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Direito Penal I
Regência: Professora Maria Fernanda Palma
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
O Direito Penal carateriza-se por ser um conjunto de normas que se autonomizam no OJ, por atribuírem a
certos factos descritos de forma pormenorizada as consequências jurídicas profundamente graves – isto é,
estabelece os crimes e as suas consequências que são as penas (aplicadas aquele que atua com culpa) e as
medidas de segurança (aplicadas consoante a perigosidade).
O crime a pena têm também um conteúdo pré-legislativo indisponível - isto decorre da relação entre a
definição material de Direito Penal e a temática de legitimidade constitucional – o Direito Penal não pode
ter qualquer conteúdo.
Vamos abordar os estudos científicos não jurídicos sobre o crime, como um fenómeno social ou
psico-social. A criminologia pretende apenas compreender o explicitar o crime, sendo uma ciência de
base descritiva e não normativa. Surgem diversas correntes criminológicas neste sentido:
• Segundo a organização de Hassemer:
o Primeira concepção: o crime acontece devido a uma razão que é exclusiva do
criminoso, identificando-se deficiências do agente (biológicas ou psicológicas);
o Segunda concepção: tenta explicitar o crime de uma perspectiva social, onde se
assinalam deficiências de socialização ou de estrutura social (isolamento de
tendências sociais para averiguar de onde provém aquele crime);
o Terceira concepção: destacam a natureza social e funcional do crime, sendo ele
concebido como uma produção social – a própria sociedade decidiu que é
indesejado e considerado crime.
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
• Tenta explicar o crime através da indiferença relativamente às regras vigentes numa determinada
sociedade – o que explicaria o crime através do desfasamento entre as metas sociais gerais e as
vias para as alcançar.
• Para Merton, o elemento determinante seria o vício da estrutura social, sendo o agente a vítima
da estrutura socio-cultural.
• O desfasamento reside entre a promoção de valores de ascensão social e a efetiva escassez dos
meios legítimos para a atingir – este desfasamento leva à indiferença aos valores e mecanismos
de adaptação individual.
Em suma:
Vem dizer que a sociedade existe e prevê certos meios e privilegia certos objetivos – caminhos e
desenvolvimento pessoal. Os meios são limitados portanto nem todos vão conseguir cumprir os seus
objetivos. Se alguém tiver um objetivo diferente será reprovado socialmente. Quem não encontra os
meios para atingir os seus objetivos ou quem tem objetivos reprovados pela sociedade irá originar uma
quebra – geram-se sintomas entre os quais podem gerar uma conduta criminosa – rebelião, radicalismo,
ritualismo. O que explica o crime é que a sociedade falha em dar respostas a toda a gente que necessita –
é de todos a responsabilidade. Falha interior da própria comunidade, o crime é tido como um verdadeiro
produto social – no entanto, suscetível de ser prevenido aguando sobre os pressupostos estruturais e
corrigindo os desajustamentos nas condições sociais.
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
Teoria de Sutherland
o Parte de uma concepção de crime e sabe quais são os comportamentos desviantes – as pessoas
estão interessadas em entender porque é que achamos que aquelas pessoas são criminosas –
porque é que excluímos determinadas pessoas.
o Percepções éticas que são divergentes da comunidade e tornam comum aos membros desse
grupo mais pequeno – como máfias e nascem nesse meio. Reconhece na violência um meio de
reação e crescendo com esse mesmo estímulo.
o Investir em programas sociais que ataquem a raíz deste problema.
o Crimes de colarinho branco – a diferença reside da percepção do criminoso. Estas pessoas
controlam de certa forma a vida social.
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
Pensamento de Kohlberg
Em suma:
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A consequência é que estas pessoas que se sentem excluídas sem oportunidade para satisfazer as
suas necessidades é a violência – delinquência secundária. Nasce em consequência do primeiro
comportamento de estigmatização. Em vez que agravar a exclusão social – dentro desta lógica – os
Estados devem devem tomar medidas para aniquilar esta estigmatização através de políticas sociais.
Conclusão
➔ Devemos ponderar uma destas teorias para ponderar o crime em questão que nos aparecerá na
frequência.
3. Tipos de crimes
• Crimes de perigo Concreto- exige-se a concretização efetiva para ser considerado crime. É um
crime – resultado. Se o A dispara contra B mas B não morre, não há crime de homicídio. Se eu
conduzo sob influencia de álcool mas não cometo nenhum perigo na minha condução não se
aplica o art.292º CP. O crime só esta consumado quando os bens são lesionados, no entanto
analisando o comportamento, se quase se deu a consumação também é um crime concreto ( ele
bebeu tanto que quase atropelou a velhinha na passadeira )
• Crime de perigo Abstrato – não exige a concretização para que seja crime. O mero
comportamento que indique a realização/concretização para aquele crime nem produzindo
nenhum perigo concreto ainda assim vai ser condenado por esse crime – art.292º CP – crimes de
mera atividade – comportamento basta. O crime de lenocínio passou de ser um crime de perigo
concreto para um crime de perigo abstrato ( retirou-se a necessidade de prova de exploração), de
modo a estancar o facto de dar azo a que os comportamentos sejam consumados. Pretende-se
evitar que o dano se torne irreversível.
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● Crimes de mero resultado: nos crimes de resultado sob a forma de comissão por ação, o tipo
pressupõe a produção de um evento como consequência da atividade do agente; nesses tipos de crime só
se dá a consumação quando se verifica uma alteração externa espácio-temporalmente distinta da conduta
○ Homicídio (art. 131° CP) - consumação só se verifica com a morte de uma pessoa
○ Ofensa à integridade física (art. 143° CP)
○ Burla (art. 217° CP)
É de resto, no fundo, essencialmente a mesma distinção que se leva a cabo quando se distinguem
crimes formais (a cuja tipicidade é indiferente a realização do resultado) e crimes materiais (a cuja
tipicidade interessa o resultado).
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A distinção entre crimes instantâneos e crimes permanentes tem uma grande importância prático-
normativa para efeitos de legítima defesa (já que só é admissível a reação contra o agressor enquanto a
agressão for atual), de tentativa, de autoria e cumplicidade, de concurso, de prescrição do procedimento
criminal, e de flagrante delito.
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• Não confundir crimes permanentes com crimes continuados: o crime continuado é uma
construção dogmática e um regime criado pelo legislador —> art.30º do CP não tem nada que
ver com crime permanente.
Ex: Roubar 7x na semana (7 dias seguidos) roupa na Zara – o Código Penal permite tratar isto
como um só crime – crime continuado de furto.
Nos crimes permanentes a característica é a de se prolongar no tempo.
Figueiredo Dias: Autonomização do conceito material de crime, face ao conceito formal de crime,
constitui uma necessidade sentida desde os tempos de Beccaria.
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• Luhmann – funcionalismo no pensamento penal que parte da análise das sociedades humanas
como sistemas sociais.
• Sociedade não é um puro fenómeno político e é um sistema social, desempenhando
determinadas funções;
• Funções consistem na institucionalização da redução de complexidade:
o O Direito é a estrutura da sociedade que regula e assegura a institucionalização de
relações constantes entre ações, cuja função é selecionar as expectativas de ação aceites
geralmente para serem institucionalizadas;
o Reduz o problema da legitimação do direito à dimensão da funcionalidade.
Toda a conduta desviada em relação à norma surge como uma frustração das expectativas de
comportamento asseguradas juridicamente.
• Conduta desviante desempenha funções positivas e é útil como fator de afirmação da ordem
vigente.
• Jakobs – ponto de vista de que o Direito Penal deve manter padrões de ação que organizam as
expetativas sociais sobre o comportamento alheio.
• Função de estabilização contra fática das expetativas geradas pela violação de uma norma
incriminadora.
• Crime é dano social objetivo sendo o pretexto de afirmação de modelos de ação.
• Direito Penal tem função ideal/simbólica de controlo social – protege a vigência da norma.
A partir da necessidade de substituição do crime por outras categorias como o processo de definição e
seleção social de criminalidade
• Roxin: Excessivo normativismo e a reafirmação da norma não é um fim em si mesmo, mas antes
está destinada a contribuir para a prevenção futura de lesões reais – pena serve, em última
instância, a proteção de bens jurídicos.
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• Razões e opções normativas, embora histórica e culturalmente produzidas não deixam de, em si
mesmas, conter uma abordagem crítica aos padrões de racionalidade;
• Reconhecimento crítico de uma distorção desta racionalidade, associado ao “mundo da vida”
pela interferência de uma racionalidade utilitarista instrumentalizadora, germinada nos
subsistemas sociais, que menosprezaria os padrões elementares da vida nas sociedades humanas
e as aquisições culturais do processo histórico.
Comportamentos incrimináveis são definíveis num modelo argumentativo de ética do discurso, em que a
legitimidade depende de não se contradizerem pela incriminação condições básicas da subjetividade e do
reconhecimento recíproco – como aconteceria, por exemplo, com a incriminação da blasfémia,
comportamentos sexuais privados, mas já não com o lenocínio.
Estado atual dos modelos de política criminal em conexão com os modelos de fundamentação do
Direito Penal
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Fundamentação do Direito Penal com os fins do Estado, bens coletivos, utilidade social e bem estar
geral
• Visão democrática em que o Direito Penal é delimitado pelo interesse político e pela necessidade
de utilização dos seus instrumentos sancionatórios em cada momento histórico.
• Não há limites constitucionais para o âmbito das normas incriminadoras – modelo expansionista
que ancora o Direito Penal na pertença a uma comunidade e na responsabilidade coletiva.
O Direito Penal tem evoluído e a principal característica é a redução de um espaço livre no Direito Penal,
substituindo-se critérios éticos tradicionais de imputação por critérios standard (homem médio) e
aumentando o controlo democrático e constitucional das opções normativas.
Há um Direito Penal menos juricizado, menos dependente de legitimação, que requer um novo modelo
fundamentador, um modelo mais complexo, que reconstrua a interpretação do sistema penal a partir da
nova situação legislativa e das funções que tem assumido nas sociedades contemporâneas.
• MFP: procurar os limites negativos do que podem ser normas incriminadoras é admitir que o
Direito não tem princípios universais e a política criminal tem alguma margem para variar.
o Não é escolha arbitrária, mas é margem do legislador e do executivo da orientação da
política criminal.
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o CRP não tem conceito material de crime e tem apenas os limites – é a forma de melhor
se coadunar com o Estado de Direito democrático e com a escolha de alternativas
democráticas à política criminal.
o O que está em causa são os limites constitucionais às opções do legislador.
A CRP tem expressos, ou dela se infere, diversos princípios que dão aso a uma reflexão sobre a
política criminal através da exploração de um conjunto de tópicos
1. Primado do princípio da igual consideração do interesse de cada pessoa como participante numa
comunidade de pessoas livres.
a) Direito penal não pode intervir para criminalizar direitos, liberdades e garantias. Ex:
não incriminação de manifestações de liberdades (de consciência, de culto, de religião e
etc.)
2. Primado do princípio do reconhecimento do outro – legitimidade da incriminação de
comportamentos discriminatórios, de ódio racial, género, religião, orientação sexual;
3. Primado da ideia de necessidade da pena como princípio de articulação de direitos,
desvinculação da necessidade da pena de fins de instrumentalização política;
4. Reconstrução do espaço pessoa-mundo, considerando, no entanto, a questão da libertação do
Direito Penal do controlo total da vida;
5. Função construtiva do Direito Penal – reintegração como reatamento do vínculo social;
a) Argumento da controlabilidade do comportamento e motivabilidade dos
comportamentos dos agentes – há certos comportamentos que ultrapassam a barreira da
legitimidade da CRP para a incriminação, pois são comportamentos que não estão
suficientemente no controlo dos agentes.
b) Há margem que resulta do funcionamento do próprio sistema (funcionamento global de
um sistema que não dá a 1 indivíduo o controlo total do seu comportamento e há toda
uma cadeia). Ex: erro médico -> Responsabilidade objetiva – não deve fazer parte do
âmbito dos comportamentos criminalizáveis.
6. Utilização das ciências do crime como critério de análise de relevância constitucional, numa
procura de controlo e de redução de um normativismo não apoiado nas solicitações da realidade
social – argumento criminológico;
7. Função preventiva de meios alternativos à pena, a partir de um critério não repressivo de
reafirmação do Direito
a) Mesmo que o comportamento tenha dignidade punitiva pode não justificar a
incriminação quando há meios alternativos para resolver.
Conclusão:
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5. Bem jurídico
• MFP: Conceito que não nasceu no séc. XIX na Alemanha como os alemães afirmam. É muito
mais antigo e a ideia de bem é essencial no direito medieval e tem gestação já no direito romano
e grego.
• A maior parte dos autores simplifica a investigação dizendo que a ideia de bem jurídico vem de
Birnbaum.
• Conceito de bem jurídico tem vários significados para a delimitação do conceito material de
crime e para a função e legitimação do Direito Penal:
o Ideia de bem jurídico tem expressado relação do objeto de proteção da norma com um
interesse individual ou com um interesse coletivo assumido pelo Estado de Direito
democrático como condição essencial de incriminação;
o Ideia de bem jurídico sugere uma necessidade intersubjetiva que carece de ser
protegida;
o Ideia de bem jurídico convoca a ideia de lesão e de dano objetivo ou objetivamente
representado e não uma função meramente simbólica de um interesse protegido pelas
normas
Roxin - defende acerrimamente o papel do bem jurídico, numa aceção personalista, como limite de
intervenção penal, admitindo uma extensão no que diz respeito à preservação do interesse vital de
gerações futuras e no que se refere à proteção da biodiversidade – é possível um conceito de bem jurídico
entendido como parâmetro crítico da legislação.
Bens jurídicos = todos os bens que correspondem às condições e finalidades necessárias ao livre
desenvolvimento do indivíduo, à realização dos seus direitos fundamentais e ao funcionamento de um
sistema estatal construído em torno dessa finalidade.
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Há quem critique o conceito de bem jurídico por ser demasiado vago, o que limitaria as suas
potencialidades.
MFP: Tese de que o bem jurídico carece de qualquer significado prático essencial esta errada, vejamos
exemplos:
1. Punição de atos homossexuais entre adultos – é evidente que essa conduta, quando consentida e tendo
lugar na esfera privada, não afeta a liberdade de desenvolvimento de ninguém nem perturba de nenhuma
forma a liberdade de convivência entre as pessoas – um conceito de bem jurídico leva a que não se puna
estes comportamentos (que eram punidas até 1969 na Alemanha).
2. Punição por ter posse de estupefacientes para consumo próprio – não há qualquer dano para outros,
sendo a descriminalização uma representação da conceção de bem jurídico como parâmetro crítico da
legislação.
3. Doação de órgãos inter vivos – não se vislumbra qualquer ofensividade para outrem e cumpre fins
socialmente úteis, pelo que a criminalização carece de uma legitimação conferida pela proteção de bens
jurídicos.
4. Incesto entre irmãos – o Direito Alemão pune esta conduta, mas, também nesta situação, em que os
irmãos atuam livres de coação e de modo consentido, sendo plenamente responsáveis.
