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Prólogo

Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Epílogo
Ele acredita que foi enganado por ela.
Ela decide manter sua gravidez inesperada em segredo!
Aos 37 anos, Louis Vittileno chegou no momento mais crucial
de sua vida: assumir a liderança da empresa da família. Um típico
italiano arrogante que sabe seu potencial para os negócios e para
as mulheres, mulherengo e conhecido por nunca ter
relacionamentos duradouros, Louis acredita que as mulheres só se
interessam por seu dinheiro e que nunca conseguirá encontrar um
grande amor.
Bianca Baptista, é a mais nova secretária do futuro presidente
das indústrias VITTILENO. Tímida desde pequena, nunca conseguiu
se relacionar com outros rapazes ou se permitir viver uma paixão, o
bullying que sofreu ainda adolescente machucou seu coração e a
encheu de inseguranças.
Ao se conhecerem na festa da empresa, um não faz ideia de
quem o outro seja, a atração explosiva resulta na primeira vez de
Bianca e em um coração partido ao acordar no dia seguinte e ver
um bolo de dinheiro no lugar que Louis deveria estar.
A convivência entre os dois na empresa é insuportável, Louis
não confia em Bianca, e ela não consegue o perdoar por humilhá-la.
Mas a química entre eles falará mais alto e quando o casal parece
estar aceitando os sentimentos que nutrem um pelo outro, uma
reviravolta coloca tudo a perder.
Bianca é acusada de traição.
Louis, com o seu cargo como futuro presidente na empresa
ameaçado.
Com a rejeição e o coração partido, ela esconde dele que
engravidou e vai embora sem olhar para trás. Quando Louis se
depara com a verdade e percebe os perigos que os rondam, não
tem outra alternativa a não ser manter a mulher que ele ama longe
para que ela fique segura. Sem fazer ideia de que ela espera sua
filha, quando descobre a verdade ele terá de reconquistá-la
enquanto ela nega que a filha é sua.
Uma gravidez inesperada seria o suficiente para acabar com
as mágoas e unir o jovem casal que nunca vivenciaram o amor?
Prólogo

Ando de um lado para o outro enquanto Bianca permanece


deitada na cama do hospital, estou furioso por ela ter escondido a
gravidez e mais ainda por saber que isso é culpa minha. Fui eu
quem a afastou e a manteve longe, porém, mesmo com todos os
problemas eu poderia ter feito mais, garantido que ela e nosso bebê
não passassem dificuldades e um maldito caso de pré-eclâmpsia
fosse desenvolvido. A partir de hoje, ela não vai levantar um
músculo nem para beber água, maldita mulher teimosa que não me
procurou!

— Se você sequer ousar gritar com ela — Olivia me encara


impaciente, é a terceira vez que ela briga comigo —, quem vai te
manter longe serei eu, Bianca não pode se irritar mais.

— Eu sei — rosno.

Bianca se mexe na cama e aos poucos abre os olhos, seguro


sua mão e encosto minha testa na dela, louco de saudade e aliviado
por ela ter despertado.
— Oi — digo, carinhoso, ela franze a testa e tenta se afastar,
mas não deixo. — Já ficamos longe tempo demais, vou encurtar
nossa distância até você se acostumar comigo de novo.

— Saia — ela rosna e tenta me empurrar, mas não deixo.

— Nunca mais.

Envolvo seu corpo em meus braços e respiro aliviado por tê-la


comigo depois de tanto tempo. Não consigo evitar que meus olhos
lacrimejem enquanto inspiro seu perfume e tenho a maciez de seus
cabelos contra meu rosto, o corpo escondido dentro do meu abraço.
Sua respiração pesada em meu pescoço e as mãos contra meu
peito apertadas em punhos, sinto quando minha camisa molha com
as lágrimas dela.

— Eu nunca mais vou te largar, meu dolce. — Beijo seu


pescoço, incontáveis vezes, enquanto ela soluça e tenta me
empurrar, no entanto, não vou ceder. — Não adianta me empurrar,
ainda não consegui matar a saudade que senti nesses meses.

— Você continua me machucando, por favor, pare — ela


soluça, suas palavras batem fundo dentro de mim, aperto meus
braços ao seu redor.

— Me matou estar longe e fingir que eu não me importava


quando tudo que eu queria era correr de volta para você e implorar
pelo seu perdão, leve o tempo que você precisar para que minha
presença não te cause mais dor. — Seguro seu rosto e beijo seus
cabelos, inspirando seu cheiro doce que sempre me acalma. — Vou
cuidar de você e do nosso bebê.

— Não é seu — ela diz e me afasto, sem compreender o


significado de suas palavras.

— O que disse? — Me sento na cama, por um segundo meu


sangue gela.

— O bebê não é seu, não tem motivos para você continuar


aqui, vá embora. — Desvia o olhar, ela pode estar vermelha de
raiva, mas a emoção na sua voz não me engana.

— Mentira — acuso, aperto os punhos e olho para a Olívia,


que desvia o olhar. Ela sabe a verdade e não quer me dizer.

— Naquela noite eu fiquei com raiva de você, fui para um bar


e transei com um estranho, o bebê não é seu. — Aperta as unhas,
sua voz trêmula e cheia de medo.

— Você mente muito mal, Bianca.

— E você não tem o que fazer aqui — acusa e, finalmente,


me olha, a decepção por não ter acreditado nela estampada em seu
rosto.
— Desde que nos conhecemos eu fui um babaca com você,
não acreditei quando me falou que era virgem e tirei conclusões
precipitadas. — Seguro suas mãos geladas e trêmulas, o bolo na
minha garganta me impede de falar, vibro as cordas vocálicas,
tentando recuperar a voz. — E mais uma vez parti seu coração
quando não te dei o benefício da dúvida e não busquei provar que
aquele dossiê era mentira, ao invés de explodir com você e dizer
aquelas coisas horríveis.

— Foi por isso que você disse: “Deve ter sido por isso que
Fernando fez aquilo com você, ele já sabia desde o início a puta que
você era.” — O gelo em seus olhos ao recitar minhas palavras me
quebra e não consigo mais segurar o choro. — Você sempre achou
que eu era uma puta, pois fui lá e me tornei uma, transei com um
qualquer e engravidei.

— Você quer me magoar como eu te magoei. — Aperto as


mãos dela, o choro nubla minha visão e a dor por ser o responsável
de toda essa amargura e ressentimento se torna insuportável. —
Mas dessa vez nada mudará o que eu sei e acredito, esse filho é
meu. — A encaro de perto, prendendo seu olhar com o meu. —
Dessa vez, eu vou confiar em você, na pessoa que eu amo e
mesmo que você negue e invente a história que quiser. Eu confio
em você — dou ênfase nas últimas palavras para que ela sinta o
impacto do que quero dizer.
Bianca não me responde e explode em um choro intenso e
doloroso, seguro sua cabeça contra meu ombro e deixo que ela
chore o quanto quiser, enquanto repito em seu ouvido que tenho
certeza de que o bebê é o meu filho. Ainda não toquei sua barriga,
embora minhas mãos cocem para sentir meu bebê pela primeira
vez, eu me contenho e, por enquanto, aproveito a trégua que ela me
deu ao deixar que eu a conforte. Com essa ação, desfruto da
sensação que é tê-la em meus braços, mesmo que nesse momento
ela esteja me odiando.

— Nós dois caímos em uma armadilha. — Tento manter


minha voz firme, mas é difícil quando tudo dentro de mim está se
estilhaçando enquanto a dor dela me preenche. — Mas não
podemos deixar que essas pessoas vençam, é a nossa vida,
Bianca, nosso bebê, se ficarmos presos ao passado nunca
poderemos seguir em frente e ser felizes.

— Você vai continuar me magoando na primeira oportunidade


em que desconfiar de mim. — Ela se afasta e meu rosto arde com a
força do seu tapa. — Como tem coragem de dizer que eu caí na
armadilha? — Descontrola-se e seus tapas vêm com mais força
contra meu corpo, deixo que ela desconte a sua fúria. — Eu sempre
confiei em você.

— Bianca para. — Olivia segura a irmã que se descontrolada


nos braços dela. — Saia daqui, Louis.
Ela grita comigo e acordo do torpor, Bianca não pode se
estressar e no momento estou causando o oposto nela. O bip dos
aparelhos que medem seus sinais vitais se altera, os números
piscando em vermelho enquanto Bianca começa a passar mal
devido às fortes emoções.
Capítulo 1

— Levanta logo, seu stronzo. [1]— Chuto meu irmão, fazendoo


cair da cama, o cheiro de bebida é insuportável dentro do quarto.
Olho para a porta e com pesar vejo o pequeno Lorran
segurando seu ursinho de pelúcia enquanto chupa o sorvete que dei
a ele. Não era para ele estar presenciando essa cena deplorável,
meu sobrinho só tem dois anos e durante sua curta vida de bebê
presenciou vezes demais o pai bêbado pela casa, depressivo e
imprestável. Eu queria ser um tio melhor e não deixá-lo aos
cuidados das babás, que foram muitas ao longo dos anos, elas
sempre desistem depois de quatro meses, no máximo, por não
aguentarem a bebedeira e os escândalos que o Levi faz.
— Stronzo. [2]— Lorran faz careta e vai embora, tenho certeza
de que ele odeia o pai nesses momentos.
Sua primeira palavra foi stronzo, carrego a culpa de ele ter
aprendido isso comigo, de tanto que digo com o Levi nas vezes em
que venho aqui verificar se esse inútil está vivo. O pequeno Lorran
sai cantando pela casa, jogando os ursinhos no chão e depois
começa a chorar, frustrado e triste por não receber amor daquele
que deveria cuidar e o proteger.
— Eu vou te arrebentar se você não acordar agora! — grito
com o Levi que permanece deitado no chão, parecendo que está em
coma.
Rosno irritado, temos um voo para pegar dentro de duas
horas, chego à casa desse inútil para levá-lo ao aeroporto junto de
Lorran e o sacana está bêbado com uma garrafa de uísque ao seu
lado e desmaiado. Rezo a Deus para que a mudança de ares faça
bem ao Levi e ele consiga reagir, que possa voltar a ser o artista que
ele era cheio de vida e apaixonado. Presenciar meu irmão desse
jeito acaba comigo e me enche de fúria, ele não podia ter acabado
desse jeito, principalmente por causa do pequeno Lorran que não
tem uma figura materna em sua vida, um péssimo pai e um tio
workaholic que não pode suprir sua carência emocional.
Desistindo de acordar o Levi, pego seus braços e o arrasto
para o banheiro, você quer dificultar minha vida, seu desgraçado,
pois eu vou fazer o mesmo com você, nada de delicadeza com um
idiota feito você. O arrasto até a banheira e o jogo dentro, no
processo ele bate a cabeça na borda e geme, por sorte não cortou,
tenho que tomar cuidado, não é como se eu quisesse matá-lo... pelo
menos não ainda, Lorran precisa que seu pai tome juízo e volte ao
normal.
Ligo o chuveiro e sorrio ao ver como isso o faz acordar, ele
abre os olhos e tosse enquanto limpa o rosto desesperado
buscando por ar e sem entender o que aconteceu. Quando ele tenta
sair da banheira, seguro-o, estou me molhando todo, mas isso não
importa agora. Levi percebe que sou eu quase o afogando e me
olha com ódio nos olhos, estou acostumado com esse sentimento
esse último ano, pois tenho o perturbado com mais frequência e não
o deixando cair na depressão de vez.
— Cazzo[3], Louis!
— Acordou, Bela Adormecida? — Levi joga água em mim, em
resposta afundo a cabeça dele dentro da banheira e o vejo se
desesperar. — Isso é por ter feito o Lorran presenciar outra situação
decadente sua!
— Maledetto, Louis — ele me empurra para longe e deixo
[4]

que saia da banheira —, vá se foder, seu stronzo.


— Temos um voo em menos de uma hora e meia, tome um
banho enquanto arrumo suas malas. — Saio do banheiro e o deixo
me xingando.
Costumava ter mais paciência com o Levi, mas ultimamente
estou ficando sem nenhuma com seu nível de babaquice tão alto.
Antes ele ainda olhava para o Lorran e tentava alguma interação
com o garoto, mas a depressão infelizmente o pegou e ele não
consegue enxergar ninguém ao seu redor. Sua recusa em fazer o
tratamento só tem piorado seu estado, meu irmão não merece
passar por isso e meu sobrinho precisa de mais. Espero que no
Brasil eles possam se achar e um enxergar o outro.
Eu, sou Louis Vittileno, tenho 37 anos, nasci e fui criado em
Milão na Itália, sou o herdeiro da quarta geração dos Vittileno e
carrego em meu sangue uma linhagem respeitada e admirada por
toda a Itália e no Brasil. Os Vittileno possuem a maior indústria têxtil
do mundo, em constante expansão para outros ramos do mercado e
em breve tudo isso será oficialmente meu. Mas antes tenho que
provar para os acionistas brasileiros que sou capaz de conduzir o
império da família sem cometer erros que nos levem a falência,
como o maldito Cavalcante gosta de apontar, ele pode ser um
grande acionista, mas é a maior pedra no meu sapato.
Meu pai, Enrico, conseguiu grandes feitos na nossa empresa,
expandindo nossos negócios para a produção de bolsas e calçados,
garantindo nosso lugar no mercado da moda, mais uma vez, e
fazendo nossos produtos serem disputados pelas grandes estrelas e
socialites da alta sociedade. Todos querem usar e vestir um VTD,
como o herdeiro e próximo líder desse império tenho que mostrar
que não sou um playboy mimado ou irresponsável, passei anos me
preparando para isso e estou indo para o Brasil deixar claro que
somente eu sentarei na cadeira de presidente das empresas
Vittileno.
— Zio. [5]— Lorran me chama, os olhos cheios de lágrimas. —
Levi mal.
Lorran nunca chamou o Levi de pai, sempre se refere a ele
pelo nome e isso me entristece, ele só tem dois anos e não deveria
passar por isso. Pego meu pequeno anjinho nos braços, Lorran é a
cara do pai, cabelos loiros e olhos azuis como todos da nossa
família, o rosto redondo e as bochechas fofinhas. Ele come muita
comida industrializada e, às vezes, assalta os doces da geladeira,
sem supervisão capaz de o controlar, é difícil manter hábitos
saudáveis.
— Oi, meu piccolo[6]. — Beijo sua cabeça enquanto o levo
para seu quarto, sua babá já deixou suas coisas arrumadas, mas ele
precisa de um banho antes de sairmos, se sujou todo com o sorvete.
— Vamo pa onde? — pergunta e aperta meu nariz para que
eu o responda com a voz fanha que ele gosta.
— Brasil.
— Basil — me imita, falando do seu jeitinho de bebê.
— Isso, vamos tomar um banho para podermos pegar o avião.
— Vião. — Levanta os braços animado e começa uma
pequena dancinha, Lorran costuma me acompanhar, às vezes, em
minhas viagens, quando tenho tempo para ficar com ele e o
imprestável de seu pai precisa ir junto.
Levi pode ser um inútil hoje em dia, mas antes ele era alguém
de grande importância para a empresa, requisitado em várias
reuniões e sempre admirado por suas ideias, se não fosse a
tragédia, meu sobrinho teria o melhor pai do mundo e eu ainda
poderia contar com meu irmão mais novo me dando apoio e
confiança quando me sinto inseguro.
Ele sempre foi meu parceiro de crime, estivemos juntos em
todos os momentos, bons e ruins, era o Levi que me ajudava a
socializar com as pessoas, que fazia eu me divertir durante meus
estudos e sempre conseguia colocar limites em meu vício pelo
trabalho. Sinto falta de ter meu parceiro comigo e por mais que eu
tente tirá-lo do poço em que se meteu, sozinho não consigo fazer
nada. Torço para que o Brasil seja o remédio que meu irmão precisa
e o faça voltar a viver.
Dou o banho no Lorran e o deixo arrumado na sala assistindo
TV, minha roupa está um caos de tão suja, vou para o quarto do
Levi onde o encontro se vestindo, ao menos a barba ele teve a
decência de fazer. As bolsas pretas embaixo de seus olhos são
resultado de dias sem dormir direito, o rosto magro e as roupas
folgadas, ele perdeu peso e está abatido. Uma sombra do homem
que ele foi um dia.
— Você é um idiota — me xinga.
Ignoro seu xingamento e pego sua mala jogando dentro dela
roupas sem nem olhar direito o que estou pegando. Quando termino
pego um terno e o visto.
— E você um stronzo que não cuida do próprio filho, por isso
mesmo que esteja me mudando a trabalho tenho que te levar junto
por medo da merda que você pode fazer sozinho. — Aperto os
punhos, uma lembrança querendo me atormentar.
— Eu não vou fazer isso de novo. — A tristeza em sua voz,
mesclada ao arrependimento são as únicas coisas que me
confortam, ao menos ele se arrepende.
— Então, cuide de comer alguma coisa, estamos de saída.
Fecho sua mala e a levo para a sala. Dessa vez, ele não
demora muito e logo estamos de saída para o aeroporto, vou usar o
avião da empresa. Ao lado da escada para o embarque nosso pai
nos espera.
— Mio piccolo! — Abre os braços e segura o Lorran, fazendo
o pequeno rir nos braços do avô babão.
— Nonno. — Ri ao ser levantado acima da cabeça do avô.
— Bom dia, pai — Levi cumprimenta e entra na aeronave sem
esperar resposta.
Meu pai me olha triste e aperto sua mão antes de entrarmos
juntos, já na aeronave sentado de frente para o homem que mais
respeito espero por suas palavras.
— Louis, mio primogênito, não faz ideia do quanto esperei
para poder te ver assumindo a presidência da empresa, você é o
melhor CEO que temos e não me restam dúvidas de que fará um
trabalho excepcional nas indústrias VITTILENO. Vamos com tudo
mostrar aos acionistas brasileiros o que os italianos já sabem, Louis
Vittileno é mais do que capaz de ser o próximo presidente.
— É uma honra ouvir isso do senhor, pai.
— A honra é minha de ter filhos tão incríveis, por favor, cuide
do seu irmão e o ajude a sair desse poço.
— Vou cuidar — prometo a ele e a mim, meu irmão vai sair
dessa.
Com as palavras de encorajamento do meu velho, eu estufo o
peito e me preparo para a batalha final da longa trajetória que
percorri para a cadeira da presidência. Não tenho dúvidas de que no
final sairei vitorioso, pode vir Brasil, estou pronto para você.
Capítulo 2

Eu vou morrer virgem!


Estou entrando em colapso nervoso desde que percebi que já
tenho 23 anos e nunca consegui dar umazinha, nem mesmo uma
rapidinha, nada de nada e isso é tudo culpa minha, tenho plena
consciência disso. Sou um fracasso como mulher sexy, terrivelmente
tímida para me envolver com homens que demonstrem interesse em
mim, pois sempre acho que eles estão brincando com minha cara e
não querem realmente se envolver comigo, ou que estão fazendo
alguma aposta e vão partir meu coração.
Não quero mais viver assim, foram mais de dez anos lutando
contra o bullying na adolescência, depois aconteceu o mesmo na
faculdade e eu só quero me jogar dentro de um poço. O que custava
um carinha legal olhar para mim e pensar: “nossa, essa menina é
legal, bem que podíamos namorar”, mas essas malditas coisas só
acontecem nos filmes e livros. E não é que eu seja um ímã
antihomem, só que é muito difícil perder a insegurança e acreditar
que alguém se interessou por mim.
Semana passada, fui com minha irmã à feirinha que tem na
cidade, enquanto esperava meu pastel com caldo de cana ficar
pronto, um rapaz que estava atrás de mim começou a puxar
conversa com a minha irmã e pediu o número dela, mas Olivia o
rejeitou e o cara de pau nem pensou duas vezes antes de começar
a falar comigo e pedir o meu número. Poxa, estava naquela fila junto
da Olivia, mas ele a viu primeiro e ao ser rejeitado quis tentar algo
comigo. O bolo subiu forte na minha garganta ao ser usada como
segunda opção, se ele queria o meu número poderia ter falado
antes comigo. Situação assim acontecem mais vezes do que posso
contar e esse sentimento é uma merda completa.
É difícil ter a autoestima elevada ou minimamente decente
quando passei tanto tempo me decepcionando com os homens e a
forma como eles me veem, sempre como a segunda opção, um
joguinho que podem brincar e descartar quando acham coisa
melhor. Eu, sou Bianca Baptista, tenho 23 anos, formada em
administração e com pós-graduação em administração de empresa,
vou ganhar três mil reais por mês com direito a bônus e plano de
saúde. E isso é só o salário inicial, com chances enormes de crescer
dentro da empresa e ganhar muito mais. E esse será o meu ponto
de virada, a chance que vai mudar a minha vida e farei isso
acontecer.
Escutei a vida inteira do meu pai que eu deveria ser uma boa
aluna, focar nos estudos e que isso mudaria a minha vida, foquei
tanto nos estudos que esqueci de viver. Cresci presenciando as
decepções amorosas da minha irmã e como resultado, estou
empregada como secretária do futuro presidente da maior empresa
têxtil do Brasil e Itália disputando mercado mundial com as mais
maiores empresas do ramo, sem um único namorado, tendo beijado
somente 20 vezes, quem diabos com 23 anos beija somente 20
vezes? E com a virgindade intacta, só levei dedada uma vez na vida
e tenho ódio da pessoa que fez isso, fazendo com que eu tomasse
mais cuidado ainda com quem me envolvo.
Eu sou um sucesso na minha vida profissional e um fracasso
na amorosa. É por isso que decidi, o próximo carinha que eu me
interessar, não precisa ser nenhum príncipe, basta ele querer algo
comigo e eu vou ter a minha primeira vez, chega de procurar pelo
amor, se ele quiser me encontrar um dia que seja sem eu estar
enlouquecendo comigo mesma para isso acontecer. E me recuso a
morrer virgem!
Aliso meu vestido risca de giz preto pela milésima vez, ainda
tenho dificuldade em me olhar no espelho e não procurar defeitos no
meu corpo, por mais que eu trabalhe a minha autoestima todos os
dias o bullying que sofri marcou fundo a minha alma. Mesmo após
dois anos intercalando entre academia e dieta, tendo perdido mais
de 10kg, eu não consigo olhar para o espelho e não me incomodar
com algo ou ficar triste lembrando as piadas que ouvia por causa do
meu corpo. Hoje é o meu grande dia, não posso me abalar por
traumas do passado, agora vou olhar somente para o futuro.
Respiro fundo e prendo o cabelo em um rabo de cavalo elegante,
usando gelatina para manter os fios nos cantos, passo meu lip tint
rosa, minha make completa é totalmente leve e bastante natural.
Faço uma maquiagem leve, só para cobrir as olheiras pretas e
realçar minha pele e olhos, um lip tint na boca dando um rosado
natural aos meus lábios, aprendi a me maquiar com muitos tutoriais
no YouTube, mas ainda não consigo fazer nada pesado ou com
muitas cores, sempre fico no básico e natural, pois tenho medo de
ficar parecendo uma palhaça e passar vergonha. Borrifo perfume,
prendo o cinto branco na cintura, pego minha bolsa, calço os saltos
e saio do meu quarto. Meu pai toma café na cozinha, enquanto
minha irmã é uma pilha de nervos lavando a louça, hoje ela começa
no novo emprego também e está nervosa.
— Você está linda — papai me elogia e sinto minhas
bochechas queimando, não estou tão bonita assim.
— Nossa, Bibi — Olivia larga os pratos e me encara sorrindo
—, perfeita!
— Não é para tanto. — Deixo a bolsa na cadeira e me sento
para tomar café.
— É para tanto! — Ela se senta ao meu lado e apoia a mão
no queixo. — Você tá ficando mais linda a cada dia que passa.
— Culpa da maquiagem. — Beberico meu café, o bom de
usar lip tint é que você pode comer o quanto quiser que ele não sai
e nem borra.
— Um dia você vai perceber o quanto é linda. — Alisa minha
orelha e volta para sua louça.
Não importa o quanto digam que sou bonita, eles são minha
família, é natural nos achar bonitos. Por exemplo, meu pai é robusto
e deixa essa barba horrível crescer, mas ainda o acho lindo, pois é
meu pai. Olivia fica parecendo uma modelo quando se arruma, em
casa ela fica toda despojada e continua linda, coisa que nunca
consigo. Eu sou normal, nem linda demais como a Olivia e nem feia,
só normal.
Termino meu café da manhã e me despeço de todos, o metrô
não fica muito longe da minha casa, para minha sorte, caminho
pouco, mas com muita dificuldade nessas calçadas de São Paulo,
tenho ódio delas com todas as minhas forças e terei de pegar dois
trens para chegar à empresa. No metrô, vejo muitas mulheres
arrumadas como eu, mas usando sapatilhas ou tênis, as bolsas
grandes o suficiente para guardarem um salto e uma ideia estrala na
minha cabeça, não vou ficar sofrendo com meu salto alto a partir de
amanhã, vou usar um calçado confortável para me locomover e
antes de chegar à empresa, eu calço o salto.
Eu deveria ter pensado nisso antes, às vezes me questiono
meu título de laureada da minha turma de faculdade. Horas trancada
estudando e fritando meus miolos valeram a pena, tenho quase
certeza de que foi isso que me garantiu a vaga na VITILLENO. Após
uma longa hora, trocando de trem e andando mais um pouco chego
em frente ao grande prédio da empresa, espelhado e moderno, com
meu crachá passo pelas catracas, respiro fundo várias vezes. Agora
que estou aqui meu coração está quase saindo pela boca.
No andar presidencial, o último do prédio, existem somente
duas salas, uma do atual presidente, Enrico Vittileno, e a outra do
futuro presidente que chegará amanhã ao Brasil, Louis Vittileno. Eu
serei a secretária do filho. Marta está sentada em sua mesa, ambas
ficam uma de frente para a outra antes das respectivas salas. O
lobby é enorme e muito bem decorado nas cores bege e branco,
plantas nos cantos da sala, iluminação embutida, clareando todo o
ambiente, e a enorme janela na parede oposta ao elevador, as salas
ficam à direita do presidente e à esquerda do futuro presidente.
Acho que o certo seria chamá-lo de vice-presidente
atualmente, Enrico enfatizou tanto que ele seria o futuro presidente
que acabou me passando despercebido que, na real, ele é o
vicepresidente.
— Bom dia, Bianca. — Marta me cumprimenta, me sento à
minha mesa e sorrio para ela, o estômago revirado e revoltado de
ansiedade.
— Bom dia, Marta. — Tento controlar minha voz para não
parecer ansiosa demais. — Chegou cedo.
— Sempre chego vinte minutos antes do horário, nos últimos
trinta anos isso me garantiu um bônus generoso — arqueia a
sobrancelha e eu pesco sua dica —, finalmente vou me aposentar.
— Espreguiça-se e eu sorrio ao ver a felicidade em seu semblante.
— Espero que tenha uma ótima aposentadoria.
— Tive preciosos anos nessa empresa, consegui formar meus
dois filhos e hoje ambos são concursados do Estado e Federal na
polícia, meus netinhos estão se preparando para o ensino médio e
eu vou viajar muito com meu marido. Só tenho a agradecer ao
senhor Enrico por ter sido um excelente chefe.
— Espero que o Louis seja assim também. — Quase morro
de ansiedade só de pensar que ainda não o conheço e que amanhã
seremos oficialmente apresentados na festa da empresa.
— O garoto Louis é tão esforçado quanto o pai, sei que vão se
dar bem. — Ela liga o computador e com isso percebo que nossa
conversa foi encerrada.
Ligo o meu e respiro fundo novamente e, em seguida, me
concentro nos gráficos à minha frente, tenho que fazer um relatório
referente às vendas dos últimos seis meses dos tecidos para a Ásia,
e quais os países que mais compraram e deram retorno financeiro
para a empresa.
Esse emprego é tudo pelo que lutei e vou dar o meu melhor
todos os dias para continuar aqui, só espero que o Louis Vittileno
seja um bom chefe e não me enlouqueça. É o fim da era da Bianca
Baptista tímida e virgem, agora sou uma nova mulher, decidida e
que perderá a virgindade em breve, só não sei com quem ainda,
mas isso eu decido depois.
Capítulo 3

Lorran está apaixonado pela cidade paulista, não para de


pular pelo apartamento e falar que quer ir passear. Ele não entende
uma palavra em português, mas faz bico pedindo para o ensinar. O
piccolo mal fala italiano ainda e já quer aprender outro idioma,
parece comigo quando tinha a sua idade, não que me lembre de
quando tinha dois anos, mas sei que desde pequeno meu interesse
por outras línguas foi despertado cedo, minha mãe dizia que aos 10
anos eu já falava fluente inglês e italiano e ficava a perturbando para
me ensinar francês.
Minha mãe, tenho muita saudade dela, sempre que me
lembro dos nossos momentos fico triste, a perdi quando tinha 15
anos em um acidente de carro. Ela estava voltando para casa
quando o motorista perdeu o controle do volante na estrada chuvosa
e bateu o carro em uma árvore, quando o socorro chegou o
motorista já tinha falecido e minha mãe estava gravemente ferido,
passou 20 dias internada e depois faleceu. Foram os dias mais
tenebrosos de nossa família, meus irmãos ainda eram muito
pequenos, principalmente a Lira, ela mal se recorda da nossa mãe.
Minha piccola Lira, de nós três ela é a mais independente,
mora nos Estados Unidos trabalhando como produtora de uma
emissora de televisão, atualmente sei que ela tem trabalhado em um
projeto de uma série Teen que é adaptação de um romance de
sucesso mundial. Tenho saudades da piccola, sempre vou vê-la
como a minha irmãzinha querida que precisa ser protegida, mesmo
sabendo que ela não precisa de mim para nada. É meu grande
orgulho essa menina e mal posso esperar para a ver novamente.
— Zio, andiannnmo a fare una passeggilalla. — Tenho
[7]

vontade de rir pela fofura que é o Lorran falando errado, sua língua
ainda trava nas palavras com “N” e ele se esquece de como
terminar as que são muito grandes.
— Não é assim, Lorran, o certo é “andiamo a fare una
passeggiata[8]. — Pego no colo, sua roupa está toda bagunçada e
fora da calça.
A babá italiana não aceitou vir para o Brasil conosco, pois ela
tem família e não iria deixá-los, o que é bastante compreensível. Só
de imaginar vir para cá sem meu piccolo já me parecia um pesadelo.
Sou muito apegado à nossa família, cresci assim e herdei isso da
minha mãe. Nosso pai sempre esteve fora viajando, mas nunca
perdeu uma data comemorativa, aniversário ou premiações e
apresentações na escola, ele foi presente mesmo em sua ausência.
Todas as noites fazia chamadas com cada um de nós antes de
dormir e fazia questão de saber como foi o nosso dia.
Eu tinha certeza de que Levi seria desse jeito, de nós três ele
sempre foi o mais apaixonado, dedicado à sua arte e aos momentos
em família, a tragédia em sua vida mudou meu irmão e agora não
sei mais o que fazer para que ele volte a ser quem era. Terapia não
funciona, pois ele não faz, tenho que pensar em algo, Lorran precisa
do pai e eu do meu irmão.
— Andiamo. [9]— Lorran pula e bate palmas, empolgado para
sair.
Vou aproveitar que hoje é meu último dia antes de iniciar na
empresa e passar com meu sobrinho. Dou banho no Lorran e o
deixo arrumado na sala assistindo desenho, enquanto vou para o
quarto do Levi, o encontro deitado na completa escuridão, são
quatro horas da tarde, mas ele faz parecer como se fosse meianoite.
— Estou saindo com o Levi, vamos? — Bato em sua perna,
fazendo-o acordar.
— Você vai me deixar em paz se eu for? — A voz rouca e
baixa, ele passou o dia chorando novamente.
— Deixarei pelo resto da noite.
— Cazzo — reclama, mas ao menos sai da cama.
Uma vitória para o Brasil, na Itália eu não conseguia retirá-lo
da cama sem uma boa briga antes. Deixo-o se arrumando e vou
fazer o mesmo, pretendo levar o Lorran ao shopping e depois vamos
jantar com o meu pai. Para a minha surpresa, quando chego à sala
vejo Levi olhando Lorran brincando com seu iPad, fico escondido no
corredor observando a cena, os olhos do meu irmão se enchem de
lágrimas e ele os cobre com as mãos. Lorran percebe o pai nesse
momento e o vê chorando, a cena que se desenrola à minha frente
me deixa emocionado.
Lorran segura a mão de Levi e o faz se abaixar, coloca o iPad
na mão do pai e liga uma musiquinha para crianças e começa a
dançar e bater palminhas, Levi sorri para o filho e com lágrimas em
suas bochechas, ele começa a bater palmas também e balançar a
cabeça. Levo minha mão aos meus olhos e enxugo as lágrimas que
insistem em descer, em dois anos essa é a primeira vez que vejo
Levi sorrir para o Lorran, do mesmo jeito que é a primeira vez que
Lorran se preocupa em fazer o pai parar de chorar. Não sei o que
ele pensou o dia todo, mas espero que esse momento não seja uma
raridade e que o Levi esteja, finalmente, começando a querer voltar
a viver.
— Vamos? — Levi estende a mão para o Lorran, que a
segura sorrindo para o pai, meu piccolo só quer o carinho e atenção
de seu progenitor.
— Levi, você tá bien? — pergunta, os olhinhos preocupados.
— Sim, e você? — responde, mas não para de chorar.
— Tambum, não clhola, eu te dou popolate. — Pega um
[10]

bombom que ele guardou em cima da mesa da sala e estende para


o pai.
— Obrigado, já me sinto melhor. — Levi desembrulha o doce
e come metade a outra ele dá ao Lorran.
— Zio! — grita, me chamando, enxugo meu rosto para que
eles não vejam que eu estava escondido, presenciando o momento
deles, e entro na sala.
— Vamos passear?
— Bolha. — Pula animado, segura a mão do pai e depois a
minha e nos puxa para a porta.
Levi engole o choro quando saímos do apartamento. Vamos
para o shopping e a união entre pai e filho dura só até Lorran se
maravilhar com o espaço para crianças. Meu sobrinho começa a
correr e a pular, Levi fica calado, observando o filho brincar, mas não
interage mais com ele, é como se tivesse se transformado em um
fantasma. O deixo quieto, já foi muito o avanço de hoje e vou brincar
com o Lorran nas máquinas de jogos e de pegar ursinhos, ele fica
louco por um elefante e me faz gastar quase cem reais com a
máquina que suga meu dinheiro até eu conseguir pegar a pelúcia.
Após uma tarde divertida, vamos encontrar meu pai em um
restaurante de culinária italiana. Podemos sair da Itália, mas a Itália
nunca sairá do nosso paladar. Ele nos espera em uma mesa
reservada, Lorran ao ver o avô se joga em seus braços e fica
sentado no colo dele. Temos uma refeição tranquila e calma,
conversamos pouco sobre a festa de amanhã, quando serei
apresentado, oficialmente, como o sucessor do meu pai a mídia
brasileira.
— Levi — meu pai o chama —, em São Paulo existem muitas
galerias de arte fantásticas, você deveria passar para conhecê-las
depois.
— Sim — responde sem entusiasmo, pela forma inquieta que
ele se mexe na cadeira sei que quer ir embora. A fim de manter a
paz do dia, encerramos o jantar e voltamos para nosso apartamento.
Na manhã seguinte, acordo cedo e faço meus exercícios
matinais, enquanto meu acionista de investimento na bolsa de
valores me passa por videochamada como estão indo as ações do
dia e em quais deveria investir e retirar investimento. Todos os dias
faço isso, é importante ter uma noção ampla do mercado de ações.
Deixo o Lorran aos cuidados do Levi, rezando a Deus para chegar
em casa e ambos estarem vivos. Preciso de uma babá urgente, mas
não consigo achar uma que fale italiano e possa entender meu
sobrinho e irmão. E não tive tempo ainda de matriculá-lo na creche,
pedi ao Levi para fazer isso hoje e o lembrei antes de sair, rezo para
que ele o faça.
O caminho para a empresa é enfadonho, o trânsito de São
Paulo é caótico, na melhor das definições, agora entendo o motivo
do meu pai só se locomover usando o helicóptero, não achei que
fosse tão ruim assim e cheio de congestionamentos. Demoro quase
uma hora e meia para chegar, sou cumprimentado por todos durante
o caminho para a minha sala, pego o elevador presidencial e ajeito
minha gravada, tenho uma reunião com os acionistas em vinte
minutos, mas antes vou falar com meu pai.
No lobby, encontro a Marta, secretária do meu pai, e uma
bolsa em cima da mesa da minha secretária, mas sem sinal dela.
— Bom dia, senhor Vittileno — Marta me cumprimenta com
um sorriso.
— Bom dia, Marta — aponto para a minha mesa —, minha
secretária?
— Ela foi ao almoxarifado pegar uns documentos para o
relatório que o senhor pediu sobre a venda dos tecidos para o
exterior.
— Certo, quando ela chegar, peça que passe em minha sala
para sermos apresentados.
— Sim, senhor.
A contratação da minha secretária foi feita por meu pai, ainda
não a conheci e estou bastante curioso para isso. Enrico teceu
tantos elogios sobre a jovem que despertou meu interesse no
mesmo instante, trabalhar com uma profissional competente é tudo
que eu poderia querer.
— Bom dia, Enrico — o cumprimento ao entrar em sua sala.
No trabalho nos tratamos formalmente.
— Bom dia, Louis — aperta minha mão —, vamos nos
preparar para a reunião com os acionistas.
— Sim, senhor.
E assim passamos o resto da manhã, em reuniões e fazendo
os preparativos para a troca de presidentes e o anúncio na festa que
teremos de noite. Minha secretária acabou passando mais tempo do
que previ no almoxarifado e juntando ao fato de que estive mais fora
do meu andar do que lá, nos desencontramos e, infelizmente, não
consegui encontrá-la hoje.
Estou indo para a última reunião do dia quando a vejo,
caminhando em direção ao banheiro enquanto segura pastas,
tentando não cair do salto alto que deve estar esmagando seus
lindos pés. Não sei quem é essa mulher, se é uma funcionária da
VITTILENO ou uma visitante, mas fico atraído por ela com
facilidade. Os cabelos presos em um rabo de cavalo, a maquiagem
leve poderia ser facilmente confundida com sua beleza natural. O
corpo esguio com seios medianos, quero apertá-los e morder sua
carne, até enlouquecê-la gritando meu nome. Ela tenta passar uma
imagem confiante com os ombros e a coluna eretos, mas vejo pela
forma como suas íris castanhas desviam de todas as pessoas que
passam perto dela que, na verdade, ela é tímida, os lábios rosados
recebendo mordidas discretas, as pastas sendo apertados em suas
mãos.
Porra, aperto minhas mãos na tentativa de controlar o animal
selvagem que habita dentro de mim, as tímidas são minhas
preferidas. As pessoas se enganam que pelo meu jeito dominante e
sem-vergonha que gosto das mulheres mais atrevidas e que se
jogam aos meus pés, no entanto, essas eu tenho aos montes. Mas
nada se compara com uma tímida, aquelas que seduzo aos poucos,
com toques e beijos e num piscar de olhos tudo que elas pensam é
em mim. A entrega na cama, o rosto vermelho, ah, minhas
preferidas. E você, meu dolce[11], em breve vou te provar inteirinha,
hoje à noite na festa da empresa vou te procurar e ter você na
minha cama até o final da noite.
Capítulo 4

Estou atrasada!
Tipo muito atrasada!
Meu chefe vai arrancar minha cabeça por não chegar na hora
durante a festa de sua nomeação como o novo presidente da
empresa VITTILENO. Pulo no meu quarto, tentando calçar meu
salto fino. O vestido verde-musgo soltinho deixa minhas costas
nuas, com amarração no pescoço. Pego minha bolsa e confiro mais
uma vez minha maquiagem no espelho. Por sorte a bruma fixadora
que uso é muito forte e mantém tudo no lugar ou eu estaria
parecendo o próprio coringa.
Passei o dia no almoxarifado procurando os documentos que
me foram solicitados, só essa parte teria sido fácil de resolver, mas
acontece que eu achei uma coisa estranha em todos os envios e
precisei verificar todos os arquivos desde que a empresa foi fundada
para saber onde começava aquela falha. Uma empresa fantasma
está comprando tecidos por um preço extremamente baixo e
recebendo o triplo do que é pedido, isso não está certo e se meu
faro me levar ao que imagino, a VITTILENO está sendo roubada por
um de seus acionistas. Eu só não descobri qual ainda.
Sou uma secretária iniciante e na minha primeira semana de
trabalho já me deparo com um pepino desse tamanho. Será que o
Sr. Vittileno estava desconfiado de algo e, por isso, me pediu para
olhar justamente esses carregamentos? Mas não acaba por aí,
investigando mais a fundo descobri que podem existir mais
empresas, se eu conseguir localizar quando isso começou e quais
os acionistas que estavam responsáveis por esses envios, consigo
chegar ao culpado. Só peço que não seja alguém grande o
suficiente para fazer a minha cabeça rolar.
Por enquanto preferi não dividir com ninguém as minhas
suspeitas, na segunda quando o Louis Vittileno e eu formos
oficialmente apresentados e ele me perguntar sobre o relatório que
me pediu via e-mail eu compartilho minhas informações. Eu quero
agradar meu chefe e fazer com que ele reconheça meu potencial,
por isso passei horas naquela sala abafada e cheia de arquivos
empoeirados, espirrando, tossindo e morrendo de sede sem nem ir
ao banheiro, pois fiquei obsessiva com minha busca, a ponto de
perder a hora e sair daquele lugar às 20h. A festa iniciava às 19h
Demorei mais uma hora para chegar em casa, obrigada
metrôs superlotados de São Paulo, eu odeio vocês na mesma
precisão com que amo, mais meia hora só no banho tirando a poeira
dos cabelos, nem morta eu apareço suja desse jeito na frente de
toda aquela gente importante. Por sorte demorei somente 20
minutos fazendo minha maquiagem, somente o básico, demorei
mais cinco brigando com meu sapato, meia hora para secar o
cabelo e prendê-lo em um meio coque alto. Simplificando, são
exatamente 22h30 e ainda vou levar quase uma hora para chegar
ao lugar da festa, estou muito atrasada.
Por minha sorte sei que o evento vai demorar no mínimo até a
meia-noite para ser encerrado, pelo que ouvi da Marta a previsão é
que acabaria às 04h, pois o atual presidente quer comemorar muito
a promoção do filho. Sem mais delongas, chamo minha irmã que
ficou de me dar uma carona e saímos para o hotel que acontecerá a
celebração.
— Você vai chegar na hora, não se preocupe — Olivia tenta
me acalmar, não paro de bater o pé no assoalho do carro.
— Como pode dizer isso? Já são quase 23h, eu deveria ter
chegado às 19h! — tento manter a calma, o medo de ser
repreendida é enorme.
— Se explicar a situação seu chefe vai entender, quer uma
dica? — Olivia fala com tanta calma que tenho vontade de socá-la,
ela não tá entendendo meu desespero.
— Diga de uma vez. — Suspiro, aceitando a derrota, vou ser
repreendida, não tem escapatória.
— Fique nos cantos, se fizer isso pode dizer que chegou na
hora, mas que ninguém te notou, pois você não estava no centro ou
no meio da multidão.
— Acha mesmo que isso dá certo? — Fico em dúvida, mas
tentada a aceitar.
— Tenho certeza, você é tímida, as pessoas não vão ter
motivos para duvidar de que preferiu não chamar a atenção. —
Nisso ela tem razão.
— Se isso der errado eu te mato. — Minha ameaça não serve
de nada, além de fazer a Olivia rir.
— Se der certo você fará minha mudança no sábado. — Sorri
para mim, convencida e sabendo que pegou no meu ponto fraco.
— Não, me recuso a aceitar que você está saindo de casa. —
Faço bico.
— É melhor para mim, você sabe que nos últimos tempos
tenho discutido muito com o pai e agora com meu emprego no outro
lado da cidade, não posso gastar duas horas por dia para me
locomover, pegando dois metrôs e um táxi. Vai embora metade do
meu salário só de transporte.
— Eu sei, mas vou morrer de saudades. — Fico chorosa.
Foi a Olivia quem me criou, por diversos momentos a vi mais
como uma mãe do que somente uma irmã mais velha, imaginar ficar
sem ela parte meu coração. Minha irmã sempre foi meu porto
seguro, mesmo com a insegurança que, às vezes, sinto por saber
que ela é mais linda do que eu, por ver como é sociável e amigável
com as pessoas. Sempre quis ser assim, mas nunca consegui.
Olivia conversa com qualquer um, encanta e conquista sem
dificuldades, ela é a melhor pessoa que já conheci, a que mais amo
e agora vou ter de ficar sem ela por perto, isso me mata.
— Ainda vai poder me visitar todos os dias. — Aperta minha
mão. O resto do caminho deixamos a melancolia de lado e
conversamos sobre a sua mudança na próxima semana.
Chego ao hotel, entrego meu convite aos seguranças e entro,
tentando não chamar a atenção. Ao ver as pessoas arrumadas,
percebo que fiz certo em escolher um vestido na altura do joelho
soltinho e alinhado. As pessoas aqui gritam luxo e poder. As
mulheres com maquiagens tão pesadas que me pergunto quanto
tempo elas levaram fazendo isso no salão e quantos milhões deve
ter custado. Tento não me sentir um patinho deslocado no meio de
tanta gente cheia de grana, ao ver outras pessoas que trabalham na
empresa respiro melhor, não sou a única que está aqui como
funcionária.
Não é difícil fazer como a Olivia disse e ficar nos cantos
observando o salão sem chamar atenção, aperto minha bolsinha,
sentindo o desconforto por estar rodeada de tantas pessoas e não
conhecer ninguém. No fim, foi uma bênção chegar atrasada, estou
me corroendo por dentro querendo ir embora, esse espaço é
opressor demais, não gosto disso.
Me movo devagar pelo salão, procurando pelo Sr. Enrico
Vittileno, vou me apresentar a ele e ao seu filho para depois ir
embora, não quero ficar aqui mais um segundo, os burburinhos,
alguns olhares em minha direção me fazem achar que as pessoas
estão falando mal de mim, da minha roupa e aparência. Vejo uma
rodinha de homens e entre eles o Sr. Enrico, atrás dele vejo a Marta
com outras secretárias, elas parecem tão à vontade umas com as
outras, será que iriam gostar se eu me metesse entre elas? Há
quanto tempo será que se conhecem? Não devem querer uma
novata intrometida em sua roda de conversa.
— Boa noite. — Uma voz grossa com sotaque carregado
chama minha atenção, viro-me de costas e preciso de cinco
segundos para absorver o homem que está à minha frente.
— Boa noite — digo baixinho, coço a garganta a fim de
recuperar a voz.
Olho para os lados e para ele, é difícil encará-la. O homem
mais lindo que já tive o prazer de ver pessoalmente está parado a
poucos passos de mim e não faço ideia do que fazer para puxar
conversa com ele. Ele é bem mais alto que eu, por isso tenho que
levantar a cabeça para encará-lo, seus olhos são azul-claros
profundos, marcantes, um olhar decidido, os cabelos loiros e bem
cortados na lateral com um topete bastante arrumado, as costeletas
terminam em um maxilar marcante e proporcional ao queixo. Nariz,
boca e olhos são de um contorno tão preciso que parece que foram
desenhados. Os lábios rosados e cheios. O pescoço grosso e os
ombros largos, o peitoral poderia ser esmagado pelo seu terno se
não fosse de um corte perfeito.
O terno nas cores cinza com a camisa branca e uma gravata
prateada tem um caimento perfeito em seu corpo, o Rolex no pulso
chama a minha atenção e me deixa mais intimidada com a sua
presença. O que alguém como ele que grita beleza, sofisticação e
dinheiro iria querer comigo que estou quase me fundindo na parede
de tanta vergonha por estar nesse lugar?
— Ainda não tinha te visto. — Sua voz volta a preencher meus
ouvidos e arrepiar o meu corpo.
— Eu... estive aqui o tempo todo — minha voz sai um oitavo
mais alta e coloco a mão na boca. Merda, não queria levantar
suspeitas sobre meu paradeiro e agora dou uma bandeira dessas.
— Certamente — dá um risinho e estende a mão para mim —,
eu sou o Lo...
Minha atenção sai completamente dele quando um som de
taça quebrando ecoa alto no salão junto de uma jovem gritando com
o garçom.
— Ele não tem culpa, coitado — lamento pela cena que se
desenrola.
— Concordo, pelo visto ela quem bateu nele — volto minha
atenção para ele —, sabe quem é aquela mulher?
— Não. — Na verdade, eu sei, é a filha de um dos acionistas,
lembro-me de ter esbarrado com ela e seu pai no elevador da
empresa e seu nariz em pé me dizia que eu deveria manter
distância e agora ao ver como ela tratou o garçom, sei que uma
simples secretária como eu não teria chance.
— É filha de um acionista da VITTILENO. — Então ele a
conhece. — Pessoas como ela, que por nascerem em berço de
ouro, se acham melhor que as outras me enojam.
— Não são das mais agradáveis — concordo com ele, mas
ainda com medo de expressar minha opinião e o afastar —, você
parece vir de uma família como a dela, importante.
— Sim, mas recebi uma educação exemplar dos meus pais,
nunca me portaria de tal forma. — Seus olhos me prendem e ele me
analisa. — E você, nasceu em berço de ouro?
— Não. — Sorrio, nunca tive vergonha das minhas origens. —
Meu pai é segurança particular e trabalhou muito para que eu e
minha irmã conseguíssemos nos formar, tenho orgulho da minha
história. — Empino o nariz, meu pescoço começa a reclamar por ter
que olhar tanto para cima.
— Faz bem — alisa meu queixo e se abaixa um pouco —,
pessoas como aquela mulher deveriam ser proibidas de vir aos
eventos, elas não sabem se portar. — Percebo um tom de
sarcasmo em sua voz e me divirto.
— Concordo. — Sorrio para ele. De repente esse lugar se
tornou menos opressor.
— Bom, estou feliz de ter te encontrado. — Dessa vez, ele
pega no meu braço, puxando-me mais para perto e sinto minhas
bochechas pegando fogo e minhas pernas bambearem.
— Por quê? — sussurro quase sem voz, seu perfume
masculino e forte invadindo meus sentidos.
— Gostei do que vi — arqueia a sobrancelha —, quer sair
daqui comigo?
— Você..., mas nem nos conhecemos. — Fico intrigada e
balançada com sua oferta.
Dificilmente, encontrarei outro homem como ele, quais seriam
as chances de ele dar em cima de mim nessa festa? Seria uma
punição por ter chegado atrasada? Me bato mentalmente, prometi
parar com a insegurança e ser mais confiante. Não tem motivos
para isso ser um joguinho, não tenho inimigos na empresa. Ao
menos uma vez na vida vou me permitir acreditar que ele não está
me iludindo.
— Podemos nos conhecer em outro lugar, mais calmo — ele
alisa minha bochecha —, percebi que você não estava gostando de
estar no meio de tantas pessoas, tenho acesso à área superior do
hotel, achei que iria gostar de respirar um ar puro.
Ele percebeu? Então... ele prestou atenção em mim quando
achei que ninguém estava me vendo.
— Somente conversar? — pergunto como uma boba.
— Sim, vamos?
— Vamos.
Ele segura na minha cintura e tremo, desequilibrando-me e,
em seguida, caio por cima de seu peito, seu aperto aperta ao meu
redor e com delicadeza ele me ajuda a me firmar. Nunca passei por
uma situação assim, achei que o meu atraso pudesse ser o meu fim,
mas parece que me garantiu uma nova oportunidade, algo pelo qual
ansiei por toda a minha vida. Deixo que ele nos leve pelo salão e
saímos por uma porta na lateral que dá acesso às escadas, subimos
sem conversar nada, meu coração quase saindo pela boca. Quando
acho que vou morrer de tanto caminhar, ele abre as portas e
entramos em um elevador. Nosso destino é uma área com piscina e
árvores, estamos no terraço.
— Sente-se melhor? — pergunta ao me ajudar a sentar em
uma mesa de frente para a piscina, ele se senta ao meu lado e seu
braço rodeia meus ombros.
— Sim, obrigada.
— Ótimo, agora me conte mais sobre você. — Sua mão
acaricia meu rosto e tenho certeza de que a última coisa que ele
quer é saber sobre mim.
— Não é isso que você quer — sussurro, sua boca se
aproximando da minha, seus olhos mirando meus lábios.
— E você quer o que eu quero? — sopra sedutoramente
contra meu rosto, fecho os olhos me deixando envolver pelo
momento.
— Quero.
Não precisamos de mais palavras, seus lábios pressionam
contra os meus, que se abrem para receber sua língua. Ele me
invade com delicadeza, puxando meu rosto contra o seu e
aprofunda o beijo. Meu coração bate tão rápido que sou capaz de
ouvir suas batidas. Ele exige mais, tornando sua língua mais
dominante, seus dentes prendendo meus lábios e suas mãos me
puxando para seu colo. Eu não tenho outra opção, a não ser deixar
que ele me domine.
Essa noite não começou como imaginei e, com certeza, terá
um desfecho surpreendente. Não sei o que acontecerá, mas estou
ansiosa para descobrir.
Capítulo 5

Será que estou fazendo o certo? O pensamento rodeia minha


mente enquanto ele coloca fogo em meu corpo, minha nossa, eu
nem sei qual o nome dele, como posso me entregar assim para um
desconhecido? Coloco as mãos em seus ombros e o afasto.

— Não estamos indo muito rápido? — pergunto, ele ignora


meu questionamento e volta a puxar meus lábios com os seus,
mordendo e beijando. Sou invadida por uma onda de desejo ao
sentir suas mãos segurando meu quadril e me girando em seu colo,
fazendo com que eu me sente com as pernas abertas.

Suspiro ao sentir o toque gostoso de seu membro coberto por


sua calça em minha calcinha. Se eu tivesse escolhido um vestido
apertado nunca conseguiria me abrir dessa forma. Ele aperta meu
quadril, guiando meus movimentos e me fazendo rebolar contra sua
calça. Isso é loucura, estou em chamas, a boca dele devorando a
minha roubando meu ar, seu quadril impulsionando contra o meu.
Minha nossa, fico sem fôlego e preciso afastar nossas bocas,
quando o faço, um pequeno gemido deixa meus lábios e, em
seguida, um grito quando sou surpreendida com seu movimento.

Ele agarra minhas coxas e me coloca em cima da mesa,


esfregando-se com mais vontade contra minha intimidade, atacando
meu pescoço e despejando arrepios em todo o meu ser, aperto seus
ombros e prendo minhas pernas em seu quadril. Eu não vou
aguentar, é muito intenso, forte e eu nunca senti tal coisa antes. Ele
impulsiona com mais força e a mesa começa a se mover, minha
cabeça pende para trás, uma de suas mãos ataca meu seio,
apertando e puxando em uma massagem apetitosa que me faz
ansiar por mais.

Estou vendo estrelas ao sentir o toque de seus dedos em


minha intimidade, ele ainda não ultrapassou minha calcinha, mas
me acaricia por cima dela e eu estou à beira de um abismo. As
estrelas se movem acima da minha cabeça enquanto suspiro na
orelha dele. Sua boca morde meu ombro e a ardência é,
assustadoramente, gostosa, como posso sentir prazer com a dor?
Mal tenho tempo de raciocinar quando seus lábios voltam a se colar
com os meus, seus dedos aumentam a intensidade e meu ventre
aperta, eu não aguento mais. O alívio me invade sem eu precisar
fazer nada, aperto seus ombros e deixo que ele me escute gemendo
em sua boca.

— Nem comecei a ser rápido — sussurra em meu ouvido e


me tremo com suas palavras —, não quer ver o quanto podemos ser
velozes essa noite? Dolce.[12]

O que esse homem fez comigo? Ele nem mesmo tirou minha
calcinha e a sinto encharcada entre minhas pernas. Encaro a
imensidão azul em seu olhar, ele está decidido a dar continuidade a
essa noite. Engulo em seco, se eu falar que sou virgem, ele é capaz
de parar? Eu realmente quero que ele pare?

Esse homem parece ter saído de um conto de fadas, alto,


bonito, com sotaque e um olhar matador, ele quer transar comigo,
posso ver o desejo queimando em seus olhos. Não foi por isso que
eu pedi durante muito tempo? Alguém que realmente me quisesse,
me visse. No meio de tantas pessoas, ele me enxergou, veio até
mim e me trouxe para cá, não pode ser uma pegadinha ou engano,
né?

— Vo-cê — coço a garganta para fazer minha voz voltar ao


normal —, realmente quer transar comigo? — Minha voz sai baixa e
incerta, mas preciso ter certeza.

— Desde o segundo em que te vi. — Beija meus lábios,


acendendo-me novamente. Ele distribui beijos até minha orelha. —
Você está ainda mais linda agora — sussurra —, não consegue
sentir o quanto te desejo? — Pega minha mão e a coloca em cima
de seu pau. Arregalo meus olhos surpresa com sua ousadia. —
Venha para a minha suíte, meu dolce, quero provar sua doçura a
noite toda.
— Mas nem nos conhecemos — digo quase sem voz, ele
pressiona mais contra mim e engasgo ao constatar o tamanho de
sua grossura. Isso tudo vai caber em mim?

— Nossos corpos chamam um pelo outro. — Solta minha mão


e segura minhas coxas, puxando-me para o seu coloco,
suspendendo-me no ar e andando comigo, certo de que aceitarei
ficar com ele. — Não podemos ignorar esse desejo, vamos?

Eu nem posso colocar a culpa no álcool pelas minhas ações,


pois não toquei em uma única gota a noite toda, fecho os olhos e
inspiro fundo, o cheiro amadeirado de seu perfume entrando em
meu sistema e balançando minhas decisões. Suas mãos sobem
mais por minhas pernas, fazendo-me arrodear sua cintura enquanto
ele caminha em direção ao elevador. Tenho menos de três segundos
para decidir e quando ele me beija novamente, sua língua macia
deslizando na minha, no melhor beijo da minha vida, eu tomo minha
decisão: vou aproveitar essa noite sem arrependimentos. Só espero
que ele não desista quando descobrir que sou virgem.

— Só tenho um pedido — peço antes de entrarmos no


elevador, o sorriso no canto de seus lábios me envergonha, ele sabe
que cedi.

— Qual? Meu dolce vou atender a todos os seus desejos essa


noite — cheira meu pescoço, me encolho.
— Essa será a minha primeira vez — minhas bochechas
queimam e encaro sua gravada, sem coragem de ver sua reação —,
pode ser delicado?

O desejo vai embora em um passe de mágica, sendo


substituído pela ansiedade, ele é um homem experiente e, com
certeza, acostumado a ter muitas mulheres em sua cama. Não
perderia tempo como uma virgem inexperiente como eu. Preparome
para descer de seu colo, nossa noite já foi encerrada. Ele me prende
com mais força, surpreendendo-me quando minhas costas vão ao
encontro da parede e seu membro pressiona minha intimidade, sua
boca ataca a minha e me desfaço em seu beijo, a língua se move
livremente, domando a minha e ditando para onde a devo mover.

— Obrigado por me dizer, meu dolce, serei delicado. — Sela


nossos lábios. Seus olhos continuam ferozes e em chamas, mas
consigo ver um fio de ternura. Confio em suas palavras e volto a
respirar aliviada.

— Certo. — Dessa vez sou eu quem toma a iniciativa, seguro


seu pescoço e choco minha boca contra a sua, apertando-o com as
minhas pernas. Aliviada por suas palavras não somente porque ele
será cuidadoso, mas por ter escolhido continuar comigo.

— Vamos — chama o elevador e as portas se abrem.

Ele não me coloca no chão e me carrega em seus braços,


como se eu fosse uma pluma que não pesa nada. Um risinho me
escapa feliz, não me restam mais dúvidas quanto ao que acontecerá
em seguida.

— Você é um hóspede daqui? — sondo.

— Sim, tenho um quarto nesse hotel. — Seu sotaque é forte e


grosso, sua voz tem um tom charmoso que me fascina, quero que
ele continue falando.

— De onde você é? — pergunto, curiosa, seu sotaque é muito


parecido com o do presidente e ele me chama de dolce que significa
doce em italiano.

— Itália, e você é brasileira? — gosto da forma como ele me


olha, com leveza, nenhuma de suas palavras é forçada.

— Sim, nascida e criada em São Paulo.

As portas do elevador apitam, indicando que chegamos ao


andar, um casal de idosos espera na porta, os idosos ficam
surpresos quando me veem em seu colo. Fico envergonhada e tento
descer, mas ele me segura forte e sorri, passando por eles,
enquanto escondo o rosto na curva do seu pescoço, sem coragem
de encarar os anciões que devem pensar que sou uma puta por
estar agarrada desse jeito a um homem no meio do hotel.

— Você fica uma gracinha com vergonha — ele diz em meu


ouvido —, vai ficar vermelhinha quando eu estiver te comendo? —
Ai, santo Deus, sua fala me deixa de pernas bambas, ainda bem
que estou no seu colo.

Ele abre a porta e não espera por minha resposta, no


segundo em que passamos e estamos trancados no cômodo, ele
volta a me atacar.

Sua mão grande segura meu pescoço e sua boca encontra a


minha em um beijo molhado, o deslizar de línguas, com mordidas
em meu lábio inferior, ele anda às cegas pelo quarto, percebo
quando tira o sapato, meu salto não é preso por tiras, retiro-o e
escuto seu baque contra o chão. Ele agarra minha cintura e me
puxa para longe, jogando-me na cama, grito com sua agilidade.

Deitada na cama, aproveito para me deliciar com a visão que


é esse monumento de homem enquanto retira a gravata e, ao
mesmo tempo, me devora com os olhos, arrancando o paletó e o
colete de seu terno. Quero arrancar sua camisa, mas tenho
vergonha demais para isso, então me contenho, mordendo meus
lábios e pressionando minhas pernas para tentar aplacar o fogo que
me incendeia. É difícil respirar diante da imagem dele removendo a
camisa botão por botão, sem pressa e revelando sua pele que é
iluminada pela luz da lua que entra pela janela. Seu abdômen
definido e trincado cheio de gominhos, o peitoral firme e durinho
com os bicos dos mamilos rosados, mordo meus lábios, imaginando
como seria morder essa parte de seu corpo.
— Toca — ele ordena, fico hipnotizada por seus olhos e o
comando em sua voz.

Devagar e me acostumando que farei isso, fico de joelhos na


cama e me aproximo dele. Minha mão treme ao se aproximar sua
pele, nunca toquei outro homem desse jeito. Ele segura minha mão
e com brusquidão faz com que eu o toque seus músculos, sua pele
é macia em minha palma. Ele guia toda a minha exploração,
deixando-me deslizar os dedos por ele todo, abdômen, peitoral,
ombros. Fico perdida na sensação que é sua pele contra meu toque.

Ele agarra minha nuca e me encara feroz trazendo meus


lábios para seu mamilo, abro a boca hesitante e, em seguida, chupo
seu mamilo, ele é pequeno, mas muito gostoso. Seguro seu quadril
e finco minhas unhas sem acreditar na minha ousadia, ele continua
guiando minha cabeça e faz com que eu lamba os gominhos em sua
barriga, chego perigosamente perto do cós da sua calça. Quase
tenho um ataque ao imaginar que ele quer que eu o chupe, não
estou pronta para isso.

— Abra — ordena, obedeço sem hesitar. Minha nossa, nunca


pensei que eu fosse agir dessa maneira.

Abro seu cinto e com as mãos trêmulas o botão de sua calça,


engulo três vezes antes de descer seu zíper, meu ventre se contrai e
minha barriga se revira em uma mistura de excitação com
ansiedade e nervosismo. E se eu morder ele? E se ele não gostar?
Se ele desistir e for embora, o que será de mim?

Ele percebe que estou travada depois de descer seu zíper e


encarar sua cueca cinza, o homem segura minhas mãos e me faz
deitar novamente, seus olhos suaves me encaram. Ele beija meu
rosto com delicadeza, acalmando minha ansiedade. Posso estar
pronta para a minha primeira vez, mas não me sinto para chupá-lo,
isso parece íntimo demais.

— Na próxima eu deixo você brincar com meu pau na sua


boca. — Fico vermelha com suas palavras, meu coração erra uma
batida e o sorriso descarado em sua cara me diz que estou
encrencada. — Hoje somente eu vou brincar. — Lambe meu
pescoço. Ele engatinha ficando com uma perna de cada lado do
meu corpo e quase passo mal com a visão desse homem em cima
de mim, usando somente a calça aberta, o volume marcado parece
que cresceu desde o momento em que estávamos no terraço.

Engulo em seco me preparando para o virá essa noite, estou


a poucos segundos de perder minha virgindade e torço para que
nada dê errado, não estou pronta para acordar do meu conto de
fadas.
Capítulo 6

Ele retira o laço em meu pescoço e fecho os olhos, não vou


aguentar sua reação ao ver meu corpo nu. O tecido desliza para fora
do meu corpo sem dificuldade, minha respiração trava na minha
garganta ao perceber que ele está tirando minha calcinha também.
Grito assustada ao sentir uma mordida seguida de uma lambida em
minha intimidade, minha Nossa Senhora, isso não pode ser real.
Sua língua passeia em minha carne explorando minha intimidade,
chupando e alternando com mordidas que fazem com que eu me
contorça. Se antes fechei meus olhos por causa da timidez, agora é
impossível os abrir, diante do prazer que me preenche.

Sons de sucção são ouvidos e, puta merda, como algo assim


pode ser tão bom? Ele beija minha entrada e me contorço ao sentir
sua língua me invadindo, é molhada, macia e domina minha
entrada. Quando acho que estou prestes a explodir de prazer me
assusto e, dessa vez, abro os olhos quando seu dedo desliza em
meu interior.
— Shi, só sente. — Ele sobe novamente e fica me encarando
enquanto movimenta o dedo em minha intimidade, indo tão fundo
que me deixa zonza.

— É bom. — Suspiro.

— Vou deixar melhor. — Um segundo dedo se junta e, em


seguida, sinto minhas paredes se alargando e junto delas a
percepção de que tem algo em meu interior aumenta gradualmente.
— Vamos com mais um? — pergunta, carinhoso. Aceno em positivo,
dessa vez uma ardência se inicia e prendo a respiração. — Relaxa,
meu dolce, estou te preparando para o meu pau, não quero
machucar sua bocetinha. — Estrala um beijo em minha bochecha, o
cheiro do meu sexo em seu rosto.

Ele volta a descer para minha intimidade e sua boca ataca


meu clitóris enquanto bombeia seus dedos. Estou molhada e agora
ele desliza facilmente, a ardência desaparece. Me entregar aos seus
estímulos é fácil, ele sabe o que faz, onde morder, chupar e lamber,
estou delirando em sua boca novamente, meu corpo ardendo em
chamas, gemo não aguentando mais a sensação esmagadora que
me preenche e, então, tudo se desfaz e me desmancho em
pedacinhos.

— La sua dolce figa è um paradiso. — Ele deixa um último


[13]

beijo em minha intimidade e se levanta, entender suas palavras em


italiano me deixa ainda mais excitada.
Enquanto recupero minhas forças após o orgasmo ouço o
som do farfalhar de roupa e algo sendo aberto, o encaro e vejo
quando ele coloca a camisinha em seu pau.

— Isso não vai caber em mim. — Arregalo os olhos, ele é


enorme.

Não que eu conheça muitos paus para comparar, mas não


tem como aquilo ser pequeno, sua extensão toca seu umbigo e sua
grossura, com certeza, eu não conseguiria segurá-lo de mão
fechada, pois seus próprios dedos o bombeando mal se fecham ao
seu redor.

— Vai caber todinho nessa boceta apertada — segura minhas


costas e me faz deitar com a cabeça no travesseiro —, não vou
mentir para você, pode ser que arda ou sinta dor, então me deixe
saber. — Alisa minhas sobrancelhas e fico tocada com o carinho em
seu olhar. — Vou te machucar o mínimo possível, tá bem?

— Não tem chance de não doer? — arrisco perguntar.

— Infelizmente não — diz com pesar em seu olhar, ele


realmente se preocupa comigo, arfo emocionada —, vou devagar e
você me diz se ficar insuportável.

— Tá bem.
Decido confiar nele, até agora tudo que tem feito foi me dar
prazer, ele não teria motivos para mentir.

— Relaxa, meu dolce. — Beija meus lábios, levando-me no


deslizar de sua língua. Sua mão desliza entre nós e toca meu
clitóris, seus movimentos são em círculos, meu corpo se acende
mais uma vez e os líquidos inundam minha intimidade.

Agarro seu ombro e aperto minha boca em seu beijo ao sentir


a glande de seu membro entrando em mim. Fico aliviada ao senti-lo
dentro de mim, entrando devagar e deslizando na minha
lubrificação, ele já entrou todo, ufa. Interrompo nosso beijo e sorriu
para ele.

— Nem foi tão ruim — digo e ele sorri divertido.

— Só coloquei a cabeça, meu dolce. — Arregalo os olhos,


impossível, sinto como se ele tivesse todo dentro de mim.

— Jura?

— Juro. — Beija meus lábios e, dessa vez, fico o olhando


enquanto ele mexe o quadril. — Vamos mais fundo?

Conforme ele empurra mais contra meu interior a ardência se


espalha e começa a ficar desconfortável. Aperto seus ombros e
franzo a testa, o ar faltando em meus pulmões e tenho ímpeto de
fechar as pernas e o empurrar para fora. Está começando a doer e
não sei se quero continuar, não pensei que fosse assim.

— Shi, tá tudo bem — ele fala em meu ouvido, seus


movimentos de invasão cessam —, já coloquei tudo.

Engulo em seco, sem conseguir responder.

— Vou deixar melhor, tá bom?

Aceno que sim e fecho os olhos, tentando pensar em outra


coisa que não seja na dor em meu interior, não acreditei que ele
pudesse caber e agora as consequências de ter seu membro me
rasgando em duas aparecem. Não é como se fosse a pior dor que já
senti na minha vida, é suportável, mas muito incômoda. Sua boca
abocanha meu seio e pequenos choques são enviados direto no
meu interior, isso sim é bom. Sua mão se enfia entre nossos corpos
e começa a acariciar meu clitóris. Aos poucos, seus movimentos
sincronizados afastam a dor, um gemidinho me escapa ao sentir seu
membro saindo e entrando em movimentos lentos e repetidos.

— Tá melhor, meu dolce? — Cada vez que ele me chama


assim tenho vontade de chorar com o carinho em sua voz.

— Si-m — respondo baixinho.

— Vou deixar melhor — beija o vão entre meus seios —, se


abre pra mim, meu dolce. — Faço o que ele pede e abro mais as
pernas, sufocando com o quanto ele consegue ir mais fundo assim.
— Delícia de bocetinha apertada, você sente isso, meu dolce? —
ele geme em meu ouvido, e eu retribuo, sim eu sinto!

Meu corpo relaxa e me entrego mais ao que ele faz comigo, o


prazer superando o incômodo, a ardência somente uma lembrança
gostosa. Meu ventre aperta e me vejo ansiando por mais, a
necessidade em meu interior me enlouquece. Ele solta meu seio e
ataca meu pescoço, gemendo contra meu ouvido e, por todos os
santos, sou capaz de ter outro orgasmo somente com a voz rouca
desse homem gemendo para mim.

A constatação de que ele sente prazer com a minha


inexperiência quebra uma corrente dentro de mim e sorrio. Gemo e
me entrego como nunca fui capaz de fazer na vida. Dessa vez, meu
orgasmo se forma mais brando, como um pequeno fio conectando
todo o meu corpo a uma bomba que explodirá em segundos. Para o
meu deleite ele explode de prazer e, em seguida, geme, vejo o suor
escorrer por seu rosto, à medida que ele morde os lábios, atacando
minha pele, deixando sua marca em todo o meu ser.

— G-oza — me atrevo a dizer entre sussurros e gemidos.

— Vem comigo, meu dolce, me entrega seu orgasmo — pede.

— É seu. — Arqueio o quadril, uma pontada me atinge e me


desmancho.
— Ah, porra. — Ele puxa para fora e seu rosto se contorce ao
gozar e esporra na camisinha.

Meu italiano se deita ao meu lado, observo seu peito subindo


e descendo. Não tenho certeza se tive um orgasmo, mas sei que foi
gostosa a sensação do alívio em meio a dor que senti. Foi diferente
de quando ele me tocou com a boca e os dedos, menos forte, mas
prazeroso. Estou feliz com a minha primeira vez, foi melhor do que
eu poderia sonhar com um homem que saiu de um conto de fadas.
— Sua vez — ele diz após recuperar o fôlego, sua boca ataca minha
intimidade dolorida e quase choro pelo contato.

Estou bastante sensível e molhada, seus toques são sentidos


com minha intimidade, antes que eu perceba meu ventre se aperta e
se contrai. É como se não tivéssemos parado o que fizemos
instantes antes, me contraio e grito ao sentir o orgasmo me cortando
de uma ponta a outra. Meu Deus, como isso é bom.

— Agora sim. — Beija meu ventre e sobe beijando minha


boca.

Quero agradecer, mas estou mole demais para isso, ele se


levanta e vai ao banheiro, respiro recuperando minhas forças e ao
me sentar minha intimidade reclama da posição, é quando vejo a
pequena mancha rosada no lençol da cama. Fico vermelha de
vergonha, o coração batendo em meus ouvidos, olho para o
banheiro e vejo a porta fechada, antes que ele volte e veja o
sangue, eu retiro o lençol e o jogo debaixo da cama. Minhas pernas
têm um filete de sangue, pego um roupão e me enrolo, desesperada
para tomar um banho e não deixar que ele veja isso.

Ele sai do banheiro e antes que diga uma palavra, me enfio lá


dentro e tranco a porta, escuto seu riso do outro lado. Ao ver minha
visão no espelho fico espantada com o quanto estou descabelada,
meu meio coque foi desfeito e minha maquiagem está toda borrada
de suor e dos seus beijos. Paro com a tortura de me analisar e entro
no banho, me lavando por completo. Termino e volto para o quarto,
ele está parado analisando a cama e fico aliviada por ter escondido
o lençol com sangue, não sei como seria capaz de encará-lo depois
disso.

— Vamos dormir juntos? — pergunto e levo a mão à boca,


escondendo meu rosto dele.

— Sim, vem. — Puxa o edredom e se deita, noto que ele


continua pelado, ainda enrolada no roupão me deito ao seu lado,
fico me perguntando se ele vai me abraçar, mas ele só deita a
cabeça no travesseiro e fecha os olhos.

— Boa noite — me arrisco a dizer, ansiosa esperando sua


resposta que não vem. Ele dorme rápido.

Demoro para pegar no sono, pois revivo cada detalhe da


noite, quando acordo não o encontro ao meu lado. É como se eu
tivesse despertado do sonho mais perfeito, no travesseiro em que
ele dormiu tem um envelope branco. O abro e as lágrimas caem
antes que eu possa segurá-las. Ele me deu dinheiro, é esse o
presente que recebo após confiar naquele desconhecido e entregar
a minha primeira vez, um envelope cheio de dinheiro pagando pelo
sexo que ele teve. Meu pai sempre disse que eu não deveria ser
fácil para os homens ou eles se aproveitariam disso. Agora entendo
que ele tinha razão, ao ser humilhada e tratada como prostituta.

No fim, meu príncipe se tornou um sapo após beijar a


GataBorralheira, eu sempre soube que contos de fadas não eram
para mim e na primeira vez que vivo um, ele acaba com o final ruim
que nenhuma princesa deseja receber. Caio contra o travesseiro,
chorando e com o coração partido. Eu o odeio e se um dia vê-lo
novamente vou fazer com que ele engula esse maldito dinheiro.
Capítulo 7

Eu a vi novamente, a mulher que chamou minha atenção na


empresa chegou atrasada na festa e estava quase se fundindo com
a parede do lugar de tanta vergonha, não sei se por ter chegado
atrasada ou qualquer outro motivo. Mas acreditei que ela precisava
ser retirada dali antes que entrasse em combustão de tamanha
timidez. Quando ela colocou os olhos em mim, eu soube que me
queria, mas fiquei na dúvida se sabia quem eu era, não agiu como
tal e falou informalmente comigo.

Só me deixou com a certeza de que ela não trabalhava na


VITTILENO. Seria injusto dizer que foi fácil levá-la para a minha
cama, joguei todo o meu charme e nenhuma mulher consegue
resistir aos meus encantos. Realmente, a morena era tímida e
gostosa, como um verdadeiro doce que esconde o seu sabor até ser
provado, estaria mentindo se falasse que não senti certo carinho por
ela. Seus olhos expressivos e seus gemidos me falando tudo que eu
tinha que saber sobre ela.

Não fiquei surpreso ao saber que era virgem, fiquei excitado,


louco para ser o seu primeiro e quem sabe ensiná-la tudo que
precisa aprender sobre o sexo em futuros encontros. Não sou
soberbo de dizer que fico somente uma vez com uma mulher, acho
isso idiotice, se o sexo é bom qual o problema de repetir? Só não
sou mais adepto a romance, comigo é sempre tudo carnal, casual e
sem cobranças. Eu fui delicado, controlei meus impulsos quando
tudo que eu queria era foder aquela boceta até que ficasse assada.
Suas reações, entrega, foram um deleite para o animal que habita
em mim, eu a queria novamente.

Até perceber a mentirosa que ela é.

Ela disse ser virgem e agiu como tal, mas a prova de sua
virgindade não existiu. Não tinha sangue na camisinha, nos lençóis
ou entre suas pernas. Quando terminamos eu a chupei com
vontade, mulher alguma saí da minha cama sem gozar feito louca,
mas não encontrei nenhuma gota de sangue, no banheiro olhei a
camisinha e não vi nada, no quarto o lençol da cama continuava
branco e ela se escondeu no banheiro como uma desculpa de se
limpar.

Ela não passa de um doce azedo que tive o desprazer de


comer.

O que me irrita mais é a mentira, outras mulheres já fizeram o


mesmo com o intuito de me fazer ser delicado e, no final, só queriam
que eu tivesse algum sentimento inútil de romance por ter sido
carinhoso em sua primeira vez. As vadias sabiam fingir bem e me
enganar com os falsos olhos angelicais. Mas essa mulher, desde
antes de termos contato, me fascinou com a sua timidez, foi fácil
acreditar.

Noto que ela dorme tranquilamente ao meu lado, se não


fosse uma mentirosa descarada poderíamos nos divertir mais, gostei
de sua boceta. Contudo, mulheres complicadas assim, eu não
permito que causem estrago na minha vida. Eu sou Louis Vittileno e
não serei feito de idiota por ninguém. Levanto-me e visto minhas
roupas, abro minha carteira e vejo que tenho a soma de dois mil
reais em espécie, pego um envelope na mesa da sala do quarto e
guardo o dinheiro dentro, o coloco em cima do travesseiro e saio do
cômodo.
Espero nunca mais encontrar com essa mulher ou a farei
pagar por ter me feito de idiota, caindo em seus encantos e mentiras
facilmente.

Passo o domingo com minha família e por mais que eu tente


me distrair é difícil apagar as lembranças daquela infeliz, seus
toques, cheiro, o gosto de sua boca na minha e o sabor de sua
boceta. Aperto o punho com raiva, estou na sala assistindo a um
filme infantil com o Lorran e o Levi desmaiado no sofá, a última
coisa que deveria pensar é na minha vontade de ter aquela
mentirosa mais uma vez na minha cama. Eu daria uma lição nela,
espancaria aquela bunda redondinha e durinha, morderia toda a
extensão de sua pele a faria engasgar com meu pau em sua
garganta, até que saíssem lágrimas, depois a comeria bruto para
que nunca mais quisesse outro pau além do meu, então a deixaria.
E nunca mais ela ousaria mentir para mim.

Eu odeio mentirosos e traidores. Por ser italiano e uma


pessoa importante, até mesmo a máfia siciliana tentou me enganar
a fim de tomar conta dos meus negócios. Eles se aproximavam de
mim em eventos sociais, sempre com propostas de negócios dos
quais tenho orgulho de ter recusado todas e nunca envolvido minha
família na sujeira desse mundo. O capo tinha duas filhas, uma mais
nova com 18 anos e a outra com 23, na época eu tinha 27. Ele usou
ambas para me seduzirem, eu nem sequer cogitei olhar para a mais
nova, mas a mais velha, essa sim chamou minha atenção, uma bela
dama.

A safada disse que não era mais virgem e por isso não tinha
se casado, pois ninguém a queria, depois de muita insistência e de
encontrá-la aberta para mim no quarto de hotel que eu ficava,
acabei comendo aquela boceta. Foi quando percebi que, na
verdade, a mulher era virgem, o sangue como evidência em todo o
lençol e camisinha. Para conseguir escapar de seu pai que exigia o
casamento tive de ceder e dar a ele 10% da empresa, parte a qual
ele usaria para a lavagem de dinheiro. Mas eu sou mais esperto que
todos aqueles velhos. Apenas com três meses após a negociação
entreguei evidências à polícia de que estavam usando minha
empresa para lavagem de dinheiro e como as ações foram
compradas de forma legal, não saí prejudicado.

Até hoje eles tentam me matar por isso, mas minha equipe de
segurança é forte e competente. Escapei de todos os atentados e
desde então vivo em pé de guerra com a máfia siciliana. No mundo
de gente grande não temos espaço para picuinhas de crianças, se
eles querem me dar um golpe eu darei outro, se me ferirem, eu
machucarei todos de volta. Trazer o Levi e o Lorran foi uma medida
de segurança, nunca permitirei que meu sobrinho seja usado como
moeda de troca e em breve essa guerra vai acabar, firmei aliança
com o filho do consigliere e em troca da paz estou financiando sua
tomada ao trono. É assim que eu vivo e por isso fui esperto para
perceber o golpe da falsa virgem daquela mulher.

— Zio! — Lorran me chama, presto atenção nele e dou risada


ao ver sua boca cheia de doce.

— O que você estava fazendo? — Pego-o no colo e vou em


direção ao banho.

— Os dolcinhos tavam pedindo tocorro. [14]

Gargalho, é inacreditável a malandragem desse menino, que


me lembra muito o Levi, pois ele costumava comer as coisas
escondido e dizer que elas estavam pedindo para serem comidas
por sua boca. Dou banho no meu sobrinho, ajudo meu irmão a ir
para o quarto, ele está dopado de calmantes e amanhã tem consulta
com uma nova psiquiatra, espero que ela diminua sua medicação.

Dou início a segunda fazendo meus exercícios e ouvindo


sobre a bolsa de valores e as ações da empresa, deixo Lorran em
casa aos cuidados da governanta que me olha de cara feia e diz que
não é babá e só está fazendo um favor. Prometo um bônus a ela,
mas de nada adianta para desfazer seu bico, Levi acorda disposto e
diz que vai matricular o Lorran na creche ainda de manhã. Os deixo,
rezando para não ter problemas e vou para a empresa de
helicóptero, nem ferrando que enfrento o trânsito infernal de São
Paulo.

As portas se abrem no andar presidencial e junto delas minha


boca ao encontrar a mulher de sábado sentada na mesa que minha
secretária deveria ficar. Recupero-me do susto e vou para minha
sala, ela me encara e vejo seus olhos quase saindo para fora, a
boca aberta em um feito O, ou ela é uma perfeita atriz, ou não sabia
que eu seria o seu chefe. Fecho a porta e me sento, esperando
pelas batidas que vem em seguida, autorizo sua entrada e seu rosto
está vermelho como um pimentão enquanto ela caminha sem me
olhar.

— Bom dia, senhor Louis Vittileno. — Sorri com sua voz


trêmula, ela realmente acha que vai me enganar com esse truque
duas vezes?

— Não precisa fingir que é tímida, sabemos a verdade, não


é? — digo com asco na voz, tenho vontade de apertar esse pescoço
até ela implorar por perdão e para que eu a foda.

Merda, a foda mansa por achar que ela era virgem, me


deixou cheio de tesão, por debaixo da mesa aperto meu punho,
controlando meus instintos, não vou perder o controle no trabalho.

— Perdão? — Seu olhar me encontra, levanto e caminho


paro à sua frente, desabotoo meu paletó e vejo seu olhar seguindo
meus movimentos, ela engole em seco e desvia o olhar para o chão.
Sento-me contra a mesa e cruzo os braços, ela parece uma gatinha
indefesa.

— Você sabia quem eu era sábado?


— Não — responde e dessa vez sua voz é firme. — Estou
surpresa que seja meu chefe, se soubesse não teria me envolvido
com você.

— Acha que teria conseguido resistir a mim? — Sorrio, ela


nunca escaparia de mim.

— Ao menos não teria sido humilhada como o senhor fez —


suspira e me encara —, por que fez aquilo? — Seus olhos brilham,
as feições magoadas, aperto os punhos quase me deixando levar
por sua tristeza.

— O quê? Te foder?

— O dinheiro. — Suspira e olha para baixo, ela começa a


apertar as unhas, descascando o esmalte, aproximo-me dela, quero
que tenha certeza de ouvir o que direi.

— Eu pago as minhas putas, não é isso que você é?

A agenda em sua mão cai no chão e lágrimas escorrem por


sua bochecha, já vi choros demais de mulheres que tentaram me
enganar, essa fedelha não vai conseguir isso. Não deixarei que ela
me abale, não passa de uma atriz, não entrarei em seu jogo
novamente.

— Não sou uma puta — fala tão baixinho que quase não a
escuto, ela se abaixa para pegar a agenda de novo e enxuga os
olhos. — Sou sua secretária. — Me encara mesmo sem conseguir
conter o choro.

— Guarde suas lágrimas de crocodilo. — Volto a me sentar à


minha mesa. — Onde está o relatório que pedi para você fazer?

Com as mãos trêmulas ela me entrega um pendrive e se


prepara para sair, mas não deixo que o faça. Se ela pensa que vai
me sensibilizar ou conseguir alguma coisa comigo está,
severamente, enganada. Vou mostrar a ela que não deve brincar
com homens como eu.

— Fique, vamos analisar isso juntos, quero ver se fez um


bom trabalho.

— Sim, senhor.

Passamos as próximas horas trabalhando no relatório e ao


contrário do que pensei, ela não é uma incompetente, ao menos não
nessa parte. Seus olhos continuam vermelhos e permanece
engolindo o choro em vários momentos quando me olha, mas
consegue explicar com clareza suas suspeitas sobre fundos que
podem estar sendo desviados com a venda dos nossos produtos a
um preço de banana e que esses tecidos podem estar sendo
revendidos e o dinheiro fica em poder somente do trapaceiro.

Eu já tinha minhas suspeitas quanto ao relatório dessa


gestão, mas não achei que fosse algo desse nível, tem grandes
chances de que eu esteja sendo roubado. Vou pegar o culpado e
fazer com que saiba o que acontece quando se mexe com um
Vittileno.

— Isso é tudo? — ela pergunta, já são 15h, nem paramos


para almoçar.

— Por enquanto sim, pode tirar seu horário de almoço e


depois retornar.

— Sim, senhor.

Ela caminha para a porta e antes que saia, a chamo.


— Espere, quero saber uma coisa. — Ela não se vira e
entendo seu receio, fui duro com ela o dia todo, mas tem algo que
preciso saber. — Por que se atrasou para a festa?

— Perdi a hora fazendo esse relatório.

— Entendi, pode ir.

No fim, ela não se comportou como a vadia que eu achei que


fosse, agora fico na dúvida se fiz certo em deixar o dinheiro e ser
rude com ela o dia inteiro. Talvez, eu possa ter errado no meu
julgamento, vou ficar de olho para ver como ela se portará nos
próximos dias.
Capítulo 8

Bianca 17 anos, ensino médio.

— Ele me disse que queria ficar com você — Alice continua


insistindo, eu detesto essa menina, ela se aproveita que sou tímida
e retraída para ficar me zoando e inventando mentiras.

— Não acredito em você.

— Ei! — Me encolho quando ela bate a mão na parede do


banheiro, prendendo-me entre seu corpo e a parede. — Eu já disse
que pode confiar em mim, sua pata gorda, Felipe disse que ficaria
comigo se você ficasse com o irmão dele, vamos logo!

— Não quero — sussurro, com medo de que ela me bata


novamente.

Eu nunca beijei e não vou fazer isso com o irmão do Felipe,


ele é asqueroso, malvado e adora puxar meu cabelo quando passa
por mim, as chances de ele querer ficar comigo são as mesmas que
tenho de pegar o Luan Santana, inexistentes. Isso só pode ser outro
plano dele. Não aguento mais sofrer isso todos os dias, é
humilhante, doloroso e acaba com minha vontade de viver.

— Vamos logo! — Puxa meu braço e o puxo de volta, suas


amigas se juntam e sou arrastada. A aula já acabou e os corredores
estão vazios, as poucas pessoas que restam não se importam
comigo para me ajudarem.

Se ao menos a Olivia estivesse aqui, ela poderia dar uma


surra nessas vadias, mas minha irmã já se formou tem dois anos e
desde que deixou o colégio o bullying aumentou consideravelmente.
É meu último ano escolar, não posso me transferir porque as outras
escolas são muito longe da minha casa, eu preciso ser forte e
aguentar. Minhas pernas fraquejam e caio no chão.

— Mas que garota chata! — Alicia me solta e segura meu


cabelo com força. — Você vai mesmo me fazer ficar mal com o
Felipe? Eu já te disse que o Fernando quer ficar contigo, ele só te
maltrata porque gosta de você.

— Você está me obrigando — gemo quando ela aperta os


dedos em meus cabelos, seguro sua mão tentando a impedir de
puxar.

— Não, estou te dando a oportunidade da sua vida, sua pata


gorda. — O tapa estrala alto no meu rosto, arde, machuca e me
humilha, mas não vou ceder. — Levanta logo!
— Não! — Grito, mesmo chorando e com vontade de me
encolher feito um bebê.

— Sua vadia! — Ela levanta a mão, mas um grito a


interrompe.

— Ei! — Alice olha para o provedor do som da voz e vejo que


se trata do Fernando e do Felipe, os gêmeos estão rindo e
caminhando tranquilos em nossa direção.

— Eu falei que a Alice não iria conseguir — Fernando fala


para o irmão que entrega uma nota de cinquenta para ele.

— Porra, gata, você me fez perder cinquentinha, vai ter de me


recompensar por isso — segura o braço de Alice e ela me solta.

— E o que você quer? — Alice pergunta.

Não quero descobrir o que vai acontecer, mesmo com as


pernas trêmulas eu me levanto e corro na direção contrária. Meu
material escolar está no banheiro com meu celular na bolsa, mas sei
que se eu fugir para lá eles vão conseguir me pegar novamente.
Escuto passos atrás de mim, não me atrevo a olhar para saber
quem é, preciso chegar ao portão ou à secretária onde o vigia deve
estar, ele vai me ajudar.
— Peguei você. — O puxão no meu cabelo me joga para trás
e grito, caindo contra um peitoral forte ao passo que seus braços me
apertam.

— Me deixa em paz — peço, já sentindo as lágrimas


escorrendo. Fernando me suspende no ar e caminha para uma das
salas de aula, tento me soltar, mas não consigo.

Ele me solta e bloqueia a passagem para sair da sala. Tenho


medo da forma como o Fernando me olha, sozinhos aqui o choro
me invade, caminho para trás quando ele vem na minha direção
como um maldito predador. Minhas costas batem contra a parede e
me encolho no chão, abraçando minhas pernas e escondendo meu
rosto.

— Estou fazendo um favor para a pata gorda e feia. — Puxa


meus cabelos, obrigando-me a encará-lo, mal consigo ver nada com
as lágrimas nublando meus olhos. — Você não quer morrer sem
nunca ter beijado, não é?

— Por favor — imploro entre soluços —, me deixa em paz.

— Estou deixando e vou até te dar um presente.

Ele empurra minha cabeça contra a parede e a batida me


deixa zonza, mas não o suficiente para não perceber o que ele faz
em seguida. Fernando pressiona seus lábios com força contra os
meus, estou tonta e sem forças para o impedir. Meu primeiro beijo é
roubado contra minha vontade por um cara que eu odeio. Sua língua
maldita e com gosto ruim invade minha boca, tenho ímpeto de
vomitar, com a outra mão ele ataca meu seio, apertando-o e
machucando a carne. Esse vai ser o meu fim?

Quando ele, finalmente, acaba com a tortura um sorriso


asqueroso desponta em seus lábios, minhas pernas tremem com o
medo de ser estuprada, e antes que eu possa fazer algo para me
afastar, ele volta a me beijar, dessa vez aperta meu pescoço
roubando meu ar e me deixa sem fôlego.

Bato as mãos em seus ombros, tentando afastá-lo e parar o


ataque, quando sinto minha consciência me deixando Fernando se
afasta, sorrindo ele me solta e desabo contra o chão, tossindo na
tentativa de recuperar o ar. Pelo amor de Deus, alguém me ajuda
imploro por socorro, Fernando joga uma nota de dois reais na minha
cabeça.

— Isso é o que vale o seu beijo, dois reais, espero que nunca
se esqueça isso e se prepare, vou pegar todos os seus beijos
enquanto eu tiver notas na minha carteira — ele diz e vai embora
assobiando.

A bile me corta com força e vomito até meu estômago só ter


um líquido branco para ser expelido. É difícil conseguir me arrastar
para fora daquela sala, mas o medo de que eles voltem é maior,
com esforço sigo para o banheiro e lavo minha boca com detergente
até meus dentes sangrarem pela força que imponho na escovação.
Pego minhas coisas e caminho para casa, demoro mais do que o
normal, as pernas moles e o choro incessante, uso o capuz para
esconder meu rosto.

Em casa, Olivia me recebe assustada e pergunta o que


aconteceu, eu conto tudo para minha irmã, a vergonha de ter sido
forçada a beijar e depois ser tratada como uma puta. Os tapas, o
aperto no meu pescoço que deixou marcas vermelhas, meu rosto
inchado onde Alice me bateu, no final ela me leva para a delegacia
da mulher e me faz relatar o ocorrido, um boletim de ocorrência é
feito e junto um exame de corpo de delito. Eu não tenho esperanças
de que isso resulte em algo, mas mesmo assim o faço porque é o
que Olivia pede.

Ela cuida da minha transferência de escola, não posso


continuar lá e correr o risco de ser estuprada por aquela pessoa. Só
consigo me matricular em uma nova escola por causa do boletim e
ser uma situação atípica, ninguém queria aceitar uma aluna faltando
dois meses para o fim do semestre, mas era isso ou eu repetiria de
ano e Olivia ameaçou processar as escolas.

Eu tive pesadelos com aquele dia durante três anos. E só


conseguia beijar na boca quando saia com a Olivia e ela me
apresentava a garotos legais nas festas em que ia e, às vezes, no
meio da bebedeira eu pegava mais de um por noite. Eu sabia que
com a Olivia ao meu lado nada de ruim poderia me acontecer.

Bianca — presente.

Mais uma vez fui tratada como uma puta que recebe dinheiro
para ficar com os homens, mas diferente do Fernando que me
forçou a ficar com ele, Louis me seduziu, me fez acreditar num
príncipe encantado enquanto me usou ao seu bel-prazer e depois
jogou fora como um pedaço de lixo.

Foi humilhante ficar naquela sala o dia inteiro com ele, tendo
que suportar a forma como ele me olhava, suas palavras duras e
lembrar que a minha maravilhosa primeira vez com esse homem foi
manchada com a lembrança daquele dinheiro. Queria estar com o
maldito envelope dentro da bolsa para poder devolver a ele, mas
nunca imaginei que aquele homem pudesse ser o vice-presidente da
VITTILENO, seu pai sempre teceu elogios sobre o filho mais velho,
mas aposto que ele não faz ideia do crápula que criou.

É difícil segurar as lágrimas quando sou humilhada dessa


forma, não quero ele pensando que sou fraca ou estou me fazendo
de vítima, por isso mesmo com o choro entalado na garganta eu
faço meu trabalho sem reclamar. E quando terminamos vou para o
banheiro, me tranco numa cabine e choro, passo a próxima meia
hora aliviando a dor em meu peito da única forma que sei, chorando.
Quando me sinto melhor, enxugo o rosto com papel higiênico
e vou para a pia, meu rosto está vermelho e inchado, a maquiagem
toda borrada. Lavo o rosto e escuto as mulheres ao meu lado
falando, elas pensam que devem estar sussurrando, mas posso
ouvir tudo.

— Se ela continuar assim não vai durar um dia.

— Olha como fica feia toda borrada e inchada, se for pra


chorar que seja em casa onde ninguém pode te ver.

Tenho ímpeto de me esconder, mas não posso me atrasar,


levanto o rosto e as encaro pelo espelho, ambas estão
deslumbrantes, em seus saltos altos e narizes empinados, elas
franzem a testa e vão embora. Pego minha bolsa e começo a
refazer minha maquiagem, estou quebrada por dentro e não vou
aguentar outros comentários como o delas, por isso refaço minha
maquiagem, à medida que engulo a tristeza. Se Louis acha que vai
ficar me humilhando, está tremendamente enganada, ele me pegou
de surpresa, mas agora estou preparada.
Capítulo 9

A semana passa da mesma forma, com Louis testando minha


paciência a cada minuto do dia. Eu ainda não consigo entender o
que fiz para ele me tratar dessa forma, fica soltando indiretas sobre
eu ser mentirosa, mas que inferno, não me lembro de mentir para
ela e maldita hora que o conheci. Nunca fui de explodir os meus
sentimentos, mas esse homem está merecendo ouvir poucas e
boas, estou a dois segundos de explodir com ele.

— Bianca! — Sua voz que uma hora achei sexy se torna


irritante e torço para que pegue uma dor de garganta e fique sem
falar durante dias, inferno de homem!

— Louis anda muito estressado desde que chegou — Marta


comenta, ela também percebeu o jeito que esse crápula me trata.

— Ele é o pior chefe que eu poderia pedir. — Levanto-me com


ódio e pego as pastas, estamos trabalhando juntos para descobrir
quem é a pessoa que tem roubado da VITTILENO, mas infelizmente
ela consegue se esconder muito bem e isso só resulta nele me
achando uma incompetente. Qualquer dia jogo essas pastas na cara
linda desse crápula!

— Louis tem sofrido pressão dos acionistas, pode ser que


seja por isso que anda mal-humorado. — Ela também se levanta e
pega uns documentos. — Achei isso, pode ser que ajude vocês.

— O que são? — Recebo as pastas em cima das que


carrego.

— Registros de quando entrei na empresa, quem sabe


procurar em outro lugar possa te ajudar a chegar onde você quer.

— Ótima ideia.

— Bianca! — A voz irritante de sexy volta a me chamar.

— Vá logo. — Ela abre a porta da sala e ao entrar, a agradeço


pela gentileza.

Louis está com sangue nos olhos, se posso definir assim, ele
está prestes a abrir aquele bocão que só sabe reclamar quando seu
celular pessoal toca. Aprendi a diferenciar o toque do de trabalho
com o pessoal, sempre que o segundo toca ele fica uma pilha de
nervos pior ainda e sou eu que sofro. Caminho silenciosa para sua
mesa, enquanto ele vai para a varanda atender ao chamado.
— Como esse infeliz esqueceu o Lorran?! — Seu grito me faz
tremer e me sento quietinha, não quero chamar sua atenção, ele
está mais furioso do que nunca.

Não sei o que está acontecendo, mas a forma como ele anda
de um lado para o outro e xinga em italiano me diz que tem algo de
muito errado. Meu celular toca e me apresso para atender, é minha
irmã.

— Oi, maninha — Olivia me saúda e percebo o tremor em sua


voz.

— Tô ocupada — sussurro, não querendo chamar a atenção


do Louis.

— Preciso da sua ajuda, você trabalha para o Louis Vittileno,


né?

— Sim.

— Preciso que você avise a ele que estou com seu sobrinho,
o pai não veio buscá-lo e nem o motorista, preciso saber onde é a
casa dele para deixá-lo lá, na secretaria o pai deixou somente o
número dele para contato, mas não atende as ligações e o
endereço ele ficou de trazer depois e não o fez.

— Minha nossa, deve ser por isso que o Louis está uma fera.

— Imagino, pode passar para ele?


— Eu vou tentar, mas não se assuste com os gritos dele — é
melhor avisar e deixá-la ciente de que o crápula está enlouquecido
de raiva.

Com as pernas bambas e o medo do que ele vai fazer quando


o interromper caminho até a varanda com o celular contra o peito,
Olivia não precisa ouvir as grosserias dele. Sei que se chamá-lo, ele
vai se irritar, então opto por ser prática e rápida, acabando com a
minha tortura.

— Seu sobrinho está com minha irmã — digo rápido antes


que ele possa abrir a boca e me xingar.

— O que disse?

— Ela é professora da creche em que seu sobrinho estuda, o


pai esqueceu de buscá-lo e não atende o telefone, muito menos
deixou outra informação de contato. Ela me ligou para pedir que
você diga o endereço do Lorran e ela possa deixá-lo deixar em
casa.

É a primeira vez que vejo medo e alívio nos olhos do Louis,


ele deve se preocupar muito com o sobrinho, pois nem me
responde, só pega o celular da minha mão e fala com ela.
— Fique com o Lorran aí, já mandei um carro buscar ele, por
favor, o acompanhe até em casa, não gosto de deixá-lo sozinho nos
veículos.

Olivia o responde e vejo o Louis suspirar e fechar os olhos,


pressionando os dedos na testa.

— Meu irmão não está bem, mas vou providenciar que isso
não volte a acontecer, obrigado.

Olha só, ele sabe falar obrigado, pena que nunca escutei essa
palavra vinda de seus lábios, mesmo me esforçando feito uma
condenada com esse relatório e ainda tendo que aguentar suas
grosserias.

Ele desliga a ligação e me entrega meu celular, dou meiavolta


e retorno ao meu lugar, enquanto Louis permanece na varanda
passando a mão no cabelo e respirando fundo. Acho que ele deve
estar tentando se acalmar, não tenho certeza. Só espero que ele
não desconte em mim a raiva pela merda que o irmão fez, esse é
um total mistério para mim, até Marta evita falar do outro filho e fica
triste com qualquer menção a ele. A verdade é que eu não sei nada
sobre essa família.

— Onde estávamos? — ele pergunta ao retornar e se sentar


em sua cadeira, o rosto está menos severo, espero que eu consiga
sobreviver ao dia sem chorar no final.
— Marta me deu esses novos arquivos — mostra a ele as
pastas —, ela disse que procurarmos por desfalques em outras
áreas poderia ajudar a achar quem é a pessoa.

— Você ainda não tinha pensado nisso? — Gelo, lá vem o


xingamento. — Se for para ser incompetente assim eu contrato a
Marta no seu lugar.

— Só estive focada em rastrear o que já sabemos —


respondo em um tom baixo, recuso-me a olhar para ele.

— Somente isso não é o suficiente, faça seu trabalho direito


— joga as pastas no chão e fico com medo, ele nunca explodiu
assim —, estou cercado de incompetentes!

Aperto os punhos e me levanto para apanhar as pastas, me


assusto com o som de vidro sendo quebrado. Louis pegou a jarra de
água e jogou contra a parede. Ele está descontrolado quebrando
tudo e jogando as coisas de sua mesa no chão, me encolho com
medo de ser atingida ou virar alvo de sua raiva. Quero sair daqui,
mas se o fizer vou ser atingida pelos cacos das coisas que ele joga
contra a parede da porta, longe de onde estou.

— Maledetto, stronzo, cazzo — xinga, descontrolado.

O telefone da sala toca e sei que pode ser a Marta para saber
o que está acontecendo, o som continua sendo emitido pela sala,
enquanto Louis xinga e chuta as coisas. Ele vai destruir tudo se
continuar assim. O ar falta em meus pulmões e começo a ter um
ataque de pânico, se ele me atingir com sua fúria ele vai me matar,
meu Deus, eu serei morta nessa sala.

Começo a hiperventilar sem conseguir fazer o ar entra em


meus pulmões, toco no chão, preciso sair daqui, engatinho para a
sacada onde devo conseguir respirar melhor e me proteger do seu
ataque. Meu peito dói, choro caindo contra o chão e minha vista
começa a escurecer, eu vou morrer aqui, não tenho dúvidas disso.
Esse chefe maluco é minha ruína.

— Merda, Bianca! — Ele paira sobre minha cabeça e dessa


vez a fúria em seus olhos desapareceu, assim como o ar em meus
pulmões. — Respire! Eu não queria te assustar, me desculpe — ele
me pega nos braços e nos traz para a varanda —, respire Bianca!

Puxo o ar, mas não consigo, não vem. Minha cabeça começa
a ficar zonza e minha vista a nublar, meu pulmão queima sem
oxigênio, o coração bate tão rápido que posso escutar as batidas.

— Você não vai desmaiar! — Inesperadamente, Louis coloca


seus lábios contra os meus e empurra uma lufada de ar contra
minha garganta, ele repete o movimento outras vezes até que
recupero minha respiração.

— Tudo... bem — digo ao recuperar o fôlego.


— Tem certeza?

— Sim.

— Grazie a Dio. — Toca a testa na minha e respira aliviado,


[15]

fico surpresa com sua reação mais do que com seu ataque de fúria.
— Perdoe-me, nunca mais vou explodir na sua frente desse jeito. —
Louis me aperta em seus braços, acho que tenta me abraçar, ainda
com medo fico quietinha.

— Ce-rto — é o que consigo dizer.

— Vou te colocar no chão. — Odeio que ele esteja sendo


delicado comigo e atencioso, me lembra o homem que conheci
naquela noite, que confiei e partiu meu coração, não vou me deixar
enganar novamente.

— Obrigada — agradeço e firmo minhas pernas.

— Eu estou furioso com meu irmão, não deveria ter feito


aquilo com você aqui dentro. — Acredito em suas palavras, seus
olhos não mentem.

— Fiquei assustada, mas estou bem agora. — Desvio meu


olhar dele, não consigo o encarar por mais de dois minutos.

— Eu fui um idiota com você, não é?


— Sim, e eu nem sei o motivo. — Aperto meu braço, não sei
quanto tempo vai durar essa paz temporária, mas não quero estar
aqui quando ele endoidar mais uma vez.

— Você sabe sim — sua voz retorna ao tom severo que ele
costuma usar comigo —, e agora me questiono se teve mesmo um
ataque de pânico ou só queria que eu te beijasse.

— Se dúvida disso poderia ter me deixado morrer. — Encaroo


com ódio, como ele pode ser gentil em um segundo e um crápula no
outro? — Seu crápula maldito!

— Sua vadia mentirosa! — rebate e tenho ímpeto de


estapeálo, mas não o faço, se ele endoidar mais uma vez eu não
conseguiria me defender, Louis é muito mais alto e forte do que eu.

— Eu não sou uma vadia mentirosa! — grito a plenos


pulmões. — Para de me chamar assim!

— Você é sim — aperta meu braço e me puxa para perto dele


—, não vou cair novamente nos seus joguinhos.

— Você é um maluco! — estapeio seu peito tentando me


soltar.

Louis está perto demais, sua respiração toca meu rosto e


dessa vez minhas pernas ficam bambas por um motivo diferente.
— Uma maldita mentirosa — segura meu pescoço me
trazendo para mais perto —, que não consigo esquecer a porra do
beijo.

Ele é bruto ao chocar meus lábios contra os seus e eu sou


uma idiota por me entregar ao beijo e deixar que sua língua invada a
minha, acendendo meu corpo e me fazendo ansiar por mais. Aperto
seu paletó e fico na ponta dos pés, tentando me igualar à sua altura,
buscando mais de seu gosto. Louis separa nossas bocas e me
arrependo de ter me entregado, seus olhos me preparam para o
golpe que sua boca dará.

— Uma vadia fácil e oferecida.

Me solta e sai da sala, deixando-me sozinha na varanda com


vergonha por ter me entregado mais uma vez a ele.
Capítulo 10

Como aquele stronzo foi capaz de esquecer o Lorran na


creche? Eu, finalmente, estava tendo esperanças de que o Levi
estava melhorando, que o tratamento o estava ajudando, mas agora
recebo ligação da creche dizendo que meu sobrinho estava
chorando e chamando pelo tio, já que o idiota do pai o esqueceu.

Converso ao telefone com o segurança responsável pelo Levi


e Lorran, ele disse que estava procurando pelo meu irmão que
sumiu e não percebeu que a hora havia passado e que estava
atrasado para buscar o Lorran. Levi só tem três tarefas na vida, uma
deixar e buscar o Lorran para ele não estar sozinho com a equipe de
segurança, segunda ir à terapia e seguir o tratamento, além da
terceira de não se matar.

— Seu sobrinho está com minha irmã. — Encaro a Bianca


sem acreditar em suas palavras.

— O que disse? — pergunto, incrédulo, como o Lorran foi


parar com a irmã dela?
— Ela é professora da creche onde seu sobrinho estuda, o pai
esqueceu de buscá-lo e não atende o telefone e nem deixou outra
informação de contato. Ela me ligou para pedir que você diga o
endereço do Lorran e ela possa deixá-lo deixar em casa.

O alívio me preenche, Lorran não está sozinho e se ele foi


capaz de se comunicar com a professora significa que ela deve falar
italiano. Pego o celular das mãos da Bianca sem nem falar com ela,
preciso que sua irmã saiba que tem de ficar com ele até eu chegar,
Lorran não pode ficar sozinho com os seguranças.

— Fique com o Lorran aí, já mandei um carro buscá-lo, por


favor, o acompanhe até em casa, não gosto de deixá-lo sozinho nos
veículos.

— Primeiramente, quando se fala com um estranho você o


cumprimenta. Segundo, eu estou cuidando do seu sobrinho, então
tenha mais educação, não sou uma de suas funcionárias. E terceiro,
como diabos o pai do Lorran esquece o menino por mais de duas
horas na creche? Vocês são loucos!

Fecho os olhos e suspiro contando até mil para não ser


grosseiro com essa mulher, pressiono os dedos na testa e mantenho
a calma ao respondê-la.

— Meu irmão não está bem, mas vou providenciar que isso
não volte a acontecer, obrigado.
— Não vai mesmo ou vou denunciar seu irmão por maustratos
com o filho!

Ela desliga o telefone e envio uma mensagem para meu


segurança informando que a professora vai acompanhar Lorran até
em casa. Tenho algumas reuniões o resto do dia, não poderia ter
esse problema agora, mas que porra! Sento-me na minha cadeira,
tentando focar no trabalho, tenho mais ou menos uns quarenta
minutos até o Lorran chegar em casa, vou encerrar isso e ir ficar
com ele.

— Onde estávamos? — pergunto a mulher que tem tirado


meu juízo todos os dias, ela entra nessa sala, age como uma
profissional competente, aguenta minhas grosseiras sem rebater,
mas que inferno! Ela fica se fazendo de idiota como se não
soubesse o motivo de maltratá-la.

O que me deixa mais furioso é saber que se não tivéssemos


tido um encontro como aquele, nossas vidas no trabalho seriam
completamente diferentes. Ela é uma ótima profissional que eu iria
admirar e se desse mole eu a conquistaria. Mas não, essa puta tinha
de estragar tudo e ainda agir como uma dissimulada!

— Marta me deu esses novos arquivos — me entrega as


pastas —, ela disse que procurarmos por desfalques em outras
áreas poderia ajudar a achar quem é a pessoa.
— Você ainda não tinha pensado nisso? Se for para ser
incompetente assim eu contrato a Marta no seu lugar.

Aperto os punhos, a fúria nublando meus sentidos e me


fazendo falar o que não deveria. Ela fica com medo e recua contra a
cadeira.

— Só estava focada em rastrear o que já sabemos. — Encara


o chão e me responde num ruído igual ao Levi quando faz merda,
aquele incompetente, vou arrancar sua cabeça quando por minhas
mãos nele.

— Somente isso não é o suficiente, faça seu trabalho direito


— em um acesso de fúria jogo as pastas no chão —, estou cercado
de incompetentes!

Como ele pôde fazer aquilo com o Lorran?

Pego a jarra de água e a jogo contra a parede, gritando


frustrado, sem saber como lidar com o ódio que estou sentindo eu
quebro tudo, jogo cadeira, livros, documentos, computador, tudo
bate contra a porta. O maldito telefone toca sem parar, o arranco do
gancho e o jogo na parede e o vejo se espatifar em milhões de
pedaços. Estou vendo vermelho, o sangue nas veias bombeando
rápido e fervendo. Mas que inferno de vida!

— Maledetto, stronzo, cazzo — xingo, chutando o sofá.


Busco por algo para descontar minha fúria quando vejo
Bianca deitada no chão e hiperventilado. Agacho-me ao seu lado e
vejo o desespero em seus olhos, as faces vermelhas e a boca
aberta sem conseguir puxar o ar para os pulmões.

— Merda, Bianca! Respira! Eu não queria te assustar, me


desculpe. — Pego-a no colo, seu corpo tão leve quanto consigo me
levar, na varanda espero que o ar fresco a faça voltar ao normal,
mas nada adianta. — Respire, Bianca!

Ela vai acabar desmaiando se continuar assim. Preciso


pensar rápido e decidir o que fazer para a ajudar.

— Você não vai desmaiar! — Inspiro uma lufada de ar e jogo


contra sua boca, inspirando e expirando junto com ela, trocando o ar
de nossas respirações até que ela consiga o fazer sozinha.

— Tudo... bem — diz.

— Tem certeza? — pergunto, ainda vendo como ela inspira


com dificuldade

— Sim.

— Grazie a Dio. — Descanso minha testa contra a sua, o


[16]

alívio me tomando. Eu sou um stronzo que explodiu na frente dela e


fez ter um ataque de pânico. — Perdoe-me, nunca mais vou explodir
na sua frente desse jeito. — Abraço-a para ter certeza de que está
viva e comigo, o calor do seu corpo se chocando em mim, as mãos
em meu peito, a respiração contra meu pescoço acalmando minha
fúria.

