Você está na página 1de 23

HISTÓRIA DO DESIGN

CAPÍTULO 1 - EXISTE ALGUM TIPO DE


RELAÇÃO ENTRE DESIGN, ARTE E
TECNOLOGIA?
José Neto de Faria

-1-
Introdução
Antes de iniciar seus estudos, reflita: há alguma relação entre design, arte e tecnologia? A resposta a esta
pergunta só pode ser formulada a partir do estabelecimento de uma abordagem que seja capaz de aproximar os
campos de saber. O objetivo é verificar a possibilidade da existência de inter-relações e de interdependências
dinâmicas capazes de resgatar, ao mesmo tempo, acontecimentos e fatos históricos relevantes às áreas de
conhecimento e descrever processos de retroalimentação que caracterizem os mecanismos de atualização,
integrados ao campo de saber do design.
O processo de consolidação do campo de saber do design aconteceu durante os séculos XVIII e XIX, sob o fundo
da Revolução Americana (1775-1783), da Revolução Francesa (1789-1799) e da Revolução Industrial (a partir
de 1760), coincidentemente um vasto processo de transformação não somente dos hábitos e dos costumes da
sociedade europeia e da América, mas das organizações, das instituições, do sistema de ensino e dos processos
dinâmicos de trocas de bens e capitais.
Neste contexto, o que, como e onde aconteceram as principais transformações que permitiram o surgimento e o
estabelecimento do campo de saber do design? Como o design se relaciona com a cultura, a arte, a ciência, a
tecnologia e a economia? Como os sistemas de produção participam do processo de design dos produtos? De que
modo as teorias estéticas participam do desenvolvimento do design? E como as organizações e as instituições
validam e promovem o desenvolvimento do design?
Neste capítulo, você verá os acontecimentos e os fatos históricos que estiveram envolvidos na consolidação do
campo de saber do design, conhecerá as ideias e as formas de pensar que promoveram a reflexão sobre a prática
do design, estudará alguns dos principais movimentos estéticos do século XIX e do início do século XX, assim
como artistas, artesãos, arquitetos e designers que foram fundamentais para o estabelecimento do design. E,
ainda, alguns dos artefatos que registram o desenvolvimento da cultura material do campo do design.
Bom estudo!

1.1 O campo de saber do design


O campo de saber do design começou a se constituir entre os séculos XVIII e XIX quando ocorreram alguns fatos
importantes, listados nos itens a seguir. Clique para ver.


Se estabeleceu um vocabulário ou um conjunto de termos socialmente compartilhados capazes de
especificar o campo de atuação do design.

Houve o reconhecimento dos profissionais que compartilhavam um conjunto de conhecimentos e
saberes específicos das práticas do campo.

Foram fundados espaços próprios, cooperativas, associações, organizações e instituições, que
tinham como principal objetivo divulgar, proteger e promover a profissão, os profissionais, os
produtos e os serviços do campo.

Logo, o campo de saber do design se estabelece no decorrer da história, entre os acontecimentos e os fatos
históricos, entre o fluxo de valores socioculturais, entre os avanços científicos e tecnológicos e a aplicação desses
avanços na resolução das necessidades, anseios e desejos humanos e entre as disputas econômicas e o
estabelecimento dos modelos econômicos.

-2-
1.1.1 O campo de saber do design e as suas interfaces históricas,
socioculturais e econômicas
O surgimento do campo de saber do design pode ser caracterizado pelos acontecimentos e fatos históricos que
se sucederam entre os séculos XVIII, XIX e XX. Clique na interação a seguir para saber mais.
Isso ocorreu, pois nos países que passaram primeiramente pela consolidação da Revolução Industrial, pode-se
acompanhar a instauração do uso do termo design para definir e nomear as atividades desenvolvidas pelos
designers para atender o setor produtivo (FORTY, 2007), sendo essas o fortalecimento das atividades projetivas
com a valorização das funções do design na organização das instituições (TORRENT; MARÍN, 2005), a fundação
de uma série de organizações, associações e instituições destinadas ao debate crítico e a promoção do design, a
consolidação de um sistema de ensino especializado na contínua formação de profissionais para o campo do
design (EFLAND, 1990), e o estabelecimento de vários tipos de premiações regionais, nacionais e internacionais,
utilizadas para reconhecer e validar os produtos e os serviços do design (SCHNEIDER, 2010).
O termo design começou a ganhar força por duas questões: primeiro, foi usado para diferenciar e definir o
trabalho feito por alguém, seja artista ou artesão, capaz de conceber, desenvolver e implantar um produto para a
linha de produção, conseguindo manter a qualidade do processo de produção, a qualidade do produto e a
aceitação do produto pelo mercado consumidor; e segundo, como o design de um padrão de uma estampa têxtil
determinava a popularidade do produto, e as máquinas de estampagem começavam a se disseminar, a partir da
década de 1830 e 1840, os proprietários das fábricas começaram a se preocupar com o estabelecimento de leis
capazes de proteger a propriedade industrial a fim de manter seus direitos sob o design dos produtos (FORTY,
2007).
Na história do design fica evidente que as principais organizações, associações e instituições foram fundadas no
primeiro momento com o intuito de promover o avanço geral da manufatura e do comércio, deixando o design
em segundo plano. Podem ser citadas como principais a Royal Society for the Encouragement of Arts,
Manufactures and Commerce (Real Sociedade para o Fomento das Artes, Manufatura e Comércio), fundada no
Reino Unido em 1754; e a Deutscher Werkbund (Associação Alemã do Trabalho e/ou Artesanato), fundada na
Alemanha em 1907.
Já no segundo momento, foram fundadas com o intuito de promover efetivamente o design. Podem, ainda, ser
citadas a United Society of Industrial Design (Sociedade Unida pelo Design Industrial), fundada nos Estados
Unidos em 1944; a Council of Industrial Design (Conselho de Design Industrial), fundada no Reino Unido em
1944; a Ratfür Formgebung (Instituto da Concepção), fundada na Alemanha em 1951; o Institut d’Esthétique
Industrielle (Instituto sobre a Estética Industrial), fundado na França em 1951; o International Council of
Societies of Industrial Design (Conselho Internacional das Sociedades de Design Industrial), fundado por um
grupo internacional de organizações em 1957; e o International Council of Garphic Design Associations
(Conselho Internacional das Associações de Design Gráfico), fundado no Reino Unido em 1963.
O ensino de design foi implantado através de diferentes propostas curriculares sempre norteadas por questões
socioculturais, políticas, ideológicas, econômicas e tecnológicas, que orientaram a teoria e a prática do campo de
saber do design. Entre as principais iniciativas no ensino do design, implantadas pelos estados em busca da
industrialização e a competição internacional por mercados, pode-se citar: o Lycée d’arts et Métiers (Liceus de
Artes e Ofícios), fundado na França entre 1794 e 1890; as Government Schools of Design (Escolas do Governo de
Design), fundadas no Reino Unido entre 1837 e 1890; Staatliches-Bauhaus (Casa da Construção do Estado),
fundada em 1919 e fechada em 1933, Bxytemac (Oficinas do Estado para o Ensino Superior de Arte e Técnica),
fundada em 1920 e fechada 1930; Hochschulefür Gestaltung (Escola Superior de Projeto/Design), fundada em
1953 e fechada em 1968; e a Cranbrook Academy of Art (Academia de Arte de Cranbrook), período de referência
entre 1977 e 1991.
A arena educacional caracteriza as disputas de poder e as intenções políticas assumidas pelos atores sociais,
desnuda as relações entre as forças conservadoras ou progressistas que definem as políticas de ensino e os
valores que vão ser implantados pelas práticas sociais. Os currículos, com seus processos educacionais,
rearticulam e reposicionam os indivíduos em seus discursos. Pois é nos currículos e “na forma do currículo que

