de habilidades ou de
conhecimentos, esquecendo o que há de fundamental que é o brincar, a
atividade deixa de ter sua função real do jogo. Podemos perceber a
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manifestação deste problema em muitos jogos educativos que muitas vezes


se desvirtua do brincar para favorecer os conteúdos por ele estabelecidos.
 Controle interno: na realização do jogo os seus acontecimentos e regras
devem está afeito ao experimento de sua prática de modo aos seus jogadores
determinarem o grau de seu desenvolvimento enquanto brincadeira, a partir
do momento que nós professores passamos a utilizar um jogo educativo em
sala de aula de forma a controlar todos os seus movimentos, sem propiciar a
seus educando a liberdade e o controle interno, estaremos mais uma vez
dando predomínio ao ensino e imortalizando o poder do professor.
Ao observarmos todas estas características, podemos compreendê-lo com
um grande conteúdo a ser explorado em seu amplo aspecto, como também ser
utilizado como um método para proporcionar as diversas experiências necessárias
para a ampliação do repertório lúdico e o motor de toda criança que a ela estiver
disponível.
Dentre os diversos jogos que fazem parte da realidade da cultura brasileira
é possível fazer uma classificação sobre as características encontradas em suas
práticas.

Jogos de perseguir:
 Alerta
 Barra – manteiga
 Chicotinho – queimada
 Garrafão
 Cabra – cega

Jogos de atirar:
 Amarelinha
 Bolinha de gude
 Boliche
 Cinco Marias (Capitão)
 Tiro ao alvo

Jogos de correr e pular:


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 Corda
 Elástico
 Corrida com pneus
 Corrida de sacos

Jogos de agilidade e destreza:


 Dança das cadeiras
 Estátuas
 Bambolê
 Pé-de-lata
 Vai-e-vem

Esta classificação não tem um caráter fixo, determinado, inflexível, ao


contrário, a sua representação é apenas um exemplo de como podemos construir
um glossário de jogos com especificidades próprias, a ponto de dar-nos suporte no
desenvolver e na escolha de nossos jogos em nossas práticas educacionais.
Todo e qualquer jogo possuidor de um objetivo, quando bem direcionado
poderá ser alcançado a medida que a sua manifestação esteja em concomitante
parceira com os seus praticantes, fazendo referencia a fase estabelecida por sua
idade ou capacidade cognitiva. Para que seja possível escolher os jogos,
brincadeiras e brinquedos que servirão como auxílio na apreensão de
conhecimentos pelos educando faz-se necessário observar alguns valores de
extrema importância:
 Valor experimental: o que este jogo, brinquedo ou brincadeira possui de
disponibilidade de exploração e ou manipulação;
 Valor de relação: o que ele vai oferecer aos seus participantes em relação ao
estabelecimento de contatos e vivenciadas a medida que a criança interage;
 Valor lúdico: até que ponto o jogo estará a estimular o lúdico.
Uma das grandes características que norteiam o jogo é a sua liberdade,
onde se demonstra livre de pressões e avaliações, partindo daí a idéia de ser ele o
produtor do clima adequado para as investigações e a busca de soluções, como
estimular a exploração em busca de resposta independente do acertar ou errar. Ele
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deve ser valorizado pelo seu potencial para o aprendizado moral, integração da
criança no grupo social e como meio para a aquisição de regras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através das pesquisas realizadas durante este curso, fica possível


