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DIREITO DE GREVE

Introdução.

A história do Direito Coletivo do Trabalho expressa a


própria história do Direito do Trabalho. Isto decorre do fato de
que a disciplina protetiva aos operários surgiu da luta coletiva
por melhores condições de trabalho e de vida. Tudo começou com a
Revolução Industrial, impulsionada pela invenção da máquina, pela
migração dos trabalhadores dos feudos para as cidades, e, também,
pelo liberalismo político e econômico, além da consolidação do
sistema capitalista.

O liberalismo, estranhamente, acabou se constituindo um


obstáculo à organização dos trabalhadores. No caso, embora fosse
enunciada a liberdade formal do indivíduo, assim como o direito à
livre associação, previstos na Declaração Universal dos Direitos
do Homem, fruto da Revolução Francesa em 1789, a Lei Chapelier, de
1791, na França, aboliu as corporações de ofício e proibiu todas
as formas de coalizão1. Na Inglaterra, as leis conhecidas como
Combinations Acts, de 1799 e 1800 consideravam a união de
trabalhadores como delito de conspiração.

Em seguida, em 1810, o Código Penal francês criminalizou,


fixando penas privativas de liberdade, a ação de quem tentasse
reunir-se para a defesa de seus interesses profissionais ou
reivindicar quaisquer direitos. Tais preceitos foram seguidos em
diversos países.

No Brasil, a Constituição de 1824 proíbe as corporações


de ofício. Com isso, o indivíduo estava liberto dos grupos sociais
que até então o subordinavam, mas passou a encontrar-se sozinho,
isolado e fragilizado para enfrentar as novas agruras da vida
operária.

No início do desenvolvimento industrial, tínhamos a


passividade do Estado diante da excessiva exploração dos
trabalhadores e a falta de consciência de classe destes, ausente
que era a noção da força social e transformadora da união
operária. Em tal contexto, os trabalhadores passaram por condições
de extrema penúria, com salários aviltantes, jornadas excessivas,
ausência de proteção acidentária e do meio ambiente de trabalho.
Esta situação era agravada com relação às crianças e mulheres que,
em regra, sofriam ainda mais com os abusos patronais.

Com a pauperização dos trabalhadores, unidos nos

1
Segundo Enoque Ribeiro dos Santos, “entende-se por coalização, uma forma efêmera de união, reunião ou agrupamento de
trabalhadores ou empregadores para um determinado objetivo, sem o vínculo da continuidade. Em outras palavras, atingido o
objetivo ou esvaindo-se a determinação dos partícipes, o agrupamento deixa de existir”. O conceito integra o estudo “O Direito
Coletivo do Trabalho sob a Perspectiva Histórica”, constante do Curso de Direito do Trabalho, volume III, Organizadores Jorge
Luís Souto Maior e Marcus Orione Gonçalves Correia, editora Ltr, São Paulo, 2008, p. 13.

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subúrbios das cidades, nos arredores das fábricas, acabou
naturalmente surgindo a consciência de grupo, a necessidade de
atuação coletiva em defesa de seus interesses. Perceberam que
individualmente não tinham qualquer poder de barganha com o
empresário, ficando, assim, reféns das imposições patronais acerca
de salários e demais condições de trabalho. Deste modo, as
associações operárias viveram um rico ciclo na história, ora
reprimidas, ora toleradas pelo Estado, até o seu reconhecimento
legal. De início, a força da resistência operária manifestava-se
por meios mais violentos, como reação aos abusos capitalistas,
provocando greves, sabotagem e boicote. Era a linguagem que
chegava à sensibilidade dos patrões, provocando a abertura de
diálogo e concessões para manter a ordem social e produtiva.

Em 1832, por meio do Representation of the People Act


1832, conhecido como Ato Reformista de 1832, a Inglaterra
legalizou as uniões de trabalhadores.

Diante da grave questão social, o Estado passou a


legislar – timidamente, é verdade -, estipulando direitos mínimos
à classe trabalhadora. Nesta fase inicial, era comum o regramento
de jornada e idade mínima para o trabalho de menores, salário
mínimo e proteção às mulheres. Mesmo assim, os Estados nacionais
não dispunham de mecanismos de inspeção do trabalho, de modo que
tais leis eram ignoradas por grande parcela do empresariado.

No final do século XIX, houve intensa movimentação em


prol da regulamentação do Direito do Trabalho, com realização de
Congressos Internacionais na Europa. Tal processo foi estimulado
pela Encíclica Rerum Novarum, na qual o Papa Leão XIII denunciava
a questão social e conclamava os Estados a protegerem o
operariado, não permitindo que o trabalho fosse considerado uma
mera mercadoria.

Este processo de consolidação do direito laboral culminou


com a constitucionalização do Direito do Trabalho, a partir da
Constituição Mexicana, de 1917 – ignorada por boa parte da
doutrina laboral européia – e da Constituição da República de
Weimar, em 1919. Também em 1919, foi criada a Organização
Internacional do Trabalho, organismo imprescindível para a difusão
e consolidação do direito do trabalho nos diversos países do
mundo.

O Direito brasileiro, com a Revolução de 1930, adotou um


modelo corporativista, pelo qual os sindicatos estavam atrelados
ao Estado, considerados órgãos de colaboração do governo,
perdendo, deste modo, à época, a natureza jurídica de ente
público. Instituiu-se a unicidade sindical, com adoção do rígido
critério do enquadramento sindical por profissões idênticas,
similares ou conexas. Tais itens constavam do Decreto 19.770, de
19/03/1931.

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Pouco tempo depois, porém, a Constituição de 1934
enunciava a pluralidade sindical, provocando a edição do Decreto
24.694, a admitir a criação de mais de um sindicato para a mesma
base de representação.

Em seguida, com inspiração no corporativismo de


Mussolini, a Constituição de 1937 prevê a organização da economia
da produção em corporações, prevendo que as entidades
representativas das forças de trabalho seriam colocadas sob a
assistência e a proteção do Estado, funcionando como órgãos
estatais e no exercício de funções delegadas do poder público.
Exigiu-se que o sindicato, novamente único, só poderia funcionar
com o reconhecimento por parte do poder público. Para regulamentar
os dispositivos constitucionais referentes ao sindicato, foi
editado o Decreto 1.402, de 05/07/1939, reafirmando a unicidade
sindical mas admitindo a pluralidade das associações profissionais
– órgãos embrionários das entidades sindicais e que seriam como
tais reconhecidas após o reconhecimento estatal da associação mais
representativa. Houve previsão de possibilidade de intervenção nos
sindicatos e de regras para administração dos mesmos. Foi neste
contexto que veio à lume a Consolidação das Leis do Trabalho,
fixando a estrutura sindical que nos chegou aos dias atuais.
Aliás, para compreender a quadra histórica em que estávamos,
torna-se interessante examinar o tratamento dado pelo legislador
brasileiro na CLT:

Art. 722 - Os empregadores que, individual ou coletivamente, suspenderem os trabalhos dos seus
estabelecimentos, sem prévia autorização do Tribunal competente, ou que violarem, ou se recusarem a
cumprir decisão proferida em dissídio coletivo, incorrerão nas seguintes penalidades:
a) multa de cinco mil cruzeiros a cinquenta mil cruzeiros; (Vide Leis nºs 6.986, de 1982 e 6.205, de 1975)
b) perda do cargo de representação profissional em cujo desempenho estiverem;
c) suspensão, pelo prazo de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, do direito de serem eleitos para cargos de
representação profissional.
§ 1º - Se o empregador for pessoa jurídica, as penas previstas nas alíneas "b" e "c" incidirão sobre os
administradores responsáveis.
§ 2º - Se o empregador for concessionário de serviço público, as penas serão aplicadas em dobro. Nesse
caso, se o concessionário for pessoa jurídica o Presidente do Tribunal que houver proferido a decisão
poderá, sem prejuízo do cumprimento desta e da aplicação das penalidades cabíveis, ordenar o
afastamento dos administradores responsáveis, sob pena de ser cassada a concessão.
§ 3º - Sem prejuízo das sanções cominadas neste artigo, os empregadores ficarão obrigados a pagar os
salários devidos aos seus empregados, durante o tempo de suspensão do trabalho.
Art. 723 - Os empregados que, coletivamente e sem prévia autorização do tribunal competente,
abandonarem o serviço, ou desobedecerem a qualquer decisão proferida em dissídio, incorrerão nas
seguintes penalidades:
a) suspensão do emprego até seis meses, ou dispensa do mesmo:
b) perda do cargo de representação profissional em cujo desempenho estiverem;
c) suspensão, pelo prazo de dois anos a cinco anos, do direito de serem eleitos para cargo de
representação profissional. (Revogado pela Lei nº 9.842, de 7.10.1999)
Art. 724 - Quando a suspensão do serviço ou a desobediência às decisões dos Tribunais do Trabalho for
ordenada por associação profissional, sindical ou não, de empregados ou de empregadores, a pena será:
a) se a ordem for ato de Assembléia, cancelamento do registro da associação, além da multa de Cr$
5.000,00 (cinco mil cruzeiros), aplicada em dobro, em se tratando de serviço público;
b) se a instigação ou ordem for ato exclusivo dos administradores, perda do cargo, sem prejuízo da pena
cominada no artigo seguinte. (Revogado pela Lei nº 9.842, de 7.10.1999)
Art. 725 - Aquele que, empregado ou empregador, ou mesmo estranho às categorias em conflito, instigar a

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prática de infrações previstas neste Capítulo ou houver feito cabeça de coligação de empregadores ou de
empregados incorrerá na pena de prisão prevista na legislação penal, sem prejuízo das demais sanções
cominadas.
§ 1º - Tratando-se de serviços públicos, ou havendo violência contra pessoa ou coisa, as penas previstas
neste artigo serão aplicadas em dobro.
§ 2º - O estrangeiro que incidir nas sanções deste artigo, depois de cumprir a respectiva penalidades será
expulso do País, observados os dispositivos da legislação comum. (Revogado pela Lei nº 9.842, de
7.10.1999)

Importante mencionar que o início do século passado foi


marcado por diversas greves, em especial no Rio de Janeiro e São
Paulo. Como isto, podemos afirmar sem medo que o reconhecimento
dos sindicatos no Brasil – e do próprio Direito do Trabalho -, não
foi fruto de mero paternalismo estatal da Era Vargas, guardando
identidade com movimentos operários antecedentes em outros países
de industrialização mais avançada. Assim, o sindicalismo
brasileiro também é fruto dos anseios dos trabalhadores em
melhoria de sua condição social, por meio de agrupamentos sociais
que lhe sirvam de voz ativa.

Ressalvamos a importância do reconhecimento estatal ao


Direito do Trabalho, tema de tratamento imprescindível em momentos
de crise, como a que agora vivemos, propícios, portanto, ao debate
sobre flexibilização precarizante e desregulamentação das relações
de trabalho. Ocorre que, sem desprezar a importância da dinâmica
consistente no diálogo direto entre as forças sociais no meio
laboral, não se pode desconsiderar que o Estado, ao legislar sobre
proteção aos trabalhadores, acaba por agir de modo pedagógico
junto à comunidade, fazendo prevalecer os valores maiores sobre
ética, justiça social e dignidade da pessoa humana, impondo freios
a qualquer tentativa de redução do necessário respeito a estes
primados.

O Direito Coletivo do Trabalho é de fundamental


importância para a dinâmica das relações sociais trabalhistas, eis
que permite o diálogo entre os atores sociais e a adaptação das
regras a serem seguidas, com a velocidade necessária para o meio
produtivo – e impossível de ser alcançada pelas formalidades e
reflexões inerentes ao processo legislativo. Não bastasse, após a
Segunda Guerra Mundial, os sindicatos obtiveram em alguns países
uma maior democratização interna da empresa, possibilitando,
inclusive, a participação da representação dos trabalhadores nas
decisões tomadas pelo empregador.

Resumindo este processo histórico de afirmação do Direito


do Trabalho e do associativismo laboral, lemos em Enoque Ribeiro
dos Santos2:
“O Direito do Trabalho constitui-se em decorrência de lutas, resistências, conflitos e reivindicações da classe
dos trabalhadores, em busca de melhores meios de vida no seio da sociedade e de condições de trabalho,
inicialmente, no chão das fábricas. Aos poucos os trabalhadores foram se conscientizando de seus direitos
e configurando-se como uma verdadeira classe operária, com características objetivas e subjetivas próprias,

2
Obra citada, p. 16.

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e dentre seus principais instrumentos de luta encontrava-se o sindicato”.

Atualmente, o Direito do Trabalho vive um momento


extremamente delicado, uma verdadeira crise. Assim, a
globalização, com redução de fronteiras políticas e econômicas,
além da conexão de todo o planeta em tempo real, por meio das
novas tecnologias da comunicação, trouxe consigo uma feroz
concorrência no mercado internacional. O capital passa a ser
nômade, mudando facilmente seus estabelecimentos com base nas
áreas do globo que lhe forneçam melhores condições, no que tange a
insumos produtivos, dentre estes considerada a mão de obra. Aliás,
importante notar que a perspectiva marxista de que o capital
sempre dependeria da força de trabalho assalariado – fato que,
inclusive, impulsionou o movimento operário, com excelentes
resultados nos primórdios do Direito do Trabalho – não se confirma
nos dias atuais.

Não bastassem os avanços de possibilidade de automação


das plantas industriais, observamos as facilidades de mobilidade
dos recursos, de modo que as grandes empresas não tem qualquer
pudor em promover dispensas em massa de empregados, fechar suas
fábricas e partir para outro local, onde seguramente conseguirão
legislação trabalhista mais frouxa e vantagens fiscais
irresistíveis.

Neste atual momento de crise, até mesmo os sindicatos


vêem-se cooptados pela idéia de que não há outro caminho a seguir,
e acabam aceitando negociações para reduzir os direitos de seus
representados. Nestes casos, porém, não se pode de modo simplista
declarar que toda negociação é fruto da autonomia da vontade dos
trabalhadores, no atendimento dos interesses específicos da
categoria. Assim, a flexibilização que sempre foi inerente ao
Direito do Trabalho, como instrumento de novas conquistas dos
trabalhadores, passa a ser expressa como retrocesso social. Neste
sentido, é interessante a lúcida observação de Carmen Camino3:
“Enquanto os trabalhadores do século XIX protagonizaram movimento de conquista do direito do trabalho,
forçando a negociação com o capital e obtendo daí as primeiras normas de proteção, posteriormente
consagradas na ordem estatal, hoje a pressão para negociar parte do capital, em busca da reversão do
direito tutelar”.

O direito de greve.

O termo “greve” tem origem em uma praça francesa, Place


de Grève, em Paris, às margens do Rio Sena e que funcionou como
local de embarque e desembarque de navios e, posteriormente, como
ponto de encontro de trabalhadores e desempregados que desejavam
protestar contra as condições de vida. O termo significa terreno
plano, composto de cascalho e areia, à margem do mar ou do rio,
onde acumulam-se gravetos.

3
Direito Individual do Trabalho, editora Síntese, 4ª edição, 2004, Porto Alegre, p. 37.

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Em sentido sociológico, qualquer espécie de paralisação
coletiva do trabalho expressa a existência de um conflito entre
capital e trabalho. A iniciativa da paralisação pode partir de
qualquer um dos polos da relação de emprego, caracterizando a
greve, quando os trabalhadores resolver parar, e o locaute, quando
a iniciativa tem origem em decisão patronal. Tratam-se de
mecanismos de autodefesa das posições de cada um no conflito
coletivo de trabalho.

A estratégia coletiva de reagir à exploração dos


detentores dos meios de produção é antiga e encontra raízes ainda
na História antiga. É o que se pode dizer, por exemplo, do êxodo
dos hebreus, ao abandonarem o Egito, região em que se encontravam
na condição de escravos. No entanto, a acepção moderna de greve,
como uma paralisação apenas temporária, tendo por intuito forçar
melhores condições de vida no próprio emprego, é de história
recente, surgindo a partir da Revolução Industrial. Ocorre que,
antes desta quadra mais contemporânea da história, não se tinha a
noção precisa da relação de trabalho, como a concebemos hoje, bem
como da própria organização coletiva dos trabalhadores.

O exercício do direito de greve expressa uma formidável


ação de solidariedade e de consciência de classe. No caso, a
adesão ao movimento paredista revela atitude pela qual os
trabalhadores admitem o risco de represálias, ou simplesmente de
perder temporariamente a fonte de sustento, o salário, em troca da
perspectiva de melhorias coletivas a serem alcançadas com a
estratégia empregada.

O direito de greve é um direito individual do


trabalhador. No entanto, seu exercício só faz sentido como ação
coletiva dos indivíduos. Vale ressaltar, ainda, que, mais que
direito, a greve seria uma garantia fundamental, pois serve de
instrumento para a efetivação de direitos sociais formalmente
reconhecidos na Constituição brasileira. Nesta linha, colhemos a
lição de José Afonso da Silva4, para quem, “a greve não é um simples direito
fundamental dos trabalhadores, mas um direito fundamental de natureza instrumental e desse modo se
insere no conceito de garantia constitucional, porque funciona como meio posto pela Constituição à
disposição dos trabalhadores, não bem como aferível em si, mas como um recurso de última instância para
a concretização de seus direitos e interesses”.

Com bem apontam Ricardo Carvalho Fraga e Luiz Alberto de


5
Vargas , “sem o direito de greve,as reivindicações obreiras tornam-se súplicas e seu atendimento
dependerá da boa vontade do patronato – e não o resultado do embate social”.

4
Curso de Direito Constitucional Positivo. Editora Revista dos Tribunais. 5ª edição. São Paulo. 1989, p. 269.
5
Greve de servidores públicos: o direito de greve dos servidores públicos após a decisão do Supremo Tribunal
Federal. Artigo publicado na obra DIREITO COLETIVO DO TRABALHO. Curso de Revisão e Atualização.
Organizadores Candy Florencio Thome e Rodrigo Garcia Schwarz. Editora Campus Elsevier. São Paulo. 2010, p.
272.

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Há que se considerar, ainda, o fato de que o
reconhecimento legal ao direito de greve revela nítida restrição
ao poderio econômico do empregador. Tal afirmação justifica-se
pelo fato de que uma greve naturalmente provoca prejuízos ao
patrão, de modo direto, e até mesmo à sociedade, num segundo
plano. No entanto, mesmo com os seus danos colaterais, a greve é
legitimada por se tratar de um mecanismo de justiça social, e um
meio de reação a ser utilizado pelos trabalhadores em busca de
melhoria de sua condição social. Como aponta Raimundo Simão de
Melo6, “é a greve o correlato da negociação coletiva. É um instrumento de pressão de que dispõem os
trabalhadores para se oporem à recusa patronal em negociar melhores condições de trabalho”.

Como fenômeno social, a greve pode ser enxergada em três


fases: preparação, desenvolvimento e término.

A preparação da greve enquadra-se como uma fase de


deliberação, na qual a categoria deverá examinar os propósitos e a
oportunidade da greve. Neste contexto, alguns elementos serão
analisados como premissas que justificam a greve:
→ força social da categoria, a indicar a capacidade de incômodo do
movimento, eis que a paralisação que não causa prejuízo ao
empregador e passa desapercebida da sociedade estará fadada ao
fracasso.
→ potencial para solução rápida do conflito, haja vista que,
embora provoque uma paralisação por tempo indeterminado, a
intenção sempre deverá ser de solução rápida, até mesmo porque os
integrantes da categoria nem sempre terão condições de suportar os
efeitos da greve, em especial a suspensão do contrato e,
consequentemente, do pagamento de salários.
→ capacidade organizacional, circunstância a indicar que a
categoria só terá êxito no movimento com uma boa articulação de
ações.
→ razoabilidade da pretensão, sem a qual a greve será
inconsequente, se não se mostrar com chances de êxito na pauta de
reivindicações.

A fase de desenvolvimento deverá espelhar a boa


articulação, perseverança e trabalho da categoria e de seus
líderes, compreendendo um processo contínuo de mobilização, para
manter a coesão da categoria em torno de seus propósitos.

O término aponta o sucesso ou fracasso do movimento


paredista. Pode terminar por inação, em razão da desarticulação da
categoria, com a categoria desistindo por não vislumbrar
possibilidade de alcançar o objetivo inicialmente previsto.
Poderá, ainda, terminar com uma negociação coletiva (acordo ou
convenção coletiva), solução pelo recurso da arbitragem ou por
meio do exercício do poder normativo da Justiça do Trabalho.

6
A Greve no Direito Brasileiro. Editora LTr, 2ª edição. São Paulo, 2009, p. 38.

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Natureza jurídica.

Discute-se na doutrina a natureza jurídica do direito de


greve.

