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Hesíodo.
Diferente de Homero, muitos críticos e estudiosos o consideram como uma figura
histórica, pois o mesmo, diferente deste último, identifica-se em ambos os seus poemas. Na
theogonia ele diz sobre si mesmo, que foi visitado pelas Musas quando estava pastoreando
ovelhas. Nesta obra, apresenta grande conhecimento sobre a vida rural e agrícola do
camponês grego. Vale sempre lembrar que neste período, a economia da grande Heláde era
sustentada principalmente por uma agricultura de sobrevivência, onde cada um produzia para
seu sustento. Heródoto aponta: "Os gregos tem sido criados na escola da pobreza, e a virtude
a ela se junta, filha da temperança e das leis estáveis, dando-nos armas contra a pobreza e a
tirania." ( v.7.102.1).
Não há glorificação do trabalho, pois se trata antes de tudo de uma necessidade. Ele se
encontra como meio, caminho entre a pobreza para a prosperidade. Portanto, o trabalho não é
algo vergonhoso, mas é possível encontrar alegria no trabalho.1
A palavra ἐργα designava simplesmente trabalhos agrícolas na antiguidade, e não tem
nenhuma semelhança com o que chamamos trabalhos modernos assalariados, como produto
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da sociedade humana. Conceito de Justiça é algo essencial para compreender a noção de
trabalho.
Inicio.
Logo de inicio Hesíodo traz um verso belo, que reflete que para aqueles que não
possuem nenhum sustento, os discursos na ágora, as filosofias não possuem importância
alguma. A fome e carência é uma das principais necessidades que os homens estão sujeitos.
Hesíodo traz ainda um aforismo famoso, que com toda evidência é um contrassenso
lógico, a parte nunca é maior que o todo, pois já esta contida na parte que ela é inferior ao
todo. Ele porém afirma que a metade é maior que o todo, se referindo que o meio, a justa
medida, é onde está a grandeza, pois nela está a justiça.
Percebe-se então esta noção de Justiça como meio termo, já aparece em Hesíodo, e
podemos percebê-la até na Ilíada, quando a força, a ὑβρις é mostrada em toda sua desmedida.
Tal concepção portanto não foi inventada por Aristóteles.
Inicia-se um dos relatos do mito de Prometeu, que serve como justificativa para a
necessidade dos trabalhos. É preciso sempre que haja trabalho, pois não é dado aos homens
ficarem ociosos, por causa do roubo que realizou o Titã por amor aos homens. Zeus teria
escondido o sustento dos homens, que somente com muito esforço e trabalho o encontrariam.
Prometeu roubou o fogo de Zeus para dá-lo aos homens numa férula oca4, (sinal da
cruz? Ésquilo em seu Prometeu Acorrentado segue esta mesma tradição, apontando que o
Titã esconde numa árvore este fogo, para entregá-lo aos mortais.
3
ὤρη γάρ τ᾽ ὀλίγη πέλεται νεικέων τ᾽ ἀγορέων τε,
ᾧτινι μὴ βίος ἔνδον ἐπηετανὸς κατάκειται
ὡραῖος, τὸν γαῖα φέρει, Δημήτερος ἀκτήν.
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εν κοιλω ναρθηκι… v.52
Após o feito de Prometeu, os homens são punidos pelos trabalhos e com a figura da
mulher, Pandora5. Surge então uma necessidade do trabalho e do amor conjugal. No relato do
Gênesis o amor conjugal é anterior ao fardo do trabalho, consequência do pecado original,
embora através deste tenha sua estrutura totalmente alterada, partindo para a dominação e
enganação (ἐπίκλοπος ἦθος6, um caráter fingido). Em ambos o trabalho é fruto do castigo
divino.
A mulher, Pandora, segundo o relato, traz todos os males para os homens, abrindo a
tampa de sua jarra, onde fica somente a Ἐλπὶς, a Esperança, a Antecipação, abaixando a jarra
para que ela também não escapasse. Espalha-se os sofrimentos sobre a terra, eis a condição da
miséria humana:
Por conta própria vem e vão sem cessar, males aos mortais levando
Em silêncio, já que privou-as de voz Zeus sábio. v.103-4
Propõe o poeta cinco gerações de homens, que tem sua excelência segundo a ordem de
seu nascimento. A primeira raça de homens feita pelos imortais habitantes do Olimpo foi a
raça de ouro, que como acentua Hesíodo, foi a primeira de fala articulada (μερόπων). Esta
raça não conheceu sofrimento, velhice ou dores. A terra não lhes negava o sustento, de modo
que repartiam livremente entre si o trabalho7. Porém a morte visitou estes homens:
A segunda raça é a de prata, considerada bem pior pelo poeta, em nada semelhante aos
de ouro. Eram insolentes e rebelde a partir de sua adolescência, e não queriam servir os
deuses. Estes após sua morte, foram levados para o subterrâneo, e lá vivem com certa honra.