muitas vezes se reproduz o cimento social que organiza a nossa consciência em seu nível mais básico” (APPLE,

-3-
muitas vezes se reproduz o cimento social que organiza a nossa consciência em seu nível mais básico” (APPLE,
2008, p. 94).

Figura 1 - Representação do espaço e do tempo sociológico educativo, em que os atores sociais em disputas de
poder estabelecem a prática do discurso do campo de saber.
Fonte: Elaborada pelo autor, baseado em BOURDIEU, 1983; APPLE, 1986-2013.

Na seara do ensino, podemos ainda caracterizar o ensino de design como um espaço de embate ideológico e
político, das forças conservadoras e progressistas, as quais buscam definir três confluentes tipos de programas: o
do currículo explícito, que apresenta a tradicional política educacional oficial implantada pelo estado; o do
currículo oculto, que caracteriza as normas e os valores não declarados, mas instaurados pela cultura
dominante; e o do currículo tensionado, o qual costuma abranger as formas de pensar e as práticas de diferentes
movimentos minoritários, introduzidas pelos educadores, familiares e membros da comunidade. Estes atores
buscam promover o embate, o tensionamento e a reverberação do conflito existente entre os valores, mas sem
conseguir, infelizmente, mudar oficialmente a estrutura do currículo hegemônico.
A relação entre o campo de saber e de ensino do design, a economia e o mercado, só ficou mais evidente quando
o historiador Adrian Forty (2007) começou a afirmar que, para compreender a história do design, deveria
entender como os processos econômicos afetam e são afetados por ele. Para além, conforme Schneider (2010, p.
13):

A qualidade estética, o caráter formal e o estilo do design não podem nem de longe ser interpretados
sem se considerar o pano de fundo econômico e ideológico diante do qual o design surgiu. A
influência dos fatores econômicos sobre o design é sempre dada, e de uma forma tal, que – estes
permanecendo invisíveis – frequentemente não se torna consciente para as pessoas que trabalham
como designers profissionais ou para docentes da área.

Contudo, durante muito tempo, no campo de saber do design, os modos de produção e as tecnologias foram
vistos somente como ferramentas ou instrumentos utilizados na materialização dos produtos e dos serviços de
design para garantir algum tipo de lucro econômico e cultural (simbólico).

-4-
1.1.2 Design, cultura, tecnologia e modos de produção
O estabelecimento da uma determinada cultura depende do sistema de inter-relações culturais que descreve o
processo de avanço dinâmico do escopo conceitual da sociedade sob os recursos naturais, gerando a apropriação
e a consequente transformação dos recursos naturais em objetos culturais.
O processo de naturalização da cultura promove o avanço paulatino das ideias e das formas de pensar, na forma
de técnicas e de tecnologias, definindo estágios entre a apropriação dos recursos da natureza e o
estabelecimento de uma cultura. Isso de modo a, primeiramente, retirar dos recursos naturais a matéria-prima
necessária à materialização do objeto técnico pela aplicação de um modelo abstrato, concebido e definido como
objeto abstrato. Por fim, visa converter o objeto técnico, inicialmente estranho à sociedade, em um objeto
cultural, tão natural quanto qualquer objeto natural, anteriormente presente na natureza.

Figura 2 - Representação do sistema de inter-relações culturais estabelecido entre o escopo conceitual da


sociedade, o conjunto de técnicas e de tecnologias e os recursos naturais.
Fonte: Elaborada pelo autor, baseado em VILLAS-BOAS, 2002; FLUSSER, 2002; SIMONDON, 2005.

O objeto cultural resultante do processo de design, carrega em si, todo o conjunto de questões provenientes do
momento cultural histórico, dos valores sociais, do uso das tecnologias e dos modos de organização do sistema
produtivo. É por isso que esse é considerado a síntese que revela o estado do desenvolviemnto cultural de uma
determinada sociedade,o elemento material que registra parte dos acontecimentos e dos fatos históricos. E
também, o elemento que demarca as transformações, evoluções e revoluções que acontecem nos modos
produtivos.
No campo de saber do design, desde o século XVIII e XIX, a reflexão e a crítica sobre a relação da sociedade com
os modos produção participam ativamente da definição teórica dos caminhos que foram ou que devem ser
seguidos no estabelecimento do desenvolvimento do design de objetos culturais. A partir da Revolução
Industrial foi estabelecido três modos de produção: o modo de produção artesanal; o modo de produção
mecanizada; e o modo de produção automatizado, conforme mostrado na interação a seguir (SMITH, 2010;
PEVSNER, 2001; TORRENT; MARÍN, 2005).