Para alguns, trata-se de mero fato jurídico. Esta tese


pressupõe dois argumentos: a violência intrínseca no instituto,
incompatível, deste modo, com a lógica de solução pacífica dos
conflitos humanos, normalmente a reger as relações sociais; a
greve representaria a ineficácia dos mecanismos estatais de
pacificação social.

Para outra corrente, a greve é um ato jurídico, eis que


praticado por atitude volitiva, apta a produzir consequências na
órbita do direito.

Trata-se, na realidade, de um direito. Um direito


fundamental, de caráter coletivo, consagrado na Carta Magna.
Resulta da autonomia privada coletiva, com desenvolvimento
marcante nas sociedades democráticas. Sendo direito fundamental do
trabalhador, reconhecido constitucionalmente, não poderá o direito
de greve ser impedido por meio de negociação coletiva, conforme
julgou recentemente o TST:
Ementa: RECURSO ORDINÁRIO EM DISSÍDIO COLETIVO. ACORDO. DIREITO À GREVE.
IRRENUNCIÁVEL. Os acordos e convenções coletivas de trabalho ganharam ênfase com a promulgação
da Constituição Federal de 1988, tendo em vista o disposto nos arts. 7º, XXVI, e 114, § 2º, da CF. Tornaram-
se verdadeiros instrumentos do estado democrático de direito. Todavia, essas formas de ajuste não podem
conter cláusulas que violem os direitos indisponíveis ou os preceitos constitucionais, sob pena de a intenção
do legislador constituinte perder o real sentido, que é o de proteger os interesses da coletividade e
proporcionar o bem-estar social. Mantém-se decisão do TRT que excluiu do acordo a cláusula que impedia
o direito à greve dos trabalhadores. Recurso ordinário não provido.
Processo: RODC - 83300-37.2008.5.15.0000 Data de Julgamento: 08/06/2009, Relatora Ministra: Kátia
Magalhães Arruda, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Divulgação: DEJT 18/12/2009.

Este direito de greve está amparado em outros direitos,


como a liberdade de trabalho, liberdade associativa e sindical,
além da autonomia sindical e autonomia privada coletiva.

No entanto, importante a reflexão sobre a natureza


jurídica, feita por Raimundo Simão de Melo7, para quem
“independentemente de ser um direito, é a greve um fato social, uma liberdade pública consistente na
suspensão do trabalho, quer subordinado ou não, com o fim de se obter algum benefício de ordem
econômica, social ou humana. É, em suma, o direito de não trabalhar”. Esta perspectiva é
importante, haja vista que alguns autores chegam a classificar a
greve como sendo um mecanismo de solução do litígio de forma
autônoma, como uma espécie de autotutela. Na realidade, a greve é
a própria expressão do conflito, e não um meio de solução,
traduzindo vetor de pressão sobre o capital, para abertura do
diálogo para uma solução negociada, ou pode representar
acirramento da demanda, a legitimar a solução pela via

7
Obra citada, p. 39.

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jurisdicional.

Como expressão social, a greve é instrumento que


contribui para a democratização das relações sociais, ao dar voz
aos trabalhadores e suas reivindicações. Nesta linha, permite-se
aos trabalhadores organizarem-se coletivamente para a suspensão da
execução contratual tendo por finalidade a reconstrução normativa
das condições de trabalho da categoria. É uma lógica que não teria
lugar num Direito Civil que prioriza o cumprimento e a
estabilidade dos contratos; no entanto, é instituto fundamental
para compreensão do sistema das relações de trabalho, que conta
com o sindicato e sua ação coletiva como instrumentos de
atualização das condições contratadas, bem como de avanços que
visem melhorar a condição social e econômica do trabalhador, em
regra incapaz de fruir de uma negociação individual exitosa para
beneficiar-se. Sobre as vantagens desta dinâmica normativa
viabilizada pelo Direito Coletivo, ouvimos Jorge Luís Souto Maior8:
“Interessante perceber, ainda, que a consagração pelo próprio direito da possibilidade de reconstruir, em
situações concretas, a ordem jurídica, representa relevante fator de estabilização das relações sociais, pois
permite sua constante evolução, evitando, assim, a solução mais comum quando os interesses, sobretudo
econômicos, entram em conflito com o conteúdo obrigacional, fixado nos contratos, que é a da cessação do
vínculo, sendo de destacar que no contexto coletivo a impossibilidade de composição dos conflitos pode
gerar o completo desajuste social”.

Para o regular exercício do direito de greve, o instituto


é moldado pelos atores sociais e pelo legislador.

No caso, aos atores sociais incumbirá sempre a decisão


pela paralisação e a fundamentação ou motivo da tomada de tal
posição. Este motivo será sempre alguma reivindicação, haja vista
que a paralisação coletiva motivada por fatores estranhos ao
interesse dos trabalhadores não configuraria a greve.

Ao legislador, por sua vez, incumbirá os processos de


reconhecimento legal do direito, disciplina do exercício,
limitações ao exercício e conteúdo da pretensão a legitimar a
greve. No entanto, cabe a ressalva de que, sendo um direito
fundamental, o instituto da greve deve ser sempre interpretado de
modo a maximizar o seu exercício. Tal perspectiva é
imprescindível, haja vista percebermos que o estudo deste
importante instrumento de ação coletiva tem priorizado a aplicação
de limites, nem sempre explicitados e lógicos em nosso sistema
jurídico.

A greve na Organização Internacional do Trabalho.

A OIT ainda não disciplinou a matéria de greve em nenhuma

8
O direito de exercer o direito de greve, artigo integrante da obra coletiva DIREITO COLETIVO DO TRABALHO –
Curso de Revisão e Atualização. Organizadores Candy Florencio Thome e Rodrigo Garcia Schwarz. Editora
Campus Elsevier. São Paulo. 2010, p. 256-257.

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de suas convenções, podendo o tema apenas ser deduzido de modo
reflexo do teor das Convenções 87 e 98, que tratam da liberdade
sindical e da negociação coletiva, respectivamente. Entretanto, o
Comitê de Liberdade Sindical, já em 1952, consagrou o direito de
greve como um dos meios de defesa dos interesses sociais e
econômicos dos trabalhadores. O Comitê, ao longo dos anos, tem
estabelecido parâmetros acerca da greve, a serem observados pelos
Estados-membros. Tais premissas são citadas por Raimundo Simão de
Melo9, indicando que o Comitê referido tem adotado as seguintes
posturas:
“1. deixado claro que se trata de um direito do qual devem gozar as organizações de trabalhadores
(sindicatos, federações e confederações);
2. adotado critério restritivo ao delimitar as categorias de trabalhadores que podem ser privadas desse
direito, e, com relação às limitações legais ao seu exercício, não devem ser excessivas;
3. vinculado o exercício do direito de greve à finalidade de promoção e defesa dos interesses econômicos e
sociais dos trabalhadores (critério este que exclui do âmbito de proteção internacional no seio da OIT as
greves puramente políticas, embora não se pronuncia, de uma maneira direta, sobre a greve de
solidariedade...)
4. considerado que o correto exercício do direito de greve não deve acarretar sanções prejudiciais de
nenhuma natureza, que implicaria atos de discriminação anti-sindical. Nesse sentido também entende a
Comissão de Peritos da OIT”.

Em seguida, Raimundo Simão de Melo lista os princípios e


regras mínimas de conduta em matéria de greve, de acordo com a
OIT, por meio do Comitê de Liberdade Sindical e da Comissão de
Peritos:

“1. a greve é um direito fundamental de que devem gozar os trabalhadores e organizações respectivas,
desde que seu exercício se revista de caráter pacífico;
2. a greve é reconhecida em caráter geral como direito dos trabalhadores do setor público e privado,
admitindo-se exceções, como restrições em relação aos funcionários públicos e trabalhadores em serviços
essenciais no sentido estrito e proibições aos membros das Forças Armadas e da polícia, para evitar pôr em
risco a vida, segurança e saúde da população;
3. não se admitem, no âmbito da liberdade sindical, greves puramente políticas, mas sim aquelas que
tenham por finalidade alcançar soluções para as grandes questões de política econômica e social de
interesse dos trabalhadores;
4. é abusiva a proibição de greves de solidariedade, salvo se a greve inicial, com a qual se solidarizam os
trabalhadores, seja, em si, ilegal;
5. é admissível o estabelecimento de serviço mínimo como medida necessária à segurança das pessoas, à
prevenção de acidentes e à segurança das instalações da empresa;
6. é admissível o estabelecimento de serviço mínimo de funcionamento da empresa ou instituição, no caso
de greve em serviços de utilidade pública ou nos serviços públicos de importância transcendental;
7. são aceitáveis como condições para o exercício do direito de greve o aviso prévio, a obrigação de
recorrência à mediação, conciliação ou arbitragem voluntária antes da sua deflagração, a exigência de
quorum mínimo e a celebração de escrutínio secreto para decidir a greve;
8. as restrições aos piquetes de greve devem limitar-se aos casos em que eles não sejam pacíficos;
9. os piquetes não devem impedir o exercício da liberdade de trabalhadores não grevistas;
10. a mobilização compulsória de trabalhadores durante a greve só deve ser admitida em caso de greve em
atividade essencial ou em circunstância de alta gravidade, como as situações de crise nacional aguda;
11. a contratação de trabalhadores em substituição aos grevistas só deve ser admitida nas greves em
serviço essencial ou em situação de crise nacional aguda;
12. são admissíveis disposições legal que prevêem o desconto salarial dos dias parados;
13. deve haver meios de proteção aos dirigentes sindicais e trabalhadores contra atos anti-sindicais pela
participação em greves legítimas;
14. os princípios da liberdade sindical não amparam os excessos no exercício do direito de greve, mas as

9
Obra citada, p. 76.

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sanções aplicadas devem ser proporcionais à gravidade das violações cometidas”.

A greve no direito brasileiro.

Como o próprio sindicato, o direito de greve passou pelas


fases de proibição, tolerância e, por fim, reconhecimento como
direito do trabalhador. Assim, a Constituição do Império (1824),
em seu art. 179, XXV, proibia a greve. Não bastasse, o Código
Penal de 1890, tipificou a greve como crime (art. 205). Já as
Constituições de 1890 e de 1934 nada consideraram sobre a greve,
seja para proibir ou autorizar. Em seguida, a Lei 38, de 1935,
tratando sobre Segurança Nacional, proibiu expressamente a greve.
Tal vedação foi reforçada pela Constituição de 1937, pela qual
mais uma vez a greve é proibida, considerada, conjuntamente com o
lock-out como sendo um recurso antissocial nocivo ao trabalhador e
ao capital e incompatível com os superiores interesses da produção
nacional (art. 139). Também reiterou a vedação à greve o Código
Penal de 1940, cujos arts. 200 e 201, também criminalizavam tal
conduta. A CLT, por sua vez, partiu da premissa que a greve era
ilegal e, assim, preocupou-se apenas em impor penalidades aos
empregadores que praticassem o locaute10. Em 1946, primeiro com o
Decreto 9.070 e depois com a Constituição, a greve foi tolerada,
para ser novamente restringida em 1964, pela Lei 4.330 que impunha
restrições ao instituto que, de tão severas, acabou por
inviabilizar o seu exercício, linha normativa que foi seguida pela
Constituição de 1967 (art. 155, XXI), pelo DL 941, de 1969, pelo
DL 1632, de 1978, e pela Lei 6.620/78.

A Constituição atual dispõe em seu art. 9º que “é assegurado o


direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os
interesses que devam por meio dele defender”. Tal dispositivo representa o efetivo
reconhecimento do direito de greve em nosso país. O tema foi
regulamentado pela lei 7.783, de 1989, a impor vários limites ao
exercício do direito constitucionalmente assegurado.

Além disso, é importante frisar que, ao instaurar um novo


ordenamento jurídico, de caráter democrático e social, o
constituinte preocupou-se em fechar feridas abertas pelo regime
autoritário que se encerrava. Assim, temos o art. 8º, §5º, do
ADCT, a indicar que
“A anistia concedida nos termos deste artigo aplica-se aos servidores públicos civis e aos empregados em
todos os níveis de governo ou em suas fundações, empresas públicas ou empresas mistas sob controle
estatal, exceto nos Ministérios militares, que tenham sido punidos ou demitidos por atividades profissionais
interrompidas em virtude de decisão de seus trabalhadores, bem como em decorrência do Decreto-lei nº
1.632,de 4 de agosto de 1978, ou por motivos exclusivamente políticos, assegurada a readmissão dos que

10
CLT, art. 722: Os empregadores que, individual ou coletivamente, suspenderem os trabalhos dos seus
estabelecimentos, sem prévia autorização do Tribunal competente, ou que violarem, ou se recusarem a cumprir
decisão proferida em dissídio coletivo, incorrerão nas seguintes penalidades: a)multa de 300 (trezentos) a 3.000 (três
mil) valores de referência regionais; b) perda do cargo de representação profissional em cujo desempenho estiverem;
c) suspensão, pelo prazo de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, do direito de serem eleitos para cargos de representação
profissional.

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foram atingidos a partir de 1979, observado o disposto no § 1º”.

Aplicando tal dispositivo, o TST julgou interessante


caso:
Ementa:
EMBARGOS ANTERIORES À VIGÊNCIA DA LEI Nº 11.496/07 - PRELIMINAR DE NULIDADE -
NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL Preliminar não analisada, com fundamento no artigo
249, § 2º, do CPC. PARTICIPAÇÃO DO EMPREGADO EM MOVIMENTO PAREDISTA - DEMISÃO POR
JUSTA CAUSA COM FUNDAMENTO NO DECRETO-LEI Nº 1.632/78 - CONVERSÃO EM DESPEDIDA
INDIRETA POSTERIOR À PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988 -
INEXISTÊNCIA DE ÓBICE À ANISTIA PREVISTA NO ART. 8º, § 5º, DO ADCT Consoante a narrativa do
acórdão regional, verifica-se que a Empresa, em 28/09/1988, convocou a Reclamante, que participava em
movimento paredista, para retornar ao trabalho. Um dia depois, em 29/09/1988, a Reclamada a demitiu por
justa causa, com fundamento no Decreto-lei nº 1.632/78, motivo pelo qual o Eg. Tribunal Regional
considerou que não foi dada sequer a oportunidade de atender à convocação. Em 25/10/1988, após a
promulgação da Constituição da República, que previu, no art. 8º, § 5º, do ADCT, a anistia para os
empregados demitidos por motivação política, a Reclamada converteu a demissão por justa causa em
dispensa imotivada, concedendo retroativamente o aviso prévio. O fato de a demissão por justa causa ter
sido transformada em despedida imotivada não afeta o direito à readmissão. Como bem delineado pelo
acórdão regional, a conversão da natureza da despedida, logo após a promulgação do novo texto
constitucional, teve como objetivo frustrar o direito da Reclamante à anistia prevista no art. 8º, § 5º, do
ADCT. Precedentes. DANOS MORAIS Embargos não conhecidos, em razão da ausência de
prequestionamento da matéria (Súmula nº 297/TST). Embargos parcialmente conhecidos e providos.
Processo: RR - 381436-96.1997.5.04.5555 Data de Julgamento: 04/06/2009, Relatora Ministra: Maria
Cristina Irigoyen Peduzzi, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Data de Divulgação: DEJT
12/06/2009.

Discute-se acerca da possível inconstitucionalidade da


lei de greve, naquilo que não se refira às atividades essenciais.
Tal argumento parte do pressuposto de que o constituinte
originário não condicionou o exercício da greve à lei
regulamentadora, deixando que a própria categoria decidisse acerca
do exercício do direito de greve. Não bastasse, trata-se de norma
de eficácia plena, com exceção das atividades essenciais, para as
quais a norma é de eficácia contida, autorizando, portanto,
restrições impostas pela legislação infraconstitucional.

A tese contrária à inconstitucionalidade da lei de greve


aponta que implicitamente a Carta Magna autorizaria a disciplina
legal limitativa do exercício do direito de greve. No caso, o
argumento funda-se no fato de que o texto constitucional pontua
que os “abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei” (art. 9º, § 2º) e a
lei de greve surgiria justamente para indicar os atos considerados
abusivos. O STF, inclusive, já mencionou que a greve não se trata
de um direito absoluto:
“O direito à greve não é absoluto, devendo a categoria observar os parâmetros legais de regência. (...)
Descabe falar em transgressão à Carta da República quando o indeferimento da garantia de emprego
decorre do fato de se haver enquadrado a greve como ilegal.” (RE 184.083, Rel. Min. Marco Aurélio,
julgamento em 7-11-2000, Segunda Turma, DJ de 18-5-2001.)

Recentemente, o STF julgou mandado de injunção sobre o


direito de greve dos servidores públicos estatutários,
determinando a aplicação a este fenômeno social de diversos
dispositivos da lei de greve a tais trabalhadores. No caso, o
Supremo deu efeito concreto ao mandado de injunção, viabilizando o

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exercício regular do direito de greve pelos servidores públicos,
para o qual ainda não houve regulamentação da norma constitucional
pelo legislador ordinário.

O TST também reconhece que o direito de greve, embora


constitucional, pode ser regulamentado. Transcrevemos o seguinte
julgado:
RECURSO ORDINÁRIO EM DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. JBS S/A. NÃO ABUSIVIDADE DO
MOVIMENTO PAREDISTA. A Constituição reconhece a greve como um direito fundamental de caráter
coletivo, resultante da autonomia privada coletiva inerente às sociedades democráticas. É direito que resulta
da liberdade de trabalho, mas também, na mesma medida, da liberdade associativa e sindical e da
autonomia dos sindicatos, configurando-se como manifestação relevante da chamada autonomia privada
coletiva, própria às democracias. Trata-se de instrumento de pressão que visa a propiciar o alcance de certo
resultado concreto, em decorrência do convencimento da parte confrontada. É movimento concertado para
objetivos definidos, em geral, de natureza econômico-profissional ou contratual trabalhista. O texto
constitucional firma, sem dúvida, extensão bastante larga para o direito de greve no segmento privado. Diz
a Constituição que compete aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercer o direito e sobre os
o
interesses que devam por meio dele defender (art. 9 , caput). A ordem jurídica infraconstitucional estabelece
alguns requisitos para a validade do movimento grevista. Em seu conjunto não se chocam com o sentido da
garantia magna: apenas civilizam o exercício de direito coletivo de tamanho impacto social. Nessa linha,
não há abusividade no exercício do direito de greve se observados os requisitos estabelecidos pela ordem
jurídica do País para a validade do movimento paredista: tentativa de negociação; aprovação da respectiva
assembleia de trabalhadores; aviso prévio à parte adversa. Recurso ordinário desprovido.
(…)
Processo: RO - 1297-05.2010.5.24.0000 Data de Julgamento: 13/02/2012, Relator Ministro: Mauricio
Godinho Delgado, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 24/02/2012.

A lei (art. 2º) conceitua o direito de greve como sendo


“a suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços a
empregador”.

Deste modo, a greve não pode ser exercitada


individualmente por um empregado, tratando-se de expressão
coletiva da categoria.

Tem por pressuposto a suspensão da prestação de serviços,


de modo que qualquer outro mecanismo de protesto não caracteriza o
exercício do direito de greve.

Tal suspensão pode ser parcial, envolvendo parte da


jornada ou apenas um setor da empresa, ou mesmo em algumas das
empresas do ramo de atividade econômica patronal, bem como total,
englobando toda a jornada e todos os trabalhadores envolvidos no
processo produtivo.

Embora não conste na lei, sem dúvida a greve é um direito


a ser exercido de modo unilateral pelos trabalhadores, eis que a
eles compete deliberar pelo seu exercício, sem qualquer
participação patronal neste ponto. Trata-se, assim, de um direito
potestativo.

A doutrina classifica as figuras de protesto coletivo,


dissociadas da greve, em movimentos para-grevistas ou de execução
ilícita da greve.

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Os procedimento para-grevistas são formas de reduzir ou
tumultuar a produção, sem uma paralisação efetiva. Neste contexto,
teremos as seguintes modalidades:
→ não-colaboração, pela qual os trabalhadores comparecem ao local
de trabalho, mas recusam-se a cumprir as ordens de serviço
emanadas do empregador.
→ operação tartaruga, consistente na diminuição proposital do
ritmo de trabalho.
→ greve ativa, na qual os trabalhadores aceleram a produção de
forma excessiva, prejudicando o planejamento empresarial.
→ excesso de zelo ou greve de regulamento, pela qual as tarefas
são feitas com observância meticulosa das normas procedimentais da
empresa, no intuito de tornar mais lento o processo produtivo.
→ greve de rodízio, situação em que são programadas rápidas
paralisações, em setores sucessivos da empresa, de modo a causar
transtornos à produção.
→ greve relâmpago, em que os trabalhadores paralisam o trabalho
apenas por alguns minutos ou algumas horas do dia e retornam em
seguida ao labor.
→ greve nevrálgica, limitada a um setor estratégico da empresa,
cujo funcionamento é imprescindível para que as demais áreas
tenham o seu funcionamento viabilizado.

