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CAMBRIA HEBERT
DISPONIBILIZAÇÃO: CIBELE FARAH
TRADUÇÃO: EIRENE THEMIS
Clique nos
nomes!! REVISÃO: GAIA CHORONOS
FORMATAÇÃO: NIX MAKARIS
Fevereiro/2017
CAMBRIA HEBERT
PERDIDO EM UM MUNDO DE BRANCO, EU ESTAVA
DEITADO. DOR E FRIO ERAM MEUS ÚNICOS
COMPANHEIROS. QUANTO TEMPO SERÁ
NECESSÁRIO ATÉ QUE EU MORRA? SERÁ QUE
MEU CORAÇÃO CONGELARÁ COM O FRIO ATÉ
PARAR DE BATER?
CAMBRIA HEBERT
Para Jenn,
Porque você disse que adorou.
CAMBRIA HEBERT
A
neve caia durante o que me pareceram dias. Flutuava silenciosa e constante
no céu, com uma ferocidade que deveria ser surpreendente por causa de seu
silêncio e beleza. Mas não era nenhuma surpresa para mim porque eu vivi aqui
toda a minha vida. Está não era a primeira tempestade de neve que eu tinha testemunhado.
Quanto tempo demora para alguém morrer congelado? Será que o frio lentamente
toma conta penetrando ao longo de cada membro até se arrastar em direção ao coração e
congelá-lo? Será que todo o sangue em minhas veias vai lentamente engrossar até que seja
incapaz de viajar por todo o meu corpo e era isso que pararia meu coração?
Outra rajada de vento uivava e a forte nevasca continuava me atingindo. Meu corpo
tinha perdido a capacidade reaquecer-se há muito tempo. Dias? Horas? Eu não sabia. O
tempo tinha sido reduzido até o frio cortante e ardente que dominava cada respiração
minha.
O som de neve trincando chegou aos meus ouvidos, mas eu pouco podia fazer,
apenas escutar. Eles provavelmente voltaram para se certificar de que eu
estava morto. Quando me encontrarem vivo não vou continuar assim por
muito tempo. Pelo menos com a morte viria a paz. Eu esperei.
A voz não era definitivamente a que eu estava esperando. Não era quem eu estava
esperando. Minha surpresa foi motivadora o suficiente para me fazer abrir meus olhos.
Minha visão estava turva, mas eu podia distinguir sua forma. Ela se agachou o mais perto
que ousou, estudando-me com uma expressão cautelosa. Seu cabelo era escuro como a
meia-noite e era um lugar para me concentrar entre todo o branco. Ele caia em ondas
grossas sobre seus ombros e ao redor do seu rosto. Ela tinha um chapéu vermelho na
cabeça.
Pisquei, tentando limpar minha visão, querendo vê-la com mais clareza.
―Quanto tempo você está aqui? ―Ela perguntou. ―Você está ferido. Coitadinho.
Ela se aproximou um pouco mais, mas não estendeu a mão. Estava assustada. Mas,
ela ainda estava aqui.
A próxima coisa que eu percebi, foi algo caindo na minha frente. Era um trenó
plástico vermelho com um longo cabo amarelo preso à frente. A mulher com cabelo
pretíssimo estava na minha frente, desta vez perto o suficiente para que eu pudesse dizer
que seus olhos eram cor de chocolate.
Ela estendeu a mão, hesitante, envolta em uma luva branca. A passou sobre mim, e
foi um leve choque de calor no meu mundo de frio. Quando eu não fiz nenhum movimento
para atacá-la, ela pareceu um pouco mais tranquila e senti a parte superior do meu corpo
sendo erguida do chão. Ela resmungou e lutou e eu pousei (não muito suavemente) no
trenó. Apenas metade de mim se encaixou e assim o resto de mim foi arrastado enquanto
ela andava. Um pouco mais tarde, o cheiro de lenha queimando chegou ao
meu nariz; um cheiro bem-vindo, algo que aliviava a tensão enrolada
dentro de mim.
Ela me arrastou através de uma sala e então parou, o trenó colocado em frente a
uma lareira enorme. Ela levou um momento para jogar alguns galhos sobre as chamas
morrendo, em seguida, virou-se para mim.
