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DOCÊNCIA EM

SAÚDE

BEM-ESTAR, PROTEÇÃO ANIMAL E


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Portal Educação

P842b Bem-estar, proteção animal e legislação / Portal Educação. - Campo


Grande: Portal Educação, 2012.

254 p. : il.

Inclui bibliografia
ISBN 978-85-8241-071-4

1. Bem-estar animal. I. Portal Educação. II. Título.

CDD 636.089
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO AO BEM-ESTAR ANIMAL ................................................................................7

1.1 CONCEITOS DE BEM-ESTAR ANIMAL ...................................................................................14

2 FUNDAMENTOS FISIOLÓGICOS EM BEA ............................................................................25

2
2.1 ESTÍMULOS E RESPOSTAS FISIOLÓGICAS .........................................................................32

3 RELAÇÕES IMUNOLÓGICAS, CONDIÇÕES FISIOLÓGICAS E PATOLÓGICAS EM


BEA ..................................................................................................................................................36

3.1 REAÇÕES IMUNOLÓGICAS BÁSICAS E CONDIÇÕES FISIOLÓGICAS ................................36

3.1.1 Barreiras naturais de defesa do corpo .......................................................................................38

3.1.1.1 Tipos de imunidade ..................................................................................................................38

3.1.1.2 Imunidade Inata .......................................................................................................................39

3.1.1.3 Imunidade adquirida (adaptativa) .............................................................................................42

3.2 BREVE REVISÃO DO SISTEMA IMUNE – COMPONENTES ..................................................47

4 FUNDAMENTOS COMPORTAMENTAIS – ETOLOGIA, APLICAÇÕES COTIDIANAS E


RELAÇÕES CLÍNICAS .......................................................................................................................54

4.1 A ETOLOGIA .............................................................................................................................54

4.1.1 Breves notas históricas............................................................................................................. 54

4.1.2 Etologia Aplicada .......................................................................................................................55

4.1.3 Método Científico .......................................................................................................................56

4.1.4 Princípios básicos de Etologia ..................................................................................................56

4.1.5 Comportamento animal e o ambiente ........................................................................................57

4.1.6 Comportamento Animal e bem-estar animal .............................................................................58

5 SENCIÊNCIA ANIMAL..............................................................................................................61
5.1 CONSCIÊNCIA E PENSAMENTOS CONSCIENTES ...............................................................61

5.2 A IMPORTÂNCIA DA SENCIÊNCIA DOS ANIMAIS .................................................................62

5.2.1 Atitudes humanas em relação à senciência animal ...................................................................63

5.2.2 Grupo social e vida social ..........................................................................................................64

5.2.3 A capacidade de aprendizagem dos animais ............................................................................67

5.2.4 Comunicação entre os animais .................................................................................................67 3

5.2.5 O estresse e o sofrimento..........................................................................................................68

5.2.6 Comportamento estereotipado ..................................................................................................68

5.2.7 A dor consciente que os animais sentem ..................................................................................70

5.2.8 Medo e ansiedade nos animais .................................................................................................72

5.2.9 Comportamento Natural ............................................................................................................72

6 A LEGISLAÇÃO E A SENCIÊNCIA..........................................................................................74

6.1 PROCESSOS ALTERNATIVOS ................................................................................................75

7 AS CINCO LIBERDADES E OS 3 RS ......................................................................................77

8 ANIMAIS DE PRODUÇÃO E BEA ............................................................................................80

8.1 MERCADO E CONSUMO .........................................................................................................81

8.2 SISTEMAS DE CRIAÇÃO E PRÁTICAS DE MANEJO .............................................................82

8.3 SISTEMAS DE CRIAÇÃO .........................................................................................................83

8.3.1 Senciência animal .....................................................................................................................91

8.3.2 Transporte e mercados de animais de produção ......................................................................91

9 NORMAS TÉCNICAS PARA O TRANSPORTE DE ANIMAIS .................................................94

9.1 ABATE DE ANIMAIS DE PRODUÇÃO.....................................................................................95

9.2 BEM-ESTAR E A ABOLIÇÃO DE PRODUÇÃO E CONSUMO ANIMAL ..................................98


9.2.1 Manejo Pré-abate e Abate Humanitário....................................................................................101

9.2.2 Métodos de insensibilização pré-abate....................................................................................107

9.2.3 Atordoamento e/ou insensibilização .........................................................................................109

10 ANIMAIS DE COMPANHIA E BEA..........................................................................................119

11 TRANSPORTE DE ANIMAIS DE PEQUENO E MÉDIO PORTE – CÃES E GATOS ..............122

11.1 ORIENTAÇÃO ÀS EMPRESAS DE TRANSPORTE INTERMUNICIPAL E USUÁRIOS 4

QUANTO AO TRANSPORTE DE ANIMAIS DOMÉSTICOS ..............................................................124

12 O PAPEL DOS ANIMAIS NA SOCIEDADE .............................................................................126

13 CONCEITO DE ETOLOGIA – COMPORTAMENTO ANIMAL.................................................131

14 ENSINO DE CÃES ..................................................................................................................134

15 SENSIÊNCIA ANIMAL .............................................................................................................136

16 COMPONENTE ANIMAL .........................................................................................................141

17 COMPONENTE HUMANO .......................................................................................................143

17.1 ABANDONO, MAUS TRATOS E CONTROLE POPULACIONAL DE ANIMAIS .......................143

18 ANIMAIS SILVESTRES, SELVAGENS, DE CIRCO E BEA ....................................................156

18.1 ANIMAIS SELVAGENS E SILVESTRES ..................................................................................156

19 ANIMAIS DE CIRCO ................................................................................................................166

20 ANIMAIS LIVRES PARA COMÉRCIO E CRIAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES COM


FINS DE PRODUÇÃO ........................................................................................................................169

20.1 ANIMAIS LIVRES PARA O COMÉRCIO ..................................................................................169

20.1.1 Criadouros de Crocodilos e Javalis ..........................................................................................169

20.1.2 Fiel depositário ou Criadouros .................................................................................................170

21 ANIMAIS DE EXPERIMENTAÇÃO E BEA ..............................................................................172

21.1 ANIMAIS DE EXPERIMENTAÇÃO...........................................................................................172


21.1.1 Camundongo ...........................................................................................................................172

21.1.2 Rato .........................................................................................................................................173

21.1.3 Hamster ...................................................................................................................................174

21.1.4 Cobaia .....................................................................................................................................174

21.1.5 Coelho .....................................................................................................................................175

21.1.6 Macaco ....................................................................................................................................176 5

22 ANIMAIS DE EXPERIMENTAÇÃO E BEA ..............................................................................177

22.1 ENRIQUECIMENTO AMBIENTAL............................................................................................179

22.2 BIOÉTICA .................................................................................................................................182

23 ÉTICA PROFISSIONAL E O BEM-ESTAR ANIMAL: MÉDICOS VETERINÁRIOS ...............192

23.1 BIOÉTICA .................................................................................................................................192

23.2 ANIMAIS DE PRODUÇÃO .......................................................................................................194

24 A CLÍNICA E O BEM-ESTAR ANIMAL ...................................................................................196

24.1 DOR ........................................................................................................................................196

24.2 AVALIAÇÃO DA DOR EM ANIMAIS ........................................................................................196

24.3 ESTRESSE .............................................................................................................................199

24.4 MECANISMO DO ESTRESSE .................................................................................................201

24.5 EFEITOS DO ESTRESSE SOBRE OS ANIMAIS.....................................................................203

24.5.1 Comportamentais .....................................................................................................................205

24.5.2 Imunológicos ............................................................................................................................206

24.5.3 Minimizando o estresse e melhorando as condições de qualidade de vida do animal ............207

24.5.4 Animais de Companhia ............................................................................................................207

24.5.5 Alterações de comportamento .................................................................................................208


25 EUTANÁSIA ............................................................................................................................209

25.1 CRITÉRIOS PARA EUTANÁSIA ..............................................................................................214

25.2 COMPORTAMENTO ANIMAL ..................................................................................................215

25.3 FATOR HUMANO ....................................................................................................................216

25.4 MÉTODOS DE EUTANÁSIA ...................................................................................................217

26 LEGISLAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA ...........................................................................229 6

26.1 DIREITO DOS ANIMAIS...........................................................................................................238

26.1.1 Os direitos dos animais no tempo............................................................................................239

27 PRIMEIRAS LEGISLAÇÕES ...................................................................................................241

27.1 LEIS BÁSICAS A SEREM CONHECIDAS ..............................................................................242

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................248
1 INTRODUÇÃO AO BEM-ESTAR ANIMAL

O termo BEM-ESTAR refere-se genericamente:

E o que pode ser novidade para muitos é que isso pode ser mensurado!
A definição de bem-estar leva a muitas implicações:
BEM-ESTAR é uma característica de um animal, mais que isto, uma condição, não
somente algo que se refere a este
BEM-ESTAR poderá variar de uma condição tida como - muito pobre a muito bom, o
que significa que um indivíduo pode estar em uma situação pobre de bem-estar ou em um bom
estado num outro momento;
BEM-ESTAR pode ser medido por meios científicos, independentemente de
considerações morais;
Medidas de falha e medidas do quanto é difícil para um animal superar determinados
problemas, podem ambas gerar dados sobre o quão pobre seja este BEM-ESTAR;
O conhecimento das preferências de um animal frequentemente gera informações
valiosas sobre quais condições acabam por resultar em um bom nível de BEM-ESTAR, mas
mensurações diretas do estado do animal, podem em muitos casos serem usadas em
observações e verificações quanto a este bem-estar ou condições que levem a esta e melhorá-
las;
Os animais podem se utilizar de uma variedade de meios quando tentam lidar com
situações. Há várias consequências quando da falha em se lidar com estas situações, e uma
série de medidas podem indicar se o BEM-ESTAR é pobre, como o crescimento, o qual, quando
normal, não significa que o bem-estar seja bom.
A relação entre o homem e os outros animais deve ser vista como uma relação natural,
podendo estar baseada em exploração e predação e em outros, em simbiose e
complementação.

A ideia central da ciência chamada Bem-estar Animal, (BEA) procura conhecer, avaliar
e garantir as condições para satisfação das necessidades básicas dos animais que passam a
viver, por diferentes motivos, sob o domínio do homem. Existe ainda uma discussão, na verdade
uma confusão quanto a BEA, que é uma ciência; Direito dos Animais, que é um movimento
baseado em conceitos filosóficos em que se busca garantir aos animais o direito de não
sofrerem e Protecionismo Animal, que também representa um movimento, onde atuam
indivíduos e comunidades ligados ou não a entidades que representem estes interesses, muitas
vezes solucionam ou buscam resolver problemas de animais isoladamente, ou de pequenos
grupos destes, que seja. A defesa destas ideias é representada por grupos, associações
entidades, ONGs, sendo que alguns grupos e atuações podem ser mais enfáticos e até mesmo
radicais que outros.

São aplicados e possuem conceitos distintos, embora a finalidade seja garantir


condições ideais ou adequadas aos animais:
A maioria das tentativas dos cientistas de conceituar o bem-estar animal resume-se em
três questões principais:

a) Os animais devem sentir-se bem, por exemplo, não serem submetidos ao medo, à
dor ou estados desagradáveis de forma intensa ou prolongada;

b) Os animais devem funcionar bem, no sentido de saúde, crescimento e


funcionamento comportamental e fisiológico normal;

9
c) Os animais devem levar vidas naturais por meio do desenvolvimento e do uso de
suas adaptações naturais.

Como qualquer outra ciência, o BEA não deve ser conduzido por morais éticas até a
sua aplicação. Já o Direito dos Animais é um movimento que parte do princípio de que sob o
domínio dos homens os animais tendem a passar por sofrimento. Como qualquer outro
movimento, é embasado pela emoção e por conceitos mais subjetivos. Apesar de terem origens
conceituais bem diferentes, pode-se afirmar que BEA e Direitos dos Animais são matérias
complementares. Independente dos meios usados, os resultados mensurados pela ciência do
bem-estar e as ideias defendidas pelo movimento de defesa dos direitos dos animais visam um
objetivo em comum: a garantia da qualidade de vida dos “animais não homens”, que, em
diferentes níveis, se relacionam com o “animal homem”. O Protecionismo Animal representa uma
ação prática, executada por membros comuns da sociedade, mas com objetivos comuns ao BEA
e aos Direitos dos Animais.
As pesquisas realizadas de BEM-ESTAR ANIMAL funcionam como base para
definição de leis, acordos, entre outros, que garantam o cumprimento e o respeito aos direitos
dos animais de terem sua qualidade de vida assegurada. Por outro lado, os argumentos mais
emotivos e filosóficos utilizados pelo movimento de defesa dos direitos dos animais podem
ajudar a ciência a avaliar questões subjetivas com as quais pode se deparar, na conclusão de
um processo, no momento em que o cientista/pesquisador deve avaliar a ética de uma situação
antes de tomar decisões sobre a aplicação do seu estudo, ou mesmo, na geração de novas leis
para amparar todas estas circunstâncias. 10

Além da relação de mascote-proprietário, verifica-se a presença do profissional médico


veterinário, e sua atuação no outro extremo, do criador, dando suporte e assistência, bem como
a postura socialmente mais correta de realizar esta reprodução e venda de animais de estimação
de modo socialmente responsável, não mais somente visando o lucro, o que na verdade, em
geral já se verifica quando se trata de criadores sérios e realmente profissionais. O comércio não
profissional, estabelecido pelos criadores de “fundo de quintal”, que na verdade objetiva um lucro
com “produtos” a serem vendidos seja de que forma for e se converta em algum benefício que
lhe retorne ao menos parte do investimento observado para a manutenção dos reprodutores.
Este comércio, não orientado, não profissional, e em geral não apoiado pelo serviço médico
veterinário, determina em muitos casos a aquisição impulsiva e sem critérios por parte do
“proprietário” e consequente abandono. 11

O profissional médico veterinário de atuação nas áreas da saúde e/ou serviço público,
em muitas situações pode se ver acuado diante da necessidade de resguardo da saúde pública
em detrimento a toda a discussão atual quanto ao recolhimento de animais abandonados e
ermos, encaminhamento aos canis municipais ou CCZs e o destino destes a eutanásia em
muitos dos municípios brasileiros. O controle populacional animal, a esterilização, o registro
animal, a posse responsável, a educação em saúde objetivando-a, bem como a eutanásia são
amplamente discutidas, em especial em regiões onde ainda se faz mister o aclaramento dos
direitos dos animais, as posturas sociais frente a sua responsabilidade junto aos mesmos e as
legislações sejam municipais, estaduais e federais atualmente existentes e passíveis de sua
aplicação imediata.

O conhecimento das atuais orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS) no


controle populacional de animais, da posição do médico veterinário - tanto o clínico, como o
servidor público, a legislação relacionada e aplicada, são imprescindíveis, em especial para que
o profissional possa se posicionar claramente diante de clientes, proprietários, criadores, bem
como munícipes que solicitem a exposição ou até mesmo, em alguns casos, imposição deste. O
Conselho Federal de Medicina Veterinária vem estimulando o bem-estar animal por meio de
publicações, além de criar a Comissão de Ética e Bem-estar Animal (CEBEA).

Ainda há os aspectos relacionados a animais mantidos em Zoológicos, recintos


diversos, circos, mas um tema que vem ganhando proporções e atenção já há bastante tempo
refere-se aos animais de produção. Estudos e questões de enriquecimento ambiental têm sido
cada vez mais discutidos e práticas relativas ao bem-estar animal, sistemas de produção
relacionados às Cinco Liberdades e mesmo o comportamento e visão não só de produtores, mas
12
especialmente de consumidores têm resultado em propostas um pouco menos agressivas a
estes animais. As condições de bem-estar animal preocupam a muitos pelos aspectos dos
Direitos dos Animais e da relação das Cinco Liberdades (Liberdade Nutricional - os animais
devem estar livres de fome, sede e desnutrição; Liberdade Sanitária - os animais devem estar
livres de dor, injúrias e doenças; Liberdade Comportamental - os animais devem estar livres para
expressar o comportamento natural de sua espécie; Liberdade Psicológica - os animais devem
estar livres de medo e estresse; e Liberdade Ambiental - os animais devem estar livres de
desconforto), e os chamados 3 Rs (Reposição, Redução e Refinamento), para animais de
experimentação, no entanto o aspecto comercial/produtivo e de pesquisas, também pesa neste
processo e é sabido que:

a) O BEA é importante porque os animais são seres capazes de sentir dor,


estresse, medo, prazer (tratado de Amsterdam, 1997);
b) BEA em produção animal é importante porque poderá melhorar a
imagem dos produtos;
c) Importante porque poderá evitar barreiras comerciais na exportação,
como no caso dos países da Comunidade Europeia.
13

Mas sem dúvida, o BEM-ESTAR ANIMAL vem ganhando âmbito devido ao seu
impacto na sociedade e comunidade de modo geral, não se trata de um conceito ou de assunto
recente, no entanto, com o avanço da conscientização ecossocial, a manutenção das condições
gerais de vida e saúde dos animais é um tópico bastante em evidência, junto à proteção animal.

Ressalva-se que a legislação vigente no país não é igualmente nova e tem sido
agregada de conceitos e parâmetros que definem mais claramente, não só o que se entende por
condições de vida e saúde adequadas e desejadas para os diferentes grupos de animais –
sejam estes da fauna, de companhia, ou de produção e trabalho. Não somente os parâmetros
ficaram mais claros, mas as penas imputadas, multas e outros, também ganharam corpo.

No entanto, ainda há déficit de esclarecimento por parte de profissionais,


munícipes/leigos/proprietários/criadores/outros, bem como das próprias forças públicas, quanto à
aplicação destas leis, sejam municipais, estaduais ou federais. Há um grande desconhecimento
em muitos níveis, da própria existência de tais leis, do que tratam, quando e a quem se aplica, a
quem recorrer, e o que muito preocupa em especial a denunciantes, a possibilidade de sigilo, ou
das consequências diante da busca de auxílio legal para solução de um dado problema
envolvendo animais.

Por sua vez, os profissionais, da área veterinária, são importantes mediadores neste
processo, para tanto a informação e formação mais fundamentada do médico veterinário quanto
a bem-estar e proteção animal. Além dos aspectos legais relacionados, são essenciais.
14
Considera-se ainda o fato de que, uma vez relacionado o problema ao âmbito veterinário, sem
dúvida podem ser evidenciados assuntos éticos.

Bem-estar Animal
Pode ser conceituado ainda como ciência, relacionado a fatores
como estresse, necessidades e sentimentos dos animais.

1.1 CONCEITOS DE BEM-ESTAR ANIMAL

O conceito oficial de bem-estar animal foi citado pela primeira vez em 1965 pelo
Comitê Brambell, um grupo denominado pelo Ministério da Agricultura da Inglaterra para avaliar
as condições em que animais eram mantidos no sistema de criação intensiva. De acordo com
este comitê, BEA é um termo abrangente que diz respeito tanto ao bem-estar físico e mental do
animal. Portanto, qualquer tentativa de avaliar o bem-estar de um animal deve considerar as
evidências científicas geradas pelos sentimentos decorrentes tanto de aspectos e índices
fisiológicos como comportamentais. A partir da década de 70 este conceito vem sendo ampliado
de forma a englobar os animais de modo geral.
BEA é uma ciência em que se procura analisar a situação sob o ponto de vista do
animal, e não mais sob o ponto de vista somente do homem, uma vez que bem-estar, também é
um termo aplicado aos humanos. Bem-estar deve ser definido de forma que permita pronta
relação com outros conceitos, tais como: necessidades, liberdades, felicidade, adaptação,
controle, capacidade de previsão, sentimentos, sofrimento, dor, ansiedade, medo, tédio, estresse
e saúde. E são três os conceitos principais, que permeiam todos os estudos de bem-estar com
os animais:

a) Sentimentos/comportamentos;
b) Funções biológicas relações fisiológicas;
c) Características de vida natural.

A avaliação do bem-estar deve ser separada de considerações éticas, esta irá gerar as 15
informações necessárias para que decisões éticas possam ser tomadas sobre uma dada
situação.

BEA refere-se à característica do animal individual, e não a algo proporcionado ao


animal pelo homem. O bem-estar pode melhorar com condições proporcionadas pelo homem, no
entanto este não representa a condição específica e individual do animal.

Vários fatores podem interferir no bem-estar de um animal como:


 Doenças – infecciosas ou não;
 Traumatismos e/ou mutilações;
 Fome;
 Estimulações positivas/negativas – insuficientes/exageradas;
 Interações sociais;
 Instalações e abrigo;
 Tratamento e assistência inadequados;
 Práticas de manejo;
 Transporte;
 Procedimentos laboratoriais; 16

 Outros.

Estabelecendo critérios para BEA e sua avaliação

Basicamente analisam-se ou consideram-se parâmetros fisiológicos do estado mental


e do comportamento do animal frente a sua capacidade de enfrentamento de uma dada situação
e sua resposta ou adaptação quanto aos resultados obtidos. Ou seja, um animal pode
apresentar-se bem quanto as suas emoções, sentimentos, status fisiológico e mesmo assim não
conseguir superar determinadas circunstâncias. Isto gera consequências que avaliadas geram
seu perfil de bem-estar naquele momento.
Enfrentar com sucesso uma situação implica em ter controle da estabilidade mental e
corporal. A dificuldade prolongada em se obter sucesso ao enfrentar uma dada situação, resulta
em prejuízos diversos como déficit no crescimento, na reprodução ou até mesmo a morte. Há
ainda a possibilidade de uso pelo animal dos chamados mecanismos de adaptação, o que
também pode representar sucesso ou falha, o animal pode ou não conseguir sucesso na sua
tentativa de adaptação a uma dada situação.
O quanto o animal encontra-se bem emocionalmente, psicologicamente, fisicamente,
numa determinada fase de sua vida, representa a base dos critérios para avaliação de seu bem- 17
estar. O conceito refere-se ao estado de um indivíduo em uma escala variando de muito bom a
muito ruim. Trata-se de um estado, portanto, mensurável.
Existem indicadores diretos de BEA que podem determinar o posicionamento de um
animal dentro da escala de muito bom a muito ruim.
São testes e medidas que avaliam o GRAU DE POBREZA – que varia de muito pobre
até adequado/bom. Quanto mais pobre os índices ou resultados – mais pobre o bem-estar do
animal numa dada situação.
18

Podem ser citados como meios de avaliação de BEA:

 Teste de esquiva;
 Teste de preferência;
 Medidas de comportamento e funções fisiológicas.
Estes avaliam o comportamento do animal. É uma MENSURAÇÃO/MEDIDA DE
COMPORTAMENTOS como indicadores DIRETOS de bem-estar.

Quanto ao teste de esquiva:

- quanto mais um animal tentar se desviar, evitar – ESQUIVAR-SE de um objeto, MAIS


POBRE será o bem-estar durante a presença do objeto ou situação. Ex.: rejeição a um dado
local ou posição para dormir e busca contínua de um local ou posição melhor. Trânsito em pisos
lisos e escorregadios.

Comportamentos anormais, tais como estereotipias, automutilação, canibalismo em


suínos, bicar de penas em aves, doenças. Ferimentos, dificuldades de movimento ou
comportamento excessivamente agressivo indicam que o indivíduo em questão encontra-se em
condições de baixo grau de bem-estar.

19

Os testes de esquiva tendem a mostram os graus mais pobres de bem-estar, por estar
fortemente associado a rejeição. Já os níveis mais ELEVADOS de bem-estar são melhores
demonstrados pelas preferências positivas do animal em relação a um objeto ou situação,
medidos pelos TESTES DE PREFERÊNCIA.

Os testes de preferência podem variar em graus de intensidade na manifestação de


sua preferência, momentaneamente, ou em relação a dois ou mais fatores, por aptidão,
necessidade ou interesse social. Ex.: Porcas no período pré-parto podiam pressionar um painel
para ter acesso a uma sala contendo palha (que usam para fazer o ninho) e outra sala para obter
alimento. Dias antes do parto a preferência era pressionar o painel mais intensamente para obter
alimento. Dois dias antes a frequência para obter palha e alimento foi semelhante. O alimento
era inicialmente mais importante, sendo que posteriormente a necessidade de construção do
ninho e o aumento da busca pela palha.

Além da intensidade, quando da avaliação de bem-estar índices de SEVERIDADE,


DURAÇÃO do evento ou situação e NÚMERO de animais afetados podem tornar o problema
avaliado pior.
As MEDIDAS DE COMPORTAMENTO E OUTRAS FUNÇÕES FISIOLÓGICAS devem
ser consideradas em condições de normalidade e as alterações demonstradas pelo animal.

20

Outros indicadores podem complementar a avaliação, fazendo parte igualmente dos


critérios de para uma melhor avaliação do BEA:
21

FONTE: BROOM e JHONSON (1993) citado por BROOM e MOLENTO (2004).

RESUMINDO:

 BEA – uma ciência se baseia na avaliação de parâmetros mensuráveis


e indicadores;
 Parâmetros de BEA para avaliação – medem GRAU DE POBREZA –
que pode variar de muito bom a muito ruim, ou seja, bem-estar muito pobre ou pouco
pobre/bom/excelente;
 Parâmetros de BEA – testes e medidas (teste de esquiva, teste de
preferência, medidas de comportamento e funções fisiológicas);
 Outros Indicadores – vários fatores auxiliam na avaliação de bem-estar.

Importante considerar:
- Há variações de capacidade individuais no enfrentamento de situações;
- As necessidades e sentimentos dos animais;
- Fatores de estresse;
- Outras medidas, como a força da motivação de um animal em relação a uma
situação;
- Os parâmetros fisiológicos e comportamentais podem indicar alterações devido às
tentativas de enfretamento a situação pelo animal, ou em alguns casos podem ser patológicas,
consequentemente dificultando seu enfrentamento da situação, ou impedindo seu sucesso;
- Parâmetros fisiológicos são tidos como mais precários e menos envidenciadores do
real bem-estar do animal que os parâmetros comportamentais, mas também são considerados,
desde que as alterações não sejam pré-patológicas ou patológicas. Exemplos destes
parâmetros: aumento de frequência cardíaca, atividade adrenal, atividade adrenal após desafio
com hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), outros. 22
23

Conceitos em BEA em relação à ética para animais de produção e de experimentação.


Na Europa, desde 1979, o Farm. Animal Welfare Council (FAWC), já preocupados com
o BEA, recomenda nas questões em especial de animais de produção, mas o conceito pode ser
ampliado aos demais animais. Estes animais mantidos em diversas condições pelo homem,
ademais do conceito de BEA, devam ser pelo menos protegidos de sofrimento desnecessário. A
FAWC (1993) considera o que chamam de Cinco Liberdades para definir um padrão aceitável de
BEA para animais de produção, inicialmente, e devem passar a nortear as resoluções e
legislações nesse sentido.
24

Para os animais de experimentação, o conceito complementar ao BEA, ou que alguns


países têm observado, como a União Europeia, o Japão, quando de resoluções e leis, ou
recomendações dos Conselhos relacionados à experimentação animal, diz respeito aos 3 Rs
(Replacement, Reduction, and Refinement) – Redução do número de animais utilizados;
substituição (Replacement) por outras alternativas e Refinamento – melhorando protocolos para
diminuição da dor e do sofrimento.
2 FUNDAMENTOS FISIOLÓGICOS EM BEA

A capacidade para interagir e responder a alterações em um dado ambiente é o que


possibilita a adaptação e a sobrevivência dos indivíduos que procuram manter suas
necessidades fisiológicas, comportamentais e psíquicas.
25
Alterações ocorridas no ambiente e no organismo animal provocam uma quebra do
equilíbrio orgânico, em outras palavras da homeostasia, e a capacidade adaptativa sob estas
alterações é chamada de metabolismo do estresse.

A compreensão das funções coordenadas do organismo e suas atividades exigem a


compreensão da fisiologia dos organismos. Esta compreensão facilita ações e medidas,
terapêuticas ou não, para buscar o equilíbrio homeostático do indivíduo e garantir melhores
condições de bem-estar.

O estudo da fisiologia é complexo, mas cabe destacar alguns pontos a serem


lembrados, para que os mecanismos de estresse, dor e medo sejam mais bem visualizados.
Todo organismo é composto de diferentes níveis estruturais desde o mais simples,
molecular, até a unidade funcional de órgãos e tecidos, regulados por hormônios, dinâmica de
fluídos, entre outros.

Desde a organização básica celular até o organismo completo, há vários mecanismos


e complexos sistemas, a sua maioria entrelaçados, que contribuem para uma adaptação do
animal frente a situações adversas ou de estresse, buscando sempre a homeostasia.

26

Da estrutura básica celular, partimos para a constituição de tecidos, primariamente


quatro tipos:

- Tecido muscular;

- Tecido nervoso;

- Tecido epitelial;

- Tecido conjuntivo.
Os diferentes tecidos organizados formam um conjunto de órgãos essenciais a função
regular do animal. Tanto ao nível molecular e celular, como tecidual e orgânico, diferentes
fatores podem afetar esta inter-relação e consequentemente a homeostasia, mesmo as mais
essenciais ao funcionamento fisiológico normal:

- Quantidade de energia disponível – energia celular – glicose/glicogênio;

- Concentração de O2 e CO2 – para muitas das reações químicas orgânicas e trocas


gasosas; 27

- Eliminação de resíduos e catabólitos – urina e fezes;

- pH – equilíbrio ácido básico; atividade enzimática;

- Quantidade de água, sais e eletrólitos – básico para o funcionamento celular e


tecidual;

- Volume de líquidos e fluídos orgânicos (sangue = volemia) e pressão;

- Temperatura corporal e ambiental;

- Parâmetros de convívio social, nichos e atividades regulares.

Os mecanismos de controle homeostáticos estão baseados na atividade de três


componentes:

a) Receptores - Células receptoras sensitivas – que detectam mudanças


específicas (estímulos) no ambiente;
b) Integradores (cérebro e medula espinhal) – atuam dirigidos por impulsos diretos
ao local onde a resposta necessária (diante do estímulo) possa ser efetivada;
c) Efetores (músculos e glândulas) – executam a resposta apropriada frente a um
estímulo.
O mecanismo básico homeostático é o FEEDBACK NEGATIVO. Este trabalha
detectando alterações no meio interno (organismo), de modo que uma possível resposta leve o
organismo às condições de equilíbrio. Similarmente a função termostática durante o
aquecimento/resfriamento do corpo, busca em alternância manter a temperatura regular. Muitos
fatores podem alterar as condições do meio interno do organismo. Toda e qualquer alteração
estimula uma resposta. A resposta espera-se, deve reverter à condição alterada ao estado inicial
de equilíbrio do indivíduo.

Em FEEDBACK POSITIVO pode haver muitas vezes uma intensificação de sinais,


levando a atividades que acabam determinando alterações internas, exemplo – conquista,
competição sexual entre os animais.

28

Alguns sistemas de controle de feedback podem ser citados:

- De conformidade: alterações internas em paralelo às condições externas. Ex.: salinidade da


água e mecanismos de regulatórios de peixes;

- Esquiva: minimização das variações internas evitando ou se esquivando de distúrbios do


ambiente. Ex.: alguns peixes evitam variações de temperatura mudando de área/lugar;

- Alostase: alteração em UMA variável fisiológica que desencadeia outra alteração. Ex.:
caranguejo azul – muda o pH sanguíneo aumentando a saturação de O2.
Exemplos de Efetores de feedback:

a) Controle antagônico: opositores em relação a variáveis. Ex.: hipotermia


(diminuição da temperatura) – os efetores promovem alterações para elevar a temperatura
(efeito termostático – Huskies não toleram alta temperatura + baixa umidade);
b) Comportamento/atitudes como efetores: animais em busca de lugares, áreas
diferentes, que não ofereçam transtorno. Ex.: migração de borboletas Monarcas para evitarem o
frio do norte. Peixes que buscam níveis de salinidade ao redor de 35 – 45% em águas marinhas.
29

Outros Sistemas de Controle:

Reostase - regulação não homeostática:

a) Sistema de “Reset” - altera parâmetros temporariamente, permanentemente ou


ciclicamente. Ex.: febre, concentrações hormonais (puberdade); ciclo reprodutivo (cio e ciclo
menstrual)
Sistema Feedback Positivo. Ex.: provoca mudanças rápidas; lactação, coagulação, etc.

ALOSTASE: Adaptação biológica,


Estresse:
como o aumento da ADRENALINA
em resposta ao exercício, estresse
ou percepção de uma situação de
É uma resposta fisiológica perigo, seguida de uma queda da
do organismo provocada epinefrina durante o
RELAXAMENTO. A alostase é
pela alteração da
conseguir a estabilidade ativando e
homeostasia, que busca
desativando os sistemas alostáticos,
fornecer ao corpo incluindo o SISTEMA IMUNE,
condições para responder SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO e
e adaptar-se a estas sistemas neuroendócrinos.
alterações
30

Se houver o prolongamento do processo estressante, haverá transtornos no


organismo, refletindo-se em alterações produtivas, reprodutivas, comportamentais e psíquicas.
Existe a necessidade de compreender o metabolismo do estresse e a resposta do animal a esta
influência.

Para isto, é importante entender as causas do estresse em animais domésticos ou


silvestres, de produção ou não, para que se possam minimizar seus efeitos, possibilitando um
melhor ambiente para a criação animal.
A ocorrência de transtornos produtivos nos animais, por influências ambientais ou
outras, faz com que a avaliação dos parâmetros do estresse sobre a fisiologia necessite ser mais
preciso, para poder prever as alterações e evitá-las, tornando possível melhorar o bem-estar
animal. Muitos destes estudos referem-se aos ambientes e possíveis melhorias, no sentido de se
promover um ENRIQUECIMENTO AMBIENTAL e procura manter ao máximo os índices de
normalidade fisiológicos dos animais em ambientes domésticos, de produção ou em áreas como
as de zoológicos, biotérios e outros.
31
Na prática, isto fica evidenciado quando vacas em lactação diminuem drasticamente
suas produções no dia seguinte a uma alteração brusca de temperatura - estresse térmico;
animais recém-desmamados levam algum tempo (meses) até demonstrarem seus potenciais
plenos de ganho de peso - estresse da desmama; dentre outros.

Pesquisas em bovinos (novilhos)


indicam que a mistura de animais
durante o transporte induz ao
estresse, sendo expresso por
alterações fisiológicas e
comportamentais.

O efeito adverso do transporte não


somente afeta o bem-estar animal,
mas também é uma influência
negativa na qualidade da carne.

O aumento fisiológico do estresse e


atividade física dos animais durante o
transporte pode causar deleção do
glicogênio muscular, fator principal
para o aumento do pH básico e,
portanto resultando em carne DFD
(Dark, Firm and Dry – escura, firme e
seca).
2.1 ESTÍMULOS E RESPOSTAS FISIOLÓGICAS

O organismo sempre que estimulado tende a manifestar respostas fisiológicas físicas,


químicas, hormonais, entre outras. O estresse pode ser entendido como um estímulo cabe
entender o que são os fatores estressores, sua intensidade, variações e consequências sobre o
32
bem-estar e condições gerais do animal, consequentemente sua qualidade de vida.

Seria impossível e, ao mesmo tempo indesejável eliminar completamente todos os


tipos de estresses, porque ao mesmo tempo estes funcionam, em diferentes graus, como
estímulos. No entanto, os efeitos danosos podem devem ser combatidos para tanto a
compreensão de seus mecanismos e respostas fisiológicas, são importantes, bem como o
conhecimento de fatores estressores, do comportamento normal dos animais em questão, de
suas necessidades, etc. Mas essa reação do organismo aos agentes estressores tem um
propósito evolutivo. É uma resposta que a natureza dotou os animais superiores ao perigo.

As reações ou alterações fisiológicas frente ao estímulo – estresse - podem ser


avaliadas em três estágios onde basicamente se tem como fator primordial a ativação do sistema
neuroendócrino.

Em sua fase inicial temos:

- Um conjunto de alterações fisiológicas do chamado Sistema Nervoso Autônomo


(SNA), ativando as respostas físicas, mentais e psicológicas ao estresse;

– SNA: um complexo conjunto neurológico que controla, autonomamente, todo o meio


interno do organismo, por meio da ativação e inibição dos diversos sistemas, vísceras e
glândulas.

- Durante o momento da estimulação, uma parte do Sistema Nervoso Central


denominado Hipotálamo promove a liberação de um hormônio, o qual, por sua vez, estimula a
hipófise (glândula vizinha ao Hipotálamo) a liberar outro hormônio, o ACTH, este ganhando a
corrente sanguínea e estimulando - o Hipotálamo secreta algumas substâncias conhecidas por
neuro-hormônios, como é o caso, entre outros, da Dopamina, da Norepinefrina (noradrenalina) e
do Fator Liberador da Corticotrofina (CRF).

- A Hipófise (também chamada de Pituitária), se localiza no Hipotálamo e aumenta a


produção de outros hormônios, tais como a Vasopressina, a Prolactina, o Hormônio
Somatotrófico (do Crescimento ou GH), o Hormônio Estimulador da Tireoide (TSH)

- GnRH ou Hormônio Liberador de Gonadotrofinas - produzido no Hipotálamo e


estimula a Hipófise na liberação dos hormônios gonadotróficos – pode aumentar ou diminuir 33

- O Hipotálamo é considerado o principal sítio cerebral responsável pelo conjunto de


respostas orgânicas aos agentes estressores.

- Hipófise - tem como uma das principais ações estimularem as glândulas suprarrenais.

- A partir da produção do Fator Liberador da Corticotrofina, o Hipotálamo estimula a


Hipófise para aumentar a produção da própria corticotrofina, chamada também de Hormônio
Adrenocorticotrófico (ACTH).

- O ACTH sobre as suprarrenais.

- Nas Glândulas suprarrenais: há um aumento na liberação de seus hormônios; os


corticoides e as catecolaminas, fundamentais na resposta fisiológica ao estresse.

- O aumento na produção destes hormônios pelas suprarrenais são indicadores


biológicos da resposta ao estresse.

- Os níveis aumentados de cortisóis podem influenciar nas atividades do sistema


imunológico.
34

- Desaparecendo os agentes estressores, todas essas alterações tendem a se


interromper e regredir. Se, no entanto, por alguma razão o organismo continuadamente
submetido à estimulação estressante prolongada as respostas podem comprometer
diferentemente o animal.