Eu preciso dela.

— Ce-rto — ela me responde baixinho.

— Vou te colocar no chão. — Tomo cuidado para que ela


consiga se firmar.

— Obrigada.

— Eu estou furioso com meu irmão, não deveria ter feito


aquilo com você aqui dentro — ela merece a verdade, então por um
segundo vou baixar meu escudo.

— Fiquei assustada, mas estou bem agora. — Seus olhos se


perdem do meu e focam na minha gravata, ela nem consegue mais
me encarar com medo das minhas babaquices.

— Eu fui um idiota com você, não é? — odeio admitir isso.

— Sim, e eu nem sei o motivo. — Quando finalmente estou


cedendo, ela tenta me enganar novamente.

— Você sabe sim e agora me questiono se teve mesmo um


ataque de pânico ou só queria que eu te beijasse. — É ridículo
pensar isso, mas o pensamento se infiltra como uma erva-daninha
na minha mente.

— Se dúvida disso poderia ter me deixado morrer. — Seu ódio


acende minha fúria. — Seu crápula maldito!

— Sua vadia mentirosa! — rosno na sua cara.

— Eu não sou uma vadia mentirosa! — Seu grito dói em meus


ouvidos — Para de me chamar assim!

— Você é sim — aperto seu braço, trazendo-a para perto,


maldita atração que me faz perder os sentidos —, não vou cair
novamente nos seus joguinhos.

— Você é um maluco! — ela bate em meu peito e essa é a


última gota.

— Uma maldita mentirosa — aperto seu pescoço a puxando


para mim —, que não consigo esquecer a porra do beijo. —
Recrimino-me por ter admitido isso para ela.

Beijo-a com brusquidão, preciso calar o maldito desejo que


queima minhas estranhas por essa mentirosa ardilosa. Ela se
infiltrou na minha pele e sei que isso só vai acabar quando fodê-la
do jeito que preciso. Pressiono seu quadril com minha mão e a puxo
para mim, aprumo sua cabeça para que eu tenha mais acesso a sua
boca, a invado com minha língua puxando seu gosto e me
saboreando com essa maldita. Ela geme contra minha boca e sei
que se não soltá-la agora vou fodê-la na minha sala e depois me
arrepender por ter cedido com tamanha facilidade a essa infeliz.
Encaro seus olhos antes de dizer:

— Uma vadia fácil e oferecida.

Solto seu corpo e a deixo na varanda, não vou mais conseguir


trabalhar hoje e preciso cuidar do meu sobrinho.

Chego ao apartamento e me deparo com uma cena inusitada,


de todos os cenários que imaginei, nenhum deles incluía o Lorran
correndo e rindo enquanto grita animado com a professora o
perseguindo pela casa usando uma máscara de dinossauro e
fazendo os sons do animal.

— Zio! — Pula no meu colo e tenta me escalar, ficando de pé


em cima dos meus ombros, seguro suas mãos para ele não perder o
equilíbrio. — Alvo do dinussuro[17] — comemora, feliz, e o dinossauro
cai no chão, dando o jogo por encerrado.

— Sei um piccolo molto inteligente. — Ela sorri para ele e


[18]

Lorran se joga em seus braços.

— Vuoi di più [19]


— ele pede, animado, me ignorando, Lorran
nunca se distraiu com outro ser humano o suficiente para me
ignorar.
— Vai a giocare um po ‘, ho bisogno di parlare com tuo zio. [20]

— Coloca-o no chão e ele acena positivo.

— Eu sinto muito — me desculpo antecipadamente —, o Levi


deveria ter ido buscar ele, não sei o que aconteceu.

— Seu irmão chegou há pouco tempo fedendo a cachaça. —


Seu olhar é mortal.

Ela não me lembra em nada a Bianca, é mais alta e tem um


corpo definido, os seios fartos, a barriga chapada e coxas grossas
que me deixam interessado em saber como seria ir para a cama
com ela. A morena grita tesão mesmo com o uniforme de trabalho, a
boca carnuda e vermelha, o olhar desafiador, ela é linda da cabeça
aos pés. Contudo, não me desperta como Bianca fez no segundo
em que a vi. A irmã mais velha pode ser mais bonita e gostosa, mas
é Bianca que tem mexido com minha cabeça.

— Eu vou cuidar disso, obrigado por trazer o Levi para casa.

— Que isso não se repita — aponta o dedo na minha cara —,


amanhã se ele for esquecido de novo vou ligar para o conselho
tutelar e abrir uma denúncia contra o seu irmão e você por
abandono parental.

— Já disse que isso não irá se repetir. — Aperto os punhos,


ao contrário de quando descarrego a raiva na Bianca, sua irmã tem
o poder de interferir na minha relação com meu sobrinho e vendo
como o menino a adora, eu não seria capaz de os afastar.

— Assim espero e contrate uma babá que fale italiano, Lorran


se sente sozinho quando você não está.

Suas palavras acertam meu coração, aceno em positivo e a


vejo se despedindo do Lorran, que a agarra pelo pescoço, beija sua
bochecha e oferece um docinho para que ela continue com ele, mas
ela nega, faz cócegas nele e promete vê-lo amanhã. Ela vai embora
e meu menino volta a brincar com seus brinquedos. Beijo sua testa
e peço desculpas por ele ter passado por isso, sua resposta me
surpreende e me machuca.

— Pui dimeeeeenticarmi di nuvu, mi pace stre com la zia


Olivia più che conIl Levi[21].

Aperto meu garoto, vou quebrar a cara do Levi por isso.


Capítulo 11

Ver Bianca naquela saia lápis marcando as curvas de sua


cintura, bunda e coxas não serviu para acalmar meu estresse,
somente acendeu o pavio que estava por um fio de explodir. Ela fica
desfilando usando essa coisa indecente pela empresa, os saltos
altos realçando suas panturrilhas, minha vontade é pegá-la no colo e
foder sua boceta usando os malditos saltos com a saia enrolada na
cintura.
Já se passaram duas semanas desde que tive meu ataque de
fúria e última briga com ela, ando tão estressado com o Levi que
não tenho tempo para provocá-la e me divertir com sua irritação,
tenho a deixado em paz nesses dias, mas hoje cheguei ao meu
limite com essa maldita saia.
Estamos indo para a sala de reuniões, sozinhos no elevador
presidencial aperto meus punhos e prendo a respiração, o perfume
doce da maldita no meu nariz não ajuda em nada a manter o
controle. Aproximo somente um pouco dela e inalo o cheiro de seus
cabelos. Ah, como tenho vontade de apertá-los em minhas mãos e
fodê-la desse jeito contra a parede do elevador. Um sinal meu e a
câmera seria desligada.
— Tá tudo bem? — ela pergunta com a voz vacilante, por
cima de seu ombro vejo seu peito subindo e descendo, uma gota de
suor escorrendo em seu pescoço.
Bianca sempre usa o cabelo em um coque alto no trabalho,
perfeito para segurar enquanto ela fica de joelhos, abocanhando
meu pau. Já faz quatro dias que não transo e estou precisando
extrapolar esse tesão acumulado ou vou acabar cometendo uma
loucura, nunca fiquei tanto tempo sem sexo. E a situação com o Levi
e Lorran tem roubado meu tempo livre e de trabalho.
— Seu cabelo tem um cheiro viciante. — Temos cerca de três
minutos antes de chegarmos ao andar de reuniões, vou aproveitar
um pouquinho. Aproximo mais um passo dela, deixando sua bunda
sentir meu membro duro por ela. Bianca é baixinha mesmo nos
saltos altos, e eu adoro isso.
— Isso não tem graça, Louis. — Afasta-se, ficando quase
colada a parede do elevador. Ela aperta o tablet em suas mãos
contra o peito, as gotas de suor aumentando em seu pescoço.
— Tem razão. — Volto a pressioná-la, dessa vez com todo o
meu corpo, rodeio seu tórax com meus braços, à medida que roço o
antebraço em seus peitos ouvindo seu arfar gostoso. — Por mais
que eu te deteste não consigo esquecer seu gosto em minha boca.
— Beijo delicadamente seu pescoço, fazendo-a se encolher e fechar
os olhos. — Você ainda se lembra? Da minha boca chupando sua
bocetinha, deixa eu provar dela novamente. — Uso um tom de voz
macio e baixo, perfeito para a deixar molhadinha e entregue.
— Não — responde, ao contrário do que pensei com a voz
firme e decidida.
— Por quê? Você gostou tanto quanto eu.
— Mas depois você quebrou meu coração com aquele maldito
dinheiro. — Soluça e percebo que passei dos limites, a solto e me
afasto.
— E você a minha confiança, considere que estamos quites
— respondo, duramente, olhando para a frente e ajeitando minha
calça para esconder meu volume.
— Como eu fiz isso? — Encara-me de frente e as lágrimas em
seus olhos me balança, como ela pode ser tão dissimulada? — Eu
fico repassando aquela noite milhares de vezes e não consigo
entender o que eu fiz de errado.
— Você sabe o que faz. — Ajeito minha gravata e as portas se
abrem, antes de sair seguro seu braço e sussurro em seu ouvido: —
é uma vadia mentirosa que só não demiti ainda por não ter um
motivo plausível para isso.
— Você é horrível. — Sua voz treme e encaro seus olhos, seu
choro não vai me convencer.
— Posso ser, mas ao menos não menti ou tentei te enganar,
ainda fui generoso de deixar dinheiro para você.
Sem esperar sua resposta a deixo no elevador e sigo para a
sala de reuniões. Essa semana meu pai está na Itália cuidando da
filial de lá. Os acionistas brasileiros estão no meu cangote como um
bando de urubus doidos para comer a carne podre. Vou demitir
metade dessa escória quando assumir de vez a presidência,
infelizmente, meu pai ainda nutre amizade e consideração por
alguns desses urubus velhos. Em breve vou começar a me
encontrar com jovens promissores que trarão muito mais para essa
empresa do que esses inúteis.
Sento-me à cabeceira da mesa e Bianca fica à minha direita
como minha secretária e pessoa que mais confio aqui dentro,
apesar de nosso desentendimento na vida pessoal não posso negar,
ela é uma excelente profissional, brilhante e com um faro para os
negócios de primeira linha, há cada dia que vejo o quanto ela é
sagaz na empresa eu me arrependo mais de ter dormido com ela,
não estou aproveitando seu potencial por causa de uma rixa pessoal
minha.
Iniciamos a reunião e repassamos os relatórios de cada setor,
minha atenção fica dividida entre o que estão falando e sendo
apresentado, e em como Bianca morde a ponta da unha. Tenho
vontade de impedir que ela faça isso e eu mesmo enfiar seu dedo
em minha boca a fim de chupá-lo com a intenção de provocá-la. Se
ela estivesse mais perto eu poderia ter uma visão melhor de suas
pernas debaixo da mesa, mas ela tinha de encolhê-las e ficar
empinando os seios, a maldita só pode estar me provocando.
— Estamos perdendo o mercado asiático. — Isso chama
minha atenção, quem fala é o Samuel, diretor de vendas dos países
asiáticos. — A seda produzida na China a um preço inferior aos
nossos produtos tem feito com que empresas de Hong Kong e o
Japão trocassem de fornecedor, foram bilhões perdidos com isso.
Arqueio a sobrancelha, não tenho certeza se a troca foi
realmente o baixo preço da seda chinesa.
— Tem certeza disso? — Bianca me passa o tablet, contendo
o relatório e observo com atenção, os gráficos me dizem outra coisa.
— Sim, senhor, recebemos essa semana um e-mail da T-zui
informando que não renovaria o contrato conosco devido à baixa
qualidade do nosso produto e o preço alto, eles vão trabalhar com
outra empresa agora.
— Silvana do setor de qualidade do produto — a mulher me
olha e já consigo perceber que está nervosa —, aconteceu algo com
os tecidos enviados para a T-zui?
— Não, senhor, estão dentro dos nossos padrões.
— Vá até Hong Kong e resolva isso, traga uma amostra dos
produtos que foram enviados para lá.
— Como eu faria isso? — Fico irritado com sua pergunta,
respiro fundo três vezes antes de a responder.
— Você não conhece nossos produtos? Sabe quais roupas
são feitas pela T-zui, se não conseguir a amostra direto com eles a
encontre no mercado.
— Senhor, isso é mesmo necessário? Podemos...
— Podemos trocar a chefe do setor de qualidade de produtos
por alguém que não seja preguiçosa!
A sala de reuniões que estava calada começa a se encher de
burburinho e protestos, bato na mesa, minha atitude cala a todos e
suas atenções ficam focadas em mim.
— Vocês são um bando de preguiçosos, com esses relatórios
porcos e insuficientes. Essa é a nossa primeira reunião de relatório
de controle de vendas e estou insatisfeito com todos os resultados.
Como que vocês recebem dois cancelamentos de contrato
reclamando da qualidade do produto e simplesmente não fazem
nada! — Levanto-me e jogo os papéis sobre a mesa, encarando
bem cada um ali. — As coisas por aqui vão mudar e quem não
estiver satisfeito pode ir embora, nunca mais me apresentem um
serviço porco como esse.
Ninguém esperava por essa reação, peguei-os de surpresa.
Sempre admirei meu pai e seu jeito de conduzir os negócios, mas é
inaceitável que tenhamos tantos incompetentes fazendo trabalhos
importantes.
— Todos considerem seus empregos como instáveis, vocês
irão passar um mês em avaliação e quem não mostrar resultado
satisfatório será demitido, seja um membro do conselho de
acionistas, um diretor de setor, ou até mesmo as secretárias. A partir
de hoje a VITTILENO brasileira vai entrar em período de avaliação e
balanceamento interno.
Não espero pelos protestos deles e saio, Bianca vem ao meu
encalço, ela já sabia que eu faria isso hoje, mas seu nervosismo
continua como se estivesse na berlinda. Ela foi a responsável por
me ajudar a ver muitas das irregularidades aqui dentro e sabia que o
resultado para isso seria demissões.
— Diga que estou chamando o diretor do setor financeiro em
minha sala.
— Sim, senhor.
Ela volta para a sala de reuniões e entro no elevador. Quando
chego ao meu andar, tateio meus bolsos e percebo que esqueci o
celular, devo o ter deixado em cima da mesa da sala de reuniões,
aperto o elevador para retornar aonde eu estava e quando as portas
se abrem, meu sangue ferve e estou prestes a cometer um
homicídio.
Bianca está sendo pressionada contra a parede por um
homem que desconheço, ele tem a perna entre as delas, a mão no
seu pescoço e a boca tocando os lábios que somente eu poderia
beijar. Seguro no ombro do infeliz e o puxo para longe, ela me
encara assustada e se abaixa para pegar suas coisas no chão com
as mãos tremendo. Não acredito que ela teve a audácia de ficar se
agarrando pelos cantos da empresa. Essa eu não deixarei passar.
— O que está acontecendo aqui? — pergunto a ambos, ela
fica encolhida com as bochechas vermelhas olhando para o chão. O
homem tem o olhar assustado quando percebe quem os separou.
— Desculpe por isso, senhor Vittileno — ele se pronuncia —,
eu e Bianca fomos namorados no ensino médio, fiquei surpreso
quando a reencontrei e acabamos perdendo o controle.
Aperto os punhos, esse deve ter sido o infeliz que levou sua
virgindade antes de mim. Quero socar a sua cara, olho para Bianca
que permanece muda, quase se escondendo de vergonha. Ela não
esperava ser surpreendida enquanto se agarrava com o
exnamorado.
— Isso é verdade, Bianca? — pergunto, no fundo preciso que
ela negue.
Em vez de me responder ela corre para dentro do elevador,
antes que as portas se fechem entro e o filho da puta vem também,
mas o paro com um empurrão em seu peito.
— Esse elevador é para o presidente, não é para você. —
Aperto o botão de fechar as portas.
Estou fervendo de raiva, como ela pôde fazer isso? Me
rejeitou mais cedo e agora estava de safadeza com aquele cara! Ela
não passa de uma puta barata e se é isso que Bianca é vou pegar o
que é para ser meu. As portas se abrem e ela corre para sua mesa
pegando sua bolsa e se preparando para sair. Seguro seu braço e a
levo para a minha sala, ela não vai escapar de mim dessa vez.
— Me rejeita e se joga nos braços de outro? — Controlo
minha voz para não explodir com ela.
— Não foi isso que aconteceu — quase não escuto sua voz.
Pego minha carteira e tiro todas as notas que tem lá, seguro
sua mão e jogo o dinheiro em sua palma.
— Você não passa de uma vadia que eu vou foder, já estou
adiantando seu pagamento.
Ela arregala os olhos e aperta o dinheiro em sua mão, sorrio
triunfante hoje acabo com minha vontade. Retiro minha gravata e
paletó, Bianca abre a bolsa para guardar o dinheiro. Mas sou
surpreendendo quando ela puxa um envelope e o joga na minha
cara junto das notas, o papel machuca meu olho e me encolho,
segurando o rosto.
— Ficou louca!? — grito.
— Vá se foder. — Lágrimas escorrem por suas bochechas. —
Eu não sou uma vadia e muito menos me deitei com você por
dinheiro. Por que você me odeia tanto? — Descontrola-se, gritando
e chorando, enquanto aperta a bolsa em sua mão.
— Você mentiu para mim, fingindo ser virgem, queria que eu
continuasse a tratando como uma princesa? Sua vadia! — grito na
sua cara, ela nega com a cabeça várias vezes antes de rebater.
— Eu nunca menti para você, aquela foi a minha primeira vez.
— Mentirosa, já dormi com muitas virgens e todas sangram
quando perdem a virgindade, mas você nem mesmo uma gota
derramou.
— Eu sangrei sim — diminui o tom de voz.
— Não tinha sangue na camisinha, lençol ou entre suas
pernas, como quer que eu acredite?
— Quando você foi para o banheiro — dessa vez ela
responde entre soluços, os braços despencam ao seu lado sem
forças —, escondi o lençol com sangue debaixo da cama, minha
virilha só manchou quando me levantei e corri para o banheiro para
me limpar, fiquei com vergonha que você visse e, por isso, encobri
tudo.
— Isso não faz sentido. — Se ela pensa que vou acreditar
nessa merda, está louca.
— Ligue para o hotel e pergunte sobre os lençóis daquela
noite. — Ela se senta no sofá e esconde o rosto entre as mãos. — É
sempre essa mesma merda comigo, todos vocês me usam e me
machucam, estou cansada disso. — Levanta-se e a dor em seus
olhos faz eu me arrepender de minhas ações, se for verdade o que
ela diz eu agi como um idiota. — Eu me demito.
— O-quê? — Não esperava por isso.
— Não faz mais sentido eu continuar. — Suspira, as lágrimas
descendo por sua bochecha. — Adeus, senhor Vittileno.
Ela sai pela porta e não tenho o direito de ir atrás dela. Pego o
telefone em cima da minha mesa e ligo para o hotel, preciso saber
se é realmente verdade o que ela falou ou se é mais uma de suas
mentiras. O gerente me confirma que no dia seguinte as camareiras
acharam um lençol com uma mancha de sangue debaixo da cama e
meu coração afunda dentro do peito. Eu não fui justo com ela, a
maltratei por pura insegurança e agora a quebrei por completo.
Vou para a varanda pegar um pouco de ar, mas que merda,
não deveria ter feito aquilo com a Bianca. Chuto a grade e dou meia-
volta, saindo do escritório, olho para a mesa dela e não vejo nada.
— Senhor Louis. — Marta me chama, levanto um dedo
indicando que se cale.
— Para onde Bianca foi?
— Escadas, mas, senhor...
Não termino de ouvir sua fala e vou atrás da morena que tem
me enlouquecido e me feito agir feito um maluco que não sabe
controlar os próprios impulsos e um perfeito homem das cavernas.
Abro a porta e nem em mil anos poderia ter me preparado para o
que encontrei naquela escada.
Capítulo 12

Descobrir que o Fernando trabalha na Vittileno foi um baque


para mim. Ele faz parte do time de contabilidade da empresa e
tenho o evitado mais do que o diabo foge da cruz. Quando o ataque
no colégio aconteceu o B.O não resultou em nada por ele ser menor
de idade, nem mesmo foi submetido a algum serviço comunitário,
mas o medo que ele me causa nunca passou. Tenho ficado mais na
minha mesa e almoçando nas escadas para evitar encontrar com
ele no refeitório, para a minha sorte ainda não fui notada por ele,
mas não sei por quanto tempo vou continuar invisível.
Louis estranhamente tem estado menos monstro essa
semana, não sei se é resultado da sua explosão naquele dia e agora
ele quer ser uma pessoa decente comigo, mas ele deixou de me
azucrinar. E tem reduzido seus insultos a olhares feios e meias
palavras, pelo menos não me chama mais de vadia. Espero que as
coisas possam continuar assim entre nós.
No elevador, a caminho da reunião, eu fico quietinha com o
coração na boca, consigo ver através do reflexo da parede do
elevador como o Louis está olhando para a minha bunda e
mordendo os lábios. Ele ainda me causa tesão e desperta meus
desejos, queria que as coisas tivessem sido diferentes e que
pudéssemos ter continuado juntos depois daquela noite. Porém, não
foi isso que aconteceu e agora quero me manter o mais longe
possível de qualquer envolvimento com ele. Embora seja difícil
controlar o que sinto.
Leva tudo de mim para não me tremer quando ele cheira meu
cabelo e seu quadril encosta em mim, minha bunda contra sua
virilha, a braguilha do seu cinto contra minha bunda. Mesmo com os
saltos altos ainda fico baixinha comparada à altura desse homem.
Aperto o tablet contra o corpo, se eu ficar quieta é capaz dele ir
embora, certo?
— Tá tudo bem? — minha voz não sai firme como pretendi,
mas não consigo somente o sentir tão perto e não fazer nada.
— Seu cabelo tem um cheiro viciante — ele insiste em me
falar essas coisas e fazer com que eu vacile em minhas
inseguranças.
— Isso não tem graça, Louis. — Afasto-me dele quase
colocando a testa na porta do elevador, aperto mais o tablet contra o
peito, malditas portas que não abrem.
— Tem razão. — Ele me abraça e arfo pelo susto. — Por mais
que eu te deteste não consigo esquecer seu gosto em minha boca.
— Encolho-me com o toque de seus lábios no meu pescoço. —
Você ainda lembra? Da minha boca chupando sua bocetinha, deixa
eu provar dela novamente. — É covardia ele brincar com meus
sentimentos dessa forma.
— Não.
— Por quê? Você gostou tanto quanto eu.
— Mas depois você quebrou meu coração com aquele maldito
dinheiro. — Que guardei dentro da minha bolsa, é difícil controlar o
soluço, a humilhação faz com que me sinta um lixo sempre que me
lembro.
— E você a minha confiança, considere que estamos quites.
— Como eu fiz isso? — Encaro-o lutando contra as lágrimas.
— Eu fico repassando aquela noite milhares de vezes e não consigo
entender o que eu fiz de errado.
— Você sabe o que faz — ele nem mesmo me olha, antes de
sairmos, sua mão segura meu braço e ele me quebra novamente —,
é uma vadia mentirosa que só não demiti ainda por não ter um
motivo plausível para isso.
— Você é horrível.
— Posso ser, mas ao menos não menti ou tentei te enganar,
ainda fui generoso de deixar dinheiro para você.
A reunião é um inferno pessoal para mim, o choro entalado na
garganta e minha concentração dispersa, ainda bem que Louis não
pede para que eu fale nada e após o seu discurso sobre as reformas
que fará na empresa saímos da sala. Retorno para chamar o diretor
e sou surpreendida quando vejo Fernando falando com ele, tento
voltar, mas o diretor já me percebeu e me chama, fazendo Fernando
notar minha existência. O jeito como ele me olha me deixa ciente de
que se lembra de mim.
— Precisa de algo, senhorita Bianca? — o diretor pergunta e
a única coisa que sei fazer é recuar e dar a volta no corredor, me
apressando para pegar o elevador presidencial. Se o idiota fizer algo
os seguranças vão ver na câmera e virão ao meu encontro.
Antes de tocar o botão, sou jogada contra a parede oposta,
minhas coisas caem no chão e não tenho tempo de gritar ou fugir.
Fernando me imobiliza com um braço pressionando minha barriga,
uma mão tampa minha boca com sua mão e enfiando uma de suas
pernas entre as minhas.
— Sabia que aquele B.O me perseguiu por anos? — Quero
gritar e correr para longe, mas não consigo. — Por sua culpa quase
que não consegui entrar na faculdade, eu também era uma criança
quando fiz aquela merda, mas você tinha de estragar tudo, não é?
— Sua boca paira sobre meu ouvido e ele o morde com força, a dor
me faz encolher e grunhir. — Passei anos arrependido por não ter te
estuprado e jurando para mim mesmo que faria isso caso a
encontrasse novamente. Olha só como o destino foi bonzinho, me
mostrou você quando deixou de ser uma pata gorda.
Ele solta minha boca e quando estou prestes a gritar sua boca
toma a minha, mordendo minha língua até sangrar quando
consegue passagem. Tento me soltar dele, mas sua força é imensa,
ele aperta meu pescoço e começo a arfar sem ar. Seu corpo é
arrancado abruptamente do meu, mas o medo não me deixa ao ver
a fúria nos olhos do Louis, ele já me acha uma vadia e nunca escuta
minhas explicações, não terei chance contra ele, com nenhum dos
dois.
— O que está acontecendo aqui? — Sua voz irritada me
assusta e me encolho, eu só quero correr e fugir para longe, mas
minhas pernas se recusam a se mover.
Não consigo ouvir o que eles falam, pego minhas coisas no
chão e corro para o elevador, preciso fugir daqui antes que o Louis
exploda comigo. Não vou suportar mais um de seus ataques, não
agora em que meu coração sangra e minha alma tem seus últimos
pedacinhos arrancados. No nosso andar pego minha bolsa para
poder ir embora, pois não posso trabalhar hoje ou continuar nessa
empresa por mais um segundo. Louis segura meu braço e me
arrasta para dentro de sua sala.
— Me rejeita e se joga nos braços de outro?
— Não foi isso que aconteceu — respondo por medo de sua
fúria. Sou incapaz de o encarar, mas ele termina de me quebrar ao
colocar dinheiro em minha mão e falar.
— Você não passa de uma vadia que eu vou foder, já estou
adiantando seu pagamento.
Essa é a gota d’água nesse inferno de vida que levo, aperto o
dinheiro e pego o envelope que guardei na bolsa para devolvê-lo,
jogo ambos em sua cara, acertando seu olho, e ouço seu grito.
— Ficou louca!?
— Vá se foder — explodo —, eu não sou uma vadia e muito
menos me deitei com você por dinheiro. Por que você me odeia
tanto? — Minhas mãos tremem e minhas pernas estão a segundos
de me fazerem cair no chão.
— Você mentiu para mim, fingindo ser virgem, queria que eu
continuasse a tratando como uma princesa? Sua vadia! — Seu grito
faz eu querer me encolher achando que ele pode me bater, mas se
esse será o final vou fazê-lo engolir suas malditas palavras.
— Eu nunca menti para você, aquela foi a minha primeira vez.
— Mentirosa, já dormi com muitas virgens e todas sangram
quando perdem a virgindade, mas você nem mesmo uma gota
derramou.
— Eu sangrei sim. — Então foi isso? Percebo agora que
minha vergonha em deixá-lo ver o sangue causou isso tudo.
— Não tinha sangue na camisinha, lençol ou entre suas
pernas, como quer que eu acredite?
— Quando você foi para o banheiro — choro descontrolada,
sou sempre uma idiota por achar que fazendo o meu máximo para
não desagradar os outros e sempre acontece o contrário —, escondi
o lençol com sangue debaixo da cama, minha virilha só manchou
quando me levantei e corri para o banheiro para me limpar, fiquei
com vergonha que você visse e, por isso, encobri tudo.
— Isso não faz sentido.
— Ligue para o hotel e pergunte sobre os lençóis daquela
noite. — Sento-me cansada no sofá, escondendo o rosto com as
mãos, estou farta dessa vida. — É sempre essa mesma merda
comigo, todos vocês me usam e me machucam, estou cansada
disso, eu me demito.
— O quê?
— Não faz mais sentido eu continuar, adeus, senhor Vittileno.
Saio pela porta, segurando minha bolsa, ignoro os chamados
de Marta perguntando o que aconteceu. Abro a porta que dá acesso
às escadas para ir ao terraço, estar em lugares altos sempre ajuda a
colocar minha cabeça no lugar e refletir sobre o que devo fazer em
seguida. Não dou um passo quando vejo um pequeno garotinho
brincando com um carrinho no degrau. Ele parece solitário e triste.
— Oi, você se perdeu? — Aproximo-me dele com cuidado,
sentando-me ao seu lado.
Ele tem cabelos loiros e as bochechas mais gostosas que já
vi, ele me encara com uma imensidão azul em suas pupilas. Os
olhinhos tristes e um biquinho que me faz guardar toda a minha dor
para poder ajudar esse pequeno.
— ão falo potugue — ele diz todo embolado, tentando
[22]

lembrar as palavras. Possa ser que eu esteja enganada, mas vou


tentar falar com ele em italiano, talvez dê certo.
— Parli italiano[23]? — Inclino a cabeça e ele acena que sim,
sorrio para o pequeno que me olha com feições puras. — Ti sei
perso? [24]
— Asplando lo zio Louis. [25]
— Vuoi che ti porti da lui? [26]

Non serve. [27] — Volta a brincar com o carrinho.
Pego seu outro carrinho e fico brincando com ele, vou esperar
aqui até o jumento do seu tio aparecer e o levar para dentro, se ele
subir as escadas sozinho vai parar no terraço e é perigoso uma
criança fazer isso.
Enxugo minhas lágrimas, meu peito ainda dói depois de tudo
que aconteceu, mas não vou deixar que o pequenino perceba. No
momento, a prioridade é garantir que ele fique bem.
A porta é aberta e Louis a atravessa assustado e parecendo
que viu um fantasma, seus olhos relaxam quando me vê e, então,
ele nota o sobrinho ao meu lado e pela sua cara percebo que ele
não está entendendo nada da cena que se desenrola.
— Lorran. — Nunca vi o Louis com uma voz delicada e cheia
de carinho quanto a que usa para chamar o menino. — Cosa ci fa
l'uomo qui? [28]
— Zio. — O menino corre para os seus braços e o Louis o
pega no colo, estranhamente o Lorran começa a buscar algo nos
bolsos do paletó do Louis, até que acha uma barrinha de chocolate
e fica agoniado para sair. Louis o coloca no chão e ele vem até mim
e me entrega o doce.
— Un dolzinho pel ere lici.
— Lorran dá doces para deixar as pessoas felizes ou para
suborná-las a ficarem mais tempo com ele — Louis explica e pega o
sobrinho no colo que grita e começa a rir quando o tio faz cócegas
em sua barriga com a boca.

Ver os dois assim me deixa feliz, então ele não é um crápula
com todo mundo, devo ter sido a sorteada para receber suas
grosseiras.
Grazie, Lorran — agradeço e me levanto, pronta para ir
embora.
Louis segura minha mão e seu olhar me desmonta, cheio de
carinho e cuidado, a última vez em que ele me olhou assim foi na
minha primeira vez. Ele não tem o direito de brincar com minhas
emoções dessa forma.
— Por favor, não vá ainda. Vou descobrir o motivo do Lorran
estar aqui e depois precisamos conversar, deixa eu me desculpar
com você e resolver essa situação.
Queria ter forças para recusar, mas não consigo. Não quando
o vejo expressando tantos sentimentos, meu coração machucado
merece um pedido de desculpas decente. Aceno que sim e volto
para o lobby com ele, lá percebo o um homem loiro e bonito como o
Louis, só que mais novo.
— O que está acontecendo aqui? — Louis pergunta, Lorran
esconde a cabeça no pescoço do tio.
— O bonito do seu sobrinho cismou que quer morar com a
professora dele, estava fazendo um escândalo em casa quebrando
os brinquedos. Não consegui o controlar e disse para ele pedir isso
a você, quem sabe assim ele perceba que é loucura querer morar
com a professora! — Ele fala tudo em italiano e muito rápido, quase
não consigo entender suas falas.

— Lorran, você não pode morar com sua professora — Louis
responde em italiano para o menino que abre o bico e começa a
chorar.
— A professora é a minha irmã? — pergunto ao Louis.
— Sim.
Posso ligar para ela vir conversar com o Lorran e o
acalmar.
— Por favor, faça isso.
Vamos todos para a sala do Louis e ligo para a Olivia que
chega dentro de uma hora e conversa com o Levi sobre isso. O
menino não poupa palavras para dizer o quanto ama a minha irmã e
quer ficar com ela o tempo todo, que odeia o Levi, que é o seu pai e
em momento algum ele o chama dessa forma. Ele quer que a Olivia
seja parte de sua família, ele a ama e não quer mais ficar longe
dela. No fim, estou chorando novamente com a dor daquele
pequenino o Louis com os olhos marejados e o Levi se acabando de
chorar no sofá.
— Eu não sei o que fazer — ela diz em português para que o
Lorran não entenda.
— Qual a sua disponibilidade? — Louis pergunta —, quando
não está na creche, você trabalha?
— Sim, fico em período integral na creche.
— Vou matricular o Lorran em tempo integral, quando ele não
estiver lá e você tiver acabado o seu expediente, aceita ser a babá
dele?

A resposta da minha irmã me pegou tão de surpresa que nem
imaginava que ela fosse falar aquilo. Pelo menos o Lorran
conseguiu se acalmar e Levi o levou para casa depois de o
convencer prometendo passar numa loja de doces para que
ele pudesse escolher o que quisesse. Quando todos se vão, fico
sozinha com Louis, meu estômago embrulha para iniciar o próximo
round.
Capítulo 13

— Por favor, me perdoe — ele caminha devagar até mim,


segura minhas mãos e as leva aos seus lábios onde distribui beijos
—, não existem palavras para descrever o quanto fui injusto com
você, errei no meu julgamento, machuquei seus sentimentos e criei
um atrito entre nós sem necessidade, não era para as coisas terem
sido assim e sou o único culpado.

Minha garganta embola, me lembrar de todo o sofrimento que


passei nesse mês e a humilhação de hoje após o encontro com o
Fernando, minha língua ainda arde onde ele mordeu e o gosto de
sangue não me deixa esquecer.

— Pode parecer que não, mas não teve um único dia em que
eu não lembrasse da nossa noite e não odiasse o rumo que as
coisas tomaram, eu já fui enganado dessa forma tantas vezes. —
Leva minhas mãos à sua testa e para a minha surpresa o Louis
soluça. — Eu não consigo confiar em outras mulheres, descontei
minhas frustrações em você e criei um cenário que não existia.
— Como assim?

— Vem, sente-se comigo, você merece a verdade depois de


ouvir tantos absurdos.

Ele me puxa para o sofá e sentamos lado a lado com os


troncos virados um para o outro, meu joelho em contato com o seu.
Continuo desconfiada quanto às suas palavras, mas é bom ter um
cessar fogo e se ele está disposto a ser sincero e se desculpar de
coração, posso ouvir suas palavras antes de tomar uma atitude.

— Eu tenho quase quarenta anos e nunca consegui amar de


verdade — tem tristeza e lembranças dolorosas em seus olhos —,
desde sempre meu sobrenome atraiu as mulheres para os meus
braços, principalmente as interesseiras. Eu sei que sou arrogante e
um mulherengo, mas nem sempre fui desse jeito, já tentei achar o
amor, mas ele nunca veio para mim.

— Impossível. — Um homem como ele? Sem chances de ter


sofrido como sofri com relacionamentos com outras pessoas.

— Quando se está no meu nível social, as pessoas ao meu


redor só pensam em dinheiro. As mulheres usam de jogos e
mentiras para me seduzirem e conseguirem me prender, já deitei
com umas três que mentiram ser virgens para fazer com que eu
fosse delicado. — Estou prestes a dizer que eu não fiz isso quando
ele levanta a mão. — Agora sei que você não mentiu. O intuito delas
era que eu me envolvesse e criasse sentimentos pela fragilidade e
com isso me apaixonasse. Mas consigo perceber as mentiras,
outras diziam não ser virgens e depois quando a verdade vinha à
tona elas exigiam que eu assumisse a responsabilidade por sua
pureza.

— Você não passa de um galinha! — Não entendo a raiva que


me consome, mas imaginá-lo com tantas mulheres é desagradável.

— Eu sei disso, não costumo titubear para comer uma boceta,


se estou com tesão eu só vou em frente.

— Safado!

— O ponto é, quando transamos eu senti que você era


inexperiente e apertada, mas isso mulheres experientes conseguem
fingir — seu dedo alisa meu rosto, limpando os rastros de lágrimas
—, eu gostei muito da nossa transa e de você, não consigo te
esquecer. — Ele aproxima o rosto do meu. — Mas peço que
entenda, quando não vi o sangue achei que você só estivesse me
enganando e errei de não ter perguntado ou te ouvido, só tenho a
pedir pelo seu perdão.

— Você foi um babaca que machucou meus sentimentos —


minha voz embarga.
Ele aproxima o nariz do meu e fecho meus olhos, sentindo
sua respiração em minha pele e seu toque em meu corpo,
conduzindo-me a deitar as costas no sofá enquanto ele fica por
cima. Ceder ao Louis é fácil, difícil é aguentar os esporros. Ele me
pareceu tão sincero agora e quero acreditar que se arrepende, mas
não posso cair novamente em seus encantos. Seguro a lapela de
seu paletó e o afasto um pouco, encarando a imensidão em seus
olhos.

— Não faz isso, não vou aguentar ser rejeitada mais uma vez.

— A última coisa que vou fazer é te magoar — ele toca os


lábios nos meus e tenho vontade de chorar, como senti falta de seu
toque —, eu te quero tanto, Bianca.

— Sou sua secretária e isso não pode acontecer.

Ele beija meu pescoço e fecho os olhos, seu tronco entre


minhas pernas impede que eu as feche, as mordidas em minha pele
enviam descargas elétricas por todo o meu corpo, fazendo-me
ansiar que ele continue.

— Uma secretária brilhante que merece muito mais do que


esse cargo, mas não vamos falar disso agora.

Ele reconhece meus esforços?


— Não brinque comigo.

— Não estou — me olha cheio de carinho e tenho vontade de


morar em seu olhar —, eu podia te detestar, mas sempre terminava
o dia admirado com seu desempenho no trabalho, você é a pessoa
mais brilhante que eu conheço.

— Ah, Louis.

Ele cola seus lábios nos meus, acabando com o sofrimento do


meu corpo. Nunca imaginei que para curar a dor da minha alma eu
só precisava que ele pedisse perdão e voltasse a ser meu. Agarro
seus ombros, enquanto sua língua passeia em minha boca e seu
quadril esmaga minha intimidade pulsante, a saia enrolada em meu
quadril sobe mais ainda quando Louis a puxa para cima. Ele está
faminto e cheio de desejo.

Ele solta minha boca e desce para minha boceta, nem me


deixando raciocinar antes de sentir sua boca abocanhar minha
intimidade em uma chupada insana de boa. Meu ventre se aperta e
minha vagina pulsa desesperada para senti-lo mais fundo, para ter
tudo dele.

— Se continuar gritando assim Marta vai achar que estou te


matando — ele sorri com os lábios melados —, fique quieta.
— Você é louco — é tudo que digo antes de arquear as costas
e prender os lábios para não gritar sentindo seus dedos bombeando
dentro de mim.

— Louco por essa boceta — lambe da minha entrada ao meu


clitóris, fazendo-me ter tremeliques —, estava morrendo de
saudades. — Beija minhas dobras. Louis me olha com tanta paixão
que balança meu coração em meio ao fogo nas minhas entranhas.
— Nunca mais a deixe longe de mim. — Volta a me abocanhar.

Pego uma almofada e aperto contra meu rosto para abafar


meus gemidos, o que esse homem está fazendo comigo não deveria
ser permitido. É gostoso, intenso e, inexplicavelmente, prazeroso
sentir sua língua em minha intimidade, os dedos entrando e saindo
com pressa, tocando meu pontinho sensível que eu nem sabia que
existia.

Quando estou prestes a gozar, ele para e retiro a almofada


para reclamar e me surpreendo com seu pau sendo puxado para
fora da calça e depois ele o encaixa na minha entrada, empurrando
fundo de uma vez. Diferente da outra vez, só sinto um leve
incômodo, misturado a um novo prazer.

— Sì, è quella figa che mi piace [29]— fala no meu ouvido.

Louis bombeia forte contra mim, seu quadril bate contra o meu
e empurra meu corpo num vai e vem gostoso. Seu pau me preenche
e ensandece, agarro seus ombros, puxando o paletó para trás,
preciso dele sem roupas para mim. Ele agarra a camisa em ambos
os lados e os puxa, fazendo os botões voarem no meu rosto, enfinco
minhas unhas em seus ombros e o puxo para mim, mordendo sua
carne para abafar meus gritos. Isso só faz Louis rosnar e gemer no
meu ouvido, segurando minha cintura ele a suspende e começa a
socar ainda mais rápido.

Meu pai amado, eu vou enlouquecer com esse homem, estou


em chamas, o incômodo entre as pernas me deixando louca, sem
saber se quero alívio ou se peço que ele continue nessa dança de
nossos quadris eternamente. Um perfeito encaixe e necessidade de
nossas almas. Meu ventre contrai e o ar falta em meus pulmões
quando me jogo no limbo perfeito, perco meus sentidos e sinto cada
poro do meu corpo tendo pequenas explosões de deleite
acumuladas em minha intimidade e sendo libertas de uma vez.

Louis agarra minha boca com seus lábios e geme gostoso


quando goza, seu líquido invadindo meu interior quente e em
abundância. Desabo no sofá e ele apoia o peso em seus braços,
deixando somente seu quadril apoiado contra meu corpo, ambos
suados e exaustos. Ele sorri com ternura e faço o mesmo, nem
consigo acreditar que horas atrás estava com tanta raiva desse
homem que joguei dinheiro na sua cara. Parece até brincadeira que
agora estou aqui, vendo o sorriso em seu rosto com seu pau dentro
de mim e feliz por termos feito as pazes.
— Sua boca tá com gosto de sangue, o que aconteceu?

Gelo, não sei se devo contar a ele sobre o Fernando, mas se


quero continuar nessa empresa não posso ficar me escondendo e
pela primeira vez na vida vou usar alguém. Vou me aproveitar de
que o Louis é o vice-presidente e garantir a minha segurança aqui
dentro, é isso ou pedir demissão, e cansei de deixar os outros se
aproveitarem de mim.

— Eu preciso te contar algo.


Capítulo 14

Ainda estou dentro dela, sei que gozei sem camisinha, tenho
de perguntar se ela toma algum anticoncepcional ou pedir que tome
a pílula do dia seguinte para não engravidar. Me abrir com a Bianca
ajudou a aplacar a fúria em meu coração e, finalmente, pude ser
sincero com meus próprios sentimentos. Estar com ela é bom, gosto
de sua companhia e mais ainda de quando fazemos sexo. Essa
rapidinha foi perfeita para acalmar o monstro dentro de mim, mas
ainda quero mais, eu preciso de tudo que ela possa me dar.

A única coisa que me incomoda é o gosto de sangue em sua


boca, é recente e não sei se foi um machucado que ela fez ou culpa
daquele imbecil. Agora que nós resolvemos vou garantir que o idiota
fique longe dela. Bianca se move embaixo de mim, deito-me de lado
e a puxo para ficar com a cabeça em meu peito.

— Aquele homem de mais cedo era seu namorado? —


pergunto, ela levanta o rosto e me olha assustada.

— O quê? Não, nunca me envolvi com ele dessa forma.

— Ele disse que vocês eram ex-namorados, você não ouviu?


— Puxo-a novamente para mim.

— Não, depois que você o tirou de cima de mim não consegui


processar nada do que aconteceu ao nosso redor.
— Me conte o que aconteceu.

Ela fica quieta um pouco e, então, começa a relatar o que ele


fez com ela no ensino médio, sobre o B.O e o encontro deles no
corredor, que ela já sabia que ele trabalhava aqui e estava fugindo e
evitando ser vista para que não fosse machucada novamente. Cada
vez que ela fala, me encho de fúria, quero ir socar a cara do imbecil
e mandá-lo para a cadeia pelo que fez com ela no passado e agora.
Contudo, me contenho, sei que ela precisa de mim neste momento
ao seu lado e não quebrando o idiota.

— Eu vou cuidar desse assunto — beijo sua cabeça —, não


se preocupe, ele nunca mais vai tocar em você.

— Promete? — O choro em sua voz me desestabiliza.

— Sim, ninguém nunca mais machucará o meu dolce. —


Aperto-a em meus braços e encho seu rosto de beijos até ver suas
feições relaxarem novamente.

— Você e o Lorran amam um doce, né? — ela brinca e beijo a


ponta de seu nariz.

— Minha mãe era apaixonada por doces, ela amava quando


comíamos juntos, nossa família não resiste a um docinho e o Lorran
aprendeu a usá-los para deixar as pessoas felizes quando estão
tristes ou trocar favores.

— Ele é um fofo, dá vontade de apertar aquelas bochechas.

— Ou morder — rimos.

— Ele se apegou a minha irmã, acha que vai dar certo o que
ela propôs?
Ainda não acredito na ideia que a Olivia teve, mas torço para
que aquilo seja benéfico para o meu sobrinho e irmão, a relação
deles nunca esteve tão fragilizada quanto agora.

— Espero que sim, o Lorran e Levi precisam disso.

Ela concorda que sim e volta a deitar, confortavelmente, em


meu ombro, aliso seus cabelos, deslizando meus dedos em seu
braço desnudo, traço o contorno do seu seio e fico com vontade de
possuí-la novamente. Puxo Bianca para cima de mim e beijo seus
lábios enquanto retiro o zíper de sua blusa.

— Você é insaciável — ela murmura contra minha boca.

— Não estou nem perto de ficar satisfeito de você. —


Mordisco seu pescoço, adoro como ela se encolhe e os gemidinhos
que escapam quando faço isso. Deslizo a peça de roupa para longe
e fico com água na boca ao ver o sutiã rendado branco cobrindo
meus preciosos.

Removo a peça e abocanho seu peito, prendendo sua cintura


com meus braços, com a mão verifico sua umidade e não fico
surpreso ao encontrá-la molhada para mim. Meu pau já está duro
feito pedra, o encaixo em sua entrada e a desço me enfiando em
seu calor. Ela tem a bocetinha mais apertada e quente que já comi,
nunca vou me cansar disso.

Bombeio devagar contra ela, aproveitando seus gemidos, o


aperto em meus ombros e a maciez de seus peitos dentro da minha
boca. Alternando entre um e outro, mordiscando o bico rosáceo,
enquanto ela trinca os dentes para conter os gemidos deliciosos que
gosto de ouvir. Preciso ter essa mulher em um quarto onde ela
poderá gritar até ficar rouca. Deito-me contra o sofá, agarro sua
bunda com força e a penetro ensandecido, minhas bolas apertam e
o prazer me corta por completo, ah, como é bom poder me perder
assim no corpo de uma mulher como Bianca.
Ela morde meu ombro novamente, a cabeça escondida da
minha boca, descarrego minha fúria em sua bunda com um tapa alto
que a faz gritar assustada e gemer, depois ataco sua boca. Seguro
sua cintura com um braço e a bunda com a mão, adentrando ainda
mais fundo em sua intimidade. Meu pau melado de seus líquidos
desliza com facilidade e agilidade, o atrito com suas paredes me
enlouquece a ponto de perder os sentidos quando ela me aperta,
gozando em meu pau. Não aguento muito mais o peso em minhas
bolas, o ar faltando em meu cérebro, o sangue fervendo em minhas
veias, gozo mais uma vez em seu interior e a encho de porra,
marcando sua boceta como minha.

— Mio, solo mio [30]— sussurro em seu ouvido antes dela


apagar em meus braços.

Deixo Bianca deitada no sofá, vou ao banheiro e pego uma


toalha umedecida e uma seca. Limpo entre suas pernas, seu peito e
pescoço, enxugando o suor de sua testa e ajeito sua blusa, ela
cansou tanto que nem se mexe enquanto arrumo suas roupas. No
banheiro, tomo um banho e visto meu terno reserva, tenho muita
coisa para resolver antes do final do dia, inclusive demitir o tal
Fernando.

Recolho o dinheiro no chão da sala e, dessa vez, tomo


cuidado de deixá-lo bem longe de Bianca, escrevo um recado e
coloco em sua mão.

Se acordar e não eu não estiver aqui, pode ficar me


esperando aqui dentro, vou resolver umas coisas e volto logo,
mio dolce.

Lembro-me de que meu celular ainda deve estar na sala de


reuniões, saio e encontro a Marta me olhando desconfiada, com
certeza ela escutou a mim e Bianca, não fomos exatamente
silenciosos.
— Senhor Louis, seu celular — me entrega o aparelho —,
uma das faxineiras veio deixar. — No papel de parede tem uma foto
minha e do Lorran, é fácil deduzir que o aparelho é meu.

— Estava mesmo procurando por isso obrigado, Marta —


guardo o aparelho no bolso do terno —, qual o andar da sala da
equipe de segurança?

— No terceiro andar, senhor, segunda porta à esquerda.

— Obrigado, não deixe ninguém entrar na minha sala.

— Sim, senhor.

Entro no elevador e vou até a sala da equipe de segurança


onde peço para conferir as imagens do corredor onde a Bianca foi
atacada e encontramos todo o desenrolar do Fernando a seguindo e
depois pressionando-a na parede contra a vontade dela.

— Por que não fizeram nada quando viram isso? — pergunto


ao chefe de segurança.

— Nós fizemos, senhor, uma equipe foi enviada, mas quando


chegou o senhor já tinha cuidado da situação e como não ordenou
nada aos guardas, eles voltaram.

Olho para a câmera e, realmente, vejo que tinham dois


seguranças indo socorrer a Bianca e que pararam quando me viram,
eles estavam perto de mim o tempo todo, mas não notei a presença
de nenhum.

— Mande uma cópia desse vídeo ao RH e avise que devem


providenciar agora mesmo a demissão do Fernando por assédio
sexual no trabalho, também vou querer que chame a polícia aqui,
uma queixa formal será apresentada.
— Sim, senhor.

— Venham comigo, vamos retirar o lixo da empresa.

Acompanhado de quatro seguranças, vamos até o setor


financeiro e na sala de contabilidade, encontro o Fernando
trabalhando em sua mesa, ao me ver ele gela e arregala os olhos.
Tenho ímpeto de socar sua cara, mas me contenho, ele é o único
que vai receber alguma punição e se eu me rebaixar ao seu nível
aqui na frente de todos esses funcionários, ele terá motivos para me
processar legalmente e eu perderei a razão.

— Senhor Fernando Oliveira — vejo seu crachá e o arranco


—, você está demitido por assédio sexual.

— Quê? — Ele arregala os olhos e abre a boca surpreso,


esse filho da puta não perde por esperar o que estou planejando
fazer com ele quando não estivermos sob olhares curiosos.

— Pegue suas coisas, passe no RH para assinar sua


demissão e nunca mais coloque os pés nas empresas VITTILENO.

— O que está acontecendo aqui? — Raul, o diretor do setor


financeiro, vem exasperado quando me nota e procura uma
explicação para tal ação.

— Existe alguma queixa de assédio sexual no trabalho contra


o Fernando? — pergunto a ele, casos assim não costumam
acontecer de maneira isolada.

— Não, senhor — nega, mas escuto duas mulheres gritando


que sim.

— Falem mais, senhoritas.


Uma toma mais coragem e vem para perto, com ódio no olhar
ela o encara e grita.

— Ele assedia todas as mulheres do setor financeiro, não foi


demitido ainda porque é filho do senhor Raul, que acoberta as
canalhices dele.

Olho para os meus seguranças que ficam surpresos com isso.

— Onde ele faz o assédio? — pergunto a ela —, vou juntar


com a filmagem que tenho para dar entrada no processo contra ele.
— Fora da empresa, sempre nas reuniões da equipe após o horário
de expediente, ele nunca faz isso na frente das câmeras.

— Avise a todos para darem seus depoimentos no RH, a


Paola cuidará do caso pessoalmente — olho para ele que espuma
de raiva —, você e o Raul estão demitidos e se preparem para o
processo.

Com um sinal de cabeça, os seguranças levam os dois, que


protestam e imploram para serem ouvidos, dizendo que a situação
não é o que penso. Retorno à sala de segurança e mando
executarem uma busca por outras situações de assédio do
Fernando e do Raul, quero todas as imagens para dar entrada num
processo contra ambos.

Retorno à minha sala após ligar para a delegacia da mulher,


que se comprometeu em investigar o caso e marcar horário com
todas as funcionárias para apurar o depoimento delas, além de
analisar as imagens de segurança para ter certeza de que ele não
se safe do crime que cometeu. Bianca deitada no sofá é adorável,
ela ainda dorme, sento-me à minha mesa e começo a trabalhar nos
gráficos da reunião, muita coisa precisa ser investigada nas
indústrias VITTILENO.
Capítulo 15

Bianca se espreguiça no meu sofá, já passa das 19h e não


parei de trabalhar e a observar dormindo. As feições amassadas do
sofá e os olhinhos lacrimejados de sono, o sorriso que desponta em
seu rosto reflete no meu. Agora que nos acertamos me sinto mais
tranquilo e seguro em relação à Bianca. Estendo minha mão a
chamando para mim, Bianca caminha vagarosamente os pés
descalços e a saia embolada em suas coxas. Puxo-a para o meu
colo e me delicio com suas bochechas vermelhas de vergonha.

— Ora, mas eu ainda não fiz nada. — Traço a linha do seu


maxilar.

— Seu olhar já me diz tudo! — Beija meus lábios, adoro


quando ela toma a iniciativa e anseia por meu carinho.

— Ele não diz nem a metade do que quero fazer com você. —
Aperto sua cintura e nos coloco de pé. — Antes vamos jantar.

— Eu dormi a tarde toda? — Enxuga os cantos dos lábios.


— Como uma fadinha — beijo sua bochecha e espalmo minha
mão em sua bunda —, agora vamos que estou faminto.

— Espero que de comida — ela brinca, aproximo minha boca


do seu ouvido.

— Da sua boceta. — Mordo sua pele e me delicio quando ela


se contorce em meus braços.

— Tenha piedade, homem, ainda estou com seu gozo na


vagina! — Pula no lugar quando mordo seu pescoço com mais
força.

— Se continuar dizendo isso vou te encher de porra antes do


jantar.

Bianca fica molinha em meus braços e sei que ela adoraria


que eu a curvasse contra a minha mesa e socasse fundo em seu
interior. Contudo, antes disso preciso garantir que ela vai ter forças
para me aguentar. Arrumamos nossas roupas e pegamos nossas
coisas, a levo ao térreo do prédio onde meu helicóptero me espera.

— Vamos jantar no L’aville — informo ao piloto.

— Não tem que ter reserva para jantar nesse lugar? — ela
pergunta quando coloco os fones em seu ouvido.
— Não quando se é o dono.

— Eu não deveria ficar surpresa por isso. — Sorrio.

Nós nos acomodamos e aproveitamos a viagem pela cidade


de São Paulo, já no restaurante seguimos para uma sala privada
com um lago artificial e mesas baixas para sentarmos em
almofadas. Um som de música clássica tocando baixinho, o garçom
nos serve o vinho sem que eu precise dizer qual queremos.

— Diga ao chefe que mande seu melhor prato — digo ao


dispensar o cardápio.

— Com certeza, senhor Vittileno, volto em breve. — Ele se vai


e Bianca que está admirando o lado tem a sua atenção voltada para
mim quando me sento ao seu lado.

— Precisamos falar de algumas coisas. — Puxo seu rosto


para perto e capturo seus lábios, não consigo me manter longe
deles por muito tempo.

— Conversar ou beijar? — ela pergunta e dou risada em sua


boca.

— Primeiro falamos, depois beijamos. — Solto-a e me ajeito


na almofada, afrouxando minha gravata e, em seguida, tiro o paletó
e o jogo no chão, despretensiosamente.
— Pode dizer.

— Você toma algum anticoncepcional?

— Desde os 15 anos quando comecei tratamento para meu


ciclo desregulado, se ele estiver funcionando direitinho não tenho
risco de engravidar — ela fala sem preocupação, não há sinais de
mentira em suas feições o que me deixa tranquilo.
— Quando foi a última vez que você fez exame de sangue de
IST’s?

— Se estiver se referindo a doenças sexualmente


transmissíveis, faço exames a cada seis meses, em breve vou
refazê-lo, mesmo estando limpo.

— Quero que faça e me mostre, farei também, se vamos


continuar transando sem camisinha temos que nos prevenir.

Tenho vontade de sorrir pela forma como suas bochechas


ficam vermelhas como um pimentão e o olhar fixado em qualquer
lugar da sala menos em mim. É notório o esforço que ela faz para
continuar falando de sexo abertamente.

— De acordo — entrego a taça de vinho para ela e bebemos


juntos —, quero que você seja somente minha, Bianca, não vou
aceitar dividi-la com outras pessoas.
— Também quero isso — ela encara a taça e brinca com a
borda entre os dedos —, não quero você com outras mulheres.

Aproximo-me dela e seguro a taça em suas mãos,


repousando-a na mesa e a puxo para meu colo.

— Serei completamente seu. — Beijo seus lábios e Bianca se


entrega a mim, arranhando meu pescoço com suas unhas e, em
seguida, aperta as coxas ao meu redor.

Batidas à porta fazem com que nos separemos e o nosso


jantar é servido. O resto da noite continuamos de namorico, até que
meu motorista nos busca e somos levados até a sua casa. Queria
passar o resto da noite ao seu lado, mas sei que ela precisa
descansar depois do dia agitado que tivemos.

E assim passamos nossos dias, embrenhados um no outro,


trabalhando juntos e tendo momentos de carinhos roubados ou
quando consigo me enfiar entre suas pernas e sentir o gosto de sua
bocetinha. Bianca ainda reluta um pouco em me chupar, mas vou
deixar que ela o faça no seu tempo, não temos pressa e por
enquanto estamos aproveitando nosso tempo juntos.

Detesto ter que ficar a levando ao hotel, no meu apartamento


evito sua presença por causa do Lorran, não quero que ele se
apegue a ela ainda. Ou deixar que ele presencie algum ato sexual,
ele tem o costume de invadir meu quarto à noite e ficará irritado
quando encontrar a porta fechada, ou se tiver sua atenção dividida
com uma estranha. Por esse motivo, decidi que precisamos de um
lugar somente nosso.

— Onde estamos indo? — ela pergunta com uma venda em


seus olhos.

— Já disse que é surpresa — digo, segurando-a em meus


braços.

Coloco-a no chão para abrir a porta e quando entramos a levo


ao centro da sala, depois retiro sua venda e a deixo ver onde
estamos.

— Louis, que lugar lindo.

— É nosso. — Estendo um par de chave para ela.

— O quê? — Cobre a boca e se vira para mim.

— Não vamos mais nos encontrar em hotel e nem passar uma


noite longe porque você tem de ir para casa se arrumar para seu
trabalho. Quero que venha ficar aqui comigo, se ainda não estiver
pronta para morar nesse lugar o...

Sou impedido de falar por seus braços ao redor do meu


pescoço, suas pernas envolvem minha cintura e sua língua invade
minha boca cheia de fome. Bianca solta meus lábios e sorri,
explodindo felicidade, aperto sua bunda e caminhamos pelo
apartamento, mostrando cada cômodo a ela. Uma sala ampla com
uma cozinha americana e uma varanda, dois quartos sendo uma
suíte completamente mobiliada e com roupas no closet que mandei
comprar para ela.

— Obrigada, isso tudo é perfeito — ela diz quando a ponho no


chão depois do nosso tour —, é o nosso lugar especial.

— Sim, somente eu e você, nada mais importa depois que


passarmos por aquelas portas. — Coloco uma mecha de seu cabelo
atrás da orelha e a deito no sofá. — Somente minha — engatinho
por cima do seu corpo —, mio dolce.

— Amore mio — é a primeira vez que ela me chama assim,


beijo a palma da sua mão e deixo um rastro molhado pelo seu braço
até a clavícula e pescoço.

Retiro sua blusa botão por botão, arrastando meus dedos pela
sua pele sedosa. Escuto seu arfar, a pele morena ao meu dispor e
deleite, puxo a barra de dentro da saia e deslizo o tecido em seus
ombros, beijando e mordiscando sua pele. Adoro sentir a maciez de
Bianca com minha boca, o gosto da sua carne, ouvir seus gemidos
enquanto a torturo com pequenos beliscões com meus dentes. Ela
sobe o quadril, facilitando a remoção de sua saia, a meia
transparente até a coxa com a cinta-liga presa ao elástico na cintura.
Ela arregala os olhos, sabendo o que estou prestes a fazer e
me divirto com sua ansiedade, deslizo o dedo no elástico testando
sua flexibilidade antes de puxar e ouvir o estralo contra sua pele
acompanhado do gritinho dela. Bianca abre mais as pernas em
resposta, a respiração ansiosa e sua calcinha preta ficando
manchada pelos seus líquidos.

— Vire-se — ordeno e ela obedece sem reclamar.

Fico de joelhos, afastando sua perna com minha coxa


impedindo que ela a feche, o calor da sua boceta perpassa o tecido
da minha calça enquanto ela se esfrega buscando prazer no atrito.
Prendo sua cintura com uma mão, mantendo-a parada e puxo a
cinta-liga em sua bunda estralando alto e marcando a carne. Bianca
grita novamente e empina o rabo para mim. Que delícia de mulher,
macia, gostosa e toda minha, não resisto a tentação e estapeio sua
nádega, depois puxo a cinta-liga até sua pele ficar vermelha e
Bianca com lágrimas nos olhos.

A sem vergonha morde e baba no travesseiro, a boceta


encharcada e desesperada para me sentir. Aperto sua bunda e a
puxo na direção oposta, abrindo seu pequeno buraco coberto pela
calcinha transparente para mim, deslizo meu nariz no tecido me
deliciando com o cheiro do seu sexo ardendo em chamas,
implorando para ser devorado. Meu pau aperta em minha calça e
fico ensandecido com minha brincadeira, mas não resisto a morder
sua bocetinha e ouvir os grunhidos saindo de seus lábios.
Puxo a calcinha para o lado e deslizo meu dedo para dentro
dela, quentinha e molhada, pronta para me receber nesse buraco
delicioso.

— Chupa — mando ao colocar o dedo em sua boca, Bianca o


engole e a visão me faz enlouquecer, preciso dessa boca no meu
pau. — Vem cá, Bianca.

Puxo-a para ficar de frente para mim, os seios ainda cobertos


pelo sutiã, os libero e beijo cada um deles, mordiscando os bicos
pontudos. Sem aguentar mais o aperto da calça no meu pau, seguro
sua mão e o coloco nele.

— Tire minha roupa e masturbe meu cacete. — Ao menos


isso ela faz, só não o coloca na boca, ainda.

A nuvem de prazer em seus olhos me diz que Bianca está


ansiando para ter meu pau dentro dela, mas não somente em sua
boceta. Deixo que ela me dispa e me beije, que morda minha pele e
lamba meu abdômen até se sentir satisfeita. Fico de pé para que
retire minha calça e meu pau pulsa ao pular para fora da cueca,
batendo em seu nariz. Em vez de se afastar, ela engole em seco e
beija minha glande rosada, porra, quase esporro na sua cara só com
esse contato.
— Devagar — gemo quando ela me engole e arranha os
dentes em meu pau —, cubra os dentes com os lábios para não me
machucar.

Ela acena que sim, seus olhos nunca deixam os meus. O


prazer queima em suas feições enquanto ela me engole, a boca
molhada e gulosa me recebendo até o fundo da sua garganta, e
sofrendo com a ânsia, mas minha garota gulosa não desiste do que
está fazendo, ela permanece me engolindo e aumentando o
desespero em minhas bolas pesadas para gozar.

— Essa boquinha é o paraíso! — rosno.

Gemo segurando sua cabeça e controlando o quadril para não


socar forte contra sua boca. Puxo para fora e a jogo no sofá, abro
suas pernas, puxo a calcinha para o lado rasgando o tecido e me
enfiar fundo em seu calor apertado.

— Louis — ela grita e arranha minhas costas, revirando os


olhos.

Bombeio contra seu interior, atingindo seu fundo e saio


novamente, nossos corpos se chocam, o calor aumentando, minhas
bolas apertadas querendo gozar e o tesão me enlouquecendo.
Nunca me senti tão ensandecido assim por outra mulher. Fico de
joelhos e a arreganho para mim com uma perna em cima do meu
ombro, enquanto a devoro ensandecido para sentir meu pau cada
vez mais fundo em sua boceta. — Eu vou gozar — ela grita,
gemendo e chorando ao mesmo tempo.

— Goza no meu pau, dolce. — Aperto sua coxa.

Explodo em seu interior quando sinto Bianca apertando meu


pau com suas extremidades e seus líquido, que me fazem deslizar
com mais facilidade, denunciando seu orgasmo.

Essa mulher é completamente minha e isso nunca irá mudar.

— Sei tutto ciò che ho sempre desiderato — sussurro ao pé


[31]

do seu ouvido.
Capítulo 16

Louis cozinha, enquanto o observo tomando uma taça de


vinho, nossos dias assim se tornaram rotina desde que estamos
praticamente morando juntos no apartamento, exceto pelos finais de
semana em que ele dedica ao Lorran e eu fico em casa, aguento o
olhar de reprovação do meu pai por causa do meu novo estilo de
vida. Em suas palavras: estou agindo igual a uma prostituta,
dormindo na semana com um homem e no final de semana sendo
descartada e ainda sendo agraciada com os presentes que Louis
me dá.

O que ele não faz ideia é de que além dos presentes e sexo
que fazemos, Louis me enche de carinho e palavras que derramam
amor. Na empresa mantemos nossa relação profissional, mas
quando estamos somente os dois aqui respiramos aliviados e
tranquilos, é somente eu e ele e nada para tirar nossa paz.

Ele usa um calção de moletom e meias, enquanto cozinha


nosso jantar, sua camisa está lindamente vestida em meu corpo.
Beberico meu vinho e rodo no banco do balcão enquanto Louis pica
as cebolas e me olha com diversão no olhar. É sempre assim, ele
nunca mais me olhou com raiva ou algo do tipo, somente diversão,
paixão e muito fogo.

— Onde você aprendeu a cozinhar assim? — pergunto.

— Com minha mãe, além da louca dos doces, ela gostava de


cozinhar. — Despeja a cebola na panela e liga o fogo para dourar os
ingredientes.

— Me fala sobre ela?

— Minha mãe era um raio de sol, é a melhor definição que


tenho para ela, sempre a via sorrindo e com uma ânsia por viver.
Por ser o mais velho, sou o filho que tem mais lembranças dela, ela
faleceu quando eu tinha quinze anos, Levi tinha treze e Lira era um
bebê de oito anos ainda.

— Oito anos não é mais bebê — brinco e ele me olha de


esgueira sobre o ombro.

— Lira sempre será meu bebê — ele diz, convencido, antes


de colocar a carne na frigideira —, um bebê que está demorando
demais para voltar a ficar com os irmãos.

— Onde ela está?


— Nos Estados Unidos, trabalhando em uma nova série Teen
que é adaptação de um livro de fantasia.

— Isso parece incrível.

— Igual à minha garotinha.

— Você ama muito seus irmãos. — Apoio o queixo na mão,


emocionada com a forma como ele ama a família.

— Sim, minha mãe me criou para cuidar deles, com carinho e


amor, me ensinou como trocar uma fralda, segurar um bebê e como
acalmar o Levi quando seu espírito artista gritava alto demais e ele
esquecia do mundo e precisava que alguém o acalmasse.

— Qual sua lembrança mais preciosa?

— Hum — ele pensa um pouco antes de dizer, sua voz é


saudosa e cheia de amor —, era a primavera na Itália, meu pai
estava de férias e tínhamos saído em família para nossa
propriedade de veraneio, nessa época do ano ela ficava cheia das
mais belas flores. Acho que eu tinha uns quatorze anos, minha mãe
se deitou na grama debaixo de uma sombra de um salgueiro e me
deitei ao seu lado, ficamos horas somente sentindo brisa fresca e
aproveitando o canto dos pássaros. Aquele foi o dia em que eu
soube o que era paz.
— Qual o nome dela? — pergunto, Louis desliga o forno e
começa a preparar os pratos.

— Cecília — seus olhos brilham quando ele me olha —, o


nome que darei a minha filha.

— É um lindo nome. — A emoção me corta, Louis tem tanto carinho


em suas feições que me permito iludir, acreditando que um dia eu
serei a mãe de sua garotinha e poderei vê-lo ser o melhor pai desse
mundo.

— Como ela faleceu? — É de conhecimento geral que a mãe


do Louis faleceu, mas nunca escutei falarem a causa.

— Acidente de carro, era uma noite chuvosa quando ela


voltava para casa e o motorista perdeu o controle do volante, minha
mãe passou uns dias em coma e depois faleceu, o motorista morreu
na hora.

— Sinto muito — aperto sua mão —, dá para perceber o


quanto você a ama.

— Sim, mesmo após todos esses anos o amor que eu sinto


por ela parece que cresce cada vez mais.

Ele me puxa para dar a voltar no balcão, assim me sento à


mesa com ele.
— E sua mãe? Você não costuma falar dela.

É verdade, enquanto em qualquer oportunidade ele fala sobre


a mãe eu mantenho a minha somente para mim.

— Não tem muito o que falar.

— Por quê?

— Minha mãe morreu quando eu tinha três anos, não tenho


lembranças dela e fui criada pela Olivia e meu pai. — Dou de
ombros, o aperto em meu peito sempre que penso no vazio que foi
crescer sem uma mãe me incomoda e me impede de falar sobre.

— Como ela morreu?

— Câncer de fígado, meu pai disse que ela descobriu pouco


tempo depois de eu nascer. Passou os anos seguintes lutando
contra a doença, até que seu corpo não resistiu mais e ela se foi. —
Remexo no meu bife e nas batatas, a vontade de comer
desapareceu. — Só a conheço por fotos e histórias.

— Tenho certeza de que no tempo que passaram juntas ela


te amou. — Louis aperta minha mão e tento sorrir para ele, sem
vontade.

Essa é uma cicatriz que vou carregar para o resto da vida e


nada será capaz de fazer a dor que sinto no meu peito passar.
— Eu te invejo — digo a ele que franze as sobrancelhas —,
você teve sua mãe por quinze anos e sempre que fala dela é com
amor e saudade no olhar, é como se a dor da perda não tivesse
maculado o que ela significa para você.

Louis se levanta e se senta ao meu lado, ele me puxa para o


seu colo e alisa meu rosto, a imensidão azul em seus olhos
transborda carinho e compaixão.

— Quando você for mãe tenho certeza de que será incrível


para seus filhos e, talvez, quando perceber que eles esqueceram as
memórias de quando tinham menos de cinco anos, você saberá que
deu amor durante esses anos e que mesmo não lembrando, eles
saberão disso. — Sua mão pousa em meu coração e soluço,
compreendendo o que ele diz e pela primeira vez na vida sentindo o
amor da minha mãe em mim. — Você pode não lembrar, mas a dor
que sente pela falta dela é reflexo do amor que recebeu durante
esses três anos.

Escondo o rosto no pescoço do Louis e choro, pela primeira


vez em 20 anos consigo perceber que o que sempre busquei esteve
dentro de mim disfarçado pela dor. Ele me embala em seu colo e
alisa meus cabelos até que o choro cesse, olho para nossa comida
esquecida.

— Desperdiçamos um ótimo jantar por minha causa.


— Nada que um micro-ondas não resolva. — Ele beija minha
bochecha e me levanto para que possa esquentar nosso jantar.

Após quente, percebo que o bife está divino, Louis nunca fez
uma refeição queimada ou que ficasse duvidosamente ruim. Seus
pratos são perfeitos, terminamos de jantar e deitamos no sofá para
assistir um filme enquanto bebo uma taça de vinho e ele seu uísque.
— Sério que ainda tem quem caia em golpe do baú em pleno 2023?
— pergunto não acreditando na trama do filme.

— Eu quase caí uma vez — ele diz e fico surpresa, paro o


filme e me viro, esperando-o falar mais. Louis suspira e começa a
contar. — Eu transava fixo com uma italiana, e sempre usei
camisinha até quando ela me chupava. — Faço careta, não gosto de
saber desse detalhe. — Desfaz esse bico.

Aperta meus lábios e grito me soltando dele, estapeio seu


braço e Louis dá risada e vira o resto do conteúdo de seu copo, ele
pega minha taça vazia e serve mais bebidas para nós.

— Enfim, ela acabou engravidando e disse que o filho era


meu, o pai dela era um senador na época e começou a fazer
pressão para que eu casasse com a filha dele. Foi preciso uma briga
na justiça para conseguir autorização do juiz e fazer um teste de
DNA com a criança ainda na barriga, somente com uns seis meses
foi possível, pois ela dificultava inventando doenças e que tinha
medo.

— O que só aumentou suas suspeitas — comento assim que


ele me entrega meu vinho.

— Exatamente, o DNA provou que eu não era o pai e depois


descobrimos que ela mentiu para o pai dela também e que o pai da
criança era o secretário dele.

— Ela teve de casar com ele?

Louis dá risada e volta a me puxar para o seu peito quando


se senta ao meu lado e nos cobre com a manta.

— O pai dela quase foi preso por obrigar a filha a fazer um


aborto de um bebê de sete meses, porque ele não aceitava que a
filha estivesse grávida do secretário.

— Meu Deus. — Fico horrorizada.

— Por sorte, a mãe dela a defendeu e denunciou a polícia, o


bebê nasceu e não sei mais do que isso.

— Quais outros perrengues você já passou por causa de


mulher? — Belisco sua barriga com o ciúme me tomando.
Ele ri e deixa derramar um pouco do uísque, quanto mais ele
demora, mais eu belisco sua cintura em busca de respostas.

— Seu galinha sem vergonha, foram tantas vezes que nem


sabe dizer?

Sou surpreendida quando ele derruba seu copo no chão e


minha taça segue o mesmo caminho, seu corpo me deita contra o
sofá e, dessa vez, sou eu quem está recebendo beliscões e muitas
cócegas. Contorço-me no sofá e grito, tentando espantar seus
dedos para longe enquanto ele gargalha e se diverte com meu
tormento, Louis só para quando começo a lacrimejar e ameaço que
vou urinar nas calças.

— Com um mafioso — ele diz e gelo, o divertimento em seu


olhar me deixa ainda mais preocupada. Então, Louis me conta todo
o envolvimento que ele teve com a filha de um mafioso.

— O filho do consigliere acabou de assumir ao trono do capo


e, finalmente, os ataques acabaram e selamos um acordo de paz.

— Isso é perigoso pra cacete, é tipo a máfia!

— Eu sei, a máfia!

Ele debocha do meu jeito de falar e empurro seu peito com


meu pé, seus dentes mordem o peito do meu pé e depois minhas
coxas. A graça se perde e começo a sentir o familiar calor entre as
pernas que só se apaga quando Louis está entre elas. Sorrio feliz e
suspiro satisfeita quando sua boca morde minha boceta. Nossa
noite apenas começou.
Capítulo 17

— Fernando vai ser preso por dois anos e meio, além de


cumprir serviço comunitário por mais um ano — Louis diz quando
me passa meu vestido, ele acorda cedo e sempre malha, além de
conversar com seu informante sobre a bolsa de valores, hoje me
trouxe uma ótima notícia.

— Uma pena pequena diante do que ele fez, mas ao menos a


justiça será feita. — Suspiro e ele me abraça.

— Vou garantir que ele receba uma lição por isso tudo. —
Beija o topo da minha cabeça e vai para o banheiro.

Nos últimos três meses estamos vivendo assim, em paz no


nosso apartamento e trabalhando empenhados no caixa dois, sinto
que estamos perto de descobrir quem está por trás de tudo, mas
falta uma última peça que não consigo encontrar.
Um caixa dois em uma empresa como a VITTILENO é um
prato cheio para os procuradores que desejam subir de cargo, além
de derrubar um esquema de corrupção em uma grande empresa.
Felizmente, a pessoa tomou bastante cuidado para cobrir seu rastro
e se até nós temos dificuldades de rastrear o dinheiro com todas as
informações que conseguimos com o acesso do Louis como
vicepresidente, imagina a dificuldade que a procuradoria teria sem
acesso a quase nada e com tudo sendo encoberto. Levaria anos e o
dinheiro já teria sumido quando chegassem a ele.

Vou para a cozinha preparar nosso café da manhã e vejo que


Lorran já acordou e assiste a um desenho na TV, ontem o Levi
tomou chá de sumiço e a babá do Lorran não pode passar a noite
com ele. Louis acabou trazendo o pequeno para ficar com a gente
no apartamento, ele basicamente só dormiu desde a hora que
chegou, mas pelo visto acordou cedo hoje. Me aproximo dele e ele
sorri, começo a falar em italiano para que me entenda.

— Bom dia, piccolo. — Pego-o no colo e beijo sua bochecha,


ele aperta as minhas e responde.

— Diaaaaa boooom. — Fazendo ar com as bochechinhas e


não resisto a morder essa fofura que grita e começa a chamar pelo
zio dele.
— Que bagunça é essa aqui? — Louis se junta a nós e
Lorran faz festa para descer do meu colo e começa a correr pela
sala ainda vestido com o seu pijama.

Os cabelos loiros voam com sua velocidade e ele quase


tropeça quando olha para trás e grita, Louis começa a bater os pés e
correr devagar atrás do sobrinho que faz festa subindo nas coisas,
junto-me a gracinha deles e estamos os três rodando pelo
apartamento brincando de pega-pega.

Quando o pequeno foguetinho se cansa, Louis o leva para


tomar um banho e eu vou fazer o café da manhã, minha irmã me
manda uma mensagem.

Lorran está bem? Ainda tô ferrada da garganta, não


posso nem pensar em chegar perto dele.

Correu uma maratona agora, ele está bem, se cuida.


Respondo para ela.

Tomo meu anticoncepcional e uma dorzinha na garganta


começa a me incomodar, espero que isso não signifique que estou
pegando a doença da Olivia. Tomamos café e após deixar o Lorran
na creche, seguimos para a empresa.

Tenho de passar em casa mais tarde, mas meu pai tem


estado uma pilha de nervos por conta da minha nova rotina em que
mal fico em casa, ele sabe que estou me envolvendo com alguém e
desaprova que ainda não o apresentei, e mais ainda por não dormir
em casa quase nenhum dia deste mês. Cansada das brigas, tenho
me refugiado mais ainda no apartamento.

A dor de garganta evolui ao longo do dia e durante a tarde


meu corpo esquenta e fica mole, enquanto Louis está em reunião a
portas fechadas com o diretor de finanças, eu me deito no sofá em
sua sala e fico encolhidinha esperando a dor passar. Nem percebo
que peguei no sono até ser despertada pelo Louis, seus olhos me
encaram com preocupação, os dedos acariciando minha testa.

— Você está pegando fogo, precisa ir ao médico — ele diz,


aceno que sim, a consciência balançando —, vamos, mio dolce, vou
te levar ao hospital. — Seus braços me pegam e eu apago.

Acordo em um quarto branco com o som de um bipe ao meu


lado, observo ao redor confusa sem saber onde estou, ao analisar o
cômodo vejo Louis sentado em uma cadeira dormindo com a cabeça
pendendo para a frente. Noto que estou em quarto de hospital com
uma intravenosa e aparelhos conferindo meus sinais vitais. Eu
desmaiei? Por que não me lembro de ter chegado até aqui?

— Louis — o chamo, ele desperta e segura minha mão,


sorrindo com a carinha amassada de sono.
— Finalmente, você acordou — vem para perto de mim —,
devia ter me dito que estava se sentindo mal, eu teria cuidado de
você.

— O que eu tenho?

— Infecção bacteriana na garganta que causou uma febre de


39° graus, fiquei louco quando você desmaiou.

— Acordei me sentindo mal, mas achei que fosse nada de


mais.

— Na próxima, me diga assim que sentir uma dor na unha. —


Louis faz com que eu me afaste e se deita comigo na cama.

— Essa cama é enorme — comento.

— A melhor para o meu dolce, agora durma de novo — beija


minha testa —, amanhã te levo para casa.

Deito a cabeça em seu peito e não demoro a adormecer, no


dia seguinte ainda me sinto doente e, por isso, tiro o dia para ficar
em casa, mas assim que chego me arrependo de ter vindo para cá e
não para o apartamento.

— Olha só quem aparece após um mês. — Odeio o


sarcasmo na voz do meu pai.
— Bom dia, pai. — Passo por ele para o meu quarto, ele me
segue e me preparo para o ataque.

— Como você pode estar fazendo isso comigo? Dei duro


para te criar e na primeira oportunidade você joga seu futuro no lixo
por causa de um homem qualquer que não tem nem a coragem de
te assumir. — Sua voz penetra meus ouvidos e fico com ódio por ter
verdade em suas palavras. — É assim que você me paga? Se
tornando a vadia de alguém!

Me viro para ele, seus olhos injetados de fúria. Meu pai nunca
teve papas na língua para machucar alguém, é por isso que ele e a
Olivia vivam brigando, ela não aguentava seus abusos, mas eu
sempre fui o contrário, me retraía e tentava fazer de tudo para
satisfazê-lo. Ledo engano achar que isso o faria confiar em mim e
não me machucar com suas palavras.

— Eu não sou a vadia de ninguém! — explodo.

— Como não? Acha mesmo que eu não sei que tem dormido
na casa de outro homem? Se ele fosse seu companheiro já teríamos
sido apresentados! Você não me engana, Bianca Baptista, está
sendo feita de vadia de alguém da empresa, se bobear é do seu
próprio chefe — aperto os punhos, meu corpo ainda cansado pela
doença e a mente fraca para ouvir seus insultos —, esse homem só
quer te comer e te usar, acorda!
— Você não sabe o que está falando — digo com a voz
embargada —, ele não é assim!

— Todos são e quando você menos esperar, ele vai te chutar,


mas não vou estar aqui para ver isso. — Ele aponta para algo na
sala e quando vejo, sinto o ar me deixando. — Suas coisas foram
arrumadas já tem duas semanas e você nem fazia ideia porque não
fica em casa, pegue tudo e saia daqui, não vou sustentar uma vadia.

— Lembre-se de que foi você quem me expulsou — digo com


o coração sangrando.

— Não, você quem escolheu esse caminho sozinha.

Engulo o choro e pego minhas malas. Do lado de fora, chamo


um Uber e vou para o apartamento, acho que o Louis me deixará
ficar aqui enquanto arrumo um lugar para mim. Com o estômago
revirando, eu tomo os antibióticos que o médico receitou e me deito,
mas ainda de dormir, envio uma mensagem de texto avisando ao
Louis o que aconteceu.

Acordo com beijos em meu pescoço, ele nunca me acorda,


mas seu carinho nesse momento é tudo o que eu mais preciso.
Escondo a cabeça em seu pescoço e deixo que o Louis mostre
como me ama com suas ações, nunca falamos sobre nossos
sentimentos um para o outro além do amore mio que o chamo. Mas
sei que ele sente o mesmo que eu.
— Você vai ficar doente — aviso como se fosse adiantar de
algo.

— Já estou doente de amor por você. — Tenho vontade de


chorar com sua declaração, todas as minhas barreiras são
quebradas. — Seu pai é um imbecil e vou fazer questão de dizer
isso pessoalmente a ele.

— Você... — Encaro-o, nunca vi o Louis com uma expressão


séria e decidida como hoje.

— Eu amo você, Bianca, e nunca mais vou deixar que a


chamem de vadia ou pensem que só estou me divertindo com você.
— Ele alisa meu rosto e eu engasgo com as emoções travadas em
minha garganta.

— Eu te amo tanto — aperto seu corpo com o meu beijando


seus lábios.

Louis retira minhas roupas com carinho e faço o mesmo com


ele, beijando seu corpo, trocando carícias e aconchegos. Ele me
penetra sem nenhuma barreira entre nós, paramos de usar
camisinha depois que fizemos exames e concordamos que
gostamos mais desse jeito, eu quero o sentir por completo em mim
como se fôssemos um só. Seu quadril balançando lentamente ao
encontro do meu. Louis me ama com cada investida, beijo e gemido,
repetindo no meu ouvido o quanto sou especial para ele. Em seus
braços eu me entrego sem medo ou reservas, esse é o homem que
eu amo e que me ama, ele nunca faria nada para me magoar e eu
permanecerei leal e ao seu lado para sempre.

Finalmente, o amor chegou para mim e por nada nesse


mundo eu deixaria essa chance escapar.
Capítulo 18

Estava feliz, mesmo com os problemas entre o Lorran e Levi


quase me enlouquecendo e a pressão dos acionistas brasileiros em
cima de mim, tudo passava e melhorava quando eu a tinha em
meus braços, quando sentia o gosto de sua boca na minha e me
perdia entre suas pernas. Bianca me conquistou com facilidade e eu
sentia que, dessa vez, eu poderia amar de verdade, me entregar a
alguém sem medo da traição.

Observo o anel de diamantes dentro da caixinha de veludo, já


estamos juntos há cinco meses e desde que ela esteve doente
nossos laços se tornaram mais fortes, sei que estou pronto para
esse passo e quero que Bianca seja minha por completo. Não tenho
dúvidas de que ela aceitará ser minha, daqui a três meses na
reunião de acionistas quando ascender ao cargo de presidente vou
pedi-la em casamento durante a nossa comemoração especial.

— Senhor Vittileno? — Fecho a caixinha com pressa e a


escondo na gaveta, quando Bianca entra na sala carregando as
pastas que solicitei. Finalmente, estamos a um passo de pegar o
culpado.

— Sim?

— Aqui estão os detalhes da conta no exterior. — Entrega o


nome e número da conta do banco e o nome fantasma em que foi
registrado. — Consegui os detalhes sobre essa pessoa, não é um
fantasma como pensávamos, mas é a mãe do senhor Castanhare,
um dos acionistas que estavam na nossa lista de suspeitos.

— Perfeito, Bianca! — Contenho meu impulso de beijá-la e a


comê-la em cima da minha mesa, a virose a atacou de novo e esses
últimos dias ela tem tido enjoos terríveis acompanhado de cansaço
e febre. Eu queria que ela ficasse em casa descansando, mas a
teimosa prefere estar aqui, já que os sintomas não são constantes.

— Com isso o senhor tem tudo que precisa para comprar as


ações do Castanhare e o expor na reunião em três meses.

— Você está certa, finalmente descobrimos o esquema dele


de venda dos tecidos a uma empresa fantasma e o desvio de
dinheiro para um paraíso fiscal, além da criação de um caixa dois na
empresa. — Puxo-a para meus braços, não resistindo a sua boca.

— Minha nossa — ela faz careta e corre para o banheiro.


Seguro seu cabelo enquanto ela vomita o pouco que comeu
no café da manhã.

— Você vai ao médico hoje mesmo — digo, cansado de vê-la


sofrendo desse jeito e não poder fazer nada.

— Não precisa — reclama e se encosta na parede, entrego a


ela uma toalha —, já, já passa.

— Você diz isso já tem duas semanas e até agora não


passou. — Odeio ver como ela fica pálida depois de vomitar, enxugo
sua testa e a levo para o sofá. — Estou ficando preocupado, Bianca,
você precisa se cuidar.

— Eu vou — me dá um selinho e se levanta —, mas agora


preciso encontrar a mãe do Castanhare e descobrir se ela sabe
sobre essa conta.

— Queria poder ir com você, mas infelizmente não posso


aparecer na casa dela ou ele saberá na hora o que estamos
fazendo.

— Por isso mesmo você vai ficar aqui. — Recebo um selinho,


seguro sua cintura e a puxo para um beijo.

— Mantenha-me informado e tome cuidado.

— Sim, senhor.
Ela sai e um pressentimento ruim me acompanha, desde o
início Bianca tem sido a pessoa em quem mais confiei nessa
empresa e é a mulher que eu amo. Se algo acontecer com ela, vou
me culpar para sempre, mando um segurança segui-la de longe e
ficar de olho para que nada de ruim aconteça com ela.

Já é de noite quando vejo um envelope sendo deslizado por


debaixo da minha porta, o pego e dentro tem um gravador e um
pendrive. Não costumo colocar essas coisas em meu computador
ou notebook, pois podem conter um vírus, para isso sempre tenho
um notebook reserva que não contém nada de importante ou dados
que possam ser roubados.

Conecto o pendrive e o conteúdo naqueles arquivos me


fazem passar mal, diversas pastas contendo informações sobre o
caixa dois e ao contrário do que pensei, ele não foi criado pelo
Castanhare, mas pela Marta e era um golpe para me fazer ser
investigado pela promotoria que já tem acesso a tudo isso e o pior
de tudo, é saber que a Bianca estava envolvida e era a principal
cúmplice da Marta, encarregada de me fazer correr atrás de uma
pista falsa e acusar o Castanhare na reunião de acionistas e com
isso me fazer perder a presidência.

No nome de Marta constam 7% das ações da diretoria da


VITTILENO, e no de Bianca existem outros 2%. Ações essas que
nunca foram do meu conhecimento e foram compradas usando o
valor do caixa dois, a conta está zerada e não foi feita no nome da
mãe do Castanhare, mas sim no da Bianca Baptista vinculada a
outra conta no nome do filho mais velho da Marta, ambas
esvaziadas há cerca de dois mês. Exatamente quando descobri a
existência dela.

Vejo o gravador e fico sem saber se o escuto e aceito mais


esse golpe em minha confiança que destrói os meus sentimentos
pela única mulher que eu amei verdadeiramente ou finjo que nunca
vi nada disso e continuo me iludindo com ela em nome do amor.

— Maldição. — Jogo o conteúdo da minha mesa no chão,


enfurecido pego o gravador e aperto o play, sendo destroçado pelo
conteúdo que existe nele.

— Já fez sua parte? — é a voz da Marta.

— Sim, mas estou com medo — Bianca responde —, não sei


como será a reação do Louis quando descobrir.

— Não se preocupe, eu vou cuidar de você — Marta


responde —, era inevitável que isso acontecesse, desde que vocês
dois entraram nessa empresa eu já sabia qual o rumo que essa
situação ia levar.

— Eu tô com muito medo de como será a reação dele —


Bianca começa a chorar —, ele vai ter certeza de que o enganei
esse tempo todo quando descobrir.
Ruídos iniciam e tornam difícil escutar o que elas falam.

— Você mentiu para ele — a gravação é cortada pelos ruídos


—, mas se ele descobrir sozinho será pior, nem o amor de vocês
poderá aguentar esse golpe.

— Amor? — a gravação torna a ficar com ruídos — nunca


amei ninguém e não planejei me envolver com ele, mas —
novamente os ruídos me impedem de ouvir o que ela diz. Com a
respiração falhando e o desespero me consumindo escuto as
palavras que são o último golpe —, isso vai destruí-lo.

Caio contra a cadeira, a gravação chega ao fim.

Ela me enganou desde o início, começou com essa


investigação e se provou excepcional, aguentando os meus abusos
quando achava que ela era uma vadia, não por querer continuar no
emprego ou sentia algo por mim. Mas ela precisava me enganar, me
colocar no caminho errado para depois me apunhalar pelas costas e
me fazer perder tudo pelo que lutei para ter a vida toda.

Muitas mulheres tentaram me enganar e me apunhalar pelas


costas, mas somente Bianca conseguiu matar minha alma e
confiança, aperto o punho por conta da fúria. Aquela vadia vai
aprender que não pode brincar com Louis Vittileno e as
consequências por se meter no meu caminho.
Capítulo 19

— Minha filha, eu não entendo nada do que tem aqui. — A


senhora de 80 anos segura o papel trêmulo em suas mãos. Suspiro
cansada, já expliquei a ela várias vezes que se tratava de uma conta
no exterior.

— Seu filho abriu uma conta no banco para a senhora no


exterior, ele me pediu para pegar a senha com você para que ele
pudesse sacar a quantia.

Eu deveria me sentir mal por enganar essa senhora, mas ao


olhar para a mansão luxuosa em que ela vive, os empregados
rondando a todo instante carregando chá, suco, água e limpando o
que não está sujo e a forma como ela parece não os enxergar me
faz entender que ela vive em uma realidade completamente
diferente da minha. Estou determinada a sair daqui com a senha da
conta para que possamos acessar e sacar o dinheiro.
— Vou ligar para o meu filho e perguntar sobre isso. — Pega
o telefone e me desespero, pois Castanhare não pode suspeitar que
estou aqui.

Levanto-me de súbito e uma tontura me faz cambalear e cair


de joelhos, a senhora Castanhare larga o celular em cima da mesa e
chama as empregadas para me ajudar. Tento firmar meus pés no
chão, mas não consigo, as pernas moles e a cabeça zonza.

— Tragam uma água para a moça — ouço ela dizendo


enquanto me deito no sofá —, coitadinha, de quantos meses você
está?

— Meses? — pergunto, confusa, tomo a água e respiro


devagar.

— Sim, com certeza, você está grávida, acha que não percebi
que o perfume das minhas flores a deixaram enjoada desde que
você passou por essas portas? Posso estar velha, mas ainda sou
inteligente para essas coisas, afinal, tive cinco filhos.

Tento processar o que ela diz, mas a palavra me parece


extremamente errada, isso não pode ser verdade, impossível que eu
esteja grávida. Transo sem camisinha, mas uso o anticoncepcional
direitinho, nunca pulei um único dia nesses últimos cinco meses.

— É só uma virose — digo, sentando-me novamente, e ela dá


de ombros, não acreditando em minha palavra.
— Em todo caso, não tenho o que você quer.

Ainda abalada com a tontura e suas palavras assombrando


minha cabeça, eu vou embora da sua casa e pego um Uber para a
empresa. Fico parada em frente as portas giratórias do prédio sem
conseguir entrar, se isso for verdade o que eu vou dizer ao Louis?
Ele vai pensar que eu dei algum golpe, que parei de tomar o
anticoncepcional e engravidei de propósito. Desde que nos
conhecemos eu sei o quanto ele é desconfiado com mulheres e,
principalmente, quanto a gravidez, ele não vai acreditar em mim.

Respiro fundo, primeiro eu tenho de saber se isso é verdade,


saio apressada pelas ruas procurando uma farmácia, entro na
primeira que encontro e na seção de testes de gravidez encaro
todas aquelas embalagens sem saber qual escolher. Pego uma de
cada e pago no caixa, nem sei quanto deu, mas estou caminhando
de volta com os testes dentro da bolsa. No banheiro minhas mãos
tremem e a visão embaça, como vou fazer isso? Sento-me no chão
e começo a chorar o medo me paralisando até a alma.

Não escuto quando a porta é aberta e, por isso, me assusto


com a mão tocando meu braço, olho para a pessoa e quando vejo
que se trata da Marta eu me jogo em seus braços, chorando
desesperada. Queria tanto ter alguém comigo nesse momento,
Olivia está trabalhando e não poderia me ajudar, meu pai me
expulsou de casa e nunca tive o carinho de uma mãe, me sinto
completamente perdida.

— O que aconteceu, Bianca? — ela pergunta com a voz


mansa e carinhosa alisando meus cabelos e beijando minha testa.
Sem conseguir falar nada eu mostro a ela os testes de gravidez
lacrados e seu olhar suaviza —, já fez algum?

— Não consigo — admito entre um soluço.

— Eu te ajudo é fácil — ela abre as embalagens e me entrega


os testes —, só precisa fazer xixi nessa ponta e esperar uns minutos
até todos ficarem prontos, espere um segundo. — Ela sai do
banheiro e depois retornar com um copo descartável. — Faz aqui e
coloca os testes nele.

— Eu tô com medo.

— Eu sei — alisa meu rosto —, minha doce criança, precisa


confiar que tudo dará certo, o senhor Louis assumirá a
responsabilidade.

— Não vai — meu choro se intensifica.

— Aquele homem ama você, nada o fará te abandonar nesse


momento — alisa minha barriga —, primeiro vamos descobrir se
você está grávida mesmo, depois pensamos no que fazer, tá bem?
— Certo.

Tremendo como vara-verde, entro em uma cabine e me forço


a urinar, depois coloco os testes, molhando as pontas e saio
carregando os seis em minhas mãos, coloco-os em cima da pia e
caio contra o chão novamente, escorada na parede e com o rosto
escondido entre os braços.

— Já fez sua parte?

— Sim, mas estou com medo, não sei como será a reação do
Louis quando descobrir.

— Não se preocupe eu vou cuidar de você, era inevitável que


isso acontecesse, desde que vocês dois entraram nessa empresa
eu já sabia qual o rumo que a essa situação levaria. — Ela me
abraça novamente e choro contra seu peito.

— Eu tô com muito medo de como será a reação dele —


desespero-me lembrando de como ele reagiu quando tentaram o
enganar com uma gravidez —, ele vai ter certeza de que o enganei
esse tempo todo quando descobrir.

— Não vai, o Louis te ama, Bianca.

— Quando nos envolvemos pela primeira vez, ele achou que


eu o estava enganando, será a mesma coisa dessa vez.
— E o que você vai fazer? Esconder que pode estar grávida
de um filho dele?

— Se eu fizer isso, ele vai me odiar do mesmo jeito que vai


achar que estou dando um golpe.

— Você mentiu para ele sobre alguma coisa enquanto


estavam juntos?

— Nunca o enganei.

— Exato, ele confia em você, Bianca, mas se ele descobrir


sozinho será pior, nem o amor de vocês poderá aguentar esse
golpe.

— Amor? Eu nem sabia o que era isso antes de conhecer


Louis, nunca amei ninguém e não planejei me envolver com ele,
mas ele confia em mim quanto ao anticoncepcional se descobrir que
engravidei, ele vai pensar que foi de propósito, sua confiança em
mim será arruinada e isso vai destruí-lo.

— Vamos ver o resultado. — Ela vai para a pia e fecho os


olhos, pronta para ter meu mundo virado de cabeça para baixo.

— Todos deram positivo, você está grávida.

Eu deveria ficar feliz, mas por que estou chorando


desesperada?
O medo rouba um momento único em minha vida e agora sei
que o Louis achará que me aproveitei dele e o usei. Passamos
horas naquele banheiro enquanto me acalmo, Marta vai embora e
eu subo para a sala do Louis, precisamos conversar e o quanto
antes fizer isso melhor será. Nossa relação começou com
desconfiança e mágoas, os últimos meses tem que valer de alguma
coisa, precisam ter algum significado e ele não pode me maltratar ou
me desprezar, nem que eu tenha que fazer um maldito teste de
DNA, Louis vai ver que não estou mentindo e sei que depois que o
choque o passar, ele ficará feliz. Seremos uma família, acaricio
minha barriga, vamos fazer isso juntos bebê.

Abro a porta da sua sala e a bagunça aqui dentro me diz que


tem algo de muito errado, procuro pelo Louis e não o encontro em
lugar algum, ligo no seu celular e só da fora de ar, envio um monte
de mensagem e nenhuma é recebida. Ele desligou o aparelho, sem
saber o que fazer pego minha bolsa e chamo um táxi para o nosso
apartamento, espero que ele esteja em casa quando eu chegar.

Do corredor do prédio consigo ouvir a música ensurdecedora


saindo do nosso apartamento, com as mãos trêmulas destranco a
fechadura e abro a porta. A cena é um verdadeiro caos, tudo está
revirado e minhas coisas estão jogadas e a maioria destruída,
minhas roupas, sapatos, livros, maquiagem, perfume, tudo quebrado
ou rasgado no chão. Com as mãos trêmulas pego meu celular para
ligar pra polícia e ando devagar de costas para ir embora, se tiver
alguém aqui dentro vai me machucar.

Grito quando sou levantada pela cintura e jogada contra o


sofá, o medo me paralisa, devido à música ensurdecedora não ouvi
quando se aproximaram de mim. Protejo minha barriga e me
preparo para o ataque que não acontece, o som é desligado e abro
os olhos assustada, procurando por meu agressor. Encontro o Louis
de pé me olhando com os olhos vermelhos de raiva, os punhos
cerrados e uma expressão assustadora, nunca o vi tão bravo.

Aperto ainda mais minha barriga aterrorizada pela ideia de


que ele vá me machucar, não sei o que aconteceu, mas pela
primeira vez desde que nos conhecemos eu sinto o medo gelando
meus ossos.
Capítulo 20

— Você é uma maldita vadia. — Ele aponta o dedo na minha


cara e me encolho contra o sofá. — Todo esse tempo armou com a
Marta pelas minhas costas para me prejudicar enquanto me fazia de
tolo apaixonado. Pela primeira vez eu me apaixonei e tinha que ser
logo por você. — O desprezo em seus olhos me magoa mais do que
suas palavras. — Uma maldita vadia.

— O que aconteceu? — pergunto quase sem voz, não


consigo entender o motivo de ele estar assim.

— Chega de me fazer de idiota! — esbraveja e me encolho,


Louis pega o abajur em cima da mesinha ao lado do sofá e o joga
contra a parede, os cacos se espalhando por todo o lugar.

— Louis, amore mio — tremendo, engatinho no sofá para


perto dele e seguro suas mãos —, vamos conversar com calma, por
favor.
— Eu deveria te foder uma última vez — grito quando ele se
joga contra mim, imobilizando-me no sofá, o bafo de bebida em sua
pele me dá ânsia e mordo sua boca quando ele tenta me beijar.

— Pare — imploro, chorando.

— É dinheiro que você quer? Te dou quanto precisar.

Ele sai de cima de mim e pega a carteira jogando as notas na


minha cara.

— Quer toda a minha fortuna? — Pega seu cartão preto e o


põem na minha mão. — Gaste tudo, sua vagabunda.

— Por que você está me humilhando assim? — pergunto com


a voz rouca de chorar e o coração afundando no peito, nunca me
senti um lixo como hoje.

— Deve ter sido por isso que Fernando fez aquilo com você
— ele empurra um punhal em meu coração com suas palavras e o
ar me falta —, ele já sabia desde o início a puta que você era. — Ele
empurra meus ombros e volto a cair contra o sofá.

— Você está me matando com suas palavras — digo,


encolhendo-me em meu choro, ele não tem o direito de falar isso.

— Já descobri tudo, pare de fingimento. — Vira-se e vai até o


bar na sala, meia garrafa de uísque já foi ingerida.
Não tem como ele saber da gravidez, eu mesma descobri
somente há poucas horas. Nada nessa maldita situação faz sentido,
ele me protegeu do Fernando e agora diz essas coisas? Louis só
pode estar possuído para me atacar impiedosamente. Com as
pernas tremendo e o coração paralisado de gelo eu me sento e
caminho para perto dele, preciso entender o que aconteceu para
Louis ficar assim e destruir nossa relação.

— Por favor, amore mio, me diz o que aconteceu.

— Não me chame assim. — Tremo e paro no lugar.

— Só me diz o que eu fiz, não estou entendendo o que houve


— imploro, com as lágrimas turvando minha visão e um embrulho na
barriga.

— Veja você mesma. — Joga vários papéis na minha cara e


senta no sofá. — Você tem sorte de um dia eu ter te amado ou isso
tudo já teria sido entregue à polícia.

Caio de joelhos e apanho os papéis, olhando o conteúdo.


Não consigo acreditar em tudo que tem ali, são provas de que eu
desviei os fundos da empresa junto da Marta para uma empresa
fantasma e depois um paraíso fiscal. É um relatório detalhado desde
quando entrei na empresa, por indicação da Marta que convenceu o
presidente que eu era a melhor para trabalhar com seu filho,
também diz que foi ordem dela eu ir para os arquivos no dia da
festa.

Que eu deveria evitar encontrar o Louis e só o fazer durante a


cerimônia, tem muitos arquivos de trocas de e-mail entre mim e ela
com datas antigas, planejando como eu seduziria Louis e depois o
levaria a caçar o Castanhare que era quem investigava a Marta e
alertava o Enrico sobre o plano dela. Como vingança e para pará-lo,
ela o incriminou.

Existem extratos, arquivos, mensagens e documentos


confidenciais provando meu suposto envolvimento com ela, no final
mostra a compra de ações da empresa. Eu teria 2% no meu nome e
Marta tem 7% no nome dela. Ao fim, vejo minha assinatura em
páginas de um contrato entre mim e ela onde selamos como seriam
divididos os lucros e acordo de confidencialidade.

— Essa assinatura não é a minha — é tudo que consigo dizer


quando acabo de ver aquelas barbáries —, isso tudo é falso.

— Isso aqui também? — minha conversa com a Marta no


banheiro reverbera pelas paredes da sala, cortada e distorcida,
fecho os olhos, sei que não adianta chorar, mas não consigo impedir
o desespero de me consumir.
— Não é isso que você está pensando. — Como vou dizer a
ele que estou grávida e falávamos sobre isso no banheiro? Do jeito
que estar o Louis vai surtar comigo.

— Então me explica, diz como você me fez de idiota esse


tempo todo fingindo me amar enquanto me apunhalava pelas
costas. — Sua voz controlada, os olhos impiedosos e a força como
ele aperta os punhos e o copo me assustam mais do que o seu
descontrole.

— Eu nunca fingi te amar, como você pode não acreditar em


mim depois de todas as confidências que trocamos? — Sinto que
estou a um fio de perder minha sanidade. — Eu não signifiquei nada
para você — explodo.

— Eu te amo — ele corre na minha direção e grita no meu


rosto enquanto me sacode, soco seu peito desesperada —, e é por
te amar e ter te deixando entrar na minha vida que sua traição está
me matando. Eu fui sincero com você — seu olhar amolece e ele me
abraça, chorando em meu ombro —, eu te amei com todo o meu
ser, Bianca, queria construir uma família ao seu lado. — Abro a boca
para confessar que nossa família está começando dentro de mim. —
Mas você me enganou e me iludiu, enquanto eu me apaixonava,
você me usou e agora quebrou a porra do meu coração. — Fico
vazia quando ele me solta e volta para o sofá. — Eu nunca mais
quero te ver, vá embora antes que eu faça algo pelo qual vá me
arrepender.
— Eu juro, isso tudo é falso. — Arrasto-me até ele, a tontura
ameaçando me fazer perder os sentidos. De joelhos, segurando em
suas pernas, eu o encaro e abro meu coração. — Eu amo você,
Louis, desde a nossa primeira vez até agora, você tem sido o meu
tudo, por favor, acredite em mim, vamos descobrir a verdade juntos.
— Seguro sua mão, desesperada. — Você me conhece, por favor,
me dá uma chance de provar que sou inocente e que ainda
podemos ser uma família.

— Como você vai provar isso? Olhe o tanto de coisa que tem
contra você, até mesmo sua assinatura nos arquivos e sua voz no
áudio. Não ache que serei feito de idiota só por que te amo. — Ele
solta minha mão e pega um arquivo o jogando na minha cara igual
como fiz quando joguei o dinheiro nele. — É sua assinatura, Bianca!

— Ela é falsa. — Pego o papel e quase caio ao me levantar,


ele segura meus braços impedindo minha queda, mas me solta logo
que percebe o que fez. — Eu nunca usei esse B, você sabe disso —
ele já me viu diversas vezes assinando —, meu B é mais delicado e
esse é grosso, pode parecer que é o mesmo, mas não é!

Me sinto uma criança birrenta fazendo birra para o pai


acreditar que não fez travessura quando sei que fiz coisa errada.
Louis não muda sua expressão, só vai ficando com mais raiva e
tremo de medo quando ele quebra o copo aos meus pés e avança
até mim, segura meus braços e me sacode.
— Você me enganou uma vez e não o fará novamente — fala
a centímetros do meu rosto —, você está demitida e a quero fora
desse apartamento agora mesmo, agradeça aos céus por não te
denunciar à polícia.

O ódio em seu olhar é o que mais me machuca, outra vez ele


não me deixa explicar, tira suas conclusões com base no que viu.
Nos últimos cinco meses, Louis me amou e eu o amei, mas não foi o
suficiente para fazer com que acredite em mim.

— Um dia você vai descobrir a verdade, quando eu me for e


você perceber que o desvio continuará acontecendo, seja daqui a
um ano ou dez, vai se arrepender da burrice que está fazendo
agora. E quando isso acontecer, você nunca mais me terá de volta.

Naquele momento, encarando o ódio em seu olhar eu decidi,


se fosse somente a mim nessa situação eu lutaria com unhas e
dentes para provar minha inocência. Não sairia dessa situação de
cabeça baixa e o faria perceber o idiota que está sendo, Louis
quebrou meu coração como nenhum outro homem foi capaz e não
vou permitir que ele continue em minha vida ou na do meu filho.

Eu cresci sem uma mãe me amando e meu neném crescerá


sem um pai o odiando.

— Saia daqui, sua vadia.


Aperto os punhos para não estapeá-lo, Louis está bêbado e
furioso, não sei o que ele faria se eu o agredir. Olho ao redor e
percebo que não tem nada meu para levar, tudo foi destruído. Pego
meu celular e bolsa do chão e uma pasta que foi jogada perto da
janela onde guardo meus documentos e é somente isso que levo ao
sair do apartamento, no elevador eu desabo, choro e deixo a dor
sair do meu peito, não faço ideia de para onde irei, meu pai não vai
me aceitar em casa, é quase fim do mês e já gastei quase todo o
meu salário, nunca fui de ter reserva em banco ou usar cartões de
crédito. Estou completamente zerada.

Caminhando pelas ruas vazias, eu me sento em um banco na


praça e fico pensando no que fazer da vida, grávida do homem que
me odeia e desconfia de mim na primeira oportunidade. Se ele
tivesse me deixado provar que aquilo tudo era falso ainda
poderíamos ter uma chance, mas ele só me acusou e me expulsou
da sua vida sem pensar duas vezes. Nem mesmo quando Fernando
me beijou a força ou quando Pedro apostou na faculdade que tiraria
minha virgindade e me masturbou com tanta força que me fez
sangrar, eu senti tamanha dor.

É sempre essa mesma coisa, os homens me usam como


querem, me enganam e iludem sem se preocuparem com meus
sentimentos. Neste momento, sozinha em uma praça de São Paulo
eu percebo que não nasci para o amor, mas meu filho foi gerado do
amor que eu sinto por seu pai e que achei que ele sentia por mim.
Acaricio minha barriga, se não tivesse esse pequeno comigo eu não
iria ter motivos para seguir em frente.

Limpo minhas lágrimas e chamo um Uber, mando mensagem


para Olivia perguntando se ela está em casa, mas ela não responde,
deve estar trabalhando ainda. Eu não tenho a chave do seu
apartamento, mas minha entrada é liberada na portaria, sentome
contra a porta do apartamento e fico esperando-a voltar para casa.
Para minha tristeza, Olivia demora demais, fico com frio e
desconfortável naquele corredor, chorando baixinho para não
chamar a atenção dos vizinhos. Adormeço naquele lugar após
passar pelo pior dia da minha vida.
Capítulo 21

— Meu Deus, Bianca! — A voz da minha irmã me desperta.


— O que diabos?

— Fala baixo, Olivia — peço, quase sem voz.

— O que aconteceu? — Ela se ajoelha e me ajuda a levantar.

Entramos e me jogo na sua cama, o apartamento da Olivia


parece mais um loft, tem um sofá e uma TV na entrada com uma
divisória de meia parede entre o quarto e a sala, além de um degrau
mais alto. A cozinha americana de frente para a sala e uma pequena
varanda, foi o melhor que ela encontrou perto da escola e é perfeito
todo decorado com plantas e quadros de artes do jeito que minha
irmã gosta. Cheio de vida e luz, queria me sentir good vibes desse
jeito, mas meu coração só quer chorar, mesmo sem lágrimas para
serem derramadas.

— Agora me diz o que aconteceu. — Olivia coloca minha


cabeça em seu colo e alisa meus cabelos, a preocupação em seu
olhar só me faz querer ficar encolhida como um bebê.

— Armaram para mim — subo no colo da minha irmã e deito a


cabeça em seu ombro, enquanto ela alisa minhas costas —, criaram
provas falsas de que eu e a Marta estamos por trás da empresa
fantasma que tem sido usada para desviar dinheiro da VITTILENO,
e o Louis acreditou em tudo, nem me deu uma chance de explicar.

— Não sei quem é mais idiota, ele ou o irmão.

— O que houve? — Encaro-a, Olivia também parece triste.

— Levi me tira do sério, aquele italiano metido.

— Achei que ele passasse o dia depressivo. — Ao menos era


o que o Louis me contava sobre o irmão.

— Depressivo? Tente mais para implicante, até uma


mamadeira que eu faço para Lorran o Levi se mete dizendo que
estou fazendo errado. Juro que tô por um triz de bater na cabeça
dele com um pau.
Só Olivia para conseguir me fazer rir, minha irmã sempre foi a
pessoa mais calma e doce desse mundo e agora fala uma coisa
dessas? Talvez o Levi esteja mexendo com outra parte da senhora
good vibes irritadinha.

— Eu prefiro bater o pau na cabeça do Louis.

— Me conta com calma tudo o que aconteceu, não entendi


ainda o lance da empresa fantasma.

Conto com calma o que houve para a Olivia e omito a parte da


gravidez, ainda não estou pronta para dizer a ninguém sobre o meu
bebê, preciso primeiro colocar a cabeça no lugar e reestruturar
minhas emoções.

— Louis deveria ter te ouvido e investigado mais essa


situação, ele foi um imbecil. — Ela me entrega uma xícara de chá de
camomila.

— Como ele pode achar que eu o estava enganando? Eu dei


meu coração a esse homem. — A louça treme em minhas mãos e
Olivia a segura, deito-me na cama e volto a chorar, meu peito
doendo pelas horas que passei fazendo isso.