Outros procedimentos de pressão social, tidos como formas


ilícitas de greve, não envolvem a paralisação do trabalho, usando
apenas estratégias que causem prejuízo ao empregador, como se dá
nos seguintes procedimentos:
→ boicote, considerada a ação dos trabalhadores consistente em
promover obstrução aos negócios de alguém11, normalmente por meio
de campanhas públicas para desestimular o consumo de produtos do
empregador.
→ sabotagem, como tal o procedimento de destruição ou inutilização
de equipamentos ou mercadorias do empregador, como manifestação de
protesto dos trabalhadores.

Outro mecanismo irregular de greve noticiado seria a


greve selvagem, procedimento pelo qual um grupo de empregados, à
revelia da manifestação da categoria e sem respaldo sindical,
resolve promover uma paralisação.

Temos ainda a figura do piquete, pela qual os


trabalhadores pressionando os colegas que não aderiram ao
movimento, na tentativa de convencê-los a não persistirem na
intenção de manter a prestação dos serviços.

11
Evaristo de Moraes, obra citada, p. 107, traça o perfil prático do boicote, então denominado boycottage: “Consiste
na ação do sindicato quando proíbe aos seus membros trabalharem em determinado estabelecimento industrial, por
esse ou aquele motivo. A fábrica ou oficina, assim lançada no Index sindical, só consegue obter o trabalho dos
poucos operários sem brio profissional e geralmente sem grandes aptidões, que são justamente postos fora da classe,
chamados na Inglaterra blackleg (pernas pretas) e nos Estados Unidos ratos leprosos”.

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Pode ocorrer, também, a ocupação do estabelecimento
patronal, situação em que os trabalhadores recusam-se a sair do
local de trabalho, lá permanecendo sem trabalhar. Este
procedimento é conhecido na doutrina estrangeira como lock-in. O
objetivo da ocupação é provocar, de modo inequívoco, uma lesão ao
direito de propriedade do empregador, ao mesmo tempo em que
inviabiliza a intenção daqueles que não queiram aderir ao
movimento.

Para fazer cessar os piquetes na porta dos


estabelecimentos, bem como a ocupação do local de trabalho, os
empregadores tem utilizado o instrumento do interdito proibitório,
ordem judicial de preservação do direito de propriedade. Tal ação,
neste caso, por envolver exercício do direito de greve, será de
competência material da Justiça do Trabalho, conforme
jurisprudência consolidada no âmbito do STF:
“A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do
exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada.” (Súmula Vinculante 23)

"Competência jurisdicional. Justiça do Trabalho X Justiça comum. Ação de Interdito Proibitório. Movimento
grevista. Acesso de funcionários e clientes à agencia bancária: ‘piquete’. Art. 114, II, da CF. Jurisprudência
do STF. Competência da Justiça do Trabalho. ‘A determinação da competência da Justiça do Trabalho não
importa que dependa a solução da lide de questões de direito civil’ (Conflito de Jurisdição 6.959), bastando
que a questão submetida à apreciação judicial decorra da relação de emprego. Ação de interdito proibitório
cuja causa de pedir decorre de movimento grevista, ainda que de forma preventiva. O exercício do direito de
greve respeita a relação de emprego, pelo que a EC 45/2003 incluiu, expressamente, na competência da
Justiça do Trabalho conhecer e julgar as ações dele decorrentes (art. 114, II, da CF).” (RE 579.648, Rel. p/ o
ac. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 10-9-2008, Plenário, DJE de 6-3-2009.)

Há um profundo debate acerca da legitimidade do


comportamento dos trabalhadores em utilizarem meios atípicos de
manifestação grevista. Nesta linha, podemos citar o enunciado 6,
da I Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho da
Justiça do Trabalho, em que foi expressa a seguinte idéia:
GREVES ATÍPICAS REALIZADAS POR TRABALHADORES. CONSTITUCIONALIDADE DOS ATOS. Não
há, no texto constitucional, previsão reducionista do direito de greve, de modo que todo e qualquer ato dela
decorrente está garantido, salvo os abusos. A Constituição da República contempla a greve atípica, ao fazer
referência à liberdade conferida aos trabalhadores para deliberarem acerca da oportunidade da
manifestação e dos interesses a serem defendidos. A greve não se esgota com a paralisação das
atividades, eis que envolve a organização do evento, os piquetes, bem como a defesa de bandeiras mais
amplas ligadas à democracia e à justiça social.

Há jurisprudência do TST entendendo ilegal a conduta dos


trabalhadores em ocupar o estabelecimento do empregador:
Ementa:
GREVE DE OCUPAÇÃO. SERVIÇOS OU ATIVIDADES ESSENCIAIS. ABUSIVIDADE. MULTA DIÁRIA. 1.
Configura greve de ocupação o comparecimento de empregados ao local da prestação de serviços
essenciais com o intuito de evitar que trabalhem aqueles que assim o desejam ou para obstar eventual
substituição temporária por novos empregados e, pois, impedir que se garanta o atendimento às
necessidades inadiáveis da população. Tal modalidade de paralisação coletiva de trabalho é duplamente
abusiva. A uma, porque inibe a liberdade de trabalho assegurada tanto pela Carta da República, nos arts.
5º, inciso XIII, e 6º, quanto pela Lei nº 7.783/89, em seu art. 6º, inciso I e §§ 1º e 3º. A duas, porquanto
atenta contra a propriedade privada da empregadora, protegida pelo art. 5º, inciso XXII, da Constituição
Federal. 2. Verificada a ocupação abusiva do local da prestação de serviços durante a greve, bem assim a
interrupção da negociação coletiva e o completo descumprimento da ordem judicial que fixou parâmetros
para que se atendesse as necessidades inadiáveis da população, respondem solidariamente os sindicatos

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profissionais pela multa diária -- reduzida, todavia, de modo a não impor gravame excessivo às
organizações profissionais. 3. Recurso ordinário a que se dá parcial provimento, mantendo-se a declaração
de abusividade do movimento e reduzindo-se a multa diária à metade de seu valor originário.
Processo: ED-RODC - 816858-82.2001.5.02.5555 Data de Julgamento: 11/12/2003, Relator Ministro: João
Oreste Dalazen, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DJ 02/04/2004.

Como expressão coletiva, o exercício do direito de greve


depende de participação do ente sindical. Assim, pelo art. 4º da
lei de greve temos que “caberá à entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu
estatuto, assembléia geral que definirá as reivindicações da categoria e deliberará sobre a paralisação
coletiva da prestação de serviços”.

O ente sindical não será necessariamente o sindicato,


podendo a greve ser convocada pela federação ou mesmo pela
confederação, isto na hipótese da categoria não ser organizada em
sindicato ou mesmo federação. Não haverá possibilidade, porém, que
a greve seja ativada e deliberada por uma central sindical. Para
isto, o § 1º dispõe que “o estatuto da entidade sindical deverá prever as formalidades de
convocação e o quorum para a deliberação, tanto da deflagração quanto da cessação da greve”. No
entanto, pelo § 2º, “na falta de entidade sindical, a assembléia geral dos trabalhadores
interessados deliberará para os fins previstos no "caput", constituindo comissão de negociação”.

O exercício do direito de greve tem, ainda, por


pressuposto que seja frustrada a negociação coletiva ou verificada
a impossibilidade de recursos via arbitral (art. 3º da lei). O TST
inclusive já decidiu:
DISSÍDIO COLETIVO. GREVE. ABUSIVIDADE. NEGOCIAÇÃO PRÉVIA.
1. A Lei nº 7.783, de 28.06.1989, regulamentou o exercício do direito de greve, valorizando a negociação e
estabelecendo prazos para a prévia comunicação ao empregador e à população. De fato, tornou
indispensável a tentativa de conciliação prévia (art. 3º).
2. Afasta-se a declaração de abusividade da greve, por ausência de negociação prévia, se demonstrado
que houve esforços da categoria profissional no afã de obter uma solução amistosa para o conflito coletivo,
sem sequer haver contraproposta da categoria econômica. O malogro das tentativas de conciliação prévia
não equivale à ausência de iniciativa nesse sentido.
3. Recurso ordinário a que se nega provimento.
Processo: RODC - 2026300-81.2003.5.02.0000 Data de Julgamento: 09/06/2005, Relator Ministro: João
Oreste Dalazen, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DJ 05/08/2005.

Deste modo, o conteúdo reivindicatório da greve


restringe-se aos temas que possam ser contemplados por meio de
negociação coletiva. Nesta linha, Arnaldo Süssekind indica que “o
objeto da greve está limitado a postulações capazes de ser atendidas por convenções ou acordo coletivo,
laudo arbitral ou sentença normativa de tribunal do trabalho”. E conclui o mestre dizendo
que “o nosso sistema constitucional e a Lei nº 7.783 não legitimam as greves políticas e as de
solidariedade”.

No entanto, há divergência, neste aspecto. Pensamos que a


Constituição conferiu à própria categoria a legitimidade para
definir os interesses a serem defendidos em uma greve. Em
consequência, pensamos que a greve não pode ser limitada a um
interesse por estabelecimento de uma norma coletiva. Neste
sentido, lembramos que o Comitê de Liberdade Sindical e a Comissão
de Peritos da OIT, desde o ano de 1983, tem expressado que os
trabalhadores podem empregar a greve como recurso legítimo de

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defesa dos seguintes interesses:
→ de natureza trabalhista, consistente na busca por melhores
condições de trabalho e de vida dos trabalhadores;
→ de natureza sindical, equivalentes à busca de garantias e
desenvolvimento dos direitos das organizações sindicais, seus
órgãos e dirigentes;
→ de natureza política, tendo por fim, ainda que indiretamente, a
defesa dos interesses econômicos e sociais dos trabalhadores,
protestando contra determinada política adotada ou em vias de ser
implementada. Segundo o Comitê de Liberdade Sindical da OIT,
porém, a greve estritamente política e desvinculada à defesa de
interesses sociais e econômicos dos trabalhadores. Até admite-se
greve contra medidas econômicas que influenciem as condições dos
trabalhadores, mas não uma paralisação fundada em elementos
estritamente políticos. Além disso, para ser admitida, a greve
política não pode se manifestar de modo a perturbar a
tranquilidade pública, de acordo com a OIT.

Pela ampliando do exercício do direito de greve, colhemos


a seguinte lição de Maurício Godinho Delgado12:
“A Carta Magna brasileira, em contraponto a todas as constituições anteriores do país, conferiu,
efetivamente, amplitude ao direito de greve. É que determinou competir aos trabalhadores a decisão sobre
a oportunidade de exercer o direito, assim como decidir a respeito dos interesses que devam por meio dele
defender (caput do art. 9º, CF/88). Oportunidades de exercício da greve e interesses a serem defendidos,
ambos sob decisão dos respectivos trabalhadores, diz a Carta Magna”.

Nesta linha, já encontramos precedente no âmbito da


jurisprudência do TST:
Ementa:
RECURSO ORDINÁRIO EM DISSÍDIO COLETIVO. AMPLITUDE DO DIREITO DE GREVE. A Carta Magna
brasileira de 1988, em contraponto a todas as constituições anteriores do país, conferiu, efetivamente,
amplitude ao direito de greve. É que determinou competir aos trabalhadores a decisão sobre a oportunidade
de exercer o direito, assim como decidir a respeito dos interesses que devam por meio dele defender (caput
do art. 9o, CF/88). A teor do comando constitucional, portanto, não são, em princípio, inválidos movimentos
paredistas que defendam interesses que não sejam rigorosamente contratuais, ilustrativamente, razões
macroprofissionais e outras. Recurso ordinário a que se nega provimento.
Processo: RODC - 54800-42.2008.5.12.0000 Data de Julgamento: 09/11/2009, Relator Ministro: Mauricio
Godinho Delgado, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Divulgação: DEJT 27/11/2009.

Raimundo Simão de Melo13 também defende o exercício


ampliado do direito de greve:
“como a lei não proíbe, são admitidas as greves políticas e de solidariedade ou protesto, desde, porém, que
voltadas para a defesa de interesses trabalhistas profissionais, mesmo que latu sensu como exemplo da
primeira, pode-se imaginar uma greve-protesto dos trabalhadores contra a política econômica empreendida
pelo governo, com claros e graves prejuízos para os trabalhadores, com diminuição do ritmo de crescimento
econômico e consequente desemprego em massa.
São hipóteses de greve de solidariedade: uma paralisação de trabalho empreendida por trabalhadores de
uma filial em apoio a uma greve dos trabalhadores da matriz, cujas reivindicações, sequencialmente, serão
encampadas pelos empregados de uma filial, quando estes terão legitimidade para paralisar suas atividades
em solidariedade aos companheiros de trabalho daquela; esse exemplo igualmente se aplica no caso de
empresas distintas, mas que os pleitos dos trabalhadores grevistas interessem àqueles que a eles se
solidarizam; protesto dos trabalhadores pela demissão dos seus representantes – como forma de retaliação
em razão de sua firme atuação – nas negociações coletivas após o encerramento”.

12
Curso de Direito do Trabalho, editora LTr, 4ª edição, 2005, p. 1416.
13
Obra citada, p. 45.

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Observamos, para reflexão, que a legislação anterior (Lei
4.330/64, art. 22) proibia, expressamente, as greves com motivação
política ou de solidariedade. Já a lei atual (Lei 7.789/83) não
contém qualquer restrição expressa, o que legitimaria tais
condutas dos trabalhadores.

Aliás, a ocorrência de greves de solidariedade não são


raras, tendo o TST já admitido a norma coletiva para pacificar
conflito desta natureza. Transcrevemos:
(…) CLÁUSULA 2ª. CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS AOS EMPREGADOS DESPEDIDOS. DIREITOS
INDIVIDUAIS. HOMOLOGAÇÃO.
1. A jurisprudência da SDC do TST admite a possibilidade de o acordo coletivo submetido à homologação
estabelecer condição de natureza individual, a fim de se resolver, em dissídio coletivo, questões pertinentes
a direitos individuais dos empregados, desde que respeitados as normas mínimas de proteção e os direitos
indisponíveis do trabalhador.
2. No caso vertente, os empregados deflagraram greve em solidariedade aos 70 colegas despedidos.
Assim, a pacificação do conflito coletivo, necessariamente, obrigava a discussão e o exame das questões
ligadas aos direitos individuais dos trabalhadores despedidos, sendo, portanto, razoável a previsão no
acordo coletivo de vantagens a esse grupo de trabalhadores.
3. Merece ser homologada cláusula que garante o pagamento dos haveres rescisórios aos empregados
despedidos e, objetivando minorar os efeitos da perda do emprego, estabelece indenização em valor
correspondente a um salário, paga em duas parcelas, além de conceder outros benefícios - convênio
médico e cesta básica - por até seis meses.
Recursos ordinários conhecidos e providos.
Processo: RO - 2002600-66.2009.5.02.0000 Data de Julgamento: 14/11/2011, Relator Ministro: Walmir
Oliveira da Costa, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 16/12/2011.

No que tange à greve política, o TST já adotou


entendimento que a vedava, conforme se constata no seguinte
julgado:
EMENTA: GREVE. NATUREZA POLÍTICA. ABUSIVIDADE. A greve política não é um meio de ação direta
da classe trabalhadora em benefício de seus interesses profissionais e, portanto, não está compreendida
dentro do conceito de greve legal trabalhista. Entende-se por greve política, em sentido amplo, a dirigida
contra os poderes públicos para conseguir determinadas reivindicações não suscetíveis de negociação
coletiva. Correta, portanto, a decisão que declara a abusividade do movimento grevista com tal conotação,
máxime quando inobservado o disposto na Lei 7.783/89. Recurso Ordinário conhecido e desprovido.
Processo: RODC - 571212-31.1999.5.01.5555 Data de Julgamento: 31/08/2000, Relator Juiz Convocado:
Márcio Ribeiro do Valle, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DJ 15/09/2000.

EMENTA: GREVE. NATUREZA POLÍTICA. ABUSIVIDADE. A greve política não é um meio de ação direta
da classe trabalhadora em benefício de seus interesses profissionais, e, portanto, não está compreendida
dentro do conceito de greve trabalhista. Entende-se por greve política, em sentido amplo, a dirigida contra
os poderes públicos para conseguir determinadas reivindicações não suscetíveis de negociação coletiva.
Recurso Ordinário Obreiro parcialmente provido.
Processo: RODC - 454136-20.1998.5.01.5555 Data de Julgamento: 14/06/1999, Relator Ministro: Valdir
Righetto, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DJ 06/08/1999.

Todavia, passou a admitir a possibilidade de greve


política quando a matéria tivesse relacionada com conteúdo
profissional. Transcrevemos:
(…) METROVIÁRIOS. GREVE. ABUSIVIDADE. É abusiva, diante do ordenamento constitucional e
infraconstitucional vigente, a greve política insurreicional ou de simples retaliação, destituída de conteúdo
profissional. Hipótese em que os metroviários de São Paulo deflagraram greve, por 24 (vinte e quatro
horas), em protesto, alegando descumprimento por parte da Companhia do Metropolitano de São Paulo -
METRÔ(suscitaqnte) de ordem judicial liminar proferida em ação popular, de interesse pessoal de dirigentes
sindicais, em que se teria determinado a suspensão do ato de abertura dos envelopes de propostas das

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empresas concorrentes em processo de licitação tendente à concessão para a iniciativa privada, por meio
de Parceria Público Privada (PPP), da nova Linha 4 - Amarela. Abusividade da greve caracterizada quanto
ao aspecto da motivação. (…)
Processo: RODC - 2025800-10.2006.5.02.0000 Data de Julgamento: 10/10/2011, Relator Ministro:
Fernando Eizo Ono, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 04/11/2011.

No conteúdo do referido julgado, existe importante


ensinamento:
“(...)
Infere-se do atual Texto Constitucional, cujo art. 9º foi reproduzido no art. 1º da Lei nº 7.783/89, que
a greve é permitida, inclusive nos serviços essenciais expressamente elencados em lei, e que cabe aos
trabalhadores não somente o juízo de conveniência a respeito do exercício da greve (momento ou
oportunidade) como a eles toca o direito de decidir -os interesses- que, por meio dela, serão objeto de
defesa.
De outro lado, observa-se que, ao contrário do sistema jurídico vigente no período anterior à
promulgação da atual Constituição Federal, em que se chegou a proibir a greve política (Lei nº 4.330/1964),
no atual texto constitucional e na Lei nº 7.783/1989, em que se regulamentou o exercício do direito de
greve, não há literal vedação à greve política.
Todavia, tem-se que a amplitude conferida ao direito de greve na legislação constitucional e
infraconstitucional citada autoriza, em princípio, as greves mistas ou decorrentes de conflitos político-
econômicos, dirigidas, por exemplo, contra a política econômica do governo (política de emprego), as
greves político-sindicais (garantias de atuação sindical), as greves motivadas pela luta por reformas sociais
(habitações adequadas, transportes coletivos suficientes, saúde eficiente, etc.), que, embora não sejam
solucionáveis diretamente pelo empregador, dependendo de atos legislativos ou governamentais, detêm
conteúdo profissional, repercutindo na vida e trabalho da coletividade dos empregados grevistas. O mesmo
não ocorre, porém, em relação à greve política insurreicional ou de simples retaliação, destituída de
qualquer conteúdo profissional. Nestas hipóteses, exsurge o caráter abusivo do exercício do direito de
greve.
(...)”.

De toda sorte, a exigência de exaurimento da negociação


como pressuposto de legitimação da greve é ressaltada na
jurisprudência do TST: OJ Nº 11 da SDC - GREVE. IMPRESCINDIBILIDADE DE TENTATIVA
DIRETA E PACÍFICA DA SOLUÇÃO DO CONFLITO. ETAPA NEGOCIAL PRÉVIA. Inserida em
27.03.1998. É abusiva a greve levada a efeito sem que as partes hajam tentado, direta e pacificamente,
solucionar o conflito que lhe constitui o objeto.

