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LINHA DE PESQUISA: CULTURA E IDENTIDADES

MAPEANDO IDENTIDADES URBANAS: A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA FAVELA


NO IMAGINÁRIO DOS MORADORES DO PEDREGAL

Autora: Ingrid Oliveira da Cruz Moura

RESUMO

O presente projeto de Mestrado busca compreender as dinâmicas sociais e espaciais


no bairro Pedregal, em Campina Grande-PB, por meio de um arcabouço teórico que
integra conceitos de Lefebvre(2000) e Goffman(1963). Sob a perspectiva lefebvriana,
analisaremos as favelas como espaços dinâmicos moldados pelas relações sociais,
observando a cotidianidade desses sujeitos. Adicionalmente, a abordagem de
Goffman(1985) sobre as "fachadas" utilizadas por esses moradores, observando as
performances empregadas por eles, explorará como os moradores gerenciam suas
identidades diante das pressões sociais que permeiam o cenário característico de
favela. Esta pesquisa visa, como objetivo geral, investigar a construção social das
identidades urbanas no Pedregal, explorando as percepções dos moradores sobre o
espaço que habitam, fazendo-os considerar aquela localidade como não favela.

Palavras-chave: Favela. Dinâmicas Sociais. Identidade do Sujeito da Favela.

INTRODUÇÃO

O espaço urbano é um palco complexo onde se desenrolam as interações


sociais, moldando e sendo moldado pelas percepções e construções sociais dos seus
habitantes. A cidade não é apenas um conjunto de edificações e ruas, mas sim um
ambiente dinâmico de desenvolvimento de narrativas que refletem a vida cotidiana e
as identidades daqueles que a habitam. Neste contexto, o presente projeto de
mestrado busca compreender as complexas tramas da construção social do bairro
Pedregal (localizado na cidade de Campina Grande – PB) no imaginário dos seus
moradores. A origem da pesquisa se encontra no contexto de uma investigação de
campo resultante do PIBIC cota 2020-2021, em que foi observado o impacto da Covid-
19 relacionado à moradia no bairro Pedregal, onde notou-se o receio manifestado por
diversos moradores de localidades com marcantes características de favelas, em
serem rotulados como "favelados".
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Goffman (1985), em sua obra "A Apresentação do Eu na Vida Cotidiana",


oferece um ponto de partida essencial para a compreensão das interações sociais e
da performance identitária nas cidades. A metáfora do "teatro" social de Goffman
sugere que os indivíduos desempenham papéis específicos, muitas vezes
influenciados pelas expectativas da sociedade em que estão inseridos. Assim, o
bairro Pedregal, estigmatizado e marginalizado, emerge como um cenário onde os
moradores são desafiados a moldar suas identidades em meio a um contexto social
complexo, negligenciados pelo Estado e suas representações, a exemplo da polícia,
com direitos básicos usurpados, como o direito à moradia digna, possibilidade de
mobilidade urbana, além da fonte de renda geralmente vir de trabalhos de menos
prestígio na sociedade.
Através da concepção de “cotidiano radical” (Heller, 1983), pode-se
argumentar que a vida diária não é apenas uma sucessão de eventos, mas um campo
de batalha simbólico onde as identidades são forjadas. Ao tentar explorar as
experiências cotidianas dos moradores do Pedregal, podemos desvendar as nuances
do cotidiano radical e compreender como a construção social do bairro se entrelaça
com as identidades de favelados ou não.
Lefebvre (2000), ao introduzir a ideia de "produção do espaço", oferece uma
lente teórica para analisar como as relações sociais se manifestam no ambiente
construído. No contexto específico do Pedregal, o bairro não é apenas um espaço
físico, mas um espaço socialmente produzido, onde as relações de poder, estigma e
resistência se entrelaçam. Mapear essa produção social do espaço é fundamental
para compreender como o bairro se insere na complexa tapeçaria das identidades
urbanas.
Portanto, este projeto propõe uma incursão no universo simbólico e social que
cerca o bairro Pedregal suas representações para os moradores. Essa incursão
implica em adentrar não apenas os aspectos físicos do local, assim como, em
compreender os significados simbólicos atribuídos pelos residentes, suas práticas
culturais, relações sociais e identidades coletiva, para entender não apenas os
elementos tangíveis de um bairro, como moradia e infraestrutura, mas sobretudo, as
histórias, tradições e símbolos que dão forma à vida comunitária, caracterizando-o
como favela para além do aspecto físico.
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Ao integrar os conceitos de Goffman (1963) e Lefebvre (2000), busca-se não


apenas entender as percepções locais do bairro, como, principalmente desvelar as
dinâmicas que moldam as identidades urbanas nesse contexto específico. O ato de
mapear as identidades urbanas no bairro Pedregal enriquece o debate acadêmico e,
lança luz sobre as experiências e perspectivas muitas vezes negligenciadas na
complexa tessitura urbana que reflete interdependência e a diversidade de elementos
que caracterizam a vida nesse ambiente.