— Pelo que você me disse o Louis tem histórico de


relacionamentos ruins, talvez seja isso, o trauma falando mais alto.
— Eu não sou aquelas mulheres! E ele vai saber disso nem
que eu tenha de gritar em sua cara.

Levanto-me de súbito e sinto o mundo girando à minha volta,


a escuridão me domina. Acordo e estou novamente em um hospital,
dessa vez não é uma ala VIP, mas a enfermaria com outros
pacientes ao meu lado, o soro e nada de aparelhos medindo meus
sinais vitais.

— Graças a Deus você acordou — Olivia aparece no meu


campo de visão —, por que não me disse que estava grávida?

— O quê?

— Você não sabia?

Sento-me e observo minha irmã ainda processando o que


aconteceu, minutos antes eu estava em seu apartamento pronta
para ir brigar com o Louis e agora estou novamente em um hospital.

— Eu descobri ontem antes da briga com o Louis. — Aliso


minha cabeça tentando recobrar os sentidos.

— Vou atrás do médico para vocês conversarem, fica aqui.

Deito-me novamente e os pensamentos me deixam mais


zonza ainda, Louis destruiu todas as minhas coisas e me demitiu,
não tenho reservas e estou grávida de um bebê que nunca saberá
quem é seu pai. Tenho medo do que ele possa fazer se descobrir e
como vingança queira tirar a criança de mim. Louis tem dinheiro e
influência, eu não tenho nada. Vou manter minha gravidez em
segredo dele e depois o meu filho, vou registrá-lo sem o nome do
pai e quando ele tiver idade suficiente para não ser tirado de mim
pela justiça eu o deixo escolher se quer a mim ou ao pai.

Não tenho tempo para estar em um hospital, preciso ir à


VITTILENO assinar minha demissão no RH e depois começar a
procurar um emprego, quem sabe com o nome da empresa no
currículo eu consiga alguma coisa. Tenho de comprar minhas roupas
e iniciar o pré-natal e conseguir um emprego antes de a barriga
aparecer, se as empresas descobrirem que estou grávida não vão
me contratar.

— Olá — o médico chama minha atenção e escuto com


cuidado que ele fez vários exames e um BETA HCG para saber o
que tinha causado o desmaio súbito, suas recomendações quanto a
iniciar o pré-natal e tomar cuidado com estresse, minha pressão
está alta e isso pode prejudicar o bebê.

Após a minha alta, volto com a Olivia para seu apartamento,


são quase cinco da manhã, visto as roupas da minha irmã e durmo
com ela fazendo carinho na minha cabeça. Desperto com o som do
meu celular e vejo um número desconhecido me ligando.

— Senhorita Bianca Baptista?


— Sim, quem é?

— Sou a Letícia do RH da VITTILENO, o senhor Louis ligou


de manhã informando sobre a sua demissão, preciso que você
venha assinar a baixa na carteira de trabalho, infelizmente a
demissão será por justa causa e você não terá nenhum
ressarcimento da empresa.

— Certo.

Desligo e me deito olhando para o teto. Ele podia ter esperado


ou me chamado para conversar antes de fazer isso. Louis está me
cortando por completo de sua vida e não me dará a chance de
explicar nada. Acaricio minha barriga, eu não tenho tempo para
lamber minhas feridas, tenho que cuidar desse pequeno que cresce
aqui dentro, por isso me levanto e me arrumo, visto um vestido da
Olivia e tomo um café da manhã leve, não consigo comer muito sem
enjoar.

A caminho da VITTILENO ligo para meu plano de saúde e


eles me informam que não posso mais acessar o serviço através do
plano da empresa, pois com a demissão perdi o benefício. Pelo jeito,
Louis se ocupou muito de manhã me cortando da sua vida e da
empresa. Tudo bem, já esperava por isso, quando sair da empresa
vou procurar uma Unidade Básica de Saúde e dar entrada no pré-
natal, se não posso fazer particular será pelo SUS. Mas nunca mais
vou me rebaixar para ele ou tentar explicar o que aconteceu.
No RH as pessoas me olham e cochicham, fico com vontade
de me encolher, é um inferno manter a cabeça erguida, a mulher
que me ligou me atende e me informa que estou sendo demitida por
ter perdido arquivos importantes do vice-presidente. Sairei sem
direito algum e com alguma sorte, conseguirei acessar o seguro
desemprego, com essa mancha em meu currículo outras empresas
podem não me contratar por pensarem que sou incompetente.

— Se alguém ligar pedindo referências, tem como não falar


sobre essa falha? — pergunto, minha voz rouca a faz me olhar com
pena.

— Infelizmente, não, o senhor Louis foi claro quanto a como


devemos recomendá-la.

— O que ele disse para falarem?

— Que você é uma profissional que, a princípio, vai se


mostrar como a melhor, mas que não devem se enganar, pois você
é um lobo em pele de cordeiro.

Aperto a bolsa em minha mão, esse desgraçado está decidido


a acabar com a minha vida, mas não vou deixar passar dessa
forma.

— Obrigada. — Assino minha demissão e saio dali decidida a


falar umas verdades ao Louis.
Pego o elevador presidencial e me surpreendo quando vejo a
Marta trabalhando normalmente, ele desceu os cachorros em mim e
me demitiu sem pensar duas vezes e ela continua aqui? Isso só
pode ser brincadeira.

— Graças a Deus você chegou — ela corre em minha direção


e aperta minha mão —, o senhor Enrico está uma fúria com o Louis,
ele ficou sabendo dos arquivos, mas não acredita que eu fiz aquilo
e, por isso, não me demitiu, mas...

— Ao menos você tem alguém ao seu lado. — Solto minhas


mãos da dela e vou até a sala do Louis, abro as portas e o vejo de
costas encarando a paisagem.

— Eu disse para ninguém me incomodar. — Sua voz é rouca


e cheia de ódio.

— Pena que não sou mais sua funcionária. — Ele se vira e


me encara com fogo nos olhos. — Você destruiu todas as minhas
coisas, me demitiu e ainda vai fazer com que falem mentiras sobre
mim para futuros empregadores. — Caminho até ele com o sangue
fervendo, eu não deveria estar aqui, mas não vou descansar
enquanto não tiver esse encerramento. — Seu pai deu a Marta o
benefício da dúvida e você que dizia me amar não fez isso por mim.

— O que você quer? — Ele se vira novamente, não me


encarando.
— Vim te dar um aviso. — Aperto a bolsa, preciso de forças
para dizer o que é necessário. — Se você atrapalhar que eu seja
contratada por qualquer pessoa, vou a mídia e digo que você se
envolveu comigo, me usou e caiu em um golpe de um de seus
acionistas e está me usando como bode expiatório. Eu ainda tenho
todos os arquivos da empresa fantasma salvo na minha nuvem
particular e vou revelar tudo e deixar que você lide com a bomba.

— Não se atreva. — Finalmente ele me encara.

— Vou me atrever, durante toda a minha vida as pessoas


pisaram em mim, me magoaram sem pensar duas vezes e você,
Louis Vittileno, está se provando o pior de todos. Você está me
expulsando da sua vida e da empresa, deixando-me sem nada, não
tenho mais uma casa para voltar, destruí minha relação com meu
pai por sua causa e, ainda por cima, não tenho nem mesmo uma
roupa para vestir e corro o risco de não receber o seguro
desemprego pela forma que você me demitiu.

— Você mereceu — ele tem a audácia de cuspir as palavras


em minha cara.

Como eu posso amar tanto alguém que está me matando por


dentro sem nem hesitar? Com as emoções travadas na garganta e
pensando somente no meu bebê, eu jogo minha cartada final.

— E você vai merecer todo o arrependimento que vai sentir


quando seu pai te mostrar que você foi feito de idiota e pior ainda —
não consigo evitar as lágrimas de escorrerem por meu rosto, os
olhos do Louis também brilham e uma gota solitária desce pelos
seus cílios —, tratou injustamente a única mulher que realmente te
amou. Eu vou sair da sua vida e espero nunca mais encontrar você,
se isso acontecer vou fingir que não te vi. A partir de hoje, você não
significa mais nada para mim.

Ele não me responde, apenas se vira e eu vou embora com o


corpo gelado e os passos vacilantes. Vou desaparecer da vida do
Louis e espero nunca mais o encontrar.
Capítulo 22

— Zio, Lou. — Lorran bate na porta do quarto e me escondo


entre os travesseiros. Eu só preciso de mais cinco minutos, não
consegui dormir nada essa noite com as palavras da Bianca
rondando minha cabeça.

Eu a magoei sem pensar duas vezes, perdido em minha


própria dor e o sentimento de traição fervilhando meus
pensamentos. Como ela pôde ser capaz de fazer aquilo comigo? Eu
a amei como nunca fiz antes e ela me traiu, pisou na minha
confiança e me usou como um maldito fantoche. Nunca a perdoarei
e suas palavras não significam nada, meu pai pode estar sendo um
tolo em acreditar na história da Marta, mas não vou me deixar
enganar facilmente.

Por mais que doa como caminhar em brasa ficar longe dela,
dos seus beijos e de acordar e dormir olhando as feições tranquilas
dela deitada em meu peito, ou ao meu lado. Eu não vou me
arrepender, posso ter jogado sujo ao falar sobre o Fernando
sabendo o mal que ele a causou, mas não voltarei atrás. Ontem foi a
última vez que nos vimos e eu vou arrancar esses sentimentos do
meu peito nem que precise fazer um transplante de coração.

— Zio! — Lorran grita ainda mais e passa a chutar a porta


pela intensidade de suas batidas. Enxugo meu rosto, não quero que
meu sobrinho me veja me comportando como meu irmão.

— Oi, piccolo. — Pego-o no braço, ele faz careta e cruza os


bracinhos a coisa mais fofa do mundo. Beijo seu pescoço sentindo
seu cheirinho de bebê. Não consigo entender como o Levi foi
incapaz de buscar consolo no Lorran para superar a perda, só de ter
meu menino nos meus braços sinto a paz retornando.

— Nonno ando. [32]


— Ele continua de bico e belisco seu nariz,
fazendo-o gritar e rir no meu colo.

— Diga ao nonno que vou tomar um banho e encontro com


ele. — Coloco-o no chão, falando em italiano para que ele entenda.

— Zio orento. [33]


— Faz careta abanando o nariz e sai
correndo.

Entro no quarto e percebo que estou fedendo a álcool e


cigarro. Fazia um bom tempo que não fumava, mas estava
precisando acalmar meus ânimos ou iria atrás da Bianca para brigar
com ela, até entender a porra do motivo para ela me trair dessa
forma. Maldita, eu a amei em cada momento que estivemos juntos,
confiei nela como nunca fiz antes, transava sem camisinha e mesmo
se ela engravidasse eu iria saber que foi um acidente e não
planejado, depositei toda a minha confiança após acreditar nela
sobre a nossa primeira vez e estava até pronto para pedi-la em
casamento.

E foi tudo uma maldita mentira, orquestrada desde o início para me


fazer apaixonar e confiar, um golpe para me tirarem da empresa e
me ridicularizar na frente do meu pai. Esse que de um jeito ou de
outro está furioso comigo e deve ter vindo aqui gritar e dizer mais
desaforos comigo, estou por um fio de explodir com ele também.
Termino de me arrumar, hoje é domingo e não preciso trabalhar,
planejava passar o dia com o Lorran na tentativa de me sentir
melhor e agora o velho veio me perturbar.

— Vamos ao escritório — ele diz assim que piso na sala,


Lorran brinca com sua babá, essa que ao me ver fecha a cara e
acredito que me mataria se tivesse a oportunidade.

Sigo para o escritório e de portas fechadas meu pai joga uma


pasta em cima da minha mesa. Nem me dou ao trabalho de abrir, já
sei o que é.

— O que você quer trazendo isso aqui? — aponto para o


dossiê que me foi entregue sobre a Bianca e Marta.

— Você só vai voltar para a empresa depois que analisar cada


página que existe nesse documento e essa maldita gravação —
bate na mesa —, como você se deixou enganar tão fácil sem nem
mandar analisar a porra desse áudio? Você tem um notebook
reserva só pra ouvir e ler arquivos suspeitos para não sofrer um
ataque cibernético e acredita em uma gravação suspeita cheia de
ruídos e cortada cegamente!

— Eu sei o que eu fiz — respondo, orgulhoso, por mais que


exista muita verdade em suas palavras.

— Destruiu o melhor relacionamento que você já teve sem


nem investigar antes — ele segura minha camisa e me sacode —,
acorde para a vida e comece a trabalhar. — Meu pai me arrasta
como se fosse um boneco para sentar na minha cadeira. — Você só
saíra desse maldito escritório quando desvendar a verdade.

— Você não pode me trancar aqui! — Levanto-me como um


garotinho protestando contra o pai.

— Posso e vou, não te criei para ser um idiota, mas um líder


inteligente e perspicaz.

Ele sai e vou atrás, mas a porta bate na minha cara e não
consigo abrir a fechadura. O maldito realmente me trancou aqui
dentro. Ando pelo escritório com vontade de destruir tudo, recusome
a fazer o que ele disse. Já li esse arquivo e sei, exatamente, o que
tem aí dentro, reler não vai me ajudar a descobrir nada de novo.

Encaro o papel, mesmo que exista uma pequena


possibilidade de ela estar falando a verdade, eu já fui longe demais
em minhas palavras e ações, massacrei nosso relacionamento e os
sentimentos que ela tinha foram manchados pela minha crueldade,
tal qual os meus por ela. Não existe nada que possa me fazer voltar
atrás, mesmo se ela for inocente, nada mudará. O que está feito,
não pode ser desfeito.

Pego meu uísque e encho meu copo, passo a próxima hora


olhando para o relógio e os malditos arquivos, não tem nada aí que
possa provar sua inocência, absolutamente nada. O medo me
consome, pois sei que se meu pai estiver certo e ela for inocente,
terei machucado sem motivo, as coisas que eu disse, o que fiz,
não... não posso pensar isso.

Em vez de abrir o envelope que a incrimina abro o arquivo da


nossa investigação, conferir isso agora não vai mudar o que
aconteceu, mas pelo menos não terei mais dúvidas e sei que no
final vai mostrar que eu fiz a coisa certa. Começo a analisar página
por página de ambos e encontro inúmeras incongruências nas
histórias e nas contas, lembranças de momentos que passei com
ela enquanto investigávamos juntos nublam minha mente e o medo
de ter cometido uma injustiça me deixa quase sem ar.

É loucura preferir que ela realmente tenha me traído do que


tê-la machucado por cair em uma armadilha de outra pessoa. Não
sei quanto tempo se passa, mas a comida chega e vai embora, uso
o banheiro do escritório, meu pai manteve sua palavra e não está
me deixando sair até terminar de analisar tudo. O calendário me diz
que já estou trancado nessa sala há uma semana enlouquecendo
diante de tantas informações e conflitos.

Sem saber qual caminho tomar, eu sigo o rastro do dinheiro,


vou precisar ir até a Suíça para descobrir qual dessas contas é a
verdadeira e quem a abriu. Vai ser difícil conseguir o acesso sem um
mandado policial ou sem ser o dono da conta, mas vou usar toda a
minha fortuna para desvendar essa bola de neve, caso contrário eu
nunca vou saber se cometi uma injustiça com a mulher que eu amo
ou se ela me enganou por causa de dinheiro.

— Abra essa porta — digo ao meu pai por telefone.

— Já achou o culpado?

— Terei que ir até a Suíça descobrir isso, agora me deixe sair.

— Não me decepcione novamente, Louis.

A porta se abre quando a ligação é finalizada, a babá do


Lorran me olha cheia de ódio e pronta para me matar, sei que ela
tem aguentado os abusos do Levi e sem mim por perto para intervir
a coisa pode estar além do imaginável.

— Você é um idiota que não merecia a Bianca.

É tudo que ela diz antes de ir embora, suspiro.


Não perco tempo discutindo com ela, vou para o quarto me
arrumar e ligo piloto preparar a aeronave que vamos viajar. A
caminho do aeroporto, recebo uma mensagem da Marta, o conteúdo
me surpreende e afunda meu coração repleto de dúvidas e
arrependimentos.

O senhor Enrico me mostrou a gravação, não é nada do


que você imagina que estávamos conversando e acredito que
eu não devo te dizer do que se trata a conversa, somente a
Bianca pode fazer isso. Mas se vai te ajudar a perceber seu
erro, veja as imagens da câmera de segurança da porta do
banheiro onde tivemos essa conversa.

O vídeo mostra a Bianca entrando desesperada, ela passa


horas lá dentro, a Marta entra e depois saí, mas a Bianca continua
lá, até que ela deixa o banheiro e seu rosto não é o de alguém que
cometeu um golpe contra mim ou uma mulher ardilosa. Ela está
vermelha e limpando as bochechas, a expressão de quem passou
horas chorando.

— Deve ter sido por isso que Fernando fez aquilo com você,
ele já sabia desde o início a puta que você era.

As minhas palavras ditas naquela noite voltam à minha mente


com o peso de mil machados. Estava bêbado e fora de mim, mas
não posso culpar a bebida ou a raiva, eu quis dizer aquilo, queria
magoá-la e vê-la destruída como eu. Não importa mais o resultado
que essa investigação vai chegar, no fundo eu sei que Bianca não
irá me perdoar e eu nunca mais terei coragem de vê-la novamente.

Sou um maldito imbecil que não merece a mulher que tinha.

Após horas, chego à Suíça e vou ao banco onde o rastro do


dinheiro me levou. Meu nome chama a atenção e o diretor vem falar
comigo pessoalmente.

— É um prazer ter um Vittileno conosco. — Ele aperta minha


mão diversas vezes, o encaro seguro de minhas ações.

— Minha empresa tem um caixa dois nesse banco — o velho


arregala os olhos e tosse —, não precisa se fazer de surpreso —
jogo, agora preciso mentir como nunca. — Fui eu quem ordenou a
criação através de um dos meus acionistas.

— Certamente, uma quantia como aquela não seria


desconhecida por um homem como o senhor.

— Acontece que esse acionista se tornou uma pedra no meu


sapato — cruzo as mãos em cima de sua mesa —, e o senhor sabe
o que fazemos com empecilhos como esse, não é?

— Devem ser descartados.

— Fico feliz que falamos a mesma língua, transfira toda a


quantia para uma nova conta.
— Senhor, para isso vou precisar do nome do dono, número
da conta e senha.

Está na hora da cartada final, levanto-me e seguro em seu


ombro, empurrando-o contra a cadeira e aproximando meu rosto do
seu.

— O que será que seus clientes pensariam ao saber que o


dinheiro deles pode ser guardado por laranjas no seu banco, mas o
verdadeiro dono não pode acessar se não tiver coisas tão pequenas
que podem ser mudadas sem o nosso conhecimento, só pelo
simples fato da conta não ser no nosso nome. — Aliso seu terno e o
homem engole em seco. — Eu vou ter que usar meu próprio nome e
chamar a atenção da justiça, é isso mesmo?

— Não, senhor, vamos resolver isso agora.

Aperto seu ombro e permaneço ao seu lado, enquanto ele


acessa a conta e preciso de forças para não cair de tamanho
arrependimento, pois o nome que pisca na tela é Alfredo Freitosa de
Castanhare.

Bianca foi acusada injustamente e eu caí no golpe como um


idiota.
Capítulo 23

Consegui um novo emprego, não era o que eu imaginava,


mas tem me ajudado a conseguir pagar metade das contas no
apartamento da Olivia, comprar minhas coisas e adiantar o enxoval
da minha bebê. Eu estava com oito semanas quando descobri a
gravidez e agora estou com vinte semanas, já consigo sentir minha
pequena se mexendo dentro de mim, crescendo a cada dia.

E meu desespero tem aumentado no mesmo passo, minha


pressão não abaixou assim como a dor em meu coração. Louis
nunca mais me procurou e soube pela Marta que hoje é o dia que
ele vai assumir a presidência da VITTILENO, ela também me disse
que a investigação sobre o caixa dois seguiu a portas fechadas e a
única certeza de que ela tem é a de que não foi provado que eu e
ela éramos culpadas, já que ela continua no emprego e vai se
aposentar oficialmente amanhã.

Louis escolheu permanecer longe, mesmo com a minha


inocência sendo provada. Ou tudo não passa de um truque e a
qualquer instante a polícia vai me prender por desvio de dinheiro
com as falsas provas. Se eu tivesse mesmo acesso aquela quantia
milionária, não estaria trabalhando em um escritório de
contabilidade, aguentando um chefe rabugento que desde que
percebeu minha barriga fica reclamando sobre a licença
maternidade e me chamando de oportunista.

Não posso pedir demissão e ele não pode me demitir, então


tenho aguentado calada seus desaforos e feito as intermináveis
horas de trabalho com tanta papelada e números que me deixa
zonza. Meu médico do posto de saúde me alertou na última consulta
que se não diminuir o estresse e minha pressão fosse normalizada,
poderia desenvolver uma pré-eclâmpsia e se isso acontecer a vida
da minha bebê vai estar em risco.

Eu tremo de medo só de imaginar perdê-la, mas como vou


sustentar nós duas? Não temos uma casa para morar, Olivia está
trabalhando o triplo na creche e no novo emprego para me ajudar a
pagar minhas compras no cartão de crédito. Infelizmente, precisei
comprar um guarda-roupa novo, já que Louis destruiu tudo que eu
tinha, sapatos, maquiagem e todas roupas para serem usadas no
trabalho.

Acumulei uma dívida de mais de cinco mil reais parcelada em


várias vezes, precisei de uma cama nova e agora o enxoval da bebê
que não pode esperar para ser feito. Preciso de um berço, roupas,
fraldas e eu não tenho dinheiro para pagar isso tudo ou espaço para
acomodar minha pequena e dividir as despesas da casa com a
Olivia. Ganho metade do que recebia na VITTILENO, trabalho mais
e quando falto para consulta meu chefe desconta no salário, mesmo
que eu tenha um atestado médico. E agora com uma barriga de
cinco meses será impossível qualquer outro lugar me contratar por
conta da licença maternidade.

Minha irmã antes de eu me mudar não pagava quase nada de


energia e água, pois mal consumia por ficar pouco em casa, comigo
aqui tudo subiu, até mesmo a comida que eu não consigo parar de
comer tudo que me dá vontade. É impossível para mim a ver
dobrando seus turnos para ter mais dinheiro e eu não contribuir,
escondi dela que estou com pressão alta e risco de pré-eclâmpsia
ou ela surtaria e não me deixaria ajudar em nada.

Estou me sentindo sozinha e perdida sem saber para onde ir


e o que fazer e é tudo culpa daquele maldito que me rejeitou,
duvidou e agora nem para pedir desculpas e implorar pelo meu
perdão. Se antes eu já estava decidida quanto ao que fazer com ele,
agora eu tenho plena certeza de que nunca mais quero ver Louis,
independentemente do quanto eu esteja no fundo do poço, vou dar
um jeito de sair por cima.

Retorno para casa após mais um dia exaustivo, hoje estou me


sentindo para baixo e desanimada, preciso de um longo banho e
colocar meus pés para cima, a sapatilha aperta meus dedinhos
inchados e quase andei descalça até em casa. Abro a porta e me
surpreendo com quem vejo lá dentro.
— Minha menina — meu pai carrega um buquê de flores e
vem até mim —, perdoe seu pai por ter sido um idiota, filha. — Ele
nem me deixa falar e me envolve em seu calor. — Eu tive tanto
medo de você terminar desse jeito que te abandonei e me deixei
cegar pela raiva. Me perdoe, meu amor, por favor.

— Você me magoou muito. — Engulo o choro, tenho feito


tanto isso ultimamente que acho que estou ficando desidratada.

— Eu sei, mas antes tarde do que nunca — ele segura meu


rosto e me olha carinhoso —, mesmo que você não possa me
perdoar, deixa eu te ajudar a passar por essa fase difícil. — Ele se
vira e vejo um berço cheio de fraldas contra a parede em frente à
minha cama na sala da Olivia. — Saia desse emprego e deixa eu
cuidar de você e dessa pequena — acaricia minha barriga —, sua
irmã não me disse o que aconteceu entre você e o pai da criança. —
Olho para ele. — Mas eu sou o avô dela e vou cuidar da minha
garotinha e da sua bebezinha.

— Pai. — É a única coisa que digo antes de chorar no seu


peito.

Meu pai me embala como uma criança, senta-se comigo no


sofá e minha irmã se une ao nosso abraço, choramos juntos,
enquanto ele acaricia minha barriga. Pela primeira vez em meses eu
respiro aliviada, essa é a resposta pela qual eu pedi aos céus para
ter. Com meu pai ao meu lado, posso sair daquele inferno e cuidar
da minha pequena.

— Se você quiser voltar para casa — ele diz —, seu quarto


continua igual e podemos transformar o da Olivia no quarto da bebê.

— Vou adorar pintar tudo de rosa — ela diz, animada, minha


irmã mais do que ninguém amou a minha neném durante esses
meses.

— Suas costas doem? — pai pergunta.

— Muito. — Enxugo minhas lágrimas.

— Vire-se de costas.

Faço o que ele diz e quase choro aliviada, quando ele


pressiona mesmo onde mais machuca, fazendo a dor dar uma
trégua tal qual o aperto em meu peito.

— Minha menina adora torturar minha coluna — reclamo.

— Você fazia o mesmo com a sua mãe — pressiona —, nesse


mesmo lugar.

— É hereditário — Olivia brinca e damos risadas.


Jantamos juntos e combino de no dia seguinte pedir
demissão, papai se responsabilizou por pagar meu cartão de crédito
e comprar as coisas da bebê, ele disse que sem a gente em casa
não tinha com o que gastar o dinheiro e acumulou uma quantia boa
para me ajudar nessa fase.

Deito-me em minha cama sem conseguir dormir com a bebê


chutando minha coluna, viro-me de um lado para o outro em busca
de uma posição confortável, meus pés inchados latejam e minha
cabeça está a dois segundos de explodir.

— Posso te contar algo que eu sei que você não quer saber,
mas acredito que precisa. — Olivia se deita ao meu lado e seus
olhos me dizem que não vou gostar de suas palavras.

— Melhor não.

— Vou falar mesmo assim.

Fico de costas para ela, recusando-me a ouvir suas palavras.

— Louis tem sofrido tanto quanto você.

— Eu não quero saber dele.


— Mas você precisa — ela me vira de volta para ela —, seu
bebê não pode crescer sem um pai e você ainda chora toda noite de
saudade desse homem e ele por você.

— Não tem como você saber disso.

— Tenho sim, o Lorran às vezes dorme com o tio e diz que ele
passa a noite chamando pela “dolce” e “Bianca”. Até aquele bebê de
dois anos e meio sabe que o tio está sofrendo por amor.

— Se ele queria tanto me ver, que tivesse me procurando —


ela segura meu rosto, meu coração bate forte contra meu peito —,
não adianta de nada você me dizer essas coisas quando ele não
está fazendo nenhum esforço para me ver.

— Ele conversou comigo ontem à noite — fecho os olhos —,


e ele nem estava bêbado.

— Eu não quero saber. — Tampo os ouvidos.

— Mas você precisa — puxa meus braços —, ele só não te


procura porque está envergonhado e não tem coragem de te ver
depois das coisas que ele falou, mas se arrepende de tudo e ainda
te ama.

— Mentira — grito, descontrolada.


— Dê ao menos uma chance a ele, Bianca, por mais que o pai
tenha dito que vai assumir suas dívidas e cuidar de você e da bebê,
ele não passou a ganhar rios de dinheiro, você sabe muito bem o
que ele ganha não é suficiente e esse suposto dinheiro que ele diz
que guardou pode ter sido um empréstimo. A família do Louis nada
na grana e você passando necessidades que só vão piorar quando
a bebê nascer.

— Cale a boca! — Tenho ímpeto de me levantar, mas a


tontura me ataca e deito novamente, se eu desmaiar agora e a
Olivia me levar para o hospital e ela ficar sabendo da pressão alta
vai ter um treco e contar ao Louis sobre a bebê.

— Pense sobre isso, se você não contar eu o conto!

— Se ele voltar para mim por causa da bebê, eu nunca serei


capaz de confiar no seu amor novamente. Ele estaria voltando pelo
bebê e não por mim.

— Então, que seja pela bebê, essa situação já passou de


todos os limites.

Ela volta para a cama dela e me deixa sozinha na minha, mais


uma noite de sono em claro pensando no Louis. Quero que ele volte
para mim por me amar e querer o meu perdão e não pela minha
bebê.
Capítulo 24

Três meses antes da nomeação a presidente.

Castanhare é um acionista com 2% das ações da direção da


VITTILENO e responsável pelo setor de distribuição dos tecidos
para a Ásia, todas as provas levavam a ele desde o início, eu fui um
imbecil de não acreditar na Bianca, deixei-me cegar por meus
traumas e perdi a mulher que eu amava, fui cruel, desprezei seus
sentimentos e matei tudo que construímos juntos. Nem eu sou
capaz de me perdoar pelo que fiz, mas preciso tentar.

Deixo a Suíça e volto para o Brasil decidido a ir atrás da


Bianca antes de fazer qualquer coisa, vou me rastejar aos seus pés
todos os dias enquanto eu viver, farei o que for preciso para tê-la
comigo e que ela possa me perdoar pelo que fiz. Desço do avião em
terras brasileiras seguindo para meu carro, quando toco na
maçaneta escuto gritos, ao longe vejo meu segurança mancando na
minha direção e gritando, não entendo o que ele fala.
O sangue escorre em seu braço e ele cai no chão, corro até
ele e só então percebo a ausência de seguranças, nem mesmo o
motorista está por perto. O estrondo atrás de mim me ensurdece,
uma rajada de vento quente chicoteia minhas costas e sou jogado
ao chão, minha cabeça bate em um baque surdo contra o chão,
meus sentidos nublados e dispersos, vejo pessoas correndo em
minha direção, vejo armas apontadas e corpos caindo, desmaio em
meio ao caos.

Ouço vozes ao meu redor, mas não entendo o que elas falam,
meu peito arde como se tivesse sido perfurado por barras de ferro
quente, tento abrir os olhos e não consigo, aos poucos a escuridão
me acalenta novamente. Desperto e sou capaz de abrir os olhos, o
claro do cômodo me cega e fecho mais uma vez as pálpebras, com
cuidado abro devagar a fim de me acostumar com a luz do dia.

— Finalmente — uma voz doce diz em italiano ao meu lado e


por um segundo acho que é a Bianca.

— Louis. — A voz severa de meu pai ressoa o seu italiano


perfeito e o vejo ao meu lado, o rosto preocupado e os olhos
desesperados.

— Nunca mais dê um susto desses na gente. — Faz muito


tempo que não escuto a voz do Levi falar coerentemente uma frase
como agora, ele fica ao lado do meu pai e mais uma vez possui
lágrimas nos olhos. — Eu achei que você fosse morrer — ele me
abraça e gemo, meu peito doendo com o contato —, desculpe,
desculpe. — Afasta-se e limpa o rosto.

— Você quase me matou de susto, Louis. — A doce voz torna


a dizer e vejo a figura da minha irmã, o rosto vermelho e os olhos
inchados, o cabelo loiro como o ouro preso no topo da cabeça.

O bipe dos aparelhos e o quarto branco me faz perceber que


estou no mesmo hospital que eu trouxe a Bianca quando ela ficou
doente.

— Vem cá. — Minha garganta parece que tem areia


arranhando-o. Lira deita a cabeça em meu ombro com cuidado para
não me machucar e chora. — Bianca?

Chamo por ela, não a avisaram que estou no hospital? Ela


viria se soubesse? Por que diabos estou em um hospital?

— Não avisamos a ela, filho — é meu pai que responde —,


pode ser perigoso envolver a moça no que vai acontecer daqui em
diante.

— O que houve comigo? — Lira se solta e Levi ocupa o lugar


que ela estava, meu irmão segura meus ombros e quero protestar
pela dor, mas deixo que ele veja que estou vivo.
— Um atentado, quando você pousou no Brasil, seus
seguranças já estavam sendo atacados no aeroporto, seja lá quem
te queria morto não poupou munição — ele pondera em suas
palavras antes de continuar —, tinha uma bomba no seu carro, ela
explodiu, mas, graças aos céus, o Alfredo conseguiu fazer você se
afastar do veículo a tempo, quando a bomba explodiu você estava
longe, mas foi machucado com o impacto da explosão.

— Meu peito dói muito — gemo e começo a tossir, Levi me


solta e pega um copo com água e me ajuda beber, o que acalma a
garganta machucada.

— Foi uma bala, a equipe de segurança teve problemas para


manter os atacantes longe e um deles acertou seu peito, a bala
perfurou seu pulmão e por um milagre divino você não morreu — ele
desvia o olhar para o céu e me encara com lágrimas grossas em
seu rosto —, você vai passar um mês descansando enquanto eu
resolvo o problema da VITTILENO, é culpa minha nunca ter notado
a existência do caixa dois e agora você está nessa situação.

— Não é culpa sua, eu que fui idiota de não acreditar na


Bianca e não ter me protegido direto, tenho que me desculpar com
ela.

— Bianca não pode saber disso — Levi diz —, você tem que
se afastar dela se não quiser que ela seja machucada no fogo
cruzado e acabe morta.
Fico em choque com suas palavras, não posso me manter
longe, não agora que descobri a verdade por trás do caixa dois, ela
tem de saber que limpei seu nome e que me arrependo por ter
duvidado.

— Não, eu posso proteger ela.

— Você não protegeu a si mesmo — ele grita —, e se ela


estivesse dentro daquele avião com você? Ela poderia ter morrido.
— As feições de Levi ficam vermelhas e seus olhos injetados de
raiva. — Você quer a dor de perder o amor da sua vida? — meu
irmão explode e suas palavras me calam. — Resolva essa maldita
confusão antes de ir atrás dela ou se culpe eternamente, caso ela
morra.

Levi sai do quarto, batendo a porta, e Lira vai atrás dele.

— Seu irmão está certo, se você ama essa mulher deve


manter distância e deixe que Castanhare acredite que você
suspeitou dela e não estão mais envolvidos, caso contrário as
consequências podem ser inimagináveis.

Meu pai chama o médico que vem me examinar e eu não


escuto uma única palavra do que ele fala. Bianca tem de saber que
eu acredito nela, mas qualquer aproximação, até mesmo
seguranças a rondando pode significar que eu estou a protegendo e
torná-la um alvo. Tenho que mantê-la segura até acabar com o
Castanhare, tenho minhas dúvidas se somente prendê-lo será o
suficiente.

Meu telefone toca e fico surpreso quando vejo o nome de


Enzo Costra, o atual capo da famiglia na Itália.

— Acho que chegou a hora de retribuir o favor que você me


deve — digo ao atender a ligação.

— Voltou dos mortos somente para me cobrar dinheiro? —


Ele ri.

— Não quero dinheiro.

— O que você precisa?

— Que seus homens mantenham uma pessoa segura e me


ajudem a me livrar dos ratos, não quero que nenhum rastro seja
deixado.

— Vai querer receber informações da protegida?

— Somente se ela estiver em perigo. — Não posso perder


meu foco e ter notícias da Bianca nesse momento só vai me fazer
querer ir atrás dela.

— Acho que terei de ir até o Brasil — ele desliga a ligação.


Somente prender o Castanhare não será o suficiente, vou
usar a máfia italiana para dar um fim nesse maldito assim que eu
denunciar o caixa dois na minha promoção a presidência, depois
disso vou recuperar a minha mulher.

Três meses depois

Castanhare é um verme que não parou seus ataques, com a


proteção dos homens do Costra consegui manter a Bianca e sua
irmã em segurança. É horrível não ter notícias da Bianca e ficar
ouvindo as ofensas da Olivia por não ter acreditado na Bianca e
fazer o meu amor sofrer me mata a cada dia. Mas não posso trazêla
para mim ainda, hoje é o dia da minha nomeação como presidente
da VITTILENO, meu dolce deveria estar comigo ao meu lado e ser
pedida em casamento quando acabasse isso tudo.

Se eu não tivesse sido tão cego e cruel esse seria nosso


destino, somente felicidade, mas a realidade é outra, uma em que
meus seguranças estão armados até os dentes juntos dos homens
do Costra, que serão os responsáveis por matar o Castanhare após
essa noite e fazer parecer um suicídio. Não vou correr o risco de ele
ser preso e conseguir influência o bastante para mandar fazer
qualquer maldade a minha mulher ou família.
— Hora do discurso, presidente — Marta avisa ao meu pai,
ela também não faz ideia do que acontecerá hoje.

Meu pai sobe no palco, estamos a família toda aqui como


deveria ser, eu, Lira, Levi e Lorran que não para quieto no colo de
sua babá. O menino é completamente apaixonado por ela, sempre
que Olivia fica longe ele dá escândalo e chama pela zia Vivia dele. A
mulher só falta me matar com o olhar, após hoje vou colocá-la em
ação no meu plano e, finalmente, recuperar tudo o que eu perdi.

— Boa noite a todos, é um prazer finalmente anunciar a minha


aposentadoria — volto minha atenção para meu pai, que ostenta um
sorriso no rosto —, passei longos anos à frente da VITTILENO e
junto da minha falecida esposa, Cecília, conseguimos construir uma
grande empresa. Obrigado a todos que fizeram parte disso, meu
legado como presidente acaba aqui e é uma honra poder passar o
cargo para meu filho, Louis Vittileno, que vai iniciar seu mandato
trazendo uma conquista a VITTILENO que nunca fui capaz de fazer.

O salão fica em silêncio e meu pai faz uma pausa dramática,


o velho sempre gostou de capturar a atenção das pessoas.

— Não fiquem preocupados quanto a liderança do meu filho,


desde que chegou ao Brasil ele descobriu um desvio dos fundos da
empresa após meses realizando uma investigação privada, Louis
com sua sagacidade conseguiu encontrar o dinheiro, recuperar o
fundo para o caixa da VITTILENO que foi convertido em um bônus
para os funcionários. Além disso, renovou nosso quadro de
funcionários problemáticos, erradicando tantos os envolvidos com
corrupção quanto com assédio sexual e abuso de poder por
pessoas competentes e comprometidas com a causa do novo
presidente.

O salão se enche de burburinho e a imprensa começa a fazer


perguntas ao meu pai quanto ao esquema de corrupção, com um
aceno de mãos ele pede que todos se calem.

— O culpado que tem roubado durante a minha gestão foi um


dos acionistas que eu mais confiava, Alfredo Freitosa de Castanhare
é o responsável por tudo isso. E assim como ele outros sócios foram
investigados para garantir que isso nunca volte a acontecer. — Em
sua mesa, Castanhare vai embora, mal sabe ele que ninguém
tentará detê-lo e o que o espera será entregue mais tarde. — Louis
Vittileno — é a minha deixa, subo ao palco e meu pai aperta minha
mão —, parabéns por seu trabalho exemplar enquanto
vicepresidente, você é o meu orgulho e espero que em suas mãos
capazes a VITTILENO prospere cada vez mais. — Meu pai sorri
para as câmeras e faço o mesmo. — Com vocês o novo presidente
da VITTILENO.

Eu gostaria de dizer que aproveitei aquela festa com alegria e


orgulho, mas para onde eu olhava buscava por Bianca, meu peito
sangrando de saudade e arrependimento pelo que fiz. Somente
mais algumas horas e tudo chegará ao fim, assim poderei colocar
minha vida no rumo que ela nunca deveria ter saído, pode demorar
o quanto for, mas vou recuperar tudo que a minha insegurança me
fez perder.

Naquela noite, tomando um uísque junto de Enzo ele me faz


assinar a compra de 1% das ações da diretoria, um acordo justo
diante o favor que ele me fez.

— Daqui a pouco a notícia da morte do Castanhare chegará,


meus homens já estão em sua casa — ele me passa o celular que
transmite a invasão —, foi um prazer fazer negócios com você.

— Digo o mesmo.

Observo a imagem do Castanhare sendo obrigado a colocar


uma arma na boca e a puxar o gatilho, depois seus miolos explodem
na parede. Agora sim coloquei um fim a tudo que me mantinha longe
da Bianca.
Capítulo 25

— Olivia, eu disse que não quero ir — reclamo, puxando meu


braço.

— Não adianta reclamar, você já veio até aqui. — Arranca-me


para fora do elevador, pisamos no lobby luxuoso do apartamento
dos seus patrões.

— Você me enganou, só na portaria que percebi onde


estávamos vindo. — Estou com o choro preso na garganta, não me
sinto pronta para ver o Louis novamente.

Ontem ele foi nomeado presidente da VITTILENO e hoje de


manhã a notícia de que o Castanhare se matou após ser descoberto
o caixa dois pelo novo presidente é um assunto comentado nos
jornais brasileiros e internacionais. Louis deve estar ocupado e
aproveitando a promoção, mas se tiver a menor chance de ele estar
em casa quero evitar encontrá-lo a qualquer custo.
Foram três meses longe sem nenhuma notícia dele, usei
todas as minhas energias para cuidar da minha gravidez e hoje é
um dia em que estou me sentindo destruída e sem ânimo. Olivia não
tinha o direito de me fazer passar por isso, eu ainda o amo e esse
amor me mata cada segundo em que estamos separados e quando
lembro de suas duras palavras.

— Louis não vai estar em casa, será um jantar somente entre


mim, você, Lorran e o ranzinza do Levi.

Ela vive reclamando do Levi, mas sempre vejo como fica


ansiosa quando sai para trabalhar e, com certeza, não é por causa
somente do Lorran, a criança tem se apegado cada vez mais a
Olivia e fico com medo do que resultará dessa relação se
continuarem dessa forma, ela não é a mãe dele, mas está
começando a agir como se fosse.

Louis não me procurou um único dia nesses três meses e


minha inocência já foi completamente provada, estou uma pilha de
nervos, meu vestido que deveria disfarçar minha barriga de 21
semanas não está cumprindo bem o seu papel, mas qualquer coisa
posso dizer que estou gorda. O afastamento dele só pode significar
que eu não significava tanto quanto imaginava e que ele não me
amava como dizia amar. Ainda tenho medo de como ele reagirá
quando descobrir sobre a gravidez, no que depender de mim, vou
morrer negando que o filho é dele.
Olivia destranca a porta com sua chave e o cheiro da comida
bate com força me trazendo saudades de quando eu e ele
estávamos no nosso apartamento jantando e nos amando. Meus
olhos lacrimejam e dou meia-volta, não posso fazer isso eu não
consigo, chamo o elevador com o coração esmagado no peito, aliso
meu peito querendo fazer a angústia ir embora.

— Bianca.

A voz, como eu odeio que ele me chama usando o timbre de


quando me amava, com doçura e amor. Enxugo os olhos e
permaneço de costas para ele, não vou deixar que veja meu
sofrimento ou que pense que ainda sinto algo por ele, que não seja
raiva e desgosto.

— Vamos conversar? — Ele toca meu braço e o puxo para


longe com brusquidão, seu perfume amadeirado sendo injetado em
meu sistema puxa lembranças que eu deveria ter guardado e jogado
a chave fora.

— Não — me limito a dizer, aperto novamente o botão


chamando o elevador.

— Eu me arrependo de cada palavra que eu disse naquele


dia. — Minha cabeça pende para a frente quando sinto seu queixo
se apoiando no meu topo. — Cai em uma armadilha e não pensei
duas vezes antes de te magoar, não existe desculpa para o que fiz,
mas farei o que for preciso para conseguir o seu perdão. — Seus
braços deslizam pelos meus e sinto que ele vai me abraçar.

As portas do elevador se abrem e eu corro para dentro,


livrando-me do seu toque, ainda de costas para ele me arrependo
de ter entrado nessa caixa minúscula quando ele me segue.

— Você teve muito tempo para isso — digo, recuso-me a


olhar para ele.

— Eu não podia encontrar com você.

— Besteira! — grito.

— Deixe ao menos eu te explicar o que aconteceu nesse


tempo e o motivo de eu não ter ido atrás de você. — Seus braços
voltam a me tocar e, dessa vez, Louis me faz o encarar de frente,
seus olhos não estão tempestuosos como da última vez que nos
vimos, estão calmos e serenos.

— Se você pensa que qualquer merda que sair da sua boca


vai me fazer esquecer suas palavras naquela noite está
completamente enganado. — Puxo meu braço e viro para o painel
do elevador, ainda estamos no mesmo andar e aperto o botão de
abrir as portas, preciso fugir daqui.
— Não sou capaz de esquecer o que te falei, não espero que
você faça isso.

Ele me segue pelo corredor, não sei para onde estou indo,
mas agradeço quando vejo a porta das escadas, entro e começo a
descer devagar para não me machucar, posso sentir minha pressão
subindo e a tontura querendo atacar.

Se eu passar mal por causa do Louis juro que o mato sem


pensar duas vezes, seus passos me seguem e ele fica calado me
acompanhando, no terceiro lance estou ofegante sem forçar para
continuar, me obrigo a parar e sentar em um degrau, não consigo
dar mais um passo.

— Castanhare tentou me matar — suas palavras me pegam


se surpresa e o encaro —, ganhei essa cicatriz no primeiro atentado.
— Ele puxa a camisa para cima e me mostra uma marca em sua
costela. — Meu pulmão foi atingido e tive de passar um mês
internado me recuperando, isso aconteceu uma semana depois da
nossa briga.

— Por que ele fez isso? — Não consigo evitar a preocupação


e olho bem para seu rosto e corpo procurando outras marcas, mas
não encontro nada, mas noto que Louis perdeu peso e os olhos
estão com bolsas profundas, típico de quem não tem dormido.
— Depois que brigamos e eu fui feito de idiota por acreditar
naquele dossiê, passei os dias seguintes me afogando em bebida e
na tristeza. — Seus olhos nublam e ele olha para o chão, desvio o
olhar para a parede lembrando do quanto foi doloroso para mim
aqueles tempos. — Isso não é uma desculpa, mas você sabe o
quanto sou desconfiado com mulheres, nunca me relacionei com
alguém como foi com você.

— Não quero ouvir — digo, lutando para que ele não perceba
minha voz embargada.

— Mas eu preciso falar.

— Foda-se.

— Eu só amei você em toda a minha vida. — Levanto-me e


Louis faz o mesmo, passando os braços ao redor do meu ombro e
me puxando contra ele. — Você foi a única e eu me arrependo por
não ter confiado em você e ter dado o benefício da dúvida. Quando
vi aquilo tudo provando uma armação para me seduzir, a pessoa
teria de saber toda a nossa história pra fazer aquilo. — Aperto meus
pulsos contra seu peito tentando me livrar dele. — Ela teria de saber
que ficamos juntos naquela festa, que depois te desprezei por achar
que mentiu para mim, teria de saber que você me fez ver a verdade,
teria de saber do nosso apartamento.
Suas palavras me pegam de surpresa, eu nunca parei para
pensar sobre isso, mas é verdade. Nas falsas conversas com a
Marta ela me dava instruções de como fazer ele acreditar em mim, o
que eu deveria falar e fazer para que Louis achasse que eu era
tímida e pudesse seduzi-lo para encaminhá-lo a uma investigação
falsa, eram conversas que somente nós dois deveríamos saber.
Paro de lutar contra ele e me concentro em manter minha barriga
longe do seu corpo.

— Por favor, tente ao menos compreender como foi difícil ver


nossa vida privada exposta naqueles documentos apontando que
você me traiu e manipulou. Eu entrei em desespero e disse coisas
que não podia, queria te magoar como me sentia magoado. — Ele
fica de joelhos e escapo de sua cabeça quando ela tenta encostar
em meu ventre. Louis cola a testa em meus pés e fico sem saber o
que fazer. — Por favor, me perdoe por não ter acreditado em você.

Aperto os olhos tentando controlar as lágrimas, fomos vítimas


na trama de outra pessoa, mas isso ainda não muda o que ele
escolheu fazer.

— Eu posso te perdoar por você ter sido enganado, mas


nunca vou conseguir esquecer suas palavras naquele dia, não me
peça para perdoar isso. Você escolheu não confiar em mim, por
mais que tudo me apontasse como criminosa, se você realmente me
amasse deveria ter me dado uma chance, em nome desse amor.
— Eu sei e vou me culpar para sempre.

— Por favor, se levante.

Louis faz o que peço e torno a me sentar, não tenho mais


forças para continuar em pé.

— Continue — digo.

— Meu pai me prendeu no meu escritório e comecei a


analisar todo o caso, passei uma semana preso até descobrir que o
dinheiro estava na Suíça, fui até lá e descobri no banco o nome do
Castanhare como dono da conta. Após voltar ao Brasil sofri um
atentado e passei um mês hospitalizado, precisei pedir ajuda ao
Enzo Costra, o mafioso que falei para você, ele fez sua segurança e
da Olivia, houve uma tentativa de invasão a casa do seu pai, mas
eles conseguiram pegar os criminosos antes disso acontecer.

Ele cuidou de mim durante todo esse tempo, minha garganta


trava com um bolo de sentimentos querendo explodir. Eu achei que
ele não vinha me procurar por não me amar, mas em vez disso ele
não veio para me proteger e, ainda assim, se aliou a um mafioso
para garantir a segurança da minha família. E eu sei o quanto ele
fez para evitar contato com a máfia. Meu Deus, como é difícil evitar
a louca vontade que tenho de abraçá-lo e fazer as pazes, de
esquecer o passado e me entregar ao amor. Mas eu não posso,
Louis não hesitou em me magoar e não existem garantias de que
ele não fará isso novamente, tenho que proteger a mim e a minha
bebê.

— Você sabe tudo que aconteceu comigo? — pergunto, não é


possível ele saber da gravidez e não ter feito nada.

— Não, eu precisava manter o foco, pedi para só te manterem


segura e não me atualizar sobre nada da sua vida.

Fico aliviada quanto a isso, minha bebê ainda é somente


minha e continuarei mantendo o Louis distante, afogarei meus
sentimentos até que eles não passem de lembranças dolorosas do
meu passado. Não aguento mais ser magoada por quem eu amo e
confio, nunca mais isso acontecerá, nem que para isso eu me torne
alguém fria e sem sentimentos.

— Descobri um gravador na minha sala na empresa, foi assim


que ficaram sabendo das nossas conversas e puderam fazer aquilo
tudo. Mantive o Castanhare por perto enquanto renovava os
funcionários para pessoas de minha confiança, sofri mais dois
atentados que não me causaram ferimentos graves. Ontem após o
anúncio do caixa dois, Castanhare se matou e eu soube que era
seguro poder te encontrar novamente, por isso pedi a Olivia que
trouxesse você aqui hoje.

É muita informação, minha cabeça fica zonza sem conseguir


processar que eu estive em perigo esse tempo todo e não fazia
ideia. Que ele descobriu a verdade e ficou longe para me manter em
segurança e que agora quer voltar para a minha vida.

— Isso tudo é loucura, não vou te aceitar de volta,


independentemente do que aconteceu, você me magoou muito,
agradeço por ter mantido minha família em segurança, mas não
temos mais nada a tratar.

Levanto-me e vejo tudo preto antes de desmaiar.


Capítulo 26

Ando de um lado para o outro enquanto Bianca permanece


deitada na cama do hospital, estou furioso por ela ter escondido a
gravidez e mais ainda por saber que isso é culpa minha. Fui eu
quem a afastou e a manteve longe, porém, mesmo com todos os
problemas eu poderia ter feito mais, garantido que ela e nosso bebê
não passassem dificuldades e um maldito caso de pré-eclâmpsia
fosse desenvolvido. A partir de hoje, ela não vai levantar um
músculo nem para beber água, maldita mulher teimosa que não me
procurou!

— Se você sequer ousar gritar com ela — Olivia me encara


impaciente, é a terceira vez que ela briga comigo —, quem vai te
manter longe serei eu, Bianca não pode se irritar mais.

— Eu sei — rosno.
Bianca se mexe na cama e aos poucos abre os olhos, seguro
sua mão e encosto minha testa na dela, louco de saudade e aliviado
por ela ter despertado.

— Oi — digo, carinhoso, ela franze a testa e tenta se afastar,


mas não deixo. — Já ficamos longe tempo demais, vou encurtar
nossa distância até você se acostumar comigo de novo.

— Saia — ela rosna e tenta me empurrar, mas não deixo.

— Nunca mais.

Envolvo seu corpo em meus braços e respiro aliviado por tê-la


comigo depois de tanto tempo. Não consigo evitar que meus olhos
lacrimejem enquanto inspiro seu perfume e tenho a maciez de seus
cabelos contra meu rosto, o corpo escondido dentro do meu abraço.
Sua respiração pesada em meu pescoço e as mãos contra meu
peito apertadas em punhos, sinto quando minha camisa molha com
as lágrimas dela.

— Eu nunca mais vou te largar, meu dolce. — Beijo seu


pescoço, incontáveis vezes, enquanto ela soluça e tenta me
empurrar, no entanto, não vou ceder. — Não adianta me empurrar,
ainda não consegui matar a saudade que senti nesses meses.
— Você continua me machucando, por favor, pare — ela
soluça, suas palavras batem fundo dentro de mim, aperto meus
braços ao seu redor.

— Me matou estar longe e fingir que eu não me importava


quando tudo que eu queria era correr de volta para você e implorar
pelo seu perdão, leve o tempo que você precisar para que minha
presença não te cause mais dor. — Seguro seu rosto e beijo seus
cabelos, inspirando seu cheiro doce que sempre me acalma. — Vou
cuidar de você e do nosso bebê.

— Não é seu — ela diz e me afasto, sem compreender o


significado de suas palavras.

— O que disse? — Me sento na cama, por um segundo meu


sangue gela.

— O bebê não é seu, não tem motivos para você continuar


aqui, vá embora. — Desvia o olhar, ela pode estar vermelha de
raiva, mas a emoção na sua voz não me engana.

— Mentira — acuso, aperto os punhos e olho para a Olívia,


que desvia o olhar. Ela sabe a verdade e não quer me dizer.

— Naquela noite eu fiquei com raiva de você, fui para um bar


e transei com um estranho, o bebê não é seu. — Aperta as unhas,
sua voz trêmula e cheia de medo.
— Você mente muito mal, Bianca.

— E você não tem o que fazer aqui — acusa e, finalmente,


me olha, a decepção por não ter acreditado nela estampada em seu
rosto.

— Desde que nos conhecemos eu fui um babaca com você,


não acreditei quando me falou que era virgem e tirei conclusões
precipitadas. — Seguro suas mãos geladas e trêmulas, o bolo na
minha garganta me impede de falar, vibro as cordas vocálicas,
tentando recuperar a voz. — E mais uma vez parti seu coração
quando não te dei o benefício da dúvida e não busquei provar que
aquele dossiê era mentira, ao invés de explodir com você e dizer
aquelas coisas horríveis.

— Foi por isso que você disse: “Deve ter sido por isso que
Fernando fez aquilo com você, ele já sabia desde o início a puta que
você era.” — O gelo em seus olhos ao recitar minhas palavras me
quebra e não consigo mais segurar o choro. — Você sempre achou
que eu era uma puta, pois fui lá e me tornei uma, transei com um
qualquer e engravidei.

— Você quer me magoar como eu te magoei. — Aperto as


mãos dela, o choro nubla minha visão e a dor por ser o responsável
de toda essa amargura e ressentimento se torna insuportável. —
Mas dessa vez nada mudará o que eu sei e acredito, esse filho é
meu. — A encaro de perto, prendendo seu olhar com o meu. —
Dessa vez, eu vou confiar em você, na pessoa que eu amo e
mesmo que você negue e invente a história que quiser. Eu confio
em você — dou ênfase nas últimas palavras para que ela sinta o
impacto do que quero dizer.

Bianca não me responde e explode em um choro intenso e


doloroso, seguro sua cabeça contra meu ombro e deixo que ela
chore o quanto quiser, enquanto repito em seu ouvido que tenho
certeza de que o bebê é o meu filho. Ainda não toquei sua barriga,
embora minhas mãos cocem para sentir meu bebê pela primeira
vez, eu me contenho e, por enquanto, aproveito a trégua que ela me
deu ao deixar que eu a conforte. Com essa ação, desfruto da
sensação que é tê-la em meus braços, mesmo que nesse momento
ela esteja me odiando.

— Nós dois caímos em uma armadilha. — Tento manter


minha voz firme, mas é difícil quando tudo dentro de mim está se
estilhaçando enquanto a dor dela me preenche. — Mas não
podemos deixar que essas pessoas vençam, é a nossa vida,
Bianca, nosso bebê, se ficarmos presos ao passado nunca
poderemos seguir em frente e ser felizes.

— Você vai continuar me magoando na primeira oportunidade


em que desconfiar de mim. — Ela se afasta e meu rosto arde com a
força do seu tapa. — Como tem coragem de dizer que eu cai na
armadilha? — Descontrola-se e seus tapas vêm com mais força
contra meu corpo, deixo que ela desconte a sua fúria. — Eu sempre
confiei em você.

— Bianca para. — Olivia segura a irmã que se descontrolada


nos braços dela. — Saia daqui, Louis.

Ela grita comigo e acordo do torpor, Bianca não pode se


estressar e no momento estou causando o oposto nela. O bip dos
aparelhos que medem seus sinais vitais se altera, os números
piscando em vermelho enquanto Bianca começa a passar mal
devido às fortes emoções.

— Meu dolce. — Tento tocar seu rosto, mas ela rosna e cai
contra o peito da Olivia, chorando em desespero.

— Vá chamar o médico agora! — Olivia diz e saio correndo,


procurando a enfermeira.

— Ajuda! — grito e uma enfermeira vem até mim —, Bianca


está descontrolada, ela precisa se acalmar.

— Eu disse para não estressar ela! — me repreende e corre


para o posto da enfermaria onde pega um remédio e vai atrás da
Bianca.

No quarto, ela injeta a medicação no acesso intravenoso no


braço da Bianca que começa a se acalmar, sua pressão é aferida e
um ultrassom é feito para conferir se estar tudo bem com o bebê. Os
sons da batida do coração ressoam pela sala, altos e fortes em um
ritmo constante. Ouvir meu pequeno me emociona e acalma o
turbilhão de sentimentos dentro de mim, fecho os olhos e imagino
meu piccolo nos meus braços, a imagem de uma garotinha de olhos
azuis me vem à mente e fico em êxtase com essa possibilidade.

— Minha garotinha — digo, abrindo os olhos e vejo a imagem


dela na tela, em 3D.

O formato do nariz, rosto, os olhinhos fechados e ela toda


encolhidinha na proteção do ventre da mãe, os dedinhos minúsculos
e fechadinhos, ela parece que sabe que estou aqui e começa a se
mexer na barriga da mãe, olho para a pele esticada de Bianca e vejo
quando minha piccola chuta. A felicidade me domina e não resisto a
aproximar o rosto dela e falar com minha menina.

— Oi, princesinha do papai, espero que você esteja bem aí


dentro — é difícil falar com a voz carregada de emoções —, prometo
que essa foi a última vez que a mamãe passou raiva, vou cuidar de
vocês duas a partir de hoje, viu. — Com cuidado toco a barriga de
Bianca, o gel melando em meus dedos, em resposta minha bebê
chuta no local que a seguro. — Isso mesmo princesa, é o papai.

— Como você sabe que é uma menina? — Bianca diz e então


percebo que ela está acordada.
Encaro a enfermeira, achei que ela tinha dado um calmante a
Bianca.

— Bianca não pode tomar calmantes por causa da bebê,


injetei somente uma medicação para controlar a pressão e que a
tranquilizasse um pouco — a enfermeira explica e depois limpa a
barriga da Bianca. — Se você a estressar novamente proibirei sua
entrada no hospital, o quadro dela não é para brincadeira e nos
próximos meses terá que fazer repouso absoluto.

— Certo.

Ela se vai e encaro Bianca, que olha para o teto, aliso


novamente sua barriga e ela fecha os olhos, minha neném gosta do
contato e continua chutando a palma da minha mão. Sorrio para ela,
sei que Bianca ainda se ressente comigo e ela tem motivos para
isso, mas vou contornar essa situação e recuperar tudo o que eu
perdi, custe o que custar.

— Eu senti que era uma menina no momento em que soube


da gravidez — respondo sua pergunta —, você pode se ressentir
comigo e levar o tempo que quiser para que minha presença não
seja mais um incômodo, mas vou cuidar da minha filha.

Bianca abre a boca para me responder, mas se cala quando


Olivia a encara emburrada e depois a mim.
— Agora os dois vão se calar e me ouvir — Olivia começa —,
primeiro, vocês levem o tempo que quiserem para discutir a relação,
mas com calma e sem estresse. Louis, você machucou minha irmã
e não pode querer resolver tudo de uma hora para a outra. — Quero
rebatê-la, mas seu dedo levantado me para. — Ainda estou falando,
e Bianca você não é burra e já entendeu que a armadilha feita para
vocês foi bem pensada e até o mais santo dos homens teria
dificuldade em não explodir e falar merda, Louis a próxima vez que
falar asneiras para a Bianca como a do Fernando, sou eu quem vai
quebrar a sua cara.

Ela me soca no ombro e continuo calado, Olivia começa a


subir o tom de voz e até Bianca parece assustada com a irmã.

— Não vou dizer quem é o pai da bebê, pois isso cabe a


Bianca.

— É a minha filha e não tem discussão. — Ela bate no meu


braço.

— Calado, mas se você quer assumir a responsabilidade


comece me entregando seu cartão sem limites que temos de
comprar o enxoval da bebê e roupas novas para a Bianca, já que as
dela estão perdidas pelo barrigão que não para de crescer.

— Olivia! — Bianca protesta.


— Quieta você também, Louis vai assumir a responsabilidade
como ele deseja. — Torna a me olhar e aceno que sim, estou
gostando do rumo dessa conversa. — Segundo, compre um novo
apartamento para a gente morar, de preferência um andar abaixo do
seu para que eu possa trabalhar e ficar de olho na Bianca, uma
enfermeira também.

— Nem pensar — Bianca protesta, mas Olivia a ignora.

— Quero um quarto para a bebê, um meu, da Bianca e para


nosso pai.

— Vocês podiam morar comigo — ofereço.

— Não, só quando a Bianca te aceitar de volta e depois o


apartamento fica para mim.

— Isso é loucura — Bianca contesta.

— Estamos combinados? — Olivia me encara. — Essa


picuinha, vocês podem resolver como quiserem, mas quando se
tratar da minha sobrinha, será do meu jeito.

— Por mim está perfeito — pego minha carteira e entrego a


ela meu cartão preto —, gaste toda a minha fortuna com minha filha
e mulher. — Encaro a Bianca que revira os olhos. — Se quiser
comprar as coisas do casamento junto, pode ficar à vontade. —
Dessa vez recebo uma joelhada na coluna vindo da Bianca e me
levanto, gemendo e rindo.

— Idiota presunçoso — ela me xinga e ri, tenho vontade de


beijar o bico em seus lábios, mas me contenho e roubo um beijo em
sua testa.

— Vou usar toda a minha presunção para ter você de volta,


agora descanse.

Ela não me responde, mas não precisa, pode levar quanto


tempo for necessário até a mágoa em seu coração passar e o amor
poder voltar preenchê-lo, Bianca será minha e nunca mais a deixarei
escapar.
Capítulo 27

Louis entra no meu quarto com um buquê de flores enormes,


fecho a cara, se ele pensa que vai me conquistar com gestos
românticos está completamente engano, deveria ter pensado nisso
antes de fazer o que fez comigo.

— Pode jogar no lixo — digo quando ele coloca as flores num


jarro perto da janela.

— Não são para você. — Ele faz careta e me mostra a língua.

— Um homem de quase quarenta anos com essa maturidade


— bufo e reviro os olhos —, pra quem seria essas flores além de
mim?

— Para a minha piccola — ele se aproxima, sorrindo, e abaixa


o rosto na altura da minha barriga —, a mamãe ficou com ciúme
porque não são para ela.

Bato na cabeça dele, que só faz rir.


— Ela não é sua filha.

— É sim. — Odeio como ele sorri confiante.

— Continue achando. — Reviro os olhos e ligo a televisão.

— Ela acha que vai conseguir me expulsar — ele continua


falando com minha bebê e eu tento não prestar atenção no carinho
em sua voz ou em como isso amolece meu coração. — Mas sua
mãe sabe o quanto eu posso ser obstinado quando quero uma
coisa.

Louis puxa uma cadeira para perto e fica olhando minha


barriga, minha bebê reage à presença do pai e começa a se agitar.

— Calma, filhinha, esse chato já, já vai embora, ele tem que
gerir o império dele — converso com ela, alisando onde a bebê
chuta.

— Não se preocupe, anjinha do papai — o atrevido coloca as


mãos na minha barriga, cobrindo as minhas com as dele —, para
ficar com você eu sou capaz de contratar até um CEO para gerir
minhas funções.

— Você não seria capaz, fez tudo aquilo para ficar com a
empresa.
— Pela minha família eu faço tudo, Bianca — ele se levanta e
aproxima o rosto de mim —, é só você me pedir e eu faço.

Seus olhos azuis me deixam fraca e agradeço por estar numa


cama de hospital, mas odeio como os aparelhos medindo meus
batimentos cardíacos aceleram com a aproximação do Louis. Sua
boca rosada perto demais do meu rosto, prendo a respiração e viro
de lado, não estou pronta para isso. Contudo, ele não para e beija
minha bochecha, testa e nariz, quero chorar de saudades do seu
carinho, de ter seu toque no meu corpo, a carência triplicando por
tê-lo comigo e, ao mesmo tempo, ele não ser mais meu.

— Quando você me quiser, eu te ajudo com esse frenesi. — A


voz rouca no meu ouvido, eu nem tinha me dado conta de que
estava apertando as pernas e sua mão desliza para a minha virilha,
os dedos perigosamente perto do meu centro latejante.

— Boa tarde. — O médico entra no quarto e fico vermelha de


vergonha por ser flagrada nessa situação com o Louis —, senhor
Vittileno a Bianca está proibida de fazer sexo, espero que saiba
disso.

— Não sabia — ele responde, fecho os olhos com vontade de


me esconder dentro de um pote.

— Mantenha o controle, o caso dela é delicado e não pode


fazer esforço físico, sexo, se estressar ou ter as emoções abaladas.
— Você pode tirar ele daqui — sugiro ao médico.

— Já tentei, mas ele fez uma doação generosa para a área


das crianças e não posso maltratar um doador como ele.

Louis pisca para o médico e bufo, não creio que ele foi
comprado facilmente.

— Vou manter tudo em ordem, doutor — Louis diz e após o


médico conferir meus sinais vitais, ele vai embora.

— Você é um safado descarado.

— Faço tudo para estar com as minhas meninas. — Ele pisca


e volta a se sentar com a cabeça perto da minha barriga. — Vamos
conversar, princesa? Quer ouvir historinhas? Essa é sobre um
garotinho italiano.

E ele começa a contar histórias de crianças para a minha


bebê, enquanto tento fingir que isso não me toca, mas assim como
minha menina se remexe na minha barriga gostando da atenção que
o pai dá a ela. Meu coração magoado começa a ter suas feridas
cicatrizadas aos poucos.

Louis não me deixa um segundo nas próximas semanas em


que fico internada, ele dorme aqui, trabalha quando precisa e fica
conversando com nossa menina sempre que pode, seja falando do
seu dia a dia ou trazendo histórias infantis e músicas que ele gosta
de cantarolar.

É difícil me manter imparcial, mas tento com afinco não


responder às suas perguntas e fingir que, na verdade, ele fala
comigo e não com a bebê. Porque aos poucos estou percebendo
que nosso dia a dia é esse em que estamos vivendo, em que ele se
dedica a mim e a nossa menina, que suas palavras são essas que
ele fala com calma e não quando está explodindo. Que o passado é
uma lembrança amarga e a cada dia se torna mais distante.

Quando completo 30 semanas de gestação, já estou


enlouquecendo por ter que ficar no hospital até o nascimento da
bebê, mas escuto com calma cada recomendação do médico e me
mantenho entretida assistindo séries nos streamings, nem me
lembro quando foi a última vez que eu pude relaxar assistindo
alguma coisa.

— Bom dia, meu dolce — Louis diz ao entrar no quarto


carregando uma caixa de bombons com recheio, como ele adivinhou
que eu estava com desejo?

— Dolcinho, zia Bibi? — Lorran entra correndo no quarto, ele


tem aprendido algumas palavras em português e eu me derreto de
amores por esse menino.
— Eu sabia que deveria ter dedo do fã número um de doces
nesse presente. — Sorrio para ele, que pula animado tentando me
ver na cama.

— Vem cá — Louis o pega no colo e o coloca na cama —, sua


priminha tá aqui dentro. — Ele mostra ao Lorran minha barriga e o
menino abre a boca surpreso.

— Tomo cabe aí? — Ele aproxima a cabeça da minha


protuberância e deita devagarinho. — Tá mexendo! — grita,
animado.

— Não pula muito, Lorran — Louis pede e ele dá risada,


acalmando-se. — Daqui mais um tempo ela vai nascer e você vai
conhecê-la, pronto pra ver sua priminha?

— Si! — bate palminhas —, dolcinho, zio.

— Vamos comer os docinhos — digo a ele e abrimos a caixa,


provo o doce de morango com chocolate que derrete na minha
boca, é o mais gostoso que já comi na minha vida!

Eu sempre gostei de ver o Louis e Lorran, mas agora fico


emocionada imaginando como ele será com a nossa menina. Ainda
não tive coragem de dizer que ela é filha dele, mas o homem fala
isso com tanta certeza de que tenho minhas dúvidas de que seria
necessário afirmar, ele já sabe. E sua confiança fecha mais um
pouco da ferida que tem cicatrizado todos os dias quando ele entra
sorrindo, trazendo flores, doces e comidas que peço quando sinto
desejo, tem cicatrizado sempre que ele fala com nossa menina em
minha barriga e, mais ainda, quando ele segura minhas mãos e
beija meu rosto.

Estou começando a aceitar melhor que o Louis fará parte da


minha vida mesmo que não fiquemos mais juntos. Minha garotinha
merece o pai incrível que aguarda por seu nascimento, ela precisa
dele assim como eu tenho passado a ansiar mais ainda por sua
presença. E agora não consigo mais me manter fiel à minha decisão
de manter Louis longe para sempre, o gelo começou a derreter sem
que eu nem percebesse.

Com 35 semanas de gravidez, estou inchada e muito


malhumorada, quero minha casa, minha cama, minha vida, não
aguento mais ficar nesse quarto. Com o passar dos dias tenho
ansiado cada vez mais para que o Louis chegue e me faça
companhia, não sei como ele tem dado conta da empresa estando
tão longe, mas sei que eu não consigo mais aguentar a falta que ele
me faz e talvez sejam os hormônios falando mais alto ou o tédio,
mas eu quero meu homem de volta.

— Tenho uma surpresa para você. — Louis entra no quarto


com uma cadeira de rodas e fico animada pensando o que pode ser.

— O que você está tramando? — Olho desconfiada.


— Consegui que seu médico te liberasse para um passeio
tranquilo, o que acha de irmos ver como está ficando o quarto da
neném?

— Sim! Por favor. — Fico animada em poder sair daqui.

— Vou te pegar no colo para colocar na cadeira — avisa antes


de passar os braços por debaixo dos meus joelhos e apoiar minhas
costas com o outro.

É um veneno sentir seu cheiro tão perto e não poder esfregar


o nariz em seu pescoço, sentindo mais de seu aroma, seus braços
continuam fortes como eu me lembrava, sua respiração no topo da
minha cabeça e não resisto a olhar para cima e ver a paixão em seu
olhar, queimando viva em seu desejo por mim. Louis aproxima a
boca devagarinho da minha e fico quietinha esperando pelo seu
beijo.

— Vou te colocar na cadeira — ele diz, mas continua próximo


de mim, aceno que sim e com cuidado ele me põe sentada. — Se
sentir qualquer coisa me avisa — pede tão perto do meu rosto que
quase sinto o sabor de seus lábios nos meus.

Louis beija meu nariz, demoradamente, e me entrego ao


carinho, vai ser tão ruim se eu ceder a ele? Não tem como ser
errado esse turbilhão de emoções que ele me causa. Ainda me
lembro de como é ser feliz quando estou sendo amada por Louis.
Será que realmente podemos voltar a ser o que éramos?
Capítulo 28

Louis me leva até o prédio em que ele mora é estranho


estarmos aqui, mas fico quietinha enquanto minha pequena se
revira dentro do meu ventre, escoro contra a cadeira e faço careta
quando ela começa a chutar minha bexiga. Preciso ir ao banheiro
com urgência ou farei xixi nas calças.

— Louis, preciso ir ao banheiro, rápido — peço, apertando as


pernas tentando segurar o xixi.

— Ela tá chutando muito? — ele pergunta quanto as portas


abrem e corre no corredor empurrando a cadeira.

No último mês, a bonitinha aprendeu um novo lugar para


chutar e tem me torturado com isso, já perdi a conta de quantas
vezes urinei na roupa por causa disso. Eu achava que o Louis
estava me trazendo para o apartamento dele para termos um dia
com sua família, mas sou surpreendida com um apartamento vazio
quando entramos. Ele me pega no colo e me leva ao banheiro que
só tem a louça e o boxe, sem nenhum item de limpeza pessoal,
como se ninguém morasse aqui.

Um novo chute e eu me lembro de que estou apertada, Louis


me coloca de pé e puxo o vestido para cima ainda com ele
segurando meus braços e desço a calcinha, sento-me e faço xixi
como se minha vida dependesse disso. Após me aliviar, eu percebo
que fiz isso tudo na frente dele e minhas bochechas pegam fogo de
vergonha por não tê-lo tirado daqui antes. Sua presença se tornou
constante e sem me dar conta, voltei a me acostumar com ele.

— Eu já vi tudo que tem aí, não tem motivo para vergonha —


ele fala com riso na voz e belisco sua barriga. Quando voltamos a
ter tanta intimidade? Em algum momento nas últimas semanas, de
forma tão simples que nem percebi. Mas agora sou capaz de rir com
ele novamente.

— Você não faz ideia de como tá as coisas aqui embaixo —


brinco.

— Se quiser, posso ver tudo agora.

Belisco novamente sua barriga e damos risada juntos. Louis


me ajuda a levantar e coloco minha roupa no lugar, meus pés estão
inchados e doloridos, não uso mais chinelos nos meus dedinhos
gordos. Louis me pega no colo novamente e, dessa vez, não me
leva para a cadeira, mas para uma porta com uma flor na frente.
— Eu queria que você visse o quarto da nossa princesa. —
Abro a porta e fico emocionada com o que vejo.

As paredes estão cheias de flores e animais fofinhos como


elefantes, ursos, cachorrinhos brincando e muitas borboletas.
Entramos no espaço e vejo tudo com cuidado, o guarda-roupa com
onças e filhotes brincando, o berço é um elefante com sua tromba
saindo várias borboletas penduradas por uma corda que gira,
tocando uma música de ninar. O trocador de fraldas com elefantes
de madeira pregados na estrutura, a poltrona de amamentação que
balança de frente para a janela que é coberta por uma cortina
rosabebê e mais borboletas, o teto do quarto tem desenho de galhos
de árvores com pássaros pousados nas pontas.

— Você que fez? — pergunto, com a voz embargada.

— Quando não estava no hospital ou trabalhando eu vinha


supervisionar a obra, infelizmente desenho não é um dos meus
fortes. Levi me ajudou no projeto, ele que desenhou tudo conforme
eu pedia — ele se aproxima da parede e vejo uma assinatura no
tronco da árvore —, ele colocou sua marca aqui.

— Louis, ficou perfeito. — Limpo o canto dos olhos onde


lágrimas teimosas insistem em cair.

— Do jeito que a nossa princesinha merece.

— Achei que o Levi tivesse parado de desenhar.


— É complicada a história por trás disso — ri sozinho —, ele
fez uma aposta com a Olivia e ela vinha todos os dias perturbá-lo
junto do Lorran enquanto pintava, no fundo, acho que ele só queria
uma desculpa para ter os dois por perto.

— Quero que você me conte tudo depois. — Sorrio,


respirando tranquila como há muito tempo não era capaz de fazer.

— Tem mais uma coisinha — ele me coloca na poltrona de


amamentação e fica de joelhos, tampo a boca, isso não pode ser o
que estou pensando —, Olivia me disse para comprar um
apartamento para a sua família se mudar. — A decepção me
domina, não era isso que eu queria ouvir.

Esperava que viesse um pedido de casamento, que o Louis


abrisse seu coração e falasse que me ama, que precisa de mim na
sua vida como eu tenho o desejado na minha vida. Não que só
comprou o apartamento e fez isso tudo por causa do que a Olivia
disse. Fecho a cara e desvio o olhar, sua risada me deixa mais
irritada e belisco ele, até que gema e se encolha, mas o riso nunca
deixando suas feições.

— Calma, irritadinha, me deixe falar primeiro.

— Não quero ouvir. — Sei que estou sendo mimada, mas


preciso de uns minutinhos para lamber minhas feridas.
— Vai ouvir mesmo assim — segura minhas mãos e me
prende com seu olhar —, a Olivia queria um apartamento para
vocês, mas eu não pude fazer isso. — Seus olhos brilham e me
desarmo com a emoção que sua alma transpassa. — Eu quero um
lar para a gente, eu, você e nossa menina. Esse apartamento foi
colocado no seu nome e ainda não tem mobília, além do quarto da
neném, pois quero que você escolha tudo e monte seu lar como
você quiser.

Fico quietinha absorvendo suas informações e estou quase


implorando para que ele diga que esse será o nosso lar, que ele vai
ficar aqui também comigo, que continuará me dando bom-dia e
boanoite. Eu quero ver todos os momentos do Louis com nossa filha
e acompanhar o pai maravilhoso que ele será, as lágrimas saltam
para fora e não impeço que caiam.

— Se for de sua vontade eu quero morar aqui também — ele


também chora emocionado —, mas não somente como o pai da
nossa bebê, e sim como seu marido. — Louis coloca a mão no bolso
e puxa uma caixinha em veludo. — Vamos começar nossa história
de amor de onde ela parou, eu ia te pedir em casamento na festa da
minha promoção a presidente e isso já foi adiado demais. Você é a
única mulher que eu amo e sempre vou amar, te quero comigo hoje
e sempre, Bianca Baptista, você aceita se casar comigo?
— Sim. — Explodo em lágrimas e emoção, finalmente
libertando meu coração da mágoa de meses atrás e aceitando que o
amor volte a fazer parte da minha vida.

Louis desliza o anel em meu dedo e se aproxima


devagarinho, primeiro ele beija minha barriga e depois a aliança. O
anel de diamantes brilha contra a luz do sol e ele me entrega uma
aliança lisa prateada que coloco em seu dedo, selando nosso
compromisso.

— Minha filha — beija minha barriga —, e minha mulher.

Seu beijo tem gosto de sal misturado com as lágrimas que


ambos derramamos. Louis segura meu rosto enquanto sua língua
explora meu interior. É um beijo carinhoso e cheio de saudades em
que nossos corações sofridos tiveram, finalmente, suas feridas
cicatrizadas. Puxo o Louis para mim e um formigamento se inicia no
meio de minhas pernas, ansiando para senti-lo dentro de mim.

— Quietinha — ele fala e separa minhas pernas, sua mão


segurando minha intimidade pulsante —, você ainda está proibida
de transar.

— A gente vai devagarinho. — Esfrego-me na sua mão, quase


chorando para senti-lo dentro de mim.
— Eu nunca mais terei arrependimentos, Bianca. — Encaro-o
e seu olhar decidido é um balde de água fria no meu fogo, ao passo
em que fico feliz com a compreensão de suas palavras.

— Certo, vamos olhar o resto da casa — peço.

— Vamos, minha garota.

— Espera, antes quero te dizer uma coisa. — Paro quando


ele ia me pegar no colo.

— Se for que a bebê é minha filha, não precisa, eu sempre


soube. — Sorrio com sua certeza.

— Não é isso, se ajoelha de novo.

Ele faz o que eu peço e fico apaixonada em sua carinha


curiosa, queria poder beijá-lo desse jeito, mas meu barrigão me
impede de conseguir me aproximar adequadamente.

— Pode dizer. — Ele parece um menino animado.

— Eu decidi o nome da nossa bebê e quero saber o que você


acha.

— Pode falar.
— Nos dois perdemos nossas mães cedo demais — tento
controlar a emoção na voz —, e fomos abençoados com nossa
menina. — Coloco suas mãos na minha barriga. — Eu quero
chamá-la de Cecília Eduarda, a junção do nome da sua mãe e da
minha.

— É perfeito, obrigado, Bianca — beija minha testa e depois


minha barriga —, oi, minha Cecília Eduarda, papai está ansioso para
te conhecer.

— Nunca mais seremos separados, me promete?

— Nem em mil anos.

Louis me beija mais uma vez e antes que eu possa


aprofundar nosso carinho, ele se separa e me leva para conhecer o
apartamento que está completamente vazio.

— Vamos nos casar somente quando a Cecília nascer — digo


quando ele me coloca na cadeira de rodas e ficamos na varanda
observando o pôr do sol.

— Quer esperar isso tudo? Por mim casávamos amanhã


mesmo. — Beija minha perna.

Ele descansa a cabeça no meu colo e fico fazendo carinho em


seus cabelos.
— Não vou poder organizar a cerimônia como quero mal
podendo sair do hospital e quero que nossa noite de núpcias seja
cheia de sexo.

— Você é uma tarada. — Mordisca minha pele.

— Sou e tenho passado necessidade nesses meses — bato


em sua testa —, então as coisas serão como eu quero e sem
discussão.

— Sim, futura senhora Vittileno.

— A casa tem de estar mobiliada quando saímos do hospital,


Cecília não pode chegar e ter somente o quarto dela pronto,
contrate uma arquiteta que possa me visitar no hospital e organizar
tudo como eu quero.

— Mais uma exigência?

— Sim, vamos comer que estou faminta.

— Como queira. — Louis se levanta e me beija.

Ele empurra a cadeira de rodas e vamos para seu


apartamento no andar de cima, começo a me sentir cansada do
agito do dia. Fico em seu quarto descansando e assistindo desenho
com o Lorran, que não para de falar o quanto está ansioso para ver
sua priminha. Jantamos os três e depois o Levi e a Olivia se juntam
a nós, não saio daquela cama o resto da noite.

Retorno ao hospital, sentindo dores no abdômen, ainda está


muito cedo para a Cecília nascer, meu médico começa a monitorar
minha situação com mais cuidado, ele disse que a qualquer
momento posso ter um parto prematuro por causa da minha
pressão, mas que a equipe já está pronta para tudo e garante que
ficaremos bem.

— Onde está a minha netinha? — A voz do pai do Louis soa


alegre na porta do meu quarto no hospital, ele carrega um urso
enorme em sua mão e vem sorridente. — Eu me aposentei e o
safado do meu filho me fez voltar à empresa para trabalhar no último
mês, acredita nisso? — ele diz e dou risada do seu jeito de falar. —
Mas por essa pequenina eu faço tudo — ele alisa minha barriga e
depois beija minha testa —, estou feliz que você aceitou esse bobão
de volta.

— Obrigada pelo apoio que o senhor me deu. — Não tivemos


muitas oportunidades de nos vermos antes e agora entendo que é
por ele cuidar da empresa enquanto o Louis cuida de mim.

— Não precisa agradecer, faço tudo por minha família e isso


inclui vocês duas.
As dores no meu ventre não diminuem, mas pelo menos não
aumentam nas semanas seguintes. Tento não ficar ansiosa e pensar
besteiras quanto ao nascimento da Cecília, os médicos têm feito um
excelente trabalho e o Louis é ótimo em me manter calma e serena.

Entro na 40° semana de gravidez e, finalmente, respiro


aliviada, conseguimos cumprir todas as semanas de gestação e
Cecília segue saudável dentro de mim, pronta para nascer. Contudo,
não poderei ter um parto normal por culpa da minha pressão, será
uma cesariana que está marcada para acontecer em três dias.

— E você não vai sair do lado dela — repasso ao Louis o que


ele deve fazer na hora do parto.

— Nem por um momento. — Sorri nervoso. Ele mal tem


dormido de tamanha ansiedade, o homem parece que é ele quem
vai dar à luz e não eu.

A dor me corta de uma ponta a outra e gemo, apertando a


mão do Louis.

— Cecília não vai esperar! — gemo com a contração intensa,


não devia começar forte desse jeito.

— Vou chamar o médico, espere um pouco. — Ele me beija e


depois a minha barriga. — Não tenha pressa, anjinho, estamos
esperando por você.
Ele vai para a porta e grita pela enfermeira, acho que as
mulheres já estão odiando Louis pelo tanto que ele chama por elas
nas últimas semanas. Cerro os dentes e respiro como a enfermeira
me ensinou, um passo de cada vez. Minha cabeça fica zonza e não
consigo mais respirar direito, a vista escurecendo. Cadê o Louis?

— Louis! — berro seu nome, e um vulto de cabelos loiros


entra no meu campo de visão segurando minha mão —, eu... não
estou enxergando.... direto.

— Vamos trazer essa bebê ao mundo, mamãe. — A voz do


médico alcança meus ouvidos, mas desmaio antes de conseguir
respondê-lo.

Acordo horas depois com um cansaço enorme e dores na


coluna e abdômen, olho para minha barriga e ela está menor. Um
grunhido chama minha atenção e procuro pelo som, ao lado da
cama vejo o Louis embalando nossa filha em seus braços.

— Olha quem acordou, minha piccola, é a mamãe — ele fala,


suavemente, e se aproxima da cama. Louis abaixa nossa menininha
para que eu possa vê-la e me emociono ao ver minha filha.

Estendo os braços e, com cuidado, ele apoia a cabecinha dela


em meu peito e o corpinho em meus braços, minha menininha não
pesa quase nada, um tufo de cabelo loiro espetado, o nariz
pequeninho e boca rosinha, as mãos apertadinhas próximo ao rosto.
Sinto seu cheirinho de neném e isso acalma minha alma e preenche
meu coração com uma emoção forte e indescritível, é como se eu
segurasse a minha vida em meus braços.

— Bem-vinda ao mundo, minha Cecília. — Beijo sua testa


com cuidado.

— O médico disse que quando você acordar pode amamentar


o nosso pequeno docinho. — Ela agarra o dedo do pai e o leva à
boca, Louis sorri para a nossa menina completamente apaixonado
pela filha.

— Quer mamar, meu amor? — pergunto e ela reage com um


chorinho fraco de fome.

— Ela estava só esperando a mamãe acordar — ele beija


minha cabeça —, você foi incrível.

— O que aconteceu?

Enquanto amamento a minha pequena que puxa com força o


bico do meu peito, machucando e me fazendo chorar pela dor.
Aguento firme e escuto do Louis que eu desmaiei devido à pressão,
a cesariana foi iniciada e durou cerca de uma hora enquanto ele
ficava de olho no nascimento da nossa menina e em mim, que
mantive meus sinais vitais fortes e firmes, agarrando-me a vida.
Agora eu tenho uma família e minha menina nunca saberá o
que é crescer sem uma mãe. Estou ansiosa para o que virá daqui
para a frente.
Epílogo

Nosso casamento será na Itália, na casa de veraneio da


minha família durante a primavera, o altar foi arrumado debaixo do
carvalho que tenho a lembrança mais feliz com a minha mãe. Toda a
família está presente neste momento, Levi aparenta estar bem
segurando o Lorran no colo, que quando pode escapa para ver a
prima nos meus braços. Ele se apaixonou completamente pela
Cecília e fica irritado por não poder andar com ela nos braços para
todo canto.

Minha menina cresce saudável, sou completamente


apaixonado por ela, os cabelos loiros como os meus e ondulados
como os de Bianca, os olhos azuis-esverdeados que mudam a
tonalidade de acordo com a iluminação, às vezes mais azuis e
outras vezes escuros. Ela tem força nos dedinhos e adora puxar
meus cabelos e bochechas, assim como me babar quando quer me
morde para coçar a gengiva. Sou muito babão e deixo essa
pequena fazer a festa que quiser comigo. Bianca vive dizendo que
estou mimando muito a Cecília, para mim é impossível não fazer as
vontades das mulheres da minha vida.
Esperamos até que Bianca estivesse bem de saúde para
poder fazer a viagem, eu omiti dela que o parto foi de risco e que ela
poderia ter morrido, não quero que ela sinta o desespero que passei
quando ela desmaiou e seus sinais vitais enlouqueceram. Que
enquanto a Cecília nascia e eu a segurava nos braços, Bianca teve
uma queda brusca de pressão que fez com que seu coração
chegasse perigosamente perto de parar de bater.

Eu não quero que as lembranças dela do nascimento da


nossa princesa sejam manchadas, por isso guardei somente para
mim e pedi ao médico para dizer que os dois meses que Bianca
passou internada foram devidos à sua pressão e não por ela estar
frágil e precisando de atenção hospitalar vinte e quatro horas. Mas
ela percebeu que tinha algo errado quando sua produção de leite se
mostrou escassa, eu a acalentei quando chorou por não conseguir
satisfazer nossa menina e tomei sua dor para mim, até que ela
estivesse melhor.

Faz cinco meses que nossa menina nasceu e Bianca


consegue, finalmente, amamentar em quantidade satisfatória nossa
pequena monstrinha gulosa. Ela já voltou a andar sozinha e seu
corpo desinchou, a pressão está normalizada e, enfim, pudemos
viajar para a Itália. Meu pai tem me ajudado nesse período cuidando
da empresa e brincando que estava em uma falsa aposentadoria.
Meu irmão me surpreendeu com o quanto ele foi prestativo com a
Bianca, mas eu percebo que ele usou o cuidado de Cecília como
uma desculpa para fazer o Lorran querer se aproximar dele só para
ficar com a priminha.

— Zio — meu piccolo grita e o olho, todo arrumadinho no


terno.

— Diga, meu príncipe.

— Dá a Cilia. — Estende os bracinhos pedindo para segurar


meu docinho.

— Vá chamar a zia Olívia, para pegar a Cecília, lembre-se de


que você vai entrar carregando as alianças e não pode desarrumar
suas roupas.

— Verdade. — Sai pulando atrás da tia.

Estou com a Cecília de frente para o altar, vendo todas


aquelas pessoas sentadas em seus cantos conversando, em
instantes a cerimônia vai ser iniciada. Olho para cima e as árvores
balançam o vento da primavera em meu rosto. Espero que você
esteja vendo tudo aí de cima mãezinha e esteja feliz pela sua
família, gostou da sua netinha? Uma borboleta pousa na mão da
Cecília, minha filha ri ao ver o pequeno inseto de asas amarelas.
Será que é a resposta da minha mãe a pergunta que fiz? A borboleta
voa rente ao meu rosto e depois sobe para as árvores e fica lá como
se estivesse me observando. Beijo a cabeça da minha princesa
sentindo a paz me dominar.

— Vem cá, bonequinha — Olívia chama a sobrinha que não


faz cerimônia antes de esticar os bracinhos para a tia.

— Vou me preparar para entrar — digo e Olivia acena que


sim.

Lira vai entrar comigo, quero minha irmã ao meu lado no lugar
de nossa mãe.

— Pronto para isso, maninho? — ela pergunta cheia de amor


no olhar.

— Com certeza. — Beijo sua testa, mais afastados


esperamos os convidados ocuparem seus lugares e o padre se
posicionar em cima do palco.

Primeiro os padrinhos entram, Levi e Olívia lado a lado, minha


princesa no colo do avô que entra em seguida, minha filha bate
palminhas e distribui sorrisos. A marcha para a minha entrada inicia
e caminho com Lira até o altar, e fico de frente esperando a minha
mulher. Ela vem caminhando e a marcha nupcial tradicional italiana
inicia, Bianca usa um vestido colado ao corpo repleto de renda, o
véu na cabeça preso por uma tiara de diamantes brilhantes, o colar
longo preenchendo o vão de seus seios.
Seu pai caminha com ela pelo tapete, me entrega a filha e
aperta minha mão, seguro Bianca pelo braço e juntos nos
ajoelhamos diante do padre. Estaria mentindo se falasse que escuto
uma só palavra do que o velho homem diz, minha atenção o tempo
todo em Bianca e no quanto ela está bela.

— Você está linda — sussurro em seu ouvido.

— Você também. — Retribui e rimos um para o outro.

— Você, Louis Vittileno, aceita Bianca Baptista como sua


esposa, para amar e respeitar, na saúde e na doença, na riqueza e
na pobreza, até que a morte os separe?

— Aceito.

— Você, Bianca Baptista, aceita Louis Vittileno como seu


marido, para amar e respeitar, na saúde e na doença, na riqueza e
na pobreza, até que a morte os separe?

— Aceito.

— Pelos poderes concedidos a mim pela Santa Igreja


Católica, eu vos declaro marido e esposa, podem se beijar.
As palmas estouram atrás de nós, mas o mundo para quando
seguro o rosto da minha esposa e beijo seus lábios, alcançando a
mais perfeita paz e contemplando o verdadeiro amor.

— Vamos logo. — Bianca puxa minha mão pelo salão de


festas.

Após a cerimônia nos reunimos para comemorar, dançar e


tirar fotos com nossos familiares, aproveitando a noite. Minha
esposa deixa nossa filha com a irmã e me puxa pela mão, correndo
para longe dos convidados. Entramos na mansão na direção da ala
em que passaremos nossa primeira noite de casados juntos.

— Isso tudo é saudade? — pergunto quando a pego no colo e


ultrapasso as portas do quarto.

— Com certeza, faz tempo que não sei o que é ser comida
com gosto. — Ataca minha boca em um beijo que me deixa sem ar.

Enquanto ela se recuperava não pudemos fazer sexo e depois


a Cecília parecia que tinha um sininho avisando quando estávamos
transando e começava a chorar pedindo pelo peito da mãe. Hoje,
nossa pequena vai se contentar com o leito de fórmula e com a tia
que a acalentará até o momento que tiver sono.

Jogo minha mulher na cama e observo uma última vez o


vestido em seu corpo. Removo seus sapatos e beijo seus dedinhos
e panturrilhas, arrancando mordidas da parte de trás de seu joelho.
Bianca grita e tenta se encolher, mas não deixo, puxo-a para mim e
ataco a sua boca enquanto com os dedos brinco com sua bocetinha
encharcada. A viro de costas e removo os laços do seu vestido,
puxo as alças e beijo seus ombros antes de mordiscar a pele de seu
pescoço.

— Não me torture, Louis — ela geme baixinho quando a deixo


somente de lingerie branca e meias.

— Vou provar do meu dolce a noite toda, não tenha pressa,


meu amor, temos toda uma eternidade para aproveitar um ao outro.

E essa é a mais pura verdade, eu sou dela e ela é


completamente minha, para todo o sempre.

Eu nunca teria conhecido a verdadeira paz e contemplado o


amor se não tivesse perdoado o Louis muitos anos atrás. Hoje,
deitada debaixo da sombra do salgueiro, eu aliso minha barriga
protuberante de sete meses, nosso quarto filho nascerá na Itália do
jeito que ele queria.
Fixamos residência aqui desde que os negócios no Brasil
foram assumidos por outra pessoa, alguém de confiança do Louis,
que apareceu em um momento inesperado e foi capaz de dar a volta
por cima e revelar seu verdadeiro eu, completando a felicidade que
faltava em nossa família. Desde então estamos morando na Itália
enquanto ele gerencia a sede principal da VITTILENO daqui.

Louis corre pelos campos com Cecília em seus ombros,


Catarina de oito anos correndo atrás dele e o pequeno Cesare de
seis anos que os acompanha quando tentam o pegar para recuperar
a bola. No meu ventre, Cosimo chuta sem piedade, deve estar
ansioso para poder ir correr com seus irmãos e pai.

Nunca imaginei que a felicidade pudesse sorrir dessa maneira


para mim, mas aqui estou eu, contemplando o verdadeiro significado
de ser feliz, ao lado do meu homem e filhos.

FIM
“Vou proteger seu coração como você aceita o meu cheio de cicatrizes.”

Levi Vittileno viu o seu mundo ruir ao perder sua esposa em um acidente
trágico. Agora, 2 anos depois, ele precisa voltar a viver e conquistar o amor do
seu filho Lorran, que não o enxerga como pai.

Ele só não imaginava que um furacão em forma de mulher iria surgir para
fazer seu coração cheio de cicatrizes voltar a bater.

Olivia Baptista, sempre sonhou em ser mãe, mas após tantas decepções ela
decide que terá seu filho sozinha e não mede esforços para que isso aconteça, já
que não acredita que exista um amor para si.

Lorran Vittileno em seus 2 anos de vida nunca viu em Levi um pai, cresceu
aos cuidados do tio e agora depois de uma mudança de pais, se encanta por
Olivia, fazendo assim com que ela seja contratada para ser sua babá.

“Você me fez voltar a querer viver novamente.”

Ela o faz lembrar de como é viver.

Ele a faz desejar uma família mais do que tudo.


Quando Olivia finalmente entrega o coração a Levi e acaba sendo rejeitada
por ele não conseguir esquecer a ex-esposa morta, ela descobre que está grávida,
com o coração aos pedaços, um filho no ventre e o amor que sente pelo Lorran,
ela toma a decisão de ir embora com o menino.

Pode um coração tão machucado pelo luto, voltar a amar?


SINOPSE

AVISO
SUMÁRIO
EPÍGRAFE
PROLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
CAPÍTULO 37
CAPÍTULO 38
CAPÍTULO 39
EPILOGO
OBRAS DA AUTORA
UMA FILHA PARA O BILIONÁRIO ITALIANO (IRMÃOS VITTILENO)
LIAM : A OBSESSÃO DO BAD BOY (BULLDOGS YALE)
SIGAM A AUTORA
Vai ser difícil de superar, e você jamais esquecerá, mas acredite que, com
o tempo, tudo ficará melhor. Pois o tempo trará serenidade e aceitação, e então,
só restará a saudade, mas, para combatê-la, você terá as lembranças que
guardará para sempre.

Desconhecido
Levi

3 ANOS ANTES.
— Estamos atrasados amor — Blanca chama da sala.

— Só um minuto.

Finalizo o nó da gravata, e abotoo o botão do paletó. Vou ao encontro da


minha esposa na sala e sorrio ao vê-la sentada no sofá, alisando sua barriga de 9
meses e 4 dias. Nosso filho nascerá a qualquer instante.

Estamos felizes, eufóricos, e loucos para conhecer nosso meninão.

— Venha para a mamãe Lorran — a voz doce com um toque de veludo


acelera o meu coração apaixonado.

Quando conheci Blanca eu sabia que ela seria a mulher da minha vida. Não
demorou três meses para que eu a pedisse em casamento. A escolha mais certa
que fiz, foram anos de felicidades e realizações.

Com o nosso pequeno a caminho, eu não poderia desejar mais nada, além
de a ter comigo para sempre.
Quando a imagino ninando nosso menino, correndo atrás dele pela casa,
brigando comigo por colocar a frauda errada, ou achando fofo quando eu o
colocar para dormir. Os primeiros passos, o choro pelo dentinho crescendo.
Pensar em todos esses momentos que teremos juntos, me enche de felicidade.

Não estou mais sozinho no mundo, eu a encontrei e agora traremos a nossa


mistura, o fruto do nosso amor ao mundo.

— Vamos? — beijo seu ombro inspirando o cheiro doce da pele.

— Finalmente — se levanta com dificuldade. Tento a ajudar, mas com um


gesto de mão ela me dispensa. — Eu ainda posso fazer isso sozinha — suspira
cansada.

— E eu te segurar — beijo sua bochecha — mulher maravilha.

— Donzelo que leva um século se arrumando — bate no meu ombro,


rindo.

— Você nunca reclama quando eu tiro a roupa, por que faz quando a visto?
— Belisco a ponta do seu nariz e ela gargalha, enquanto me bate no ombro.

— Pelado você é mais bonito — rosna.

— Posso tirar tudo — seguro a borda do paletó e faço menção de o


remover, Blanca me desafia a tirá-lo, com o olhar — pensando bem... estamos
atrasados — seguro em sua cintura fazendo-a caminhar — vamos logo sua tarada,
na volta eu tiro tudo para você.

— Só vou poder olhar, enquanto Lorran não nascer, nós não teremos mais
diversão de adultos. — Gargalho da sua escolha de palavras

— Você fica uma graça tomando cuidado com o palavreado.


— Lorran não vai crescer sabendo um palavrão, temos de começar a nos
policiar com ele ainda na barriga — aponta um dedo para mim, e sorrio para ela.

— Vamos, mamãe coruja.

Deixamos o apartamento em que moramos na Itália entre risos e


brincadeiras. A caminho para o baile beneficente organizado pela empresa da
minha família, a VITTILENO, em prol das crianças que sofreram com o
desabamento devido ao terremoto nas Filipinas.

Fiz a doação de cinco modelos de minha criação para serem leiloados no


evento, e o dinheiro arrecadado, será convertido em alimentos.

Sou grato ao Louis, meu irmão mais velho, por ser o próximo herdeiro da
VITTILENO, graças a isso pude estudar moda e me especializar naquilo que eu
amo fazer.

Criar modelos de roupas, ver as pessoas os usando e amando minhas obras


de artes.

Não assino com o meu nome para não atrair mais atenção da mídia para
mim. Apesar de tudo, sou uma pessoa reservada, que prefere manter a vida
privada.

O assédio que sofro por ser um Vittileno me incomoda desde pequeno. Ser
bonito não ajudou muito, herdei a beleza da minha mãe, igual aos meus irmãos.
Temia um dia encontrar uma mulher que me quisesse por ser um Vittileno, ou
devido à minha aparência.

Blanca apareceu como um presente dos céus, alguém que me ama por eu
ser quem eu sou. Minha beleza e dinheiro nunca a impressionaram, é ao meu
coração e minha alma livre que ela ama.

E eu a amo cada dia mais.


A conheci em um dos desfiles da minha grife. A modelo mais linda, que
usou a peça-chave da coleção, no primeiro momento ela me dispensou por ser um
dos Vittileno, e seu patrão.

Eu insisti, todos os dias, por mais de um ano. No fim, três meses depois do
nosso primeiro encontro, o amor venceu, e hoje estamos aqui, casados e
esperando nosso primeiro filho.

Encaro a minha esposa sentada no banco de trás, ao meu lado no carro que
nos leva ao evento. Seguro seu queixo e ela me encara sorrindo. Uma luz forte
ilumina o seu rosto. A buzina do nosso motorista explode. Olho para a frente e
fico cego pelo clarão.

Não vejo mais nada depois disso.

****

Acordo com a cabeça latejando.

— Levi — vejo meu pai, assustado, pairando acima de mim — graças a


Deus, filho.

— O-oque?... — Minha garganta está seca, e engulo em seco.

— Aqui — com a ajuda dele bebo um pouco de água, acalmando a


quentura na garganta.

— Blanca? — pergunto.

— Filho — lágrimas nascem em seus olhos.

— Pai... — o desespero gela a minha alma.


— Vai ficar tudo bem — ele beija minha cabeça, e a dor causada por seu
ato, me faz revirar os olhos e me afastar dele. — Vou chamar o médico — ele se
afasta, me deixando sozinho.

A tontura faz com que eu tenha ânsia de vômito. Preciso saber o que
aconteceu com a minha mulher e meu filho. Tento mexer a perna direita, e a dor é
excruciante, corta da ponta do pé a minha coxa, inclino a cabeça tentando ver o
que me prende, e sou forçado para trás pela tontura.

— Calma — Louis aparece no meu campo de visão, os olhos vermelhos e


inchados. — Você fraturou a perna em três lugares, não pode se levantar.

— Blanca? — peço com as lágrimas turvando minha visão.

— Na UTI, os ferimentos dela foram leves, mas o parto do Lorran teve de


ser prematuro, vai ficar tudo bem.

— E-ele... tá b-bem? — esforço para conseguir falar.

— Sim, é um lindo bebezinho de 3 quilos e 500 gramas. — Seu sorriso me


conforta.

— Quero vê-lo.

— Por enquanto ele dorme no berçário, quando você receber alta eu te levo
lá — Louis segura minha mão, fazendo carinho.

Aliviado, por saber que ambos estão vivos, eu cedo a tontura e desmaio.

A semana passa da mesma forma, com Blanca na UTI, o Lorran no


berçário, e eu preso nesse quarto, oscilando entre a consciência e o torpor.

Recebo alta duas semanas após o acidente de trânsito, a primeira coisa que
peço, é para ver minha esposa, mas as visitas estão restritas, para garantir que ela
não tenha uma infecção.
O acidente aconteceu devido a uma moto, que cortou na frente de um
caminhão, e o susto fez o motorista perder o controle do volante, invadindo a
contramão.

O motorista do carro não teve tempo de desviar, e bateu, ele morreu na


hora, enquanto eu e a Blanca fomos levados ao hospital.

Arrepios sobem pelo meu corpo ao lembrar que a minha mãe faleceu da
mesma forma.

Um acidente, causado pela perda do controle do carro durante a intensa


chuva, quando ela voltava para casa. O motorista faleceu no local do acidente, e
minha mãe ficou internada por dias, até não conseguir mais lutar por conta dos
ferimentos, e nos deixar.

Rezo aos céus para que o destino dado a minha mãe não seja o mesmo da
Blanca.

Tento ser otimista, e acredito que tudo ficará bem, que ela vai sair dessa e
voltar para mim, e o nosso filho. Todos os dias em que ela continua dormindo, e
perdendo aos poucos as funções dos órgãos, são agulhadas enfiadas no meu
coração.

Ela teve uma hemorragia durante o nascimento do Lorran, misturado com o


sangue que tinha perdido devido ao ferimento profundo no braço esquerdo,
precisou de transfusão sanguínea urgente.

Por falta de bolsas de sangue AB positivo, ela teve falência do fígado e


rins, e agora, outros órgãos estão em risco de falência.

O coração não bombeia em plena capacidade, e o pulmão, não envia


oxigênio para as células. Rogo pedindo a Deus há cada instante do dia para que
ela consiga lutar pela sua vida.
Eu e nosso menino precisamos dela.

— Quer ir ver o Lorran? — Louis pergunta quando termino de vestir minha


roupa, e sento na cadeira de rodas.

— Vamos — tento sorrir pelo meu meninão.

A porta do quarto abre, e o médico responsável pelo tratamento da Blanca


entra com o semblante triste.

— Sinto muito Levi — aproxima cruzando as mãos na frente do corpo —


fizemos tudo que podíamos por sua esposa, mas infelizmente, ela não resistiu, e
teve uma parada cardíaca.

O mundo desaba em escuridão ao meu redor.


Levi Um ano após o

acidente.
Perdão, Blanca.

Vejo meu filho no berço, dormindo com um pijama de ursinhos, agarrado


na pelúcia que a mãe comprou quando ela estava com sete meses de gestação,
trouxemos todas as suas coisas na mudança, as minha eu queimei.

Não consegui voltar para a nossa casa, a escuridão tomando as paredes,


tornou-se impossível respirar lá dentro. Tive um ataque de pânico quando passei
pelas portas, e fui levado de volta ao hospital, passei uma semana internado até
conseguir me acalmar e receber alta.

Louis assumiu a responsabilidade de cuidar de mim e do Lorran, viemos


morar com ele. Sua casa foi adaptada para nos receber, o quarto do Lorran
decorado com imagens infantis e ursos que ele adora brincar, enquanto o observo
de longe, com medo de tocar no meu pequeno e o machucar, ele parece tão frágil
e pequeno.
As minhas coisas lembravam a Blanca em tudo, na gravata que ela
amarrava, os desenhos que ela analisava e dava palpites de como melhorar, o
sabonete que ela comprava, e adorava cheirar em minha pele, o perfume que a
fazia franzir o nariz, e dizer que não sabia como eu aguentava aquele cheiro.

Todas as lembranças dolorosas que eu queimei quando se tornou


impossível continuar relembrando ao olhar para elas.

Um ano se passou desde que eu perdi o amor da minha vida e a razão pela
qual eu seguia em frente. Minha mãe morreu quando eu ainda era jovem, em um
acidente de carro, e agora... anos depois, outro acidente levou a mulher que eu
mais amei, e sonhava em passar a vida ao lado dela.

Briguei com a Lira, minha irmã mais nova, quando ela me fez ir ao
psicólogo semana passada, e eu não quis o tratamento, passei uma hora sentado
em silêncio, enquanto o psicólogo me fazia perguntas sem respostas. Explodi
com ela, por me fazer passar por aquilo, e com lágrimas nos olhos, minha irmã
voltou aos Estados Unidos, destruída, sem conseguir assistir a minha
autodestruição sem fazer nada.

As pessoas ao meu redor não conseguem entender como eu posso ter me


deixado afundar no luto e ignorado o meu filho. Eu não desprezo o Lorran, não o
quero longe, eu só não sei o que fazer sem ela aqui. Lorran é a cara da mãe, o
nariz pequeninho e afinado, os lábios de um tom rosinha, com uma curvatura de
coração, como os de Blanca.

Meu filho me lembra a todo instante quem eu perdi, olhar para ele é como
ver o futuro que eu tinha, se desmoronando na minha frente, dia após dia.

Quanto mais essa sensação se afunda em meu peito, mais eu fujo dele, não
querendo contaminar um anjo indefeso com a minha podridão.

Minha mãe morreu... Minha esposa morreu.


Por que eu continuo vivo?

E se o Lorran morrer, por ser meu filho?

Meu irmão também morrerá?

Meu pai?...

Minha irmã?...

Todos vão morrer, e eu vou continuar vagando como um fantasma nesse


mundo sem cor. Bebo um longo gole do uísque, o álcool não traz mais o
entorpecimento de que preciso para continuar vivendo. A dor a cada dia mais
forte e impossível de ser controlada.

A mão treme quando a aproximo da cabeça do Lorran, cabelos louros em


tufos volumosos. O peito dele desce e sobe ritmado enquanto sua boquinha se
abre em um bocejo, e os olhos azuis como os meus me encaram sonolento.

Afasto a mão, não posso contaminar meu filho com a minha escuridão. Ele
é um anjo de luz, não vou permitir que um demônio como, eu manche sua vida e
o amaldiçoe com uma morte precoce.

Nunca mais pessoas que eu amo irão morrer por fazerem parte da minha
vida, vou proteger o Lorran, meu pai, minha irmã, e irmão, do destino cruel.

Perdão, Blanca.

Lorran estica um dedo tentando agarrar minha mão, a garrafa de uísque


balança quando me afasto dele, como se tivesse sido empurrado. Cambaleio e
caio no chão, fazendo barulho por ter esmagado um de seus brinquedos.

O choro do Lorran explode como uma bomba, em menos de três segundos


Louis chega na porta do quarto. A expressão de meu irmão mais velho me joga
mais fundo no abismo, repleto de pena e tristeza.
Eu não sirvo mais para viver nesse mundo.

Sou um fantasma que só tem causado incomodo para todos ao meu redor.

Louis não trabalha direito, meu pai não para de se preocupar. E mandei
embora minha irmã mais nova, que só queria o meu bem, eu sou uma praga que
deve ser exterminada.

— Lorran seria mais feliz — a voz arrastada pela embriagues — se você


fosse o pai dele — aponto para meu irmão, apoio a mão no chão para me
levantar, tropeçando, firmo o corpo. — Quer ele para você? — algo molhado
enche a face de meu rosto.

— Não diga besteiras Levi — Louis se aproxima, e me senta na cadeira de


ninar do Lorran. — Você precisa voltar a terapia, procurar ajuda para poder sair
da depressão — ele agarra a garrafa de uísque — e parar de beber!

— Lorran tá chorando — o soluço que achei ter ouvido do meu filho, sai da
minha garganta — vá ajudar ele.

— Não é o Lorran, Levi — Louis segura meu rosto — é você. Vamos


tomar um banho.

Louis sempre foi o certinho, centrado, e quem me ajudava a fugir de casa


para ir nas festas da escola, sem nossos pais saberem.

Desde que nossa mãe morreu, é o Louis quem tem ajudado nosso pai a nos
criar.

Eu não tenho o direito de impedir a vida adulta do meu irmão, sou um


estorvo para ele e todos ao meu redor.

— Vou me deitar — falo em um fio de voz quase impossível de ser ouvido


— cuida do Lorran?
— Claro.

— Prometa Louis — agarro seus ombros o fazendo me encarar nos olhos


— nunca deixe o Lorran sozinho, cuide do meu filho, seja o pai que eu não
consigo ser.

— Eu sempre vou cuidar do Lorran. — Meu irmão encosta a testa na


minha — e de você, da Lira, do nosso pai. Vocês são a minha família, vamos
superar isso juntos.

— Não tenho salvação Lou — saio de seu abraço, olho para meu filho no
berço que brinca com o ursinho. — Cuide bem do garoto, você será um pai
melhor do que eu.

— Levi... — a voz pesada não me alcança.

Deixo o quarto do Lorran cambaleando para o meu. A vista embaçada pela


bebida, e lembranças do rosto de Blanca na última vez que a vi.

Ela ama o nosso menino.

É ela quem devia estar naquele quarto comigo.

Por que eu não fui no lugar dela?

Blanca, meu amor, eu sinto tanto a sua falta.

Abro a porta do quarto, vou para o closet, e vejo a corda que deixei
pendurada entre os fortes cabideiros. Roupas que não foram usadas desde que a
Lira as comprou, quando toquei fogo nas minhas, não tem sentido serem usadas.

Perdi a paixão que tinha pela moda, não crio mais nada, não vivo, só passo
um dia pelo outro bebendo, dormindo e me enchendo de remédios, buscando o
esquecimento.
Não consigo encontrar aquilo que procuro na bebida, nos medicamentos, e
no sono.

Blanca sempre aparece quando fecho os olhos, o rosto iluminado, o sorriso


doce, a mão na barriga acariciando nosso bebê. Ela nunca saberá como é o rosto
do nosso menino, o cheiro dele, a voz, não pode ver quando ele coloca o pezinho
na boca e morde, achando graça da pequena travessura.