Aliás, a jurisprudência tem entendido pela ilegalidade da


greve quando não seguidos os requisitos formais estipulados em
lei.
Ementa:
RECURSO ORDINÁRIO. PORTUÁRIOS. GREVE. ABUSIVIDADE. O exercício do direito de greve,
assegurado aos trabalhadores na Constituição Federal, está regulamentado pela Lei nº 7.783/89, que
objetiva coibir o abuso e, se for o caso, garantir o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade,
quando a greve afetar serviços ou atividades essenciais. Assim, uma vez deflagrada a greve, deveria a
categoria profissional observar as exigências legais para tanto instituídas, o que não ocorreu in casu. Do
exame dos autos, constata-se que o suscitado não trouxe a comprovação das tentativas de negociação com
o ora suscitante, da convocação, da pauta de reinvidicações e de quorum, bem como da ata da assembléia
autorizadora da paralisação, além de não ter comprovado a notificação prévia da paralisação,
desconsiderando os requisitos dos arts. 3º, parágrafo único, e 4º da Lei de Greve já citada. Recurso
ordinário provido, para declarar a abusividade da greve.
Processo: RODC - 2400400-20.2006.5.09.0909 Data de Julgamento: 10/05/2010, Relatora Ministra:
Kátia Magalhães Arruda, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT
24/09/2010.

Sobre a oportunidade do exercício do direito de greve,


temos no art. 14 da lei que “constitui abuso do direito de greve a inobservância das normas
contidas na presente Lei, bem como a manutenção da paralisação após a celebração de acordo, convenção

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ou decisão da Justiça do Trabalho”.

No entanto, o parágrafo único do art. 14 excepciona a


regra, ao indicar que
“na vigência de acordo, convenção ou sentença normativa não constitui abuso do exercício do direito de
greve a paralisação que:
I - tenha por objetivo exigir o cumprimento de cláusula ou condição;
II - seja motivada pela superveniência de fatos novo ou acontecimento imprevisto que modifique
substancialmente a relação de trabalho”.

O art. 9º da lei indica deveres de manutenção de serviços


que evitem prejuízos irreparáveis ao empregador:
Durante a greve, o sindicato ou a comissão de negociação, mediante acordo com a entidade patronal ou
diretamente com o empregador, manterá em atividade equipes de empregados com o propósito de
assegurar os serviços cuja paralisação resultem em prejuízo irreparável, pela deterioração irreversível de
bens, máquinas e equipamentos, bem como a manutenção daqueles essenciais à retomada das atividades
da empresa quando da cessação do movimento.
Parágrafo único. Não havendo acordo, é assegurado ao empregador, enquanto perdurar a greve, o direito
de contratar diretamente os serviços necessários a que se refere este artigo.

Decidida a deflagração do movimento paredista, o ente


sindical convocante da greve deve notificar a entidade patronal
correspondente ou os empregadores diretamente interessados, com
antecedência mínima de 48 horas, da paralisação (parágrafo único
do art. 4º da lei de greve). No entanto, caso a paralisação
envolve atividades ou serviços essenciais, a comunicação será com
antecedência mínima de 72 horas e destinada não apenas aos
empregadores, bem como aos usuários dos serviços (art. 13 da lei
7.789). A greve-surpresa, deflagrada sem o conhecimento prévio dos
empregadores, será, portanto, ilegal.

O prazo pode ser inclusive alargado pela norma coletiva,


o que se infere da seguinte decisão do TST:
(…)
2. CLÁUSULA 11. PRIMEIRA PARTE. DEFLAGRAÇÃO DE GREVE. PRAZO DE PRÉVIA
COMUNICAÇÃO AO EMPREGADOR
Pretensão de decretação de nulidade de cláusula de acordo coletivo em que se estabelece, na hipótese de
greve, prazo de antecedência de 96 (noventa e seis horas) para a comunicação a respeito da deflagração
do movimento, independentemente da atividade do empregador, sob o argumento de violação do disposto
no art. 3º da Lei nº 7.783/89. Declaração de improcedência da pretensão anulatória pelo Tribunal a quo.
Manutenção dessa decisão. Lei em referência, em que se fixam prazos mínimos de 48 (quarenta e oito) e
72 (setenta e duas) horas para a prévia comunicação na ocorrência de greve, em relação aos serviços
considerados não essenciais e essenciais, respectivamente, a ensejar a estipulação de prazo de
antecedência maior do que aquele já estipulado para a referida comunicação, por meio de negociação
coletiva. Violação do art. 3º da Lei nº 7.783/89 que não se observa.
(…)
Processo: ROAA - 13900-52.2006.5.24.0000 Data de Julgamento: 18/10/2010, Relator Ministro: Fernando
Eizo Ono, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 10/12/2010.

No sentido de sintetizar os requisitos, transcrevemos


esclarecedor julgado do TST:
(…) DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. MOVIMENTO PAREDISTA EM CONFORMIDADE COM O ART. 9º
DA CF E COM OS REQUISITOS DA LEI Nº 7.783/89. GREVE NÃO ABUSIVA. A Carta Constitucional
reconhece a greve como um direito fundamental de caráter coletivo, resultante da autonomia privada
coletiva inerente às sociedades democráticas. Não constitui abuso no seu exercício quando há observância
dos requisitos estabelecidos pela ordem jurídica do país para a validade do movimento paredista: tentativa

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de negociação; aprovação da respectiva assembleia de trabalhadores; aviso prévio à parte adversa. Na
hipótese dos autos, percebe-se que o direito de greve foi exercido pelos empregados dentro dos limites
legais. Não houve atentado à boa-fé coletiva. Relembro que a empresa tem unidades em praticamente
todos os municípios do país - são mais de 5.000 municípios. No caso concreto, não se teve notícias de
grandes incidentes durante todo o movimento da categoria profissional. Tal fato corrobora com a conclusão
de que a greve não foi abusiva. Declaro não abusiva a greve.
Processo: DC - 6535-37.2011.5.00.0000 Data de Julgamento: 11/10/2011, Relator Ministro: Mauricio
Godinho Delgado, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 17/10/2011.

Quanto às atividades e serviços essenciais, o § 1º do


art. 9º da Constituição aponta que “a lei definirá os serviços ou atividades essenciais e
disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade”.

No caso, o art. 10 da lei de greve aponta que são


considerados serviços ou atividades essenciais:
→ tratamento e abastecimento de água;
→ produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;
→ assistência médica e hospitalar;
→ distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;
→ funerários;
→ transporte coletivo;
→ captação e tratamento de esgoto e lixo;
→ telecomunicações;
→ guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos
e materiais nucleares;
→ processamento de dados ligados a serviços essenciais;
→ controle de tráfego aéreo;
→ compensação bancária.

Muito embora não tenha sido contida no rol, o serviço


postal cuida de atividade essencial, o que demonstra que o rol não
é exaustivo. O TST já decidiu em relação ao serviço postal:
GREVE. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉFRAFOS. PARALISAÇÃO QUE PÕE EM
RISCO NECESSIDADES INADIÁVEIS DA COMUNIDADE. SERVIÇO PÚBLICO TRANSCENDENTAL.
NECESSIDADE DE INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO.
1. A paralisação dos empregados dos Correios põe em risco necessidades inadiáveis da comunidade,
justificando a intervenção do Poder Público para compatibilizar o exercício legítimo do direito de greve e o
atendimento de tais necessidades.
2. Ainda que não relacionada pelo artigo 10 da Lei de Greve, as atividades desempenhadas pela Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos constituem prestação de serviço público transcendental e sua
interrupção impõe prejuízos às necessidades inadiáveis da comunidade.
3. A Organização Internacional do Trabalho reconheceu a importância dos serviços de Correios para a
comunidade, ao decidir, em questão proposta pela Federação Agravante, possível a fixação de um número
mínimo de trabalhadores durante a greve, para manutenção das atividades inadiáveis da população.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
Processo: AgR-DC - 6535-37.2011.5.00.0000 Data de Julgamento: 11/10/2011, Relator Ministro: João
Oreste Dalazen, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 16/03/2012.

Dada a imprescindibilidade de tais atividades e serviços,


o art. 11 aponta que “os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam obrigados, de
comum acordo, a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das
necessidades inadiáveis da comunidade”. Este aspecto é tratado na jurisprudência
do TST:
OJ Nº 38 da SDC - GREVE. SERVIÇOS ESSENCIAIS. GARANTIA DAS NECESSIDADES INADIÁVEIS
DA POPULAÇÃO USUÁRIA. FATOR DETERMINANTE DA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DO MOVIMENTO.

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Inserida em 07.12.1998. É abusiva a greve que se realiza em setores que a lei define como sendo
essenciais à comunidade, se não é assegurado o atendimento básico das necessidades inadiáveis dos
usuários do serviço, na forma prevista na Lei nº 7.783/89.

As atividades inadiáveis são tidas como aquelas que, não


atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou
a segurança da população (parágrafo único do art. 11). Caso os
sujeitos diretamente envolvidos não cumprem a determinação de
manutenção dos serviços, o Poder Público assegurará a prestação
dos serviços indispensáveis (art. 12 da lei de greve).

No caso de greve em atividade essencial, havendo risco de


grave lesão ao interesse público, o Ministério Público do Trabalho
poderá promover o dissídio coletivo de greve, com o objetivo de
resolver o conflito, por acordo ou por decisão judicial (CF, art.
114, § 3º).

Registre-se, por oportuno, que o julgamento acerca do


atendimento da população não poderá inviabilizar o exercício do
direito de greve:
(…) DECISÃO LIMINAR. DESCUMPRIMENTO. MULTA. Decisão liminar proferida em processo cautelar
preparatório, em que se impôs, como forma de garantia da prestação dos serviços indispensáveis ao
atendimento das necessidades inadiáveis da população, o funcionamento entre 100% (cem por cento) e
80% (oitenta por cento) das linhas de metrô durante movimento grevista, de curto e determinado período de
duração (vinte e quatro horas), sob pena de pagamento de multa no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).
Falta de razoabilidade do comando judicial liminar, em que se impôs, como limites operacionais mínimos
para atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, percentuais evidentemente inalcançáveis
em qualquer movimento grevista cuja tônica é a paralisação das atividades por período determinado de 24
(vinte e quatro) horas, a estimular o seu descumprimento. Hipótese, todavia, em que não se constata
qualquer tipo de iniciativa do sindicato profissional suscitado em atender, ainda que dentro de limites
aceitáveis, a decisão judicial liminar proferida com a finalidade de assegurar aquilo que na lei já se
estabelece, de antemão, como obrigação de todos os envolvidos para o exercício do direito de greve nas
atividades classificadas como essenciais: garantia, durante a greve, da prestação dos serviços
indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade (Lei nº 7783/89, art. 11). Valor
fixado a título de multa por descumprimento de decisão judicial que, nesse contexto, se afigura aplicável,
porém em limite mais razoável, considerando as circunstâncias e o porte do Sindicato profissional. Recurso
ordinário a que se dá provimento parcial, a fim de se reduzir para R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) o valor
fixado a título de multa por descumprimento da determinação judicial liminar.
Processo: RODC - 2025800-10.2006.5.02.0000 Data de Julgamento: 10/10/2011, Relator Ministro:
Fernando Eizo Ono, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 04/11/2011.

RECURSO ORDINÁRIO EM DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. LIMINAR DETERMINANDO O


FUNCIONAMENTO DE 100% (CEM POR CENTO) DO METRÔ NOS HORÁRIOS DE PICO E DE 80%
(OITENTA POR CENTO) NOS DEMAIS HORÁRIOS. ALEGAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO. NÃO
ABUSIVIDADE DA GREVE. O art. 11 da Lei nº 7.783/89 impõe aos agentes sociais envolvidos na greve -
representações, empregadores e trabalhadores - o dever de garantir, de comum acordo, -a prestação dos
serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade-. Se inviável, de todo,
o consenso entre as partes sobre a maneira eficaz e efetiva para o atendimento da obrigação, incumbe ao
Poder Público garantir a prestação dos serviços essenciais, consoante as disposições do art. 12 da aludida
lei. Nesse âmbito, insere-se a possibilidade de determinação, pela autoridade competente, de níveis
operacionais mínimos considerados indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis. Esses
níveis, frise-se, não podem ser tão altos que impeçam o exercício do direito de greve, nem tão baixos que
desatendam à finalidade da lei. Na fixação de parâmetros, resulta inviável condicionar, como saída única
para a realização da greve, o descumprimento da determinação. No caso, o índice de funcionamento do
metrô, fixado na liminar em 100% (cem por cento) nos horários de pico, obviamente impede o exercício da
greve, afrontando o art. 9º da Constituição Federal, pelo que não pode ser considerado como parâmetro
para eventual declaração de abusividade da greve e condenação em multa. Recurso ordinário a que se dá
provimento para excluir a declaração de abusividade da greve e a condenação em multa.

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Processo: RODC - 2021800-30.2007.5.02.0000 Data de Julgamento: 14/06/2010, Relator Ministro: Márcio
Eurico Vitral Amaro, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 20/08/2010.

A categoria pode ser punida, caso descumpra o dever de


garantir os serviços mínimos para a população nas atividades
essenciais.
Ementa:
RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE ABUSIVIDADE DE GREVE. DESCUMPRIMENTO
DE DECISÃO JUDICIAL QUE FIXAVA PERCENTUAL MÍNIMO PARA MANUTENÇÃO DOS SERVIÇOS
ESSENCIAIS. O texto constitucional firma, sem dúvida, extensão bastante larga para o direito de greve no
segmento privado. Diz a Constituição que compete aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de
exercer o direito e sobre os interesses que devam por meio dele defender (art. 9o, caput). A ordem jurídica
infraconstitucional estabelece alguns requisitos para a validade do movimento grevista. Em seu conjunto
não se chocam com o sentido da garantia magna: apenas civilizam o exercício de direito coletivo de
tamanho impacto social. Na hipótese dos autos, a greve foi declarada abusiva por não terem sido
respeitadas as decisões liminares expedidas pelo Judiciário Trabalhista no sentido de resguardar, durante a
greve, os interesses da sociedade, mediante o atendimento básico das necessidades inadiáveis dos
usuários do serviço de transporte público local, o que foi entendido como garantir a prestação dos serviços
indispensáveis de transporte coletivo com, pelo menos, quarenta por cento (40%) da frota de ônibus. Tal
desrespeito vai de encontro ao art. 11 da Lei 7.783/89, o que acarreta na manutenção da decisão da Corte
Regional. Recurso ordinário a que se nega provimento.
Processo: ROAD - 36200-81.2008.5.08.0000 Data de Julgamento: 14/06/2010, Relator Ministro:
Mauricio Godinho Delgado, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT
28/06/2010.

Resumindo, podemos dizer que toda greve tem como


requisitos comuns:
→ abrangência coletiva, temporariedade e pacificidade (art. 2º),
frustração da negociação ou inviabilidade do juízo arbitral, além
da notificação prévia dos empregadores, com antecedência de 48
horas (art. 3º);
→ deliberação de assembleia (art. 4º);
→ manutenção de atividades indispensáveis ao empregador (art. 9º).

Além destes, tratando-se de greve em atividades


essenciais exige-se a notificação prévia dos empregadores e
usuários dos serviços, com antecedência de 72 horas do início da
paralisação (art. 13) e garantia de prestação de serviços
inadiáveis à comunidade (art. 11).

Durante a greve, há suspensão do contrato de trabalho dos


trabalhadores em paralisação (art. 7º da lei), devendo as relações
obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo,
convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.
Normalmente, as partes acordam reposição de horas perdidas em
troca dos empregados não sofrerem descontos salariais pelos dias
de paralisação.

Parte da doutrina, porém, recusa a diferença entre os


termos suspensão e interrupção do contrato, e concluem que o
trabalhador faria jus aos salários por ocasião da ocorrência de
greve. Porém, prevalece o entendimento de que o trabalhador não
fará jus ao recebimento de salários do período de paralisação, em
razão da suspensão contratual, salvo se pagos por liberalidade ou

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 23


mesmo em decorrência de negociação coletiva que põe fim à greve.
Em que pese a ideia prevalecente, temos que a ausência de salários
vai contra o sentido do próprio direito que legitima o trabalhador
a paralisar a prestação de serviços. Nesta linha, colhemos a
manifestação de Jorge Luís Souto Maior14, para quem “um dos exemplos da
limitação indevida no direito de greve é a negação do direito ao salário durante a greve. Recusar aos
trabalhadores o direito ao salário quando estiverem exercendo o direito de greve equivale, na prática, a
negar-lhes o direito de exercer o direito de greve, e isto não é um mal apenas para os trabalhadores, mas
para a democracia e para a configuração do Estado Social de Direito do qual muito nos orgulhamos. Afinal,
foram as lutas históricas dos trabalhadores que nos conferiram este legado!”

No entanto, prevalece o entendimento de que os salários,


em regra, não são devidos durante a greve:
(…) 2. ABUSIVIDADE DA GREVE. NÃO COMPROVAÇÃO DA REALIZAÇÃO DA ASSEMBLEIA DE
TRABALHADORES. DESCONTO DOS DIAS PARADOS. O exercício do direito de greve, assegurado ao
trabalhador pelo art. 9º, caput, da Constituição Federal, foi regulado pela Lei nº 7.783/1989, que impôs
limites e estabeleceu requisitos a serem observados na deflagração do movimento. In casu, o sindicato
profissional suscitante não comprovou, nos autos, o cumprimento do art. 4º da Lei de Greve, quanto à
convocação e a realização da assembleia de trabalhadores que decidiu pela deflagração do movimento, nos
termos de seu estatuto social. Ademais, nos termos do art. 7º da referida Lei, da jurisprudência do Supremo
Tribunal Federal e desta Corte, a greve suspende o contrato de trabalho. Assim, independentemente de ser
considerada abusiva ou não, e salvo casos especiais, nos quais a greve em exame não se enquadra, o
empregador não pode ser compelido a remunerar os grevistas pelos dias não trabalhados, mormente se
não houve consenso das partes inclusive quanto à possibilidade de compensação. Reforma-se, pois, a
decisão recorrida, declarando-se a abusividade do movimento e isentando a empresa do pagamento dos
dias de paralisação. Recurso ordinário a que se dá provimento (…)
Processo: RO - 1319-96.2010.5.12.0000 Data de Julgamento: 12/09/2011, Relatora Ministra: Dora Maria da
Costa, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 23/09/2011.

(...) PAGAMENTO DOS VALORES CORRESPONDENTES AOS SALÁRIOS DOS DIAS DE


PARALISAÇÃO DOS SERVIÇOS. A jurisprudência desta Seção Normativa firmou-se no sentido de que a
paralisação dos trabalhos em decorrência de greve importa em suspensão do contrato de trabalho (art. 7º
da Lei nº 7.783/89), razão por que, não havendo trabalho, mesmo que declarada a legalidade da greve, não
deve ser pago o período não trabalhado, salvo acordo diverso entre as partes ou comprovação de que o
empregador, por meio de conduta recriminável ou inerte, tenha contribuído decisivamente para que
houvesse a paralisação, como nas hipóteses de atraso no pagamento dos salários e prática de lock-out (art.
17, parágrafo único, da Lei de Greve), exceções não verificadas no caso concreto. Recurso ordinário a que
se dá provimento parcial, a fim de se excluir do acórdão recorrido a determinação de pagamento dos
valores correspondentes a 50% (cinquenta por cento) dos salários dos dias em que houve a paralisação dos
serviços.
Processo: RODC - 178000-10.2005.5.15.0000 Data de Julgamento: 10/05/2010, Relator Ministro: Fernando
Eizo Ono, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Divulgação: DEJT 28/05/2010.

Por outro lado, algumas situações excepcionais autorizam


o pagamento dos dias parados:
AGRAVO REGIMENTAL. EFEITO SUSPENSIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM DISSÍDIO COLETIVO DE
GREVE. PETROLEIROS. PAGAMENTO DOS SALÁRIOS DOS DIAS PARADOS. JURISPRUDÊNCIA
PACÍFICA DO TST E DO STF. EXCEPCIONALIDADE. RISCO À VIDA, À SAÚDE E À SEGURANÇA DOS
TRABALHADORES. AFASTAMENTO DA PREMISSA DE SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
(LEI Nº 7.783/89, ART. 7º).
1. Cediço que, a teor da jurisprudência pacífica da Seção de Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do
Trabalho, a participação em greve suspende o contrato de trabalho (art. 7º, caput, da Lei nº 7.783/89) e,
portanto, não autoriza o pagamento dos dias parados, salvo em situações excepcionais.
2. Presentemente, a SDC do TST considera excepcionais as hipóteses em que a motivação da greve
decorreu de atraso no pagamento de salários ou de realização de lockout, e, nessas circunstâncias, afasta
a premissa de suspensão do contrato de trabalho para autorizar o pagamento de salários dos dias de

14
Artigo citado, p. 257.

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 24


paralisação.
3. Reveste-se de idêntica excepcionalidade a deflagração de greve para obter do empregador a adoção de
medidas de segurança do trabalho, indispensáveis à salvaguarda da própria vida dos trabalhadores,
petroleiros que se ativam em plataformas de exploração de gás natural. Nesta hipótese, deve ser mitigada a
regra geral contida no caput do artigo 7º da Lei de Greve.
4. O insuperável valor do bem jurídico tutelado em dissídio coletivo de greve de tal natureza, a própria vida
humana, mais do que autorizar, recomenda o pagamento dos salários correspondentes aos dias parados. A
ausência de labor durante o movimento grevista, nesse caso, traduz não só protesto por melhores
condições de trabalho, mas reação contra fundado temor pela integridade física dos trabalhadores.
5. Não merece reforma, portanto, decisão da Presidência do Tribunal Superior do Trabalho que indefere
pedido de efeito suspensivo em recurso ordinário em dissídio coletivo de
greve, permitindo, assim, a imediata execução da sentença normativa que determinou a reposição salarial
dos dias parados em decorrência da paralisação dos petroleiros.
6. Agravo Regimental em Efeito Suspensivo a que se nega provimento.
Processo: AgR-ES - 4253-26.2011.5.00.0000 Data de Julgamento: 13/02/2012, Relator Ministro: João
Oreste Dalazen, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 02/03/2012.