perceber que a “atividade lúdica” intervêm no aprendizado da criança na sala de
aula. O jogo é agradável, motivador e enriquecedor, possibilitando o aprendizado de
várias habilidades e também auxiliando no desenvolvimento mental, na cognição e
no raciocínio infantil. A ludicidade precisa ser trabalhada por todos os professores,
independente da disciplina que atuam, dentro e fora da sala de aula.
Os professores devem usar a interdisciplinaridade para ensinar as
crianças. Precisam planejar cuidadosamente os objetivos das aulas e trocar
informações entre si. Mas o que realmente acontece nas escolas é uma distância
entre o professor de Educação Física e outros professores: há um imenso abismo,
obscuro e íngreme, entre os docentes de classe e os professores de Educação
Física.
Os professores precisariam se unir para trazer novamente o prazer às
crianças em aprender. E também os próprios professores recuperarem a vontade de
ensinar. O foco que devemos ter é apenas o benefício da criança, conhecê-la
realmente, saber suas dificuldades e vontades; e é através do lúdico que
conseguiremos reconhecer os problemas de cada criança, apresentando a elas um
mundo real, misterioso e curioso para se aprender e transformar.
Através da interdisciplinaridade, os professores não deixariam os aspectos
teóricos e os conhecimentos de lado... Apenas problematizá-los em conjunto com os
aspectos práticos e problematizações reais e contextualizações. Ensinariam o que
fosse preciso, aplicável, usando a dinâmica de jogos e brincadeiras, que poderia
estimular o desenvolvimento do raciocínio, além de estimulá-las com desafios que
as incitassem a serem mais ágeis, espertas, atenciosas, criativas e dinâmicas,
condutoras de seus próprios movimentos.
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O jogo é o melhor caminho da iniciação ao prazer estético, à descoberta da


individualidade e a meditação pessoal. Entretanto, deve ser usado pedagogicamente
com rigoroso e cuidadoso planejamento, marcados por etapas muitos nítidas e que
efetivamente acompanhem o progresso dos alunos.
Verá que o tempo não para e que a cada dia que passa se faz necessária a
existência de profissionais mais comprometidos com o ato de educar, de forma a
adentrar no campo de significação infantil, a ponto de perceber a ludicidade
enraizada em seu existir, e com essa percepção, ser capaz de se autoregar de
estudos de forma a poder brotar jogos, brincadeiras, brinquedos e espaços que
ofereçam a cultura infantil à máxima que a vida lhe proporciona, que é a capacidade
de viver e aprender.
A ludicidade faz parte das atividades essências da dinâmica humana,
caracterizando por ser espontâneo funcional e satisfatório levando a realização de
diversas atividades que englobam a criança dentro de sua especificidade
contribuindo para uma satisfação pessoal.
Portanto, a ludicidade pode ser um tema atual, porém já era um lema
estudado de muito tempo atrás. Visto numa abordagem restrita a Educação Física e
presente somente nestas aulas, sem vinculo a outras demais áreas de
conhecimento.
Enfim, o brincar é a primeira etapa da criança e nesta vertente é que se
pode atuar com qualidade no processo de ensino e interferir na aprendizagem com
atuação do lúdico de acordo com a cultura regional. Pois acredito que todos nós
professores, que acreditamos em mudanças, que somos curiosos e que estamos
sempre em busca de ações educativas eficazes, devemos sim, apostar no lúdico
como processo de ensino aprendizagem.

REFERÊNCIAS:
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suas relações com as propostas de ensino. Revista Baiana de Educação Física, v.
3, n. 2, jul/dez 2002.

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Parâmetros Curriculares Nacionais: educação física. 3. Ed. Brasília: A Secretaria,
2001.

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Campinas: Papirus, 1998.

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Paulo: Editora do Brasil, 1956.

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Paulo: Cortez, 1992.

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social dos conteúdos e a educação física brasileira. São Paulo: Edições Loyola,
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Educativa Lúdica: pode um peixe viver fora d’agua fria. 2003. Tese (Doutorado
em Educação) – Faculdade de Educação da Bahia, Universidade Federal da Bahia.
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TANI, Go et al. Educação física escolar: fundamentos de uma abordagem


desenvolvimentista. São Paulo: EPU, 1988.

VYGOSTSKY, Lev Semenovich. A formação social da mente. 6. ed. São Paulo:


Martins Fontes, 1998.

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