- Este arco formado pelo hipotálamo, hipófise e córtex da adrenal é essencial para a
sobrevivência e fundamental nos processos de adaptação, pois quando um animal é submetido
a constantes elevações nos níveis plasmáticos de cortisol, os mecanismos de homeostase são
alterados e o estresse crônico poderá se desenvolver.
35

Estímulo e resposta Fisiológica.

- Os níveis de cortisol podem ser monitorados por meio do plasma, saliva ou urina.

- Alguns autores consideram os níveis de glicorticoides como indicadores de BEA.

- A investigação de um animal deve começar pela obtenção de informações acerca do


consumo de alimentos e de água, defecação, vômito, alteração no comportamento, vocalizações
ou qualquer outro sinal que possam ser reportados pelo proprietário/tratador.

- O manejo em si, transporte, fuga de predadores, intervenções cirúrgicas, mudanças


bruscas nas condições regulares vividas pelo mesmo podem servir como agentes estressores.
3 RELAÇÕES IMUNOLÓGICAS, CONDIÇÕES FISIOLÓGICAS E PATOLÓGICAS EM BEA

3.1 REAÇÕES IMUNOLÓGICAS BÁSICAS E CONDIÇÕES FISIOLÓGICAS

36
A resposta imune tem papel fundamental na defesa contra
agentes infecciosos e se constitui no principal impedimento para a
ocorrência de infecções disseminadas, habitualmente associadas
com alto índice de mortalidade. É também conhecido o fato de que,
para a quase totalidade das doenças infecciosas, o número de
indivíduos expostos à infecção é bem superior ao dos que
apresentam doença, indicando que a maioria das pessoas/animais tem condições de destruir
esses micro-organismos e impedir a progressão da infecção. Em contraste, as deficiências
imunológicas, sejam da imunidade inata (disfunções de células fagocíticas e deficiência de
complemento) ou da imunidade adaptativa (deficiência de produção de anticorpos ou deficiência
da função de células T e B), são fortemente associadas com aumento de susceptibilidade a
infecções, estas podem ser originadas por uma baixa na defesa imune, devido às condições de
BEA pobres ou indesejáveis.
Embora a resposta imune seja fundamental para a defesa contra a maioria de agentes
infectantes, têm sido acumuladas nos últimos anos evidências de que em muitas doenças
infecciosas os principais aspectos patológicos não estão relacionados com uma ação direta do
agente agressor, mas sim com uma resposta imune anormal. Atividades do próprio patógeno,
condições de variação do bem-estar, fatores estressores podem determinar um favorecimento no
aumento da incidência de enfermidades por estímulos negativos e consequente
imunossupressão.
37

O conhecimento de que diferentes tipos de microrganismos são combatidos, por


diferentes componentes da resposta imune, data do início dos anos 50, quando ficou
documentada a importância dos anticorpos na destruição de bactérias extracelulares. Embora
isoladamente os anticorpos por si só não tenham a capacidade de destruir bactérias, anticorpos
podem neutralizar os micro-organismos, impedindo sua ligação com o tecido do hospedeiro.
38

3.1.1 Barreiras naturais de defesa do corpo

O organismo tem barreiras básicas e simples, comuns, que estão em atividade


contínua contra QUALQUER ANTÍGENO (agente agressor). A importância das barreiras naturais
no combate às infecções é bem reconhecida. A integridade da pele e das mucosas impede a
aderência e a penetração de bactérias; o movimento mucociliar (cílios da traqueia, por exemplo)
elimina bactérias do trato respiratório; o pH ácido do estômago destrói bactérias que penetram
pelo trato digestivo alto; e na saliva e secreções prostáticas existem substâncias com atividade
antimicrobiana.

3.1.1.1 Tipos de imunidade

O organismo conta com diferentes formas de mecanismos de defesa, e estes são


agrupados em IMUNIDADE INATA e IMUNIDADE ADQUIRIDA:
3.1.1.2 Imunidade Inata

Fazem parte da IMUNIDADE INATA do organismo:


a) Barreiras naturais físicas e químicas;
b) Células fagocíticas;
c) Sistema complemento; 39
d) Citocinas.

A participação da imunidade inata ocorre primeiramente pelas defesas naturais de


barreiras físicas e químicas (pele, mucosas, pH do estômago, etc.), que vencidas pelo agressor,
passa a atuar por meio das células fagocitárias, da ativação do sistema complemento e da
produção de quimiocinas e citocinas.

Às proteínas circulantes do sistema complemento que se ligam na superfície do


Antígeno (Ag) – agente agressor, ou se liga no Ag já neutralizado pelo Ac (anticorpo), de
qualquer forma ou o sistema complemento liso (quebra a estrutura e destrói) o Ag ou “facilita a
fagocitose” atraindo os macrófagos que vão eliminar o sistema complemento em especial ligado
ao complexo Ag-Ac.
Paralelamente atuam as células fagocitárias e as células do tecido agredido ou
estimuladas pela presença do agressor começam a liberar uma série de substâncias químicas
que atraem mais células de defesa e ativam outros mecanismos, até mesmo a produção de
anticorpos.
Todas as células da imunidade inata participam da defesa embora seja enfatizado 40
principalmente o papel de neutrófilos e monócitos/macrófagos pela capacidade fagocítica dessas
células.
Os basófilos e mastócitos ativados por fatores do sistema complemento atraem
leucócitos para o sítio de agressão e contribuem para a passagem dessas células dos vasos
para os tecidos, local onde está ocorrendo à agressão ao hospedeiro.
Os eosinófilos, além da atividade fagocítica, podem destruir micro-organismos por meio
da liberação de proteínas com atividade microbicida, tais como a proteína básica principal e a
proteína catiônica eosinofílica.
Embora tanto os neutrófilos como os macrófagos sejam células fagocíticas, essas
células possuem características bem diferentes.

Neutrófilos:

Possuem vida curta tanto no sangue como nos tecidos neutrófilos só são encontrados
nos tecidos inflamados defendem principalmente contra as bactérias extracelulares.

Macrófagos:

Macrófagos têm sobrevida prolongada concentram-se tanto em tecidos inflamados


como em tecido sadio são fundamentais para a eliminação dos agentes intracelulares.
41

As células da resposta imune são também as principais fontes de citocinas e


quimiocinas, as quais exercem sua ação tanto na fase inata como na adaptativa. As quimiocinas,
devido a seu papel de atrair células para o sítio da lesão, são muito importantes no processo de
defesa do hospedeiro. Existem vários tipos de quimiocinas e citocinas, as mais conhecidas são
as Interleucinas (IL) e os Interferons (IF).
42

3.1.1.3 Imunidade adquirida (adaptativa)

A imunidade adaptativa (adquirida), principalmente mediada por anticorpos,


desempenha importante papel na defesa.
Os anticorpos podem exercer suas ações de três maneiras:

1) Opsonização (Ac se ligam aos Ag e atraem os macrófagos para a fagocitose desse


complexo Ag-Ac),

2) Ativando o sistema complemento (as proteínas do complemento se ligam e


destroem o Ag diretamente, ou destroem o complexo Ag-Ac já formado),

3) Promovendo a neutralização de bactérias/Ags ou de seus produtos (Ac se ligam nos


Ag e impedem suas ações no organismo).
A formação dos anticorpos se dá na chamada IMUNIDADE ADAPTATIVA
(ADQUIRIDA), com a invasão do Ag (agente agressor) e estímulo de células fagocitárias, em
especial o macrófago, ainda na fase da IMUNIDADE INATA, desencadeiam estímulos também
de outras células com as células B e T helper.

Esta sequência dá origem a modificações celulares que culminam com a produção dos
ANTICORPOS pelas células B estimuladas e modificadas (que passam a chamar-se 43
PLASMÓCITOS). Os PLASMÓCITOS (células B estimuladas e diferenciadas em resposta ao
Ag) secretam pequenas moléculas específicas CONTRA O AGENTE AGRESSOR =
ANTICORPOS. Esta RESPOSTA, que leva a produção dos Ac é chamada de RESPOSTA
HUMORAL.

As células B estimuladas (sensibilizadas) que não se diferenciam em plasmócitos,


ficam “na reserva” e podem ser rapidamente estimuladas em uma nova infecção e produzirem
Ac rapidamente. Estas células B sensibilizadas e não diferenciadas são chamadas de CÉLULAS
B DE MEMÓRIA.

Paralelamente, outras células T podem ser estimuladas e passam a atuar como as


células Killer e NK (natural killer), em especial no caso de infecções virais. Esta RESPOSTA é
denominada de RESPOSTA CELULAR.
Seguem dois quadros-resumos destes eventos.

44
45
A resposta mediada pelas células T é extremamente efetiva no mecanismo de defesa
contra agentes intracelulares, como vírus, protozoários, fungos e bactérias intracelulares. As
células T podem exercer sua função por meio da citotoxicidade mediada por células CD8+ ou
por meio da secreção de citocinas que vão ativar macrófagos para destruir os agentes
intracelulares.
Se de um lado já eram conhecidas as células e os mediadores envolvidos nas defesas
dos humanos, só recentemente foi documentado o fato de que a população de células TCD4+ (T
helper) é heterogênea, sendo constituída de duas subpopulações: as células Th1 e Th2. Essa 46
observação tem contribuído bastante para o entendimento da imunopatogênese da maioria das
doenças infecciosas.
É fundamental o entendimento de que tanto a resposta Th1 como a resposta Th2 são
importantes na defesa do hospedeiro contra as infecções. A resposta Th1 está relacionada com
a defesa contra protozoários, bactérias intracelulares e vírus, enquanto a resposta Th2 é mais
efetiva contra os helmintos e bactérias extracelulares.
3.2 BREVE REVISÃO DO SISTEMA IMUNE – COMPONENTES

Anticorpo (Ac): Imunoglobulina (Ig):

Uma proteína, produzida pelos linfócitos B, que reage com um Sinônimo de anticorpo.
antígeno específico; também denominado imunoglobulina.

47

Antígeno (Ag): Interleucina (IL):

Qualquer molécula capaz de estimular uma resposta imune. Um tipo de citocina que
influencia uma série de
células.

Célula: Leucócito:
A menor unidade viva dos tecidos, composta por um núcleo e um Um glóbulo branco. Os
citoplasma linfócitos e os neutrófilos,
envolta por uma membrana. O núcleo contém DNA e o citoplasma entre outros, não leucócitos.
contém estruturas (organelas) que realizam as funções celulares.

48

Quimiotaxia: Linfócito:

Um processo de atração e recrutamento das células no qual uma A principal célula do sistema
célula desloca-se em direção a uma concentração mais elevada de linfático, subcategorizada
determinada substância química. como linfócitos B
(que produzem anticorpos) e
linfócitos T (que ajudam o
corpo a diferenciar entre o
que lhe é próprio do que não
o é).
49

Sistema Complemento: Macrófago:

Grupo de proteínas que ajuda a atacar antígenos. Grande célula que engloba
(ingere) micróbios depois
deles terem sido marcados
para serem destruídos pelo
sistema imune.
50

Citocinas: Complexo de
histocompatibilidade
Proteínas solúveis, secretadas por células do sistema imune, que principal (MHC, major
funcionam como mensageiros para ajudar na regulação de uma histocompatibility complex):
resposta imune.
Grupo de moléculas
importantes por auxiliar o
organismo a diferenciar o
que lhe é próprio do que não
o é.
51

Endocitose: Molécula:

Processo por meio do qual a célula fagocita (ingere) certos Um grupo (agregação) de
antígenos. átomos quimicamente
combinados para formar
uma substância química
única.

Histocompatibilidade: Célula assassina natural:


Literalmente significa tecido compatível. Utilizada para determinar se Um tipo de linfócito que
um tecido ou órgão transplantado (por exemplo, transplante de pode matar determinados
medula óssea ou de rim) será aceito pelo receptor. A micróbios e células
histocompatibilidade é determinada pelas moléculas do complexo cancerosas.
de histocompatibilidade principal.

52

Antígenos leucocitários humanos (HLA, human leucocyte antigens): Neutrófilo:

Sinônimo do complexo de histocompatibilidade principal. Um grande leucócito que


fagocita (ingere) antígenos e
outras substâncias.

Resposta imune: Peptídeo:

A resposta a um antígeno pelos componentes do sistema imune Dois ou mais aminoácidos


sejam células ou anticorpos. quimicamente ligados para
formar uma única molécula.
53

Receptor: Proteína:

Molécula localizada sobre a superfície celular ou no citoplasma que Um grande número de


se encaixa numa outra molécula, como um sistema de chave e aminoácidos quimicamente
fechadura. ligados numa cadeia. As
proteínas são peptídeos
grandes.
4 FUNDAMENTOS COMPORTAMENTAIS – ETOLOGIA, APLICAÇÕES COTIDIANAS E
RELAÇÕES CLÍNICAS

4.1 A ETOLOGIA

54

A etologia é a ciência que estuda o comportamento animal. O comportamento animal é


a ponte entre os aspectos moleculares e fisiológicos da biologia e da ecologia. O comportamento
é a ligação entre o ambiente, sistema nervoso e o ecossistema. O comportamento é uma das
propriedades mais importantes da vida animal e tem um papel essencial nas adaptações das
funções biológicas; representa a parte de um organismo que interage com o ambiente.

4.1.1 Breves notas históricas

Apesar de Aristóteles, Sêneca e São Tomás de Aquino, na antiguidade terem se


debruçado sobre este tema, fundamentalmente por motivações filosófico-religiosas, foi Charles
Darwin que no seu livro “A Origem das Espécies” dedicou um capítulo ao tema dos instintos
animais em que aplicava a teoria da Seleção Natural como, aliás, havia feito anteriormente nas
mutações físicas.

Mas foi no Século XX que a Etologia nasce como Biologia do Comportamento que,
depois da teoria dos Tropismos de Loeb (1918), começam a perfilar duas grandes correntes; a
de Watson ou Behaviorismo baseada nas teorias de Ivan Pavlov e do Reflexo Condicionado, e a
Concepção Vitalista criada pelo Austríaco e Prêmio Nobel da Medicina de 1973; Konrad Lorenz,
criador do conceito imprinting.
Os padrões ontogênicos são a base de uma linha de estudo do comportamento
animal. Esta corrente baseia-se no estudo de muitos atos instintivos e no desenvolvimento de
padrões ontogênicos ou dos comportamentos inatos.

Padrões Ontogênicos são comportamentos que o animal desenvolve desde o seu


nascimento que continuam inalteráveis durante todo o período vital, exceto por interferências.
São comportamentos natos do animal.

55

4.1.2 Etologia Aplicada

Basicamente Etologia é o estudo das regras de conduta, mais ou menos complexas,


dos animais em liberdade, com o objetivo de resolver problemas de sobrevivência e reprodução.
Tendo por base este conceito conclui-se que, por meio da Seleção Natural, só sobrevive e só
evolui o mais apto, o mais adaptado ao meio em que está inserido, aquele que obtém maior
número de cópias genéticas, que alcança, melhor que outro, à fonte de recursos (alimentação) e
evita com maior êxito a depredação.

Daí a importância de conceitos de FISIOLOGIA – como os mecanismos de


homeostase e de adaptação. Resposta aos diferentes agentes estressores. Seu bem-estar – ou
sua capacidade de enfretamento a situações, seu sucesso ou fracasso e seu comportamento
diante destes fatos. Melhores condições e respostas imunológicas – melhores condições de
defesa orgânica. Todos estes fatores são fundamentais.

Quando o homem domestica o cão sobrepõe à Seleção Natural uma Seleção Artificial
estereotipada, tendo como consequência uma ausência quase total de instintos básicos:
proteção (o homem assegura-lhe essa necessidade), conservação (não precisa procurar
recursos, pois os têm em quantidade) e procriação (não necessita de lutar pela cópula). Sendo
assim, inevitavelmente serão colocadas perguntas sempre polêmicas: serão os nossos cães os
melhores? Os mais adaptados? Que aconteceria se os integrássemos numa matilha de cães
livres? Acaso os campeões seriam os mais aptos? Não há dúvida que a polêmica seria muita e
cheia de argumentos.

4.1.3 Método Científico

56

O Método Científico é o meio que nos permite progredir no conhecimento do


comportamento animal e implica, perante qualquer comportamento, a pergunta obrigatória:

Por quê?

Esta pergunta pode ser respondida por meio de diversos pontos de vista todos eles
lógicos e todos corretos.

Por exemplo, por que ladram os cães? Por alguns aspectos, tais como:

 História evolutiva: descendem de outros que sabiam fazê-lo;


 Em termos de desenvolvimento: aprenderam com outros adultos;
 Enfoque Causal: ladram porque têm um aparelho fonético que lhes permite
fazê-lo;
 Enfoque funcional: necessitam fazê-lo para sua sobrevivência e/ou
reprodução.

4.1.4 Princípios básicos de Etologia


Adaptação – É qualquer mudança que favoreça a sobrevivência dos mais aptos,
conseguida durante a evolução e por processos de Seleção Natural. Apesar disso, só o que está
nos genes produz adaptação

Decisão – Qualquer indivíduo de qualquer espécie, perante um problema com mais do


que uma solução decide sempre em função da relação: custos/benefícios. Pensa-se que a
palavra “decidir” implica antropomorfismo, mas realmente não é o indivíduo, como tal, que
decide, mas sim a Seleção Natural que o faz por ele.
57
Portanto, um cão decide não lutar com o humano se o pode evitar, já que o custo de
um ferimento eventualmente grave será muito alto para ele. Quando um cão adestrado ataca o
faz sob um Condicionamento. Se imaginarmos um cão que ataca por sistematicamente qualquer
pessoa que entra no seu campo de visão, este seria um indivíduo com pouca chance de ser
considerado apto, dentre demais animais da mesma espécie e que convivem com o homem.

Diferente, é o caso do cão que ataca para defender o seu território e o seu dono ou
família. Nesse caso ele obterá benefícios superiores aos custos e isso é adaptação.

Dimorfismo sexual interespécies – Em todas as espécies animais, salvo raras


exceções, o macho é maior e mais forte que a fêmea. A relação de peso e tamanho entre macho
e fêmea chama-se Dimorfismo Sexual. No cão, o coeficiente é ligeiramente superior à unidade.

Êxito reprodutor, Eficácia biológica ou eficácia Darwiniana – É a consequência da


atuação da Seleção Natural sobre a capacidade do indivíduo em propagar os seus genes. Mede-
se em filhos adultos descontando-lhes o êxito devido ao meio ambiente da espécie e somando-
lhe o êxito que não terá tido por ação de influências sociais externas.

4.1.5 Comportamento animal e o ambiente

O comportamento dos animais frequentemente fornece os primeiros indícios de


degradação ambiental. Mudanças em comportamentos sexuais e em outros comportamentos
ocorrem devido a distúrbios no ambiente de várias formas – no padrão reprodutivo, no tamanho
das populações. Estudos de comportamento no ambiente natural proporcionam medidas tanto
para avaliação de BEA como para medidas que possam colaborar com o sistema ecológico. O
conhecimento do comportamento de alimentação dos animais pode levar à compreensão da
regeneração de espaços de mata ou florestas. Muitos animais atuam como dispersores de
sementes, importantes na preservação do seu próprio habitat.

A conservação de espécies ameaçadas de extinção requer o conhecimento sobre o


58
comportamento natural dessas espécies, como:

- Padrões migratórios;

- Interações com outros grupos;

- Demanda de alimentos;

- Comportamento reprodutivo;

- Formas de comunicação, entre outros.

Esse conhecimento de comportamento e índices de bem-estar permitirá medidas


efetivas de proteção.

A recolocação ou reintrodução de animais, como no caso de micos-leões-dourados,


por exemplo, não é possível sem o conhecimento da história
natural da espécie.

Estudos básicos sobre o comportamento reprodutivo


levaram ao aperfeiçoamento de técnicas de criação e reprodução
em cativeiro de micos-leões dourados (Leontopithecus rosalia) e de
muitas espécies ameaçadas de extinção.

4.1.6 Comportamento Animal e bem-estar animal


A sociedade tem aumentado a atenção em relação ao bem-estar de animais de
experimentação, de companhia, de criação comercial, selvagens, zoológicos etc. No entanto, o
bem-estar animal sem conhecimento prévio do comportamento da espécie em questão é
impossível. Estes comportamentais fazem parte dos indicadores de BEA, para promover boas
condições para animais de produção, por exemplo, bem como de espécies ameaçadas de
extinção, e também a indicação ou recomendação de cuidados mais apropriados para os
animais de companhia.
59
O fato de diferentes espécies de animais domésticos utilizarem a mesma pastagem,
mesmo que simultaneamente, não significa que ocupem o mesmo nicho e estejam em direta
competição pelos mesmos recursos forrageiros. De fato Bovinos, Caprinos e Ovinos exibem
diferenças marcantes na composição botânica da sua dieta, pastoreio como resposta à
disponibilidade do alimento, estação do ano, intensidade de pastoreio e fatores morfológicos do
animal e de apreensão do alimento.

O comportamento destes animais em pastoreio e a quantidade de alimento ingerida


podem ser influenciados por fatores ligados à pastagem: a disponibilidade do pasto, a
distribuição espacial das plantas, o estado vegetativo, a altura e a relação folhas/caules; por
fatores ambientais: principalmente a temperatura, a umidade relativa e a velocidade do vento,
que podem modificar o tempo e os períodos de pastoreio ao longo do dia; e ainda por fatores
físicos, fisiológicos e comportamentais, ligados ao próprio animal.
No início dos anos cinquenta, numa pequena ilha foi observado um macaco japonês
(Macaca fuscata) limpando batatas doces na água antes de comê-
las. Este comportamento inovador que se espalhou nesta
comunidade animal ao longo dos anos criou vários debates relativos
à transmissão de tradições culturais por imitação. Alguns
experimentos, no entanto, mostraram que este comportamento
60
emerge facilmente depois de algumas horas em diversas espécies
de macacos se a água é de acesso imediato.

Quando a água é bastante afastada, o número de


macacos apresentando este comportamento diminui drasticamente.
O comportamento de limpeza parece ser descoberto por acaso
pelos indivíduos mais curiosos durante atividades exploratórias onde os mesmos combinam
elementos do ambiente. Além disso, nenhum indício de imitação (que consiste na habilidade de
aprender rapidamente um novo comportamento observando o comportamento de outro
indivíduo) foi observado, indicando que os sujeitos atuam e aprendem independentemente uns
dos outros.

A presença de limpadores é importante porque ela estimula o interesse pela água, o


acesso a pedacinhos de comida e os comportamentos de brincadeira e exploração que podem
levar à emergência do comportamento, que uma vez efetivado vai tomar sentido na vivência dos
animais. Outra observação que merece ser feita relativa a este comportamento de limpeza é que
o termo limpar implica a intenção de limpar. Porém, as experimentações e observações críticas
feitas sobre os próprios macacos japoneses foram incapazes de confirmar esta intenção de
limpar e deveríamos escolher outro nome para falar deste fenômeno, como é o caso de
numerosos outros comportamentos exibidos pelos animais.
5 SENCIÊNCIA ANIMAL

A senciência é a capacidade dos animais sentirem dor, medo, prazer, alegria e


estresse. Senciência, é a "capacidade de sofrer ou sentir prazer ou felicidade", não inclui,
necessariamente, a autoconsciência. Senciência, portanto, é a capacidade de sentir. É uma
discussão recente no âmbito internacional e no Brasil. 61

A senciência e o bem-estar animal têm ganhado crescente destaque internacional,


influenciando inclusive os hábitos de consumo e o comportamento da
sociedade. A questão também está intimamente ligada à balança
comercial dos países, levando a adaptações de governos, que
procuram seguir padrões internacionais de bem-estar e até mesmo
buscam sistemas produtivos alternativos, atingindo não só os animais
de produção, como também os selvagens. A pesca comercial de
baleias, por exemplo, tem sido cada vez mais recriminada e
discriminada por diversos países e entidades internacionais. Países como a Argentina tem
investido na proteção e exploração comercial TURÍSTICA das baleias, promovendo projetos
educacionais e pacotes turísticos cada vez mais populares.

Programas de educação em saúde, envolvendo pontos quanto a abandono, maus


tratos, controle populacional animal têm contemplado esses interesses quanto a senciência dos
animais domésticos de companhia, como cães e gatos, principalmente. Ainda, animais utilizados
para o trabalho e tração nas cidades e zona rural, também estão sendo beneficiados com o
surgimento de regulamentações.

5.1 CONSCIÊNCIA E PENSAMENTOS CONSCIENTES

A consciência é uma das áreas de estudos mais difíceis, tanto em humanos quanto em
animais. É difícil descrever pensamentos conscientes em humanos com exatidão. Durante muito
tempo se pensou que ao contrário do que acontecem com os humanos os outros animais não
teriam pensamentos conscientes e preocupações, questões morais em se descoberto que os
animais têm algum grau de moralidade, e que se preocupam não só com os outros animais, mas
também com o homem que vive acerca deste.
Por exemplo, um experimento com primatas mostra certo comportamento de
ALTRUÍSMO. Primatas submetidos a experiências dolorosas e que compreenderam quais os
mecanismos tinham lhe causado a dor, se recusaram a acionar este mesmo mecanismo para
causar dor a outro primata diante deles, e mantiveram esta recusa mesmo quando se recusaram 62
a acionar esse mecanismo indutor de dor nos outros primatas e receberam um estímulo doloroso
como castigo.

5.2 A IMPORTÂNCIA DA SENCIÊNCIA DOS ANIMAIS

Apesar de ser difícil dizer exatamente o que os animais sentem, poucos atualmente
acreditam que os animais são máquinas insensíveis e sem mente. É importante conhecer a
senciência animal e fazer com que seja reconhecida, bem como considerá-la em todas as áreas
onde estejam envolvidos animais.
O termo vulgarmente usado "animal de consumo" designa um animal criado e usado
com fins alimentares, como bovinos, suínos, aves, peixes e outros. Animais de consumo
recebem esta atenção especial por dois motivos:
1) Porque a senciência (e a inteligência) destes animais é ainda desconhecida e tende
a ser mais desconsiderada do que com animais de estimação, por exemplo;
2) Porque em termos numéricos, estes animais são bastante afetados pela atividade
da INDÚSTRIA PECUÁRIA.
63

Entender os sentimentos dos animais levanta definitivamente questões


éticas acerca do uso destes, dos efeitos que o homem provoca nos
ambientes dos animais e do grau de sofrimento que infligimos na maneira
como os tratamos, com práticas de manejo e sistemas criatórios.

Os animais têm direito à consideração moral e jurídica, deste modo, o


tratamento que é destinado aos animais deve incluir o que é apropriado e
melhor para o animal, a sua personalidade, o seu comportamento natural e os
seus sentimentos. Isto implica perceber que os animais têm um conjunto de
direitos fundamentais que podemos e devemos reconhecer:
1) O direito de não serem torturados física ou psicologicamente
2) Direito a não serem confinados para o seu prejuízo
3) Direito a não serem mortos, o que choca com os interesses para a criação e
exploração pecuária.

5.2.1 Atitudes humanas em relação à senciência animal

O modo pelo qual as pessoas veem os animais é influenciado:


a) Por sua formação, cultura e condições socioeconômicas;
b) Pelas tendências do seu tempo.

Por exemplo, o filósofo francês René Descartes (1596-1650) deixou uma duradoura
influência com a sua opinião de que os animais eram "máquinas" sem alma. Já a psicologia
do século XX considerava que apenas o
comportamento deveria ser estudado em vez
de qualquer emoção ou raciocínio que possa
estar na base deste. Contudo, muitos 64
cientistas modernos, que estudam o
comportamento animal, acreditam que é
muito claro que animais sentem e pensam e
o seu comportamento é o resultado de
processos conscientes e inteligentes. A razão
disto ser tão importante prende-se ao fato de
haver neste momento cerca de 22 bilhões de
animais em sistemas criatórios e mantidos exploração pecuária (excluindo-se os peixes).
Assim, Comunidade Europeia já há anos procura instituir procedimentos visando
melhorar as condições de criação destes, e isto têm influenciado substancialmente até mesmo
no comércio exterior com estes países, que já não aceitam mais formas de criação e exploração
cruentas e sem considerações no tocante ao BEA.

5.2.2 Grupo social e vida social

Poucos são os animais que passam suas vidas, sozinhos. Muitos passam suas vidas
em grupos sociais, é o caso dos animais de consumo, animais de vida selvagem e outros.
Especialistas concluíram que apesar dos milhares de anos de domesticação, estes mantêm
basicamente as mesmas necessidades psicológicas e emocionais e características de seus
antepassados.
Cientistas estudaram e compararam a vida de animais de consumo em condições
naturais, e intensivas de produção pecuária. Ficou claro que os milhares de anos de uso
doméstico, reprodução e criação intensivas não alteraram os seus padrões de comportamento
básicos, exemplo: suínos e as galinhas mantidas em unidades pecuárias podem retomar ao seu
comportamento selvagem sem dificuldade, desde que tenha esta oportunidade. Isto significa que
são animais com delicadas e complexas necessidades psicológicas e de comportamento, que
estão fortemente reprimidos, de tal modo que facilmente retornam a sua natureza quando
tenham oportunidade.

65

FONTE: Criação ao ar livre de suínos de exploração comercial (Brasil).

FONTE: Criação de poedeiras. (Ministério da Agricultura de Portugal).

Bovinos, suínos, ovinos, caprinos, galináceos e outras aves comerciais vivem


naturalmente em grupos. Coordenam entre si atividades de deslocamento, descanso, pastagens
ou alimentação que, em geral, não cumprem isoladamente.
Habitualmente formam hierarquias sociais e em criação extensivas estas hierarquias
são mantidas e mais notadas. Muitos métodos de criação comercial de animais causam
problemas na formação de grupos, pois os animais são colocados de forma não natural em
grupos muito grandes, e em condições naturais jamais, muitos destes se reuniriam, ou ainda,
mudam os grupos sem considerar quais as características sociais destes animais. Isso por si
só é um fator de grande estresse.
Outro aspecto importante são os laços familiares entre animais de consumo, e criar
seus filhotes é uma atividade vital para os animais, mesmo os criados para exploração
comercial. Devido a isto, as mães animais evoluíram de modo a se sentirem altamente
motivadas para expressar o seu comportamento natural de cuidar de suas crias.
A criação intensiva de animais tem tido implicações drasticamente graves nas vidas
sociais naturais, nos laços e relações reprodutivas em animais de consumo. Os cientistas 66
afirmam que as necessidades psicológicas e emocionais destes são o oposto ao ambiente e das
condições mantidas na indústria pecuária:
a) Na avicultura de corte, o pinto recém-nascido está predisposto a procurar a figura
maternal. Nas unidades de produção intensiva os pintos nascem
numa incubadora e nunca verão suas mães. Crescem com
milhares de outros pintos cuja vida durará apenas seis semanas,
em média.
b) A porca está predisposta a cuidar de suas crias enquanto estas crescem - e estas
dependem emocionalmente das mães. Os leitões são retirados de suas mães muito cedo e são
colocados em grandes grupos de outros leitões.

FONTE: Sistema de criação ao ar livre e sistema de criação comercial convencional (creches).

c) As fêmeas estão predispostas a escolherem um parceiro com base em certos


atributos. A inseminação artificial substitui este comportamento em muitos ambientes criatórios.
5.2.3 A capacidade de aprendizagem dos animais

Sempre subestimaram as capacidades destes para lidarem com problemas e resolvê-


los; para entenderem o seu ambiente e para aprenderem. Contudo, em condições naturais, estas
capacidades são apenas uma parte daquilo que um animal precisa para sobreviver. As ovelhas e
cabras são capazes de lembrar a localização de fontes de alimentos, além de distinguirem o que 67
é comestível do que não é.
Experiências sobre a capacidade cognitiva dos animais de consumo mostram que
estes são capazes de formar expectativas do que é provável que aconteça e que são capazes
de lidar com novas situações. Os animais de consumo têm consciência do mundo em que vivem
e têm expectativa de como funciona e de como esperam que funcionem as situações.
Os suínos são reconhecidos como animais tão bons em resolver problemas, como os
cães e são capazes de lembrar-se de onde encontram a comida que esconderam. Animais
demonstram capacidade de tomar suas próprias decisões de modo a poderem atingir seus
objetivos, muito embora este tipo de comportamento tenha sido assumido como especial e único
nos primatas não humanos e do homem.

5.2.4 Comunicação entre os animais

Ovinos, bovinos, suínos e aves são animais muito sociais para os quais a comunicação
é essencial, de modo que possam manter relações entre pais e suas crias, para transmitirem
informação acerca dos perigos ou acerca dos alimentos, e para expressarem intenções ou
emoções.
As vacas usam diferentes sons para indicar excitação, interesse e prazer (em comer)
ou frustração, ou para recuperarem contato quando estão isoladas. Os porcos são animais
extremamente vocais e as galinhas são capazes de emitir 30 tipos de sons para comunicarem-
se.
Bovinos e outros animais frequentemente expressam suas emoções.
68

5.2.5 O estresse e o sofrimento

O sofrimento ocorre quando um animal não é capaz de evitar o estresse e experimenta


o desconforto. Os padrões de comportamento são usados para identificar o estresse não natural
nos animais mantidos em cativeiro ou nos diversos tipos de sistemas e práticas de manejo nas
criações comerciais.
Sempre que os comportamentos naturais de expressão se encontram de alguma forma
impedidos, estes animais buscam desenvolver "comportamentos deslocados". Os animais usam
comportamentos deslocados como potencial solução para contornar sentimentos desagradáveis,
causados por circunstância de restrição ou privação. O mesmo acontece também com os
humanos. Estes comportamentos deslocados podem evoluir para comportamentos
estereotipados (estereopatias).

5.2.6 Comportamento estereotipado

Comportamento repetitivo sem sentido e obsessivo. Pode ser visto em animais em


cativeiro, sendo mais intensos quando mais pobre for o cativeiro.
Um urso enjaulado no zoológico, o leão no circo e a porca presa numa cela pecuária
são exemplos. Os atos mais reconhecíveis neste comportamento são o balançar repetitivo da
cabeça, lamber ou roer objetos e enrolar as línguas. As vitelas mantidas em celas para a
produção de carne tentam enrolar a língua e lamber-se compulsivamente. Em zoológico é
comum ver leões, ursos andarem de um ponto para frente e para trás sucessivamente. Estes
comportamentos não são vistos em animais que estão em seu ambiente natural e significam que
estes animais estão psicologicamente e emocionalmente afetados pelo cativeiro e pelas
condições em que são mantidos.
As figuras abaixo representam uma série de comportamentos anormais e repetitivos,
mesmo em animais domésticos de companhia, como o cão ou silvestre de companhia, como 69
determinados psitacídeos.

Cavalo e suíno apresentando comportamento anormal de mordeduras em seus recintos.

Girafa com movimentação repetitiva e anormal da língua. Cão com atividade de circular sobre si
mesmo e morder a cauda.
70

Cracatua mostrando arrancar de penas e automutilação em região peitoral.

5.2.7 A dor consciente que os animais sentem

A dor sentida pelos humanos é definida como uma sensação, às vezes, como uma
emoção. A sensação de dor fisiologicamente é transmitida pelo sistema nervoso. Já a
experiência emocional ou subjetiva da dor e sua intensidade dependem das circunstâncias e do
contexto.
Os animais sentem dor como os humanos? Tantos os mamíferos quanto às aves têm
sistema nervoso semelhante ao dos humanos. O comportamento de um animal com dor varia de
espécie para espécie e de indivíduo para indivíduo (é válido também para os humanos). Um
exemplo seria o comportamento, às vezes, enganador de se atribuir mais ou menos dor por sua
aparência de mais ou menos apelo emocional junto ao próprio homem, como se um cordeirinho,
por seu aspecto cálido e terno, pudesse sentir MAIS ou MENOS dor do que um cão.
Em realidade na natureza os animais evitam manifestar visualmente ou mesmo
sonoramente o sentimento de dor, uma vez que este pode ser interpretado como um sinal de
fraqueza e atrair predadores que poderão atacar o animal.

No entanto, estudos mostram que os receptores de dor são basicamente iguais para o
cavalo, bovinos, ovelhas e humanos.
Os animais de consumo estão sujeitos a dor de maneiras diferentes. Devido a
procedimentos como mutilações incluídas nas práticas de manejo convencionais (amputações
de caudas, bicos, ou castrações muitas vezes sem anestesia) outras são práticas diárias
próprias da indústria pecuária, que vão desde tratamento brusco e violento dos animais, à
criação genética e aceleração do crescimento por meio de hormônios - terminando no transporte
e abate.

71

Processo de debicagem, comum em criações aviárias para evitar que as aves selecionem o
alimento.

Em todos estes episódios os animais de consumo experimentam uma DOR


CONSTANTE, PROFUNDA E CONSCIENTE, assistem os membros de seus grupos a
experimentar todo este desconforto e sofrimento, o que aumenta ainda mais a dor que sentem,
pelo estresse de todo este momento.
Está provado que animais de consumo, assim como qualquer outro animal são
capazes de sofrer por verem outro animal sofrer - isso acontece com o sofrimento de uma vaca
quando tem seu bezerro apartado, para a produção do leite ou de carne de vitela, e este bezerro
vocaliza manifestando seu sofrimento pela separação.
O mesmo ocorre também nas linhas de abate, quando animais ficam chocados e
severamente perturbados por assistirem a morte de outros animais a sua frente.

5.2.8 Medo e ansiedade nos animais

72

Os animais de consumo vivem sob controle humano e é frequente sofrerem com medo
do que os humanos possam lhes causar, sendo que o medo envolve uma sensação muito
desagradável que pode ser uma causa de sofrimento, um processo de ansiedade em alguns
casos, constante.
Em diversas práticas que fazem parte da indústria pecuária é fácil encontrar animais
com medo ou ansiosos, principalmente quando os animais são carregados das unidades de
engorda para os caminhões de transporte, quando a violência é usada para acelerar esta
operação, quando viajam em caminhões desconfortáveis onde a sobrecarga pode ser usada,
quando são descarregados dos caminhões para os matadouros, quando são alinhados e
conduzidos para o abate, a etapa de atordoamento, e quando por fim chegam à linha de abate.
Em qualquer destes momentos o terror e o pânico, mais do que o medo são os sentimentos mais
fortes e evidentes.