-5-
O modo de produção artesanal é caracterizado pela execução de todas as tarefas por um artesão ou uma
cooperativa de artesãos sem uma divisão ou especialização clara das tarefas.

O modo de produção mecanizada é caracterizado pela substituição de parte da força da mão de obra por
máquinas e, consequentemente, a racionalização da divisão do trabalho, tanto para adequar as tarefas às
máquinas quanto para adequar as tarefas ao trabalho cada vez mais especializado.

O modo de produção automatizado é caracterizado pela substituição extensiva da mão de obra por máquinas e
robôs. Consequentemente, a racionalização e sistematização da automação da produção e da montagem dos
produtos faz com que a mão de obra especializada se desloque para as atividades de concepção de projeto, de
manutenção e de gerenciamento das máquinas.

1.2 Design e Revolução Industrial


A Revolução Americana, a Revolução Francesa e a Revolução Industrial promoveram na Europa e nos EUA uma
transformação profunda nas relações sociais, no comportamento social, na organização política, nos sistemas
produtivos e nos modos como acontecem os processos de trocas de bens e capital. A revolução científica e
tecnológica começou a permitir ao homem um controle maior sobre a natureza, doenças puderam ser
controladas, desastres naturais evitados, e os objetos culturais adquiriram diferentes usos e finalidades.
O design se enalteceu como campo de saber de uma profissão essencial ao desenvolvimento econômico, uma
ferramenta para diminuir o preço e, ao mesmo tempo, qualificar os produtos. Um instrumento de configuração
do comportamento e dos hábitos sociais e, claro, uma das principais ferramentas utilizada pelos estados para
disputar tempos de paz nos mercados nacionais e internacionais.

1.2.1 Cultura, sociedade, economia, modos de produção


A Revolução Industrial foi um longo processo de transformações socioculturais, políticas, tecnológicas,
produtivas e econômicas que começaram no século XVIII.
Durante o processo houve a transformação das forças produtivas e das relações de produção, mediante as quais
se desenvolveu o capitalismo industrial (BALDÓ apud TORRENT; MARÍN, 2005).
Entre as principais transformações decorrentes da Revolução Industrial podem-se destacar as apresentadas na
interação a seguir.
A consolidação de duas classes sociais: a classe detentora de todos os meios de produção, denominada
burguesia; e a classe trabalhadora que somente possui o seu trabalho para vender aos proprietários dos meios
de produção, denominada de proletariado.
O surgimento de um novo modo de se produzir baseado na organização e generalização do trabalho assalariado,
em que o trabalho se torna mais produtivo tanto pela divisão do trabalho quanto pela organização do trabalho
em grandes unidades produtivas.
A divisão do trabalho promove a especialização do trabalhador na execução de uma determinada atividade, isso
aumenta a sua eficiência na execução da tarefa enquanto diminui o tempo perdido decorrente da troca de
atividade (SMITH, 2010).
O uso extensivo da mecanização nos processos produtivos, por meio da invenção de uma grande quantidade de
máquinas, e o aproveitamento das fontes de energia animal e de energia de origem inumana (caldeiras de vapor).

-6-
VOCÊ SABIA?
O Reino Unido foi o primeiro país do mundo a ter a sua população urbana maior do que a que
morava no campo, a partir de 1852. A Revolução Industrial promoveu o deslocamento humano
do campo para a cidade, onde se encontrava trabalho nas fábricas e meios de sustentar as
famílias. No Brasil, a população urbana superou a rural em 1965. Para saber mais sobre os
indicadores da concentração das populações urbana e rural no país acesse:
<http://www2.fct.unesp.br/nera/atlas/caracteristicas_socioeconomicas_b.htm>.

Mesmo com todas as transformações e os benefícios promovidos pela Revolução Industrial, os trabalhadores
viviam em condições de vida penosas. A jornada de trabalho durava de 12 a 16 horas por dia, seis dias na
semana; as condições eram péssimas, sendo muito comum os operários morrerem em acidentes de trabalho
como a explosão de caldeiras. As crianças eram empregadas e trabalhavam até a exaustão física, e os salários
eram miseráveis.

VOCÊ QUER VER?


O filme Germinal (1993) aborda os processos de transformação que ocorreram durante a
Revolução Industrial, como a formação das classes sociais e os principais dilemas da sociedade
industrial francesa do século XIX. A obra dirigida por Claude Berri (1934-2009) é baseada no
romance homônimo de Émile Zola (1840-1902), e a narrativa se desenvolve numa cidade
francesa na qual os mineradores se rebelam contra seus chefes, acabam vivendo uma série de
confrontos sociais e passam a ser alvos da repressão das autoridades. Para assistir, acesse:
<http://cinetvx.com/pt/assistir-germinal-1993-online>.

O proletariado não percebia o sistema econômico capitalista – cujas novas relações sociais intensificavam as
diferenças entre as classes – como o seu verdadeiro carrasco, e organizou um movimento de luta contra o ente
mais visível de todo o sistema, as máquinas. O ludismo foi, então, um movimento de resistência operário
violento, que se opunha às máquinas porque os trabalhadores acreditavam que elas roubavam os seus empregos.
As ações do movimento se concentraram nas cidades mais industrializadas, onde os ativistas invadiam as
grandes indústrias e destruíam as máquinas. Com o tempo, perceberam que não obtinham grandes resultados e,
finalmente, começaram a organizar os primeiros sindicatos de trabalhadores.

-7-
VOCÊ QUER LER?
Samuel Butler escreveu e publicou, em 1872, a obra “Erewhon”, uma crítica satírica utópica à
sociedade britânica, questionando a relação e o papel da tecnologia na sociedade. O livro
aborda questões ligadas ao comportamento social inglês, ao Romantismo, ao Naturalismo e ao
Evolucionismo (BUTLER, 2007).