A dor de voltar à vida era quase pior do que a dor de morrer. Meus membros
pareciam que estavam sendo mantidos sobre um fogo intenso e a ardência da queimadura
apenas continuava aumentando. Cada músculo do meu corpo doía. Doía por causa do frio,
sofria com o calor e doía por estar de bruços na mesma posição por Deus sabe quanto
tempo. Minha barriga, vazia e irritada, exigiu comida, mas quando o macio e perfumado
brilhante pão com manteiga foi apresentado a mim, eu me levantei, grandes convulsões me
deixaram com mais dor do que antes.
Não sei por quanto tempo eu fui um prisioneiro da dor, mas aos poucos, se tornou
suportável. Comecei a acordar por mais do que momentos evasivos e minha mente
começou segurando as coisas que eu estava experimentando. A casa estava em silêncio
quando abri os olhos para focar nas chamas vermelhas-alaranjadas do fogo que crepitava
na minha frente. Tomei consciência do tapete grosso que estava embaixo de mim e, um
cobertor quente suave sobre meu corpo. Havia até mesmo um travesseiro cheio de penas
embaixo da minha cabeça, algo que eu achei engraçado.
Fiquei grato. Eu não conseguia me lembrar da última vez em que alguém tinha me
tratado com bondade. Enquanto eu observava as chamas devorarem a madeira, memórias
recentes encheram minha mente. Uma mulher, jovem e dolorosamente bela, se inclinou
sobre mim; suas mãos eram gentis, mas confiantes, enquanto passava um pano úmido
sobre a lateral do meu corpo. Ele saiu vermelho, e ela mergulhou em uma tigela grande de
água quente. Ela repetiu o processo uma e outra vez. Eu não lembro de nenhuma dor. Tudo
o que eu poderia focar eram os fios de seu cabelo cor de meia-noite e a sensação das
pontas roçando contra mim. Foi um contato tênue, fugaz, na melhor das hipóteses, mas eu
podia sentir isso tão claramente, como se ele enviasse sacudidas pelo meu
corpo.
Eu nunca te machucaria. Mas, ela não podia ouvir meus pensamentos e eu não
podia falar.
Eu saí dos meus pensamentos e levantei a cabeça para ver o meu lado, um curativo
limpo envolto esticado em volta do meu meio. Parece que seu desejo de me ajudar superou
seu medo.
Meu estômago roncou alto e tive outro flash de memória. Mais uma vez, a beleza
de cabelos escuros, desta vez dando colheradas de algum tipo de caldo na minha boca. Eu
podia sentir o calor dele atingindo minha barriga vazia e se espalhar. Eu senti como se eu
estivesse sendo aquecido de dentro para fora.
Eu ainda fiquei imóvel por um longo tempo. A casa estava silenciosa, a noite me
cercava, enquanto me lembrava de todos os momentos de bondade que eu podia. Era por
causa dela que eu estava vivo. Eu rezei para que me salvar não a fizesse morrer.
Os primeiros passos que dei foram lentos e rígidos, mas meu corpo se recuperou
rapidamente e se lembrou de como se mover. Segui o cheiro de canela e andei pela
escuridão, sem problemas. Encontrei a cozinha e senti uma piscina de saliva na minha boca
quando vi um pedaço de pão na ilha. Olhei para a grande despensa, mas minha fome estava
impaciente e eu mergulhei no pão. Um rosnado baixo se formou no fundo da minha
garganta com a primeira mordida. Foi tão bom. Eu não podia me lembrar da última vez em
que eu tinha comido algo sólido.
Ela estava lá com um taco de beisebol preso em suas mãos e ela não usava nada
além de uma camisa. Era branca com um grande rosto sorridente na frente. A camisa era
enorme e chegava em sua coxa... ela não estava usando nenhuma calça. Suas pernas eram
longas e pálidas.
Eu não conseguia parar de olhar. Eu estava com fome, mas CAMBRIA HEBERT
de repente, o pão não estava me satisfazendo.
Ela me olhou por um longo momento antes de suspirar e enfiar o bastão debaixo do
braço. ―Eu acho que se você fosse me machucar você teria feito isso na semana passada.
―Mas, se você fizer um movimento repentino, eu vou bater em você. ―Ela disse,
levantando o bastão novamente e agitando antes de colocá-lo de lado e ir para a geladeira
para puxar os recipientes empilhados para a mesa.
Eu a olhei em silêncio.
Ela olhou por cima de um montante do que parecia ser um sanduíche de presunto e
suspirou. ―Seu olhar sombrio está me deixando nervosa, assim como o seu silêncio.