(…) RECURSO ADESIVO DO SUSCITANTE - SINDICATO DOS TRABALHADORES NAS INDÚSTRIAS


DA CARNE E DERIVADOS DE CAMPO GRANDE. NÃO ABUSIVIDADE DO MOVIMENTO PAREDISTA.
DESCUMPRIMENTO DE CLÁUSULA DE ACORDO COLETIVO DE TRABALHO. INTERRUPÇÃO DO
CONTRATO DE TRABALHO. A regra geral é tratar a duração do movimento paredista como suspensão do
contrato de trabalho (art. 7º, Lei 7.783/89). Isso significa que os dias parados, em princípio, não são pagos,
não se computando para fins contratuais o mesmo período. Entretanto, caso se trate de greve em função de
não cumprimento de cláusulas contratuais relevantes e regras legais pela empresa (não pagamento ou
atrasos reiterados de salários, más condições ambientais e risco à higidez dos obreiros, etc.), pode-se falar
na aplicação da regra retificadora da exceção do contrato não cumprido. Neste caso, é cabível enquadrar-
se como mera interrupção o período de duração do movimento paredista e, por consequência, determinar o
pagamento dos dias parados. Recurso ordinário provido.
Processo: RO - 1297-05.2010.5.24.0000 Data de Julgamento: 13/02/2012, Relator Ministro: Mauricio
Godinho Delgado, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 24/02/2012.

(…) 2. GREVE. ABUSIVIDADE. PAGAMENTO DOS DIAS PARADOS. Mantém-se a decisão regional que,
considerando a boa-fé norteadora das negociações e dos termos do acordo parcial apresentado pelas
partes, declarou a não abusividade da greve dos trabalhadores da empresa Prensa Jundiaí S.A. Quanto ao
pagamento dos dias parados, embora o entendimento desta Corte seja no sentido de que,
independentemente de a greve ter sido declarada abusiva, ou não, o empregador não está obrigado ao
pagamento dos salários (art. 7º da Lei nº 7.783/89), in casu, a situação apresentada enquadra-se em uma
das hipóteses de exceção a tal entendimento: o acordo entre as partes. Constatando-se que as partes
definiram, em mesa redonda realizada com a intermediação do Órgão do Ministério do Trabalho e Emprego,
que os dias de paralisação seriam abonados, com o retorno imediato dos trabalhadores grevistas às suas
atividades, mantém-se a decisão regional que declarou a impossibilidade de desconto dos salários,
referente aos dias parados. (…)
Processo: RO - 187-20.2010.5.15.0000 Data de Julgamento: 12/12/2011, Relatora Ministra: Dora Maria da
Costa, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 03/02/2012.

Entretanto, o TST já admitiu outra hipótese diversa das


mencionadas:
DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE - IMBEL - CLÁUSULAS ECONÔMICAS. 1.Diante do achatamento
salarial da categoria, com mais de 50% dos empregados da IMBEL (Indústria de Material Bélico do Brasil)
percebendo salário em torno do mínimo legal, foi ajuizado dissídio coletivo articulado em 71 cláusulas, com
deflagração de greve. 2.Em audiência promovida por este Relator, as Partes em conflito concordaram na
manutenção das condições previstas no acordo coletivo anterior, desistindo-se do dissídio quanto às
cláusulas sociais, remanescendo 3 cláusulas econômicas para julgamento. 3. Quanto à greve, considero-a
não abusiva, uma vez atendidos os requisitos legais para sua deflagração: frustração das negociações,
aprovação por assembléia geral específica, aviso prévio de 48 horas e utilização de meios pacíficos. 4.
Sendo o período de greve considerado de suspensão do contrato de trabalho (Lei 7.783/89, art. 7º) e tendo,
no caso, a paralisação se dado em face da mútua intransigência (insensibilidade obreira para a situação
financeira precária da Empresa e ausência de empenho patronal em obter do DEST - Departamento de
Coordenação e Controle das Empresas Estatais - condições para reajuste salarial que ao menos repusesse
a inflação do período), devem ambas as partes arcar parcialmente com os ônus da paralisação. Assim

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 25


sendo, determino o pagamento de 50% dos dias parados e a compensação pelos trabalhadores dos demais
dias. 5. Em que pese a inflação do período (01/04/05-31/03/06) ter ficado em 4,15%, defere-se o reajuste
salarial de 6%, aceito pela Empresa e parte da categoria, diante da circunstância de que mais de 50% dos
empregados recebem salário mínimo, cujo reajuste legal foi superior a esse percentual. Por essa mesma
razão, não obstante ser convencional a norma coletiva anterior, indefere-se o reajuste salarial do piso
salarial da categoria nos moldes da jurisprudência do TST (mesmo percentual do reajuste salarial deferido),
já que resultaria em valor inferior ao mínimo legal. Dissídio coletivo julgado procedente em parte.
Processo: DC - 1713616-52.2006.5.00.0000 Data de Julgamento: 13/09/2007, Relator Ministro: Ives Gandra
Martins Filho, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DJ 19/10/2007.

Como o contrato é suspenso, é vedada a rescisão de


contrato de trabalho durante a greve, bem como a contratação de
trabalhadores substitutos (par. único do art. 7º). Nesta linha, o
STF, por meio da súmula 316, esclarece que “a simples adesão à greve não constitui
falta greve”. No caso, é importante fixar o entendimento de que o
trabalhador não pode ser despedido por justa causa em razão de sua
participação na greve, ainda que a greve seja considerada ilegal
pelo Poder Judiciário.

Por oportuno, citamos o enunciado 25, aprovado na I


Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho na Justiça do
Trabalho, com o seguinte teor:
Enunciado 25 - CONDUTA ANTI-SINDICAL. PARTICIPAÇÃO EM GREVE. DISPENSA DO
TRABALHADOR. A dispensa de trabalhador motivada por sua participação lícita na atividade sindical,
inclusive em greve, constitui ato de discriminação anti-sindical e desafia a aplicação do art. 4º da Lei
9.029/95, devendo ser determinada a “readmissão com ressarcimento integral de todo o período de
afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas” ou “a percepção, em dobro, da remuneração
do período de afastamento” sempre corrigidas monetariamente e acrescida dos juros legais.

Vale dizer, porém, que esta ideia não exclui a punição


individual de atos abusivos, pelo uso dos poderes diretivos
patronais, como seria o caso de empregados que utilizassem meios
violentos durante a greve. No entanto, a participação da greve em
si, ainda que o movimento seja considerado ilegal, não pode ser
considerado justa causa para a despedida. Transcrevemos:
RECURSO ORDINÁRIO. DISSÍDIO COLETIVO. GREVE. ABUSIVIDADE. O transporte coletivo é
considerado serviço essencial, nos termos do art. 10, V, da Lei n.º 7.783/89. Assim, conforme o art. 11
dessa lei, os sindicatos, os empregados e os trabalhadores ficam obrigados de comum acordo para garantir,
durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da
comunidade. Entretanto, no caso dos autos, os grevistas desrespeitaram a ordem judicial quanto ao
percentual de funcionamento de ônibus, causando constrangimentos à comunidade e à empresa acima dos
limites razoáveis ao exercício do seu direito. Nesses termos, ainda que a deflagração da greve fosse
justificada, conforme alega o recorrente, o procedimento do sindicato durante a paralisação tornou-a
abusiva, já que não observado o disposto no artigo 6.º, §§ 1.º e 3.º da Lei n.º 7.783/89, segundo os quais os
meios adotados no movimento não poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de
outrem, e as manifestações e atos de persuasão não poderão causar ameaça ou dano à propriedade.
Recurso ordinário a que se nega provimento. GREVE ABUSIVA. AUTORIZAÇÃO JUDICIAL PARA
DISPENSAS APÓS ENCERRADO O MOVIMENTO. Os arts. 7.º, parágrafo único, c/c 9.º e 14 da Lei n.º
7.783/89, autorizam a contratação de trabalhadores substitutos aos grevistas, durante o período de greve,
como medida acautelatória, a fim de prevenir prejuízo para a empresa (art. 9.º), ou para a comunidade em
geral (art. 14). Não há nesses dispositivos fundamento para a dispensa de trabalhadores durante a greve,
nem após encerrado o movimento, como no caso dos autos. Ademais, a decisão monocrática proferida nos
autos, que declarou a abusividade da greve, posteriormente confirmada pelo Colegiado, determinou, para o
fim de evitar o prejuízo na prestação do serviço de transporte, apenas a observância do percentual mínimo
de ônibus em circulação. Nesses termos, se no transcurso da greve declarada abusiva foi considerada
suficiente, para preservar o interesse público, a manutenção de um percentual mínimo de ônibus em
circulação, após o término do movimento, não é cabível a autorização de dispensas, já que os direitos

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 26


tutelados pelos arts. 7.º, parágrafo único, c/c 9.º e 14 da Lei n.º 7.783/89 já não se encontravam em risco.
Evidentemente, não se está proibindo as empresas de apurar os atos praticados por cada trabalhador
durante o movimento, nem de proceder às dispensas que entender cabíveis, com amparo no seu poder
potestativo. Nesse caso, caberá aos trabalhadores que se considerarem prejudicados buscar o Poder
Judiciário para postular aquilo que entenderem de direito. Porém, não há amparo para a autorização
conferida de forma genérica pelo TRT, para dispensas em decorrência da simples participação na greve,
ainda que abusiva. Recurso ordinário a que se dá provimento. (…)
Processo: RO - 1262-24.2010.5.14.0000 Data de Julgamento: 09/05/2011, Relatora Ministra: Kátia
Magalhães Arruda, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 20/05/2011.

RECURSO DE REVISTA - ADESÃO À GREVE - INEXISTÊNCIA DE FALTA GRAVE - RESCISÃO POR


JUSTA CAUSA - IMPOSSIBILIDADE 1. A garantia constitucional (art. 9º) de que compete aos
trabalhadores decidir sobre a oportunidade de recorrer ao direito de greve e os interesses a serem
defendidos por meio dele leva a duas conclusões: (i) o exercício do direito não tem sua validade e
constitucionalidade condicionadas à procedência ou não das reivindicações; (ii) o eventual descumprimento
das formalidades legais, embora possa caracterizar -abuso- para os estritos fins da Lei nº 7.783/89, não
converte a participação na greve em falta grave. 2. O Supremo Tribunal Federal, há muito tempo, consagrou
o entendimento de que -a simples adesão à greve não constitui falta grave- (Súmula nº 316). 3. A Corte de
origem, ao declarar a justa causa para a rescisão contratual, diante da participação do Reclamante em
movimento paredista, violou a previsão constitucional (art. 9º da Carta de 1988) e legal (art. 1º da Lei nº
7.783/89) do direito de greve. Recurso de Revista conhecido e provido.
Processo: RR - 124500-08.2008.5.24.0086 Data de Julgamento: 22/09/2010, Relatora Ministra: Maria
Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/09/2010.

Vale lembrar, justamente para garantir êxito à greve, que


o art. 9º da lei autoriza a contratação dos serviços inadiáveis.
Temos interpretado que, a rigor, a empresa não poderá contratar
diretamente novos empregados, mas a prestação dos serviços que se
fizerem necessários.

Por sua vez, o art. 14 indica as situações de abusividade


no exercício do direito de greve, situação em que poderia haver
substituição do pessoal irregularmente paralisado, bem como
dispensa daquelas que abusam do direito de greve.

Outro aspecto a ser analisado são os direitos e


responsabilidades dos grevistas. Assim, no art. 6º da lei temos
que são assegurados aos grevistas, dentre outros direitos:
→ emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os
trabalhadores a aderirem à greve;
→ arrecadação de fundos;
→ livre divulgação do movimento.

Porém, pelo § 1º, em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e


empregadores poderão violar ou constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem. Do mesmo
modo, pelo § 2º, é vedado às empresas adotar meios para constranger o empregado ao
comparecimento ao trabalho, bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento.

Por fim, pelo § 3º, as manifestações e atos de persuasão utilizados pelos


grevistas não poderão impedir o acesso ao trabalho nem causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa.

Como visto, a concessão de direitos aos grevistas sempre


é limitada ao emprego de meios pacíficos. Tanto é assim que o TST
já declarou como abusiva:

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REEXAME NECESSÁRIO E RECURSO ORDINÁRIO. DISSÍDIO COLETIVO. GREVE DOS SERVIDORES
DA FUNDAÇÃO MUNICIPAL DE SAÚDE, REGIDOS PELA CLT. APLICAÇÃO DA LEI Nº 7.783/1989.
ABUSIVIDADE DO MOVIMENTO E DESCONTO DOS DIAS PARADOS. Seguindo a diretriz traçada pelo
Supremo Tribunal Federal, em face da ausência de lei específica a regular o direito de greve do servidor
público, assegurado pelo art. 37 da Constituição Federal, deve-se aplicar a Lei nº 7.783/1989, nos dissídios
coletivos de greve que envolvam o referido segmento profissional. Constata-se, in casu, que, embora o
Sindicato dos Servidores Municipais de Teresina tenha cumprido vários requisitos legais, a exemplo
da comunicação prévia ao empregador, não observou o disposto no § 3º do art. 6º da supracitada Lei, no
que se refere à provocação de danos à propriedade ou à pessoa, na medida em que se possibilitou a
queima, pelos grevistas, das fardas de trabalho, concedidas pelo empregador aos servidores para o
exercício de suas atividades. Assim, ante a gravidade do ato praticado, deve-se atribuir à greve o caráter de
sua abusividade. Ressalta-se que, no entendimento desta Seção Especializada, independentemente de o
movimento paredista ser declarado abusivo, ou não, a greve provoca a suspensão do pacto laboral (art. 7º
da Lei de Greve), não devendo ser pago o período não trabalhado, salvo acordo diverso entre as partes ou
em outras hipóteses, como o atraso no pagamento dos salários, mas que não se aplicam ao caso em tela.
Assim, dá-se provimento ao reexame necessário e ao recurso ordinário interposto pela Fundação Municipal
de Saúde para declarar a abusividade da greve e para isentar a referida entidade do pagamento referente
aos dias de paralisação. Reexame necessário e recurso ordinário providos.
Processo: ReeNec e RO - 79800-02.2007.5.22.0000 Data de Julgamento: 13/09/2010, Relatora Ministra:
Dora Maria da Costa, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 24/09/2010.

Pelo art. 15 da lei, “a responsabilidade pelos atos praticados, ilícitos ou


crimes cometidos, no curso da greve, será apurada, conforme o caso, segundo a legislação trabalhista, civil
ou penal”.

Os atos ou omissões irregulares podem corresponder aos


seguintes atos:
→ formalidades a serem atendidas pelo ente promotor da greve,
→ oportunidade da deflagração da greve,
→ objeto da greve,
→ atos abusivos ou ilícitos praticados no exercício do direito de
greve.

Para o TST, a greve abusiva não pode gerar direitos a


seus participantes:
OJ Nº 10 da SDC - GREVE ABUSIVA NÃO GERA EFEITOS. Inserida em 27.03.1998. É incompatível com a
declaração de abusividade de movimento grevista o estabelecimento de quaisquer vantagens ou garantias a
seus partícipes, que assumiram os riscos inerentes à utilização do instrumento de pressão máximo.

Arnaldo Süssekind resume os principais atos abusivos de


possível ocorrência na greve:
“a) negar-se o sindicato a firmar acordo para a manutenção de serviços cuja paralisação importe em
prejuízo irreparável à empresa ou cuja prestação seja indispensável ao atendimento das necessidades
inadiáveis da comunidade e os empregados a prestar os respectivos serviços; b) o sindicato ou os grevistas
utilizarem meios violentos para aliciar ou persuadir trabalhadores, violar ou constranger direitos e garantias
fundamentais de outrem, causar ameaça ou dano à propriedade; c) o sindicato organizar ou os
trabalhadores participarem de piquetes obstativos do livre acesso ao trabalho ou de 'arrastões' que retiram
do local de trabalho os empregados que não aderiram à greve; d) prosseguir a greve após a decisão da
Justiça do Trabalho; e) a empresa adotar meios para constranger empregados a não participarem da greve
ou para frustrar a divulgação do movimento”.

Greve no serviço público.

Antes da Constituição de 88, os servidores públicos não


tinham direito ao exercício da greve, conforme vedação expressa

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constante do art. 157, § 7º, da CF/6715. Esta era a linha, também,
da antiga lei de greve, a indicar que “a greve não pode ser exercida pelos
funcionários e servidores da União, Estados, Territórios, Municípios e autarquias, salvo se se tratar de
serviços industriais e o pessoal não receber remuneração fixada por lei ou estiver amparado pela legislação
do trabalho” (art. 4º da lei 4.330/64). Não bastasse, a greve no
serviço público estava enquadrada na Lei de Segurança Nacional,
tipificando penalmente o exercício da greve em tais atividades16.

Na redação original da Constituição de 1988, o art. 37,


VII, enunciava que o servidor público tinha garantido o exercício
do direito de greve, nos termos e limites definidos em lei
complementar. Com a EC 19 (Reforma Administrativa) tal dispositivo
foi alterado, em benefício do servidor público, passando a exigir
lei específica para regulamentar o direito, sem demandar lei
complementar. O novo ordenamento constitucional manteve a
proibição de greve para os servidores militares (art. 142), daí
porque não se trata de um direito genérico e absoluto.

Diante da regra constitucional, prevaleceu o entendimento


no sentido de tratar-se de norma de eficácia limitada, a demandar,
portanto, uma lei regulamentadora, como pressuposto de
efetivamente da garantia. Neste caso, o STF deferia o pedido de
mandado de injunção apresentado por ente sindical de servidores
públicos, mas limitava-se a cientificar o Congresso Nacional
acerca da omissão regulamentadora do direito fundamental:
EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO - DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO CIVIL
- EVOLUÇÃO DESSE DIREITO NO CONSTITUCIONALISMO BRASILEIRO - MODELOS NORMATIVOS
NO DIREITO COMPARADO - PRERROGATIVA JURÍDICA ASSEGURADA PELA CONSTITUIÇÃO (ART.
37, VII) - IMPOSSIBILIDADE DE SEU EXERCÍCIO ANTES DA EDIÇÃO DE LEI COMPLEMENTAR -
OMISSÃO LEGISLATIVA - HIPÓTESE DE SUA CONFIGURAÇÃO - RECONHECIMENTO DO ESTADO
DE MORA DO CONGRESSO NACIONAL - IMPETRAÇÃO POR ENTIDADE DE CLASSE -
ADMISSIBILIDADE - WRIT CONCEDIDO. DIREITO DE GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO: O preceito
constitucional que reconheceu o direito de greve ao servidor público civil constitui norma de eficácia
meramente limitada, desprovida, em conseqüência, de auto-aplicabilidade, razão pela qual, para atuar
plenamente, depende da edição da lei complementar exigida pelo próprio texto da Constituição. A mera
outorga constitucional do direito de greve ao servidor público civil não basta - ante a ausência de auto-
aplicabilidade da norma constante do art. 37, VII, da Constituição - para justificar o seu imediato exercício. O
exercício do direito público subjetivo de greve outorgado aos servidores civis só se revelará possível depois
da edição da lei complementar reclamada pela Carta Política. A lei complementar referida - que vai definir os
termos e os limites do exercício do direito de greve no serviço público - constitui requisito de aplicabilidade e
de operatividade da norma inscrita no art. 37, VII, do texto constitucional. Essa situação de lacuna técnica,
precisamente por inviabilizar o exercício do direito de greve, justifica a utilização e o deferimento do
mandado de injunção. A inércia estatal configura-se, objetivamente, quando o excessivo e irrazoável
retardamento na efetivação da prestação legislativa - não obstante a ausência, na Constituição, de prazo
pré-fixado para a edição da necessária norma regulamentadora - vem a comprometer e a nulificar a
situação subjetiva de vantagem criada pelo texto constitucional em favor dos seus beneficiários. MANDADO
DE INJUNÇÃO COLETIVO: A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de admitir a
utilização, pelos organismos sindicais e pelas entidades de classe, do mandado de injunção coletivo, com a
finalidade de viabilizar, em favor dos membros ou associados dessas instituições, o exercício de direitos
assegurados pela Constituição. Precedentes e doutrina. (MI 20-DF, Relator Ministro Celso de Mello,
julgamento em 19/05/1994, publicado DJ 22/11/1996, pp 45690)

15
O referido dispositivo tinha a seguinte redação: “não será permitida greve nos serviços públicos e atividades
essenciais, definidas em lei”.
16
No caso, o art. 37 da Lei 6.620/78 registrava a seguinte redação: “Cessarem funcionários públicos, coletivamente,
no todo, ou em parte, os serviços a seu cargo. Pena: detenção, de 8 meses a 1 ano”.