PROBLEMÁTICA DE INVESTIGAÇÃO

Diante do cenário que envolve a identificação variada dos moradores do bairro


Pedregal como "favelados", torna-se imperativo compreender os significados e
representações atribuídos a esses territórios populares, em especial no contexto
urbano de Campina Grande-PB.
O bairro Pedregal destaca-se por peculiaridades no contexto urbano,
apresentando características similares a áreas estigmatizadas como favelas, como
construções informais, infraestrutura inadequada, densidade populacional elevada e
problemas com saneamento. No entanto, ao interagir com moradores em pesquisas
anteriores, percebe-se que muitos não se reconhecem como habitantes de favela.
Essa dificuldade em aceitar tal classificação é atribuída ao imaginário desses
residentes, associando a ideia de favela a morros densamente povoados ou casas
precárias feitas de materiais recicláveis. A problemática que motiva esta pesquisa
reside na necessidade de abordar a complexa construção da identidade de morador
de favela no imaginário dos sujeitos inseridos no Pedregal, considerando a resistência
local à classificação estigmatizante frequentemente atribuída.
A percepção ambígua do Pedregal, entre o reconhecimento de suas
características e a recusa de ser chamado de favela, levanta a seguinte questão
problematizadora: Como as identidades urbanas são moldadas e vivenciadas pelos
moradores do Bairro Pedregal? O desafio de compreender as dinâmicas sociais,
simbólicas e culturais que permeiam os moradores do Pedregal, bem como a relação
dessas dinâmicas com a construção de identidade dentro do espaço urbano, constitui
a essência da problemática desta pesquisa.
Dessa forma, a investigação busca responder à questão sobre como o
Pedregal é percebido e, mais profundamente, explora as nuances das identidades
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dos favelados nesse cenário específico. Ao fazê-lo, almeja-se ampliar o conhecimento


acadêmico sobre a complexidade das áreas urbanas, além de contribuir para a
promoção de uma compreensão mais holística e empática das experiências dos
moradores do Pedregal, favorecendo abordagens sociais e políticas mais informadas
e sensíveis à diversidade das realidades urbanas.

OBJETIVOS

OBJETIVO GERAL: Compreender como as identidades urbanas são representadas


pelos moradores do Bairro Pedregal explorando as percepções destes sobre o
espaço que habitam.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
● Analisar a percepção dos moradores em relação ao significado atribuído à
expressão "favela", buscando compreender como essa definição influencia a
construção de identidades no bairro Pedregal, em Campina Grande-PB.
● Observar e explorar a construção da identidade de favela dos moradores do
Pedregal.
● Investigar a relação entre as experiências cotidianas dos moradores do
Pedregal e a construção de fachadas dentro e fora desse espaço.

REFERENCIAL TEÓRICO

O entendimento das origens das favelas no Brasil remonta a um contexto


marcado por transformações socioeconômicas, urbanísticas e políticas. Alfredo
Pereira de Queiroz Filho (2011), em suas análises, destaca o surgimento das favelas
como uma resposta direta às mudanças na estrutura urbana e social do país. O autor
argumenta que o crescimento populacional acelerado, associado à migração massiva
de trabalhadores em busca de oportunidades nas áreas urbanas, contribuiu
significativamente para a formação desses assentamentos precários. A falta de
políticas habitacionais efetivas e a rápida urbanização, sem o devido planejamento,
resultaram na ocupação irregular de terrenos, geralmente em encostas de morros ou
áreas periféricas, dando origem às favelas.
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Ainda segundo Queiroz Filho (2011), a origem do termo "favela" remonta à