―Quero dizer que você nem sequer emitiu um som mesmo quando eu retirei as
três balas do seu lado. Francamente, eu estou chocada que você está vivo.
Suas mãos eram graciosas e seu cabelo estava selvagem do sono. Eu fiz um som
grunhindo e isso a assustou. Ela saltou, a mão pressionando contra o peito.
Quando eu não fiz nenhum movimento, ela riu. ―Bem, o que eu esperava? Estou
resmungando sobre a sua falta de barulho e, em seguida, quando você faz um som, eu salto
como uma menina. ―Ela apontou para mim com a faca de manteiga, arremessando
maionese. ―Obviamente, eu sou uma menina.
Obviamente.
Ela pegou o sanduíche e atravessou a sala em minha direção, suas pernas longas,
mais uma vez chamando a minha atenção...
O sanduíche apareceu diante de mim. Quando eu não fiz nenhum movimento para
pegá-lo, ela revirou os olhos ―O quê? Eu realmente pensei que você fosse chegar e pegar?
Como um cão faz.
Essa é a razão pela qual ela não está com tanto medo quanto provavelmente
deveria estar.
―O que você acha de Harry? ―Pensou ela, voltando para o outro lado da sala para
empilhar as coisas na geladeira.
Eu balancei a cabeça.
―Não?
Rosnei.
Isso fez com que ela desse uma parada e eu vi seus olhos deslizarem para o taco de
beisebol na porta. Eu fui a ele, levando-o em minha boca e trazendo outro lado da sala,
parando diante dela.
―Okayyy. ―Disse ela. ―Vou voltar para a cama. ―Ela desligou a luz da cozinha e
eu a segui para a sala, onde ela jogou mais lenha na lareira.
―Vá deitar-se. ―Ela disse, tentando parecer forte enquanto ela apontava para os
cobertores que eu estava deitado.
Deitei-me.
Ela resmungou sobre cachorros estranhos todo o caminho de volta pelo corredor.
Passei pela janela, a cortina caindo no lugar, ocultando o mundo de branco. Era uma
visão que eu estava contente de me livrar. Quase morrer lá fora não era uma lembrança
que eu esqueceria tão cedo. Tentei mais uma vez me transformar, arrancar este casaco,
mas eu não poderia. Parece que mesmo que meu corpo tivesse descongelado, eu ainda
estava congelado. Por que eu não podia me transformar? Não era uma lei que os shifters1
poderiam mudar indefinidamente? Eu me lembro dos dias em que eu não tinha poder
sobre quando eu me transformava. Eu quase desejava ter aqueles dias de volta. Quase.
Andei pela sala, parando na frente de uma árvore de Natal decorada, uma árvore
muito pequena para tetos altos e paredes largas. Foi decorado de forma simples com
cordões de pipoca amarradas e bolas de vidro coloridas. As luzes eram multicoloridas e um
anjo empoleirado no topo. Quando olhei para a árvore, um zumbido suave surgiu em minha
mente. Era uma canção e a memória agitou algo em mim. Deve ter sido daqui, da semana
passada, porque eu não conseguia me lembrar da última vez em que eu comemorei o Natal
ou qualquer feriado.
Meus ouvidos estremeceram quando eu captei um som ―um som vindo de fora.
Mas não estava vindo de fora da porta da frente. Estava vindo do outro lado da casa. O lado
onde todos os quartos estavam. Havia uma porta lá atrás em algum lugar? De repente eu
desejei ter explorado os outros quartos na minha agitação. Ouvi o ruído suave novamente.
O som de uma janela ou porta que sendo aberta.
A adrenalina passou por mim e meu coração começou a acelerar. Ela estava lá atrás,
em um desses quartos. Ela provavelmente estava dormindo, sem saber que
sua casa estava sendo invadida. Ela estava desprotegida.
1
Shifters são seres que possuem forma humana e animal.
corredor, saindo de um dos quartos e parando para determinar qual caminho percorrer.
Eu fui direto para a sua garganta. Era a maneira mais rápida, mais fácil de desabilitá-
lo. Infelizmente, ele me segurou com os braços trêmulos. Rasguei minhas garras sobre ele,
rasgando o casaco de inverno que ele usava e rasgando sua camisa de flanela.
Ele deu um grito e nós rolamos, batendo na parede. O corredor era um lugar
estreito e dois shifters indo para lá fez o espaço parecer ainda menor. Ele me jogou para
trás e eu bati na parede. Uma foto caiu de seu gancho, e vidro quebrado em toda parte.