Segundo Torrent e Marín (2005), a formulação da teoria do gosto pelos filósofos britânicos entre os séculos
XVII e XVIII se mostrou fundamental para a crítica do design dos produtos industriais. Assim, deve-se destacar
que Francis Hutcheson (1694-1746) inaugura uma abordagem psicológica da teoria do gosto, que estabelece que
a beleza não é uma qualidade objetiva, mas um efeito subjetivo produzido no indivíduo ao contemplar a
uniformidade e a variedade. Os juízos estéticos estariam sujeitos a maior ou a menor capacidade imaginativa do
indivíduo, pela capacidade associativa de ideias promovidas por vivências pessoais e pelos motivos sociológicos
como a educação.
David Hume (1711-1776) estuda a diversidade dos gostos existentes para então estabelecer que entre a
variedade dos gostos existem princípios gerais de aprovação e censura ao gosto. Associa as normas do gosto às
regras de composição artística e afirma que um verdadeiro crítico do gosto deve possuir delicadeza, ter sentidos
aguçados, praticar algum tipo de arte, buscar estar livre de prejulgamentos e realizar frequentemente
comparações.
De certa forma, define o que se deve promover no ensino de design nas escolas para melhorar a qualidade do
design dos produtos industriais.

1.2.2 A Exposição Nacional Francesa de Paris (1798)


Após a consolidação da Revolução Francesa (1789-1799) o estado francês começou a organizar grandes
exposições nacionais conhecidas como Expositions Nationales Françaises (Exposições Nacionais Francesas). Elas
foram promovidas para estimular a produção e a comercialização dos produtos franceses a fim de restaurar o
nível da produção industrial anterior à revolução.
As exposições se consolidaram como uma nova ferramenta estratégica, fundamental para que o estado francês
conseguisse divulgar e promover o design dos seus produtos de ferro fundido, prataria, cerâmicos, vidraria,
móveis e têxtil. As exposições tiveram tanto sucesso que, em 1849, a 11ª French Nacional Exhibition (11ª
Exibição Nacional Francesa) conseguiu atrair cerca de 4,5 milhões de visitantes.
Saiba mais observando o caso a seguir.

-8-
CASO
No início do século XIX a Revolução Industrial criava novas demandas parecidas com as
demandas geradas pela atual Revolução Eletrônica Digital. Os processos de mecanização e de
automatização da produção não estavam completamente implantados na produção industrial.
Michel Thonet (1796-1871) procurava melhorar a produção do mobiliário. Pesquisou vários
tipos de avanços científicos, processos e tecnologias industriais para criar seus móveis. De
1830 até 1836, pesquisou técnicas para curvar madeira laminada e, em 1841, patenteou o
primeiro sistema de dobra, a quente, de madeira, passando a conceber e produzir móveis
curvados. Dessa maneira, criou uma marca no design quando desenvolveu, em 1858, a Cadeira
o
n 14.
Assim, Michel Thonet atingiu seu objetivo através da simplificação do design e da adaptação
dos processos de produção, de mecanização e de automação, e chegou a uma fórmula de
produção industrial que perdura até os dias de hoje. Já foram vendidas mais de 100 milhões de
cadeiras no mundo. Michel Thonet teve um papel fundamental como pioneiro na fabricação
industrial de móveis (SCHNEIDER, 2010).

No tópico a seguir, você conhecerá os movimentos estéticos que marcaram a Era Vitoriana.

1.3 A Era Vitoriana


A Era Vitoriana, além de ter sido influenciada pela Revolução Industrial, também foi marcada por uma série de
movimentos estéticos que podem ser divididos em dois grupos. O primeiro foram os movimentos que, de certa
forma, buscavam reviver as tradições do passado através da apropriação e do uso de formas históricas, como o
Romantismo, o Neoclassicismo, o Historicismo e o Ecletismo. O segundo, compreende os movimentos que
buscavam reformar o comportamento da sociedade vitoriana, resgatando os valores sociais como o Neogótico,
Arts and Crafts (Artes e Ofícios) e Art Nouveau (Arte Nova).
Os movimentos de reforma deram origem aos fundamentos do design moderno. O movimento de Arts and Crafts
se desenvolveu de 1850 até meados de 1914; o movimento Art Nouveau, de 1880 até meados de 1910. Os
movimentos de reforma foram uma reação aos efeitos da industrialização do século XIX. Buscavam reabilitar o
ser humano frente à degeneração do meio ambiente, das relações sociais, das condições de trabalho e da baixa
qualidade do design dos produtos industriais. Também propunham uma posição mais sensível e ética no
desenvolvimento do design e da fabricação artesanal e industrial dos produtos.

1.3.1 Thomas Carlyle (1795-1881), Augustus Welby Northmore Pugin


(1812-1852), John Ruskin (1819-1900) e William Morris (1834-1896)
Thomas Carlyle foi um crítico social calvinista. Ensaísta, escritor e historiador do movimento Romantismo,
criticava o utilitarismo e o materialismo, acreditando que as riquezas materiais não tinham valor porque
produziam uma crise na personalidade. Carlyle defendia que o desenvolvimento da civilização dependia dos

feitos de indivíduos excepcionais, e não das massas. Acreditava no idealismo espiritual e demostrava uma grande

-9-
feitos de indivíduos excepcionais, e não das massas. Acreditava no idealismo espiritual e demostrava uma grande
preocupação com a situação degradante dos trabalhadores britânicos, causada pelo capitalismo selvagem da
Revolução Industrial.
De acordo com Bhaskaran (2007), um dos primeiros críticos ao processo de degeneração social foi o teórico e
arquiteto Augustus Welby Northmore Pugin. Ele elaborou a teoria do objeto moralizante, que fazia uma conexão
entre o declínio das condições sociais e das formas estéticas dos objetos, a qual buscou combater, na prática, o
processo de degeneração definido por Thomas Carlyle.
Pugin afirmava que os objetos deveriam ter uma estética que fosse capaz de simbolizar os verdadeiros valores
de uma sociedade cristã, pois a estética dos objetos determinava não só o gosto, mas também a moral do
indivíduo. Assim, o design para transformar a sociedade deveria traduzir para as formas dos objetos a
representação dos valores cristãos como honestidade, austeridade, despojamentos e simplicidade. Essa ética
cristã que deveria ser posta no design dos objetos, poderia servir para reformar a sociedade, requalificaria as
relações sociais, as condições de vida dos artesãos e dos trabalhadores através da produção de objetos
(BHASKARAN, 2007).

VOCÊ QUER LER?