É necessário recorrer-se aos Três Degraus da Proteção de Bens Jurídicos: toda a norma penal de
legitimidade questionável deve:
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Função liberal da ideia de bem jurídico consiste precisamente também em proteger a minoria contra o
domínio da maioria.
• Opinião pública sobre a aprovação ou reprovação de determinadas condutas não ofensivas de
bens jurídicos é mutável e suscetível de manipulação.
• Não pode ser esse o fundamento de uma política jurídico-penal que se pretenda racional
• Roxin concorda com a seguinte afirmação: “os defensores de um conceito de bem jurídico
crítico da legislação dirigem-se (...) antes de mais ao legislador e indicam orientações político-
criminais sem pretenderem que as suas propostas (...) alcancem em todos os casos um sentido-
constitucionalmente vinculante”.
Conclusões de Roxin:
Figueiredo Dias
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Não consistindo em o bem jurídico um conceito fechado e apto à subsunção, bem se compreende que,
apesar de toda a evolução e progresso verificados, continuem hoje a discutir-se várias questões relativas à
sua concreta verificação, como a de saber se protegem autênticos bens jurídicos algumas incriminações.
Quem considera o conceito de bem jurídico tem por objeto de proteção da norma uma substancialidade
real e social – tem que ser um quid lesionável, quid esse que tem certa substancialidade em termos de
vida social e corresponde a algo mais que um interesse privado ou subjetivo.
• Tem que ser configurado como interesse intersubjetivo – tem que corresponder a necessidades
mais do que do sujeito, da comunidade;
• Quids que têm substância real, não meramente simbólica, e correspondem a realidades que têm
existência no mundo real e são lesionáveis.
o MFP: certa ideia de substancialidade é sobretudo uma ideia presente na propriedade, na
coisa.
o Ideia de bem jurídico é ideia liberal e em que há um certo caráter real em todos os
interesses valores (reificação da ideia de bem jurídico). Algo substancial é algo
semelhante a uma coisa, por isso lesionável.
▪ Ideia não muito favorável ao conceito de bem jurídico – tornar a vida ou a
integridade em coisas é expressão máxima do liberalismo.
▪ O ponto de partida para o conceito de bem jurídico não pode já ser a
propriedade, que não está no topo dos bens que exemplarmente fundamentam
o Estado.
Uma dimensão de pessoa (valor da livre orientação sexual, desenvolvimento de personalidade e etc.) pode
ser um interesse suficientemente relevante para legitimar incriminações que, em última análise, têm
apenas uma vaga referência a bens jurídicos no sentido tradicional.
• Conceito pode ser equívoco pelo que a pertinência da sua utilização deve limitar-se a ser
conceito exploratório de critérios limitadores das normas incriminadoras, o que permite
reconhecer algumas características de que depende a legitimidade das mesmas;
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• Pedra de toque não é o bem jurídico, mas sim qual o fundamento do poder punitivo do Estado, à
luz dos vetores;
• Conceito material de crime prende-se com a ideia de saber qual a legitimidade de se incriminar
certa conduta.
o Roxin e FD: partem do conceito de bem jurídico e de qual o interesse que está a ser
protegido ao criminalizar determinada conduta.
o MFP: há vários patamares. Não basta haver um bem jurídico e temos de perceber se
essa incriminação é válida consoante os princípios jurídico-constitucionais.
o Se não passar no crivo dos princípios é materialmente inconstitucional, logo não
corresponde a um crime, no seu conceito material.
O problema que surge à luz do fim das penas reside na discussão de toda a teoria penal que
incide fundamentalmente sobre as seguintes questões: legitimação, fundamentação e função da
intervenção penal estatal. O sentido, o fundamento e as finalidades da pena criminal são determinações
indispensáveis para decidir de que forma deve ela actuar, no sentido de cumprir a função do Direito Penal
– elas recaem portanto no próprio conceito material de crime.
À luz desta teoria, a essência da pena criminal reconduz-se à retribuição, expiação (penitência), reparação
ou compensação do mal crime que foi cometido.
A ideia é a de que o facto que se cometeu no passado, é a justa paga do mal que com o crime se realizou,
sendo o justo e o equivalente do dano do facto e da culpa do agente – tem de existir correspondência entre
a pena e o facto. Apenas deste modo fica assegurada a dignidade histórica que a pena desde tempos
remotos assumiu, alcançando a sintonia com o sentimento cultural comunitário, reconduzindo a pena ao
que sempre se entendeu, um castigo e uma expiação do mal do crime cometido.
MFP: as teorias retributivas foram nas suas primeiras formulações, teorias absolutas, com o fim de
justificar a compensação do mal do crime – independentemente de qualquer fim pragmático.
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Esta teoria tem dignidade histórica, sendo também suportada pelo pensamento filosófico:
• Na antiguidade grega é relatada uma conversa entre Anaxágoras e Péricles onde se manifesta,
primordialmente, a concepção retributiva;
• O princípio do Talião “olho por olho, dente por dente”, correspondendo à Idade Antiga de
representações mitológicas e durante a Idade Média, em que se afigurava como um raciocínio
religioso de que a realização de justiça no mundo, com o mandamento de Deus, conduz à
legitimação da aplicação da pena retributiva pelo juiz como representante do terreno da justiça
divina;
• KANT, neste sentido, encarava a pena como sendo um “imperativo categórico”, preconizando
que quando a justiça desapareça, não tinha mais valor que os homens vivessem na terra (teria o
último assassino que se encontrasse na prisão de ser previamente enforcado), sendo na negação
do direito alheio a negação do direito em geral, o que reconduz à ideia do imperativo categórico,
concebendo o crime como a negação da universalidade da lei;
• HEGEL, considerava o crime como a negação do direito e a pena como a negação da negação,
como a anulação do crime, que de outro modo continuaria a valer, e como restabelecimento do
Direito. Acrescentava ainda que aplicar esta consideração absoluta da pena com qualquer fim de
prevenção seria como “levantar um pau contra um cão e tratar o ser humano não segundo a sua
honra e liberdade, mas como um cão.” –concebia a pena como um modo de honrar o criminoso,
e não como um instrumento ao serviço da sociedade através do qual a dignidade do criminoso
como pessoa possa ser afetada. A pena é uma consequência lógica do crime, pois sendo a
negação deste que constitui a reafirmação dialética do Direito.
No entanto, deve frisar-se que se toda a pena supõe a culpa, nem toda a culpa supõe a pena – apenas
aquela culpa que simultaneamente acarrete necessidade ou carência de pena. Chegamos portanto à
seguinte máxima – a culpa é pressuposto e limite, mas não fundamento da pena.
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Como teoria dos fins das penas, a doutrina retributiva das teorias absolutas não pode operar, à luz do
Professor Figueiredo Dias. Não é verdadeiramente uma teoria dos fins da pena, visando justamente o
contrário - a consideração da pena como entidade independente de fins – não sendo a justiça um “fim”,
mas sim os efeitos relevantes na e para a vida em sociedade.
A doutrina de retribuição deve também ser recusada pela sua inadequação à legitimação, à fundamentação
e ao sentido da intervenção penal, estes elementos apenas podem resultar da necessidade que ao Estado
incumbe de satisfazer, de proporcionar as condições de existência em sociedade assegurando a cada
pessoa o especo possível de realização livre da sua personalidade, como fundamento para retirar o
mínimo e indispensável de direitos, liberdades e garantias assegurando o direito dos outros e com
eles a comunidade.
MFP: A intervenção do Estado, servido do poder punitivo, não pode servir para sancionar diretamente a
culpa uma vez que nem a própria pena é adequada a uma intervenção na personalidade de cada criminoso.
Não cabe ao Estado, pelo menos não num Estado de Direito Democrático promover uma Ética ou moral
em si mesmas – cabe sim assegurar a medida indispensável da preservação das medidas de segurança
com o fim de garantir condições sociais de existência. O princípio da necessidade da pena vem reafirmar
isto, consagrado no art.18º, nº2 CRP, postula que a pena só deve ser aplicada quando necessária para a
preservação da sociedade.
Conclusões:
• Neste sentido para cumprir a retribuição, a expiação ou a compensação do mal do crime não são
meios legítimos ou idóneos;
• Como Estado Democrático e pluralista dos nossos dias, este não pode afigurar-se como uma
entidade sancionadora de pecados ou vícios, tendo de limitar-se a proteger os bens jurídicos;
• O Estado não pode servir-se de uma pena dissociada de fins, como a que é apresentada pela
teorias absoluta, nem se pode afigurar como instância destinada à realização do ideal de “justiça”
como uma espécie de justiça divina.
Crítica: uma pena retributiva, baseada na compensação pelo mal do crime, fazendo sofrer o delinquente
como compensação ou expiação, configura uma doutrina puramente social-negativa, vedando qualquer
socialização do delinquente ou restauração da paz jurídica afetada pelo crime, sendo inimiga de qualquer
atuação preventiva e qualquer pretensão de controlo e domínio da criminalidade.
Ao contrário do que foi supracitado (relativamente à teoria absoluta), as teorias relativas são teorias de
fins. A pena é encarada como um mal para quem a sofre, e não como uma compensação ou expiação pelo
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mal do crime, sendo encarado de outro prisma, nomeadamente de um prisma de prevenção ou profilaxia
criminal.
• Para o funcionamento da sociedade, cada pessoa, tem de prescindir de direitos que lhe assistem e
lhe são conferidos em nome da sua eminente dignidade (na sua medida indispensável).
• A questão da preservação da dignidade da pessoa é independente da questão das finalidades da
pena – deve ser resolvida independentemente dela. A questão reside em saber se, não a pena mas
sim a sua aplicação não deve fazer-se em termos que respeitem a intocável dignidade da pessoa
humana , sendo a resposta inevitavelmente positiva. Este problema prende-se com os limites que
devem ser impostos às suas condições de aplicação, e não com os fins da pena.
• Contende, portanto, com a função e a materialidade do concreto de culpa jurídico-penal e não
com as finalidades do conceito da pena.
A prevenção geral radica na concepção da pena como um instrumento político-criminal destinado a atuar
sobre a generalidade dos membros da comunidade – afastando-os da prática do crime através da ameaça
penal estatuída pela lei, da realidade da tua aplicação e da efetividade da sua execução. Os defensores das
teorias absolutas julgam a prevenção geral como uma violação da eminente dignidade humana –
improcedente.1
A atuação estatal, neste sentido, assume uma dupla perspectiva:
• Prevenção geral negativa: a pena é concebida como uma forma estatal de intimidação das
outras pessoas, através do sofrimento que com ela se inflige ao delinquente, e cujo receio desta
punição reconduz a não cometerem factos puníveis.
Críticas: os defensores da teoria absoluta retributiva, que julgam as teorias relativas, apesar de
forma improcedente, apontam uma indiscutível fragilidade à prevenção geral na sua vertente
negativa, nomeadamente por se tratar de uma forma de intimidação da generalidade dos
cidadãos. Não se torna possível determinar empiricamente o quantum de pena necessário para
alcançar tal efeito, por diversos motivos – não logrando na erradicação do crime, a tendência
será a de usarem para tal efeito penas cada vez mais severas e desumanas, podendo o Direito
Penal descambar, culminando num Direito Penal do terror e desproporcional, violando a
eminente dignidade da pessoa humana.
• Prevenção geral positiva: por outro lado, a pena é concebida como a forma que um Estado se
serve para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força das suas normas
na tutela dos bens jurídicos, configurando um instrumento destinado a relevar perante a
comunidade e à inquebrantabilidade da ordem jurídica, reforçando os padrões de comportamento
1
DIAS FIGUEIREDO, Jorge, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 3ª edição, 2019, pp.57 e 58.
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• O ponto de partida das doutrinas da prevenção geral é desde logo acolhido, pelo facto de se
conectar com a função do direito penal de tutela subsidiária de bens jurídicos, ao contrário do
que sucede com as doutrinas de retribuição.
• Exige-se portanto da pena, à luz desta perspectiva, uma atuação preventiva sobre a generalidade
dos membros da sociedade seja no momento da sua ameaça abstrata, seja no momento da sua
aplicação ou na sua efetiva execução.
“As doutrinas da prevenção especial têm por denominador comum a ideia de que a pena é um instrumento
de atuação preventiva sobre a pessoa do delinquente com o fim de evitar que no futuro ele cometa novos
crimes.”3
Assim, este critério é também encarado com uma finalidade de prevenção de reincidência. De que forma
deve então a pena cumprir esta finalidade?
O efeito pretendido com a prevenção especial é o de que se criem condições necessárias para que o
delinquente possa no futuro continuar a viver a sua vida sem cometer crimes – prevenção de reincidência.
2
Feuerbach.
3 DIAS FIGUEIREDO, Jorge, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 3ª edição, 2019, p.62.
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Para além desse propósito, tendem ainda em lograr a reinserção social, a ressocialização do delinquente –
prevenção especial positiva ou de socialização. Tal como se verificou com a prevenção geral, a prevenção
especial revela de igual modo sintonia com a função do direito penal como tutela subsidiária dos bens
jurídicos. Reforça portanto a ideia de que o Estado tem o dever de auxiliar os membros da comunidade
colocados em posição particularmente desfavorável, oferecendo os meios necessários à sua reincerção
social.
Críticas:
4 Pinto de Albuquerque.
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É hoje debatida, cada vez com mais persistência, uma nova e autónoma finalidade da pena no sentido de,
com ela operar conjuntamente uma possível concertação entre o agente e a vítima através da reparação de
danos (tanto patrimoniais como morais) causados pelo crime.
• ROXIN, procura através desta acepção erguer um sistema tripartido de sanções penais: penas,
medidas de segurança e reparação de danos.
As teorias onde reentre a ideia de retribuição das teorias absolutas são rejeitadas à luz de teorias
unificadoras. No entanto como iremos ver, não podemos realizar esta desconexão, uma vez que coloca em
causa o princípio da é culpa.
O ponto de partida reside na combinação ou unificação das finalidades da pena – que opera
a nível da prevenção geral e especial, com exclusão de qualquer vestígio de retribuição,
expiação ou compensação do mal. Consiste portanto numa compreensão orientada para
atribuir a cada uma (prevenção geral e especial) a máxima incidência na prossecução de um
ideal de prevenção integral. Esta concepção unificadora deve ser globalmente recusada, uma
vez que veda qualquer intervenção da concepção retributiva na legitimidade para integrar a
composição dos fins das penas o que traduz na grave consequência de recusa do pensamento
da culpa e do seu princípio como limite do problema: substituindo-se pela perigosidade ou
pelo principio da proporcionalidade, e ainda por uma manipulação das ideia de culpa como
derivada da prevenção.
Isto traduz-se num desrespeito pela eminente dignidade da pessoa (pressuposto e limite
do Direito Penal).
ROXIN, por outro lado conclui que a pena serve exclusivamente finalidades de prevenção
geral e especial, mas nunca negando a intervenção da retribuição na querela de finalidades
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da pena, pelo que não significa abandonar nem minimizar o pensamento e o princípio da
culpa.