Guerra de Canudos, no final do século XIX, quando ex-soldados que participaram
desse conflito passaram a ocupar o Morro da Providência, no Rio de Janeiro. A
designação "favela" foi associada à planta resistente e abundante Cnidoscolus
quercifolius, presente na região de Canudos. Essa associação simbólica transcendeu
as características físicas das habitações precárias, conectando-se à resistência e
resiliência das comunidades diante das adversidades urbanas e socioeconômicas. O
termo "favela", portanto, não apenas descreve geograficamente esses
assentamentos informais, mas também incorpora uma dimensão histórica e cultural
intrínseca à identidade dessas áreas urbanas no Brasil.
A ampla generalização sobre os habitantes de áreas periféricas, fortalecida
inclusive pelas elites simbólicas, intensifica o receio das pessoas em se identificarem
como pertencentes a esses territórios populares. O conceito de "estigmas” de
Goffman (1963) pode ser aplicado aos residentes de territórios populares, por
constantemente gerenciarem suas imagens perante a sociedade, pois se negam a
construção de uma identidade enquanto favelado para se distanciarem dos estigmas
postos no imaginário coletivo sobre a representação da favela. Este espaço tem
marcadores que são socialmente desqualificadores para os sujeitos que nele vivem,
assim os estigmas são um fenômeno social resultante de interações sociais que
relacionam os atributos e estereótipos postos pela percepção do outro. Assim, os
sujeitos acabam por construir fachadas afim de se distanciarem dos estigmas postos,
na tentativa de não serem impactados com os variados tipos de preconceitos
existentes em relação aos moradores de favelas, utilizando recursos como tom de
voz, linguagem corporal, roupas e acessórios para apresentarem uma imagem mais
favorável, distanciando-se da cultura periférica. Nesse cenário, o cotidiano nas
favelas se torna um palco onde as pessoas desempenham papéis sociais, buscando
se adaptar e sobreviver em um ambiente marcado pela marginalização.
Lefebvre (2008) propõe uma análise crítica do espaço urbano, argumentando
que o acesso à cidade não deve se limitar à dimensão física, mas incorporar aspectos
sociais, culturais e políticos. No contexto das favelas, essa abordagem permite
explorar as questões habitacionais e, as dimensões simbólicas e culturais,
reconhecendo a luta dos moradores pelo direito à cidade como uma experiência
multifacetada. A perspectiva lefebvriana, centrada na produção social do espaço,
oferece um arcabouço teórico para compreender as favelas como espaços dinâmicos
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moldados pelas relações sociais em constante mudança. Sob essa ótica, as favelas
não se resumem a resultados passivos das desigualdades sociais, mas representam
arenas ativas onde se desenrolam práticas cotidianas que contribuem para a
construção de identidades e resistências. Porém, os estigmas de outrem em relação
ao espaço de favela contribuem na percepção dos sujeitos que habitam nessa
localidade não quererem se reconhecerem como favelados. Lefebvre (2008) ressalta
que a urbanização transcende o âmbito técnico, sendo uma expressão complexa das
relações sociais, econômicas e políticas, fornecendo uma base analítica mais
profunda para examinar as experiências dos moradores de territórios populares.
Além disso, a aplicação do conceito de "espaço vivido" de Lefebvre (2000) no
projeto de pesquisa permite uma compreensão abrangente de como os habitantes de
favelas percebem e vivenciam o ambiente ao seu redor. Ao considerar o espaço
vivido, a análise não se restringe às condições materiais, abrangendo as narrativas e
significados singulares atribuídos pelos residentes a esses lugares. Esta abordagem
proporciona uma compreensão holística das complexidades nas dinâmicas urbanas
das favelas, alinhando-se aos objetivos deste projeto em explorar as múltiplas
dimensões das experiências dos moradores nesses territórios.

METODOLOGIA

A presente pesquisa adota uma abordagem qualitativa, pois é a mais


adequada, segundo Minayo (1997), para estabelecer uma visão dos fatos de forma
mais profunda, não se reduzindo apenas ao quantitativo. Será adotada a pesquisa
bibliográfica, pois é uma abordagem amplamente utilizada para adquirir
conhecimentos prévios sobre um determinado tópico. Assim, serão estudados
autores como Erving Goffman e Henri Lefebvre, além de outros autores de livros que
serão incluídos na pesquisa exploratória com o auxílio do(a) orientador(a) e artigos
científicos que tratem da temática identitária das representações da favela e sua
origem, como Alfredo Queiroz.
Será realizada pesquisa documental, com o intuito de buscar em jornais ou em
documentos oficiais registros de se, em algum momento, o bairro Pedregal foi
classificado com a denominação de favela, revisando registros históricos e materiais
jornalísticos locais, enriquecendo a compreensão da história e representação do
Pedregal. É fundamental a pesquisa exploratória, Gil (2002) nessa etapa consiste em
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uma investigação informal e relativamente mais livre, onde a pesquisadora tentará