Ela se foi, e eu continuo preso nesse inferno de mundo, a alma morta por
dentro, tendo de seguir em frente ao corpo que insiste em permanecer respirando.
Meu coração podia simplesmente parar, os pulmões não enviarem mais ar, tudo
podia desaparecer.

Eu não aguento mais sentir, e viver nesse inferno de prisão.

Caminho até a corda, subo no banquinho, e a passo no meu pescoço. Fecho


os olhos, inspiro fundo, e salto.

Perdão, Blanca.

As veias aéreas queimam. A cabeça explode pela falta de oxigênio. O


pulmão e coração em ritmos descompassados. A dor é excruciante, como se
minha cabeça estivesse sendo partida em duas. Por impulso, seguro a corda ao
redor do pescoço, não vou tira-la, não posso continuar existindo quando tudo em
mim morreu.

A visão embaça, escurece, o entorpecimento tomando meus músculos que


cansam de lutar contra a perda de oxigênio. Sinto o coração batendo lentamente,
o pulmão rasgando pela falta de ar. Os braços pendem ao lado do corpo e a
cabeça tomba.

Estou morrendo.

Vou te encontrar Blanca.


O Louis cuidara bem do nosso menino.

— LEVI! — escuto ao longe, não adianta, ninguém pode me alcançar.

O corpo balança violentamente, a corda é rompida e desabo em braços


fortes, impedindo a minha queda. Sou colocado no chão, sinto a pressão em meu
peito, ar injetado na garganta queimar.

— ACORDA — ele grita, desespero.

Tusso, me deitando de lado, e vomitando.

Mal termino de expelir os líquidos, e sou pego em braços protetores,


lágrimas molham minha cabeça enquanto ele soluça se certificando de que estou
vivo.

Mais uma vez a morte bateu a minha porta.

Outra vez fui impedido de ser levado.

Eu só quero desaparecer.

— Nunca mais faça isso, me ouviu? — Louis me aperta forte contra ele,
como se fosse capaz de tirar a minha dor.

— Eu não consigo mais continuar — digo com a voz rouca e falha, a


garganta arde como se tivesse engolido areia.

— Deixa eu te ajudar Levi, por favor — meu irmão chora em desespero.


Continuo causando dor aos que são importantes para mim.

— Enquanto eu existir, você vai permanecer preso nessa dor, se


preocupando comigo, me deixa acabar com o sofrimento.

— Isso não é resposta, Levi — Louis segura meus ombros e me sacode, me


obrigando a encará-lo — hoje pode doer como o inferno, amanhã também, mas
você não pode prever o futuro, não sabe como será daqui a um ano, dois..., três...,
porra, você não pode viver assim!

— Eu não estou vivendo Louis, só existindo.

— Blanca nunca te perdoara se você abandonar o Lorran, faz ideia de como


ele vai crescer? Sabendo que o pai se matou depois da morte da mãe?

— Diga que você é o pai dele e me apague da existência.

— NUNCA! — Louis grita e volta a me abraçar. — Me prometa Levi, você


não vai fazer isso de novo.

— Não posso.

— Se você se matar, eu vou junto — ódio purga em sua voz.

— Não! — me solto com dificuldade, encarando o rosto do meu irmão.


Inchado, vermelho, e banhado em lágrimas de sofrimento — você não pode
morrer, o Lorran precisa que você, seja o pai dele.

— Ele precisa de você — aperta minha testa contra a sua — deixa eu te


ajudar, eu prometo que a dor vai passar.

— E se não passar?

— Não existe essa possibilidade.

Eu quero acreditar no Louis como sempre fiz.

Meu irmão nunca mentiu para mim, e por ele, eu vou tentar, só mais um
pouco.

— Não prometo nada.


— Já é um começo — beija minha cabeça, e com dificuldade, consegue me
levar para o banho.

— Prometa que cuidará do Lorran, Louis — peço novamente, antes da


água tocar meu corpo.

— Vou cuidar de você e dele — assinto em positivo.

Eu vou tentar só mais um pouquinho, pelo Lorran e pelo Louis.

Perdão, Blanca...

Por não conseguir seguir sem você aqui.


Levi

Dias atuais.
— Eu preciso ir para o Brasil, Levi, venha comigo — Louis pede.

Deitado na cama, escondido do mundo, eu coloco a cabeça para fora das


cobertas e vejo o meu irmão. Que segura o Lorran dormindo nos braços, agarrado
nas suas pelúcias de gato e cachorro.

— Fazer o quê? — viro, procuro pelo relógio no quarto e vejo que já são
vinte horas e cinco minutos, não lembro se acordei hoje, ou estou dormindo desde
ontem.

— Para a sucessão da VITTILENO, eu preciso passar ao menos um ano a


frente da empresa no Brasil, e preciso resolver uns problemas que identifiquei nos
relatórios. Não posso fazer isso da Itália, e não consigo partir deixando você e o
Lorran aqui.

Sua voz mansa e baixa, acho que ele não quer acordar o Lorran. Me sento
na cama, e esfrego o rosto sem saber o que fazer. Brasil ou Itália, meu purgatório
será o mesmo. Abandonei mais uma vez a terapia, não consigo me comunicar
com os estranhos, que querem que eu fale da minha vida e de Blanca, da dor que
me atormenta.

Fui diagnosticado com depressão e alcoolismo.

Desde então, o Louis tem ficado no meu pé, e tomando cuidado para que eu
não ingira bebidas alcoólicas.

Me levar para o Brasil, vai garantir que ele possa continuar me vigiando e
impedindo que eu me mate, sei que prometi nunca mais fazer isso, mas o
pensamento não saiu da minha mente, nem por um segundo, desde aquele dia.

Lorran cresce a cada dia, e eu perco seu desenvolvimento enquanto me


escondo no quarto. Encaro meu irmão, ele tem esperança no olhar, vejo meu filho
dormindo confortável em seus braços, quando eu sou incapaz de o segurar dessa
forma.

Perdi o controle da minha vida, e nesse segundo, eu tomo a decisão, pelo


Lorran.

— Vou com você, mas não espere que eu me comunique com ninguém —
franzo o nariz — deixa ao menos eu beber um dia por semana, ceda em algo,
também.

— Sem bebidas para você — diz levantando — arrume sua mala, partimos
de manhã.

— Quando você pretendia me contar que iriamos viajar? Horas antes de


entrar no avião?

— Algo do tipo — dá de ombros e sai.

Ele tenta controlar que eu não beba, impedindo os funcionários de comprar


bebidas para mim e com a mídia sempre de olho nos meus passos, não consigo
beber em paz em um bar. No Brasil, talvez seja mais fácil de conseguir convencer
alguém a me trazer bebida, ou de ir a algum lugar.

Vou porque meu irmão me pediu, e eu preciso tentar recomeçar, mas os


pensamentos pedindo por álcool não são um bom sinal. Estou sóbrio tem um mês,
e o inferno continua o mesmo.

****

Ainda não processei que acordei, e fui colocado em um avião com o Louis
e meu pai, em direção ao Brasil. Louis tem perdendo a paciência comigo, e sei
que a culpa é minha, pelas brigas que tivemos devido à bebida no último mês.

Tenho sido um bosta de irmão e um pai miserável, prova disso, é o fato do


meu filho me chamar mais de stronzzo do que de Levi.

Ele nunca me chamou de pai.

Não o culpo.

Eu fico perdido dentro da escuridão a maioria do tempo, não o olho como


merecia. O pensamento de contaminar o Lorran com a minha podridão, faz com
que eu queira desaparecer no mundo.

Ele estaria melhor se o Louis fosse o pai dele.

Prometi ao Louis e ao meu pai que não tentaria o suicídio novamente, que
me manteria firme, pelo Lorran. A bebida, misturada aos remédios, tem sido meu
conforto quando o mundo ao meu redor escurece. A temperatura cai graus,
trazendo um frio de gelar os ossos, e as lágrimas brotam incessantemente.

Eu não vejo os dias passarem quando estou dopado pela medicação e o


álcool. É mais fácil de continuar existindo quando não sinto nada.
Queria que o Louis conseguisse entender que as drogas me ajudam a
continuar vivo, sem elas, os dias se misturam em um só, e a dor consome minha
alma.

Trancando nesse avião, encaro o Lorran brincar com seu ursinho, fazendo
sons de bebê. Ele é tão lindo, um pequeno anjo, iluminando a escuridão da minha
vida.

— Lorran — chamo baixinho, os olhos azuis idênticos aos meus me fitam


com interesse. — Tudo bem? — pergunto receoso.

Não sei me comunicar com meu próprio filho, isso é patético!

— Zim — responde mostrando os dentinhos de leite pequenininhos.

É injusto a Blanca não poder ver como ele fica lindo com os dentes
preenchendo a boquinha rosada e pequena. As bochechas protuberantes e os
olhos inocentes, astutos, prestando atenção ao redor como um mini falcão.

— Quer? — Estende os bracinhos entregando a pelúcia de gato.

A mão treme ao esticar para pegar o bichinho, e tento não deixar ele
perceber. Lorran começa a fazer sons de cachorro empurrando sua pelúcia contra
a minha, em uma pequena briga. Aproveito que ele está sentado de frente para
mim, preso a cadeira, e fico movendo o gatinho no ar, fugindo do seu ataque.

Ele sorri como poucas vezes o vejo fazendo para mim. Tenta pular no
acento, querendo alcançar o gatinho, faz bico por não conseguir. Um riso tímido
escapa entre meus lábios e grunhindo eu esfrego o gatinho no Lorran, que se
desmancha em gargalhas.

Por que eu nunca brinquei com meu filho?


Ver seu sorriso inocente por minha causa aquece uma parte morta dentro de
mim.

O pequeno momento de alegria some tão rápido quanto veio.

O avião escurece, as luzes piscam. Lorran parece não perceber o que


acontece ao seu redor. As paredes tremem, busco pelo meu irmão e ele continua
concentrado digitando em seu notebook enquanto conversa com nosso pai.

— Mexe — Lorran pula inquieto na cadeira.

Deixo o gatinho ao seu lado e removo meu cinto de segurança, corro para o
banheiro enquanto as cadeiras do avião vão sendo tomadas, uma a uma pela
escuridão.

Entro na cabine e a fecho, acendo a luz, e ela não responde. As mãos


tremem ao buscar o celular no bolso e ligar a lanterna. A densa escuridão devora
a iluminação proveniente do aparelho. Me encolho no chão e prendo a cabeça
entre as pernas, o ar escasso nos pulmões.

É sempre assim quando tento me aproximar dele, as sombras vêm me


buscar, lembrando que eu não posso contaminar o Lorran.

Ele é o pequeno anjo que a Blanca deixou para iluminar o mundo, e eu...

Eu não sou nada...

Além da destruição.

****

— Levi? — Louis me chama do outro lado da porta — o avião vai pousar,


você precisa voltar para o seu lugar.

— Certo — respondo com a voz rouca.


Levanto a cabeça esperando encontrar as sombras e sou banhado pela luz
invadindo a janela do banheiro.

Não sei quanto tempo passei na cabine, as costas doem pela posição
encolhida, os olhos ardem, e a garganta arranha. Evito encarar o meu reflexo no
espelho, lavo o rosto e abro a porta.

Louis me encara de testa franzida.

— Tudo bem? Você passou muito tempo aí dentro.

— Não precisa se preocupar — desvio dele, é doloroso encarar meu irmão


e a preocupação em suas faces.

— Filho — meu pai chama com o tom de voz preocupado, que faz eu odiar
cada segundo, por causar sofrimento a ele pelo meu estado.

— Estou bem — passo por ele.

A mão áspera agarra meu pulso e sou puxado para um abraço. Nunca fui
bom em controlar as lágrimas, e quando recebo o calor do meu pai, derretendo o
gelo em meus ossos, eu soluço.

Eu não tinha o direito de o preocupar desse jeito. Louis não deveria parar
de trabalhar para ficar checando se eu me matei, ou se não expus o Lorran a uma
situação deplorável.

Se eu sumisse, eles nunca mais teriam de se preocupar.

Antes que o pensamento ganhe forma, eu o movo para longe. Sacudo a


cabeça, e dou leves tapas nas costas do meu pai, indicando que ele pode me
soltar. Os olhos iguais aos meus me encaram, preocupados e cheios de amor, não
consigo corresponder ao seu sentimento.
Abaixo a cabeça e retorno ao meu acento. Lorran dorme agarrado com suas
pelúcias, melhor assim, quanto menos contato tivermos, mais eu o protejo.

Agulhas perfuram meu peito por saber que o Lorran nunca soube o que era
ser olhado com amor paternal, como o meu pai faz por mim.

O que eu estou fazendo com nosso menino, Blanca?

Enquanto a aeronave perde altitude, eu choro silencioso. Decepcionado


comigo mesmo por infligir sofrimento ao Lorran, ele não merecia esse destino.
Não merecia um pai de bosta como eu.

O avião pousa e o trajeto ao apartamento é lento e angustiante. Preciso me


esconder na segurança do meu quarto. Os efeitos do delírio de antes retornam, e o
mundo começa a escurecer, quanto mais avançamos cidade adentro.

Uma das terapeutas que tive, disse que isso era um efeito da depressão. O
mundo perdendo a cor, tornando-se frio e indesejável de se viver, quando nos
perdemos dentro de nós, incapaz de encarar a realidade e enfrentar os problemas.

Já faz dois anos que a Blanca morreu, ainda não superei a sua perda, e vivo
em um eterno luto.

O pavor de me tornar a razão da morte da minha família, de machucar


Lorran, ao ser um pai para ele, e depois o fazer sofrer por eu partir.

Não estou pronto para encarar a realidade: um mundo em que a Blanca não
existe, e que eu deveria ser o pai para o pequeno anjo que não me vê como tal,
por consequência das minhas ações. Se eu sumir agora, ele não sofrerá como eu
sofri com a morte da minha mãe.

O Lorran tem o Louis, e o Louis tem o Lorran.

Não precisam de mim, e mesmo assim não me deixam ir embora.


Chegamos no apartamento, e termino o tour até saber onde é o meu quarto.
Me deito, fugindo da realidade que me esmaga. Os gritos animados do Lorran
explorando com o tio preenchem meus ouvidos, como eles conseguem ser felizes
nesse mundo escuro e frio?

****

— Estou saindo Levi, vamos? — Acordo com o Louis batendo na minha


perna.

— Você vai me deixar em paz se eu for? — coloco a cabeça para fora da


coberta, o sol ilumina o dia.

— Deixarei pelo resto da noite.

Eu me escondi do mundo enquanto tudo continuava sombrio. A luz, que


poucas vezes eu via na Itália, brilha ao ponto de ser cegante. Talvez seja um sinal
de que algo de bom possa vir desse passeio.

— Cazzo — reclamo saindo da cama.

Tomo um banho rápido sem me importar se estou me lavando direito. Faço


o mínimo para que o Louis não me mande tomar outro. As parcas energias que eu
tenho, vão embora quando chego na sala, sento-me no sofá, e vejo o Lorran
brincar com o Ipad, enquanto um desenho passa na tv.

Observo meu filho distraído com o jogo, quando as nuvens de sombra


rondam ao seu redor. Não faz nem cinco minutos que estou na sua presença e o
contamino. Eu não mereço olhar para esse anjo, eu não mereço continuar aqui.

Levo as mãos ao rosto, evitando que o Lorran perceba meu choro, o peito
queimando pelo desespero.
Mãos pequenas seguram as minhas, e relutante eu deixo o Lorran me fazer
o encarar. Meu menino coloca o Ipad na minha mão, impedindo que eu tampe o
rosto novamente, dá play numa música infantil, italiana, e começa a dançar e
bater palminhas. As nuvens vão embora, sendo iluminadas pelos raios que o meu
pequeno provoca.

Rio da sua dancinha, deixo o aparelho de lado e começo a bater palmas


com ele, que gargalha gostoso quando percebe que estou brincando junto.

Aos poucos a queimação diminui, e consigo respirar novamente. Quero


tocar o Lorran, e o puxar para um beijo, mas não posso macular sua aura
brilhante com a minha.

Não é justo com ele.

— Vamos? — ele estende a mão, e tremendo, eu seguro sua mãozinha,


rezando para que ele não se contamine.

— Levi — fecho as pálpebras tentando conter as lágrimas. Meu filho nunca


será capaz de me chamar de pai, enquanto eu continuar não sendo um para ele —
você tá bien?

Forço a voz para responder, não quero que ele se preocupe. Embora, não
consiga controlar o choro.

— Sim, e você?

— Tambum, não clhola, eu te dou popolate [1]— à lembrança da minha mãe


fazendo isso, para acalentar meu choro quando era pequeno, sorrio para o Lorran.

— Obrigado, já me sinto melhor — mordo o doce, e divido com ele a outra


metade.

— ZIOOOOO! — Chama impaciente quando termina de comer o doce.


— Vamos passear? — Louis tem os olhos vermelhos quando estende a mão
ao Lorran.

Talvez ele tenha observado escondido a minha interação com o Lorran.


Louis acredita que um dia eu serei um pai para o pequeno. Preciso poder acreditar
também, ou nunca poderei olhar para o Lorran sem medo de o contaminar.

— Bolha[2] — pula animado, ainda segurando a minha mão ele pega a do


tio e dispara para a porta.

Eu sei que não tenho o direito, mas por um segundo eu anseio ser um pai
para o Lorran.
Olivia
Foi paixão à primeira vista.

Meus relacionados se iniciavam com essa frase, e pouco tempo depois, eu


descobria que foi, ilusão à primeira vista.

Tenho 26 anos, sou formada em pedagogia, trabalho em uma creche com


crianças fofas e preciosas.

O desejo de ser mãe surgiu cedo em mim, após cuidar da minha irmã mais
nova, Bianca, após nossa mãe morrer de câncer, quando eu tinha 6 anos.

Guardo lembranças preciosas com ela no meu coração, e tentei ser tudo que
a Bianca precisava enquanto crescia.

Um dia eu esperava minha mãe me acordar para a escola, no outro eu usava


o despertador. Tirava o leite da geladeira e fazia pão com manteiga para tomar
café, enquanto o meu pai chorava pela perda da esposa.

Eu levantava a Bianca, dava de comer a ela, beijava sua testa, a do meu pai,
e depois saia para a escola.
Tinha acabado de iniciar a alfabetização, e a escola ficava a duas ruas de
distância.

Geralmente, as vizinhas que levavam os filhos, me faziam companhia e


tomavam cuidado para nada acontecer comigo no trajeto de ida e volta para a
escola. Foi assim que eu me criei sozinha, vendo meu pai chorar pelos cantos,
minha irmã chamando pela mãe, e eu engolindo o choro, para ser forte por eles.

Meu pai só acordou para a vida e voltou a trabalhar, quando os alimentos


começaram a faltar dentro de casa, e ele me viu pedindo comida nas vizinhas,
para que a Bianca pudesse comer.

Desde então, tem sido mais presente e cuidadoso, não deixando faltar nada.

Eu me ressinto com meu pai, não tive uma infância, cuidei dele, da minha
irmã, e quando adolescente, precisava ouvir o quanto era importante eu me
manter pura. Brigávamos muito, e em algumas dessas brigas, cheguei a jogar na
cara dele que era um péssimo pai, por ter nós abandonado quando nossa mãe
morreu.

Naquele dia, ele entendeu a dor que carreguei durante anos. Nunca deixei a
Bianca saber como eu me sentia, quero protegê-la de tudo e todos, inclusive dos
sentimentos ruins que guardo dentro do peito.

Foram longos anos até a Bianca se tornar independente, hoje ela se formou
e conseguiu um emprego estável em uma grande empresa. Não poderia estar mais
orgulhosa da minha menina.

Finalmente, senti que estava livre do dever de cuidar da Bianca, e podia


aproveitar mais a mim mesma.
Sou namoradeira desde a adolescência, nunca fui muito fundo com os caras
que conhecia, a maioria se mostravam babacas que não mereciam o meu tempo.
E o medo de transar e engravidar jovem, me apavorava a alma.

Passei anos virgem, mesmo gostando de dar uns beijinhos em carinhas


bonitos. Todos faziam por onde partir meu coração, e como uma boba, continuei
acreditando no amor, que alguém cuidaria de mim, veria minhas feridas e beijaria
todas com paixão.

Quando conheci o Roberto na faculdade, fazíamos o mesmo curso, ele era


divertido, extrovertido, cheio de vida, e se dava bem com as crianças do nosso
campo de estágio. Passei quatro períodos apaixonada, ele me deu uma chance,
jantamos, conversamos, e nos beijamos.

Daquela vez eu estava certa: ele era o cara, o homem da minha vida,
casaríamos e teríamos uma família. Me entreguei a paixão sem pensar duas
vezes, eu tinha certeza da pessoa ao meu lado, não existiam motivos para recusar
suas investidas, transamos muitas vezes, apaixonados, eu sentia que ele era o meu
porto seguro. Éramos um casal que se amava.

Durante a formatura, Roberto levou a família dele, fiquei nervosa,


acreditando que conheceria meus sogros naquela noite. Quando cheguei ao teatro
com a minha família, eu o vi, lindo, de beca e capelo, sorrindo enquanto tirava
fotos.

Eu dei um passo em sua direção, no segundo travei no lugar, e senti o


coração espetado por uma estaca.

Roberto segurava uma mulher nos braços, ele a abraçou demoradamente,


tiraram fotos, e quando achei que ele a largaria, seus lábios se tocaram, e sua
família aplaudia.
Desnorteada, fui até ele, sua expressão não se abalou, me apresentou como
uma amiga do curso, e nada mais.

Fiquei sem chão, as mãos suando frio, a vista embaçada. Travei o choro,
cumprimentei aquelas pessoas, e quando ficamos em fila para entrar com os
padrinhos, eu me agarrei ao meu pai e escondi o rosto em seu ombro. Sem dizer
mais nada, ele segurou minha cabeça, beijou minha testa e disse o quanto me
amava e estava feliz pela minha conquista.

Não sei como sobrevivi a formatura, quando tudo acabou, encontrei o


Roberto em um restaurante, dias depois.

Confusa e desnorteada, ouvi enquanto ele ficava surpreso, por eu declarar


meus sentimentos, chorando por ser usada.

Sem arrependimentos ele me disse; ... “Eu nunca te pedi em namoro, não
foi minha culpa se você se iludiu”.

Mais uma vez, o “amor à primeira vista” tornou-se “ilusão à primeira


vista”. Após o Roberto, não consegui me relacionar com outros homens de forma
afetiva, o medo de me machucarem persistia enraizado na minha alma. Aceitei
que nasci para cuidar, e não ser cuidada.

Os anos foram passando e a vontade de ser mãe crescendo novamente. Eu


já não tenho esperanças de formar uma família com um homem, por isso, decidi
que teria meu filho sozinha.

Busquei os meios legais que poderia fazer isso e fiz o meu cadastro para a
adoção, também procurei por meio de inseminação artificial, mas com o que
ganho no momento, não conseguiria pagar o procedimento.
Faz dois anos que entrei no cadastro de adoção e fiquei perplexa quando
me perguntaram qual o tipo de criança que eu queria, se era branca, negra,
menina, menino, olhos azuis ou marrons, e todo o tipo de pergunta absurda.

Senti que estava montando um sanduíche em vez de me preparando para


receber meu filho.

Fui enfática quando disse que não tinha preferência de nenhum tipo, que
queria uma criança para amar e ser amada, que aceitava grupos de irmãos, e
crianças com deficiência, pois se estivessem sendo gerados no meu ventre eu
nunca poderia escolher como eles seriam.

É injusto que o sistema de adoção tenha uma seleção ridícula como essa. A
moça ficou feliz pela minha resposta, e disse que quando uma criança com o
perfil que escolhi aparecesse, eu seria chamada, e depois seguiríamos o processo
de adoção.

Até o momento não consegui nada, pois a ordem, é de acordo, com as


famílias que se inscreveram antes de mim.

O fato de trabalhar em uma creche particular e de prestígio vai me ajudar se


eu pegar uma criança com menos de 6 anos. A levaria de dia para o trabalho
comigo, e a noite ficaríamos em casa, seria mãe solteira em tempo integral.

Estou quase enlouquecendo com a angústia e incerteza de não saber se


conseguirei realizar meu sonho, e transando com o primeiro que aparecer, vou
furar a camisinha, e depois o cara nunca vai saber que me engravidou. Terei meu
bebê e poderei realizar meu maior sonho, ser mãe.

Amar alguém sem esperar nada em troca, criar uma pessoa, ser o seu ponto
seguro, a felicidade, o mundo de uma pequena parte minha. E esse pequeno ser
que nascerá de mim, vai me amar incondicionalmente, e quando eu ficar
velhinha, serei cuidada, amparada, e finalmente poderei descansar em paz.
— Olivia — a supervisora me chama, deixo meus alunos que pintam e vou
até ela.

— Sim?

— Precisamos da sua ajuda — Ela olha a sala e depois a mim — pode ir


até a direção, eu fico com eles.

— Certo.

Caminho pelas paredes coloridas, pintadas com animais e bonecos infantis.


Eu amo trabalhar na Creche Zoológico dos Pequenos. Consegui esse emprego
graças ao meu pai, por ser segurança particular do dono, falou bem de mim, e o
convenceu a me dar uma chance.

Tenho minhas desavenças ideológicas com meu pai, mas ele nunca deixou
de me amparar por brigarmos e pensarmos diferente. Bato na porta da diretora, e
quando entro, levo um segundo para processar o homem a minha frente.

Uma beleza destruída.

Louro dos olhos azuis. Alto e magro, ao ponto de a roupa ser folgada. Os
ombros encolhidos, e a expressão desolada, com olheiras negras e olhar
quebrado.

Ele é lindo, mesmo parecendo destruído.

— Ah, Olivia! — Dolores, a diretora me cumprimenta. — Preciso da sua


ajuda, meu italiano não está funcionando bem — ela ri sem graça.

Dolores não fala uma palavra em italiano, é fluente em inglês e espanhol,


mas nunca se dedicou a outros idiomas.

— Como posso ajudar? — entro na sala ficando ao lado do homem.


Observo ao redor, e vejo o pequeno menino, brincando na mesinha no
canto da sala. As bochechas mais gostosas que já vi, tenho vontade de ir até ele e
bagunçar o cabelo de fios dourados como ouro.

— Levi deseja matricular o Lorran na nossa creche, mas ambos só falam


italiano.

Contenho o ímpeto de arquear a sobrancelha. É comum em países da


Europa, eles serem dotados em mais de uma língua, aprendem no dia a dia novos
idiomas. Principalmente aqueles que tem empregados em suas residências, que se
originam de outros países.

— Nem inglês? — questiono.

— Ou ele não fala, ou não quer se comunicar comigo — fala baixinho,


envergonhada.

— Entendi, serei a intérprete — sorrio para o homem que me ignora, como


se eu não existisse.

— Vamos — Dolores aponta a cadeira a frente e me sento, Levi faz o


mesmo.

O cheiro dele não é exatamente agradável, como se tivesse tomado banho


às pressas e esquecido de passar um desodorante ou perfume. Fico preocupada
quanto a criança por conviver com esse homem como seu pai. Onde estará a mãe
do menino?

— Bom dia, você trouxe os documentos do seu filho? — pergunto em


italiano, ele pega uma pasta na bolsa, e me entrega.

— Estão todos aqui dentro — responde também em italiano, a voz grave


em tom baixo me causa pequenos arrepios.
Continuamos o processo de matrícula, enquanto eu sou a intérprete para
que ambos possam se entender. Quando terminamos, ele diz que trará o menino
no dia seguinte, e o chama.

O pequeno pega a folha em que desenhava e entrega ao pai, as mãos dele


tremem ao segurar o papel, e um pequeno sorriso desponta no canto de seus
lábios, antes dele fechar a expressão novamente e estender a mão, segurando a do
filho e partindo.

Queria ter tido tempo de conversar mais com a criança. Ele parece um
doce, e muito fofinho.

— Coloca o menino na minha turma — peço a Dolores.

— Já estava pensando em fazer isso — ela me entrega os papeis da


matrícula — a mãe do menino faleceu quando ele nasceu. — Ela lê a ficha e bate
na testa — esquecemos de pedir um número reserva, de outra pessoa que fique
responsável pelo Lorran, caso não consigamos contatar Levi.

— Foi a confusão pela tradução do idioma — sorrio para ela — quando ele
vier amanhã deixar o Lorran pegaremos o contato.

— Sim, por favor, não esqueça.

— Pode deixar.

Sorrio, e retorno a minha sala, a lembrança do pequeno italiano


preenchendo meus pensamentos.
Levi
Fico intrigado pela cara de idiota do Louis.

Já faz mais de uma hora que ele retornou da empresa, após o segundo dia
de trabalho, e continua encarando a tela do notebook sem digitar uma palavra no
arquivo aberto, ou mudar a página.

— O que você tem? — pergunto, sentando-me ao seu lado.

— Nada, por quê? — sacode a cabeça e bate no rosto, sinal de quando ele
precisa manter o foco.

— Já faz mais de uma hora que você encara esse notebook sem fazer nada
— aponto a tela — sei que não sou a melhor companhia dos últimos tempos, mas
se quiser conversar — dou de ombros.

— Não aconteceu nada de mais — fecha a tela, coçando a cabeça. — E


você não é uma companhia ruim, só não está no seu melhor momento.

— Corta o papo furado e diga logo o que aconteceu. Aproveite que estou
mostrando interesse.
São raros os dias em que realmente tenho vontade de conversar com o
Louis. Após matricular o Lorran, me sinto mais disposto a fazer alguma coisa,
além de ficar trancado debaixo das cobertas.

— Tem essa mulher — faz gestos com as mãos — a gente se conheceu na


festa da empresa. Transamos, e descobri que ela é minha secretária.

— Porra! Logo você que não se envolve com funcionárias.

— E isso não é a pior parte. — Ele se levanta andando de um lado ao outro


— ela me disse que era virgem, aquilo mexeu comigo, e fiz sexo mais carinhoso,
com cuidado — Louis esfrega o rosto — quantos cabaços você já tirou?

— Alguns — dou de ombros, não me importo muito com essa parte. —


Que diferença isso faz?

— TODA — Exclama abrindo os braços. Fico surpreso por sua reação,


Louis tende a ser calmo e calculista.

— Não sei se entendi — coço a cabeça, tentando acompanhar o raciocínio


dele.

— Quando uma cereja é estourada tem sangue. Quando olhei os lençóis e a


camisinha, não encontrei nada. Acredito que ela mentiu para mim, deixei um
pagamento pelo sexo e fui embora. E agora a desgraçada é minha secretaria, e
fica me olhando como se eu fosse o babaca da história, e não ela a mentirosa!

— E se ela não estiver mentindo? Não conheço a moça, mas sei que nem
toda primeira vez é igual.

— Não, isso é uma regra — bate na mão irritado — toda mulher na


primeira vez sangra em algum momento, durante ou depois. Mas não tinha nada
que provasse que ela era virgem!
— E qual a teoria maluca que passa pela sua cabeça?

Louis às vezes tende a ser muito insistente, quando convicto de algo.


Dificilmente ele escuta outras pessoas, não conheço a mulher, e não posso atestar
por sua honra. Contudo, não estou convencido sobre a certeza do meu irmão
nesse caso.

Se tratando de mulher, ele perde a razão, e suas desconfianças o fazem


quase alucinar bolando teorias conspiratórias de que toda mulher do mundo quer
ferrar com a vida dele.

O histórico do Louis é péssimo com mulheres querendo o enganar, ao


contrário de mim, que até conhecer a Blanca, era um apaixonado pelo corpo
feminino e me envolvia sem medo.

O Louis se envolve cheio de desconfianças, muitas mulheres tentaram


enganar meu irmão com falsas virgindades e gravidez, para o fazer casar com
elas. Até da Máfia Italiana ele já foi alvo de golpe para casamento.

— Ela usou a cartada da virgindade para me fazer ser delicado com ela,
criar apego — morde o lábio, enraivecido — ela me paga, vou fazer com que
confesse que mentiu para mim.

— Lembre-se que no trabalho você é o chefe dela — estico as pernas e o


pescoço — se o pai descobrir isso, vai arrancar suas bolas.

— Ele não vai ficar sabendo de nada — me encara com seu olhar de águia
— e você vai continuar calado sobre isso.

Simulo um zíper sendo passado na boca e jogo a chave fora. Louis suspira,
sentando-se ao meu lado novamente.

— Faz tempo que não reclamo de mulher com você — bate na minha coxa
— obrigado por me ouvir.
— Quer minha opinião? — ignoro o sentimentalismo sobre como temos
nos afastados durante a minha depressão.

— Manda.

— Talvez ela não tenha mentido. Não sabemos ao certo como a virgindade
é tratada no Brasil, vai que ela fez algo para esconder o sangue.

— Até da camisinha?

— Seu nojento — me afasto dele e Louis gargalha.

— Não tem como eu ter errado, pensei em todas as possibilidades para essa
situação. — Pega o notebook e se levanta — vou fazê-la confessar que tentou me
enganar.

Vai embora resmungando sobre nunca ser feito de trouxa. Enquanto eu me


apaixonei somente por uma mulher, o Louis nunca experimentou o sentimento.
Sempre correndo, buscando realizar com perfeição os estudos, encargos na
empresa, e atento a todas com quem se envolvia.

A dor de perder quem ama é excruciante. Desejo que meu irmão nunca
passe por tal sentimento.

O Brasil tem de ser bom para um de nós dois.

Continuo na mesma, um pai de bosta, e irmão pior ainda.

— Eu adloro popolate — Lorran entra cantando na sala, com as bochechas


cheias de chocolate e as mãos segurando a barra devorada.

— Quem te deixou comer todo esse doce? — inclino na sua direção.


Percebendo que não está sozinho, Lorran trava no lugar e os olhos
arregalam de susto. Enfia o resto da barra de uma vez na boca, e desvia a atenção
para a janela da sacada. As mãos rapidamente vão para trás do corpo.

— Não adianta esconder Lorran, eu vi que você comeu chocolate —


verifico as horas no relógio — daqui a pouco é a sua janta, quem te deu
permissão para comer doce?

— Zio — continua desconfiado.

— Não pode mentir Lorran, é errado. — Fico de joelhos — vá tomar um


banho, você não pode comer chocolate antes das refeições.

Lorran faz bico, os olhos ficam vermelhos e o choro irrompe como uma
represa sendo aberta.

— Não tem motivo para chorar — falo, e ele grita, intensificando o choro.

— Stronzo! — Grita.

— O que aconteceu? — Louis entra na sala, ver o choro do Lorran, e a


mim, ele coloca as mãos na cintura e fecha a cara.

— Zio! — Lorran soluça indo para os braços do tio — Levi bligo imo[3].

— Por quê? — Louis não se importa com a sujeira do chocolate no Lorran,


o pegando no colo.

— Num tei — se encolhe no pescoço do tio.

— Levi? — pergunta, os olhos desconfiados de que briguei com o Lorran.

— Eu só disse para ele não comer chocolate antes da janta — me levanto.

O incômodo por fazer o Lorran chorar espezinha meu peito.


— Desculpa Lorran, me perdoa — a voz embarga, a visão embaça, o bolo
na garganta dificulta falar.

— Você tem razão — Louis encara o Lorran — não pode comer chocolate
antes das refeições, Lorran.

— Eu sou um merda — encolho — se tivesse te deixado falar, ele não teria


chorado — soluço, sem coragem de encarar aos dois — me perdoa.

Peço, saio da sala, o caminho para o quarto é tomado pela escuridão. Abro
a porta e a fecho com um baque, não conseguindo ouvir as vozes que chamam
meu nome.

A mão treme, e as pernas cambaleiam ao andar até o armário com meus


remédios. Jogo as roupas no chão, e pego os comprimidos, engolindo sem água,
encolhido no canto da parede, eu sou envolto pela escuridão que me abraça.

Eu não devo me aproximar do Lorran, vou continuar magoando seu


coração e o fazendo sofrer enquanto estiver ao seu lado.

****

Desperto com o som do celular tocando, meio grogue, me arrasto pelo


quarto até encontrar o aparelho em cima da mesa. Um aviso toca na tela “deixar
o Lorran na creche” o efeito dos remédios de ontem ainda impregnado em meu
organismo.

Deveria mandar o Louis acompanhar o Levi para a creche em vez de fazer


isso sozinho, posso acabar magoando novamente os sentimentos do pequeno.

Batidas soam na porta seguido da voz

— Senhor Levi, hora de deixar o Lorran na creche — a governanta fala em


português. Não a respondo, não quero que saiba que entendo seu idioma.
A cabeça explode e o estômago revira, a ânsia de vômito misturada com a
náusea. Preciso de um comprimido, abro a gaveta e pego um antiácido, e um para
a dor. Engulo ambos no seco, sacudo a cabeça e me levanto.

Abro a porta, e a escuridão continua em todos os lados. Caminho com


dificuldade até a sala onde o Lorran me espera com a mochila e animado para ir à
creche.

Ele prefere ficar lá do que no apartamento comigo, mas por qual razão ele
iria preferir a mim? Não passo de uma praga em sua vida.

— Vamos — chamo.

Ele se levanta e vai para a porta sem esperar por mim. Descemos em
silêncios no elevador e permanecemos assim durante o trajeto para a escola.

Louis não confia em deixar o Lorran sozinho com um segurança o


buscando e trazendo dos lugares, tem medo que algo de ruim aconteça, e que o
Lorran precise de um responsável para o socorrer.

Eu não sirvo de nada.

Ele fica mais seguro com o motorista do que comigo.

A cidade é tomada pelas sombras, as pessoas andando na calçada são


sugadas e desaparecem. Lorran brincando com o tablet ao meu lado é envolto
pelas nuvens negras.

— Lorran — chamo seu nome, com medo dele ser machucado — o que
você quer fazer hoje? — Tento uma conversa, qualquer coisa capaz de o manter a
salvo.

— Num sei — dá de ombros e continua jogado no tablet.


— Quer ir ao zoológico? — pergunto, sem saber ao certo o que estou
fazendo.

O desesperado para o afastar da escuridão que consome o mundo,


atormenta minha mente, confunde o que eu posso fazer para ajudar meu filho. Ele
não merece ser tomado por essa dor.

— Sí — finalmente me olha, os fios de ouro brilham espantando as


sombras ao seu redor.

— Combinado.

Chegamos à creche, e as sombras permanecem ao redor. Desço com ele do


carro e o levo a sua sala, tentando não demonstrar o quanto estou desestabilizado.
Na porta, a professora espera por ele, ela sorri iluminando o corredor e mandando
embora as trevas negras.

Lorran vai ficar seguro enquanto a tiver por perto.

Entrego meu filho ao raio de sol e vou embora, dominado pela tempestade.
Vejo o carro me esperando, se eu sumir e deixar o Lorran com aquela mulher, ele
nunca mais ficará envolto da dor, poderá sorrir novamente e ser feliz.

Não penso muito quando ignoro o carro e ando sem rumo pela cidade.

E não contaminarei meu filho, ele merece a luz.


Olivia
Lorran se joga nos meus braços quando o pai vai embora. Divido a atenção
entre o pequeno sorridente, e o homem de ombros curvados e expressão
desesperadora.

Ele parece a ponto de pular de um penhasco, não sei explicar, mas tenho o
impulso de querer o segurar.

— Tudo bem fofinho? — pergunto em italiano, o menino ganha vida ao


ouvir seu idioma, e sorri, mostrando os dentinhos de leite.

— Sí, como tchama[4]? — eu sou apaixonada em bebenez, as línguas que


somente essas coisinhas preciosas falam e conseguem entender. Ainda mais
quando acrescentado o sotaque italiano, da vontade de morder as bochechas dele.

Lorran é muito fofinho e simpático, de cara se jogou nos meus braços e me


recebeu com um sorriso no rosto. Meu útero coça de vontade para ser mãe ao
olhar essa fofura, e imaginar como seria ele me beijar a bochecha e chamar de
mamãe.

— Sou a Zia Olivia — seguro sua mão e o coloco no chão — vamos


conhecer seus colegas de classe?
Lorran acena em positivo, pede colo novamente, e fico com vontade de
ceder ao seu pedido. Me controlo quando a mãe da Suzana chega trazendo a linda
menina, negra de cachos esvoaçantes, que parecem uma coroa ao redor do rosto
redondinho e bochechudo.

— Vivia! — Lorran chama insistindo pelo colo e o pego, entendo a


necessidade especial de uma criança estrangeira em uma sala que ninguém fala
seu idioma. Ele me vê como um porto seguro, alguém que o entende e será capaz
de o ajudar.

Acho muito fofo ele me chamar de “vivia” em vez de Olivia ou de Zia,


como me apresentei. Seguro o fofinho e sorrio para a Suzana e a mãe dela, Carla.
Ambas sorriem ao me ver, e a menina pula no colo da mãe, querendo o abraço
que dou em todos os meus alunos ao recebê-los na porta da sala.

— Bom dia, Carla, e Suzana — beijo a mão da Suzana e sorrio para Carla.

— Que menino mais lindo — Carla pega na mão do Lorran e ele se derrete
sorrindo para ela, dengoso. — Que fofura, meu Deus! — A voz dela fica um
oitavo mais alta, chamando a atenção das mães que estão no corredor — ele é
brasileiro?

— Não, italiano — respondo, logo uma rodinha se forma ao nosso redor, e


Lorran fica todo tímido, sorrindo com as bochechas vermelhas e se encolhendo
nos meus braços. — Não fala português ainda.

— Ele é um fofo! — Dona Paola diz, uma senhora rica que sempre deixa
os netos na creche. — Come sta il bambino[5]?

— Bene — Lorran responde e faz um “ploc” com a boca, fazendo a


senhora levar as mãos as bochechas e gargalhar encantada pelo carisma do
pequeno.
— Ele lai ser nosso toleguinha? — Suzana pergunta, a língua embolada
para falar, ela tem dois anos e quatro meses, e é a minha gostosa, sou apaixonada
por todos os meus alunos, e quando eles falam em bebenes preciso me controlar
para não morrer de amores todas às vezes.

— Sim, vai ser amiguinha dele? — pergunto a ela que acena em positivo e
estende a mão para o Lorran.

— Sou a Suzana — fala orgulhosa, e Lorran, apesar de não entender o que


ela diz, segura a mão dela de volta e sorri.

— Ele não fala português ainda, Suzana — a mãe dela fala — seja
boazinha com ele e o ajude, assim como a mamãe te ensina a falar, combinado?

— Sim mamãe.

— Até mais Olivia — Carla se despede, dá um beijo na filha e vai embora.

— Bom dia, senhoras — digo para as mães no corredor — vou começar a


aula com os pequenos.

— Até mais.

— Depois voltamos para ver o fofinho.

— Tenham um bom dia crianças.

— Te vejo mais tarde.

Elas falam e vão embora quando fecho a porta.

— Lorran, seu pai colocou as coisas que pedi na sua mochila? — pergunto
em italiano e ele dá de ombros.

O coloco no chão e pego sua bolsa para guardar na estante junto da mochila
dos outros alunos. Abro e vejo que a lista dada ao Levi ontem foi cumprida à
risca, toalha para banho, escova de dentes, troca de roupa, e frauda, lençol para
dormir o sono da tarde, dentre outras coisas, tudo bordado com o nome dele na
ponta.

Ao menos isso, Levi conseguiu fazer, tinha a impressão de que o homem


passaria a noite trancado em um quarto afundando em choro. Eu entendo a dor
que a perda do conjugue pode causar na pessoa, vi isso acontecer com o meu pai.
Mas em hipótese alguma podemos deixar a dor consumir nossas vidas e
abandonar os filhos.

É neles que devemos encontrar forças para continuar seguindo em frente, e


por eles, não desistir da vida.

— Lorran, sempre que sentir dificuldade em se comunica com seus colegas


me avise, vou apresentar você a eles — pego sua mão e ficamos na frente da
turma — atenção, crianças, esse é o Lorran, ele é italiano e ainda não fala
português, sejam bonzinhos com ele e o ajudem a entender as coisas, a paciência
é fundamental. Posso contar com a ajuda de vocês para o Lorran ser bem
recebido?

— Sim, tia Olivia — respondem em uníssono, e sorrio para os meus


pequenos.

— Hoje vamos aprender as cores em português, e em italiano, para que o


Lorran possa entender, se tiverem dúvidas perguntem, certo?

— Cerlo — respondem, e sorrio para eles.

— Lorran pode sentar-se com seus colegas — aponto a todos que sentam
espalhados em cima do tatame no chão da sala — hoje vamos aprender o nome
das cores, vou ensinar em italiano e português, quero que você preste atenção, ou
se sentir dificuldade, me fale, desse jeito poderá aprender mais fácil a língua,
combinado? — falo em italiano com calma, sendo observada pelas pedras azuis
que ele tem nos olhos.

— Sì zia Vivia — senta ao lado da Suzana que sorri para ele, e Lorran faz o
mesmo.

Inicio a aula, e tudo corre bem, noto que algumas crianças se divertem mais
do que outras, aprendendo italiano, e ficam repetindo as palavras até acertarem a
pronúncia correta da cor no outro idioma.

Na hora do almoço os levo para o refeitório, e cada um faz sua refeição,


Lorran se adapta fácil aos meninos, mesmo não conseguindo falar no mesmo
idioma que os outros, eles fazem gestos para sinalizar o que querem dizer.

Após o almoço, os levo ao banheiro, primeiro as meninas, e os meninos


acompanhados de outro professor para o banho e escovar os dentes.

A hora da soneca é tranquila, meus anjinhos dormem nos colchonetes com


seus lençóis, e eu aproveito para corrigir a folha que eles me entregaram da
atividade de sinalização das cores.

Fico feliz ao ver que muitos escreveram em português e italiano, e que o


Lorran fez em ambos os idiomas. Trocaram muitas letras, e algumas palavras em
outro idioma, ficaram erradas. Fico feliz por meus alunos serem fofos e se
preocuparem com a inclusão do coleguinha, torço para que ele consiga se adaptar
bem.

A hora de ir embora chega, e um a um vou deixando os pequenos com seus


responsáveis até sobrar somente o Lorran, que brinca no caderno de desenho, não
parecendo preocupado com o pai não ter aparecido ainda.

— Lorran, seu pai sabe a hora de te buscar? — pergunto e ele dá de


ombros.
— O Levi?

É estranho que ele conheça o pai pelo nome.

— Vamos esperar mais um pouco.

E esse pouco se torna em mais uma hora, já são 19 horas e nem sinal do
Levi aparecer. Fico com o Lorran na sala da diretora, que preocupada tenta
contato com Levi e nada.

Vejo o menino que dorme no sofá, tentando encontrar uma solução, olho na
folha de contatos e o nome Vittileno se destaca e um pensamento me ocorre.

— Quais as chances de ele ser irmão do Louis Vittileno? — pergunto a


diretora, busco o celular no bolso e procuro o número da minha irmã.

— Altas — ela me encara com esperança de uma solução — você tem o


número da empresa? Podemos tentar contato.

— Minha irmã é secretária do Louis, vou ligar para ela.

Bianca atende no primeiro toque.

— Oi, maninha — tento disfarçar a preocupação no tom de voz.

— Estou ocupada — sussurra, odeio a incomodar, sabendo como seu chefe


é chato.

— Preciso da sua ajuda, você trabalha para o Louis Vittileno, né?

— Sim.

— Preciso que você avise a ele que estou com seu sobrinho, o pai não o
veio buscar, e nem o motorista, preciso saber onde é a casa dele para o deixar lá,
mas o Lorran não sabe, e na secretaria o pai deixou somente o número dele para
contato, ao qual não é atendido as ligações, e o endereço ele não soube dar, ficou
de o trazer depois, e não fez.

— Minha nossa, deve ser por isso que o Louis está uma fera. — Bianca
exclama, e quase posso a ver colocando a mão no peito preocupada.

— Imagino, pode passar para ele?

— Eu vou tentar, mas não se assuste com os gritos dele.

Tenho vontade de socar o Louis por fazer minha irmã ter medo, contudo,
no momento, preciso manter a calma e garantir que Lorran possa voltar para casa
em segurança.

— Fique com o Lorran aí, já mandei um carro buscá-lo, por favor, o


acompanhe até em casa, não gosto de deixá-lo sozinho nos veículos.

O homem é uma escavadeira me dando ordens sem nem dizer “oi”


primeiro. O sangue ferve pela sua grosseria, e o estresse causado pelo Levi faz
com que eu não consiga segurar a língua.

— Senhor Vittileno seja educado! Estou há mais de duas horas tentando


contatar uma pessoa que possa vir buscar o Lorran, e não fui mal-educada com
você! Guarde seus gritos para o irresponsável do Levi, e não para quem está
tentando resolver a situação.

O homem suspira do outro lado e fica mudo por breves segundos, estou
pronta para uma briga.

— Meu irmão não está bem, mas vou providenciar que isso não torne a
acontecer, obrigado.

Sou surpreendida por ele abaixar o tom e agradecido. Ao menos se tocou


que não sou seu saco de pancadas.
— De nada, levarei o Lorran quando o motorista chegar.

Ele desliga

— O que foi isso? — Dolores pergunta.

— O cara é um mal-educado, atendeu me dando ordens e gritando!

— Que irresponsável, tenho pena do Lorran, cercado de pessoas assim.


Você vai levar o menino?

— Sim, ele me pediu para o acompanhar até em casa, vou aproveitar e


pegar o endereço e contato do Louis, caso algo assim aconteça novamente.

— Onde será que o Levi se meteu?

— Não sei — pego o Lorran no colo e coloco a mochila nas minhas costas
— mas espero que o Louis grite muito com ele.

— Não se meta nessa briga, Olivia, você é a professora do Lorran, não


passe dos limites.

— Os limites já foram passados, até amanhã.

Saio da sala não querendo ouvir mais nada, fervendo de raiva pela
irresponsabilidade do Levi, e por ouvir gritos do Louis.

Esses dois italianos que se preparem, eles vão conhecer o quanto uma
brasileira pode ser esquentada quando mexem com uma criança indefesa!
Levi
Antes que o segurança possa me seguir, eu entro em uma lanchonete e vou
para o banheiro. O horário de pico facilita que ninguém me incomode. Tranco a
porta e me sento na privada, vejo as horas e decido que vou esperar meia hora
aqui dentro, ou até alguém precisar usar o banheiro.

O tempo passa lentamente, cada minuto parece uma hora, e quando


finalmente o relógio marca que se passou meia hora eu saio. Na lanchonete as
pessoas falam alto enquanto tomam seu café da manhã, os clientes não parecem
incomodados pelo barulho no local. Aquilo fere meus ouvidos e saio olhando ao
redor para ter certeza de que o segurança foi embora.

Não conheço muito da cidade de São Paulo, vim aqui poucas vezes para
desfiles dos meus modelos, durante o São Paulo Fashion Week.

O último ano em que participei, Blanca desfilou um modelo de grávida, era


perfeito, ajustando-se as curvas, a barriga protuberante, e os pés descalços pelo
inchaço. Foi o último desfile dela, iria parar a carreira para cuidar do Lorran, mas
a morte a levou antes disso.

Caminho sem rumo enquanto as ruas que deveriam ser claras pelo sol são
sombrias e frias. As pessoas andam pelas calçadas apressadas, esbarrando umas
nas outras, ou parando nas barraquinhas de comida, e entrando nas lojas ao longo
do calçadão.

Não sei por quando tempo perambulo sem rumo, dobrando as esquinas,
passando nas fachas de pedestre.

Vejo a escada para o metrô e entro, talvez lá dentro eu consiga encontrar


um rumo para ir. Sou obrigado a comprar um cartão de acesso, o faço, e entro na
cabine lotada de pessoas.

Como é possível estar rodeado por tantos corpos e sentir o frio gelando
minha alma, sozinho. O desespero para fazer besteira se implanta na minha
mente, após muitas estações, e o metrô vagar, eu desço em uma, no bairro Vila
Olímpia.

Tem bares por todas as partes, mesas sendo abertas do lado de fora,
ocupando parte da calçada. Fito o céu que ganha um tom alaranjado enquanto o
sol de põem, trazendo a todos como é o meu mundo.

Faz um mês que não bebo, geralmente o faço escondido do Louis, e hoje,
minha boca seca de vontade por uma gota de álcool.

Como um maldito viciado, eu caminho vidrado para o bar, o cérebro


apitando e exigindo pela substância, e o entorpecimento que ela me causa.

Entro no lugar e vou direto para uma mesa, perto do bar. Os garçons se
olham e me fitam, antes de um deles vir me atender com um sorriso no rosto. Não
tenho vontade de retribuir, pego o cardápio e vejo as opções de bebida, por sorte
entrei em um que tem uísque.

— Uma garrafa — falo em português, fingir que não falo o idioma não vai
servir nesse momento.

— Pagamento no dinheiro ou cartão?


— Cartão — pego a carteira e passo na maquineta.

— Volto em um instante.

Estar no Brasil me permite não me comunicar com as pessoas ao meu


redor, e ignorar tudo que elas falam, fingindo que não entendo o idioma.

Se querem a minha atenção, que falem em italiano. A professora do Lorran


invade minha mente, a mulher de nariz arrebitado que sabe falar italiano, e pensa
que eu não compreendi o que ela falou com a diretora.

Ela nem tentou esconder a vontade que teve de questionar quando a outra
disse que eu só falava italiano. E muito menos o quanto ver o Lorran a deixou
feliz. Por que eu não consigo sentir o mesmo pelo meu filho? Ela abriu os braços
com facilidade para ele, sorriu e o cumprimento.

Lorran se jogou nos braços dela com alegria, eles nunca tiveram contato
antes, e meu filho ansiou mais pelos braços de uma estranha do que os meus. Eu
sou um bosta que não deveria sentir inveja da desconhecida. Me corrói saber o
quanto eu não sou importante para o Lorran, queria o proteger da escuridão que
me cerca, me afastando e o mantendo a salvo, mas ao invés disso estou me
tornando invisível para meu filho.

— Aqui, senhor — o garçom coloca o uísque na minha mesa. — Gostaria


de algo para comer?

— Qualquer coisa — peço só para não pensar que estou aqui somente para
encher a cara.

— Volto logo.

Ele sai e pego o copo, enchendo-o com o líquido âmbar, a língua saliva de
vontade. Levo a bebida a boca com a mão tremendo pela ansiedade de me
embebedar, após um mês de abstinência. O uísque desce queimando pela
garganta, tomo a dose em um único gole, e bato o copo a mesa, apreciando o
ardor causado no corpo, finalmente o frio começa a ir embora.

— Era disso que eu precisava — falo sozinho em italiano. Percebo um


balde de gelo ao lado da garrafa e coloco dois cubos dentro do copo, derramo
novamente o líquido, antes mesmo que o uísque esfrie eu consumo o conteúdo.

Fecho os olhos, inclino o corpo para trás na cadeira e aproveito as


sensações que somente a bebida pode me trazer. A queimação, o calor, o gosto, e
finalmente, a sensação de que estou vivo.

Não demoro para tomar outra dose, seguida de mais uma.

— Aqui, senhor — o garçom coloca um prato na mesa — rodelas de cebola


empanada com molho especial acompanhando, vai querer mais alguma coisa?

— Por enquanto não — consigo pronunciar sem problemas, apesar de ter


bebido cinco doses, ainda não me sinto bêbado.

Pago pelo prato, e ele vai embora.

As pessoas começam a chegar depois das dezenove horas, já comi metade


das cebolas empanadas e tomei metade da garrafa de uísque. A maldita resistência
ao álcool não me deixa ficar bêbado com somente essa quantia, continuo virando
um copo atrás do outro, observando ao meu redor.

Como essas pessoas conseguem ficar felizes, sair com outras e rirem sem
preocupação? Nunca, perderam alguém querido ou tiveram o seu mundo
desmoronando, elas não sabem o que é ter um filho, e ser incapaz de desenvolver
vínculos com ele, de ter medo de o machucar, e o fazer chorar, e mesmo assim
sofrer por perceber que não significam nada para eles.

Ninguém nesse lugar entende a minha dor, o quanto a alma em meu corpo é
queimada diariamente. Bebo sem moderação, algumas pessoas me olham torto,
inclusive os garçons, devem ter medo de que eu faça alguma merda ou incomode
os clientes, eu só quero ficar bebendo isolado em meu mundo.

Quando a garrafa termina peço outra, a cabeça nubla, e não sinto bem meus
dedos, quando pego o cartão e o aproximo da maquineta. O bipe da compra
aprovada, recolho o cartão e acho que o guardo na carteira, não tenho certeza.

— O senhor quer que eu chame um taxi? — ele pergunta, o encaro, vendo


dois dele, na minha frente.

— Não — a fala arrasta, a língua está dormente e difícil de movimentar.

Pego minha garrafa e torno a beber, mantendo a compostura de antes,


despejar o líquido âmbar no copo e depois o levar a boca.

Gotas deslizam pelo canto dos lábios e os limpo com um gesto brusco. A
cabeça pesa dez quilos a mais, com lentidão, deito o braço na mesa e apoio a
cabeça nele. Aos poucos o entorpecimento que eu buscava chega e tudo ao meu
redor para.

— Finalmente te encontrei! — alguém fala alto demais perto de mim.

— Você o conhece? — perguntam.

— Sim, é o meu patrão — responde e sinto o corpo ser sacolejado —


acorda Levi, te procurei feito um louco!

— Ham? — abro a pálpebra, não enxergando direito o que tem a minha


frente.

— Você conhece esse senhor? — o garçom me pergunta — ele bebeu


muito, mas não posso deixar que saia daqui sem ter certeza de que se conhecem.
— Isso é ridículo — respondem a ele — veja, eu sou o segurança dele — acho
que ele mostra algo ao outro — e agora, podemos ir?
— Sim, desculpe por isso, senhor.

— Não foi nada.

Não entendo o que acontece ao meu redor, só que sou amparado por braços
fortes. As pernas viram gelatinas, e com muito custo consigo me firmar em cima
delas.

Vejo a garrafa de uísque pela metade em cima da mesa e a pego, trazendo


para perto de mim.

— Vamos senhor Vittileno.

Quem me carrega?

Miro o rosto do homem, e ele me lembra vagamente o segurança de mais


cedo. Deve ser o que despistei, como ele conseguiu me achar? Não faço ideia,
estou cansado demais para pensar nisso agora.

Sou arrastado para fora do bar e colocado em um veículo. Apago segurando


firme a garrafa de uísque.

Acordo ao ser puxado novamente, dessa vez consigo ver que estou na
garagem do prédio em que moro. O caminho para o apartamento é feito entre
clarões e apagões da minha mente entorpecida. Passamos pela porta, e o raio de
sol que vi mais cedo me encara do sofá com as mãos na cintura.

— Onde diabos você se meteu? — ela sussurra em italiano.

Rio de sua cara de raiva, ela até que fica fofinha com as bochechas
vermelhas, fumaça rodeia sua cabeça, acho que vai explodir a qualquer segundo
se continuar irritada desse jeito.
— Vo........cê vai explorrrrrrrrdir — respondo embolado e cambaleio em
sua direção, é bom poder falar em italiano sem me preocupar se vão me entender
ou não.

— Quem vai explodir é você, seu bêbado irresponsável! Como pode


esquecer o Lorran na creche? — ela para perto de mim e luto para não cair. O
segurança continua me segurando.

— Ele não pleciza de mim — mastigo a saliva, a sede me atacando


repentinamente.

— Ele é seu filho! — Ela se exalta em um quase grito e fecho as pálpebras


sentindo a cabeça explodir.

— Vá se foder — digo, não tenho motivos para aturar essa merda de uma
estranha — sua piranha — aponto o dedo na sua cara.

Ela bate na minha mão, não sinto nada pelo seu toque brusco e rio da sua
cara. Que mulher fraquinha.

— Fracoteeeeeeeeeeeee — cantarolo.

— Como você ousa? O Lorran ficou por horas te esperando.

— E daí? Ele tinha você! — falo alto.

— Não grita ou o Lorran vai acordar — pede fazendo gestos com as mãos.

— NÃO PROVLOQUE — Grito.

— Levi? — uma vozinha fina chama e o vejo na porta da sala.

— Não me veja assim.

Estou bêbado, falando merda, e ver os olhinhos inocentes do Lorran me


encarando decepcionados.
Eu esqueci dele, sou um bosta!

— Me perdoa Lorran.

Peço, me solto do segurança e tento chegar perto do meu filho, ele corre
para os braços da professora, e isso era a estaca que faltava ser enfiada no meu
coração. O que eu esperava que ele fizesse? Eu não mereço esse garoto, nunca
tive o direito de me considerar um pai.

Cambaleio com a garrafa de uísque para o quarto, bato a porta atrás de


mim, e bebo o líquido até apagar jogado na cama.

Quero poder nunca mais acordar.


Olivia
— Tia Vivia — Lorran coça os olhos vermelhos, os lábios tremem na
iminência do choro.

— Não chora fofinho — o pego nos braços e balanço de um lado ao outro


— não fica chateado, não foi nada de mais — uso um tom de voz macio para o
acalmar.

— Levi bligo cum ocê — funga, tentando controlar o choro.

— Não foi uma briga — me sento no sofá com ele no meu colo — seu pai
não está bem, discutimos porque ele não foi te buscar na escola. O Levi sente
muito por agir errado.

Não tenho certeza se ele realmente se arrepende.

Quando chegou, estava bêbado e devastado, mas quando viu o Lorran foi
como se algo dentro daquele homem fosse atingido por um raio, e o choque o
fizesse ver pela primeira vez a realidade toxica em que ele obriga a criança a
viver.
Lorran não merecia crescer com um pai como esse por perto, a falta da mãe
já é motivo o suficiente para a criança crescer traumatiza, insegura, e sentindo
que falta um pedaço do ser dela em todos os instantes do seu desenvolvimento.

Foi assim durante a minha vida, cresci sem uma mãe presente, e com um
pai afundado em depressão.

Não vou permitir que o Lorran saiba a dor que a falta dos pais causa. Nem
que eu tenha de abrir a cabeça do Levi ao meio para o fazer compreender o mal
que está fazendo ao Lorran e que ainda dá tempo de remediar a situação se ele se
esforçar.

Ele vai ser um pai para esse menino.

Estou sendo intrometida, atrevida, e passando de todos os limites, mas uma


criança pede socorro pelo choro. Eu não vou ignorar a dor do Lorran, não serei
omissa nesse abandono parental.

— Ele tá dodói? — pergunta com os olhos inocente e o choro contido.

— Sim, bem aqui — toco no coração do Lorran — a gente não consegue


ver, mas dói dentro dele, vamos fazer o papai melhorar? — Lorran sorri para
mim, e beijo suas bochechas.

Eu não deveria me intrometer, mas quem pediu a minha ajuda foi esse
pequeno anjo, e não posso ignorar a ligação que se formou entre nós nesses
poucos dias.

— Num é papai, é o Levi — estende o ursinho para mim — blinca comigo?

Ele nem o considera como um pai, o quanto a relação deles dois foi
quebrada?

— Sim.
Lorran desce do meu colo e pega uma máscara de dinossauro, me entrega e
depois corre pela sala. Visto a máscara e o persigo fazendo sons de dinossauro
enquanto ele grita feliz.

Antes que eu possa o parar, Lorran corre pelo apartamento, entra no


corredor e some por uma porta, vou atrás e estanco quando vejo o Levi deitado na
cama com uma garrafa de uísque derramando no chão.

Lorran ignora a garrafa como se aquilo fosse normal e sobe em cima da


cama, ele se equilibra subindo nas costas do pai, e começa a pular e rir
escandalosamente. Levi abre os olhos e encara o menino em cima dele, me
apresso para pegar o Lorran, paraliso no lugar.

Levi se vira derrubando o Lorran na cama, que começa a rir mais alto
quando o pai faz cócegas em sua barriga simulando mordidas na pele. Não tenho
certeza se ele entende o que faz com o filho, mas observo o momento com um nó
na garganta.

Talvez ele não tenha desistido do Lorran, só não sabe como ser um pai para
o pequeno.

— O que faz aqui pequeno ouro? — Levi pergunta com a voz arrastada e a
língua presa.

— Blincar — Lorran estende os bracinhos querendo mais das cócegas.


Levi continua encarando o filho com uma dor profunda, capaz de ser sentida de
onde estou, ao pé da cama.

— Cuida dele para mim? — Para a minha surpresa, Levi fala em


português, ele me encara com lágrimas grossas escorrendo pelas bochechas —
não deixa a escuridão tirar o brilho dele — desliza a mão pela cabeça do filho e
beija seus cabelos. A cabeça pende para o lado e percebo que ele dorme.
— Levi? — Lorran chama e cutuca a bochecha do pai — mimiu.

— Vem Lorran, vamos brincar na sala — me recupero do impacto que foi


esse momento, e pego o Lorran no colo, o levando para a sala, e correndo atrás
dele.

A porta do apartamento é aberta, e um homem muito lindo de cabelos


louros e olhos azuis cristalino entra. O terno amarrotado e a expressão
preocupada. Quando ele ve Lorran brincando comigo, relaxa os ombros, o
baixinho ao ver o tio se joga em seus braços, e a fúria me enche novamente.

Esse desgraçado que atormenta a minha irmã no emprego e não cuida


direito do irmão depressivo e do sobrinho.

— Zio!!! Alvo do dinussuro [6]


— Lorran comemora que não consigo o
pegar, e admitindo a derrota, eu me jogo no chão.

— Sei un piccolo molto intelligente [7]— Sorrio para o neném e ele se joga
em meus braços novamente.

— Vuoi di più [8]— pula, e preciso tomar cuidado para que não caia.

— Vai a giocare un po ', ho bisogno di parlare con tuo zio [9]— o coloco no
chão, e o Lorran vai para os brinquedos. Aperto os punhos quando me viro para o
Louis, a vontade de falar mais do que posso na frente do Lorran.

— Eu sinto muito, o Levi deveria ter ido buscá-lo, não sei o que aconteceu.
— Tenta se explicar, como não sabe o que aconteceu? Deixou uma criança na
responsabilidade de um incapaz! É o que tenho vontade de gritar, mas por
respeito ao desenvolvimento do Lorran eu me contenho.

— Seu irmão chegou recentemente fedendo a cachaça. — Me limito a


dizer, não vou aliviar a barra do Levi.
— Eu vou cuidar disso, obrigado por trazer o Lorran para casa. — Se limita
a dizer.

— Que isso não se repita — aponto o dedo na cara dele, querendo fazer
muito mais — amanhã, se ele for esquecido de novo, vou ligar para o conselho
tutelar e fazer uma denúncia contra o seu irmão e você, por abandono parental.

— Já disse que isso não irá se repetir — vejo como ele se controla para não
gritar comigo, a forma, como aperta os punhos, e os lábios são prensados em uma
linha de tensão.

— Assim espero, e contrate uma babá que fale italiano, o Lorran se sente
sozinho quando você não está.

— Não é tão fácil conseguir alguém de última hora, fluente em italiano —


ele suspira, de certa querendo me convencer a amansar.

— Eu falo italiano muito bem e cuido dos meus alunos em horário de aula.
Eu e você devemos ter uma conversa séria sobre o Levi ser o responsável do
Lorran, mas considerando que o dia já foi bastante estressante eu vou embora.

— Você é muito atrevida — fala com os dentes cerrados.

— Você não viu nada — pego minha bolsa, quase deixando escapar que
não sou tão passiva quanto a minha irmã. — Anota o número do seu celular, caso
eu precise te ligar novamente — estendo o celular para ele que o pega, e faz o
que pedi.

— Boa noite professora Olivia — fala pausado, arrebito o nariz para ele.

— Boa noite, Louis.

Vou até o Lorran e me despeço do pequeno com um beijo na bochecha.


Saio e chamo um táxi para meu apartamento. O caminho inteiro penso o
quanto o Lorran precisa de uma figura paterna de verdade, por mais que o tio
esteja lá por ele, não é o pai, e o menino não parece reconhecer ninguém como
tal.

Em casa, organizo umas coisas do trabalho antes de ligar para a minha


irmã.

— Bianca, vamos sair — peço antes que ela possa dizer “oi” — topa um
espetinho?

— Tô cansada, Olivia — a voz rouca não me engana, ela estava chorando.

— O que o babaca do seu chefe fez? — levanto do sofá e calço minha


sapatilha — chego aí em dois minutos, vá se arrumar, vamos beber e falar mal
desses italianos!

Não espero ela responder, sei que vai recusar. Desligo a ligação e me visto
rápido, chamo um táxi, e muitos minutos depois desço em frente à casa do meu
pai. Um aperto comprime meu peito ao ver a casa em que cresci, desde que fui
embora, sinto muitas saudades de falar com minha irmã todos os dias, e até das
brigas com o meu pai.

— Vamos — chamo do portão.

Procuro pela chave na bolsa e percebo que acabei esquecendo em casa.

— Não me diga que perdeu sua chave — ouço uma voz grossa atrás de
mim, viro e vejo meu pai com seu uniforme de segurança dentro do carro que usa
para trabalhar.

— Não dessa vez — me afasto para que o portão seja aberto


automaticamente — só esqueci em casa.
— Não esquece a cabeça porque não pode a remover — debocha antes de
entrar, aproveito e faço o mesmo.

— Sai apressada — passo por ele e vou atrás da minha irmã. — Vamos
Bianca!

— Sua irmã trabalha cedo, não a leve para beber a essa hora! — lá vem as
reclamações.

— São nove horas, vamos jantar — finjo não me importar com sua
alfinetada. Ele é sempre assim, acusa antes de perguntar.

— Não demorem.

— Eu não tenho mais 15 anos, pai — o encaro, cansada de como me trata


— não sou mais uma criança para você controlar meu horário de saída e chegada.

— Como se algum dia você tivesse me deixado fazer isso. — O escarnio


em sua voz me faz revirar os olhos, eu deveria ter esperado a Bianca na
churrascaria.

— Não comecem — Bianca pede — vou sair para jantar com a minha
irmã, sei das minhas responsabilidades, pai — beija a bochecha dele e o homem
derrete. Bianca é sempre assim, nunca o enfrenta.

— Traga um espeto de bacon com alho para mim — pede a ela, que
concorda.

Saio com a Bianca e vamos em silêncio até a churrascaria, nos sentamos


em uma mesa no lado de dentro e pedimos uma cerveja e algo para comer.

— Eu odeio aquele italiano — falamos em uníssono e rimos.

— Primeiro você — digo a ela — o que o babaca fez?


— Ele acha que fingi que era virgem! — As bochechas dela ficam
vermelhas, apesar da raiva ela fala baixinho para as pessoas não ouvirem.

— Tem como fingir isso? — pergunto e bebo a cerveja geladinha.

— Na cabeça daquele idiota, sim! — Bebe o copo de uma vez e pede outro
ao garçom.

— Vai com calma ou a ressaca vem forte.

— Eu tô tão frustrada — se encolhe na mesa — ele tinha sido perfeito


enquanto a gente… você sabe — fica vermelha e acho graça — e depois fez
aquela merda toda, não consigo entender.

— Deve ser de família, o irmão tem uma relação tão ruim com o filho que
o Lorran nem o chama de pai.

— Isso é pesado, eu soube que ele tem depressão desde que a mãe do
Lorran morreu, logo que ele nasceu.

— Uma merda — bebo o resto da cerveja e peço outra — você deveria ver
o menino, é muito carismático e apaixonante — suspiro.

— Não se envolva demais Olivia — Bianca segura minha mão — sei que
você quer ser mãe e pode acabar se apegando demais ao Lorran.

— Eu sei.

Não conto a Bianca que eu já me envolvi emocionalmente com o pequeno,


e quero a cabeça do pai dele em uma estaca.

Pelo resto da noite, bebemos e falamos mal dos irmãos italianos que estão
tirando a nossa paz.
Levi
Acordo com uma puta ressaca, a cabeça partida em duas. As janelas do
quarto são abertas, e a claridade me cega. Uma figura alta se projeta na minha
frente. Pisco tentando entender quem é.

— Hoje você vai tomar um rumo na sua vida! — A voz grossa, raivosa. Só
pode ser o Louis.

Deito-me para o outro lado e cubro a cabeça com as cobertas, sem


paciência para os gritos dele.

— Nada disso, Levi, já deixei essa situação ir longe demais — as cobertas


são puxadas e me levanto com raiva.

— Que porra Louis, me deixa! — Grito.

Louis espuma de raiva, eu vejo seu braço subindo, a mão fechando, e o


punho vindo na minha direção. Não esforço para desviar do soco no estômago,
perco o ar e caio de joelhos tentado recuperar o folego.

Ele segura meus ombros e me põem contra a parede, o rosto a centímetros


do meu.
— Isso foi por esquecer o Lorran — rosna enfurecido — de todas as
merdas que você já fez essa foi a pior Levi, enquanto você só se machucava eu
fechava os olhos e acreditava que você ainda teria uma salvação, que iria
conseguir sair da merda desse buraco, mas agora acabou!

Semicerro os olhos, o que ele quer dizer com isso?

— Vai deixar eu me matar? — pergunto e recebo um tapa na cara como


resposta.

— Nunca mais fale essa merda, a partir de hoje você vai voltar a viver.

— Não seja ridículo, Louis, sabemos que já estou morto por dentro há
muito tempo. Você que não me deixa partir.

— Você vai ter uma rotina agora, todos os dias — ele me ignora — vamos
malhar juntos, depois vai levar o Levi para a creche enquanto eu trabalho, e você
vai para a terapia. Já achei um terapeuta brasileiro que vai falar em italiano com
você já que se recusa a usar o português.

— Vai ser a mesma merda de sempre. — Desvio a atenção dele, odiando


esse plano.

— Quando sair da terapia, você vai se ocupar com qualquer merda que
seja, nem que eu tenha de te fazer ficar ao meu lado no trabalho. Depois vai
buscar o Lorran na creche, e aí vai ter um tempo com o seu filho.

— Não pode me obrigar — soo birrento.

— E você não vai continuar vivendo na escuridão. Nunca mais esqueça o


Lorran na creche, ou eu juro que te jogo em um hospital psiquiátrico.

— Zio? — Lorran aparece na porta, vestido o uniforme da creche e com a


pelúcia de gato debaixo do braço.
— Você — Louis sussurra para que somente eu ouça — nunca o ensinou a
te chamar de pai, acha mesmo que pode continuar nessa situação para sempre? Se
não pode fazer isso por você ou por mim. Faça pelo Lorran, ele merece a chance
de ter um pai.

As palavras do Louis machucam mais do que o soco e o tapa que ele me


deu.

Lorran aprendeu a falar “zio” e “nonno”, porque ele foi ensinado pelo meu
irmão e pai, a os chamar dessa forma. Eu nunca passei tempo o suficiente com
meu filho enquanto ele cresce para o ensinar a me chamar de “papà”. Ele escuta a
todos me chamando de Levi, e imitou, nem meu nome eu fui capaz de o ensinar.

Os filhos só descobrem os nomes dos pais depois que crescem e escutam


outras pessoas chamando, e percebem que “pai” e “mãe” não é exclusivo deles e
de seus pais. Que toda uma sociedade denomina assim aqueles que se dedicam a
criação de um filho.

Eu tirei do Lorran o choque de perceber qual era o meu verdadeiro nome, e


nunca o ensinei a ver uma foto da mãe e a chamar de “mamma”.

— Eu vou tentar — digo baixinho — promete não me largar?

Não sei de onde vem a dor que me assola ao imaginar meu irmão
desistindo de mim. Não posso perder a única pessoa que luta por mim quando eu
sou incapaz de fazer isso.

— Nunca te deixaria — Louis me abraça, e sinto as lágrimas molhando a


pele do meu ombro desnudo.

— Quelo — Lorran corre e se joga no meio de nós dois.


— Prometo tentar Lorran — beijo sua cabeça com cuidado para não o
machucar. Ele parece tão delicado, e poderia quebrar a qualquer momento pelo
meu toque.

— O qule? — me olha com as irises azuis, cheio de curiosidade. Como ele


pode não me odiar quando sou tão nocivo?

— Ser um pai para você — aliso sua bochecha e ele franze a testa, não
entendendo o que quero dizer.

Lorran sabe o que é ter um tio, um avô.

O farei descobrir como é ter um pai ao seu lado. Vai ser um caminho longo
e doloroso, como tem sido diariamente, mas eu vou tentar.

Eu finalmente percebi o resultado do meu afastamento, e o quanto isso


machuca, a única pessoa que não tem culpa de nada da situação em que vivo, e a
única que realmente vai sofrer como eu sofro quando perceber a falta que uma
mãe faz.

Eu nunca parei para pensar o quanto poderia prejudicar o Lorran no futuro,


quando ele sentir a falta de uma mãe, se é que já não sente. Que ter um pai
ausente e de bosta como eu só iria causar mais sofrimento ao meu filho.

A Blanca morreu.

Eu continuo aqui.

Vou fazer o Lorran e a mim, constantemente lembrar que:

Eu. Ainda. Estou. Vivo.

— Levi tá englaclado.
Acho graça de como ele fica fofinho embolando as palavras e trocando o
“r” pelo “l”. Reflito pensando se alguma vez eu percebi o Lorran falando dessa
forma e o achei fofo, não consigo lembrar se já aconteceu.

Encaro o meu filho analisando seu rostinho redondo, com as bochechas


proeminentes, os cabelos louros brilhando a luz do sol, e o corpinho pequeno
jogado em cima do meu.

A maioria das vezes em que prestava atenção no Lorran era quando


brigávamos por besteiras, ou quando a escuridão o envolvia.

Hoje eu vejo o meu filho por quem ele realmente é.

Uma criança inocente que precisa de um pai em sua vida... uma criança,
que perdeu a mãe no momento de seu nascimento... uma criança com dois anos,
em que todos os seus aniversários, eu passava bêbado, chorando a perda da minha
esposa.

Uma criança que nunca foi abraçada por mim.

As mãos tremem quando levanto ao redor de seu corpo e o envolvo com


medo de o machucar. Lorran percebe o que faço e deita a cabeça em meu ombro,
sorrindo para mim. As lágrimas deslizam pelas minhas bochechas pingando na
dele.

Como pude perder tanto tempo? Como fui capaz de o abandonar?

— Me perdoa? — peço.

— Polque?

— Por não ser presente.

Ele franze a sobrancelha sem entender, e antes de o traumatizar, deixo a luz


envolver seu corpo quando beijo novamente sua cabeça. Inspiro seu cheiro de
neném. Lorran fica inquieto e sai do meu abraço, Louis chora enquanto observa o
sobrinho deixar o quarto.

— Vamos irmão?

— Sim — aceno em positivo.

Vou para o banho e não me olho no espelho, imagino que devo parecer um
zumbi. Tomo banho, e pela primeira vez, penteio os cabelos sem ser obrigado
pelo Louis ou meu pai.

Os fios doem quando passo o pente entre eles, emaranhado e ressecados.


Coço a barba, e os pelos me incomodam, sem encarar o espelho, pego o
barbeador elétrico e o passo na pele. Os fios louros caindo na pia.

Faz anos que não tenho vontade de limpar o corpo e arrumar os cabelos.

Acho que finalmente aceitar a dor que causei no meu filho, e que devo
buscar ajuda e melhorar, foram um estopim para poder começar a cuidar de mim
mesmo.

Tomo café com meu irmão e filho, Lorran brinca com a comida, e não sei
como o fazer comer sem ficar todo sujo. Observo enquanto o Louis passa o
babador no pescoço dele, e com uma mão, leva a comida a boca do Lorran e a
outra a sua própria. Eu nunca fiz isso e não sei se conseguiria agora.

— Precisamos de uma babá que possa se comunicar com o Lorran — Louis


diz.

— Traga uma da Itália.

— Já tentei, mas não consegui nenhuma — suspira — até quando vai ficar
fingindo que não fala português?

— Eu não falo português — desvio o olhar dele.


— Eu sei que você é fluente, lembre-se que fui eu quem te ensinou. Não
consigo entender o motivo dessa birra com o idioma.

— Você me arrastou da Itália para cá — a irritação ferve no meu sangue —


não espere que eu seja totalmente receptivo — jogo o guardanapo na mesa, sem
paciência para continuar aqui — vamos Lorran, hora da creche.

— Levi não saia assim — Louis pede e o ignoro.

Pego o menino e vamos para o carro. Lorran fica assistindo desenhos em


seu Ipad enquanto eu encaro a janela, o dia começa a ficar nublado, e não sei se é
resultado da minha depressão ou se o tempo mudou.

A discursão idiota com o Louis azedou meu bom humor repentino,


mandando embora minha vontade de seguir em frente.

Quero as cobertas e me esconder do mundo.

— Levi — Lorran me chama, percebo que paramos em frente a creche. —


vlamos?

Ele precisa de mim.

Mordo a bochecha e seguro sua mão. Um momento de briga com o Louis e


eu quis desistir de tudo. Se eu retroceder agora perderei a chance de o Lorran ser
feliz, e crescer sabendo o que é ter um pai. Engulo em seco e vou com ele até a
porta da sala de aula. A professora de ontem me olha com raiva e sorri para o meu
menino.

— Lorran como você está lindo! — O menino fica todo risinho, com as
bochechas vermelhas enquanto corre para os braços dela — dormiu bem?

— Sì — acena e a abraça.
Eu tenho de seguir em frente para que meu filho seja capaz de me abraçar e
beijar com a mesma felicidade que ele fez pela professora.

— Desculpe por ontem — peço a ela que me olha atenta — eu não tenho
como justificar meu comportamento, mas o incidente me fez perceber o que estou
fazendo de errado — encaro o Lorran — vou tentar melhorar, mas enquanto isso
não acontece, me ajuda a cuidar dele?

— O que você está pedindo? — pergunta desconfiada.

— Só continue sendo boa para ele — seguro a mão do Lorran — até mais
tarde, hoje eu te busco no horário.

— Celto.

Lorran desce do colo da professora e corre para a sala de aula, vejo quando
ele cumprimenta os amigos com sorriso, e é bem recebido por eles.

— Ele é um garoto maravilhoso — a professora fala — não o magoe mais.

— Não vou.

Não sei se prometo isso a ela ou a mim, mas vou fazer o possível para
cumprir com a minha palavra.

Saio da creche decidido a procurar por um psicólogo, não consigo sair


desse poço sozinho. Prova, é a vontade de beber rondando minha cabeça, e a
necessidade pelos remédios que me trazem o esquecimento.

Pelo Lorran eu vou tentar uma última vez, com mais afinco do que em
todas as outras.

Ele merece a chance de ter um pai.


Levi
Encaro a mensagem no celular com o endereço do psicólogo que o Louis
marcou consulta para mim. Dentro do carro, de frente para o prédio, eu fico
hesitante quanto a entrar. Já tentei outras vezes e nunca deu certo, por que agora
seria diferente?

Você tem o Lorran e quer melhorar por ele.

Uma voz sussurra ao meu ouvido, busco por outra pessoa dentro do carro, e
só vejo o segurança que mantem o olho no lado de fora. Acho que estou
realmente enlouquecendo, passei a ouvir coisas.

A voz tem razão, das outras vezes eu não queria melhorar, ainda me sinto
no fundo do poço, rondado por escuridão. Tenho de ser forte e sair desse carro,
falar com o psicólogo, e buscar pela melhora, é a vida do Lorran que está em
jogo, não somente a minha.

Meu celular toca e vejo o nome da minha irmã, faz tempo que não nos
falamos.

— Oi — atendo.
— Senti que você precisava de mim — Lira tem a voz doce e chorosa —
Louis me contou que vocês estão no Brasil e imaginei o quanto deve ser difícil
para você se adaptar.

— Uma merda — sussurro, o bolo na garganta ao lembrar a última vez que


falei com a Lira, e como a machuquei com as palavras — me desculpa? Eu fui...
horrível com você.

— Tem razão, um completo idiota — soluça — me leve para jantar quando


eu chegar aí, e vamos passar uma tinta por cima de tudo, estou com saudades
Levi.

— Passar tinta não é a solução Lira — suspiro — eu vou me consultar com


um psicólogo agora, preciso tentar sair desse poço, o Lorran... ele precisa de um
pai.

— Ah, meu irmão — ela soluça — você não faz ideia do quanto me deixa
feliz saber que finalmente quer procurar tratamento. Eu estava errada da outra
vez, não podia ter te forçado, aquilo só te machucou.

— Você nunca fez nada errado, não se culpe Lira.

— O que te fez mudar de ideia?

— Perceber que estou sendo um trauma na vida do Lorran — dói aceitar a


verdade, rasga meu peito mil pedaços — se eu não me cuidar, é ele quem vai
precisar de terapia no futuro.

Lira chora do outro lado e fica difícil entender o que ela fala entre os
soluços. Usando minha irmã de força, eu saio do carro e entro no prédio, com ela
na linha, como se estivesse segurando a minha mão. Pego o elevador até o quinto
andar, quando as portas se abrem, a Lira para de chorar e funga.

— Você vai ser um ótimo pai.


— Não, eu vou ser um pai, só isso já basta.

Na recepção tem outras duas pessoas sentadas no sofá, esperando, e uma


moça atrás de uma mesa. Ela me encara e indica que posso me sentar na cadeira
de frente a ela.

— Preciso ir — digo a Lira.

— Me liga quando terminar?

— Certo.

Desligo e faço a minha ficha com a atendente, menos de meia hora depois
sou chamado na sala do psicólogo.

O homem é mais jovem do que eu esperava, deve estar na casa dos seus
trinta anos. Sentado na poltrona, ele aponta o sofá para que eu me acomode.

A sala é desnecessariamente iluminada, e isso incomoda a minha vista.

— Muito claro para você? — ele pergunta.

— Demais — sento-me no sofá e fecho os olhos.

— Vou ajustar a iluminação.

Aos poucos o ambiente vai ficando mais na penumbra, e agradeço por isso.
A sensação de ser observado como uma presa prestes a ser abatida ameniza,
sempre me senti assim com os outros psicólogos, como se eles estivessem me
julgando em vez de ajudando.

— Eu sou o Yuri Silva, você é o Levi Vittileno, certo?

— Sim, prazer — passo a mão no rosto, começando a ficar sufocado.


— Fique à vontade, quando você quiser começar... iniciamos, temos uma
hora para conversar.

— Não vai me encher de perguntas? — me levanto e ando de um lado ao


outro.

— Você quer que eu faça isso? — a penumbra impede que eu veja seus
olhos, mas sei que a cabeça dele está abaixada, não me analisa enquanto ando
feito um louco.

— Não, odeio isso.

— Eu também — fico surpreso, paro e o encaro — os pacientes vêm aqui


porque precisam de ajuda, os interrogar com perguntas só vai parecer que sou um
policial atrás de um criminoso.

Ele pausa e me sento, prestando mais atenção nele. Dessa vez o homem
inclina o rosto para cima e me encara, não que eu consiga ver muito de sua
expressão.

— Você quer ajuda com a dor que as outras pessoas não podem ver o
ferimento, e não vou cutucar a ferida. Esse é um espaço seguro Levi, só
falaremos do que você estiver pronto, e sem cobranças, cada pessoa tem o seu
ritmo, aos poucos... descobriremos o seu.

Fico quieto, suas palavras me deixam mais confortável. Aos poucos, o


frenesi que me atacou quando entrei aqui, dá espaço a uma estranha calmaria, e a
penumbra deixa de ser reconfortante e se torna opressora.

Eu vivo na escuridão há tanto tempo, que busquei por ela no primeiro


segundo de desconforto.

— Pode acender mais as luzes?


— Claro.

A iluminação retorna, mais fraca do que antes e mais agradável.

— Eu tenho um filho — digo após uns minutos em silêncio — ele nunca


me chamou de pai, e eu achava que era porque ele me odiava, por eu ser ausente
— a garganta trava e inspiro e expiro fundo três vezes — mas ontem, eu percebi
que nunca o ensinei a me chamar de pai.

Espero pelas perguntas, mas ele não faz nenhuma. Respeita o meu tempo
de descanso entre uma fala e outra.

— Eu não posso continuar magoando o Lorran ou vou jogá-lo em um poço


fundo igual ao meu, e não quero isso para ele. Por isso estou aqui, para ser
melhor pelo Lorran, não por mim.

— Buscar a cura pelo Lorran é uma mostra de que você também quer se
curar Levi, e encontrou no seu filho, a força para buscar ajuda.

— Eu só não quero continuar magoando-o.

Limpo as lágrimas que escorrem, e suspiro me sentindo exausto depois de


poucos segundos de conversa.

— Quando você se machucou?

— A Blanca morreu e eu fiquei sozinho, sem o amor da minha vida —


inclino para trás deitando a cabeça no encosto do sofá. — Nunca senti vontade de
falar sobre isso antes.

— Quando você busca para si a melhora, é como abrir uma porta que
esteve fechada durante anos em um segundo, nada passa por ela, no outro, tudo
transborda, arrombando as dobradiças e exigindo que sejam vistas.
— Boa forma de pensar — pondero em silêncio por mais tempo — sou
viciado em álcool e remédios.

— Com que frequência faz uso deles?

— Os remédios todos os dias, os psiquiatras passaram para tratar a


depressão, e os uso para esquecer. Álcool quando consigo beber escondido do
meu irmão.

— Ele te impede?

— Sim, ontem bebi feito um louco, esqueci o Lorran na creche, e em casa


levei esporro da professora dele. A mulher exala luz com o sorriso dela, não faz
ideia de como é sofrer com uma dor como a minha, como ela pode ter me
julgado?

— Veja a situação por outro ângulo, você esqueceu seu filho, e ela ficou
preocupada. Talvez ela não tenha te julgado, mas como professora, percebeu o
risco em que a criança foi exposta, e quis evitar que acontecesse novamente.

— Como sabe disso? — levanto a cabeça o encarando — conhece a


professorinha por acaso?

— Não, mas posso analisar a situação por fora, entendendo a posição de


uma pedagoga, e a sua.

— Eu sumi para beber — admito — nem pensei duas vezes antes de fazer
isso com o Lorran, eu sou um merda — escondo o rosto nas mãos.

— Temos muitas coisas para falar, ao que posso perceber. Quer começar
por uma, e depois vamos a outras? Separar as dores, e ir tratando os machucados
por vez pode ajudar de maneira mais eficaz.
— Pode ser — deito-me no sofá, me sentindo cansado — não sei por onde
começar.

— Qual a que te incomoda mais agora?

— Ter esquecido do Lorran por ter ido beber. Eu queria sumir, fazer a dor
passar, e fugi sem que percebessem, não me importei com ninguém além de mim.

— Vamos falar sobre o seu vício na bebida.

— Ela me leva ao esquecimento, não tem muito o que falar.

— Os vícios são nocivos por trazerem sensações momentâneas que


apaziguam a dor. A bebida te faz esquecer enquanto você a consome, mas quando
o efeito passa, as coisas continuam iguais, e você não sabe como melhorar, como
contornar a situação, a ansiedade ataca, o mundo parece sem sentido, e a pressão
que você sente para aliviar a dor te faz buscar aquilo que te dá a falsa sensação de
prazer, de que tudo vai ficar bem. É um círculo vicioso que podemos reverter, se
você estiver disposto.

— Tudo bem se eu cair?

— Vai ficar tudo bem se você se levantar, não é vergonhoso, ou sinal de


fraqueza cair. O importante é reunir forças para se levantar.

— Eu me sinto no fundo do poço, rodeado pela escuridão que obscurece os


meus dias.

— Você deu o primeiro passo na sua escalada, continue assim, um dia de


cada vez e quando perceber, os momentos de dor serão somente lembranças, e a
felicidade poderá vir sem a busca pelos vícios.

— Como faço para evitar a vontade de beber e usar os remédios?


— Seus medicamentos devem ser revistos pelo psiquiatra, marque uma
consulta quando sair daqui, temos ótimos profissionais nesse prédio. Ele vai te
ajudar com a medicação certa e com seu diagnóstico, como psicólogo, não posso
fazer isso. Quanto ao vício em bebida, precisamos achar catalisadores, coisas que
possam te distrair quando tiver vontade de beber, e te ajudar a se controlar.

— Meu irmão me prende em casa, sem me deixar sair.

— Não é uma boa opção, isso aumenta a compulsão para fazer o que não te
permitem. Você pode usar um elástico, sempre que sentir o desejo pelo álcool
estrale o elástico no seu pulso, o ardor na pele vai te ajudar a enfrentar a
compulsão.

— Não sei se um simples elástico pode ajudar — suspiro — é forte demais.

— Você disse que quer melhorar pelo seu filho, tente passar um tempo com
ele, nem que seja somente o olhando, ou brincando, conversando, passeando.
Você acha que conseguiria evitar beber na frente dele?

— Sim, não o deixo me ver alcoolizado.

— Você se preocupa com o Lorran, isso é bom Levi.

— Sou um bosta, se me preocupasse o bastante não seria um pai de merda.

— Muitos pais expõem os filhos as drogas e as bebidas, você toma cuidado


para não o expor. Está aqui procurando ajuda, é um começo.

— Vou tentar. Me sinto cansado, posso ir embora?

— Faltam 10 minutos para a sessão acabar. Quero te ver três vezes por
semana. Agende as consultas do mês inteiro quando sair daqui, e te vejo na
próxima.

— Obrigado... — me levanto — por não me fazer sentir desconfortável.


— Aqui é o seu lugar seguro.

Assinto e vou embora. Marco as consultas durante o mês, e uma com um


novo psiquiatra, saio de lá com um pouco mais de confiança de que posso seguir
em frente do que quando entrei.

O Lorran merece que eu tente por ele, não me sinto bem, pelo contrário a
escuridão ainda caminha ao meu redor as quatro da tarde, quando vou buscá-lo na
creche. Mas nunca mais a deixarei me vencer sem lutar, ontem foi a última vez
que me entreguei.
Olivia
— Hora da filinha para esperar os pais — digo, e todos correm para a
parede ao lado da porta e ficam alinhados esperando serem chamados.

Abro a porta e fico surpresa ao ver o homem louro parado do outro lado.
Ele está diferente de ontem, os cabelos arrumados, a barba feita, e usando um
perfume forte.

As roupas arrumadas, e as mãos na frente do corpo cutucando as unhas. Ele


me encara e a imensidão de seus olhos azuis me deixa um pouco mexida, um mar
revolto repleto de tristeza.

— Boa tarde — ele diz em italiano.

— Eu sei que você fala português — queria ter soado menos arisca, mas
não consegui controlar a língua.

— Non so a cosa ti riferisci — ele nem desvia o olhar, sustentando sua


[10]

mentira.

O safado vai realmente fingir que não fala português após ter se
comunicado comigo ontem? Fico na dúvida se ele lembra a conversa que
tivemos. Minha atenção é desviada para as mães que param no corredor e ficam
encarando o Levi com a mão na boca, surpresas pela beleza dele.

Decido não insistir quanto ao português, vou continuar falando em italiano


com ele, por enquanto.

— Lorran seu pai chegou — chamo o pequeno que vem caminhando


cabisbaixo.

— Num quelo ir — faz biquinho e encara o chão.

Agacho de frente para ele e pego suas mãos.

— É hora de ir para casa com o seu papai — Lorran aumenta o bico mais
ainda — amanhã a gente se ve cedinho, e passa o dia na creche, combinado?

— NÃO! — Fico surpresa com seu grito seguido do berreiro.

— É uma pena que você não queira ir comigo — Levi fala, noto que ele se
agachou ao meu lado, e com as mãos tremulas toca o braço do filho, chamando a
atenção — queria te levar para comer muito popolate com sorvete.

— Muito? — Tenho vontade de rir como o Lorran muda de ideia fácil


quando o assunto envolve doce.

— O tanto que você quiser — Levi olha no relógio no pulso — mas temos
de ir rápido, ou vai dar a hora da janta e você não poderá mais comer sorvete com
chocolate.

— Zia vivia vai? — e então entendo, Lorran não quer sair da creche por
minha causa.

— Não posso pequeno — ele volta a fazer bico e me arrependo de


machucar o coração desse anjinho.
Plode sì! — bate o pé.

— Ele não quer ir embora com o pai?

Percebo a comoção de mães que se forma do lado de fora observando a


cena do Lorran, e cochichando sobre a situação. Me sinto mal por expor a criança
dessa forma, e pelos outros alunos que olham com cuidado o que irei fazer.

Alguns deles já insistiram em não voltar para casa ou me levar para sair,
como se fosse parte de suas famílias.

Nenhum deles perdeu um dos pais, ou passa por problemas em casa, não
entendem o pedido do Lorran e o quanto o menino se diverte quando está comigo
aqui na creche.

Ele deve querer repetir a brincadeira de ontem e o cuidado que tive com
ele, quando chegamos a sua casa e o dei banho e janta, o colocando para dormir
antes do Levi chegar fazendo zoada.

Fico encurralada sem saber o que fazer.

O coração grita para pegar o pequeno nos braços e o levar para casa, dar
banho, vestir sua roupinha e dar sua janta. Brincar um pouco antes dele dormir, e
depois o ninar nos braços até que o sono o domine.

Isso é algo que somente uma mãe faz, e eu não sou a mãe dele, ou muito
menos sua família.

— Lorran, vamos conversar depois — opto por esperar a plateia ir embora,


e, resolver a situação — você pode esperar dentro da sala?

— Sì — ele nem olha para o pai quando corre para se sentar no tapete.

— Desculpe por isso — digo ao Levi — quando eu terminar de entregar os


alunos a gente conversa melhor, pode ser.

— Certo — percebo o tom arisco em sua fala, acho que ele não esperava a
reação do Lorran, nem eu, mas não posso fazer muito se o menino prefere ficar
comigo do que com o pai ausente.

Levi entra na sala e se senta perto do Lorran, ambos calados, esperando


todos os alunos serem entregues aos seus pais. As mães curiosas tentam puxar
assunto querendo saber o que aconteceu, e quem é o “bonitão louro”, sorrio
educada para elas e digo que é assunto de família.

Quando o último aluno é entregue ao pai, eu fecho a porta da sala e


caminho até eles, sentando-me de frente para ambos, e Lorran sorri enquanto o
Levi continua emburrado.

Tenho quase certeza de que estou estragando algum plano dele com o filho.

— Lorran — chamo sua atenção — a zia não pode sair do trabalho com os
alunos, é proibido.

— Ontem ocê icou comligo[11].

— Foi uma situação especial porque eu não podia te deixar sozinho


enquanto seu pai não chegava.

— Vai emblola Levi.

Ele expulsa o pai sem pensar duas vezes, e preciso me controlar para ele
não perceber que achei engraçado seu jeitinho fofo e simples de falar.

Dói perceber o quanto Lorran não se importa e não reconhece o Levi como
pai. Eles não têm nenhum laço afetivo, e a relação entre eles é inexistente, tenho
vontade de fazer com que ambos possam se entender melhor.
— Lorran — Levi o chama — vamos embora comigo, prometo que vai ser
divertido.

Num quelo — cruza os braços.

Eu sei que não posso ceder à chantagem do Lorran, ele só tem dois anos, e
faz birra querendo que sua vontade seja cumprida. Mas ver os olhinhos tristes, os
lábios tremendo, e as mãos cruzadas, mexe comigo, não consigo ignorar o quanto
o emocional dele pode ter sido machucado.

— Lorran fofinho — seguro seus braços — eu não posso ir com você hoje,
vou te esperar amanhã na creche para passarmos o dia junto de seus colegas,
agora você precisa ir para casa com seu pai.

— Vamos a uma sorveteria juntos — percebo que o Levi fala comigo — de


lá eu te deixo em casa, deve ser tempo suficiente para o Lorran se acalmar, o que
acha amigão?

— Tia vivia vai?

Mordo o lábio inferior dividida entre o certo a se fazer como a professora


dele, e meu lado humano, que implora para que eu proteja os sentimentos dessa
criança.

— Somente um sorvete — cedo, e Lorran pula no meu colo comemorando.

— Obrigada — Levi agradece.

— Não é por você — sussurro — vamos Lorran.

— Sì — ele fica de pé e estende a mão para mim, a pego e me levanto.

— Segura a minha também, Lorran — Levi pede, posso jurar que senti um
pouco de ciúmes na voz dele.

O pequeno pega a mão do pai, e saímos juntos da sala, desse jeito.

— Preciso ir à secretária antes — digo a eles — me espera do lado de fora,


por favor.

Lorran solta minha mão relutante, faço o caminho até a secretária e sou
parada por meus colegas, querendo saber o que foi a comoção na minha turma.
Omito deles parte da situação, é comum às vezes os alunos se apegarem demais,
e eles entendem isso, mas nunca cedemos a vontade dos pequenos, posso acabar
sendo demitida por me envolver demais.

Com as mãos suando frio, entro na secretaria e bato o ponto, registrando a


hora em que sai, pego minha bolsa no armário e vou embora, evitando assunto.

Do lado de fora, vejo Lorran e Levi em frente a uma SUV preta, esperando
por mim, vou até eles sem chamar a atenção dos meus colegas que saem, dou a
volta e entro no carro, agradecendo pelos vidros negros.

Estou me sentindo uma fugitiva por toda essa situação, não posso continuar
agindo impulsivamente, ou terei problemas no trabalho.

Perder esse emprego está fora de questão.

— Zia ta englaçada — Lorran zomba de mim, e rio, percebendo a tensão


em meus ombros.

— É por isso Lorran — Levi chama a atenção do filho — que não podemos
pedir que a Olivia nos acompanhe nos passeios depois da creche.

— Num tendi — Levi passa o cinto no Lorran na cadeirinha de proteção, e


o carro se move.
— A Olivia não pode ficar saindo do trabalho com a gente, porque ela tem
uma vida pessoal — Levi suspira, percebendo que o Lorran não entende o que ele
quer dizer.

Lorran — o chamo — o que o seu pai quer dizer, é que eu tenho


afazeres depois do trabalho, e não posso deixar de cumprir eles porque você quer
que fiquemos juntos.

— Num pode? — fica tristinho de novo.

— Não posso, hoje será uma exceção por que vamos tomar sorvete, e você
ainda não tinha entendido, mas agora que já sabe, não vamos repetir essa saída,
entendeu?

— Sì — fica cabisbaixo.

— Seu Ipad — Levi entrega o aparelho e o Lorran não o pega, continua de


braços cruzados.

— Se você ficar irritado, não podemos aproveitar o dia de hoje juntos —


cutuco seu peito — não quer tomar sorvete comigo?

— Quelo.

— Me dá um sorriso de quem está animado.

Ele continua fazendo bico, e o cutuco na barriga fazendo cóceguinhas até


que esteja gargalhando alto e tenha esquecido a birra.

— É assim que eu gosto, sorridente — toco em seu nariz, e ele sorri para
mim, do jeitinho que derrete meu coração.

Não demora muito para chegarmos em uma sorveteria. Entramos os três, e


as pessoas nos olham, dê certo, pensando que somos uma família.

Lorran pede colo e o carrego nos braços, Levi vai para o balcão e
montamos os sorvetes, Lorran se esbalda no sabor de chocolate.

— Me ensina a dar de comer a ele? — Levi pede, o encaro incrédula, não


acredito que ele não sabe alimentar o filho.

— Tá.

Nos sentamos, e o Lorran insiste em ficar no meu colo, deixo meu sorvete
de frente a mim, e coloco o do Lorran entre mim e o Levi.

— Aproveita que ele tá de frente para você, segura a colher com pouco
sorvete ou ele vai se sujar mais do que comer, acho que é isso, não tem segredo.

— Certo.

Acho curioso como ele esfrega as mãos uma na outra parecendo se preparar
para uma grande batalha.

Levi coloca o sorvete na colher, uma quantidade pequena e me olha


perguntando se fez certo, aceno em positivo e ele leva a colher a boca do Lorran,
que abre e engole o conteúdo feliz da vida.

— Adolo popolate — acho graça do jeitinho fofo que ele fala, e cheiro sua
cabecinha.

— Você se envolve assim com todos os seus alunos? — tem aspereza na


voz dele, fico empertigada por seu tom de voz duro, estou ajudando na relação
dele com o filho, e se acha no direito de me julgar?

— Nenhum dos meus alunos se negam a sair com os pais, para que eu
precise intervir entre eles — digo em português.
— Parlare in italiano — rebate, ele continua fingindo que não entende o
que eu digo.

— Seu arrogante — sorte dele que o Lorran está em meus braços, e não
quero que ele entenda as ofensas ditas contra seu pai — você falou comigo em
português ontem, não tente me enganar se fingindo de idiota.

— Lorran quer mais sorvete?

— Sì.

Ele me ignora completamente, e pelo resto do tempo que passamos na


sorveteria finge que não entende quando falo em português com ele.

Me recuso a fazer a sua vontade, e só falo em italiano com o Lorran. No


carro a caminho da minha casa, Lorran pega no sono e consigo sair sem o
acordar, evitando outro escândalo.

O gosto amargo na boca pela forma arrogante que Levi me tratou me


empertiga. Eu só quero ajudar essa família e ele se recusa a ver isso? Mas esse
italiano vai ver que não pode mexer comigo e sair impune!
Levi
Quem aquela professorinha pensa que é?

Ela só pode ter feito alguma coisa para o Lorran se apegar a ela daquela
forma, não é normal que o menino faça birra diariamente quando tenho de ir
buscá-lo na creche.

Justo agora que estou buscando tratamento e tentando ser um pai de


verdade, o Lorran me rejeita, mas a culpa não é dele. É somente minha que o
abandonei desde o seu nascimento, mesmo morando debaixo do mesmo teto.

Foi isso tudo que a bebida e os remédios me tomaram: uma vida com meu
filho.

É mais fácil culpar as drogas do que admitir que eu sou a razão.

— Quelo zia vivia! — ele continua cantando enquanto roda pela casa em
protesto.

Os pés descalços e gordinhos batendo com firmeza no carpete da sala,


enquanto os braços sobem e descem em um protesto firme. Já faz três dias que a
birra dele tem piorado, e eu não sei o que fazer para o acalmar. Louis tem passado
mais tempo no escritório e não me dá suporte algum.

É a primeira vez que eu paro para cuidar do meu filho, é normal ser um
idiota que não sabe o que fazer, certo?

— Vamos tomar sorvete? — pergunto.

— Com a zia vivia? — para e os olhos dele brilham de vontade pela


companhia dela, suspiro frustrado.

— Não, só eu e você.

— Num quelo. — Faz bico e volta a marchar.

Passo a mão no rosto sem saber mais como barganhar com ele para o
convencer a parar de birra. Não faz nem dez minutos que chegamos da creche, e
estou me coçando para poder o deixar sozinho e fugir dessa perturbação na minha
cabeça.

Eu sou um idiota fraco e covarde, como pude pensar que de uma hora para
outra ele iria me aceitar? Se não tivesse a interferência daquela mulher maldita,
isso não estaria acontecendo, e eu poderia me comunicar com o Lorran sem todo
o estresse.

— Vamos tomar sorvete — levanto e vou à geladeira pegar o pote de


morango com chocolate. — Vem Lorran — ofereço uma colher a ele.

Lorran se aproxima com um bico maior ainda, pega a colher da minha mão,
e me abaixo para ele poder pegar o sorvete. A colher sobe acima de sua cabeça e
desce com velocidade no pote de sorvete, que balança na minha mão e acaba
caindo no chão.
O encaro incrédulo pela rebeldia, a cara fofinha dele explodindo em raiva
acumulada. Os braços cruzados fortemente na frente do corpo.

— Zia vivia! — grita na minha cara e depois sai correndo jogando tudo que
ele pega no chão.

O sangue ferve nas minhas veias e tenho ímpeto de gritar para o Lorran se
aquietar. Abro a boca e puxo o ar pronto para reclamar com ele. As mãos
pequenas pegam o Ipad em cima da mesa e o arremessa no chão com força
enquanto ele grita com toda a força pela Olivia.

— Chega Lorran! — Grito.

Ele me encara surpreso pela forma que falei com ele, e abre a boca ainda
mais, berrando alto.

— Santo Deus, que comoção é essa? — a governanta entra na sala e fica


horrorizada quando vê o estado entre a sala e a cozinha. — Não deixa o menino
quebrar as coisas!

A ignoro fingindo que não entendo seu idioma, ela é idiota ou o quê? Acha
mesmo que estou deixando o Lorran fazer essa zona na casa de propósito? Eu só
não sei que merda fazer com ele, se o Louis estivesse aqui saberia como acalmar
o Lorran, e o convencer de que não pode ficar com a professorinha dele direto,
aquela maldita!

Vai roubar meu filho de mim sem nem me dar a chance de lutar para que
ele possa ser meu.

— Para com isso, Lorran — vou até ele.

O tremor nas mãos aumenta a cada dia que fico sem beber, e sem os
medicamentos que usava para me dopar. Estou ingerindo uma nova medicação, e
ela ajuda a controlar a ansiedade melhor que a antiga, contudo, não afastou as
nuvens negras que se espalham ao redor.

— Vai tazer a zia vivia? — pergunta fazendo bico e calmo.

Esse moleque!

— Não.

— TE ODLEIO — Grita, alto demais com as bochechas ficando vermelhas.

O impacto de suas palavras me derruba no chão. Como que posso ter


quebrado minha relação com ele até chegar a esse ponto? Lorran tenta virar a
mesa de centro, mas não consegue devido ao peso dela.

Meu peito aperta tão forte que o ar me falta, e corro para a varanda
tentando respirar.

Inspiro e expiro tantas vezes que o dia começa a escurecer e o céu ser
coberto pela lua, enquanto o Lorran continua revirando a casa, e a governanta vai
embora, não conseguindo lidar com a situação.

Somente eu e ele nesse apartamento, envolto em sombras.

Puxo os cabelos, eu prometi que seria melhor, e na primeira dificuldade,


estou deixando o Lorran sozinho. Levanto cambaleando e o pego nos braços,
apanho seus tênis na entrada da casa, e enquanto ele grita no meu colo, desço até
a garagem e chamo o motorista.

O Louis vai conseguir lidar com essa situação melhor do que eu, tenho
certeza.

— Quer morar com sua professora? Pois peça ao seu zio! Eu desisto dessa
merda.
Ainda sou incapaz de fazer tudo sozinho, mas isso não significa que não
posso chamar pelo meu irmão para me ajudar. Calço os sapatos do Lorran quando
ele se acalma, deve achar que o tio concordara com a vontade dele, como sempre
fez.

Chegamos na empresa e a ansiedade triplica quando entro no elevador,


Lorran continua se debatendo. No lóbi vejo a secretária do meu pai, entro
cambaleando e deixo o menino com ela, sem explicação, corro para a sala do meu
pai que sei que está vazia.

Fecho as portas atrás de mim e puxo o elástico no meu pulso, o ardor na


pele começa a me ajudar a me acalmar.

Quando consigo respirar sozinho, eu saio da sala e vejo que o Lorran


sumiu. Levo as mãos a cabeça entrando em desespero quando portas são abertas,
e Louis surge com fúria no rosto, e o Lorran em seu colo escondendo a cabeça na
curva do pescoço do tio.

Parece até um anjo.

Fico com raiva por perceber o quanto ele muda quando está na presença do
meu irmão. Comigo ele não quer conversa, mas com o Louis, fica mansinho.

Mordo a bochecha, tentando evitar que a fúria escape.

— O que está acontecendo aqui? — Louis questiona.

— O bonito do seu sobrinho cismou que quer morar com a professora dele,
estava fazendo um escândalo em casa quebrando os brinquedos. Não consegui
controlá-lo e disse para ele pedir isso a você, quem sabe assim ele perceba que é
loucura querer morar com a professora! — atropelo as palavras uma na outra, a
fúria correndo quente em minhas veias.
— Lorran, você não pode morar com sua professora — ao contrário do que
o Lorran esperava, o Louis não apoia sua maluquice, e agora Louis ve o que eu
estava passando quando o Lorran começa a chorar e esperneia nos braços dele.

— A professora é a minha irmã? — Uma moça ao lado do Louis, pergunta,


não a tinha notado ainda.

— Sim.

— Posso ligar para ela vir, conversar com o Lorran, e o acalmar. — Ela
pega o telefone, a Olivia tem uma irmã que trabalha com o Louis?

— Por favor, faça isso.

Louis caminha para sua sala e o seguimos, sem que ele diga nada.

A mulher que imagino que seja sua secretária, liga para a Olivia e a
observo de perto, e o jeito que meu irmão a encara. É ela quem esse idiota acha
que o enganou sobre a virgindade? Só de ver os ombros curvados, a voz mansa, e
o jeito que ela o encara pelo canto do olho, percebo a timidez da moça.

Não sei o que aconteceu entre eles, mas tenho certeza de que essa coisinha
indefesa seria incapaz de enganar alguém como o Louis. Ele com seu ego
gigantesco tem se enganado sozinho.

Como essa mulher pode ser irmã da professorinha? A outra parece a porra
de um furacão, devastando tudo por onde passa, enquanto ela é mais como uma
rosa em meio a primavera.

Lorran continua em um choro sentido no colo do tio, enquanto me sento no


sofá, e fico puxando o elástico até a pele no meu pulso ficar vermelha e dolorida.
E mesmo assim, não é o suficiente para fazer a vontade de beber passar, não
consigo lidar com a tensão no ar, com o Lorran chorando, querendo uma pessoa
que ele mal conhece, e com o Louis me recriminando com o olhar.
Eu sei que sou um pai de bosta, não precisa ficar passando isso na minha
cara a todo segundo!

— Com licença — a voz doce chega aos meus ouvidos, olho para a porta e
ela entra, ainda usando o uniforme da creche.

— Zia vivia! — Lorran fica afoito no colo do Louis, e desce correndo para
os braços da professora, com um sorriso no rosto.

O elástico estrala mais uma vez no meu pulso quando eu vejo o sorriso dela
para ele, os olhos cheios de carinho e o abraço, envolvendo Lorran, caloroso
como o de uma mãe. Eu sou um imbecil por pensar por um segundo em ficar com
raiva pelo Lorran a preferir, sou o pai dele há dois anos e nunca olhei, ou abracei
meu filho com tamanho amor.