A terceira raça é a de bronze, marcada pela violência, brutalidade, pois eram fortes e
vigorosos, mas pereceram pela sua própria força. A quarta é a dos heróis, os semideuses,
geração essa que precede à nossa, e que é foi destruída com as guerras como são contados nas
histórias... Por fim, a última, que é a atual da humanidade, é a raça de ferro, marcada pelo
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Pandora… dom de todos… pois todos os olímpicos a fizeram para da-la aos homens…
6
v.67..
7
v.119
sofrimento, pelo trabalho e pelos diversos infortúnios. Trata-se de uma raça bastante
miserável e imoral, que se compraz na força, na insolência, e não respeita a Justiça.
O poeta se refere à um Χειροδικαι, o direto da força, característico deste homem, que
ele chama de homem-violencia ύβριν ανερα: Marcado pela desmedida, não reconhecem o que
é o bem e o que é o mal, pois preferem o mal ao bem.
Nenhum apreço haverá por quem é fiel aos juramentos, pelo justo
ou pelo bom: antes o malfeitor e o homem-violencia
honrarão. A sentença estará na força; reverência
Não existirá… v.190-4
A Justiça
Fábula da falcão e do rouxinol… que usa sua força para dominar a pequena ave
poeta... A moral da história é de que nunca deve se medir com os mais fortes, pois estes o
destruiriam. Com isso, porém, Hesíodo quer mostrar que há uma diferença entre os homens e
os animais, e pede a seu irmão para ouvir a Justiça, que não é comum aos animais.
Trata ainda da Justiça maltrata, arrastada, pelos homens 9, pois não a querem ouvir nem
distribuí-la retamente. A consequência é que ela mesma traz diversos males aos homens.
Principalmente ao que ele denomina os devoradores de dons... δωροφαγοι… devoradores de
presentes…
O homem difere dos animais, pois estes se baseiam na força, o homem deve basear-se
na justiça. Trata-se de uma lei fixada por Zeus.
Sobre o trabalho
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ὑβρις como insolência, violência e desmedida…
9
v.220
O trabalho foi fixado como caminho para se chegar ao sustento e prosperidade,
portanto é algo necessário. Não foi dado aos mortais a conquista sem sofrimento (τόν πάθει
μάθος???).
Hesíodo dirigindo a Pérses, aponta que embora nunca tenha navegado, exceto num
rara ocasião, irá dirigir instruções sobre a navegação, pois foi inspirado pelas Musas, filhas de
Zeus:
Contra a desmedida, buscando o lucro, pode ser motivo de ruína e queda. Fardos excessivos
no carro podem quebrar o eixo e a carga se estraga. Para evitar, é importante usar a medida
(μέτρον) adequada, nem a falta ou excesso. Percebe-se então que isto estava presente no
espírito grego, e não foi uma descoberta de Aristóteles, que simplesmente teorizou o que já
estava presente na mentalidade grega. A justiça está relacionada com a medida adequada:
Hesíodo trata como deve ser o trato com os amigos, como deve se evitar toda forma de
mentira, e que o perdão para as faltas é algo louvável. Adverte ainda sobre a justa medida
(μέτρον) no falar, mostrando que em todas as coisas, esta noção grega deve ser aplicada. A
noção de medida permeia esta parte do poema.... casar nem muito velho, nem muito novo;
nem homem de muitos hospedes nem de nenhum; nem companheiro dos maus, ou de rixa com
os bons.
Sobre a religião.
Os Dias
Neste final do poema, o poeta traça uma longa descrição dos dias do mês,
aconselhando o que dever ser realizado em cada dia, como inicio de plantar e de colher,
quando castrar os animais, quando tecer ou fiar... Parece que há uma certa religiosidade nos
dias, com suas funções próprias, algo religioso e sagrado. É preciso observar tais dias pois foi
algo fixado por Zeus, que pune aqueles que os transgridem. Trata-se de um calendário lunar,
onde o próprio mês as vezes é sinônimo de lua.
Hesíodo cita ainda dias que possuem caráter negativo, como que fossem dias
amaldiçoados. Há dias bons para nascerem meninos e outros para nascerem meninas, que
podem interferir no comportamento dos mesmos. Fala dos dias nove como dias inofensivos
aos homens, de todo bons, que são úteis para nascer tanto homens quanto mulheres.
O poeta traz por fim, que os dias podem ser ora madrastas ora mães, e que tudo
depende dos presságios informados pelos deuses. O homem feliz é aquele que os percebe e
trabalha sem ofender os deuses. Assim termina esta obra monumental.