Assim:
Ao mesmo tempo que ROXIN afirma que a medida da culpa é dada não por um ponto exato da
escala penal, mas através de uma moldura de culpa, em que o juiz deve fixar a medida concreta
da pena, implica uma teoria unificadora preventiva dos fins da pena. Com a construção desta
moldura da culpa como espaço de aplicação da pena, surge de novo a ideia de compensação da
culpa – ideia de retribuição, regressando de novo às finalidades da pena e degradando os
propósitos preventivos que deveriam ser únicos, para meros corretores da correspondência entre
pena e culpa – uma versão disfarçada da ideia de compensação da culpa, a ideia mestra de
retribuição, implicando o seu regresso às finalidades da pena. Assim se degrada o papel central
que cabe à prevenção geral (positiva), para lhe conferir a função de mínimo dos mínimos da
pena.
A solução preconizada pelo Professor Figueiredo Dias é a de que os fins das penas só podem ter
natureza preventiva, seja ela prevenção geral (negativa ou positiva) ou prevenção especial
(positiva ou negativa) mas não natureza retributiva. O Direito Penal e o seu exercício pelo
Estado fundamentam-se na necessidade estatal de subtrair à disponibilidade de cada pessoa o
mínimo dos seus direitos, liberdades e garantias indispensável ao funcionamento da sociedade,
preservação dos bens jurídicos essenciais e em última instância permitir a realização da mais
livre possível personalidade de cada um enquanto indivíduo e enquanto membro da sociedade.
• Posto isto, a pena criminal na sua ameaça, na sua aplicação concreta e na sua execução
efetiva apenas pode prosseguir a realização desta finalidade – prevenindo a prática de
futuros crimes.
• A prevenção geral e especial devem operar-se em conjunto, não esquecendo, como
refere a Professora Maria Fernanda Palma , que a prevenção especial tem uma lógica
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O art.40º do CP estabelece as finalidades da punição. O preceito foi introduzido aquando uma reforma
penal que ocorreu em 1995, no seguimento de uma fase que pretendia ultrapassar as rotinas judiciais
retributivas.
• O preceito tinha como objetivo estabelecer o fundamento da punição, que seria a prevenção geral
na dimensão da proteção dos bens jurídicos (auxiliada pela prevenção especial) e que a culpa-
retribuição apenas iria conter uma função restritiva – consagrada no art.40º, nº2 CP.
• O Professor Figueiredo Dias densificou o pensamento de ROXIN (associar a culpabilidade do
agente a uma função meramente restritiva nos fundamentos de punição), e neste sentido
pretendia uma exclusiva fundamentação preventivo-geral da decisão de punir.
• Neste sentido, o Professor preconiza que segundo o art.40º a punição deve ancorar-se na
necessidade preventiva, mesmo que os limites de culpabilidade anulem a justificação da pena –
neste prisma, a Professora MFP refere que, à luz desta interpretação, parece nunca haver lugar
ao afastamento da pena perante a persistência das exigências mínimas da prevenção geral,
ainda que as exigências da culpa apontem para um limite inferior. Este pensamento fará
depender a aplicação da pena exclusivamente da prevenção geral positiva e a culpabilidade do
agente apenas controlará a medida da pena.
➔ O primeiro argumento é o de que, esta leitura do art.40º aporta desde logo dificuldades do ponto
de vista sistemático, uma vez que o próprio Código Penal estabelece a culpa do agente como o
critério fundamental da medida da pena – justificando a variação entre o máximo e o mínimo
(art.70º CP), o que evidencia logo o problema de o critério da medida judicial da pena poder
ser diferente do fundamento legal de punição.
➔ O segundo argumento reside no facto de diminuir/reduzir a culpabilidade do agente a um
critério meramente restritivo ou acessório de uma responsabilidade baseada na PG positiva
(proteção de bens jurídicos e promoção da segurança geral) auxiliada pena PE, quando a
culpabilidade do agente é um elemento do conceito de crime e um pressuposto essencial de
toda a atribuição de responsabilidade.
➔ Concretizando estes dois primeiros argumentos, MFP chega à seguinte conclusão: qual o
significado desta redução da culpabilidade a um mero princípio restritivo e até que ponto será
esta redução compatível com o sistema legal e constitucional. Será plausível justificar a
aplicação de uma pena ao agente quando a censurabilidade deste seja mínima, com fundamento
na perda de confiança no Direito, os sentimentos de impunidade ou o enfraquecer das
expectativas relativas ao sistema (Estado e aplicação do Direito)?
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➔ O princípio da culpa é expressão de uma consideração plena da igual dignidade da pessoa, assim
como de igual modo a consideração dos interesses de todos e a justa oportunidade de cada
pessoa orientar o seu comportamento pelas normas penais (art.1º, 13º e 27º da CRP). Desde logo
a tese do caráter restritivo de culpabilidade apresenta debilidades.
➔ Nada tem que ver com a ideia de retribuição, mas sim com a ideia de uma relação punitiva
justa, a partir de comportamentos que merecem tutela penal porque os seus autores reuniram as
condições para se reconhecerem como responsáveis, tendo deste modo cabimento um juízo de
censura pessoal pela prática de certos comportamentos.
➔ Na própria seleção legislativa dos comportamentos a ser puníveis, não pode ser considerada
apenas uma perspectiva baseada na satisfação dos interesses gerais da comunidade ou numa
perspectiva objetiva de proteger bens jurídicos – terá de existir cabimento para a consideração de
um certo nível de desvalor da ação, bem como a exigibilidade média de um outro
comportamento a quem viola a norma. Ex: erros médicos ou outras atividades de risco praticados
em situações de excesso de trabalho, ou certos casos de interrupção voluntária da gravidez
(quando passa do prazo) – situação de comportamento que colide com bem jurídico provando
danos sociais, em situações de grave desigualdade e restrição de oportunidade.
➔ Utilizar a prevenção essencialmente e exclusivamente como pressuposto da aplicação da pena,
dado o caráter instrumentalizador5que possuí a prevenção geral, instrumentalizam a pessoa –
aplicando-se penas acima da culpa.
Posto isto, existem dois modelos referentes à análise do art.40º, concretamente na sua articulação
entre o nº1 e o nº2: relação entre prevenção geral positiva, prevenção especial e a função da
culpabilidade do agente na fundamentação judicial da punição (determinação da pena concreta)
• Para o FD, a culpabilidade não tem um papel determinante na decisão do se da pena – opera
apenas a posteriori na determinação da medida judicial concreta para evitar que se transgrida um
limite, ainda que justificável preventivamente – para evitar excessos preventivos numa moldura
entre um máximo e um mínimo baseada em critérios de culpabilidade média.
o A culpabilidade é um princípio restritivo que funciona no quadro da prevenção,
fixando o limite máximo atingível pela prevenção.
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o Não apoia uma dupla fundamentação do art.40º, defendendo que torvaria a natureza
exclusivamente preventiva das finalidades das penas.
• Para MFP, a culpabilidade opera desde logo a priori, condicionando os critérios de necessidade
a partir da consideração do merecimento da conduta do agente (não numa lógica de retribuição).
A culpabilidade não restringe a necessidade , apenas a reconfigura – estabelecendo um limite
inultrapassável, não podendo a pena concreta e a decisão de punir ultrapassar este limite.
o A prevenção é um princípio restritivo que opera no quadro delimitado pela
culpabilidade (máximo e mínimo) que o comportamento justifica – mas a culpa não é
alheia à prevenção.
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dentro da moldura penal pelo juízo de culpa, o mesmo raciocínio para valores mínimos
– pena mínima. (Contrariamente a FD)
➔ A moldura penal é então fixada em função deste limite, pelo que a PG e a PE podem determinar
uma pena, no entanto nunca pode ser superior a esse limite de culpabilidade a priori fixado.
Portanto, a PG e a PE nunca poderão justificar a punição se a culpa for mínima ou exígua. Neste
sentido FD preconiza que o papel da culpa no sistema punitivo reside na proibição do excesso,
não sendo fundamento da pena, mas constituindo o seu pressuposto necessário e
consequentemente o seu limite inultrapassável.
Os princípios são idéias gerais cujo papel é permitir que a constante regulamentação normativa produzida
num sistema jurídico respeite uma determinada racionalidade, assim como assegurar o controlo da
efetivação prática do sistema.
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• No CP é expressamente indicado como fator de determinação da medida da pena (art. 40º/2, 71º
e 72º).
o Coaduna-se com o art. 147º CP pois todos os crimes de agravação pelo resultado têm de ser
coadunados com o art. 18º CRP, que diz que só há imputação de resultados agravantes se tiver
agido com algum tipo de culpa (como a negligência);
o Não há resposta do Direito Penal para condutas fora do controlo dos agentes – associada a uma
liberdade de agir, em que há condições para os agentes se motivarem pela norma, e respetivas
consequências;
o Por este motivo, TC italiano liga este princípio com o princípio da legalidade pois não há crime
sem lei, tendo os agentes que conhecer as normas para se motivarem por elas. Tem de haver
possibilidade dos agentes se motivarem pelas normas para agirem, só assim é que cumprem os
seus ditames de conduta.
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A culpa tem de estar aferida por descrição de conduta e com base num facto suscetível de ser provado
em Tribunal e articula-se com o princípio da legalidade.
Surgiu como uma reação contra a utilização discricionária das penas pelo poder político ao serviço de
quaisquer fins, traduzindo historicamente a ideia de que a utilização pelo Estado de meios penais deve ser
limitada ou mesmo excecional.
Vindo de uma ideia primitiva de contrato social, hoje resta a aceitação de que o poder político se
justifica pelo serviço aos membros da sociedade – subordinação racional dos abstratos fins políticos à
realização da pessoa em sociedade.
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• Art. 13º CRP – não é princípio específico do Direito Penal, mas orienta as soluções do sistema
penal.
À igualdade subjaz uma ideia de proporcionalidade entre a gravidade do ilícito e da pena bem como é a
igualdade que sustenta a medição da pena pela culpa.
Proporcionalidade é princípio formal cujo conteúdo é preenchido pelos outros princípios constitucionais
de Direito Penal, como a culpa e a necessidade da pena.
Idêntica necessidade de punir e idêntica culpa justificarão idênticas penas – ou, pelo menos, o direito a
que não seja mais gravemente punido.
• O princípio da igualdade proíbe tipos penais discriminatórios. Por outro lado, tendencialmente,
factos menos graves não podem ter uma punição superior a factos mais graves. Isso violaria o
princípio da igualdade (ex: furto de supermercado e violação);
• No que se refere ao conceito material de crime, o princípio da igualdade tem relevância na
delimitação negativa das incriminações e legitima, em certos casos, o conteúdo de normas
incriminadoras, mas não prevalece sobre o princípio da necessidade da pena;
• João Matos Viana: é um princípio fraco em direito penal. É altamente constrangido pelo
princípio da necessidade e da culpa. Em direito penal, muitas vezes, aquilo que aparentemente é
igual é tratado de forma desigual devido ao princípio da necessidade.
• Justifica a rejeição de penas atentatórias do respeito pela pessoa humana como a pena de morte,
prisão perpétua, torturas e etc. (art. 24º /2, 25º /2 e 30º/1, 4 e 5 CRP).
➔ Expressão da dignidade da pessoa humana – um criminoso tem uma compreensão dos seus
direitos civis e políticos, mas não deixa de ser pessoa.
Apela ao princípio da sociabilidade, numa perspetiva de orientação do sistema penal não contemplada
pelos fins tradicionais da política criminal e que explicará que a lógica impiedosa e vertical do sistema
punitivo ceda a soluções que a flexibilizam por causa da noção de uma supremacia social de certos
interesses individuais aos quais outros interesses se deveriam sacrificar.
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Breve sistematização:
o Corolários:
o Scripta: art.163º, nº1 , al c) CRP – reserva de lei em sentido formal, tem de ser criada
pela AR ou Governo dentro dos limites da CRP – única forma de a lei penal ser válida.
o Certa: princípio da determinação
o Stricta: art.1º, nº3 CP – proibição de analogia.
o Praevia: art.2º e 3º CP e art.29º CRP, proibição de retroatividade
(Para que haja crime e pena, a lei deve ser escrita, certa, estrita e prévia).
1) A lei apenas pode, em princípio, ser fonte de Direito Penal mediante uma reserva relativa de
competência da Assembleia da República – no seu art.165º, nº1, al c) CRP;
2) O próprio conteúdo das normas penais terá de revelar um elevado grau de determinação, na
descrição das condutas incriminadas e das suas consequências – art. 29º, nºs 1 e 3 da CRP;
3) Existe um condicionamento do intérprete da lei penal, estando proibida a analogia e
eventualmente a própria interpretação extensiva de normas incriminadoras (MFP) – art.29º,
nºs 1 e 3 da CRP e art.1º, nº3 do CP;
4) Está consagrada a proibição de retroatividade de normas penais – art.29º, nºs 1 e 3 da CRP e
art.1º, nº1 do CP;
5) Consagra-se o princípio da retroatividade das leis penais que sejam de conteúdo mais
favorável ao arguido – art.29º, nº4 da CRP e art.2º, nºs 2 e 4 CP)
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o O plano do âmbito de aplicação: cumpre assinalar, neste plano, que o princípio da legalidade não
cobre segundo a sua função e o seu sentido toda a matéria penal, mas apenas aquela que se
traduza em fundamentar ou agravar a responsabilidade do agente. Caso abrangesse também a
exclusão ou atenuação da responsabilidade o princípio passaria a operar contra a tua própria
teleologia e a sua razão de ser: a proteção dos direitos, liberdades e garantias do cidadão face à
possibilidade de arbítrio e de excesso do poder estatal.
Exemplo dado pelo professor: O princípio da legalidade cobre toda a matéria relativa ao tipo
de ilícito ou quanto ao tipo de culpa, mas já não cobre no que concerne às causas de justificação
ou causas de exclusão de culpa.
o Plano da fonte: conduz à exigência de lei formal, apenas a lei da AR ou por ela competentemente
autorizada pode definir o regime dos crimes, das penas, medidas de segurança e os seus
pressupostos.
o Determinabilidade do tipo legal: importa que a descrição da matéria proibida e de todos os
outros requisitos de que dependa em concreto uma punição sejam passíveis de ser objetivamente
determináveis os comportamentos proibidos e sancionados, e consequentemente, se torne
objetivamente motivável e dirigível a conduta dos cidadãos – a norma tem de ser esclarecedora é
passível de compreensão objetiva, para que os cidadãos possam orientar o seu comportamento
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consoante a mesma. Posto isto, na formulação dos tipos legais é inevitável a utilização de
elementos normativos, conceitos indeterminados, clausulas gerais – o que não pode acontecer é
queda sua utilização obste à determinabilidade objetiva das condutas proibidas (a respeito das
normais penais em branco como iremos abordar de seguida) – nesta mesma acepção se afirma
que a lei penal fundamentadora ou agravadora da responsabilidade tem de ser uma lei certa e
determinada – é aqui que reside o grande perigo para a consistência do princípio nullum
crimen.