A criança só quer ser amada.

A culpa não é dele ou dela, é somente minha.

Levo a mão ao rosto cobrindo os olhos e tentando sufocar os soluços que


irrompem do meu peito como uma represa. A dor me rasgando em dois por me
dar conta, mais uma vez, do quanto fiz meu filho sofrer por nunca o ter olhado
como merecia.

A Blanca me odiaria por causar a dor do abandono no Lorran.

Minha língua saliva, querendo beber, e a cabeça implora pelos remédios


que me jogam no esquecimento.

Enquanto eu ceder aos vícios, continuarei machucando o Lorran e a mim


mesmo. Abafo um grito que vem da minha alma, desespero, solidão, e tristeza,
disputando quem me machuca mais.
Eu preciso sair desse fundo sem poço ou vou continuar machucando o
Lorran e destruindo os sentimentos do meu filho.

Olivia
Lorran chora.

Levi chora.

Bianca chora.

Louis tem os olhos marejados querendo chorar.

E eu seguro como posso as lágrimas para que o Lorran não me veja


chorando, e pense que é por culpa dele.

— Zia vivia eu quelo fica com ocê — soluça e meu coração fica do
tamanho de uma uva.

Enxugo as bochechas do Lorran, molhadas pelas lágrimas, e beijo sua testa


o apertando forte em meus braços. Eu não podia me envolver, é errado dar
carinho e atenção para além do profissional a uma criança, mas o que fazer
quando ele me pede com os diamantes em seus olhos brilhando de tristeza?
Eu não consigo negar afeto a ele, corro um risco enorme de perder meu
emprego, mas o Lorran precisa mais de mim do que eu de dinheiro.

— Num golto de fica cum o Levi — soluça — fica comligo zia vivia.

— Oh meu Deus — tampo a boca contendo o soluço, o que esse


desgraçado fez com o menino para ele ter aversão ao pai dessa forma? Encaro
Levi com o ódio borbulhando em minhas veias, e o vejo chorando copiosamente
enquanto puxa um elástico diversas vezes no pulso.

— Você podia tudo na sua depressão — digo em português para que o


Lorran não entenda — menos causar dor no menino dessa forma, seu imbecil —
mordo a língua querendo dizer muito mais.

— Olivia — Louis chama em tom firme — não julgue o Levi sem saber
pelo que ele passou.

— Não o defenda ignorando os sentimentos da criança — evito dizer o


nome dele para não saber que falamos sobre ele — você acha que isso é normal?
Ele me conhece a menos de um mês, e já se apegou ao ponto de dizer que odeia o
pai e que prefere ficar comigo! Eu também tive um pai com depressão pela morte
da minha mãe, sei o quanto corta de dentro para fora ser abandonada pelo único
pai que restou!

— Olivia! — Bianca grita meu nome, a voz embargada e os olhos


transbordando choro — não fale sobre o nosso pai desse jeito, todos nós
sofremos.

— São com justificativas assim que crianças como ele crescem com
traumas e abandonadas pelos pais — aperto o Lorran em meus braços — se Levi
fosse responsável o suficiente para sofrer sem magoar o filho, essa situação não
aconteceria. Não é errado sentir a dor da perda, mas a transferir, e fazer outras
pessoas a sentirem, é cruel. Você impôs aos outros aquilo que te machuca para
não sofrer sozinho.

Travo os lábios ao sentir a eminência do choro.

A sala fica em silêncio completo enquanto o Lorran brinca com os fios do


meu cabelo, mais calmo agora que cheguei, e deve imaginar que ficaremos
juntos. Levi não se atreve a me olhar, as mãos dele tremem, as pernas e o tronco
tomado pelos soluços silenciosos. A esse ponto ele ignorou o elástico e se encolhe
na sua bolha de dor.

— Como podemos resolver isso? — Louis pergunta.

— Eu não sei o que fazer — admito — o Lorran precisa de cuidados de


uma babá em tempo integral

— Qual a sua disponibilidade? — Louis pergunta — quando não está na


creche, você trabalha fora?

— Não, fico em período integral na creche.

— Vou matricular o Lorran em tempo integral, quando ele não estiver lá e


você tiver acabado o seu expediente, aceita ser a babá dele?

— Ele já passa o dia na creche, não sabia disso? — fico confusa.

— Desculpe, acabei esquecendo — sacode a cabeça de um lado ao outro,


atordoado — com tudo isso, fiquei um pouco... enfim, você aceita a proposta?

— Levi vai entrar em contato com a creche pedindo para que eu não seja
demitida por aceitar o emprego de babá de um dos meus alunos, e explicando a
situação peculiar que envolve o Lorran. Ele vai passar o dia na creche, e depois
fico com ele em casa até que durma, Levi vai assumir responsabilidade como pai
de todos os dias, dar o café da manhã dele, e o levar e buscar na creche —
arrebito o nariz — e quero um bom salário para aguentar o escroto do seu irmão
no processo.

— Você fez muitas exigências — posso ver a veia saltando na testa do


Louis, ele não esperava por alguém que o contrarie.

— Estou aceitando isso pelo Lorran — aperto o pequeno — mas não


significa que vou permanecer alienada ao abandono parental do Levi, ele vai
aprender a ser um pai, e garantir que o futuro do filho não seja enfiado em
psicólogos tratando os traumas causados na infância.

— Eu aceito — Levi fala, a voz rouca e os olhos inchados de chorar. Ao


menos ele conseguiu se recompor um pouco, apesar dos soluços persistentes —
seja a babá do Lorran, e me ensine a cuidar do meu filho.

— Não vou ensinar nada — me levanto com o Lorran no colo — fique de


olho no que faço e aprenda sozinho. A primeira coisa é se tratar...

— Já faço isso — me corta — sua julgadora de nariz arrebitado — se


levanta, posso ver um pouco de raiva em seu semblante — você não sabe a minha
dor, não tem o direito de me julgar.

— Enquanto você for o causador da dor do Lorran eu vou te julgar e jogar


pedras!

— Já chega! — Louis pede.

Mastigo a bochecha tentando evitar uma briga pior, meu sangue ferve.
Mexam com tudo que puderem nesse mundo, mas não façam uma criança chorar
que eu me revolto e jogo pedras antes de perguntar o crime.

— Vocês dois cuidarão do Lorran o dia todo, não podem se matar dessa
forma — Louis continua — Olivia, suas exigências serão atendidas, o que acha
de um salário de três mil?
— Bom, mas se seu irmão me tirar muito o juízo, você vai pagar extra por
cada vez em que eu não o matar.

— Eu que deveria receber — Levi levanta apertando os punhos — por ter


de lidar com você, sua desaforada!

— Irresponsável!

— Parem os dois! — Bianca pede.

— Se continuarem brigando dessa forma na frente do Lorran — Louis


intervém — esse arranjo nunca dará certo.

— É só continuar falando em português com um sorriso no rosto, não é


Levi? — Arqueio a sobrancelha para ele que morde os lábios percebendo que a
todo momento, se comunicou comigo na minha língua materna, e não em italiano
— seu disfarce de italiano que não sabe português caiu por terra.

— Non so a cosa ti riferisci[12]. — Empina o queixo, e volta a usar o


italiano.

Não parece o homem que se debulhava em choro segundos atrás. Talvez,


seja disso que o Levi precisa, para acordar e perceber que precisa ser um pai de
verdade para o Lorran. De alguém que o jogue nos limites, e o faça sentir outra
coisa além da tristeza profunda, e se esse italiano continuar me irritando, pode ter
certeza de que eu serei essa pessoa.

Não o deixarei em paz um segundo da sua vida enquanto eu não ver o


Lorran o chamando de pai, e feliz por ter sua presença na vida dele.

— O que ocês falam? — Lorran pergunta, ainda mexendo em meu cabelo.

— Que vamos te levar para tomar sorvete — o balanço e ele gargalha,


esquecendo o choro de tempos atrás.
— Quelo — Levanta os bracinhos sorrindo sapeca, e beijo suas bochechas.

— Vai passar a mão na cabeça dele depois de uma birra que destruiu os
brinquedos? — Levi pergunta em italiano, e Lorran o encara com medo de ser
repreendido.

— Se sentiu melhor quebrando seus brinquedos, Lorran? — pergunto ao


pequeno que faz bico e olha para o chão.

— Num — responde em um muxoxo.

— Você pode sentir raiva, mas não deve descontar nas pessoas — olho o
Levi de rabo de olho — ou nos objetos. Para que você não esqueça que isso é
errado, vai ficar sem novos brinquedos por um mês.

— Até meu iiiipad? — puxa o som do “i” e preciso me controlar para não
morder essa fofura.

— Principalmente o Ipad, onde já se viu um bebê com um aparelho caro


desses? Inacreditável — encaro feio o pai e o tio dele, e ambos desviam o olhar
— só vai ter outro quando eu achar que você é responsável o suficiente para ter
um.

— Zia vivia — quer começar a fazer manha, e encaro com seriedade. Ele
murcha e dá de ombros, aceitando que não vou ser manipulada pela sua birra,
como o pai e o tio.

— Agora vamos tomar sorvete, por que foi um dia cansativo, não acha
fofinho?

— Sì — sorri fofinho, e beijo sua bochecha dando por encerrado o assunto.

— Vamos — viro de costas e abro a porta saindo, não chamo o Levi, ele
vem atrás da gente, e percebo que ainda aperta o elástico contra o pulso.
Entramos no elevador, e Levi fica perto demais, fico empertigada quando ele
aproxima a boca do meu ouvido.

— Você é um diabo — ele fala baixinho para que o Lorran não escute, e
pequenos arrepios correm pelo meu corpo, a voz um tom mais grave causa um
rebuliço dentro de mim.

Me afasto dele sem dizer mais nada,

Enquanto fazemos o caminho para a sorveteria, eu percebo que agora com


os três mil que vou ganhar por ser a babá do Lorran, e meu emprego garantido na
creche, terei dinheiro o suficiente para poder realizar o meu sonho.

Posso dar entrada no processo de inseminação artificial, usando o esperma


de um doador anônimo, o dinheiro extra será usado no meu tratamento, e com
isso não sofrerei mais, esperando na fila da adoção pelo meu filho, posso o gerar
dentro de mim.

Arfo baixinho pelo alívio que inunda o meu peito.

Meu sonho finalmente vai se tornar realidade.


Levi
— Não é assim Levi! — Olivia branda pela quinta vez, e eu aperto a faca
no punho, imaginando quantos anos de prisão vou pegar por esfaquear essa
maldita mulher!

— Eu estou cortando cenouras — ranjo os dentes tentando controlar a


irritação — o que diabos pode ser feito de errado ao cortar cenouras?!

— Fatie em pedaços menores — ela pega a faca da minha mão, deve ter
sentido minha intenção homicida. — Presta atenção! — exclama, desvio o olhar
do rosto dela, e vejo as fatias minúsculas que ela corta as cenouras.

— Não vai dar nem para sentir o gosto desse jeito!

— Exatamente! Criança tem aversão a comer vegetal naturalmente, e o


Lorran não é acostumado a essa alimentação, temos de introduzir aos poucos.

— Corta maior, isso vai sumir quando colocar na panela.

— Fica quieto — ela suspira sem paciência. — O acordo foi você ficar
observando calado, e não zoando feito uma gralha!

— Uma, o quê?
— Uma ave barulhenta — revira os olhos e me afasto, antes que eu cometa
um assassinato contra essa mulher.

— Não sei como você pode ser professora do jardim de infância com uma
atitude ridícula dessas.

— Você que não sabe ouvir nada do que eu digo, é pior que os meus
alunos, e olha que eles só têm entre dois e três anos!

— Sua insuportável — levanto as mãos simulando que a estrangulo.

— Seu asno!

— Asno! — Uma voz fininha fala atrás da gente, e me viro para ver o
Lorran dando risada da nova palavra descoberta.

— Agora vai ensinar palavrões ao menino — ralho.

— Lorran fofinho — ela se abaixa ficando na altura dele — não pode


chamar ninguém de asno, a zia vivia disse uma palavra feia — abanda a mão na
frente do rosto, e o Lorran dá mais risada.

— Sì zia vivia.

— Em português fofinho, como fala a palavra sì?

— Sim — faz um ploc e abre os bracinhos a abraçando pelo pescoço.

Faz três dias que a Olivia é a babá do Lorran, e nunca vi meu filho sorrir
tanto enquanto eu enlouqueço. Nem tenho tido tempo para ficar triste com esse
furacão devastador me dando ordens o tempo todo.

— Podem ir tomar banho, vocês dois — ela diz — vou terminar o jantar.

— Vamos Lorran — estendo a mão para ele, a tremedeira tem aumentado


conforme os dias sem beber e meus medicamentos vão aumentando.
Faço, um esforço sobre-humano, para não ceder à tentação, e esfolo o pulso
de tanto bater o elástico contra a pele, tentando controlar o frenesi que corta
minhas células, implorando pelo vício.

Ficar mais tempo com o Lorran ajuda, não quero expor meu filho a esse
comportamento nocivo, mas tenho medo de acabar me irritando com ele por
besteira e o fazer me odiar mais ainda.

Lorran parece em paz com a Olivia em sua vida, e por mais que eu odeie
essa mulher, não teria a coragem para acabar com o relacionamento deles, ou
manchar a paz que meu filho tem tido.

À noite, quando me recolho no quarto, eu sou envolto pela escuridão que


nubla meu sono e enche minha cabeça de pensamentos autodestrutivos, enquanto
o peito é rasgado em dois pela dor que só aumenta sem os sedativos que eu usava.
E de dia, eu coloco um sorriso no rosto e finjo ficar feliz e disposto para fazer o
que preciso.

Malhar com o Louis, me alimentar melhor, ir ao terapeuta, e ficar


assistindo tevê enquanto não dá a hora de buscar o Lorran na creche, e trazer o
diabo para a minha casa.

— Blora? — Lorran puxa minha mão, não tinha percebido que fiquei
parado encarando o teto como um idiota.

— Sì.

— Plotugues Levi — ele me repreende, agora que a Olivia ensina a língua


a ele, sou impelido de falar também.

Eu não quero me comunicar com as pessoas, e fingir ignorância quanto ao


idioma, ajuda que elas não queiram falar comigo. Maldita hora em que deixei o
diabo perceber que eu falo fluentemente o idioma, ela sempre me olha
atravessado quando finjo não entender o que diz em português.

Acho que ela poderia enfiar a faca em mim se pudesse.

— Sim — digo a contragosto.

Eu nunca dei banho no Lorran.

É a primeira vez que farei isso, e fico nervoso, e se eu o afogar na


banheira? Se a água queimar a sua pele ou tiver gelada demais e ele pegar um
resfriado? Olho para a Olivia, que voltou a cortar a cenoura em pedaços
inexistentes, e pondero em pedir sua orientação sobre como não matar meu filho
durante um banho.

— Olivia — chamo e ela se vira para mim — a... a-a — pigarreio tentando
não gaguejar tanto — água deve... — me calo, ela suspira pesado, com pena.

— Ajuste a temperatura para a morna, e deixe o Lorran colocar a mão


antes, ele vai saber se está boa ou não.

— Certo — aceno e vou embora, constrangido o suficiente por não saber


medir a temperatura da água.

— O ensine a lavar o pintinho — ela diz — ele não sabe fazer isso ainda, e
não consegui demonstrar apropriadamente como faz.

— Tá bem.

Imagens de quando meu pai me ensinou como lavar meu pênis surgem na
minha mente. É a lembrança mais antiga que tenho com ele, não imaginei que o
Louis não tivesse ensinado isso ao Lorran ainda, meu irmão não deveria ser um
superpai que sabe fazer tudo melhor do que eu?
Talvez ele só tenha feito tudo esse tempo todo, sem ensinar ao Lorran como
ser independente de cuidados externos. Mordo a bochecha para transferir a dor do
peito para a carne, eu fui ausente e relapso por anos com o Lorran, não posso
querer recriminar o Louis por não fazer algo que era a minha obrigação.

No banho tiro a roupa do Lorran e olho o corpo do meu filho pela primeira
vez, ele é tão pequeno e branquinho, os cabelos se fossem louro-branco,
deixariam Lorran um albino, por sorte ele puxou meu tom, e o cabelo é como
ouro brilhante e cheio de vida. Checo à temperatura da água e o Lorran aprova
quando coloca a mão na banheira.

— Lorran você sabe como lavar o pintinho? — pergunto quando passo o


sabonete nas minhas mãos.

— Não — acena em negativo e bate as mãos na água jogando gotas por


todos os lados, molho a camisa e a tiro.

— Vou te ensinar, presta atenção no que faço e você repete em si, certo?

— Celto — foca sua atenção em mim.

Tiro a roupa e entro na banheira com o Lorran, e o ensinando como lavar


sua parte intimida. Ele dá risada quando deixo o sabonete cair na água, mas com
paciência ele se limpa sem se machucar.

É a primeira vez que ensino algo ao meu filho, e a sensação é libertadora,


um peso saí dos meus ombros, e respirar se torna um pouco mais fácil enquanto
olho as bochechinhas vermelhas e o sorriso de dentes pequenos no rostinho dele.

— O do Levi é glande, polque? — Ele aponta para o meu pênis.

— Eu sou adulto, tudo meu é maior comparado ao seu — encosto sua mão
na minha.
— Verdade — exclama e abre a boca como se tivesse descoberto um
momento único. — Eu vou flicar glandão?

— Se comer direitinho, e fizer muito exercício físico, vai, sim, somos


homens grandes, de família.

— Verdade?

— Já viu como seu zio e seu nonno são altos?

— Sim — acena em positivo — enolmes.

— É de família, você vai ficar desse jeito quando crescer.

— Quelo clescel lolgo — se esforça para falar com a língua travando nas
consoantes.

— Não tenha pressa — aliso sua cabeça — acho que tenho de lavar seu
cabelo, feche os olhos para não cair shampoo.

— Celto.

Lavo o cabelo do Lorran com cuidado para não machucar sua cabeça e não
arder seus olhos. Quando termino, o enxugo e a mim, saio com a toalha enrolada
no quadril, e imito o mesmo no Lorran, que acha divertido.

Vamos para seu quarto e estanco na porta quando vejo a Olivia separando a
roupa dele na cama, ela me nota, e os olhos travam no meu corpo desnudo, as
bochechas ganham um tom de vermelho muito forte enquanto ela desvia o olhar
para qualquer canto no quarto que não na minha direção.

— Vai com a Olivia para ela colocar sua roupa, Lorran — o coloco no chão
e ele corre para ela.

Antes que ela possa dizer algo, eu saio do quarto.


O jeito que ela me encarou me incomoda, uma pontada no peito como se eu
tivesse feito alguma coisa errada. Vou para o quarto, e depois jantamos em
silêncio, evito conversar enquanto não consigo distinguir o incomodo que me
abateu.
Olivia

Alguns dias depois


É difícil lidar com o Levi quando ele tenta ser prestativo, mas é pior ainda
quando ele não quer ser útil para nada!

Acordo com o celular tocando, e a voz do Louis irritada, pedindo que eu vá


buscar o Lorran em casa e o levar para a creche. Esse italiano folgado gosta de
gritar com todo mundo, ele tem sorte que fiquei agradecida pelo que ele fez por
minha irmã, ou eu o receberia com uns bons gritos por alterar a voz para mim.

Quando o Louis não age como um prepotente arrogante, ele se torna um


cara minimamente descente. Ainda não sei o que minha irmã vê nele, eu percebo
o jeitinho envergonhado que ela fica quando está na presença dele, as bochechas
vermelhas e como olha para ele querendo muito mais do que ele dá.

Até uns dias atrás eu queria o mandar enfiar o ego no meio do rabo dele,
mas a Bianca passou por uma situação difícil, e que eu não poderia a proteger, e o
Louis fez isso no meu lugar.
Preciso lembrar de demonstrar minha gratidão por cuidar dela quando não
pude. Vou levar um porrete comigo, para o agradecer, e depois ameaçar, que ele
não pense que pode partir o coração da Bianca, ou eu que o partirei em dois.

Enquanto eu desisti de acreditar no amor, Bianca segue se apaixonando


cada dia mais por aquele italiano arrogante. Ao menos, o Louis faz alguma coisa,
ao contrário do Levi, pensei que ele estava melhorando por fazer as tarefas
mínimas de cuidado com o Lorran, e às vezes puxar papo com o menino e dar
pequenos risos olhando o filho.

Até ontem, quando o imbecil se trancou no quarto e pelo visto não saiu
mais.

Desligo o celular e me levanto, em três dias poderei dar início ao processo


de fertilização, e estou uma pilha de ansiedade, se der certo, meu sonho de ter um
filho, finalmente poderá se tornar realidade. Penso no Lorran, será que ele ficaria
feliz em saber que eu posso ter um filho? Imaginar que o pequeno possa ficar
com ciúmes ou magoado aperta meu coração, e por um segundo mínimo, eu
penso em desistir da ideia.

Me assusto com o quanto deixei me apegar ao Lorran, ao ponto de querer


adiar meu sonho de ser mãe para não magoar o coração do pequeno, pensando
que o abandonarei para cuidar do meu filho.

Ele sofreu muito em seus poucos anos de vida, em vez de meu futuro filho
ser um obstáculo para Lorran, vou fazer com que sejam melhores amigos.

Levanto e faço minha higiene matinal, quando saio do apartamento passo


na padaria e como um salgado, na rua vejo a SUV preta que busca o Lorran na
creche, e o motorista do lado de fora procurando por alguém, quando me vê
acena e vou até ele. Entro no carro ainda bebendo meu café e vamos para o
apartamento.
Checo meus e-mails e redes sociais no caminho, e vejo que uma colega de
faculdade casou e anunciou a gravidez.

Eu lembro de quando ela conheceu o namorado, ele era do curso de CIT e


muito charmoso, sempre a buscava na sala de aula, e as meninas o chamavam de
piegas, enquanto ela dava a língua para todas e sorria feliz, por encontrar o amor.

Será que agora ela continua com o mesmo sentimento de antes?

Como será que é amar alguém e ter a confiança de que aquela é a pessoa
certa? Eu não consigo acreditar que outros homens, serão capazes, de serem
diferentes dos meus ex que machucaram meu coração. Ninguém ama outra
pessoa eternamente, somente enquanto ela está presente.

Paramos no prédio e olho para cima, naquele lugar tem um homem que
amou tanto uma mulher que após a sua morte, entrou em depressão profunda, ao
ponto de esquecer do próprio filho. Realmente é amor o que ele sente, ou
somente a falta da presença dela, e o que ela significava em sua vida? Nunca
parei para entender as razões do Levi ser dessa forma, eu o julgo baseado na
minha situação que se assemelha ao do Lorran.

Talvez eu esteja sendo um pouco dura com ele.

Entro no elevador e quando saio ouço os gritos do Lorran, ele parece que
brinca com alguém, pelas gargalhadas. Bato na porta e ela é aberta pelo Louis,
com o sobrinho pendurado em seus ombros, Lorran usa somente uma cueca, com
os cabelos totalmente bagunçados, verifico a hora e temos menos de meia hora
para sair de casa e chegar a tempo na creche.

— Por que ele não está arrumado? — rango os dentes, a consideração que
eu tinha adquirido pelo Louis indo embora em um passe de mágica!
— A coisa está caótica Olivia — Louis suspira e vejo as bolsas negras
embaixo de seus olhos — hoje é a data que o Levi e a Blanca se casaram, e desde
ontem ele entrou em um mini surto — ele fala baixo em português para o Lorran
não entender — deixa para brigar comigo depois, agora tira o Lorran daqui que
eu vou cuidar do meu irmão antes de sair.

Ele me entrega o sobrinho e desaparece entre as portas, Lorran sorri para


mim e beija minha bochecha bem gostoso.

Um homem que nunca esqueceu o amor pela esposa, lembro com um


suspiro antes de beijar o Lorran e o levar para um banho apressado, enquanto
peço a governanta para preparar o café dele.

Lorran come sem fazer bagunça e vamos para a creche, quando estamos
saindo escuto gritos profundos da dor do Levi. O som parte minha alma, eu já o
vi chorando, mas nunca foi forte como nesse momento.

****

Voltamos para casa e as coisas continuam igual, o Levi trancado no quarto,


enquanto o Lorran começa a ficar inquieto, ele se apegou um pouco ao pai esses
dias em que ele esteve presente.

— Levi num vem janta? — pergunta, quando coloco outra colher de arroz
na boca dele.

— Acho que não fofinho.

— Polque? — entrego o guardanapo, a ele que limpa os cantos da boca e


abre pedindo mais. Estou começando a introduzir que ele coma os alimentos mais
sólidos, como frutas, sozinho, por enquanto os que precisam de uma colher eu
dou a ele.

— Acho que ele está doente.


— Vamos velifica? — antes que eu possa responder, o Lorran desce da
cadeira e corre para o quarto do pai.

Não sei o motivo, mas a porta do Levi nunca fica trancada e já percebi que
ela não tem chave na fechadura, talvez seja coisa do Louis com medo do irmão
fazer alguma besteira. Lorran entra como um pequeno furacão no quarto escuro e
sobe em cima do Levi, que não se mexe quando o pequeno começa a pular em
cima dele.

Acendo a luz, e o quarto está impecável, como se ninguém morasse ali, se


não fosse o Levi na cama, apagado, eu juraria que não tinha pessoas nesse quarto.
Lorran sacode o pai que não se mexe e começo a ficar irritada, tudo bem que ele
esteja doente e sentindo uma dor do inferno no coração, mas não se ignora um
filho.

— PARA LORRAN — Sua voz rouca branda debaixo do coberto e o


Lorran se assusta, ele treme e cai na cama começando a chorar, o pego no colo no
mesmo instante e quero espancar o Levi por fazer o Lorran chorar desse jeito.

— Calma, fofinho — peço o tirando do quarto antes que cometa um


assassinato.

— Polque ele glito comigo? — funga.

A culpa é minha por confiar nas outras vezes em que o Lorran pulou em
cima do Levi e ele não fez nada com o menino, no fundo, tive a pequena
esperança que ele fizesse como da outra vez e abraçasse o filho. Aquele
desgraçado vai ver que não se mexe com uma criança.

— Não pula mais em cima do Levi quando ele estiver daquele jeito, certo?
— peço encarando seu rostinho choroso, e ele funga antes de assentir.

— Levi tá dodói?
— Sim, bem aqui — passo a mão no peito dele — mas um dia ele vai ficar
bom.

— Polmete?

— Sim — beijo sua testa.

Odeio fazer promessas que não posso cumprir, e essa ao Lorran, me deixa
de coração na mão com medo de decepcionar o pequeno. Levi pode nunca
superar a depressão, e viver o resto de sua vida desse jeito, recluso, triste, com
dor, e causando no pequeno.

Demoro mais do que o normal para fazer Lorran dormir, e percebo como
ele olha para o quarto do pai com medo, talvez, de que ele saia de lá e grite
novamente.

Quando finalmente o coloco para dormir, eu decido que Levi vai aprender
que mesmo na dor dele, não pode machucar as pessoas ao seu redor. Lorran não
vai crescer como eu cresci, e as chances de que eu seja demitida pelo que estou
prestes a fazer são poucas, afinal, Lorran não me deixaria ir embora, e o Louis faz
tudo o que puder para que o sobrinho seja feliz.

Encho o balde com água, e com cuidado vou para o quarto do Levi, não
quero que ele escute o que estou prestes a fazer. Abro a porta e ele ainda dorme
embolado nas cobertas, aproximo, e com cuidado eu consigo subir na cama para
ficar acima de sua cabeça, posiciono o balde e viro o conteúdo encharcando o
Levi.

Ele empurra as cobertas e a água o cega, enquanto continuo jogando o


líquido até acabar. Levi cai da cama atordoado, limpando o rosto, e quando os
fios de cabelo saem de seus olhos ele procura a fonte do aguaceiro, e me acha em
cima da cama. Eu vejo o segundo exato em que a dor deixa as suas írises e se
transforma em raiva, quente, latente, e finalmente o fazendo reagir de uma forma
diferente.

— FICOU LOUCA? — Berra, ainda sentado no chão.

— Fala baixo que acabei de colocar o Lorran para dormir — deixo um


dedo em riste na frente da boca e desço da cama, ainda o olhando por cima —
você, nunca mais grite com o menino, ou eu juro que da próxima vez, a água vai
estar pegando fogo.

— Quem merda você pensa que é? — se levanta, a voz imbuída em raiva,


mas mais calma.

— A pessoa, que não vai, aceitar que você continue sendo um bosta de pai
— jogo o balde nos seus pés e ele pula no lugar — chega dessa merda de
depressão e de ficar magoando o Lorran.

— Você não faz ideia do que eu sinto — rosna na minha cara.

— Mas eu sei o que o Lorran sente — devolvo, Levi é uns bons


centímetros mais alto do que eu, e preciso empinar o nariz para o encarar nos
olhos.

Faíscas saltam de nossos corpos se chocando um contra o outro enquanto


nos desafiamos com o olhar. Levi não está disposto a ceder, e muito menos eu. É
a primeira vez que fico perto dele dessa forma, capaz de sentir sua respiração
pulsante contra meu rosto, nariz a um centímetro de se tocarem, e olhos fixos,
com o poder, de devorar a alma.

— Amanhã à noite se prepare — digo a ele — você vai sair dessa maldita
cama e aprender a viver a vida.

— Que merda você quer dizer com isso? — fica confuso.


— Que eu vou ser a babá do Lorran e te ensinar a viver novamente,
sairemos às 19h, invente a desculpa que quiser ao Louis, ele vai ficar com o
Lorran e você vai aprender que estar vivo, não é só ter um coração batendo no
corpo.

Saio do quarto sem esperar a sua resposta, pego minha bolsa em cima do
sofá e deixo o apartamento, do lado de fora me escoro contra a porta pensando o
que diabos eu acabei de fazer.

Merda, intimei o Levi a ir em um encontro comigo e nem sei direito o


motivo de ter feito isso.
Levi
Essa mulher é o cão.

Satanás deve ter tido medo dela e a expulsado do inferno, para ela vir me
punir pessoalmente por todos os pecados que cometi sendo um pai relapso para o
meu filho.

A água que jogou em mim, ainda pinga no piso do quarto enquanto eu fico
como um idiota encarando a porta do quarto por onde ela passou faz uma meia
hora.

Passei o dia sentindo uma dor dilacerante no meu peito lembrando do dia
do meu casamento com Blanca, e do nosso último aniversário junto, até essa
desgraçada vir me molhar, e falar essas merdas na minha cara, quem diabos ela
pensa que é?

Encaro a minha cama sem saber onde vou dormir agora que tudo ficou
ensopado. Tiro a roupa e me enxugo para vestir uma seca e vou para o quarto do
Lorran, não percebi que tinha brigado com ele até a Olivia chamar a minha
atenção, quando fiz isso?
O encontro dormindo dentro do berço, e me aproximo com calma, para não
perturbar seu sono. Lorran se mexe quando toco em sua testa e os olhos abrem
sonolentos, fechando em seguida e tornando a abrir quando ele me vê.

— Ocê tá bien? — pergunta com a voz rouca de sono.

— Desculpe ter gritado com você — o pego no colo e beijo sua cabeça,
inspirar o cheiro do Lorran ajuda a acalmar a tormenta em meu peito — não
percebi que tinha gritado.

— Tá bom — deita a cabeça no meu ombro e brinca com a gola da minha


camisa.

Não sei ao certo como agir com o Lorran agora, se o deixo dormindo no
berço ou faço alguma outra coisa, já são 21 horas da noite e sei que ele dorme
cedo. Mas o segurar no braço me trouxe uma calma que eu não posso perder
agora, a segurança de que tudo ficará bem se eu continuar o apertando firme em
meus braços.

— Quer dormir comigo? — pergunto.

— Sì — boceja.

Minha cama ficou ensopada e o sofá não é uma boa opção, olho ao redor e
não vejo um lugar confortável para mim e ele. O Louis já chegou em casa? Vou
para o quarto dele e vejo a cama arrumada indicando que ele não ficou por aqui,
parando para pensar, meu irmão tem dormido pouco em casa nos últimos dias, o
que será que tem acontecido com ele?

Entro e me deito na cama com o Lorran, que só agora percebo, que ainda
tem a pelúcia do gato agarrada em seus bracinhos. Ele se encolhe entre os lençóis
e dorme em dois instantes, apesar de ter passado o dia recluso na cama, estou
sentindo muito sono. Entro debaixo das cobertas e fico observando o pequeno
rostinho dele, até ser vencido pelo sono.

Acordo com Lorran saindo da cama sozinho, sem fazer barulho, os


pezinhos tocam o chão na ponta dos dedos enquanto ele fecha a porta atrás de si.
Me levanto e vou atrás dele, sem fazer barulho ou deixar que ele me perceba,
Lorran entra na cozinha e abre a geladeira, se esticando para conseguir pegar
alguma coisa dentro.

Pairo acima dele e vejo que ele quer uma garrafa de água, a pego, e depois
o levanto, colocando-o em cima do balcão de mármore, e sirvo a água em um
corpo de plástico. As mãos pequenas agarram o copo e o levam a boca, lá fora o
tempo está nublado e prometendo uma chuva forte, a governanta aparece na
cozinha, acena para mim e vai preparar o café da manhã.

— Banho? — pergunto ao Lorran que acena em positivo.

Em menos de duas horas ele e eu estamos arrumados e alimentados,


estranhamente, a infelicidade que me assolou ontem não faz presença, e consigo
o deixar na creche sem dificuldade ou acompanhado pelas sombras que
retornaram ontem.

Fico com uma pequena ansiedade quando descemos em frente a creche e


caminhamos para a sala de aula dele. Parada na porta com um sorriso no rosto
está a secretária do satanás usando a farda da creche e o cabelo preso em um rabo
de cavalo com alguns fios solto em seu pescoço.

É a primeira vez em que reparo na Olivia, ela tem olhos verdes e cabelos
castanho escuro, o rosto redondo com bochechas que ficam cheias sempre que ela
sorrir para os alunos, os dentes brancos e bem alinhados. Pescoço longo, ombros
pequenos, e uma cintura marcada pelo cinto da calça, que cobre a barra da
camisa. Ela é bonita, e eu nunca parei mais do que três segundos para analisar a
sua existência.

Por que ela me toca de maneira diferente dessa vez? Ontem eu queria matá-
la quando me tirou da cama, a dor me consumia em carne viva, e então o ódio fez
tudo desaparecer, e desde que dormi com o Lorran, tenho sentido uma estranha
letargia, nem dor e nem paz, algo como ficar flutuando em um limbo. Por um
segundo a depressão parece que me deixa em paz, e o frenesi por beber começa a
acalmar.

— Bom dia fofinho — se abaixa para beijar a bochecha do Lorran e


receber o carinho dele. — Tudo bem?

— Sì! Eu dolmi com o Levi — fala animado.

— Sério? — ela tenta não deixar que ele perceba o quanto fica chocada,
mas eu noto o franzir de sua sobrancelha e o olhar em descrença — e como foi
isso?

— Num sei, só dolmi — dá de ombros, e alguém o chama dentro da classe,


Lorran corre para encontrar com a coleguinha — tchau Levi — diz sem me olhar,
entretido.

— Eu te pego as 19h, já disse ao Louis que ele vai cuidar do Lorran —


Olivia chama minha atenção, e coço a cabeça, sem saber como proceder.

— Isso não vai dar certo — digo e vou embora.

Não existe a menor possibilidade desse encontro dar certo, eu não quero
me envolver com a Olivia. Amo a Blanca com a mesma intensidade de quando
ela estava viva, e nunca seria capaz de sentir tal coisa por outra mulher ou de trair
a imagem da minha esposa.
Entro no carro e lembro que hoje eu não fiz os exercícios com o Louis,
mando o segurança me deixar na empresa, talvez meu irmão possa me dar um
conselho sobre essa maluquice da Olivia, que eu nem sei o que é ainda.

Minha consulta com o psicólogo é somente as 14 horas, e ainda tenho


muito tempo sem nada para fazer enquanto enlouqueço.

Chego na empresa e não vejo a secretária dele do lado de fora, a do meu


pai sorri para mim e não fala nada, além de um cumprimento. Abro a porta da
sala do Louis e entro, o som de algo caindo chama a minha atenção, e vejo meu
irmão entre as pernas da Bianca enquanto o porta caneta foi ao chão.

Bianca tem os olhos arregalados me encarando com os lábios roxos e fecho


a porta atrás de mim, então o sem vergonha decidiu ter algo com ela e não me
contou nada? Louis vira para trás, e ao me ver, tem a mesma expressão surpresa
que a Bianca, ele faz sinal com os olhos de que devo ir embora, mas
curiosamente, estou ansioso para saber o que se passa entre esses dois.

Me sento no sofá e cruzo uma perna em cima da coxa esperando o que eles
vão fazer. A calça dele está perfeitamente arrumada, e sei que não deve ter o pinto
para fora, por isso só viro o rosto para o outro lado enquanto escuto sussurros e a
Bianca deixa a sala com um sorriso envergonhado.

— Esqueceu como se bate? — ele pergunta irritado, sentando-se no sofá de


frente para mim.

— Com certeza — digo e sorrio para ele — é essa a garota que você
achava que tinha mentido sobre ser virgem só para te fisgar?

— Sim — coça a cabeça — eu estava errado, a Bianca não fez isso, e fui
um asno por ter pensado mal dela.
— O grande Louis Vittileno admitindo que foi um asno, com certeza é o
fim dos tempos — debocho, e ele tem um olhar suave quando me encara.

— Vai fazendo piada seu engraçadinho — se estica e bate na minha perna.

— Onde você passou a noite? — pergunto.

— Com a Bianca — coça o queixo — estamos meio que juntos — dá de


ombros como se não fosse nada demais.

— Tem certeza de que você quer isso? — pergunto sério, sei o quanto o
Louis pode ser desconfiado com as mulheres e para ele se entregar tem de ter um
motivo.

— Sim, eu confio na Bianca — a certeza em seu olhar bate firme dentro de


mim — e sobre o que eu te disse sobre ela...

— Não esquenta — levanto as mãos — é assunto pessoal, e confio mais no


seu julgamento do que no meu — aponto para a porta — aquela moça tem uma
aura doce, não seja um completo idiota.

— O que te aconteceu? — ele me analisa desconfiado e feliz — você


parece diferente.

— Tomei um banho ontem à noite e dormi com o Lorran, acho que renovou
minhas energias — omito sobre a Olivia, ainda tô achando estranho, o estranho
limbo em que acordei.

— Desde quando um banho tem tamanho poder de mudança? Você fala


como se fosse um porco que nunca vê água — debocha, e rio.

Pela primeira vez em muitos anos eu realmente sou capaz de abrir a boca e
gargalhar. Meu Deus, o que está acontecendo comigo, e por que me sinto assim?
Cheio de endorfina.
— Vou nessa — me levanto — tenho de malhar, porque você não dormiu
em casa, e não me acordou para fazermos isso mais cedo.

— Eu malhei de outro jeito — se levanta rindo.

Sinto a estranha vontade de abraçar meu irmão e faço isso, ele retribui com
dois tapinhas na minha cabeça.

— Hoje à noite vou sair, toma conta do Lorran — digo.

— Você saindo? — me olha desconfiado — para onde, e com quem?

— Não é da sua conta, papai — brinco e o Louis fica mais desconfiado,


antes que ele possa fazer outras perguntas eu vou embora.

— Tchau!

Não sei o que aconteceu comigo, mas pela primeira vez em dois anos, eu
quero aproveitar um dia nublado em vez de me esconder debaixo dos
travesseiros. Inspiro fundo e vou para a academia, e depois, a minha sessão no
psicólogo, em que passamos horas falando sobre como me sinto estranho no
estado de limbo.

— Esse pode ter sido o seu ponto de vira Levi — ele diz.

— Não entendo, não aconteceu nada demais.

— Foi um conjunto de acontecimentos, aos poucos você estabeleceu uma


rotina, criou laços com seu filho e seu irmão. Interagiu com outras pessoas, e
mesmo que brigando com a Olivia, ela é capaz de te fazer sentir outra coisa além
da raiva.

— Eu vou continuar assim para sempre? É isso, venci a depressão?


— A depressão é formada por vários estágios, você passou os últimos anos
extremamente deprimido e sem vontade de viver. Agora que passou a realmente
viver os seus dias, você está evoluindo no estágio da depressão em que consegue
ter dias que não são nublados, isso não significa que ela não vá voltar ou que
você não possa ser feliz, somente que você percebeu que tem outros jeitos de
seguir em frente.

— Vou conviver com a depressão por muito mais tempo, é isso?

— Talvez, vamos continuar tratando seus sentimentos e o luto nas nossas


sessões, para que você consiga ter mais dias ensolarados do que sombrios.

— Isso parece uma boa promessa.

— Não é promessa Levi, é o resultado do seu tratamento.

— Certo.

Conversamos mais um pouco e vou embora, busco o Lorran na creche, e


ligo para o Louis buscá-lo que estou prestes a sair. Não acredito que vou usar
meu irmão para cuidar do meu filho enquanto saio com uma mulher. Isso parece
errado e certo ao mesmo tempo. Não consigo processar a fundo o que acontece
comigo, porque a campainha toca, e quando a abro, vejo uma Olivia que nunca
observei antes.

Cabelo solto e de maquiagem, realçando a beleza, vestido soltinho e uma


rasteirinha nos pés, a bolsa na mão enquanto ela me olha com expectativa no
olhar.

Não posso prever o que acontecera hoje, mas sei que estou animado para
descobrir, pela primeira vez em dois anos, não quero só dormir, me dopar e beber.

Tenho vontade de viver.


Olivia
Levi está decente.

Convenço a mim mesma desse pensamento quando o encontro na porta do


apartamento. Trajando uma camisa de manga ¾ na cor marrom, e calça bege,
com sapato na mesma tonalidade, ele penteou os cabelos para trás, e acho que
nunca consegui ver tanto de seu rosto como nesse momento.

Os olhos azuis com uma depressão profunda e os lábios comprimidos.

Meu estomago dá cambalhotas, e só pode ser sinal de fome, não existe


outra razão para isso acontecer além da necessidade por comida, afinal, não me
alimento desde a hora do almoço.

— Vamos? — pergunto, quebrando o gelo que se passou nos últimos


minutos desde que ele abriu a porta.

— Para onde, exatamente? — fecha a porta atrás de si e sou atingida por


seu cheiro almiscarado.

— Você vai ver — dou meia volta na direção do elevador, aperto a bolsa
sem entender ao certo a ansiedade causada pelo nosso encontro.
— Espero que não esteja me levando para uma balada — resmunga —
devo ter ficado louco em concordar em sair com você.

— Eu que perdi a minha sanidade — reviro os olhos e entramos no


elevador, sozinhos nessa caixa fechada, o ar fica rarefeito e preenchido pelo
cheiro dele.

— Por que me arrastou para isso? — se escora no elevador — você me


detesta.

— Não exatamente, eu só não concordo com sua atitude paterna — dou de


ombros e o encaro de frente — olha eu adoro o Lorran e pretendo ver esse
menino crescer, mas se continuarmos em pé de guerra, em algum momento ele
será prejudicado, e eu prefiro perder um braço a machucar o Lorran.

— Você está passando de todos os limites, não deveria se envolver.

— E você deveria se envolver mais — rosno — o Lorran precisa de um


pai, ficar chafurdando na sua dor, não traz benefício a ninguém, hoje vamos sair
para você lembrar como é viver em sociedade!

— Eu sei que preciso mudar — bufa e mira o chão — estou me esforçando


na terapia, e não bebi uma gota de álcool desde aquele dia, é difícil Olivia — me
encara, por um segundo me arrependo de julgá-lo. Levi tem dor, e vontade de ser
melhor em sua expressão — você pode ter passado pelo inferno, mas sua
experiência não é a minha ou a do Lorran, você me julga sem nunca realmente
me entender.

— Você não está errado — empino o queixo, não querendo dar o braço a
torcer — e vou continuar te julgando enquanto não sentir que você se tornou um
pai para Lorran.
— E quando na sua cabeça julgadora seria esse momento? — arqueia a
sobrancelha.

— Quando ele te chamar de pai, podemos começar por isso.

— Você não tem medo de machucar as pessoas com suas palavras.

Não é uma pergunta, ele já percebeu que não tenho paciência, ou papas na
língua, para ser delicada com quem julgo que não merece.

— Ninguém se importa em me machucar, por que eu deveria fazer isso


pelos outros?

As portas se abrem e saímos sem terminar a conversa. É estranho me abrir


minimamente com Levi, e talvez esse passeio seja uma má ideia. Preciso lembrar
a razão de eu fazer isso: Lorran não pode conviver comigo e com o pai dele se
matando vinte e quatro horas, por coisas idiotas, um pouco de intimidade vai
ajudar na nossa relação com o pequeno.

— Vamos andando — digo a ele quando o vejo parado, olhando para os


lados como se esperasse o motorista — não é muito longe.

— Depende do que você considera longe — ele reclama quando me segue


pelas ruas de São Paulo.

— Vocês moram em um ótimo bairro, zona de gente rica — mostro a


língua e ele revira os olhos — um riquinho mimado como você precisa andar um
pouco.

Levi fica ao meu lado, coloca as mãos no bolso da calça e encara o céu,
como se ele visse algo que eu não fosse capaz. As estrelas acima da nossa cabeça
brilham com algumas nuvens cinzas ao redor. É uma bela noite para um passeio,
caso não chova, se acontecer, estou preparada com minha sombrinha.
— O trânsito daqui é sempre caótico? — ele pergunta, enquanto esperamos
na faixa de pedestre para atravessar na Rua Bela Cintra, ao nos dirigirmos para a
Avenida Paulista.

— Tem dia que fica pior, já tentou andar no metrô? — apresso o passo
quando o sinal fica vermelho para o pedestre, e ele me segue, acho fofo como ele
anda com as mãos dentro do bolso.

— Uma vez, quando fiquei bêbado, entrei no metrô sem destino. Não me
lembro ao certo o que fiz enquanto estava dentro dele.

— Por que você sumiu naquele dia? — pergunto, faz um tempinho que
queria saber o que houve.

— Hum — ele pondera — se eu contar vai te fazer me detestar menos?

— Com certeza não — dou de ombros — mas irei te julgar menos, caso eu
compreenda o motivo.

— No dia anterior eu tinha feito o Lorran chorar — curvo na esquina


pegando a Alameda Itu, e ele passa direto, volto e o puxo pela manga da camisa
— e aquilo me desestabilizou, minha depressão, tem momentos em que eu vejo
tudo perder a cor, o mundo se torna sombrio, e é como se eu caminhasse com
sombras ao meu redor. Quando deixei o Lorran na creche as sombras queriam o
pegar.

Levi se cala, ele encara ao redor como se estivesse pensando se deve ou


não continuar me contando o que aconteceu.

— Você pode falar comigo — toco seu cotovelo.

— O Lorran tem um brilho ao redor dele que sempre afasta as sombras,


mas eu tenho medo de que elas o machuquem e manchem sua alma, como
fizeram comigo. Quando eu te vi naquela manhã, você brilhava igual ao Lorran
— ele evita me encarar — na minha mente confusa eu achava que ele ficaria
melhor com você, que era um raio de sol, do que comigo, envolto em trevas, por
isso sumi e fui beber, desesperado por um alívio no meu tormento.

— Você foi embora por que queria protegê-lo, é isso?

— Basicamente — encolhe os ombros.

— E eu sou um raio de sol? — arqueio a sobrancelha meio incrédula,


nunca me chamaram dessa forma.

— Sim — ele vira o rosto para que eu não o veja, mas consigo visualizar
suas orelhas vermelhas — para de me encher com isso.

— Não estou fazendo nada — sorrio.

Puxo o cotovelo do Levi e o faço parar no meio da calçada e me encarar.


Levi é uns bons centímetros mais alto, suas bochechas estão rubras, e o olhos não
conseguem focar em mim por mais de três segundos antes de desviar. Seguro
suas bochechas e o faço se inclinar para que escute com atenção o que direi.

— Pode me usar como seu raio de sol quando a escuridão te atormentar,


faça o que for preciso para conseguir melhorar e ser um pai para o Lorran.

A forma dele me enxergar como uma luz faz meu coração amolecer para a
sua dor, e quero o ajudar mais do que o julgar.

— Eu não quero um relacionamento com você, amo a Blanca e isso não vai
mudar.

— Não estou oferecendo que tenhamos uma relação amorosa Levi — o


puxo mais ainda, encostado nossas testas uma na outra — somente que use minha
luz para clarear sua escuridão. — O solto — e eu não quero namorar com você —
o encaro de cima a baixo — você não é o meu tipo — me tremo, simulando que a
ideia de me relacionar com ele me dá nojo.

Não acredito que deixei esse idiota amolecer meu coração com o papo de
raio de sol!

— Arrogante — rosna se ofendendo por eu ter me tremido — eu que não


quero você, já estive com mulheres muito mais deslumbrantes.

— E eu acredito — coloco as mãos na cintura — já viu como o Lorran é


bonito? Com certeza puxou a mãe dele, ela deveria ser deslumbrante!

— Uma deusa, ao contrário de você que mais parece uma rata! — tira as
mãos do bolso e as abre apontando para mim.

Arfo, como ele ousa?

— Uma rata que você acabou de chamar de raio de sol! Seja mais
convincente em suas mentiras.

— A depressão me fez agir como louco por dizer isso, sua rata!

Seguro a bolsa com força e bato em seu ombro três vezes sufocando gritos
de frustração antes de me recuperar e começar a andar. Levi não perde tempo e
vem atrás de mim calado e bufando de raiva. Entramos na Rua Pedro João e
depois na Avenida Paulista em silencio total, quero esganar esse italiano
arrogante, como ele ousa me chamar de rata e supor que não sou bonita?

Eu sou linda, e não preciso que esse italiano diga algo para eu saber disso.
Foram anos cuidando da minha autoestima e percebendo como as pessoas reagem
a mim para poder me olhar no espelho com confiança e dizer que sou bonita, não
é ele que vai me fazer pensar minimamente diferente.
— Dá para você me dizer para onde vamos? — pergunta irritado atrás de
mim, acelerei o passo para não ter de ficar ao seu lado, estou muito arrependida
de o ter convidado hoje.

Paramos em frente ao parque Siqueira Campos e aponto para o prédio do


outro lado da Avenida Paulista.

— O Museu de Artes de São Paulo — aponto — vai ter uma exposição


hoje, e achei que ela poderia te ajudar.

— Sobre o que? — se desarma, depois de perceber que nosso passeio é


mais para ele do que para mim.

— Luto e depressão, como sair de um inverno sombrio e aproveitar a


primavera e a cor das flores — vamos para a faixa de pedestre e passamos.

Levi observa o prédio suspenso no ar por quatro colunas vermelhas


enormes. O bloco de concreto espelhados parece flutuar acima de nossas cabeças,
sustentado pela arquitetura perfeita do lugar, me faz lembrar de um bondinho que
é suspenso somente pelos cabos.

— Fica perto de mim para não se perder — peço a ele, Levi acena em
positivo e se posiciona ao meu lado.

Entramos e na porta vemos um quadro negro com uma pequena cabana


pintada em tons de cinza e branco, dentro dela podemos ver uma pessoa apoiada
na janela encarando a escuridão. Levi analisa a obra por minutos antes de se dar
por satisfeito, acredito que para ele, o significado foi mais profundo do que a
mim.

Em seguida, ao entrarmos, somos envoltos por cortinas pretas, o frio


artificial gela meus ossos e me encolho alisando os braços, enquanto percorremos
o corredor.
— É assim que eu me sinto — ele fala baixinho — quando a escuridão
aparece, tudo fica frio e sem perspectiva de uma saída, somente a solidão e a dor.

— Vamos achar a saída juntos — seguro sua mão e o puxo para andarmos
mais rápido, entramos em um corredor e nele tem neve por todo o lado, as
pinturas são de paisagens cobertas pelo gelo, e da pessoa que estava na cabana
andando por cada uma delas, se curvando quando fica difícil caminhar, e
chorando em desespero, olhando para o céu em busca de uma saída.

— É assim para você? — sussurro quando ele para de frente ao último


quadro, do homem olhando o abismo com um pé para fora, decidindo se pula ou
não.

— O abismo só o vi uma vez — ele tem os olhos marejados — quando


soube da morte da Blanca, eu caí no poço sem fundo — seus dedos se esticam
para a frente, sem tocar a tela — estou lá até agora, você acha que ele vai
conseguir sair?

— Vamos descobrir.

Envolvo meu braço no dele, percebendo que Levi perdeu a força nas
pernas, diante do cenário que expõem a sua dor. Eu sempre julguei o meu pai por
ter abandonado a mim e a Bianca quando minha mãe morreu, e ter sucumbido a
depressão, fiz o mesmo com Levi, suas lágrimas nunca fizeram meu coração
amolecer.

Ver o reconhecimento de si mesmo nas pinturas e cenários pelos quais


passamos, proporciona que eu enxergue o Levi como ele realmente é, não a
pessoa que pintei por causa do meu preconceito. Um homem quebrado que
caminha em meio a sombras e frio, sem conseguir visualizar uma saída para a dor
que o persegue.
Torço para que nossa vinda até aqui não seja em vão, e que no final, Levi
possa enxergar o caminho dele mesmo para a luz.
Levi
Estou exposto naquelas pinturas, não conheço o autor, nunca o vi, não sei
se é homem ou mulher. Mas essa pessoa conseguiu pegar a forma da minha dor e
a jogou nessas paredes, com uma precisão que assusta a minha alma, e faz com
que eu trema por dentro por encontrar o reconhecimento do que me aflige em
outra pessoa.

— Vamos continuar? — Olivia puxa meu braço e deixo que me guie.

Entramos em um corredor, feito por cortinas em tonalidade de dégradé.


Preto, cinza, branco, amarelo-claro, mais forte, e por fim, desaguando em uma
sala coberta de grandes telas de girassóis. O homem tem diferentes movimentos
nas telas.

A primeira ele está com medo de sair de sua cabana, fica olhando o lado de
fora com desejo por mais, na segunda, ele dá um passo para fora, e na terceira,
ele sai, e dessa vez o céu que ele encara não é frio e sombrio, mas repleto de luz
azul e amarelo, com flores do lado de fora por onde ele passa.

O abismo que ele encarava em dúvida de pular, se transformou em uma


cachoeira com muitos passados voando ao redor, quase posso sentir o calor que
emana desse lugar.
— É quentinho aqui — Olivia diz ao meu lado e lembro que ela estava
junto comigo, mergulhei na representação artística que acabei me esquecendo da
sua presença, e não notei as pessoas ao redor, imersas no que a obra transmite.

— Sim, quase inacreditável que passamos por aquela sala antes — digo.

— Tem mais uma.

Vamos juntos, as cortinas em cores do arco-íris esvoaçam para todos os


lados, com o vento as movimentando em espiral, na parte final da exposição,
ouvimos o som dos pássaros e o cheiro de flores preenche o ambiente.

Aqui tem somente a estátua de um homem, pintada em diversas cores em


cima de um jardim olhando as flores e feliz. Uma placa ao seu lado com um
texto, me aproximo para ler.

— Quer que traduza para você? — percebo o sarcasmo na voz dela e a


ignoro.

****

Eu perdi minha família para o covid-19.

Primeiro a minha esposa se foi, ela trabalhava como enfermeira.

Nosso menino morreu menos de 3 meses após a mãe.

A caçula, se foi com seis meses, ainda novinha.

Eu tive a doença e me entreguei, pronto para partir.

Mas não era a minha hora e fui curado.

O inverno chegou, e todos os dias eram escuros e frios.


Eu olhava da janela da minha casa, e não entendia como aquilo podia ter
acontecido.

Não existiam mais motivos para continuar vivendo.

As estações mudaram e tudo continuava igual dentro de mim.

Até que olhei para fora e vi o pequeno girassol.

Ele nasceu no meio do meu jardim devastado.

Minha esposa nunca me perdoaria por deixar o jardim dela daquele jeito.

Eu peguei uma pá de jardinagem e tirei o girassol do meio da podridão,


prometi que limparia o jardim, e depois me jogaria do abismo.

Levei meses limpando tudo, e quando finalmente podia plantar novamente,


o inverno voltou, a neve cobriu tudo, e eu não podia ir ainda, não tinha
terminado o jardim.

Quando a neve derreteu, eu peguei as raízes do pequeno girassol que


morreu com o frio e o plantei novamente.

Adicionei novas rosas, todas que minha esposa gostava.

Plantei algumas que lembrava os meus filhos.

Quando terminei meu jardim, eu percebi que não podia o abandonar, ou


ele voltaria a ser destruído.

Naquele dia eu percebi:

Minha esposa se foi.

Nossos filhos morreram.

Mas eu continuava vivo, enquanto eles viveram, eu fui amado e amei, isso
não mudou devido à morte deles.
Naquele dia eu decidi que queria continuar vivendo e cuidando do meu
jardim, para ele que nunca mais fosse devastado pelo inverno.

A vida é somente uma, perder quem amamos é um ciclo doloroso e


cotidiano que a humanidade passa.

Não é errado sobreviver, não é errado sentir dor, não é errado olhar uma
flor e sentir-se feliz.

Os que se foram não tem mais o poder de julgar o que é certo e errado no
mundo dos vivos.

Viva!... A vida continua florescendo, independente do seu inverno


pessoal.

Cabe a você, decidir continuar no frio ou aproveitar o calor.

Obrigado por vir aqui, conhecer a minha dor e ver a minha superação.

****

Enxugo o rosto e noto que Olivia também tem lágrimas nas bochechas.
Levo a mão ao seu rosto, amparando a gota no meu polegar e Olivia me encara,
com os olhos verdes brilhantes de felicidade, mesclado com tristeza e
compreensão.

— Pode continuar olhando para o seu raio de sol — a voz meio embargada,
tiro a mão de sua pele como se levasse um choque.

— Certo — me limito a dizer, com um bolo na garganta.

Saímos da galeria em silêncio, ainda processando o choque que a exposição


me causou. Apesar de não saber o nome do autor, eu compreendi a sua dor.
Os dias de inverno me arrastaram com tudo para o fundo do poço, e o
pequeno girassol que sorriu para ele se materializou na forma de duas pessoas na
minha vida, meus dois raios de sol, o Lorran e a Olivia.

Por que ela ocupa essa posição na minha vida? Eu não a conheço, nunca a
tinha visto, antes de chegar naquela creche, e agora... saímos juntos, e ela pôde
encontrar algo para fazermos, com força suficiente para tocar a minha alma.

Nada disso parece errado.

— Vamos parar e respirar um pouco — ela aponta para os bancos no


parque, e nos dirigimos para os mais afastados, com privacidade para
conversamos.

— O que você quer falar? — pergunto quando o silêncio começa a ficar


incomodo.

— Eu tinha seis anos quando fiz meu café da manhã pela primeira vez e
acabei me queimando com a manteiga quente — ela desabafa — ia para a escola
todos os dias com as vizinhas me acompanhando porque iam deixar os filhos.
Quando o Dia das Mães chegava, eu sempre ficava triste, a minha não podia mais
ir, e eu era excluída de todas as dinâmicas, mas precisava ficar lá, vendo as mães
brincando com os filhos.

Encaro a Olivia e a vejo mordendo os lábios com força, deixando a pele


fina, branca pela pressão imposta.

— Quando me menstruei pela primeira vez, entrei em desespero, achando


que ia morrer — ela confessa e vejo a água se acumulando no canto de seus olhos
— faz ideia do que é acordar e ver que tem sangue entre suas pernas, sem
entender o que aconteceu? Naquela época eu ainda não tinha tido aulas sobre o
sistema reprodutivo feminino, e menstruação, minha mãe nunca tinha conversado
disso comigo, e foi assustador.
— Não sei como é isso — coço a cabeça.

— Claro que não, você é homem — me olha como se eu fosse um ET, que
não entendeu o que ela quis dizer — para mim o desespero foi a menstruação,
para o Lorran o que você acha que será? Quando ele acordar e perceber que
ejaculou dormindo, e ficar morto de vergonha, ou quando não conseguir controlar
o pênis ereto durante a puberdade. Já parou para pensar que se ninguém o ensinar,
ele nunca vai saber lidar com esses momentos? Com a voz mudando, e ele
sentindo receio de que o ridicularizem.

— Não imaginei nenhum desses cenários — encaro o chão e chuto uma


pedrinha.

— Exatamente, você esteve dois anos perdido na dor do luto, e não parou
para idealizar como seria o futuro com o seu filho, só enxergou a si mesmo. Use a
oportunidade que você está tendo agora de se tratar e aprender a cuidar do
Lorran, para criar um verdadeiro laço com ele, que o faça te chamar quando
quiser falar sobre como controlar o pênis, ou compartilhar o quanto é estranho a
mudança de voz, e quantas outras coisas homens puderem passar.

— Se eu falhar com ele — engasgo, o peito apertando.

— Tudo bem errar, o que você não pode, é continuar caído — ela levanta
— vem — estende a mão para mim e a pego — promete para mim que vai tomar
mais cuidado a partir de agora, e ser um pai para o Lorran? Não o faça recorrer ao
tio para tudo, como eu tive de buscar ajuda nas minhas tias.

— Prometo — aperto a mão dela — você vai me ajudar? Sei que pode soar
ridículo...

— Ei — ela me corta — não é ridículo pedir ajuda, Levi, sei que podemos
continuar nos matando, porque você ainda me tira do sério, mas vou te ajudar,
quando tiver alguma dúvida, me pergunte, pode ser pessoalmente ou por
mensagem de texto.

— Obrigada Olivia.

Acho que essa é a primeira vez em que a chamo pelo nome.

— Se quiser falar sobre a Blanca, eu vou ouvir com prazer — começa a


caminhar e me leva junto — pode declarar todo o seu amor por ela para mim, não
guarde mais a dor aqui dentro — toca meu peito — você não merece sofrer
sozinho.

— Eu falo, mas se você se abrir sobre sua mãe e seu pai comigo — ela
também carrega dor em seu coração — compartilhar nossas dores pode ser útil.

— Eu já contei uma, sua vez.

— Você só fala quando quer me repreender — aponto — não, foi algo do


coração.

— Que piegas Levi — ela ri.

— Como você soube que eu gostava de arte?

— Pesquisei seu nome no Google, e achei muita coisa em sites italianos,


muitos especulam que é você o estilista por trás das coleções lançadas pela
VITTILENO.

— Ganhei uma stalker? — brinco, e ela me empurra com o ombro, noto


que ainda estamos de mãos dadas e estranhamente não sinto vontade de me
afastar, interessante.

— Estava fazendo meu trabalho em prol do meu cliente, não vá se achando


— arrebita o nariz — agora me conte, é você o estilista famoso?
— Você poderia ganhar muito vendendo essa informação, nunca vou dizer.

— Para quem eu venderia? — pisca as pálpebras como uma boneca


inocente.

— Sei de cabeça uns 10 jornalistas que iriam adorar saber que sou o
VITTILENO.

— Ah rá! — Ela para e pula no lugar apontando o dedo para mim — é


realmente você o estilista!

— Eu não disse isso — desconverso.

— Você falou exatamente “que sou o VITTILENO” — Olivia comemora


no lugar, e acho divertido como ela sorri pela sua vitória — quanto será que vou
lucrar com essa informação?

— Faça isso e o Louis te demite — ameaço e ela paralisa me olhando


desconfiada.

— Não, o Lorran nunca permitiria.

— O Lorran não vai conseguir convencer o tio dele a manter a babá que
fará a empresa da família perder ações de investimento por descobrirem que sou
o VITTILENO, e que nos últimos dois anos, outro estilista assumiu a marca por
que não consegui criar um único designer.

— Vamos mudar isso — ela me solta e sinto falta do seu calor — faça um
modelo para mim — Olivia posa na minha frente com uma mão na cabeça e outra
na cintura, a perna para frente meio dobrada e a de trás totalmente esticada,
gargalho pela sua pose ridícula — pode chamar ela de: Olivia o raio de sol!

— Você é ridícula — empurro seu ombro e ela se segura no meu braço


gargalhando.
Olivia tropeça nos pés e perde o equilíbrio, me movo rápido na sua direção,
segurando-a para que não caia. Uma mão na cintura, a outra em seu pulso, o
queixo dela bate contra meu peito, e ela continua rindo feito uma maluca.

Sua risada reverbera em meu corpo e a acompanho, gargalho olhando o céu


sem entender o que aconteceu de tão engraçado para estarmos soltando o riso sem
restrição.

Pela primeira vez em dois anos eu pude gargalhar sem peso no coração.

Olivia é meu raio de sol, mesmo quando é noite.

Olivia
Levi me tem em seus braços, enquanto gargalhamos da minha pose
ridícula. Não sei o que me deu para agir desse jeito com ele, mas percebo, que
essa foi a primeira vez em me divertir nos braços de um homem, sem medo de
que ele quebre o meu coração, ou esperando que me dê mais do que está disposto.

Eu não sinto atração pelo Levi, não o amo, e nem o vejo como um
potencial relacionamento amoroso.
Ele é somente o Levi, pai do Lorran, que precisa de uma ajuda para
conseguir sair da depressão e poder ser um ser humano melhor, capaz de cuidar
do filho, e não causar mais traumas nele.

— Então, você estava me falando sobre sua lembrança mais feliz com a
Blanca? — pergunto como quem não quer nada, me afastando um passo ele.

— Não me lembro de mencionar isso.

Tem riso na sua voz e eu adoro como seus olhos ganharam um pouco mais
de vida, comparado à quando o encontrei mais cedo. Sua mão continua em minha
cintura, e aos poucos ela desliza até me soltar, enquanto a que agarra meu punho,
segura minha mão e entrelaça nossos dedos, quando ele nos conduz em uma
caminhada.

— Eu tenho certeza de que você disse como uma chantagem para que não
revele que você é o VITTILENO.

Não me surpreende que seja ele o estilista dos modelos que vi, de alguma
forma, eu soube que tinha a essência do Levi naquelas peças. Todas são
deslumbrantes, carregando com elas uma história em cada corte, e os momentos
em que poderiam ser usadas.

— Acho que é você quem está usando de chantagem comigo — ele ainda
ri, e eu amo o som da sua risada.

— Talvez..., funcionou?

— A Blanca adorava ir a desfiles de outros estilistas comigo, só para eu


apontar erros nas obras deles. — Confessa.

— Ela não teria coragem de fazer isso — fico chocada com a ousadia — é
o mesmo de ficar vendo seu ex com a atual, só para falar mal dela.
— Analogia interessante — ele ri gostoso — quando se é estilista, você não
consegue olhar uma peça de roupa, sem pensar no que poderá fazer para a deixar
melhor. É compulsório.

— O que acha do meu vestido? — pergunto.

Levi para e me encara, sua boca franze enquanto as sobrancelhas arqueiam.


Meu rosto pega fogo por ser analisada de perto por ele, tenho um pequeno ímpeto
de desviar o olhar, mas me mantenho firme. É bobeira me deixar afetar só porque
ele me analisa com cuidado, medindo minhas curvas, me sinto nua diante de sua
presença.

— As alças finas ficariam melhor se fossem transadas nas costas — ele


segura meus ombros e me vira — aqui elas ficam apertadas e sem graça — seus
dedos deslizam na minha pele causando pequenos arrepios em meus braços — se
fossem cruzadas em X — faz o movimento trançando de uma ponta a outra —
daria um ar mais ousado a peça, sem precisar colocar um decote. Você não é uma
pessoa recatada, usar roupas que não combinam com sua personalidade vão te
apagar.

Ele me solta, e não consigo me virar ainda, aconteceu algo nesse pequeno
espaço de tempo que mexe comigo, e não estou pronta para analisar emoções
supérfluas.

Faz um bom tempo desde que estive com um homem, e sinto falta do
carinho, e contato do sexo oposto, Levi só tocou no meu ponto fraco, a qual é a
pele das minhas costas, nada de mais, posso lidar com o arrepio na coluna.

— Bem observado — pigarro para a voz sair normal. — Coloquei um


vestido mais comportado por termos ido a uma exposição de arte, não queria
chamar a atenção.
— Mesmo se tivesse escolhido um que reflete sua personalidade, seria o
mesmo resultado. As pessoas estavam focadas na obra, e ninguém reparou em
quem estava ao seu redor, ao menos eu não notei, e em alguns momentos, acho
que esqueci que estava lá com você.

— Quer dizer que eu não chamo a atenção? — viro para ele, incomodada.

— Não, eu disse que quando nos ocupamos olhando para dentro de nós
mesmo, o mundo exterior desaparece — Levi vira o rosto observando os
arredores — já contei cinco caras diferentes que quase perderam o pescoço
virando para te ver passar.

— Não seja exagerado — abano não acreditando em suas palavras.

— Aquele ali — aponta com o queixo e sigo a direção indicada — guardou


o celular para poder te olhar, e passa a mão na calça a cada cinco minutos, deve
querer saber se somos namorados, ou se tem alguma chance contigo.

O cara realmente parece nervoso, ele é mais novo, posso ver por suas
feições jovens e com espinhas no nariz. Aproveito para observar os arredores, e
Levi tinha razão, realmente chamamos a atenção das pessoas que passam ao
redor, muitas mulheres perdidas na beleza dele.

— Você também é alvo de olhares — digo.

— Eu percebi, só não me importo — dá de ombros, e chega um pouco mais


perto, invadindo meu espaço pessoal — você liga?

— Não — sacudo a cabeça — não quero me envolver com ninguém.

Tenho vontade de compartilhar com o Levi o que irei fazer amanhã, não
contei nem mesmo para a minha irmã, mas a ansiedade que sufoca meu peito, faz
com que eu queira me abrir com ele.
— Posso te contar uma coisa e promete não me julgar?

— Como você tem me julgado? — arqueia a sobrancelha.

— Esquece — reviro os olhos e ando — não sei por que achei que poderia
conversar com você.

— Ei, estava brincando — segura meu cotovelo e nos leva para um banco
— pode falar.

— Quando você não está sendo um escroto, até que é legal — observo.

— Você não consegue passar um segundo sem me ofender?

— É mais forte do que eu — dou de ombros e ele sacode a cabeça.

— Diz o que queria falar.

— Eu quero ser mãe — confesso — sempre quis, mas ultimamente, sinto


como se eu estivesse buscando um sonho impossível.

— Eu percebi como você é apegada a crianças, imaginei que algo assim


pudesse acontecer.

— Já faz um tempo que estou na fila da adoção, e hoje de manhã, liguei


para saber se tinha tido algum progresso, e a atendente me falou que continuava
na mesma. Que a fila para adoção era extensa demais, e que quando chegasse a
minha vez, eu seria informada.

— Não sei o que é maior, as filas de adoção ou as crianças que esperam


para serem adotadas — ele pontua.

— Existem mais pessoas querendo adotar do que adotantes disponíveis, o


problema é que quem vai adotar, pode escolher a criança, se é menina ou menino,
cor da pele, idade é como se — travo, com receio de dizer o que penso e parecer
idiota.

— Estivessem escolhendo qual roupa usar no dia — ele completa minha


frase.

— Exatamente, e isso é tão errado — aperto os punhos — se você gerar um


filho no ventre não poderá escolher como ele será, por que para adotar precisa
fazer isso? É ridículo!

— Deveriam só entrar na fila e a criança que estivesse disponível ser


adotada.

— Basicamente, penso como você — abro a mão e encaro o Levi, ele


observa o céu. — Com o emprego de babá, agora eu posso tentar outro método
para ter um filho.

— Qual? — me encara.

— Inseminação artificial. Basicamente, vou escolher quem será o doador


de espermas disponível na clínica, e depois fazer o procedimento.

— Ainda continua optando por qual roupa usar — tem um pouco de


julgamento em sua voz, e reviro os olhos.

— Não é o mesmo — aponto para um dos caras que me olha — se eu fosse


transar com aquele cara, seria porque o acho bonito com a barba por fazer, e se eu
engravidar, tem chances do nosso filho se parecer com ele.

— Não tenha um filho sem amar o pai da criança, Olivia, isso é


deprimente.

— Falou aquele que é um pai ausente — aponto na sua cara e no mesmo


instante me arrependo. Levi fecha as feições e encolhe os braços rente ao corpo.
— Eu amo a Blanca, e para sempre vou tê-la em meu coração, meu
problema, é não saber lidar com o fato dela não estar aqui — confessa baixinho
— quero ser um bom pai para Lorran, e por isso estou tentando o meu melhor,
não posso esperar te agradar, quando não é com você que eu me importo.

Suas palavras têm fel, e me causam incomodo terrível no estômago. Prendo


os lábios um no outro tentando controlar a resposta que quero dar a ele, um
grande e belo, “foda-se”. Estávamos em um clima de paz grande demais para ser
verdade.

— Isso não importa, eu vou ter o meu bebê, independe de como seja.

— Você me julga por ser um pai ausente, mas estar tendo um filho por
inseminação artificial, vai fazer o seu bebê crescer sem um pai, e no futuro vai
contar a ele que nasceu de uma proveta?

Ele sabe onde me machucar.

É ácido em suas palavras.

Me ponho de pé sem querer o responder mais.

— Ao contrário de você, eu vou fazer com que meu filho de proveta saiba
que é amado. — Bufo — fui uma idiota por achar que poderíamos ter ao menos
uma amizade.

— Não, Olivia — ele se levanta — você só está irritada demais para


perceber que me julga sem olhar as minhas feridas, mas quando jogo sal nas suas,
você se ofende, como se eu estivesse te esfaqueando.

— Tem razão — meu queixo treme e aperto a bolsinha em minha mão —


sou egoísta, e penso mais em mim mesma do que nos outros. Vamos embora,
antes que a pequena trégua que tivemos essa noite vá pelos ares.
— Essa foi a melhor ideia que você teve — ele ferve em raiva.

Odeio admitir, mas eu realmente julguei o Levi por uma situação, em que
eu só vi a como eu me sentia pelo Lorran e do meu passado. Odeio o fato dele ter
falado sobre a minha ideia com insensibilidade, e como se eu fosse inconsequente
que não pensa nas coisas.

— Em prol — engulo meu orgulho — da pequena simpatia que tivemos um


pelo outro essa noite, eu vou guardar meus julgamentos para mim, e espero que
você faça o mesmo e possa agir como um ser humano descente.

— Como quiser — rosna — desde que você saiba como se portar com
outras pessoas.

— Sei perfeitamente — empino o queixo o desafiando.

Levi está perigosamente perto de mim, os olhos penetrando fundo em


minha alma, e sua respiração tocando a minha testa.

Se eu ficar na ponta dos pés, conseguirei sentir o sabor da sua boca, lábios
finos que eu encaro mais do que deveria. Meu estômago dá uma cambalhota, e
viro de costas, mexida, ele consegue me enlouquecer de raiva em segundos.

Antes de ter meu bebê, preciso aliviar a tensão sexual dos últimos meses
sem um companheiro, ela é a única razão pela qual achei a boca do Levi
minimamente atraente.

— Vamos embora.

Começo a andar, e ele vem atrás de mim sem falar mais nada.

Caminhamos em silêncio, e aproveito o momento para colocar a cabeça no


lugar e esfriar minhas emoções. Na frente do prédio, eu paro e o Levi não entra,
ele fica me encarando.
— Desculpe pelo que falei — fico surpresa com suas palavras — sua
situação é completamente diferente da minha, tenho certeza de que se a Blanca
pudesse, ela estaria aqui com Lorran, e eu não seria esse bosta de pai. É diferente
do seu bebê ser gerado por inseminação artificial, você vai estar presente em cada
momento e o amar, não duvido que possa explicar a situação do concebimento
dele sem dificuldades.

— Obrigada... por suas palavras.

Ele coça a cabeça e eu me desarmo, o caminho todo ele ficou refletindo


sobre o que aconteceu entre nós?

— De nada, espero que o clima de amizade não se desfaça pela minha


idiotice, é isso.

Levi não espera pela minha resposta e entra no prédio. Fico atônita na
calçada, processando o que acabou de acontecer. Ele realmente pediu desculpas, e
foi capaz de me entender?

Sorrio.

Levi ainda tem salvação e poderá ser um pai incrível para o Lorran.
Levi
— Vamos Lorran, hora de acordar — o sacudo pela bunda, e ele continua
de cara nos travesseiros, babando.

— Num quelo — responde manhoso e cobre a cabeça com o lençol — hoje


é felia — boceja.

— Hoje é domingo, e vamos almoçar com seu zio e seu nonno, levanta —
puxo seu quadril, obrigando-o a sentar, e ele coça os olhos antes de abrir a boca e
gritar com toda a força.

— NUM QUELO — encolhe a cabeça entre as pernas e coço o pescoço


sem saber o que fazer, já faz meia hora que tento o acordar.

— Será possível? — Louis entra no quarto — não consegue acordar o


menino sem uma briga?

— Ei! — ralho com ele — baixa o tom que não estou fazendo nada de
errado!

— Não, só uma confusão desnecessária — anda até o berço — vamos


Lorran, hora do banho para tomar seu café e podermos sair.
Como em um passe de mágica, o pequeno diabinho levanta os braços para
o tio, e sai do berço sem reclamar, enquanto é levado para o banheiro.

Vou atrás deles sem dizer nada, se o Louis acha que vai poder cortar minha
autoridade como pai, está enganado. No passado as coisas podem ter acontecido
assim, mas agora é diferente, e eu vou dar o banho no Lorran.

Pego meu filho de seus braços e o encaro de rosto fechado, ele pensa em
me responder por dois segundos, antes de franzir a testa. O deixo no meio do
corredor e vou com o Lorran para o banheiro.

— Você não pode continuar fazendo isso, Lorran — falo com meu filho, o
coloco no chão, e me agacho, ficando na altura dos seus olhos — sei que eu não
cuidava de você antes, mas agora as coisas estão diferentes, e eu quero fazer
melhor — seguro sua mão — me ajude para que eu possa ser um pai para você,
certo?

— Ocê num é pai, é o Levi.

A dor irradia do meu coração para meu corpo, percorrendo cada centímetro
de pele, sinto-a na ponta dos dedos das mãos e minhas pernas, que fraquejam.
Não vou permitir que a realidade de como o Lorran me ve, faça com que eu
fraqueje, estou determinado, e permanecerei até meu filho ser capaz de me ver
como pai.

— Não, Lorran, eu sou o seu pai. — A voz embarga e ele franze a testa,
como se fosse estranho pensar em mim assim.

— E mi madre? — noto as lágrimas nos cantos dos olhos dele, nunca falei
da Blanca para o Lorran, e hoje me arrependo disso. O que se passava na cabeça
do meu filho durante todos esses anos? Pensava que não tinha os pais, e que eu
era somente um conhecido que morava com ele?
— Sua mãe morreu quando você ainda era bebê — engasgo com as
palavras, seguro os braços dele e o trago para meu colo — eu sou o seu pai, e a
Blanca a sua mãe, ela te amou desde que descobriu que estava grávida de você.
— Beijo a testa dele quando o Levi começa a chorar. — Não chora anjinho.

— Eu num vou vel ela? — pergunta, no choro baixinho.

— Não tem como, ela foi para o céu — o aperto contra mim — quer ver
uma foto dela?

— Quelo.

Puxo o celular do meu bolso, enquanto o Lorran continua fungando


baixinho, puxando a gola da minha camisa. Busco as fotos da Blanca grávida e
mostro a ele.

— Essa é a sua mãe, Blanca, quando ela estava grávida de você.

— Cadê eu? — segura o celular analisando curioso a imagem.

— Bem aqui — aponto para a barriga dela — os bebês ficam dentro da


barriga da mãe até poderem sair.

— Onde tá a mamãe aglora? — me olha.

— No céu, quando morremos, nossos espíritos são levados para o céu, e de


lá, podemos ver as pessoas que amamos aqui na terra.

— Ela vilou um passainho? — enxugo seu rostinho.

— Não, ela virou luz — aliso seus cabelos, percebendo que o brilho que
enxergo ao redor dele se intensifica. — Sempre que você olhar para o céu, vai ver
a luz do dia ou da noite, e saberá que sua mãe olha por você.

— Eu amo a mamãe — ele beija a foto da Blanca e minha garganta trava.


— E o papai? — pergunto com medo da resposta.

— Talbem, aglora sei que tenlo um papai — ele sobe no meu colo e beija
minha bochecha.

— Me chama de pai, filho? — peço.

— Num de Levi? — leva o dedo ao queixo, pensando — eu golto de Levi.

Dois anos, lembro a mim mesmo, foram dois anos sendo chamado de Levi,
e não reconhecido como pai. Não posso ter pressa, e deixar que aconteça quando
o Lorran estiver pronto para isso.

— Me chame como você quiser — beijo sua bochechinha.

— Celto, bora mimi? — se agarra ao meu pescoço.

— Depois do banho, e do café da manhã.

Ele faz bico novamente e faço cócegas em sua barriga. O ajudo a escovar
os dentes, e depois dou seu banho.

Louis mexe no celular na sala enquanto dou café ao Lorran, noto como ele
tem andado mais sorridente ultimamente, principalmente quando está com a cara
enfiada no aparelho, e fica de risinhos.

— Louis — o chamo, deixo o Lorran dormir no sofá — o que aconteceu


que você tem estado diferente esses dias? — me sento ao seu lado e espio seu
celular, ele fala com a Bianca, com um coração ao lado do nome dela.

— Eu e a Bianca nos acertamos — sorri.

— Minha nossa — cubro os olhos — quase fico cego com sua felicidade
saltando ao seu redor.
— Acho que ela é a mulher certa — encaro o Louis e ele tem uma
expressão decidida.

— O que você quer dizer com isso?

— Lembra quando você me disse que iria se casar com a Blanca, no


segundo dia em que se conheceram?

— E eu estava certo — encosto a cabeça no encosto, lembrar da minha


esposa sempre me traz felicidade, mesclado com tristeza e dor, hoje somente a
alegria me visita.

— Finalmente eu entendo o que te fez agir daquele jeito — Louis imita a


minha pose — eu amo a Bianca, quero me casar com ela.

— Vai fundo.

— Faz cinco meses que estamos juntos, e eu amo aquela mulher — levanta
animado.

— Já se passou todo esse tempo desde que chegamos ao Brasil? Não tinha
percebido.

— Você anda ocupado brigando com Olivia para notar algo ao seu redor.

— Deixe de idiotice, não brigamos mais — viro o rosto para as janelas,


encarando o dia ensolarado.

— Verdade, já tem o quê? Uns três meses, que não a vejo querendo te
assassinar?

— Desde que fomos ao Museu — me arrependo na mesma hora de ter dito


isso.
— Como assim? — Louis se senta ao meu lado novamente — você saiu
com ela?

— Algo do tipo — não quero falar com ele, por algum motivo estranho,
fico com vergonha de admitir.

— Levi, me conte isso agora — Louis engrossa a voz, o que me faz


lembrar o nosso pai quando dava suas ordens.

— Faz uns meses que a Olivia me levou a uma exposição de arte, sobre
depressão e luto, e como o artista conseguiu superar. Eu já vinha me sentindo
melhor antes disso, e ver como um simples girassol o ajudou a voltar a enxergar o
mundo e querer viver, me fez perceber que eu já tenho o meu girassol, e que se
não cuidar dele, vai se tornar um jardim devastado.

Louis fica em silêncio por longos minutos.

— E a vontade de beber?

— Não passou totalmente — admito — quando sinto o frenesi da ânsia


pelo álcool eu me agarro ao Lorran. O ter por perto evita que eu procure pelo
álcool, não quero que ele seja exposto.

— Vocês ainda brigam tanto — Louis suspira — às vezes acho que vou
enlouquecer quando escuto você pedindo ao Lorran para ele fazer algo, e os
gritos começam.

— Lorran não me via como pai — admito — e não sabia que tinha uma
mãe. Não consigo imaginar a dor que causei no meu filho ao longo desses
últimos dois anos.

— Eu disse a ele uma vez que a mãe dele estava no céu — Louis admite
com tristeza — ele deve ter esquecido, ele mal tinha um ano.
— Hoje eu mostrei uma foto da Blanca a ele, acho que vou mandar fazer
um quadro dela, com várias fotos para que ele possa ver a mãe sempre que quiser
no quarto dele.

— É uma ótima ideia.

— E continuarei me esforçando, para o Lorran perceber que sou o pai dele,


e me chamar assim. — Travo por um segundo — eu disse que ele podia se referir
a mim como pai, mas ele achou estranho, que prefere “Levi”.

— É uma escalada — Louis aperta meu ombro — quando ele se sentir


confortável, vai te chamar assim e depois nunca mais parará.

— Eu espero — suspiro.

A campainha toca e fico intrigado com quem poderia ser, a Olivia não
trabalha aos domingos. Já faz um mês que dei esse dia de folga a ela, consigo me
manter mais estável nos cuidados do Lorran, e decidi que esse seria o meu dia
com o meu filho.

Louis pula do sofá depressa e vai abrir a porta, pelo tamanho do sorriso
dele, imagino que seja a Bianca. Ela entra acompanhada da irmã, Olivia veste um
shortinho desfiado, e uma blusa de magas, colada a suas curvas, com um casaco
leve caído nos ombros. O rosto carregado de maquiagem como nunca a vi usar
antes.

É a primeira vez que observo aquela mulher, ela é linda. Olivia tem peitos
fartos no decote singelo, coxas grossas, e panturrilhas torneadas. Os cabelos
presos em um meio coque, realçando a beleza de seu rosto redondo, e os olhos
verdes parecem duas esmeraldas enfeitando sua face.

— Você por aqui? — pergunto — seus dias de me infernizar são de


segunda a sábado, pode ir embora. — A provoco.
— O capeta não pode deixar seus súditos sem a sua presença, ou eles
choram pedindo punição — ela devolve com um sorriso no canto dos lábios.

— Cruzes — Bianca leva a mão ao peito e encara a irmã horrorizada —


isso é jeito de se referir a você mesma, Olivia?

— Estamos só brincando — ela bate o ombro no da irmã — certo, Levi?

— Claro — concordo fingindo que estou sendo forçado a isso.

— Ridículo — revira os olhos.

— Maluca — devolvo.

— Vocês não param — Louis ralha — vamos sair logo, quem sabe em
público eles se comportem bem.

— Você que deve se comportar bem — Olivia devolve — ainda não


aprovei seu relacionamento com a minha irmã.

— Olivia! — Bianca fica uns dez tons mais vermelha — para com isso.

— Sua irmã, que deveria ser aprovada por mim — digo a ela que me fita
furiosa — não sei se te quero na minha família — aponto para ela — sua
selvagem.

— Fica quieto Levi — ela joga uma almofada em mim e a pego, rindo.

— Zia vivia! — Lorran pula no sofá, e se joga no colo dela — tava cum
saldade! — ele sorri e tenho vontade de me estapear, por o Lorran não ter essa
reação comigo.

— Saudade, fofinho — ela toca no nariz dele — já tomou seu café?

— Olivia já são 11 horas, obvio que ele tomou café — ralho.


— Não sei se posso confiar em você — ela me olha de cima a baixo — vai
que enlouquece e come, a refeição do menino.

Lorran gargalha como ele sempre faz quando estamos brigando.

Encaro a Olivia, com riso em seu olhar, imagino que o meu esteja do
mesmo jeito. Estamos bem um com o outro, e apesar das implicâncias, eu gosto
da presença dela, na minha vida.
Olivia
Negativo. / Negativo. / Negativo. / Negativo. / Negativo.

Choro encarando os testes de gravidez em cima do banheiro no meu


apartamento, como é possível? Eu faço tudo o que o médico recomenda, me
alimento melhor, estou na academia, e pouco tenho me estressado, e mesmo
assim, os testes continuam dando negativo.

Eu só quero ser mãe.

Me encolho no chão do banheiro, chorando tudo que a minha alma exige.

O que fiz de errado para merecer esse castigo? Não consigo ter um
relacionamento saudável com um homem sem terminar de coração quebrado, a
fila da adoção nunca anda, e o meu nome não é chamado, consegui dinheiro
suficiente para pagar pela inseminação artificial, e os testes continuam dando
negativo.

Já fiz duas tentativas, o médico avisou que isso poderia acontecer. E agora
me encaro diante do meu terceiro fracasso.
Em cada um dos procedimentos, escolhi homens diferentes, para garantir
que pudesse ter uma maior chance de acerto, mas ao contrário do que imaginei,
só estou tendo decepção em cima de decepção.

Qual foi o meu maldito pecado para ser castigada com o desejo ardente de
ser mãe, e nunca conseguir engravidar ou adotar? Se ao menos um desconhecido
filho da puta me engravidasse, mas nem essa maldita sorte eu dou, pois não tenho
coragem de me relacionar com caras que não conheço, e quanto mais espero,
mais o tempo passa, e meu sonho se torna uma realidade nublada de pesadelos.

O alarme do celular toca em cima da bancada do banheiro, meu corpo dói,


a cabeça lateja, e tudo que eu queria, era poder me encolher debaixo da cama e
fingir que o mundo não existe.

Ao menos hoje, quero desaparecer e não olhar a luz do sol. É assim que o
Levi se sente? Como ele conseguiu continuar vivo com uma dor como essa,
assolando seu coração e caminhando no mundo sem cor?

Eu devia ter pegado mais leve com ele quando nos conhecemos.

Ele não é má pessoa, só alguém com depressão que precisou de ajuda para
se erguer, e poder formar laços com o filho. Lorran, meu pequeno anjinho de
sorriso lindo, ser a babá dele é uma benção e um tormento, eu o tenho para mim
ao mesmo tempo que não.

Limpo minhas lágrimas e lavo meu rosto, preciso ir trabalhar, e não posso
deixar que minha tristeza interfira na forma como cuido dos meus alunos, todos
eles precisam de atenção e cuidado, e não de alguém com o coração quebrado
pelas sucessivas decepções da vida.

Eu fiz todos os exames, o médico me garantiu que meu útero era saudável e
estava apto a gerar um bebê, então por que eu não consigo? Soluço, a água do
chuveiro se mesclando com o meu choro.
Evito tomar o café para não enjoar mais do que já me sinto, caminho para
fora, e vou para a creche, uso o tempo andando para tentar limpar a minha mente.

Minha poupança foi quase zerada com o tratamento, preciso juntar grana
novamente para poder fazer outro tratamento, e isso vai demorar no mínimo uns
três meses. Ainda tenho contas no cartão para pagar do último tratamento, e não
sei se consigo aguentar mais uma falha, por enquanto, vou focar em colocar a
cabeça no lugar.

Chego na creche, e percebo que estou atrasa, quando vejo a inspetora que
está recebendo meus alunos, e conversando com as mães, avisando que não sabe
o motivo do meu atraso.

— Bom dia — cumprimento a todas — desculpem a demora, não acordei


me sentindo bem.

— É gripe? — a mãe do Eduardo pergunta franzindo o nariz.

— Não senhora, somente cansaço.

— Imagino, ficar o dia todo com essas crianças e depois ser babá — a
crítica em sua voz não me passa despercebida — se eu soubesse que podia te
contratar, teria oferecido antes.

— O Lorran é um caso especial, ele precisava de alguém que falasse seu


idioma e pudesse o ajudar com o português.

— Contratassem uma professora de línguas!

Mordo a bochecha com o sangue fervendo para não ser grosseira com ela.
A Sofia é a mãe de um dos meus alunos, e devo sempre sorrir e ser gentil,
independente das idiotices que falem.
— Eduardo tem uma ótima babá — digo, por fim — ele não precisa dos
meus cuidados.

— Mas você é mais instruída do que aquela tonta — revira os olhos — eu


te pago o dobro para ser babá dele, o que acha?

— Desculpe Sofia, não é assim que funciona.

— Não seja esnobe, Olivia — ela me encara com fúria e arrogância —


passe na minha casa mais tarde e vamos acertar os termos.

— Ela não vai para lugar nenhum!

A voz grossa e potente diz atrás de mim, em um português, claro e firme.


Giro no lugar e dou de cara com Levi, encarando a Sofia com severidade, Lorran
em seu colo, observa o pai e imita a pose dele, tenho ímpeto de rir do pequeno,
mas o jeito que o Levi se porta, desperta algo dentro de mim.

— Não percebe que está sendo inconveniente? — Ele continua, não sei
como a Sofia ou a inspetora reagem. Estou focada demais em como meu ventre
aperta ao ver a masculinidade do Levi, a mandíbula travada, os olhos
enraivecidos, e as feições fortes e sexy, enquanto ele me defende.

— Q-quem é você? — Sofia pergunta.

— O pai do Lorran, e a pessoa de quem você quer roubar, a babá é do meu


filho, não permitirei que faça isso, a Olivia é a única que vai cuidar dele.

Eu poderia ser a mãe do Lorran.

Levi defenderia a esposa com esse mesmo vigor.

Ele envolve a mão no meu braço e me puxa para o seu lado.


Por que eu não tenho repulsa ou tento frear os pensamentos sobre fazer
parte dessa família? As batidas do meu coração ganham força ao passo que a
situação vai mexendo comigo, e abalando minhas estruturas.

Eu nunca o vi dessa forma, e ele é a primeira pessoa que me defende


quando me atacam. Sempre fiz isso sozinha, cuidei de mim mesma e dos outros,
lutei as minhas batalhas sem precisar pedir ajuda.

Ser cuidada, e sentir como se pudesse confiar em alguém e nas atitudes


dele, e que tudo dará certo. O calor que preenche meu peito, e faz meu coração
disparar, ansioso para saber quais serão suas próximas palavras, é resultado de
saber que tem alguém lutando por mim sem que eu peça ajuda?

Como seria me jogar em seus braços e deixar que ele me envolvesse igual
como faz com o Lorran? O pequeno também faria isso por mim, certo? Mordo a
bochecha tentando frear o descontrole emocional que me acomete, estou
fragilizada pelos negativos de hoje de manhã, e imaginando coisa onde não tem.

Pois pensar que Levi possa ter sentimentos por mim, para me defender,
abre brechas no meu coração que não poderia acontecer. Ele ama a esposa
falecida, tem se esforçado para criar vínculos com o filho, e nunca me olhou de
outra maneira que não seja com deboche, raiva, ou diversão, nunca o vi agir com
carinho ou proteção comigo, como nesse segundo.

Esse não é o Levi que eu conheço.

O outro é fácil me manter distante e não desenvolver sentimentos.

O Levi que me defende é um perigo para as minhas emoções.

— Agora entendo o motivo dela ter aceitado ser babá, com um homem
como você por perto — Sofia empina o nariz, e fico envergonhada por ela
insinuar que aceitei o cargo pelo Levi.
— Olivia aceitou ser babá porque o meu filho precisava dela, sua
amargurada. Não sabe nada sobre a minha família, ou a mulher que você quer
ofender, continue falando essas barbáries e irei te processar por insinuar que a
Olivia e eu temos um caso, a desmerecendo.

— Vamos nos acalmar, sim — a inspetora mede com um sorriso amarelo, e


recobro a noção do que acontece ao nosso redor.

— Sofia, por favor, não faça comentários desse tipo sobre mim — peço —
a diretora sabe que sou babá do Lorran, e concordou, ela, ao contrário de você,
está ciente da situação da criança.

— Que seja — Arrebita o nariz e vai embora.

— Desculpe por isso, Olivia — a inspetora pede — ela estava insistindo


em como a babá do Eduardo é, nas palavras dela, inútil... e queria que você
assumisse o lugar dela.

— A culpa não é sua, pode ir que eu tomo conta das coisas agora — agraço
a ela com um sorriso forçado.

— Você — Levi volta a usar o italiano — não deveria sorrir forçado — o


encaro, e sua mão vem a minha bochecha, alisando a superfície — fica mais
bonita quando o faz naturalmente.

— Isso foi uma cantada? — pergunto em baixa voz, ele me envolve em


uma bolha de calor que alivia a dor em meu peito.

— Não, Olivia, foi a verdade — me puxa um pouquinho para perto e toca


meu nariz — meu raio de sol deve sorrir quando sentir vontade, não quando achar
que deve.

— Não acredito que me chamou assim — arquejo.


— Tive de aceitar — sua mão se vai, e ele dá de ombros antes de beijar a
cabeça do Lorran — vocês dois são meus raios de sol. O que acha de jantar fora
hoje?

— Uma boa ideia — aceito, e dessa vez preciso conter o sorriso que insiste
em ganhar caminho no meu rosto.

— Saímos antes do Lorran dormir.

— Combinado, vou em casa buscar uma muda de roupa antes de ir para o


apartamento, após o expediente — coloco um fio de cabelo atrás da orelha.

— Eu te levo, e depois vamos para casa.

“Casa” soa diferente agora que foi pronunciado pelo Levi com carinho.

Ele realmente considera o apartamento o nosso lugar de convivência


familiar, admito que penso que moro mais lá do que na minha casa, e o quanto
me sinto mais confortável cercada por eles dois, do que sozinha.

— Zia vivia — Lorran chama, a carinha de interrogação, sem entender por


que não falei com ele ainda.

— Oi, meu pequeno — o pego no colo e encho sua bochecha de beijos. —


Até mais tarde Levi.

— Tchau Levi — Lorran manda beijinho para o pai que retribui e vai
embora.

Levi tem costas largas, e uma bunda avantajada. Meu rosto queima por
perceber o quanto esse homem parece atraente, ele tem ganhado peso desde que
passou a malhar com o irmão, e isso cai bem nele. Traz vida a quem, antes, era só
um zumbi. Levi começou a viver, em vez de somente existir, e sou feliz por ele
conseguir isso.
— Vamos fofinho? — pergunto ao Lorran quando retorno ao presente.

A maioria dos meus alunos estão na classe, espero mais um pouco pelos
que ainda faltam entrarem, e depois fecho a porta, e dou início a manhã de
atividades, hoje vou preparar eles para cantarem a música que será usada no
festival da creche, no final do mês.

O dia passa lentamente, e conforme me distraio com os pequenos, o aperto


no peito vai aliviando até se tornar somente um incômodo.

O dia termina, e vou com o Lorran para o SUV preto que nos espera na
porta da creche, lá dentro, Levi está sentado, usando uma calça branca e camisa
bege, noto o relógio prateado no pulso, e o sorriso em seu rosto.

Ele tem feito mais isso ultimamente, sorrindo e se arrumando. O cheiro


almiscarado domina o ambiente do carro, e agradeço aos céus pelo Lorran ficar
entre mim e o Levi no banco, ou iria sufocar de tanto cheirar esse homem no
pescoço. Meu baixo ventre aperta, e sinto desejo pelo Levi, não deveria me portar
dessa maneira, mas é impossível controlar o que o meu corpo dita que sentirei.

— Pronta para sairmos juntos? — pergunta quando retorno ao carro, após


ter trocado de roupa.

— Você fala como se estivéssemos em um encontro — aponto, preciso que


ele fale que estou ficando louca e que tire essa ideia maluca da minha mente.

— Seria quase isso se o Lorran não fosse junto.

Desgraçado.

Meu coração dá um solavanco enorme dentro do peito, que o sinto batendo


até a minha garganta. O Levi não tem o direito de me fazer acreditar que estamos
tendo um encontro, ou que ele tem sentimentos por mim. Ele ama a Blanca, eu já
vi o quanto esse amor é forte, não é justo me iludir.
— Não me iluda Levi — peço.

— Eu nunca faria isso com você — sua mão estica até segurar meus dedos.
— Gosto da sua companhia Olivia, e quero passar mais tempo com você, não é
nada de mais, somos só bons amigos.

Ele não quis dizer isso, noto só pelo jeito que engole em seco, e como seu
olhar desvia para o lado.

— Eu só quero continuar me sentindo bem — agora ele me encara e vejo a


verdade em suas palavras — me ajuda a continuar vivendo.

— Claro.

Engulo em seco, sabendo o perigo que estou me enfiando com essa


promessa.

Levi

Noite anterior ao encontro


Eu quero falar com alguém sobre os sentimentos que corroem a minha
alma. Meu psicólogo me incentiva a ir em frente, diz que é bom para mim voltar
a sentir desejo por outra mulher, e que não é errado, pois eu continuo vivo, e
quando aceitei buscar a melhora, esse era um dos passos que eu iria acabar
dando.

Convivendo com outras pessoas e passando a apreciar a companhia delas,


mas tinha de ser logo a Olivia?

Aquela mulher maluca me tira do sério mais vezes do que sou capaz de
contar, e ainda assim, anseio a encontrar todos os dias de manhã com um sorriso
no rosto para receber o meu filho em seus braços, e depois no apartamento, onde
fica, horas brincando com ele e brigando comigo. Eu gosto das nossas discussões,
de ver como ela fica vermelha, com os olhos em chamas, decidindo se me bate
com as mãos ou com uma panela.

Provocar a Olivia me faz sentir vivo, torna a dor que rasga meu peito pela
morte da Blanca, mais fácil de lidar. O medo não vai embora, e volta a ganhar
espaço na minha mente, quando penso que posso ser o causador de alguma
tragédia para a Olivia, por se envolver comigo.

Meu psicólogo tenta com afinco fazer eu perceber que não tive culpa no
acidente da minha mãe, e no da Blanca, que foi um acaso do destino que elas
tenham morrido.

Não consigo me convencer disso com a facilidade que ele o faz, e gostaria
de comentar sobre, com o Louis, nunca o deixei saber que me sinto culpado pela
morte delas. Ele também perdeu a nossa mãe, posso ouvir sua voz me
questionando como seria minha culpa se eu não estava naquele carro, e não era
motivo dela voltar para casa.

Foi só mais um dia normal em que o inesperado aconteceu, do mesmo jeito


com a Blanca. As duas mulheres que mais amei na minha vida, mortas da mesma
forma, como eu não poderia ter relação com isso? Nem que seja amaldiçoando-as
com o meu azar ou que merda for.
É impossível pensar que se eu não as conhecesse, aquilo tudo não teria
acontecido, e elas ainda estariam preenchendo o mundo com cor.

Ouço o toque do celular em cima da mesinha de cabeceira no meu quarto e


pego o aparelho, o número da minha irmã pisca na tela, e fico surpreso, aqui já
passa das 4 horas da madrugada, para ela deve ser umas 00h.

— Oi — atendo.

— Te acordei? — Lira não está bem, percebo pelo seu tom de voz rouco, e
o fungado em seu nariz.

— Não, aconteceu alguma coisa? — sento-me na cama — quer falar por


vídeo?

— Pode ser.

Ela desliga, e dou inicio a uma chamada de vídeo, ligo o abajur para que
ela possa me ver, e quando o rosto da Lira aparece do outro lado, eu tenho
vontade de pegar um avião para Los Angeles e poder quebrar a cara de quem
machucou a minha irmã.

Os olhos vermelhos e inchados, a boca inchada, o nariz escorrendo, e


vermelho de uma ponta a outra, o choro se derrama em suas bochechas como
uma cachoeira.

Por ser branca e loura, como eu e Louis, Lira quando chora, fica parecendo
um pimentão e quando ela se transforma em um pimentão inchado, significa que
alguém partiu seu coração.

— Quem é o babaca que devo matar? — pergunto em um rosnado.

— Você parece tão bem — ela soluça e volta a chorar — eu quero ir para
casa, mas não posso abandonar a filmagem no final, vem ficar comigo Levi?
A tristeza por ver minha irmãzinha se desmanchando em lágrimas coloca
em segundo plano todos os meus problemas, e tudo o que eu preciso agora, é
poder cuidar da Lira. Ela sempre foi um doce, ao contrário do Louis e de mim,
que somos mais centrados. Lira esbanja sorrisos e gracejos, fazendo amizade fácil
e se apaixonando mais ainda.

— Quem te magoou? — pergunto, aperto o punho, não quero a chatear.

— Essa é a primeira vez em dois anos que você se preocupa comigo —


soluça novamente — eu quero um abraço — a voz desanda em um choro
sensível.

— Lira, fala comigo, por favor. O que aconteceu com você?

— Eu conheci esse cara — ela funga e esconde a cabeça no travesseiro —


ele é bem mais velho do que eu — é um pouco difícil de entender sua voz
abafada — e ficamos somente uma noite, e eu me apaixonei por ele, foi coisa de
amor à primeira vista Levi.

— Você sempre diz isso. Lira — suspiro, já perdi a conta de quantas vezes
ela se apaixonou à “primeira vista”.

— Dessa vez foi diferente — ralha. — Se for me julgar eu desligo, se eu


quisesse ouvir como sou inconsequente teria ligado para o Louis!

— Desculpa, o que o babaca fez?

— Ele é casado! — grita. — Aquele desgraçado tirou a aliança e ficou


comigo, e depois o vi a colocando no dedo, e ele admitiu ser casado, e agora
tenho de o encontrar diariamente nas filmagens porque ele foi cotado para a
administração do estúdio, e a esposa dele é a atriz principal da série que estou
dirigindo! Eu quero me encolher, sempre que o vejo com ela — grita e fecho os
olhos sentindo dor nos tímpanos.
— A esposa dele sabe sobre vocês?

— Não, e o pior de tudo, é que ela é legal — suspira — eles que são
estranhos juntos, parece que estão fazendo aquilo forçado.

— Por que você acha isso?

— A Candice sempre sorri para todo mundo e dá bom dia, traz café, e
nunca reclamou quando a mando repetir a mesma cena 300 mil vezes — funga se
preparando para um novo choro — mas quando ela fica no mesmo ambiente que
ele, é como se a alma da mulher fosse sugada para marte, e dá para perceber
que eles não se suportam, mas ficam se abraçando e se beijando no estúdio.

— O casamento deles pode estar em crise — Lira fica com fúria no olhar.

— CLARO QUE ESTÁ! — Grita — e aquele babaca ficou comigo, e agora


tá pegando a diretora de imagem! Eu vi os dois transando no trailer dela hoje de
manhã. Eu quero morrer e nunca mais olhar para ele — geme e volta a esconder
o rosto — e ele ainda teve a coragem de ficar falando comigo como se não nos
conhecêssemos.

— Arruma outro homem e faz ele ver vocês juntos. Aposto que deve ter
algum ator bonito querendo pegar a diretora deles.

— Seu escroto desgraçado, espero que morra engasgado — bate o celular


no travesseiro.

— Você já fez isso antes. Lira — a lembro — é a sua principal arma para
poder fazer um cara perceber que ele não tem importância na sua vida.

— Mas eu gosto desse desgraçado — ralha, e escuto quando ela esperneia


na cama.

— Desgoste!
— Você fala como se fosse fácil — volto a ver seu rosto — me conta
alguma novidade para me distrair? O Louis não atende o telefone, e você sempre
foi ótimo em me fazer sentir melhor.

— Acho que posso estar gostando de alguém — confesso para ela.

— Me conta tudo, isso é a melhor distração que você poderia me dar —


limpa os olhos.

Pela próxima hora relato para a Lira como foi o meu envolvimento com a
Olivia, e como a terapia tem me ajudado a entender meus sentimentos, e poder
colocar a cabeça no lugar.

Confesso para ela o medo que sinto de colocar a Olivia em perigo, e que
ainda acho que posso acordar qualquer dia com a dor dominando minha alma
novamente, e me excluindo da vida que construí para mim.

Falo sobre o Lorran, que estou determinado a fazer com que ele me veja
como um pai.

— E é isso — dou de ombros, olho para a janela e vejo o sol nascendo, não
dormi nada, e daqui a pouco vou preparar o café do Lorran.

— Levi você não faz ideia do quanto é bom saber que voltou a viver.

Lira tem os olhos menos inchados, e parou de chorar já tem uns 45


minutos.

— É estranho para mim — admito — eu ainda amo a Blanca, não posso


têla, porque ela morreu, mas não sinto que estou a traindo. Acho que estou
aceitando que ela realmente se foi, e não poderemos mais ficar juntos.
— A Blanca foi uma das pessoas mais legais que conheci — Lira sorri —
eu amava passar as noites conversando com ela e tomando sorvete, enquanto
você estava ocupado no ateliê, desenhando sua próxima coleção.

— Ela nem tentava me fazer parar de desenhar, somente aceitava que eu


focava, e o mundo ao meu redor desaparecia.

— Exatamente, ela teria sido uma mãe incrível para o Lorran. — Lira se
cala, e sinto que ela quer dizer mais — se eu passar dos limites me interrompa,
mas...

— Pode dizer.

— A Olivia parece amar muito o Lorran e você gosta dela, talvez essa seja
a chance de você voltar a amar, e do Lorran ter uma mãe. Não estou dizendo que
ele não tenha uma, mas sem a Blanca, ele vai crescer sentindo falta desse
carinho — Lira desvia o olhar da tela — às vezes eu queria que o nosso pai
arrumasse uma madrasta, somente para eu poder ter uma figura feminina para
me ajudar na adolescência. Se eu a tivesse, agora estaria buscando conselhos
maternos, ela saberia o que fazer com aquele filho da puta.

— Pega outro na frente dele — digo e ela gargalha — o pai nunca,


escolheria alguém ruim, deve ser por isso que não se apaixonou de novo.

— Você podia conversar com ele, de um viúvo para o outro, saber o que
ele pensa sobre se relacionar novamente.

— Vou fazer isso, obrigado.

— Estou aqui para quando precisar, e Levi — Lira sorri — você não tem
culpa da morte da nossa mãe ou da Blanca, a mamãe estava voltando para casa,
e a Blanca teria ido naquele desfile, com, ou sem você. Se privar de viver uma
nova experiência com a Olivia fará você não viver o amor novamente, e o
Lorran crescer sem uma mãe, dá uma chance para ela, significa uma segunda
oportunidade para vocês dois.

— Você tem razão — admito — acho que estou me preocupando demais.

— Você sempre foi assim — ela ri — lembra que ficou um ano pensando
em diversas formas de conquistar a Blanca, ao mesmo tempo, em que achava
que ela iria te dar um pé na bunda diferente, para cada nova ideia que você
tinha.

— Eu estava certo em todas, ela massacrou meu coração — é gostoso falar


da Blanca com a Lira.

— Deixe de ser dramático, você tinha uma fama de galinha maior que o
Louis.

— Nossa mãe ficaria decepcionada por como os três filhos dela tinham
fama de galinhas.

— Eu sempre fui uma lady! — a voz sobe um oitavo.

— A lady, que me liga de madrugada chorando por causa de homem, pega


outro na frente desse desgraçado e tudo ficará bem.

— Eu pego, se você chamar a Olivia para sair.

— Feito.

Eu já queria fazer isso, vou usar como um pretexto para que a minha irmã
possa superar o babaca que a faz sofrer.

— Quero uma foto de vocês dois juntos, não esqueça.

— Digo o mesmo de você.

— Venha me visitar.
— Lorran só terá férias daqui a uns meses para podermos viajar, enquanto
isso, venha ficar conosco quando as filmagens acabarem.

— Vou sim. — Gosto de a ver sorrindo, diferente de quando iniciamos a


ligação.

— Você fica linda ao sorrir.

— E você é um galanteador de primeira — Lira boceja — vou dormir, até


mais Levi.

— Tchau Lira.

Desligo, e me sinto mais leve, o sono bate e decido dormir um pouco, antes
de acordar o Lorran.

Olivia
— O que vamos fazer? — Lorran fala devagar cada palavra para acertar a
pronúncia.

— Vamos jantar — Levi responde e pega o filho no colo quando saímos do


carro.
— Oba — bate palminhas.

O restaurante é deslumbrante, acho que nunca estive em um lugar de


aparência chique. A frente é feita em madeira, com vidros mostrando o ambiente
interno iluminado por lustres, com plantas em cada coluna, um ar rústico e
sofisticado.

O maitre nos leva a uma mesa com cadeira para crianças, ao lado das
janelas com fonte de água, do lado de fora, pequenas luzes ao redor.

— É lindo — comento quando nos sentamos, Levi sorri para mim e


acomoda o Lorran antes de se sentar na cadeira de frente.

— Foi indicação do motorista, ele disse que os antigos patrões gostavam de


vir aqui.

— Não pesquisou na internet? Jurava que você tinha feito isso.

— Odeio pesquisar lugares na internet — franze o nariz — gosto de


indicações de quem já foi no lugar.

— Com certeza essa foi uma ótima aposta — sorrio para ele.

Estava me sentindo péssima de manhã, passar a tarde na creche ajudou a


aliviar a dorzinha no meu coração. Ficar aqui com Levi e Lorran me faz esquecer
de que quero desesperadamente um filho, e me iludo que tenho uma família que é
minha. Meu filho, Lorran, e meu marido Levi, como se um dia essa ilusão
pudesse ser real.

— Passei a noite em claro — ele admite — desculpe se eu estiver


parecendo cansado.

— Você tem um ótimo aspecto — sorrio por que acho que é a única coisa
de que consigo fazer no momento — por que me chamou para sair? É realmente
sério o que você disse no carro? — desvio a atenção para o Lorran, que assiste
um desenho no seu Ipad.

— Sim — ele estende uma mão e toca a minha por cima da mesa — eu
passei os últimos dois anos em depressão profunda, e sei que ainda não estou
recuperado, às vezes ainda sinto as trevas tomando conta da minha mente, e
quando isso acontece, eu olho para o Lorran ou para você, e a calma retorna.

Seus dedos acariciam os meus.

— Talvez eu esteja sendo um escroto por usar você para me sentir melhor,
mas eu quero isso, Olivia — seus olhos brilham pela sinceridade em suas
palavras — poder me sentir vivo novamente, e ter sentimentos por outras
pessoas, por você.

— Levi, eu já me machuquei muito em relacionamentos passados —


pigarreio forçando a voz a continuar firme — você ainda ama sua ex-mulher e
não sei se tem lugar para mim ao seu lado.

— Eu sempre amarei a Blanca — me magoa a certeza com que ele diz isso
— ela é a mãe biologia do Lorran e a minha primeira esposa, é a mulher com a
qual eu tive maior envolvimento amoroso e me casei, eu quis uma vida com ela
— tento puxar minha mão e ele não deixa — não nos separamos porque o amor
acabou, ou porque um magoou o outro, ela morreu, e eu continuo aqui.

