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Atuação do

psicólogo no
sistema prisional
Psicologia Jurídica
Prof. Me. Francisco Neto
A Prisão e a Psicologia
• Os estabelecimentos prisionais são resultantes dos fatores que
produziram a sociedade e o Estado moderno, após a
superação da ordem feudal e fortalecimento do modo de
produção capitalista.
• As prisões brasileiras são constituídas a partir de diversos
princípios, sobretudo legais e funcionais, que legitimam as
formas/forças de suas configurações atuais:
1. Retributivas e punitivas: funcionando como uma
prevenção geral do delito através do princípio da
exemplaridade.
2. Ressocializadoras e “terapêuticas”: funcionando como
uma prevenção especial do delito por meio de métodos
disciplinares.
• Pra quem serve as prisões?

• Psicologia e a prisão são fenômenos


contemporâneos– ambas são categorias a
serviço do mesmo projeto social de produção e
transformação de subjetividades.

• Michel Foucault (1979): a prisão foi projetada


para funcionar como um instrumento tão
aperfeiçoado quanto a escola, agindo sobre os
indivíduos com precisão.

• A ciência psicológica está presente nas prisões


desde a época de 1930, marcada pelo discurso
médico da psiquiatria sobre o indivíduo
criminoso.
Noções de
criminologia
• A criminologia, enquanto ciência, originou-
se na segunda metade do século XIX, cujo
marco principal é a obra do italiano Cesare
Lombroso “Tratado Antropológico
Experimental do Homem Delinquente”.
• Garcia-Pablos de Malina (1997):
criminologia moderna é uma ciência
empírica e interdisciplinar, que se ocupa do
estudo do crime, da pessoa do infrator, da
vítima e do controle social do
comportamento delitivo.
• O crime é um problema da sociedade, nasce na sociedade e nela deve encontrar
fórmulas de solução positiva, exatamente porque delinquente e vítima são
membros ativos da sociedade.

• O controle social pode ser formal, representado pelas instituições estatais, desde
a investigação até a execução da pena, ou informal, com o controle presente na
sociedade, que muitas vezes clama pela repressão e o endurecimento do controle
formal.
A compreensão sobre
o fenômeno delitivo

• Antiguidade: o delinquente foi


entendido como um ser anormal.
• Século III: o desvio que levava a
pessoa a afastar-se das normas
sociais era intervenção do
demônio.
• Renascimento: homem visto como
dono de seu próprio destino.
Humanização das penas e o
tratamento dos condenados.
• Mesocriminoso: atuação antissocial por
força das injunções do meio exterior, como
se o indivíduo fosse mero agente passivo;
• Mesocriminoso preponderante: maior
preponderância de fatores ambientais;
• Mesobiocriminoso: determinantes tanto
ambientais, quanto biológicos;
• Biocriminoso preponderante: portador de anomalia
biológica insuficiente para levá-lo ao crime, mas capaz de
torná-lo vulnerável a uma situação exterior, respondendo
a ela com facilidade;
• Biocriminoso puro: atua em virtude de incitações
endógenas, como ocorre em algumas perturbações
mentais.
(Hilário Veiga de Carvalho, 1981)
• Fatores que combinam elementos intrapsíquicos e
sociais:
o Valores, crenças e conceitos;
o Cópia e/ou identificação com modelos (pessoas
significativas);
o Influência do grupo ou equipe a qual o indivíduo
pertence ou com a qual participa de ações;
o Condicionamento capaz de produzir
comportamentos estereotipados inadequados;
o Emoções extremas, que conduzem a momentos de
descontrole em que o indivíduo comete ações fora
do domínio consciente, embora
responsável por elas.
• A vítima participa direta ou indiretamente do
comportamento delitivo por meio dos
próprios comportamentos.
• Os mecanismos de estímulo e controle têm
influência direta sobre as expectativas
quanto às consequências do
comportamento: afetam a percepção do
potencial delinquente e combinam-se com
todos os elementos intra e extra psíquicos.
• Prof. Alvino Augusto de Sá: a abordagem que
se faz da motivação criminal é a "pedra de
toque" pela qual se diferenciam os mais
diversos posicionamentos científicos e ideológicos sobre crime, criminalidade e
homem criminoso.

Concepção
Concepção causalista Concepção crítica
multifatorial

• Concepção crítica Questionamento centrado na crítica aos fundamentos


que norteiam o Direito Penal Desperta-se a criminologia para um conceito
muito mais próximo do social.
• O homem fala, pensa, aprende e ensina, transforma a natureza; o homem é
cultura, é história. O seu organismo é uma infraestrutura que permite o
desenvolvimento de uma superestrutura que é social e, portanto, histórica.
O que fazer
em relação
ao
fenômeno
delitivo?
O CRIME COMO RESULTADO
DA PRIVAÇÃO

• A privação tem antes um efeito relativo do que absoluto.


Trata-se, aqui, da relação figura e fundo.

• Vias de solução da privação, que não a delinquência: o


Elaboração psíquica; o Deslocamento ou sublimação; o
Procedimentos obsessivos estereotipados, socialmente
ajustados;
o Transtornos mentais; o Drogadição.
O CRIME COMO PRODUTO
DO MEIO
• A delinquência como o resultado inexorável do
microssocial. Nega
-se ao indivíduo o livre
-arbítrio
e a possibilidade de percorrer um caminho
diferente daquele dos seus pares.
• Os condicionamentos não podem ser alterados,
ainda que o indivíduo tenha a oportunidade de
 Os
praticar novas convivências
condicionamentos estabelecidos são fortes,
porém, não substituíveis e tudo depende de uma
conjugação de fatores, entre os quais, a
persistência talvez seja dos mais importantes.
• Os indivíduos tornam-se escravos
de seus modelos A grande
dificuldade encontra-se em
proporcionar modelos alternativos.