A reserva de lei penal exige uma conformação da técnica legislativa e da interpretação, de modo a
permitir que as normas penais se apliquem estritamente de acordo com a sua definição legislativa.
A decorrência destas proposições é o chamado princípio determinação das normas penais
incriminadoras – no que respeita ao preceito primário e ao preceito secundário.
Nota:
Tipicidade – adequação do facto a um tipo legal de crime.
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(mecânica). O fim da norma era punir mais gravemente as condutas realizadas por meios
especialmente perigosos.
o Direito Penal português: o conceito de “veneno” relativamente ao homicídio qualificado
(art.132º, alínea i )) em que deverão caber dentro do conceito todas as substâncias que em si
mesmas não sejam tóxicas, mas que surtem o mesmo efeito no organismo humano (podendo ser
ministradas com outras, ou em grandes quantidades contra pessoas particularmente débeis –
ministrar quantidades elevadas de açúcar a doentes diabéticos).
o Acórdãos:
(a) Acórdão 427/95 do TC – é um caso em que há uma norma incriminadora que prevê a
proibição de inclusão de aditivos num produto alimentar (que desvirtuem a qualidade do
alimento) e que remete para uma portaria que fixa as substâncias que, apesar de serem
aditivos, não são proibidos. O TC entendeu que não havia aqui violação da reserva de
lei, uma vez que a proibição estava contida na primeira norma, enquanto proibição de
aditivos, e a segunda meramente excluía certas substâncias do âmbito da proibição; ou
seja, tinha uma delimitação negativa e não extensiva. Respeitou-se assim uma reserva
de certeza e de previsbilidade na norma incriminadora: esta dava informação suficiente
sobre o que era o comportamento proibido; a Portaria apenas vinha acrescentar
informações técnicas sobre o que não seriam aditivos proibidos.
(b) Acórdão 115/2008 – questionou-se a constitucionalidade do art. 277º CP, que remete
para normas regulamentares ou técnicas, ao configurar o comportamento típico de violação
de regras de construção de que resulte perigo para a vida, integridade física ou propriedade
de terceiros. Nesse caso, também o legislador pretendeu assegurar um efeito de
regulamentação, consistente em relacionar o perigo produzido com a violação de leges artis
da construção, na medida em que estas correspondem às boas práticas de controlo de riscos.
A proibição contida na norma remissiva refere- se ao não respeito por estes critérios.
Assim, a violação dos princípios da determinação e da tipicidade não ocorre quando estamos
perante uma destas situações – pelo que o legislador pode utilizar conceitos menos precisos, ou o
intérprete excede o sentido puramente lógico-formal das palavras.
Dá-se sim quando a possibilidade de uma compreensão e controlo do desvalor expresso no tipo
legal de crime deixa de existir – deixa de existir compreensão objetiva.
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Ocorre ainda outro tipo de situações que podem levar à violação da reserva de lei (violação de lei
escrita – scripta associado ao princípio da legalidade):
➔ Normas penais que estabeleçam o conteúdo da sua previsão ou da sua estatuição por remissão
para outras normas constantes de leis hierarquicamente inferiores – como sucede no caso de leis
penais remeterem para regulamentos (leis do Governo sem autorização legislativa), ou portarias
– a definição de elementos de que resulte o comportamento incriminado ou a pena aplicável
➔ No entanto, a remissão de uma norma para outras não é em si um obstáculo ao respeito da
legalidade, mas sim o grau de esvaziamento de conteúdo precetivo e a atribuição da competência
para definir o comportamento proibitivo a leis hierarquicamente inferiores ou mesmo a atos
administrativos.
➔ Assim, em situações em que a essência do proibido depende totalmente da norma para a qual se
remete, será uma norma penal em branco e consequentemente será inconstitucional (MFP).
➔ Se apenas possuir um sentido técnico, e a essência do proibido estiver na norma penal, esta é
admissível e é considerada uma norma remissiva para normas técnicas (mas a essência do
proibido consta na norma remissiva (principal)).
➔ Muitas vezes as normas remissivas apenas têm a função de orientar o intérprete segundo critérios
objetivos quanto à verificação de um comportamento proibido.
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Questão da constitucionalidade:
• Para o professor é uma norma que contém sanção penal (a norma penal em branco) e que, quanto
ao facto típico remete total ou parcialmente para descrição feita por outra norma extra-penal, do
ordenamento jurídico. Determina direta e expressamente a pena, e define indiretamente ou por
remissão a matéria da proibição penal, isto é, a conduta a que é aplicável a sanção estabelecida
pela dita norma penal em branco.
• O problema da (in)constitucionalidade coloca-se em relação à norma extra-penal complementar,
implementadora ou integradora da norma penal em branco uma vez que esta tem
necessariamente de contar de lei ou de decreto-lei autorizado pela AR. Desde que a norma extra-
penal respeite as exigências de determinabilidade (lei certa) ou tipicidade, decorrentes do
princípio da legalidade não existem razões para considerar inconstitucional a norma penal em
branco.
• Argumento utilizado: é o próprio legislador penal a definir, embora o faça por remissão, a
matéria da proibição penal e portanto a norma para que remete também assume por força dessa
remissão natureza penal, exigindo-se apenas que a remissão-conexão entre a norma penal e a
norma extra-penal seja clara, inequívoca e seja precisa da descrição da conduta – Taipa de
Carvalho.
• A alteração do conteúdo normativo da norma extrapenal significará a revogação tácita da norma
penal em branco. Ex: se a norma penal em branco estabelecer que é punível com determinada
pena de prisão ou de multa quem praticar o facto descrito na norma extrapenal x, a alteração
desta hipótese legal irá significar a ineficácia da norma penal em branco.
• O professor considera deste modo as normas penais em branco com sentido estrito (que ele
próprio lhes atribui) dizendo que se devem evitar a todo o custo, e apenas são admissíveis
quando o sentido técnico-legislativo for indispensável.
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MFP: estas teorias que legitimam normas remissivas enfatizando o interesse fundamental das normas
remissivas como a de mera obediência e necessidade a uma regulamentação administrativa colocaria em
causa a separação de poderes e o princípio da legalidade.
Em que medida é que uma norma penal que não define todo o seu conteúdo remetendo para uma
outra viola o princípio da reserva de lei?
• A remissão de uma norma para outras não é, em si mesma, obstáculo ao respeito pelo princípio
da legalidade.
• O que pode desrespeitar este princípio é o esvaziamento de conteúdo precetivo e a atribuição da
competência para definir o comportamento proibido a leis hierarquicamente inferiores ou até aos
atos administrativos.
• Assim, importa distinguir, atendendo ao “critério do proibido”:
▪ Situações em que o núcleo do comportamento proibido pela norma depende totalmente
da norma para qual se remete, não sendo previsível para os destinatários sem essa
norma o que deles se espera; Ex: remissão de uma norma que incrimina o tráfico de
estupefacientes para um regulamento que qualifique como estupefaciente uma certa
substância. Sem o conhecimento da natureza legalmente atribuída de droga proibida a
essa substância não é previsível que a venda da mesma possa ser tráfico.
▪ São inconstitucionais pois violam o princípio da legalidade (na aceção da reserva de lei)
e conflituam com a separação de poderes.
• Situações em que a remissão é puramente para um critério técnico, não estando o objeto da
norma remissiva, o interesse fundamental protegido, dependente do conteúdo concreto
deste critério – efeito de regulação da norma incriminadora, que não depende do conteúdo da
norma para a qual se remete.
▪ Neste caso se encontram aquelas normas em que o cerne da proibição (e por isso do
ilícito) se centra manifestamente num efeito pretendido ou num interesse fundadamente
prosseguido, não dependendo do critério técnico (em si mesmo variável em função de
novos conhecimentos) o sentido essencial do comportamento contrário ao Direito.
A distinção entre normas remissivas que violam a reserva de lei e as que são com ela compatíveis
depende, de saber se a função da norma penal é estabelecer direta e materialmente a fronteira entre o
proibido e o permitido ou apenas sinalizar que um certo efeito material dependente da obediência à
regulação legal devido à natureza ou grau de risco da atividade é o conteúdo fundamental da proibição.
• Art. 277º CP é considerado, por alguns autores, como norma penal em branco e, devido a
tal, inconstitucional.
• MFP: não entende assim. Pode ser norma formalmente penal em branco por ser remissiva, mas,
o que se pretende com este tipo de normas é que certas atividades perigosas devem ver
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Em suma, na fronteira da violação da reserva de lei encontra-se a garantia de que não emana da norma
regulamentar ou do ato da autoridade administrativa a diferenciação entre o comportamento permitido e o
proibido, mas antes da norma remissiva. Será esta a linha de rumo na distinção entre as normas penais em
branco, propriamente ditas, inconstitucionais, e as normas remissivas para normas técnicas que não
violam a referida reserva de certeza e de previsibilidade.
Se houver remissão para Regulamento da UE isso não viola a reserva de lei – há violação quando se
remete para decisão-quadro ou diretiva.
1. Começar por: A norma penal tem de ser certa, escrita, estrita e prévia (scripta, certa, stricta e
proevia) – segundo o corolário do princípio da legalidade consagrado no art.29º, nº1 e 3 CRP.
2. Identificar:
➔ Bem jurídico (que esta a ser colocado em causa com o comportamento )
➔ Desvalor da ação (comportamento que se quer evitar)
➔ Desvalor do resultado (perigo ou dano que te pretende evitar).
3. A norma extrapenal nunca pode ter caráter inovador nem deve constar a essência do proibido
(essa tem de constar da norma penal), se constar na norma extrapenal temos uma
inconstitucionalidade material.
4. Consequências
• Inconstitucionalidade orgânica - foi um órgão que não a AR a legislar sobre o assunto
– 165º, nº1, al.c CRP
• Inconstitucionalidade formal - porque não é uma lei, em sentido de ato jurídico –
112º, nº5 CRP
• Inconstitucionalidade material - porque viola o princípio da legalidade – 29º, nº1 e 3
CRP
Em suma:
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Temos portanto a questão de saber qual será a interpretação proibida e a interpretação permitida –
é necessário perceber em primeiro lugar a proibição da analogia, a sua ratio e a sua possibilidade.
Descobrindo a razão de ser de tal proibição (na segurança jurídica e no controlo democrático) da aplicação
da lei penal conseguiremos compreender a diferença entre interpretação extensiva e analogia.
O art.1º, nº3 do CP não proíbe expressamente a interpretação extensiva, no entanto não se poderá
interferir com a proibição da analgia in malam partem pelo nº3 do art.1º do CP a sua permissão num
raciocínio a contrario sensu – assim, a proibição da interpretação extensiva só poderá ser integrada no
art.1º, nº3 do CP por analogia com a própria proibição de analogia. No entanto no ordenamento jurídico
temos a seguinte solução:
• Segundo o art.11º do CC, a analogia apenas é proibida quanto às normas excecionais, que podem
no entanto ser alvo de interpretação extensiva.
• Ora, posto isto, impor uma limitação interpretativa mais ampla que a que está consagrada no
Código Civil só seria plausível se os princípios constitucionais do Direito Penal o impusessem –
o que não sucede, portanto na medida requerida pela reserva de lei e pela legalidade - sendo a
interpretação extensiva tida como a expressão do pensamento da lei, revelado pelos elementos
não literais da interpretação, não irá contender com estes princípios.
• Art.29º, nº3 da CRP: não seria legítimo de igual modo extrair da expressa cominação legal das
penas e das medidas de segurança, a proibição da interpretação extensiva – pode entender-se que
esta corresponde a um pensamento expresso, embora imperfeitamente.
Sousa e Brito: entende que a interpretação extensiva é inconstitucional porque sustenta que entre o
sentido possível das palavras e o mínimo de correspondência verbal existe uma grande distância a ser
percorrida incompatível com a segurança jurídica e com o princípio da legalidade
Castanheira Neves: nega neste sentido que a distância entre o sentido possível das palavras e o mínimo
de correspondência verbal exista uma distância significativa, não havendo sensível diferença.
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Posto isto, existem dois modos de abordagem – duas teorias – na resolução do problema suscitado quanto
à proibição da análgica e do cumprimento da legalidade:
Crítica (MFP): a perspectiva proposta por Castanheira Neves, converte o controlo da reserva de lei
(modelo democrático-parlamentar) num controlo institucional-jurisprudencial da lei penal, ultrapassando
a racionalidade democrática que está na origem da proibição da analogia. De forma fundamental a critica
pela professora reside no facto de o autor remeter a definição dos critérios de interpretacao da lei penal
para a decisão das instâncias menos diretamente controladas pelos cidadãos – a adequação sistemática
depende de redifenições atualizadas – que penas estão ao alcance das instâncias de discussão pública e
parlamentar. A unidade do direito que Castanheira Neves preconiza apenas é possível através de um juízo
de constitucionalidade que apenas pode ser efetuado pelo Tribunal Constitucional – a garantia
institucional apenas pode ser garantida por este.
Se a condição da descoberta da norma penal é essa, seria colocada em causa a questão da segurança
jurídica - para conseguir fazer uma interpretação lícita do Direito Penal, os critérios são demasiados
exigentes e pouco operativos.
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• Condições de validade
o Sentido comunicacional social – tem de ser cognoscível pelo resto da sociedade, e não
em qualquer sentido lógico não sustentável pela linguagem social;
o Contexto normativo da norma – o sentido do texto ou das palavras no texto jurídico e
não das palavras de forma isolada, sentido no conjunto onde a norma está inserida.
o Essência do proíbido - a interpretação permitida também resulta da teleologia da
norma em questão, que está relacionado com o bem jurídico que visa proteger – é a
adequação do texto de acordo com as valorações do sistema que a norma diretamente
exprime ou pretende exprimir.
Estas condições contribuem para a fixação do sentido jurídico definitivo do texto – para a
delimitação normativa que ele objetivamente revela.
➔ Os dois primeiros critérios vão de encontro à essência do proibido. Se estes três pressupostos
estiverem reunidos podemos realizar a interpretação, porque cabe dentro do sentido possível
das palavras, e caso algum destes falhe, então a interpretação permitida não irá operar,
colocando em causa a proibição da analogia (art.1º, nº3 do CP) colocando em causa o princípio
da legalidade (art.29º, nº1 e 3 da CRP).
➔ A vinculação ao texto normativo, preconizada por esta teoria positivista, irá redundar numa
rejeição da redução teleológica incriminadora – uma vez que também corresponde ao sentido
possível das palavras a sua utilização no sentido comunicacional mais amplo.
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Síntese:
• O texto jurídico destas normas não é pré-determinante, como sucede nas normas
incriminadoras.
• MFP: o recurso à analogia, desde que justificado pela necessidade de concretizações
diferentes das legalmente previstas, a partir dos princípios reguladores dos conflitos de
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
➔ Por outro lado, a analogia iuris, não será legítima em casos em que a norma permissiva – neste
sentido Cavaleiro de Ferreira – constituir um direito excecional e não direito geral.
o Analogia legis – aplica-se a uma norma que não regula uma situação jurídica a uma situação
qualitativamente similar à que foi regulada pela lei – proibida pelo art.1º, nº3 CP.