Corri para ele, levantando de pé sobre as patas traseiras, usando a minha altura como uma
alavanca e pousando nele. Ele caiu para trás e eu senti meus dentes afundarem facilmente
na carne.
Eu recuei, pronto para morder outra vez quando vi seu rosto começar a mudar. Sua
boca e nariz começaram a escurecer sob a pele e começou a empurrar para fora, alongando
seu rosto. Ele estendeu as mãos, que estavam em meio de mudança também, parecendo
viciado e aleijado. Mas, eu sabia melhor. Ele não estava aleijado. Em poucos segundos a
mudança assumiria e ele seria mais forte do que era agora.
O tiro de espingarda sacudiu as paredes. Senti o calor da bala que voava (mais perto
do que confortável) passando pelo meu corpo. A bala entrou no peito do
intruso. Eu vi quando ele caiu para trás, humano novamente.
Assim quando ela saiu da porta, chegando mais perto, o homem se levantou para
sentar-se. Eu soltei um rosnado e avancei sobre ele, rasgando sua garganta. Ele fez um som
borbulhante antes de cair de volta no chão.
Eu fiquei sobre seu corpo e olhei de volta para a mulher. Sua mão cobriu sua boca
em choque. Passaram-se longos e silenciosos segundos e ela deu um passo para o corredor
mais uma vez e eu rosnei. Insegura, ela parou e olhou para mim.
Agarrei o homem por sua bota e o arrastei pelo corredor e passei pela sala de estar,
parando na porta da frente. Eu me virei e procurei a mulher. Ela parecia entender o que eu
queria e se apressou para abrir a porta. Eu arrastei o corpo para fora na neve, um rastro de
vermelho seguindo, parecendo sinistro contra o branco puro da neve. Fazia frio e o sol
começava a subir.
Eu queria queimar o corpo. Uma maneira segura de me certificar de que ele não
voltaria, mas eu não era capaz de fazer isso no momento. Então, em vez disso, eu o arrastei
para o bosque.
Eu segui o rastro de vermelho de volta para a casa, percebendo que era inútil tentar
esconder o sangue. As pessoas que me queriam morto já sabiam onde eu estava. Este
sangue não ia dizer-lhes nada que eles já não sabiam. Exceto uma confirmação de que eu
estava realmente vivo.
Quando a casa, uma cabana com uma grande chaminé de pedra e grandes janelas
de vidro, entrou em cena, eu percebi que eu não pertencia aqui. Esta não era minha casa e
depois do que ela tinha visto, ela provavelmente não me deixaria voltar para dentro.
Sentei-me na neve e olhei para a casa. Eu deveria ir embora. Mas, isso a deixaria
aqui sozinha, desprotegida. Quando o Beta não voltasse, eles virão novamente, mas na
próxima vez eles trariam mais. Eles a torturariam para descobrir o que ela sabia, sem
acreditar que ela não sabia de nada.
Eu não posso acreditar que ela ainda pensava seriamente que eu era um cachorro.
Eu não era Alpha, mas eu era certamente maior do que um cão.
―Venha. ―Ela chamou novamente, abrindo mais a porta desta vez, me chamando para
dentro.
Olhei mais uma vez na direção das árvores. Então eu virei de costas para ela e corri
para a casa.
Ela ficou quieta durante toda a manhã, enquanto limpava o sangue e vidro no
corredor. Ela não disse nada quando entrou no quarto e viu a janela erguida. Sua cor
parecia melhor quando ela saiu do banheiro cheio de vapor, vestindo nada além de um
roupão branco. Ela secou com a toalha as pontas de seu cabelo enquanto entrava em seu
quarto, mas parou quando viu que eu estava deitado ao pé de sua cama.
Eu sabia melhor do que pensar que era minha casa, mas isso não me impediu de
ficar confortável.
Ela suspirou. ―Se não fosse por você, eu provavelmente estaria morta agora
mesmo. ―Ela se moveu em direção a uma cômoda grande de madeira e pegou uma escova
para começar a passar através de seus cabelos úmidos. ―Ele provavelmente não percebeu
que alguém estava aqui e pensou que ele seria capaz de entrar e tomar o que queria. Eu
vou ter que ligar para a polícia assim que as linhas telefônicas começarem a funcionar
novamente.
―O que você fez com esse corpo, a propósito? ― Ela perguntou, se virando para
olhar para mim.