Uma lágrima escorre pela sua bochecha e ele se apressa em a enxugar com
a mão livre. Minha garganta trava com a vontade de chorar, o amor à primeira
vista não existe para mim, e nenhum outro tipo.

— Eu sei que se ela estivesse viva eu não me apaixonaria novamente,


porque eu tinha a mulher dá, minha vida comigo. Eu nunca vou te enganar Olivia,
amei a Blanca no passado, e ela continuará tendo um lugar no meu coração
enquanto eu viver. — Ele inspira fundo. — Mas é somente isso que será daqui em
diante.

— O que você quer dizer? — pergunto em um fio de voz.

— Meu relacionamento com ela acabou no segundo em que ela morreu e


eu continuei vivo. O amor pode continuar, mas é somente isso que me restou
dela, o amor, e o Lorran — olha para o filho — eu te detesto — ele me diz isso
com carinho no olhar, e riso nos lábios — dou risada — você me deixa louco
desde o segundo em que nos conhecemos na sala da diretora, quando matriculei o
Lorran na creche, e os últimos cinco meses tem sido um verdadeiro campo
minado.

— Você é um insuportável! — acuso e gargalho, apesar das ofensas eu me


sinto feliz.

— Você também não é flor que se cheire, e como um maldito viciado que
sou, quero continuar cheirando a flor que me deixa louco de raiva em uma
proporção mais forte do que o voo de um foguete.

Gargalho e ele faz o mesmo, Lorran nos encara rindo, e começa a rir
também.

— Qualquer dia eu jogo uma panela na sua cabeça — enxugo as lágrimas


formadas pelo riso.

— E garanta que vai me levar ao hospital depois, ainda quero ser o pai do
Lorran.

— Farei esse favor a você, mas só por causa dele.

— É isso que eu quero Olivia — Levi fica sereno — continuar implicando


com você e me divertindo nas nossas briguinhas. Você me fez voltar a querer
viver novamente.
— Eu não fiz nada, você já tinha começado a terapia quando eu cheguei e
tentava se aproximar do Lorran.

— É verdade, vou reformular a minha frase, já que a senhora chatinha não


me deixa dar a ela alguma importância.

— Prefiro assim — arqueio o queixo e ele ri.

— Eu dei um passo, porque queria melhorar, e você segurou a minha mão


me ajudando a seguir em frente. Não foi com carinho ou delicadeza, como todos
ao meu redor faziam, você me jogou na beira do abismo, e me deixou escolher
pular ou voltar para seus braços, e hoje eu tomei essa decisão. Eu não vou pular,
vou segurar sua mão — aperta — e quero que caminhemos juntos para longe do
abismo, se você conseguir aceitar que eu sempre amarei a Blanca, mas isso não
vai me impedir de um dia te amar.

— Todo esse discurso e você ainda não me ama? — finjo de ofendida e ele
dá de ombros, fazendo uma carinha fofa.

— É mais ódio do que outra coisa, tenho uma veia masoquista bem aqui —
aponta para a cabeça.

— Adoro — rosno para ele que torna a gargalhar.

O peso que sentia em meu peito desaparece como bolhas no ar.

— Eu aceito seus sentimentos pela Blanca, compreendo que ela é a


verdadeira mãe do Lorran, e seu amor. Eu já fui muito rejeitada pelos homens que
amei, Levi — engulo em seco — obrigado por ser sincero comigo.

— Se um dia eu encontrar os babacas que partiram seu coração, eu vou dar


um soco neles, e depois agradecer por deixarem você livre para mim.
— Promete que será sincero comigo, e não vai me rejeitar? Não sei se
aguento outro golpe.

— Eu juro — ele beija meus dedos — vou proteger seu coração, igual a
como você aceita o meu cheio de cicatrizes.

— Vamos devagar — miro o Lorran — ele também será afetado se esse


arranjo não der certo.

— Eu perderia meu filho para você, tenho certeza — brinca.

— Você é esperto — gargalho.

— Vamos pedir?

— Claro.

Ele chama o garçom, e quando o homem se aproxima, eu fico em choque


ao ver Roberto, com a roupa branca e o avental preto, segurando um cardápio,
vindo até nós.

Ele tem um sorriso no rosto que murcha no instante em que me ve


acompanhada do Levi, e do Lorran.

— O-Olivia — gagueja.

— Oi — desvio o olhar, a humilhação que senti na formatura, quando o vi


com a família e a namorada, retorna.

— Quem é ele? — Levi pergunta em italiano, com uma sobrancelha


arqueada, encarando Roberto e a mim.

— Um dos babacas que partiu meu coração — respondo em italiano, e ergo


o queixo.
— Não sabia que você tinha casado — Roberto encara o Lorran e o Levi,
com um sorriso amarelo no rosto — e teve um filho!

— Por que da surpresa? — Levi pergunta a ele em português — não se


dirija a minha esposa com intimidade.

Tenho um solavanco quando ele me chama de esposa com naturalidade,


como se fosse corriqueiro em seu dia a dia me apresentar como sua.

— Desculpe por isso, senhor — Roberto abaixa a cabeça.

— Chame outro garçom para nos atender — Levi pede.

— Sim, senhor.

Roberto vai embora e respiro aliviada por me ver livre de sua presença.

— O que ele fez com você?

Conto a ele todo o envolvimento que tive com o Roberto, enquanto


esperamos os pratos que pedimos a um novo garçom, chegar. Lorran fica irritado
porque falamos em português, e começa a fazer birrar para usarmos o italiano.
Cedo, e evitamos falar sobre meu passado amoroso e desastroso na frente dele.
Em vez disso, Levi me conta sobre como era, quando ele fazia modelos.

— Não sente vontade de desenhar novamente? — pergunto.

— Até agora não, acho que preciso de uma nova musa — seu olhar
esquenta, e meu ventre revira.

— Quer que eu pose para você? — pergunto baixinho.

— Não sei se conseguiria me concentrar — ele analisa meu busto com


fome — você tem curvas tentadoras para um artista olhar, e não tocar.
— Pode tocar o quanto quiser — escondo o rosto atrás do meu vinho ao
beber um longo gole.

— Sexta de noite — ele diz e engasgo com a bebida.

— Amanhã? É muito cedo!

— Fiquei inspirado — inspira fundo fazendo drama de artista — vou criar


uma coleção inteira, e a chamar de raio de sol.

— Vai ser toda em amarelo?

— Preto — ele diz com seriedade — como a exposição que vimos, vou
contar uma história através das roupas.

— Do inverno a primavera, poderia chamar assim.

— Não, será raio de sol — puxa minha mão para a beijar novamente.

— Vou ganhar porcentagem por ser sua modelo? — arqueio a sobrancelha,


e ele morde minha pele.

— Vai poder usar e abusar do artista.

— Gostei dessa proposta — estreio as pálpebras — mas quero outra coisa


— baixo o tom de voz — muito dinheiro na minha conta.

Levi gargalha, e o Lorran acompanha o pai sem entender a piada, ele gosta
de quando rimos.

— Sua pequena aproveitadora!

— Tenho de fazer valer meus dotes — aponto um ombro para ele — quero
ao menos 50%
— Não seja gananciosa, Olivia — ele enxuga o canto dos olhos, e limpa a
boca com o guardanapo.

Levi tem lábios beijáveis, daqueles que quando se olha a distância, eu


tenho o ímpeto de chegar perto do homem, e testar se são realmente macios como
eu imagino.

— Depois conversamos sobre a minha porcentagem — termino de comer, e


limpo o Lorran, que sujou as mãos com o espaguete.

— Vamos fazer isso com muito cuidado — fica em pé e pega o filho no


colo, estendendo a mão para mim — acho que precisamos de outra babá para o
Lorran — diz em português — quero me aproveitar da dele.

— Seu sem-vergonha — bato em seu ombro e entrelaço nossos dedos.

— Você acordou a fera, é sua obrigação saciar a minha fome — ele tem
desejo pungente em seus olhos.

— Como quiser.

Saímos do restaurante rindo e felizes, sinto que coloquei no eixo todas as


pontas soltas da minha vida. Lorran dorme dentro do carro, no caminho para o
meu apartamento, e quando paramos no lado de fora, Levi desce do carro comigo
e segura minha cintura, impedindo que eu vá embora.

— Sei que queremos ir com calma — ele encosta a testa na minha — mas
estou louco para te beijar.

— Então beija.

Entrelaço os braços ao redor do seu pescoço, e deixo que ele se curve,


encostando os lábios nos meus. Macios, molhados e gostosos. Levi desliza sua
língua em minha boca pedindo passagem, e entrelaçando ela com a minha, gosto
de sua saliva misturada a minha, sinto minhas pernas virarem gelatina, pela
pressão se sua mão na minha cintura, me trazendo para perto de seu corpo.

O beijo poderia ter durado a noite toda, como acabado em questão de


segundo, que eu não saberia dizer. O solto quando meu pulmão queima
precisando de ar, ele distribui pequenos selinhos em meus lábios e bochecha.

— Não quero ir embora — confessa.

— Não quero que você vá — admito.

O beijo novamente, e quando começo a sentir um calor infernal subindo do


meu ventre para meu peito, eu sei que preciso parar agora, ou o levarei para o
meu apartamento, e o Lorran não pode dormir dentro do carro.

O solto devagar, encarando seus olhos azuis que brilham como dois
diamantes, eu mordo seu lábio inferior e me afasto um pouco.

— Até amanhã Levi.

— Tchau Olivia.

Ele me espera entrar, e depois vai embora. Ainda com um sorriso bobo, eu
entro no meu andar, tenho o coração jogado ao chão ao ver a Bianca no chão da
minha porta, dormindo.

— Meu Deus, Bianca! O que diabos?

— Fala baixo Olivia — ela pede com a voz rouca

— O que aconteceu? — fico de joelhos e a ajudo a se levantar, para


podermos entrar.

Deito Bianca com a cabeça no meu colo, e faço carinho em seus cabelos.

— Agora me diz o que aconteceu — peço.


— Armaram para mim, criaram provas falsas de que eu e a Marta, estamos
por trás da empresa fantasma que tem sido usada para desviar dinheiro da
VITTILENO, e o Louis acreditou em tudo, nem me deu uma chance de explicar.

— Não sei quem é mais idiota, ele ou o irmão.

Opto por não contar a Bianca sobre o meu relacionamento com Levi, e
deixar ela acreditar que ainda o detesto.

A Bianca, de coração partido pelo Louis, poderia até ficar feliz por mim e
pelo Levi, mas eu sei que ela ficaria preocupada sobre ter de encontrar o Louis,
quando eu e Levi estivéssemos juntos, ou em jantares de família, e tudo isso
partiria o coração da minha irmã.

Sei que vou estar a enganando ao fazer isso, mas no momento, é o melhor
caminho.

Tenho de pedir ao Levi para manter nossa relação recém iniciada em


segredo, Louis é um babaca de ego gigante, não sei se ele apoiaria o irmão, ou se
tentaria me demitir para evitar ver minha irmã, e ouvir minha opinião sobre essa
merda que aconteceu entre eles.

Eles realmente se gostavam, que droga Louis!

— O que houve? — Bianca pergunta.

— Levi me tira do sério, aquele italiano metido. — É essa a narrativa que


manterei.

— Achei que ele passasse o dia depressivo.

— Depressivo? Tente mais para implicante, até uma mamadeira que eu


faço para o Lorran ele se mete, dizendo que estou fazendo errado. Juro que estou
por um triz de bater na cabeça dele com um pau.
Continuamos conversando sobre a situação entre eles, e quando finalmente
ela se acalma, levanta-se rápido demais e desmaia.

Ligo para uma ambulância, e a levo ao hospital, lá descubro que minha


irmã está grávida do idiota que partiu seu coração, e a acusou de algo terrível.

Acho que quando se é para ser mãe, acontece fácil assim, Bianca
engravidou enquanto tomava anticoncepcional, e o pai do bebê, e ela, estão
separados, enquanto eu tento de mil formas ter um filho e não consigo.

Sufoco o sentimento ruim em meu peito, devo ser forte e apoiar Bianca, ela
precisa de mim e a colocarei em primeiro lugar, quantas vezes forem necessárias.

Levi
— O Louis é um asno — digo ao meu pai.

Estamos analisando os documentos entregues ao meu irmão, acusando


Bianca e a Marta de terem desviado fundos da empresa, enquanto ele chora e se
embebeda no quarto.

Fecho a última pasta e coço a cabeça, as decepções amorosas do Louis, o


cegaram ao ponto de não poder confiar em mais ninguém, por um lado, eu
entendo meu irmão, mas ainda o acho um imbecil por magoar uma mulher como
a Bianca.

— Vai contar a ele do seu envolvimento com a Olivia? — meu pai


pergunta.

— Não, deixa ele pensar que ainda a detesto, não quero que fique
ressentido com a Olivia, ou comigo.

— Fico feliz por você encontrar o amor novamente — ele toca meu ombro.

— Não é amor... ainda — decido ser sincero — eu tenho carinho pela


Olivia, e gosto dela, mas não posso afirmar que é um amor, principalmente
depois do que vivi com Blanca.

— Existem vários amores na vida, Levi, o seu e o da Blanca foi épico,


digno de cinema. Sua relação com a Olivia não precisa ser assim, pode ser a
calmaria, conforto, e confiança que ambos precisam.

— Não sei se entendi — franzo a sobrancelha.

— A Blanca te fez amar intensamente, e com toda a sua alma. Já Olivia, te


fez querer voltar a viver, a se apaixonar novamente, e ter novos objetivos de vida.
São amores diferentes em intensidades, que não se comparam, mas cada um deles
tem momentos, significados importantes, e únicos.

— Você se apaixonou novamente?

— Eu tive uma vida ao lado da sua mãe, terminamos porque ela morreu, e
nunca senti que precisava de mais depois que ela se foi. Nenhuma outra mulher
me fez sentir como a Cecília, não sei como será no futuro, tive meus casos de
uma noite ou duas, mas nenhuma me fez querer continuar voando com elas.

Meu pai se aproxima e toca meu ombro, me encarando nos olhos.


— Abra suas asas, filho, se o amor batesse na minha porta novamente, eu o
deixaria entrar.

— Obrigado, pai. — Ele também é viúvo, sabe o que eu sinto. É


reconfortante ouvir suas palavras.

— Vamos fazer o stronzo do seu irmão perceber que cometeu um erro.

— E dos grandes.

Saio do escritório e vou para a sala, onde encontro a Olivia com o Lorran.

— Filho, seu nonno chamou por você no escritório.

— Celto — ele desce rápido do sofá, e vai correndo atrás do avô.

— Chamou mesmo? — Olivia arqueia a sobrancelha quando chego perto


dela e roubo um beijo para mim.

— Eu tinha de despistar ele — murmuro em sua boca — lembra que ainda


estamos deixando eles acharem que nos odiamos? — puxo sua cintura para o meu
colo.

— É fácil fingir isso — ela diz entre beijos — você me tira do sério.

— Você que me enlouquece — deslizo a mão em seu joelho, e belisco a


carne da sua coxa.

— O que eu posso fazer se você não consegue ficar longe de mim? —


Morde meu pescoço, e aquilo causa uma reação direta no meu pau.

— Zia Viviaaaaaaaa — Lorran grita, e jogo a Olivia no chão.

— Ai! — ela grita quando bate a cabeça na mesa, e puxo uma almofada
para o meu colo. — Seu idiota — bate na minha coxa.
— Tal bligando? — Lorran pergunta entrando na sala.

— Por que me chamou fofinho? — ela pergunta, levantando e indo até ele,
os olhos fervendo de raiva, com certeza serei punido por tê-la jogado.

— Zio Lou tava clolando — fala mexendo os dedinhos — cadê meus


dolcinhos para deixa ele feliz?

Gargalho, Lorran herdou a mania da minha mãe de deixar as pessoas


felizes ao dar doces a elas.

— Vamos fazer um bolo, Lorran — o chamo.

— Bola — vem saltitando comigo para a cozinha.

Ele entra primeiro, e antes que eu passe pela porta, Olivia puxa o cós da
minha calça, me fazendo voltar. Ela fica na ponta dos pés, e quando acho que vai
me beijar, fecho os olhos, o ardor seguido da dor no meu pescoço faz eu me
encolher e resmungar. Ela me mordeu!

— Olivia!

— Isso é por ter me jogado no chão — volta a posição normal, e pisca os


cílios — faça de novo, e na próxima é no seu pau que vou morder para arrancar
um pedaço.

— Desalmada!

— Idiota — arrebita o nariz e vai embora, rebolando o quadril, e chamando


minha atenção para a sua bunda empinada e apertada na calça jeans.

Coço os dedos com vontade de estapear sua carne, e poder prová-la. Já


estamos juntos a quase uma semana, e não passamos de beijos contidos, que só
acende o fogo dentro de mim.
Eu quero essa mulher, e estou começando a sentir um novo vício rastejando
pela minha pele. Com o Louis sendo um babaca tristonho, não posso deixá-lo
cuidando do Lorran, para poder ter um tempo com a Olivia, meu irmão não podia
ter escolhido hora pior para ter o coração partido!

— Vamos arrumar outra babá para o Lorran — digo, e ela arqueia a


sobrancelha sugestiva — ao menos por uma noite.

— Tem certeza de que quer isso? — tem um pouco de dúvida e medo na


sua voz.

Me aproximo da Olivia e sussurro em seu ouvido.

— Eu quero você.

— Eu também — ronrona.

— Quel o clque? — Lorran embola as palavras e o vejo com a boca cheia


de chocolate.

— Lorran! — eu e ela falamos juntos, e rimos, o pequeno nos acompanha


gostando do clima leve no ambiente.

Ele pegou as barras na geladeira, enquanto eu pensava em comer a Olivia.


Desse jeito não conseguiremos um segundo de paz.

Limpo o Lorran, enquanto Olivia pega os utensílios e ingredientes para


fazermos um bolo de chocolate, e passamos a tarde ocupados fazendo o doce.

Na sala, assistimos a um filme com o Lorran agarrado na Olivia, faço


carinho na cabeça dele, querendo o trazer para mim. É torturante esperar que ele
queira o meu carinho, sei que é consequência das minhas ações, e o deixarei vir a
mim quando se sentir pronto, como eu me senti para ir até ele.

— Vou ao banheiro — Olivia diz e se levanta, a sigo com o olhar.


Ela demora mais do que o normal, e levanto, no corredor vejo quando a
porta do escritório do Louis é aberta, e Olivia o encara.

— Você é um idiota que não merecia a Bianca.

Louis parece mais decidido do que quando entrou, deve ter percebido o
erro que cometeu. Ele ignora a Olivia e vai para o quarto dele, ela volta para o
sofá e se senta ao meu lado, colocando o Lorran em cima dela.

Passo um braço ao redor de seus ombros, e cheiro sua cabeça, sei que a
vontade dela era de o xingar muito mais, agradeço por não fazer isso.

— Eu ainda detesto seu irmão.

— Ele foi enganado.

Conversamos baixinho, enquanto conto a ela a história do que eu e meu pai


achamos que aconteceu na empresa, e sobre o passado do Louis com outras
mulheres.

Ele também já foi magoado, e tem seus motivos para ser desconfiado
quanto a outras mulheres, mas não podia ter descontado na Bianca as frustrações
passadas.

— Ele sofre com a falta dela.

— Ela também, só sabe chorar em cima da cama com o coração partido.

— Acha que devemos ajudar eles dois a voltarem a ficar juntos?

— Por enquanto o Louis tem de tomar uma atitude, foi ele quem magoou a
Bianca, não vou fazer nada enquanto não tiver a certeza de que ele a ama.

— Estou indo para a suíça — Louis passa como um tornado pela sala.

— Viu — digo a ela — desesperado para arrumar a bagunça que ele fez.
— Vamos — continua observando, ela toca a cabeça do Lorran e
percebemos que ele dormiu — vou colocá-lo no berço.

— Certo.

A ajudo a levar o Lorran para o quarto dele, e quando fecho a porta atrás de
nós, eu pego a Olivia no colo e calo a sua boca com a minha.

Estamos sozinhos no apartamento, e vou aproveitar para fazer o que anseio


há dias com essa mulher.

A jogo contra a parede, e enredo minha língua na sua, em um beijo urgente


e cheio de desejo. Enfio minha mão dentro de sua blusa, puxando-a para cima, e
liberando seu busto, enfio o rosto entre o vão de seus peitos, e a cubro de beijos e
mordidas.

Olivia puxa meus cabelos e rebola o quadril contra minha barriga. Seguro
sua bunda com ambas as mãos, e cambaleio pelo corredor, até chegar ao meu
quarto.

— Levi — ela suspira mordendo minha orelha.

Um arrepio corta minha espinha, e jogo a Olivia na minha cama com


necessidade. Seguro a borda de sua calça e abro o botão, desço o zíper com
rapidez, enquanto puxo o tecido para fora de seu corpo, deixando-a somente com
a lingerie roxa.

Minhas bolas pesam dentro da cueca, tiro minha camisa com um braço,
antes de baixar as calças e subir em cima dela.

Fico afoito, com as mãos tremendo enquanto tento tirar seu sutiã. Sem
paciência, Olivia segura o feche e o tira, liberando os seios que pulam na minha
cara. Desço o rosto, segurando ambos nas mãos, e os cheiro, com um inspirar
profundo me embriagando pelo aroma sexy dela.
Mordo seu mamilo, e Olivia sufoca um grito contra a palma da mão.

— Vou te comer com minha boca e meu pau — a solto e deslizo o dedo em
sua calcinha molhada — não acorde o Lorran com seus gritos.

— Convencido — geme quando penetro meu dedo em seu calor, com


força, indo o mais fundo que posso nela — nunca me faria gritar — ela diz isso
com a voz entrecortada.

— É o que veremos.

Tiro sua calcinha, e arreganho suas pernas para mim, a bocetinha brilhando,
molhando os pelos ralos em sua pele. Desço o rosto de encontro a sua carne e
abocanho, me deliciando no gosto de seus fluidos.

Mordo seu clitóris, enfiando dois dedos em seu interior, e Olivia tem
solavancos no colchão, movendo o quadril feito louca, fazendo seu clitóris
escapar de meus lábios.

Ela sufoca os gritos, mordendo o travesseiro, não dando o braço a torcer.


Minhas bolas parecem mais pesadas dentro da minha cueca, e fico louco para
meter dentro dela, sinto que posso gozar somente a chupando.

— Nem meti meu pau em você e já está se contorcendo — a provoco.

— Deixa de falar e vem logo — agarra a barra da minha cueca e puxa meu
membro para fora, duro feito aço — você é enorme, porra, não vai caber em mim.

— Vai deslizar na sua bocetinha melada.

— Coloca a camisinha e deixa de falar — geme, se deitando aberta.

— Acho que eu não tenho uma — Olivia parece que vai me matar com um
olhar.
— Eu parei com o anticoncepcional devido à inseminação, que merda Levi
— bate no colchão.

— Fica aí, vou pegar uma do Louis — beijo seus lábios e pulo da cama.

Enrolo uma toalha ao redor do quadril e vou para o quarto do Louis, acho
um pacote na gaveta e volto.

Estanco quando a vejo com os dedos deslizando no clitóris, dando prazer a


si mesma. Visto a camisinha e subo na cama, ficando entre suas pernas.

— Geme para mim — peço mordendo seu pescoço e me acomodando entre


suas pernas.

— Me come gostoso que eu gemo — ela abraça meu peitoral, e busca por
minha boca.

Meto meu pau na sua boceta, e sou abraçado pelo calor esmagador da
Olivia. Porra, ela é apertada, e ferve por dentro. Levo uns segundos me
acostumando com seu interior, antes de começar a socar forte, até sentir minhas
bolas batendo em sua bunda.

Olivia rebola o quadril, esfregando o clitóris em minha pélvis enquanto


geme gostoso no meu ouvido, intercalando com mordidas.

Fodo gostoso com ela, deslizando nossos corpos um no outro, roubando


beijos com gemidos, e criando uma conexão única entre nossas almas.

— Le-vi — geme, as paredes de seu interior me apertam, e a vejo revirando


os olhos, enquanto se desmancha em meu pau.

Meto mais duas vezes, antes de gozar na camisinha e desabar contra seu
corpo.

— Vai me matar — geme baixinho.


Giro de lado a trazendo para os meus braços, ambos respirando com
dificuldade.

— Você é perfeita — sussurro em seu ouvido.

Ficamos de chamego mais um pouco na cama, até irmos tomar um banho


juntos.

— Vou para casa — ela diz quando se veste.

— Dorme comigo — a puxo para a cama, e beijo seu lábio, dengoso.

— Bianca pode precisar de mim — murmura, não fazendo força para se


levantar.

— Liga para ela, se estiver tudo bem, você fica comigo — passo um braço
por cima de seu estomago e prendo sua perna com a minha.

— Você é muito carente.

— Completamente — beijo seu pescoço — perdidamente — a bochecha —


carente por você — toco seus lábios.

No fim a Bianca já estava dormindo, e Olivia fica a noite toda comigo.


Durmo em paz com ela em meus braços.
Levi
Corro pelos corredores brancos do hospital, tropeçando nos meus pés,
enquanto tento localizar onde fica a emergência. Uma enfermeira me guia, dobro
no corredor e vejo meu pai, sentado em uma sala perto das portas, de frente a sala
de emergência do hospital.

— Pai! — chamo e vou até ele.

— Ele vai ficar bem — ele segura meus ombros, me fazendo sentar —
respira Levi — pede. Acompanho seus movimentos de inspirar e expirar por
longos segundos, até me sentir calmo o suficiente.

— O que aconteceu?

— Alfredo continua investigando, uma bomba explodiu no carro do Louis,


e ele foi atingido por uma bala no meio do tiroteio.

— Quem fez isso?

— Não sei — aperta os punhos — quando descobrir vou matar o infeliz


que atentou contra a vida do meu filho.
— Ele foi para a Suécia investigar o desvio de dinheiro na VITTILENO, só
pode ter sido a pessoa responsável pelo roubo que tentou o matar. — Concluo. —
Desconfio disso também.

Louis continua em cirurgia pelas próximas quatro horas, enquanto eu e meu


pai tentamos não enlouquecer de preocupação.

Ele não pode morrer, não agora. Ele estava bem, saudável, amando uma
mulher que o amava, e era maravilhosa, e agora toda essa merda aconteceu.

Vai morrer, como a minha mãe morreu.

Partirá como a Blanca partiu.

Vou perder meu irmão mais velho, o único que nunca me abandonou, e
aguentou minha pior fase. O Lorran nunca vai conseguir superar a perda do tio,
isso não pode acontecer.

Não.

Não.

Não.

Cenas do meu irmão morrendo inundam minha mente, bato na cabeça


tentando as expulsar. Ele não pode morrer, ele não vai morrer, o Louis nunca me
deixaria.

Alguém me chama, não consigo ouvir o que fala, meu corpo sacode para os
lados, o mundo começa a ficar fora de foco. A respiração falta, e uma dor
insuportável irradia no meu coração. Ponho a mão em cima e arfo, tentando
respirar sem sucesso.

Apago.
Desperto, e a claridade do quarto me incomoda.

— Devagar — reconheço a voz doce ao meu lado.

— Lira?

— Sim — sua mão alisa meus cabelos, e consigo focar no rosto da minha
irmã, inchado pelo choro — você ficou tão lindo, ganhou peso, e um aspecto de
vida — ela sorri e me abraça forte.

Envolvo o corpo de minha irmã, e inspiro seu cheiro doce de flores, faz
muito tempo que não a vejo.

— Senti sua falta — digo a ela.

— Eu também — beija minha bochecha — cadê sua namorada?

— Quem? — Franzo a sobrancelha.

— O pai me contou que acha que você está finalmente namorando a babá
do Lorran, não ouse mentir — aponta o dedo para mim.

— Nunca te enganaria — sento-me e percebo que estou em um quarto


hospitalar — o que aconteceu comigo?

— Você teve um ataque de pânico e desmaiou, ficou apagado por 12 horas.

— E o que você faz aqui? — coço a cabeça — nosso pai?

— Quando ele me ligou para falar sobre o atentado que o Louis sofreu, eu
larguei as filmagens e corri para cá. Ele foi ficar com o Louis, enquanto eu cuido
de você.

— Foi tudo bem na cirurgia? — me sinto um pouco lento, e com muita


sede.
— Sim, ele não corre perigo, ao menos não hospitalares — me entrega uma
garrafa de água — usaram um sedativo em você para te acalmar.

— Entendi — bebo a garrafa inteira. — Vamos ficar com ele.

— Depois que o médico te atender, fique aqui.

Ela sai sem esperar a minha resposta.

O médico me alerta sobre a crise de pânico, e procurar ajuda psicológica,


informo que já estou sendo acompanhado e sou finalmente liberado. Vamos para
o quarto do Louis, quando entramos, ele desperta, e a Lira se joga em seus
braços.

— Nunca mais dê um susto desses na gente — peço sentindo as lágrimas


retornarem — eu achei que você fosse morrer — não consigo controlar a vontade
de abraçar o Louis, e o aperto, me arrependendo ao ouvir seus gemidos —
desculpa..., desculpa — peço ao me afastar, e limpar o rosto.

— Você quase me matou de susto Louis — Lira funga.

— Vem cá — ele a chama, e minha irmã se encolhe na cama com ele, sem
o machucar — Bianca?

Fecho os olhos, Louis não parece que compreende a gravidade da situação


em que ele se encontra.

— Não avisamos a ela filho — meu pai diz — pode ser perigoso envolver a
moça no que vai acontecer daqui em diante.

— O que houve comigo? — Lira sai de perto dele, e tomo o lugar dela,
segurando seu ombro, o fazendo focar em mim.
Explico ao Louis tudo o que aconteceu quando ele pousou no Brasil, e os
motivos pelos quais ele e a Bianca não podem mais ficar juntos. Ela só estaria
sendo colocada em risco.

Deus, se eu tivesse tido a chance de proteger a Blanca do acidente de carro,


teria agido sem pensar duas vezes. Não vou permitir que o Louis sofra a dor que
me destruiu.

— Bianca não pode saber disso, você tem de se afastar dela se não quiser
que ela seja pega no fogo cruzado, e acabe morta.

— Não, eu posso protegê-la. — Vejo o desespero nublando seu semblante,


e fico furioso pelo Louis querer a colocar em perigo, por egoísmo de não
conseguir ficar sem ela.

— Você não protegeu a si mesmo — grito — e se ela estivesse dentro


daquele avião com você? Ela poderia ter morrido — imagens da Blanca sendo
velada em um caixão, invocam a dor que senti no dia que soube de sua morte —
VOCÊ QUER A DOR DE PERDER O AMOR DA SUA VIDA? Resolva essa
maldita confusão antes de ir atrás dela, ou se culpe eternamente caso ela morra.

— Levi! — Lira grita comigo.

— NÃO! — Esbravejo com ela — você — aponto para o meu pai — sabe
a dor de perder quem você ama, o buraco que fica dentro da gente que nunca será
preenchido, por mais que encontre outro amor — encaro o Louis — EU DARIA
TUDO PARA TER A BLANCA DE VOLTA, EM MEUS BRAÇOS, e você que
diz amar a Bianca, quer mesmo a colocar em perigo e correr o risco de ela
morrer?!

— Eu sei que... — não o deixo continuar falando.

— DEPOIS QUE SE MORRE, NÃO TEM MAIS VOLTA. Seu imbecil!


Não suporto continuar olhando para o Louis, e saio do quarto, antes de
iniciar uma briga com meu irmão. Como ele pode ser tão idiota? A vida humana
não é como um prato que você quebra e joga os restos no lixo sem se importar,
depois que a pessoa dá o último suspiro, ela nunca mais volta, e quando isso
acontece só resta a dor para os que permanecem.

A vida deve ser valorizada enquanto ela ainda existe.

Eu devo valorizar a minha vida enquanto estou vivo.

O pensamento é como uma epifania em meu cérebro, e sei aonde devo ir, e
o que preciso fazer.

— Levi, espera — Lira puxa meu cotovelo — vamos conversar, não faça
besteira.

Aperto minha irmã com força em meus braços.

— Eu preciso ver a Olivia e comemorar que estamos vivos — beijo seus


cabelos várias vezes — vá ficar com o Louis, eu estou bem.

Sorrio para a minha irmã com o peito explodindo em vontade de viver, de


aproveitar o tempo que me resta no mundo com as pessoas queridas, eu estou
vivo, meu coração ainda bate, e eu ainda respiro. Eu continuo nesse mundo, a
Blanca, meu grande amor se foi, doeu tanto que me rasgou em dois, mas eu estou
aqui.

— Toma cuidado — ela beija minha bochecha e corro para o lado de fora.

Chamo um táxi, pela hora, a Olivia e o Lorran estão na creche ainda, deve
ser o momento do sono da tarde das crianças. Chego ao prédio, e os seguranças
liberam minha entrada após confirmarem que sou o pai do Lorran.
Corro pelos corredores, e paro arfante em frente a sala da Olivia, bato no
vidro e poucos segundos depois ela abre a porta.

— Eu quero viver com você.

Digo arfante, e antes que possa recuperar meu folego ou ouvir a sua
resposta, eu a puxo para o lado de fora e colo sua boca na minha. A beijando
como nunca fiz antes, com vida explodindo em cada lambida que dou na sua
língua, mordida em seus lábios, puxo seu rosto para mim, e colo meu corpo ao
dela, desesperado para a sentir.

Eu estou vivo, e quero continuar vivendo, com a Olivia e o Lorran.

— Eu estou na creche! — ela me empurra como se eu fosse um leproso, e


tudo que consigo fazer é agarrar sua cintura e voltar a devorá-la com um beijo. —
Levi! — exclama em meus lábios.

Minha costela dói pra cacete, e me encolho segurando o estomago quando


Olivia começa a beliscar a minha pele, para me fazer afastar dela.

— Ficou louco?! — Fala entre dentes aumentando os beliscões, até minhas


costas baterem contra a parede. Ela segura meu mamilo e o torce entre os dedos,
e eu vejo estrelas com a dor — quer que eu seja demitida e processada por
atentado ao pudor na frente de crianças menores de três anos? — bate no meu
ombro.

— Se continuar me batendo vai ser preza por agressão — belisco sua


barriga, e ela se encolhe com fúria no olhar.

— O que diabos? — ela me analisa bem, fico parado sorrindo para ela,
tenho vontade de deixar o mundo inteiro perceber o quanto essa mulher me faz
bem. Seguro seu rosto com delicadeza e a trago para perto de mim, beijando sua
testa inúmeras vezes.
— Eu. Quero. Viver. Com. Você — digo cada uma das palavras entre beijos
em sua face.

— Você parece diferente — me afasta e continua me analisando. — Que


história é essa de querer morar comigo?

— Não é morar Olivia — abaixo ficando na altura dos seus olhos — hoje
eu percebi o quanto devemos valorizar a vida que temos, e eu quero fazer isso
com você ao meu lado, viver as nossas vidas, juntos, enquanto vemos o Lorran
crescer e se desenvolver — minha voz trava por um segundo e engulo em seco —
eu abandonei a escuridão, e me joguei na luz, vive comigo?

— Você é um louco que vai custar meu emprego — passa os braços ao


redor do meu pescoço e me abraça — tenho de controlar sua loucura antes que
faça uma besteira.

— Isso foi um sim?

— Foi um; ... Eu vou caminhar ao seu lado enquanto estivermos vivendo.

A abraço e inspiro seu cheiro de sol e calmaria. Feliz por conseguir chegar
ao topo do poço em que vivi durante os últimos dois anos.

— Posso pegar o Lorran? — pergunto.

Ao meu filho eu devo muito mais do que beijos e palavras, que ele não
conseguirá compreender.

— Ainda temos o período da tarde, mas se quiser, eu o líbero mais cedo —


me solta — o que você planejou?

— Vamos passar a noite brincando juntos, esperando você chegar em casa.

— Vem me buscar?
— Não perco isso por nada.

— Espera aqui — beija minha bochecha e sai de meus braços, entrando na


sala e surgindo pouco tempo depois com o Lorran, com os olhos pesados de sono.

— Levi? — coça o rostinho.

— Vamos passear? — estendo a mão para ele — quero muito brincar com
você hoje.

— Blola — estende a mão para mim e o pego no colo, enchendo suas


bochechas de beijos, e ele grita feliz. Lorran segura meu rosto e faz um bico
enorme antes de encostar os lábios no meu nariz e me encher de beijos também.

— Eu te amo muito filho — sussurro em seu ouvido, e Lorran aperta os


braços no meu pescoço — obrigado por ser você o meu menino, eu nunca mais
vou te deixar, te prometo, me dá uma chance de te fazer me amar?

— Eu amo o papai — ele fala baixinho no meu ouvido, e naquele segundo,


eu me sinto o pai mais realizado do mundo.

— Meu anjo — perco a força nas pernas e caio no chão, segurando o


Lorran forte em meus braços, inspirando seu cheiro de bebê, como pude ficar
tanto tempo o negligenciando? — Eu te amo tanto.

— Levi tá biem? — pergunta tentando olhar meu rosto.

É, acho que ainda vou ter de continuar mostrando que sou o pai dele, até
ele se acostumar a me chamar assim.

— Estou ótimo — beijo sua mãozinha — vamos brincar com o papai?

— Blola — se agarra novamente a mim e me levanto com ele — xau zia


vivia.
— Tchau fofinho — Olivia tem lágrimas contidas. — Até mais tarde.

— Tchau — digo a ela com vontade de falar muito mais.

Estou explodindo em um trilhão de emoções. Devo tomar cuidado para não


ficar afobado e falar tudo o que percebi, de uma vez, vou reconstruir a minha
vida, um relacionamento por vez, agora eu tenho meu filho, e a mulher com quem
quero viver. Ainda preciso resolver as coisas com meu irmão, e garantir que
minha família permaneça segura, nunca vou perder quem eu amo.
Olivia
— Você é louco — sussurro na boca dele.

Não consegui acreditar quando Levi parou na porta da creche, sem o


Lorran, e disse que deixou o filho com o avô para que ele pudesse ter uma noite
de solteiro comigo!

— Hoje eu posso ser tudo — me puxa para o seu colo dentro do carro.

Levi esbanja felicidade, é gostoso o beijar sentindo a vida transbordando


dos seus lábios para os meus, o jeito como ele me pega com força pela cintura, e
esfrega seu quadril contra o centro das minhas pernas.

Agarro seus cabelos e mordo seus lábios me deliciando com o fogo que
consome sua íris.

— O que deu em você? — pergunto o mantendo imobilizado para conter o


seu ataque.

— Louis sofreu um atentado, como você sabe, e isso me fez gritar com ele
quando insistiu em ir atrás da Bianca. Ele é louco por a querer por perto, sabendo
que tem um alvo em suas costas, enquanto eu brigava com ele, fui percebendo o
valor que temos de dar a vida, e a quem está ao nosso redor.

Seus olhos brilham, e minha garganta trava ao perceber que ele está se
declarando

— Lorran e você tem sido o meu centro nos últimos meses, e eu quero que
continuemos seguindo em frente, nós três — beija minha bochecha — eu amo o
meu filho, e vou ser o pai que ele merece, e você... — Levi me observa como se
não acreditasse que eu sou real — você não é a Blanca, e eu não sinto por você o
que sentia por ela.

Meu coração murcha dentro do peito como se estivesse sendo esmagado


por uma pedra de dez mil toneladas. Tenho ímpeto de sair do seu colo, mas ele
me segura firme, impedindo a minha fuga.

— Não fuja, me deixe terminar de falar — bate na minha bunda, e pulo


pelo susto.

— Ei! — ralho estapeando o seu peito.

— Fique quieta, estou me abrindo para você — firma meu quadril sobre os
eu — como eu dizia, você não é a Blanca, ela não é você, e eu não sou mais o

Levi que viveu com a Blanca. Aquelas duas pessoas vivem em um passado
de dois anos atrás, e nunca mais poderão encontrar a nós dois no presente.

— Levi faça mais sentido, por favor — peço, minha cabeça começando a
dar nós.

— O que eu quero dizer é; ... O Levi de hoje, quer estar com a Olivia, a
mulher que foi capaz de me ajudar a perceber o quanto eu perdi do mundo me
escondendo na escuridão, e a única que trouxe calor para o meu mundo frio. É
você, e somente você, Olivia, que eu quero para mim. — Ele beija meu nariz, e
forço os olhos a não chorar. — Você me aceita quebrado, amando uma pessoa que
ficou no meu passado de dois anos, e disposto a ter um presente e futuro com
você?

— Levi — murmuro o beijando com paixão e gosto de sal pelas pequenas


lágrimas, que insistem em escorrer dos meus olhos, o coração explodindo com
mil borboletas que voam por meu estômago.

— Preciso de uma confirmação Olivia — sussurra em meus lábios.

— Sim, eu te aceito do jeito que você é, passado, presente e futuro.

Digo por fim.

— Vamos para uma balada? — ele pede quando enfim solta meus lábios,
olho para fora, e vejo que estamos na frente do meu prédio.

— Não, prefere algo mais calmo?

— Não, hoje quero me divertir muito com você — beija meu pescoço.

— Você enlouqueceu mesmo — gargalho recebendo mordidas em meu


busto.

— Completamente, agora vá se arrumar — estrala um tapa na minha


bunda, e mordo seu ombro em resposta.

Volto para o meu acento, e damos a partida para a minha casa.

É um suplício ficar longe dele, quando tudo que eu quero, é me jogar em


seu colo e beijar muito a boca rosa que me encara, mordendo os lábios ao ponto
de ficarem brancos. Chegamos, e corro para meu apartamento. Bianca assiste à
tevê comendo um pote de coxinha, com refrigerante.
— Você não deveria comer isso — a alerto — lembra o que sua
nutricionista falou?

— Sim — as bochechas cheias — é desejo do bebê, não posso fazer nada


— engole mais uma coxinha.

— Sei — vou para o banheiro sem prolongar o assunto, meu italiano espera
por mim do lado de fora.

Bagunço todas as minhas roupas depois do banho, e opto por um conjunto


de short, com um cropped, na cor vinho, mostrando três dedos da minha barriga.
Calço meus sapatos de plataforma, e faço uma make o mais rápido que posso,
pela graça dos céus, deixei o cabelo preso, enrolado, e agora ele desce em ondas
arrumadas.

Termino de me arrumar, as 19 horas, e vejo que o Levi mandou várias


mensagens falando o que fazia enquanto me esperava.

— Vai para onde? — Bianca pergunta, ela ainda come suas coxinhas.

— Sair com umas amigas — pego o celular, e meu cartão — vai ficar bem
sem mim?

— Com certeza, vou já dormir — boceja — não me acorde quando chegar.

Beijo a bochecha dela e saio de casa.

Levi espera dentro do carro, e quando me vê, fico orgulhosa de mim


mesma pela produção que fiz, capaz de deixar um dos homens mais lindos que já
vi de boca aberta, com uma pequena baba escorrendo. Estico a mão e limpo o
canto de seus lábios.

— Não precisa babar, Levi.


— Eu estava esperando a minha namorada e acabo de encontrar uma deusa.
Se o pós-vida era bom desse jeito, eu deveria ter vindo antes.

Gargalho e bato no peito dele. Levi segura minha mão e me puxa para perto
dele, me sentando em seu colo novamente. O carro se movimenta, e ele faz sinal
com a cabeça de que devo voltar ao meu lugar e passar o cinto. Recordo de que a
mãe e a esposa morreram em acidentes de carro, não sei como ele consegue
entrar em um sem ter um ataque.

— Levi, você não tem medo de carros?

— Por um tempo eu tive, quando minha mãe morreu — seu olhar cai ao
encontro do meu — fiquei três meses sem conseguir andar de carro, e me
locomovendo de metrô ou bicicleta. Com a ajuda da Lira, eu fui me acostumando
novamente ao veículo, mas não consigo dirigir.

— O que você sente quando fica atrás do volante?

— As mãos tremem, o ar falta, e o medo de causar um acidente, é tudo o


que eu consigo pensar — ele descansa a cabeça no encosto e fecha as pálpebras
— Lira foi me ajudando, entrando primeiro em um carro parado, e depois ela saia
e entrava da garagem, dava voltas perto de casa, até conseguirmos nos locomover
pela cidade sem problemas. Depois disso, ela quis que eu voltasse a dirigir, não
deu muito certo, e me acostumei a usar os motoristas.

— Se um dia você quiser tentar de novo pode me chamar — toco sua mão
— não dirijo regulamente porque não tenho carro, embora seja uma ótima
motorista.

— Obrigado — beija minha palma — você não deveria ter falado sobre ser
boa motorista — morde minha pele, e arrepios cortam minha carne — agora
estou imaginando como seria gostoso te comer dentro desse carro.
— Levi! — fico vermelha, encaro o segurança, que não demonstra abalo
pelas palavras sacanas do patrão.

— Não seja tímida, meu raio de sol — seus lábios tocam meu pulso —
você está prestes a descobrir as mil formas das quais pretendo te comer.

— Minha nossa senhora — abano meu rosto com o calor subindo


perigosamente por meu corpo.

O carro para, e sou salva do ataque das mordidas do Levi. Observo que
estamos em um restaurante.

— Achei que iríamos a uma balada.

— Tenho de te alimentar antes de te comer. — Sorri sacana e pisca o olho.

Desço com as pernas tremulas em expectativas, não conhecia o lado sem


vergonha do Levi, e agora que o provei, quero muito mais.

Uma droga não irmos direto para o quarto dele, em público é vergonhoso
ouvir ele falar sobre a minha boceta, mesmo que seja em italiano.

— Qual o motivo de você não falar português? — questiono quando ele


segura minha mão, e entramos no estabelecimento.

— No início era por birra, eu não queria me comunicar com as pessoas, e


achava que fazê-las pensar que só falo italiano, as afastariam, e me deixariam em
paz — puxa meu corpo contra o seu — só não contava com você aparecendo e
me irritando em italiano — beija meu cabelo.

— Você fala português muito bem, e tem um sotaque sexy, se comunique


comigo assim — faço bico, e ele me beija demoradamente na entrada do
restaurante.
— Por você eu faço tudo — diz em português, e meu ventre contrai com o
sotaque carregado dele.

— Sim — murmuro querendo mais do que nunca um quarto para ficarmos


sozinhos.

— Boa noite — uma moça fala e nos soltamos, Levi ostenta um sorriso
lindo em seu rosto, o imito, deixando de lado a vergonha.

— Olá querida, mesa para dois, por favor — ele responde.

Seguimos a mocinha e nos sentamos perto do palco, pouco minutos após


pedirmos a refeição, se inicia uma música ao vivo. Levi só toma suco, e eu tomo
drink sem álcool.

Nunca fui muito de beber, e sei que ele é alcoólatra, e faz de tudo para se
manter sóbrio, só de estarmos em um ambiente como esse, pode ser uma
tentação.

— Você sente muita vontade de beber? — pergunto.

— Todos os dias — balança a cabeça ao ritmo da música — eu me escondi


no álcool por anos, é difícil parar, os medicamentos e a terapia ajudam. O resto,
depende da minha força de vontade em ter uma vida, sem o vício me
prejudicando, talvez um dia eu possa voltar a conseguir tomar somente uma taça,
ou algo do tipo, hoje eu sei que se ingerir uma gota, não vou conseguir parar.

— Se você confiar em mim para te ajudar — seguro sua mão — posso ser
sua guia.

— Eu vi que você não bebeu, obrigado por isso — beija minha mão com
carinho — quando sentir que estou pronto para tentar, eu te digo, mas por
enquanto, quero me manter sóbrio por anos.
— E eu te acompanho — remexo nossas mãos — nunca fui fã de beber,
para mim não faz falta.

— Vamos?

— Sim.

Levi paga a conta, e o motorista nos encontra no carro, noto os sacos de


lanche que ele joga no lixo, e fico tranquila por saber que fez uma refeição. O
caminho para a boate é feito com expectativa no ar, eu quero desesperadamente,
somente ir para casa e poder aproveitar do meu homem.

Ele quer dançar e lembrar que está vivo, e nada nesse mundo impediria o
Levi de ser feliz essa noite, e fazer o que ele deseja.

Acho que finalmente consegui encontrar o homem que vai me amar e me


dar a família com a qual eu sonho há anos.
Olivia
Chegamos à boate, e o lugar parece ser ótimo, a julgar pela fila de pessoas
que tem, esperando para entrar, as vibrações da música chegam a nós no lado de
fora, e Levi segura a minha mão, me conduzindo com confiança para a entrada.

As pessoas na fila cochicham sobre furarmos a fila, não tenho certeza de


como são as boates na Itália, e se o Levi sabe que precisa esperar a vez dele para
entrar.

— Boa noite, senhor Vittileno — o segurança o cumprimenta, sem que o


Levi fale nada — seu camarote foi preparado mais cedo, pode seguir a atendente
que ela irá levá-los, o que precisar, é só pedir que providenciaremos.

— Obrigado — ele responde.

Seguimos a mulher, que nos leva as escadas e depois a uma sala VIP, com
um barman, uma parede de vidro mostrando a pista de dança, e o palco. Quando a
porta se fecha atrás de nós, a música é interrompida, e tudo fica em silêncio,
observo os sofás vermelhos e a pista de dança, com luzes piscando. Com um
aceno de cabeça, o barman começa a preparar drinks.

— Sem álcool — Levi diz — certeza de que não quer beber?


— Sim.

— Se quiser descer lá embaixo me avisa, por enquanto, vou te provar aqui.

— Levi — ralho, e o barman ri, ao perceber que estou vergonhada pela


presença dele. — Nessas horas que você deveria falar italiano — bato em seu
braço, e o sem vergonha só faz rir, antes de me pegar no colo e se sentar no sofá,
comigo entre suas pernas.

— O barman vai preparar nossas bebidas e depois sairá por aquela porta,
nos dando privacidade total.

— Como você conseguiu isso? — olho ao redor ainda fascinada com a


privacidade do lugar e o luxo que esse ambiente grita.

— O dono daqui é louco para se tornar um acionista na VITTILENO, ou o


Louis e ele se tornem sócios, e ele possa expandir as boates dele para a Itália, só
precisei ligar para ele e pedir a sala, nada de mais.

— Ele espera que você consiga um lugar para ele na empresa — arqueio a
sobrancelha.

— O Saulo sabe que é o Louis quem comanda a empresa, e eu sou só um


artista recluso. No mínimo, ele espera que eu fale do lugar para o Louis, e meu
irmão tenha interesse em vir aqui.

— Pessoas com poder são assustadoras — brinco.

— Você nunca viu como o Louis ou a Lira são bajulados.

— Sua irmã? Ela é importante na empresa?

— Lira Vittileno, é a diretora mais disputada do cenário de filmes


americanos. Ela fez sucesso com três series na Itália, e depois foi para os Estados
Unidos, trabalhar em um grande estúdio, desde então, tem ficado por lá dando
vida as criações dela.

— Ela é incrível!

— Qualquer pessoa que tenha um negócio é louco para conseguir ser um


patrocinador nas produções da Lira, e poder exibir a marca, é sucesso na certa.
Uma vez, a protagonista usou um dos meus modelos, e no dia seguinte não
tínhamos mais estoque da peça.

— Preciso conhecer sua irmã.

— E você vai, amanhã durante o almoço, agora ela está cuidando do Louis,
e eu estou sendo o irmão irresponsável que só vai gritar com ele por ser idiota.

— Você fez certo — beijo sua testa — não quero o Louis perto da Bianca
agora, ela precisa descansar, e poder se recuperar do coração partido.

— Vamos primeiro ajudar eles individualmente, e depois a gente os junta.

— Acho melhor não contarmos que estamos juntos por enquanto, eles
podem ter pensamentos de que quererem usar a gente contra o outro, seja para o
bem ou mal.

— Quando quiser que eu te assuma, é só me dizer, e vou gritar aos quatro


hemisférios que você é minha.

Levi gira o quadril, e me joga no sofá, ficando entre minhas pernas. Seu
membro duro na calça pressiona o meu centro com força, e eu vejo pequenas
estrelas, quando suas unhas arranham a pele desnuda de minhas costas, misturada
as mordidas em meu queixo. O quadril empurrando contra o meu, causando uma
fricção deliciosa em meu centro.

— Levi — suspiro o puxando para mim e moendo meu centro contra ele.
Os tremores se espalham por meu corpo cadenciadamente, panturrilhas,
coxas, ventre, braços, até desaguar em minha cabeça. A jogo para trás e deixo
Levi morder a minha pele do jeito que ele quiser, molhando onde passa a língua,
e o ardor delicioso. Prendo seus fios de cabelo com as mãos, e o puxo, precisando
que ele me beije.

— Perdeu a vergonha, amore mio?

— Foda-se essa merda — arqueio com um forte espasmo — eu quero sua


língua em minha boceta, Levi.

— Apressadinha — beija minha orelha — quer dar um show para o


barman?

O medo de ser pega fazendo sexo evapora quando os dedos dele se enfiam
em meu short, e o frio da ponta de seu dedo toca meu clitóris, me fazendo
esquecer do mundo.

— Geme meu nome Olivia — ele manda e eu obedeço, delirando nos giros
rápidos em minha carne, que me encharca com o estímulo. Luto contra meu
quadril para o manter quieto enquanto Levi continua me torturando com o
volume de sua calça, metendo na minha entrada coberta, e os dedos apertando
meu grelinho, como se fosse uma gelatina.

— Leeeeevi — arfo em seu ouvido, arranhando seu pescoço ao puxar para


mim, e engolir sua boca com a minha — eu te quero muito — confesso — fica
comigo para sempre? — peço no auge da minha crise.

— Por toda a eternidade — beija minha testa, e mete o dedo fundo em meu
interior, roubando o ar de meus pulmões quando faz isso, e como um gancho,
puxa para fora arranhando minha parede em um lugar perigoso, que me faz ejetar
líquidos loucamente, enquanto gemo quente.
As células entram em ebulição, e todos os meus músculos tensionam
quando sou jogada no orgasmo delicioso. O mundo fica silencioso, e quando
relaxo os músculos eu volto aos poucos para a realidade.

Levi chupa os dedos se lambuzando com meu sabor.

— Posso colocar seu creme no meu drink? — Pede e faz “ploc” ao tirar o
dedo da boca — melhor ingrediente que já provei.

— Seu tarado — sorrio largada nas almofadas, totalmente satisfeita.

— Eu? Você que gozou gritando meu nome, e nem tirei sua roupa — ele
cheira meu pescoço — vou te comer naquele vidro, sobre todas aquelas pessoas.

— Não — arregalo os olhos, o medo da exposição me deixando inquieta.

— Ninguém poderá nos ver do lado de fora — ele me puxa para seu colo
— e você vai enlouquecer com a sensação de ser vista.

— Você é um voyeur ou algo do tipo?

— Quase isso — morde meu queixo — gosto da sensação do proibido, de


fazer sexo onde as pessoas não consideram permitido, e depois, ver como elas
estão alheias enquanto eu fodo gostoso — levanta comigo em seu colo. — Quer
experimentar?

— Tem certeza de que ninguém vai ver a gente? — observo todas aquelas
pessoas do lado de fora, dançando e muitas com o rosto para cima.

— Absoluta — estala um beijo em meu pescoço — igual como percebi


quando o barman saiu, antes de enfiar o dedo no seu short.

— Ele... — fixo o lugar onde ele estava, e realmente não tem ninguém lá,
além dos drinks no balcão.
— Gostou de imaginar que ele estava vendo-me te enlouquecer — Levi me
coloca no chão e vira de frente para os vidros — vamos fazer aquelas pessoas
ouvirem seus gritos? — Ele levanta minha perna, a apoiando na balaustra que
fica na altura do meu joelho.

— Eu esqueci que ele existia — assumo em meio a um suspiro, Levi


desliza os dedos na parte interna de minha coxa, subindo o tecido do short até
alcançar a minha virilha.

— Você continua encharcada — morde meu lóbulo, e deito a cabeça em


seu ombro — tira a roupa para mim, Olivia?

Ele me vira de frente, e aponta para o Pole dance. Tenho um pouco de


vergonha, não sou boa dançaria. Encaro Levi pronta para dizer que não, e vejo o
fogo incendiando sua face, aquiesço, quero fazer isso, quanto mais serei capaz de
o enlouquecer com meu corpo?

— Sente-se — ordeno.

Caminho rebolando até o Pole dance, e Levi aperta um controle, que


permite que a música da boate preencha o ambiente. Para a minha sorte toca uma
batida sensual.

Agarro o Pole, ficando de frente para ele e me abaixo, dando uma visão
ampla de minha bunda a ele, e recebendo um tapa em resposta, retorno devagar,
mexendo o quadril aos poucos.

Inspiro fundo antes de segurar a lateral da roupa e a baixar devagar,


mantendo a calcinha no lugar. Remexo para a frente e para trás, e com receio, vou
me encostando no poste, até sentir o metal frio em minha intimidade pulsante.
Seguro a barra do cropped, e puxo para cima, liberando meus seios, não
usei sutiã. Arfo baixinho com a expectativa de como Levi vai me encarar quando
eu virar.

Giro ao redor da barra, a prendo com minhas pernas, e deixo que reparta
meus seios, ficando de frente para o homem, com o pau para fora das calças,
ereto como um tronco batendo em seu umbigo.

Não percebi quando ele ficou pelado, me delicio com a luxúria exalando
dele e batendo no meu corpo.

Ele fica em pé segurando o membro pela base, e vem até mim, com passos
lentos. Sem que ele precise falar, eu abro a boca e recebo sua grossura em meus
lábios. Levi é enorme, e não consigo cobrir nem metade dele, agarro firme o que
não consigo engolir, e coordeno os movimentos de minha cabeça com as mãos,
enquanto o meu homem abre a boca, e deixa gemidos deliciosos escaparem.

— Engole mais Olivia — ele pede — abre bem, e trava a respiração.

Faço como o Levi diz, e seu pau desliza em minha garganta, a ânsia vem
forte, me fazendo engasgar. Levi puxa para fora, limpando a baba no canto de
meus lábios antes de voltar a meter novamente, dessa vez ele desce mais, e juro
que vou vomitar, e, ao mesmo tempo, morrer de tesão com a delícia que é ter esse
homem entrando fundo na minha boca, e gemendo gostoso enquanto faz isso.

— Porra de garganta profunda, aguenta meu gozo amore? — ele pede


aquilo como se estivesse me oferecendo água.

Sou incapaz de falar com sua grossura em minha língua, a mantendo cativa
de seu quadril, e pisco os olhos, molhados pela ânsia, tanto quanto minha vagina,
melada de desejo.
— Ah, Olivia — desliza o polegar em meu rosto, e volta a enfiar seu
cumprimento na minha garganta.

Paro de respirar, sua pélvis bate no meu nariz, e não sei como infernos
consegui o ter todo na minha boca. A garganta completamente dominada, engulo
em seco, desesperada para respirar, e bato em sua coxa o pedindo para sair.

Levi fecha os olhos e puxa o pau despejando seu jato quente e salgado na
minha boca, engulo tudo antes de começar a arfar, querendo vomitar.

— Boa menina — alisa meu rosto e me puxa para cima, beijando as


lágrimas que desceram por minha face. — Engoliu tudinho, como a boa putinha
que você é.

— Somente sua — arfo com a garganta ardendo.

Nunca imaginei que fossem me chamar de puta e eu iria gostar. Do Levi eu


quero ser tudo, a mulher da vida dele, a puta que o enlouquece na cama, e aquela
que preenche seu coração e vai ter uma família ao seu lado.

— Quer um presente? — pergunta distribuindo beijinhos em minha face.

— Sim.

— Vou te deixar escolher aonde vou te chupar, contra aquele vidro ou nesse
sofá.

Não preciso analisar as opções, tomada pela luxúria eu sei onde quero ser
devorada. Aponto a janela com a cabeça e Levi me pega no colo como uma
pluma.

Ele me deixa escorada contra o vidro, e fica de joelhos, os olhos fixos nos
meus enquanto ele segura minha perna, a colocando em cima de seu ombro, e
puxa minha calcinha em direções opostas rasgando o tecido encharcado.
O rosto desce contra meu centro cheirando minha virilha e intimidade,
como se ele estivesse me comendo com o nariz.

A língua quente, sugando meus líquidos enquanto ele bebe com ferocidade
no olhar. Bato a cabeça no vidro e grito ao ser mordida em diferentes lugares, até
sua boca se aquietar na minha entrada e ele enfiar a língua.

Dura e macia, alcançando meu pontinho mais sensível, e fazendo as luzes


da balada parecerem estrelas em meio ao meu delírio de prazer. Puxo seus
cabelos, prendo seu rosto com minhas coxas, o forçando a ir mais fundo. Perco a
respiração por segundos incontáveis e inspiro novamente, tentando manter minha
mente focada em qualquer coisa que não seja no quanto eu quero me desmanchar
na boca do Levi.

Ele morde minha entrada, e esse é o meu fim, despejo líquidos em sua boca
aberta, que engole em grandes goles tudo que tenho, a oferecer, sugando até
mesmo a minha alma.

Levi se certifica de ter me limpado toda com suas sucções e volta para
cima, metendo o pau dele, deslizando fácil em meu interior.

Sem forças nas pernas, eu desabo contra o vidro.

Ele segura minhas coxas e faz com que circule sua cintura com elas. Sua
boca chega perto da minha, e meu cheiro invade meus sentidos em um beijo,
misturando o sabor de ambos, animalesco, enquanto sou fodida contra o vidro em
investidas fortes e cruéis, de tão prazerosas.

— Olha para trás, Olivia — faço como ele manda — todas essas pessoas lá
embaixo e elas não fazem ideia de como eu estou comendo a boceta mais quente
desse lugar! — Rosna contra minha cabeça, a respiração quente em meu rosto.
Já desisti de tentar respirar, e aceitei que vou viver em um limbo de
pequenas arfadas de ar para continuar viva.

Meu corpo incendiando com os prazeres despertos, me cortando de uma


ponta a outra, enquanto Levi fala safadezas em meu ouvido.

— Gosta de ser comida com força? Posso quase sentir seu útero na cabeça
do meu pau.

— S-sim — gemo quase chorando de tamanho prazer arrancado por cada


pedacinho de pele do meu ser.

— Eu vou esporrar gostoso em você, Olivia, quero te comer assim todos os


dias, pela eternidade. Porra — ele bate no vidro com força — aperta meu pau
com sua boceta!

Ordena e eu obedeço, isso causa uma reação enlouquecedora nele, em que


suas estocadas tornam-se mais intensas contra minha pele. Ficarei assada sem
conseguir fechar as pernas, tamanha a força do seu quadril batendo contra o meu.

Fecho os olhos e arfo, com a cabeça explodindo, sentindo mil fogos de


artifício saindo do meu corpo ao mesmo tempo.

Levi geme gostoso contra mim, e mete fundo mais uma vez antes de
esporrar no meu interior. Desabo completamente contra seu corpo, e ele cai no
chão, me deixando em cima do seu peito, arfantes, suados, e completamente
satisfeitos.

— Eu vou te comer de novo — ele fala entre lufadas.

— Não aguento — protesto, a vagina ardendo.

— Não hoje, mas pelo resto dos nossos dias — beija minha cabeça, e sorrio
contra o seu peito.
Suas promessas são tudo o que eu mais quis ouvir de caras errados.
Demorou, chorei e me machuquei, no caminho para encontrar o homem que me
aceita, e que nunca seria capaz de me magoar.
Olivia
— Por favor, Olivia! — Louis continua implorando enquanto eu finjo que
não o escuto.

— Não vai chegar perto da minha irmã enquanto não resolver essa
situação! — Bato a colher de madeira em cima da bancada — tem um maluco
querendo te matar, e você quer ver a Bianca? Nem pensar!

— Eu já disse que amanhã será o fim dele — Louis suspira — vou expor
seus crimes, e em seguida ele será preso.

— Não me importa — arrebito o nariz — quando Bianca quiser te


encontrar, ela o fará!

Não aguento mais o Louis enchendo meu saco declarando o amor dele pela
Bianca, eu entendo que seu coração foi machucado muitas vezes no passado, e
tudo que ele falou, o que me fez ter um pouco mais de empatia pelo italiano
arrogante.

Eu sei que tem um segurança seguindo a mim e a Bianca, nos mantendo


segura dos inimigos dele, e que o homem só falta morrer de saudade.
Não irei deixar as provas do amor dele me convencerem, o Louis não vai
chegar perto da Bianca, até que a situação com os inimigos dele seja resolvida.

Minha irmã já tem passado por uma barra difícil com a gravidez de risco,
devido à pressão alta, e tenho medo de que a qualquer segundo ela passe mal e
perca a bebê, ou algo de pior aconteça com ela.

Como ela me pediu, eu mantive a gravidez em segredo de todas as pessoas,


incluindo do Levi. Nossa relação ficou mais sólida desde que ele me pediu para
viver com ele, e demonstra o quanto gosta de mim em todos os dias que
seguiriam.

Meu coração aperta do tamanho de uma amora quando o Lorran encara o


Levi, e fala “pai”, com a boca cheia de carinho, e como o Levi responde sorrindo
e o beijando.

O homem quebrado, que conheci na secretaria da creche, juntou seus


pedaços e tem desabrochado lindamente, buscando pelo sol como um girassol.

— Olivia! — ele branda e pisco — já que você não quer me ajudar ainda
— frisa bem a palavra — quero sua opinião em outra coisa, vem comigo
rapidinho?

— Deixa eu terminar de fazer a janta do Lorran.

— O Levi cuida disso — pega minha mão e me arrasta para fora do


apartamento.

— Você parece mais leve — digo quando entramos no elevador — com


menos peso nos ombros, apesar de viver com um alvo na cabeça.

— Eu já tenho calculado tudo que acontecerá nos próximos dias — a


certeza em seus olhos azuis me toca — vou destruir meus inimigos e recuperar a
mulher que eu amo.
— Não sei quanto ao segundo, mas boa sorte — dou tapinhas em seu
ombro.

— E você vai me ajudar — saímos no andar de cima, e vamos para um


apartamento vazio — o que acha daqui?

— Legal — dou de ombros.

— Quero morar aqui com a Bianca e construir uma família com ela — noto
como a voz dele assume um tom mais sério — vou falar com seu pai, e fazer tudo
direito, mas você me dá a usa benção?

— Você acusou a Bianca, e partiu o coração dela — levanto o dedo na cara


dele — a deixou sem nada, e ainda destruiu as coisas que ela tinha, faz ideia do
quanto estamos vivendo no limite por sua causa? — aperto os punhos — e apesar
dessas merdas todas, eu sei que você é um ser humano capaz de errar e acertar —
estapeio seu braço com raiva — nunca mais machuque o coração da minha irmã,
ou eu juro que vou te matar!

A Bianca não quer ver o Louis nem pintado de ouro. Grávida, e com
pressão alta, precisando de remédios, a situação piora a cada dia pela dor que ela
sente, por não o ter por perto.

O Louis também sofre, e não faz questão de esconder. Dois corações


separados pela ruindade das pessoas, não merecem continuar sofrendo.

Vou ajudar o Louis a reconquistar Bianca, não por causa dele ou dela, mas
porque ambos estavam vivendo uma história de amor, antes de serem separados.
Assim como não é certo, Levi continuar vivendo no luto, e esquecendo das
pessoas ao redor porque a esposa morreu, o Louis e a Bianca não devem
continuar sofrendo devido a outra pessoa.
— Quando eu sentir que ela está pronta, a trarei até você, enquanto isso,
continue respeitando o tempo que ela precisa.

— Farei isso — Louis pressiona as mãos inquieto — deixa eu cuidar dela


sem ela saber? Posso aumentar seu salário para ajudar na situação financeira de
vocês.

— Faça isso. — Mordo a bochecha, quase deixando escapar que ele vai ter
uma filha, e permanece alheio a essa situação.

Dou meia volta antes de fazer qualquer besteira, e deixo o apartamento que
ele comprou para viver com minha irmã. É isso que homens apaixonados fazem,
planejam um futuro, falam que amam, e querem viver com a pessoa a vida toda,
como o Levi tem feito comigo.

Bianca poderá em breve voltar aos braços do homem que ela ama,
enquanto eu continuo descobrindo meus sentimentos em relação ao Levi, que
crescem a cada dia, quase não cabendo no meu peito.

*****

Levi
— Você não se meta — Olivia aponta o dedo na minha cara.

— Eu deveria dizer isso a você! — Rebato — fica marcando encontros


entre a Bianca e o Louis, depois ela mata meu irmão e eu faço o quê?

— Chora — arrebita o nariz.

— Vocês vão brigar muito? — Lira coloca a cabeça na sala e sorri amarelo.

— Ah, oi — Olivia responde ficando mais calma.

— Essa é a minha irmã. Lira — apresento as duas.


Três meses atrás, quando Louis sofreu o atentado, e Lira veio correndo para
o Brasil, ela precisou voltar quase no mesmo dia em que soube que o Louis
estava de alta.

Após finalizar as filmagens, ela decidiu vir ficar um tempo conosco, até
precisar voltar para a organização do novo seriado que o estúdio quer que ela
dirija. Pelo jeito que minha irmã chegou, e na tristeza em seus olhos, suspeito que
ela esteja fugindo do cara que tem enchido seu saco.

Se eu pego aquele desgraçado, estouro os miolos dele.

— Prazer te conhecer — Olivia estende a mão, e Lira a puxa para um


abraço.

— É você o raio de sol do meu irmão? — Lira pergunta com um sorriso de


deboche no rosto.

— Um deles, o outro é o Lorran.

— Eu? — ao ouvir o nome, o pequeno aparece na sala segurando um


pirulito enquanto come o outro.

— Lorran! — Lira exclama — eu disse para não deixar seu pai e a Olivia te
verem comendo doce antes do jantar.

— Você fez isso? — ralho com ela que se esconde atrás da Olivia, mas nem
imagina que o verdadeiro perigo é a mulher, com fogo nos olhos, e não eu.

— Só uma coisinha. — A voz dela fica dez oitavos mais baixa.

— Lorran — Olivia chama, e ele vem olhando para baixo e escondendo o


pirulito atrás das costas — o que eu te disse sobre doces depois das 17 horas?
— Que num polde — fala baixinho, fazendo bico e mexendo os pés. Tenho
quase vontade de rir, se não fosse pela Olivia com as mãos na cintura o encarando
seria.

Porra, essa mulher fica um tesão quando séria, poderosa, dando ordens e
reclamando. Adoro quando ela me bate durante o sexo, e assume o controle em
nossos jogos de dominação.

Estremeço só de lembrar que ontem ela me bateu com uma régua enquanto
me punia por ser levado, e não a deixado gozar na minha língua.

Eu estou viciado, ensandecido, e louco pela Olivia, de uma forma que


nunca me senti antes. Ela entrou nas minhas veias e seria o inferno viver sem ela
ao meu lado, mandando, risonha, gostosa, carinhosa, um misto de emoções que a
tornam a mulher mais preciosa desse mundo.

Olivia se tornou meu raio de sol, e os poucos, tem ganhado mais e mais
espaço no meu coração. Às vezes penso que estou amando, mas tenho medo de
confundir o sentimento, e acabar magoando a mim, ou a ela.

Ir com calma é a melhor opção para nós dois. Não podemos correr o risco
de nos magoarmos novamente.

— Lira — Olivia encara minha irmã com ameaça, e até eu me encolho —


nessa casa não damos doces ao Lorran mais de uma vez por dia, ou antes, das
refeições. Ele é uma criança em fase de crescimento, e consumir essa quantidade
de açúcar não fará bem a ele, entendido?

— Sim! — Lira fica estática como uma vara, e depois corre para trás de
mim. Seguro sua cintura e a coloco de frente para a Olivia.

— Aguenta a bronca irmãzinha.


— Você gosta mesmo dessa mulher? — ela me pergunta com medo — ela
me apavora.

— Gosto — digo encarando a Olivia que amansa ao me ouvir — e quero


que você atenda ao pedido dela sobre doces ao Lorran.

— Certo — acena rápido demais e muitas vezes.

— Lorran vá guardar o pirulito, e jogue o que você está comendo fora, não
pode quebrar as regras.

— Pai? — ele me chama fazendo biquinho, o sem vergonha aprendeu a me


chamar de pai somente quando a Olivia briga com ele, querendo escapar e me
usando.

— Faça o que a Olivia pediu.

Ele sai marchando com os braços cruzados e reclamando em um idioma


que não consigo entender.

— Desde quando ele te chama assim? — Lira pergunta.

— Já tem um tempo, por enquanto o “Levi” persiste na boca dele —


suspiro — mas com paciência sei que ele vai se acostumar a me chamar de pai.

— Isso é maravilhoso Levi — ela me abraça pulando meu colo.

Giro a Lira no ar como costumava fazer quando éramos mais novos, e ela
gargalha feliz.

Uma batida alta na porta, e o Louis entra com a Bianca desmaiada em seus
braços. Solto a Lira, e Olivia corre para ver o que aconteceu com a irmã.

A comoção é grande, a correria maior ainda, quando a Bianca é levada ao


hospital, vou junto, e Lira fica em casa cuidando do Lorran.
— Eu não devia ter concordado — ela repete inúmeras vezes enquanto o
médico atende a Bianca.

— Eu não sei o que aconteceu — Louis diz caminhando em círculos — ela


estava bem, estamos conversando, ela ficou exaltada e depois disso, desmaiou.

Só preciso analisar a Olivia uma vez para saber que ela tem ciência do que
aconteceu com a irmã. Nossos olhares se encontram e ela balança a cabeça em
negativa, me pedindo para não falar nada.

Vejo o Louis e a preocupação dele, e entendo, é um segredo da Bianca, que


ela não quer contar ao meu irmão. Algo forte o suficiente para fazer a Olivia
manter a promessa de não falar, e ainda assim, fazer ela ter ajudado o Louis e a
Bianca a se encontrarem.

O médico se aproxima, e antes que a Olivia chegue nele o homem fala:

— A Bianca não pode sofrer graves estresses, ou isso vai prejudicar o bebê.

— Ela... — Louis se engasga — está grávida?

Meu irmão fica de joelhos, segurando o peito enquanto tenta respirar.


Merda! Não fazia ideia de que a Bianca escondia uma gravidez, corro até Louis e
o apoio, ajudando que ele sente enquanto processa o que acabou de descobrir.

— Você sabia? — ele pergunta a Olivia.

— Não era meu dever contar — ela fala pressionando as unhas, e vejo o
quanto ela tem ficado aflita em esconder a gravidez da irmã.

— Não? — Louis se prepara para gritar e o empurro na cadeira.

— Não ouse levantar a voz para a Olivia — o ameaço — você que partiu o
coração da Bianca, e se a Olivia escolheu não dizer nada, não pode descontar a
raiva que sente de si mesmo nela.
Louis tem os olhos azuis em chamas, ele bate no meu braço e vai para o

quarto da Bianca. Olivia tenta o seguir, e a seguro. Posso ter controlado o


Louis, mas eu também tenho minhas perguntas.

— Vamos conversar.

— Vou falar com o pai do bebê — o médico diz — pela fúria dele dever ser
o que entrou. Se ele estressar a paciente, eu mando os seguranças o expulsarem.

— Eu não podia contar — ela diz.

— Percebi — a puxo para meus braços — é por isso que você ficava
ouvindo as lamentações do Louis, sem querer arrancar a cabeça dele por magoar
sua irmã?

— Basicamente, desde o início, eu sabia que eles se amavam, e não era


justo ficarem separados devido a outra pessoa. Queria ter certeza de que a Bianca
estava segura antes de fazer alguma coisa para eles se resolverem.

— Não consigo imaginar o quanto foi difícil para você cuidar da Bianca e
não poder falar nada — beijo a cabeça dela, ficando mais calmo — não acredito
que o Louis vai ser pai.

— Ele será um pai incrível.

— Teve muito tempo de treino com o Lorran — encaro o chão.

— Ei — ela segura meu queixo, encontrando nossos olhares — você tem


sido um pai fantástico nesses últimos meses, e Lorran, eu, e todos, percebemos
isso. Sua irmã mal chegou dos Estados Unidos e já percebeu o quanto vocês
evoluíram como uma família.

— Obrigado por ter me apoiado em todo o caminho — beijo seu ombro.


— Eu quero tudo que pudermos ter juntos, Levi, um dia você vai poder
saber como é trocar uma frauda, mas por enquanto, se contente em fazer o Lorran
não comer doces escondidos.

— A Lira deve estar estragando-o agora.

— Eu a mato.

Rirmos juntos.

Olivia tem razão, perdi anos preciosos com o Lorran. Me lamentar por
causa disso não vai trazer de volta o tempo perdido, somente mais tristeza para
nossas vidas, e nunca mais quero ficar envolto de escuridão.

Não agora que eu tenho os meus sóis.


Olivia
Não consigo acreditar que a Bianca já completou a 35ª semana de gravidez,
e as coisas estão bem.

O Lorran, e o Levi, brigam menos, ambos continuam apegados a mim, e


Levi mantém a pose de que se incomoda com o quanto o Lorran me ama,
enquanto eu finjo que me irrito com as besteiras que ele, supostamente, faz para
me irritar.

Minha irmã está a alguns passos de perdoar o Louis, e eu sei que em breve
ele fará a jogada final, que derreterá o coração dela, e os dois poderão voltar a ser
o casal apaixonado que eram, antes de tudo desandar, e eu e o Levi poderemos
assumir que estamos juntos.

Eu não tenho motivos para me sentir mal, tenho ao meu lado um homem
que eu amo, minha irmã tem sido cuidada, e recebido tudo que precisa na
gravidez. Meu pai deixou de ser babaca com a Bianca e comigo, ele se limita a
uma convivência normal, Lorran é meu pequeno fofinho, que eu amo ficar perto,
cada dia mais o quero grudado comigo.

Não existem razões para meu coração ficar me incomodando com uma
dorzinha sempre que vejo Levi mostrando fotos da Blanca ao Lorran, e falando
sobre a mãe dele. Ela é a mãe do Lorran, não deveria me incomodar como a
palavra “mamãe” sai com facilidade de seus lábios, e não deveria me deixar
triste, como o Levi tem se esforçado para fazer Lorran reconhecer somente a
Blanca como mãe dele.

Posso ser a namorada do Levi, e a babá do Lorran, mas é só isso. No


máximo, me tornarei a madrasta dele, para quando crescer me odiar por estar com
o pai, substituindo o lugar da Blanca.

Eu engano a mim mesma, achando que um dia a poderei “substituir”, não


existe esse cargo para mim.

Sou a mulher que o Levi gosta e quer viver junto. E a que vai cuidar do
Lorran enquanto ele cresce, se um dia eu me casar com Levi, seremos uma
família, e Lorran terá irmãos.

Ele poderá considerar meus filhos como irmãos e querer bem a eles? Não
pensará que são crianças tomando o seu lugar, e vivendo o que o pai dele não
viveu com ele, isso nunca acontecerá, certo?

Pensamentos assim tem nublado minha mente nos últimos tempos, e


tornado meu coração pesado. Ontem recebi uma ligação informando que minha
situação na fila de adoção continua a mesma, e outra perguntando se vou querer
fazer outro processo de inseminação artificial.

Eu ainda quero ter filhos, por mim já teria engravidado do Levi, mas exceto
pela vez que ele esqueceu a camisinha na balada, não transamos mais sem o
preservativo.

Seria um indício de que ele talvez não queira filhos comigo, ou não esteja
pronto para ser pai, enquanto constrói a relação com o Lorran?
— Olivia! — Viro o rosto e o vejo deitado do meu lado, com o Lorran entre
nós, percebo estar encarando a página do livro enquanto me perdia em
pensamentos.

— Sim?

— Não ouviu o que eu falei?

— Pode repetir?

— O aniversário do Lorran é próxima semana, quero fazer uma festa para


ele.

Me deito nos travesseiros, e aliso a cabeleira loura do Lorran, dormindo


com o rosto no peito do pai. Dias assim tem se tornado rotineiro entre nós,
momentos vividos somente por uma família, e eu estou aqui, pensando o quanto
quero que esses dois sejam meus.

Meu marido.

Meu filho.

— Vamos levar ele ao zoológico, e depois fazemos os parabéns em casa,


com tema de animais, ele vai gostar. A Bianca não poderá participar, pela
condição dela, acha que o Louis irá?

— Com certeza, ele não perderia o aniversário do Lorran. E pelo que ele
me disse, vai trazer a Bianca para ver como ficou o quarto do bebê.

— Eu sei, podemos pedir para ele levar ela no dia do aniversário do Lorran,
e depois eles vinham cantar os parabéns.

— Gostei dessa ideia, vou chamar minha irmã.


— Certo — deixo o livro na mesinha e apago o abajur, me enrolando na
coberta.

— O que tem te incomodado? — ele pergunta baixinho — posso ouvir


daqui, as engrenagens na sua cabeça, rondando.

— Você sabe qual é o meu maior desejo? — sussurro.

— Ser mãe.

— E você deseja... — travo com medo de perguntar — ser o pai dos meus
filhos?

Levi fica em silêncio me encarando com a testa franzida, e me arrependo


de ter perguntado isso. Não é porque ele quer ficar comigo, que possa querer ter
outros filhos.

Fungo com os olhos ardendo, e viro de costas, não conseguindo sustentar


seu olhar afiado.

— Esquece — digo.

Ouço o farfalhar dos lençóis, e a coberta cobrindo minha cabeça é puxada


para baixo, me fazendo encarar o par de olhos azuis, cheios de sentimentos.
Fecho as pálpebras, não querendo ter mais essa conversa com ele, eu não gosto
de me sentir vulnerável e deixar que percebam que estou desestabilizada, Levi
consegue entrar na minha mente e alcançar onde mais dói.

— Vamos conversar lá fora — ele pede, e nego com a cabeça, Levi suspira
e puxa as cobertas novamente, ele segura minhas pernas, e minha cabeça, me
levando em seu colo para o lado de fora.

— Para, esquece o que eu disse, foi besteira — a voz embarga se


transformando em um suspiro baixinho.
— Não, vamos falar sobre o que tem te incomodado, e resolver a situação,
não gosto de ver você triste — beija meus cabelos, e sinto quando ele se senta no
sofá comigo em seus braços.

Levi me aperta forte, quase me deixando sem ar antes de me soltar.

— Eu só... — é difícil conseguir me abrir.

— Você quer ser mãe, e agora que estamos em um relacionamento, pensou


que poderia acontecer a qualquer instante, é isso?

Não tem emoção em sua voz, somente a certeza de que compreendeu a


situação. Eu estava certa em querer ficar calada, não deveria ter aberto a boca e o
deixado perceber o que tem me incomodado.

— Conversa comigo Olivia, ou não conseguiremos resolver o problema.

— Eu quero ser mãe — aperto meu punho escondendo o rosto em seu peito
— e posso ter confundido meu trabalho como babá.

— Não acho que seja errado você começar a pensar no Lorran de outra
forma — Levi segura meu queixo e puxa para cima, fecho os olhos firme,
acovardada para o encarar.

Deve pensar que quero roubar o lugar da verdadeira mãe do Lorran.

— Não posso fazer isso — tento sair de seu colo e sou presa mais forte.

— Pode, sim, o Lorran te admira, gosta de ficar na sua companhia, e depois


que começamos a namorar, ele tem se enfiado entre a gente como se fossemos
uma família. Eu percebo essas coisas, Olivia.

— Mas? — me preparo para o que virá.


— Eu quero que antes dele te ver como mãe, ele sabia que a Blanca foi a
pessoa que o trouxe ao mundo, e tenha na mente dele que ele pode te amar ou a
querer como mãe. Mas que nunca esqueça quem é a mãe biológica dele, a Blanca
não merece ser esquecida.

— Você já estava pensando sobre isso?

— Claro — sua mão desliza em minha coxa — bem antes de estarmos


juntos, eu via como o Lorran se apegou a você. Não tenho dúvidas de que se eu
pedisse para ele escolher entre mim e você, ele correria para seu colo sem pensar
duas vezes. É você a figura materna que o Lorran tem, não a Blanca, e isso me
preocupa, porque ela teria sido uma mãe incrível, e eu não quero que ele esqueça
dela.

— Seja claro quanto ao que você quer me dizer — peço, sentindo meu
coração ganhando esperanças que só poderão me machucar no futuro.

— Deixa o Lorran decidir se quer te chamar de mãe, quando ele fizer isso,
eu vou aceitar com um sorriso no rosto. — Ele hesita, e me preparo para as
palavras que podem partir meu coração — só não o deixe esquecer quem deu à
luz a ele. Lorran pode ter duas mães, e sei que Blanca iria querer alguém amando
e cuidando do filho dela como você faz.

Soluço, não conseguindo mais guardar para mim mesma, o turbilhão de


sentimentos que tem povoado minha alma desesperada para ser a mãe daquele
menininho.

— Não chora meu amor — Levi segura meu rosto, beijando minhas
lágrimas, e o encaro. As feições relaxadas e sem peso, certo da decisão que
tomou. — Você pode pedir para ele te chamar de “mãe”, mas deixa só ele
conhecer mais um pouquinho da Blanca?

— Sim — respondo em meio aos soluços.


Eu me enchi de medo achando que ele nunca aceitaria que eu me tornasse a
mãe do Lorran, e ao contrário do que pensei, ele já estava preparando o filho para
saber que ele teve uma mãe que o amou, e que se não tivesse morrido, teria sido
incrível, mas que agora ele tem a mim, e eu posso ser a mãe daquele garotinho
que eu tanto amo.

Meu peito explode de mil formas diferentes enquanto eu choro aliviada,


como nunca me senti na vida. Eu fui aceita, por ele e pelo Lorran, quando ele se
sentir pronto, me chamara de mãe. Não tem motivo para ter medo, não existem
razões para hesitar. Levi é o meu agora, e me entende como ninguém nunca foi
capaz.

Eu o amo.

— Você já é incrível com o Lorran, e sei que será uma mãe ainda melhor
— beija meu nariz e meus lábios, engolindo meu choro — só pega leve no doce
ou ele vai te odiar.

Dou risada em meio a minha crise.

— V-você..., a-acha?

— Com certeza, já viu o bico que ele faz quando você tira um doce dele?

— Ele vai superar isso — digo rindo, mais do que chorando, e Levi me
beija com intensidade, a língua preenchendo minha boca e dançando com a
minha. Sua mão desce por minha coxa, subindo e descendo, em um carinho
gostoso, finalizo o beijo com um selinho e descanso a cabeça em seu ombro.

— Desculpe por agir assim — peço depois de um tempo em silêncio.

— Desde que nos conhecemos eu sei que você quer ser mãe — ele alisa
meus cabelos — fiquei com medo de que estivesse ressentida comigo por não
tentar te engravidar ainda.
— Confesso que pensei a respeito.

— Me dá mais um tempinho? — pede, ouço o medo em sua voz — ainda


estou me tratando no psicólogo, não superei completamente a depressão, e luto
contra os dias sombrios, me ancorando em você e no Lorran, minha relação com
ele agora que começou a andar para frente, e eu... tenho medo de não ser um bom
pai.

— Você é um pai maravilhoso, e o Lorran sabe disso — seguro seu rosto e


descanso a testa na dele — quando estiver pronto, teremos o nosso bebê.

— Não consigo acreditar que você me quer como pai dos seus filhos —
Levi me enche de beijos fazendo cócegas em minha barriga.

— Escolhi bem, não foi? — brinco, lembrando da nossa conversa na praça


em frente ao museu.

— Sim, a melhor opção do cardápio — ele morde meu pescoço, e me


encolho em seus braços.

— Para — dou um gritinho fino, tentando escapar das mordidas e das


cócegas. Caio no chão, e a porta da frente é aberta. Levi paralisa e espia por cima
do sofá, Louis passa apressado, correndo para o quarto e não percebe nossa
presença na sala.

— Ainda não contamos para eles, né? — pergunta baixinho.

— Deixa eles se resolverem primeiro — beijo sua bochecha — vamos para


o quarto antes que ele volte.

— Certo.

Eu poderia ter falado antes para o Levi como me sentia, e tirado o peso das
costas que tem me enchido de preocupações.
Não tem mais hesitação em meu coração, Levi é o homem que será meu
marido e pai dos meus filhos, e quando Lorran estiver pronto, serei quem ele
chamará de mãe.
Levi
Lorran fica de boca aberta quando vê os macacos no zoológico, brincando
de pular de um galho para o outro, e interagindo entre eles.

Eu tenho feito tudo que pude para conseguir sorrir hoje e aproveitar o dia
com o meu filho e a Olivia.

As lembranças do dia do acidente estão martelando forte em minha mente,


e hoje que deveria ser feliz, comemorando o dia em que o meu garoto nasceu. Eu
só consigo pensar que em poucos dias será a data da morte da Blanca, e que estou
a milhões de quilômetros longe dela.

Sempre a visitei em seu ano de morte, e pensar em não o fazer dessa vez,
abre um buraco enorme em meu peito.

— Vamos ver as girafas — Olivia chama.

Reunimos a família hoje, Olivia, meu pai. Lira, e o Louis, que disse que
poderia ficar um pouco, antes de ir buscar a Bianca para ficarem juntos e
descerem para a festa de aniversário do Lorran.
Ele já mostrou o apartamento a ela, e conseguiu permissão do médico para
ela vir para a festa, passará só uma hora, e depois voltará ao hospital.

Meu irmão está feliz com a mulher que ama, e vão se casar após o
nascimento do bebê.

Eu tenho meu filho em meus braços, que finalmente me chama de pai mais
do que de Levi, pulando feliz ao ver os animais no zoológico.

A Lira parou de chorar pelo vacilão que a fez sofrer, e voltou a sorrir, e tem
sido uma ótima amiga para a Olivia.

Meu pai se aposentou, e tem vivido feliz, passando todas as tardes para
brincar com o Lorran e babar a Bianca, esperando a netinha dele nascer.

Porque eu sou o único que sente retroceder.

Há uns dias, prometi a Olivia que seria o pai dos filhos dela, e que o Lorran
poderá a chamar de mãe. A única pessoa que ele deveria chamar assim, morreu, e
em breve fará 3 anos da partida dela, ele nunca saberá o que é ser segurado pelos
braços calorosos da Blanca, ver o sorriso dela, que trazia vida ao mundo, sentir o
cheiro doce de sua pele.

Lorran nunca foi segurado pela mãe, e agora eu penso em colocar outra no
lugar dela? Como pude me deixar viver nessa mentira, e arrastar todas essas
pessoas comigo.

Não é certo colocar a Olivia no meio da minha escuridão, ela é um raio de


luz que será consumida por mim, o Lorran não merece um pai de merda como eu,
que em vez de aproveitar seu aniversário, só consigo pensar que em poucos dias,
sentirei novamente a dor de quando falaram que a Blanca faleceu.

— Vem com o nonno Lorran — ele se joga nos braços do meu pai que o
leva para perto das girafas.
— Quer conversar? — Olivia pergunta baixinho, nos separando do grupo.

— Não tem nada acontecendo — evito a encarar, sei que vou achar seu
olhar cheio de amor por um homem que não merece.

— O dia, de hoje, é difícil para você — não é uma pergunta, ela passa os
braços ao redor do meu pescoço, e tenho vontade de a afastar — tudo bem sentir
a falta dela e querer que ela estivesse aqui.

— Se a Blanca não tivesse morrido, eu e você não existiríamos, como pode


me dizer isso?

Eu sei que a feri com minhas palavras, e me arrependo no segundo em que


as digo. Olivia fica tensa e imóvel por longos minutos, antes de me soltar e fazer
com que eu a encare.

— Não volte para o passado, Levi — ela pede com a voz embargada —
você precisa continuar vivendo no presente, comigo e com o Lorran, somos sua
família agora, lembra?

Não posso a culpar por pensar assim, foi, eu que dei essas esperanças, e
agora queria poder retirar todas elas, e fazer com que a Olivia nunca tivesse se
apaixonado por mim.

Para ela não ter de sofrer com os dias sombrios que povoam minha mente e
escurecem meu coração, não deixando espaço para ela ficar nele.

— Não quero te magoar Olivia — a solto — vamos continuar a


comemoração do Lorran, prometo não estragar nada, só não me força, certo?

— Oh, querido, eu nunca faria isso — segura minha mão e a beija — me


chame para conversar se sentir que precisa.

— Certo.
O que eu preciso é beber e esquecer que a merda desse mundo existe, e que
a Blanca se transformou em cinzas no jazido de sua família na Itália.

Eu nunca mais a verei, e passarei o dia da sua morte longe dela, é esse o
tipo de ser humano desprezível que me tornei, alguém que abandona quem ele
ama, e coloca outra pessoa no lugar.

— Levi, vamos conversar — Louis me puxa sem deixar que eu responda.

— O que você quer? — sou ríspido.

Ele não me responde e continua me puxando entre as pessoas, até estarmos


em um lugar isolado, entre as plantas.

— Não faz isso cara. — Ele tem a expressão de tristeza e preocupação.

— O quê?

— Não joga fora tudo o que você conquistou nesse último ano. Eu sei o
quanto você fica deprimido e irritado nas semanas que antecedem a data do
aniversário da morte da Blanca, mas não faz isso com você e com a Olivia.

— Não temos nada — desvio o olhar.

— Mas querem ter — Louis cutuca meu peito — você voltou a viver, e não
é errado, pode sorrir e comemorar o aniversário do seu filho com a mulher que
você gosta. A Blanca nunca te julgaria por isso, não se torture.

— O Louis tem razão — A voz da Lira surge por trás do meu irmão — eu e
a Blanca éramos amigas, e eu também perdi alguém que amava naquele dia —
Lira passo os braços ao redor da minha cintura — ela te amou por cada segundo
em que respirou. E eu tenho certeza, de que se ela te visse agora, puxaria o seu
cabelo e mandaria você deixar de ser idiota, por estar perdendo o aniversário do
Lorran.
— Não fale por ela — peço com a garganta travada.

— Se eu não posso dizer que ela odiaria te ver desse jeito, você não pode
falar em ficar triste por não a ter aqui, ou pensar idiotices do tipo, que não
poderia ficar com a Olivia, ou comemorar o aniversário do Lorran sem culpa.

— Você não está sozinho, irmão — Louis segura meu ombro — se quiser,
podemos ficar conversando a noite, depois da festa.

— Você vai ficar com a Bianca — encolho sentindo os olhos arderem.

— Eu posso ficar com você — Lira sobe à cabeça encontrando meu olhar
— vamos fazer uma festa do pijama, e mandar a tristeza embora.

— Não somos mais crianças!

— Sempre vou ser infantil perto de vocês dois — ela se estica e beija
minha bochecha. — Seja sincero sobre seus sentimentos com a Olivia, ela vai
entender, e evitará discussão futura entre vocês por isso.

— Eu não mereço a Olivia.

— Seja capaz — Louis me encara — de fazer aquela mulher feliz, e você


vai ser merecedor.

— Papai! — Lorran chama alto, e o vejo no início da trilha, caminhando,


puxando a Olivia pela mão — paaaaaaaai.

— Vá ficar com o seu filho — Lira me solta.

— É o primeiro aniversário de vocês juntos, faça valer a pena Levi. —


Louis bate no meu ombro, me empurrando para a frente.

Aperto os punhos, evitando a tremedeira, e caminho para o Lorran e a


Olivia. Ela tem uma expressão preocupada, e limpo os olhos, na esperança que
não tenha percebido o meu choro.

Lorran se solta da mão dela e corre para mim, o pego no colo, e ele sorri,
segurando meu rosto com as mãos gordinhas.

— Você tem de ver os tilgles papai — ele encosta a testa na minha, falando
concentrado.

— Não acredito que tem tigres aqui — forço a voz a parecer espantada.

— Um montão — abre os braços — vamos?

— Bora.

Caminho com o Lorran no braço, focando na felicidade do meu filho, e a


usando para abafar os gritos em minha cabeça que insistem em dizer que é errado
eu estar aqui com ele e me divertindo.

Por que é errado querer viver?

Aperto os punhos, e encaro a Olivia, ela respeita meu silêncio, embora seu
rosto grite mil perguntas. Hoje eu fui um completo idiota com ela e com meu
filho, jogado em dores do passado que perturbam a minha mente e me fazem
esquecer do que realmente é importante, o presente.

Ajudou poder conversar com meus irmãos, e pelo resto do dia no zoológico
eu foco em manter Lorran feliz, conversando sobre os animais, e em fazer a
Olivia não se sentir deixada de lado. A ruga em sua testa não desaparece quando
chegamos, em casa, mas ela relaxa quando sorrio.

Estou vendo escuridão em todos os cantos das paredes, e lutando para me


manter firme, buscando apoio no sorriso da mulher que eu quero comigo e no
meu filho, que precisa de um pai que seja capaz de o amar e comemorar seus
aniversários ao seu lado.

— Bianca! — Olivia comemora quando a irmã passa pela porta, a barriga


enorme e pesada.

O que se passa pela cabeça dela ao ver a irmã mais nova gravida e de
casamento marcado, enquanto eu não estou pronto para construir a família que
ela precisa.

Olho o Lorran, que comemora quando a “zia bibi” dele chega.

— Você tá enolme — ele olha abismado para a barriga dela, e dou risada
pela primeira vez no dia.

— Sua priminha não para de chutar — Bianca se senta, e o Lorran fica ao


lado dela, com a cabeça em seu colo.

Todos prestam atenção na interação dele com ela.

Meus olhos são atraídos pela Olivia no canto, perto do sofá, olhando a irmã
com um desejo enorme de ser ela a pessoa grávida com quem o Lorran conversa,
querendo que o bebê nasça para brincar com ele.

Eu vou atrasar a vida dela se continuarmos juntos por mais tempo, a


impedindo de achar um cara decente que possa dar a família que ela precisa.

Pode ser a escuridão falando mais alto hoje, mas nesse segundo, eu
decido; ... Não posso continuar com a Olivia e a fazendo mal, ela merece alguém
completo, e não um despedaçado como eu.

— Vamos cantar os parabéns! — Meu pai entra na sala com o bolo e a vela
acesa, Lorran fica em pé, e todos iniciamos a cantiga.
— De quem será o primeiro pedaço? — Lira pergunta entregando a fatia no
prato para ele.

Lorran desce do sofá e corre na minha direção, me abaixo quando ele me


entrega o prato com o bolo e gargalha.

— Para o papai.

A garganta trava e os olhos ardem, como ele consegue amar alguém como
eu? Seguro o prato com as mãos tremendo, e abraço o corpinho pequeno do meu
filho, inspirando seu cheiro e buscando forças para continuar em frente, e poder
voltar a ser feliz como nos últimos dias.

Não quero perder a felicidade que conquistei, mas se as coisas não


mudarem, só terei um destino a seguir.
Olivia
Cecilia Eduarda, o nome é uma homenagem à mãe do Louis, Cecilia, e a
minha mãe, Eduarda.

Minha sobrinha nasceu dois dias depois do aniversário do Lorran, e chegou


forte e saudável ao mundo, gritando com toda a força, sempre que quer se
alimentar, ou quando sente falta do colo do pai.

Nino a pequena Cecilia em meus braços.

O quarto dela, repleto de bichinhos desenhados nas paredes, que o Lorran


adora ficar olhando e pegando neles. Todos os dias ele pede para fazer aquilo no
quarto dele, e se o Levi não estivesse passando uma fase difícil devido à data de
morte da Blanca, que chega em 5 dias, não tenho dúvidas que ele já teria pintado
o quarto do filho, como fez com o da sobrinha.

Ele ainda se sentia bem quando fez as pinturas na parede, e mentiu para o
Louis, falando que eu o tinha desafiado dizendo que ele não conseguiria.

Para manter a carapuça, eu e o Lorran íamos ficar com ele, para o


“atrapalhar” enquanto desenhava. Quando ele terminou de desenhar o elefante,
foi a última tarde que tivemos em paz, os dias sombrios chegaram, e não
conseguimos fazer passar.

Parte meu coração ver como ele perdeu o brilho e a cor que ganhou nos
últimos dias.

É difícil fazer ele sair da cama e ir para a terapia, Louis que tem se
preocupado com a noiva e a filha, não consegue cuidar do irmão direito, e tem
atingido outro nível de cansaço.

A Lira precisou voltar aos Estados Unidos, para a estreia e promoções da


série de tevê que ela produziu, e ficou de retornar antes do casamento do irmão.

Resta somente a mim, Lorran, e ao Enrico, pai dele, para cuidarmos do


Levi, e o fazer ao menos se alimentar. Quando ele quis se ajudar e sair do fundo
do poço, Levi conseguiu sozinho, mas agora ele se entregou a dor por achar que
merece sofrer pela Blanca estar morta e ele vivo.

É errado e injusto, ele parou de viver e ficar com as pessoas que ele se
importa, para retornar ao passado.

Fico louca querendo fazer algo para o ajudar, e não consigo pensar em
nada.

Ele me expulsou, eu bato com uma marreta em suas paredes e não consigo
causar rachaduras. Se ele me amasse, eu deveria ser suficiente, capaz de colocar
sorrisos em seu rosto machucado, Lorran é o único que quando fala, Levi escuta,
ele ama o filho e quando amamos, fazemos de tudo por aquela pessoa.

— Não chora Livinha — Bianca pede.

Encaro minha irmã deitada na cama, e noto meu rosto molhado.


— Só estou emocionada demais, você agora é mãe Bianca — tento sorrir,
escondendo a dor em meu peito.

Não é certo eu achar injusto minha irmã ter se tornado mãe antes de mim.
Bianca nunca quis isso, tinha medo de ser uma mãe ruim, e agora aqui está ela,
conquistando tudo o que eu sempre quis e abdiquei para cuidar dela.

Não tive infância, vivia ocupada cuidando da casa e da Bianca, brigando


com meu pai, não pude viver minha adolescência, sempre preocupada com o
bullying que a Bianca sofria. Minha vida adulta passa diante dos meus olhos
enquanto a dela desabrocha em um mar de realizações.

É desrespeitoso eu me sentir derrotada, quando nunca competimos por


nada. Bianca encontrou um homem que a ama, e que destruiu seus inimigos para
eles ficarem juntos, alguém que ficou feliz em ter uma filha com ela, estão de
casamento marcado e uma vida cheia de alegria e amor para o futuro deles.

Fui eu que escolhi abdicar de tudo por ela, deveria me sentir feliz e
realizada por conseguir fazer isso direito. A inveja rasga meu peito junto da
incerteza sobre Levi.

Se todos os anos que se seguirem continuarem desse jeito, ele nunca me


aceitará como sua esposa, por ter medo de magoar a ex, morta.

Não poderei ser a mãe do Lorran, com a sombra da Blanca pairando em sua
cabeça, e no dia que Levi terminar comigo, e não gostar da minha presença
cuidando de seu filho, eu serei descartada como um pedaço de papel velho.

— Você gosta do Levi, não é? — Bianca pergunta baixinho, e estende os


braços pedindo pela filha, que começa a chorar — hora dela mamar, vem aqui il
mio piccola linda.
Entrego Cecilia para a mãe, e observo como ela agarra o peito da Bianca,
sugando com força o leite. Minha irmã faz careta pela dor, e eu a invejo, eu quero
isso, uma criança sugando meu peito com ferocidade ao ponto de machucar, e me
fazer pensar sobre dar a mamadeira para evitar a dor.

Eu quero tanto uma família, ser amada e amar na mesma intensidade. Por
que a vida é tão injusta comigo e me impede de ter o que anseio? Coloca um
homem quebrado no meu caminho que me deu esperanças de que tinha
encontrado tudo o que eu sempre quis, só para arrancar meu sonho de meus
braços e aumentar a ferida em meu coração.

— Eu... — hesito, não quero compartilhar com Bianca meus sentimentos.


Não agora que Levi passou de uma certeza para uma incógnita.

— Quando quiser falar estarei aqui para ouvir — Bianca segura minha mão
e sorri para mim.

Deito a cabeça em suas pernas, buscando consolo em seu colo. As lágrimas


se derramam como uma cachoeira de meus olhos, enquanto choro baixinho no
colo da Bianca.

Ela alisa meus cabelos, e sinto as pernas de minha sobrinha, sendo apoiadas
na minha cabeça, para minha irmã conseguir me dar conforto.

Nunca procurei o colo dela, teria sido mais fácil se eu tivesse dividido as
responsabilidades com a Bianca, ao invés de abraçar a todas?

— Você foi bem Olivia — Bianca tem a fala macia. — Conseguiu me criar
direito, e eu sou grata por tudo o que você abdicou por mim. Quando nossa mãe
morreu, eu ainda era muito pequena e tenho poucas lembranças com ela. Nunca
vou me esquecer de quando acordei na manhã seguinte ao falecimento dela, e te
vi na cozinha, passando manteiga em seu dedo por que tinha se queimado
fazendo um ovo para eu poder comer.
— Estava horrível e queimado — digo soluçando.

— Foi o ovo mais gostoso que provei na minha vida, ele foi feito pela irmã
que sufocou a dor dela, para poder cuidar da minha. Você sempre fez isso, esteve
lá, lutando todas as minhas batalhas enquanto eu te assistia, esquecendo de cuidar
de si mesma. Hoje eu estou feliz, e tenho a minha família, uma filha que eu amo,
e um noivo que sou loucamente apaixonada.

— Tenho orgulho de você — beijo sua perna, usando sua pele para limpar
o molhado do meu rosto.

— E eu de você, e me parte te ver triste dessa forma pelo Levi, não adianta
esconder, eu já percebi que você gosta dele, e ele de você. Mas Levi tem dores
profundas, e não sei se você conseguirá alcançá-lo. Não se sufoque mais por
outra pessoa, Olivia, ou você vai acabar morrendo por dentro.

É assim que eu me sinto, morrendo por dentro, quando o vejo sofrendo por
outra que ele amou com a própria vida, enquanto eu continuo batendo com uma
marreta na porta dele, sem conseguir causar impactos.

— Eu nunca vou ser feliz — sufoco um grito. A pequena Cecilia começa a


gemer no colo da mãe, incomodada pelo meu choro.

— Vai, sim, você esteve radiante nos últimos meses, e fez o que pode para
esconder de mim e não me magoar. Mas eu nunca ficaria triste por você ser feliz,
te ver alegre e com os olhos brilhando, me deu forças para continuar em frente.
Agora a única coisa que eu preciso de você, é que possa cuidar de si mesma e
sorrir novamente, você pode ser feliz Olivia. Não se prenda mais a dor de outra
pessoa.

— Eu deveria o deixar? — a simples ideia de abandonar o Levi rasga meu


peito em milhões de pedacinhos.
— Você deve se priorizar. Enquanto Levi não quiser sair do luto, nem você,
o Louis, o Enrico, ou a Lira, serão capazes de o fazer voltar a superfície. Não
pare seu mundo porque o Levi escolheu parar o dele. É doloroso e cruel o que
estou dizendo, mas só o falo por me preocupar com você Olivia.

Bianca começa a chorar e ela se mexe na cama. Seus braços puxam os


meus para cima, e encaro o rosto banhado da minha irmã. Cecilia foi colocada
nos travesseiros ao lado dela. Bianca alisa minhas bochechas e beija a minha
testa.

— Não aguento mais ver o quanto você sofre sem conseguir fazer nada, se
eu pudesse surrar o Levi até ele acordar para a vida. Não sei qual será a sua
escolha, mas eu vou te apoiar incondicionalmente no que decidir. Não abandone
seu sonho, ou o coloque em espera, por ninguém, pela primeira vez viva a sua
vida, Olivia.

Abraço Bianca e deságuo a dor do meu peito no colo dela. Minha


irmãzinha tem razão, eu nunca vivi para mim mesma. Deixei Levi entrar,
acreditando que com ele seria diferente, suas palavras, ações, desde o início eu
sabia que ele sofria por outra pessoa, e que seria difícil ter espaço em sua vida
para mim.

Eu estou exausta de não ser suficiente e de permanecer lutando contra a


maré, nadando sem nunca chegar à praia. Abafando meus sonhos e felicidade
para cuidar das dores de outra pessoa.

Ele sabe que estou aqui por ele e escolheu não me deixar entrar. Agora eu
vou ter de escolher a mim mesma.

Meu coração será partido de uma forma, ou de outra, ao menos dessa vez
eu vou me permitir escolher como acontecerá.
Fico com a Bianca pelo resto da tarde, e quando Louis retorna, carregando
o Lorran dormindo no colo, eu pego meu pequeno fofinho e o levo para a sua
casa.

O ambiente frio nos recebe em meio a escuridão, e lembro de quando fui


com Levi a exposição no museu, quando se abriu para mim sobre a dor em seu
coração.

Meu instinto grita que preciso dar mais uma chance a ele, e meu coração
magoado se prepara para mais uma rejeição. Quando estava com a minha irmã eu
me convenci de que conseguiria cuidar e me priorizar. E aqui, eu queimo
querendo fazer isso por ele.

Deixo Lorran em seu quarto e respiro fundo, vou tentar somente mais uma
vez, se o Levi me expulsar, eu vou embora da sua vida e voltarei a ficar sozinha,
lutando para ter um filho.

Caminho pelo corredor e bato na porta dele, baixinho, acho que ele não vai
ouvir. Bato com mais intensidade e pouco tempo depois ela se abre. O homem
que eu amo tem os olhos vermelhos, o peito desnudo, e os lábios inchados como
se tivesse passado horas mastigando a pele.

— Oi! — Digo, o coração dispara com medo da rejeição.

— Entra.

Ele me dá passagem e retorna para as cobertas, se escondendo do mundo. A


ponta dos dedos pinica, e coço tentando afastar a inquietação. Vou para a cama, e
deito ao lado dele, a mão treme quando a levanto e toco o seu rosto, Levi fica de
olhos fechados e me puxa para perto.

— Eu ainda te quero, Olivia — ele sussurra.

Sua frase machuca meu peito mais do que a rejeição.


Tem tristeza em cada uma das palavras, carrega dor e arrependimento. A
garganta trava com o bolo enorme, não tenho mais forças para lutar contra o Levi,
e insistir que ele me deixe entrar.

Se ele me amasse, não sofreríamos tanto para ficar juntos.

Só uma última vez. — Sussurro para mim como uma viciada prestes a usar
drogas após decidir que iria parar.

Aproximo minha boca da dele e o beijo, lábios frios me recebem com


tristeza. Afasto a cabeça para longe dele e sou surpreendida quando seu corpo se
posiciona em cima do meu.

— Eu vou melhorar meu raio de sol — ele sussurra em meu ouvido — me


perdoa por ser horrível com você.

— Você não está pronto para nós, Levi — soluço, a dor irradiando por meu
corpo como um veneno.

— Eu quero estar — ele beija meu pescoço — quero ficar com você, e
voltar aos dias em que estar junto não causava dor.

— Eu te machuco? — murmuro não conseguindo impedir o choro.

— Você nunca fez isso, eu que sou a fonte da dor — ele beija minhas
lágrimas. — Deixa eu tentar acertar as coisas, só mais uma vez? Por favor.

— Eu não aguento mais sofrer Levi.

— Eu sei — encosta os lábios nos meus — eu também quero ser feliz,


Olivia.

— Por favor, não faz isso comigo, eu não aguento mais ser insuficiente.

— Você é mais Olivia, sempre foi.


Levi me beija pela primeira vez em semanas, tristeza espalha do seu corpo
para o meu a cada toque. Ele desliza as mãos para baixo, tirando minha roupa, e
eu deixo, ao menos mais uma vez eu quero me sentir amada como nos últimos
meses.

Entrego meu corpo a ele sem reservas, arranho suas costas quando ele me
preenche sem o preservativo, o sentindo inteiro dentro de mim. Suspiro em seus
lábios, o beijo, desesperada, sabendo que essa é uma transa de despedida.

Não existe mais espaço para mim em sua dor, e não posso continuar
abdicando de meus sonhos por ele. Nunca mais colocarei a mim em segundo
plano.

Quando terminamos, Levi não me deixa ir embora, e agarra meu corpo com
força, adormeço em seus braços com as lágrimas caindo, e o coração desfeito.
Olivia
Entro na clínica com as pernas bambas de ansiedade. Vou fazer novamente
outra inseminação artificial.

Nos últimos três dias eu senti que Levi estava se despedindo de mim, e que
não poderíamos ter um futuro juntos.

O medo de perder Lorran caso eu e o Levi terminemos, faz com que eu


continue aguentando a tristeza com a qual ele me beija, e como tem evitado olhar
em meus olhos quando transamos.

Não é comigo que ele quer estar, não são pelos meus beijos que ele
procura, e todo o fogo que queimava entre nós dois se dissipou, como o vento, ao
bater em uma parede.

Vou continuar tentando engravidar sozinha, e quando tiver meu bebê em


meu ventre, a dor vai amenizar, não tem como o sofrimento durar para sempre e
se prolongar, transformando os meus dias felizes em uma bolha de sofrimento.

Vou romper sozinha essa barreira e serei feliz, custe o que custar.
— Senhorita Olivia Baptista? — A recepcionista me chama — pode ir fazer
o teste de gravidez agora. — Ela aponta a sala ao lado. — Depois o doutor te
atenderá.

— Certo.

Caminho para a sala com as pernas bambas.

Eu não engravidei, tenho certeza disso, mas antes dos procedimentos


preciso fazer o teste, principalmente por ter uma vida sexualmente ativa.

Entro na sala branca e faço xixi em um copinho, coloco os testes de


gravidez dentro dele, e deixo o ambiente antes de ver o resultado.

Eu já sei o que se seguirá.

Vou para a sala do doutor e não o encontro lá dentro. Sento-me na cadeira


com o estômago dando voltas de ansiedade. Será a minha terceira tentativa, e
dizem que a terceira é a certa, não tem como dar errado.

O doador que escolhi é um homem saudável e bonito, brasileiro e formado


em direito. Não tem como falhar, dessa vez eu terei o meu bebê.