Limites à analogia:
• Regras excecionais – art.11º CC;
• As causas de exclusão de ilicitude não admitem analogia legis;
• Causas de exclusão da responsabilidade (causas de justificação, causas de exclusão de culpa);
• Cavaleiro Ferreira: causas de justificação de Direito Geral. Mas também há causas de
justificação excecionais (ex: art. 187º CP – excecionalmente autorizada para obter a prova de
facto a um elenco taxativo de crimes) relativamente às quais não é concebível a analogia porque
é uma intervenção em direitos alheios.
Em princípio qualquer analogia está proibida, mas em relação à legitima defesa deve ponderar-se
se não se deve criar outra figura de uma outra legitima defesa com pressupostos diferentes, mas
restritivos.
• MFP: Art. 32º do CP deve fazer-se interpretação restritiva (ou redução teleológica)
sobre a necessidade do meio – é mais restritiva que a interpretação comum da
necessidade do meio. A legitima defesa requer que seja meio menos gravoso para o
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
agressor, sem alternativa de meios, sustenta a própria necessidade de defesa em si. Não
se veda uma interpretação algo restritiva, eventualmente redução teleológica, desde que
seja a interpretação que coloca os requisitos da causa de justificação de acordo com o
seu princípio fundamentador - questão de ratio legis.
O princípio da legalidade tem como uma das suas máximas “nullum crimen, nulla poena sine
lege praevia”, que origina problemas complexos – proibição da retroatividade in malem partem,
isto é, contra o agente.
A proibição da retroatividade corresponde deste modo à garantia de que, o exercício do poder punitivo
seja exercido de acordo com critérios e limites conhecidos antecipadamente, cognoscíveis pelos cidadãos
em geral, e não alteráveis por força de um interesse particular, ou para resolver um caso concreto antes
não previsto.
o Incriminações;
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
Pressupostos da retroatividade:
Temos de realizar uma delimitação normativa – a retroatividade apenas existe se houver uma
sucessão de leis, um regime que entre em vigor que delimite a mesma situação típico-normativa
(continuidade típico-normativa).
Tal situação, segundo o art.3º do CP, é referida ao momento da efetiva prática da ação criminosa
ou ao momento em que se iria produzir a ação que evitaria o resultado típico – se a lei em causa for
anterior à da produção do resultado típico, mas posterior à prática da ação prevista, já existiria
retroatividade.
Não existe retroatividade se não existir esta continuidade típico-normativa (sucessão de leis),
portanto se o dever ser objetivo e a intenção normativa compreendidas a partir do texto não se puderem
concretizar naquelas situações.
Do art.3º conseguimos retirar, como solução para este tipo de problemas, que é decisivo para a
determinação do momento da prática do facto a conduta e não o resultado.
• Segundo o Professor Figueiredo Dias esta solução dada pela norma, é a que melhor se enquadra
com o principio da legalidade, uma vez que é no momento em que o agente atua (e nos casos de
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
omissão, deveria ter actuado) que se revela a função tutelar dos direitos, liberdades e garantias da
pessoa que constitui a razão de ser do princípio.
• Tanto se aplica para os autores como para os cúmplices, valendo esta solução para todos os
comparticipantes (art.26º e 27º) - são igualmente credores da proteção e garantia que o princípio
da legalidade oferece.
➔ Caso fosse o resultado o momento decisivo, iria abrir-se a porta ao arbítrio e ao possível
excesso de intervenção punitiva do Estado.
Exceções:
• Nos crimes de consumação: neste tipo de crimes a ação perdura no tempo, iniciando-se a
consumação a partir do início da ação, e a consumação perdura até ao último ato, de modo a
que uma alteração da lei penal ainda que agravante ocorrida enquanto a consumação não se
esgotou terá de ser aplicada a todo o comportamento punível – isto porque o agente manteve a
realização do comportamento após a entrada em vigor da lei nova, não sendo surpreendido pela
sua aplicação —> caso cesse o seu comportamento, poderá ser aplicada lei anterior.
• Nos crimes continuados: art.30º, nº2 e 79º do CP. Existe uma unificação de ações idênticas
suportadas por uma intenção criminosa continuada, no contexto de circunstâncias externas
favoráveis à renovação da vontade criminosa. Também nestas situações se irá justificar a
aplicação da lei nova mais gravosa, a todo o período de continuação criminosa.
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• Posto isto, para MFP apenas se justifica o levantamento da continuação nos seguintes
casos:
• A perigosidade do agente, entendida como sendo um sintoma, era vista como pressuposto e
fundamento da medida de segurança, pelo que não existiria qualquer retroatividade desde que a
lei criasse ou modificasse uma certa medida de segurança fosse contemporânea de um estado de
perigosidade que já era anterior e duradouro – enquanto existisse perigosidade no presente e
embora manifestada no passado não se poderia conceber uma verdadeira retroatividade da lei
que agravasse a medida.
• As medidas de segurança eram vistas como medidas de prevenção especial positiva, comandadas
pelo verdadeiro bem do agente.
Argumento: Existia a convicção de que a proibição de retroatividade se baseava no princípio da culpa,
pelo que o facto se assegurar finalidades preventivas das sanções penais não tinha de respeitar o
conhecimento to pelo agente da existência ou da medida da sanção
Presentemente, esta perspectiva foi totalmente refutada, apesar de ter influenciado o Direito alemão, é
refutada pela própria doutrina alemã e inclusive a que sustentou. No nosso ordenamento foi
decididamente afastada pelo art.29º, nº1 e 3 da nossa CRP e pelo art.2º do CP.
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➔ Esta tese vem defender que a proibição de retroatividade nas medidas de segurança seria executado
no momento da formulação pelo Tribunal do juízo da perigosidade “aplicando-se a lei vigente no
momento da formulação do juízo de perigosidade” – fundado no receio de que o agente venha a
cometer outros factos ilícitos típicos – determinando-se a lei a aplicar como sendo a lei vigente no
momento da decisão, por este corresponder ao preenchimento do pressuposto da perigosidade
criminal do agente.
➔ MFP: refuta esta teoria, dizendo que é uma redução teleológica do art.2º, nº1 do CP contra o
arguido. Iria quebrar-se a conexão entre os indícios de perigosidade com o pressuposto que é a
prática de um facto típico e ilícito – pelo que ao aceitarmos esta tese, estamos a admitir uma medida
de segurança para uma perigosidade desligada do facto típico e ilícito.
• Do art.5º, nº1 do CPP resulta a aplicabilidade imediata da nova lei processual penal – no entanto
o nº2 do mesmo artigo limita a sua aplicabilidade imediata:
➢ Aos processos iniciados anteriormente à sua vigência;
➢ Agravamento sensível da situação processual do arguido;
➢ Quebra de harmonia e unidade de vários atos do processo;
• O primeiro tipo de limites exclui a aplicabilidade imediata de todas as normas de processo penal
que não sejam puras normas processuais – possuindo uma natureza substantiva penal numa
conexão fundamentadora da responsabilidade do arguido.
Normas prescricionais:
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• É também de rejeitar a aplicação imediata da lei que transforme um crime particular ou semi-
público em público – isto porque o facto criminoso cometido no passado contra o qual não foi
deduzida queixa pelo particular possa vir a ser objeto de processo penal. A aplicação neste tipo de
casos deverá ser a aplicação da lei antiga, visto que não iria garantir (aplicação da LN) o princípio
da objetividade e vinculação ao Estado e ao seu Direito.
• Neste tipo de casos a solução afigura-se distinta, na medida me que o princípio do Estado de
Direito não será critério decisivo na solução jurídica na perspectiva do arguido, se dele
pretendermos extrair exclusivamente garantias de que o Estado se vincule ao seu Direito para não
agravar, arbitrária e de forma inesperada a posição do arguido – assim como a lógica da segurança
jurídica é insuficiente para a formação da decisão na lógica do arguido.
• A função do direito de queixa configura uma valia extraprocessual e extra-penal – não se justifica
a referência a normas que o regulam à ratio legis do art.5º, nº1 - a adaptação do processo a
soluções novas e eficientes, instrumental da realização da justiça.
• Assim, a lei da qual resultem alterações ao direito de queixa não é apenas uma lei penal no sentido
de Direito Penal, mas um conjunto de normas direta ou indiretamente incriminadora tendo como
meio de aplicação o processo penal.
Conclusão: os limites previstos no art.5º, nº2 do CPP referem-se a normas processuais das quais derive um
efeito essencial para a posição processual do arguido, na relação jurídica punitiva, na sua fase processual.
Ex: Direito de defesa.
Divergência:
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O acontece no processo, caso exista uma alteração a meio do processo para o professor Taipa de Carvalho
– o processo continua, assim como a investigação – mas o queixoso pode dizer que pode extinguir o
processo. O silêncio do titular do direito de queixa faz com que o processo continue a andar
Para MFP o processo para logo assim que seja decretada essa alteração e da-se um prazo ao titular do direito
de queixa para que o mesmo o exerça.
➔ Como limite não intrínseco à proibição da retroatividade, consagra-se nos art.29º, nº4 da CRP e
no art.2º, nº4 do CP a aplicação retroativa da lei mais favorável, como salvaguarda dos direitos,
liberdades e garantias das pessoas. Configura, neste sentido, mais do que uma mera exceção ao
princípio da legalidade, possui uma natureza autónoma diretamente decorrente do princípio da
necessidade.
Se a lei penal posterior suprimir uma norma incriminadora, será injusto que agentes que praticam factos
idênticos recebam um tratamento diferente, de punição ou não punição, conforme atos factos tenham sido
praticados antes ou depois da revogação da norma (LA). Se um crime deixar de o ser, é porque no ponto
de vista da prevenção geral não será necessário um tratamento diferenciado.
➔ O art.2º, nº2 do CP impõe que a revogação da norma incriminadora tenha como consequência a
extinção da pena ou do procedimento criminal sem quaisquer limitações.
➔ MFP: o art.29º, nº4 da CRP, sugere a aplicação da retroativa da lei penal mais favorável
podendo deter o trânsito em julgado na medida em que se faz referência à “lei penal mais
favorável ao arguido”. No entanto, a restrição pelo trânsito em julgado não se adequa ao
princípio da retroatividade in melius – porque por essa lógica, à luz de tal princípio, apenas se
justificaria por uma lógica exterior e estabilidade das instituições que executam as penas. A
referência a “arguido” não é sinónimo de “caso julgado” na medida em que após o “caso
julgado” a qualidade de arguido irá persistir ainda que o processo seja retroativo.
O problema que se coloca, é o facto de o art.29º, nº4 da CRP ter uma natureza análoga a esta
solução, ainda que se aceitasse uma interpretação restritiva da referência do preceito a “arguido”
– no art.2º do CP o princípio da aplicação retroativa da lei mais favorável consagra-se de um
modo mais amplo, não tendo suporte constitucional a restrição da garantia emanada por este
artigo.
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Assim, atualmente:
➔ O atual art.2º, nº4 do CP parte do princípio geral da aplicabilidade da lei mais favorável: prevê
a cessação da condenação e de todos os seus efeitos.
o Operatividade: logo que a parte da pena que se encontrar cumprida atinja o limite
máximo da pena prevista na lei posterior.
o No caso de se atingir o limite máximo existe de imediato a aplicação da lei penal, ope
legis, como tutelado pelo artigo.
o No caso se um regime mais favorável entrar em vigor antes de ter cessado a execução
da pena, terá de existir uma adaptação nos termos do art.371º-A do CPP. (Lacuna
preenchida).
o A aplicação retroativa da lei penal de conteúdo mais favorável impõe que seja
determinado o regime concreto mais favorável ao arguido, isto é, que se considere a
medida da pena mais favorável face a todas as causas de justificação, desculpa,
atenuação, agravarão ou precedibilidade.
A retroatividade in melius pressupõe que exista uma verdadeira sucessão de leis no tempo, pelo que a
sintomas penais sucessivas podem fundamentar a decisão dos mesmos casos embora de forma diversa –
para isto ocorrer tem de existir, necessariamente, uma continuidade típico-normativa – tem d existir uma
previsão da factualidade típica e idêntica relativamente a condutas humanas idênticas.
➔ Não haverá sucessão de leis no tempo se o comportamento que é objeto de juízo de ilicitude for
parcialmente reproduzido na lei posterior.
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O problema que se coloca na sucessão de leis, que é um pressuposto essencial da resolução de problemas
de substituição de punição de certos factos no âmbito penal, coloca-se em dois cenários:
• Houve alteração do regime punitivo ( ex: uma pena passa de 3 anos de prisão para 2 anos) –
aplicação do art.2º, nº4 do CP;
• Houve um fenómeno de descriminação – art.2º, nº2 do CP.
Situações especiais:
Neste sentido, é incorreto defender a extinção em absoluto da responsabilidade jurídica em tais situações,
quando não existir uma vontade expressa e coerente legislativa de extinção de toda a responsabilidade por
factos passados, porque se passa de ser considerado crime para ser convertido numa contra-ordenação,
não existe a vontade expressa de extinguir a responsabilidade.
o O objeto da proibição é um comportamento humano, idêntico na sua essencialidade na previsão
de diferentes normas – assegurando a unidade do facto e a continuidade normativa.
o Assim, não há qualquer entrave à aplicação da punição mais favorável.
• De forma semelhante pode também ocorrer a conversão de crime de perigo abstrato em crime
de perigo concreto, em que a LA dispensa prova efetiva do perigo para os bens jurídicos e a a
LN requerer tal prova
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
luz da LA não deixariam de ser punidos pela LN que tenha vindo a excluir o mero
perigo presumido, exigindo uma efetivação do perigo.
o Inversamente, a transformação de um crime de perigo concreto em crime de perigo
abstrato irá envolver uma ampliação da responsabilidade, mas os comportamentos de
perigo concreto serão incluídos no novo conjunto de factos por maioria de razão
➔ A aplicação no tempo da lei mais favorável nos termos do art.2º, nº4 do CP levará a que aplique
sempre a moldura penal mais favorável ao agente.
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• Por todas as razões referidas impõe-se uma única solução jurídica para este tipo de casos: a
atribuição de oportunidade para o exercício do direito de queixa – embora o seu fundamento não
decorra diretamente do art.29º, nº4 da CRP, mas sim dos princípios jurídicos que lhe subjazem –
a igualdade e a necessidade da pena e a proteção da confiança emenda do Estado de Direito
democrático.
• Assim, deve ser aplicada a lei nova e a proteção do exercício do direito de queixa.
2. Existe sucessão de leis no tempo? Critério da continuidade normativa – nas situações em que se
altera o elemento típico temos de aferir se essa alteração é especificadora ou especializadora.
• Especializadora: o legislador penal decidiu incorporar uma situação típica ex novo, um contexto
novo que não existia no crime —> vem valorar uma ocorrência que até então não tinha valor,
pelo que não pode ser aplicada. (Segurança jurídica)
o Não existe continuidade normativo-típica, não há sucessão de leis.
• Especificadora: quando essa alteração da descrição do comportamento proibido reside em
especificar a forma como queria punir um crime que já punia.