• Os indivíduos são dominados por


crenças inadequadas, perversas e
antissociais.

As modalidades de
crimes
• Tem especial interesse para o
Direito a intenção que cerca o ato
criminoso, por parte de quem o
comete.
• Delito doloso: em que ocorre ato voluntário com resultado esperado.
• De se considerar que a consciência estabeleça um diálogo com o inconsciente, na
avaliação da vantagem de perpetrar o ato.
• Projeção ou racionalização.
• Delinquência neurótica: a conduta delitiva é encarada como uma manifestação dos
conflitos do sujeito com ele mesmo Delinquência sintomática.
NEUROSE PERSONALIDADE DELINQUENTE

Conflito interno Aparentemente sem conflito


Agressividade voltada para si Agressividade voltada para a sociedade
Gratificação por meio de fantasias Alívio de tensões internas por ações criminosas
Desenvolvimento de reações emocionais
Desenvolvimento de defesas emocionais
positivas
Admissão dos próprios impulsos e
Atribuição de seus impulsos ao mundo exterior
reconhecimento dos erros
Comportamentos socialmente ajustados Comportamento dissocial
Perturbações psicossomáticas menos
Perturbações psicossomáticas mais frequentes
frequentes
Superego desenvolvido Superego desarmônico
Psicologia do
Testemunho
• O testemunho depende do modo como a
pessoa percebeu o acontecimento,
conservou-o na memória, de sua
capacidade de evocá-lo e da maneira
como quer expressá-lo. Isso se manifesta
no relato que ela fará dos
acontecimentos.
RELATO ESPONTÂNEO
• Nesta forma de relato, verificam-
se a irregularidade e a
incompletude.
• A espontaneidade possibilita a
falta de objetividade, até mesmo
porque o que fala pode não ter
consciência do que seja relevante.
• Pode ser prejudicado por uma
série de características pessoais
do indivíduo:
Detalhes de personalidade;
Experiencia em expor as próprias
ideias;
Aspectos relacionados com a fonoaudiologia;
Dificuldades com a linguagem.
PARTICULARIDADES NO TESTEMUNHO DE
CRIANÇAS E ADOLESCENTES

 Emitir uma linguagem que a criança entenda;


 Compreender a linguagem que ela utiliza;
 Preservar sua integridade psíquica, não submetendo-a a situação que possa
compromete-la.

• O desafio é imprimir credibilidade ao testemunho da criança. A imaturidade


psicológica e orgânica combinam-se para torná-la imaginativa e sugestionável.

• Criança/adolescente vítima da violência Encontra-se extremamente


fragilizada e a continuidade do processo de inquirição, representa uma
revitimização.
A Psicologia e o Exame
Criminológico

• Resolução CFP 012/2011

• A intervenção realizada pelo(a) psicólogo(a)


dentro do sistema prisional está ligada a
uma atuação em que se procura promover
mudanças satisfatórias, não só em relação
às pessoas em cumprimento de pena
privativa de liberdade ou medida de
segurança, mas também de todo sistema.
• Algumas considerações sobre o exame criminológico:
 Viola o princípio da legalidade, pois tal condição para a
progressão de regime ou de livramento condicional não
advêm de lei, mas sim de um laudo;
 Substitui o paradigma da “culpabilidade” pelo da
“periculosidade”, o que em tese só se aplicaria aos
submetidos às medidas de segurança;
 Está afeto ao Direito Penal de autor e não de fato: onde se
pune mais gravemente o condenado pelo que ele é e não
pelo que fez;
 Os juízes transferem o oficio de julgar aos “técnicos
morais” e seus saberes “científicos”;
 No pouquíssimo tempo de entrevista, não é possível
conhecer a personalidade do condenado e não existem
condições técnicas ou estruturais para fazer uma
“prognose
criminal” sobre
possíveis
reincidências.
• Especificamente no contexto do
sistema prisional, o CFP e os conselhos
entendem que, muitas vezes, apenas parte
restrita desse complexo trabalho esteja sendo
demandada para os(as) psicólogos(as) dessa
seara. Outras vezes, essa demanda judiciária
ultrapassa as possibilidades técnicas e éticas da
profissão, extrapolando as condições que
dispõem as ciências e práticas psicológicas de
responder a questões não condizentes a
conceitos e matérias psicológicas.
Referências
• FIORELLI, J. O.; MANGINI, R. C. R. Psicologia e direito penal. In:___.
Psicologia
Jurídica. 6ª ed. São Paulo: Atlas S.A., 2015, p.335
-372, cap.9.

• CFP.O Trabalho da(o) Psicóloga(o) no Sistema Prisional


: problematizações, ética
e orientações. Conselho Federal de Psicologia. Brasília: CFP, 2016.

• CFP.Referências Técnicas para Atuação das(os) Psicólogas(os) no Sistema


Prisional. Conselho Federal de Psicologia. Brasília: CFP, 2012.
Vamos pensar sobre a
Psicologia no sistema
prisional?

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