5.2.9 Comportamento Natural

Os animais de consumo experimentam muitas emoções negativas, mas são capazes


de apreciar emoções positivas, a partir do prazer de comer, de interagir com outros membros do
grupo, além de exploração do solo, procurar alimento e fazer exercícios.
Os sistemas de criação ao ar livre mostram claramente essas experiências e
sensações de mais prazerosas do que os animais mantidos sob sistema de criação
convencional. Alguns exemplos são mais evidentes como a vontade enorme das galinhas que
são mantidas em pequenos espaços de correrem e explorarem o solo pela manhã, ou as
brincadeiras e sinais de alegria que os porcos evidenciam quando são libertados de uma cela
superlotada para um espaço ao ar livre.
Muitas das capacidades de que todos os animais precisariam nas suas vidas adultas
na natureza são aprendidas por meio de brincadeiras e de atividades de diversão que
desenvolvem quando são novos - estas incluem manipulação de objetos, perseguir uns aos
outros, lutar sem causar ferimento, avançar ou retroceder, e até mesmo acrobacias. São
comportamentos úteis, mas que também os fazem sentir alegria. 73
6 A LEGISLAÇÃO E A SENCIÊNCIA

Os animais já são considerados pela União Europeia (UE) como seres sencientes, o
que significa que se reconhece juridicamente que um animal:
1) Tem consciência do que o rodeia e do ambiente em que vive e se encontra;
2) Tem consciência das emoções que sente e que são relativas às sensações que 74
vive;
3) Tem capacidade para aprender com as experiências que vive;
4) Tem consciência das sensações que sentem em seu próprio corpo, tais como dor,
calor, fome ou frio;
5) Tem consciência de suas relações com outros animais, incluindo os humanos;
6) Tem a capacidade de distinguir e escolher entre diferentes objetos, animais e
situações, o que mostra que compreende o que acontece em seu ambiente e distingue
indivíduos.
Esta legislação deve ainda ser muito melhorada tanto na UE como no Brasil, mas isto
não basta. Tanto a legislação atual como a que futuramente venha a ser aprovada e a entrar em
vigor têm que ser aplicadas, por meio das autoridades competentes.
A criação intensiva de animais desenvolveu-se devido ao enorme aumento da procura
de carne, ovos e leite baratos, e em grandes quantidades. O mesmo aconteceu com a pesca
intensiva. Em resultado disto, a criação intensiva é o método segundo o qual, a grande maioria
de animais de consumo é obtida nos países desenvolvidos e subdesenvolvidos. No entanto,
estes sistemas são extremamente invasivos nos aspectos de ética, moral e bem-estar dos
animais.
Atualmente, várias nações têm revisado estes processos, uma vez que os direitos dos
animais, suas capacidades de sentir e manifestar suas emoções têm sido reconhecidos. Assim,
é cada vez mais frequente que países onde a legislação vigente inclua sistemas de criação
animal que procurem ferir o mínimo as condições de BEA, imponham a centros exportadores
determinados padrões para que o comércio exterior não seja afetado. Estas sociedades acabam
estabelecendo exigências de bem-estar determinadas de acordo com as características e
necessidades naturais destes animais para regular a atividade da indústria pecuária que produz
alimentos de origem animal.
Ainda, a pressão da comunidade científica e de organizações europeias de proteção
dos animais, têm resultado em alguns passos em direção ao reconhecimento e proteção da
senciência animal na União Europeia (EU). Cabe aos cientistas brasileiros e as organizações e
instituições brasileiras, bem como de proteção animal desenvolver cada vez mais aqui este tipo
de trabalho. Algumas leis da União Europeia determinam que:
a) A amputação de leitões seja ilegal na UE;
b) A UE está quase iniciando o processo de estabelecimento de juntas diretivas para
regular o bem-estar dos centros avicultores em geral; 75
c) O Parlamento Europeu votou a favor de um máximo de 8 horas o tempo de
transporte de longa distância de animais vivos para abate;
d) As celas para porcas gestantes estarão proibidas na UE a partir de 2013;
e) O corte de bicos de galinhas poedeiras será proibido a partir de 2011;
f) A todos os porcos deverá ser dado material manipulável suficiente (exemplo - palha)
que lhes permita ter um comportamento mais próximo do natural;
g) As baias de confinamento para vitela serão ilegais na UE a partir de janeiro de 2007;
h) Os animais são reconhecidos como seres sencientes no Tratado Europeu de 1997.
Esta evolução legislativa é ainda muito pequena, se considerarmos a imensidão da
indústria pecuária e a maneira como os sistemas e práticas de manejo mais convencionais
afetam aos animais de consumo.

6.1 PROCESSOS ALTERNATIVOS

Existem alternativas aos sistemas de criação intensiva que tomam em muito maior
consideração a senciência dos animais de consumo e que devem ser cada vez mais promovidas
e disciplinadas para que se desenvolvam ainda mais de acordo as necessidades e
características naturais destes animais. Muitas entidades e instituições europeias defendem que
a agricultura europeia e mundial devem favorecer exclusivamente os sistemas de criação
extensiva e biológica de animais, por serem menos cruéis e invasivos para estes.
A conscientização da população tem levado aos consumidores exigirem alimentos
animais produzidos de acordo com elevadas regras de bem-estar animal o que tem pressionado
às empresas pecuárias a tratarem os animais que exploram de maneira menos cruel,
considerando muito mais a senciência dos animais de consumo.

76
7 AS CINCO LIBERDADES E OS 3 RS

Especialistas em bem-estar animal do Farm Animal Welfare Council consideram que


um conjunto de princípios essenciais para o bem-estar animal chamado "CINCO
LIBERDADES", deveria regular as práticas agrícolas e outras onde são explorados animais.
Ainda há os 3 Rs, no entanto este conjunto é mais aplicado aos animais de biotério e de 77
experimentação.

Segundo estes especialistas, o respeito por estas cinco liberdades traria um estado
ideal de bem-estar para os animais:
1) Liberdade de fome e de sede: os animais deveriam ter sempre acesso a água
fresca e uma alimentação adequada às suas necessidades para serem perfeitamente saudáveis
e estarem fisicamente bem;
2) Liberdade do desconforto: os animais devem ter condições de alojamento e
ambientais adequados às suas necessidades e confortáveis de acordo com a suas
características;
3) Liberdade da dor, dos ferimentos e das doenças: os animais devem ter a sua
saúde protegida, quer por uma constante prevenção de doenças, ferimentos e da dor. Por
intermédio de assistência veterinária adequada imediata, uma vez detectado um problema de
saúde nos animais;
4) Liberdade para expressar o comportamento natural: os animais devem ter
espaço que lhes permita expressar o seu comportamento natural, devem ser mantidos em
espaços adequados que favoreçam suas necessidades comportamentais e devem estar na
companhia de membros de sua espécie de acordo com as suas características e necessidades
sociais;
5) Liberdade do medo e da angústia: os animais devem ser mantidos e tratados de 78
modo a evitar que sofram psicológica e emocionalmente.

Todos os animais devem:

1 - Ser livres de Medo e Estresse.

2 - Ser livres de Fome e Sede.

3 - Ser livres de Desconforto.


5 liberdades

4 - Ser livres de Dor e Doenças.

5 - Ter liberdade para expressar seu Comportamento Natural.

Para experimentação em laboratórios

1 - Redução - do número de animais utilizados.

2 - Substituição (Replacement em inglês) - por alternativas sem


3 Rs

animais.
3 - Refinamento – alterando protocolos de experiências para
diminuição de dor e sofrimento.

Tanto as CINCO LIBERDADES como os 3 Rs são considerados como critérios para


BEA e sua aplicação em diferentes setores da vida animal em relação ao homem. São tomadas
79
como base na União Europeia (Comunidade Europeia) para formulação de leis e
regulamentações em especial no que diz respeito aos animais de produção (5 Liberdades).
Animais de experimentação, tanto da EU como de outros países – ex. conselhos de pesquisa de
diferentes países utilizam os 3 Rs para embasar seus regulamentos.

As Cinco Liberdades compreendem critérios que aliados ao BEA podem permitir


uma avaliação e indicação de condições de qualidade de vida do animal, e estas circunstâncias
são mensuráveis, servindo de recurso crítico para o BEA como ciência. Lembrando sempre que
o Bem-estar pode ser bom ou ruim e estes índices (indicadores) são mensuráveis.
8 ANIMAIS DE PRODUÇÃO E BEA

A cadeia produtiva no Brasil se caracteriza predominantemente pelo emprego de


sistemas intensivos, nos setores suinícolas, de aves e de produção de leite. Na bovinocultura de
corte há o emprego do sistema de confinamento, bem como sistemas extensivos. Há presença
80
de pequenos, médios e grandes produtores, ainda, grandes empresas podem “integrar” os
criadores, o que é verificado na suinocultura e avicultura basicamente.

A melhoria técnica e genética, no entanto, tem contado com investimentos dos


criadores, que pretendem aumento nos índices de produtividade e lucros. Boa parte da produção
é comercializada no mercado interno, mas os investimentos e necessidades do mercado externo
têm feito com que os níveis de exportação sejam crescentes nas diferentes áreas – bovinos,
suínos, aves e outros.

Entretanto, para atender as exigências do consumidor nacional e do mercado


internacional existe a necessidade da contínua implementação de programas que garantam
elevado padrão de qualidade dos produtos. Além da melhoria dos plantéis, incremento genético
e técnico; programas de rastreabilidade têm sido instituídos e visam à garantia dessa qualidade,
em especial procurando atender as exigências externas.

Nesse sentido, a aplicação de boas práticas de produção e em especial as que visam a


preservação do meio ambiente, bem como o bem-estar animal e dos trabalhadores, devem ser
consideradas parte desse processo. As legislações vigentes na União Europeia (UE), o
reconhecimento dos animais como seres sencientes no Tratado Europeu de 1997, a crescente
conscientização de criadores e população destes países têm determinado uma pressão sobre os
países produtores de alimentos de origem animal de modo que os sistemas de criação
compreendam cada vez mais os critérios de BEA.

Juntamente com as questões ambientais e a segurança alimentar, o bem-estar animal


vem sendo considerado entre os três maiores desafios confrontando a agricultura nos anos
futuros. O Comitê Brambell, em 1965, já questionava a validade de se tomar apenas um
parâmetro – produção ou produtividade – como única medida de avaliação de um sistema de
manejo.
8.1 MERCADO E CONSUMO

O bem-estar animal pode ser considerado um fator para que passem a empregar
sistemas de criação defensáveis eticamente e aceitáveis socialmente, pois em muitos mercados
as pessoas manifestam que desejam comer carne com “qualidade ética”, isto é, carne de
81
animais que foram criados, tratados e abatidos em sistemas que promovam o seu bem-estar, e
que sejam sustentáveis e ambientalmente corretos.

A ética social tradicional condena a crueldade e os maus tratos contra os animais. O


sadismo contra animais, a violência e os maus tratos deliberados não fazem parte do cotidiano
da criação animal, a não ser questões individuais onde pessoas particularmente tenham ou
adotem este tipo de comportamento.

Ausência de bem-estar animal e sofrimento não devem ser confundidos com crueldade
animal. A crueldade animal é deliberada, sádica, inútil e desnecessária causa de dor, sofrimento
e negligência contra animais.

É conhecido o fato de que pessoas cruéis aos animais são também cruéis a outras
pessoas. Assassinos em série, em geral, têm história passada de abuso contra animais, e existe
uma conexão muito próxima entre abuso contra crianças e contra animais.

Uma pretensa sociedade civilizada tem rejeitado cada vez mais a crueldade no
tratamento dos animais. O BEA caminha com outras questões, como a ecologia e o uso de
agrotóxicos, os transgênicos, deste modo o assunto do bem-estar animal vem de “fora para
dentro”, quer dizer, da sociedade para a atividade agrícola.

E tem se tornado cada vez mais presente nas preocupações morais das pessoas
nesse final de milênio. Muitas pessoas sentem que, uma vez que os animais foram
domesticados e estão completamente sob controle do homem, passamos a assumir um
compromisso implícito com a qualidade de vida desses seres.

Em vários países a questão do bem-estar animal vem se tornando uma preocupação


crescente, onde a sociedade tem demandado um número cada vez maior de regulamentações
que melhorem a qualidade de vida dos animais.
8.2 SISTEMAS DE CRIAÇÃO E PRÁTICAS DE MANEJO

Na agricultura animal tradicional, extensiva ou semi-intensiva, os interesses dos


animais se confundiam com os interesses do produtor, ou seja, se o animal ia bem, o produtor ia
bem. O sofrimento animal estava relacionado a estar doente, fraco, desprotegido das
82
intempéries, ou com fome.

Nessas condições, o animal não produzia em toda sua potencialidade e o produtor não
obtinha os lucros desejados. Entretanto, com a industrialização da agricultura, intensificada no
período pós 2ª Guerra Mundial, os métodos de produção mudaram radicalmente, com uma
preocupação quase que exclusiva com o desempenho quantitativo dos animais.

Observa-se que entre 1820 e 1920 a produtividade agrícola dobrou, e de 1945 a 1975
esta quintuplicou; continuou a ser intensificada com rendimentos de produção cada vez maiores,
sendo que em 1940 um produtor norte-americano produzia alimento para alimentar 11 pessoas,
já em 1990 produz para 80.

Este aumento na produtividade animal está basicamente associado a três fatores:

 Melhoramento genético;
 Nutrição;
 Industrialização de processos.
8.3 SISTEMAS DE CRIAÇÃO

Basicamente os sistemas de criação convencionais podem ser classificados em três.

1. EXTENSIVO

* Animais criados soltos, exclusivamente a pastos. 83

* Sistema característico de grandes propriedades (quando da criação de bovinos,


ovinos, caprinos).

* O animal sofre mais com variações de clima, quantidade e qualidade de alimento.

* Mais para a produção de carnes e peles.

2. SEMIEXTENSIVO

* Animais permanecem a pasto apenas parte do dia, recebendo suplementação


alimentar em cochos;

* Sistema adotado tanto para a produção de carnes, peles, leite, em geral.


84

3. INTENSIVO

* Sistema mais característico de pequenas e médias propriedades;

* Requer maior investimento e mão de obra especializada;

* Sistema adotado à produção leiteira, aves (ovos/carne); suínos, peixes, bovinos


(confinamentos – produção de carne);

* O animal recebe alimentação balanceada em cochos;

* Grande número de animais por m2, animais criados em confinamentos.

Confinamento bovino.
85

Avicultura de corte

Suinocultura.

O confinamento foi o caminho para reduzir trabalho, perda energética dos animais e
ganhar espaço, colocando os animais sob fácil manejo, no entanto, a intensificação dos sistemas
de criação favoreceu ao incremento de uma gama de problemas sanitários, por exemplo, pois o
aumento no número de animais/m2 facilita a transmissão de várias enfermidades e
concomitantemente, agravaram-se, então, os problemas de comportamento e bem-estar animal.
86

Seja por consciência própria ou por imposição de leis e garantia de mercado e


comércio, muitos produtores já vêm mudando a forma e práticas de manejo passam a adotar
outros sistemas e recursos alternativos.

Alguns estudos realizados junto a produtores britânicos apontam para estas mudanças.
Os critérios de BEA com fins de produção estão baseados nas Cinco Liberdades, as quais
os produtores têm conhecimento na rotina diária de atividades junto aos animais.

Uma pesquisa sobre a motivação dos produtores em relação às Cinco Liberdades


mostra o grau de importância atribuída pelos produtores às mesmas, mais de 80% destes
consideraram todas as liberdades de muita ou extrema importância. Esse índice é diferente para
diferentes grupos de produtores e diferentes países. Mas mesmo na população produtora
pesquisada, altamente motivada, existem problemas de bem-estar animal significativos. No
Reino Unido, por exemplo, 20% do gado de leite apresentam manqueira e a mortalidade de
borregos atinge mais de 20%.

Tomam-se alguns pontos como critérios para quantificação destes problemas na


criação:

 Severidade dos processos patológicos ou de comportamento;


 Duração;
 Número de animais afetados.
A severidade destes processos é verificada pela avaliação de:
 Comportamento - ex.: medo;
 Doença - ex.: manqueira e pneumonia;
 Desempenho da produção - ex.: índices de crescimento;
 Fisiologia - ex.: frequência cardíaca e cortisol.

Exemplo de severidade:

87

- Isolamento social em ovinos.


Exemplo de duração de um evento ou processo:

- Por quanto tempo os ovinos permanecem sensíveis à dor, após um quadro de


manqueira.

88

Exemplo de número afetado:

- Quantos animais sofrem de manqueira num dado momento.


Um exemplo em suínos seria na produção de leitões, nas baias de parição,
maternidades. Estas representam um grau de problemas relativos quanto ao bem-estar, no
entanto são usadas no mundo todo e consideradas inevitáveis na suinocultura comercial. Os
benefícios para a ninhada/produção são à custa do bem-estar da porca, para tanto se considera:

Severidade:

- Restrição de liberdade de movimentos;

89
- Restrição da liberdade para construir ninho;

- Restrição da liberdade para evitar a ninhada.

Duração:

- Três a quatro semanas.

Número afetado:

- Maioria das porcas em sistema de produção intensivo.

No caso específico da bovinocultura de corte esses estudos compreendem


elementos importantes para a produção de carne:

1. A biologia e psicologia dos bovinos;


2. Ambiente criatório;
3. Ações de manejo.

Existem bons exemplos indicando ganhos diretos e indiretos quando se considera o


comportamento dos bovinos para definição das ações de manejo. Muitos reconhecem a
importância de reduzir o estresse dos animais durante a rotina de manejo, por exemplo, a
questão de que animais agitados durante o manejo correm mais riscos de acidente, levando ao
aumento de contusões, além da carne ficar mais dura e escura (dark, firm and dry – DFD).
90

FONTE: SOARES, G. J. D. Disponível em: <www.upf.br/sial2005/germano_soares.pdf>. Acesso


em:

FONTE: SOARES, G. J. D. Disponível em: <www.upf.br/sial2005/germano_soares.pdf>. Acesso


em:
8.3.1 Senciência animal

Novos tipos de sofrimento animal resultaram do confinamento intensivo, ao menos em


três aspectos:

 Aumento de doenças de produção, embora um percentual esperado de animais 91


adoeça e até morra, a eficiência econômica geral espera superar a perda. Um exemplo no
confinamento de suínos são as doenças respiratórias, que mesmo em Santa Catarina, onde as
instalações não são completamente fechadas e são inclusive abertas em parte do ano, há algum
grau de incidência de rinite atrófica ou infecção pulmonar em aproximadamente 50% dos animais
abatidos;
 Produção em escala e pequena margem de lucro trabalham contra atenção
individualizada aos animais;
 Sofrimento também resulta de privação física ou psicológica dos animais no
confinamento: ausência de espaço, isolamento social, impossibilidade de se movimentar,
monotonia, etc.

8.3.2 Transporte e mercados de animais de produção

Exceto cães e gatos, todos os outros animais em território nacional necessitam do Guia
de Trânsito Animal (GTA) – como controle de transporte interestadual e intermunicipal - para
transitar pelo país, por exemplo, gado, aves etc. As guias para transporte de animais de
produção e outros, bem como informes gerais do Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento estão disponibilizadas no link:
As questões de BEA são aplicadas ainda timidamente no país, mais pela consciência
de transportadores, criadores; apesar de regulamentações e recomendações existentes, isto
quando comparamos ao que já existe na Comunidade Europeia. No Brasil as preocupações
maiores ainda são tão somente quanto aos aspectos zoosanitário, sanidade e vigilância
sanitária. No entanto, vários pesquisadores vêm buscando soluções para minimizar ao máximo
os efeitos de estresse durante o transporte, pois este traz prejuízos aos animais e
consequentemente ao seu produto final.
92

Transporte bovino – terrestre – caminhões especiais – Brasil.

Caminhões para transporte de suínos – Brasil.


93

Transporte – travessia rio. Chile.

A UE por meio de legislação específica dispõe de Normas Técnicas para melhores


condições de transporte dos animais considerando os critérios das Cinco Liberdades.
9 NORMAS TÉCNICAS PARA O TRANSPORTE DE ANIMAIS

O regulamento introduz normas mais rigorosas a serem aplicadas aos trajetos de


duração superior a oito horas. Estas normas dizem respeito quer aos veículos quer aos animais.

O regulamento prevê também um equipamento de melhor qualidade nos veículos de 94


transporte, o que inclui, designadamente, a regulação da temperatura (ventilação mecânica,
registro da temperatura e sistema de alerta na cabina do condutor), a melhoria das condições de
transporte a bordo dos navios de transporte de gado (ventilação, dispositivos de água de bebida,
sistema de aprovação, etc.).

É proibido o transporte de determinados animais. É o caso dos animais muito jovens


(vitelos com menos de dez dias, suínos com menos de três semanas e cordeiros com menos de
uma semana), exceto se forem transportados a uma distância inferior a 100 km. O regulamento
proíbe igualmente o transporte de fêmeas prenhes em fase terminal de gestação e de fêmeas
que tenham parido na semana anterior.

Por outro lado, as condições de transporte de equídeos em viagens de longo curso são
melhoradas, sobretudo com a obrigação de utilização sistemática de baias individuais.

As disposições sobre a duração das viagens e os espaços previstos para os animais


mantêm-se inalteradas em relação à anterior regulamentação. Em matéria de duração do
transporte, o regulamento prevê, assim, períodos diferentes para os tipos de animais: animais
não desmamados, ou seja, que recebem ainda uma alimentação láctea (9 horas de viagem, em
seguida 1 hora de repouso para bebida e depois 9 horas de viagem), suínos (24 horas de
viagem, quando possam ter sempre água à disposição), equídeos (24 horas de viagem com
bebida/água de 8 em 8 horas), bovinos, ovinos e caprinos (14 horas de viagem, em seguida 1
hora de repouso para água e depois 14 horas de viagem). As sequências anteriormente referidas
podem repetir-se se os animais forem descarregados, alimentados, oferecida água e deixados
em repouso durante, pelo menos, 24 horas num posto de controle acreditado.

Esta importante legislação de bem-estar animal visa reduzir o estresse e os danos que
os animais podem sentir durante o transporte por terra, aéreo e marítimo. Entre as novas
medidas de proteção para os animais a introduzir estão às normas mais exigentes para veículos
e equipamento, e requisitos mais apertados para os que lidam com animais durante o transporte.
A Regulação prevê também medidas para assegurar uma melhor execução da legislação da UE
neste domínio, inclusive com o uso de sistemas de navegação por satélite.

O Regulamento 1/2005/EC não inclui novas medidas sobre os tempos de transporte


ou o número de animais por m2, como a proposta original da Comissão previa, no entanto, os
representantes estão empenhados em apresentar propostas relativas a estes dois importantes
aspectos do transporte animal antes do fim de 2009.
95
O transporte rodoviário é sem dúvida o meio mais comum de condução de animais de
corte para o abate e inclui pontos importantes para o BEA e qualidade da carne:

 Condições desfavoráveis podem provocar a morte dos animais, contusões,


perda de peso e estresse dos animais;
 Altas temperaturas, maiores distâncias de transporte e a diminuição do espaço
ocupado por animal também contribuem para que ocorram problemas de transporte;
 Privação de alimento e água - perda de peso do animal.
Aumento do estresse durante o transporte - pelas condições desfavoráveis como:
 Privação de alimento e água, alta umidade, alta velocidade do ar e densidade de
carga;
 Respostas fisiológicas ao estresse: hipertermia, aumento da frequência
respiratória e cardíaca. Estímulo da hipófise e adrenal - aumentos dos níveis de cortisol, glicose
e ácidos graxos livres no plasma. Aumento de neutrófilos e diminuição de linfócitos, eosinófilos e
monócitos;
 Operações de embarque e desembarque dos animais podem produzir aumento
nos níveis de estresse.

9.1 ABATE DE ANIMAIS DE PRODUÇÃO

Os métodos de abate vêm sofrendo modificações já há vários anos. Métodos de abate


cruentos têm sido rejeitados cada vez em muitos países, mesmo onde o BEA quanto a sistemas
de criação, ainda não seja tão considerado. Os conceitos atuais implicam em “abate
humanitário”, no entanto para muitos ativistas em proteção animal, não há na prática uma “morte
melhor”, sendo que vários lutam pela “abolição” do abate e consumo animal.

Abate humanitário pode ser definido como o conjunto de procedimentos técnicos e


científicos que garantem o bem-estar dos animais desde o embarque na propriedade rural até a
operação de sangria no matadouro-frigorífico. O abate de animais deve ser realizado sem
sofrimentos desnecessários. As condições humanitárias devem prevalecer em todos os
96
momentos precedentes ao abate. A discussão para muitos é como conseguir manejá-los de uma
maneira que amenize o sofrimento e oferecer uma morte menos dolorosa (abate humanitário)

Existem ONGs, como a WSPA (World Society for the Protection of Animals) que vem
tentando tornar concreta uma ação conjunta com o Ministério da Agricultura e revisar uma série
de pontos acerca daquilo que se tem atualmente e da própria consciência e atividade de
frigoríficos, abatedouros e mesmo de transportadores. O Conselho Federal de Medicina
Veterinária (CFMV) tem agido apoiando e promovendo o tema junto à comunidade médica
veterinária, entidades governamentais e não governamentais, bem como junto aos setores
produtivos e à comunidade.

Na Inglaterra, por exemplo, a Universidade de Bristol age em parceria com frigoríficos


britânicos, para desenvolver técnicas de abate humanitário, com cursos e treinamentos, inclusive
quanto a transporte, o que é obrigatório em toda a União Europeia. Onde os condutores
precisam passar por um programa sobre o bem-estar animal antes de trabalhar com transporte
de carga viva.

A intenção de membros e coordenadores da WSPA é ensinar, por exemplo, a carregar


animais de fazendas e granjas para os frigoríficos procurando diminuir o sofrimento durante o
trajeto. O embarque e o desembarque devem ser feitos de uma forma mais tranquila, que atenda
às boas práticas de manejo. Matadouros e abatedouros do Estado de São Paulo são obrigados,
desde 1995, a utilizar métodos científicos e modernos que impeçam o abate cruel de animais.
Mas existem problemas que burlam tanto a legislação como a intenção de ONGs e
protecionistas, como por exemplo, o chamado abate clandestino. O índice de carne clandestina
varia de 20%, nas regiões mais abastadas, a 60%, nas mais pobres do país. Nesses casos, o
abate é feito ainda de forma primitiva, cruel e violenta. O transporte em geral é muito precário, os
animais sofrem durante o trajeto: bois são pisoteados, frangos acumulam fraturas e
machucados, entre outros.
No Brasil foi divulgado recentemente pela Representação Regional da OIE (Office
International des Epizooties – World Organization for Animal Health) para as Américas, um
conjunto de recomendações quanto Bem-estar Animal, resultantes I Reunião Interamericana de
Bem-estar Animal, realizada em agosto/2008, no Panamá.

Estas recomendações incluem dentre outros, aspectos relacionados ao BEA de


animais de produção e obviamente que se atinjam metas comuns em relação ao mercado
externo de exportação e sanitário, como:
97
 Os padrões de Bem-estar Animal devem ter por base a ciência, tendo em conta o
destino e a utilização dos animais em cada caso, além dos aspectos ambientais,
regionais, geográficos, sistemas de produção, aspectos econômicos e culturais, dentre
outros;
 A informação científica que se aplique ou se tome como referência para a elaboração de
padrões internacionais deverá ser devidamente avaliada e validada nos diferentes
sistemas de produção, ambientes, climas, situações sanitárias e espécies animais;
 A adoção, promoção e desenvolvimento de padrões de bem-estar animal e boas práticas
de manejo com a finalidade de assegurar a saúde animal;
 A promoção da ajuda regional para que se coloquem em prática os padrões da OIE;
 A OIE priorize os trabalhos de Bem-estar Animal em diferentes sistemas de produção de
carne bovina;
 Deverá levar-se em conta a necessidade de uma implementação progressiva de normas
internacionais adaptadas às possibilidades econômicas e de estrutura dos países
membros;
 Se promova a pesquisa, capacitação, educação e comunicação do bem-estar animal;
 A coordenação das ações na região realizada pela Representação Regional da OIE para
as Américas;
 Para que se obtenham resultados sustentáveis de Bem-estar Animal baseados na
prática e na evidência e conhecimento científicos deve-se levar em conta aspectos
socioeconômicos, geográficos, práticas e sistemas produtivos;
 Deve-se assegurar que as normas privadas de bem-estar dos animais, em caso de
utilização, sejam coerentes com as da OIE e não entrem em conflito com estas;
 A Comissão Regional da OIE das Américas avalie a criação de um Comitê
Interamericano de Bem-estar Animal das Américas, coordenado pela Representação
Regional da OIE das Américas;
 Os Países membros, Organizações Internacionais, Organizações Governamentais e não
governamentais, setor privado, academia, entre outros, promovam o desenvolvimento e
implementação dos Padrões da OIE e da legislação nacional;
 Se promova a Educação e capacitação;
 Se estimule a inclusão, nos currículos dos cursos de medicina veterinária de graduação,
o tema Bem-estar Animal;
 Se promova a pesquisa e desenvolvimento, de acordo com as condições e
características da região; 98
 Se promova a Comunicação.

Estas recomendações se estendem a todos os animais, terrestres e aquáticos, com


ênfase inicial nos animais destinados à produção de alimentos e a população canina e de
animais destinados a exibições, pesquisa com um especial foco no seu impacto na saúde
pública - zoonoses, saúde animal e meio ambiente.

9.2 BEM-ESTAR E A ABOLIÇÃO DE PRODUÇÃO E CONSUMO ANIMAL

Na opinião de alguns defensores dos animais, pouco importa colocar música clássica
para os bovinos ouvirem ou colorir as granjas com elementos, ou seja, buscar uma melhoria nas
questões de enriquecimento ambiental (enriquecimento do ambiente criatório), pois o destino
final destes animais é apenas um: a morte. O abate humanitário não é visto com bons olhos por
todos os ativistas.

Dentro das organizações de defesa animal, existem duas correntes: a do bem-


estarismo e a do abolicionismo. A primeira, prega melhores condições de criação e abate
como é o caso da WSPA, parceira do governo nesse projeto. A segunda clama pelo fim da
exploração animal. Nesta última, enquadram-se uma série de outras entidades, em sua maioria
Vegetarianistas (vegetarianos) e que defendem este modo de vida. Para estes, qualquer ação
que vise a melhorar o bem-estar animal tem como objetivos unicamente interesses comerciais e
perpetua a exploração, porque cria na população a falsa impressão de que estes animais têm
uma vida digna. Para muitos representantes destas instituições, o trabalho de sensibilização e
conscientização fica prejudicado.

99

Vegetarianos – não consomem carne.

Os muitos ativistas neste segmento ainda se valem de pesquisas e estudos, como os


realizados pela FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação) que
mostram a criação e exploração de animais para consumo como uma real causa de problemas
ambientais, incluindo o aquecimento global, a degradação da terra, a poluição da água e do ar e
a perda da biodiversidade.
Há vários movimentos em defesa do não consumo da carne e em defesa da vida dos
animais de produção.

Uma das organizações mais ativas e talvez polêmicas do mundo é a norte-americana


PETA (Pessoas pelo Tratamento Ético dos Animais, da sigla em inglês), manifestos desta
chegam a comparar os matadouros a campos de extermínio nazistas. A PETA é reconhecida por
fortes campanhas a favor do vegetarianismo e contra o consumo de carne. Especialistas, no
entanto, admitem que a exclusão do consumo imediato e total de carne é um objetivo um tanto
100
quanto difícil, no entanto, a minimização do sofrimento animal deve ser, portanto a ferramenta
para um trabalho mais consciente quanto a BEA nos setores produtivos. Há toda uma questão
de educação, hábitos e costumes envolvidos, difíceis de serem tratados de modo padrão, são
questões regionais com importantes fatores socioeconômicos e, às vezes, climáticos e
geográficos envolvidos. Mesmo com uma total conscientização, hoje do consumidor brasileiro,
este ainda não dispõe de ferramentas para identificar, na hora da compra, se o produto
obedeceu às normas de bem-estar animal durante a criação e o abate, como é comum na
Europa e em parte dos EUA.

Prato básico da alimentação do brasileiro – arroz, feijão, batatas fritas e carne.


9.2.1 Manejo Pré-abate e Abate Humanitário

No entanto, há ainda um aspecto de importância, a questão do manejo pré-abate e do


que se denomina atualmente de ABATE HUMANITÁRIO. A movimentação dos lotes de animais,
a serem encaminhados do local de produção até os centros abatedouros por si só, já é um fator
101
de enorme estresse.

No manejo pré-abate há fatores estressantes, que dependendo da duração ou


severidade, são capazes de alterar a qualidade da carne. Um dos fatores considerado crítico
para o bem-estar é a movimentação inadequada dos animais. Ao sofrer maus tratos no processo
de criação e abate, os animais liberam substâncias que alteram o pH (índice de acidez que vai
de zero a sete) da carne. Quanto mais alto o pH, pior a qualidade da carne com pH acima de 6,
não entrando no mercado europeu por ser considerada mais rígida e de qualidade inferior.
Assim, dependendo da forma de condução dos animais, pode-se observar que maus tratos,
medo, esforço e excessiva utilização de bastão elétrico, resultam em perdas econômicas, em
função da redução da qualidade carne.

Alguns países que já avaliaram os prejuízos decorrente do manejo pré-abate


inadequado encontraram perdas anuais de 1.500 toneladas no Canadá, de US$ 20 milhões na
Austrália e de U$ 60 milhões pelo defeito PSE (carne – pale, soft and exsudative) nos EUA. As
carcaças que apresentam lesões severas podem perder até 6% do seu valor.

Na Europa, pressionados por consumidores e entidades de defesa dos animais,


grandes empresas, como cadeias de fast food e grandes mercados varejistas estão exigindo o
selo de ‘bem-estar animal’ na carne comprada.

No Brasil, grandes frigoríficos exportadores já possuem áreas estruturadas de bem-


estar animal. Os técnicos percorrem fazendas e frigoríficos para aplicar um sistema de auditorias
de bem-estar onde são verificados itens como o uso de choque elétrico para conduzir o gado,
quedas e lesões, e eficiência no abate - se animal é morto logo na primeira tentativa.

Com relação ao abate, o ambiente de frigorífico ou matadouros apresenta basicamente


cinco causas de problemas do bem-estar animal:
a) Estresse provocado por equipamentos e métodos impróprios que proporcionam
excitação, estresse e contusões;

b) Transtornos que impedem o movimento natural do animal, como reflexo da água no


piso, brilho de metais e ruídos de alta frequência;

c) Falta de treinamento de pessoal;

d) Falta de manutenção de equipamentos, como conservação de pisos e corredores;


102
e) Condições precárias pelas quais os animais chegam ao estabelecimento,
principalmente em razão ao transporte.

Ambientes de frigorífico bovino – pré-abate.


103

Ambiente – frigorífico de aves.

Algumas medidas são consideradas práticas de manejo pré-abate, como o


descanso ou dieta hídrica e o banho de aspersão. A retenção dos animais, o manejo adotado
e as inovações que o animal recebe são causas de estresse psicológico, enquanto que os
extremos de temperatura, fome, sede, fadiga e injúrias, são as principais causas do estresse
físico.

Descanso ou dieta hídrica no matadouro é o tempo necessário para que os animais


se recuperem totalmente das perturbações surgidas pelo deslocamento desde o local de origem
até o local destinado. É regulamentado de acordo com o artigo no. 110 do RIISPOA -
Regulamento de Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (1968), os
animais devem permanecer em descanso, jejum e dieta hídrica nos currais por 24 horas,
podendo este período ser reduzido em função de menor distância percorrida. O descanso tem
como objetivo principal reduzir o conteúdo gástrico para facilitar a evisceração da carcaça e
também restabelecer as reservas de glicogênio muscular, tendo em vista que as condições de
estresse reduzem as reservas de glicogênio antes do abate.

Banho de aspersão dos animais é após o descanso, estes seguem por uma rampa
de acesso ao boxe de, também regulamentado pelo RIISPOA – artigo 146 (1968). O objetivo do
banho do animal antes do abate é limpar a pele para assegurar uma esfola higiênica, reduzir a
poeira, tendo em vista que a pele fica úmida, e, portanto, diminuiria a sujeira na sala de abate. O
manejo tranquilo durante este trajeto na rampa de acesso é importante para que se evitem
quedas.
104

O nível do estresse é avaliado nesta etapa da rampa de acesso aos boxes. Uma das
verificações é o número de vocalizações ou mugidos que são indicativos de dor nos bovinos. O
número de vezes que o bovino vocaliza durante o manejo estressante tem relação com o nível
de cortisol circulante.

A utilização do bastão elétrico para conduzir os animais é um dos motivos do alto


índice de mugidos. A necessidade da utilização do bastão elétrico para conduzir os animais
também constitui um sinal em que o manejo está inadequado.
105

FONTE: (Roça et al. 2001)


Abate humanitário

Conjunto de procedimentos técnicos e científicos que garantem o bem-estar dos


animais desde o embarque na propriedade rural até a operação de sangria no matadouro-
frigorífico. O essencial é que o abate de animais seja realizado sem sofrimentos desnecessários
e que a sangria seja eficiente. As condições humanitárias não devem prevalecer somente no ato
de abater e sim nos momentos precedentes ao abate.

GRACEY e COLLINS, 1992 106

Segundo pesquisadores, há vários critérios que definem um bom método de abate:

a) Os animais não devem ser tratados com crueldade;

b) Os animais não podem ser estressados desnecessariamente;

c) A sangria deve ser a mais rápida e completa possível;

d) As contusões na carcaça devem ser mínimas;

e) O método de abate deve ser higiênico, econômico e seguro para os operadores.

Os métodos convencionais de abate de bovinos envolvem a operação de


insensibilização antes da sangria, com exceção dos abates realizados conforme os rituais
judaicos ou islâmicos.