Leis intermédias:
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
vez que com a vigência da lei mais favorável (lei intermédia) o agente adquiriu uma posição
jurídica que deve ficar salvaguardada pela proibição da retroatividade da lei mais grave
posterior.
• O agente beneficia de uma lei mais favorável devido à ideia de autovinculação do estado, que
consta do art.2º do CP – o agente adquiriu uma expectativa jurídica de que vai beneficiar de uma
lei nova.
➔ A jurisprudência pronunciou-se neste sentido, pelo que deve entender-se que uma pena elevada
de multa (deverá considerar-se mais favorável) do que uma pena de prisão, ainda que leve.
➔ Quanto às restantes situações, deve aceitar-se que o juízo complexivo de maior ou menor favor
deve resultar da totalidade do regime a que o caso se submete.
Américo Taipa de Carvalho: se for mais favorável ao arguido, aplicar-se-á (será retroativa e,
simultaneamente, ultraativa).
• As leis temporárias consagram uma exceção ao princípio da aplicação da lei mais favorável –
consagrada do art.2º, nº3 do CP.
• O professor Figueiredo Dias realiza a seguinte distinção:
o Leis temporárias em sentido estrito – o período é adaptado pelo legislador em termos
de calendário ou em função de um estado de sítio ou de guerra;
o Leis temporárias em sentido amplo – aquele período se torna reconhecível em função
de certas circunstâncias temporais.
• É comum a lei cessar a sua vigência automaticamente uma vez decorrido o período de tempo
para a qual foi editada – o afastamento da aplicação da lei temporária apesar de favorável reside
no facto de não existir uma verdadeira continuidade típico-normativa (que seria a alteração de
uma concepção legislativa) mas sim uma alteração das circunstâncias fácticas – não existem
expectativas jurídicas que mereçam por este motivo ser tuteladas, e por outro lado as razões de
prevenção geral persistem.
• Deve realizar-se uma interpretação rigorosa daquilo que é uma lei temporária, e em caso de
dúvida fazer valer as regras de proibição de retroatividade e da aplicação da lei mais favorável
consoante o caso concreto.
• MFP: O art.2º, nº3 do CP não pode ultrapassar os preceitos constitucionais apenas apoiado na
prevalência da intenção legislativa quanto ao caráter temporário de uma lei, assim como o
legislador ordinário não pode legitimamente decretar que a retroatividade in melius não se aplica
quando descriminaliza, também a atribuição do caráter temporário de uma lei em situações que
subsista uma verdadeira sucessão de leis tem de ser disciplinada pelos princípios da igualdade e
necessidade da pena.
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Em situações de sucessão de leis de emergência a aplicação da lei retroativa mais favorável deve
impor-se sempre que persista como elemento constante do tipo incriminado a mesma situação de
excecionalidade.
Fora destes casos, a sucessão de leis de emergência cabe no art.2º, nº3 do CP.
Pode ocorrer que a lei que deveria ser aplicável (a mais favorável) venha posteriormente a ser declarada
inconstitucional – poderá uma lei inconstitucional ser ainda assim aplicável por ser mais favorável,
segundo o art.29º, nº4 da CRP ou outra norma constitucional?
➔ Segunda posição (Jorge Miranda) , preconiza que não será possível realizar uma interpretação
rígida do art.282º, nº1 da CRP tendo em conta o art.29º, nº4 CRP e o princípio do Estado de
Direito democrático assente na confiança —> por esta razão a lei mais favorável declarada
posteriormente inconstitucional deve ser aplicada, uma vez que foi esta que orientou o
comportamento do agente e o Estado vinculou através dela o comportamento dos destinatários.
Argumentos:
• Prevalência do princípio da igualdade subjacente ao art.29º, nº4 da CRP;
• Princípio do Estado de Direito, na vertente da vinculação que cria nos seus
destinatários;
• Princípio do Estado de Direito, na vertente de confiança depositada pelos destinatários
nas normais penais.
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Posição MFP - concorda com esta segunda posição, uma vez que não decorre de uma
verificação fictícia de erro sobre a ilicitude e a um mero recurso ao art.17º do CP para
deixar de punir o agente pela lei mais severa – no caso de não ser aplicável bastaria
apenas atenuar a pena de acordo com a lei inconstitucional mais favorável. No entanto
faz a ressalva de que.
- A proteção do caso julgado deve prevalecer sobre as consequências da declaração
de inconstitucionalidade, sendo apenas afastada pela exceção consagrada no nº3 ;
- Quanto à lacuna existente, deve ser integrada através da articulação dos
princípios por razões de igualdade, necessidade da lei penal e da confiança
inerente ao Estado de Direito, devendo abranger a situação não contemplada no
art.282º, nº1 da CRP – a aplicação da lei penal mais favorável.
Síntese:
1. Determinar o que vamos designar o momento da prática do facto – tempus delictum ou delicti
(qual era a lei em vigor no momento da prática do facto) art.3º/1 do CP – critério do momento
da prática do facto e não do resultado; (importa apontar o momento temporal em que o agente
agiu), é no momento em que a pessoa atua que ela tem de atuar conforme o direito – desvalor da
ação e do resultado podem não coincidir no tempo — o agente apenas tem controlo absoluto
sobre o desvalor da ação – o desvalor do resultado não é controlável, é no momento da conduta
que tem que se exigir que cumpra a lei - critério unilateral da conduta.
2. Existem leis novas depois do momento da prática do facto? Temos de determinar se existe
sucessão de leis penais no tempo. A sucessão de leis penais no tempo só vai acontecer quando a
LN vai regular a mesma situação jurídico penal da LA. É necessário que exista uma
continuidade normativa e típica - a nova legislação tem que conter normas que regulem a
mesma realidade típica - a forma como são descritos os comportamentos proibidos pela norma
penal.
3. Se não há sucessão de leis penais no tempo não há duvidas, continua-se a aplicar a LA.
Havendo lei temos de avaliar o seguinte, no caso em concreto:
• A lei é mais favorável ao agente; (o que é mais favorável aquele agente em concreto – uma LN
que seja favorável ao A pode ser desfavorável ao B – dependendo do caso concreto)
• A lei é desfavorável ao agente.
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4. Concluir: aplica-se a LN ou a LA, a concreta solução do caso tem que culminar com a
disposição legal aplicável – interpretar o art.29º, nº1 e 4 CRP (que segmento do art.29º se
aplica) e o art.2º do CP – 2º, nº2 e 2º, nº4.
• Art. 2º, nº2 CP: trata dos casos de descriminalização eliminando do catálogo de crimes aquele.
• Art.2º, nº4 CP: Não elimina o crime mas altera a forma como o mesmo é redigido – a descrição
da ação que se quer punir, mexe com a pena aplicável (sendo mais pesada ou mais leve)
consoante o juízo de favorabilidade.
Notas:
• RETROATIVIDADE: aplica-se a lei atual a factos anteriores.
• ULTRA-ATIVIDADE: aplica-se a lei depois de estar revogada.
Existe uma necessidade de coexistência espacial de diversas ordens jurídicas, que configura uma
limitação natural do desenvolvimento absoluto dos princípios – no Direito Penal de um Estado, a
territorialidade tende a ser o critério básico da validade espacial da lei penal, condicionado uma
determinada apetência pela universalidade – preocupações com questões de previsibilidade e de
segurança, e razões de Direito Internacional.
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• Há que distinguir o Direito Internacional Penal (âmbito de validade especial) do Direito Penal
português fora do território do Estado – corresponde à aplicabilidade com relevância
internacional (atingindo factos cometidos no estrangeiro) do Direito interno ao Direito Penal
Internacional.
➔ Exceções:
• Seja qual for a nacionalidade do agente e salvo convenção em contrário, o facto que seja
praticado em território português – dependendo de limitações de território e o que seja entendido
por praticar um facto em território português – pelo que temos:
• Território português (art.5º, nº1 e 2 da Lei Constitucional nº1/89): inclui o espaço terrestre, aéreo
e marítimo, sendo ainda território português os navios e as aeronaves portuguesas – princípio do
pavilhão (art.4º, alínea b do CP)) destinado a resolver conflitos negativos de competência;
• A lei penal portuguesa é também aplicável aos crimes cometidos em aeronaves estrangeiras –
remissão para a Lei nº254/2003 e o DL nº208/2004 de 19 de agosto art.2º e 3º e crimes
decorrentes do art.4º do mesmo diploma.
• Princípio especial – art.5º - em determinadas circunstâncias a lei portuguesa pode aplicar-se
fora do território português, que consagra o princípio da administração supletiva da justiça penal
em que a lei portuguesa passa a ter competência para conhecer dos factos que não se
encontrando sujeitos às regras já referidas, foram praticados no estrangeiro por estrangeiros que
se encontram em Portugal – cuja extradição sendo requerida não pode ser concedida.
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Figueiredo Dias:
A confirmação do sistema estadual de aplicação da lei penal do espaço baseia-se em diversos princípios e
num certo modelo:
➔ A generalidade dos sistemas legislativos penais tem adotado como princípio basilar o princípio
da territorialidade e não o da nacionalidade, sendo a posição do Direito Penal português.
• Argumentos:
• Deve ser na sede do delito que mais se deve fazer sentir as necessidades de punição e de
cumprimento das suas finalidades à luz das exigências da prevenção geral positiva – é a
comunidade onde o facto foi praticado, que viu a sua paz jurídica perturbada e que
exige por este motivo a sua confiança no ordenamento jurídico (razões substantivas) e
também porque o lugar do facto é aquele onde melhor se pode investigá-lo e fazer a sua
prova, consequentemente existem expectativas mais fundamentadas de que se possa
obter uma decisão justa (razão processual).
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A ação e o resultado
• O legislador penal teve de recorrer a esta dualidade, o chamando princípio da ubiquidade (MFP)
em que basta que um destes dois elementos essenciais se manifeste em território português para
que a lei portuguesa possa ser aplicável —> manifestação da soberania do Estado português
através do seu poder punitivo, ampliando o âmbito de aplicação da lei penal portuguesa.
• A doutrina recorreu a uma solução mista ou plurilateral (FD) para determinar o local da prática
do facto, ao inverso do que sucede com a determinação do tempus delicti.
• Decorre do princípio da territorialidade que a lei penal portuguesa é aplicável a factos praticados
em território português seja qual for a nacionalidade do agente, tornando-se indispensável
determinar o local onde o facto foi praticado – locus delicti.
O critério da lei penal definido para aferir o lugar da prática do facto, baseado no objetivo do máximo
alcance da soberania da soberania punitiva do Estado seja diverso do que se estabelece para o momento
da prática do facto (art.3º CP) orientado pelo princípio da legalidade.
• MFP: A lei portuguesa não poderá ser aplicada apesar de o resultado típico em território
português quando por por força do critério de aplicação no tempo o facto não seja punível por
não estar previsto em lei anterior à realização da ação em território estrangeiro.
• Os critérios dos art.2º e 3º do CP derivados do art.29º, nº1 da CRP aplicam-se independente do
princípio da ubiquidade que estabelece o âmbito da validade espacial da lei penal portuguesa, a
sua aplicação não fica comprometida.
• Exemplo:
Uma sucessão de leis no tempo, em que o resultado seja produzido em território
português num momento em que passou a vigorar uma lei que vem a punir o facto,
quando no momento em que o mesmo foi praticado no estrangeiro não era punido em
Portugal.
- O art.7º do CP determina ainda assim, a aplicabilidade ao facto da lei penal
portuguesa, embora nos termos do art.2º, nº1 do CP e art.29º, nº1 CRP o facto não
possa ser punido —> proibição de retroatividade in pejus.
- A aplicação da lei penal nos termos do art.4º e 7º do CP não dispensa a observância
de todos os princípios a que a mesma de subordina – aplicação no tempo e proibição de
analogia.
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➔ O art.7º basta-se com a tentativa inacabada, mas já não com a prática de atos preparatórios não
puníeis (art.21º e 22º do CP) para a definição do lugar da prática do facto – deixou de ser
discutível se a mera possibilidade da ocorrência do dano (entendido como lesão do bem jurídico,
autónoma da verificação do evento típico ou do resultado) em território português será suficiente
para a aplicação da lei penal portuguesa ao facto – depois da revisão do CP de 1998 passou a
estar legalmente previsto que nos casos de tentativa o facto deverá considerar-se igualmente
praticado no lugar em que de acordo com a representação do agente o resultado se deveria ter
produzido.
➔ A doutrina penal tem entendido que tentativa é crime de perigo concreto e os crimes de perigo
concreto são crimes de resultado portanto, fará todo o sentido que caiba no âmbito do art.7º do
CP a mera possibilidade da ocorrência do resultado em território português ainda que a ação
criminosa se desenrole no estrangeiro —> a possibilidade do resultado se desencadear em
território português será abrangida pela norma (MFP)
➔ O perigo afronta a Ordem Jurídica e coloca em causa a segurança dos bens e a confiança no
Direito, clamando pela soberania punitiva do Estado do mesmo modo que sucede com a ação e o
resultado.
• Pode ainda ocorrer situações em que, a mera ocorrência do dano (lesão do bem jurídico) sem
que o resultado típico se verifique em Portugal permite considerar praticado em território
português o facto.
• Exemplo dado no manual: Alguém profere no estrangeiro difamação perante terceiros contra
pessoa vivendo em Portugal, poder-se-á afirmar que o facto foi praticado em Portugal
considerando que apenas a lesão da honra tem conexão com uma pessoa que vive em território
português e o resultado típico se verificou no estrangeiro?
Neste caso, o art.7º apenas poderia abranger o dano através de uma analogia incriminadora, que
se encontra proibida pelo art.1º, nº3 do CP – (MFP) resposta negativa na medida em que o
dano nunca é uma lesão ideal do bem jurídico totalmente desligada de um certo evento
contraponível e imputável à ação típica. O resultado típico pode corresponder a uma fase menos
concretizada e avançada da lesão do bem jurídico, pelo que todo o dano pressupõe nos crimes de
resultado uma manutenção do resultado típico ou a sua intensificação – o primeiro momento não
afasta a conexão com a ordem jurídica portuguesa, porque se pressupõe uma intensificação ou
desenvolvimento do evento típico.
• A revisão do CP de 1998 veio ainda prever uma alteração muito significativa nos casos em que o
resultado típico ou o resultado não compreendido no tipo de crime se tiver produzido em
território nacional. São os casos de crimes de perigo comum (art.272º e ss do CP) ou de crimes
de falsificação (art.255º e ss do CP) – também o resultado material que já não é necessário para
a consumação continua a ser relevante para a determinação do lugar da prática do crime.
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
Figueiredo Dias:
Assim, a revisão do CP de 1998 veio aditar duas novas conexões ao art.7º que já não seriam exigidas pela
solução plurilateral (princípio da ubiquidade para MFP):
1. O local onde se produziu o resultado não compreendido no tipo de crime: diz respeito aos
crimes tipicamente formais mas substancialmente materiais, que atingem a sua consumação
típica antes de se ter verificado a lesão que a lei pretende evitar, garantido-se uma tutela
antecipada do bem jurídico;
- Exemplo: Fraude na obtenção de crédito punido segundo o art.38º do DL 28/84 que consuma a
prática da conduta fraudulenta independentemente da efetiva obtenção do crédito;
- No caso se embriaguez e intoxicação (art.295º CP): caso a autocolocação em estado de
inimputabilidade tiver ocorrido no estrangeiro e a condição objetiva de punibilidade (prática do
facto ilícito típico) ocorrer em Portugal – a lei portuguesa será competente.