Owen Jones publicou, em 1852, a obra The Grammar of Ornament, cujo título em português é
“A gramática do ornamento”. Trata-se de um catálogo de estilos ornamentais de vários países e
culturas, com padrões indianos, hindus, árabes, mouriscos, persas, gregos, turcos, celtas – além
de padrões vegetais e florais. É considerada a primeira publicação do campo de saber do
design. Foi usada como referência nos trabalhos dos adeptos do Romantismo, Neoclassicismo,
Historicismo e Ecletismo (JONES, 2010).

Na segunda metade do século XIX, no Reino Unido, as ideias e formas de pensar de Pugin e Carlyle influenciaram
decisivamente a obra de John Ruskin e William Morris, contribuindo para o surgimento de um movimento
idealista estético. Esse ideal promovia o reconhecimento da importância da arte, do artesanato e do design.
Defendia o combate aos efeitos degenerativos da produção em massa, bem como a ponderação sobre o momento
adequado do uso da mão de obra braçal e das máquinas, a fim de melhorar – ao mesmo tempo – a qualidade e
manter a produção de uma quantidade apropriada de produtos (ADAMS, 1998). O movimento de reforma ficaria
conhecido mais tarde como Arts and Crafts.
John Ruskin, teórico, escritor e crítico de arte, denunciava o egoísmo da sociedade capitalista, defendia uma arte
mais voltada para o campo e para a natureza. Enfatizava como era importante valorizar o trabalho, em particular
o criativo. Para tanto, era preciso reconhecer que a divisão das tarefas em função das operações realizadas pelas
máquinas fracionava o trabalho humano e alienava o proletariado. Isso gerava um certo processo de
desumanização no qual os trabalhadores deixavam de conhecer e controlar todo o processo de produção, o que
tornava impossível manter uma formação humana mais completa.

- 10 -
Figura 3 - Arquitetura de Veneza e Janela de Veneza, de Jonh Ruskin, 1845; ladrilhos hidráulicos da St Giles RC
Church e Houses of Parliament, de Augustus Welby Pugin, 1812-1852.
Fonte: ADAMS, 1998, p. 22-31; Dan Breckwoldt, Shutterstock, 2018.

William Morris foi o pioneiro em levar as ideias de Pugin para a prática. Em 1861, fundou a Morris, Marshall,
Faulkner & Co. e começou a produzir tapeçaria, mobiliário e cristais cromados. Como socialista, acreditava que o
retorno ao artesanato tradicional poderia melhorar a vida dos pobres. Mas, na prática, a maioria dos seus
produtos eram muito caros e só puderam ser consumidos pelos nobres e grandes industriais britânicos
(FLORES, 1992).

- 11 -
Figura 4 - Strawberry e Chrysanthemum, padrões têxteis de William Morris, 1883; Sussex Chair, da Morris & Co.,
1865.
Fonte: FLORES, 1992, p. 25-27; ADAMS, 1998, p. 35.

De acordo com Flores (1992), o esforço de William Morris é historicamente importante, pois contribuiu para
refletir e criticar as qualidades estruturais, funcionais e formais dos produtos, ao mesmo tempo em que ajudou a
promover o apogeu do design do século XIX. Seu esforço contagiou jovens artistas, artesãos, arquitetos e
designers que passaram a se interessar pelo desenho e pelo sistema de produção, atividades consideradas até
então pouco edificantes e sem prestigio até o momento. Morris deixou como legado uma reflexão crítica do
compromisso social e moral do design, do qual não se pode mais esquivar-se nos dias de hoje.

- 12 -
Figura 5 - Cadeira e escrivaninha, de Arthur Heygate Mackmurdo, respectivamente de 1881 e 1886; aparador e
contentor, de Charles Robert Ashbee, respectivamente de 1895 e 1907.
Fonte: SCHNEIDER, 2010, p. 31; BHASKARAN, 2010, p. 25; DEMPSEY, 2003, p. 31; ADAMS, 1998, p. 34.

Segundo Bhaskaran (2007, p. 28), as principais confrarias e associações do movimento de reforma, todas
fundadas em Londres (Reino Unido) são as apresentadas nos itens a seguir. Clique para ver.


Guild of St. George: fundada em 1872, por John Ruskin (1819-1900).

The Century Guild: fundada 1882, por Arthur Heygate Mackmurdo (1851-1942) e Selwyn Image

- 13 -
The Century Guild: fundada 1882, por Arthur Heygate Mackmurdo (1851-1942) e Selwyn Image
(1849-1930).

St. George’s Art Society: fundada em 1883, por Gerald Horsley (1862-1917), William R. Lethaby
(1857-1931), Mervyn Macartney (1853-1932), Ernest Newton (1856-1922) e E. S. Prior (1852-
1932).

Art Workers Guild: fundada em 1884, por John Ruskin (1819-1900), Walter Crane (1845-1915) e
Lewis Foreman Day (1845-1910).

Guild of Handicraft: fundada em 1888, por Charles Robert Ashbee (1863-1942).

Finalmente, a partir da primeira exposição organizada pela Arts and Crafts Exhibition Society, o movimento de
reforma passou a ser denominado Arts and Crafts (Artes e Ofícios). O movimento sempre acreditou que a boa
arte e o bom design podiam reformar a sociedade e melhorar a qualidade de vida dos criadores, produtores e
consumidores. De modo geral, apresentou duas fases: a primeira, inspirada em formas de animais e plantas
extraídas da natureza; a segunda, mais abstrata, inspirada nos movimentos e em criaturas exóticas e místicas.

1.3.2 Government School of Design (1837-1945)


O Reino Unido sente o acirramento da competição internacional pelo controle dos mercados consumidores de
produtos industriais. Isso porque a França pós-Revolução, para tornar-se um estado mais competitivo,
reestrutura o seu sistema produtivo para um sistema mais eficiente de ensino de design e, dessa forma, melhora
o design dos seus produtos.
Como resposta, o parlamento inglês forma em 1835 um comitê para analisar a situação, o The Arts and their
Connection with Manufactures, que elabora um conjunto de medidas com o intuito de estimular o fim do
analfabetismo, o ensino de desenho nas escolas, a formação de uma rede de escolas de design e a criação da
Grande Exposição de Londres.