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 29


No entanto, o STF, recentemente, passou a adotar a teoria
concretista, pela qual a Corte, no julgamento de Mandado de
Injunção, persistindo a omissão do Poder Legislativo, poderá
regulamentar provisoriamente o direito fundamental pendente de
norma integrativa. Raimundo Simão Filho17 captou bem a destinação
do instrumento do mandado de injunção, inovação da Carta de 1988,
ponderando que “a finalidade do mandado de injunção é obter, por meio de uma decisão judicial, as
condições necessárias para a implementação imediata do direito reclamado, mediante a fixação provisória
da normatização respectiva, até que seja feita a regulamentação adequada e definitiva por quem de
direito”.

Ricardo Carvalho Fraga e Luiz Alberto de Vargas18 fazem


importantes ponderações acerca dos problemas que se pretendeu
resolver com a regulamentação judicial da greve no serviço
público:
“Não pode haver dúvidas de que a decisão do STF se dá num contexto de garantia dos direitos subjetivos
dos trabalhadores do serviço público ao exercício do direito de greve assegurado constitucionalmente mas,
até então, negado pela inércia do Legislativo e do Executivo. É nesse espírito de extensão à significativa
parcela dos trabalhadores dos mesmos direitos à luta coletiva pacífica já assegurados aos trabalhadores da
iniciativa privada que se deve interpretar a aplicação à greve no serviço público das normas atinentes à
greve do setor privado.
Por outro lado, também visível ter pesado na decisão do Supremo a urgência de que as paralisações no
serviço público tivessem algum parâmetro para declaração ou não de sua eventual abusividade, forma
constitucional de restrição do exercício do direito de greve pelo Poder Judiciário em caso de paralisações
que, entre outras formas de abuso de direito, desatendam o princípio da boa-fé negocial, que terminem por
violar outros direitos fundamentais ou que atinjam seriamente o direito de terceiros, em especial em serviços
essenciais ou em desatendimento de necessidades inadiáveis da comunidade”.

Assim, ao julgar o MI 712-8, Relator Ministro Eros Grau,


o STF reconheceu a mora legislativa e regulamentou provisoriamente
o direito de greve, aplicando, no que cabível, e com algumas
adaptações, a lei 7.783/89 aos servidores públicos. Por sua
importância, transcrevemos a ementa do referido julgado:
EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. ART. 5º, LXXI DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. CONCESSÃO DE
EFETIVIDADE À NORMA VEICULADA PELO ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
LEGITIMIDADE ATIVA DE ENTIDADE SINDICAL. GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL [ART. 9º
DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL N. 7.783/89 À GREVE NO SERVIÇO
PÚBLICO ATÉ QUE SOBREVENHA LEI REGULAMENTADORA. PARÂMETROS CONCERNENTES AO
EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELOS SERVIDORES PÚBLICOS DEFINIDOS POR ESTA CORTE.
CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO. ALTERAÇÃO DE
ENTENDIMENTO ANTERIOR QUANTO À SUBSTÂNCIA DO MANDADO DE INJUNÇÃO. PREVALÊNCIA
DO INTERESSE SOCIAL. INSUBSSISTÊNCIA DO ARGUMENTO SEGUNDO O QUAL DAR-SE-IA
OFENSA À INDEPENDÊNCIA E HARMONIA ENTRE OS PODERES [ART. 2O DA CONSTITUIÇÃO DO
BRASIL] E À SEPARAÇÃO DOS PODERES [art. 60, § 4o, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL].
INCUMBE AO PODER JUDICIÁRIO PRODUZIR A NORMA SUFICIENTE PARA TORNAR VIÁVEL O
EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS, CONSAGRADO NO ARTIGO 37,
VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. O acesso de entidades de classe à via do mandado de injunção
coletivo é processualmente admissível, desde que legalmente constituídas e em funcionamento há pelo
menos um ano. 2. A Constituição do Brasil reconhece expressamente possam os servidores públicos civis
exercer o direito de greve --- artigo 37, inciso VII. A Lei n. 7.783/89 dispõe sobre o exercício do direito de
greve dos trabalhadores em geral, afirmado pelo artigo 9º da Constituição do Brasil. Ato normativo de início
inaplicável aos servidores públicos civis. 3. O preceito veiculado pelo artigo 37, inciso VII, da CB/88 exige a
edição de ato normativo que integre sua eficácia. Reclama-se, para fins de plena incidência do preceito,

17
Obra citada, p. 53.
18
Artigo citado, p. 281.

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 30


atuação legislativa que dê concreção ao comando positivado no texto da Constituição. 4. Reconhecimento,
por esta Corte, em diversas oportunidades, de omissão do Congresso Nacional no que respeita ao dever,
que lhe incumbe, de dar concreção ao preceito constitucional. Precedentes. 5. Diante de mora legislativa,
cumpre ao Supremo Tribunal Federal decidir no sentido de suprir omissão dessa ordem. Esta Corte não se
presta, quando se trate da apreciação de mandados de injunção, a emitir decisões desnutridas de eficácia.
6. A greve, poder de fato, é a arma mais eficaz de que dispõem os trabalhadores visando à conquista de
melhores condições de vida. Sua auto-aplicabilidade é inquestionável; trata-se de direito fundamental de
caráter instrumental. 7. A Constituição, ao dispor sobre os trabalhadores em geral, não prevê limitação do
direito de greve: a eles compete decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam
por meio dela defender. Por isso a lei não pode restringi-lo, senão protegê-lo, sendo constitucionalmente
admissíveis todos os tipos de greve. 8. Na relação estatutária do emprego público não se manifesta tensão
entre trabalho e capital, tal como se realiza no campo da exploração da atividade econômica pelos
particulares. Neste, o exercício do poder de fato, a greve, coloca em risco os interesses egoísticos do sujeito
detentor de capital --- indivíduo ou empresa --- que, em face dela, suporta, em tese, potencial ou
efetivamente redução de sua capacidade de acumulação de capital. Verifica-se, então, oposição direta entre
os interesses dos trabalhadores e os interesses dos capitalistas. Como a greve pode conduzir à diminuição
de ganhos do titular de capital, os trabalhadores podem em tese vir a obter, efetiva ou potencialmente,
algumas vantagens mercê do seu exercício. O mesmo não se dá na relação estatutária, no âmbito da qual,
em tese, aos interesses dos trabalhadores não correspondem, antagonicamente, interesses individuais,
senão o interesse social. A greve no serviço público não compromete, diretamente, interesses egoísticos do
detentor de capital, mas sim os interesses dos cidadãos que necessitam da prestação do serviço público. 9.
A norma veiculada pelo artigo 37, VII, da Constituição do Brasil reclama regulamentação, a fim de que seja
adequadamente assegurada a coesão social. 10. A regulamentação do exercício do direito de greve pelos
servidores públicos há de ser peculiar, mesmo porque "serviços ou atividades essenciais" e "necessidades
inadiáveis da coletividade" não se superpõem a "serviços públicos"; e vice-versa. 11. Daí porque não deve
ser aplicado ao exercício do direito de greve no âmbito da Administração tão-somente o disposto na Lei n.
7.783/89. A esta Corte impõe-se traçar os parâmetros atinentes a esse exercício. 12. O que deve ser
regulado, na hipótese dos autos, é a coerência entre o exercício do direito de greve pelo servidor público e
as condições necessárias à coesão e interdependência social, que a prestação continuada dos serviços
públicos assegura. 13. O argumento de que a Corte estaria então a legislar --- o que se afiguraria
inconcebível, por ferir a independência e harmonia entre os poderes [art. 2o da Constituição do Brasil] e a
separação dos poderes [art. 60, § 4o, III] --- é insubsistente. 14. O Poder Judiciário está vinculado pelo
dever-poder de, no mandado de injunção, formular supletivamente a norma regulamentadora de que carece
o ordenamento jurídico. 15. No mandado de injunção o Poder Judiciário não define norma de decisão, mas
enuncia o texto normativo que faltava para, no caso, tornar viável o exercício do direito de greve dos
servidores públicos. 16. Mandado de injunção julgado procedente, para remover o obstáculo decorrente da
omissão legislativa e, supletivamente, tornar viável o exercício do direito consagrado no artigo 37, VII, da
Constituição do Brasil. (MI 712-PA, Ministro Eros Grau, julgamento em
25/10/2007, publicado DJ-e 206, 30/10/2008)

No entanto, no mesmo dia o STF julgou o MI 670,


estabelecendo a competência da Justiça Comum para o julgamento dos
dissídios de greve envolvendo os servidores públicos civis
estatutários ou regidos por relação jurídico-administrativa, além
de reforçar aplicação de efeitos concretos ao mandado de injunção:
EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. GARANTIA FUNDAMENTAL (CF, ART. 5º, INCISO LXXI). DIREITO
DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS (CF, ART. 37, INCISO VII). EVOLUÇÃO DO TEMA NA
JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). DEFINIÇÃO DOS PARÂMETROS DE
COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PARA APRECIAÇÃO NO ÂMBITO DA JUSTIÇA FEDERAL E DA
JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PERTINENTE, NOS TERMOS DO
ART. 37, VII, DA CF. EM OBSERVÂNCIA AOS DITAMES DA SEGURANÇA JURÍDICA E À EVOLUÇÃO
JURISPRUDENCIAL NA INTERPRETAÇÃO DA OMISSÃO LEGISLATIVA SOBRE O DIREITO DE GREVE
DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS, FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60 (SESSENTA) DIAS PARA QUE O
CONGRESSO NACIONAL LEGISLE SOBRE A MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO DEFERIDO PARA
DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS Nos 7.701/1988 E 7.783/1989. 1. SINAIS DE EVOLUÇÃO DA
GARANTIA FUNDAMENTAL DO MANDADO DE INJUNÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL (STF). 1.1. No julgamento do MI no 107/DF, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 21.9.1990, o
Plenário do STF consolidou entendimento que conferiu ao mandado de injunção os seguintes elementos
operacionais: i) os direitos constitucionalmente garantidos por meio de mandado de injunção apresentam-se

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como direitos à expedição de um ato normativo, os quais, via de regra, não poderiam ser diretamente
satisfeitos por meio de provimento jurisdicional do STF; ii) a decisão judicial que declara a existência de
uma omissão inconstitucional constata, igualmente, a mora do órgão ou poder legiferante, insta-o a editar a
norma requerida; iii) a omissão inconstitucional tanto pode referir-se a uma omissão total do legislador
quanto a uma omissão parcial; iv) a decisão proferida em sede do controle abstrato de normas acerca da
existência, ou não, de omissão é dotada de eficácia erga omnes, e não apresenta diferença significativa em
relação a atos decisórios proferidos no contexto de mandado de injunção; iv) o STF possui competência
constitucional para, na ação de mandado de injunção, determinar a suspensão de processos administrativos
ou judiciais, com o intuito de assegurar ao interessado a possibilidade de ser contemplado por norma mais
benéfica, ou que lhe assegure o direito constitucional invocado; v) por fim, esse plexo de poderes
institucionais legitima que o STF determine a edição de outras medidas que garantam a posição do
impetrante até a oportuna expedição de normas pelo legislador. 1.2. Apesar dos avanços proporcionados
por essa construção jurisprudencial inicial, o STF flexibilizou a interpretação constitucional primeiramente
fixada para conferir uma compreensão mais abrangente à garantia fundamental do mandado de injunção. A
partir de uma série de precedentes, o Tribunal passou a admitir soluções "normativas" para a decisão
judicial como alternativa legítima de tornar a proteção judicial efetiva (CF, art. 5o, XXXV). Precedentes: MI
no 283, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 14.11.1991; MI no 232/RJ, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 27.3.1992;
MI nº 284, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. para o acórdão Min. Celso de Mello, DJ 26.6.1992; MI no 543/DF,
Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 24.5.2002; MI no 679/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 17.12.2002; e MI no
562/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 20.6.2003. 2. O MANDADO DE INJUNÇÃO E O DIREITO DE GREVE
DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS NA JURISPRUDÊNCIA DO STF. 2.1. O tema da existência, ou não,
de omissão legislativa quanto à definição das possibilidades, condições e limites para o exercício do direito
de greve por servidores públicos civis já foi, por diversas vezes, apreciado pelo STF. Em todas as
oportunidades, esta Corte firmou o entendimento de que o objeto do mandado de injunção cingir-se-ia à
declaração da existência, ou não, de mora legislativa para a edição de norma regulamentadora específica.
Precedentes: MI no 20/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 22.11.1996; MI no 585/TO, Rel. Min. Ilmar Galvão,
DJ 2.8.2002; e MI no 485/MT, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 23.8.2002. 2.2. Em alguns precedentes(em
especial, no voto do Min. Carlos Velloso, proferido no julgamento do MI no 631/MS, Rel. Min. Ilmar Galvão,
DJ 2.8.2002), aventou-se a possibilidade de aplicação aos servidores públicos civis da lei que disciplina os
movimentos grevistas no âmbito do setor privado (Lei no 7.783/1989). 3. DIREITO DE GREVE DOS
SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS. HIPÓTESE DE OMISSÃO LEGISLATIVA INCONSTITUCIONAL. MORA
JUDICIAL, POR DIVERSAS VEZES, DECLARADA PELO PLENÁRIO DO STF. RISCOS DE
CONSOLIDAÇÃO DE TÍPICA OMISSÃO JUDICIAL QUANTO À MATÉRIA. A EXPERIÊNCIA DO DIREITO
COMPARADO. LEGITIMIDADE DE ADOÇÃO DE ALTERNATIVAS NORMATIVAS E INSTITUCIONAIS DE
SUPERAÇÃO DA SITUAÇÃO DE OMISSÃO. 3.1. A permanência da situação de não-regulamentação do
direito de greve dos servidores públicos civis contribui para a ampliação da regularidade das instituições de
um Estado democrático de Direito (CF, art. 1o). Além de o tema envolver uma série de questões
estratégicas e orçamentárias diretamente relacionadas aos serviços públicos, a ausência de parâmetros
jurídicos de controle dos abusos cometidos na deflagração desse tipo específico de movimento grevista tem
favorecido que o legítimo exercício de direitos constitucionais seja afastado por uma verdadeira "lei da
selva". 3.2. Apesar das modificações implementadas pela Emenda Constitucional no 19/1998 quanto à
modificação da reserva legal de lei complementar para a de lei ordinária específica (CF, art. 37, VII),
observa-se que o direito de greve dos servidores públicos civis continua sem receber tratamento legislativo
minimamente satisfatório para garantir o exercício dessa prerrogativa em consonância com imperativos
constitucionais. 3.3. Tendo em vista as imperiosas balizas jurídico-políticas que demandam a concretização
do direito de greve a todos os trabalhadores, o STF não pode se abster de reconhecer que, assim como o
controle judicial deve incidir sobre a atividade do legislador, é possível que a Corte Constitucional atue
também nos casos de inatividade ou omissão do Legislativo. 3.4. A mora legislativa em questão já foi, por
diversas vezes, declarada na ordem constitucional brasileira. Por esse motivo, a permanência dessa
situação de ausência de regulamentação do direito de greve dos servidores públicos civis passa a invocar,
para si, os riscos de consolidação de uma típica omissão judicial. 3.5. Na experiência do direito comparado
(em especial, na Alemanha e na Itália), admite-se que o Poder Judiciário adote medidas normativas como
alternativa legítima de superação de omissões inconstitucionais, sem que a proteção judicial efetiva a
direitos fundamentais se configure como ofensa ao modelo de separação de poderes (CF, art. 2o). 4.
DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS. REGULAMENTAÇÃO DA LEI DE GREVE
DOS TRABALHADORES EM GERAL (LEI No 7.783/1989). FIXAÇÃO DE PARÂMETROS DE CONTROLE
JUDICIAL DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELO LEGISLADOR INFRACONSTITUCIONAL. 4.1.
A disciplina do direito de greve para os trabalhadores em geral, quanto às "atividades essenciais", é
especificamente delineada nos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Na hipótese de aplicação dessa
legislação geral ao caso específico do direito de greve dos servidores públicos, antes de tudo, afigura-se
inegável o conflito existente entre as necessidades mínimas de legislação para o exercício do direito de

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greve dos servidores públicos civis (CF, art. 9o, caput, c/c art. 37, VII), de um lado, e o direito a serviços
públicos adequados e prestados de forma contínua a todos os cidadãos (CF, art. 9o, §1o), de outro.
Evidentemente, não se outorgaria ao legislador qualquer poder discricionário quanto à edição, ou não, da lei
disciplinadora do direito de greve. O legislador poderia adotar um modelo mais ou menos rígido, mais ou
menos restritivo do direito de greve no âmbito do serviço público, mas não poderia deixar de reconhecer
direito previamente definido pelo texto da Constituição. Considerada a evolução jurisprudencial do tema
perante o STF, em sede do mandado de injunção, não se pode atribuir amplamente ao legislador a última
palavra acerca da concessão, ou não, do direito de greve dos servidores públicos civis, sob pena de se
esvaziar direito fundamental positivado. Tal premissa, contudo, não impede que, futuramente, o legislador
infraconstitucional confira novos contornos acerca da adequada configuração da disciplina desse direito
constitucional. 4.2 Considerada a omissão legislativa alegada na espécie, seria o caso de se acolher a
pretensão, tão-somente no sentido de que se aplique a Lei no 7.783/1989 enquanto a omissão não for
devidamente regulamentada por lei específica para os servidores públicos civis (CF, art. 37, VII). 4.3 Em
razão dos imperativos da continuidade dos serviços públicos, contudo, não se pode afastar que, de acordo
com as peculiaridades de cada caso concreto e mediante solicitação de entidade ou órgão legítimo, seja
facultado ao tribunal competente impor a observância a regime de greve mais severo em razão de tratar-se
de "serviços ou atividades essenciais", nos termos do regime fixado pelos arts. 9o a 11 da Lei no
7.783/1989. Isso ocorre porque não se pode deixar de cogitar dos riscos decorrentes das possibilidades de
que a regulação dos serviços públicos que tenham características afins a esses "serviços ou atividades
essenciais" seja menos severa que a disciplina dispensada aos serviços privados ditos "essenciais". 4.4. O
sistema de judicialização do direito de greve dos servidores públicos civis está aberto para que outras
atividades sejam submetidas a idêntico regime. Pela complexidade e variedade dos serviços públicos e
atividades estratégicas típicas do Estado, há outros serviços públicos, cuja essencialidade não está
contemplada pelo rol dos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Para os fins desta decisão, a enunciação do
regime fixado pelos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989 é apenas exemplificativa (numerus apertus). 5. O
PROCESSAMENTO E O JULGAMENTO DE EVENTUAIS DISSÍDIOS DE GREVE QUE ENVOLVAM
SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS DEVEM OBEDECER AO MODELO DE COMPETÊNCIAS E
ATRIBUIÇÕES APLICÁVEL AOS TRABALHADORES EM GERAL (CELETISTAS), NOS TERMOS DA
REGULAMENTAÇÃO DA LEI No 7.783/1989. A APLICAÇÃO COMPLEMENTAR DA LEI No 7.701/1988
VISA À JUDICIALIZAÇÃO DOS CONFLITOS QUE ENVOLVAM OS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS NO
CONTEXTO DO ATENDIMENTO DE ATIVIDADES RELACIONADAS A NECESSIDADES INADIÁVEIS DA
COMUNIDADE QUE, SE NÃO ATENDIDAS, COLOQUEM "EM PERIGO IMINENTE A SOBREVIVÊNCIA,
A SAÚDE OU A SEGURANÇA DA POPULAÇÃO" (LEI No 7.783/1989, PARÁGRAFO ÚNICO, ART. 11).
5.1. Pendência do julgamento de mérito da ADI no 3.395/DF, Rel. Min. Cezar Peluso, na qual se discute a
competência constitucional para a apreciação das "ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os
entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios" (CF, art. 114, I, na redação conferida pela EC no 45/2004). 5.2. Diante da
singularidade do debate constitucional do direito de greve dos servidores públicos civis, sob pena de
injustificada e inadmissível negativa de prestação jurisdicional nos âmbitos federal, estadual e municipal,
devem-se fixar também os parâmetros institucionais e constitucionais de definição de competência,
provisória e ampliativa, para a apreciação de dissídios de greve instaurados entre o Poder Público e os
servidores públicos civis. 5.3. No plano procedimental, afigura-se recomendável aplicar ao caso concreto a
disciplina da Lei no 7.701/1988 (que versa sobre especialização das turmas dos Tribunais do Trabalho em
processos coletivos), no que tange à competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais
referentes à greve de servidores públicos que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa
específica da lacuna ora declarada, nos termos do inciso VII do art. 37 da CF. 5.4. A adequação e a
necessidade da definição dessas questões de organização e procedimento dizem respeito a elementos de
fixação de competência constitucional de modo a assegurar, a um só tempo, a possibilidade e, sobretudo,
os limites ao exercício do direito constitucional de greve dos servidores públicos, e a continuidade na
prestação dos serviços públicos. Ao adotar essa medida, este Tribunal passa a assegurar o direito de greve
constitucionalmente garantido no art. 37, VII, da Constituição Federal, sem desconsiderar a garantia da
continuidade de prestação de serviços públicos - um elemento fundamental para a preservação do interesse
público em áreas que são extremamente demandadas pela sociedade. 6. DEFINIÇÃO DOS PARÂMETROS
DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PARA APRECIAÇÃO DO TEMA NO ÂMBITO DA JUSTIÇA
FEDERAL E DA JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PERTINENTE,
NOS TERMOS DO ART. 37, VII, DA CF. FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60 (SESSENTA) DIAS PARA QUE O
CONGRESSO NACIONAL LEGISLE SOBRE A MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO DEFERIDO PARA
DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS Nos 7.701/1988 E 7.783/1989. 6.1. Aplicabilidade aos servidores
públicos civis da Lei no 7.783/1989, sem prejuízo de que, diante do caso concreto e mediante solicitação de
entidade ou órgão legítimo, seja facultado ao juízo competente a fixação de regime de greve mais severo,
em razão de tratarem de "serviços ou atividades essenciais" (Lei no 7.783/1989, arts. 9o a 11). 6.2. Nessa