2. Em caso de tentativa, o local onde se deveria ter produzido de acordo com a representação do
agente: o art.7º, nº2 do CP acrescentou uma nova inovação quanto aos critérios de determinação
do locus delicti – o local do facto é, em caso de tentativa, o local onde o resultado deveria
ocorrer segundo a representação do agente.
- Exemplo: cai sob a alçada da lei portuguesa o envio por um agente de uma carta armadilhada a
explodir em Portugal e com o intuito de matar um cidadão aqui residente que, todavia, é
desativada pelas autoridades de um Estado estrangeiro: caso a carta penetra-se o território
português existe uma parcela iter criminis que decorre do território nacional, pelo que à luz do
princípio da territorialidade fundaria desde logo a competência portuguesa, podendo caso isso
não ocorresse ser fundamentada com base em regras de nacionalidade passiva e da proteção dos
interesses nacionais - concluindo, a lei portuguesa limita a competência da lei nacional aos
casos em que a infração já configura uma tentativa.
A territorialidade da lei penal não permite estabelecer de forma exaustiva a conexão entre o poder
punitivo e a defesa de bens jurídicos essenciais à preservação de certas condições essenciais da
organização e da segurança da sociedade – sempre que ocorram lesões de bens jurídicos exteriores ao
território português por se destinarem a lesar os bens jurídicos deste, ainda que praticados os factos no
estrangeiro.
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
(art.262º a 271º), crimes contra a segurança do Estado e contra a realização do Estado de Direito
(art.308º a 321º e art.325º a 345º respetivamente).
• A revisão do CP de 1995 introduziu os crimes de burla informática, o que enfatiza a
extraterritorialidade cada vez mais presente em diversos tipos de crimes tendo em conta o
desenvolvimento das novas realidades de comunicação e informática – delimitação do âmbito do
poder punitivo dos Estados menos vinculada ao território – em que o espaço comunicacional se
introduz como nova fronteira do poder punitivo dos Estados.
• Todavia, crimes ainda mais graves que a burla informática não são contemplados (Lei nº 109/91
de 17 de agosto).
Em suma: o princípio encontra-se consagrado no art.5º, nº1, al a) do CP, sendo o conjunto de crimes que
tutelam interesses próprios da soberania e do Estado português, pelo que os bens jurídicos em causa têm
de ser protegidos pelo Estado – não existem mais países que protejam os bens jurídicos- soberania do
Estado português. Apenas é aplicável quando esteja em causa algum dos crimes que constam do referido
artigo na sua alínea a).
Consagrado no art.5º, nº1, al c) do CP, o princípio da universalidade segundo o qual a validade espacial
penal portuguesa é delimitada pela necessidade de cooperação do Estado português na proteção penal de
bens da humanidade de valor universal.
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
• Destina-se a permitir a aplicação da lei penal portuguesa a factos cometidos no estrangeiro que
atentam contra bens jurídicos que carecem de proteção internacional ou que, de qualquer modo,
o Estado português se vinculou internacionalmente a proteger.
• O princípio deve valer independentemente da sedes delicti e da nacionalidade do agente – não se
tratando de permitir a cada Estado a intervenção penal relativamente a todo e qualquer facto
considerado crime pela sua lei interna, o que seria fomentador de conflitos internacionais de
caráter jurídico-penal – mas sim, de reconhecimento do caráter supranacional de determinados
bens jurídicos que merecem tutela universal (uma proteção a nível mundial).
• Jescheck – “luta contra a delinquência internacional perigosa”.
➔ Os art.5º, nº1/ c) e d) do CP ordenam a aplicação da lei penal portuguesa aos seguintes crimes
que visam tutelar bens jurídicos que carecem de proteção internacional:
• Art.5º, nº1/ c):
o Mutilação genital feminina (art.144º. -A CP);
o Tráfico de órgãos humanos (art.144º. -B CP);
o Casamento forçado (art.154º. -B CP);
o Atos preparatórios (art.154º.-C CP);
o Escravidão (art.159º CP);
o Tráfico de pessoas (art.160º CP);
o Rapto (art.161º CP);
o Abuso sexual de crianças (art.171º CP);
o Abuso sexual de menores dependentes (art.172º CP)
o Etc. (referidos no artigo)
• A aplicação da lei penal portuguesa nas referidas hipóteses está sujeita a uma dupla
condição:
o O agente seja encontrado em Portugal;
o Não possa ser extraditado ou em entregue em resultado de execução de
mandato de detenção europeu ou de outro instrumento de cooperação
internacional que vincule o Estado Português.
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Tais limitações aos olhos de Figueiredo Dias são compreensíveis, sendo apenas colocada a questão de
saber se quanto à segunda condição ela vale para o caso em que a extradição/entrega foi requerida mas
não pode ser concedida ou se vale também para os casos em que nem foi requerida.
Solução: a interpretação mais ampla parece ser imposta pela teleologia específica do princípio
da universalidade. A redação da al f) parece reforçar este entendimento uma vez que o legislador fez
questão de especificar que a competência da lei portuguesa no caso aí previsto depende da concreta
existência de um pedido de extradição que não pode ser atendido (ao contrario do que sucede nas al c) e
d) ).
Os crimes contra a humanidade apesar de não se integrarem na previsão da al c) do art.5º do CP,
seguem um critério universalista nos termos da Lei nº31/2004 de 22 de Julho nos termos do art.5º do
mesmo diploma – o âmbito das duas normas é bastante semelhante, com exceção do último caso em que
existe um critério de mera oportunidade quanto à não entrega ao Tribunal Penal Internacional - “desde
que o agente seja encontrado em Portugal e não possa ser extraditado ou seja decidida a sua não entrega
ao Tribunal Penal Internacional”.
➔ Por fim, a fonte do princípio da universalidade pode ser o direito internacional convencional a
que Portugal se tenha obrigado – neste sentido dispõe o art.5º, nº2 do CP. Casos exemplares da
aplicação do princípio com esta fonte: casos de luta internacional contra a pirataria aérea,
terrorismo, tráfico de droga, falsificação de moeda, etc.
Fundamentos:
• Nacionalidade ativa: vínculo dos cidadãos portugueses à soberania punitiva do seu próprio
Estado;
• Nacionalidade passiva: dever do Estado português conceder proteção aos bens jurídicos de que
os cidadãos portugueses sejam titulares ainda que no estrangeiro.
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
1. A aplicação da lei penal portuguesa pressupõe um mínimo de respeito pelas expectativas dos
agentes envolvidos e pelo sentido do desvalor (ílicito) das suas condutas praticadas no
estrangeiro, bem como pela igualdade entre aqueles agentes e os estrangeiros que a lei penal
portuguesa nao possa abranger – os agentes terão de ser puníveis pela legislação do lugar em
que os factos foram praticados – locus delicti.
2. Os agentes terão de ser encontrados em território português e não poderão ser extraditados
ou entregues a outro título incluindo os casos em que essa situação dependa de uma decisão
do Estado português —> nesta condição estamos perante uma situação em que o Estado
português pode punir os agentes por razões materiais e jurídico-constitucionais. Não terá
apenas as possibilidades materiais de os punir com presença em território português como
também por força dos art.33º, nº1, 2 e 3 da CRP estará colocado numa posição em que só ele
possa punir ou em que exista a possibilidade legal de ser o Estado Português a punir e assim
seja decidido.
A alínea b) do nº1 do art.5º alarga o poder punitivo do Estado português às situações em que os
factos no estrangeiro contra portugueses, sem que o requisito da punibilidade pela legislação do
lugar se verifique, desde que tais agentes vivam habitualmente em Portugal ao tempo da prática
desses factos e aqui sejam encontrados —> serve precisamente para evitar as situações em que
os agentes praticam factos no estrangeiro na expectativa de escaparem ao poder punitivo do
Estado português, sem que, no entanto, estejam determinados pela irrelevância penal das suas
condutas, não tendo cabimento assegurar expectativas ou proteger a igualdade entre estes agentes
e os estrangeiros.
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➔ A interpretação do art.5º, nº1 al e) suscita algumas questões que terão de ser resolvidas segundo
a ratio legis e com o próprio teor do princípio da nacionalidade.
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crimes contra portugueses, sem o recurso a analogia. O aborto, previsto no art.140º, nº2
do CP, “feto” parece não ser, no sentido normal das palavras um cidadão português.
o O aborto consentido proibido tem como objetivo a ação típica o próprio feto e o bem
jurídico protegido é a vida intra-uterina, sendo os interesses da sociedade portuguesa
como um todo, como qualquer outro crime, que são afetados.
o O bem jurídico sendo a vida intra-uterina de um futuro cidadão português é um bem
cuja tutela penal tem de ser justificada por um interesse objetivo da sociedade.
o Não existe neste caso necessidade de recorrer à analogia entre o conceito feto e cidadão
português uma vez que é possível determinar através de uma interpretação sistemática o
sujeito passivo do crime a toda a sociedade – a todos os portugueses – não estamos
portanto perante uma analogia proibida.
➔ O art.6º, nº2 do CP consagra uma restrição à aplicação da lei penal portuguesa menos favorável
nos casos em que esta seja aplicada por força dos princípios da universalidade e da nacionalidade
– quando não estejam em causa os princípios da territorialidade e da defesa dos interesses
nacionais (art.6º, nº1 e 3 CP) e sempre que o agente encontrado em território nacional não tiver
sido julgado no país da prática do facto ou se houver subtraído ao cumprimento tal ou parcial da
condenação.
➔ Esta restrição é explicitamente excluída, porém existem exceções:
o Estejam em causa crimes de terrorismo (organização terrorista) - art.8º, nº2
relativamente aos crimes de organização terrorista e de terrorismo previstos nos art.2º e
3º da Lei nº52/2003.
o Nos crimes de violação do Direito Internacional Humanitário previstos na Lei nº
31/2004 nos termos do art.5º, nº2.
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Tendo em conta a gravidade dos crimes e o facto de o Estado Português se assumir como
representante da comunidade internacional, não apenas para cobrir lacunas de punibilidade mas
sim de um modo proativo nestes casos não se aplica a lei estrangeira mais favorável.
➔ Tal restrição consiste na exigência de naqueles casos ser aplicada a lei do país em que o facto
tiver sido praticado sempre que aquela for concretamente mais favorável ao agente – art.6º, nº2
CP.
Fundamento:
• Conjugação da subsidiariedade do exercício do poder punitivo do Estado Português nestes casos
com:
o Princípio da culpa;
o Princípio da Igualdade;
o Princípio da necessidade da pena;
o Princípio da segurança jurídica.
Nas situações referidas o Estado pune porque outro Estado não pôde punir, mas não deixa de conceber a
punição de acordo com os seus princípios constitucionais.
➔ A punição pelo Direito português em termos mais graves não iria garantir uma adequação da
consciência da ilicitude do agente ao desvalor da ação e à gravidade do ilícito para ele previsível
– o agente orientou a sua conduta num determinado sentido, pelo que não teria a mesma
concepção do ilícito nem das consequências da sua conduta.
O princípio da aplicação da lei estrangeira mais favorável não abrange as al a) e b) do nº1 do art.5º - o
poder punitivo do Estado nestas condições não é subsidiário.
➔ O art.6º pressupõe que o facto seja punível em país estrangeiro, contrariamente ao art.5º, nº1 al
a) e b) se baseiam em que o facto não seja punível no território em que é praticado nem em
abstrato nem em concreto ou ser menos gravemente punível.
➔ Também a circunstâncias de o art.5º, nº1 alínea e), ii) ter sido interpretado com referência à
aplicação da lei penal mais favorável, fazendo uma interpretação da punibilidade pela legislação
estrangeira no sentido de punibilidade em concreto, não contende com a subtração ao princípio
referida no art.5º, nº1 al b), uma vez que estes casos previstos não são por natureza comparáveis
em termos de igualdade e necessidade aos factos semelhantes cometidos por estrangeiros no
respetivo país.
➔ A subtração ao princípio da lei mais favorável também se prevê, nos casos de terrorismo (art.8º,
nº2 relativamente aos crimes de organização terrorista e de terrorismo previstos no art.2º e 4º da
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Lei nº 52/2003 e nos crimes de violação do Direito Internacional Humanitário previstos na Lei nº
31/2004 nos termos do art.5º, nº2.
➔ Dada a gravidade dos crimes e o facto de o Estado Português se assumir como representante da
comunidade internacional de modo proativo e não meramente para cobrir lacunas de
punibilidade não se justifica a aplicação da lei estrangeira mais favorável.
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o A proteção mais absoluta do non bis in idem em situações em que não haveria qualquer
acordo internacional sobre a eficácia das sentenças estrangeiras não é exigível pela CRP
– desde que o novo julgamento preconizado esteja contido nos seis estimulados pelo
chamado princípio do desconto – isto quer dizer, desde que a pena já cumprida seja
efetivamente descontada na nova condenação (art.82º do CP)
o O princípio non bis in idem atinge em absoluto um efeito impeditivo de dupla punição
mas não um efeito impeditivo de repetição do julgamento realizado em país estrangeiro.
o O art.6º, nº2 estabelece um mecanismo de conversão da pena aplicável ao que
corresponder no sistema português, ou que a lei portuguesa previr o facto. Tal sistema
refere-se à aplicação de do Direito Penal estrangeiro em sentença proferida por tribunais
portugueses como também à revisão e à confirmação de sentença penal estrangeira
pelos tribunais portugueses.
o A conversão é não só decorrência de um princípio de praticabilidade como também a
emanação dos princípios da necessidade da pena (apenas a pena correspondente é
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
necessária) e non bis in idem (a pena aplicável nunca poderá, pela conversão, vir a
impor uma espécie de segunda punição ou qualquer punição mais gravosa).
o É à luz destes princípios a conversão em concreto deve realizar-se, pelo que caso se
imponha uma pena não privativa da liberdade não se converta numa pena de prisão – se
a lei penal estrangeira previr uma pena pecuniária para o facto, terá que ser aplicada
multa de medida correspondente. Mas se a pena estabelecida no estrangeiro for uma
pena não privativa da liberdade e não pecuniária a pena corresponde só poderá ser uma
pena igualmente não privativa de liberdade e não pecuniária.
A cooperação judiciária internacional suscita diversas questões quanto aos limites de aplicação da lei no
espaço, existindo duas situações que interferem com a aplicação da lei penal portuguesa a factos
praticados fora por estrangeiros ou portugueses:
• Impedimentos para extraditar certos agentes por razões legais e constitucionais – art.33º, nº3, 4
e 6 CRP;
• O dever de julgar nos casos em que não se possa extraditar ou se tenha decidido não o fazer –
princípio aut dedere aut judicare – consagra a não extradição ou entrega a título por motivos
políticos – art.33º, nº 6 CRP, e art.7º, nº1, al a) da Lei nº144/99 de 31 de agosto.