— Olivia — o doutor Campos entra com um sorriso no rosto — você não


parece muito bem, aconteceu algo?

— Nada de diferente — não quero mentir, ao menos com ele, anseio ser
sincera.

— Faz tempo que você não vem aqui, as coisas com o namorado estão indo
bem?

— Não muito — dou de ombros — ele foi casado, e quando a esposa


morreu entrou em depressão. Esses últimos dias tem sido difícil, e percebi que
não tem lugar para mim no coração dele.
— A depressão destrói a mente da pessoa e ao corpo. Não o culpe por agir
de forma errada nesses dias, ele precisa de ajuda, e sei que você conseguirá fazer
isso.

— Eu cansei de ajudar — sorrio com a vista nublada — ao menos uma vez,


gostaria que fizessem isso por mim.

— Estou aqui para ser a sua ajuda — ele segura minha mão — vamos ver o
resultado do teste, e depois damos início ao procedimento.

— Certo, mas não será diferente das outras vezes.

Duas batidas na porta e a enfermeira entra, carregando consigo os testes de


gravidez. Ela entrega ao doutor Campos que me olha com a sobrancelha franzida,
escondendo o resultado. Com um sinal de cabeça, a enfermeira deixa a sala e ele
guarda os testes na gaveta.

— Vamos conversar primeiro — ele cruza as mãos — você terminou com o


seu namorado?

— Não consigo — deslizo o dedo na bochecha limpando o molhado — eu


sei que preciso terminar com ele, e parar de sofrer. Tenho medo de perder o
contato com o Lorran, e ficar sem aquele menino na minha vida seria o inferno.

— Você não acredita que seu namorado possa ter salvação?

— Não mais — suspiro — enquanto ele não largar o fantasma da esposa,


ele nunca me dará uma chance.

— Olivia, preciso que você me ouça com atenção agora — ele se levanta e
se senta na cadeira ao meu lado — você é uma moça adorável, e será uma mãe
fantástica, sortudo é o Lorran por ter você com ele. Independente do seu
namorado não querer mais você perto do menino, sei que conseguirá um jeito de
ficar com ele.
— O tio dele pode fazer isso, acho que o Louis não teria coragem de me
afastar do Lorran.

— Você não está sozinha, nunca mais ficará.

— Como pode ter essa certeza? — inclino a cabeça para o lado.

— Não iremos mais fazer o procedimento.

— Como assim? — fico assustada, ele não pode tirar isso de mim.

— Você conseguiu, você está grávida Olivia.

O mundo para de girar ao meu redor, e tudo se torna brilhante.

— Eu... vou ter um bebê? — pergunto incrédula levando a mão ao ventre.

— Sim, parabéns.

Doutor Campos me envolve em seus braços, e eu fico atônita sem


conseguir acreditar que isso finalmente aconteceu.

Vou ter um bebê! Um filho para amar e ser amada, ninguém poderá tirar ele
de mim, e nunca mais estarei sozinha. Meu maior sonho se tornou realidade e
ninguém poderá apagar a felicidade que estou sentindo.

— Como é possível? — digo em meio aos risos e as lágrimas alegres.

— Você transou sem camisinha, não é obvio? — ele gargalha e o


acompanho.

Eu transei sem camisinha.

Eu... transei sem camisinha.

O pavor retorna ao meu peito como uma avalanche.


— O Levi é o pai — murcho.

— E você a mãe, não deixe o momento perder o brilho por causa desse
homem, você finalmente conseguiu!

Ele tem razão.

Eu realizei meu maior sonho, e não vou deixar a tristeza pelo meu
relacionamento ofuscar esse momento.

Levo a mão ao ventre e baixo a cabeça, encarando minha barriga lisa que
em breve ficará enorme.

— Eu amo você, minha pequena — sussurro.

— Acha que é uma menina? — ele pergunta brincalhão. — Mal soube que
será mãe e já previu o sexo.

— Tenho certeza, a minha menina está dentro de mim.

Sorrio.

Nada poderá arrancar a minha felicidade e quando eu me sentir pronta,


contarei ao Levi sobre o bebê. Não sei como ele vai reagir e vou esperar um
tempo, até ter certeza de que é seguro.

****

Levi
— Quelo um tilgle papai. — Lorran pede.

Hoje é o dia em que a Blanca morreu e tenho me agarrado ao Lorran como


um bote salva-vidas, para não correr para o bar e beber até apagar, e esquecer o
meu nome.
Tenho feito mal a ele com o meu afastamento e magoado a Olivia. Apesar
de ela não ter terminado comigo, eu sinto que a afastei e coloquei uma barreira
entre nós.

Sou um lixo que a usou todas as noites para não ficar sozinho, sentindo a
falta da Blanca, e que tem feito amor com ela buscando por outra pessoa.

A Olivia não é idiota, ela percebeu que faço isso, e tem deixado, não
entendo como ela pode aguentar um merda como eu sem me mandar embora.

Nossa relação está por um fio e a culpa é inteiramente minha. Não sei
como consertar o que se quebrou dentro de mim e na nossa relação. A única coisa
que consigo fazer, é pintar o quarto do Lorran com os animais que ele tem me
pedido, e rezar para que a Olivia tenha a coragem de ir embora.

Sou um fraco idiota, incapaz de a afastar por precisar dela ao meu lado, me
fazendo esquecer a dor da perda.

Não é justo com ela, não é certo fazer isso comigo. Antes dos dias sombrios
chegarem, eu estava com ela e me sentia bem, nunca pensei em a ter usado como
uma substituta, ela é o meu raio de sol, que perde a luz devido à minha escuridão.

Eu tenho ciência das merdas que estou fazendo e não consigo impedir.
Continuo a procurar como um maldito viciado, enquanto rezo para que ela me
deixe e pare de machucar a si mesma com esperanças de que um dia eu vá mudar.

Não tem como eu ser diferente do que sou agora, Blanca deixou um vazio
dentro do meu peito que nunca será preenchido, e quando o vazio doer, eu não
poderei fazer nada além de me entregar a ele, deixando que consuma toda a
felicidade que eu não sou digno de receber.

— Beeeeeeeem glande — Lorran abre os braços quando termino o desenho


a lápis, do tigre na parede.
— Se ficar grande demais, os outros animais vão ter medo dele — digo,
sem coragem de apagar e fazer outro.

— Polqule? — se senta e suspira — tansei.

— Você não fez nada — rio e ele passa a mão na testa enxugando um falso
suor.

— Tansa da oldem, quelo tolme — levanta e sai correndo, provavelmente


para a cozinha atrás da Olivia.

Foco em desenhar os outros desenhos, e meu peito vai sendo comprimido,


e a vontade de beber chega a me enlouquecer.

Erro a tromba do elefante cinco vezes. Irritado, jogo o lápis no chão e saio
do quarto, vou para a cozinha e paro na porta quando vejo o Lorran em cima do
balcão e a Olivia esfregando o nariz no dele enquanto riem juntos.

Era para ser a Blanca.

Aperto os punhos com raiva do que vejo. Ela não tem o direito de se
infiltrar na vida do Lorran e o tratar com o carinho de uma mãe.

Ele já tem uma e não precisa outra.

— Lorran! — chamo com a voz grave e menino se assusta, pulando no


canto e me encarando de olhos arregalados. Olivia tem a mesma reação — vamos
terminar os desenhos.

— Sì papai — ele estende os braços para a Olivia, e ela o coloca no chão.


Lorran passa correndo por mim voltando ao quarto dele.

— Não precisa agir assim — ela pede em voz baixa.

— Você não é a mãe dele, não esqueça disso.


Os olhos dela nublam, trinca o queixo para que eu não perceba a tremedeira
que se espalha pelo seu corpo.

— A mãe do Lorran morreu há três anos, hoje é o dia mais triste da minha
vida, e só quero passar ele com o meu filho e tentando não morrer de tanta dor —
me aproximo dela com raiva na voz — não ouse pensar que você pode roubar o
Lorran de mim ou da Blanca. Você é a babá, nada mais!

— Vou embora. — Ela fala em um fio de voz e sai sem olhar para trás.

Eu destruí seu coração, quem sabe agora ela perceba que não sou o certo
para ela e se mantenha distante. Ninguém vai roubar o Lorran de mim
novamente, ou apagar a imagem da Blanca.

Volto para o quarto e o Lorran tem as mãos cheias de tinta passando elas
nas paredes.

— O que você fez? — tento não soar irritado.

— Patinha dos bilcinhos — noto que ele só marcou na parte em que fica a
pata dos animais.

— Vamos deixar isso melhor. — Me sento ao lado do Lorran.

A Olivia foi embora, a afastei antes de tornar sua vida um inferno pior por
continuar comigo. Eu só preciso do meu filho para sobreviver ao hoje, e nada
mudará isso.

Ela pode ser feliz sem mim em sua vida.


Olivia
Cada célula, músculo e articulação do meu corpo dói.

Passei os últimos cinco dias trancada em meu apartamento, chorando após


ouvir as palavras cruéis do Levi.

Enquanto me afogava na dor, decidi que não irei contar a ele sobre o bebê,
esse filho é somente meu, e quando perguntarem, eu digo que a inseminação
artificial deu certo.

Agora eu consigo entender o medo da Bianca em contar ao Louis sobre a


gravidez após ter sido rejeitada.

Eu fui jogada na lama como um rato morto, alguém que não adianta lutar
ou ficar ao lado.

Desprezada.

Rejeitada.

Sem amor.

Me dedicando mais do que recebo em troca.


Essa foi a história da minha vida, por que acreditei que seria diferente com
Levi? Logo ele, um homem depressivo, marcado por um grande amor.

Fui uma idiota pôr o deixar entrar no meu coração, por ter esperanças e me
iludido. Não posso culpar a ninguém além de mim, os sinais de que acabaríamos
assim sempre estiveram ali, eu só me recusei a ver.

Ele não deixava o Lorran me ver como uma mãe.

Concordou em não contar sobre o nosso relacionamento para ninguém, e


mesmo após nossos irmãos terem se resolvido, ele permaneceu me mantendo em
segredo.

A Bianca vai casar-se daqui a umas semanas, ela conseguiu tudo o que eu
sempre sonhei.

Um homem a amando.

Um casamento.

Um filho.

E eu recebi mais uma vez a rejeição e o desprezo, palavras cruéis ditas por
lábios que fingiram gostar de mim, e me usaram. Não tem mais volta, o Levi
nunca me amou, e não amara o nosso filho.

Meu bebê não vai saber o que é ser odiada, se sentir insuficiente e sozinha,
eu vou cuidar dela, serei uma mãe perfeita, e nunca a deixarei sentir a falta de um
pai na sua vida. Eu serei suficiente.

Contarei a todos a mesma história, e a verdade será guardada comigo a sete


chaves. Eu fiz a inseminação, deu certo e agora vou ser mãe. Tenho nove meses
para curar meu coração, não permitirei que minha filha venha ao mundo comigo
nesse estado.
A campainha toca e viro para o lado oposto, me recusando a receber visitas.

— Zia viviaaaaaaaaaaa — ele grita e meu coração estremece.

Meu fofinho.

Faz sete dias que não vejo Lorran, e a saudade vinha comprimindo meus
pulmões, chegando a ficar difícil respirar, sem pensar nele e no quanto o queria
comigo.

As palavras do Levi foram um aviso claro; ... Eu não sou a mãe dele e não
tenho o direito de ficar perto.

Me levanto cambaleando, tenho me alimentado o máximo que posso para


não fazer mal a meu neném. Meu coração pode ter ficado em pedaços, mas não
vou deixar isso causar prejuízos a pequena que cresce em meu ventre.

Limpo os olhos, como se fosse adiantar de alguma coisa, o inchaço é tanto,


que mal consigo enxergar.

Destranco a porta e vejo o meu fofinho no colo do pai.

Levi não me encara e desvia o olhar para o lado oposto. Lorran estica os
braços e o pego no colo, inspirando seu cheirinho de bebê que aquece meu
coração magoado. Entro e fecho a porta, não quero ver o pai dele.

— Ocê tá bien? — ele pergunta com as mãozinhas em meu rosto, os


olhinhos azuis preocupados, e as bochechas vermelhas.

— Estou doente — minto, disse o mesmo na creche, e ao Louis, para


justificar meu sumiço.

Doutor Campos foi generoso comigo e me deu um atestado médico, para


corroborar com a minha história. Ele era o único a quem eu poderia pedir isso, e
sua ajuda foi bem-vinda, me permitiu sofrer em casa sem ninguém me
procurando.

— Dodói? — franze a testa e beija meu nariz — melholou?

— Com certeza fofinho — vou com o Lorran para a cama e deito com ele
ao meu lado, tenho medo de ficar o segurando com a bebê em meu ventre.

— Vamos pla casa? — Ele alisa meus cabelos e beijo sua mãozinha.

— Ainda não posso fofinho, fica um pouco comigo?

— Sì, senti sua falta zia vivia — ele se agarra ao meu pescoço. — Num
deixa eu.

— Eu te amo tanto Lorran — sussurro em sua cabeça, sentindo o cheiro de


seus cabelos — Seria incapaz de te deixar — aliso os fios de ouro.

— Amo a zia vivia — ele aperta mais meu pescoço, escondendo a cabeça,
tentando se fundir a mim.

As palavras do meu anjinho colam um pouco do machucado aberto em meu


peito. Como pude ficar sete dias longe dele? Sem ouvir sua doce voz, a
gargalhada gostosa, e poder passar o dia brincando e cuidando dele.

Nem que eu tenha de tirar o Lorran do Levi, nunca mais cometerei o erro
de pensar em ficar longe dele.

— Não vou te deixar fofinho.

— Polmete?

— Sim — beijo sua cabeça, e Lorran sorri. — Bola sisti?

— Sí.
Levanto com o Lorran e coloco um desenho na tevê para a assistirmos
enquanto aliso seus cabelos. Sou incapaz de negar algo a esse pequeno. Batidas
soam na porta, e depois o Levi entra.

— Olivia, precisamos conversar

— Não! — O ignoro — Lorran vai dormir aqui, depois eu ligo para o Louis
vir buscá-lo, pode ir embora.

— Eu tenho de falar com você Olivia — ele fala com pesar na voz, não o

encaro. Ele não tem o direito de partir meu coração quando está depressivo,
e depois vir com o rabo entre as pernas tentando me fazer voltar com ele.

— Saia da minha casa. — O encaro com fúria, e opto por falar em


português para o Lorran não entender.

Levi não tem a expressão de quem quer pedir desculpas ou qualquer merda
que justifique seus atos. Todos que me magoaram nunca me pediram perdão, ou
voltaram, atrás, ele não será diferente, eu que serei.

— Eu te deixei entrar e você pisou em mim sem pensar duas vezes, ou


considerar o quanto me faria mal. Eu aguentei a sua dor e suprimi a minha,
enquanto você foi um egoísta miserável que só pensou em si. Vá embora, quando
eu estiver com o Lorran você ficará longe. Se tentar me afastar dele, eu juro que
faço o Louis tirar a guarda dele de você.

— Lorran é meu filho! Não vou perdê-lo, e por isso...

— Então seja esperto, e não tente me irritar, agora saia. — Não o deixo
terminar de falar suas mentiras, ficar perto do Levi arde em meu coração.

— Eu vou para a Itália, vim deixar o Lorran para passar uns dias com você.

— Fuja o quanto quiser.


Ele deixa uma mala ao pé da porta, e depois vem até o Lorran, que estende
os braços para o pai e beija a bochecha dele, enquanto se despedem. Levi diz que
passara somente uma semana fora, e pede ao Lorran para se comportar, reviro os
olhos sem acreditar em como ele pode ser frio após partir meu coração.

— Papai sentiu sua falta — Lorran se esforça para falar correto, depois que
o pai vai embora.

— Como sabe disso fofinho?

— Eu vi — ele sobe no meu colo e deita a cabeça em meu peito — ele


ficava olando sua foto dileto, e clolava.

Não deixo que isso mexa comigo, provavelmente, Lorran se confundiu, e a


quem o Levi via, era Blanca, a única mulher que ele realmente amou.

****

Lorran fica comigo pelos próximos dias, e Levi manda mensagens,


perguntando do menino, deixo que o filho responda por áudio, me recuso a dirigir
a palavra a ele, mesmo por mensagem de texto.

Vou focar em mim, na gravidez, no Lorran, e em ser feliz.

Não deixarei a minha alegria ser determinada devido a um homem. Na


segunda volto a trabalhar na creche, e a ficar com o Lorran no apartamento, tento
ignorar a dorzinha no peito que sinto, ao lembrar dos momentos que passamos
juntos nesse lugar.

Entrar na cozinha é reviver quando ele despedaçou meu coração.

Louis vem buscar o Lorran para ficar a noite com ele e a Cecília, somos
todos apaixonados na pequena e sempre que posso fico por lá, ajudando a Bianca
com o resguardo.
Mas hoje eu preciso da minha cama, comer sorvete, e chorar, a mágoa
permanece obscurecendo os meus sentimentos, e não me deixando ser feliz.

— Você sabe o motivo dele ter ido a Itália? — Louis diz quando entrego
um Lorran dorminhoco em seus braços.

— Não quero saber sobre ele — desvio o olhar.

— Foi por você...

Endureço as feições e interrompo o Louis.

— Não defenda seu irmão, ir para outro continente depois do que ele fez
não vai mudar nada. Levi escolheu dizer cada uma das palavras que me
magoaram, e nada mudará isso.

Não espero por sua resposta e vou embora.

O casamento deles será em três dias, e viajaremos para a Itália, as 7 horas


da manhã. Passo a noite rolando na cama, sentindo um enjoou terrível e sem
saber o que fazer para melhorar, já que o remédio passado pela minha obstetra
não serve de nada.

Amanhã o verei e serei obrigada a ficar na mesma casa que ele durante os
preparativos, o casamento e os dias seguintes a festa acontecerem.

No total, duas semanas de puro inferno, precisando suportar ficar perto do


homem que me fez acreditar em um futuro juntos, e jogou tudo no lixo, que fugiu
quando as coisas ficaram complicadas me deixando para trás, destruída e grávida.

Bianca me olha com tristeza, e evito a encarar, se ela quer um casamento


pacífico e sem drama, não espere que eu vá me dar bem com Levi, ou seria capaz
de o enforcar por tirar a minha paz e ainda fazer morada em meu coração idiota.
Não serei boba novamente, por mais que eu ainda o ame e sofra com a
distância, ninguém pisará em mim.

Embarcamos sem dificuldade, e fico com o Lorran ao meu lado, ele se


estica direto para ver a prima no colo da Bianca, e eu tenho esperança de que um
dia ele tenha a mesma felicidade para brincar com a irmãzinha dele, que cresce
em meu ventre.

— Lorran — chamo baixinho.

— Sì zia vivia — eu amo quando ele me chama assim, e beijo suas


bochechas.

— Você ficaria feliz em ter uma irmãzinha?

— Muuuuuuuuuuito — abre os braços e sorri lindamente, mostrando os


dentinhos pequenos de leite.

— Vai ser um bom irmão mais velho?

— Com celteza — acena em positivo. — Me dá uma ilmanzinha?

Meus olhos lacrimejam, e eu beijo a cabeça dele.

Esconder a gravidez do Levi é uma coisa, ele magoou meu coração e


terminou tudo entre nós por não conseguir esquecer a esposa morta.

O Lorran não tem culpa de nada, e consigo imaginar o quanto ele seria um
irmão maravilhoso e apaixonado.

Pelo Lorran eu escolho contar a verdade sobre a paternidade da minha


filha, somente quando eu me sentir forte para aceitar que terei de conviver com
Levi como pai dela, sem sermos um casal. Lorran não merece pagar, novamente,
pelas idiotices do pai.
E sendo a mãe da irmã dele, talvez Lorran possa me ver como a mãe dele
também.

Meu pequeno fofinho criou raízes poderosas em meu coração, quero ser a
mãe dele, independe de ter uma filha gerada no meu ventre.

Eu tenho dois filhos, e por eles eu faço tudo.


CAPÍTULO 33

Levi

Dias antes
Já faz três dias que terminei com a Olivia e não tenho notícias dela.
Acabou, não a faço sofrer o luto que me atormenta. Não traio mais a Blanca
colocando outra em seu lugar e impedindo que o Lorran reconheça quem é a
única e verdadeira mãe dele. Envolver com outra pessoa foi um erro e um
pecado, nunca poderei pedir perdão o suficiente a nenhuma das duas reparando o
erro cometido.

Quero que meu filho entenda que não podemos mais continuar com a
Olivia em nossas vidas. A raiva com a qual ele joga os talhes no chão e grita a
plenos pulmões pedindo pela Olivia reforça o que eu já sabia: o Lorran se apegou
a ela como um filho a sua mãe, o amor entre eles não vai trazer felicidade e
somente tristeza. É a Blanca que ele tem de amar, não a Olivia.

— Lorran — seguro seus ombros e ele morde meu dedo. — Para filho, eu
já disse que a Olivia precisou ir embora, não chama mais ela.

— MENTILA (MENTIRA) — Grita em meio ao choro — eu quelo a


Olivia.

Sua birra me lembra de quando conheci a Olivia e o garoto se apegou a ela.


Se eu tivesse tido forças o suficiente para evitar essa situação de merda. O Lorran
nunca teria se apegado a Olivia e não estaria sofrendo agora. É tudo culpa
daquela maldita por se infiltra em nossas vidas e fazer o meu filho a querer como
quem precisa da mãe.

— Vem comigo — o pego no colo o levando para o quarto onde coloquei


vários porta-retratos da mãe dele na parede em um mural de animais. — Essa é a
sua mãe.

— Eu sei. — Soluça.

— Você ama a sua mãe?

— Sí.

— Por que chama pela Olivia? É a sua mãe quem você deve querer.

— NÃO — Ele grita e bate no meu rosto com os punhos — a mamãe tá no


céu, ela num fica colmigo, a zia vivia sim. Eu quelo a zia vivia! — Chora
esperneando em meus braços.

Eu recebo um soco forte em meu peito, o ar sessa em meus pulmões e caio


de joelhos soltando o Lorran que senta no chão chorando. Acompanho meu filho
em seu choro me dando conta da merda que eu fiz com o Lorran. Ele não chama
pela mãe, ele não conhece a mãe além das fotos, sabe que ela não pode estar com
ele.

É a Olivia quem da carinho e amor enquanto a Blanca é um fantasma que


usei para aprisionar meu filho e não o deixar ser feliz com o carinho de uma mãe
que o ame e possa o abraçar, colocar para dormir, dar comida e beijar seu rosto
até os lábios ficarem roxos e ele vermelho como a Olivia faz.
Faz 3 anos e 3 dias que a minha esposa morreu.

Lorran está com a Olivia a mais de um ano sendo cuidado e amado.

Eu a tive por meses ao meu lado e não consegui dar valor a mulher incrível
que ela era enquanto me perdia no luto pela mulher que eu amei com a vida. Foi
preciso meu filho de três anos chorar me dizendo que a mãe dele foi para o céu e
que a Olivia estava com ele para que eu pudesse perceber a merda que eu fiz.

Eu não protegi a imagem da Blanca.

Não honrei ao nosso sentimento.

Eu afastarei o Lorran da única mulher que ofereceu a ele o colo de uma


mãe.

Afastei de mim a única que foi capaz de me fazer ver a luz. Perceber a
burrada que fiz não ajuda a amezinhar como me sinto. Estou confuso sem saber o
que fazer. Aceitar a Olivia na minha e na vida do Lorran é deixar a Blanca para
trás e eu não consigo fazer isso, não importa o quanto tente. Mas não se trata
mais de mim, o Lorran precisa da Olivia e eu devo pensar nele.

Com o Lorran, meu único filho que chora implorando pela Olivia eu vou
fazer o que é certo, só preciso de coragem.

— Vem cá Lorran — o pego no colo e beijo seus cabelos — vamos fazer


um acordo, eu te levo para ver a Olivia, mas antes ajuda o papai a se sentir
melhor?

— Como?

— Só me abraça forte e me deixa sentir o seu amor.

— Eu te amo papai — ele aperta meu pescoço em seus braços e passamos


as próximas horas chorando em seu quarto de saudade da Olivia.
Ele dorme e o levo para o quarto comigo. Puxo o celular do bolso e a foto
da Olivia salta na tela de proteção. Ela e o Lorran brincando de pintar o rosto um
do outro na páscoa na creche. Abro a galeria do meu celular e vejo as inúmeras
fotos que tirei dela e do Lorran, dela comigo e do meu pequeno em meus braços.
Vejo os vídeos na galeria até o sono me nocautear.

Desperto com a gargalhada da Olivia e por um segundo acho que ela


retornou. Levanto a cabeça e vejo o Lorran deitado no meu peito vendo os vídeos
dele com a Olivia, ele também sente a falta dela. Beijo a cabeça dele e ficamos
assistindo juntos as imagens. Na hora do almoço subo para o apartamento do
Louis e deixo o Lorran admirando a prima com a Bianca e puxo meu irmão.

— Vou para a Itália amanhã e te encontro no seu casamento na casa de


primavera — digo quando ele fecha a porta do escritório.

— Explique-se — pede com calma sentando no sofá e o acompanho.

— Eu preciso ver a Blanca, vou na fazenda da Beatrice.

— Novamente, explique-se. — Cruza as mãos e suspiro.

— Eu gosto da Olivia e não consigo aceitar meus sentimentos por achar


que estou traindo a Blanca. O Lorran ver a Olivia como a mãe dele e eu não
quero isso com medo dele esquecer quem é a Blanca e estou sendo egoísta e um
desgraçado por agir dessa maneira com o Lorran e a Olivia. Preciso conversar
com a Blanca ou as cinzas dela. Não aguento mais viver nessa indecisão
machucando as pessoas que são importantes para mim.

— Uau.

Ele fica calado pelos minutos seguintes olhando ao redor.

— Você falou algo para a Olivia?


— Eu a expulsei da minha vida e do Lorran.

— Vacilou muito Levi — coça a cabeça — a Olivia não é doce como a


Bianca, ela é casca grossa e não sei se ela te perdoaria somente com palavras.

— Não precisa falar o que eu já sei. Antes de encarar a Olivia preciso


resolver as coisas com a Blanca, cuida do Lorran pra mim?

— Não.

— O que?

— O Lorran quer a Olivia e não a mim ou a Bianca, vá deixar ele na casa


dela e diga que vai viajar e peça para ela cuidar dele. Tenha a decência de fazer
isso seu idiota — Louis explode e bate na minha cabeça.

— Ai — reclamo e recebo mais tapas, me encolho no sofá.

— Você estava construindo uma família com ela seu stronzo se eu pudesse
arrancava suas orelhas fora. Certifique-se de explicar bem ao Lorran sua viagem
e resolva de uma vez por todas o seu passado.

Louis deixa o escritório e aliso meu braço atacado. Pego o celular e aviso
que vou usar o avião amanhã para uma viagem a Itália. Deixo o Lorran o dia com
a prima e de noite o levo para casa, dou a janta e deito com ele na minha cama.

— Filho.

— Sì papai.

— Amanhã eu vou voltar para a Itália por uns dias e vou te deixar com a
Olivia, tudo bem por você?

— Vai delmola pla volta? (demorar para)

— Não, vou encontrar vocês no casamento do seu tio.


— Celto, pode il. (Certo, pode ir) — Beija minha bochecha.

O coloco para dormir e me preparo para ver a Olivia amanhã.

Chegamos ao prédio em que ela mora, bato na porta e Lorran chama pela
Olivia. Ela abre a porta o pega no colo e fecha sem me deixar a ver direito. Fico
irritado com sua reação, fecho o punho pronto para bater novamente e recuo, não
tenho o direito, ela tem razão em não querer me ver. Retorno para meu
apartamento e arrumo as minhas malas e a do Lorran, vou deixar lá e ela terá de
falar comigo.

Termino e retorno ao apartamento dela a tarde. Bato novamente e não


escuto resposta, testo a maçaneta e a porta se abre. Olivia está deitada no sofá
com o Levi e marcha na minha direção com fúria. Antes que ela possa fecha a
porta eu falo:

— Olivia precisamos conversar

— Não! — ruge — o Lorran vai dormir aqui depois eu ligo para o Louis
vir buscar ele, pode ir embora.

— Eu tenho de falar com você Olivia — fico triste ao ver como ela tem
bolsas negras embaixo dos olhos, o cabelo prezo em um rabo de cavalo
emaranhado e parece mais magra.

Ver o resultado do meu egoísmo faz com que eu tenha mais certa: devo
resolver de uma vez por todas o meu passado para poder seguir em frente.

— Saia da minha casa. Eu te deixei entrar e você pisou em mim sem pensar
duas vezes ou considerar o quanto me faria mal. Eu aguentei a sua dor e suprimi a
minha, enquanto você foi um egoísta miserável que só pensou em si mesmo. Vá
embora, quando eu estiver com o Lorran você ficará longe. Se tentar me afastar
dele eu juro que faço o Louis tirar a guarda dele de você.
— Lorran é meu filho! Não vou perde-lo e por isso... — tento explicar a ela
o que acontece dentro da minha cabeça, mas é em vão, ela não vai me ouvir.

— Então seja esperto e não tente me irritar, agora saia.

— Eu vou para a Itália, vim deixar o Lorran para passar uns dias com você.
— Tento e sou cortado novamente.

— Fuja o quanto quiser.

Olivia fecha a porta e encaro a madeira com vontade de falar muito mais,
não tenho o direito e sei que ela não vai me escutar. Eu não ouço ninguém e
continuo fazendo idiotices.

Saio do apartamento para a Itália, chegou a hora de resolver as coisas com


o meu passado para que eu tenha um futuro.

Levi
A fazenda da Beatrice fica na zona rural da Itália.

É quase um vinhedo, onde ela produz um dos melhores vinhos do país,


chamamos de fazenda por ter animais espalhados pelo lugar, como a Bea sempre
quis.
Ao me casar com a Blanca, eu presenteei a Beatrice com o terreno, e a
apoiei, para que pudesse empreender o que ela quisesse.

O vinhedo foi ideia da Blanca, para que a irmã pudesse ter uma produção
que gerasse renda o suficiente para ela conseguir viver sem a pressão dos pais, e
poder se dedicar aos animais, sem pensar neles como forma de renda.

Ambas sofreram muito nas mãos dos genitores, e parte do motivo da


Blanca recusar ficar comigo, era porque os pais dela não apoiavam um estilista
como namorado da filha, preferiam um político.

Por ser a mais velha, Blanca deveria casar-se antes da Beatrice, e a mais
nova não podia ser envolver com homens, ficando reclusa dentro de casa, ou
somente saindo quando a irmã a levava junto.

Ser uma modelo foi a forma encontrada pelos pais delas para que Blanca
fosse exposta a homens poderosos, que pudessem se interessar em um
relacionamento com ela.

Quando descobri, tirei Blanca e Beatrice de casa, dei a Bea a fazenda que
ela queria, para viver em liberdade, com os animais que ela ama.

Acho que Lorran puxou da tia o carinho por animais, todas as pelúcias que
ele tem de bichinhos, foram presentes da Bea.

Quando Blanca morreu, os pais dela entraram na justiça querendo que a


filha fosse enterrada no jazido da família, enquanto eu e Beatrice, decidimos a
deixar descansar na fazenda, lugar em que ela se sentia confortável, e uma vez
pediu a Bea que quando morresse fosse enterrada lá, perto da irmã, e onde ela
amava, um lugar que eu e nossos filhos pudéssemos a visitar sem o peso da
família por perto.
O motorista para o carro em frente aos portões, e nossa presença é
informada.

A equipe de segurança foi algo que eu não abri mão após a morta da
Blanca, mesmo em meio a depressão, me preocupei de que Beatrice conseguisse
ficar em segurança, sem os pais a incomodando devido ao túmulo da Blanca ser
na fazenda.

Entramos, e após passar pela enorme plantação de vinho, o carro estaciona


e eu desço.

Bea espera por mim com um sorriso e os braços abertos. Os olhos


azuisclaro brilham, e o cabelo louro voa por seu rosto, enquanto ela tenta os
controlar e manter os braços abertos me recebendo. Com três passos chego a ela e
envolvo seu corpo em um abraço, sentindo o cheiro que me lembra a irmã.

Beatrice é poucos centímetros mais baixa que Blanca, o cabelo louro


escuro, e a pele bronzeada. Ao contrário de mim, a Beatrice grita felicidade e
vida, com a pele e o corpo. A solto, e ela encara meu rosto com carinho.

— Estava me perguntando quando você viria, se atrasou esse ano. — A voz


dela é doce e suave, traz conforto e carinho.

— Eu fiz besteira, uma idiotice enorme que não tem perdão.

— Vamos entrar e beber um café enquanto você me conta, ou quer ir direto


para o jazido da Blanca?

— Preciso falar com você antes, talvez me ajude a amenizar os sentimentos


que me corroem sobre Blanca.

— Ah, querido, o que houve?


Conto a ela tudo o que aconteceu desde que coloquei o pé no Brasil, e
quando parti o coração da Olivia no dia da morte da Blanca.

— Enquanto sofria pela perda de Blanca, eu magoei a Olivia, achei estar


fazendo o que era certo, logo a raiva passaria, e ela perceberia ser melhor viver
sem mim ao seu lado. Atormentado pelo fantasma da esposa que amo, nunca
poderei dar a ela o amor que merece, eu nem consigo dizer “eu te amo” sem
achar que estou traindo a Blanca.

— Levi, espera um segundo — Beatrice pede — respira fundo e expira,


você está tremendo muito, e com falta de ar, nem se deu conta.

Observo minhas mãos e pernas, ela tem razão.

— Vou pegar um chá para te ajudar enquanto conversamos.

Beatrice desaparece e eu continuo inspirando e expirando. Ela retorna com


o bule e duas xícaras, serve a minha e a dela. Beatrice franze a testa preocupada
mordendo os lábios ao me observar beber a bebida.

Queimo a língua, e me tremo mais ainda.

— Calma — ela segura minha mão.

Encaro seus olhos azuis, e a boca em bico, respirando devagar para que eu
a siga.

— Eu sei como é sofrer pela morte da Blanca, Levi, não fique ansioso
comigo. Acho que sou a única pessoa que poderá te ouvir sem te julgar, ou exigir
uma reação de melhora de você, então vamos devagar, certo?

— Você sente muito a falta dela?

— Todos os dias, mas isso não me impede de viver. Eu lembro dela com
felicidade, por ter uma irmã maravilhosa. Blanca por anos, foi minha pior inimiga
e melhor amiga, devido à relação tóxica que nossos pais criaram entre a gente.
Mas ela nunca desistiu de mim, e somente por causa dela hoje eu sou livre.

Lágrimas nublam seus olhos, e ela se cala, antes de prosseguir.

— Blanca não ficaria feliz se me visse perdendo tudo o que ela me deixou.
Me afogar no luto iria trazer tristeza a memória da minha irmã, e, eu não seria,
capaz de viver sabendo que a magoei. Eu continuei seguindo em frente, e fiz da
saudade a força para cuidar dos meus animais e dos negócios. Transformei o
amor que eu sentia por ela em vida, em um amor saudoso, do tipo em que eu
ainda posso a amar com todo o coração, mas nunca sentir que não poderei viver
sem ela comigo.

Nunca consegui pensar dessa maneira.

O mundo não tinha sentido sem a Blanca comigo.

A Beatrice deu sentido ao mundo, para poder continuar vivendo com a


Blanca no coração.

— Foram anos com sua irmã, jurando amor e lealdade, ficar com a Olivia
começou a me trazer um sentimento de traição, que se ampliou na semana de
morte da Blanca. Senti que estava apagando a imagem da minha esposa, e sendo
infiel, a traindo, e pior... fazendo outra pessoa cuidar do filho dela. Na minha
cabeça, o Lorran não pode crescer sem amar a Blanca, em minha insanidade, eu
sabia o que estava fazendo, e queria aquilo, que a Olivia fosse embora e nunca
mais voltasse. Que o Lorran tivesse somente a mim e a Blanca.

— Você disse isso a ela, não foi?

— Sim, a expulsei sem pensar duas vezes.

— Você sempre foi um homem justo, e agia com base nas suas emoções,
magoou a Olivia por não pensar na sua ação, somente no que te atormentava. Eu
consigo ver em seus olhos que você mudou de ideia sobre substituir a Blanca, o
que aconteceu?

— O Lorran, meu filho, que ama a Olivia como uma mãe, e não consegue
ficar sem ela. Ele me disse que a mãe dele estava no céu, e a Olivia com ele. Só
percebi o que estava tirando dele, quando entendi que a Blanca pode ser a mãe
biologia dele, mas é a Olivia quem dá amor, carinho, e cuida do Lorran como um
filho.

— Para aquele pequeno se apegar a ela assim, a Olivia deve ser uma
mulher incrível. Não acho que a Blanca sentiria ciúmes da Olivia, quem sabe
tenha sido a minha irmã que mandou essa mulher para cuidar do filho dela, já
pensou nisso?

— Nunca.

— A Blanca amou você e ao Lorran com a alma dela, não sabemos o que
acontece no, pós-morte, e nada impediria que uma alma guiasse vocês até aquela
creche, e fizesse você ver brilho na Olivia, quando só via isso no Lorran. Gosto
de acreditar que a Blanca continua cuidando de vocês, e mexendo com o universo
para que o homem da vida dela continue vivo, e possa ser feliz, e para que o filho
dela tenha a chance de ter uma mãe.

— Eu traí a Blanca, não acho que isso possa ser verdade — coço a cabeça
incrédulo demais para acreditar na teoria da Beatrice.

— Não Levi, você foi fiel a ela enquanto a Blanca respirava, os votos de
vocês terminaram no dia em que ela morreu. Continuar vivendo com medo de ser
infiel, ou de magoar a Blanca, tem causado mais danos do que uma traição. Você
realmente acredita que Blanca ficaria feliz em ver você e ao Lorran sofrendo?

— Não, ela nunca ficaria bem com isso — cutuco minhas unhas.
— Qual é o seu verdadeiro medo, Levi? Olhe para dentro de si, e perceba o
que te atormenta. Você falou sobre ter se sentido culpado pela morte da sua mãe e
da Blanca, depois disse estar traindo a Blanca ao colocar Olivia no lugar dela,
mas você não percebe a verdade. A Blanca morreu, sua mãe morreu, e você não
tem culpa no acidente que levou ambas, nascemos com dia, hora, e lugar,
morremos da mesma forma, e ninguém pode controlar isso.

— Se aquele caminhão...

— Se o caminhão não tivesse perdido o controle, se a chuva não estivesse


molhando a estrada, se eu não tivesse irritado a pessoa errada, se eu fosse uma
pessoa melhor, se a doença não existisse... — Beatrice segura meu braço e chega
perto do meu rosto. — Estamos sempre procurando motivos para justificar a
morte, e não aceitamos que ela é natural. Nascemos com um dia marcado para a
nossa morte, e não existe crença ou religião que possa impedir alguém de morrer.
Você pode ter uma morte pacífica, com idade avançada enquanto dorme, como
pode morrer brutalmente assassinado por um membro da máfia. Mesmo quando é
cometido um suicídio, não tem como ter a certeza de que aquilo vai levar ao fim
da pessoa.

— Você sabia... — interrompo e ela aperta meu braço fazendo eu me calar.

— Mesmo quando é cometido um suicídio, não tem como ter a certeza de


que aquilo vai levar ao fim da pessoa. A morte é incontrolável e inevitável, você
continua arranjando desculpas e se culpando, como se fosse um Deus, e não
aceita que você é somente um homem, um filho que perdeu a mãe, e um marido
que perdeu a esposa, e... um idiota que está perdendo uma mulher incrível, e seu
filho no processo, por não conseguir se livrar do medo que te acorrentou.

As palavras da Beatrice batem forte dentro de mim, e o muro que ergui nos
últimos anos desaba, deixando uma dor antiga jorrar para fora do meu corpo
enquanto um desespero novo se aproxima. O medo de perder quem continua
vivo, por ter me apegado a quem estava morta.

Eu posso amar as duas, respeitar a lembrança da Blanca, e ser feliz com a


Olivia, sem causar danos a nenhuma delas.

— Você tem razão.

— Agora vá se despedir da minha irmã, e vamos trabalhar a sua dor nos


próximos dias, temos só uma semana até o casamento do seu irmão.

— Certo.

Corro para o lugar que fica o túmulo da Blanca com o sol se ponto no
horizonte. A euforia por ter uma certeza, e um objetivo, pela primeira vez
dominando o meu peito.

Não vou mais me afogar em arrependimentos, ou sofrimento, serei feliz, e


vou rastejar o quanto for preciso para ter a Olivia de volta, e formar uma família
com ela e o Lorran.

O jardim ao redor do tumulo dela desabrochou, com lindas flores, no


centro, a pedra com o ano de nascimento e morte, um retrato da Blanca sorrindo,
e uma cruz acima.

Fico de joelhos de frente para ela, pela primeira vez que venho aqui, não
tenho vontade de chorar, somente de sorrir.

— Oi, meu amor, desculpe ter demorado a vir esse ano, acho que temos
muito o que conversar. Eu consegui me comunicar com o Lorran, e agora estamos
mais próximos. Ele cresceu tanto, você consegue ver ele do céu? Nosso menino
ficou enorme, e fala tanto, ele puxou a minha mãe o gosto por chocolates.
Respiro fundo e coloco a mão em nossas alianças, guardadas em uma
caixinha de cimento embaixo da foto dela.

— Será que é verdade a teoria da Beatrice, que foi você quem me guiou a
Olivia, para que ela pudesse cuidar do Lorran e me fazer sentir vivo de novo?

Uma brisa toca meu rosto, balançando as folhas ao redor, se a Beatrice


estivesse aqui, diria que foi a Blanca me respondendo.

— Não é errado eu me apaixonar de novo, certo? Eu te amei enquanto


estava viva, e pelos dias e anos seguintes, e ainda te amo, eu só... acho que
aprendi a viver sem você ao meu lado, e não estava pronto para aceitar o nosso
final.

Abaixo o rosto colando a testa a sua lápide.

— Eu te amo Blanca, sempre vou te amar, sou grato pela nossa história de
amor, e por você ter me dado o Lorran, mas agora eu preciso ir atrás da Olivia. É
com ela quem eu quero ficar e ser feliz, você consegue me dar a sua benção
amor? — fecho os olhos, o vento se torna mais forte contra meu rosto, como um
carinho suave — é você, não é? Sempre falou que voltaria com o vento quando
eu estivesse perdido, e me mostraria a direção certa.

O vento se intensifica fazendo algumas pétalas das rosas se soltarem e


voarem para perto de mim. Levando com ele o peso que eu tinha em meu
coração, me permitindo respirar pela primeira vez em três anos, sem sentir que
sou culpado por continuar vivo, ou que fui o causador da morte da minha mãe e
da Blanca.

— Eu sempre irei te carregar em meu coração, mas agora estou pronto para
deixar outra pessoa entrar. Você aceita dividir espaço com ela? — mais uma vez o
vento ricocheteia contra meu rosto, bagunçado meus cabelos — estou enrolando
demais, é isso que você quer dizer? — como se me respondesse, uma rajada me
joga no chão e gargalho — eu entendi o recado, essa é a última vez que te
chamarei assim e falarei essas palavras.

Fico de joelhos, e beijo meus dedos, os levando a foto dela.

— Eu te amo Blanca, meu amor, nos vemos quando eu falecer, e prometo


que nunca mais tentarei causar a minha morte. Só não fica com ciúmes se eu
chegar junto da Olivia, certo?

A resposta que recebo é do vento calmo movendo as flores.

— Adeus, amor.

Me levanto, caminhando de volta para a casa com o coração leve,


observando as estrelas, no céu roxo.

Eu consegui superar a dor e a perda, aceitei a morte da Blanca, e que estou


pronto para viver com a Olivia, farei o que eu puder para a reconquistar, leve
quantos anos for preciso, eu a terei de volta.

****

A semana passa se arrastando, conforme imagino que vou rever a Olivia.


Converso com a Beatrice diariamente, e tenho escutado como passa os dias dela.

Fico preocupado de a Beatrice não ter encontrado ninguém para dividir a


vida, o coração dela continua magoado pelos pais, e não sei se ela será capaz de
se abrir novamente ao amor.

Quando finalmente o dia que eles chegarão a Itália chega, eu me preparo


para a encontrar.

— Vem comigo para o casamento? — chamo pela décima vez. — O Louis


vai gostar de te ver, e você poderá conhecer a Olivia, venha me dar sua benção no
lugar da Blanca.
— Você não desiste — ela suspira — vou arrumar as minhas coisas, espera
aqui.

Uma hora depois, chegamos à casa de primavera da minha família. Ouço


gritos em português vindo da cozinha, e Beatrice olha na mesma direção.

— Vou subir para meu quarto, você vai ver o que aconteceu. — Ela já tem
o costume de ficar aqui conosco, e sobe rapidamente as escadas.

Sigo na direção do som.

Vejo a Olivia brigando com o pai, que a encara furioso.

— Você enlouqueceu?! — Ele grita abrindo os braços.

— Para de gritar pai — Bianca pede e segura o marido pelo braço — o


senhor não sabe o que a fez tomar essa decisão.

— Você sempre foi assim — Marcelo tem os olhos molhados, e Olivia o


encara de queixo erguido, os outros podem não perceber, mas eu noto como o
queixo dela treme. — Faz o que quer sem se importar com o que os outros vão
pensar, você nunca pergunta, e age impulsivamente. Onde diabos eu errei na sua
criação? — fala desgostoso.

— Se você ao menos tivesse me criado — Olivia diz carregada de mágoa


— você nunca foi presente para mim, eu tive de me criar sozinha.

— Cresça, e pare de me culpar pelos seus erros.

— MEU FILHO NÃO É UM ERRO! — Ela berra.

— O quê? — pergunto — ela engravidou?

Olivia vira para mim, e o medo atravessa sua íris, mais rápido do que
consigo processar, o fato dela ter engravidado.
— Não vá tendo ideias — fala cheia de ódio comigo — continuei com a
inseminação artificial, e consegui engravidar, o bebê não é seu.

— ANTES FOSSE — Marcelo grita novamente — ao menos a criança


teria um pai presente, ao invés de ser criado pela mãe solteira, o que vai dizer a
ele quando perguntar pelo pai?

— Falarei a verdade. Eu queria ser mãe, e consegui, não tem mais nada a
ser falado.

— Por que você não pode ser como a Bianca, e ter engravidado de um
homem que te ama, e estivesse disposto a casar com você? Ter esse bebê em um
lar saudável.

— E você acha que alguém me ama? — Olivia não consegue mais segurar
as lágrimas que deságuam de seu rosto pequeno. — Eu devo ser um ser humano
horrível que nunca pôde encontrar o amor de um homem, nem você me amou pai
— o nariz dela escorre, e os soluços fazem seu peito tremer — eu tenho 27 anos e
nunca te ouvi dizer um “eu te amo” para mim, por que você não pode me amar?
— Não seja idiota, é claro que te amo — ele fala baixando a guarda.

Meu peito comprimi com uma nova dor tomando consciência do dano que
causei na Olivia.

— Não, não ama. — Ela olha ao redor, e seu olhar encontra o meu. — O
homem que eu amava me disse no dia do meu aniversário, que eu e ele não
poderíamos ficar juntos, e que eu não tinha o direito de querer ser a mãe do filho
dele. Ele era a minha última esperança de amar e ser amada.

Choro, com o peito comprimido de arrependimento pôr a ter magoado.

— Me perdoa — peço chegando perto — eu não...


— CALA A BOCA — grita — você não pensou no quanto me machucaria
ao dizer aquilo, no dano que deixaria. Vocês dois — olha de mim para o pai — eu
nunca fui importante o suficiente para vocês poderem me amar, e agora que
finalmente realizei meu sonho de ser mãe — leva a mão ao ventre — não deixarei
ninguém tirar isso de mim, ou roubar a minha felicidade. A Bianca e o Louis vão
se casar, e depois voltaremos para nossas vidas, não finjam que me amam só por
que joguei verdades na cara de vocês.

Ela não deixa ninguém a responder e sai da cozinha.

Eu fiz um estrago que não tem perdão ou volta.

Nos últimos dias, eu aprendi que somente a morte tem o poder, de colocar o
ponto final em uma história. Pode demorar 10 ou 50 anos, farei com que a Olivia
me perdoe, e se ela quiser, teremos a nossa família e serei um pai para o seu bebê,
como quero que ela seja a mãe do Lorran.

Olivia
Eu não queria que eles soubessem, mas não consegui evitar, o enjoo que
passei a tarde, pirou quando jantamos.
Meu pai desconfiou, e Bianca perguntou. Eu sabia que era questão de
tempo até a minha barriga começar a crescer, e eu ter de explicar quem era o pai
do bebê.

Optei por mentir para eles até decidir como contar sobre a gravidez ao
Levi, meu pai foi cruel em suas palavras, e eu queria machucá-lo, é injusto eu ser
a única ferida.

Quando vi o Levi, ele parecia bem, sem bolsas debaixo dos olhos, o cabelo
arrumado e o rosto mais rechonchudo. Ele estava bem, enquanto eu me acabo em
sofrimento devido à rejeição dele.

Disse o que estava preso em minha garganta e não me arrependo.

Os olhos azuis podem transbordar arrependimento ou pena, não me


importo em decifrar o que ele esconde em seu interior. Nunca mais colocarei
outra pessoa acima de mim, todos podem se desfazer na minha frente, que eu irei
continuar em frente, e priorizando o meu bem-estar.

Corro para fora da cozinha, e ouço passos atrás de mim, acelero na direção
do jardim, não quero ver ou falar com ninguém. Atravesso as portas de vidro, e
em meio a corrida eu tropeço na grama, indo ao encontro do chão, braços fortes
rodeiam minha cintura impedindo minha queda.

Eu conheço esse cheiro, é do primeiro homem que magoou meu coração, e


me fez viver buscando por algo que ele nunca me deu.

— Vamos conversar, por favor — meu pai pede beijando minha cabeça e
não o encaro, sento-me no chão de costas — como você pode pensar que eu não
te amo Olivia?
— Você nunca disse — fungo — cresci ouvindo suas repreensões, e
quando a mãe morreu, você me abandonou, sofrendo por ela — tremo com os
soluços.

— Eu deveria ter percebido o que acontecia com você antes.

Ele alisa o topo dos meus cabelos, e me puxa contra seu peito, afagando
minhas costas. Não tenho forças para continuar lutando contra ele ou qualquer
outra pessoa, cheguei ao meu limite emocional, e não sei o que fazer para me
sentir bem novamente.

— Vamos por parte, certo? — a voz dele fica mais grave — quando
conversei com a Bianca e percebi estar sendo injusto com ela, eu comecei a
lembrar do passado, e a notar que fiz o mesmo com você, fui duro demais na
criação de ambas, e causei feridas que vão para além da nossa relação.

— Você se desculpou com ela — murmuro — mas nunca pensou em falar


comigo.

— Eu estava com vergonha, Olivia — tento me soltar e ele me aperta mais


forte.

— Não seja ridículo — ralho.

— Você não é obrigada a acreditar, mas estou sendo sincero, fiquei


envergonhado ao perceber o que fiz com as minhas filhas, e não soube como
pedir desculpas. Nunca tivemos uma relação aberta, e eu não sabia como me
aproximar, fui te machucando ao longo do caminho, e hoje eu vejo o resultado
das minhas ações.

— Não importa mais — sussurro — não tem mais o que ser perdoado.

— Tem sim — sinto o nariz dele deslizando em minha cabeça — quando


sua mãe descobriu a doença, foi um choque para ambos, eu a amei com a minha
alma, e sem a Eduarda, respirar era dolorido. Quando você e a Bianca nasceram,
eu senti que estava sendo abençoado com anjos como resultado pelo meu amor e
o da Duda.

— Você esqueceu fácil disso — acuso, querendo o fazer sofrer como eu,
que seu peito seja despedaçado e rasgado.

— Eu prometi a Eduarda que iria cuidar de vocês, mas quando ela deu o
último suspiro, eu fui com ela, uma parte minha morreu, e a que ficou não sabia
como continuar. Me afoguei no luto e na bebida.

— Igual ao Levi, eu fui uma grande idiota por achar que ele seria diferente
de você — percebo, a relação tóxica que tentei fugir do meu pai, foi reproduzida
no Levi, e com isso o resultado foi o mesmo; ... Destruição.

— Não conheço o Levi, e não vou falar por ele, somente por mim. Eu não
conseguia ver nada ao redor pelos meses que se seguiram a morte da Eduarda.
Em uma manhã, eu acordei e você já tinha sete anos, vestia o uniforme da
Bianca, e dava de comer a ela, o resto de um pão velho. Você segurou a mão dela,
quando Bianca terminou de se alimentar, e a levou para escola, sem reclamar da
fome.

— Era final de mês e nossa tia não tinha enviado a cesta básica que ela
dava para nos ajudar enquanto você sofria, e eu não quis pedir as vizinhas, já
fazia três dias que me alimentava somente da merenda da escola, para que a
Bianca não passasse fome.

Pela primeira vez em anos eu escuto o meu pai chorando. Os braços dele
tremem ao me redor, enquanto ele tenta recuperar a respiração. Lembrar da
infância traz um gosto amargo, eu era pequena e precisava de proteção, mas ele
não conseguia me ver.
— Não consigo reparar o erro que cometi naquela época, quando vi aquilo,
eu me dei conta de que você e a Bianca continuavam vivas, e eu tinha de voltar a
trabalhar para sustentar a casa. Arrumei o primeiro emprego que consegui como
segurança, e usei o cartão para fazer a feira, quando você chegou, seus olhos se
iluminaram ao ver a comida, e eu te fiz uma promessa naquele dia, você lembra?

Tento recordar do que ele fala, as lembranças que tenho da infância se


resumem a dor e a fome, a cuidar da Bianca, e a ver o meu pai sofrendo.

— Você só tinha sete anos, e a Bianca 4 anos, eu nem sei como você tinha
conseguido a matricular em uma creche.

— Foi a tia Denise, ela que conseguiu a vaga, e mandava os alimentos.

— Denise não me contou, e ela será a próxima a quem vou agradecer por
cuidar dos meus anjos quando eu não pude.

— Você nunca fez nada — rosno.

— Eu fiz Olivia, mas você não lembra por que era pequena demais, o que
se instaurou no seu coração foi a dor. Quando vocês chegaram naquele dia, você
chorou ao ver os armários cheios, e a Bianca correu para o meu colo, eu me
ajoelhei na sua frente e prometi que não deixaria mais vocês passarem fome, e
iria cuidar novamente de ambas.

— Mentira — não pode ser verdade, eu não consigo me lembrar.

— Depois daquela vez, vocês voltaram a passar fome?

— Não — murmuro.

— Quem te acordava e arrumava a Bianca, e depois deixava ambas na


escola?

— Você.
Não tem como ser verdade, eu não consigo me lembrar da conversa com
ele, mas sei que depois que voltamos da escola naquele dia, o meu pai tinha
voltado a cuidar da casa e da gente.

Eu achava que ele tinha acordado para a vida e era somente isso, sem
conversar, sem se explicar ou pedir desculpas.

Bato no peito dele com os pulsos, ele não tem esse direito, após anos, não é
justo que me conte somente agora o que aconteceu naqueles dias sombrios.

Ele nunca cuidou da gente, não pode ser verdade, porque se for, eu passei a
vida presa na mágoa, e não abri meus olhos para o que acontecia ao meu redor
além do que imaginei.

— Eu fui duro com você e com a Bianca, não vou negar isso, me
entristecia te ver pulando de namorado em namorado, e saber que as vizinhas
falavam mal da minha menina, por como ela se comportava. Eu sabia que você
estava presa a mágoa que te causei na infância, mas eu não podia deixar que você
continuasse sendo vista como uma vagabunda, brigamos e discutimos mais vezes
do que sou capaz de lembrar.

— Você estava querendo me defender? — o encaro, os olhos vermelhos e o


rosto banhado em lágrimas, arfo ao ver a dor refletida nos olhos dele.

— Do meu jeito errado e cruel, sim. Eu queria que as pessoas parassem de


te chamar de vadia — ele alisa meu rosto — mas eu também estava preso a
vergonha pelo que te obriguei a passar, e sabia que a culpa era minha. Perdia o
controle quando discutíamos, e falei muita besteira, me perdoa por escolher a
forma errada de te proteger.

— Você não pode fazer isso — bato no peito dele com força enquanto grito
frustrada — não é justo me dizer isso tudo quando explodo, você partiu meu
coração — berro, caindo contra o peito dele, sem forças para continuar
alimentando o ódio.

— Você sempre foi o meu orgulho, Olivia — ele me abraça, o corpo


soluçando e balançando o meu — eu tenho todos os nossos momentos juntos
guardados em meu coração, quanto mais eu te via crescendo, mais eu queria te
pedir perdão, e dizer o quanto você me deixava orgulhoso. Lembra do dia da sua
formatura? Eu falei baixinho no seu ouvido que te amava. Você não me
respondeu, e não tenho certeza se percebeu, sua atenção estava focada em um
rapaz.

“Sem dizer mais nada, ele segurou minha cabeça, beijou minha testa e
disse o quanto me amava e estava feliz pela minha conquista.”

Era verdade, como eu pude esquecer disso?

A lembrança da formatura destrava a minha mente, e inúmeros momentos


retornam como uma bomba, explodindo em minha cabeça e permitindo ver o que
eu tinha apagado.

No ensino médio, meu pai indo me deixar e brigando com o Gustavo, o


garoto que tinha ficado comigo e espalhado que estávamos transando. Ele só
parou depois que levou uma prensa do meu pai.

Ele me defendeu, e eu esqueci.

Eu tinha saído para uma festa com minhas amigas, e já era quase três horas,
os pais delas buscaram a todas, e a minha carona não aconteceu, porque a mãe da
Julia foi de moto e eu fiquei sozinha.

Meu pai estava trabalhando, eu liguei para ele e depois ele chegou para me
pegar no carro do patrão. O caminho para casa foi com ele brigando e me
chamando de irresponsável.
Ele sabia que podia ser demitido, e foi me buscar. Ele cuidou de mim e eu
só absorvi as reclamações.

Era Dia das Mães no colégio, eu e Bianca estávamos tristes, e ele nos levou
para uma viagem ao sítio da família, passou o dia conosco e a tristeza foi apagada
pelos momentos em que estivemos juntos.

Ele não deixou que ficássemos magoadas pela ausência da nossa mãe.

Momentos de brigas, marcados, começam a ter a verdade sobre eles


revelados. Como eu pude ver somente o monstro, e esquecer que ele cuidava de
mim?

Desabo chorando contra seu corpo, a garganta doendo e a cabeça


explodindo. O mundo girando ao meu redor, ao perceber que mergulhei em um
poço de amargura e mágoas, moldando a realidade ao que eu queria acreditar,
pintando meu pai como um vilão, quando ele sofreu como eu e tentou consertar
as coisas cuidando de mim e da Bianca, por cada segundo desde a manhã que ele
acordou para a vida.

— O ódio tem obscurecido seu coração, e te impedido de ver o amor,


Olivia. No segundo em que o Levi entrou na cozinha, eu percebi que você estava
apaixonada, e que ele sentia o mesmo, conversa comigo minha menina, deixa eu
ser o seu pai. Já perdemos muitos anos presos na dor, vamos ser felizes juntos.
Eu te amo minha garotinha, guarde para sempre essas palavras.

— Papai — soluço, sem forças para continuar.

— Me perdoa por ser duro com você, quando soube do bebê, e que você
fez inseminação, fiquei louco, preocupado em como você criaria a criança
sozinha. Você nasceu para amar e ser amada Olivia, seu filho deveria ser
concebido com amor, e não por sua obsessão de ser mãe. O carinho que você
procura em um filho, você sempre o teve ao seu redor, minha menina, só estava
cega para perceber.

Sem forças, eu me encolho contra o carinho dele, e choro até meu corpo
desidratar e o ar entrar com dificuldade por meu nariz entupido. Sinto como se
tivesse chegado ao fim de uma maratona.

Liberta pela primeira vez do ódio.

— É do Levi. — Admito após segundos em silêncio.

— Vai contar a ele?

— Vou, o Lorran quer um irmãozinho, e eu amo tanto aquele menino — a


vontade de falar com meu pai transborda, e eu conto a ele tudo o que aconteceu
entre mim e o Levi desde que o conheci na creche, e como ele me jogou para fora
da sua vida.

— Não vou falar pelo Levi, mas talvez, existe a possibilidade de ele ter
feito o mesmo que você, se afogado no ódio, não conseguindo enxergar o amor
que ele tinha ao redor.

— Acredita nisso?

— Sim — beija minha testa — conversa com ele, sem a mágoa


obscurecendo seus pensamentos, Olivia, você já sabe como é viver com o ódio no
coração, te impedindo de ser feliz. O ouça com o coração, e não com a mente,
depois você decide o que fazer.

— Depois, não tenho forças para isso.

— Quando estiver pronta estarei aqui para te oferecer colo e muitos beijos
— enche meu rosto deles. — Vamos nos deitar, o sol está quase nascendo.
Olho para o céu e vejo o azul-claro tomando o lugar da escuridão. No
horizonte o sol nasce, trazendo um novo dia e iluminando meus pensamentos.

Eu vivi 20 anos mergulha na dor e no ódio, se eu repetir com o Levi o que


fiz com o meu pai, não poderei seguir em frente.

Eu quero amar e ser amada.

Não somente por um filho, mas por um marido, um amor que pare de me
magoar, e possa me fazer ser feliz. Vou escutar o Levi somente uma vez, para
decidir o que fazer em seguida.

Olivia
— Você é a minha madrinha e não pode continuar evitando o padrinho! —
Bianca bate o pé.

Já se passaram uns dias que conversei com o meu pai, e o Levi tenta
chamar a minha atenção para podermos resolver nossas pendências.

Antes eu estava espumando de raiva, e queria o magoar, mas as coisas


mudaram, e preciso de um tempo para mim, poder respirar e acalmar meus
sentimentos, ao invés de ir falar com ele para saber o que aconteceu naquele dia,
e se ele realmente me quer em sua vida.

Estou em dúvida se quero dar uma segunda chance a nós dois. Meu coração
continua apaixonado, e sem a mágoa pelo meu pai obscurecendo meus
pensamentos, tem se tornado, mais difícil, continuar firme, e longe do Levi, sem
vacilar quando me encara com os olhos cheios de arrependimento, e a boca aberta
para falar o que me recuso a ouvir por medo.

Medo dele não me querer mais.

Medo dele dizer que vai morar na Itália com o Lorran.

Medo de contar sobre a gravidez, e ele me rejeitar.

Medo dele não amar nosso bebê.

Medo de o perdoar, e depois de um ano, voltar a sofrer novamente quando


ele perceber que ama a Blanca, e prefere passar o dia da morte dela sofrendo, do
que comemorando meu aniversário comigo.

Eu e ela temos a data em comum, o dia da morte dela, e do meu


nascimento.

Estou com medo de abrir meu coração para o Levi novamente, me entregar,
e acabar do mesmo jeito, rejeitada.

— Quando formos entrar a gente se fala — dou de ombros.

Terminei a prova do vestido, e o casamento é amanhã. Estou uma pilha de


nervos em pensar que terei de caminhar com ele ao meu lado. Sem portas entre
nós, sem fones de ouvido me impedindo de escutar suas palavras. Sem meu pai
para o manter longe, e respeitar o meu tempo. Será somente eu e o Levi
caminhando pelo altar e ficando lado a lado, enquanto a minha irmã casa.
— Não — bate o pé — você vai conversar com ele agora, e chega de fugir.

— Você não pode decidir isso, Bianca — suspiro.

— Já cansei de te ver sendo a mulher maravilha, é o meu casamento, e


estou assumindo as rédeas da situação a partir de agora — cruza os braços — tira
o vestido e vá conversar com o Levi, pare de ser covarde!

— Me deixa ser covarde ao menos hoje — suspiro — prometo que depois


do casamento eu converso com ele, mas preciso de tempo para organizar o que
está aqui dentro — aliso meu peito.

— O filho que você espera é dele? — ela pergunta, mas vejo certeza em
seu olhar. Aceno em positivo e Bianca suspira — eu sabia, você nunca foi boa
mentirosa, e se o Levi acreditou naquilo, é um tapado. Você viu o quanto eu sofri
ao tentar esconder do Louis a paternidade da Cecília, e o quanto fui feliz após o
aceitar novamente. Viver com a mágoa só vai gerar mais sofrimento, Olivia.

Bianca se aproxima e alisa meu rosto, escondendo os fios de cabelo atrás


da minha orelha. Beija minha bochecha e me puxa para seus braços.

— Minha irmã que sempre quis ser amada e ter um bebê. Seu momento
chegou, você conseguiu engravidar, e tem um homem desesperado, querendo te
dar amor e uma família. Não passe mais um único segundo sofrendo por medo ou
raiva, sentimentos ruins nos destroem de dentro para fora, o amor cura todas as
feridas, trazendo uma felicidade que transborda.

— Depois do casamento — prometo a ela — eu só preciso de um


tempinho.

— Sua cabeça dura — empurra minha testa para trás — combinado, ao


menos fale civilizadamente com ele, ou diga que depois do casamento vocês
conversam. Ele já sofreu demais por um amor, não o faça repetir o ciclo por
outro.

— Tá — aceno.

— Vamos, temos muito o que resolver ainda.

O dia passa rápido e mal posso registrar os momentos com a minha irmã,
correndo de um lado ao outro com os preparativos.

Quando a noite chega, sentamos a mesa para jantar, e o Levi vem na minha
direção, quando é puxado pela Beatrice, que eu descobri ser a irmã da Blanca,
indiretamente e sem que eu tenha pedido, ela ajuda a manter o Levi distante.

Ela parece entender que estou fugindo, e que preciso respirar antes de o
encontrar, e podermos conversar para decidir sobre a nossa vida.

Já aceitei que vou contar a verdade sobre meu neném, não a privarei de ter
um pai devido à minha mágoa. O Lorran será um irmão maravilhoso, e meu peito
aquece só de imaginar ele brincando com ela.

— Zia vivia — Lorran corre para mim e o pego no colo — é veldade que
você vai ter um bebê?

— Sim, meu anjinho — beijo seu rosto e o sento ao meu lado para
jantarmos.

— Deixa eu blinca com ela? — os olhos dele brilham e aquilo faz eu


transbordar por dentro.

— O quanto você quiser — pego a mãozinha dele, e a coloco sobre o meu


ventre — ela ainda é do tamanho de uma castanha e vai ficar dentro da minha
barriga até poder vir ao mundo, quando ela chegar, promete que vai ser um bom...
— me calo ao perceber que iria dizer “irmãozinho”, observo ao redor, e Levi tem
os olhos fixos em mim, a expressão cheia de expectativa pela minha fala — com
ela — opto, mais seguro.

Lorran não saberia guardar o segredo, e o Levi não pode saber por outra
pessoa além de mim que será pai, tenho medo da reação dele.

— Sì — sorri e beijo sua bochecha — como ela entrou aí? A Zia Bibi não
me disse como a Cecilia entrou e saiu dela — faz bico e mordo sua bochecha o
fazendo rir.

— Eu desejei muito por um filho, e meu pedido foi atendido — aliso seus
cabelos — quando ela nascer, te conto como foi, combinado?

— Sí!

O jantar é servido, e comemos conversando, fujo do olhar intenso do Levi


o quanto posso. Ao terminamos, eu pego Lorran, e o levo para o meu quarto,
quase correndo em minha fuga.

Fecho a porta antes que o Levi consiga chegar até mim. Só mais um dia
para acalmar o meu coração, é disso que preciso.

— Levi! — Ouço a voz da Beatrice do outro lado da parede.

— Você precisa — Lira fala — deixar a Olivia respirar, homem!

— Passa já para o seu quarto! — Dou risada pela forma autoritária da


Beatrice.

— Se eu te pegar correndo atrás da Olivia de novo — Lira diz — juro que


vou te amarrar na cama até a hora da cerimônia.

— Vocês duas são uma dupla de capetas! — Ele esbraveja, e o Lorran


gargalha comigo. — Eu preciso falar com ela e não vou sair daqui até conseguir!
— Amanhã — eu grito — conversamos, vá embora.

— Promete? — posso quase ver os olhos pidões dele.

— Sim.

— Vamos nos resolver Olivia e tudo vai ficar bem — o sinto no outro lado
da porta.

— Vai imblola papai — Lorran pede rindo — zia vivia vai mimi com eu.

— Não me troca Lorran — Levi pede, e o filho gargalha mais, sem


entender a situação.

— Num to tolcando, só quero mimi com a zia vivia. Boa noite, papai.

— Vem anjinho — o pego pela mão e o levo ao banheiro para o banho, e


escovar os dentes.

Na cama, Lorran deita a cabeça em meu peito e fica alisando minha


barriga, enquanto faço carinho em sua cabeça para pegar no sono.

— Ela vai ser sua filhinha, zia vivia?

— Sim, fofinho.

Lorran levanta a cabeça escorando o queixo em meu peito, e o olhar dele


desvia várias vezes antes de focar em mim.

— Eu também quelo ser seu filhinho.

— Lorran — o puxo para cima, colando nossos narizes — você quer que
eu seja sua mãe? — minha garganta trava, mal consigo respirar tomada pela
emoção.

— Sì — beija a pontinha do meu nariz.


— Eu quero muito ser a sua mãe Lorran — sussurro sem conseguir conter
as lágrimas, e o encho de beijos, ouvindo a gargalhada gostosa do meu menino —
meu Lorran, meu filho — beijo sua bochecha até ele ficar vermelho, quando
cesso meu ataque e as lágrimas param, com o coração explodindo fogos de
artifício como no dia em que descobri que teria a minha menina.

— Mamãe — enche a boca para falar e repete a palavras várias vezes,


rindo enquanto o beijo.

— Meu filho!

— Vamos contar ao papai? — pergunta com tanta fofura que tenho vontade
de o morder.

— Sim, ele agora tem de saber que você é meu também.

Lorran se levanta em um pulo, e corre apressado para a porta do quarto,


ficando na pontinha dos pés para alcançar a fechadura. Acho fofo demais como
ele se estica, e abro a porta o deixando correr.

Essa é uma felicidade, e momento dele, se ele quer compartilhar, eu não


vou impedir. O sigo pelo corredor até parar de frente a porta do quarto do Levi.

— Oi?

Ele surge com a calça pendura no quadril, mostrando um pouco da pélvis, e


aquilo bate forte no meu ventre e o desejo ascende ao analisar seu corpo.

Ele ganhou peso, e o quadril ficou mais largo, peitos e ombros. O pescoço
grosso com uma veia saltada, a mandíbula dura e contraída ao me flagrar o
encarando.

Tenho saudade de ser beijada por sua boca rosa, carnuda, de ser chupada
por sua língua, e me sentir protegida em seus braços fortes. De dormir ouvindo o
som da respiração dele, e recebendo carinho dos seus dedos. De ficar eu, ele, e o
Lorran na cama, o pequeno dormindo entre nós, enquanto deixávamos nossos pés
entrelaçados.

Eu o quero.

Eu anseio por seu amor.

Meu peito sangra desde que ele foi embora, a ferida não consegue
cicatrizar pelo medo de uma nova rejeição, e vai continuar aberta enquanto eu o
mantiver longe.

Estou causando danos a mim mesma.

— Papai — Lorran chama sua atenção estendendo os braços — eu tenho


uma mamãe.

— Claro que tem — Levi fala sem entender o que o filho quis dizer. Ele
não vai me aceitar como a mãe do Lorran, dou um passo à frente, querendo calar
o pequeno, e paraliso — a Olivia é sua mamãe na terra, e a Blanca sua mamãe no
céu.

— Sì — Lorran comemora.

E eu vou ao chão.

Com as mesmas palavras que ele usou para me quebrar, ele fechou a ferida
aberta. Me aceitou como a mãe do Lorran, sem que eu falasse nada, sem que o
Lorran dissesse ou me chamasse assim.

Levi me aceitou.

Mesmo que eu o esteja afastando.


Eu fui realmente rejeitada naquele dia ou o Levi estava cego pela dor, como
eu passei a vida toda?

Vejo pés na minha frente e levanto o rosto, uma mão estendida para mim.

— Vamos colocar o Lorran para dormir, quando você estiver pronta


falamos.

— Certo.

Tremo ao segurar sua mão na minha, ele me puxa rápido e bato em seu
peito. Lorran aperta meu pescoço e o do pai.

— Somos uma família Olivia — Levi sussurra em meu ouvido e beija meu
ombro — não chore mais, você tem tudo o que sempre quis, estarei ao seu lado
durante o percurso. Você me aceitando ou não, como seu, o Lorran continua
sendo seu filho.

Transbordo em lágrimas enquanto sou acalentada pelos homens da minha


vida. Meu pequeno filhinho, e o homem que eu amo.

Levi não fala mais nada, enxuga as lágrimas no meu rosto, e puxa minha
mão para o seu quarto.

O sigo em silêncio, nos deitamos na cama com o Lorran entre nós, e seu
braço estica acima da cabeça do filho, alisando meus cabelos, as pernas
entrelaçadas enquanto pego no sono, presa nos olhos azuis.

Ele me aceitou como a mãe do Lorran, não tenho mais dúvidas quanto a
contar a verdade sobre a paternidade da minha menina.
Olivia
Acordo antes do Lorran e do Levi, observo pai e filho dormindo lado a
lado, e não consigo impedir o cenário na minha mente, do Lorran segurando a
irmã nos braços, e dela encostada no peito do Levi, dormindo tranquila, protegida
pelo pai.

— É bom, né? — ele pergunta de olhos, fechado, e me assusto — imaginar


nossa menininha dormindo conosco — abre as pálpebras, os olhos carregados de
carinho — será que ela terá seus cabelos castanho escuro ou louros como o meu?

— O-quê? — travo o ar na garganta, não tem como ele saber.

— Eu falhei com você Olivia. — Se senta devagar, passa por cima do


Lorran, apoia um braço de cada lado da minha cintura, e vem sobre mim,
enquanto me afasto, encostando a cabeça no travesseiro. — Fiquei cego em meio
a dor do luto, e não percebi a felicidade nos meus dias, causada por você e pelo
Lorran — seu nariz desce ao encontro do meu, e o coração dispara ensandecido
— você aceitou o meu filho como seu. — Desliza carinhos pelo meu rosto, fecho
os olhos não aguentando a ansiedade causada pela sua presença. — E se você me
rejeitar, e me mandar embora, eu vou ser teimoso e não partirei. Você pode não
querer, recusar, me bater, e me xingar. Continuarei aceitando sua filha como
minha — a mão dele repousa em meu ventre — eu vou ser o pai dela, e do
Lorran, você vai ser a mãe deles, estando juntos ou separados. Nada, nunca,
poderá mudar isso.

— Isso é seu pedido de desculpas? — entalo, não querendo colocar o


orgulho de parte, antes de conversamos direito.

— Não — beija minha bochecha, travo o pescoço me recusando a buscar


por seus lábios, ainda não — estou te informando como será o nosso futuro. Você
não vai ficar longe do Lorran, e eu não ficarei da sua bebê, se quiser, moramos no
mesmo apartamento, ou de frente para o outro, eu vou te perseguir enquanto tiver
ar em meus pulmões, e no além, entraremos juntos no paraíso.

— Você tem um ano — decido — prove que mudou com ações e não
palavras, e considero a sua proposta.

— Um ano é muito tempo para dois corações que se amam — ele


serpenteia os lábios perto dos meus, e arfo baixinho, abrindo a boca.

— Você passou três anos sofrendo pela Blanca, como vou confiar que não
me afastará novamente quando sentir a falta dela? Não posso me entregar sem ter
certeza Levi.

Fecho os olhos, exausta de lutar contra a corrente e de esconder meus


sentimentos.

Eu o quero de volta, quero seu amor e sua paixão, me sentir amada em seus
braços. Mas não posso entrar em uma nova relação com mágoas em meu peito
que me farão duvidar dele, e não conseguir ser sincera quanto aos meus
sentimentos, por medo da rejeição.

— Eu amo você, e a rejeição no dia do meu aniversário queima em meu


peito todos os dias, não quero viver cegada pelo ódio e no desespero. Eu me
recuso a viver com dúvidas, se você quiser, é um ano sem me tocar, beijar, e
declarações, ou o que você possa pensar para me fazer ceder, quero ter a certeza
de que você mudou antes de te deixar entrar novamente.

— Eu já entrei, Olivia — beija minha testa — tenho uma contraproposta.

— Como assim? Você não tem direito a negociação.

— Vamos fingir que eu tenho — morde minha orelha e me encolho.

— Passarei os próximos nove meses em quarentena, você me usa como


quiser, meu corpo, alma, e coração, a sua disposição e eu não vou exigir nada em
troca. — Ele tem a voz suave e o olhar decidido — Quando a bebê nascer, se
você me deixar registrar ela no meu nome, como o pai legitimo, será a prova do
seu perdão, nos três meses seguintes, vamos preparar o nosso casamento, e no seu
aniversário a gente se casa na igreja, templo, ou na mansão, onde você decidir.

— Isso não é justo — soluço baixinho — você está mudando as regras.

— Eu quero que você seja feliz Olivia, quero te amar e te deixar fazer
perceber que eu pertenço a você, e você a mim — segura minha mão a levando
ao seu peito — eu te amo Olivia, esse coração bate por você, e continuará assim
para sempre.

Ali estão elas as palavras que ansiei ouvir feito uma louca desesperada para
ser amada. Engulo em seco, ele podia ter dito isso antes de me machucar com
crueldade.

Não posso o aceitar ainda, e não quero continuar longe, infligindo dor a
mim mesma. Não sei o que fazer ou qual caminho seguir, fecho os olhos
inspirando fundo e decidindo:

— Levi — murmuro, a um passo de ceder.


— Sim? — seus lábios tocam os meus de leve, um carinho, deixando que
eu decida se o beijo ou não.

— Não será do seu jeito — ergo o queixo — vou te usar como eu quiser e
só te terei quando eu estiver pronta.

— Pode usar do jeito que preferir — sua coxa desce entre a minha perna,
tocando meu ponto sensível — vou adorar ser seu bichinho de estimação — beija
meu pescoço — me maltrate ou me ame, mas não me mande embora.

— Seu desgraçado — soluço, agarrando forte seus ombros — você não vai
ser nada além do meu brinquedo, ouviu?

— Sim, senhora — morde meu lóbulo, e me encolho — quais suas ordens?

— Vá fazer o meu café — o empurro — e tenha modos perto do Lorran —


olho nosso menino dormindo, alheio ao que acontece com os pais.

— Sim senhora.

Ainda temos muito o que conversar, as mágoas não foram cicatrizadas por
completo. E ainda tenho medo de me magoar, vou usar esse ano para ter a certeza
de que Levi mudou, enquanto conversaremos sobre tudo o que aconteceu entre
nós.

Por enquanto, vou aproveitar a felicidade de ter meu menino, e saber que
ainda pode existir um futuro, em que eu esteja junto do pai dos meus filhos.

— Bom dia mamãe — Lorran desperta com preguiça, se esticando e


fazendo careta, beijo sua barriga arrancando gargalhadas dele.

— Bom dia meu filho — beijo sua bochecha — vamos tomar banho?

— Sì — estica os braços.
Levo o Lorran para o banho, e descemos para tomar café. O cheiro de
queimado chama nossa atenção, e corremos para a cozinha, onde o Levi coloca
uma frigideira na pia enquanto a Beatrice tem as mãos na cabeça.

— Eu só tentei fazer um ovo — ela diz.

— Você não pode chegar perto do fogão — Levi ponta para a mesa — vá
sentar que eu faço isso.

— O que aconteceu? — pergunto.

— A Beatrice tentando colocar fogo na mansão — Levi ralha — ela não


sabe fritar um ovo!

— Papai ta blabo — Lorran gargalha, achando a situação divertida — Zia


Bea — corre para a tia que o pega no colo, e o enche de beijos — eu tenho uma
mamãe — olha para mim e chama — vem conhecer minha zia Bea, mamãe.

— Oi — digo tímida, se essa mulher é a irmã da Blanca, ela pode não


gostar de ver o sobrinho me chamando assim.

— Prazer, Olivia — me puxa para um abraço, com o Lorran de lado —


estava louca para falar com você, mas tinha de controlar o afoito do Levi, para ele
te deixar respirar — alisa meu braço — não pegue leve com esse asno.

— Estou fazendo isso — digo rindo, e aliviada, ela tem carinho no rosto.

— Ouça minhas palavras como se fossem as da minha irmã: obrigada por


cuida do Lorran e ser a mãe dele — beija minha bochecha, e pisco contendo as
lágrimas, suas palavras tocam minha alma — e se você conseguir, não torture
muito o Levi, sei que você e ele já sofreram muito.

— Como... sabe?
— Ele passou os últimos dias na minha fazenda, curando a alma, e se
despedindo da Blanca, para poder libertar o coração dele do medo, da dor, e da
perda, para existir somente você. Eu te garanto, o coração dele só tem você — me
abraça novamente — quando estiver pronta, aceite a felicidade.

— Certo.

É o que respondo.

Então foi isso que ele fez nos últimos dias? Deu adeus a Blanca para
continuar comigo? Não sei o motivo, mas ouvir isso dá Beatrice, alivia
mais meu coração, do que escutar do Levi.

É uma prova de que ele realmente se esforçou, e pensa em mim, quando me


sentir pronta, ouvirei como foi esse momento de despedida e aceitação.

O dia passa voando com os preparativos do casamento, e quando a tarde


chega estou vestindo o vestido de madrinha, pronta para entrar com o Levi.

— Me ajuda — Lira pede pouco antes de ir para o lugar dela.

— O que houve? — questiono.

— Sabe o Daniel — aponta um dos convidados do Louis — ele é muito


gato, e eu quero ficar com ele — alterna o peso de um pé para o outro — acho
que ele quer também, desde que chegou fica me arrodeando, e puxando assunto.

— Ele é muito lindo — observo o homem sentado.

Em um terno sob medida, os cabelos negros aparados, e com fios grisalhos


que realçam o chame sexy exalando dele. O maxilar quadrado, e olhos castanhos
hipnotizantes.

Entendo o motivo da Lira se sentir atraída, eu também ficaria assim com


esse homem me devorando com o olhar, como ele faz com ela.
— E educado, gentil, com um cheiro — revira os olhos e abana o rosto —
enfim, eu tenho um dedo podre para homens, e não quero fazer besteira, me
ajuda?

— Com o quê?

— Sonda ele para saber quais são as intensões dele, flertando comigo desse
jeito.

— Lira, vocês nem se conhecem, e já quer saber se o homem, quer namorar


ou transar com você?

— Exatamente! — Arregala os olhos — faz isso por mim?

— Tá, me dá um segundo.

Caminho entre os convidados, e me sento ao lado do Daniel.

— Prazer, sou a irmã da noiva — o cumprimento.

— Bom te conhecer — olha para a Lira — diz a ela que se quiser falar
comigo terá de vir pessoalmente.

Fico empertigada pelo jeito convencido dele, me lembra ao Louis quando o


conheci.

— Vou dizer a ela para manter distância de um babaca como você!

Levanto e ele puxa minha mão.

— Desculpe, mas ela que tem fugido quando me aproximo. Se quer


informações, ela que venha descobrir.

— Idiota — reviro os olhos e volto para a Lira — ele é um cafajeste, igual


ao seu irmão, deu para perceber isso só conversando, não se envolva.
— Aí merda — balança as mãos — tenho um fraco enorme por cafajestes.

— Não caia na dele. Lira — peço sentindo que ela vai.

— Claro, pode deixar.

Lira não me escuta e vai se sentar ao lado do Daniel.

Tenho medo do que resultará desse envolvimento.

— Vamos? — tremo, ao ouvir a voz do Levi ao meu lado.

— Sim.

Seguro seu braço e sou embriagada pelo seu cheiro, exalando pelo paletó
cinza, abraçando suas curvas perfeitamente.

A cerimônia inicia, e quando caminho ao lado dele para o altar, eu sonho


em um dia ser eu vestida de noiva, sendo entregue por meu pai ao homem que me
ama.

Olho para o Levi, e ele tem os olhos fixos em mim.

Posso realmente acreditar que ele não me magoara novamente, e seremos


felizes juntos?
Levi
O Louis e a Bianca sumiram depois de algumas danças, Lorran e Cecilia
dormem com meu pai cuidando de ambos, e as tias babonas querendo velar pelo
sono dos mais novos.

Lira, eu tenho certeza de que a vi se agarrando com o amigo do Louis,


aquele cara não vale um centavo no quesito mulher, e se envolveu com a minha
irmã.

Quebro a cara dele se a fizer sofrer.

Beatrice conversa cheia de sorrisos com o Cowboy, filho do senhor que


cuida da nossa casa de primavera, não o conheço bem, mas vou ficar de olho
nesses dois.

Olivia tem um sorriso, observando a festa, e bate o pé no chão, inquieta.


Aproximo a boca do seu ouvido e sopro em sua pele a fazendo se arrepiar e dar
um saltinho.

Ela me encara com vontade de me bater, ou me beijar, deve estar decidindo


qual das duas é o mais adequado para a ocasião.

— O que você quer fazer? — ela rosna, e eu me tremo de vontade de ter


essa mulher de volta para mim.

— Eu disse para você me usar como o seu brinquedo, estou esperando —


abro os braços, oferecendo meu corpo.

Olivia semicerra as pálpebras, e vira para o lado me ignorando. Chego


perto do seu pescoço cheirando a pele sedosa
— Você também sente minha falta — deslizo o braço em sua cintura a
puxando para mim — vamos conversar e resolver nossos problemas, para
podermos nos amar.

— Um ano Levi. — Rosna.

— Sim, um longo e torturante ano, que podemos passar aproveitando nosso


filho e nossa menina — aliso seu ventre — de quantas semanas você está?

Ela fica quieta, duvidando se me conta a verdade ou não. Tenho suspeitas


sobre a real paternidade do bebê da Olivia, terminamos tem pouco menos de um
mês, se o bebê tiver mais de quatro semanas, ele é meu.

Enquanto estávamos juntos, ela parou com o procedimento, e não usava o


anticoncepcional, só utilizávamos camisinha, e algumas vezes fizemos sem.

Espero com expectativa por sua resposta, mas Olivia me frustra


levantando-se e indo embora. A sigo como um cachorrinho precisando da atenção
da dona para ser feliz.

Eu fiz muita merda e a magoei, e farei o dobro de merdas para ser capaz de
me perdoar e volte a ser minha. Vou mostrar a Olivia que eu sou um novo
homem, a farei me amar novamente, e nunca mais a deixarei partir.

Olivia entra na cozinha e ataca os docinhos em cima da mesa, comendo


dois de uma vez. Fico atrás dela e abraço seu corpo, descansando o queixo em
seu ombro. Beijo a pele lisa e deslizo as mãos em seu ventre sentindo minha
menina dentro dela.

— Vai devagar nos doces ou passará mal.

— Não importa — fala com a boca cheia.


— Claro que importa, não quero ver o meu amor passando mal e
prejudicando nossa menina — beijo seu pescoço, a fazendo se encolher em meus
braços — eu estava apavorado Olivia, por isso eu fiz aquela merda.

— Cala a boca — pede com a voz embargando e enfiando mais doce na


boca.

A giro em meus braços, e pego o pedaço do docinho que ela estava


mordendo, com meus dentes, beijando sua boca empanturrada com a minha.

Mal consigo deslizar minha língua em sua boca, e ela apoia as mãos em
meu peito, não me afasta e não me puxa, só me deixa ficar assim a beijando,
sufocado.

— Eu senti tanto a sua falta — murmuro, e beijo seu nariz. — Me perdoa


por não saber a data do seu aniversário e ter sido cruel — descanso a testa na sua,
encarando os olhos verdes, magoados — quando percebi que o Lorran estava te
vendo como mãe, nos dias que antecederam a morte da Blanca, eu entrei em
desespero achando que estava traindo a imagem dela, e que ela não me perdoaria
por dar uma mãe ao Lorran e o fazer esquecê-la.

— Não quero saber — ela luta para sair, e a mantenho presa entre mim e a
mesa, até suas forças minarem e ela esconder o rosto em meu peito.

— Mas precisa, eu vivi no luto por tempo demais, e quando comecei a sair,
eu tive uma epifania de felicidade que me fez ignorar todos os outros
sentimentos. Quando eles retornaram, foi intenso, e me fez perder a razão, agindo
como um maluco amargurado e magoando os que estavam perto de mim, e eram
a razão por eu ser feliz. A culpa consumiu a minha alma com força, devorando
tudo o que existia de bom.

— Poderia ter falado comigo — suspira, e noto que ela chora.


— Eu estava te magoando, podia ver isso em sua expressão quando me
olhava. Eu precisava te mandar para longe, te fazer escapar da bagunça que eu
era, e sabia que você não iria embora, a menos que eu magoasse seu coração. Não
pensei antes de agir, proferi palavras cruéis, e consegui te fazer ir embora e me
odiar, eu merecia aquilo, acreditava que o amor era proibido para mim, e estava
pecando em colocar outra no lugar da Blanca. — Respiro sem folego, após falar
muito.

Não tenho vontade de chorar, apesar de encarar o que fiz, sinto que devo
ser forte, e reparar o erro cometido, curar a ferida que sangra na mulher que eu
amo.

Mostrar a ela que não vou mais chorar e lamentar pela Blanca ter morrido.

— O que mudou? — Olivia chora baixinho contra meu peito, e beijo a


cabeça dela.

— Quando você saiu, eu não me senti aliviado como achei que ficaria.
Doeu mais do que pensei te mandar embora. Ardeu na minha alma como nunca, a
dor de perder a Blanca acabou comigo, mas a de te fazer sofrer — inspiro
controlando as lágrimas por lembrar como é ruim ficar sem ela — te mandar
embora com os olhos gritando desespero, aquilo foi como ter o ar deixando meus
pulmões, e depois daquele dia, não consegui respirar direito.

Puxo o rosto da Olivia para que ela me olhe.

— Não foi instantâneo — limpo suas lágrimas com os polegares. —


Briguei comigo mesmo, guerreando entre o que eu achava certo e a vontade de ir
atrás de você, dizer que te amo, e implorar pelo seu perdão — fico de joelhos e
escoro a cabeça em seu ventre — somente quando o Lorran chorou querendo
você, e dizendo que você era a mãe dele, que estava viva, e a Blanca no céu, foi
que percebi. Eu estava me apegando a um fantasma e fazendo meu filho e você
sofrerem uma dor que não era justo para nenhum de nós.

— E depois? — Ergo a cabeça, ela toca meus cabelos, e apesar das


lágrimas, consigo ver o olhar dela aliviando.

— Eu continuei perdido, desesperado para consertar meus erros, e sabia


que não ia conseguir fazer isso enquanto a Blanca estivesse em meu coração.
Deixei o Lorran com você, e vim me despedir da Blanca. Eu disse adeus a ela,
contei sobre você, e senti que ela estava me dando a benção dela, e a Beatrice me
fez acreditar que foi a Blanca quem te colocou no meu caminho, para amar o
nosso filho e a mim.

— Você tem certeza? — ela soluça forte, e fico em pé, segurando seu rosto
em minhas mãos.

— Como ar que entra em meus pulmões. Nunca mais vai existir Blanca
entre a gente Olivia, você é a única mãe que o Lorran terá, e se me permitir, serei
o pai de todos os seus filhos.

— Eu acredito em você — suspira e baixa o olhar, antes de me fitar


novamente determinada — mas meu peito ainda dói, e não conseguirei ter uma
relação enquanto o medo de que você acorde e não me queira mais persistir. Você
tem um ano para mostrar que mudou, não vou abrir mão.

— Serei seu brinquedinho? — pergunto sorrindo, e beijando suas


bochechas, feliz por ter uma chance de fazer a coisa certa.

— Não, será... qualquer coisa — suspira.

— Namorado, podemos começar assim — beijo seus lábios, aliviado


quando ela corresponde, agarrando meu pescoço — e no nascimento da nossa
menina, serei o pai dela — beijo a outra bochecha — e no dia do seu aniversário,
o seu marido.

— Vá com calma, rapaz — uma voz grossa fala atrás de nós, e vejo o
Marcelo segurando a Cecilia nos braços — antes de casar-se com a minha filha,
eu terei de dar a minha benção, você a fez sofrer demais — antes eu que consiga
evitar, sinto a dor do chute que ele dá em minha bunda, e me encolho.

Olivia gargalha de mim, sem intenção de me ajudar.

— Eu mereci essa — digo ficando em pé novamente — sou Levi, prazer


Marcelo — estendo a mão, e ele ajeita a Cecilia no colo, antes de apertar com
muita força meus dedos.

Tento não fazer careta, acho que ele quer quebrar meus ossos.

— Vou ficar de olho em você.

— Para pai — Olivia pede com riso na voz — eu vou torturar ele o
suficiente por nós dois.

— Não abra brecha para esse safado.

— Calma, sogrinho — brinco e recebo um olhar matador, engulo em seco,


e coço a garganta — vamos Olivia? Hora de dormir — me escondo atrás dela,
que ri ainda mais, quando o pai se aproxima e beija sua bochecha.

Pelo visto eles fizeram as pazes, e minha garota voltou a exalar raios de
luz.

— Você vai dormir no seu quarto — bate no meu peito e sai rebolando.

— Tchau! — Digo ao Marcelo antes de correr atrás da mulher que manda


em mim.
No corredor dos quartos ouço gemidos, e encaro a Olivia desconfiado,
quem está transando aqui em cima?

— É a Lira, ou a Beatrice? — sussurro segurando sua cintura.

— Não sei, espero que a Beatrice — ela fala de volta — o Daniel parece
ser um cafajeste.

— Se for ele tocando na minha irmã, eu arranco o pau dele.

— A Lira é grandinha, vai saber lidar com esse tipinho.

— Boa noite casal — Viro de costas e vejo a Beatrice com um sorriso no


rosto — Levi, o Dante é amigo seu? O que pode me dizer sobre ele? — trança o
braço no meu, com um sorriso enorme no rosto.

— Não o conheço bem, pergunta ao meu pai, acho que ele viu o menino
crescer, ou coisa assim.

— Ele é muito lindo — fala apaixonada.

— Concordo — Olivia diz, e giro o pescoço rápido na sua direção


estralando as vértebras.

— Como é?!

— Muito lindo! — estrala a língua na boca, e quero surrar a bunda dela.

— Sua safada — me solto da Beatrice, e Olivia corre gritando.

Ela alcança o quarto antes de mim e fecha a porta na minha cara.

— Até amanhã Levi — diz alegre.

— Você vai me torturar assim mesmo?

— Com certeza.
Bato a cabeça na porta frustrado por ser rejeitado.

Ao menos ela concordou em continuar me fazendo sofrer, e vou tentar a


Olivia como o próprio satanás, até ela me aceitar de volta em sua vida. Beijos,
cheiros, e palavras sacanas, vou preparar meu menor arsenal para a fazer ceder ao
meu charme, e quando tiver em cima dela, vou despejar palavras de amor que
amolecerão seu coração, e a fará com que ela confie em mim.

Só existe a Olivia, e nem que eu passe a eternidade provando isso, a farei


perceber que aprendi com meu erro e nunca mais deixarei a escuridão tomar
conta da minha vida.

Olivia
Voltamos para o Brasil, e o Levi se recusa a aceitar que eu more no meu
apartamento, e ele no dele com o Lorran.

Já faz um mês que retornamos, e todos os dias tenho dificuldade para ir


embora de seu apartamento, ou ele me prende, escondendo a chave, combina com
Lorran de ficar inventando que está doente, ou me segue até meu apartamento, e
entra aqui dentro com o Lorran e não vai embora até o dia seguinte, quando vou
para a creche.
Já bati tanto nele por isso, que estou com calos nas mãos.

Nunca o vi grudento dessa forma, e, ao mesmo tempo que adoro, eu odeio,


e quero o esganar por não me dar espaço. Os hormônios da gravidez estão me
deixando louca, uma hora eu quero transar loucamente, na outra vomitar minha
alma, e em seguida fico chorosa, deixando o Levi dormir ao meu lado e fazer
carinho em meus cabelos.

Não transamos ainda, é tudo recente, e quero ter a confiança de que não
vou me magoar se o deixa ficar em meu coração.

Por enquanto, temos mantido essa dinâmica, é bom, ele está perto,
respeitando minhas barreiras e me enchendo de carinho e confiança. Não sei se
conseguirei aguentar muito mais com a distância, ou escondendo que a minha
menina é filha dele.

— Na sua casa ou na minha? — ele pergunta quando entra na cozinha


segurando uma pasta preta.

— Aqui, estou cansada — bocejo me espreguiçando.

— Coloco o Lorran para dormir na cama dele, ou na nossa? — chega perto


e arrodeia minha cintura, descanso a cabeça em seu ombro, e aceito a massagem
em minhas costas.

— Na dele, hoje tenho necessidades — Levi fica todo animado e sai


correndo, para pôr o Lorran para dormir.

Termino de guardar as sobras, e vou para o banho, tranco a porta para o


espertinho não achar que estou o chamando para entrar. Visto a camisola e me
deito de lado na cama, minha barriga não cresceu muito nas últimas oito semanas,
somente um inchaço protuberante. Amanhã tenho um ultrassom, e vou chamar o
Levi para me acompanhar.
— Hora da diversão — ele tira a camisa animado com fogo nos olhos.

— Com certeza — jogo nele o pote de gel de massagem — pode começar


pelas minhas pernas, já estou sentindo os pés inchados — deito e gargalho com a
cara de cachorro que caiu da mudança.

— Vai ser a melhor massagem da sua vida, sua mulher infernal — morde
minha panturrilha, e me tremo.

Levi despeja o gel na minha perna esquerda e começa uma massagem lenta
em meu tornozelo, estralando as vértebras e aliviando a dor na sola do pé.

— Amanhã eu tenho um ultrassom...

— Que horas saímos? — ele nem me deixa terminar a frase, e rio. —


Lorran vai querer ir junto, vamos levá-lo?

— Minha consulta é às 9 horas.

— Qual o seu plano de saúde? Vou te trazer para o meu, e ter acesso a um
melhor.

— Não precisa, o que eu pago é bom, e...

— Quando se trata de saúde, quanto mais caro, mais acesso aos


procedimentos, nossa menina vai nascer em um parto humanizado, e você terá
um pré-natal seguro. Não abro mão disso, Olivia — a seriedade em seu olhar me
cala, é a primeira vez que ele toma as rédeas de uma situação, e gosto de como
me sinto com isso.

— Certo.

— Vai deixar para comprar o enxoval quando soubermos o sexo? — ele


pergunta subindo as mãos pelo interior da minha coxa, deslizando suavemente,
aplicando pressão com os dedos.
Tenho de respirar para manter o foco no que ele perguntou.

— Vamos iniciar com as coisas unissex primeiro — gemo quando o safado


toca minha virilha — já sei que é uma menina, e vou fazer o enxoval dela lilás,
com figuras de algodão-doce e ursinhos.

— Vou pintar todos no quarto que será dela — seus dedos deslizam na
borda da calcinha, e esqueço do que estávamos falando — algodão-doce,
ursinhos, e alguns gatinhos. Podemos comprar tudo amanhã, depois do exame.

Ele continua falando, e eu fecho os olhos, me entregando a carícia do seu


dedo deslizando sobre minha intimidade encharcada, por cima da calcinha.

Levi força a penetração pelo tecido, e eu me tremo, prendendo sua mão


com minha coxa. Ele desce o rosto ao encontro do meu, e beija meus lábios, até
que eu relaxe e solte sua mão.

Com mais liberdade, ele tira a peça de roupa e desce beijando meu corpo.
Eu queria ter mais forças, e poder resistir, mas o evitar só vai me causar dor
interna, e pode parecer que se passou pouco tempo, mas sinto como se
estivéssemos a uma eternidade separados, sem sentir um ao outro.

— É só sexo — digo ao ter minha camisola retirada, e quando ele fica nu,
colocando o pau enorme para fora.

— Não, é fazer amor — desliza para dentro de mim.

As paredes da minha vagina ardem pelo seu tamanho, encolho meus dedos,
agarrando seus ombros, o sentindo todo dentro de mim, e com uma saudade
enlouquecedora, agarro sua bunda durinha, forçando que ele me coma com mais
força.

Levi estabelece um ritmo lento entre nosso quadril, com os olhos travados
no meu e a boca pairando sobre a minha, gemendo como um maldito macho alfa.
— Sentiu minha falta como eu a sua? — ele pergunta baixinho — estava
enlouquecendo de vontade de me enfiar no seu calor, sente isso Olivia — desliza
devagarinho, empurrando a cabeça na parede interna, e eu vejo estrelas. — Diz
que me queria dentro de você — repete o movimento, me levando a insanidade,
nem se eu quisesse conseguiria falar.

— Levi — grito por seu nome ensandecida, com o corpo explodindo em


prazer.

— Isso, Olivia, fala o nome do seu homem — morde minha orelha, e uma
rajada de lubrificação deixa meu interior, facilitando suas investidas — diz o
nome do homem que vai se casar com você, e é o pai dos seus filhos.

— Levi — suspiro em meio a uma crise de quase choro, perto de alcançar


meu ápice.

— Eu te amo Olivia, diz que me ama.

Ignoro seu pedido, não vou ceder enquanto ele me fode. Belisco sua bunda,
e perco o ar, atingindo o clímax.

Ele rosna ao perceber que não me ganhou na conversa, e jorra pesado em


meu interior. Sustenta seu peso com os braços, e me enche de beijos, deslizando a
língua pela minha com carinho, beija minha testa, e sai de dentro de mim,
deitando-se ao meu lado.

Sua mão desliza em minha barriga, e ele beija meu ventre, com um sorriso.
É a primeira vez que o deixo me tocar dessa forma.

— Eu amo você, minha menininha — beija novamente meu ventre, e eu


travo em emoções.

— Você é o pai da minha bebê — admito.


— Eu sei — beija meu ventre — sou o pai dela, quando decidi que seria os
pais de todos os seus filhos — encontra nossos lábios um no outro.

— Não Levi — embargo, não pretendi contar agora. Ao ser envolta no


amor dele, e pelo sexo gostoso que fizemos, baixei a guarda... e não foi ruim
fazer isso — eu menti sobre a inseminação, não fiz o procedimento enquanto
estávamos juntos ou depois.

O rosto dele se ilumina, e Levi me enche de beijos até o ar faltar em meus


pulmões.

— Nossa garotinha — beija meu ventre — papai ama você e a mamãe,


prometo que antes de você nascer, eu vou ter casado com sua mãe.

— Não apresse as coisas. — Peço.

— Eu já apressei tudo, Olivia — ele me puxa para seu colo e dormirmos


abraçados.

Não é ruim ceder.

É maravilhoso deixar o amor dele entrar, e o peso sair.

No dia seguinte, vamos os três para o consultório, e o Lorran pula inquieto


querendo saber tudo sobre a irmã.

Levi tem um sorriso enorme no rosto, e fala para todos, que viemos a
primeira consulta da nossa bebê, juntos, já que a outra, eu realizei quando
descobri sobre a gravidez e não foi aprofundada como a de hoje, em que
poderemos ouvir os batimentos do coração dela.

Entramos na sala, e coloco o avental, me deito na cama e Levi se senta ao


meu lado, com Lorran em seu colo. A médica entra com um sorriso no rosto.
— Bom dia, mamãe e papai — ela se senta na cadeira perto de mim — e
esse menininho, é o filho de vocês?

— Sim — Levi responde orgulhoso.

— Nos seus registros não consta que você já teve filhos — ela analisa uma
prancheta — acho que devemos atualizar ele.

— Ele não nasceu de mim — digo — a bebê será a primeira que vou dar à
luz.

— Minha outra mamãe tá no céu — Lorran levanta os bracinhos — a


mamãe Olivia tá na terra comigo — ele se estica, e Levi o ajuda a beijar minha
bochecha — e eu amo a mamãe.

— Amo você, meu menino — aliso os cabelos dele.

— Que família feliz! Vamos logo ver como está a irmãzinha dele — passa
o gel em meu ventre e coloca o aparelho.

Meu plano não garantiu um ultrassom 3D, por isso foi a normal, e tenho
um pouco de dificuldades em entender as imagens na tela, mesmo a médica me
explicando sobre o tamanho da bebê.

Levi me encara e ergue a sobrancelha como quem diz “eu te avisei” dou de
ombros.

— Agora vamos ao coração.

Tum... Tum... Tum...

Preenche a sala, e eu choro feliz por escutar o som da vida da minha filha
em meu ventre. Levi me beija, com o Lorran pendurado entre nós, as lágrimas
dele misturadas as minhas, e o Lorran deita a cabeça em meu peito.
Eu tenho uma família comigo e não abrirei mão dela, nunca mais serei
infeliz.

****

3 meses depois
Meu bebê já tem 24,5 centímetros, e após o ultrassom 3D, conseguimos ver
melhor o formato do corpinho dela, ainda não tivemos a confirmação do sexo,
mas ela segue saudável e bem, dentro de mim, e meu coração que estava
obscurecido por tristeza ganhou a luz do amor, e a felicidade fez morada nele.

Eu e o Levi estamos bem, ainda não falei que o aceitei completamente,


embora passemos o tempo juntos, e fazendo amor.

No último mês ele montou um ateliê para ele perto do apartamento, e tem
passado bastante tempo por lá, criando sua próxima coleção. Ele não me deixou
ver nada, e Lorran é seu principal cúmplice nas peças.

— Mamãe — Lorran chama, estou dobrando a roupa dele, quando o vejo


pelado puxando o pinto — tá doendo.

— O que meu amor? — fico de olhos, e procuro machucado em seu


pintinho.

— Aqui — puxa novamente a piroquinha, e faz careta, prestes a chorar.

— O que você estava fazendo para doer aí?

— Blincando na valanda — tiro a mão dele e vejo que a cabecinha está


vermelha — aí o gatinho da vizinha pulou pla cá, e eu o peguei no colo, e o
pintinho ta doendo.

— O gatinho te arranhou?
Já avisei para aquela diaba de menina não deixar o gato dela vir para a
nossa varanda. Vou mandar colocar uma tela de proteção que impeça a vinda do
animal, dificilmente deixo o Lorran ficar na varanda, fecho as portas, e tenho
certeza de que não abri elas.

— Sim, no pintinho — tem lágrimas nos olhos.

— Vamos, vou te levar ao hospital, e depois ter uma conversa séria com
aquela diaba.

— Celto.

Visto uma roupa no Lorran, e o pego no colo, evitando seus pés perto do
meu ventre. Na sala, vejo que a governanta está limpando a varanda com as
portas abertas.

— Você saiu e deixou as portas abertas? — pergunto, ela vira se


assustando.

— Santo Deus, menina, que susto — coloca a mão no peito. — Sai


rapidinho para buscar mais água na cozinha, por quê?

— A gata da vizinha pulou para cá de novo e arranhou o Lorran, vou levar


ele ao médico.

Chamo o motorista, e uma hora depois deixamos o hospital com o Lorran


medicado para infecção urinaria. Chegamos no apartamento com ele dormindo, e
ouço batidas na varanda, vou ver o que acontece, e encontro o Levi, dando ordens
para três homens que colocam janelas com uma tela de proteção, tampando tudo.

É isso que ele faz, ele cuida da gente sem que precisemos falar nada. Eu
amo esse homem, e estou pronta para abandonar a dor e viver o amor.
Olivia

3 meses depois
— É uma menina! — a médica fala feliz, e Levi grita, comemorando. —
Demorou, mas finalmente conseguimos ver o sexo.

Estou de 32 semanas, e somente agora minha pequena abriu as pernas


durante um ultrassom, e descobrimos o sexo dela.

O enxoval já está completamente pronto, e nossa família vai se reunir


amanhã na Itália, para comemorarmos o aniversário da Cecilia, faz tempo que
não reunimos todo mundo.

A Bianca e o Louis, estão quase morando lá, e o Daniel assumiu como


CEO da empresa no Brasil. A Lira terminou semana passada o filme da adaptação
de um livro famoso, e em breve sairá em tour na divulgação da obra.

Beatrice, que tem mantido contato por vídeos, chamadas com o sobrinho e
comigo, vai estar presente, e eu tenho quase certeza de que o maior motivo, é por
ela querer ver o Dante.
O Cowboy não sai da cabeça da Beatrice, assim como o Daniel não para de
povoar os pensamentos da Lira.

Eu e Levi estamos bem, vivendo juntos, e cada um fazendo seus trabalhos.


Ele diz que logo terminara a coleção, enquanto eu não tenho mais certeza se
preciso dizer que o aceito de volta, ele sente isso, quando o beijo e fazemos amor.

— Você estava certa — Levi beija minha testa — vamos ter uma menina.

— Eu sempre soube — respondo com o coração flutuando de felicidade.

— Uma irmãzinha pla mim — Lorran abre os braços.

Saímos do consultório e vamos a um restaurante comemorar, depois


voltamos para o apartamento. Entramos, e a casa está repleta de música, sigo o
som, e vejo meu pai montando o berço da minha menina, o quarto já está quase
pronto, só falta o, guarda-roupas e a cadeira de amamentação chegarem.

As paredes foram pintadas de lilás com branco, nuvens de algodão-doce,


com ursinhos descendo por ela em todos os lugares, e gatinhos folgados,
dormindo tranquilo, a patinha deles é a mão do Lorran pintada na parede.

— E então? — meu pai pergunta.

— É uma menina!

Ele comemora e bate na mão do Levi, ambos fizeram as pazes, e desde que
passei a morar aqui, o meu pai tem me visitado para brincar com Lorran, e
conversar comigo e com o Levi.

Eu gosto da direção que a minha família tomou, e nada poderá estragar a


felicidade nascente.
Partimos para a Itália, e quando chegamos lá, Bianca corre para me abraçar
e perguntar tudo sobre a gravidez. Não escondo nenhum detalhe, e logo a Lira e a
Beatrice se juntam a nós.

As quatro na beira da piscina, enquanto os homens preparam o almoço.

— Agora vocês, me conte o que tem acontecido — peço para as duas.

— Bom, eu estou grávida — Lira joga isso como uma bomba, e dá de


ombros — já contei ao Louis, e vou falar com o Levi ainda, não vou dizer quem é
o pai — o medo nos olhos dela arde tanto quanto o ódio — eu tentei contar três
vezes a ele sobre o bebê, e o babaca sempre desliga na minha cara, achando que
estou sendo grudenta, então ele que vá se ferrar.

— De quantas semanas? — pergunto ainda absorvendo o impacto da


informação.

— 29 semanas — as bochechas assumem um tom vermelho e ela pede


segredo com a expressão. 29 semanas atrás, Bianca estava se casando, e a Lira
estava flertando com o cafajeste do Daniel.

— Tem certeza de que não quer contar ao pai do bebê? — pergunto com o
coração apertado, pelo que ela deve estar passando.

— Sim — ergue o queixo — quando ele perceber minha barriga


protuberante, e fizer as contas na cabeça dele, vou decidir o que fazer, enquanto
isso, não vou implorar pela atenção do desgraçado.

— Estamos aqui — Bianca segura a mão dela — para o que precisar, como
o Louis disse ontem.

— Obrigada — Lira beija a cabeça da Bianca, e eu aperto a mão dela.


Levi vai surtar quando souber, e considerando que o Daniel veio para cá,
acho difícil o segredo continuar por muito tempo.

— Você sabe que é provável que ele descubra hoje, né? — pergunto
baixinho a abraçando.

— Estou pronta para isso — beija meu ombro.

— E você, dona Beatrice? — Bianca a cutuca.

— Ah, eu estou bem — ela continua procurando pelo Dante com os olhos.

— Manteve contato com o Cowboy? — instigo.

— Talvez, ele me ajuda com os animais.

— E com outras coisas, pelo seu sorriso — acuso e ela morde os lábios
rindo internamente.

Continuamos conversando, e depois almoçamos.

Lira chama o Levi para conversar, e eles somem por quase duas horas,
depois retornam, e ele tem a expressão de quem vai cometer um assassinato a
qualquer instante.

Por sorte se controla.

Pego o Daniel seguindo a Lira com os olhos, e quando ela se recolhe no


quarto ele vai atrás. Estou tentada a ir ver o que acontece, quando o Cowboy da
Beatrice entra dando boa noite a todos, e eu fico para ver a interação tímida e
cheia de química desses dois.

Duas histórias de amor se desenrolam diante dos meus olhos, e não sei por
qual estou mais ansiosa para assistir.
Nos recolhemos no quarto, e o Levi não perde tempo ao me puxar para ele,
me coloca sentada na cama e fica de joelhos na minha frente.

— Você me deu um ano para provar que eu te amava e estava pronto para
viver ao seu lado — segura minhas mãos — mas eu sou apressado demais, e não
consigo mais não te chamar de minha esposa, ainda precisamos de um ano?

— Não, meu amor — seguro seu rosto, certa de minha decisão.

— Chegou a hora Olivia — ele esfrega as mãos, e põem dentro do bolso —


eu juro que iria fazer isso amanhã, em um cenário de tirar o folego, mas eu não
consigo esperar para poder dizer — puxa a caixinha, e vejo um anel de ouro
branco com um diamante no centro — eu te amo, passei os últimos meses
provando que estou mudado, e você é a única mulher no meu coração, sem
passado, somente o presente.

Ele puxa minha mão para si, e eu travo a garganta, pronta para responder.

— Você é a mãe do Lorran e da nossa menininha, vamos construir nossa


família juntos, ter muitos mais filhos, e viver em um lar cheio de amor. Olivia
Baptista, me perdoa por ter te magoado e causado uma ferida em seu coração,
espero que você tenha percebido que eu sou uma pessoa melhor — aceno em
positivo — deixa eu cuidar de você e dos nossos filhos, me permita te amar até
nosso último suspiro — beija minha mão — casa comigo?