O manejo do gado no frigorífico é extremamente importante quanto:

a) A segurança dos operadores;


b) Qualidade da carne;
c) Bem-estar animal.
Vários fatores colaboram para este desfecho, quanto ao BEA:

a) As instalações dos matadouros-frigoríficos bem delineadas – para minimizar


efeitos do estresse e melhora as condições do abate;
b) As etapas de transporte, descarga, descanso, movimentação, insensibilização e
sangria - devendo-se evitar todo o sofrimento desnecessário;
c) Treinamento, capacitação e sensibilidade dos transportadores, pessoal de
manejo geral, magarefes e outros.
107

9.2.2 Métodos de insensibilização pré-abate

Basicamente – o abate é antecedido pelo atordoamento ou a insensibilização, ou


também pode ser realizado por meio da degola cruenta (método kasher ou kosher) sem
atordoamento prévio.

Insensibilização pré-abate.
108

Animal já abatido, iniciando esfola.

Abate clandestino – bovinos.


Ritual Kasher/Kosher

O termo kosher ou kasher é utilizado para definir os alimentos preparados de acordo


com as leis judaicas de alimentação denominadas de kashrut seguidas pelos membros da
religião judaica. O abate kasher/kosher ou schechita envolve a contenção do animal, estiramento
da cabeça e degola cruenta do mesmo, sem prévia insensibilização, esta operação tem como
objetivo permitir a máxima remoção de sangue. Schechita é o ritual de abate dos animais para o
preparo da carne kasher, realizado por um magarefe treinado = schochet. Há o corte das artérias
109
carótidas e veias jugulares rapidamente, proporcionando rápida inconsciência e insensibilidade,
para sangria. O instrumento cortante utilizado para essa operação é chamado de chalaf, o qual é
afiado de forma eficiente e examinado após cada utilização.

Alimentos kosher

São alimentos kosher: a carne, frango, peixe com escamas, laticínios, frutas, legumes
e produtos de confeitaria. Não são considerados kosher a carne suína, misturas de carne e
laticínios, camarão, lagosta e frutos do mar. Adquiridos por judeus, mas também por
muçulmanos, adventistas, vegetarianos, pessoas com alergias a certos alimentos e ingredientes
e outros consumidores que simplesmente consideram subjetivamente o alimento kosher como
sinônimo de qualidade.

9.2.3 Atordoamento e/ou insensibilização

Obtido por meios diversos, procura deixar o animal em um estado de inconsciência,


que perdure até o final da sangria sem causar sofrimento desnecessário.

Os instrumentos ou métodos de insensibilização que podem ser utilizados são:


Marreta de insensibilização:

É largamente utilizada no Brasil, principalmente em estabelecimentos clandestinos.


Promove grave lesão do tecido ósseo com afundamento da região atingida, com contusão
cranioencefálica.

110
Martelo pneumático não penetrante:

Leva a uma lesão encefálica. Promove incoordenação motora, porém mantém


atividade cardíaca e respiratória, considerado por alguns autores como de baixa eficiência como
método de insensibilização.

Arma de fogo:

Considerada uma operação de alto risco em matadouros-frigoríficos.

Pistolas pneumáticas:

Produz uma grave laceração encefálica e promove inconsciência rápida do animal e


pode ser considerado um método eficiente de abate de bovinos.

Pistola de dardo cativo acionada por cartucho de explosão:

É um método que tem recebido destaque em publicações científicas. O dardo produz


uma cavidade temporária no cérebro e provoca aumento da pressão interna pelo efeito
dilacerante do dardo. É considerado o mais eficiente e humano para a insensibilização para
abates de animais em geral.

111

Corte da medula ou Choupeamento:

Mais relacionado ao abate de búfalos, devido à alta resistência da calota craniana,


dificultando ou impedindo o uso adequado de outros processos mecânicos.

Eletronarcose e os processos químicos (CO2 - dióxido de carbono):

Somente para suínos, exige pessoal treinado especificamente.

Após a insensibilização, o animal segue pelos procedimentos até a sangria, mas é


importante salientar que nem sempre a insensibilização é bem-sucedida, que deve ser
avaliada em termos de eficiência.
Os sinais de uma insensibilização deficiente são:

a) Vocalizações;
b) Reflexos oculares presentes;
c) Movimentos oculares;
d) Contração dos membros dianteiros.

Os únicos processos de atordoamento de animais previstos na Convenção 112


Europeia sobre Proteção dos Animais são:

a) Meios mecânicos com a utilização de instrumentos com percussão ou perfuração do


cérebro.

b) Eletronarcose.

c) Anestesia por gás.

Foram abolidas pela UE as técnicas:

a) Choupeamento.
b) Do prego ou estilete.
c) Do martelo de cavilha.
d) Máscara de cavilha.
e) Armas de fogo.

São exceções:

a) O abate de acordo com rituais religiosos.


b) Abate de emergência.

No Brasil, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA)


regulamento os procedimentos de abate (IN nº 3, janeiro de 2003, MAPA):

– Concussão cerebral (pistola);


– Eletronarcose;

– Atmosfera Modificada;

– Abate religioso.

Procedimentos proibidos:

– Marretada; 113

– Choupeamento;

- Corte da medula espinhal (espaço atlantoccipital);

- Permitido apenas para búfalos.

Uso de pistola para insensibilização no abate animal.

No entanto, os Estados também legislam sob tais aspectos. No Estado de São Paulo,
por exemplo, estes procedimentos são regulamentados de acordo com a Lei número 7705/1992,
onde são proibidos os usos da marreta e do método de choupagem, além de outros cuidados
com relação ao emprego da escaldagem para alguns animais, uso de choque, abate de fêmeas,
entre inúmeras questões de importância sobre este tema:
Lei N.º 7.705, de 19 de fevereiro de 1992

Estabelece normas para abate de animais destinados ao consumo e dá providências


correlatas.

O GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO: 114

Faço saber que a Assembleia Legislativa decreta e eu promulgo a seguinte lei:

Artigo 1º - É obrigatório em todos os matadouros, matadouros-frigoríficos e


abatedouros, estabelecidos no Estado de São Paulo, o emprego de métodos científicos e
modernos de insensibilização aplicados antes da sangria, por instrumento de percussão
mecânica, por processamento químico (gás CO2), choque elétrico (eletronarcose), ou ainda por
outros métodos modernos que impeçam o abate cruel de qualquer tipo de animal destinado ao
consumo

§ 1º - É vedado o uso de marreta e picada do bulbo (choupa), bem como ferir ou


mutilar os animais antes da insensibilização.

§ 2º - Nos casos em que se utilizar tanque de escaldagem, a velocidade do trilho aéreo


será regulada de forma a impedir a queda de animais ainda vivos, nestes recipientes.

Artigo 2º - O boxe deverá ser adequado para o uso do equipamento do abate de


método científico, visando à contenção de um animal por vez.

§ 1º - O fechamento da comporta do boxe somente será efetuado após a entrada total


do animal naquele compartimento, evitando-se assim que a comporta venha atingir e ferir parte
do corpo do animal.

§ 2º - O choque elétrico, para mover os animais no corredor de abate, terá a menor


carga possível, usado com o máximo critério e não será aplicado, em qualquer circunstância,
sobre as partes sensíveis do animal, como mucosa, vulva, ânus, nariz e olhos.
Artigo 3º - É vedado o abate de fêmeas com mais de dois terços do tempo normal de
gestação ou em parto recente, ou ainda, de animais caquéticos ou que padeçam de qualquer
enfermidade, que torne a carne imprópria para o consumo.

Artigo 4º - É vedado o abate de qualquer animal que não tenha permanecido pelo
menos 24 horas em descanso em dependências adequadas do estabelecimento.

§ 1º - O período de repouso poderá ser reduzido quando o tempo de viagem não for
superior a duas horas e os animais forem procedentes de campos, mercados ou feiras, sob 115
controle sanitário e permanente.

§ 2º - O repouso, em qualquer circunstância, não será inferior a 6 horas.

§ 3º - Durante o período de repouso o animal será alimentado somente com água.

Artigo 5º - O corredor de abate será adequado à espécie do animal a que se destina,


visando facilitar seu deslocamento, sem provocar ferimentos ou contusões.

Parágrafo único - O animal que cair no corredor de abate será insensibilizado no local
onde tombou, antes de ser arrastado para o boxe

Artigo 6º - Os animais, quando estiverem aguardando o abate, não poderão ser alvos
de maus tratos, provocações ou outras formas de falsa diversão pública, ou ainda, sujeitos a
qualquer condição, que provoque estresse ou sofrimento físico e psíquico.

Artigo 7º - Os animais doentes, agonizantes, com fraturas, contusões generalizadas ou


hemorragias, deverão ser abatidos de forma emergente, no local e com métodos científicos.

Artigo 8 º - Não será permitida a presença de menores de idade no local de abate nem
de pessoas estranhas ao serviço, salvo funcionários autorizados, representantes de órgãos
governamentais e membros de associações protetoras de animais, mediante autorização dos
Serviços de Inspeção, desde que estejam devidamente uniformizados.

Artigo 9º - Para efeito desta lei, são aplicáveis as seguintes definições:

I - Matadouro Frigorífico - é o estabelecimento dotado de instalações completas para o


abate de várias espécies vendidas em açougue com o aproveitamento dos subprodutos não
comestíveis, possuindo instalações de frio industrial;
II - Matadouro - é o estabelecimento dotado de instalações adequadas para o abate de
quaisquer espécies vendidas para o açougue com ou sem dependências para a industrialização;

III - Abatedouro - é o estabelecimento dotado de instalações para o abate de aves,


suínos, com peso máximo de 60 quilos, coelhos, ovinos e caprinos;

IV - Animais de Consumo - diz-se dos animais de qualquer espécie destinados à


alimentação humana ou de outros animais;

116
V - Métodos Científicos - são todos aqueles processos que provoquem a perda total da
consciência e da sensibilidade previamente a sangria;

VI - Métodos Mecânicos - são aqueles que se utilizam de pistolas mecânicas de


penetração ou concussão que provocam coma cerebral imediato;

VII - Métodos Elétricos - são os que se utilizam de aparelhos com eletrodos que
provocam uma passagem de corrente elétrica pelo cérebro do animal, tornando-o inconsciente e
insensível (eletronarcose);

VIII - Métodos Químicos - é o caso do emprego do CO2 (dióxido de carbono) em


mistura adequada com o ar ambiental, que provoque a perda de consciência dos animais.

Artigo 10º - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e
municipal, o não cumprimento do estabelecido nesta lei sujeitará o infrator às seguintes sanções:

I - multa simples ou diária, nos valores correspondentes, a 10 (dez) e no máximo, a


1000 (mil) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo - UFESPS, ou por outro índice que a venha
substituir, vigente na data da infração ou no dia imediatamente posterior, agravada em casos de
reincidência específica, vedada a sua cobrança pelo estado, se já tiver sido aplicada pela União
ou Município multa pela mesma infração;

II - perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo estado;

III - perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em


estabelecimentos oficiais de crédito, instituídos pelo Poder Público Estadual.

IV - suspensão temporária de suas atividades, até 60 (sessenta) dias, por ato do


Secretário de Estado competente;
V - suspensão definitiva de sua atividade, por ato do Governador do Estado, desde que
ocorra qualquer das seguintes hipóteses:

a) reincidência continuada, caracterizada pela ação ou omissão inicialmente punida;

b) dolo, mesmo eventual;

c) infração reiterada no período noturno, em domingo, feriado, e dia declarado ponto


facultativo estadual;
117
d) danos permanentes à saúde humana;

e) emprego reiterado de métodos cruéis na morte de animais.

§ 1º - O valor das multas referidas no inciso I deste artigo será cobrado em dobro, se a
infração tiver sido praticada no período noturno, em domingo, feriado ou em dia declarado ponto
facultativo estadual.

§ 2º - Nos casos previstos nos incisos II e III deste artigo, o ato declaratório da perda,
restrição ou suspensão caberá à autoridade administrativa ou financeira que concedeu os
benefícios, incentivos ou financiamentos, mediante a respectiva comunicação, de
responsabilidade da autoridade competente.

§ 3º - A suspensão temporária referida no inciso IV poderá ser interrompida por ato do


Secretário de Estado, no caso de comprovada a reparação do fato motivador da sanção.

Artigo 11 - Os órgãos e instituições públicos responsáveis pela aplicação desta lei


deverão comunicar ao Ministério Público, de imediato, a inobservância de suas exigências e de
seu regulamento.

Artigo 12 - O disposto no artigo 1º e no "capítulo" do artigo 2º desta lei, será exigido a


partir do décimo segundo 12º mês de sua vigência.

Parágrafo único - O prazo referido neste artigo poderá ser prorrogado por até doze
meses, a juízo da autoridade competente e mediante requerimento do interessado, desde que
devidamente comprovada à impossibilidade técnica de adaptação de suas instalações e
equipamentos às exigências contidas no artigo 1º e no capítulo do artigo 2º desta lei.

Artigo 13 - O poder executivo regulamentará o disposto nesta lei no prazo de 90


(noventa) dias, contados de sua publicação, e estabelecerá o procedimento administrativo e os
agentes públicos para a sua aplicação, bem como o valor das multas e o prazo de suspensão
temporária de atividade, referidos nos incisos I e IV do seu artigo 10º, de acordo com a
gravidade da infração.

Artigo 14 - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação.

Palácio dos Bandeirantes, 19 de fevereiro de 1992


118
FONTE: Disponível em:
<http://www.cda.sp.gov.br/www/legislacoes/popup.php?action=view&idleg=22>
10 ANIMAIS DE COMPANHIA E BEA

Diferentes espécies animais são tidas como de companhia ao homem, sendo que às
mais populares, sem dúvida sejam o cão e o gato. Em alguns casos, mesmo animais
normalmente observados como de produção podem ser encontrados servindo como de
119
companhia.

No caso de cães e gatos tem sido talvez, muito mais comum verificar as discussões
sobre bem-estar, mescladas a assuntos como abandono, maus tratos e controle populacional
destes, em especial nos centros urbanos. Os movimentos de proteção animal já vêm ganhando
força há alguns anos no Brasil e paralelamente os grupos e profissionais que buscam
estabelecer e aplicar os princípios do BEA.

Nos últimos anos houve uma mudança significativa na importância dos animais de
companhia em relação ao indivíduo e a família. Um conceito mais emocional e subjetivo vem
sendo atribuído cada vez mais ao animal, até mesmo uma atribuição de caracteres nitidamente
comuns ao gosto e as necessidades do homem, que passa a tratá-lo muitas vezes como a si
mesmo, passando a preocupar-se com não somente a saúde do mesmo, sua higidez física e de
BEA, mas de regalos que em princípio lhe seriam desnecessários – roupas, acessórios, serviços
de hotelaria e lazer, entre outros, o que denota certa confusão sobre o que significa a qualidade
de vida de um animal.

Por um lado, isto favoreceu que alguns estudos passassem a ser encarados como
mais facilidade e até com a devida importância como as questões psicológicas e de
comportamento destes animais, a tal ponto que hoje serviços de atendimento ou assistência de
comportamento para animais de companhia têm sido procurados e seus especialistas
valorizados. Por outro lado, houve certa banalização do animal de companhia, que chega a ser
120
“confundido” por alguns como “acessórios de companhia” e facilmente são abandonados ou
destratados diante de insatisfações do proprietário ou qualquer problemas que o animal venha a
apresentar.

Os problemas atuais vividos pela sociedade e a violência tem se refletido igualmente


sobre os animais, que podem ser igualmente vítimas de maus tratos, descaso, crueldade e
abandono por parte de seu dono ou terceiros.

Em verdade muitas são as questões quanto ao BEA de animais de companhia desde


sua relação com o homem, até as considerações básicas como saúde, doenças, nutrição,
manejo, instalações, higiene; ainda – espécie, raça, aspectos reprodutivos e de cruzamento,
aspectos como cirurgias consideradas de estética, uso em experimentações, no esporte no
trabalho, sua comercialização, manutenção, necessidades de comportamento e problemas
sociais como o de superpopulação e seu controle. Todas estas questões dentre muitas outras
influenciam no que se pode considerar BEA destes animais, mas os pontos básicos são os
mesmos para as demais espécies – as Cinco Liberdades.

Além dos fatores muitas vezes sociais envolvidos, muitos animais ainda padecem de
ações de crueldade ou de imposição de sofrimento e estresse devido ao pensamento até mesmo
empírico e filosófico antigo de que animal não sente como o homem. Muitos simplesmente
descreem de que animais sofram de enfermidades cardíacas, respiratórias, reprodutivas e
outros, menos ainda de transtornos psicológicos ou de comportamento, possíveis inclusive de
diagnóstico e tratamento em muitos dos casos.

No Brasil, tem se buscado em especial nos grandes centros o estabelecimento de uma


conscientização da população, inicialmente com a manifestação de preocupações no controle de
animais/abandono, uso de animais em experimentação – com destino de cães abandonados
para pesquisas, por exemplo, e situações de maus tratos. As políticas atuais previstas em muitos
municípios elegem o controle populacional de cães e gatos, como medida de conter o abandono,
no entanto cresce cada vez mais o perfil de instituição de programas de saúde animal, com o
controle de população animal com:

- Campanhas de castração animal;

- Identificação e registro animal;

- Educação em saúde – combate ao abandono e maus tratos, por meio de projetos em


121
educação – POSSE RESPONSÁVEL;

- Campanhas de vacinação e saúde animal.

Mesmo assim, são inúmeros os casos de abandonos e maus tratos verificados


diariamente, registrados ou não pelos Centros de Controle de Zoonoses municipais, Canis
Municipais ou mesmo pelas forças públicas – como polícia, corpo de bombeiros, ou por
denúncias e declarações da própria população.

Em vários países, como no caso do Brasil, a questão do sofrimento de cães devido ao


desconhecimento ou à inobservância da guarda responsável torna-se central, pelo número de
animais envolvidos. A estratégia de captura e extermínio como método de controle populacional
de cães significou décadas de sofrimento adicional para cães de rua e semidomiciliados. Esta
abordagem, reconhecidamente ineficaz, vem sendo substituída por alternativas coerentes com
as recomendações de diminuição da taxa de renovação da população canina constantes do
mesmo relatório. Novas abordagens, que prezam o bem-estar humano e animal, estão em fase
de implantação em alguns Centros de Controle de Zoonoses brasileiros, como os de São Paulo
e de Curitiba. A participação da classe veterinária aparece de maneira importante, a partir de
especialistas em bem-estar animal e por meio de orientações de Conselhos, como a Carta de
São José dos Pinhais.
11 TRANSPORTE DE ANIMAIS DE PEQUENO E MÉDIO PORTE – CÃES E GATOS

Outro importante fator é o transporte de animais de companhia, em especial cães e


gatos, no trânsito municipal, intermunicipal e muitas vezes interestadual e internacional. Há
pessoas que por não poderem se locomover ou transitar com seus animais de companhia
122
durante períodos de férias, por exemplo, acabam deixando-os em condições de maus tratos em
casa – quanto à água e alimentos; ou ainda acabam abandonando os mesmos.

A única exigência atual do Ministério da Agricultura para levar cães e gatos em viagens
aéreas, rodoviárias e ferroviárias é o atestado sanitário emitido por um veterinário, além da
carteira de vacinação completa, com especial atenção a vacina antirrábica.

Profissionais registrados no Conselho Regional de Medicina Veterinária do estado de


origem do animal poderão emitir o atestado sanitário, além de providenciar a vacinação do
animal de estimação. O atestado sanitário tem validade de dez dias. Caso a viagem ultrapasse
esse tempo, será necessário novo atestado.

Para qualquer tipo de viagem - de avião, trem ou ônibus é sempre indicado contato
prévio com as empresas, pois algumas companhias têm regras diferentes.

Em geral, o transporte em ônibus de linha comercial, de uso da grande massa da


população é proibido na maioria dos municípios, no entanto o transporte por táxis, por exemplo,
ou ônibus especiais, fica a critério do proprietário dos mesmos, ou da empresa.

O comum é que, quando este


transporte é permitido, que exijam
carteirinha de saúde/vacinas do animal, o
uso de caixinha de transporte (adequada
para espécie e tamanhão do animal a ser
transportado) e alguns solicitam até
mesmo um atestado de saúde emitido por
médico veterinário. É importante destacar,
que sendo permitido este transporte,
jamais este deve ocorrer sob condições onde as categorias de BEA e as Cinco Liberdades do
mesmo não sejam respeitadas, ou seja, o animal nunca poderá ser transportado:

a) No porta-malas, mesmo que este vá aberto ou qualquer outra “solução prática”


proposta;
b) No bagageiro superior, sobre o carro ou ônibus/veículo de transporte, em
hipótese alguma, mesmo que se proponha amarrar, cobrir com lona.
JAMAIS;
123
c) No interior do carro, sob malas e outros que
impeçam condições ideais de respiração e troca caloria do mesmo.
Em condições onde sua ventilação seja diminuída, exagerada ou de
alguma forma prejudicada.
d) Caminhões de mudança em qualquer das situações
acima ou inusitadas que firam as questões de BEA. Ainda, pick ups,
caminhonetas, kombis, vans, motocicleta, bicicleta, barcos e outros veículos de transporte e
condução.
e) Em transporte aéreo, há um compartimento especial para o transporte de carga
viva, climatizada e devidamente pressurizada. A companhia aérea deve ser informada
antecipadamente, e o proprietário deve obedecer às normas e regulamentos nacionais e
internacionais (dependendo do destino do voo), bem como da própria companhia de voo.
Atualmente existem taxis especiais que realizam este tipo de transporte, principalmente
nas mais populosas. Clínicas veterinárias e muitos pet shops disponibilizam meio de transporte
aos seus clientes.

Em municípios de menor porte é pouco frequente e muitas vezes o animal acompanha


caminhando o seu proprietário, até mesmo por longas distâncias, o que também preocupa
quanto às questões de BEA. É sabido que longas caminhadas, sob temperaturas elevadas,
podem levar o cão a danos musculares severos, às vezes, irreversíveis ou mesmo à morte. A
fadiga excessiva também prejudica comumente a animais de tração.

Segue o que se dispõe atualmente para o município de São Paulo – SP, quanto ao
transporte de cães e gatos.
11.1 ORIENTAÇÃO ÀS EMPRESAS DE TRANSPORTE INTERMUNICIPAL E USUÁRIOS
QUANTO AO TRANSPORTE DE ANIMAIS DOMÉSTICOS

Nos serviços de ônibus rodoviários e suburbanos intermunicipais, do sistema regular,


de acordo com o artigo 31, item VII do Decreto 29.913, o passageiro poderá embarcar consigo
animais domésticos de pequeno e médio porte, devidamente acondicionados e de acordo com
as disposições regulamentares pertinentes. 124

O transporte do animal doméstico deve ser realizado preservando a comodidade,


segurança e conforto dos passageiros e de terceiros, bem como o bem-estar do animal, sem
acarretar alteração no cumprimento do quadro de regime de funcionamento da linha.

Os animais domésticos de pequeno e médio porte (cão e gato), com peso até oito
quilos, podem ser transportados desde que atendam as seguintes condições:

Serão transportados obrigatoriamente em contêineres, com dimensões apropriadas,


confeccionados em fiberglass ou similar, mantidas boas condições de higiene, segurança e
conforto ao animal.

O contêiner deverá ser alojado, preferencialmente, no assoalho do ônibus, próximo ao


passageiro detentor, restrito ao espaço físico de sua poltrona e deverá permanecer confinado
durante toda a viagem, sendo proibida sua acomodação no corredor.

Excepcionalmente, os animais poderão ser transportados em compartimento isolado,


desde que o ônibus disponha de local apropriado, com perfeitas condições de iluminação,
ventilação e segurança, garantindo seu bem-estar.

É vetado o transporte de animais com suas patas atadas, ou qualquer modo que lhes
produza sofrimento ou estresse.

Particular atenção deve ser dada a sua higienização e do recipiente de transporte,


preservando a comodidade e conforto dos passageiros. Se necessário, nos pontos de parada
durante a viagem, deverá ser feita nova higienização.

Antes do embarque, o passageiro detentor deverá apresentar documento firmado por


médico veterinário, atestando as boas condições de saúde do animal, emitido no máximo 15 dias
antes da data da viagem.
Deverá ainda apresentar carteira de vacinação atualizada, na qual constem pelo
menos as vacinas, antirrábica e polivalente.

Lembramos que o animal, a critério de seu dono, poderá ser sedado durante a viagem.
Recomenda-se, para tanto, seguir a orientação de um médico veterinário.

Na excepcionalidade do transporte de aves e animais silvestres, da fauna brasileira,


deverá ser respeitada a regulamentação do IBAMA.

125
Não será permitido o transporte de animal que por sua espécie, tamanho, ferocidade,
peçonha ou saúde, comprometa o conforto e a segurança do veículo, de seus ocupantes ou de
terceiros.

Havendo qualquer manifestação ou nova notícia fundamentada de omissão, no que


tange a maus tratos, pode ser pedida a alteração dos termos destas INSTRUÇÕES.
12 O PAPEL DOS ANIMAIS NA SOCIEDADE

O ser humano sempre viveu rodeado de animais, adaptando-se a estes e vice-versa,


consoante as suas necessidades. Atualmente e mais do que nunca, os animais de companhia
exercem um função de extrema importância na sociedade, ajudando a preencher lacunas que a
126
própria sociedade criou. Por vezes com alguns exageros, não tendo em linha de conta o bem-
estar, a etologia e a psicologia animal.

Um animal de companhia não é um "objeto" descartável à medida da nossa


conveniência, nem um brinquedo para os nossos filhos. Ter um animal de companhia significa
assumir uma responsabilidade. Por isso é preciso pensar bem antes de adquirir ou adotar um
animal; é preciso saber se estamos dispostos a assumir essa responsabilidade
incondicionalmente.

Como animais de companhia podem ter uma gama muito variada desde hamsters,
chinchilas, papagaios, canários, porcos, iguanas, cágados, coelhos, cães, gatos, mas, sem
dúvida os gatos e os cães são os preferidos, pela forma como interagem com o ser humano.

No norte da América e Europa existem mais gatos que cães, como animais de
companhia, uma das razões é o gato doméstico continuar a ser uma espécie autossuficiente e
independente, tornando-se mais adaptável para quem tem uma vida mais ocupada.

Por sua vez o cão, inicialmente utilizado como animal de trabalho rapidamente adquiriu
o status como uma das principais escolhas como animal de companhia, sem nunca esquecer às
suas competências, como animal de trabalho. A dupla capacidade de o cão ser um animal de
companhia e ao mesmo tempo utilizar competências em auxílio ao seu dono, tornam-no único.

Muitos dos “trabalhos” efetuados pelos cães são de grande importância humanitária, e
alguns deles podem mesmo ser desenvolvidos por cães sem serem de raça pura, pela maioria
dos cães, exemplos de algumas destas atividades:

 Conduzem o gado/ovelhas e protegem-nos: cães de pastoreio;


 Policiam propriedades, auxiliam as forças públicas: cães de guarda e de defesa;
127

 Farejam e detectam substâncias ilícitas: cães de pista;

 Caçam: cães de caça (várias raças);

 Guiam cegos: cães-guia;


128

 Procuram e salvam pessoas perdidas ou em escombros: cães de busca e de


faro;

 Confortam doentes: utilização de cães em terapia hospitalar (cães de


assistência);

 Ouvem pelos surdos;


129

 Ajudam deficientes motores em simples trabalhos domésticos (cão-de-serviço);

 Práticas desportivas;

 Ou simplesmente acrescentam um brilho na vida de centenas de milhares de


pessoas espalhadas por todo o mundo.
130
Atualmente existem escolas e associações que proporcionam um ensino sério e
completo dos cães. O ensino e o treino moderno não podem prescindir do conhecimento
de estudos etológicos e psicológicos realizados sobre o cão.

Para uma melhor e mais útil integração do cão na sociedade é necessário saber
comunicar e saber entender o animal. Comunicação pressupõe compreensão:

Nenhum cão compreenderá o homem se não passar por duas fases básicas, ambas
ligadas à sua Primeira (1ª) infância:

 Imprinting - processo que ocorre entre a 3ª e 7ª semana de vida do animal;

 Socialização – processo que ocorre entre a 8ª e 12ª semana de vida;


13 CONCEITO DE ETOLOGIA – COMPORTAMENTO ANIMAL

I) IMPRINTIG:
O cachorro começa a reconhecer como seres a todos os animais (incluindo o homem)
que interagem com ele neste período. Se o cachorro não fizer o imprinting com outros cães, ele
131
por meio do olfato irá reconstituir essa imagem. Se o cachorro não fizer o imprinting com o
homem, esse processo será irreversível, pois não reconhecerá animais que não pertençam à
outra espécie que não a sua.

Imprinting – importante contato com outros cães e animais de outras espécies, em


especial o homem.
IMPORTANTE: o cachorro nesta fase deve ter o máximo de atenção, ter frequentes
contatos visuais, táteis, olfativos e auditivos, com várias pessoas distintas.

II) SOCIALIZAÇÃO:
É a escola de vida de um cão. O cão percebe que existem leis precisas; que existe
hierarquia (superiores e inferiores hierárquicos) - que tem de obedecer aos primeiros e que os
segundos podem ser mandados, muito importante para futuros cães de trabalho.
Uma socialização incorreta não é irreversível como no imprinting, no entanto pode ser
132
difícil de mudar, exigindo paciência, trabalho e muitas vezes o empenho de sentimentos para
com este animal - amor. “Não é fácil fazer o papel de soldado, um cão que se julga general”.

Cão devidamente socializado não mostra comportamento agressivo.

Cãezinhos – comportamento natural – cãozinho alfa (dominante) e os demais


observam.

Um cachorro que passou bem pela fase de imprinting e socialização possui as bases
indispensáveis para comunicar com o homem. Cabe ao homem, agora construir as suas regras,
apoiadas na etologia e psicologia canina, e constituir relações mais saudáveis com base nas
considerações do bem-estar animal.

133
14 ENSINO DE CÃES

Entende-se por adestramento o ensino de um trabalho especializado. Este começa


normalmente pelos oito a nove meses. Nesta idade é possível ensinar-lhe quase tudo para virem
a ter muitos desempenhos, exceto alguns exercícios físicos como saltos específicos por exigirem
134
já um desenvolvimento físico completo do animal ou mesmo aprendizagem de formas de ataque,
que requerem e exigem que o animal já tenha completado o seu desenvolvimento psíquico.

No entanto, animais mais velhos também são capazes de aprendizados, assim como
animais que já passaram por outras experiências. O cão pode ser adestrado ou educado, assim
como outras espécies animais. O respeito às atitudes inerentes de cada espécie e o
aproveitamento disto como forma e parte da aprendizagem é importante.

Os métodos de ensino ao animal podem e devem incluir a disciplina, no entanto, esta


não deve ferir suas atitudes e comportamento normais em determinadas situações. Não devem
coibir sua natureza. Métodos educativos ou de adestramento não são sinônimos de brutalidade
ou de crueldade contra o animal.

Adestramento canino.

Ainda, há que se ter especial conhecimento e controle técnico dos métodos, pois
animais, em especial treinados para defesa podem adquirir comportamentos mais acentuados
onde a falta de controle pode representar perigo, muitas vezes pelo porte e força do animal, ou
do próprio comportamento daqueles que interagem com este. Animais de comportamento tímido
e arredio, não somente aqueles destemidos e sem inibições, são animais, que por força de sua
necessidade de se proteger, quando sem controle ou o devido acompanhamento podem acabar
promovendo ataques e acidentes indesejáveis.

O adestramento é muito procurado, em especial para animais para defesa, ou ainda de


exibição ou de trabalho e esporte. Os aspectos mais relacionados a ensino de condutas de
“educação” ao cão, por exemplo, são mais relacionados com o interesse de seu dono com intuito
de disciplinar atividades, e muitas vezes o próprio dono procura executar, como:
135
 Comportamento durante o passeio;
 Onde o animal pode ou não subir, deitar e dormir;
 Onde deve urinar ou defecar.

Além do adestramento profissional, os cuidados e ensino, educação por parte do


proprietário do animal são fundamentais. De forma geral os proprietários procuram educar seus
animais com hábitos de higiene – locais onde devem ou não urinar e defecar; regularidade e
horários de alimentação. Questões de obediência – simples – são fundamentais para um bom
desenvolvimento do animal, assim como a sua socialização; ainda o ambiente, as pessoas, as
condições oferecidas ao animal o convívio com outros animais.
15 SENCIÊNCIA ANIMAL

Por certo, pela proximidade nos pareça mais fácil admitir “sentimentos” aos animais de
companhia, mas este tipo de pensamento nem sempre foi assim. Nos últimos tempos, a
sociedade tem admitido mais facilmente a capacidade de sentir dos animais, muito embora ainda
136
encontremos com frequência pessoas que se admiram quando se deparam com afirmações a
respeito da consciência e dos sentimentos dos animais, mesmo os mais próximos e comuns,
como os cães e gatos.

O próprio conceito de inteligência é ainda muito discutido pelas pessoas em geral, que
nem sempre acham natural estes “atributos” em um animal. Infelizmente, ainda é comum
também encontrarmos com indivíduos que consideram, mesmo as atividades mais básicas,
como comer, beber, andar e mesmo ficar doente, como situações de menor importância ou de
menor necessidade, quando comparado ao humano.

Os sentimentos de um animal constituem uma parte extremamente importante de seu


bem-estar. O sofrimento é um sentimento negativo desagradável que deve ser reconhecido e
prevenido sempre que possível. Entretanto, apesar de existirem muitas formas de se medir
ferimentos, doenças e tentativas fisiológicas e comportamentais de adaptação ao ambiente,
poucos estudos relatam informações sobre os sentimentos dos animais. Alguns são observáveis,
no entanto, no cotidiano com o animal, a tristeza diante da saída de seu proprietário, e a
manifestação de alegria quando do retorno do mesmo. A inclusão de um novo animal em um
domicílio onde já há a presença de outro, e muitas vezes a manifestação de “insatisfação” do
primeiro animal com atitudes que podem ir desde a agressão, a tristeza/apatia, indiferença,
inapetência e a não aceitação com problemas de convívio incontornáveis entre o novo membro e
o primeiro animalzinho.

Os sentimentos são aspectos da biologia de um indivíduo que devem ter evoluído para
auxiliar o indivíduo a sobreviver, exatamente da mesma maneira que ocorreu a evolução de
aspectos de anatomia, fisiologia e comportamento. Assim, não seria lógico enfocar apenas
sentimentos, excluindo outros mecanismos, quando se define bem-estar. Se a definição de bem-
estar fosse restrita aos sentimentos de um indivíduo, não seria possível se fazer referência ao
bem-estar de uma pessoa ou de um indivíduo de outra espécie que não tenha sentimentos por
estar dormindo, anestesiado, medicado ou sofrendo de uma doença que afete a consciência. Se
somente sentimentos fossem considerados, aspectos como as respostas fisiológicas extremas,
anormalidades comportamentais, imunossupressão, doença, incapacidade de crescer ou se
reproduzir, ou ainda redução da expectativa de vida, não seriam tidas como evidências de
pobreza de bem-estar, a menos que se pudesse demonstrar relação a sentimentos ruins.

O sentimento manifesto por muitos animais, com a saída do proprietário da casa, e sua
alegria ao retorno, pode ir além da simples tristeza/alegria. Considerando a história natural dos
137
canídeos devemos considerar aspectos importantes da história natural destes animais, de seu
comportamento natural, independente de sua relação com humanos. O que pode parecer
“chocante” a alguns proprietários que imaginam apenas a manifestação dos sentimentos
tristeza/alegria. O cãozinho pode apenas estar manifestando sua confusão diante de um membro
de seu grupo (matilha) não estar ou sob seu domínio, ou momentaneamente deixando de lhe
oferecer “proteção/direção”. Os cães têm comportamento de dominância, formam
grupos/matilhas, que devem ser considerados, assim como outros comportamentos, quando
consideramos avaliação de bem-estar e seus sentimentos.

OS CANÍDEOS - GRUPOS E MATILHA - ORGANIZAÇÃO HIERÁRQUICA

Supõe-se que o primeiro parente dos canídeos apareceu no Plioceno há cerca


de 10 milhões de anos, mas o atual cão (Canis familiaris) tem apenas 16 mil anos de
idade. Apesar de seu comportamento etológico na natureza, sua domesticação, traz um
problema ao analisar simplesmente o comportamento do cão: o seu contato diário com o
homem, a sua enorme capacidade de adaptação a um meio artificial, a sua falta de
liberdade na seleção sexual e uma série de outros condicionantes. Ainda que doméstica,
a espécie canina, apresenta um grande número de comportamentos que teria em
liberdade.

Formação de Grupos e Matilha

Define-se matilha como sendo um grupo estável e duradouro que se mantém,


salvo em muito raras exceções, no mesmo território. Com a domesticação, o homem foi
selecionando e aperfeiçoando as raças em função das suas próprias necessidades.
Apesar de existirem atualmente centenas de raças caninas o seu código genético é
exatamente o mesmo quer sejam Pinschers miniaturas ou Grand Danois.

138

Organização hierárquica nos cães

O conceito de hierarquia implica uma relação em “pirâmide” entre os membros


de uma matilha (grupo de cães). Os cães formam grupos estáveis e duradouros à
semelhança do que acontece nas alcateias de Lobos, nestas, a autoridade absoluta é de
um macho dominante, na sequência, vem uma fêmea, subordinada ao macho, mas que
ocupa o segundo grau na hierarquia e que, no caso dos Lobos, só pode ser coberta pelo
dominante. Depois destes dois “patriarcas” a pirâmide hierárquica completa-se com os
machos e fêmeas subordinadas. Existem alcateias de lobos, onde a dominância é
exercida por uma fêmea dominante, mas o normal é que a autoridade absoluta seja
exercida pelo macho dominante.

Em Psicologia Experimental chama-se Alfa ao indivíduo dominante e Beta ao


subordinado. O Alfa, para se impor, produz a maior parte das comunicações e agressões
que se manifesta entre os dois. Também quando se disputa uma fonte de recurso é o
Alfa que invariavelmente a consegue. Uma vez estabelecidas às posições hierárquicas, a
agressividade deixa de estar presente em quase todos os seus atos sociais.

Para manter estas relações sem necessidade de enfrentamentos diretos e


constantes, o cão desenvolveu uma linguagem corporal que estabelece claramente,
“quem manda”, nas interações cotidianas. Isto se verifica entre filhotes, que logo
estabelecem esta relação, ainda entre animais que convivem em um mesmo espaço; e
mesmo do cãozinho em relação a sua nova “família”, quando é levado como um animal
de companhia.