Eu assisti em silêncio enquanto ela deslizava o jeans sobre suas curvas e abotoava o
botão, em seguida, ela enfiou a mão na gaveta novamente e tirou uma camisa branca de
mangas compridas para vestir. Antes de fazer isso, ela se virou para mim e eu peguei um
vislumbre de sua barriga plana antes de ela alisar o top para baixo.
―Você tem um olhar inquietante. ―Ela murmurou, virando-se para pegar seu roupão
e toalha. Uma vez que os guardou, ela foi para a porta. ―Vamos lá, eu estou fazendo café da
manhã. Desde que você é um bom cão de guarda, vamos arranjar algo especial.
Eu a assisti na cozinha. Ela se movia com facilidade e conforto. Observei suas mãos
quando ela quebrou os ovos e ela sorriu quando os biscoitos de canela ficaram macios. Ela
riu quando derramou seu café e xingou quando o bacon queimou.
Quando a cozinha estava limpa e nossas barrigas estavam cheias, ela levou uma
caneca de chá fumegante à sala de estar e se sentou em uma cadeira junto ao fogo.
Estiquei-me no sofá, esperando que ela me derrubasse, mas ela nunca o fez.
―O sinal da TV está fora. ―Ela disse. ―Acho que vou ter que procurar um livro.
―Não se mova. ―Ela disse, balançando o atiçador. Ela olhou ao redor da sala, sem
dúvida, à procura do seu “cachorro”.
―Eu posso explicar. ―Eu disse, minha voz soando como cascalho. Quando foi a
última vez que eu a tinha usado?
Eu não queria me levantar porque estava nu. Isso só pioraria as coisas. ―Você pode
me entregar esse cobertor? ―Eu perguntei calmamente, levantando as mãos para mostrar
a ela que eu não queria lhe fazer mal.
―Eu sei que isso vai parecer loucura, mas aquele cachorro que você encontrou?
Não era um cachorro.
―Você está louco? Quantos de vocês estão lá fora? Eu matei o seu amigo e eu vou
fazer o mesmo com você.
―Na verdade, eu o matei. ―Bem, eu não tinha certeza se ele estava morto.
Ela deu um passo para trás, segurando o atiçador na frente dela. ―Saia.
―Aquele homem desta manhã, ele entrou pela janela do quarto e você atirou nele
com uma espingarda. Seu ―hum ―cachorro rasgou a garganta dele até...
―Isso é o que eu estou tentando dizer. Aquilo não era um cachorro. Era eu.
―Você não se mova. ―Ela disse e saiu correndo da sala. A ouvi correr de janela em
janela, para verificar se eu estava certo. Ela até mesmo chamou o cachorro várias vezes.
Fiquei ali, imóvel, até que ela voltou. Ela estava pálida e claramente abalada, ela não queria
acreditar em mim, mas que outra explicação poderia haver? Eu me concentrei na
espingarda que estava agora em suas mãos.
―Eu vou, eu não vou voltar. ―Eu disse, erguendo minhas mãos.
Comecei avançando para mais perto, sem tirar os olhos da arma. Quando eu estava
na porta, com a mão na maçaneta, me virei ―Obrigado por me ajudar. E, a propósito, você
faz um inferno de um biscoito de canela.
Abri a porta da frente e o frio atingiu minha pele quase nua. Eu não congelaria, mas
não ia ser confortável.
―Espere.
―Feche a porta.
Eu fechei a porta e esperei para ver o que ela faria. Para minha surpresa, ela abaixou
a arma, mas a manteve nas mãos. ―Vou lhe dar cinco minutos para explicar.
Abri a boca para começar, mas ela levantou a mão. ―Primeiro, deixe-me pegar
alguma calça.
Tentei não ficar incomodado pelo fato de que ela tinha roupas de homem aqui.
Tentei dizer a mim mesmo que ela tinha direito a uma vida e que mal nos conhecíamos.
―Uh-huh. ―Ela disse com ceticismo. ―E o homem que entrou aqui nesta manhã,
ele estava atrás de você?
―Eu tive minhas razões. ―Eu respondi. Pela maneira como seus olhos se
estreitaram percebi que a resposta não era boa o suficiente. ―Eu não gostei do seu estilo
de vida. Eu estava cansado de ser dito o que fazer pelo Alpha. ―Um Alpha que gostava de
dominar demais.
―Como é que você veio parar aqui? ―Perguntou ela, uma mecha de cabelo escuro
caindo sobre um olho.