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extensão do deferimento do mandado de injunção, aplicação da Lei no 7.701/1988, no que tange à
competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais referentes à greve de servidores públicos
que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa específica da lacuna ora declarada, nos
termos do inciso VII do art. 37 da CF. 6.3. Até a devida disciplina legislativa, devem-se definir as situações
provisórias de competência constitucional para a apreciação desses dissídios no contexto nacional,
regional, estadual e municipal. Assim, nas condições acima especificadas, se a paralisação for de âmbito
nacional, ou abranger mais de uma região da justiça federal, ou ainda, compreender mais de uma unidade
da federação, a competência para o dissídio de greve será do Superior Tribunal de Justiça (por aplicação
analógica do art. 2o, I, "a", da Lei no 7.701/1988). Ainda no âmbito federal, se a controvérsia estiver adstrita
a uma única região da justiça federal, a competência será dos Tribunais Regionais Federais (aplicação
analógica do art. 6o da Lei no 7.701/1988). Para o caso da jurisdição no contexto estadual ou municipal, se
a controvérsia estiver adstrita a uma unidade da federação, a competência será do respectivo Tribunal de
Justiça (também por aplicação analógica do art. 6o da Lei no 7.701/1988). As greves de âmbito local ou
municipal serão dirimidas pelo Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal com jurisdição sobre o local
da paralisação, conforme se trate de greve de servidores municipais, estaduais ou federais. 6.4.
Considerados os parâmetros acima delineados, a par da competência para o dissídio de greve em si, no
qual se discuta a abusividade, ou não, da greve, os referidos tribunais, nos âmbitos de sua jurisdição, serão
competentes para decidir acerca do mérito do pagamento, ou não, dos dias de paralisação em consonância
com a excepcionalidade de que esse juízo se reveste. Nesse contexto, nos termos do art. 7o da Lei no
7.783/1989, a deflagração da greve, em princípio, corresponde à suspensão do contrato de trabalho. Como
regra geral, portanto, os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos, salvo no caso em que a
greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento aos servidores públicos civis, ou por
outras situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato de
trabalho (art. 7o da Lei no 7.783/1989, in fine). 6.5. Os tribunais mencionados também serão competentes
para apreciar e julgar medidas cautelares eventualmente incidentes relacionadas ao exercício do direito de
greve dos servidores públicos civis, tais como: i) aquelas nas quais se postule a preservação do objeto da
querela judicial, qual seja, o percentual mínimo de servidores públicos que deve continuar trabalhando
durante o movimento paredista, ou mesmo a proibição de qualquer tipo de paralisação; ii) os interditos
possessórios para a desocupação de dependências dos órgãos públicos eventualmente tomados por
grevistas; e iii) as demais medidas cautelares que apresentem conexão direta com o dissídio coletivo de
greve. 6.6. Em razão da evolução jurisprudencial sobre o tema da interpretação da omissão legislativa do
direito de greve dos servidores públicos civis e em respeito aos ditames de segurança jurídica, fixa-se o
prazo de 60 (sessenta) dias para que o Congresso Nacional legisle sobre a matéria. 6.7. Mandado de
injunção conhecido e, no mérito, deferido para, nos termos acima especificados, determinar a aplicação das
Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que envolvam a interpretação do direito
de greve dos servidores públicos civis. (STF, MI 670-ES, Relator Designado Ministro Gilmar Mendes,
julgamento em 25/10/2007, Dje-206, 31/10/2008, pp-0001)

Do referido julgamento no MI 670, destacamos os seguintes


pontos:
→ aplicação da lei 7.783/89, até que sobrevenha lei específica de
que trata o art. 37, VII);
→ possibilidade de imposição, em novos casos concretos, de regimes
mais severos para o exercício do direito de greve em atividades
essenciais, em atendimento à continuidade dos serviços públicos.
Para tanto, poderá ser adotado critério ampliativo acerca das
atividades essenciais, ainda que estas estejam arroladas no art.
10 da referida Lei de Greve. No caso, entendeu-se pela existência
de setores estratégicos do poder público e que não estão arrolados
na lei como de atividade essencial, daí porque o rol da lei (art.
10) é tido como meramente exemplificativo.
→ Constou do julgado a competência do STJ - Superior Tribunal de
Justiça, em aplicação analógica do art. 2º, I, “a”, da lei
7.701/88 - para o julgamento do dissídio coletivo, caso a
paralisação for de âmbito nacional, ou abranger mais de uma região
de Justiça Federal, ou, ainda, compreender mais de uma unidade da
federação. Por outro lado, caso o conflito seja restrito a uma

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única região da Justiça Federal, a competência será do Tribunal
Regional Federal respectivo, em aplicação analógica do art. 6º, da
lei 7.701/88. no julgado, o STF constou, ainda, a competência do
Tribunal de Justiça, para julgar o dissídio adstrito a uma unidade
da Federação, ou mesmo apresentada no âmbito municipal ou
estadual. Diferencia, no entanto, que a competência seria do TJ,
caso a greve envolva servidores públicos estaduais ou municipais,
enquanto o TRF julgaria dissídio envolvendo servidores públicos
federais. Fixada a competência, o STF estendeu-a para o exame de
medidas cautelares incidentes, relacionadas ao exercício do
direito de greve dos servidores públicos, arrolando algumas
possíveis matérias a serem apreciadas. Registramos, porém, que,
ainda que não tenha constado no julgado, é evidente que se o
regime de contratação for o celetista a competência seria da
Justiça do Trabalho para examinar os conflitos coletivos.
→ garantia da continuidade de prestação de serviços públicos,
durante uma greve. I) postulação de preservação do objeto da
querela judicial, ou seja, o percentual mínimo de servidores
públicos que deve continuar trabalhando durante o movimento
paredista, ou mesmo a proibição de qualquer tipo de paralisação;
II) os interditos possessórios para a desocupação de dependências
dos órgãos públicos eventualmente tomados por grevistas; e III) as
demais medidas cautelares que apresentem conexão direta com o
dissídio coletivo de greve.
→ havendo debate acerca da abusividade ou não do movimento
paredista, o tribunal decide acerca do pagamento, ou não, dos dias
de paralisação. Aplicando o art. 7º da lei 7.783/89, o STF fixou a
premissa de que a greve provoca a suspensão dos contratos de
trabalho e, assim, não gera o pagamento dos dias de parede. No
entanto, o pagamento será devido caso a greve tenha sido provocada
justamente pelo atraso no pagamento aos servidores, ou por outras
situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa
da suspensão do contrato.

Neste contexto, admitida a possibilidade de greve dos


servidores públicos, incusive com a incidência, observadas algumas
peculiaridades, da Lei 7.783/89, resta evidente que normas
estaduais que limitam, ainda que indiretamente, o exercício do
direito de greve fora dos limites da lei específica que ainda será
editada violam a Constituição. O STF possui precedente
interessante:
ADI 3235 / AL - ALAGOAS AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Relator(a): Min. CARLOS
VELLOSO Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES (art. 38, II, RISTF) Julgamento:
04/02/2010 Órgão Julgador: Tribunal Pleno
Publicação
DJe-045 DIVULG 11-03-2010 PUBLIC 12-03-2010
EMENT VOL-02393-01 PP-00153
RTJ VOL-00214- PP-00029
Ementa EMENTA: 1. Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Parágrafo único do art. 1º do Decreto
estadual n.° 1.807, publicado no Diário Oficial do Estado de Alagoas de 26 de março de 2004. 3.
Determinação de imediata exoneração de servidor público em estágio probatório, caso seja confirmada sua
participação em paralisação do serviço a título de greve. 4. Alegada ofensa do direito de greve dos
servidores públicos (art. 37, VII) e das garantias do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV). 5.

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Inconstitucionalidade. 6. O Supremo Tribunal Federal, nos termos dos Mandados de Injunção n.ºs 670/ES,
708/DF e 712/PA, já manifestou o entendimento no sentido da eficácia imediata do direito constitucional de
greve dos servidores públicos, a ser exercício por meio da aplicação da Lei n.º 7.783/89, até que
sobrevenha lei específica para regulamentar a questão. 7. Decreto estadual que viola a Constituição
Federal, por (a) considerar o exercício não abusivo do direito constitucional de greve como fato
desabonador da conduta do servidor público e por (b) criar distinção de tratamento a servidores públicos
estáveis e não estáveis em razão do exercício do direito de greve. 8. Ação julgada procedente.

No julgamento da ADI 712-8, o sindicato autor intentou


desistir da ação, após o início do julgamento, o que provocou
interessante precedente do STF, no sentido de que a defesa dos
direitos fundamentais, levada à Corte, não pode ser objeto de
livre disposição por parte do interessado:
EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. ARTIGO 5º, LXXI, DA CB/88. QUESTÃO DE ORDEM. AÇÃO DE
ÍNDOLE CONSTITUCIONAL. PEDIDO DE DESISTÊNCIA TARDIO. JULGAMENTO INICIADO. NÃO
CABIMENTO. CONTINUIDADE DO PROCESSAMENTO DO FEITO. 1. É incabível o pedido de desistência
formulado após o início do julgamento por esta Corte, quando a maioria dos Ministros já havia se
manifestado favoravelmente à concessão da medida. 2. O mandado de injunção coletivo, bem como a ação
direta de inconstitucionalidade, não pode ser utilizado como meio de pressão sobre o Poder Judiciário ou
qualquer entidade. 3. Sindicato que, na relação processual, é legitimado extraordinário para figurar na
causa; sindicato que postula em nome próprio, na defesa de direito alheio. Os substitutos processuais não
detêm a titularidade dessas ações. O princípio da indisponibilidade é inerente às ações constitucionais. 4.
Pedido de desistência rejeitado. Prosseguimento do mandado de injunção. (Questão de Ordem no MI 712-8,
Relator Ministro Eros Grau, julgamento em 15/10/2007, publicado DJ-e 22/11/2007, pp. 00030)

O exercício do direito de greve pelos servidores


públicos, sempre envolverá um conflito de difícil solução, por
exigir a observância do direito da comunidade em contar com a
continuidade dos serviços públicos executados por seus
trabalhadores, em especial quanto aos serviços cuja paralisação
possa colocar em risco a vida, a saúde ou a segurança das pessoas.
Neste contexto, o direito de greve poderá revelar confronto ou
inviabilizar o exercício de outros direitos fundamentais, como
saúde, eleições, tutela da liberdade (processamento de habeas
corpus) e direito de certidão, entre outros. Para solucionar tais
confrontos será sempre usado o juízo de ponderação, a conciliar os
interesses conflito, harmonizando, no caso concreto, as normas
garantidoras de direitos fundamentais.

Cabe o registro de que a definição do exercício do


direito de greve no serviço público revela a transposição do
ideário pelo qual a relação jurídica envolvendo o Estado como
tomador de serviços seria unilateral, podendo este, em nome do
interesse público, impor as condições de trabalho sem qualquer
espaço para negociação coletiva. Aliás, foi com base na
unilateralidade da fixação das condições do trabalho que o STF,
por meio da ADI 492-DF, julgou inconstitucionais as alíneas 'd' e
'e' do art. 240 da lei 8.112, a prever para os servidores públicos
estatutários o direito à negociação coletiva e ao ajuizamento de
dissídio coletivo. Assim, ao permitir exercício de greve pelo
servidor público, temos fixada a premissa de que a negociação
coletiva é viável em seus domínios, mesmo porque não faria sentido
que os trabalhadores pudessem sindicalizar-se e fazer greve sem
ser possível a negociação.

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Ao lidar com a regulamentação da greve no serviço
público, o STF fixou a seguinte regulamentação provisória,
efetuada no julgamento da injunção, fixando os parâmetros
provisórios para exercício do direito de greve por parte dos
servidores públicos civis:
Art. 1º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de
exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.
Parágrafo único. O direito de greve será exercido na forma estabelecida nesta Lei.
Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se legítimo exercício do direito de greve a suspensão coletiva,
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temporária e pacífica, parcial , de prestação pessoal de serviços a empregador.
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Art. 3º Frustrada a negociação ou verificada a impossibilidade de recursos via arbitral , é facultada a
cessação parcial do trabalho.
Parágrafo único. A entidade patronal correspondente ou os empregadores diretamente interessados serão
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notificados, com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas, da paralisação .
Art. 4º Caberá à entidade sindical correspondente convocar, na forma do seu estatuto, assembléia geral que
definirá as reivindicações da categoria e deliberará sobre a paralisação parcial da prestação de serviços.
§ 1º O estatuto da entidade sindical deverá prever as formalidades de convocação e o quórum para a
deliberação, tanto da deflagração quando da cessação da greve.
§ 2º Na falta de entidade sindical, a assembléia geral dos trabalhadores interessados deliberará para os fins
previsto no caput, constituindo comissão de negociação.
Art. 5º A entidade sindical ou comissão especialmente eleita representará os interesses dos trabalhadores
23
nas negociações ou na Justiça do Trabalho .
Art. 6º São assegurados aos grevistas, dentre outros direitos::
I – o emprego de meios pacíficos, tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve;
II – a arrecadação de fundos e a livre divulgação do movimento.
§ 1º Em nenhuma hipótese, os meios adotados por empregados e empregadores poderão violar ou
constranger os direitos e garantias fundamentais de outrem.
§ 2º É vedado às empresas adotar meios para constranger o empregado ao comparecimento ao trabalho,
bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento.
§ 3º As manifestações e atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão impedir o acesso ao
trabalho nem causar ameaça ou dano à propriedade ou pessoa.
Art. 7º Observadas as condições previstas nesta Lei, a participação em greve suspende o contrato de
trabalho, devendo as relações obrigacionais, durante o período, ser regidas pelo acordo, convenção, laudo
arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho.
Parágrafo único. É vedada a rescisão de contrato de trabalho durante a greve, exceto na ocorrência da
hipótese prevista no art. 14.
art. 8º A Justiça do Trabalho, por iniciativa de qualquer das partes ou do Ministério Público do Trabalho,
decidirá sobre a procedência, total ou parcial, ou improcedente das reivindicações, cumprindo ao Tribunal
publicar, de imediato, o competente acórdão.
Art. 9º Durante a greve, o sindicato ou a comissão de negociação, mediante acordo com a entidade patronal
ou diretamente com o empregador, manterá em atividade equipes de empregados com o propósito de
assegurar a regular continuidade da prestação do serviço público.

19
Vê-se, assim, que o STF não admite que a greve provoque a paralisação total do serviço público, devendo ser
exercida sempre de modo parcial.
20
Esta negociação desaguará na solução de pendências envolvendo a categoria e na formulação de protocolo de
intenções, no qual o Executivo comprometer-se-á a enviar projeto de lei para revisão dos salários nos moldes
ajustados. Importante tal ressalva, eis que, em razão do princípio da reserva legal para fixação de patamar
remuneratório para o servidor público, não será possível a formalização de acordo ou convenção coletiva de trabalho
envolvendo tais matérias.
21
Na prática, dificilmente o poder público fará uso da arbitragem para solucionar tais conflitos, em razão dos
interesses públicos envolvidos.
22
Adotou-se o critério pelo qual todo serviço público reveste-se de essencialidade, o que justificaria prazo mais amplo
de comunicação antecedente. No entanto, não se exigiu que os usuários do serviço fossem comunicados da
paralisação, como dita a lei de greve para os serviços essenciais.
23
O julgado reproduz a lei de greve, o que não implica que a competência para julgar o dissídio seja da Justiça do
Trabalho, conforme vimos ocorrido no julgamento do MI 670, no qual o STF distribui a competência para
julgamento do dissídio de greve entre o STJ, TRFs e Tjs.

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 37


Parágrafo único. É assegurado ao empregador, enquanto perdurar a greve, o direito de contratar
diretamente os serviços necessários a que se refere este artigo.
Art. 14. Constitui abuso do direito de greve a inobservância das normas contidas na presente Lei, em
especial o comprometimento da regular continuidade na prestação do serviço público, bem como a
manutenção da paralisação após a celebração de acordo, convenção ou decisão da Justiça do Trabalho.
Art. 15. A responsabilidade pelos atos praticados, ilícitos, ou crimes cometidos no curso da greve, será
apurada, conforme o caso, segundo a legislação trabalhista, civil ou penal.
Parágrafo único. Deverá o Ministério Público, de ofício, requisitar abertura do competente inquérito e
oferecer denúncia quando houver indício da prática de delito.
Art. 17. Fica vedada a paralisação das atividades, por iniciativa do empregador, com o objetivo de frustrar
negociação ou dificultar o atendimento de reivindicações dos respectivos empregados (locaute).
Parágrafo único. A prática referida no caput assegura aos trabalhadores o direito à percepção dos salários
durante o período de paralisação.