139

O cão quando no convívio familiar logo estabelece o restante da família, como


membros de seu grupo, ou seja, de sua matilha. A saída de seu dono/proprietário faz
com que ele fique confuso – tanto como Alfa ou como Beta, em termos de parte dessa
“matilha”.

Felídeos são caçadores natos, e o gato doméstico mantém este hábito, caçando
pássaros, roedores, insetos. Na natureza, o êxito de uma caça é compartido com a família e os
demais membros do grupo, no caso do gato doméstico seu êxito deve ser compartilhado com a
família, por isso muitas vezes, os resultados de suas caças são encontrados como tributos ao
seu dono, membro do “grupo”, e é quando os proprietários eventualmente podem se deparar
com lagartixas, baratas e outros sobre suas camas e sofás. A atitude do animal, neste caso é de
pura manifestação de alegria e satisfação por seu êxito, que na maioria das vezes é entendida
como hábitos não interessantes pelo dono do animal, que geralmente os punem com castigos.
Ainda em gatos domésticos a introdução de novos membros no grupo pode não ser
uma tarefa fácil, estes exercem sua dominância territorial fortemente e demarcam territórios
igualmente.

Gatos são territorialistas e precisam ser introduzidos a outros animais lentamente para
que possam se acostumar um com o outro antes de um confronto. Uma introdução lenta ajuda a
evitar o desenvolvimento de problemas relacionados ao medo e à agressividade, estas podem
ser difíceis de reverter. É claro que alguns gatos são mais sociáveis que outros. Por exemplo,
140
um felino de oito anos que nunca esteve próximo de outros animais pode não aprender a dividir
seu território (e suas pessoas) com outros animais na residência. No entanto, um filhote de oito
semanas que acaba de ser separado de sua mãe e irmãos pode ficar contente em encontrar um
cão ou gato como companhia.

Em algumas áreas da pesquisa em bem-estar animal, a identificação experimental das


experiências subjetivas de um animal é difícil, como no caso dos efeitos de doenças, na
interpretação de preferências ao se testar alimentos e medicamentos. Já outras questões, como
preferência sobre as melhores condições para os animais – como estar com outros animais,
dormir, comer, o que comer, condutas de manejo das pessoas em relação ao animal, fornece
informações sobre as experiências subjetivas dos animais. Os estudos de preferência e o
monitoramento direto do bem-estar exercem função central na pesquisa sobre bem-estar animal.
16 COMPONENTE ANIMAL

No entanto, para avaliações de BEA, há necessidade da consideração etológica com


base nos conhecimentos científicos e para os animais de companhia se consideram:

- Sistemas de comportamento (etogramas); 141

- Necessidades sociais inter específicas e de estrutura social;

- Necessidades de desenvolvimento, que variam dependendo da fase d


desenvolvimento do animal;

- Necessidades de aprendizado, em termos do que se espera do animal em um


ambiente humano;

- Necessidades específicas ou individuais da espécie, raça, sexo ou idade.

Os critérios para um comportamento esperado como normal para um animal em


particular está relacionado com sua espécie, raça, idade e sexo. E, obviamente, quando
problemas são encontrados, estes não necessariamente indicam que há algum tipo de ato de
mau trato ou crueldade do proprietário envolvido, mas pode indicar algum fato desconhecido ao
dono, falta de conhecimento sobre determinado aspecto. Atualmente as necessidades quanto ao
bem-estar do animal tomam lugar aos aspectos que causam “medo e dor” ao animal, pois um
compromisso maior quanto a atender um melhor bem-estar do animal, pode preencher mais
adequadamente lacunas de necessidades não manifestas pelo animal em situações apenas de
“medo e dor”. Cientistas e pesquisadores são capazes de distinguir entre “necessidades”e
comportamento do animal – necessidades normais ou esperadas para determinado animal em
relação a comportamentos aceitáveis ou não pelo proprietário, mas tidos como “normais”para
aquele animal – daquela espécie, raça, idade, sexo e outras características específicas.

O comportamento anormal é caracterizado por ocorrer em minoria em uma


determinada população de espécie/raça animal. Este é perigoso tanto ao animal quanto ao
homem, em muitos casos, podendo ocorrer extremos do conhecido padrão normal do
comportamento animal – exemplo – cães de guarda/defesa – animal exageradamente agressivo.

Há ainda comportamentos induzidos pelo humano, de modo que levem o animal a se


opor a necessidades básicas de determinada espécie ou raça.

Um problema já comentado anteriormente é o fato de que os proprietários muitas


vezes podem interpretar determinados comportamentos animais de modo não profissional ou
científico, e em alguns casos traduzi-lo de forma incorreta, exagerada ou subestimada. Isto pode 142
gerar erros na condução de disciplinas e educação de um animal, dificultando por vezes o
convívio e adaptação deste animal com as pessoas e, consequentemente naquilo em que se
considera bem-estar.

As avaliações sobre bem-estar, como estudadas anteriormente, são questões


profissionais e analisadas sob critérios científicos, a visão não técnica ou profissional sob um
dado comportamento, pode distorcer a realidade do quadro de bem-estar verdadeiro do animal.

Pessoas sem um treinamento profissional podem confundir aspectos biológicos do


animal, como uma habilidade deste para adaptação, socialização, dessensibilização de
situações. Quando apenas se avaliam ou se verificam um roll de comportamentos esperados,
sem a consideração de aspectos biológicos, fatalmente se incorrerão em erros na avaliação do
bem-estar desse animal. Uma adaptação apropriada de um animal comumente é acompanhada
da ausência de problemas de comportamentos; injúrias/lesões; doenças; sinais de estresse –
alteração de pulso, apetite, respiração, libido, ansiedade ou depressão.
17 COMPONENTE HUMANO

O componente humano não se refere apenas as atitudes da pessoa em relação ao


animal, mas ao ambiente proporcionado a este, que é um ambiente humano, sem dúvidas, mas
que deve preencher as necessidades básicas deste animal.
143
O enriquecimento do ambiente, de modo a atender estas necessidades, como
comedouros e bebedouros adequados, brinquedos, petiscos e outros, podem causar certo
desconforto financeiro para alguns proprietários, que nem sempre estão predispostos a este tipo
de aplicação prática do bem-estar do animal. No entanto, mesmo para aqueles que se
preocupam com estes aspectos, podem ocorrer momentos em que os pensamentos como de
René Descartes – de animais – automatas, os levem a recolher e guardar, por exemplo, todos os
brinquedos do animal, “até que estes necessitem novamente dos mesmos”. Em verdade, estes
brinquedos só estarão disponíveis novamente, quando o proprietário se lembrar ou desejar que
seu animal brinquedo, neste caso satisfazendo seu próprio bem-estar.

Além do enriquecimento ambiental, a higiene, facilidade de manejo, disponibilidade de


espaço para o animal se exercitar; disponibilidade de alimento, água e aspectos relativos às
necessidades básicas, são componentes humanos, ou que partem da pessoa para o animal.

17.1 ABANDONO, MAUS TRATOS E CONTROLE POPULACIONAL DE ANIMAIS

Por diferentes razões – sociais, culturais, econômicas, individuais, e até falta de


informações, uma pessoa pode acabar abandonando seu animal de estimação. Considerando,
somente aspectos de ligação emocional, sentimental, a senciência de um animal, já admitida
anteriormente, um animal em situação de abandono deve apresentar um grau de pobreza de seu
bem-estar. As adaptações nem sempre são possíveis do animal frente a estas situações de
desafios na sua maioria novos e nunca antes experimentados pelo mesmo. O grau de frustração
e nível de carências diversas, fora as emocionais podem ser supostas observando o
comportamento de animais perdidos nesta situação na rua – medo, visível ansiedade,
desorientação, sinais de doenças, às vezes, lesões físicas/traumas, fome e sede.

O abandono, em si, seja qual for à razão, se avaliado pode levar a índices prováveis de
baixíssimo bem-estar. As questões morais são muitas vezes renegadas por parte dos indivíduos
que racionalizam o problema, renegando-o a um segundo plano, e comparando-o a outras
144
situações graves como o abandono e sofrimento infantil ou mesmo de idosos. Considerando a
senciência dos animais, os Direitos dos Animais, as questões científicas já comprovadas quanto
a bem-estar, a ética e a moral, atualmente a questão do abando se torna inadmissível a uma
sociedade que pretenda um status de no mínimo em desenvolvimento ou que queira se
desenvolver seja em qual aspecto for.

Há circunstâncias ainda que envolvam desde a agressão física, a que mais


comumente as pessoas se referem, até mesmo impor ao animal a fome, a sede, danos
psicológicos – como a desatenção e mesmo de amor/carinho, por parte de quem trata do
mesmo. Inegavelmente o sofrimento físico e psicológico, na maioria das vezes combinadamente
colabora para um índice cada vez mais baixo de bem-estar em animais vítimas de maus tratos
ou de abandono.

O abandono é uma forma de mau trato, existindo de várias formas – desde se colocar
o animal simplesmente para fora de casa, como também, o abandono longe das imediações do
domicílio, procurando evitar que o animal retorne; há ainda o abandono “premeditado” em que, o
animal é deixado em clínicas e pet shops por seus próprios donos. Os quais não retornam para
recuperá-los, ou até mesmo levados por seus proprietários e abandonados sem causas
aparentes em canis municipais ou Centros de Controles de Zoonoses.
145

As causas mais comuns de abando, entretanto, alegadas, muitas vezes são:

- Idade – cães já idosos ou filhotes, ainda muito novos e que dão trabalho ou choram
muito;

- Animais em fase de crescimento ou jovens adultos – com hábitos de “destruição” de


objetos, plantas e outros;

- Nascimento de um bebê – e o “medo” de contato da criança com animais,


transmissão de doenças, alergias, ou de agressão por parte do animal a criança;

- Crianças pequenas no domicílio;

- Separação de casais;

- “Alergias” em algum membro da família;

- Animais doentes;

- Falta de condições financeiras;

- Animal mordedor e agressor;

- Cão que late muito;

- Não querer mais o animal

- Desconhecimento dos direitos dos animais e de legislação que os ampara;

- Outros.
De qualquer forma, anterior à vontade ou necessidade manifesta do proprietário, em
não querer mais o animal, ou sua intenção de abandoná-lo, este deve procurar conhecer
primeiramente as suas obrigações legais para com qualquer animal que venha a comprar, adotar
ou ganhar, que passe, enfim a ser de sua responsabilidade. Os animais encontram-se
amparados por legislação federal e estadual, ainda e muito mais importante, o indivíduo precisa
conhecer seus deveres quanto a POSSE RESPONSÁVEL de um animal, devendo antes de
tudo, antes de adquirir um animal, conhecer suas necessidades e características.
146
O abandono ainda traz consequências à sociedade bastante significativa, no tocante à
saúde pública. Animais têm potência de adquirir determinadas enfermidades dos homens e de
transmiti-las, ou senão de manter o ciclo das mesmas, ativos nas regiões onde prevalecem.

Assim, o abandono é uma responsabilidade social importante e que chama a atenção


de um número cada vez maior de pessoas, preocupadas seja com o bem estar dos mesmos,
pelo sofrimento observado e que desperta a atenção de muitos ou ainda por questões éticas
profissionais, éticas e morais do próprio homem. O interesse ético profissional tem levado a
discussões e estudos científicos quanto a bem-estar e comportamento; mas não se pode ignorar
que a pressão comercial tem exercido diferença na velocidade de alteração de alguns
pensamentos, em especial com os animais de produção.

Sem dúvida, questões sociais, como a saúde pública e o potencial zoonótico dos
animais, têm caracterizado movimentos e projetos que levem a um controle populacional dos
animais nas comunidades urbanas e mesmo nas rurais.
A saúde pública é o que a sociedade faz coletivamente para assegurar as condições
nas quais as pessoas podem ser saudáveis, o conjunto de práticas e saberes que objetivam um
melhor estado de saúde possível das populações.

O controle populacional de cães e gatos está inserido na área de saúde pública, sendo
as ações relacionadas à promoção da saúde executadas tanto por órgãos governamentais como
por organizações não governamentais. No Brasil as organizações não governamentais têm
desempenhado importante papel na mudança de alguns perfis do controle populacional de cães
147
e gatos, com maior discussão do controle ético dos animais de estimação, procurando a
promoção da saúde, na comunidade como um todo, considerando que esses animais têm
assumido importância cada vez maior na família, inclusive para a manutenção da saúde mental
de nossa sociedade, ajudando a manter o equilíbrio emocional do indivíduo e colaborando de
diferentes modos no bem-estar do próprio homem.

Os cães e gatos interferem na promoção da saúde, positiva ou negativamente,


dependendo da responsabilidade do proprietário (posse responsável) e das políticas públicas
implantadas, sejam para a estabilização dessas populações e prevenção das zoonoses e demais
agravos que esses animais possam produzir ao indivíduo e coletividade, seja para o bem-estar
dos próprios animais. Politicamente os animais devem ser analisados não somente como
transtornos sanitários, em especial quando do descontrole de sua população seja por cães não
domiciliados (sem donos e abandonados) ou semidomiciliados (animais que têm donos, porém
têm acesso às ruas). O transtorno sanitário é entendido em especial pelo potencial de agente
transmissor de enfermidades zoonóticas que os animais de estimação apresentam, mas há
ainda o transtorno no número em si de animais circulando pelas ruas, a procura de alimentos
nos lixos, invasão de domicílios e outros, fêmeas em cio atraindo machos e complicando trânsito,
trazendo inclusive risco de acidentes. Mas o transtorno moral, ético e social tem forçado o
pensamento e movimento que buscam não só as soluções pelo controle populacional destes
animais, mas pelo seu bem-estar e garantia de seus direitos.
148

Animais abandonados, semidomiciliados, comunitários (tratados pelos moradores da


rua, sem serem efetivamente adotados) ou mesmo os domiciliados não esterilizados (castrados)
ou não devidamente controlados por seus proprietários podem representar um grande problema
no que se refere à reprodução, uma vez que cães e gatos podem ter mais de um ciclo estral (cio)
ao ano, seus períodos de gestação são rápidos (média de 63 dias) e são espécies relativamente
prolíferas, ou seja, podem gerar uma média de 3-6 filhotes por gestação.

FONTE: Disponível em: <http://odia.terra.com.br/blog/gislandiagoverno/images/castracao.jpg>.


Historicamente no mundo e no Brasil, o controle populacional animal, inicialmente era
praticado tão somente eliminando-se estes animais – primeiramente recolhendo-os das ruas e
posteriormente praticando a eutanásia, e pelos conceitos anteriores, em que animal seria
sencientes, os métodos para eutanásia em geral eram cruentos – como pauladas, choques,
câmaras de gás, sem qualquer insensibilização, menos ainda procedimentos anestésicos. Não
eram os objetivos, e sim a promoção da saúde por meio do controle da população animal, que
poderia transmitir zoonoses. Há ainda eventos históricos importantes, que traumatizam ainda
mais esta relação, como o caso de doenças como a raiva humana, transmitida por cães, e 149
obviamente a necessidade de seu recolhimento e eliminação, consequentemente de um controle
no número de animais, sendo a raiva uma doença sem tratamento, sem cura e diretamente
relacionada com este processo – cães/controle de número de animais, talvez este tipo de
relação tornasse mais “permissível” aos pensamentos políticos anteriores programas de
“controle” como estes.

Zoonoses - doenças comuns e transmissíveis a homens e animais

Claramente, diversos estudos tanto de pesquisadores como da Organização Mundial


da Saúde (OMS) mostram que estas medidas não são eficazes e muito menos permitem
qualquer consenso quanto a bem-estar e direito dos animais. Há ainda a questão profissional
dos médicos veterinários que procuram balizar suas condutas dentro do que é ético e dos
aspectos de saúde dos próprios animais. Eticamente, todos os profissionais diretamente ou
indiretamente envolvidos com recolhimento, tratamento e manutenção dos animais, bem como
os mentores políticos de ações e projetos foram sendo cada vez mais discutidas.
As recomendações da OMS - controle populacional de cães e gatos –
concentram-se em atividades como a esterilização de cães e gatos; Posse Responsável;
registro de animais, estímulo a adoção de animais.

Há outras ações além do controle populacional. Ações efetivas para o controle


populacional de cães e gatos - o registro e identificação, controle da reprodução, educação e
legislações pertinentes, recolhimento seletivo e ações específicas para animais comunitários – 150
foram recomendadas pela primeira vez por órgão estadual público no Brasil em 2005, bem como
o manejo etológico e visando o bem-estar animal, em todas as ações, como por exemplo, a
implantação de cursos de capacitação específicos para os funcionários que lidam com o controle
populacional, recentes no Brasil, mas já há algum tempo praticado na União Europeia, como o
caso onde exige o treinamento de profissionais que desejam trabalhar com o transporte de
animais.

Sendo um problema social, o abandono de animais, gera a possibilidade de excesso


ou de número de animais elevado nas ruas e por vários motivos, podem ser recolhidos, hoje com
possibilidade de diferentes destinos, mas anteriormente, na sua grande maioria, eutanasiados.

A eutanásia é uma possibilidade concreta, para muitos ainda, uma das únicas,
considerando os gastos para recolhimento, assistência veterinária e posterior manutenção ou
trabalho de recolocação destes animais na sociedades e ainda, procedimentos cirúrgicos para
esterilização (castração) e identificação (registro) desse animal. Analisando parte da cadeia do
controle populacional de cães e gatos são detectados alguns pontos críticos para o bem-estar
humano, animal ou da comunidade, isto é, áreas onde o desenvolvimento das ações podem
gerar mal-estar para os seres humanos - funcionários ou comunidade - e/ou para os animais,
considerando os órgãos de atendimento público a estes casos, em geral os Centros de Controle
de Zoonoses (CCzs) ou Canis Municipais:

a) Forma de recolhimento dos animais: Envolve o processo desde a tomada de


decisão da retirada do animal até o transporte do mesmo, onde temos:
- Contato com a comunidade ou representação local: em geral procura o órgão público,
para casos de interesse particular ou geral, de vizinhos, ruas ou bairros. É importante o contato
com o munícipe e esclarecimento das razões ou situações envolvidas, em geral numa solicitação
de recolhimento de algum animal. Quais os motivos do munícipe para a solicitação? É
importante que o reclamante seja conscientizado sobre diversas questões, em especial sobre
POSSE RESPONSÁVEL, ABANDONO, MAUS TRATOS, possibilidade de adoção ou de
promover a adoção de um animal e sobre aspectos relacionados a necessidades de eutanásia.
- Análise da situação do animal: é do próprio munícipe? Está doente? Idade?
Características gerais. É domiciliado (pode não ser do reclamante, mas de algum vizinho);
semidomiciliado (tem dono, vive em alguma casa, no entanto tem acesso a rua); comportamento
– dócil, agressivo, assustadiço, outros; animal abandonado; vítima de maus tratos; outros.
- Análise do ambiente: domicílio onde vive o animal, terrenos, ruas, construções. 151
Condições gerais do ambiente, higiene, vizinhança, outros animais.
- Situações de risco ou emergências: casos de acidentes, agressões invasões de
domicílios e outros.
- Tomada de decisão: nessa fase, poderá ocorrer ou não o recolhimento do animal.
- Recolhimento: passa pelo processo de manejo para o recolhimento (interação com o
animal, aproximação, intervenção para contenção/imobilização, embarque no veículo de
transporte e transporte);

b) Internação do animal no serviço de controle animal (centro de controle de


zoonoses, canil municipal, etc.), onde temos: desembarque do animal do veículo; avaliação
clínica; separação dos animais nos alojamentos (canis, gatis); assistência médica veterinária;
alimentação e outros.

c) Manutenção dos animais no serviço de controle animal: alimentação;


limpeza; avaliação e acompanhamento clínico; remanejamento de animais, avaliação
comportamental e outros.

d) Destino do animal:
o Resgate pelo proprietário ou responsável;
o Adoção;
o Devolução no local do recolhimento (animais comunitários);
o Adoção;
o Eutanásia;
o Outros.
e) Controle reprodutivo: esterilização cirúrgica (castração); capacitação de
profissionais, promoção da adoção ou recolocação na sociedade.
152

A forma de recolhimento dos animais tem sido negligenciada em vários países com o
problema de animais sem controle. Laçar os animais e jogá-los dentro de veículos inapropriados
é o panorama encontrado na maioria dos centros de controle de zoonoses, principalmente em
países em desenvolvimento. Como consequência, o órgão público e seus funcionários são
desrespeitados pela comunidade e a parceria com a mesma se torna difícil. Ao se tomar cuidado
com a forma de recolhimento por meio da capacitação de oficiais de controle animal, se está
cuidando de quatro áreas simultaneamente: o bem-estar animal, o bem-estar do funcionário e da
comunidade, e fazendo com que os profissionais envolvidos na cadeia do controle, no caso
particular o veterinário, demonstre perante a sociedade a sua capacidade como profissional de
operar de acordo com a ética profissional que reflete e está em harmonia com a ética do
consenso social no tratamento dos animais, mantendo sua autonomia.

O tratamento dentro dos serviços de controle animal não leva em consideração todos
os usuários desse sistema de saúde. Os animais são usuários desses serviços e ações para
esse tipo de usuários devem ser levadas em consideração. Animais doentes, em sofrimento
físico ou mental, sem perspectivas de resgate ou adoção, são encontrados muitas vezes nesses
serviços, aguardando o dia da sua morte, ou eutanásia. Há prazos estabelecidos por lei muitas
vezes municipais, determinando este prazo para recolhimento pelo proprietário ou adoção do
mesmo, em caso contrário o animal pode ser destinado à eutanásia. Os métodos de eutanásia
são regulamentos de acordo com o previsto pelo CFMV. E apenas praticados, legalmente por
médicos veterinários.

Ações para capacitação dos funcionários em etologia e bem-estar animal são de


extrema importância, e deve ser estimuladas por projetos e programas políticos, e deveriam ser
amparadas legalmente, pois conduzem a um manejo etológico, beneficiando animais e
funcionários, uma vez que os animais quando bem manjados e mantidos apresentarão um
comportamento mais tranquilo.

Sempre, as questões éticas, acompanham as ações dos profissionais envolvidos,


sejam estes tratadores, pessoas da administração ou técnicos, como os veterinários.

Em sendo um problema de conotação social, o envolvimento do público, sua


conscientização e participação positiva, com ações diretas, são exigidas. O destino do animal
seja ele domiciliado, semidomiciliado, comunitário (que é tratado na rua pelos moradores locais e 153
vizinhança, mas não adotado efetivamente por ninguém), abandonado ou vítima de maus tratos
é de responsabilidade do indivíduo, e em algumas situações de uma comunidade.

Há que se considerar a ética social do problema, portanto, além da ética profissional,


ações como o registro/identificação do animal impõem sobre o proprietário certo receio de ir
contra a lei, mesmo que moralmente suas atitudes não se traduzam inteiramente da mesma
forma. Um indivíduo que tem sue animal registrado e identificado, junto a clínicas veterinárias ou
órgãos públicos fica com mais receio de abandoná-lo e ser posteriormente identificado como
responsável por este crime.

"Artigo 32 da Lei Federal nº. 9.605/98

É considerado crime praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais


silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos.

Pena - Detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano e multa.

Parágrafo 1° - Incorre nas mesmas Penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel
em animais vivos, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos
alternativos.

Parágrafo 2°. - A Pena é aumentada de 1 (um) terço a 1(um) sexto, se ocorrer a morte
do(s) animal(s)."
Os atos de maus-tratos e crueldades mais comuns são: abandono; manter animal
preso por muito tempo sem comida e contato com seus donos/responsáveis; deixar animal em
lugar impróprio e sem higiene; envenenamento; agressão física; mutilação; utilizar animal em
situações ou trabalho que possa lhe causar pânico e sofrimento; não procurar um veterinário se
o animal estiver doente; outros.

Isso serve para os animais domésticos mais comuns como cães, gatos e pássaros,
também cavalos usados em trabalho de tração (carroças muito comuns nas ruas de cidades),
154
além de animais criados e domesticados em sítios, chácaras e fazendas. Animais silvestres
estão inclusos nessa Lei, possuindo também Leis e Portarias próprias criadas pelo IBAMA.

A POSSE RESPONSÁVEL é um item de extrema importância e parte dos princípios da


Educação em Saúde, tendo como foco o indivíduo da sociedade e sua conscientização, deve
além dos programas de esterilização, castração animal, registro/identificação animal; fazer parte
de todos os programas de controle populacional animal. Instituições não governamentais de
destaque participam ativamente em todo o mundo, no caso do Brasil há a ARCA – Associação
Humanitária de Proteção e Bem-Estar Animal, que não só acompanha e orienta programas de
controle populacional, como edita instruções de Posse Responsável importantes para o público
em geral, como os 10 Mandamentos para a Posse Responsável:

1. Antes de adquirir um animal, considere que seu tempo médio de vida é de 12 anos.
Pergunte à família se todos estão de acordo, se há recursos necessários para mantê-lo e
verifique quem cuidará dele nas férias ou em feriados prolongados.

2. Adote animais de abrigos públicos e privados (vacinados e castrados), em vez de


comprar por impulso.

3. Informe-se sobre as características e necessidades da espécie escolhida como,


tamanho, peculiaridades e espaço físico.

4. Mantenha o seu animal sempre dentro de casa, jamais solto na rua. Para os cães,
passeios são fundamentais, mas apenas com coleira/guia e conduzido por quem possa contê-lo.

5. Cuide da saúde física do animal. Forneça abrigo, alimento, vacinas e leve-o


regularmente ao veterinário. Dê banho, escove-o e exercite-o regularmente.
6. Zele pela saúde psicológica do animal. Dê atenção, carinho e ambiente adequado a
ele.

7. Eduque o animal, se necessário, por meio de adestramento, mas respeite suas


características.

8. Recolha e jogue os dejetos (cocô) em local apropriado.

9. Identifique o animal com plaqueta e registre-o no Centro de Controle de Zoonoses


155
ou similar, informando-se sobre a legislação do local. Também é recomendável uma
identificação permanente (microchip ou tatuagem).

10. Evite as crias indesejadas de cães e gatos. Castre os machos e fêmeas. A


castração é a única medida definitiva no controle da procriação e não tem contraindicações.

A ética social e profissional, aliadas a valorização não apenas de atos, de motivações,


caráter e emoções dos envolvidos, podem fortalecer relacionamentos comunitários e
órgãos/programas públicos, o indivíduo e sua interação com os animais de estimação, numa
relação mais saudável e capaz de promover o bem-estar não somente do homem, pela presença
benéfica dos animais, mas do próprio bem-estar doas animais.
18 ANIMAIS SILVESTRES, SELVAGENS, DE CIRCO E BEA

18.1 ANIMAIS SELVAGENS E SILVESTRES

156

Os animais selvagens representam vários pontos que poderiam ser discutidos quanto
ao BEA, como os animais em cativeiro nos zoológicos, algumas espécies utilizadas em circos e
centros de lazer, em ambientes de criação extensiva comercial de animais silvestres, mantidos
em zoológicos privados ou por fiéis depositários (autorizados pelo IBAMA – Instituto Brasileiro do
Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e ainda os animais submetidos e
recuperados do tráfico de animais.

Os animais sempre exerceram fascínio sobre os homens, de um modo geral. A


manutenção de exemplares de diferentes espécies em cativeiro é uma prática antiga, os animais
selvagens, seja por sua beleza, natureza, simbologia de força e outros, levaram a criação de
recintos, inicialmente particulares, como forma de demonstração de status e posteriormente o
aparecimento de locais públicos, no entanto, tais construções remetiam estruturas que
consideravam apenas a facilidade de limpeza do ambiente, sendo comum o emprego de
cimento, concreto e barras de ferro.

Zoológicos durante muito tempo foram sinônimos apenas de locais de exposição da


vida silvestre, somente a partir do século XX surgiu a preocupação com o ambiente onde estes
animais eram mantidos, comportamento, necessidades e respostas fisiológicas, anomalias de
comportamento, estresse e outros. A aplicação de conceitos quanto ao enriquecimento
ambiental, como forma de melhorar a qualidade de vida e condições de BEA em animais em
zoológicos, no entanto, é mais recente.

Os zoológicos são considerados locais destinados convencionalmente à coleção de


animais selvagens, principalmente desconhecidos do público, para exibição, preservação e
reprodução desses animais. Atualmente, os parques zoológicos apresentam objetivos adicionais:
1) A conservação de espécies, servindo como local de preservação de espécies
ameaçadas de extinção pela destruição de seu habitat natural;

2) O desenvolvimento e aperfeiçoamento profissional;

3) A pesquisa científica.

4) A educação ambiental, tentando conscientizar as pessoas da importância de


conservar a natureza, preservando espécies locais e possibilitando um melhor entendimento das
157
inter-relações entre os animais e seu papel no ecossistema.

5) O lazer dos seres humanos, utilizando os animais para entretenimento,


possibilitando ao público apreciar a estes animais.

FONTE: Fundação Parque Zoológico de São Paulo. Disponível em:


<http://www.zoologico.sp.gov.br/historiadozoo.htm>.
Os animais na natureza desenvolvem hábitos e comportamentos de acordo com uma
série de características da espécie, anatômicas, fisiológicas que se adaptam as condições de
geografia, clima, disponibilidade de alimentos, entre outros. Desenvolvem seu instinto e
preocupam-se basicamente com a busca do alimento para sua manutenção, atividade
reprodutiva, a criação ou proteção de seus filhotes, seu convívio com outros animais, defesa
contra predadores. Há ambiente dinâmico frente a desafios diários. O cativeiro pode alterar
sobremaneira este equilíbrio dinâmico, num primeiro passo isentando o animal das interações
competitivas ou mesmo a procura pelo alimento. Estes animais, muitas vezes, são oriundos de 158
locais com clima, vegetação e alimentação distintas do zoológico onde estão confinados. E são
submetidos a situações até mesmo desfavoráveis, ocasionando um estresse desnecessário.
Importante lembrar, que muitos animais selvagens, também podem chegar aos zoológicos por
meio de apreensão de comércio ou criações clandestinas, ou seja, as circunstâncias de
estresse, trauma, danos físicos e psicológicos encontram-se aumentados.

Estas interferências ou modificações de ambiente com o cativeiro podem levá-los a


apresentar comportamentos anormais, distinto daqueles apresentados na natureza, ou até
mesmo comportamentos estereotipados, ou seja, movimentos repetitivos e com certo padrão, ou
ainda depressão e automutilação.

Animais em cativeiro – alteração de seu ambiente pode provocar anomalias de


comportamento – lambeduras, roer objetos ou partes do recinto, andar em ciclos
repetitivos/rotas.

Com o pensamento crescente em proteção ambiental, temas quanto a degradação do


meio ambiente, biodiversidade, espécies em extinção, os zoológicos passaram, portanto, a
representar uma forma não somente de preservação, conservação e manutenção de espécies,
como fonte de estudos, consequentemente o bem-estar tem sido foco de muitos profissionais em
promover modificações que garantam esta condição aos animais em cativeiro. Este bem-estar
pode ser entendido como a capacidade do animal ajustar-se ao ambiente em que vive. O estado
de um indivíduo com relação a seu ambiente pode ser medido, por meio da observação e
registro de ausência e presença de certos comportamentos.

159

A preocupação técnica com BEA em ambientes de cativeiro tem aumentado o emprego


de recursos de enriquecimento ambiental. O mesmo se aplica as condições de criação e práticas
de manejo para extensiva e exploração comercial de animais silvestres.

O enriquecimento ambiental consiste em técnicas para aumentar a estimulação do


ambiente pela introdução de objetos com os quais os animais possam interagir, porém não se
deve apenas colocar vários itens no ambiente, procura estimular o bem-estar psicológico e,
físicos ótimos. O enriquecimento pode resultar na melhora da função biológica dos animais,
incluindo o aumento do sucesso da atividade reprodutiva, qualidade de vida e até mesmo
expectativa de vida do animal.

Sua aplicação consiste em enriquecer o recinto do animal, a fim de proporcionar


situações parecidas com as quais viveria em um ambiente natural, amenizando o
comportamento de cativeiro. Os propósitos para enriquecer o ambiente de animais em cativeiro
incluem:

- Um aumento da atividade;

- Um incremento na atividade reprodutiva;

- Estimular repostas positivas ao público;

- Reduzir o comportamento estereotipado;


- Reduzir o estresse;

- Reduzir a agressão e a automutilação.

160

Exemplos de recintos com ambientes pobres e sem enriquecimento ambiental.

Enriquecimento Ambiental.

FONTE: Fundação Rio Zoo. Disponível em:


<http://www.rio.rj.gov.br/pcrj/destaques/especial/riozoo.htm>
161

Enriquecimento Ambiental.

A alteração de comportamento pode ser um fator indicativo de variação negativa do


bem-estar, chegando aos comportamentos atípicos e estereotipados, sem função aparente e
associados ao tédio.

O enriquecimento ambiental pode ser alimentar, sensorial, físico, cognitivo, ou social.

a) Enriquecimento alimentar: promove variações na alimentação dos animais


cativos, trazendo certa dificuldade para os animais obterem o alimento. Por exemplo, pode-se
esconder um osso dentro de uma caixa com feno para algum animal carnívoro, ou colocá-lo
dentro de um pneu.
b) Enriquecimento sensorial: explora um dos cinco sentidos dos animais. Como
exemplo, pode-se citar o uso de sons com vocalização, ervas aromáticas, canela em pó, hortelã,
menta, urina e fezes de outros animais (esses dois últimos exemplos são usados para estimular
a marcação do terreno).
c) Enriquecimento físico: procura deixar os recintos mais semelhantes ao habitat
natural. Para isso, colocam-se poleiros e cordas para aves, tanques para hipopótamos, ursos,
pinguins, antas e capivaras, ou galhos nos recintos de macacos, dentre outros exemplos.
d) Enriquecimento cognitivo: busca despertar a capacidade cognitiva dos
animais, ou seja, despertar sua capacidade intelectual, principalmente com os primatas,
fornecendo, por exemplo, galhos para que os macacos retirem cupins de um cupinzeiro.
Também se podem fornecer rochas ou alimentos duros esporadicamente, como nozes, avelãs,
amêndoas, coco seco, e castanhas inteiras, para que os animais tenham que quebrá-los,
estimulando suas habilidades e capacidades.
e) Enriquecimento social: permite o convívio com outros animais com os quais
normalmente conviveriam, podendo ser intraespecífica ou interespecífica.
Vários brinquedos, diversos utensílios, e materiais podem ser usados como, por
exemplo, tubos de PVC, bolas plásticas (duras), bambu, ratos de brinquedo, frutas congeladas,
gravetos, capim e folhas secas, cordas, garrafas pet, sangue, urina e fezes. A indicação de
emprego destes vai depender da espécie e suas necessidades, bem como do respeito a alguns
critérios de segurança, quanto aos itens usados:
162
- Devem ser atóxicos;

- Não devem facilitar a fuga ou causar ferimentos nos animais;

- Não podem ser arremessados pelos animais, de modo a ferir visitantes, funcionários
e mesmo outros animais;

- Devem ser adequados para cada recinto;

- Não devem permanecer por muito tempo, pois perde o caráter de novidade;

- Deve se alterar o tipo de enriquecimento e sua frequência;

- Os animais devem ter oportunidade de escolha, não sendo obrigados a interagir com
os itens.

A fauna silvestre brasileira é protegida pela Lei Federal 5197/67 de onde se destacam:

Art. 1º Os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase do seu desenvolvimento e


que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos,
abrigos e criadouros naturais são propriedades do Estado, sendo proibida a sua utilização,
perseguição, destruição, caça ou apanha.

§ 1º Se peculiaridades regionais comportarem o exercício da caça, a permissão será


estabelecida em ato regulamentador do Poder Público Federal.

§ 2º A utilização, perseguição, caça ou apanha de espécies da fauna silvestre em


terras de domínio privado, mesmo quando permitidas na forma do parágrafo anterior, poderão
ser igualmente proibidas pelos respectivos proprietários, assumindo estes a responsabilidade da
fiscalização de seus domínios. Nestas áreas, para a prática do ato de caça é necessário o
consentimento expresso ou tácito dos proprietários, nos termos dos arts. 594, 595, 596, 597 e
598 do Código Civil.

Art. 2º É proibido o exercício da caça profissional.

Art. 3º É proibido o comércio de espécimes da fauna silvestre e de produtos e objetos 163


que impliquem na sua caça, perseguição, destruição ou apanha.

§ 1º Excetuam-se os espécimes provenientes de criadouros devidamente legalizados.

§ 2º Será permitida, mediante licença da autoridade competente, a apanha de ovos,


larvas e filhotes que se destinem aos estabelecimentos acima referidos, bem como a destruição
de animais silvestres considerados nocivos à agricultura ou à saúde pública.

Art. 4º Nenhuma espécie poderá ser introduzida no País, sem parecer técnico oficial
favorável e licença expedida na forma da Lei.

Art. 7º A utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha de espécimes da fauna


silvestre, quando consentidas na forma desta Lei, serão considerados atos de caça.

Art. 16. Fica instituído o registro das pessoas físicas ou jurídicas que negociem com
animais silvestres e seus produtos.

Art. 17. As pessoas físicas ou jurídicas, de que trata o artigo anterior, são obrigadas à
apresentação de declaração de estoques e valores, sempre que exigida pela autoridade
competente.
Parágrafo único. O não cumprimento do disposto neste artigo, além das penalidades
previstas nesta lei obriga o cancelamento do registro.

Art. 18. É proibida a exportação para o Exterior, de peles e couros de anfíbios e


répteis, em bruto.

164
Art. 27. Constituem contravenções penais, puníveis com três meses a um ano de
prisão simples ou multa de uma a dez vezes do salário-mínimo mensal do lugar e da data da
infração, ou ambas as penas cumulativamente, violar os arts. 1º e seu § 2º, 3º, 4º, 8º e suas
alíneas a, b, e c, 10 e suas alíneas a, b, c, d, e, f, g, h, i, j, l, m, 13 e seu parágrafo único, 14 § 3º,
17, 18 e 19.