Ela pareceu ser pega de surpresa pela minha pergunta. Foi a primeira que eu tinha
feito.
―Grace. ―Eu disse testando o nome. Gostei da forma como pareceu na minha
língua. ―Você salvou minha vida, Grace.
―Eu acho que uma pessoa deve ter permissão para viver sua
própria vida. ―Ela argumentou.
―Você fala como alguém que passou algum tempo sendo CAMBRIA HEBERT
mandada.
―Eu vim aqui para um pouco de tempo sozinha, para pensar sobre algumas coisas.
Eu nunca quis ficar aqui por tanto tempo. Era para eu passar o Natal com meus pais. Mas, a
tempestade de neve teve outras ideias.
Ela assentiu com a cabeça. ―É Natal, só porque estou sozinha não significa que não
posso comemorar.
―Claro. Para mim, não é sobre a comida ou os presentes ou até mesmo a árvore. É
sobre um sentimento. Paz, espírito e renovação. Trata-se de lembrar o bem em sua vida e
decidir que o mal não pode assombrá-lo a menos que você deixe.
Eu nunca tinha pensado sobre o Natal assim antes. Para mim, sempre parecia não
haver nenhum ponto se você não tinha alguém com quem gastá-lo.
―Claro, eu adoraria estar com minha família, e eu estarei. Assim que a estrada for
transitável.
―Além disso, eu não estou mais sozinha. Nós podemos ter o Natal juntos.
Depois disso, ela pulou da cadeira e começou a cozinhar. Ela insistiu que eu a
ajudasse, então nós ficamos na cozinha quente e fizemos biscoitos e torta de maçã até o sol
se pôr atrás das árvores. Ela tinha um rádio e um saco cheio de baterias, e ela colocou um
CD cheio de músicas natalinas e outras. Foi o único CD que ela tinha então o ouvimos mais
e mais. Mas nunca ficou velho.
Quando eu fui dormir naquela noite no sofá, fiquei surpreso ao perceber que eu
estava realmente cantarolando uma das canções.
―Feliz Natal! ― Ela disse com alegria e encheu minha caneca com café.
Ela colocou a jarra de café para baixo e olhou para cima. Seus olhos eram da cor rica
de chocolate derretido. ―Seus olhos, como um... lobo, tinham algo humano sobre eles.
Mesmo que houvesse sombras atrás de seu olhar, havia clareza, também. Além disso, é a
época de dar e amar. Por que não devo aceitá-lo?
Eu não sabia o que dizer. Ela fez tudo parecer tão simples.
Alguns momentos tranquilos passaram quando nós dois sentamos na mesa com
nossos pratos. ―Eles vão vir atrás de você, não vão? ―Ela perguntou em voz baixa.
―Sim. Você precisa sair daqui o mais rápido possível e não voltar.
Eu não disse nada. Quanto menos ela soubesse, melhor. Em vez disso, tomei um
gole de café. Gostaria de voltar no tempo. Tempo suficiente para garantir que ela tivesse
ficado longe. Então, talvez eu pudesse partir novamente. Só que da próxima vez, eu iria na
direção oposta.
―Você não pode. ―Ela disse, seu garfo bateu contra o prato.
Olhei para cima e segurei seu olhar. Ela sabia que não podia me deter. Ela sabia que
depois de hoje teríamos que nos separar. ―Nós sempre teremos o Natal. ―Eu disse.
Nós não falamos mais sobre o que aconteceria amanhã. Em vez disso, nós rimos e
brincamos. Colocamos o CD de Natal e cozinhamos uma festa com o que foi deixado na
cozinha. Nós jogamos cartas junto ao fogo e comemos torta perto da árvore.
Foi o melhor dia que tive em anos. Foi a primeira vez que eu senti que pertencia a
qualquer lugar desde que eu comecei a me transformar.
Quando chegou à noite, o telefone fixo tocou. O cabo e linhas telefônicas tinham
sido restaurados. Era o pai de Grace. Ele estava ligando para dizer a ela que as
estradas principais estavam limpas e para ver se ela achava que poderia voltar.
Quando ela adormeceu e sua cabeça deslizou sobre o meu peito, eu não a acordei.
Na manhã seguinte estava um frio amargo e o vento uivava por entre as árvores. Eu
já estava acordado, apreciando a sensação do meu braço em torno dela e o cheiro do seu
cabelo, quando ela abriu os olhos.