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• Quanto ao segundo princípio também são abrangidas infrações conexas segundo as “concepções
do direito português – art. 7º, nº1, al a) da Lei nº144/99.
• Entre o art.33º, nº6 e o art.7º, nº1 da Lei nº144/99 não existe uma total correspondência (MFP),
uma vez que a Constituição refere a não extradição a qualquer título por motivos políticos, a lei
por outro lado utiliza a natureza política como critério – apelando a um critério objetivo – a
natureza política, deste modo, estaria relacionada com a atividade dos titulares de cargos
políticos.
• O problema surge pela seguinte razão – a Constituição pretende evitar que a extradição seja
manipulada por razões de mera perseguição política, pelo que à luz da constituição parece dar-
se primazia à motivação, independentemente de qualquer natureza objetiva dos crimes.
• A Lei de cooperação judiciária internacional apesar de ser mais ampla, consagra uma mera
natureza objetiva em função da atividade dos agentes dos crimes – o que uma interpretação
muito estrita dos crimes de natureza política seria violadora da Constituição – o que permitiria
que fosse concedida a extradição sempre que os crimes, apesar de não terem natureza política,
pudessem constituir pretexto para uma perseguição política.
• Assim, MFP, diz que devemos interpretar o art.7º, nº1, al a) de a “natureza política” ser
considerada como um indício objetivo impeditivo de uma excessiva subjetivação da qualificação
da motivação política – mas não restringindo o critério a um tipo de crimes.
• O art.7º da Lei nº144/99 exclui crimes como o genocídio, contra a humanidade, de guerra e
terrorismo do conceito de crimes de natureza política – a CRP não faz qualquer exclusão de tais
tipos de crimes – no entanto, a dimensão da proteção dos direitos humanos e da lesão de bens da
comunidade internacional como um todo, afastará, uma interpretação no sentido de natureza
política desses crimes, pelo que não colocam em causa a previsão constitucional.
• No entanto, o art.7º, nº1, al d) da mesma lei prevê a possibilidade de uma convenção retirar
natureza política a certos crimes – o que vai contra a letra da Constituição – ultrapassando o seu
espírito na medida em que possa ser retirada a natureza política, por convenção, a crimes em que
a extradição seja requerida por motivação política sem que a natureza objetiva dos factos
criminosos justifique que se retire tal natureza política dos mesmos.
O princípio da não extradição por crimes a que corresponda a pena de morte ou a lesão irreversível da
integridade física
➔ Segundo o Direito do Estado requisitante, está vedada a possibilidade de extradição por crimes
correspondentes aos referidos, decorrente do art.33º, nº6 da CRP e o art.6º, alínea e) da Lei
nº144/99.
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➔ Este princípio não admite qualquer flexibilidade na sua interpretação, pelo que caso o país
requisitante dê alguma garantia política concreta de que tais penas não se aplicarão, não será
ainda assim possível a extradição por força deste princípio.
➔ No entanto o art.6º, nº2 al a) admite a cooperação se o Estado que formular o pedido por acto
irrevogável e vinculativo para com os seus tribunais, comutar a pena de morte ou outra de que
possa resultar a lesão irreversível da integridade física.
O princípio da restrição da extradição por crimes a que corresponda pena ou medida de segurança
privativa ou restritiva da liberdade com caráter perpétuo ou de duração indefinida
➔ Assim, o sentido do texto corresponde à exigência de que seja realizado um acordo entre o
Estado português e o outro Estado em matéria de extradição (não necessariamente bilateral,
poderá ser multilateral) que contemple como condição as garantias constitucionais de não
aplicação da prisão perpétua
➔ A interpretação de que seriam garantias diplomáticas ad hoc não resulta da norma constitucional.
Para além dos princípios de matriz constitucional já enumerados anteriormente, a Lei nº144/99 estabelece
critérios gerais quanto à cooperação judiciária internacional em matéria penal:
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Princípio da reciprocidade
➔ Prevista no art.4º da Lei nº144/99, como sendo um princípio geral – no entanto não obsta a
que, caso não se verifique a reciprocidade, não possa existir cooperação em razão de política
criminal – prevenção geral, prevenção especial e a própria proteção dos cidadãos portugueses
(art.4º, nº3):
“ A falta de reciprocidade não impede a satisfação de um pedido de cooperação desde que essa
cooperação:
a) Se mostre aconselhável em razão da natureza do facto ou da necessidade de lutar contra
certas formas graves de criminalidade;
b) Possa contribuir para melhorar a situação do arguido ou para a sua reinserção social;
c) Sirva para esclarecer factos imputados a um cidadão português.”
Regra da especialidade
o Extradição passiva – regra semelhante implica que não possa a pessoa extraditada
sofrer qualquer intervenção processual por facto distinto daquele que determinou o
pedido de cooperação, anterior à sua saída do território português (art.16, nº2), devendo
ser prestada uma garantia de que assim o será pelo Estado requisitante (art.16, nº3).
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➔ As garantias exigíveis para a extradição (art.6º, nº2, al b)) foram objeto de fiscalização da
constitucionalidade pelo Acórdão do TC nº1/2001 – que analisou a alínea a) acabou por analisar
a alínea b) – referindo a sua compatibilidade com a CRP – em que se chegou à conclusão de
que o género de limites existem qualquer que seja o modo de definição de um direito na
Constituição, resultando da existência de outros direitos ou bases, igualmente reconhecidos na
CRP e que em certas circunstâncias entram em conflito.
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o Com o Tratado de Maastricht em 1992, para além da União económica foram instituídos mais
dois pilares da construção europeia – o segundo que respeita à Política Europeia e o terceiro que
corresponde à Justiça e Assuntos internos.
o Depois da consolidação com o Tratado de Lisboa que reforçou os poderes dos orgãos
comunitários e lançou as bases para uma política cidadania europeia foi consolidado o mandato
de detenção europeu em Portugal através da Lei nº65/2003 que constitui o principal instrumento
de cooperação judiciária na UE, permitindo a detenção e entrega por um Estado a outro Estado
de pessoas procuradas para efeitos de procedimento criminal ou cumprimento da pena (incluindo
cidadãos nacionais) – com base no princípio de reconhecimento mútuo.
➔ Este mecanismo dispensa a verificação de dupla incriminação (pelo Estado que emite e pelo
Estado que executa o mandato). O catálogo de crimes (art.2º, nº2):
o Organização criminosa;
o Terrorismo;
o Homicídio;
o Tráfico de pessoas;
o Drogas;
o Armas e viaturas;
o Exploração sexual de crianças;
o Corrupção e branqueamento;
o Entre outros.
A sua aplicação também aporta as suas dificuldades, como por exemplo o TC alemão que já
julgou inconstitucional por mais de uma vez, por violação dos princípios da proteção de nacionais e pela
legalidade.
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No entanto, tem uma utilização bastante recorrente e o seu modelo inspirou o surgimento do
mandato de obtenção de provas: através deste, os Estados conseguem solicitar entre si, para efeitos de
utilização num processo, a apreensão e a preservação de meios de prova obtidos no território de cada um.
4. Afastamento das garantias constitucionais do art.33º, nº4 quanto às garantias exigíveis nos
casos em que corresponda a pena de prisão perpétua ou de duração indefinida. Neste instrumento
basta a garantia de:
o Estar previsto no Estado a emissão de uma revisão da pena a pedido;
o Revisão obrigatória quando passarem 20 anos (no caso de não ter existido pedido);
o Medidas de clemência com vista a que tal pena não venha a ser executado – art.13º, nº1
al a).
o Atenção: sempre em conformidade com o art.33º, nº5 CRP. A única objeção que se
pode colocar segundo MFP seria a eventual ultrapassagem dos limites da revisão
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
O problema que se coloca no plano constitucional segundo MFP, prende-se com o facto de que os
objetivos da cooperação internacional na construção de uma união jurídica europeia de possam sobrepor à
concepção constitucional dos direitos, liberdades e garantias.
A conversão de uma proibição absoluta de penas de duração perpétua em penas de duração perpétua
revisíveis seria aos olhos da professora regente uma interpretação harmonizável com a prevalência dos
objetivos da cooperação.
➔ Deste modo, não se violariam os limites materiais da revisão constitucional dando-se cobertura
através do art.33º, nº5 a normas como o art.13º, nº1, al a) da Lei nº65/2003, aludindo à primazia
que Portugal dá à construção e aprofundamento da UE que corresponde aos princípios
fundamentais do Estado português consagrados nos art.7º, nº6 e 8º, nº4 da CRP.
➔ MFP: No entanto, a mera revisibilidade não oferece garantias essenciais no que tange ao núcleo
da dignidade da pessoa humana, o que faz com que a norma contida no art.13º , nº1, al a) se
baseie numa dimensão interpretativa do art.35º, nº5 da CRP e contenda com o art.288º, al d) da
CRP - não respeitando os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
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o A única forma do direito penal se aplicar aquele crime é se estivermos numa das alíneas
do artigo 5º do CP (se nenhuma alínea está preenchida a lei penal portuguesa não é
aplicável) - aplicação da lei portuguesa fora do território português - ver alínea a alínea
se se aplica ou não e explicar porquê - Cada alínea tem um princípio subjacente que
devemos mencionar:
➢ Alínea a): Princípio da defesa dos interesses nacionais
▪ Conjunto de crimes que tutelam interesses próprios da soberania e do estado português,
estes bens jurídicos tem de ser protegidos pelo Estado Português porque não há mais
países que protejam os bens jurídicos “soberania do estado português”;
▪ Apenas quando estiver em causa um destes crimes se aplica a alínea a).
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➢ Alínea f): Alínea residual que tutela o princípio de que quem não extradita julga -
aut dedere aut judicare- se há um agente suspeito pela prática de um crime e o
encontrar num determinado país, se esse país não o entregar fica esse país responsável
por ele.
➢ Alínea g): Aplicação às pessoas coletivas.
Artigo 6º do CP
• Princípio non bis idem → o agente só pode ser julgado uma vez por determinado facto jurídico
o Tem projeção interna, mas também internacional → no país onde o crime aconteceu,
não sendo Portugal, que já tenha julgado aquela questão - quando isso acontecer, a lei
penal (portuguesa) não obstante estar destinada a aplicar-se, está proibida de o fazer →
1ª coisa a controlar depois de aplicar o art.5º do CP.
o Se a lei do local do facto, onde ocorreu ação ou resultado, se alguma delas for mais
favorável que a lei portuguesa, aplica-se a lei mais favorável.
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o Artigo 6º/3 CP → se aplicar sempre a lei mais favorável, estou a dar a solução que o
art.5º algumas vezes quis evitar —> Nas situações do nº 1 do art. 5º alínea a) e b) a
lei mais favorável não se aplica.
Esquema final:
Art.7º CP Art.4º CP
Nº2
- Lei mais favorável
- nº3 – art.5º, nº1 al. a) e b)
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Inês Nabeiro Ano letivo 2023/2024
▪ Artigo 6º: conjugar n.o 2 com alínea e) e f) - pode ou não Portugal colaborar
com outro país quando esteja em causa pena de morte ou irreversível;
▪ Há infrações com as quais nunca cooperamos - Artigo 7º - perseguição
política e crimes militares.
▪ Artigo 32º:
Situações nas quais não se extradita
I. Nº 2 - não extradição de cidadãos nacionais – art.33º, nº3, 2ª parte -
uma exceção que tem 3 requisitos;
II. Nº3 - Portugal só faz extradição de cidadãos nacionais para efeitos de
procedimento - nunca para cumprimento de pena!
III. Nº5 - princípio aut dedere aut judicare
➢ Artigo 1º e artigo 2º: têm de estar preenchidos para se aplicar esta lei e depois avançar
para as leis de entrega;
▪ Art.2º, nº1: limites da pena constante esteja em causa uma entrega para
procedimento ou cumprimento da pena;
▪ Se estiver verificado – regime dual:
1. Ver se o crime está no art.2º, nº2 – prescinde do requisito de dupla
incriminação;
2. Se não estiver – art.2º, nº3 – requisito de dupla incriminação;
3. Remissão do nº3 para o art.11º, al f).
▪ Art.11º;
▪ Art.12º - facultativas
▪ Art.13º - especiais
- Pena perpétua;
- Cidadão ser português para efeitos procedimentais.
▪ Nada nesta lei impede de entregar um português – isto não contende com a
CRP? Não, nos termos do art.8º entende-se que pode derrogar a CRP nesta
parte – art.33º, nº6 da CRP.
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13. Imunidades
Modelo Britânico:
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➔ O referido anteriormente já não exprime totalmente o contexto atual das imunidades – tanto as
parlamentares como as de outros titulares de cargos públicos, pelas seguintes razões históricas:
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Imunidade do PR
• O art.130º, nº4 da CRP determina que, fica o PR excluído da prossecução penal relativamente a
crimes estranhos ao exercício de funções durante o mandato, sendo apenas julgado
posteriormente (no fim do seu mandato) nos tribunais comuns, suspendendo a responsabilidade
penal durante esse período de tempo.
• No que se refere aos crimes praticados no exercício de funções não existe imunidade, estando o
julgamento a cargo do Supremo Tribunal de Justiça, implicando a destituição do cargo e o
impedimento da reeleição.
• O que se deve entender por crimes praticados em efetividade de funções?
o Numa interpretação sistemática restritiva tratar-se-ia apenas dos crimes referidos na Lei
nº34/87 de 16 de julho – no entanto existem outros crimes, nomeadamente contra o
Estado (art.308º e ss) ou contra a humanidade que pressupõe o abuso e o desvio dos
poderes que terão de se enquadrar na ratio legis no âmbito dos crimes do exercício de
funções.
o A conexão com o exercício de funções deve ser entendida em sentido material,
abrangendo o exercício de atividades próprias das funções como ações e omissões que
tenham o exercício de funções como causa ou finalidade.
o Exemplo: um homicídio para ocultar um erro político ou um facto da vida privada que
poderia colocar em causa o cargo de PR seria entendido como um crime cometido no
exercício de funções.
o A suspensão do procedimento criminal relativamente a crimes fora do exercício de
funções não deveria afetar os prazos prescricionais previstos no CP, embora tal
situação não esteja prevista para determinar o início ou a interrupção da prescrição.
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Síntese
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1. Acórdão Incesto
o Impacto da disfunção familiar que o incesto causa no âmbito da sociedade - pilar basilar da
família nas sociedades, uma figura importante para a vida social
o Sociedade é o primeiro nível social de uma pessoa
o Se os papeis dentro da concepção e regulação jurídica da família gera-se sobreposição de
direitos e deveres a nível jurídico
o Impacto da disfunção familiar no âmbito da proteção da criança nascida de uma relação
incestuosa.
• Saúde pública
• Moral
Aquilo que caracteriza o incesto, como tal em relação a outros crimes sexuais, é o consentimento livre
e material de ambas as partes.
- A coesão social não se define a partir da moral sexual, mas sim a partir da liberdade individual.
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