Desta forma fica estabelecida a proibição e a ação criminosa de diversos tipos de atos
como a retirada de animais de seu ambiente natural, o que muitas vezes acaba alimentando o
tráfico ilegal de animais silvestres, ou na manutenção irregular, ilegal de várias espécies em
ambientes de zoológicos ou reservas não autorizadas ou até mesmo domiciliares. Em situações
de ilegalidade é muito mais difícil combater maus tratos e consequentemente a previsão de
aspectos de BEA aos animais onde se impõe condições às mais variadas, quase sempre de
inadequações em vários níveis e até mesmo sofrimento.

O IBAMA tem a responsabilidade legal de controlar a criação e as atividades de


zoológicos no Brasil (Lei Federal 7173/83; Lei 7.735/89; Decreto nº 97.94689) e estimula a
regulamentação de zoológicos não somente públicos, bem como privados (Instrução Normativa
04/02).

Operação "Zoológico Legal"

A operação "Zoológico Legal" é uma iniciativa do IBAMA e da Sociedade de Zoológicos


do Brasil, que consiste na realização de vistorias técnicas nos zoológicos brasileiros com o
objetivo de avaliar a situação destes, frente à legislação vigente. As vistorias são realizadas por
técnicos do IBAMA local, da SZB e por representantes da sociedade civil organizada. As
vistorias têm um caráter técnico. A meta no primeiro momento é corrigir quaisquer
irregularidades. Os problemas detectados são descritos no relatório, o qual é analisado pela
equipe de vistoria, que elabora um diagnóstico da situação, e encaminha à Gerência Executiva
Estadual do IBAMA, cabendo a esta, e em última instância à Diretoria de Fauna e Recursos
Pesqueiros do IBAMA a decisão final sobre as orientações em cada um dos casos. Até o
momento, foram vistoriados os zoológicos de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. A meta
para 2003 é vistoriar os zoológicos dos demais Estados, nos padrões da Operação "Zoológico
Legal". 165
19 ANIMAIS DE CIRCO

Algumas espécies de animais silvestres criadas em ambiente de zoológico têm sua


entrada no país, prevista e autorizada pela Lei 5197/67, no entanto alguns animais silvestres
tanto da fauna brasileira como externa podem ser encontradas em centros de
166
lazer/reservas/zoológicos privados e mesmo circos. Em todas estas situações há necessidade
de autorização prévia e não somente isto, mas ainda a Lei Federal 9605/98, em que maus tratos
a qualquer espécie animal é crime.

A questão de BEA pode ser questionada, uma vez que na maioria dos recintos de
circos, por exemplo, os recintos são mínimos e os aspectos quanto a transporte, ambientação,
adestramento, e enriquecimento ambiental são fortemente prejudicados quando comparadas as
necessidades básicas da maioria destes animais em seu ambiente natural. Mais uma vez, os
aspectos de maus tratos referidos e citados publicamente por diversas mídias, até mesmo o
descaso e abandono praticados por alguns destes estabelecimentos, chamam a atenção da
opinião pública e acabam forçando uma maior discussão de ética de uma maneira geral e
mudança no posicionamento político, consequentemente o surgimento de leis que se imponham
contra estas práticas. Como já mencionado em capítulos anteriores, sob condições extras ao seu
comportamento natural, muitas vezes é difícil uma avaliação de determinados critérios utilizados
como indicadores de BEA. No entanto, níveis de estresse e alterações de comportamento são
muitas vezes, facilmente evidenciados.

Entidades como a WSPA (Sociedade Mundial de Proteção Animal) se lançam contra


este tipo de atividade e surgem movimentos como – “Circo Legal Não tem Animal” onde
defendem o Projeto de Lei 7291/2006, não votado e não aprovado pela Câmara dos Deputados,
que procura banir a presença de animais das atividades circenses. É importante lembrar, que
animais domésticos também são utilizados em shows e atividades de circo.

Segundo divulgação no site da WSPA:

Razões para a proibição do uso de animais em circo:


Animais em circo sofrem uma vida inteira de maus-tratos. Estes não incluem apenas as
formas desumanas de treinamento (em sua maioria com o uso de choques, chicotes ou bastões
pontiagudos), mas também os espetáculos em si, onde os animais, por sofrerem agressões para
um suposto aprendizado, se comportam como nunca se comportariam na natureza, apenas por
um capricho do ser humano. Além disso, passam suas vidas em espaços muito pequenos e em
constante transporte, circunstâncias que causam alto grau de estresse aos animais. E, para
piorar a situação, muitas vezes não têm à disposição alimento de qualidade ou em quantidade
suficiente. 167

Animais em circo expõem as pessoas a muitos riscos. Não é possível prever como um
animal estressado irá reagir em uma determinada situação. Além disso, muitas vezes
permanecem em instalações inadequadas e frágeis, expondo os funcionários do circo e a
população em geral. Vários acidentes já foram documentados inúmeras vezes pela mídia, como
o caso do menino de seis anos que, no ano de 2000, em Pernambuco, foi devorado por leões
que não comiam há vários dias e estavam em local inseguro.

Animais em circo podem transmitir doenças aos seres humanos, visto que não existe
vacinação eficiente para os animais selvagens.

Animais em circo estimulam o tráfico de animais selvagens ao redor do mundo, prática


reconhecidamente cruel e criminosa.

Há países que já optaram pela proibição do uso de animais em circos (Áustria, Costa
Rica, Dinamarca, Finlândia, Índia, Israel, Cingapura e Suécia), no Brasil, há proibição em vários
municípios, por força de lei municipal (ver quadro – Fonte: WSPA):

Locais onde há proibição de animais em circo.

U
Cidade
F

M
Campo Grande
S

P Curitiba, Ponta Grossa, São José dos Pinhais


U
Cidade
F

P
Olinda
E

R Porto Alegre, Caxias do Sul, Montenegro, Novo Hamburgo, Passo Fundo, Rio 168
S Grande, Santa Maria, São Leopoldo e Taquara.

S Florianópolis, Blumenau, Itajaí, Jaraguá do Sul, Joinville, Videira, Joaçaba e


C Camboriú

São Paulo, Araraquara, Atibaia, Avaré, Batatais, Bauru, Bebedouro, Campinas,


Cotia,SGuarulhos, Itu, Jacareí, Jundiaí, Mogi das Cruzes, Nova Odessa, Ribeirão Pires,
P Salto, Santo André, Santos, São Bernardo, São Caetano do Sul, São José dos Campos, São
Vicente, Sorocaba, Taubaté, Ubatuba e Vinhedo
20 ANIMAIS LIVRES PARA COMÉRCIO E CRIAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES COM FINS
DE PRODUÇÃO

De acordo com a atual legislação brasileira e com o IBAMA temos espécies que são
consideradas de livre comércio. No entanto, ainda o que se questionam além das praticadas
169
serem legais ou não, são como os aspectos podem ser vislumbrados. Na verdade o que se têm
na prática são apenas a legalidade ou não da situação, bem como a procura da garantia do
direito do animal a não ser maltratado.

20.1 ANIMAIS LIVRES PARA O COMÉRCIO

A criação e comércio de animais domésticos como cães, gatos, vacas, porcos, patos,
galinhas, codornas, coelhos, periquitos australianos e canários-belga, entre outros, não
necessita de autorização do IBAMA. A Portaria nº 93/98, que regulamenta a entrada e saída de
animais silvestres e exóticos no Brasil, isenta esses animais do controle do IBAMA. Com a
Portaria nº 36/02, o avestruz-africano passou também a ser considerado animal doméstico.

20.1.1 Criadouros de Crocodilos e Javalis

O crocodilo-do-nilo, Crocodilus niloticus e o javali-europeu, Sus scrofa scrofa não estão


liberados para a importação e implantação de novos criadouros. Port. nº 102/98.
O maltrato já discutido anteriormente, prevê o desrespeito a uma série de
necessidades do animal, imposição de dor, sofrimento entre outros, mas em nenhum momento
consegue prever ou garantir qualidade do bem-estar em maior ou menor grau. O desconforto
momentâneo, seu reflexo no bem-estar geral, nível de estresse vivido, preferência dos animais,
entre outros, em muitas destas situações podem ser difíceis de serem acompanhadas, por ser
um comércio muitas vezes, mais fragmentado e em menor escala do que em animais de
produção com bovinos, suínos e aves.
170

20.1.2 Fiel depositário ou Criadouros

A legislação e o IBAMA preveem a figura do fiel depositário ou de criadouros, a


pessoa, ou a figura privada pode vir a criar e manter um animal (s) silvestre (s). Essa posição
visa fortalecer a coibição do ato criatório ilegal, consequentemente a busca de melhores
condições para o animal criado fora de seu ambiente natural, bem como o tráfico de animais.

Saiba, porém que ter um animal silvestre em casa requer grande


responsabilidade: respeito às características comportamentais do animal, cuidados com a
sua alimentação, prevenção e tratamento de doenças, fornecimento de abrigo,
alimentação e segurança adequados e respeito às leis vigentes.

Se você pudesse escolher, o que escolheria? Comprar um animal silvestre


procedente do tráfico na beira da estrada, em uma feira livre ou em um depósito
clandestino, sem saber sua origem ou o quanto ele sofreu até chegar a você ou comprar o
mesmo animal, nascido em cativeiro autorizado pelo IBAMA, cercado de todos os
cuidados veterinários e que já viesse marcado, sexado, com nota fiscal e de forma legal,
conforme estabelece as normas do IBAMA?
Caso tenha escolhido a segunda opção você está demonstrando ser consciente,
um cidadão cumpridor das leis! E foi pensando nisso; no desejo que diversas pessoas
têm em possuir um animal de estimação de forma legal e ainda na diminuição do tráfico
de animais silvestres, que o IBAMA, a partir de 1993, publicou diversas portarias e
instruções normativas, com o intuito de ordenar a criação de animais silvestres em
cativeiro: nasciam assim os chamados criadouros de animais silvestres.

A existência desses criadouros é previsto na Lei de Proteção a Fauna- Lei nº


171
5197/67, na Lei de Crimes Ambientais - Lei nº 9605/98 e no Decreto que regulamentou essa
Lei, o Decreto nº 3179/99. Há vários instrumentos legais que regulamentam o registro e
funcionamento dos criadouros de animais silvestres, nas mais várias modalidades, além
do comércio de animais nascidos nos criadouros comerciais.
21 ANIMAIS DE EXPERIMENTAÇÃO E BEA

A experimentação animal data dos antigos Gregos e Romanos, porém foi durante os
séculos dezoito e dezenove que progrediu lentamente de uma prática relativamente incomum,
até alcançar um enfoque científico. Apenas recentemente, percebeu-se a importância do modelo
172
animal e seu bem-estar para os resultados de um experimento. Desta forma surgiu a ciência em
animais de laboratório, onde o estudo é o próprio animal que será utilizado na pesquisa e como
este deve ser criado e manipulado.

21.1 ANIMAIS DE EXPERIMENTAÇÃO

São inúmeros os modelos animais utilizados nas pesquisas científicas, porém foram
definidas cinco espécies como sendo as espécies convencionais de animais de laboratório.
Estas espécies são conhecidas popularmente pelos seguintes nomes, camundongo, rato,
hamster, cobaia e coelho.

21.1.1 Camundongo

É um roedor da família Muridae, muito utilizado nas


pesquisas biomédicas e seu nome científico é Mus domesticus
domesticus. Nascem com aproximadamente uma a duas gramas,
sem pelo, de olhos e orelhas fechadas e sem dentes. Atingem a
puberdade por volta dos 40 dias de idade, são acasalados com 60
dias, o período gestacional das fêmeas é em média vinte e um dias, têm ninhadas grandes de 10
a 12 filhotes e o desmame dessas ninhadas ocorre aos vinte e um dias de vida. Há uma enorme
variedade de linhagens de camundongos, que vão do branco ao preto. Dentre as linhagens
estão às albinas, que fenotipicamente (aparência externa) parecem iguais, mas geneticamente
são totalmente diferentes. O camundongo é a espécie que apresenta maior variedade de
linhagens.

173

21.1.2 Rato

O rato é um roedor da família Muridae,


podendo ser o Rattus rattus, que é o rato do
telhado e o Rattus norvegicus. A principal diferença
entre os dois é o tamanho da cauda, o Rattus
rattus possui a cauda maior que o corpo, com uma
finalidade preênsil (de agarrar); o Rattus
norvegicus tem a cauda menor que o corpo. A
principal linhagem utilizada nas pesquisas é a linhagem Wistar, um rato albino (branco). Nasce
com peso variando entre quatro a seis gramas, sem pelo, de olhos e orelhas fechadas, sem
dentes. Atinge a maturidade sexual por volta dos sessenta dias de idade, as fêmeas são
acasaladas aos noventa dias, o período gestacional é em média vinte e um dias, têm ninhadas
grandes de 10 a 14 filhotes e o desmame dessas ninhadas ocorre aos vinte e um dias de vida.
Existem ratos heterogênicos e isogênicos. Desde o século passado, o papel do rato na medicina
mudou de portador de doenças contagiosas a uma ferramenta indispensável no desenvolvimento
experimental da medicina e de produtos farmacêuticos. Foi no rato que se desenvolveram vários
estudos sobre os medicamentos destinados a depressão, câncer de mama e próstata.
21.1.3 Hamster

O hamster dourado, um roedor também


conhecido como hamster da Síria (Mesocricetus auratus), é
a espécie mais comum da subfamília Cricetidae a ser
174
usada na pesquisa biomédica, sendo chamado,
normalmente, de hamster de laboratório. O hamster
dourado se originou no sudoeste da Europa e no Oriente
médio, de um macho e duas fêmeas sobreviventes de uma ninhada de 10 filhotes capturados na
região de Aleppo na Síria, numa expedição liderada pelo zoólogo Israel Aharoni. Comparados
com ratos e camundongos, o uso de hamster na pesquisa biomédica é menos expressivo, porém
como animal de estimação é o mais usado. Nesta espécie as fêmeas são maiores e mais
agressivas que os machos. Como os outros roedores (rato e camundongo), nascem sem pelos,
com olhos e orelhas fechadas, porém nascem com dentes. Quando adultos têm a pele muito
flácida. Este roedor apresenta “bolsas guturais” na boca, onde alojam alimento. Nascem
pesando por volta de duas gramas, o período gestacional é de aproximadamente 18 dias e o
tamanho da ninhada é de cinco a oito filhotes por parto. Sua utilização está voltada para estudos
de virologia e anomalias congênitas.

21.1.4 Cobaia

Conhecida vulgarmente como porquinho da Índia é


um roedor da família Cavidae e seu nome científico
é Cavia porcellus. Dentre as cinco espécies
convencionais de animais de laboratório é a única
que tem origem na América do Sul. Foi encontrada
no Peru e posteriormente levada a Europa como animais de estimação. Os filhotes
diferentemente dos outros, nesta espécie, nascem com pelo, olhos abertos, orelhas soltas e
andam dentre as primeiras horas após o parto, se alimentam de sólidos já na primeira semana
de vida. Outras particularidades destes roedores é que não apresentam cauda e não sintetizam
a vitamina C, necessitando recebê-la de forma exógena (administrado na água de beber). As
fêmeas são acasaladas por volta dos noventa dias de idade e o período gestacional é em média
de 70 dias.
175

21.1.5 Coelho

São Lagomorpha pertencentes à


família Leporidae, posição zoológica que lhe
foi garantida pela presença de quatro incisivos
superiores e não apenas dois como nos
roedores. Existem várias raças de coelhos,
sendo que a mais utilizada na experimentação
científica é BNZ (Branco Nova Zelândia). Este
animal é de porte médio com pelagem branca, nascem sem pelos olhos e orelhas fechadas,
pesando por volta de cinquenta gramas. Atingem a puberdade em torno dos quatro meses de
idade e o período gestacional das fêmeas é em média de trinta dias. Os filhotes de coelho,
quando recém-nascidos, são chamados de láparos. São muito utilizados no desenvolvimento do
tratamento da quimioterapia.
21.1.6 Macaco

O macaco Rhesus é um dos mais comuns ligados a experimentação. Espécie


originária do continente asiático (Índia), iniciada no ano de 1929, por meio da importação de 150
animais que foram utilizados no desenvolvimento de trabalhos de pesquisa da febre amarela. Os
176
primatas não humanos ou infra-humanos são mamíferos essencialmente tropicais e são
divididos em dois grandes grupos: Primatas do Novo Mundo
e Primatas do Velho Mundo, sendo que os macacos Rhesus
são do Velho Mundo, pertencendo à Ordem dos Catharrinos,
os quais possuem a expansão septal muito reduzida, ficando
as narinas de forma oblíqua. Possuem 32 dentes, o que
atesta que estão, no processo evolutivo, mais próximos do
homem. Em relação à taxonomia os Rhesus pertencem à
classe Mammalia, ordem Primatas, família Cercopitecidae, gênero Macaca, espécie mulatta,
com o nome popular: de “macaco rhesus”, sendo os mais utilizados na pesquisa biomédica. As
fêmeas desta espécie têm ciclo menstrual semelhante ao dos humanos e apresentam sinais
externos de menstruação (sangue na vagina). A 1ª menstruação (menarca) ocorre aos dois anos
de idade, sendo seguida por um período de ciclos menstruais irregulares e a 1ª concepção
ocorre geralmente ao redor dos quatro anos de idade e nasce um único produto, com
aproximadamente 400 gramas. A gestação varia entre 161 e 175 dias. Os rhesus apresentam
estações de acasalamento definidas, como período de anestro e variações estacionais na
capacidade reprodutiva. Esta espécie quando criada em cativeiro, na América do Sul, apresenta
estação de acasalamento (estro) de abril a setembro e anestro durante o restante do ano.
22 ANIMAIS DE EXPERIMENTAÇÃO E BEA

A evolução da ciência e os constantes questionamentos sobre o uso de animais em


experimentação científica alteraram as relações entre o ser humano e os animais, transformando
o bem-estar animal em uma importante área de estudo. A ciência de animais de laboratório
177
considera o bem-estar animal como um dos principais fatores que podem influenciar o resultado
de um experimento e valoriza o uso ético dos animais retomando o princípio dos 3 R's
desenvolvido: refinamento, redução e substituição.

Bem-estar: estado do indivíduo em relação às suas tentativas de adaptar-se ao seu


ambiente, porém é importante salientar que este conceito está relacionado a um dado momento
ou fase da vida pelo qual aquele ser está passando. O bem-estar deve ser definido de forma que
permita relação com outros conceitos, tais como: necessidades, liberdade, adaptação, felicidade,
capacidade de previsão, sofrimento, dor, ansiedade, medo, tédio, estresse e saúde.

O uso de animais na ciência e nos meios acadêmicos se divide em três áreas:


pesquisa, teste de produtos, e ensino. Para mensurar o bem-estar animal é fundamental
entender o ambiente onde está e compreender aspectos da anatomia, fisiologia, etologia e
manejo das espécies em questão. A partir desse conhecimento é gerada uma série de
obrigações éticas que certamente favorecerão o bem-estar dos animais de laboratório.

Uma série de fatores, físicos, químicos ou microbiológicos pode iniciar um desequilíbrio


fisiológico nos animais e consequentemente aumentar ou diminuir o bem-estar, principalmente
pela situação de confinamento e impossibilidade de resolver situações indesejáveis.

Um ambiente adequado para manutenção de animais de laboratório é necessário, pois


essas espécies são sistemas biológicos sensíveis a fatores internos e externos.
178

A área destinada ao alojamento é um exemplo, pois deve levar em conta as


necessidades básicas do animal. Um dos requisitos principais é o espaço suficiente para a
realização de movimentos corporais normais e livre acesso à água e alimento. O estresse
causado por excesso de animais confinados ou o isolamento pode causar alterações fisiológicas
e comportamentais que certamente influenciarão na resposta ao experimento. Ambientes mais
equilibrados quanto às necessidades básicas destes animais como: ausência de odores
indesejáveis, limpos, com luminosidade e temperatura ideais, isentos de micro-organismos
patogênicos são cientificamente mais aceitos e favorecem o bem-estar animal.

O manejo diário, mais que os procedimentos experimentais podem interferir de forma


acentuada no favorecimento ou diminuição do bem-estar dos animais. Portanto, é fundamental
que os funcionários, técnicos e pesquisadores que estão diariamente envolvidos nas atividades
diárias do manejo dos animais, tenham conhecimento e treinamento para suas atividades.

O estresse é um fenômeno comumente vinculado a uma profunda alteração fisiológica


associada a um processo de doença ou alteração ambiental. Para alguns pesquisadores o
estresse é uma situação extrema e indesejável enquanto outros consideram um parâmetro
normal, transitório e desejável, já que representa uma reação de adaptação do organismo frente
a uma nova situação. Este estresse agudo pode ser considerado bom e necessário para a
evolução e aprendizado, sem provocar danos maiores e desencadear um estresse crônico.
Assim, é importante salientar que isso dependerá do grau de estresse sofrido para então
relacionar com diminuição do bem-estar.

Um dos principais estressores para os animais é a dor. Poucos pesquisadores ignoram


intencionalmente a dor do animal; na verdade não há um reconhecimento do comportamento
que sinaliza a dor. É importante saber reconhecer quando os animais estão sofrendo como
consequência de um procedimento e também qual o grau desse sofrimento. A dor é uma
experiência individual, e o quanto essa experiência se traduz em um comportamento observável
179
e mensurável depende de vários fatores como a espécie, a genética, o sexo, o peso corpóreo, o
condicionamento prévio, a dominância social do animal, a saúde em geral e as condições do
meio ambiente no momento da observação.

As preocupações não se limitam a presença ou ausência de dor como indicador do


bem-estar dos animais. Independentemente da dor, o grau de bem-estar está ligado à situação
em que se encontra o animal e poderá ser reduzido ou elevado.

Alterações nos procedimentos ou protocolos experimentais para minimizar a dor e o


estresse devem ser consideradas para aumentar o bem-estar animal. Uso de drogas que aliviem
ou eliminem a dor, equipamentos e instrumentos corretos, manejo adequado, realização de
contenção física adequada reduzem, acentuadamente, o desconforto físico causado pelo
procedimento. Em estudos no qual o animal necessariamente é exposto a algum fator
estressante ou doloroso é muito importante estabelecer o momento de encerrar o experimento e
da eutanásia do animal.

22.1 ENRIQUECIMENTO AMBIENTAL

Da mesma forma como já discutido em animais de produção, de companhia e


silvestres, verifica-se que outra forma de contribuição para aumento do bem-estar é a utilização
de enriquecimento ambiental. Este enriquecimento consiste na exposição de animais a
ambientes ricos em estimulação sensorial, gerada por objetos inanimados, como rodas de
atividades, canos e brinquedos, e/ou caixas com infraestruturas mais complexas, contendo
tocas, galerias de túneis e/ou plataformas com diferentes níveis de acesso.

180

No entanto, cabe ressaltar que em relação aos animais de laboratório, uma série de
parâmetros pode ser alterada com o enriquecimento ambiental, por exemplo:

a) Diminuição do nível de excitabilidade dos animais diante dos procedimentos de


manipulação no laboratório;

b) Melhora nas condições gerais de saúde;

c) Diminuição dos níveis de agressão intraespecífica;

d) Diminuição dos níveis circulantes de hormônios suprarrenais associados ao


estresse;

e) Diminuição da frequência de comportamentos estereotipados;

f) Menor incidência de perda de filhotes por infanticídio, canibalismo e negligência;

g) Maior taxa de sucesso de acasalamento;

h) Melhora no comportamento social com o grupo.


181

FONTE: Disponível em:


<http://www.zoonews.com.br/arquivos/Image/560x370/camundongos_univali.JPG>.

Valores éticos estão envolvidos em todo o processo experimental, desde a justificativa


para a realização do experimento, a escolha do modelo adequado para a pesquisa, o número de
animais e como estes serão alojados, a utilização de anestésicos e analgésicos quando
necessários, entre outros. Todos estes pontos exigem considerações e postura ética do
pesquisador. Estas questões são atualmente avaliadas pelas comissões de ética no uso de
animais onde o caráter ético do experimento proposto e da utilização de animais é questionado.

Apesar de sua grande contribuição no refinamento dos experimentos realizados com


animais estas comissões não têm como fiscalizar e, na prática o bem-estar do animal dependerá
apenas da conduta ética dos pesquisadores.

Mais uma vez, a capacitação, treinamento e conscientização de pessoas que lidam


com estes animais, são fundamentais para melhoria no grau de bem-estar.
22.2 BIOÉTICA

A ética profissional tem sido cada vez mais discutida nos procedimentos com usos de
animais e experimentações, o CFMV criou as Comissões de Éticas, sendo o CEBEA – Comissão
de Ética e Bem-Estar Animal. Diante do CFMV tem-se:
182

RESOLUÇÃO Nº 879, DE 15 DE FEVEREIRO DE 2008

Dispõe sobre o uso de animais no ensino e na pesquisa e regulamenta as


Comissões de Ética no Uso de Animais (CEUAs) no âmbito da Medicina Veterinária e da
Zootecnia brasileiras e dá outras providências. Considerando a necessidade de
disciplinar, uniformizar e normatizar o uso científico de animais sencientes no ensino e na
pesquisa médica-veterinária e zootécnica, em nível nacional; considerando a necessidade
de adequar ou criar comissões de ética no uso de animais nas instituições de ensino
superior e de pesquisa no âmbito da Medicina Veterinária e da Zootecnia; considerando
que a formação do médico veterinário e do zootecnista lhes imputa o zelo pelo bem-estar
animal; com o intuito de atender às necessidades físicas, mentais, etológicas e sanitárias
dos mesmos; considerando a necessidade da aplicação das Cinco Liberdades do bem-
estar animal no ensino e na experimentação; considerando a necessidade de adotar o
Princípio dos “3 R's”, substituir, reduzir e refinar, no uso de animais no ensino e na
experimentação.

Quanto a legislação, recentemente foi aprovado e publicada em no Diário Oficial da


União – 09 de outubro de 2008:

LEI FEDERAL Nº 11.794


Regulamenta o inciso VII do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelecendo
procedimentos para o uso científico de animais; revoga a Lei 6.638, de 8 de maio de 1979; e dá
outras providências.

CAPÍTULO I

DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1o A criação e a utilização de animais em atividades de ensino e pesquisa


183
científica, em todo o território nacional, obedecem aos critérios estabelecidos nesta Lei.

§ 1o A utilização de animais em atividades educacionais fica restrita a:

I – estabelecimentos de ensino superior;

II – estabelecimentos de educação profissional técnica de nível médio da área


biomédica.

§ 2o São consideradas como atividades de pesquisa científica todas aquelas


relacionadas com ciência básica, ciência aplicada, desenvolvimento tecnológico, produção e
controle da qualidade de drogas, medicamentos, alimentos, imunobiológicos, instrumentos, ou
quaisquer outros testados em animais, conforme definido em regulamento próprio.

§ 3o Não são consideradas como atividades de pesquisa as práticas zootécnicas


relacionadas à agropecuária.

Art. 2o O disposto nesta Lei aplica-se aos animais das espécies classificadas como filo
Chordata, subfilo Vertebrata, observada a legislação ambiental.

Art. 3o Para as finalidades desta Lei entende-se por:

I – filo Chordata: animais que possuem como características exclusivas, ao menos na


fase embrionária, a presença de notocorda, fendas branquiais na faringe e tubo nervoso dorsal
único;

II – subfilo Vertebrata: animais cordados que têm como características exclusivas, um


encéfalo grande encerrado numa caixa craniana e uma coluna vertebral;

III – experimentos: procedimentos efetuados em animais vivos, visando à elucidação


de fenômenos fisiológicos ou patológicos, mediante técnicas específicas e preestabelecidas;
IV – morte por meios humanitários: a morte de um animal em condições que envolvam,
segundo as espécies, um mínimo de sofrimento físico ou mental.

Parágrafo único. Não se considera experimento:

I – a profilaxia e o tratamento veterinário do animal que deles necessite;

II – o anilhamento, a tatuagem, a marcação ou a aplicação de outro método com


finalidade de identificação do animal, desde que cause apenas dor ou aflição momentânea ou
184
dano passageiro;

III – as intervenções não experimentais relacionadas às práticas agropecuárias.

CAPÍTULO II

DO CONSELHO NACIONAL DE CONTROLE DE

EXPERIMENTAÇÃO ANIMAL – CONCEA

Art. 4o Fica criado o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal –


CONCEA.

Art. 5o Compete ao CONCEA:

I – formular e zelar pelo cumprimento das normas relativas à utilização humanitária de


animais com finalidade de ensino e pesquisa científica;

II – credenciar instituições para criação ou utilização de animais em ensino e pesquisa


científica;

III – monitorar e avaliar a introdução de técnicas alternativas que substituam a


utilização de animais em ensino e pesquisa;

IV – estabelecer e rever, periodicamente, as normas para uso e cuidados com animais


para ensino e pesquisa, em consonância com as convenções internacionais das quais o Brasil
seja signatário;
V – estabelecer e rever, periodicamente, normas técnicas para instalação e
funcionamento de centros de criação, de biotérios e de laboratórios de experimentação animal,
bem como sobre as condições de trabalho em tais instalações;

VI – estabelecer e rever, periodicamente, normas para credenciamento de instituições


que criem ou utilizem animais para ensino e pesquisa;

VII – manter cadastro atualizado dos procedimentos de ensino e pesquisa realizados


ou em andamento no País, assim como dos pesquisadores, a partir de informações remetidas 185
pelas Comissões de Ética no Uso de Animais - CEUAs, de que trata o art. 8o desta Lei;

VIII – apreciar e decidir recursos interpostos contra decisões das CEUAs;

IX – elaborar e submeter ao Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, para


aprovação, o seu regimento interno;

X – assessorar o Poder Executivo a respeito das atividades de ensino e pesquisa


tratadas nesta Lei.

Art. 6o O CONCEA é constituído por:

I – Plenário;

II – Câmaras Permanentes e Temporárias;

III – Secretaria-Executiva.

§ 1o As Câmaras Permanentes e Temporárias do CONCEA serão definidas no


regimento interno.

§ 2o A Secretaria-Executiva é responsável pelo expediente do CONCEA e terá o apoio


administrativo do Ministério da Ciência e Tecnologia.

§ 3o O CONCEA poderá valer-se de consultores ad hoc de reconhecida competência


técnica e científica, para instruir quaisquer processos de sua pauta de trabalhos.

Art. 7o O CONCEA será presidido pelo Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia e


integrado por:

I – 1 (um) representante de cada órgão e entidades a seguir indicadas:


a) Ministério da Ciência e Tecnologia;

b) Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq;

c) Ministério da Educação;

d) Ministério do Meio Ambiente;

e) Ministério da Saúde;

f) Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; 186

g) Conselho de Reitores das Universidades do Brasil – CRUB;

h) Academia Brasileira de Ciências;

i) Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência;

j) Federação das Sociedades de Biologia Experimental;

l) Colégio Brasileiro de Experimentação Animal;

m) Federação Nacional da Indústria Farmacêutica;

II – 2 (dois) representantes das sociedades protetoras de animais legalmente


estabelecidas no País.

§ 1o Nos seus impedimentos, o Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia será


substituído, na Presidência do CONCEA, pelo Secretário-Executivo do respectivo Ministério.

§ 2o O Presidente do CONCEA terá o voto de qualidade.

§ 3o Os membros do CONCEA não serão remunerados, sendo os serviços por eles


prestados considerados, para todos os efeitos, de relevante serviço público.

CAPÍTULO III

DAS COMISSÕES DE ÉTICA NO USO DE ANIMAIS – CEUAs

Art. 8o É condição indispensável para o credenciamento das instituições com


atividades de ensino ou pesquisa com animais a constituição prévia de Comissões de Ética no
Uso de Animais – CEUAs.

Art. 9o As CEUAs são integradas por:


I – médicos veterinários e biólogos;

II – docentes e pesquisadores na área específica;

III – 1 (um) representante de sociedades protetoras de animais legalmente


estabelecidas no País, na forma do Regulamento.

Art. 10. Compete às CEUAs:

I – cumprir e fazer cumprir, no âmbito de suas atribuições, o disposto nesta Lei e nas 187
demais normas aplicáveis à utilização de animais para ensino e pesquisa, especialmente nas
resoluções do CONCEA;

II – examinar previamente os procedimentos de ensino e pesquisa a serem realizados


na instituição à qual esteja vinculada, para determinar sua compatibilidade com a legislação
aplicável;

III – manter cadastro atualizado dos procedimentos de ensino e pesquisa realizados,


ou em andamento, na instituição, enviando cópia ao CONCEA;

IV – manter cadastro dos pesquisadores que realizem procedimentos de ensino e


pesquisa, enviando cópia ao CONCEA;

V – expedir, no âmbito de suas atribuições, certificados que se fizerem necessários


perante órgãos de financiamento de pesquisa, periódicos científicos ou outros;

VI – notificar imediatamente ao CONCEA e às autoridades sanitárias a ocorrência de


qualquer acidente com os animais nas instituições credenciadas, fornecendo informações que
permitam ações saneadoras.

§ 1o Constatado qualquer procedimento em descumprimento às disposições desta Lei


na execução de atividade de ensino e pesquisa, a respectiva CEUA determinará a paralisação
de sua execução, até que a irregularidade seja sanada, sem prejuízo da aplicação de outras
sanções cabíveis.

§ 2o Quando se configurar a hipótese prevista no § 1o deste artigo, a omissão da CEUA


acarretará sanções à instituição, nos termos dos arts. 17 e 20 desta Lei.

§ 3o Das decisões proferidas pelas CEUAs cabe recurso, sem efeito suspensivo, ao
CONCEA.
§ 4o Os membros das CEUAs responderão pelos prejuízos que, por dolo, causarem às
pesquisas em andamento.

§ 5o Os membros das CEUAs estão obrigados a resguardar o segredo industrial, sob


pena de responsabilidade.

CAPÍTULO IV

DAS CONDIÇÕES DE CRIAÇÃO E USO DE ANIMAIS PARA ENSINO E


188
PESQUISA CIENTÍFICA

Art. 11. Compete ao Ministério da Ciência e Tecnologia licenciar as atividades


destinadas à criação de animais, ao ensino e à pesquisa científica de que trata esta Lei.

Art. 12. A criação ou a utilização de animais para pesquisa ficam restritas,


exclusivamente, às instituições credenciadas no CONCEA.

Art. 13. Qualquer instituição legalmente estabelecida em território nacional que crie ou
utilize animais para ensino e pesquisa deverá requerer credenciamento no CONCEA, para uso
de animais, desde que, previamente, crie a CEUA.

§ 1o A critério da instituição e mediante autorização do CONCEA, é admitida a criação


de mais de uma CEUA por instituição.

§ 2o Na hipótese prevista no § 1o deste artigo, cada CEUA definirá os laboratórios de


experimentação animal, biotérios e centros de criação sob seu controle.

Art. 14. O animal só poderá ser submetido às intervenções recomendadas nos


protocolos dos experimentos que constituem a pesquisa ou programa de aprendizado quando,
antes, durante e após o experimento, receber cuidados especiais, conforme estabelecido pelo
CONCEA.

§ 1o O animal será submetido a eutanásia, sob estrita obediência às prescrições


pertinentes a cada espécie, conforme as diretrizes do Ministério da Ciência e Tecnologia, sempre
que, encerrado o experimento ou em qualquer de suas fases, for tecnicamente recomendado
aquele procedimento ou quando ocorrer intenso sofrimento.

§ 2o Excepcionalmente, quando os animais utilizados em experiências ou


demonstrações não forem submetidos a eutanásia, poderão sair do biotério após a intervenção,
ouvida a respectiva CEUA quanto aos critérios vigentes de segurança, desde que destinados a
pessoas idôneas ou entidades protetoras de animais devidamente legalizadas, que por eles
queiram responsabilizar-se.

§ 3o Sempre que possível, as práticas de ensino deverão ser fotografadas, filmadas ou


gravadas, de forma a permitir sua reprodução para ilustração de práticas futuras, evitando-se a
repetição desnecessária de procedimentos didáticos com animais.

§ 4o O número de animais a serem utilizados para a execução de um projeto e o tempo 189


de duração de cada experimento será o mínimo indispensável para produzir o resultado
conclusivo, poupando-se, ao máximo, o animal de sofrimento.

§ 5o Experimentos que possam causar dor ou angústia desenvolver-se-ão sob


sedação, analgesia ou anestesia adequadas.

§ 6o Experimentos cujo objetivo seja o estudo dos processos relacionados à dor e à


angústia exigem autorização específica da CEUA, em obediência a normas estabelecidas pelo
CONCEA.

§ 7o É vedado o uso de bloqueadores neuromusculares ou de relaxantes musculares


em substituição a substâncias sedativas, analgésicas ou anestésicas.

§ 8o É vedada a reutilização do mesmo animal depois de alcançado o objetivo principal


do projeto de pesquisa.

§ 9o Em programa de ensino, sempre que forem empregados procedimentos


traumáticos, vários procedimentos poderão ser realizados num mesmo animal, desde que todos
sejam executados durante a vigência de um único anestésico e que o animal seja sacrificado
antes de recobrar a consciência.

§ 10. Para a realização de trabalhos de criação e experimentação de animais em


sistemas fechados, serão consideradas as condições e normas de segurança recomendadas
pelos organismos internacionais aos quais o Brasil se vincula.

Art. 15. O CONCEA, levando em conta a relação entre o nível de sofrimento para o
animal e os resultados práticos que se esperam obter, poderá restringir ou proibir experimentos
que importem em elevado grau de agressão.
Art. 16. Todo projeto de pesquisa científica ou atividade de ensino será supervisionado
por profissional de nível superior, graduado ou pós-graduado na área biomédica, vinculado a
entidade de ensino ou pesquisa credenciada pelo CONCEA.

CAPÍTULO V

DAS PENALIDADES

Art. 17. As instituições que executem atividades reguladas por esta Lei estão sujeitas,
190
em caso de transgressão às suas disposições e ao seu regulamento, às penalidades
administrativas de:

I – advertência;

II – multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 20.000,00 (vinte mil reais);

III – interdição temporária;

IV – suspensão de financiamentos provenientes de fontes oficiais de crédito e fomento


científico;

V – interdição definitiva.

Parágrafo único. A interdição por prazo superior a 30 (trinta) dias somente poderá ser
determinada em ato do Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, ouvido o CONCEA.