- 14 -
Figura 6 - Detalhes do design do mobiliário e da arquitetura do prédio da Glasgow Government School of Design,
projetado por Charles Rennie Mackintosh, em 1897, e construído entre 1899 e 1909.
Fonte: BUCHANAN, 2004, p. 41-42; FERGUSON, 1995, p. 17; MACAULAY, 2002, p. 24.

O programa estabelecido pelo comitê definiu a fundação nos centros industriais do Reino Unido de 20
instituições de ensino de design, entre 1837 e 1851. A primeira Government School of Design (escola
governamental de design) foi fundada dois anos depois, em Londres, em 1837. Em 1853, começou a aplicar o
programa Nacional Art Training School, promovendo o treinamento de novos professores para a educação
artística nacional. Em 1896, passou a se chamar de Royal College of Art (RCA) e pode ser considerada a escola de
design mais influente do século XIX.
Em 1845, na cidade portuária de Glasgow (Escócia), foi fundada a Glasgow Government School of Design, a
segunda escola de design mais influente implantada pelo programa. Em 1853, passou a chamar-se The Glasgow
School of Art (GSA).

- 15 -
1.3.3 A Grande Exposição de Londres (1851)

o
The Great Exhibition, conhecida também como A Grande Exposição de Londres, foi inaugurada no dia 1 de maio
de 1851, e é considerada a primeira grande exposição internacional de produtos industriais. Teve mais de 6
milhões de visitantes e mais de 15 mil expositores. Contudo, foi inspirada na série de Exposições Nacionais
Francesas, realizadas a partir de 1798.

VOCÊ O CONHECE?
Joseph Paxton (1803-1865) foi ilustrador, paisagista, arquiteto e naturalista autodidata. Ele
projetou The Crystal Palace (O Palácio de Cristal), inspirado no Victoria Regia House, para
abrigar a Grande Exposição de Londres, em 1851. A construção é composta por uma estrutura
pré-fabricada em ferro e vidro, erguida no Hyde Park, em Londres. Depois da exposição foi
desmontado e transportado para o bairro mais nobre de Londres, Sydenham Hill, onde ficou
até ser destruído por um incêndio, em 1936.

A exposição em Londres faz parte de um conjunto de iniciativas, entre as décadas de 1830 e 1840, para resgatar
o prestígio e a posição da indústria inglesa, que havia sido perdida durante as Guerras Napoleônicas. Propunha,
também, estabelecer um espaço para o debate crítico da arte, da ciência e da manufatura.
No entanto, o evento acabou sofrendo com a antipatia e os ataques dos críticos de design, os quais diziam que a
exposição apresentava como a decadência moral estava gerando produtos mal-acabados, de desenho duvidoso e
que não representavam mais o gosto – os chamados produtos desonestos.

- 16 -
Figura 7 - Gravura do rosto de Joseph Paxton; croqui apresentado no concurso para eleição do projeto para
prédio principal da exposição; vistas aéreas e fachada do Palácio de Cristal; capa da revista ilustrada anunciando
o incêndio que destruiu o prédio, em 1936.
Fonte: ANTHONY, 1976, p. 72-73; PAXTON; FOX, 1994, p. 115-116.

No tópico a seguir, você conhecerá outros dois movimentos de reforma estética e saberá por que o Art Nouveau é
considerado o de maior abrangência internacional.

1.4 Art Nouveau e Wiener Werkstätte


No final do século XIX o movimento de reforma estética Arts and Crafts, mais local e regional, começa a perder
espaço para o movimento de reforma estética Art Nouveau, bem mais abrangente e internacional.
Apoiado nos princípios teóricos do Naturalismo e do Evolucionismo, e no desenvolvimento de novos materiais
tecnológicos, o Art Nouveau se espalhou rapidamente pelo mundo. A utilização das novas técnicas de manejo do
ferro e do aço possibilitou, por exemplo, a construção da Torre Eiffel, então o prédio mais alto da capital
francesa. Foi projetado pelos engenheiros Stephen Sauvestre (1847-1919) e Gustave Eiffel (1832-1923), para a
Exposição Universal de Paris, de 1889.

1.4.1 Art Nouveau (1880-1910)


O movimento de reforma Art Nouveau surgiu na França, inspirado inicialmente pelo Arts and Crafts, na década
de 1880. Recebeu nomes diferentes em cada país: Arte Nova (Portugal), Modern Style (Inglaterra), Modernismo
(Espanha), Jugendstil (Alemanha, Dinamarca, Suécia e Noruega), Nieuwe Kunst (Holanda), Secessionsstil
(Áustria), Stile Liberty (Itália) e модерн (Rússia).
De modo geral, conforme Flores (1992), o Art Nouveau possuía duas vertentes. Clique nas abas a seguir.
Orgânica curvilínea
Caracterizada pelas formas naturais de folhagem, assimetria, linhas sinuosas e excessos de curvas em chicote, foi

- 17 -
Orgânica curvilínea
Caracterizada pelas formas naturais de folhagem, assimetria, linhas sinuosas e excessos de curvas em chicote, foi
mais presente na França, Inglaterra, Bélgica, Holanda, Portugal, Hungria, República Checa, Espanha, Itália e
Estados Unidos.
Retilínea geométrica
Caracterizada pelas formas geométricas, simetria, estilização geométrica das formas da natureza e silhuetas
severas, foi mais presente na Escócia, Alemanha, Suíça, Dinamarca, Suécia, Noruega, Rússia e Áustria.

Figura 8 - Mesa aparadora (1904), entradas do metrô de Paris em Porte Dauphine (1900) e Reaumur-Sebastopol
(1904), de Hector Guimard; Museu Victor Horta (1898-1901), em Bruxelas.
Fonte: BHASKARAN, 2010, p. 42-45; FLORES, 1992, p. 101-102.