compreender o máximo possível os atributos que contribuem para a constituição do
objeto pesquisado. Essa metodologia corrobora para a compreensão detalhada das
percepções, experiências e representações dos moradores do Pedregal, sendo a
abordagem exploratória essencial para investigar fenômenos pouco explorados,
como o motivo pelo qual as pessoas não se reconhecem de forma identitária com a
favela onde residem.
A coleta de dados será realizada por meio de entrevistas semiestruturadas,
que abordarão temas como a percepção do termo "favela", a construção da
identidade e as sociabilidades presentes no bairro. Para a coleta desses dados, será
utilizado o método de Snowball (Bockorni; Gomes 2021), que consiste em
amostragem bola de neve, em que um entrevistado indica o outro, e assim
sucessivamente, até construir uma cadeia de recrutamento que se assemelha a uma
bola de neve, e essas entrevistas serão utilizadas para análise do objeto pesquisado.
A observação participante será implementada a partir da pesquisa de campo para
permitir uma compreensão mais contextualizada das dinâmicas sociais e interações
cotidianas dos moradores.
O presente estudo considerará critérios para a seleção dos atores sociais a
serem investigados como tempo de residência no bairro e diferentes perspectivas em
relação à identificação com a condição de favelado. Essa diversidade de vozes é
crucial para uma compreensão abrangente dos fenômenos em estudo. A análise de
dados compreenderá a transcrição e codificação das entrevistas, a técnica da
entrevista é mais adequada para entender as fachadas, levando em consideração
que o contato na entrevista semiestruturada permite uma fluição maior por parte do
entrevistado, assim a pesquisadora pode observar outros pontos para além das
perguntas feitas, seguida por uma análise de conteúdo para identificar padrões, temas
recorrentes e divergências nas respostas dos participantes. A triangulação de dados,
combinando informações provenientes de entrevistas, observações e análise
documental, será empregada para garantir a validade e confiabilidade dos resultados.
A pesquisa será conduzida em conformidade com princípios éticos, incluindo a
obtenção de consentimento informado, garantia de anonimato e confidencialidade,
bem como respeito pelos direitos e bem-estar dos participantes. Reconhecendo a
complexidade do tema, é importante mencionar possíveis limitações, como a
subjetividade inerente às percepções individuais e eventuais restrições de acesso a
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informações ou participantes. A metodologia proposta visa proporcionar uma


compreensão aprofundada das identidades do ser favelado no Pedregal, contribuindo
para uma visão mais holística das realidades urbanas.
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CRONOGRAMA

Atividade mar abr mai jun jul ago set out nov dez jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez
24 24 24 24 24 24 24 24 24 24 25 26 25 25 25 25 25 25 25 25 25 25

Aulas nas ✔ ✔ ✔ ✔ ✔ ✔ ✔ ✔ ✔ ✔
Disciplinas do
Mestrado

Revisão do ✔ ✔
Projeto

Pesquisa ✔ ✔
Exploratória

Pesquisa ✔ ✔ ✔ ✔ ✔ ✔
Bibliográfica

Elaboração do ✔ ✔ ✔
Instrumento de
Pesquisa

Obtenção do ✔ ✔
Parecer Ético

Pesquisa de ✔ ✔ ✔
Campo/ Coleta de
Dados

Análise de Dados ✔ ✔

Redação da ✔ ✔ ✔ ✔ ✔
Dissertação

Apresentação de ✔ ✔ ✔
Resultados
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REFERÊNCIAS

BOCKORNI, B. R. S.; GOMES, A. F. A amostragem em snowball (bola de neve)


em uma pesquisa qualitativa no campo da administração. Revista de Ciências
Empresariais da UNIPAR, Umuarama, v. 22, n. 1, p. 105-117, jan./jun. 2021.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa/Antônio Carlos Gil. - 4.
ed. - São Paulo : Atlas, 2002
GOFFMAN, Erving. Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade
Deteriorada. Rio de Janeiro: Zahar, 1963.
GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana; Tradução de Maria
Célia Santos Raposo. Petrópolis, Vozes, 1985
HELLER, Agnes. A filosofia radical. Trad. Carlos Nelson Coutinho. São Paulo:
Brasiliense, 1983
LEFEBVRE, Henri. A Produção do Espaço. Trad. Doralice Barros Pereira e Sérgio
Martins (do original: La Production de L'Espace. 4. ed. Paris: Ed. Anthropos, 2000).
Primeira versão: início – fev. 2006.
LEFEBVRE, Henri. O Direito à Cidade. 5 ed. São Paulo: Ed. Centauro, 2008.
MINAYO, Maria Cecilia de Souza. Pesquisa social: teoria, método e criatividade.
10ed. São Paulo: Vozes, 1997.
QUEIROZ FILHO, Alfredo Pereira. Sobre as origens da favela. Mercator. Fortaleza,
volume 10, 22, p. 33-48 setembro-dezembro, 2011.

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