Art. 18. Qualquer pessoa que execute de forma indevida atividades reguladas por esta
Lei ou participe de procedimentos não autorizados pelo CONCEA será passível das seguintes
penalidades administrativas:

I – advertência;

II – multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 5.000,00 (cinco mil reais);

III – suspensão temporária;

IV – interdição definitiva para o exercício da atividade regulada nesta Lei.

Art. 19. As penalidades previstas nos arts. 17 e 18 desta Lei serão aplicadas de acordo
com a gravidade da infração, os danos que dela provierem, as circunstâncias agravantes ou
atenuantes e os antecedentes do infrator.
Art. 20. As sanções previstas nos arts. 17 e 18 desta Lei serão aplicadas pelo
CONCEA, sem prejuízo de correspondente responsabilidade penal.

Art. 21. A fiscalização das atividades reguladas por esta Lei fica a cargo dos órgãos
dos Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Saúde, da Educação, da Ciência e
Tecnologia e do Meio Ambiente, nas respectivas áreas de competência.

CAPÍTULO VI

191
DISPOSIÇÕES GERAIS E TRANSITÓRIAS

Art. 22. As instituições que criem ou utilizem animais para ensino ou pesquisa
existentes no País antes da data de vigência desta Lei deverão:

I – criar a CEUA, no prazo máximo de 90 (noventa) dias, após a regulamentação


referida no art. 25 desta Lei;

II – compatibilizar suas instalações físicas, no prazo máximo de 5 (cinco) anos, a partir


da entrada em vigor das normas estabelecidas pelo CONCEA, com base no inciso V do caput
do art. 5o desta Lei.

Art. 23. O CONCEA, mediante resolução, recomendará às agências de amparo e


fomento à pesquisa científica o indeferimento de projetos por qualquer dos seguintes motivos:

I – que estejam sendo realizados sem a aprovação da CEUA;

II – cuja realização tenha sido suspensa pela CEUA.

Art. 24. Os recursos orçamentários necessários ao funcionamento do CONCEA serão


previstos nas dotações do Ministério da Ciência e Tecnologia.

Art. 25. Esta Lei será regulamentada no prazo de 180 (cento e oitenta) dias.

Art. 26. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 27. Revoga-se a Lei. 6.638, de 8 de maio de 1979.


23 ÉTICA PROFISSIONAL E O BEM-ESTAR ANIMAL: MÉDICOS VETERINÁRIOS

As questões éticas e de BEA são de grande importância em todos os âmbitos da


profissão médica veterinária. O Conselho Federal de Medicina Veterinária constituiu o CEBEA –
Comissão de Ética e Bem-estar Animal para melhor acompanhar tais aspectos e suas diferentes
implicações nas atividades profissionais veterinárias. A vivisecção e processo/métodos de
192
experimentação são temas que atraem a atenção de especialistas e da opinião pública em geral.

Os aspectos mais comumente discutidos quanto a ética, em muitos casos denominada


bioética, ao se relacionar a ética profissional aos aspectos de BEA, referem-se ao uso de
animais em experimentações e recém-regulamentado pela Lei 11 794 de 9 de outubro de 2008,
que também cria o CONCEA – Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal. O
CFMV dispõe a Resolução 879 de 15 de fevereiro de 2008 sobre o uso de animais no ensino e
na pesquisa e regulamenta as Comissões de Ética no Uso de Animais (CEUAs) no âmbito da
Medicina Veterinária e da Zootecnia brasileira (DOU 25-04-2008).

No segmento da clínica de animais de companhia referem-se, por exemplo, as


cirurgias consideradas mutilantes, a Resolução 877 de 15 de fevereiro de 2008, do CFMV dispõe
sobre o assunto abrangendo os animais de produção e silvestres, considerando também formas
e procedimentos cirúrgicos.

23.1 BIOÉTICA

O termo "Bioética" foi utilizado pela primeira vez pelo bioquímico norte-americano Van
Rensselaer Potter (1911-2001), pesquisador em oncologia da Universidade de Wisconsin. O
termo, lançado em seu artigo "Bioethics, the science of survival" (1970) e difundido no livro
"Bioethics, bridge to the future" (1971), referia-se a um novo conhecimento que procuraria ligar
as ciências biológicas e os valores morais.
Uma aplicação da Bioética e que pode ser útil em seus conceitos para aqueles que
trabalham com animais, especialmente os médicos veterinários, é a teoria do australiano Peter
Singer, bioeticista e professor da Universidade de Princeton. Singer desenvolve o princípio da
igual consideração de interesses em que cada ser afetado por uma ação deve ser levado em
conta e receber o mesmo peso que os interesses semelhantes de qualquer outro ser. A dor e o
sofrimento são em si mesmo, ruins e devem ser evitados ou minimizados, não importa a raça, o
sexo ou a espécie do ser que sofre.
193
Já o Bem-estar Animal é uma ciência voltada para o conhecimento e a satisfação das
necessidades básicas dos animais; o grau em que as necessidades físicas, psicológicas,
comportamentais, sociais e ambientais de um animal são satisfeitas, bem como sua capacidade
de se adaptar a situações. O BEA também pode ser considerado como uma ferramenta,
instrumentalizando aquele que a utiliza com um conjunto de conceitos e parâmetros objetivos
que permitem a avaliação da qualidade de vida dos animais. Considerando que um estado pobre
de bem-estar pode originar, entre outras consequências, redução da expectativa de vida,
redução da habilidade para crescer e produzir, baixa ou ausente aptidão para a reprodução,
imunossupressão, lesões corporais e doenças, alterações comportamentais, alteração do
processo fisiológico normal e do desenvolvimento anatômico, todas indicativas de baixa
qualidade de vida e de sofrimento animal.

Recentemente a American Veterinary Medical Association's (AVMA) estabeleceu os


"princípios do Bem-estar Animal", que servirão como um guia para avaliar políticas, resoluções e
ações relativas aos animais nos Estados Unidos. Estes princípios pressupõem que os médicos
veterinários devem se esforçar, continuamente, para prover saúde e bem-estar aos animais,
ressaltando que sua utilização deve ser responsável, fundamentada no conhecimento científico,
na ética e nos valores da sociedade. Apontam a obrigação de prover as necessidades básicas
como água, alimento, manejo adequado, cuidados com a saúde e um ambiente apropriado, em
consideração à biologia e ao comportamento, característicos da espécie, assim como também
consideram os cuidados que devemos tomar para minimizar seu medo, dor, estresse e
sofrimento.

Os médicos veterinários, executando tarefas e funções muitas vezes bem


diferenciadas, podem aplicar os princípios de esses dois saberes - a Bioética e o Bem-estar
Animal - de múltiplas formas.
23.2 ANIMAIS DE PRODUÇÃO

Os diferentes setores de produção animal têm questionado pontos essenciais quanto


aos interesses de produção BEA e ética.

Em suinocultura, alguns questionamentos podem ser colocados: 194

a) Como fazer para compatibilizar os interesses econômicos da indústria animal


(genética, fármacos, insumos equipamentos, etc.) e dos produtores (incremento na
produtividade) com o atendimento das necessidades biológicas dos animais de forma a garantir
sua saúde e bem-estar?
b) Que estratégias devem ser usadas no sentido de conscientizar a sociedade
sobre a necessidade de se aumentar o valor da vida de cada animal de produção?
A promoção do bem-estar de animais de fazenda visa satisfazer certas necessidades
básicas (por alimento, água, espaço físico, ambiente limpo, etc.) e evitar certos danos físicos
(doença, injúria, estresse e exposição excessiva a ambientes inóspitos).

No entanto, os custos do bem-estar na produção de suínos onde os sistemas atingir,


por exemplo, em animais para reprodução, desmamar um número máximo de leitões por
porca/ano, enquanto aqueles que trabalham com recria e engorda, buscam alcançar seu objetivo
no menor número de dias possível. A produção de suínos em larga escala associada à pequena
margem de lucros desta atividade comercial reduziu drasticamente a atenção individualizada a
ser dispensada aos animais no plantel. O sistema de confinamento, procura racionalizar estas
situações e aumentar a margem de lucros do criador, porém confere uma série de problemas
com a redução desta atenção ao animal em si, no que se refere a bem-estar.

Por esta razão, sistemas alternativos de criação como a criação ao ar livre de suínos,
têm sido propostas e já vem sendo utilizada há anos em países da União Europeia. Mas é
importante que se discuta sobre a sustentabilidade deste modelo sob diferentes condições,
mesmo porque, atualmente este tipo de sistema criatório para obtenção de carne com qualidade
ética – “orgânica”, procura atender a mercados que já têm essa conscientização.

No Brasil, o sistema Siscal preconizado pela Embrapa Suínos e Aves e que durante
anos tem sido usado por inúmeros criadores do Sul tem se apresentado como uma opção de
suinocultura em bases sustentáveis, em razão de suas características produtivas (ausência de
piso de concreto, uso de piquetes, liberdade para realizar movimentos e exteriorizar condutas
típicas da espécie, melhores condições ambientais, redução no uso de fármacos, principalmente
antibióticos etc.), e consequentemente vêm contribuindo para a melhoria do bem-estar dos
suínos nas várias fases da produção.

Outros setores também têm buscado se adaptarem as questões de bem-estar


promovendo modificações senão quanto ao sistema criatório, ao menos a pontos importantes
195
como adaptação climática – controle de temperatura – ou seja questões de AMBIÊNCIA; ainda
de instalações entre outros.
24 A CLÍNICA E O BEM-ESTAR ANIMAL

24.1 DOR

196

A dor serve como sinal de alerta para que os indivíduos percebam a ocorrência de
dano tecidual e que estabeleçam mecanismos de defesa ou de fuga. Esta é a dor conhecida
como fisiológica e tem função protetora, porém sua persistência, com dano tecidual, pode
significar algum processo patológico. A dor, clinicamente, pode ter significado variado, mas
sempre leva a suspeita clínica e necessidade de verificação de sua origem.

24.2 AVALIAÇÃO DA DOR EM ANIMAIS


De forma geral os estímulos que causam dor nas diferentes espécies de animais são
muito similares, havendo uma similaridade de limiar de dor para estímulos, mecânicos, térmicos
ou químicos. A variação entre as espécies não ocorre pela sensação em si, mas sim pela forma
de manifestação comportamental reativa frente ao estímulo doloroso.

Dentre os animais domésticos, os animais de produção são os que mais possivelmente


são expostos à dor, tanto pelo fato de que raramente recebem profilaxia ou tratamento
analgésico em condições clínicas, como pelo fato que são submetidos a diversos procedimentos
197
cruentos com a finalidade de aumentar a capacidade produtiva ou corrigir problemas
relacionados com a produção.

Dentre as causas principais de dor e sofrimento em animais de produção têm-se a


marcação a quente ou frio, orquiectomia, descorna, mastite e laminite em ruminantes, a muda
forçada, a debicagem e a doença degenerativa articular em aves domésticas e a caudectomia,
orquiectomia e o corte de dentes em suínos. Adicionalmente o próprio manejo dos animais pode
desencadear um estímulo que gere sofrimento e dor, como em casos de traumas durante o
transporte e a falta de espaço pelo confinamento, neste caso principalmente em aves de postura
e de corte e em criações intensivas de suínos.

Marcação a ferro.
198

Debicagem

Mastite bovina
24.3 ESTRESSE

A dor é provocada por estímulos e estímulos podem desencadear reações e respostas


de estresse do organismo. A dor é um agente estressor.

Os objetivos da terapêutica com analgésicos e sedativos diante da dor patológica são 199

os de:

 Obter a estabilidade fisiológica máxima;


 Aliviar a dor;
 Diminuir a ansiedade.

Em processos de trauma:

- Diminuindo o nível de consciência;

- Diminuindo a memória;

- Minimizar as consequências fisiológicas negativas.

O impacto da dor e ansiedade na resposta humoral é caracterizado por um aumento


nos níveis circulantes dos hormônios catabolizantes como as catecolaminas, glucagon e cortisol.
Os efeitos metabólicos da resposta hormonal ao estresse incluem: aumento do consumo de
oxigênio, glicogenólise, gliconeogênese e lipólise (tabela 1).
Tabela 1: Respostas metabólicas Neuroendócrinas devidas a Lesão Cirúrgica ou
Traumática
ENDÓCRINA:

 Aumento do hormônio adrenocorticotrópico- ACTH, cortisol, hormônio antidiurético-


HAD, hormônio de crescimento, glucagon, renina, aldosterona;
 Diminuição na Insulina e Aldosterona.

METABÓLICA:
200
 Carboidratos: hiperglicemia, resistência a insulina, intolerância a glicose.
 Proteínas: aumento do catabolismo fornecendo aminoácidos para a glicogênese.
 Gorduras: aumento da lipólise fornecendo ácidos graxos livres.

ÁGUA E ELETRÓLITOS:

 Retenção de água e sódio;


 Excreção aumentada de K+

A resposta corpórea ao trauma ou cirurgia provoca uma síndrome de adaptação geral


ou resposta ao estresse que pode ser amplificada por vários outros fatores. (Tabela 2)

A magnitude da resposta ao estresse está relacionada diretamente ao grau da lesão


tecidual.

O estresse é definido como sendo o estado do organismo que, após a atuação de


agentes ambientais de qualquer natureza (estressores), responde com uma série de reações
não específicas de adaptação (Síndrome de Adaptação Geral).

No estresse, é a glândula adrenal que desempenha as mais importantes funções. O


córtex da adrenal é o responsável pela produção dos corticosteroides. Destes, os
glicocorticosteroides ou glicocorticoides têm como principal função a regulação do metabolismo
dos carboidratos, proteínas e lipídios, levando à formação de glicose por meio da degradação de
proteínas e gorduras, o que resulta em um aumento na concentração do açúcar do sangue.

A Síndrome de Adaptação Geral é a ferramenta do organismo para reduzir os efeitos


dos estressores, entretanto, quando o estado de estresse é intenso ou prolongado , o efeito
catabólico dos glicocorticosteroides sobre os tecidos - ósseo, conjuntivo e órgãos linfáticos pode
ser altamente prejudicial até levá-lo à morte.
201

24.4 MECANISMO DO ESTRESSE

Classicamente, um agente estressor é aquele que possui a capacidade para alterar a


homeostasia, provocando a ativação do eixo hipotalâmico-hipofisário-adrenal. Como exemplos
de agentes estressores, podem-se citar fome, dor, calor/frio, ansiedade, medo, entre outros
fatores.

Os glicocorticoides, em conjunto com as catecolaminas irão provocar alterações


metabólicas visando mobilizar e fornecer energia para o organismo, por meio da lipólise, da
glicogenólise e da degradação de proteínas, dando subsídios para que o corpo possa
restabelecer o equilíbrio. Além destes efeitos, ocorre a secreção de arginina vasopressina
(ADH), ocitocina, prolactina, hormônio somatotrófico (GH) e do hormônio estimulador da tireoide
(TSH) que irão atuar promovendo o aumento da produção e secreção de ACTH e α-endorfinas
na adeno-hipófise e no aumento da atividade metabólica geral. A regulação do eixo HPA é
fornecida por um mecanismo de retroalimentação negativa (feedback negativo) pelos
glicocorticoides, que atuam sobre o hipotálamo, inibindo a liberação de CRH, e na adeno-
hipófise, inibindo a secreção de ACTH.
202

De forma geral, o mecanismo do estresse pode ser dividido em três etapas ou


fases:

1) Reação de alarme:
- Pode ser subdividida em:

 Fase de choque:
Consiste no desencadeamento provocado pelo agente estressor que irá ativar o eixo
HHA. Nesta fase, ocorre também a participação do sistema nervoso autônomo, ativando as
respostas físicas, mentais e psicológicas ao estresse.

 Fase de contrachoque:
Consiste na fase de reação marcada pela mobilização das forças defensivas em que o
córtex adrenal e a secreção dos hormônios adrenocorticóides aumentam.

2) Fase de resistência:

Há uma atuação predominante da adrenal, ocorrendo uma atuação máxima de


glicocorticoides e catecolaminas. Estes atuam ativando a glicogenólise no líquido extracelular e a
glicogênese e gliconeogênese no fígado, inibindo a insulina e estimulando o glucagon. Isto
permite um maior aporte de glicose para todo o organismo, principalmente para as células
cerebrais e musculares. Os glicocorticoides atuam também controlando as catecolaminas, que
necessitam de glicose para sua síntese.

3) A fase de esgotamento:

203
Começam a falhar os mecanismos adaptativos e inicia-se um déficit energético, pois as
reservas corporais estão esgotadas. As modificações biológicas que ocorrem nesta fase são
semelhantes à primeira fase, porém o organismo não tem mais capacidade de prover substratos
energéticos para o corpo.

Este mecanismo adaptativo do organismo é conhecido como Síndrome da Adaptação


Geral, que viabiliza a manutenção da vida diante das transformações constantes.

24.5 EFEITOS DO ESTRESSE SOBRE OS ANIMAIS

Reprodutivos:

São bem conhecidos os efeitos dos hormônios do estresse sobre a função reprodutiva.

Sabe-se que o CRH atua de forma inibitória sobre o hormônio liberador de


gonadotrofinas (GnRH) no hipotálamo, o que provoca um inibição no eixo hipotalâmico-
hipofisário-gonadal (HHG). Em consequência disso, a hipófise não secreta o hormônio
luteinizante (LH) e o hormônio folículo estimulante (FSH).

Animais de vida livre também sofrem os efeitos do estresse e alguns trabalhos


demonstram isto de forma interessante.

Os primatas do gênero Alouatta sp têm sido mantidos em cativeiro com dificuldades


devido a má adaptação da espécie, desenvolvendo quadros de anorexia, inanição, úlceras
gástricas, infecções secundárias e morte. Baixas taxas reprodutivas também são registradas
nesta espécie, em razão ao estresse crônico.

204

Em animais domésticos, têm sido demonstrados que alguns fatores estressantes


levam a queda da produção, transtornos reprodutivos, distúrbios comportamentais e alterações
fisiológicas importantes. Em vacas leiteiras, o estresse calórico leva a uma queda na produção
de leite devido ao menor consumo de matéria seca, ocorrendo um balanço energético negativo
prolongado pós-parto e aumentando o intervalo entre partos. Além disso, há uma queda na
fertilidade, evidenciada por ausência de manifestação de estro e diminuição da eleição de um
folículo dominante.

Em suínos, a restrição alimentar, uma forma de manejo adotado na maioria das


granjas comerciais, para evitar que as porcas cheguem ao final da gestação com sobrepeso, tem
gerado o aparecimento de comportamentos anormais. Como os animais ficam saciados por
menos tempo, é comum observar os animais inquietos, roendo barras de ferro, engolindo ar
(aerofagia), ficando agitados no recinto, entre outros comportamentos estereotipados. Altos
níveis de cortisol foram observados em porcas mantidas nestas condições, influenciando
negativamente os índices reprodutivos e o bem-estar. O uso de fibra na dieta tem sido adotado
para fazer com que a sensação de saciedade possa ser fornecida, minimizando estresse.
24.5.1 Comportamentais

O cativeiro por si só é um fator limitante ao animal, sendo que algumas espécies não
conseguem adaptar-se na vida cativa, desenvolvendo a chamada síndrome da má adaptação,
onde os animais iniciam um processo de anorexia que pode levar à morte.
205
Existem evidências de que o excesso de sons em zoológicos pode influenciar
negativamente a função reprodutiva em alguns animais, como demonstrado, em panda gigante
(Ailuropoda melanoleuca). Estudos de comportamento dos pandas gigantes também fizeram
com que as taxas reprodutivas triplicassem em sete anos, por meio do enriquecimento
ambiental, observação dos sinais de estro, e familiarizando os casais por meio de estímulos
visuais e olfativos no período reprodutivo. Programas de enriquecimento em zoológicos com
pandas cativos têm demonstrado ser efetivos para promover o bem-estar animal, aumentando as
taxas reprodutivas destes animais e minimizando o estresse do cativeiro.

Tem sido demonstrado que o transporte para transferência de recintos em zoológicos


pode atuar de forma estressante em tigres (Panthera tigris) cativos, por meio do aumento dos
níveis de cortisol, alterando negativamente também seu comportamento. Em elefantes cativos, o
estresse leva ao aparecimento de comportamentos repetitivos como balançar constante de
cabeça, observação comum em circos.
Primatas apresentam comportamentos estereotipados e automutilação em virtude de
um ambiente pouco atrativo. O aumento do comportamento autodirecionado (catação, toque e 206
coçar) em primatas não humanos servem como indicadores de estresse e ansiedade.

Em animais de vida livre, a hierarquia social e a manutenção da dominância podem


levar os animais a quadros de constante estresse. Em lobos (Canis lupus) altos níveis de cortisol
foram associados com animais dominantes, sendo de alto custo para a espécie manter
dominância, devido ao estresse crônico.

24.5.2 Imunológicos

Níveis aumentados de corticoides influenciam na resposta imune, inibindo a resposta


inflamatória, afetando a atuação das células T, além da diminuição da migração de leucócitos
para áreas inflamatórias. Dessa forma, este mecanismo pode ser benéfico temporariamente,
diminuindo a resposta inflamatória em situações agudas, porém sendo prejudicial em situações
crônicas. Além disso, se o estresse for prolongado, os glicocorticoides atuam de forma destrutiva
nos tecidos, inibindo o crescimento somático e ósseo.
24.5.3 Minimizando o estresse e melhorando as condições de qualidade de vida do animal

Estudos de comportamento em animais de zoológico contribuem para o bem-estar dos


animais cativos e auxiliam na formulação de métodos mais efetivos para o desenvolvimento de
ambientes e técnicas de manejo adequado, bem como para a reprodução em cativeiro e
207
reintrodução de animais a vida livre. Uma das formas de propiciar melhores condições de vida
aos animais em parques zoológicos é por meio do uso de enriquecimento ambiental.

O enriquecimento ambiental consiste em uma série de modificações no ambiente físico


e social, melhorando a qualidade de vida dos animais cativos por contemplar suas necessidades
etológicas. É um princípio no manejo animal que procura ampliar a qualidade de vida dos
animais em cativeiro por meio da identificação e fornecimento de estímulos ambientais
necessários para alcançar o bem-estar psíquico e fisiológico, estimulando comportamentos
típicos da espécie, reduzindo estresse e tornando o ambiente cativo mais complexo e diverso.

A redução do estresse, a diminuição de distúrbios comportamentais, redução de


intervenções clínicas, diminuição da mortalidade e aumento de taxas reprodutivas são alguns
benefícios do enriquecimento ambiental.

24.5.4 Animais de Companhia

Os proprietários têm a possibilidade de reconhecimento precoce de sinais de doenças


em seus animais de companhia. Como já mencionado a avaliação do processo de dor, suas
causas podem não ser fáceis e necessitam de critérios por parte do veterinário. Muitas vezes, os
animais podem inclusive apresentar vários sinais, representativos de mais de um processo:

- Temperatura, taxa respiratória e batimentos cardíacos.


Animais mais ativos, permanência sob o sol, o estado fisiológico, condições
momentâneas de estresse podem fazer com que a média de temperatura corporal se eleve em
até 1°C, no momento de sua aferição. O mesmo cuidado com relação à verificação de
batimentos cardíacos, tempo de preenchimento capilar e movimentos respiratórios.

208
24.5.5 Alterações de comportamento

Animais de companhia mantidos em ambientes inadequados as suas necessidades, ou


que não as atendam ainda expostos a fatores psicológicos e emocionais negativos podem
apresentar problemas como a depressão; ansiedade, fadiga, sonolência, hiperatividade,
tremores e perda de peso. Estes podem levar a transtornos comportamentais de repetição, por
exemplo; automutilação e favorecer a doenças autoimunes.

O animal pode manifestar dor, por inquietudes ou falta de atividade, acompanhadas ou


não de vocalizações, movimentos de escavar. Dores agudas em geral são acompanhadas de
vocalização da dor – como em traumas, lesões abruptas. No entanto, deve-se verificar que o
limiar a sensação dolorosa também pode variar, por exemplo, em cães os American Pit Bull
Terriers mostram um elevado limiar à dor, quando comparados a outras raças.

A mudança no temperamento do animal também pode evidenciar processo de dor,


esta, por mecanismos de defesa, pode aumentar a agressividade manifesta do animal. Mento ou
retirada da causa da dor.
25 EUTANÁSIA

Entre os procedimentos utilizados em medicina veterinária, está a eutanásia, utilizada


com alguma frequência em pequenos animais. Este procedimento pode ser utilizado com
diversos objetivos, entre eles o alívio do sofrimento. Discutem-se atualmente, no país, leis que
209
limitam a natalidade e/ou a proibição de determinadas raças, e há quem defenda a eutanásia
deste tipo de cão.

Situações éticas sobre a eutanásia como em casos de animais de produção; animais


de experimentação possam ser mais claras e objetivas; no caso de animais de companhia há
além de fatores ético-profissionais, bem-estar animal, há ainda o fator psicológico da relação
animal-proprietário. Porém a justa consideração dos aspectos de qualidade de vida do animal e
de bem-estar do mesmo pode ajudar inclusive neste momento.

As questões humanas que envolvem o assunto são complexas e estão além do ponto
de vista ético-profissional, principalmente por ser esta profissão a única com o direito de
execução de um paciente, acatando, na maioria dos casos, ordens de pessoas hierarquicamente
superiores.

O termo EUTANÁSIA vem do grego eu thanos - “boa morte”. Este conceito foi criado
por Francis Bacon (1561-1626) ato de induzir a morte sem dor ou tensão. Como definição,
eutanásia é aquela morte que alguém dá a uma pessoa que sofre de uma enfermidade incurável,
a seu próprio requerimento, para abreviar a agonia demasiada, longa ou dolorosa. Esta é a
definição de sentimento, de piedade e humanidade, presente naquele que pratica a eutanásia.

Em medicina veterinária eutanásia significa que o animal sofrerá uma morte tranquila,
sem sofrimento físico ou mental, que será provocada voluntariamente por compaixão. O ato da
prática da eutanásia animal é exercido nas mais diversas esferas e necessidades atuais,
compreendendo os matadouros, os laboratórios e/ou biotérios, as clínicas veterinárias, partindo
da experimentação animal, obtenção de alimentos de origem animal, e abate por situações
humanitárias e socioeconômicas.
- ABATE: o atato de matas animais para o consumo

- MORTE POR MISERICÓRDIA: matar um animal (de preferência e eticamente


abolindo o processo doloroso) que sofra de uma doença incurável ou pela
impossibilidade de tratamento ou socorro.

A eutanásia é a morte provocada de maneira humanitária e misericordiosa de animais,


executada por pessoas especialmente treinadas, sob a responsabilidade de um médico
veterinário de acordo com a resolução 714 do Conselho Federal de Medicina Veterinária de 20 210
de junho de 2002.

A decisão sobre a eutanásia:

 Autoridades locais podem decidir sobre o controle populacional de animais nas


ruas de um município, por exemplo;
 Proprietários, indivíduos, às vezes, decidem sobre a eutanásia com base no
conceito de que animais não sentem (não são sencientes); são descartáveis – problemas
oriundos em questões socioeconômicas, culturais, psicológicas, emocionais e individuais;
 Médicos veterinários diante de situações e obrigações éticas e profissionais;
 Pesquisadores e cientistas;
 Outros.

No entanto, nos últimos anos tem ocorrido uma crescente preocupação por parte da
sociedade e dos profissionais envolvidos neste processo, quanto à uniformização de
metodologias, e das questões éticas do papel do profissional na indicação da eutanásia quanto
ao posicionamento moral junto aos proprietários, necessitando a observância de parâmetros
éticos específicos e de bem-estar do animal.

A eutanásia animal tem se revestido cada vez mais de aspectos éticos. Neste caso a
eutanásia é realizada quando não existem meios de manter um animal vivo sem sofrimento;
quando clinicamente não há como mantê-lo vivo ou na falta de condições locais para realizar
tratamento clínico ou cirúrgico. Admite-se na hipótese de o proprietário não possuir recursos
financeiros para realizar o tratamento, ou, se não há interesse em gastar alta soma num animal
de esporte que não dará retorno. O veterinário além de adotar método indolor, deve considerar a
afetividade que existe entre o proprietário e seu animal, antes de recomendar a eutanásia.

Há várias causas apontadas para indicação ou solicitação da eutanásia. No Brasil, por


exemplo, a ocorrência da leishmaniose visceral tem gerado polêmica na eutanásia de cães
soropositivos a leishmaniose visceral, por condição de saúde pública, onde: a leishmaniose
visceral pode acometer cães, seu tratamento não é recomendado no Brasil, fato também
polêmico, e é uma enfermidade zoonótica grave ao homem.
211
Também diferentes outros fatores podem levar a eutanásia, não só no Brasil, mas em
diferentes países no mundo. O abandono dos animais pelos seus proprietários é uma das
principais causas de eutanásia com estimativa de oito milhões de cães e gatos eutanasiados;
outros fatores: agressividade, senilidade, enfermidades terminais, traumas, problemas
comportamentais e mesmo animais saudáveis.

Estudos mostram que alguns problemas comportamentais que acabam levando a


eutanásia possuem indicação de tratamento. Na Dinamarca as principais causas de eutanásia
são problemas relacionados à idade (29,6%) ou problemas comportamentais (21,4%), onde na
maioria das vezes os animais que acusam problemas comportamentais não recebem tratamento
prévio a indicação ou prática da eutanásia.

A senilidade é a principal causa pela qual os pequenos animais são eutanasiados na


Inglaterra e Dinamarca. Nos Estados Unidos, estudos mostram que a agressividade é um
importante motivo de eutanásia em cães. O abandono é uma causa bastante expressiva nos
CCZs (Centro de Controle de Zoonoses) de acordo com diversos levantamentos.

É fundamental que se observem os motivos e os princípios bioéticos


profissionais quando da eutanásia:

a- Quer diminuir dor, tensão, sofrimento inaceitável;


b- Quando o estado de saúde dos animais é preocupante, e doenças incuráveis;
c- Para a obtenção de alimentos;
d- Após a realização de uma experiência onde ocorreram efeitos adversos;
segundo o protocolo;
e- Para a obtenção de materiais biológicos com fins científicos;
f- Quando já não servem para a reprodução;
g- Quando o crescimento populacional é demasiadamente alto, como número de
cães vadios nos grandes centros urbanos, quando o sexo não seja ajustável aos fins
experimentais. Quando determinada espécie animal passa a trazer transtornos corriqueiros,
como zoonoses, custos com sua manutenção, incidentes, desequilíbrio ecológico etc., torna-se,
então, necessário o sacrifício destes animais para o bem comum da sociedade e do meio
ambiente. É conveniente ressaltar que nos casos dos animais de companhia, como cães e
gatos, que passam a constituir tais transtornos mais comumente, é um fator decorrente da
irresponsabilidade de seus proprietários quanto a sua guarda, em razão de ser negligente na 212
responsabilidade a qual lhe cabem possuírem um animal.
No caso de animais de companhia ainda o profissional considera a relação animal-
proprietário, onde a decisão final cabe tão somente ao dono. Mas a ética profissional não deve
permitir a eutanásia no caso de animais de estimação por questões de abandono, os motivos
técnicos podem ser variados, porém a prática da eutanásia apenas pela vontade do proprietário
por não desejar mais o animal, não é eticamente correta, neste caso cabem outras
recomendações como a recolocação do animal – adoção. No relacionamento entre veterinário e
cliente, a eutanásia nunca deve ser realizada sem a autorização por escrito do cliente ou agente
legal. Veterinários têm sido processados por clientes que negaram ter dado permissão verbal
para a eutanásia de seus animais.

Nesta relação podem ser considerados vários fatores: importância do animal para a
pessoa/família; idade; gravidade do caso; casos terminais; bem-estar e qualidade de vida do
animal em relação ao seu sofrimento; tempo de sobrevida do animal; disponibilidade dos
familiares para prestarem assistência ao animal quando necessário; fator econômico;
possibilidade de manutenção do animal sob tratamento no domicílio, outros.

Ainda, no caso da opção pela eutanásia:

- O indivíduo ou família devem ser esclarecidos e conscientizados sobre todos os


aspectos relacionados às condições do animal e suas expectativas de vida;

- Esclarecidos sobre questões de qualidade de vida e bem-estar;

- Esclarecidos sobre a eutanásia e tudo que a envolve;


- O profissional veterinário deve ter compreensão que o processo de luto vivenciado
pela perda de entes queridos, no caso de animas de companhia é igualmente experimentado
pelos proprietários que realmente estimam seus animais e deve ter todo o cuidado no
atendimento e esclarecimentos destes.

Distinguem-se as diversas formas de eutanásia, considerando-se os motivos e os


meios empregados na sua execução, bem como a pessoa que a realiza:

a) Eutanásia terapêutica: está relacionada com o emprego ou omissão de meios 213


terapêuticos a fim de obter a morte do paciente, distinguindo-se, nos casos presentes aplicáveis
a eutanásia animal:

 Eutanásia ativa: provocar morte sem sofrimento por fins misericordiosos;


 Eutanásia passiva ou indireta: a morte ocorre dentro de um estado de
terminalidade ou se omite uma ação médica necessária;
 Eutanásia involuntária: morte ocorre contra a vontade do paciente;
 Eutanásia não voluntária: inexistência de manifestação da posição do paciente
em relação a ela;
 Eutanásia de duplo efeito: morte é acelerada como uma consequência indireta
das ações médicas, visando alívio de um paciente terminal;

b) Eutanásia eugênica: eliminação indolor dos doentes indesejáveis, velhos, inválidos


com o escopo de aliviar a sociedade, pessoas e a economia;

c) Eutanásia criminal: eliminar pessoas e animais socialmente perigosos;

d) Eutanásia experimental: morte indolor com o fim experimental para o progresso da


ciência;

e) Eutanásia legal: morte consentida por lei.


25.1 CRITÉRIOS PARA EUTANÁSIA

Segundo a Resolução nº 714, de 20 de Junho de 2002, a eutanásia será indicada


quando o bem-estar animal estiver ameaçado, como meio de eliminar a dor e o sofrimento que
não possam ser aliviados, ou quando o animal constituir ameaça à saúde pública ou animal, ou
214
for objeto de ensino ou pesquisa.

A Declaração Universal dos Direitos dos Animais em seu Art. 3. alínea b.:

“...Se a morte de um animal é necessária ela deve ser instantânea, sem dor ou
angústia.”

Conforme o Art. 32. da Legislação Ambiental Brasileira Lei de Crimes Ambientais


(Lei 9605/98) incorre em crime quem:

“...Praticar ato abusivo, maus tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou
domesticados, nativos ou exóticos..., em pena de três a um ano, e multa.”

Parágrafo 1º. Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel
em animal vivo ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos
alternativos.

Em termos de bem-estar animal, os critérios devem fundamentar-se na utilização de


métodos indolores, que conduzam rapidamente à inconsciência e a morte, que exijam o mínimo
de contenção, que evitem a excitação dos animais e que sejam apropriados para a idade,
espécie e estados de saúde do animal. O método escolhido deve minimizar o medo e a tensão
psicológica – estresse, ser confiável, simples de administrar, seguro para o operador e
eticamente aceitável para o executor e observador.
A eutanásia pode ser vista sob várias perspectivas:

- Para o animal: deve ser indolor, produzir inconsciência rápida e morte rápida;

- Para o executante: deve ser um método seguro e não provocar choques emocionais;

- Para a pesquisa: não deve resultar em modificações biológicas e ou histológicas


incompatíveis com os dados esperados de um ensaio;

- Para a administração: a eutanásia deve ser praticada nas melhores condições 215
econômicas;

- Para a saúde pública: não deve gerar transtornos secundários – como destinos de
cadáveres, resíduos hospitalares e outros.

Há divergências e discussões sobre os métodos realmente humanitários, porém


mesmo estes se praticados por indivíduos nervosos, não habilitados, podem causar sofrimento
ao animal.

25. 2 COMPORTAMENTO ANIMAL

A expressão facial e a postura corporal podem sinalizar vários estados emocionais dos
animais e funcionar como indicadores do comportamento animal. As respostas comportamentais
e fisiológicas a estímulos nocivos incluem os seguintes sinais:

- Vocalização: angústia;

- Tentativa de fuga;

- Agressão defensiva;

- Salivação;

- Emissão de urina;
- Defecação;

- Midríase;

- Taquicardia;

- Contrações musculares: tremores e espasmos.

Algumas destas reações podem ocorrer tanto em animais conscientes como 216

inconscientes. O medo pode causar imobilidade em algumas espécies, particularmente coelhos


e galinhas, o que não deve ser interpretado como inconsciência. A presença de outros animais
durante a eutanásia não é recomendável, uma vez que há liberação também de ferormônios,
além da possibilidade de manifestação de outros sinais.

25.3 FATOR HUMANO

Há três circunstâncias que devem ser consideradas:

- Aspectos de decisões clínicas: o proprietário do animal deve decidir pela eutanásia


e quando deve ser realizada;

- Eutanásia coletiva: para o controle de animais abandonados nas ruas, por exemplo;

- Eutanásia de animais de laboratório.

No caso onde envolvem decisões clínicas os proprietários contam com o julgamento do


veterinário. Na eutanásia coletiva, pode se desenvolver um estado de desconforto nas pessoas
diretamente envolvidas, quando o processo é repetitivo, caracterizado por um estado de forte
insatisfação em trabalhar ou alienação, que podem ser expressos por falta habitual ao trabalho,
agressividade, descuido ou tratamento rude aos animais.
Não são raros os casos de pesquisadores, técnicos e estudantes, pela natureza e
duração das pesquisas, desenvolverem afetividade por um determinado animal ou grupo de
animais que deverão ser submetidos à eutanásia ao final do experimento.

Assim, nos dois últimos casos, o rodízio das pessoas envolvidas, quando possível,
pode ajudar a minimizar o problema.

Deve ser considerado o fato que a eutanásia é um procedimento admissível no


controle populacional de animais selvagens ou que sofreram lesão grave; animais domésticos 217
abatidos em grupos/para consumo e animais de zoológico. A eutanásia para fins de controle
populacional sofre pressão muito forte da opinião pública, no sentido de que sejam salvos do
procedimento os animais, em especial recolhidos aos canis públicos ou aos CCZs.

Ainda, o grande número de animais domésticos processados diariamente, em abate,


para fins de consumo, pode significar um alto preço para os empregados, do ponto de vista
emocional e físico.