Entre os principais artesãos, artistas, arquitetos e designers do movimento, devem-se citar: Charles Rennie
Mackintosh (1868-1928), da Escócia; Henri de Toulouse-Lautrec (1864-1901) e Hector Guimard (1867-1942),
da França; Victor Horta (1861-1947), da Bélgica; Henri van der Velde (1863-1957), Peter Behrens (1868-1940),
Otto Eckmann (1865-1902), Richard Riemerschmid (1868-1957), Herman Obrist (1862-1927), Bruno Paul
(1874-1968) e Bernhard Pankok (1972-1943), da Alemanha; Josef Franz Maria Hoffmann (1870-1956), Otto
Wagner (1841-1918), Josef Maria Olbrich (1867-1918) e Kolomann Moser (1868-1918), da Áustria; Antoni
Gaudí (1852-1926), da Espanha; Alphonse Maria Mucha (1860-1939), da República Checa; Louis Comfort Tiffany
(1848-1933), Louis Sullivan (1856-1924) e Frank Lloyd Wright (1867-1959), dos EUA.

- 18 -
VOCÊ SABIA?
O termo “formas desonestas” foi usado primeiro para denunciar as formas que não
respeitavam valores cristãos, verdade, honestidade, austeridade, simplicidade e integridade.
Mas com o desenvolvimento dos movimentos de reforma, passou a nomear as formas
históricas, rebuscadas, extravagantes e exageradas utilizadas para mascarar todos os tipos de
objetos industriais. Quando um crítico de design dizia que um determinado objeto possuía
“formas desonestas” era porque o objeto buscava ostentar mais do que exercer as suas funções
práticas desejadas do objeto, não respeitando os materiais, os processos de produção e as
funções de uso (FARIA, 2017).

Os artesãos, artistas, arquitetos e designers dos movimentos de reforma Jugendstil (alemão) e Secessionsstil
(austríaco) mantinham uma proximidade maior com os pensadores do movimento de reforma Arts and Crafts,
pois propunham o uso de formas derivadas da natureza, com o intuito de renovar tanto o design quanto a
sociedade. Artesania, ética, simplicidade, austeridade nas formas e respeito às propriedades dos materiais
produziram uma prática de surpreendente modernidade.
Henri van der Velde defendia firmemente a importância da educação para o desenvolvimento do design, da
indústria e da economia. Acabou assumindo, de 1904 até 1914, a direção da Weimer Kunstgewerbeschule
(Escola de Artes e Ofícios de Weimer), que mais tarde seria encampada como parte da Staatliches-Bauhaus (Casa
da Construção do Estado).

- 19 -
Fonte: BHASKARAN, 2010, p. 61; SCHNEIDER, 2010, p. 31; FLORES, 1992, p. 45-47; WITT-DORRING, 2017, p. 32-
43.

As contradições lógicas vividas pelos artistas, artesãos e designers dos movimentos de reforma estética trazem
uma questão que permanece até o tempo atual: qual a relação do designer com a mais valia introduzida na
matéria e forma dos produtos, seja artesanal, industrial, customizado, personalizado ou único? É certo que o
projeto que dá forma aos objetos, cada vez mais, é responsável pelo valor dos produtos, pois as matérias-primas
e os processos de produção, por si só, não são capazes de agregar nenhum valor à experiência. O conjunto
coerente de formas e funções é o que define o valor do objeto.

1.4.2 Wiener Werkstätte (1903-1932)


Em 1903, Josef Franz Maria Hoffmann e Kolomann Moser fundaram o Winer Werkstätte (Ateliê de Viena) com a
ajuda do empresário Fritz Wändorfer. O Wiener Werkstätte foi extremamente influenciado pelas ideias e pela
prática dos princípios estéticos desenvolvidos pelos movimentos de reforma Arts and Crafts, Jugendstil e
Secessionsstil. Nunca buscaram o confronto com a indústria, nem se interessaram em produzir produtos para o
consumo de massa, o que afastou claramente o Winer Werkstätte dos ideais sociais modernos.
No entanto, de acordo com Fahr-Becker (2008), o trabalho teórico e prático de Otto Wagner (1841-1918) – um
dos nomes mais importantes do movimento de reforma Secessionsstil – defendia uma arquitetura determinada

pela função, pelas propriedades dos materiais e pelo uso adequado das técnicas de construção. A defesa teve

- 20 -
pela função, pelas propriedades dos materiais e pelo uso adequado das técnicas de construção. A defesa teve
apoio de Adolf Loos (1870-1933), pois ele acreditava que o modernismo era baseado em uma visão do uso social
dos objetos e na linguagem austera do funcionalismo técnico.

Figura 9 - Edifício de exposições em Darmstadt, Alemanha, de Josef Maria Olbrich (1908); edifício de
apartamentos e lojas em Viena, Áustria, de Adolf Loos (1911); Casa Harley Bradley em Kankakee, EUA, de Frank
Lloyd Wright (1900).
Fonte: SCHNEIDER, 2010, p. 43; FLORES, 1992, p. 98.

VOCÊ O CONHECE?
Adolf Loos (1870-1933) foi um arquiteto austríaco que escreveu o ensaio “Ornamento e
Crime”, em 1908, manifesto no qual advogava pelas superfícies lisas e sem decoração. Para
saber mais sobre Loos, considerado um dos pais do funcionalismo técnico, consulte a edição
portuguesa desta obra, publicada em 2006 pela editora Cotovia, de Lisboa.

Junto com Gustav Klint (1862-1918) e Otto Wagner, o grupo acreditava na arte integral e na reforma das artes e
ofícios, produzindo peças com uma linguagem formal clara, ângulos retos e traços severos, os quais
contrastavam com os predominantes motivos florais. Dessa maneira, o quadrado ganhou destaque nos designs
gráfico, de mobiliário e de joias. Contudo, teve o mesmo destino do Arts and Crafts.