No início, ela parecia confortável, se esticando contra mim, mas então a consciência
se instalou e ela parou. Ela inclinou a cabeça para cima e olhou para mim através de olhos
sonolentos.
Eu a beijei.
Foi um beijo suave, um beijo gentil. Um Olá e um Adeus tudo embrulhado em um.
Em seguida, nos levantamos e nos preparamos para seguir nossos caminhos separados.
Quando o sol estava alto no céu, ela trouxe uma única mochila grande e a deixou na
porta. Ela olhou para onde a árvore costumava estar. Eu a tinha ajudado a tirar as
decorações e depois levá-la para fora.
Ela pegou as chaves; Eu as peguei e saí para dar partida no seu carro e ligar o
aquecimento.
Quando eu saí e comecei a voltar para a casa, a ouvi gritar. Eu corri, entrando pela
porta da frente e parando quando vi dois dos meus velhos companheiros de matilha
encurralando Grace.
Eu os ataquei, mudando de volta para o lobo e estalando os dentes contra sua carne.
Eles se mudaram, também, e uma briga se seguiu. Foi dois contra um, mas eu me segurei.
Eu queria procurar Grace, para dizer a ela para ir embora enquanto ela tinha a
chance, mas eu não poderia encontrá-la.
Enquanto ele queimava, olhei para a floresta para ver que eu estava sendo
observado pelo outro lobo. Ele andava de um lado para o outro, sem dúvida se
perguntando se ele poderia me enfrentar. Nesse momento, Grace saiu da casa, com a
espingarda ainda na mão.
―Você deve ir. ―Eu disse a ela. ―O outro ainda está aqui e ele não vai desistir. Ir
para casa sem mim seria ruim para ele.
Eu sabia que era loucura. Eu sabia que parecia impossível. Mas, eu tinha me
apaixonado por Grace. Eu tinha me apaixonado por uma mulher que tentou me matar.
Ela deu vários passos para trás, colocando alguma distância entre
nós. ―Você está louco.
―Não.
―Eu, pelo menos, escutei a sua explicação depois que você se transformou de
cachorro em homem na minha sala!
―Lobo. ―Rosnei.
Ela certamente não estava agindo muito chateada com o fato de que ela tentou me
matar. Agora eu estava melhor e ela estava em um quarto sozinho comigo. Ela não pensou
que eu retaliaria? ―Bem. Explique.
―Eu tive que atirar em você. Você mesmo disse que outro lobo não iria para casa
sem você. Bem, eu fiz isso para ele também.
Pisquei.
―Ele acha que você está morto agora. Eu atirei em você e então o arrastei pelo outro
lado do fogo. O lado que ele não podia ver. Então eu fui para a casa de lenhas e arrastei para
fora esse homem que você matou, e joguei no fogo ―bem rolou realmente, mas aquele é ao
lado do ponto. Fiquei ali por um longo tempo e fingi assistir você queimar. Aquele outro lobo
assistiu também. Então eu arrastei seu corpo para o bosque, tudo atrás da cobertura das
chamas e, em seguida, sai carregando uma carga de madeira para jogar no fogo.
―Funcionou. Tentei atirar em você em algum lugar que podia não doer muito.
Ela fez uma careta. ―Eu tive que deixar você no sótão até que tive certeza de que
outro lobo saiu. Espero que não tenha ficado muito frio.
―Eu apenas pensei que esta era a única maneira que você teria
uma chance de fugir. Para ter uma vida que você realmente queria.
CAMBRIA HEBERT
―Você atirou em mim para me dar de volta a minha
vida? ― Eu disse.
―Sim.
―Você não viu ninguém mais à espreita na propriedade? Ninguém tentou entrar?
―Você arriscou uma chance por mim. Um tiro longo. Por que você faria isso?
―Bem, isso depende ainda. ―Eu disse, trazendo seu corpo mais perto do meu,
acariciando meus dedos contra ela.
―De você.
―Bem, como posso passar o resto dos meus Natais com um homem cujo nome eu
não sei?
Eu sorri. ―Tristan.
Eu queria estar feliz, mas eu tinha uma coisa a perguntar. ―Você sabe que há
trezentos e sessenta e quatro dias fora do ano que não são de Natal...
―Eu tenho um sentimento de que com você, todos os dias vão ser como o Natal.
Ela riu.
E eu a beijei. <3
FIM
CAMBRIA HEBERT
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CAMBRIA HEBERT