Instado em sede de Reclamação Constitucional, o STF


esclareceu que o direito de greve para o servidor público não é
absoluto, devendo ser negado a algumas categorias em razão do
interesse público. Reiterou que a Justiça do Trabalho não tem
competência para julgar dissídio de greve envolvendo servidores
públicos, em razão da autoridade da decisão proferida na ADI
3.395:
EMENTA: RECLAMAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. POLICIAIS CIVIS. DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE.
SERVIÇOS OU ATIVIDADES PÚBLICAS ESSENCIAIS. COMPETÊNCIA PARA CONHECER E JULGAR O
DISSÍDIO. ARTIGO 114, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIREITO DE GREVE. ARTIGO 37,
INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. LEI N. 7.783/89. INAPLICABILIDADE AOS SERVIDORES
PÚBLICOS. DIREITO NÃO ABSOLUTO. RELATIVIZAÇÃO DO DIREITO DE GREVE EM RAZÃO DA
ÍNDOLE DE DETERMINADAS ATIVIDADES PÚBLICAS. AMPLITUDE DA DECISÃO PROFERIDA NO
JULGAMENTO DO MANDADO DE INJUNÇÃO N. 712. ART. 142, § 3º, INCISO IV, DA CONSTITUIÇÃO
DO BRASIL. INTERPRETAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO. AFRONTA AO DECIDIDO NA ADI 3.395.
INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA DIRIMIR CONFLITOS ENTRE SERVIDORES
PÚBLICOS E ENTES DA ADMINISTRAÇÃO ÀS QUAIS ESTÃO VINCULADOS. RECLAMAÇÃO
JULGADA PROCEDENTE. 1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o MI n. 712, afirmou entendimento no
sentido de que a Lei n. 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve dos trabalhadores em
geral, é ato normativo de início inaplicável aos servidores públicos civis, mas ao Poder Judiciário dar
concreção ao artigo 37, inciso VII, da Constituição do Brasil, suprindo omissões do Poder Legislativo. 2.
Servidores públicos que exercem atividades relacionadas à manutenção da ordem pública e à segurança
pública, à administração da Justiça --- aí os integrados nas chamadas carreiras de Estado, que exercem
atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária --- e à saúde pública. A conservação do bem
comum exige que certas categorias de servidores públicos sejam privadas do exercício do direito de greve.
Defesa dessa conservação e efetiva proteção de outros direitos igualmente salvaguardados pela
Constituição do Brasil. 3. Doutrina do duplo efeito, segundo Tomás de Aquino, na Suma Teológica (II Seção
da II Parte, Questão 64, Artigo 7). Não há dúvida quanto a serem, os servidores públicos, titulares do direito
de greve. Porém, tal e qual é lícito matar a outrem em vista do bem comum, não será ilícita a recusa do
direito de greve a tais e quais servidores públicos em benefício do bem comum. Não há mesmo dúvida
quanto a serem eles titulares do direito de greve. A Constituição é, contudo, uma totalidade. Não um
conjunto de enunciados que se possa ler palavra por palavra, em experiência de leitura bem comportada ou
esteticamente ordenada. Dela são extraídos, pelo intérprete, sentidos normativos, outras coisas que não
somente textos. A força normativa da Constituição é desprendida da totalidade, totalidade normativa, que a
Constituição é. Os servidores públicos são, seguramente, titulares do direito de greve. Essa é a regra.
Ocorre, contudo, que entre os serviços públicos há alguns que a coesão social impõe sejam prestados
plenamente, em sua totalidade. Atividades das quais dependam a manutenção da ordem pública e a
segurança pública, a administração da Justiça --- onde as carreiras de Estado, cujos membros exercem
atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária --- e a saúde pública não estão inseridos no elenco
dos servidores alcançados por esse direito. Serviços públicos desenvolvidos por grupos armados: as
atividades desenvolvidas pela polícia civil são análogas, para esse efeito, às dos militares, em relação aos
quais a Constituição expressamente proíbe a greve [art. 142, § 3º, IV]. 4. No julgamento da ADI 3.395, o
Supremo Tribunal Federal, dando interpretação conforme ao artigo 114, inciso I, da Constituição do Brasil,
na redação a ele conferida pela EC 45/04, afastou a competência da Justiça do Trabalho para dirimir os
conflitos decorrentes das relações travadas entre servidores públicos e entes da Administração à qual estão

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 38


vinculados. Pedido julgado procedente. (Rcl 6568-SP, Relator Ministro Eros Grau, julgamento em
21/05/2009, publicação Dje 181, 24/09/2009).

Locaute.

O locaute tem origem histórica recente. Trata-se de uma


resposta patronal ao movimento operário. A expressão é oriunda do
inglês lock-out, sem tradução precisa para o português. Lock-out
teria o sentido de fechar por fora, dando a ideia, no âmbito
trabalhista, de uma empresa que fecha as portas de seu
estabelecimento, impedindo que os empregados nele ingressem para
exercer sua atividade laborativa.

Alguns países, como é o caso de Espanha, Itália e


Alemanha, toleram o uso do lock-out, no entendimento de que
tratar-se-ia de reação patronal justa para o equilíbrio das forças
em um conflito coletivo. Esta opção legislativa, a nosso ver, é
inadequada, pois a greve já o mecanismo de equilíbrio das forças
coletivas, ao passo que o lock-out produziria o efeito de
maximizar o poder patronal no litígio, podendo, inclusive, com sua
autorização e uso, inviabilizar o exercício do direito de greve.

O locaute assemelha-se com a greve apenas no fato de que


ambos provocam a suspensão da prestação de serviços. No mais, os
institutos revelam substanciais diferenças.

Em primeiro lugar, vale dizer que a greve é um direito


fundamental, individual e coletivo dos trabalhadores, ao passo que
o locaute é expressamente proibido. Neste sentido, o art. 17 da
lei de greve indica que “fica vedada a paralisação das atividades, por iniciativa do
empregador, com o objetivo de frustrar negociação ou dificultar o atendimento de reivindicações dos
respectivos empregados (lockout)”.

Pelo conceito legal, revela-se que o locaute apresenta-se


como conduta anti-social e ilegítima, por seu intuito de frustrar
negociação ou dificultar as reivindicações dos empregados. A
greve, por sua vez, atua em sentido contrário, a viabilizar a
negociação e a melhoria das condições sociais e econômicas dos
trabalhadores. De tal diferenciação, podemos dizer que a greve é
instrumento de realização e avanço dos direitos sociais, ao passo
que o locaute é mecanismo de retrocesso social.

Pelo conceito legal, o locaute não tem por pressuposto o


fechamento do estabelecimento, pois pode ser parcial. Não
bastasse, também caracterizará o locaute a conduta patronal que
permite o acesso dos trabalhadores ao local de trabalho mas sem
fornecer os meios necessários para a atividade produtiva. No
entanto, pensamos que a ação patronal em impedir a prestação de
serviços de alguns empregados como mecanismo de discriminação à
participação dos mesmos no movimento sindical ou na greve não
configura locaute, mas, sim, conduta anti-sindical e

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 39


discriminação, com reflexos nos planos individual e coletivo.
Nesta linha, colhemos a lição de Márcio Mendes Granconato24:
“o lock-out poderá atingir todos ou apenas alguns trabalhadores. O empregador poderá impedir que todos
os empregados adentrem ou então apenas parte deles,isso não importa, pois em qualquer dos dois casos
sua conduta será enquadrada como lock-out.
Deve ficar claro, todavia, que o lock-out não se configura caso um ou dois trabalhadores, por exemplo,
venham a ser impedidos de trabalhar por motivos alheios às normais atividades da empresa. É que o lock-
out tem como uma de suas qualidades atingir uma pluralidade destinatários e nesse sentido deve ser
interpretado o artigo em questão ao usar palavras plurais como “empregados” e “trabalhadores”. Para ser
caracterizado, o lock-out requer uma decisão patronal unilateral que atinja uma coletividade de
trabalhadores expressiva, ainda que não total, e que isso ainda seja capaz de influir no resultado da
produção”.

Por outro lado, ao contrário da greve, a apresentar-se


como instrumento de reação coletiva, o locaute poderá expressar
manifestação individual de um único empregador. Assim, a vontade
patronal isoladamente seria a única força responsável pela
paralisação dos serviços. A unilateralidade do locaute merece
reflexão, pois acaba por atentar contra a liberdade de trabalho e
o direito à efetiva ocupação no emprego. A greve, além de ser
coletiva, não provoca a suspensão da prestação de serviços
daqueles que, individualmente, optem por não aderir ao movimento,
ao passo em que o locaute força a inação dos trabalhadores
atingidos, independentemente de sua vontade.

Terá por pressupostos: a paralisação da atividade, de


maneira transitória e com a intenção de pressionar os
trabalhadores a aceitarem as condições oferecidas pelo empregador
para solução dos conflitos coletivos. O elemento intencional de
frustrar ou prejudicar as pretensões dos trabalhadores durante o
conflito coletivo é imprescindível, daí porque a paralisação da
produção por motivos vinculados à própria organização produtiva
não seriam hábeis a caracterizar o locaute. Por outro lado, a
dispensa coletiva de trabalhadores, pela definitividade da solução
dada aos contratos, ainda que discutível legalidade quando
apresentar-se como um meio de protesto patronal, não caracterizará
o locaute.

O lock-out revela-se instrumento de pressão


economicamente abusivo, haja vista que o empregador aposta que a
falta de pagamento de salários, em decorrência da paralisação das
atividades do estabelecimento, fará os trabalhadores sucumbirem à
vontade patronal no conflito coletivo.

O locaute é uma medida desproporcional, tendo em vista


que o empregador já dispõe do poder diretivo, com o comando do
próprio empreendimento. Deste modo, naturalmente exerce pressão
sobre os empregados, em especial em sistema jurídico como o nosso,
no qual a estabilidade no emprego não é reconhecida. Seria, nesta

24
Lock-out. Artigo integrante da obra DIREITO COLETIVO DO TRABALHO. Curso de Revisão e Atualização.
Organização de Candy Florencio Thome e Rodrigo Garcia Schwarz. Editora Campus Elsevier. São Paulo. 2010, p.
296.

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 40


perspectiva, desmedido legitimar que o empregador, além de suas
próprias forças, pudesse ainda recorrer ao instrumento do locaute.

Conforme a intenção buscada, o locaute pode ser próprio,


se vinculado a um conflito trabalhista de expressão coletiva, ou
impróprio, caso seja um protesto de índole econômica, política ou
ideológica, mas sem ligação com o embate trabalhista. Para Márcio
Mendes Granconato25, “o lock-out impróprio também poderá ser um ato de protesto contra o
Estado como forma de buscar o apoio governamental contra um movimento grevista ocorrido ou em vias de
ocorrer. Nesse caso, porém, tudo indica que se estará diante de um lock-out de natureza mista, porque seus
efeitos alcançarão pressões inter e extraempresarial”. Não concordamos com tal critério
misto, haja vista que neste caso a conduta relevante seria a
motivação de frustração à movimentação operária.

Sendo próprio, o locaute poderá ser defensivo ou


ofensivo. Na primeira modalidade, revela ato de vingança patronal
diante da deflagração de movimento paredista por parte dos
trabalhadores ou mesmo pela declaração de estado de greve pelos
mesmos. Na segunda modalidade, o empregador usa a paralisação como
meio de pressão para fazer com que os trabalhadores aceitem um
determinado pleito patronal até então resistido, como, por
exemplo, de flexibilizar determinadas condições de trabalho ou
mesmo ajustar redução salarial por meio de norma coletiva.

Não visualizamos, porém, como locaute, a atitude patronal


em impedir acesso de grevistas que buscam a ocupação do
estabelecimento. Do mesmo modo, diante do risco iminente de
violência, ou mesmo quando a greve paralisou setores
imprescindíveis para a garantia da segurança e da salubridade do
local de trabalho, o empregador, poderá, em prol da integridade de
seus empregados, fechar o estabelecimento como meio de defesa
legítima.

Neste sentido o TST já decidiu:


RECURSO ORDINÁRIO. DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. ILEGITIMIDADE ATIVA. DECLARAÇÃO DE
ABUSIVIDADE DA PARALISAÇÃO. -LOCKOUT-.
Depreende-se dos autos que a paralisação das atividades foi de iniciativa dos empregados. Por outro lado,
restou evidenciado o acirramento do conflito coletivo e, assim, eventual fechamento dos portões da
empresa justificou-se ante a ameaça de depredação do patrimônio, não se caracterizando o alegado -
lockout-. Quanto à greve, conquanto se reconheça a legitimidade do sindicato profissional para instaurar a
instância coletiva, não houve comprovação de observância dos requisitos formais previstos nos arts. 3º e 4º
da Lei nº 7.783/89, especialmente no tocante à realização da assembléia em que os trabalhadores
deliberaram a paralisação. Nesse contexto, resultou formalmente abusiva a greve, não se justificando o
pagamento dos dias parados.
Recurso ordinário conhecido e não provido.
Processo: RO - 2000400-52.2010.5.02.0000 Data de Julgamento: 11/04/2011, Relator Ministro: Walmir
Oliveira da Costa, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT 17/06/2011.

Pelo parágrafo único do art. 17, da lei de greve, a


prática do locaute assegura aos trabalhadores o direito à
percepção dos salários durante o período de paralisação. Aqui
temos mais uma distinção com relação à greve, haja vista que o
25
Artigo citado, p. 303.

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 41


locaute não terá efeito de conduzir o contrato para situação de
suspensão, mantendo-se plenamente seus efeitos.

Não bastasse, a prática de locaute constitui falta


patronal e descumprimento do contrato, daí porque poderá ensejar a
rescisão indireta do pacto, com fundamento no art. 483, d, da CLT.
Não bastasse, conforme a forma em que expressa-se o locaute, o
procedimento poderá causar ofensa a direitos de personalidade dos
trabalhadores, além de ofender valores sociais como a segurança
jurídica e o próprio direito ao trabalho, podendo originar
pretensão judicial de reparação por danos morais, individuais e
coletivos.

Cabe o registro, por fim, que o locaute é tipificado como


crime contra a organização do trabalho, com previsão de pena de
detenção por até um ano, além de multa, enquadrando-se como
atentado contra a liberdade de trabalho, conforme estabelecido no
art. 197 do Código Penal.

Ações judiciais sobre o exercício do direito de greve.

Os conflitos surgidos pelo exercício do direito de greve,


a partir da EC 45 (CF, art. 114, II), passam a ser dirimidos na
Justiça do Trabalho. Vale lembrar que, antes da alteração do art.
114 da Carta Magna, o entendimento era no sentido de que os
Tribunais Trabalhistas limitavam-se ao julgamento dos dissídios
coletivos provocados pela paralisação de uma determinada
categoria. Agora, porém, a competência trabalhista foi ampliada,
alcançando qualquer litígio decorrente do exercício do direito de
greve, conforme, aliás, reconheceu o STF, com relação aos
interditos proibitórios:
EMENTA: CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA JURISDICIONAL. JUSTIÇA DO TRABALHO X JUSTIÇA
COMUM. AÇÃO DE INTERDITO PROIBITÓRIO. MOVIMENTO GREVISTA. ACESSO DE FUNCIONÁRIOS
E CLIENTES À AGÊNCIA BANCÁRIA: "PIQUETE". ART. 114, INCISO II, DA CONSTITUIÇÃO DA
REPÚBLICA. JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
DO TRABALHO. 1. "A determinação da competência da Justiça do Trabalho não importa que dependa a
solução da lide de questões de direito civil" (Conflito de Jurisdição n. 6.959), bastando que a questão
submetida à apreciação judicial decorra da relação de emprego. 2. Ação de interdito proibitório cuja causa
de pedir decorre de movimento grevista, ainda que de forma preventiva. 3. O exercício do direito de greve
respeita a relação de emprego, pelo que a Emenda Constitucional n. 45/2003 incluiu, expressamente, na
competência da Justiça do Trabalho conhecer e julgar as ações dele decorrentes (art. 114, inciso II, da
Constituição da República). 4. Recurso extraordinário conhecido e provido para fixar a competência da
Justiça do Trabalho. (STF, RE 579.648-MG, Relatora Designada Ministra Carmen Lúcia, Dje-043,
06/03/2009, pp-01534).

Consolidando tal entendimento, o STF editou a súmula


vinculante 23, com o seguinte teor: “A Justiça do Trabalho é competente para
processar e julgar as ações possessórias ajuizadas em decorrência do exercício do direito de greve pelos
trabalhadores da iniciativa privada”.

Durante a greve, será comum o manejo das seguintes ações


judiciais:
→ dissídio coletivo de greve, a ser apresentado pelos sindicatos e

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 42


empresas envolvidas no conflito, conforme o caso, além do
Ministério Público do Trabalho.
Excepcionalmente, para as categorias inorganizadas em
sindicato, admite-se a legitimidade da federação ou da
confederação.
As centrais sindicais, associações civis ou profissionais
não terão legitimidade para o manejo de tais ações.
Observe-se que, após a CF/88, interpreta-se pela não
recepção do art. 856 da CLT, no que se refere à possibilidade de
apresentação do dissídio pelo Presidente do Tribunal.
Conforme o âmbito geográfico do conflito, o dissídio será
julgado pelo TRT ou pelo TST.
Esta ação presta-se a examinar a abusividade do movimento
paredista e para fixar as condições de trabalho a reger a empresa
ou a categoria, já que restou malograda a negociação entre os
sujeitos coletivos.
Em cumprimento ao disposto no art. 865 da CLT, o Tribunal
poderá fixar medidas de urgência a serem cumpridas, como forma de
garantia a ordem jurídica e os direitos fundamentais, em especial
quando violado o não atendimento a serviços essenciais à
população, ou mesmo em caso de flagrante conduta anti-sindical dos
empregadores.
Pela natureza do conflito em curso, não se pode exigir o
comum acordo, previsto no art. 114, § 2º, da Constituição, para
admissibilidade desta ação. Neste sentido o seguinte julgado do
TST:
DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. COMPETÊNCIA MATERIAL. Trata-se de dissídio coletivo de greve
ajuizado pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de
São Paulo, Mogi das Cruzes-SP, em que se discute a demissão em massa ocorrida na empresa BEKUM
DO BRASIL e o pedido de declaração de legalidade da greve feita em decorrência dessas dispensas. A
ação ajuizada, bem como a matéria em discussão, greve em face de dispensa em massa, têm natureza
tipicamente coletiva, cuja competência para julgamento é dos Tribunais Regionais do Trabalho, nos termos
do art. 114, II e IX, § 2º, da CF, c/c o art. 678, I, a, da CLT. Recurso ordinário a que se nega provimento.
FALTA DE COMUM ACORDO. A jurisprudência desta Corte é firme ao estabelecer que apenas nos
dissídios coletivos econômicos, instaurados sem greve, deve ser observado o pressuposto processual do
comum acordo, fixado pela Emenda Constitucional 45/2004, no § 2º do art. 114 da Constituição. Recurso
ordinário a que se nega provimento. (…)
Processo: RODC - 2004700-91.2009.5.02.0000 Data de Julgamento: 14/11/2011, Relatora Ministra:
Kátia Magalhães Arruda, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DEJT
16/12/2011.

→ para defesa da ordem jurídica e dos interesses da sociedade, o


Ministério Público do Trabalho atuará na greve como mediador ou
árbitro do conflito, ou mesmo apresentando o dissídio de greve.
Aqui, há que se esclarecer que a previsão constitucional
de legitimidade do MPT para o dissídio em greve envolvendo
atividades essenciais não exclui a sua legitimidade para o
dissídio em qualquer outra paralisação, desde que perturbada a
ordem pública ou colocada a integridade da população em risco,
atendendo ao disposto no art. 83 da LC 75, ou mesmo pelo art. 129
do texto constitucional, a fixar a missão institucional do MP como
defensor da sociedade e da ordem jurídica.
Além de tais medidas, o MPT poderá instaurar inquérito

Pós Graduação IDP – Professores José Gervásio Meireles e Fabiano Coelho 43


civil, ajustar Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta e
promover ação civil pública, com pedido liminar, em especial na
hipótese de não atendimento mínimo à população durante uma greve
em serviços essenciais.

→ interditos proibitórios e outras ações possessórias, destinadas


à restituição da posse de estabelecimento patronal, irregularmente
turbada pelos grevistas.
Há divergência, porém, sobre o cabimento do interdito
proibitório em matéria de greve, como se percebe da leitura de
Jorge Luís Souto Maior26 sobre o tema:
“No fundo, sob o manto de defenderem sua propriedade e seu direito de liberdade e até o direito de ir e vir
de seus clientes, o que os empregadores pretendem com a utilização do interdito proibitório, em verdade, é
evitar que a greve seja, efetivamente, exercida. Querem que a greve não lhes impeça a continuação da
atividade econômica.
O “interdito proibitório”, no entanto, é plenamente impróprio para a defesa dos interesses em questão, vez
que vinculado às ações possessórias, onde esbulhos ou turbações obstruam o direito de propriedade. Os
conflitos trabalhistas não se inserem no contexto de conflitos de terra, de invasões ou coisas do gênero. Os
trabalhadores possuem relações jurídicas com as empresas e a sua presença no ambiente de trabalho,
para execução dos serviços ou para reivindicar direitos, faz parte da própria existência da empresa. Não há
empresa sem trabalhadores.
Não se pode considerar, portanto, os trabalhadores como invasores. Sua manifestação em movimento
paredista é ato democrático, para fins de estabelecer o necessário diálogo entre o capital e o trabalho. Faz
parte do contexto da relação produtiva. Não se insere, pois, na esfera do esbulho ou turbação de
propriedade alheia”.

→ ações para defesa do direito de greve, em especial envolvendo


tutela inibitória, a impedir que o empregador promova ou persista
em práticas lesivas ao livre exercício do direito de greve.

→ ações reparatórias por danos materiais causados durante a greve,


mediante emprego de violência.
Aqui, vale lembrar que os prejuízos decorrentes da
paralisação da atividade patronal não poderão ser reparados, haja
vista que a ordem jurídico-constitucional estabelece que no
conflito capital-trabalho, tais danos são suportados em
decorrência do próprio risco da atividade econômica, ainda que a
greve seja considerada ilegal.
No entanto, o emprego de violência, com destruição do
patrimônio físico dos estabelecimentos, poderá ser objeto de
reparação, aplicando-se ao caso a regra do art. 186 do Código
Civil, pela qual “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar
direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito” e do art.
187/CC, pelo qual “também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons
costumes”.

26
Artigo citado, p. 257.

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