Síntese
Concluímos este estudo introdutório, que apresentou de forma sucinta as origens do campo de saber do design, a
formação e o uso do termo design, a fundação das primeiras instituições para promover e validar a prática do
campo, bem como das primeiras instituições de ensino de design. Também conhecemos a organização das
grandes feiras de exibição de produtos, os primeiros movimentos estéticos que influenciaram o design e os
principais teóricos e produtores de design no século XIX.
Neste capítulo, você teve a oportunidade de:
• acompanhar os processos históricos que geraram a formação do campo de saber do design e a sua
participação ativa na formação da cultura material;

• entender as inter-relações dinâmicas existentes entre o campo de saber do design, a sociedade, a

- 21 -
• entender as inter-relações dinâmicas existentes entre o campo de saber do design, a sociedade, a
cultura, a tecnologia e a economia;
• identificar e relacionar as transformações causadas pela Revolução Industrial com as disputas sociais, as
teorias estéticas do século XIX e a consolidação do campo de saber do design;
• reconhecer os processos de promoção dos produtos industriais nas grandes exposições;
• entender a formação dos sistemas de ensino de design;
• compreender como a Teoria do Gosto e a Teoria do Objeto Moralizante ajudaram a estabelecer as
principais teorias estéticas dos movimentos de reforma do século XIX;
• reconhecer e distinguir as ideias e as formas de pensar, os objetos e os principais autores do design do
movimento de reforma Arts and Craft;
• reconhecer e distinguir as ideias e as formas de pensar, os objetos e os principais autores do design do
movimento de reforma Art Nouveau;
• reconhecer e distinguir as ideias e as formas de pensar, os objetos e os principais autores do design do
Wiener Werkstätte.

Bibliografia
ADAMS, S. The Arts & Crafts movement. Londres: QUMA&C, 1998.
ANTHONY, B. Paxton’s Palace. London: Cassell, 1976.
ANTHONY, J. Joseph Paxton. New York: Shire, 2008.
APPLE, M. W. Ideología y currículo. Madrid: Ediciones Akal, 1986.
______. Knowledge, power, and education: the selected Works of Michael W. Apple. New York: Routledge, 2013.
______. Para além da lógica do mercado: compreendendo e opondo-se ao neoliberalismo. Rio de Janeiro: DP&A,
2005.
______. Política cultural y educación. Madrid: Ediciones Morata, 2001.
______. The New Technology: Is It Part of the Solution or Part of the Problem in Education? Computers in the
Schools, New York, v. 8, n. 1, p. 59-81, 1991. Disponível em: <https://www.learntechlib.org/p/143667/>.
Acesso em: 21/12/2018.
______; BURAS, K. L. et al. Currículo, poder e lutas: com a palavra, os subalternos. Porto Alegre: Artmed, 2008.
BHASKARAN, L. El diseño em el tiempo: movimientos y estilos del diseño contemporáneo. Madrid: Blume,
2007.
BUCHANAN, W. Mackintosh’s Masterwork: the Glasgow School of Art. EUA: Rutgers University Press, 2004.
BÜRDEK, B. E. Design: história, teoria e prática do design de produtos. São Paulo: Blucher, 2006.
BUTLER, S. Erewhon. Lisboa: Livros do Brasil, 2007.
CARDOSO, R. Uma introdução à história do design. São Paulo: Blucher, 2008.
DEMPSEY, A. Estilos, escolas & movimentos: guia enciclopédico da arte moderna. São Paulo: Cosac Naify, 2003.
EFLAND, A. D. History of Art Education: intellectual and social currents in teaching the visual arts. New York:
Teachers College Press, 1990.
FAHR-BECKER, G. Winer Werkstätte. New York: Taschen, 2008.
FARIA, J. N. de. As categorias filosóficas de Gilbert Simondon e suas relações com o objeto técnico do
campo de saber do design. Tese (Doutorado em Design) – Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, 2017.
FERGUSON, H. Glasgow School of Art: the History. Glasgow: The Foulis Press of the Glasgow School of Art, 1995.
FLORES, O. S. Historia del diseño industrial. México: Trillas, 1992.
FLUSSER, V. Filosofia da caixa preta. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002.
FORTY, A. Objetos de desejo: design e sociedade desde 1750. São Paulo: Cosac Naify, 2007.

GERMINAL. Direção: Claude Berri. Produção: Renn Productions, DD Productions, Alternative Films, Nuova Artisti

- 22 -
GERMINAL. Direção: Claude Berri. Produção: Renn Productions, DD Productions, Alternative Films, Nuova Artisti
Associati Italie. França/Itália/Bélgica, 1993, 160 min. Disponível em : <http://cinetvx.com/pt/assistir-germinal-
1993-online>. Acesso em: 20/12/2018.
GIRARDI, E. P. Atlas da questão agrária brasileira. Disponível em: <http://www2.fct.unesp.br/nera/atlas
/caracteristicas_socioeconomicas_b.htm>. Acesso em: 21/10/2018.
HAMBER, A.; HUNT, T. Photography and the Great Exhibition. London: V. & A. Publication, 2018.
HAUFFE, T. Design: a Concise History. New York: Barron’s, 1998.
JONES, O. A gramática do ornamento. São Paulo: Senac-SP, 2010.
KNOWLES, R. Carlyle, Ruskin and Morris: Work Across the ‘River of Fire’. History of Economics Review, out.
2011. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication
/45363057_Carlyle_Ruskin_and_Morris_Work_Across_the_%27River_of_Fire%27>. Acesso em: 21/12/2018.
KUHN, T. S. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 2013.
LÖBACH, B. Design industrial: bases para a configuração dos produtos industriais.São Paulo: Blucher, 2001.
LOOS, A. Ornamento e crime. Lisboa: Cotovia, 2006.
MACAULAY, J. Glasgow School of Art Aid. London: Phaidon Press, 2002.
MEGGS, P. B. História do design gráfico. São Paulo: Blucher, 2009.
PAXTON, J.; FOX, C. Crystal Palace: Joseph Paxton and Charles Fox. London: Phaidon Inc Ltd, 1994.
PEVSNER, N. Origens da arquitetura moderna e do design. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
SCHNEIDER, B. Design, uma introdução: o design no contexto social, cultural e econômico. São Paulo: Blucher,
2010.
SIMONDON, G. Du mode d’existence des objets techniques. Paris: Editions Aubier, 2005.
SMITH, A. A riqueza das nações. v. 1-2. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2010.
TORRENT, R; MARÍN, J. M. Historia del diseño industrial. Madrid: Cátedra, 2005.
VILLAS-BOAS, A. Identidade e cultura. Rio de Janeiro: 2AB, 2002.
WITT-DORRING, C; STAGGS, J. Winer Werkstätte: 1903-1932 the luxury of beauty. Munich: Prestel Publishing,
2017.
WOODHAM, J. M. A Dictionary of Modern Design, New York: Oxford University Press, 2004.

- 23 -

Você também pode gostar