25.4 MÉTODOS DE EUTANÁSIA

A aplicação da eutanásia bem como seus procedimentos dependerá da espécie animal


envolvida, dos meios disponíveis para a contenção, da técnica do executor, do número de
animais, e no caso de experimentação animal, do protocolo de estudo devendo o método ser
segundo a Resolução nº 714, de 20 de Junho de 2002:

 Compatível com os fins desejados;


 Seguro para quem o executa, causando o mínimo de estresse no operador,
observador e no animal;
 Realizado com o maior grau de confiabilidade possível, comprovando-se a morte
do animal com a declaração do óbito pelo Médico Veterinário.
A eutanásia ideal é aquela cujo método ou agente escolhido:

a- Não provoque dor, ansiedade, medo, luta, vocalização, espasmos musculares,


ou sinais clínicos de ativação autonômica, possa agir rapidamente, que provoque inconsciência e
morte instantânea ou dentro de minutos, confiável, seguro e prático, que tenha rígido controle
sobre as drogas, esteticamente aceitável, econômico e condizente com a finalidade.

b- Que não provoque alterações teciduais que prejudiquem o ato da necropsia, 218
bem como provoquem contaminação ambiental e de saneamento. Para que ocorra uma melhor
desenvoltura e aceitabilidade do processo, evitar situações de estresse, angústia, optar-se-á por
realizá-lo em um ambiente seguro, silencioso, e totalmente isolado de outros animais,
principalmente, os da mesma espécie em razão dos ferormônios que indicam seu estado de
angústia, medo, o que é logo percebido pelos outros animais. A identificação dos sinais de dor,
medo e angústia, é importantíssima para uma correta eutanásia onde se manifestam
vocalizações de angústia, debate, tentativas de fuga, agressão defensiva ou reativa, imobilidade,
respiração ofegante, salivação, urinar ou defecar, midríase, taquicardia, sudação e contrações
musculares reflexas (calafrios, tremores e espasmos).
O reconhecimento e a confirmação da morte é papel único do Médico Veterinário
(Resolução 714/02); onde o executante seja capaz de reconhecer e confirmar a morte dos
animais submetidos à eutanásia quando os sinais, em conjunto, forem parada cardíaca e
respiratória e ausência de reflexos. Deste modo, o procedimento da eutanásia deverá resultar na
rápida perda de consciência, seguida de parada cardíaca e respiratória e por fim perda da
função cerebral.

São considerados alguns critérios para comprovação da morte do animal:

 Perda de todo o sentido de ambiente, de todo contato entre o cérebro e o


organismo;
 Total incapacidade Muscular;
 Cessação espontânea da respiração;
 Colapso da pressão sanguínea no momento em que deixa de ser mantida
artificialmente;
 Cessação absoluta da atividade cerebral comprovada eletricamente pelo traçado
linear no EEC (eletro encefalógrafo), mesmo sob estímulo. Portanto, considera-se que a morte
humanitária de animais deve ser aquela que ocorre com o mínimo de dor e estresse possível.
A eutanásia pode então ser classificada de acordo com o método empregado
dividindo-a por métodos físicos e químicos sendo por sua vez inalantes ou não.

219

Os métodos físicos ocasionam na maioria das vezes a morte instantânea, porém tais
procedimentos são esteticamente indesejáveis inviabilizando em termos sua aplicação. Já os
métodos químicos são os mais aceitáveis, seguros e humanitários entre os mesmos.

A avaliação dos melhores métodos de eutanásia, em cada espécie animal, pode ser
feita considerando cinco parâmetros:

1) Rapidez;
2) Nível de experiência do operador;
3) Eficácia;
4) Segurança do operador;
5) Aceitabilidade ética – visualização observador.
A União Europeia, desde 1993, de acordo com o DG XI já avalia os métodos de acordo
com estes parâmetros em valores positivos e negativos, em uma escala de 0-5, onde os
resultados podem ser combinados e o método considerado melhor julgado.
Métodos físicos:

 Arma de efeito cativo:


Provocam destruição do tecido cerebral por lâmina ou ar comprimido, normalmente
associado ao abate de animais para a produção.

 Arma de fogo:
220
Quando bem utilizado produz morte rápida e indolor, porém pode ser considerado
esteticamente inaceitável.

 Deslocamento cervical:
Utilizados em animais de laboratório ou de pequeno porte, preferencialmente sedados,
facilitando o deslocamento das vértebras e rompimento do tecido nervoso local.

 Decapitação:
Utilizado em pequenos animais de laboratório podendo ser associado com a
eletrocussão.

 Eletrocussão:
A fulminação ou eletrocussão é considerada um método quase perfeito para realizar a
eutanásia em razão a sua rapidez.

 Irradiação por micro-ondas:


Somente é liberado para uso em animais de pesquisa como ratos, camundongos e
cobaias. Tem como desvantagem o custo do equipamento industrial, sendo que, os aparelhos
domésticos são totalmente inaceitáveis para esta finalidade.
 Compressão torácica:
Método rápido e aparentemente indolor deve-se levar em consideração seu caráter
estético.

 Ainda:
A concussão, destruição medular, maceração, esmagamento da nuca,
estrangulamento, a descompressão, hipotermia (congelação), hipertermia, exsanguinação e 221
afogamento, todos tidos como métodos físicos inaceitáveis.

Métodos Químicos Inalantes:

 Anestésicos:
Halotano, isoflurano e sevoflurano;

Podem ser utilizadas como indutores de eutanásia. Sua desvantagem está no alto
custo dos equipamentos e fármacos, além da possibilidade dos animais tornarem-se ansiosos e
irritados durante a indução anestésica.

 Nitrogênio e argônio:
São gases inodoros, inflamáveis, que produzem a morte por hipóxia cerebral
(competição com o oxigênio). Ocorrem dificuldades de se manter um ambiente em
concentrações de oxigênio menores do que 2%.

 Monóxido e dióxido de carbono:


Apresentam custo baixo, animais jovens têm maior resistência a hipóxia e podem
permanecer vivos após a interrupção do fornecimento do gás. Muitas investigações têm sugerido
que altas concentrações de gás carbônico podem causar sofrimento (dor e aflição) aos animais
por causa da irritação da mucosa e estimulação ventilatória. Além disso, alguns animais podem
apresentar extraordinária resistência ao gás carbônico.
 Ainda:
Azoto, óxido nitroso, ciclopropano e cianeto de hidrogênio.

Método Químico Não Inalantes:

 Barbitúricos
Promovem rápida perda de consciência com mínimo desconforto dos animais. O
222
procedimento deve contar com altas concentrações do produto e rápida velocidade de aplicação.
Tais drogas são controladas por legislação federal. São substâncias que mais se aproximam de
um agente ideal para eutanásia quando administrada em altas doses. Deprimem o centro
respiratório e vasomotor. A morte é rápida e suave, fornecendo ao clínico e ao proprietário o
efeito desejável do ponto de vista psicológico e humanitário tão importante numa prática desta
natureza. Os barbitúricos podem ser usados na eutanásia de grandes animais, porém no cavalo
produzem considerável excitação, além de serem economicamente inviáveis devido à alta
dosagem necessária. Podem promover agonia respiratória.

 Hidrato de cloral:
Deve ser empregado somente em grandes animais intravenosamente, não devendo
ser aplicado em cães e gatos. Deprimem mortalmente o centro respiratório e vasomotor.

 T-61:
Uma combinação de três drogas não barbitúricas e não narcóticas de ação
curariforme. Usado para eutanásia de animais de pequeno e grande porte, de administração
endovenosa, devendo haver controle quanto à velocidade de administração da droga de forma
ininterrupta. Para que ocorra uma eutanásia a contento, a manipulação adequada e a contenção
devem seguir critérios específicos para cada espécie animal, tamanho, domesticação, presença
de doenças e ferimentos dolorosos e o grau de excitação. Os instrumentos, equipamentos, e
instalações utilizadas para atordoar ou matar os animais, devem ser desenhados, construídos e
mantidos de modo a obter rápida e eficazmente os efeitos desejados. Devem ainda ser
regularmente inspecionados para garantir o seu bom funcionamento quando necessário.
Os métodos a serem escolhidos devem constar da relação de meios permitidos pelo
CFMV. Quando da escolha dos métodos recomendados e aceitos, devem seguir linhas de
trabalhos consultadas obedecendo as suas especificações no caso de associações. Seja qual for
o método ou agente escolhido para a indução da morte do animal, o mesmo só poderá ser
empregado após o total conhecimento de seu mecanismo de ação.

Há métodos considerados não aceitáveis pelo CFMV e práticas e orientações sob o


momento da realização da eutanásia, Resolução 714/02:
223

CAPÍTULO II DOS PROCEDIMENTOS

Art. 8º A escolha do método dependerá da espécie animal envolvida, dos meios


disponíveis para a contenção dos animais, da habilidade técnica do executor, do número de
animais e, no caso de experimentação animal, do protocolo de estudo, devendo ainda o método
ser:

I - compatível com os fins desejados;

II - seguro para quem o executa, causando o mínimo de estresse no operador, no


observador e no animal;

III - realizado com o maior grau de confiabilidade possível, comprovando-se sempre a


morte do animal, com a declaração do óbito pelo Médico Veterinário.

Art. 9º Em situações onde se fizer necessária a indicação da eutanásia de um número


significativo de animais, como por exemplo, rebanhos, Centros de Controle de Zoonoses, seja
por questões de saúde pública ou por questões adversas aqui não contempladas, a prática da
eutanásia deverá adaptar-se a esta condição, seguindo sempre os métodos indicados para a
espécie em questão.

Art. 10. Os procedimentos de eutanásia são de exclusiva responsabilidade do médico


veterinário.

Art. 11. Nas situações em que o objeto da eutanásia for o ovo embrionado, a morte do
embrião deverá ser comprovada antes da manipulação ou eliminação do mesmo.
CAPÍTULO III DOS MÉTODOS RECOMENDADOS

Art. 12. Os agentes e métodos de eutanásia, recomendados e aceitos sob restrição,


seguem as recomendações propostas e atualizadas de diversas linhas de trabalho consultadas-,
entre elas a Associação Americana de Medicina Veterinária (AVMA), estando adequados à
realidade nacional, e encontram-se listados, por espécie, no anexo I desta Resolução.

224
§ 1º Métodos recomendados são aqueles que produzem consistentemente uma morte
humanitária, quando usados como métodos únicos de eutanásia.

§ 2º Métodos aceitos sob restrição são aqueles que, por sua natureza técnica ou por
possuírem um maior potencial de erro por parte do executor ou por apresentarem problemas de
segurança, podem não produzir consistentemente uma morte humanitária, ou ainda por se
constituírem em métodos não bem documentados na literatura científica. Tais métodos devem
ser empregados somente diante da total impossibilidade do uso dos métodos recomendados
constantes do anexo I desta Resolução.

Art. 13. Outros métodos de eutanásia não contemplados no ANEXO I poderão ser
permitidos, desde que realizados sob autorização do CRMV ou CFMV.

Métodos aceitáveis:

Aceitos sob
Espécie Recomendados
Restrição
Barbitúricos, anestésicos
Pistola de ar
inaláveis (em algumas espécies), Dióxido
comprimido, pistola,
de Carbono (CO²), Monóxido de Carbono
Anfíbios atordoamento e decapitação,
(CO), metano sulfonato de tricaína (TMS,
decapitação e secção da
MS222), hidrocloreto de benzocaína, dupla
medula espinhal.
secção da medula espinhal.
Animais selvagens Barbitúricos intravenosos (IV) ou CO², CO, Nitrogênio
de vida livre intraperitonais (IP), anestésicos inaláveis, (N²), argônio, pistola de ar
cloreto de potássio com anestesia geral comprimido, pistola,
prévia. armadilhas (testadas
cientificamente)
Barbitúricos, anestésicos
Animais de N², argônio, pistola
inaláveis, CO², CO, cloreto de potássio
zoológicos de ar comprimido e pistola.
com anestesia geral prévia.
N², argônio,
Barbitúricos, anestésicos
Aves deslocamento cervical e 225
inaláveis, CO², CO e pistola.
decapitação.
Barbitúricos, anestésicos N², argônio, pistola
Cães inaláveis, CO², CO, cloreto de potássio de ar comprimido, eletrocussão
com anestesia geral prévia. com sedação prévia.
Hidrato cloral, (IV,
Barbitúricos, cloreto de potássio
após sedação), pistola,
Cavalos com anestesia geral prévia e pistola de ar
eletrocussão com sedação
comprimido.
prévia.
N², argônio,
Barbitúricos, anestésicos
deslocamento cervical (<1 kg),
Coelhos inaláveis, CO², CO, cloreto de potássio
decapitação e pistola de ar
com anestesia geral prévia.
comprimido.
Barbitúricos, anestésicos
Gatos inaláveis, CO², CO, cloreto de potássio N², argônio.
com anestesia geral prévia.
Mamíferos Barbitúricos e hidrocloreto de Pistola (cetáceos
marinhos etorfina. <4m de comprimento)
Barbitúricos, anestésicos Decapitação e
inaláveis, CO², tricaína metano sulfonato secção da medula espinhal,
Peixes
(TMS, MS222), hidrocloreto de atordoamento e decapitação
benzocaína, 2-fenoxietanol. ou secção da medula espinhal.
Anestésicos
Primatas não
Barbitúricos inaláveis, CO², CO, N²,
humanos
argônio.
Répteis Barbitúricos, anestésicos Pistola de ar
inaláveis (em algumas espécies), CO² (em comprimido, pistola,
algumas espécies). decapitação e secção da
medula espinhal,
atordoamento e decapitação
Roedores e outros Barbitúricos, anestésicos Metoxiflurano, N²,
pequenos inaláveis, CO², CO, cloreto de potássio argônio, deslocamento cervical
mamíferos com anestesia geral prévia. (ratos <200g), decapitação.
Hidrato cloral (IV, 226
Barbitúricos, cloreto de potássio
após sedação), pistola,
Ruminantes com anestesia geral prévia, pistola de ar
eletrocussão, com sedação
comprimido.
prévia.
Anestésicos
inaláveis, CO, hidrato cloral,
Barbitúricos, CO², cloreto de
(IV após sedação), pistola,
Suínos potássio com anestesia geral prévia,
eletrocussão com sedação
pistola de ar comprimido.
prévia, pancada na cabeça (<
3 semanas de idade).
Barbitúricos, anestésicos
Visões, raposas, e N², argônio,
inaláveis, CO² (visões requerem altas
outros mamíferos eletrocussão, com sedação
concentrações para eutanásia sem
criados para prévia seguida de
agentes suplementares), CO, cloreto de
extração do pelo. deslocamento cervical.
potássio, com anestesia geral prévia.

São considerados métodos inaceitáveis:

 Embolia Gasosa;
 Traumatismo Craniano;
 Incineração in vivo;
 Hidrato de Cloral (para pequenos animais);
 Clorofórmio;
 Gás Cianídrico e Cianuretos;
 Descompressão;
 Afogamento;
 Exsanguinação (sem sedação prévia);
 Imersão em Formol;
 Bloqueadores Neuromusculares (uso isolado de nicotina, sulfato de magnésio,
cloreto de potássio e todos os curarizantes);
 Estricnina.

227

Considerações sobre alguns agentes métodos:

Clorofórmio:

Usado para eutanásia de pequenos animais e de animais de laboratório, produz efeitos


indesejáveis por serem miocardiotóxico, causando forte excitação no animal quando injetado. E
em locais fechados, a morte se dá por depressão do centro respiratório.

Éter:

Usado de maneira semelhante ao clorofórmio, não oferece resultados desejáveis


devido ao efeito excitante que provoca. Para alcançar à eutanásia a dosagem deve ser
aumentada até o ponto de colapso.

Sulfato de magnésio:

Usado para eutanásia de pequenos e grandes animais, deprime o sistema nervoso


central, causando perda de sensações antes da parada respiratória, o animal cai convulsionando
e morre antes dentro de 1 a 2 minutos.

Estricnina:
Provoca intenso sofrimento do animal. Nas primeiras etapas da convulsão o animal
está consciente e sente dores fortíssimas causadas pelo intenso espasmo muscular. A estricnina
provoca morte agitada, por qualquer que seja a via de administração.

Ácido cianídrico:

Provoca dores quando o animal entra em tetania. Sua desvantagem é a grande


228
excitação do animal e a manipulação perigosa.

Bloqueadores neuromusculares:

Aparentemente causam a morte do animal, porém com asfixia e minutos de sofrimento


sem possibilidades de defesa. Tais drogas somente serão permitidas quando houver uma prévia
sedação e inconsciência dos animais.

Sem dúvida, a associação de anestésicos gerais e cloreto de potássio é o método mais


prático, além de ser o agente que melhor satisfaz os critérios para emprego na eutanásia, por
causar perda rápida e suave da consciência, provocando morte de maneira humanitária e
misericordiosa, apesar de outros métodos previstos pela Resolução 714/2002 do CFMV.

A eutanásia é regulamentada pelo CFMV – Resolução 714/02 e observa leis federais


– quanto a maus tratos aos animais – Lei 9605/98 e Leis mais específicas estaduais e
municipais. Recentemente o Estado de São Paulo aprovou Lei referente à proibição da
eutanásia em canis municipais e CCZs simplesmente como medida de controle de população
animal, sendo mantido o procedimento somente para casos de risco em saúde pública, doenças
graves e incuráveis – Lei 12916/08.
26 LEGISLAÇÃO E LEGISLAÇÃO APLICADA

229

Conceituar o direito é defini-lo. Pode-se definir direito simplesmente estabelecendo o


que a palavra direito significa. Essa seria uma definição nominal. O vocábulo direito comporta
várias acepções. O vocábulo direito pode significar norma, lei, regra de conduta social
obrigatória. Mas a palavra direito pode aparecer também na acepção de uma faculdade, de uma
prerrogativa, de um poder.

Especialmente os sociólogos costumam dar conotação diversa ainda à palavra direito,


a fim de designá-lo como um fenômeno social, tal como a religião, a economia, a cultura e a
política. Nesse sentido, direito diz respeito ao conjunto de condições de existência e de
desenvolvimento de uma sociedade. Já para os filósofos, a palavra direito comumente é
associada a algo que é devido por justiça.

Há ainda uma noção de que o direito é a consequência de um imperativo moral, ou


seja, de algo que é devido por justiça. Há distinção entre o direito objetivo e o direito subjetivo, "o
direito objetivo ou a regra de direito designa os valores éticos que se exige dos indivíduos que
vivem em sociedade".

O Direito legal e suas considerações penais e criminais são importantes, pois vão
garantir tudo àquilo que se propõe como proteção animal em muitas vezes, no entanto o
pensamento do que seja direito dos animais historicamente vem navegando por caminhos
tortuosos e ainda há o pensamento de muitos onde o sentimento dos animais é assunto
“discutível” o que dizer de seus “direitos”. No entanto, esta matéria, é assunto já mundialmente
reconhecido, mesmo que não praticado, o que mostram as lutas constantes e diárias de
inúmeras entidades e discussões científicas, políticas e de cunho filosófico e humanitário.

Bem-estar, proteção e direito dos animais são conceitos distintos muito embora
possam ter pontos em comum e não devem ser confundidos. A aplicação correta de seus
conhecimentos gera em benefício aos animais. O conhecimento e aplicação do bem-estar animal
230
como ciência, da ética podem levar aleias mais completas e benéficas não somente a
comunidade, mas em especial aos animais.

As atividades quanto ao bem-estar animal, em sendo uma ciência, está diretamente


relacionada à função do médico veterinário, por se tratar de atividade técnica e profissional e que
estritamente se dedica a tarefas com os animais, a indústria afim, comércio,
sociedade/comunidade.
231
232

Além da legislação básica – federal, estadual e/ou municipal. Da atuação individual, de


profissional, políticos entidades governamentais ou não governamentais, ainda há fundamentos
importantes como a ciência do Bem-Estar Animal – BEA e conceitos como das Cinco
Liberdades, dos 3 Rs e da Senciência Animal.

As Cinco liberdades e os 3Rs são os conceitos que atualmente embasam legislação


específica de proteção a animais de produção e animais usados em experiências em
laboratórios nos países da União Europeia.
233
234
235

Quando se pretende a proteção aos direitos dos animais e a proteção de animais que
sofrem maus tratos ou até mesmo a prevenção a estes é importante salientar:
• O respeito e aplicação de legislação vigente;
• DEVE SER OBSERVADA TANTO PARA QUEM PREJUDICA UM ANIMAL;
• COMO POR AQUELES QUE TENTAM PROTEGÊ-LOS.

O empenho por medidas que visem ações mais abrangentes é salutar e desejável,
procurando por:

• Leis que atendam às situações a que são expostos os animais; 236


• Projetos e políticas que levem EDUCAÇÃO, POSSE RESPONSÁVEL,
SISTEMÁTICAS DE CONTROLE POPULACIONAL, ESTERILIZAÇÃO ANIMAL, CAMPANHAS
DE ADOÇÃO, REGISTRO ANIMAL e outros.

Em meio a todas estas questões, no dia a dia, o BEA como questão científica é difícil
de ser avaliada, ficando o aspecto legal dos Direitos dos Animais e as atividades exercidas por
munícipes de forma variada quanto ao protecionismo aos animais. O médico veterinário, como
profissional bem como as entidades, devem verificar cotidianamente aquilo que está previsto em
resoluções, no caso do CFMV, que possuem uma Comissão de Ética e Bem-estar e que procura
promover a observação dos critérios das Cinco Liberdades e 3 Rs, bem como de legislações
federais, estaduais e municipais.
• É importante o embasamento técnico do Médico Veterinário em especial quanto a
medidas, projetos e políticas existentes em seu município, região ou estado.
• O Médico Veterinário é responsável pelo esclarecimento do público em especial
como um primeiro divulgador das questões de Educação e Posse Responsável, assim como as
demais.

• Independente de sua atividade, no serviço público ou particular deve conhecer a


237
legislação mínima, ao menos de sua localidade quanto aos Direitos dos Animais, formas de sua
aplicação, e a quem procurar. É o profissional médico veterinário quem deve mediar estes
interesses junto ao público e as forças públicas.

IMPORTANTE:

• As forças públicas igualmente devem ser orientadas sobre as leis ação existentes,
penalidades, formas de sua aplicação.
• Na maioria dos casos nota-se um desconhecimento das forças públicas sobre o
assunto e despreparo. Reconhecemos que as forças públicas brasileiras já contam com
inúmeros problemas. Este seria mais um. Mesmo sobre como um membro de uma força pública
acionada deva atuar mediante um caso que envolva animal – acidentado, agressor, invasor, sob
mau trato e abandonado.

O médico veterinário tem que considerar que é natural que para o público de modo
geral, a busca de informações sobre o que fazer em situações em que surjam dúvidas não
somente clínicas, envolvendo animais, junto a um profissional, que trabalha com animais, por
isso o seu preparo e o conhecimento para ao menos orientações básicas e seguras a pessoa
são fundamentais, para que a comunidade não incorra em erros e acabem muitas vezes
induzidas a práticas de desespero coletivo ou mesmo individuais que podem não resolver a
situação do animal e até mesmo comprometer a situação da pessoa(s) envolvida. Ao menos
saber orientar a que órgão competente encaminhar, o direito mínimo, situação legal mínima ou
encaminhar a outro colega que tenha um esclarecimento melhor sobre o

238

assunto.

26.1 DIREITO DOS ANIMAIS

As leis sobre os Direitos dos Animais variam de PIS para pais, no entanto, é consenso
que a União Europeia tem avançado nos últimos anos por força de opinião pública e do que
pregam consumidores que forçam criadores e consequentemente profissionais e seus blocos de
representação em discussões sobre a ética profissional na questão da produção animal.

A Declaração Universal dos Direitos dos Animais ocorreu em Bruxelas – 1978, em


assembleia da UNESCO, posteriormente. O conceito de Cinco Liberdades foi manifesto
primeiramente em 1979 e posteriormente complementado em 1993 pelo Farm Animal Welfare
Council inglês e tem sido usado como base para leis e regulamentações não somente em
animais de produção de animais de produção, mas outros grupos animais de modo geral no
mundo todo, como pelo CFMV no Brasil quando da expressão da Resolução 879/08 sobre uso
de animais de experimentação. O mesmo deve passar a inspirar futuras leis que venham ser
projetadas e implementadas, não somente os critérios de Cinco Liberdades e dos 3 Rs, mas
fundamento do conhecimento de que garantir o bem-estar a um animal, vai além de sua
proteção. 239

26.1.1 Os direitos dos animais no tempo

No papiro de Kahoun, documento do antigo Egito, que data de 4000 anos atrás, foram
anotadas observações interessantes sobre cuidados com os animais. Também no Código de
Hamurabi são encontradas normas que preveem obrigações dos humanos em relação à saúde
dos animais. Buda já pregava que uma relação harmoniosa e virtuosa com o mundo traz bem-
estar e leveza ao coração, bem como clareza imperturbável à mente. Um dos registros mais
remotos da preservação da fauna terrestre remonta ao Velho Testamento, com os elementos
descritos na história da Arca de Noé. O grande filósofo Aristóteles foi o autor da primeira obra
que se tem conhecimento sobre o direito dos animais, compreendendo um conjunto de dez
livros, dentre os quais se destacava o Livro dos Animais, que abordava as partes dos animais, a
sua marcha e geração.

A utilização de animais em pesquisas médicas remonta a Hipócrates (450 a. C.);


depois no séc. XVII, com o racionalismo de René Descartes, houve um retrocesso quanto ao
comportamento ético dos homens em relação aos animais. O filósofo francês, criador do
racionalismo, "acreditava que os processos de pensamento e sensibilidade faziam parte da
alma. Como na sua concepção os animais não tinham alma, não havia sequer a possibilidade de
sentirem dor". Apenas no final de 1700, se retoma o pensamento ético da antiga Grécia em
relação aos animais. Importante revolução no pensamento ocidental do séc. XVIII foi a
publicação de A Origem das Espécies (C. Darwin), em 1859, ao estabelecer que o homem não
era o filho de Deus, mas uma evolução dos primatas.

240
27 PRIMEIRAS LEGISLAÇÕES

Embora os direitos dos animais, em muitas regiões do planeta, tenham permanecido


por longo tempo vinculado exclusivamente ao comportamento ético e moral da humanidade,
alguns países, gradativamente, iniciaram a positivação de leis e regras, objetivando garantir de
241
forma mais efetiva esses direitos.

A primeira sociedade protetora dos animais que se tem notícia surgiu na Inglaterra, em
1824, com o nome de Society for de Preservation of Cruelty to Animals. Atualmente, dentre as
organizações não governamentais mais atuantes destacam-se o Fundo Mundial para a
Preservação da Vida Selvagem (ou World Wildlife Found – WWF), o Greenpeace, a União
Vegetariana Internacional e o Movimento pelos Direitos dos Animais. No Brasil, hoje, em quase
todas as cidades há associações que se interessam pelo bem-estar e pela proteção dos animais,
buscando primordialmente minimizar o problema das superpopulações de cães e gatos nos
centros urbanos.

Provavelmente, a PRIMEIRA LEGISLAÇÃO INSTITUÍDA CONTRA CRUELDADE


CONTRA QUALQUER ANIMAL - visando à proteção dos animais – deva ter sido a
implementada na Colônia de Massachussets Bay, em 1641, que previa que ninguém poderia
exercer tirania ou crueldade para com qualquer criatura animal que habitualmente fosse utilizada
para auxiliar nas tarefas do homem.

Posteriormente – 1850, na França se instituiu outra lei protecionista passível de multa e


pena de prisão diante me maus tratos aos animais domésticos.

Mais contemporaneamente o tema dos maus-tratos contra os animais mereceu a


atenção mundial, a ponto de a UNESCO, em 27 de janeiro de 1978, promulgar, em Bruxelas, a
Declaração Universal dos Direitos dos Animais. Considerando que todo o animal possui direitos.

A Legislação Brasileira referente ao assunto não é recente, há muitos anos o Brasil já


conta com Leis básicas para proteção dos animais e de seus direitos Esta legislação vem
ganhando corpo com a preocupação cada vez maior com questões ecológicas e de BEA.
As Leis Federais vêm sendo incrementadas por leis Estaduais e municipais que
também passaram a incorporar o quadro de Leis, tornando-o mais abrangente e rigorosa sobre
vários temas relacionados à proteção e bem-estar animal. Cabem várias adequações e
modificações de consenso, práticas para que algumas leis possam de fato se tornar realidade e
ajudado a incrementar não só a proteção aos animais, mas fundamentalmente seu bem-estar,
sejam estes: de produção, de companhia, animais selvagens, de experimentação, outros.

Há uma importância muito grande do profissional veterinário como responsável direto


242
pelos animais em diferentes setores e por ser igualmente mediador direto entre animais e outros
segmentos a própria comunidade e cidadão comum. Mas também as sociedades como um todo.
Representantes políticos, entidades governamentais, não governamentais, forças públicas e
outros devem exercer não só suas responsabilidades, mas assumir seus papéis.

27.1 LEIS BÁSICAS A SEREM CONHECIDAS


Recentemente foi promulgada e publicada uma nova Lei Federal a respeito do uso de
animais de experimentação no Brasil, a primeira a regulamentar este assunto. Trata-se da LEI
Nº 11.794, DE 8 DE OUTUBRO DE 2008, estabelecendo procedimentos para o uso científico de
animais; revoga a Lei nº 6.638, de 8 de maio de 1979.

243
Ainda na questão da eutanásia, já discutida em capítulo específico temos no CFMV -
RESOLUÇÃO Nº 714/02. Dispõe sobre procedimentos e métodos de eutanásia em animais, e dá
outras providências. Considerando a diversidade de espécies envolvidas e a multiplicidade de
métodos aplicados; que a eutanásia é um procedimento amplamente utilizado e necessário, e
que sua aplicação pressupõe a observância de parâmetros éticos específicos. Onde: RESOLVE:
Art. 1º Instituir normas reguladoras de procedimentos relativos à eutanásia em animais.
244
A situação de animais de circo é atualmente discutida por entidades, comunidades e a
sociedade como um todo. Apesar disso, não há até o momento uma Lei Federal que determine
ou regulamente a situação de animais em circos, centros de lazer e outros. O Projeto de Lei
7291/06 encontra-se na Câmara dos Deputados e sua votação vem sendo adiada ao longo do
tempo, retardando a possibilidade de implementação de medidas legais que possam auxiliar sem
condições de bem-estar ou até mesmo padecendo de sofrimentos. Há inúmeras denúncias de
abusos e maus tratos, o que acabou determinando o desenvolvimento do projeto. Vários
municípios brasileiros apoiam por meio de leis municipais a iniciativa e não permitem mais a
atividade de circos que se utilizam e empregam o trabalho ou fazem a exploração do trabalho de
animais.

Locais onde o uso de animais em circo já é proibido:

U
Cidade
F

M
Campo Grande
S

P
Curitiba, Ponta Grossa e São José dos Pinhais
R

P
Olinda
E

R Porto Alegre, Caxias do Sul, Montenegro, Novo Hamburgo, Passo Fundo, Rio
S Grande, Santa Maria, São Leopoldo e Taquara
U
Cidade
F

S Florianópolis, Blumenau, Itajaí, Jaraguá do Sul, Joinville, Videira, Joaçaba e


C Camboriú

São Paulo, Araraquara, Atibaia, Avaré, Batatais, Bauru, Bebedouro, Campinas,


Cotia, Guarulhos, Itu, Jacareí, Jundiaí, Mogi das Cruzes, Nova Odessa, Ribeirão Pires,
S 245
Salto, Santo André, Santos, São Bernardo, São Caetano do Sul, São José dos Campos, São
P
Vicente, Sorocaba, Taubaté, Ubatuba e Vinhedo

FONTE: WSPA. Disponível em: <http://www.wspabrasil.org/wspaswork/udaw/circo-legal.aspx>.

PL 7291/06 – em tramitação na Câmara dos Deputados, não foi aprovada até o momento.
Aguarda votação.

Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=329678>

Art. 1º Esta Lei institui o registro de circos junto ao Poder Público Federal e dispõe
sobre o uso de animais em espetáculos circenses.

Art. 2º Para os fins do disposto nesta Lei, o circo é entendido como o empreendimento
voltado para a apresentação de espetáculos em estruturas circulares desmontáveis, cobertas por
lona e itinerantes.

Art. 3º O circo constitui um dos bens do patrimônio cultural brasileiro, nos termos do
art. 216 da Constituição Federal, e sua atividade fica assegurada em todo o território nacional.

Art. 4º O uso da denominação “circo” dependerá de registro do empreendimento


perante o órgão federal responsável pela política acional de cultura.

Art. 5º A certidão de registro será expedida pelo órgão federal competente, conforme
disposto no art. 4º desta Lei, e constitui documento hábil para a instalação de circos e
apresentação de espetáculos circenses, atendidas as legislações estaduais e municipais.
Art. 6º Os animais da fauna silvestre brasileira e exótica mantidos pelos circos, ainda
que não utilizados nos espetáculos circenses, deverão ser registrados no órgão ambiental
competente e somente poderão ser mantidos, expostos ao público e transportados sob
condições definidas na regulamentação desta Lei.

Art. 7º Mediante permissão da autoridade ambiental competente, os circos poderão


proceder à venda ou permuta de seus espécimes da fauna silvestre brasileira e exótica com
instituições congêneres do País e do exterior.
246
Art. 8º Esta Lei entra em vigor 90 (noventa) dias após a data de sua publicação.

Para entendimento e compreensão de algumas das leis citadas e referidas neste


capítulo e em anteriores ainda - leitura complementar:

Os animais. Direitos deles. E éticas para com eles.

Jane Justina Maschio

Capítulo 01 e Capítulo 02

Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7142>.(capítulo 01)

Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7142&p=2>. (capítulo 01 e capítulo


02)

Sobre animais de tração – o que verificamos é a observação de leis federais, estaduais


e em especial alguns casos particulares que tratam mais especificamente deste assunto. Os
animais de tração são ainda comuns e frequentes mesmo em grandes centros. A espécie mais
utilizada é a equina, os maus tratos, os abusos, o descaso com suas condições de trabalho e em
enfrentar uma jornada dura, procurando respeitar seus limites e o próprio direito de descanso,
acesso a água e alimentos, são aspectos básicos verificados nas denúncias e nos casos
acompanhados por profissionais ou entidades governamentais ou não governamentais. As leis
mais comumente evocadas em processos envolvendo animais de tração:

- Decreto 24645/34 – Federal;

- Lei Federal 9605/98 – Lei de Crimes Ambientais;


- Lei Estadual 11977/05 – São Paulo;

- Lei Municipal – 11887/95 – São Paulo.

As leis municipais mais recentes procuram garantir aspectos importantes, para estes
animais trabalhadores, direitos básicos – como tempo de jornada de trabalho – diária e total para
sua vida, direito a repouso, descanso, acesso a água, alimentos, locais limpos, e adequados
entre outros. Para melhor compreensão da dimensão destes fatos segue leitura complementar.
Sobre animais de tração, legislação e BEA, sugerimos a seguinte leitura: 247

Disponível em: <http://www.ambienteemfoco.com.br/wp-


content/uploads/pdf/MFAS.pdf.pdf>.
REFERÊNCIAS

ABRAFRIGO. Associação Brasileira de Frigoríficos. Disponível em:


<http://www.abrafrigo.com.br/>.

ARCA. Disponível em: <http://www.arcabrasil.org.br/index.htm>. Aceso em 27 jan.2007


248

AVICULTURA INDUSTRIAL. Disponível em: <http://www.aviculturaindustrial.com.br/>. Acesso


em 25 jan.2007.

AVMA - AMERICAN VETERINARY MEDICAL ASSOCIATION. AVMA Animal Welfare


Principles. Disponível em: <http://www.avma.org/issues/policy/animal_welfare /principles.asp>.
Acesso em: 25 jan. 2007.

BARROS, A. R. Bem-estar animal, Proteção Animal e Legislação. Palestra. Portal Veterinária.


Junho, 2008.

BROOM, D.; JOHNSON, K.G. Stress and Animal Welfare. London: Chapman & Hall, 1993. 228
p.

BROOM, D. M.; MOLENTO, C. F. M. Bem-estar animal: conceito e questões relacionadas –


revisão. Archives of Veterinary Science v. 9, n. 2, p. 1-11, 2004.

CARVALHO, W. B. Sedação e analgesia no pronto-socorro. Disponível em:


<http://www.brazilpednews.org.br/dezem99/ao9907.htm>.

CDA – SP – Coordenadoria de Defesa Agropecuária do Estado de São Paulo. Disponível em:


<http://www.cda.sp.gov.br/>.

CFMV. Disponível em: <http://www.cfmv.org.br/portal/>. Acesso em: 25 jan.2007.


COBEA. Disponível em: <http://www.cobea.org.br/>. Acesso em: 23 jan.2007.

CORDEIRO, R. S. B. Legalização do uso de animais de laboratório: presente, passado e


futuro. Cienc. Cult., São Paulo, v. 60, n. 2, 2008.

COSTA, A. N. Produção e bem-estar animal. Aspectos técnicos e éticos na produção intensiva


de suínos. Ciênc. vet. tróp., Recife-PE, v. 11, suplemento 1, p. 43-48, abril, 2008.

249
COSTA, M. J. R. P. Comportamento e bem-estar de bovinos e suas relações com a
produção de qualidade. NUTRIR – Grupo de Estudos de Nutrição de Ruminantes –

FCAV – UNESP – FMVZ. Disponível em:


<http://www.fca.unesp.br/nutrir/artigos/sanidade/comportamento.PDF>. Acesso em: 20 jan.2007.

CRUZ, V. F.; PEREIRA, A.; SILVA, F. C. Monitorização de instalações pecuárias tendo em


vista o bem-estar animal. 1º Congresso Luso-Brasileiro de Tecnologias de Informação e
Comunicação na Agropecuária. Disponível em:
<http://www.agriculturadigital.org/agritic_2004/congresso/Mod_Sim_Monit_ContrAmbiental/Monit
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DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO. Lei 11.794 de 08 de outubro de 2008. Ano CXLV, n. 196, p. 1-2,
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Disponível em: <http://www.butantan.gov.br/materialdidatico/numero11/numero11.pdf>. Acesso
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EMBRAPA – GADO DE CORTE. Disponível em: <http://www.cnpgc.embrapa.br/>. Acesso em:


20 jan.2007.

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