— Sim, eu te perdoei, e caso com você.

Levi me puxa em seus braços com amor, beijando todos os lugares que ele
encontra. Os lábios afoitos não me deixam respirar ou rir, enquanto sou devorada
por ele.

— Eu tinha planejado um mega pedido...


— Foi perfeito — o interrompo, e deixo que coloque a aliança no meu
dedo.

— Se quiser, nos casamos amanhã — alisa meu rosto — fiz um vestido de


noiva para você, e trouxe comigo, nossas famílias estão aqui, e tudo que eu
preciso é de você.

— Vamos — gargalho.

Fazemos amor a noite toda, e no dia seguinte, ninguém fica surpreso com a
notícia do casamento, pelo contrário.

— Seu sem-vergonha — Louis bate na cabeça do irmão — passei um mês


te ajudando a montar o cenário perfeito, e você estraga tudo pedindo adiantado, o
que custava aguentar mais um pouco?

— Eu não consigo ficar mais um segundo longe dela!

— Você gostou do pedido? — meu pai pergunta, acho que ele também
tinha ajudado o Levi.

— Sim — gargalho.

— Vamos usar o cenário para o nosso casamento — Levi diz — Dante,


traga um padre, casamos às 17 horas.

A chuva de gritos é grande, Bianca puxa minha mão sorrindo para mim, e
sumimos entre nossos familiares entrando no carro.

— Vamos te deixar linda para a sua cerimônia. — Ela sorri, e a abraço.

Fazer cabelo, maquiagem, depilação, escolher as joias, é exaustivo, mas


quando chegamos a mansão e vejo tudo decorado para o casamento, eu me
pergunto há quanto tempo o Levi planejou tudo isso e guardou segredo.
Subo sem o deixar me ver, e no quarto encontro Beatrice arrumando meu
vestido no cabide. É uma peça deslumbrante, leve, com renda, e de alças finas.

Visto, e a peça serve perfeitamente, ajustada na minha barriga para não


causar pressão. Meu pai entra no quarto com um sorriso no rosto, vestindo um
terno preto e arrumado.

— Desde quando você sabia?

— Ele começou a planejar tudo quando voltamos ao Brasil — me entrega


uma caixinha de veludo, abro, e vejo um broche azul — algo azul, emprestado,
pois quero de volta, ele era da sua avó, e sua mãe o usou no nosso casamento,
então é bem velho — coloca o broche no meu cabelo e prende o véu — estou
orgulhoso de você Olivia.

— Obrigada pai — beijo seu rosto. Não existe a necessidade de mais


apalavras entre nós, fizemos as pazes, e perdoamos um ao outro naquela noite.

— Vamos? — estende o braço.

— Sim.

Descemos as escadas e caminhamos por um tapete vermelho, até que vejo


as cadeiras de frente para uma estrutura de madeira, rodeada de flores, banhado
pelo pôr do sol no horizonte.

Levi me espera usando um terno cinza, e nossos familiares e amigos, que


eu nem sabia que tinham vindo — levantam quando a marcha nupcial inicia.

Em todas às vezes que imaginei como seria o meu casamento, me via


correndo de um lado para o outro, resolvendo tudo e pensando se meu noivo
ajudaria.
Hoje vou me casar com o homem, que sozinho arrumou a nossa festa e me
trouxe segurança, conforto, e amor, que me deu uma família e me fez realizar o
meu desejo, de ter uma família só minha.

Minha história de amor não começou com amor à primeira vista, foi ódio,
depois a paixão, e então a decepção, e hoje, estamos escrevendo o primeiro
capítulo da nossa vida como, casados, sem dores em nosso peito, amando um ao
outro, e estando certos de que é isso o que queremos.

— Eu te amo — ele sussurra.

— Eu amo você — devolvo.

No altar o padre fala, e eu só consigo sentir minha pequena chutando o meu


ventre, levo a mão do Levi a minha barriga, e ele arregala os olhos com lágrimas
descendo por suas bochechas. Lorran entra, segurando as alianças e fica parado
sorrindo, esperando que peguemos elas.

Beijo a cabeça do meu menino, e Levi faz o mesmo.

— Levi Vittileno, você aceita Olivia Baptista como sua esposa para amar,
honrar, respeitar, e ser fiel em todos os dias da sua vida, até que a morte os
separe?

— Aceito — ele coloca a aliança em meu dedo.

— Olivia Baptista, você aceita Levi Vittileno, como seu marido, para amar,
honrar, respeitar, e ser fiel em todos os dias da sua vida, até que a morte os
separe?

— Aceito.

Coloco a aliança no dedo dele.


— Pelos poderes a mim concedidos pela Santa Igreja Católica, eu vos
declaro, marido, e mulher, pode beijar a noiva.

Nossos lábios se tocam, entrelaçando nossas vidas no amor eterno que


viveremos.

Olivia
Eu nunca senti tanta dor quanto nas horas que passei em trabalho de parto.
Ter meu corpo sendo partido em dois é agoniante e muito dolorido. Minha
pequena nasceu gordinha, com 4 quilos, e a coisa mais linda do universo.

Ela tem bochechas gorduchas, e cabelos, castanho escuro como os meus, os


olhos alternam entre azul e verde, e eu não poderia estar mais cansada e feliz do
que nesse segundo, segurando o meu pequeno mundo nos braços.

Ainda não decidimos o nome, deixamos Lorran escolher, e ele tem


demorado para se decidir. Vamos dar mais dois dias, se ele não falar qual nome
quer dar a irmã, eu vou decidir com o Levi.

Estou no quarto da maternidade com minha pequena no colo, faz menos de


dez minutos que ela nasceu e eu só tenho a agradecer, minha menina nasceu com
2 meses de diferença para a data de aniversário do Lorran, e ele acha o máximo, e
quer comemorar o aniversário de ambos juntos.

— Mamãe! — grita, e corre afoito para a cama, segurando a pelúcia do


cachorro e do gatinho.

— Vem ver sua irmãzinha amor — Levi o pega no colo e coloca o Lorran
entre minhas pernas abertas, ele tem os olhos arregalados e cheios de amor
observando a irmã.

— Já sei o nome.

— Qual? — Levi pergunta segurando a cabeça pequena de nossa menina.

— Lorran, igual a mim — abre os braços a bate palmas, encaro o Levi, e


damos risada.

Estou exausta, e consigo rir plenamente com as gracinhas dele.

— Não pode Lorran — Levi responde — ela é menina, e tem de ter nome
de menina.

— E tem de ser diferente do seu — digo.

— Lorra... — Bota o dedo no queixo olhando para cima — ny. Lorrany.

Não tenho como negar, um nome lindo, e escolhido pelo meu filho. Após o
casamento, Levi e eu oficializamos a maternidade do Lorran, adotei ele como
meu, e para todos os fins legais e emocionais, ele é o meu filho e ninguém nunca
poderá mudar isso.

Tenho meus dois fofinhos na cama comigo, e meu marido, que me enche de
amor todos os dias.
— Eu amei — digo e beijo a cabecinha dela — bem-vinda ao mundo
Lorrany.

— Eu te amo irmãzinha — Lorran a beija na bochecha com cuidado —


para você — entrega a pelúcia de gatinho, e eu embargo, ele é apegado ao
gatinho e ao cachorrinho, e dar a irmã, é um gesto enorme.

— Tem certeza, Lorran? — Levi pergunta, com os olhos marejados.

— Sì, ela é minha irmãzinha, e o gatinho e o cachorrinho também, vamos


dividir eles — beija ela de novo — ela é tão lindaaaaaa.

— É, sim, igual a você — encaro meu menino e meu marido.

Eu encontrei a felicidade, e nada nesse mundo poderá apagar a luz que se


acendeu nas nossas vidas.

***

3 meses depois.

Itália.
Retorno de Levi Vittileno, o estilista da marca Vittileno.

— Boa noite a todos, e todas — Levi sobe ao palco segurando o microfone.

Hoje ele vai mostrar ao mundo a sua nova coleção, e o seu retorno como o
estilista da VITTILENO. Estamos todos reunidos para presenciar o momento,
Louis e Bianca com a Cecília, e esperando o próximo bebê deles, no ventre, de 3
meses da minha irmã.

Lira, com um barrigão de 8 meses, prestes a dar à luz, retornou a Itália para
que o bebê pudesse nascer no país de origem dela. Infelizmente o Daniel não
perguntou sobre a paternidade, e acho que eles não se viram desde o casamento.
Minha cunhada aguentou firme a gravidez, com o cafajeste do pai do bebê, sem
ter noção de que o bebê dele, está prestes a vir ao mundo.

Beatrice, eu não sei dizer o que acontece entre ela e o Dante, uma hora
acho que estão juntos, e na outra parece que ela vai voar no pescoço dele e
arrancar sua cabeça fora.

Hoje eles estão em paz, com pequenos olhares, e se alfinetando. Ele tem
babado de ciúmes desde que um estilista amigo do Levi se sentou ao lado da
Beatrice, e não para de puxar assunto com ela.

Marcelo e Enrico se tornaram bons amigos, e agora que meu pai se


aposentou, tem viajado bastante com meu sogro pelo mundo. Tenho a leve
desconfiança de que ambos arrumaram uma namorada, e um acoberta o outro.

Por enquanto vou respeitar o silêncio deles, ambos perderam as esposas, e


um entende o outro melhor do que ninguém.

— Mamãe — Lorran me chama — vai começar!

— Vai sim — aliso sua cabeça e chego a Lorrany dormindo no carrinho, na


minha frente.

— Como já foi anunciado pela mídia, eu sou o estilista por trás de todas as
peças da VITTILENO, e após meus hiatos de 4 anos, estou retornando aos palcos,
no dia do aniversário da minha linda esposa — aponta para mim — um salve de
palmas para a mulher, que tem meu coração, e a mãe dos meus filhos.

Fico envergonhada quando os flashs viram na minha direção, e um coro de


“parabéns” entoa alto no salão.

Após isso, Levi chama atenção para ele novamente.


— Hoje a minha coleção se chama “raio de sol” em homenagem aos três
raios de sol que eu tenho na minha vida. Meu menino Lorran, minha garotinha
Lorrany, e minha esposa Olivia. Obrigado por não desistirem de mim e me
apoiado em toda a trajetória até esse momento, eu amo vocês, meus raios de sol.
Aproveitem o desfile.

Levi vai para os bastidores, e as luzes focam na passarela, as modelos


entram uma a uma, mostrando as peças deslumbrantes em cores claras e
vibrantes, transbordando alegria e amor como tem sido nossas vidas.

Me desprender do ódio e aceitar o amor foi a escolha mais certa que fiz.
Conquistei a minha família, e todos os meus dias têm sido felizes desde então.

Puxo meu menino para mim, e seguro a mão da minha filha, a aliança
brilhando meu dedo.

FIM
Lira Vittileno, é conhecida por ter o pior da personalidade dos seus dois
irmãos. Dona de uma personalidade forte e um coração que anseia ser
verdadeiramente amado. Lira já teve seu coração partido inúmeras vezes, mas
nada a preparou para aquele que não só partiria seu coração, mas também lhe
rejeitaria grávida.

“Nunca mais amarei e deixarei outra pessoa me conhecer para levar uma
parte minha, me deixando vazia e sem rumo”.

Daniel Albuquerque, nunca imaginou que se encantaria pela irmã do seu


amigo. Após uma noite intensa, tudo o que ele queria era poder repetir a dose
com aquela mulher que parecia ter sido feita sob medida para ele.

Agora, meses após a noite, em que passaram juntos, as fagulhas da paixão


queimam entre os dois em mais uma noite envolvente.

“Não estou disposta a machucar meu coração uma segunda vez, porque
depois colar os cacos acaba comigo.”

Ao contar sobre sua gravidez. Lira tem seu coração partido mais uma vez,
pois Daniel tem certeza de ser estéril. Agora, 2 anos após a rejeição, ela, sua filha
Lizzie, e a família, se reúnem para uma comemoração e só bastou um olhar para
que Daniel recordasse que Lira falou para ele que estava grávida e seu coração se
encher de arrependimentos ao perceber a filha que ele rejeitou.

“O que importa é o agora. Um agora em que a minha menina pode


finalmente ter um pai”.

Mas seria Daniel capaz de apagar a mágoa no coração de Lira e conquistar


um lugar na vida das garotas Vittileno?
SINOPSE
DEDICATÓRIA
AGRADECIMENTOS
SUMÁRIO
PRÓLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18 CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
EPÍLOGO
OBRAS RELACIONADAS
REDES SOCIAIS
Lira
Amar um homem e sermos felizes para sempre? Não consigo mais
acreditar nessas palavras ou sentimento.

No casamento do Louis eu encontrei um homem que pensei que pudesse


ser mais do que uma aventura. Ele me respeitava, me tocava com força, os olhos
famintos e no meio da névoa de desejo, eu via o carinho em suas irises
castanhas.

Daniel Albuquerque é o último homem que partiu meu coração. O


primeiro foi uma paixonite quando eu ainda era criança e mal recordo o motivo
de termos terminado, acho que peguei o morango dele e ele não gostou. Mas
com Daniel foi diferente, era para ter sido somente uma noite, eu sabia disso,
mas aquela noite gerou uma consequência perfeita, um pequeno pacotinho se
desenvolveu no meu útero.

No casamento do meu irmão Levi, ele me seguiu queria mais uma noite
após ter rejeitado minhas ligações em que tentei revelar a ele sobre a gravidez.
Daniel não quis ouvir, me beijou, cheirou e enlouqueceu meu corpo. Como uma
boba, eu caí no encanto dele, a áurea de homem mais velho me hipnotizando,
como se ele fosse capaz de pela maturidade dar respostas a todas as minhas
dúvidas.

Daniel não percebeu meu ventre proeminente ou se notou, preferiu ficar


calado. Ele nunca se perguntou o que eu queria com ele e, como pude engordar
somente no ventre? Que homem não acharia isso suspeito? Por um segundo,
enquanto transávamos e ele sussurrava no meu ouvido que sentiu a minha falta,
eu me iludi de que no dia seguinte poderíamos conversar sobre o que aconteceu
entre nós.

No dia seguinte acordei solitária na cama, Daniel tinha partido mais uma
vez. Levi e Olivia decidiram se casar de última hora e com isso no final da noite,
estavam todos animados e comemorando a união do casal que passou pelo
inferno para conseguirem ficar juntos.

Naquela mesma noite eu procurei Daniel em seu quarto, o cheiro de


uísque purgante fez o meu estômago revirar. Brigamos porque ele me achou
grudenta e eu confessei a verdade, disse que estava gravida. Com nojo no olhar,
Daniel me mandou ir embora, ele tinha certeza de que o filho não era dele.

Meu coração foi partido há dois anos, me escondi daquele que me magoou
para tentar colocar a cabeça no lugar e cuidar da minha garotinha. Não posso
continuar dessa forma para sempre, por isso eu decidi usar esse espaço para
expurgar todas as lembranças que assombram o meu coração. Em poucas
semanas terei de encontrar o homem que me despedaçou, o pai ao qual minha
filha pergunta com os olhos brilhantes e eu nunca sei o que responder.

Meu querido diário, me ajude a achar a cura para meu coração, quando
ainda sinto a ferida me rasgando todos os dias.

Eu sou Lira Vittileno e essa é a história de como eu me tornei mãe e tive o


coração partido pela última vez. Nunca mais amarei e deixarei outra pessoa me
conhecer para levar uma parte minha, me deixando vazia e sem rumo.
Lira
Louis finalmente vai se casar!

Chego com alegria a mansão de primavera da minha família, tenho ótimas


lembranças dos dias em que passei aqui com os meus irmãos e algumas poucas
da minha mãe. Inspiro o ar limpo, finalmente o cabeça dura e cafajeste deu um
jeito na vida dele, eu entendo como é gostoso ficar com pessoas aleatórias e
casinhos de uma noite. Mas diferente do Louis, eu busco nos casinhos de uma
noite um amor que consuma.

Foi terrível me recuperar do choque foi saber que o Santiago, um colega de


produção transava comigo me enchendo de amores, tínhamos uma química forte,
ele era mais velho, sarado e muito bonito. Falava como um verdadeiro galã,
viajamos juntos duas vezes no final de semana e era harmônico trabalhar com ele
no set de filmagens da série drama que eu estava dirigindo.

Estava tudo perfeito, até o Santiago vir ao meu apartamento em Los


Angeles, o hálito fedendo a álcool, a mão na porta e a boca descendo para me
beijar. Foi quando a luz bateu no dedo dele e eu vi o aro dourado brilhando. O
empurrei e perguntei o que era aquilo, ele sorriu removendo a aliança do dedo e
guardando no bolso, me agarrou pela cintura me beijando novamente. Ainda
lembro a raiva que senti ao segurar o peito dele e gritar.

— Você é casado!?

— Isso importa? — dá de ombros, avançando novamente.

— Claro! Eu não me relaciono com homens casados!

— Não faça escândalos Lira, tem semanas que estou comendo sua boceta e
você não reclama. Até parece que não sabia que a Candice é a minha esposa.

O gelo penetrou forte na minha espinha, apertei a maçaneta com força o


suficiente para quebrar.

Candice Averon é a protagonista da série, nunca a vi de aliança no set ou


interagindo com o Santiago, até mesmo os sobrenomes deles são diferentes.
Como isso é possível?

— Ela nunca falou de você.

— Candice é discreta, não quer atrapalhar a carreira dela, agora vem cá —


avança para cima de mim. Espalmo as mãos em seu peito o empurrando para
longe.

— Nunca mais toque em mim. — Bato a porta na sua cara.

Depois disso Santiago usou a aliança todos os dias exibindo na minha cara
que era casado e eu fui feita de amante. Candice que era recatada e não mostrava
o relacionamento, anunciou que era casada para todos do set. O clima ficou uma
merda, pois ela era legal, me dava bom dia e perguntava como eu estava sempre
que podia, tinha paciência para refazer a cena até eu me dar por satisfeita e
sempre me encontrava com um cappuccino de manhã e tarde.
Eu não sabia se era alguma armadilha para me fazer sentir mal por ter
namorado o marido dela, ou ela realmente não sabia que eu tive um caso com
Santiago. Tive fortes crises de ansiedade enquanto trabalhava no seriado, e eu só
queria me esconder ou acabar em um dia as filmagens.

Para piorar, o babaca pegou a diretora de imagens, transando com ela no set
quando achou que todos tinham ido embora.

Ele tinha uma mulher incrível ao seu lado e a tratava feito lixo. Levi foi um
anjo me ouvindo e me ajudando a superar essa barra. Eu queria que ele também
se abrisse para o amor com Olivia, consigo ver as faíscas saindo de seus corpos
sempre que ficam perto um do outro, a tensão sexual chega a níveis alarmantes.

Termino de me arrumar e desço as escadas. Estanco na metade dos degraus


ao ver um homem charmoso perto do meu irmão. Eles conversam formalmente
no arco que divide a sala e a cozinha. Despretensiosamente vou me aproximando
do desconhecido. Ele é o homem mais sexy e charmoso que já vi.

A pele bronzeada esmaga o terno de linho bem acoplado a seu corpo. O


cabelo castanho claro disfarça os fios cinza embranquecidos que despontam na
lateral das orelhas e na barba bem aparada. O rosto de feições fortes e marcantes,
as maçãs proeminentes e o nariz afilado, arrepios me cortam ao imaginar como
seria sentir os pelos ralos entre as minhas pernas. O olhar castanho intenso, como
se ele pudesse ler a minha alma.

Engulo em seco parando perto deles. Ambos muito altos, me fazem parecer
pequena, mesmo no salto alto. O cheiro dele me invade como um, furação. O
homem cheira a sexo, bruto, suado e gostoso. Não ficaria surpresa em saber que
ele esteve com alguém antes de se vestir.

— Lira — Louis me chama com um sorriso — esse é Daniel, o novo CEO


da empresa no Brasil, essa é a minha irmã mais nova.
— Consigo ver a semelhança — a voz grave causa suaves arrepios em
minha pele — embora ela seja mais linda — ri grave. Estendo a mão para que ele
a pegue, os lábios quentes beijando a superfície.

— Lira sempre foi a mais bela de nós três — Louis fala orgulhoso.

— Prazer em te conhecer — recupero a minha voz.

— O prazer é meu — fala com malícia.

— Bom — Louis interrompe — precisamos falar de mais algumas coisas,


com licença Lira.

— Depois falamos mais, Lira — diz com a voz grave

Meu irmão leva o homem mais gostoso que já vi para longe e eu me abano,
sentindo o sangue volta a correr pelo corpo. Nunca me senti tão balançada na
presença de um homem como agora. Chega a ser imoral eu me deixar afetar dessa
forma com uma simples conversa e troca de palavras.

Abano o rosto caminhando para o jardim e me distraio até recuperar o


folego. Vejo a Olivia perto das cadeiras, Levi a observa de uma árvore, com o
Lorran distraído com uma borboleta. Acho que vou dar uma ajudinha ao casal.
Dou um passo na direção dela e travo ao fisgar o Daniel caminhando entre os
convidados, ele pisca para mim antes de se sentar.

O homem sabe que sou irmã do Louis e ainda me paquera, ele só pode ser
maluco. Não quero irritar meu irmão ou o fazer perder um negócio sem ter
certeza de que o Daniel quer ficar comigo, por isso caminho até a Olivia para
pedir a ajuda dela.

— Me ajuda — seguro seu braço a impedindo de sair do canto.

— O que houve? — franze a testa.


— Sabe o Daniel — aponto o homem que exala sexo do corpo — ele é
muito gato e eu quero ficar com ele — balanço ansiosa demais — acho que ele
quer também, desde que chegou fica me arrodeando e puxando assunto.

— Ele é muito bonito mesmo — Olivia fala depois de o observar


atentamente

— E educado, gentil e tem um cheiro... — reviro os olhos, abanando o


rosto, pegando fogo — enfim, eu tenho um dedo podre para homens e não quero
fazer besteira, me ajuda?

Dedo podre chega a ser um elogio, nunca consegui escolher direito os


homens com quem me relaciono. Todos, sem nenhuma exceção partiram meu
coração e me mostraram que era melhor ficar solteira do que perdendo tempo
com homem que não sabe valorizar a mulher incrível que eu sou.

— Com o que?

— Sonda ele para saber quais são as intensões dele flertando comigo desse
jeito.

— Lira, vocês nem se conhecem e já quer saber se o homem quer namorar


ou transar com você? — Me encara desacreditada.

— Exatamente! faz isso por mim?

— Tá, me dá um segundo.

Comemoro por ter convencido Olivia, ela é maravilhosa e será uma esposa
perfeita para o meu irmão. Só basta ele conseguir se abrir para o amor dela e
esquecer o passado. Se eu vivesse presa às minhas péssimas experiências, teria
desistido de ter um amor há anos, mas continuo na luta, buscando pelo amor de
um homem, ter uma família só minha.
Olivia bufa e vem irritada, ela não deve ter gostado da resposta do Daniel,
mas foda-se eu ainda quero esse homem.

— Ele é um cafajeste igual ao seu irmão, deu para perceber isso só


conversando, não se envolva.

Fico na dúvida se ela se refere ao Louis ao Levi, mas vou chutar na


primeira opção, e se ele realmente for como o Louis, então tem uma mínima
chance dele se apaixonar por mim como o Louis se apaixonou pela Bianca e hoje
estamos no casamento deles.

Pode dar certo ou errado, são 50% de chance para ambas as coisas.

— Aí merda — balanço as mãos me deixando convencer por minhas


loucuras — tenho um fraco enorme por cafajestes.

E pela ideia de converter um em um homem de família. Mas não digo a


última parte a Olivia.

— Não caia na dele, Lira — pede, sabendo que não vou dar ouvidos.

— Claro, pode deixar. — Respondo sem a encarar.

Vou sentar ao lado do Daniel e descobrir por mim mesma se o cafajeste


também pode amar como o Louis.

— Achei que não viria — ele fala, grave.

— Você sabe que sou irmã do Louis e não tem medo de se envolver
comigo?

— Não deixo relações de trabalho intervirem na minha vida privada — sua


mão desliza entre a fenda do meu vestido, alisando a pele do joelho — você
deixa?
— Se eu trabalhar com a pessoa todos os dias, ou se for meu chefe, então
sim. Não me envolvo com colegas de trabalho — obrigada Santiago, por reforçar
mais uma vez o motivo de ser uma péssima ideia, relação sexual no trabalho.

— Eu não trabalho com você — vira o rosto aproximando a boca da minha


— posso te foder sem culpa.

— Depois do casamento — digo a ele, vejo a cerimonialista me chamando


e me levanto.

Choro quando finalmente vejo meu irmão mais velho casado com o amor
da sua vida, a Bianca nem parece que deu à luz nos últimos meses, a pequena
Cecília dormiu aconchegada nos meus braços, e o Lorran no de Olivia. Levi pega
o filho no colo e eu entrego Cecília ao meu pai com a desculpa de que preciso ir
ao banheiro.

Eles vão levar as crianças para dormirem enquanto os adultos seguem para
a festa na estrutura montada no jardim.

Entro no meu quarto na mansão e fecho a porta respirando fundo, tento


controlar a emoção, mas as lágrimas se derramam em enxurrada pelo meu rosto.
A saudade que sinto da minha mãe sufoca meu peito como um punho. Ela deveria
ter entrado no altar com o Louis hoje, conhecer a neta que é a cara de seu filho
amado, me dar conselhos de que é uma péssima decisão me envolver com
homens que partiram meu coração.

Mas ela não está aqui, deslizo contra a porta, abafando os soluços e a
vontade de conseguir me lembrar dela com nitidez. Seu rosto nas minhas
memorias começa a desaparecer como fumaças, eu era tão pequena quando ela
morreu em um acidente de carro, tivemos pouquíssimos momentos juntas e tive
de passar por tanta coisa sem ela, dependendo das governantas para me ajudarem,
e hoje eu percebi que no dia em que me casar e tiver meus filhos, ela não vai estar
lá sorrindo para mim.

Não lembro a última vez em que a vi, mas a dor de descobrir a sua perda
ainda incendeia meu coração.

Batidas soam na porta, levanto limpando o rosto.

— Lira? — a voz grave do Daniel.

Abro a porta, escondendo metade do rosto.

— Sim?

— Tudo bem com você? Te vi chorando enquanto subia as escadas.

— Só fiquei muito emocionada com a cerimônia — fungo, abrindo a porta


para que ele entre.

— Casamentos são entediantes — ele fala sentando-se na cama — prefiro


quando acaba — a dupla sugestão na sua voz desperta meus sentidos, me fazendo
esquecer por um segundo a dor que me atormentava.

— Já foi em muitos?

— Sim, inclusive no papel de noivo.

A informação não me surpreende, Daniel é charmoso e deve ter por volta


de uns quarenta anos. Seria estranho um homem como ele não ter se casado.

— É divorciado? — preciso ter certeza de perguntar dessa vez.

— Sim, há muitos anos — se levanta como um predador — vamos


aproveitar a festa do seu irmão antes de podermos desaparecer sem chamar
atenção — cheira meu pescoço, arrepios percorrem minha pele como brasa.
— Boa ideia. — Respondo.

Não espero pela resposta dele, giro nos calcanhares deixando o quarto. Sou
grata por ele ter aparecido e me distraído da dor sufocante no peito. Vou usar o
Daniel para outra distração mais tarde, por enquanto quero ficar mais um pouco
com a minha família e compartilhar da felicidade deles.
Lira
— Dance comigo — puxo o Levi pela mão o arrastando para a pista de
dança. Nossa tia, Antonella, começou a puxar conversa e quase não o deixava
respirar com o sermão de que o Levi tem de superar a morte da Blanca.

— Grazie — ele suspira segurando minha cintura enquanto giramos


animados ao som das músicas típicas italianas.

— Tia Antonella estava a cinco passos de te jogar de uma ponte por não ter
se casado novamente.

— Eu a vi me jogando da ponte — arregala os olhos, as pupilas azuis


brilhando na luz.

Finalmente a cor voltou ao rosto do meu irmão.

— Promete não desperdiçar a sua chance com a Olivia? — Peço, com um


bolo na garganta por tê-lo visto tendo dias maravilhosos e depois caindo no
inferno novamente. Meu irmão merece ser feliz, e a Olivia é o sol que surgiu para
clarear os dias dele.
— Sì, não vou mais cometer erros — respira aliviado — eu aceitei que
Blanca foi uma grande parte da minha vida e a mulher que amei por muitos anos.
Mas ela se foi e eu continuo aqui, vivendo, eu posso amar a Olivia e amar a
Blanca, mas nunca mais machucarei a Olivia pelo amor que tive com a Blanca.

— Eu fico muito feliz em ouvir suas palavras — paramos, puxo seus


ombros abraçando-o.

— E você, quando vai parar de ser uma versão cafajeste de saia do Louis e
aceitar o amor?

Gargalho, meu pai vive me chamando de “Louis versão feminina”, por


anos fui desapegada como Louis. Se o cara não me fazia sentir borboletas no
estômago, somente excitação, eu ficava com ele até outro despertar mais meu
desejo. Pulando de sapo em sapo, em busca do príncipe encantado que nunca
veio. Depois de Santiago, eu não quero outro príncipe, quero um homem de
verdade que me cause um vendaval no estômago e excitação no útero.

Eu quero um amor completo, alguém que me faça flutuar com os pés no


chão. Um homem capaz de entender meu coração, aceitar minha profissão e que
nunca abdiquemos de nada que amamos pelo outro. Alguém para dividir sorrisos
e enxugar lágrimas, um homem como o Louis, capaz de ficar longe da mulher
que ama para a proteger e lutar com a alma para a reconquistar. Ou como o Levi,
que seja capaz de superar as dores que rasgam a alma pelo amor da companheira.

Eu posso ser libertina, mas ainda tenho um coração que anseia


desesperadamente pelo amor. Às vezes, eu relembro de como as mães das minhas
amigas adolescentes as controlavam, para não namorarem e não fazerem sexo,
que isso só fazia os homens quererem se divertir com elas, achando que eram
fáceis, e mulheres para uma única noite. Minha mãe morreu quando eu tinha 6
anos e meu pai sempre ficava constrangido ao precisar falar de sexo comigo.
Lembro como se fosse hoje quando menstruei a primeira vez e fiquei
desesperada, sem saber o que era o sangue na calcinha. Gritei tão alto, que o
Louis entrou no banheiro feito um foguete — meu banheiro era acoplado ao
closet e não tinha porta — meu irmão ficou vermelho como um tomate enquanto
eu achava que estava morrendo e pedia que ele me levasse ao hospital. Foi o
Louis quem me ensinou o que era menstruação, e comprou meu primeiro
absorvente.

De tarde, a governanta veio conversar comigo e me explicar o ciclo de uma


menstruação, e perguntou se eu queria ir a ginecologista. Eu sentia tanta dor que
aceitei na hora. Uma médica me ensinou o que era para a minha mãe ter feito,
quando cheguei em casa, eu chorei de saudade. Implorei ao universo para me
deixar falar ao menos uma vez com ela, para que ela pudesse ter somente mais
um minuto na terra comigo.

A Lira de 12 anos clamou pela mãe no silêncio da noite, como a Lira de 28


anos faz, quando sente uma saudade e um vazio estarrecedor. Se ao menos meu
pai tivesse casado novamente, eu teria tido uma figura feminina comigo.

A única lembrança que tenho da minha mãe, é de quando eu acordava e a


chamava para ela despertar, pois queria comer. Mamãe sorriu, alisou meu cabelo
e levantou me levando para a cozinha.

Desde então eu busco pelo que chamam de amor, tentando encontrar


qualquer coisa que preencha o buraco no meu peito pela saudade que a minha
mãe deixou. Eu sou uma versão masculina do Louis e do Levi, que amou
intensamente, e de mim mesma, a Lira que não aceita nada menos do que mereço,
uma mulher que sabe o seu valor e não está disposta a deixar qualquer um entrar
para descobrir as minhas feridas e ir embora, levando uma parte importante de
mim.
— Quando eu encontrar essa pessoa, você será o primeiro a saber — aperto
o nariz dele, vejo a Olivia o olhando com expectativa — agora vá ficar com a sua
amada.

— E você?

— Vou continuar aproveitando o casamento, acabei de ver um garçom com


zeppole preciso de um.

— Vai lá — ele beija minha cabeça e some indo ao encontro do seu amor.

Não minto, vou direto atrás do zeppole, uma rosquinha tradicional da Itália,
partida ao meio com recheio de creme confeiteiro no meio e em cima, com amora
no topo e açúcar de confeiteiro polvilhado. Como duas deliciosas, quando sinto
um arrepio na espinha. Giro o pescoço encontrando olhos afiados me encarando,
Daniel me desafia com o olhar para chegar perto dele.

Giro dando-lhe uma visão das minhas costas nuas pelo vestido, eu sinto a
pressão do ar mudando pelo caminhar dele na minha direção. Uma mão grossa
pousa na base do vestido, e seu cheiro amadeirado invade meu nariz com força,
me fazendo inspirar forte.

— Boa noite — murmura rouco.

— Boa noite — giro a cabeça na sua direção encarando-o de rabo de olho e


levo o dedo com creme a boca, chupando devagarinho. Daniel morde o lábio
inferior aproximando a boca do meu ouvido.

— Tenho algo mais gostoso para você chupar — a outra mão desce a
minha cintura trazendo meu quadril de encontro a sua pélvis.

Daniel é obsceno, seduz facilmente com uma palavra, é um pecado para a


minha libido. Tenho vontade de deixar que ele me foda aqui mesmo, nunca fui
adepta a jogos de sedução, de negar o que você quer. Se eu quero um homem e
ele me quer, ficamos juntos, sem complicações — a menos que ele seja um
safado traidor.

— E eu para você — sussurro. Levo meu dedo a seus lábios, Daniel beija a
pontinha discreto, dando uma mordida na pele macia.

— Consigo sentir o cheiro da sua excitação— rosna baixinho no meu


ouvido — te foderia agora, na frente de todas essas pessoas.

— E seria demitido antes de levantar meu vestido — o provoco. Tem algo


de quente em saber que estou pegando um amigo do meu irmão. Nunca me
envolvi com os amigos de Louis ou Levi, sempre foram proibidos, mas Daniel é
como a serpente que tentou Eva, não consigo me manter longe.

— Seus irmãos não precisam ficar sabendo — ele sopra na minha orelha —
Louis já subiu com Bianca e Levi se escondeu com a Olivia em algum canto.

— Ficou prestando atenção neles só para me provocar? — arqueio o queixo


encontrando o dele.

— Estava preparando o terreno para caçar a minha presa — ele morde meu
queixo, fecho os olhos, sua língua serpenteia nos meus lábios. — Vem comigo.

Não é um pedido.

Fico ereta, de queixo erguido, eu saio na frente, quando percebo seus


passos parados, giro o tronco e o chamo com o indicador. Como um cachorrinho
obedecendo à dona, Daniel vem a mim, o sorriso lascivo nos lábios, sabendo o
que o aguarda. Um homem como ele não tem chances de ser ruim de cama ou ter
um pau pequeno, mas caso seja, sempre tenho uma armadilha pronta para correr
de homens ruins de cama.

Se eu falar “banana” meu celular toca com uma falsa ligação, invento que
tem alguém passando mal e vou embora, sem peso na consciência. Nada dói mais
do que um cara cheio de marra de bom fodedor, e ele ser uma tristeza que se
importa somente com o seu prazer. Sexo é uma atividade feita por duas pessoas
— o convencional — se ambos não estão gostando, o outro não deve suportar só
pelo parceiro. Ou é bom para ambos, ou não tem.

Subo as escadas sentindo Daniel a uns passos de distância, entro no quarto


e paro no centro, girando de frente. Ele passa pelo portal como um rei, os dentes a
mostra em um sorriso arrasador de calcinhas, os olhos em chamas e a calça
marcada pelo pau. Esse homem é enorme! Um arrepio me corta da espinha a
vagina, queimando por onde passa.

— Lira — a voz grave pronúncia meu nome como se ele estivesse me


fodendo — tira o vestido.

— Venha você — o chamo com o dedo — fazer isso.

Daniel ri rouco, o hálito quente de uísque toca minha face com sua
aproximação. Os pés batem contra o meu, e sua perna se enfia entre as minhas.
Perco o equilíbrio com o choque, seu braço forte rodeia minha cintura me
puxando para perto. A ponta dos dedos quase não tocando o chão, os seios
esmagados contra o peitoral forte dele.

— Gosto de mulher mandona — agarra forte minha bunda — com essa


carinha de anjo, você esconde o demônio que se esconde nas suas veias.

— Eu sou uma Vittileno, nunca espere que sejamos passivos — digo


estralando a língua na boca.

Daniel sorri, desce o nariz encostando no meu, seus lábios tocam o meu e
se afastam, me provocando com pequenas carícias. Agarro seu cabelo enfiando os
dedos nos fios macios. Pego impulso pulando para cima, rodeando sua cintura
com as coxas, seguro seu queixo, enfiando as unhas na carne áspera da barba e o
beijo.
Enfio minha língua na sua boca, aproveitando cada pedacinho macio e
molhado que encontro. Esfrego o quadril em seu tórax sarado, exploro o peito
duro removendo seu paletó, enquanto chupo sua língua com lasciva. Solto seu
rosto adorando o vermelho inchado dos lábios, seguro a camisa de botões
puxando em direção oposta, fazendo os botões voarem pelo quarto.

Daniel tem o fogo de um vulcão nos olhos. A boca sedenta desce contra
meu pescoço mordicando a pele. Fagulhas de prazer se espalham, consumindo
minha sanidade e mandando o cuidado para o inferno. Ele anda, bate o joelho na
cama e me joga contra o colchão. Mal tenho tempo de reagir e sua boca volta
devorando minha pele, as mãos apertando meus seios como se fossem ursos de
pelúcia.

Encontro o volume em sua calça e me esfrego contra ele. Daniel rosna


contra a minha pele, segura as alças do vestido abaixando, prende meus braços
com o tecido, impossibilitando que eu me mexa. Um tremor de excitação corre
perigoso quando percebo a intenção dele. Com os braços presos, Daniel me vira
de rosto contra o colchão, puxa meus pulsos e os prende com a gravata.

— Você gosta de sexo pesado — ele puxa meu cabelo, batendo minha
lombar no seu tórax — vou comer sua boceta até que não consiga andar. Se gritar,
eu te bato — estapeia minha bunda, arfo — entendeu?

— Ah, bebê — rio rouco, provocativa — eu vou gritar implorando pelos


seus tapas.

— Porra Lira — Daniel puxa meus cabelos, os olhos lacrimejam pela dor e
eu arfo, ensandecida para que ele me foda.

Daniel solta meu tronco, bato no colchão com a bunda empinada. O vestido
sobe enrolando na cintura, a calcinha desce pelas coxas e seus dedos alisam a
região macia com delicadeza. A mão dele me deixa, o ardor se espalha, o tapa
estrala alto, e eu gemo me deliciando. Daniel me bate mais cinco vezes, abro as
pernas, sedenta para ter seu pau em mim, pingando de desejo para ser fodida.

— Abre mais, vou estapear sua bocetinha — ordena, e eu me arreganho


para ele, quase babando no colchão. — Você ficou encharcada e nem coloquei
meu pau para fora da cueca — os dedos me provocam, gemo empurrando contra
sua mão — nunca encontrei uma mulher como você, que se entrega ao prazer,
sem vergonha — seu rosto desce contra minha bunda, esfregando a barba — eu
vou te comer a noite toda, até eu não ter mais porra.

— Aproveite — digo a ele — pois será a única vez.

— Uma noite e nunca mais, porra Lira — estapeia minha vagina, grito,
quase gozando — não tem como ser mais perfeita!

Daniel não é o príncipe que eu procuro, ele quer uma foda alucinante, tanto
quanto eu. Nunca fui de implorar por homem e não vou fazer isso por esse
cafajeste gostoso. Se nossos destinos se cruzarem novamente, que seja por outro
motivo.

Daniel me leva ao paraíso, beliscando meu clitóris, o rosto barbudo


provocando a polpa da minha bunda. Ele me abre, metendo a língua no meu
interior, deliro gemendo, rebolando na sua cara, na iminência de um orgasmo. A
mordida na minha entrada é o meu fim, o corpo superaquecido de prazer
despenca com a onda forte tomando meus nervos, gemo contra o colchão, vendo
fogos de artifício.

— Deliciosa — ele me vira de frente, os lábios e a barba molhados. Daniel


puxa o tecido do vestido me fazendo ficar de joelhos. Pressiona a calça no meu
rosto, cheiro o sexo por cima do tecido, mordendo a proeminência. — Abre a
boca e chupa. — Manda.
Abro os lábios pronta para o receber. Daniel retira o pau da calça e eu
salivo ao ver a grossura e o tamanho. Minha vagina contrai ansiosa para o ter.
Beijo a cabeça rosada enfiando o que consigo, o chupo com maestria, arrancando
gemidos roucos de sua garganta, deixando claro o quanto ele gosta que eu o tenha
na boca.

Daniel puxa meu cabelo me fazendo o soltar com um “ploc”, alisa meus
lábios e me joga novamente no colchão. Abro as pernas, pronta para recebê-lo.
Daniel cai contra meu corpo, alisando o pau na minha vagina como um vibrador.
Morde meu pescoço e mete no meu interior com força. Grito, amando a sensação
de ser preenchida.

A cama balança, meu corpo sobe e desce, enquanto ele soca com força e
velocidade no meu interior. Os braços doem pela posição e eu faço da dor um
prazer inestimável. As mordidas vão para meu peito, mordiscando a carne entre
os dentes, enlouquecida eu chamo seu nome várias vezes. Daniel surge acima da
minha cabeça, beija meus lábios e me olha lascivo.

— Eu poderia comer sua boceta para sempre — confessa — molhada,


quentinha, e apertada como o inferno.

— Seu pau enorme vai me partir em duas — respondo, quase babando —


eu te deixaria me comer todos os dias.

— Só uma noite é pouco — admite, gemendo na minha boca — vou te


pegar sempre que eu quiser.

— Terá de ir a New York para isso — sorrio com o prazer do orgasmo se


aproximando. Inclino a cabeça para trás, rindo em meio a minha crise — isso
Daniel, mais forte.

— Toma sua safada — ele enfia até o meu útero e vejo estrelas.
A temperatura do quarto sobe como um foguete. O ventre contraindo feito
louco, os dedos apertados com o prazer me cruzando de uma ponta a outra.
Prendo a respiração quando minha crise atinge o seu ápice, e desabo na cama
satisfeita. Daniel geme rouco, gozando, ele bombeia mais uma vez antes de sair
de dentro de mim e se deitar de lado.

A noite só iniciou, gozo mais duas vezes com o Daniel antes do sol nascer.
Na porta do quarto, o beijo uma última vez.

— Foi um prazer — digo.

— Até mais. Lira — meu nome se desmancha em sua boca.

Apesar das palavras ditas enquanto transávamos, sabemos que nosso caso é
de uma única noite.
Lira
Deixo o diário em cima da mesa, de volta a meu apartamento em Los
Angeles, eu me preparo para as filmagens da nova adaptação em filme, do livro
“Ultrapassando o tempo por você” a primeira foi um desastre.

O diretor trocou a história dos personagens criando algo totalmente novo, o


que revoltou os fãs, que fizeram um abaixo assinado com mais de três milhões de
assinaturas para a produtora, pedindo outra adaptação. Os livros disparando em
vendas para realçar a popularidade da obra, e aqui estou eu, terminando de fazer
os últimos ajustes que a roteirista me mandou, pronta para dar vida a uma versão
fiel ao livro.

Parto para Vancouver amanhã, onde passarei os próximos seis meses


dirigindo as gravações, e os três seguintes, editando e dando vida a um filme com
orçamento de 80 milhões de dólares. Esperamos um sucesso que seja capaz de
arrecadar mais de 200 milhões na semana de estreia, tendo como base a primeira
versão que foi cruelmente criticada, e ainda rendeu 120 milhões na estreia.

Não faz nem três dias que voltei para casa, após o casamento do Louis, e
por mais que use o trabalho para conseguir me distrair, a imagem do Daniel
retorna aos meus pensamentos. Os olhos frios como gelo e a boca quente como o
inferno, beijando meu corpo, me tomando para si e enlouquecendo cada pedaço
do meu ser. Nunca tive tanta vontade de repetir uma transa quanto com esse
homem.

Um miado chama a minha atenção, através da varanda vejo Puppy, um gato


com nome de “cachorrinho” o casal que a cria tem uns parafusos soltos e se a
Puppy veio na varanda pedir atenção, imagino que seus donos estejam transando
loucamente e em breve vou ouvir gemidos.

A vizinha conservadora do outro lado vai sair para o lado de fora batendo
na porta dele com panelas, que só recebera como resposta mais gemidos altos.

Me estico pegando a Puppy no colo. O pelo ralinho e amarelo, esfrego o


nariz na sua barriga quando o primeiro grito chega ao meu apartamento.

— Se eu não viajasse tanto a trabalho ficava com você — falo para ela que
mia esticando o pescoço pedindo carinho no queixo.

Aliso a pele macia, outro grito da vizinha Molly e um rugido do Terry, o


cheiro de maconha invade como uma tempestade meu apartamento, acho que eles
esqueceram de fechar a porta. Se a Megan pudesse, já teria os, denunciado para a
polícia, mas Molly é filha do comissário de polícia de Los Angeles, e Terry, o pai
é desembargador. Dando a liberdade ao casal de usarem quanta maconha
quiserem.

Os polícias do distrito já se acostumaram com a Megan ligando para


reclamar do casal, e só aparecem para colocar a mulher para dentro de casa.
Qualquer dia eu vou escrever um filme de comédia sobre um casal gente boa, que
gosta de transar fazendo zoada, e precisam lidar com a vizinha conservadora que
não sabe o quanto um orgasmo te faz perder o sentido de tudo e transforma
pequenos gritos em barulhos estrondosos.

— Eu tive sorte de ninguém ter me ouvido — reflito.


Puppy parece que ri de mim ao abrir a boca mostrando todos os dentes.
Gargalho feliz pela experiência que vivi, depois dele, não sei quando terei outro
homem novamente, decidi que vou dar um tempo na pegação. Focar no filme e
estar pronta para retornar ao Brasil ou Itália, quando a Olivia ganhar bebê, por
enquanto os dois pareciam bem quando os deixei com a promessa de se darem
uma nova chance, sem fantasmas os separando.

****

Meus dias passam voando, quando me dou conta, um mês se passou desde
que cheguei a Vancouver, o tempo frio acaba comigo, uma gripe me faz ficar de
cama por vários dias. Minha assistente, Louise, cuida de mim como uma
verdadeira irmã. Após essa maldita gripe passar vou garantir um aumento para
ela, ninguém merece ficar segurando meu cabelo enquanto vomito colocando as
tripas para fora.

— Lira, eu acho que você não está gripada — ela fala após uma longa
sessão de vômito matinal.

— E o que eu teria? — pergunto após lavar a boca. Estamos no estúdio de


filmagens, conseguimos filmar até a cena 27, é um avanço enorme no
cronograma de 150 cenas para serem feitas em 6 meses.

Deixo o banheiro particular da minha sala e me sento no sofá, colocando


uma bolsa de gelo na cabeça. Mais cedo fiquei tonta e acabei batendo a testa em
uma câmera, estou com um galo enorme e sem forças para continuar. Só preciso
dormir por umas longas semanas.

— Pensa comigo — ela se senta ao meu lado, segurando a minha mão —


você foi para a Itália após ter tido uma infecção e precisado usar antibióticos,
certo?
— Nem me lembra daquela infecção — reclamo gemendo, eu fiquei
horrível por semanas.

— O antibiótico cortava o efeito do anticoncepcional e você não tinha


retornado ainda o uso de uma nova tabela quando transou com o Daniel, e agora
um mês depois está com enjoos e ficando tonta. Sem contar o cansaço, você
dormiu enquanto o Pedro fazia a cena dele!

— Era uma cena muito chata — a dor na cabeça não me permite


acompanhar a linha de pensamento dela.

— Eu acho que você deveria fazer um teste de gravidez.

— O quê? — pulo, me arrependendo no mesmo segundo.

A tontura me joga de volta no sofá e o mundo gira ao meu redor, se


desmanchando em água. Louise segura meus ombros, os olhos dela perdem o
foco e a sua voz é abafada na minha mente.

— Respira devagar, vamos.

Faço o que ela pede, aos poucos consigo me acalmar e respirar melhor.
Relembro a minha noite com Daniel, buscando vestígios de que eu tenha
esquecido de usar camisinha. Eu lembro de absolutamente cada segundo, menos
do momento em que ele vestiu a camisinha antes de me foder. Ele pode ter feito
sem que eu olhasse, certo? Merda de álcool misturado ao tesão, não me deixaram
prestar atenção ao que acontecia no momento.

— Preciso fazer um teste — digo a Louise.

— Vou comprar um.

Ela deixa a sala e eu me deito, refletindo sobre o que vou fazer da minha
vida se eu realmente estiver gravida. Minha jornada no set de gravação é intensa,
iniciamos as 8 da manhã e só vamos embora depois das 22h, para cumprir o
prazo e as cenas poderem ficar perfeitas. Eu não tenho como cuidar de um bebê
enquanto vivo nessa loucura de vida atarefada e o Daniel...

MEU DEUS!

Ele é um homem adulto, divorciado, que eu não sei quase nada sobre a
vida, além de que trabalha para o meu irmão, e se ele tiver filhos e não quiser
outro? Prometemos que seria somente aquela noite, se eu aparecer contando que
fiquei grávida ele pode pensar que sou uma interesseira ou uma maluca que
engravidou para o prender.

Eu não quero aquele homem e muito menos me prender a alguém. Não


importa o quanto o sexo foi maravilhoso, não vou me casar somente pelo bebê.
Eu quero amor, paixão, alguém para cuidar de mim, que me ajude a relaxar e
possa entrar na minha vida, e me deixe fazer parte da sua.

Esse não era o acordo com o Daniel, e o medo de como ele vai reagir gela a
minha espinha. Eu deveria ter lembrado que não estava usando o
anticoncepcional e mandado ele colocar uma camisinha! Bato na testa sem saber
o que farei da vida. No segundo em que Louis descobrir sobre o bebê, vai querer
saber quem é o pai e o motivo de não estarmos juntos, ele vai matar o Daniel!

Pego o celular em cima da mesa procurando nos contatos o número do


homem que vai virar meu mundo de ponta cabeça. Não o encontro, claro que não,
a gente não trocou números. Ando de um lado ao outro sem saber o que fazer, se
eu pedir ao Louis, ele me manda, mas existe a grande chance de ele querer saber
o motivo e não quero causar problemas para o Daniel sem ter uma certeza de
nada.

Respiro fundo me acalmando, como eu poderia conseguir o número? Se


estou realmente grávida, ele tem o direito de saber sobre o bebê e decidir se quer
fazer parte da vida da criança. Não vou esconder do meu bebê que ele tem um
pai, seu nome e onde mora, é o mais certo a se fazer pela criança. Não é porque
eu não tenho nada com o Daniel, que ela não pode ter.

Sento-me cansada de andar. Louise entra segurando uma sacola com o


teste, pego da sua mão e corro para o banheiro. Faço xixi no palitinho e saio do
banheiro, o coloco em cima da mesa e aperto a mão da Louise. Os minutos
seguintes selam o meu destino com a notícia que eu nunca imaginei ouvir, ao
menos não nos próximos anos.

— Positivo — Louise fala — você está gravida.

— Meu Deus.

É tudo o que digo antes de apagar, caindo para trás.

Acordo com um cheiro forte no nariz.

— Funcionou — Louise diz.

Abro os olhos vendo-a e o diretor de imagem, Devon, ele tem um pano


debaixo do meu nariz e me encara de testa franzida. Me levanto devagar, com a
cabeça doendo. Aos poucos as lembranças retornam, levo a mão a testa fechando
os olhos com a dor de cabeça que estará por vir.

Eu vou ser mãe, não faço a mínima ideia de como fazer isso, só tive uma
até os 6 anos e fui cuidada por três homens extremamente ciumentos e protetores.
Mas safados ao ponto de me ensinarem que devemos ser desapagados de amores
que só vão nos machucar. Louis engravidou a Bianca e encontrou o amor dela,
Levi engravidou a Olivia e estão construindo um novo amor. E agora, eu
engravidei do Daniel, quais as chances da história se repetir?

A enorme diferença entre mim e as duas, é que eu não sou um poço de


gentileza como a Bianca, ou ilumino as pessoas como a Olivia. Eu sou só a Lira,
aquela que se apaixonou tantas vezes e teve o coração partido, que desistiu de
procurar por um príncipe encantado. Eles não existem e eu tenho certeza de que o
Daniel, com a brutalidade dele, não é esse tipo de homem.

Levo a mão ao coração respirando devagar, enquanto decido o que vou


fazer nas próximas horas. Peço que me deixem sozinha e mando o diretor
assistente prosseguir com a agenda de gravação do dia. Vou para o apartamento
em Vancouver e deito olhando as estrelas, em busca de uma solução. Quando o
fuso horário coincide com o, Itália, marcando 9 horas da manhã lá, eu mando
uma mensagem para a Bianca.

“Preciso da sua ajuda, eu quero o número do Daniel. Não pergunta o


motivo e nem fala ao Louis, pode me ajudar?”

Três minutos depois, ela me envia o número, sem fazer perguntas, com a
frase:

“Estou aqui para o que você precisar e não direi nada ao seu irmão”

“obrigada”

Fecho a conversa e ligo para o Daniel. O número chama até cair na caixa
de mensagens, tento novamente mais três vezes, até ouvir a voz grave do outro
lado.

— Daniel Albuquerque — ele fala.

Meu ventre se contrai em ansiedade pelo que precisarei fazer. Talvez seja
melhor marcar um encontro pessoalmente do que dar a notícia por telefone.

— Oi, é a Lira, a irmã do Louis, lembra de mim?

A linha fica muda por uns minutos, levando meu coração a quase sair pela
boca.
— Sim, senhorita Vittileno — odeio a formalidade na sua voz, indica que
ele não quer ter essa conversa.

— Precisamos nos ver, quando você estará livre?

— Acho que uma coisa não ficou clara naquela noite — Daniel faz um
som, como se estivesse fechando uma porta — nosso caso foi de somente uma
noite, não iremos nos ver a não ser, que seja pelo Louis.

— Você não entende — tento argumentar, ele faz um som de “xiu” no outro
lado e me calo.

— A senhorita que não entendeu, não temos nada para conversar, adeus
Lira.

A linha fica muda e eu quero socar a cara do Daniel. Imagino como a


situação deva parecer para ele, a irmã do seu chefe, com quem ele transou,
ligando um mês depois e pedindo para se encontrar, como se morássemos na
mesma cidade.

A recusa dele só acende o meu fogo em fazer com que o Daniel saiba sobre
o bebê. Esse desgraçado não vai escapar facilmente, não depois do modo como
me tratou.

Eu sou Lira Vittileno, e o Daniel Albuquerque vai aprender que não se


engravida uma Vittileno e foge impune.
Lira
Uma menina!

A frase não para de repetir na minha mente, enquanto a médica continua


apontando para o ultrassom, mostrando as formas da minha menina e as batidas
forte do seu coraçãozinho, preenchendo a sala. Infelizmente não tenho ninguém
me acompanhando, vim a todas as consultas, sozinha, e isso me deixou abalada.

É difícil ignorar a sensação de solidão, quando o pai da minha bebê se


recusa a falar comigo e ouvir sobre a filha dele. Não aguento mais ouvir a voz
intragável da secretária do Daniel. Se não fossem pelas gravações da série, eu
teria ido pessoalmente ao Brasil, fazer aquele arrogante ouvir que será pai e que
ele vai assumir a criança.

Por enquanto não contei a ninguém sobre a bebê e espero continuar assim,
não estou emocionalmente estável e minha equipe tem sofrido com a alteração de
humor e o quanto tenho passado mal no período das gravações. Sei que a minha
médica vai brigar comigo novamente, quando terminar de falar sobre o
desenvolvimento da bebê de 15 semanas no meu ventre.
— Lira, eu continuo preocupada — ela fala limpando meu ventre do gel —
a bebê deveria ter cerca de 16,5 centímetros nesse período. Mas ela está
pequenininha, ainda com 13 centímetros, apesar de estar se desenvolvendo
normal e não ter nenhuma anomalia detectada, ela precisa ganhar mais 3
centímetros e continuar se desenvolvendo conforme o esperado para a gestação.

— Meu ventre quase não aparece — suspiro, sentindo a dor no peito por
estar ofendendo a minha bebê — eu juro que estou tentando me alimentar melhor
e descansar — lágrimas invadem meus olhos — mas é muito difícil fazer
qualquer alimento parar no meu estômago. Vomito assim que mordo a primeira
fatia, até de uma maçã. — Soluço — eu não sei o que fazer, preciso continuar
trabalhando para encerrar a série, e o que posso fazer deitada para descansar, eu
realizo, mas é difícil.

— Vamos trocar o seu remédio de enjoo, por enquanto quero que você vá
tomar umas vitaminas na veia. E preciso de mais exames da bebê para saber se
ela está nutrida. Volte daqui a um mês, e caso o enjoo não cesse e você continue
perdendo peso, teremos de usar métodos mais ofensivos para te fazer se
alimentar.

— Certo — respondo limpando os olhos.

É tão difícil não ter ninguém me ajudando e ter de lidar com a pressão da
diretoria por eu estar a uma cena de atrasar a finalização da série. Quando esse
trabalho acabar, vou tirar férias por tempo indeterminado, não aguento mais a
pressão da indústria e saber que estou causando mal a minha bebê acaba comigo.

Não posso contar com os meus irmãos, eles estão seguindo com suas vidas
e superando suas próprias dificuldades, o pai da bebê simplesmente decidiu que
eu não existo e se recusa a falar comigo, estou perdida como nunca estive. Vou
direto para a sala da enfermaria tomar as vitaminas, a enfermeira sorri triste por
me ver ali novamente, praticamente depois de toda consulta, tenho vindo até aqui
tomar algo.

Me sento na poltrona e tento controlar as lágrimas que jorram. Enquanto o


líquido pinga lentamente na minha veia, escrevo no meu diário sobre os
acontecimentos de hoje e a frustração por estar sozinha.

Sempre me criei rodeada por homens e nunca foi o suficiente para suprir a
dor no meu peito, não queria que a minha bebê crescesse sem um pai na sua vida
e sentisse o que senti pela ausência da minha mãe, mas se o Daniel se recusa a me
atender, só posso esperar pelo dia que vamos nos reencontrar. Mas pela minha
pequena, eu vou fazê-lo me ouvir.

O tempo continua passando e minha bebê não ganha o peso esperado, ou


cresce o suficiente, dependendo da roupa que uso não parece que estou com 20
semanas de gestação, a única coisa que me conforta é saber que apesar de ser
pequenina, ela se desenvolve corretamente no meu ventre e não apresentou
nenhuma deficiência ou falta de nutrição. Continuo tomando o soro com
vitaminas todos os meses.

Em breve será o aniversário da pequena Cecília, minha sobrinha vai fazer 1


ano e vamos reunir a família na Itália. A Olivia está enorme com a gravidez
avançando, e me pergunto quando o Levi vai pedi-la em casamento de uma vez.
Tenho mantido contato constante com meus irmãos, e é bom ver como eles estão
felizes com suas amadas.

Diferente de mim, a Olivia tem um barrigão enorme, nem mesmo parece


que a diferença de tempo de gestação entre mim e ela é só de algumas semanas.

Eu queria que o Daniel fosse capaz de entender que eu não estou pedindo
um relacionamento, somente que ele reconheça a paternidade da filha, ou, no
caso, fique ciente sobre a existência da bebê. Já tem cinco meses e meu ventre
não se desenvolveu muito, aumentou pouca coisa. Sem uma evidência explicita
da bebê em meu ventre, dificilmente ele notará, se eu não o falar sobre a bebê.

Passo horas andando de um lado para o outro com o encerramento das


filmagens. O filme precisa ficar pronto em 15 dias e não temos um só segundo a
perder, minha bebê se desenvolve saudável no meu ventre, pequenina, mas muito
bem, é o que importa. O remédio de enjoo ajudou um pouco, tenho um
despertador no celular me lembrando de comer e descansar, faço o máximo que
posso para a correria não prejudicar minha filha.

É fácil disfarçar a gravidez usando blusas de moletom e não exibindo a


barriga pela cidade. Ainda não contei aos meus irmãos e planejo fazer isso
somente no aniversário da Cecília, tirar o band-aid de uma vez, e deixar o Louis e
o Levi enlouquecerem, antes de quererem saber quem é o pai. Não direi que é o
Daniel antes de ter a certeza de que ele vai assumir a pequena no meu ventre,
ainda não me decidi qual nome darei a ela.

Eu cresci com a dor de perder a minha mãe, a minha pequena não vai
crescer rejeitada pelo pai. Se ele não assumir a responsabilidade, direi a todos que
o pai da bebê morreu em uma explosão nuclear e assim ninguém me fará
perguntas invasivas. Tenho certeza de que meus irmãos não vão acreditar nessa
desculpa, mas o problema é deles e não meu, a minha parte estou fazendo,
cuidando da minha pequena princesa.

— Pode ir tranquila — Louise praticamente me empurra para a fila no


aeroporto — só faltam as cenas finais serem finalizadas na edição, e o filme
estará pronto para ir ao ar. O Piloto já foi exibido para o estúdio e a nota foi
máxima — ela sorri animada.

— Odeio estreia de filmes, podemos perder tudo em um único dia — aliso


a testa — qualquer coisa me chame, não podemos deixar esse projeto fracassar.
— É uma produção de Lira Vittileno, nunca falhará — sorrio ouvindo o
orgulho em sua voz, Louise tem razão, nem mesmo no início da minha carreira eu
fracassei.

— Até mais Louise — mando um beijo para ela.

— Tchau Lira. — Acena.

Embarco no avião em direção a Itália, estou com 29 semanas de gravidez e


finalmente meu ventre começou a crescer. Minha pequena deveria ter cerca de
37,5 centímetros e pesar mais de um quilo, mas como ela já mostrou que será
pequenina, só tem 30 centímetros e pesa 900 gramas. Os braços, pernas, tronco e
cabeça, estão formados com perfeição, seus órgãos se desenvolvem bem, e apesar
de pequena e levinha, ela continua perfeita, sem apresentar anomalias ou
deficiências.

A minha obstetra espera que com a folga que terei até a promoção da série,
eu consiga me alimentar melhor e não fazer nenhum esforço que me force a
perder peso.

Minha meta é engordar e fazer minha bebê crescer para o tamanho


esperado. Com a finalização da edição dos últimos episódios, eu tirei férias do
estúdio e apliquei a minha licença a maternidade. Não aceitarei nenhum projeto
pelos próximos anos, quero aproveitar esse tempo com a minha menina e não
trabalhando em um estúdio, enquanto uma babá cuida da minha pequena.

Só participarei da promoção da série, que deve ocorrer pouco antes do meu


resguardo. Dependendo se a médica me liberar eu irei, caso não, a impressa terá
de se contentar com uma carta contando como foi a minha experiência. Aproveito
o longo voo para escrever no meu diário sobre os últimos dias.

Pouso na Itália e vejo meu pai me esperando com os braços abertos, meu
ventre contrai ao imaginar como ele irá reagir quando souber da gravidez. Não
consigo imaginar quem dos três homens da minha vida será o mais exagerado
quando souber a verdade.

— Minha princesinha — ele me aperta forte — como você está linda —


analisa minhas bochechas, seus olhos descem pelo meu corpo e param no meu
ventre.

Estou usando um suéter verde colado, que deixa meu ventre pequeno
protuberante. Seus olhos encontram os meus com lágrimas contidas, ele não fala
nada antes de me abraçar forte e fungar nos meus cabelos. Aperto seu corpo com
carinho, senti tantas saudades dele.

— Vai me contar que essa gordurinha na sua barriga é outra coisa?

— Sì, vamos conversar no carro — digo.

Ele acena em positivo e entramos no veículo. O motorista dirige pelas ruas


da Itália com cuidado, temos mais de quatro horas de viagem pela frente.

— Promete que não vai dizer uma palavra ao Louis ou ao Levi? Quero
resolver a situação sem a intromissão dos dois.

— Bom, então temos uma situação a ser resolvida — passa as mãos nos
fios negros com alguns brancos na cabeça.

— Não é bem “a ser resolvida” — faço aspas com os dedos — vou


começar do começo, mas não vou dizer o nome dele, quero manter isso comigo,
enquanto não falo a ele sobre a bebê.

— O uomo[1] não sabe da gravidez?

— Eu não consegui contar.


A tristeza se alastra em meu peito, deito a cabeça no ombro do meu pai
abraçando sua barriga musculosa. Apesar da idade, meu velho se mantém na
academia, cuidando do corpo. Sempre me perguntei o motivo dele não ter
encontrado uma esposa depois de todos os anos que a mamãe morreu. Ele
continua lindo, é charmoso, e tem muito dinheiro, é o sonho de quase toda mulher
casar-se com alguém como ele.

Principalmente as novinhas que querem um sugar daddy. Já cansei de


terminar amizades, que quando conheciam meu pai, queriam ser apresentadas a
ele com interesse amoroso. Não sou contra a ideia de ele conseguir encontrar
outra pessoa para amar, se a solidão da morte da minha mãe dói em mim e nos
meus irmãos, só consigo imaginar como foi devastador para ele. Nunca o julgaria
por encontrar outro amor, independentemente da idade, o importante seria a
mulher o amar sem interesse.

Fungo dispersando os pensamentos sobre o meu pai e conto a ele tudo que
aconteceu com o Daniel. Sou sincera ao admitir que é um amigo do Louis e por
esse motivo vou contar ao meu irmão sem dizer que a pessoa é próxima a ele.

— Louis causaria uma verdadeira guerra e poderia atrapalhar na relação do


pai da bebê com ela — confesso — não almejo me relacionar amorosamente com
esse homem, mas não quero causar confusão entre ele e a bebê.

— Então a verdade é que você ainda não conseguiu contar, porque ele não
quis falar com você. Concordaram que seria somente uma noite e agora ele pensa
que você quer um relacionamento?

— Exatamente, talvez ele esteja presente no aniversário da Cecília, então


contarei a verdade.

— Se ele rejeitar a minha neta me diga, vou garantir que o Louis não o
mate.
— Acha que consegue? — encaro meu pai com o semblante irritado.

— Com certeza, eu mesmo mato o sujeito.

— Pai — ralho encostando novamente o rosto contra seu peito — não seja
agressivo. O Louis é o único babaca da família.

— Você é muito parecida com ele — beija meus cabelos — minha


principessa. Conte comigo para tudo, você nunca estará sozinha, e se o stronzo[2]
se recusar a assumir a paternidade, eu serei o pai e avô dela.

— Obrigada papà — encolho o rosto contra a lapela do seu terno, chorando


a dor que tem me incomodado durante os meses.

É horrível imaginar que o Daniel pode rejeitar a nossa menina, não


aguentaria uma pancada dessas.
Lira
Louis me abraça forte entre seus braços enormes, quase esmagando meus
pulmões com a sua força. Grito gargalhando, faz anos que ele não me esmaga
desse jeito, quando era criança vivia pedindo pelos abraços de urso do meu
irmão, hoje fico com medo pela minha bebê.

— PER PAZZO[3] — ele me põe no chão sorrindo abertamente.

— Estava com saudades de te apertar.

— Eu esmago suas bolas se fizer isso novamente.

— Não se atreva — leva a mão ao meio das pernas franzindo a


sobrancelha.

— Ela tem garras afiadas — a voz reverbera grossa atrás de mim e arrepios
sobem por minha coluna ao reconhecer a quem aquele timbre pertence.

— Nunca mecha com um Vittileno — Louis diz — sabemos como


machucar.
Eles riem em cumplicidade. Passei meses tentando falar com Daniel e
agora ele aparece como se nada tivesse acontecido, como se não tivesse rejeitado
todas as minhas tentativas de contato fracassadas, como se não tivéssemos
assuntos inacabados para resolver.

Aperto os punhos ignorando sua presença, não me deixando afetar por seu
cheiro. Sorrio para meu irmão o puxando pela mão, quero acabar com a tortura
quanto antes.

Louis pode não ser tão perceptivo quanto nosso pai para notar a
protuberância em meu ventre, mas nada me garante que Daniel seja dessa forma,
e não quero causar uma cena no aniversário da minha sobrinha.

Por hora vou manter meu plano de falar a verdade aos meus irmãos sobre a
gravidez e aproveitar o Daniel aqui para o encurralar e fazer com que me escute.

— Oi Lira — ele fala, quando o ignoro subindo as escadas com o Louis.


Viro o rosto de lado encarando o homem que parece ter ficado dez vezes mais
lindo, os fios brancos na barba causam comichão entre as minhas pernas.

— Olá — respondo seca.

Viro novamente caminhando para meu quarto com meu irmão ao meu
encalço. Entramos, e me preparando para os gritos que virão, eu ligo o som do
quarto, não quero ninguém de fora ouvindo o que vai acontecer aqui dentro.

— Não entendi a música — Louis fala franzindo o nariz.

— É para que as outras pessoas não escutem, vou contar a cada um no seu
devido tempo — aperto os dedos e me sento na cama como uma criança que fez
ruindade — vem pra cá.

Louis percebe meu tom sério e se senta ao meu lado, sua mão áspera,
segura a minha fazendo carinho nos meus dedos, e eu só queria poder me
esconder nos braços do meu irmão, como fazia quando era pequena e deixar ele
resolver a situação por mim. Ser adulto é uma merda, temos de arcar com as
consequências das nossas escolhas.

— Eu estou grávida, Lou — a voz treme ao contar a ele.

Louis fica em silêncio por mais tempo do que imaginei, a música é a única
coisa audível na sala. Sua mão aperta a minha com mais força — sem machucar
— e ele levanta num rompante me puxando junto. Seus braços me rodeiam com
força, a mão levando minha cabeça contra seu peito. Agarro meu irmão chorando
contra ele.

— Quem é o pai? — a pergunta que eu temia acontece — você não estaria


preocupada e com medo, se o stronzo fosse uma boa pessoa.

— Eu não posso te dizer, ainda — falo com a voz embargada — ainda não
consegui contar para ele.

— Como assim? — Louis segura meus ombros me afastando a tempestade


em seus olhos, analisando minhas feições com cuidado.

— Lou — começo prevendo que os gritos estão por iniciar — eu e ele


combinamos que seria somente uma noite, estávamos bêbados e esquecemos a
camisinha. Eu tentei entrar em contato, mas ele pensa que estou sendo grudenta,
não consegui falar a verdade.

— Eu vou matar o filho da puta — me larga andando pelo quarto puxando


os cabelos como uma besta enjaulada — eu quero um nome. Lira, agora —
aponta.

Me sento na cama prevendo o que seguira, encolho os ombros e nego com


a cabeça. Não posso fazer isso, o Daniel está no andar de baixo, se o Louis souber
que é ele, vai partir para cima do amigo e CEO da empresa VITTILENO no
Brasil.

Não é somente o futuro da minha bebê que está em risco com a verdade
revelada de forma errada, mas a relação deles dois e a direção da empresa, muitas
pessoas serão afetadas pela minha escolha.

— Você não manda em mim Louis — digo, apertando a colcha da cama.

— Mas eu posso te proteger — soca o ar — como o imbecil dorme com


você sem camisinha e depois rejeita suas ligações?

— Igual como você dormiu com a Bianca — jogo a verdade na sua cara —
e depois foi mega babaca com ela.

— Aí por que fui um stronzo dá o direito de outro homem ser assim com
você? — abre os braços — eu aprendi com os meus erros e me arrependo
amargamente de ter magoado a Bianca, mas fui homem para assumir as minhas
responsabilidades e reparar os erros, e graças a Deus que ela me perdoou, ou hoje
não teríamos a nossa família!

— Essa é a minha história! — Me lvanto gritando com ele — MINHA


ESCOLHA e você não vai tirar ela de mim.

— Se acalme que você não está em condições de se estressar — aponta


para meu ventre — meu Deus de quantas semanas você está?

Louis acalma após ver minha barriga protuberante.

— 29 semanas — me sento novamente — minha bebê não cresceu muito,


por isso o ventre pequeno — aliso a pele inchada — estou de férias emendado
com a licença a maternidade, vou usar o tempo para me alimentar melhor e
garantir que ela cresça.
— Deixa eu te ajudar — ele pede com os olhos tristes — me permita cuidar
de vocês — fica ao meu lado, me puxando contra si — não consigo acreditar que
você será mãe.

— Demorou um pouco para me acostumar com a ideia — fungo — eu vou


ser mãe Lou, por favor, respeita a minha decisão. Não quero que minha filha,
sinta que foi rejeitada pelo pai, ou aceita por que você causou uma cena, eu
preciso contar, e fazer isso sozinha.

— Você nunca estará só — segura minhas bochechas me forçando a o


encarar — vou percorrer o inferno para matar o desgraçado que ousar rejeitar a
minha sobrinha, mas se a sua vontade é resolver as coisas sem me falar a verdade
completa, vou respeitar — respira fundo — só... nunca mais repita que está
sozinha — beija minha testa — vou estar aqui com você para tudo.

— Obrigada Lou — abraço meu irmão.

— Minha irmãzinha — beija minha testa — vai ser mãe, não acredito que
você cresceu assim.

— Nem eu — rio — agora preciso contar ao Levi e as meninas, mas antes,


quero que você me prometa não contar a ninguém, nem mesmo a seus amigos
como o Daniel — tento falar de modo a não levantar suspeitas — quero fazer no
meu tempo.

— Prometo — beija minha mão — se você prometer me procurar para um


espirro que sentir que deu errado.

— Eu juro — beijo a sua mão, sorrindo para ele.

— Vem, preciso te alimentar para que a minha sobrinha consiga crescer


bem.

— Pode descer, vou tomar um banho antes.


Louis sai do quarto e abro a mala deixando as roupas no closet. Entro na
banheira onde fico pela próxima meia hora recuperando as energias do voo e
absorvendo o impacto de encontrar o Daniel depois de tanto tempo.

Ele continua lindo como o inferno e eu me odeio por reagir a sua


intensidade. Ele deve pensar que eu sou louca por insistir em falar com ele nos
últimos meses, e quando tive a chance, o dispensado sem pensar duas vezes.

A louca aqui decidiu que vou fazê-lo sofrer um pouco. Antes de irmos
embora, eu conto a verdade, mas enquanto isso, ele vai sentir como é ser
ignorado por quem quer conversar com você, e baixar a bola dele por achar que
eu queria algo além do que combinamos.

Aliso meu ventre com carinho, sempre que estou estressada com o Daniel
eu toco a casinha da minha bebê na esperança de acalmar a fúria no meu coração
e não a deixar sentir os sentimentos ruins que se espalham como um vulcão.

— Prometo que estou fazendo o melhor para você, meu anjinho.

Termino o banho e desço, para a minha sorte, Daniel está na churrasqueira,


ajudando os homens a fazerem o almoço, enquanto as mulheres conversam na
beira da piscina. Me junto a elas abraçando cada uma, Bianca, Olivia e Beatrice,
a irmã da falecida esposa do Levi. Sempre fomos muito amigas e isso não mudou
com a distância. Sendo ao lado da Bea a apertando.

— Agora vocês, me contem o que tem acontecido — Olivia pede animada,


o barrigão dela enorme diferente do meu.

— Bom, eu estou grávida — digo dando de ombros, com as meninas não


preciso de tanto tato quanto com meus irmãos e pai — já contei ao Louis e vou
falar com o Levi ainda, não vou dizer quem é o pai — aperto os punhos,
lembrando a rejeição dele as minhas ligações — eu tentei contar três vezes a ele
sobre o bebê e o babaca sempre desliga na minha cara, achando que estou sendo
grudenta, então ele que vá se ferrar.

Pela primeira vez no dia eu explodo o que realmente sinto. Elas me


encaram com empatia e Bea me aperta contra ela, entendendo o quanto deve ser
difícil para mim lidar com o que tem acontecido.

— De quantas semanas? — Olivia pergunta meio atordoada.

— 29 semanas — Olivia arregala os olhos e tento conter a vermelhidão em


minhas bochechas, ao perceber que ela faz as contas mentalmente de que 29
semanas atrás foi o casamento da Bianca e do Louis, onde conheci o Daniel e que
a Olivia serviu de ponte. Peço com os olhos que ela guarde segredo.

— Tem certeza de que não quer contar ao pai do bebê? — pergunta em


dúvida.

— Sim — ergo o queixo — quando ele perceber minha barriga


protuberante e fizer as contas na cabeça dele vou decidir o que fazer, enquanto
isso não vou implorar pela atenção do desgraçado.

— Estamos aqui — Bianca segura a minha mão — para o que precisar,


como o Louis disse ontem.

— Obrigada — Beijo a cabeça da Bianca e aperto a mão da Olivia.

— Você sabe que é provável que ele descubra hoje, né? — Olivia me
abraça e pergunta baixinho.

— Estou pronta para isso — beijo seu ombro, tocada pelo carinho da minha
cunhada.

— E você, dona Beatrice? — Bianca muda de assunto.


— Ah, eu estou bem — Beatrice responde e percebo seu olhar vagando
pela propriedade, deve estar buscando pelo Dante, o amor secreto de anos dela.

— Manteve contato com o Cowboy? — instigo.

— Talvez, ele me ajuda com os animais. — Amarra os cabelos com as


bochechas em chamas.

— E com outras coisas, pelo seu sorriso — Olivia acusa gerando risadas.

Louis nos chama para o almoço. Todos os casais sentam junto e meu pai na
ponta da mesa e o da Olivia e Bianca na outra. Sobrando para eu ficar ao lado do
Daniel. Continuo ignorando-o, fingindo que não sou afetada pelo cheiro sexy
emanando de seu corpo chocando contra o meu como a colisão entre dois carros.

— O que tem feito Lira? — Daniel pergunta.

Corto o pedaço de carne o levando a boca, ainda o ignorando.

Seu pé alisa o meu, em resposta piso no dele com força. Daniel chia ao
meu lado antes de apertar o garfo com força e me olhar com ódio. Sorrio de lado
para ele o deixando ciente de que não estou a fim de conversa, a raiva borbulha
como um vulcão. Se o stronzo me rejeitou achando que eu estava sendo grudenta,
agora vai perceber que não era nada disso. Que morra se contorcendo para saber
o que eu queria.

Terminamos de almoçar e vou para a sala, sinto o cheiro de Daniel me


seguindo e querendo o torturar um pouco mais, puxo o Levi comigo para o
quarto, chegou a hora de contar ao meu segundo irmão a verdade sobre a minha
bebê. Entramos e me sento na cama, repito o mesmo ritual que fiz com o Louis e
o Levi não me decepciona com sua reação.
— Eu poderia arrancar a cabeça do bastardo — ele diz me puxando forte
contra seu peito. Deitados, ele alisa minhas costas — fazer picadinho dele e
garantir que nunca mais tocasse em outra mulher.

— Espero que não faça isso quando descobrir quem é, minha filha precisa
de um pai.

— Bom, se o stronzo a rejeitar, tenha a certeza de que eu assumo esse papel


com orgulho. Não vou deixar nada faltar para a minha sobrinha.

Levi se senta me fazendo deitar, ele encara meu ventre e toca minha barriga
com cuidado.

— Me preocupa como seu ventre é pequeno — levanto o suéter o deixando


ver — tem certeza de que está tudo bem com ela?

— Sì, a médica me garantiu.

— Vai ficar o resto da gestação na Itália?

— Sì, é aqui onde minha família está e quero dar uma pausa, me alimentar
melhor e cuidar da minha menina sem estresse.

— O pai da bebê é italiano? — arqueio a sobrancelha. — Ao menos isso


você poderia me dizer.

— Não, ele não é italiano — respondo com um suspiro — e chega de tentar


conseguir mais respostas.

— Como quiser — beija meu ventre — o zio Levi vai te amar e te proteger
de tudo e todos, minha princesinha. Você vai ter três priminhos para brincar e te
amar.

A garganta embarga com o choro de emoção preso.


Sim, minha menina terá uma família que a ama e protege de tudo e todos,
nunca vamos deixar nada faltar e mesmo que o Daniel não queira assumir sua
responsabilidade eu estarei pronta.

— Obrigada Levi.

Ele beija minha bochecha antes de me puxar para seu colo novamente. Em
algum momento eu adormeço.
Lira
A noite chega e todos se reúnem em um jantar alegre. Como, com o
estômago revirando por ficar novamente perto do Daniel. Não aguentando mais a
ansiedade pôr ignorá-lo, e sabendo que terei de contar a verdade em algum
momento. Eu esperava que ele continuasse frio e distante como nos últimos
tempos, ao invés de ficar me cercando e seguindo por onde vou.

Por isso decido acabar de uma vez com a tormenta e deixo que ele me siga
para o quarto.

Passo deixando a porta aberta, os pelos do corpo se arrepiam ao notar sua


presença atrás de mim. Mais cedo troquei de roupa, por um vestido soltinho de
mangas compridas e caimento até metade da coxa. Os olhos azuis percorrem
minha pele como um animal faminto analisando a presa e o tesão reprimido de
meses me ataca como uma avalanche.

— Achei que fosse me ignorar para sempre — ele diz se aproximando.

— Deveria — ergo o queixo — você não quis falar comigo quando tentei
contato, o que mudou?
— Combinamos que seria somente uma noite. Lira — seu polegar desliza
pela minha bochecha — ligações no dia seguinte não fazia parte do acordo.

— Novamente — seguro seu punho o tirando do meu rosto — o que


mudou?

— Você — ele me olha com tanta fome que me deixa ansiosa, querendo o
provar mais uma vez — mais linda do que nunca.

Daniel desliza a mão pelo meu braço subindo a manga do vestido,


arrastando arrepios pela minha pele em chamas. Fecho os olhos me odiando por
ser fraca na sua presença. Seu hálito quente bate contra o meu rosto, o quanto
seria ruim o usar somente essa noite e depois o mandar embora? Vou perder
novamente a chance que eu tenho para contar sobre a bebê no meu ventre.

— Não adianta Daniel — digo em um sussurro — não vou ceder — minto,


eu sei que estou cedendo e me odeio por cair facilmente em sua armadilha —
temos algo para conversar — abro os olhos o encarando firme.

— O que seria mais importante que a minha boca em sua boceta?

Sua filha. — Respondo mentalmente.

Levo a mão ao ventre pronta para contar a ele. Foi o Daniel que veio atrás
de mim, é ele quem me tenta, querendo a minha atenção e mais uma noite de
sexo. É ele quem terá de lidar com as consequências dessa vez.

— Algo muito mais importante — digo.

— Depois você me conta.

Daniel não me dá chance de responder e ataca meus lábios com os seus,


calando minhas palavras. Se ele não quer ouvir, vai ter de descobrir quando ver
meu ventre, por mais que esteja pequeno, será impossível ele não notar o
tamanho proeminente. Deixo que suas mãos deslizem pelo meu quadril esperando
pelo momento em que ele descobrirá a verdade.

Sou virada de costas, sua mão agarra minha bunda quando ele me faz ficar
de joelhos na cama. Levanta o vestido expondo meu quadril e eu entro em
chamas ao sentir sua barba raspando na minha pele, mordendo minhas coxas e
sugando minha intimidade pulsante por cima da calcinha. Apoio as mãos no
colchão, esquecendo completamente que um dia eu queria dizer algo a ele e
mergulhando no prazer enlouquecido que sua boca me causa.

Daniel puxa a calcinha me livrando da peça sem retirar a boca da minha


vagina. A língua dura e macia penetra minha intimidade com força, arrancando
longos suspiros. Cedo ao tesão desabando o rosto contra o colchão e empinando a
bunda na cara dele, rebolando e delirando no atrito da sua barba com a minha
carne sensível.

— Porra gostosa — sussurra — faz ideia do quanto senti falta dela?

— Por que não me atendeu? — digo em um rosnado, tentando manter a


mente consciente e não focada nas suas sugadas.

— Temos de honrar nossos acordos — ele morde minhas nádegas e fecho


os olhos imersos na provocação.

— E qual o dessa vez? — uma ideia perversa invade a minha mente.

— Uma noite nada mais — rosna.

— Lembre bem de suas palavras — digo sorrindo perversa adorando o


plano que tracei.

Daniel me solta e ouço o som da camisinha sendo rasgada, dessa vez ele
lembrou. Pena que não vai adiantar de nada. Empino mais a bunda abrindo as
pernas para facilitar a sua entrada, deixo que me penetre forte e bruto. Gemo
gostoso aproveitando cada segundo das estocadas contra a minha pele, das mãos
apertando com força minhas coxas puxando contra ele, da respiração pesada que
desce contra meu pescoço.

As mordidas, lambidas, tudo por cima da roupa e de quatro. O vendaval de


tesão começa a remexer com meu interior, forçando a avalanche de prazer a se
espalhar por cada célula e poro, queimando, levando e delirando meu interior
com a força de suas investidas. Daniel geme rouco, mordendo meu pescoço e eu
deságuo em um orgasmo explosivo.

Percebo que ele se aproxima de seu ápice e baixo o quadril fazendo seu
membro escapar de dentro de mim. Como um animal cedendo, ele segura meu
quadril me virando de frente, pronto para meter novamente, eu sorrio ao fechar as
pernas impedindo sua investida. Me sento na cama, enquanto Daniel me olha sem
entender o que aconteceu.

De joelhos vou até ele, seguro seu queixo trazendo sua boca para mim em
um beijo erótico, quente. Suas mãos apertam minha bunda, tentando me fazer
abrir novamente as pernas. Mordo seus lábios preguiçosa, o encaro com lascívia
no olhar e sorrindo o solto.

— Você me ignorou quando eu queria falar, agora sou eu quem vai te


ignorar — desço da cama caminhando até a porta do quarto enquanto ele fica
com o pau enorme e duro para fora das calças, me olhando incrédulo. Toco a
maçaneta — se não quiser que te vejam assim, sugiro que se vista.

— Você só pode estar de brincadeira — fala muito irritado.

— Nunca falei tão sério — digo melodiosa, estralando os lábios —


obrigada pelo orgasmo.
— Isso não faz sentido — arranca a camisinha a jogando no chão — foi
você que insistia em falar comigo, e agora que estou aqui me dispensa? — adoro
ver como ele se sente ofendido, igual como eu fiquei quando fui rejeitada por ele.

Daniel fecha as calças avançando na minha direção. Abro a porta contendo


seu avanço pelo medo de ser pego no meu quarto. Se o Louis ou Levi o vissem
aqui, juntariam fácil os pontos da paternidade da minha bebê. Eu deveria ter
falado a verdade quando tive a chance, mas o ódio por ser ignorada queimou forte
no meu peito, e tudo o que eu precisava era poder me vingar do Daniel, remover
das minhas veias a ira que me queimou por meses.

— Eu não te liguei querendo repetir outra noite ou uma relação, se tivesse


me atendido e me deixado falar, saberia a verdade. Mas agora estou com tanta
raiva que poderia arrancar seus olhos, saia já do meu quarto.

— Você é a porra de uma maluca — rosna antes de sair. Fecho a porta me


escorando contra ela sem acreditar no que fui capaz de fazer.

Me deito na cama rezando para não me arrepender, ainda temos mais dias
juntos na mansão e agora que consegui a minha vingança, poderei contar a
verdade e deixar que o Daniel decida o que ele quer fazer.

Para mim sempre foi clara qual a decisão certa, ter a minha bebê e a amar,
independente do que o pai dela queira fazer. Minha piccola será amparada por
uma família que a ama.

Como se me ouvisse, sinto fome, visto uma calcinha e desço as escadas


cantarolando feliz. Na cozinha encontro o Louis e o Daniel bebendo, ele tem fogo
nos olhos quando me vê, e me sentindo tentada pelo diabo, eu faço dois
sanduíches e sento ao lado do meu irmão, de frente para o Daniel.

— Boa noite — cumprimento os dois com um sorriso — Louis, Daniel.


— Boa noite — Louis fala — sem sono?

— Estava me exercitando — provoco Daniel com um sorrisinho — vou


fazer um lanche antes de dormir.

— A essa hora? Que tipo de exercício — Louis pergunta desconfiado.

— Agachamento — digo e mordo meu sanduíche — e você Daniel, gosta


de se exercitar a noite?

Ele me fulmina com os olhos como se pudesse me fazer desaparecer com a


sua fúria.

— Sim, mas só quando tenho uma companheira a altura — bebe o líquido


âmbar em um gole — não gosto de meninas mimadas.

— As mimadas são as piores — provoco — elas desafiam a paciência de


um, mostrando que são incontroláveis.

— Vocês parecem falar em código — Louis observa. Percebo que deixei


escapar demais minhas intenções e me retraio comendo o resto do sanduíche
antes que eu irmão fale o que não deve.

Por mais que eu queira irritar o Daniel, decido o fazer em outro momento.
Termino de comer e subo para o meu quarto, ansiosa demais pela minha proeza,
acabo demorando a dormir.

Levi e Olivia vão se casar! O que era para ser uma festa de aniversário da
pequena Cecilia, se transformou em um casamento de última hora. Por sorte, a
estrutura que ele usaria para fazer o pedido de casamento acabou sendo perfeita
para usar durante a cerimônia. Que foi linda e perfeita, após a festa todos se
reúnem para beber e por volta das 2 horas da madrugada, eu canso de tanto rir das
histórias do pai da Olivia com o meu pai, ambos planejam uma viagem de coroas
pelo próximo ano.
— Boa noite para vocês — digo a todos e a ninguém em especial. Subo
para meu quarto morta de cansaço e quando finalmente entro e fecho a porta um
sapato preto impede.

— Temos de falar — a voz dele se arrasta e o cheiro de álcool é forte.


Daniel me olha focado, não sei dizer qual nível de bêbado ele está, mas o vi
bebendo muito com o Louis.

— Amanhã — tento o colocar para fora e ele entra como um trator.

— Hoje, ou amanhã você foge de novo.

— Eu nunca fugi — digo indignada.

— Como não? Estávamos transando ontem e você simplesmente acabou


tudo — abre os braços.

Apesar de ele falar coerentemente, eu não consigo dizer se o Daniel está


realmente ciente de suas ações. Nunca o vi tão falador e expressando o que sente.
Decido ficar atenta e dar uma chance ao que ele tem a dizer.

— O que você quer? Achei que tinha ficado claro que seria somente uma
noite — cruzo os braços, como ele não percebeu meu ventre inchado nesse
vestido colado?

— Era para ser, mas você não sai da minha cabeça — toca a testa — porra
Lira, eu sou um homem adulto que desistiu do amor depois das merdas que a
minha ex fez, ter sentimentos por você nunca fez parte dos planos.

Desarmo, ele realmente gosta de mim? Meu coração acelera uma batida
quando ouço suas palavras.

— Não minta para mim, Daniel — me aproximo — você realmente gosta


de mim?
— Sim — segura meu rosto — mas tenho medo de me apaixonar e sofrer
novamente — bate a testa na minha — só mais uma noite e eu prometo te deixar
em paz.

— E se eu não quiser que você me deixe? — arisco, a vontade de ser


sincera massacrando meu coração. O forte cheiro da bebida me incomoda, não sei
como o Daniel fica quando bebe, e o medo dele fazer algo que eu não goste
também me incomoda.

— Talvez eu fique — beija meus lábios carinhoso — não posso prometer


nada, o álcool sempre me deixa mais maleável.

— Geralmente você é um cafajeste babaca.

— Muito, terrivelmente babaca — alisa meu pescoço — só mais uma


noite?

— Tenho de te contar algo antes — tomo coragem — promete não


esquecer disso amanhã?

— Nunca.

— Eu estou grávida — deixo as palavras escaparem com medo. Daniel me


solta se afastando.

— Quem é o pai? — tem tormenta em seus olhos.

— Você, estou com 29 semanas, transamos sem camisinha.

— Isso é impossível, Lira.

— Não é — insisto indo até ele, e Daniel se afasta mais um passo.

— Eu não posso ter filhos — ele fala com pesar. — O pai do seu bebê deve
ser outra pessoa.
— Não estou enganada, Daniel, é você! — Aperto os punhos com raiva
pela sua recusa.

— Não, Lira — suspira pesado — eu sou estéril — cambaleia mexendo nos


cabelos — é uma merda que você pense que te engravidei, mas não tem como.

Atônita e sem reação, é como eu fico quando Daniel passa por mim me
deixando sozinha no quarto. É impossível o que ele acabou de falar, eu tenho
plena consciência que não me deitei com nenhum homem ao menos três meses
antes de o conhecer e depois dele, não existiu mais ninguém. A minha bebê é do
Daniel, mas como o fazer acreditar que falo a verdade?

Saio do quarto disposta a conversa e o fazer ver a verdade em minhas


palavras, encontro-o bebendo na companhia do Louis que não para de encher a
porra da cara. Tenho vontade de matar meu irmão e mais ainda o Daniel. Com
eles juntos não poderei questionar o pai da minha filha sobre o que me contou
agora.

Subo decidida a esperar. A espera leva horas e quando percebo o sol nasce
e o aniversário da Cecilia começa. Daniel passa o dia trancado de ressaca, e o
Louis feliz da vida tirando fotos com a filha. Tenho vontade de falar com a
Beatrice sobre o que aconteceu, mas desisto ao ver a minha amiga conversando
com o Cowboy gostoso. Quando desisto de esperar o Daniel sair do quarto, vou
até lá. Entro o encontrando deitado, encarando o teto.

— Daniel — chamo baixinho.

— Oi — responde fazendo careta.

— Sobre o que conversamos ontem — início.


— Lira — ele me corta arisco — chega, você precisa entender o conceito
de uma noite só. Transamos, e depois você se vinga de mim por não querer
conversar, mas foi só isso, para de me perseguir!

— Seu babaca.

Engulo em seco o choro entalado na garganta, deixando-o sozinho. Se é


assim que o Daniel vai tratar a verdade sobre a nossa bebê, eu espero que ele vá
se foder. Na escada encontro Beatrice sorrindo feito boba e seguro suas mãos,
tomando uma decisão.

— Eu preciso de paz, sossego e me alimentar bem, posso ficar com você na


sua fazenda durante minha gestação?

— E de companhia — ela me diz me puxando para um abraço duradouro


— podemos ir quando você quiser.

— Obrigada — beijo seus cabelos.

Estou certa sobre a minha decisão. Não vou permitir que Daniel rejeite
novamente a minha filha, eu fiz a minha parte, contei a verdade. Não preciso dele
para ser uma boa mãe.
Daniel
Puta ressaca do caralho, eu não deveria ter bebido tanto ontem com o
Louis. Às vezes esqueço que o maldito italiano tem um fígado de aço que aguenta
álcool como se fosse água. Não lembro bem o que aconteceu ontem, o dia inteiro
foi apagado da minha memória e agora estou trancado no quarto, sofrendo com
dor de estômago, cabeça, e enjoado para cacete.

Nunca mais eu tento acompanhar o italiano em uma bebedeira.

Lembro que o motivo da minha raiva foi a Lira, como ela ousou me
dispensar depois de todo o tempo que passou tentando entrar em contato?
Quando não era as ligações dela que eu rejeitava, eram as da minha ex-esposa,
que está determinada a tirar até o último centavo que eu tenho com o pagamento
da maldita pensão.

A desgraçada conseguiu provar para o juiz que ela era impossibilitada de


trabalhar e sustentar pela depressão que supostamente eu causei nela e o
alcoolismo. Agora, além de marido infiel, fui taxado de abusivo, que transformou
a noiva em uma depressiva alcoólica. Aquela vadia desgraçada me traiu com o
meu melhor amigo por anos e ainda me fez perder a empresa que fundei com
aquele desgraçado, me deixando sem nada.

Eu vivi 20 anos ao lado daquela mulher e nunca imaginei que pudesse ser
traído daquela forma. Estive ao lado dela quando o diagnóstico de infertilidade
veio, revelando que eu era infértil e não podia dar o que ela sempre quis, filhos.
Eu fiquei arrasado, os anos passaram, e agora com 40 anos, ela não pode mais ter
bebês e me culpa por ficar depressiva por causa disso.

Mas ela tinha a porra de um amante desde os 35 anos, poderia ter usado ele
para dar os filhos que ela queria, já que eu não era uma opção.
Sempre que me lembro daquele dia eu tenho vontade de beber cada vez
mais, fiz o exame e pouco depois o médico me deu a notícia, Verônica chorou a
noite toda e depois que fui trabalhar e retornei, ela tinha desaparecido. Por uma
semana inteira não tive notícias dela e quase enlouqueci, a polícia achava que eu
a tinha matado.

Então ela reapareceu depressiva e alcoólica, nunca me contou onde esteve


naquela semana, os anos seguintes, foi um verdadeiro inferno, até que descobri a
traição e terminei o casamento. Antes eu tivesse de pagar uma pensão para meus
filhos ao invés daquela diaba de mulher ardilosa que consegue sempre enganar os
médicos psiquiatras.

Ontem a última lembrança que tenho é a dela me ligando para reclamar do


valor da pensão que não pagaria sua viagem para as Maldivas para poder se
recuperar emocionalmente.

A mandei tomar no cu e desliguei. Ainda estava irritado com a proeza da


Lira em transar comigo só para me deixar de bolas azuis. Eu tinha prometido a
mim mesmo não me envolver novamente com mulheres grudentas que
lembrassem a Verônica, e a Lira parecia exatamente assim, me ligando e pedindo
por um encontro, e quando finalmente nos vemos de novo a safada me deixa sem
gozar!

Eu tive vontade de arrancar o pescoço lindo dela quando fui colocado para
fora e meu pau se recusou a brochar, ele queria voltar para a bocetinha quente que
tinha dispensado a nós dois nem que fosse na marra.

Por isso fui para o banheiro e bati punheta como um maldito adolescente,
louco para gozar e poder tirar satisfação com a safada, a foder de novo até o talo
e esporrar no meu interior quentinho.
Mas ao invés disso, bebi como um condenado por causa da raiva que a
Verônica me causa e ainda tenho de aguentar a Lira entrando feito um vendaval
no meu quarto espumando pela boca, querendo explicação sobre o que falamos
ontem. Eu nem lembro de a ter visto depois do casamento, quanto mais de
conversado. Mas sei que não transamos ou minhas bolas ainda não estariam
doendo de desejo.

Ela vai embora bufando de raiva e eu continuo rezando aos céus para me
recuperar da maldita ressaca. No andar de baixo as crianças gritam,
principalmente o Lorran, ocasionalmente o ouço dando ordens nas brincadeiras.
O menino será pior que o tio e o pai juntos quando crescer, ou talvez ainda pior
que a Lira, que parece uma mistura feminina dos irmãos.

Por mais que eu queira esquecer a diaba, ela não sai da minha mente.

Durmo após tomar outro comprimido, acordo de madrugada com uma cede
infernal, o jarro de água que eu tinha trazido secou e tenho de descer. Na cozinha
a luz da geladeira acesa me mostrando uma bunda empinada na minha direção, eu
conheço aqueles cabelos loiros como o sol e a bunda mais redonda e gostosa que
eu já vi. Me aproximo devagar dela que come o resto do bolo.

— Oi — digo com a voz rouca ao pé do seu ouvido.

Lira se assusta e afasta para trás, batendo contra meu quadril, a seguro com
as mãos. Ela gira nos meus braços me olhando desconfiada, com a boca cheia de
glace. Ao contrário do que outras mulheres fariam, ela me ignora e volta a ficar
inclinada com a bunda roçando em mim enquanto come seu bolo. Me estico
sobre ela pegando a garrafa de água, roçando meu pau traidor e duro como aço na
bunda que ele quer comer.

— Vai se esfregar em mim até quando? — ela pergunta de boca cheia.

— Até você me deixar meter no seu rabo — digo antes de beber a água.
Lira, como a capeta que é, segura o vestido para cima, levantando o tecido
e me mostrando a calcinha de renda preta. Agarro sua bunda redonda, alisando a
pele como um tarado, esfregando em sua bunda gostosa. Deixo a jarra em cima
do balcão e fico de joelhos, beijo sua bochecha arranhando a barba contra a sua
pele. Sem paciência para joguinhos, eu desço sua calcinha, provado a delícia do
seu mel na minha língua.

— Tem certeza de que não vou te deixar na mão de novo? — ela pergunta e
eu ligo o foda-se, agora que provei o gosto da sua bocetinha, eu só quero mais. —
Eu poderia te deixar me fazer gozar e sair daqui rebolando — fecha a geladeira,
sentando-se para trás, esfregando a boceta na minha boca. Mordo seu grelinho
arrancando um gemido safado dela.

— Você não vai embora — digo soltando sua carne e ficando em pé.

— Quem te garante? — ela encosta a cabeça no meu ombro.

— Eu não vou te deixar gozar com tamanha facilidade — digo em seu


ouvido, segurando suas mãos e a colocando contra a bancada.

— Não! — Lira fala alto e me assusto, achando que a machuquei. Solto


seus braços e ela se afasta da bancada como se tivesse levado um susto — qual é
a sua, Daniel? Primeiro me rejeita e depois finge que não se importa com o que
eu te disse ontem, e agora vem cheio de fogo — abaixa a roupa como se tivesse
lembrado que estava determinada a me afastar.

— Lira, eu estava bêbado para cacete naquele momento — começo, mas o


franzir de sobrancelha dela me irrita.

— Óbvio que vai usar a desculpa da bebida — revira os olhos — eu


também bebi e lembro que você não usou a camisinha e ainda assim quer me
fazer de louca — ela empurra meu peito — eu sei com quem eu transo e quando
o faço. Não sou uma – cafajeste como você!
— O que diabos camisinha tem a ver com isso? — pergunto confuso — e
daí que eu esqueci? Já faz tempo e não muda nada.

Acho que ela deve falar da última vez que transamos, mas estou realmente
confuso como a camisinha pode ter vindo parar no assunto. Eu tenho certeza de
que não tenho nenhuma DST, faço meus exames regularmente e antes de transar
com ela e depois eu estava limpo. Sou um homem estéril que não pode ter filhos,
não consigo entender a raiva dela, quando obviamente ela esqueceu também.

— Você é um desgraçado — rosna me empurrando novamente — quando


se der conta do que perdeu não venha atrás pedindo para fazer teste que eu juro
que te mato.

Ela sai bufando da cozinha e eu fico sem entender que porra acabou de
acontecer. Camisinha, teste, o que diabos essa mulher quis dizer com isso? Coço
a cabeça decidido a ir tirar essa história a limpo, quando subo o primeiro degrau
da escada meu celular toca, nem lembrava que estava com ele no bolso. O nome
de Verônica brilha na tela e eu tenho vontade de cometer um assassinato.

— O que você quer, porra?! — rosno.

— Te avisar que entrei com uma ação para aumento de pensão, já que você se
recusa a fazer isso com uma conversa amigável, eu vou para a justiça.

— Peça pensão ao maldito do Fred, é com ele que você namora e me traiu, ou já
se esqueceu que o desgraçado me deu um golpe e ficou com a minha empresa?

— Supera isso, amor, o Fred já é passado, terminei com ele e preciso de


férias para recuperar as minhas

energias. — Quando você se tornou esse

monstro fútil?
— No dia que você passou a ficar mais na empresa do que comigo,
agora aumente a minha pensão, não precisamos de um juiz, você sabe que
tudo o que
fez comigo e como isso me magoou.

— Se você ao menos tivesse me dado um filho — digo amargurado, eu


também sempre quis uma criança.

— O estéril aqui é você, amor, não eu, fiz todos os exames necessários na época,
não me faça repetir. Eu era completamente fértil. Agora aumente a minha
pensão. — Vai se foder, sua vadia

oportunista.

Desligo o telefone querendo cometer um assassinato. Quando a minha doce


Verônica se transformou nesse monstro? Passamos vinte anos juntos, duas
décadas amando a mesma mulher e sendo fiel, nunca a dando motivos para ser
uma vadia completa comigo e agora só decepção e mágoa.

Nunca vou ser capaz de superar a dor que a Verônica me causou e por isso
me surpreende tanto a minha vontade de ter a Lira, dela não sair dos meus
pensamentos, isso não acontece desde o meu divórcio.

E quanto mais essa diaba me rejeita, mais eu quero ir atrás dela e fazê-la
engolir o seu orgulho enquanto como sua bocetinha. Levo os dedos aos lábios
aproveitando o resquício do gosto dela. Preciso tê-la novamente, mas não hoje,
estou irritado demais com a Verônica e sou capaz de discutir feio com a Lira
projetando nela a minha raiva.

Volto para o meu quarto, ainda temos mais uma semana na casa de verão da
família Vittileno, vou usar esse tempo para entender o que a Lira quis dizer sobre
teste e camisinha. Na minha cabeça não consigo encaixar as peças desse quebra-
cabeça, e a italiana arisca vai ter de fazer isso, por bem ou sob tortura a
amarrando na cama e impedindo que goze, enquanto não me falar a verdade.
Não que eu seja um tarado, mas a primeira coisa que faço ao acordar é ir
atrás da Lira, encontro seu quarto vazio, desço as escadas vendo a família reunida
na mesa, noto a ausência da Lira e da loura amiga dela, acho que era Beatrice o
nome da mulher. Me sento ao lado do Louis e como quem não quer nada
pergunto:

— Onde está a Lira e a Beatrice?

— Saíram faz meia hora com o Dante.

— O cowboy? — não tem como esquecer um homem usando chapéu de


Cowboy, ele é um cara legal, mas pelo pouco que falamos, percebi que não tem
interesse na Beatrice, já ela, qualquer um percebia que está apaixonada.

— Sim, eles voltaram para cuidar da fazenda e a Lira foi junto — Olivia
me responde, atenta a conversa.

— Entendi.

Me limito a dizer, pelo visto terei de esperar outra reunião de família a qual
serei convidado para conseguir falar com a Lira. Apaguei o número que ela me
ligava e não posso pedir a seus irmãos sem levantar suspeitas de que algo
aconteceu entre mim e ela.

Por enquanto meu emprego na Vittileno é vital para a minha sobrevivência.


Após ter declarado falência, foi a confiança do Louis nas minhas habilidades
como CEO que me salvaram, estava por um triz de ser preso por atrasar a pensão
da maldita.

Pode demorar quanto tempo for, mas eu ainda vou encontrar a Lira
Vittileno e tirar a limpo a situação que nos envolvemos, tem alguma coisa desse
quebra-cabeça que não faz sentido e eu vou desvendar.
Lira
Finalmente estou com um barrigão enorme de fazer inveja.

Comemoro quando minha nova obstetra, a senhora Ramirez, me fala as


medidas da minha bebê. 45 centímetros, pesando cerca de 2 quilos. Ela é do
tamanho de um melão amarelo e meus olhos se enchem de lagrimas ao visualizar
o formato do rostinho dela, os olhos fechados enquanto ela flutua no meu ventre.

— Ela é enorme — Beatrice fala segurando a emoção.

— Sim, minha bebê finalmente ganhou peso — choro o medo que me


acompanhou durante a gestação inteira, finalmente indo embora.

O alívio que sinto é tão grande que tenho vontade de ligar para o Daniel e
dizer que a nossa menina está saudável e bem, que acabam os dias de medo e
comilança desesperadas — tudo com base no que a minha nutricionista
recomendou — que ela finalmente ganhou peso e minha barriga de gestante pode
ser vista a quilômetros de distância.

A gravidez me deixa sensível e eu sou mais do que agradecida por ter a


Beatrice ao meu lado, e o Dante, que me ajuda sempre que preciso fazer algum
esforço. Secretamente eu tento juntar esses dois, mas o Cowboy não colabora
enquanto a minha amiga cai de amores por eles.

O Dia dos Namorados se aproxima e tenho planos para o casal, pena que
eles não sabem disso ainda.

Às vezes tenho vontade de ligar para o Daniel e contar tudo sobre a


gestação, mas como ele falou comigo retorna a minha mente, me deixando com
medo de uma nova rejeição. Sei que sou forte e posso fazer tudo sozinha, mas
ainda assim, eu queria o que os meus irmãos têm, companheirismo e amor
enquanto cuidam dos filhos.

O Levi acabou de ter uma linda menininha chamada Lorrany, nome


escolhido pelo Lorran, ainda não fui visitar os dois por conta da gravidez
avançada, não posso pegar avião e me limito a viagens somente para a cidade de
Veneza, onde faço minhas consultas e compro o enxoval do bebê. A pedido da
Beatrice vou ficar com ela por tempo indeterminado.

Sinto saudades da Louise, mas sou grata todos os dias por ter a Beatrice ao
meu lado.

Pela primeira vez, vim a uma consulta acompanhada e é reconfortante ter


uma mão para apertar e um par de olhos para me encarar, felizes por saber as
novidades da minha bebê. Agora que me dedico exclusivamente a ela, eu
finalmente sinto que as coisas estão voltando aos eixos certo, se não fosse a
distância do Daniel, tudo estaria perfeito, tento não pensar nele e reservo a
melancolia para o meu diário.

Cansei de tentar encontrar o amor, não preciso de homem na minha vida e


serei feliz cuidando da minha pequena, que eu ainda não decidi o nome. A ideia
de homenagear a minha mãe paira constantemente na minha cabeça, mas não
quero duas, Cecília na família. Louis teve sorte de ser o primeiro a ter uma
herdeira mulher, o safado ainda me paga por pegar o nome da nossa mãe sem
saber se eu queria usá-lo também.

Tenho certeza de quando a minha bebê nascer já terá um nome, continuo


procurando um, incansavelmente, na internet. E mesmo se não me decidir antes
do nascimento, quando eu a olhar saberei qual é a melhor escolha.

Enxugo as lágrimas enquanto a senhora limpa o gel na minha barriga, não


precisarei tomar vitaminas, mas farei novos exames para acompanhar o
desenvolvimento, em breve estarei dando à luz a uma linda garotinha.

— Vai à loja de roupinhas hoje? — Beatrice pergunta, andamos com os


braços enlaçados pelas ruas de Veneza.

Por sorte não estamos em temporada que o nível da água sobe e podemos
andar sem precisar nos locomovermos em embarcações, tenho pena dos turistas
que veem aqui nessa época do ano, achando que encontrarão a cidade feita entre
as águas, isso só acontece em uma determinada época do ano, e é magnifico, mas
o resto do tempo é só uma cidade comum com muitos canais de água.

— Com certeza, ainda não tenho roupas o suficiente — adoro usar blusas
que deixam a barriga a mostra, exibindo com orgulho a minha gestação.

Não irei participar da premier do filme, e não me sinto nem um pouco


culpada por isso, a equipe de marketing que dê um jeito nas entrevistas, sem a
diretora, já enviei minhas respostas para as perguntas da imprensa, e agora é só
esperar os lucros. Investi cerca de 10% no filme, e espero ter um lucro de mais de
um milhão de retorno.

Não preciso me forçar a trabalhar, me dediquei anos a indústria e agora


tenho outra prioridade que eu amo muito mais, no meu ventre. Chutando sem
parar e chamando a atenção pela marca de seu pezinho na minha pele exposta.
Entramos na loja e compro mais vinte roupinhas, todas de tamanhos
diferentes, para a minha pequena usar quando for crescendo, sei que ela não
ficara do mesmo tamanho por mais de três meses e quero estar preparada.

Voltamos para a fazenda e Beatrice chama o Dante para ajudar pegando as


coisas dentro do carro.

— Você vai ter uma bebê ou um exército? — ele pergunta franzindo as


sobrancelhas.

— Não seja exagerado — brinco me sentando na varanda alisando a


barriga. — Ela não vai usar isso tudo de uma vez e quero aproveitar o tempo que
tenho para fazer compras, depois será somente choro e fraudas sujas.

— Minha mãe disse que pode te ajudar no seu resguardo — ele fala
trazendo as sacolas.

— Eu agradeço e com certeza vou querer a ajuda dela. Todos vocês têm
sido incríveis nesse tempo, obrigada — seguro a mão dele, quando passa por mim
e o puxo para um abraço.

Apesar de ser meio turrão, Dante é um amor de homem, ele escuta,


conversa, e não te faz sentir mendigando por atenção. Eu entendo o motivo de ter
sido fácil para a Beatrice se apaixonar por ele. Um homem lindo como ele, com
cabelo cheiroso e braços musculosos é a receita para derrubar qualquer mulher
com um hormônio querendo sexo.

A pena que faz é a timidez da minha amiga em não conseguir expressar o


que realmente sente em palavras e ações. Os pais dela tomaram cuidado para
podar a Beatrice e a fazer ter uma fobia social severa, durante toda a vida, se não
fosse pela Blanca, ela teria enlouquecido e só Deus sabe onde estaria agora.
Essa fazenda é mais do que a sua fonte de renda, é o seu refúgio do mundo
e das dores do passado.

— E o pai da piccola? Ainda não quis saber dela?

— Ele tem meu número e eu já contei a verdade, se não me ligou, ele que
vá catar bosta de vaca.

Evito usar palavrões para a minha piccola não aprender, é difícil ser
criativa quando quero mandar alguém se foder, mas tudo pelo bom
desenvolvimento da minha menina.

— Louis deve estar planejando com cuidado o assassinato dele — Dante se


senta ao meu lado e chama a Beatrice para ficar ao lado dele com a mão. Como
diabos esse homem consegue não perceber os olhos dela brilhando e a vontade
que ela tem de se sentar no colo dele e o abraçar?

É um asno da pior espécie!

— Ele tenta o tempo todo me fazer falar — dou de ombros — mas não
quero minha piccola sentindo que só foi aceita pelo pai devido ao tio babaca que
não respeita a decisão da mãe. Para mim o infeliz morreu.

— Você não sente saudades dele? — Beatrice pergunta, discretamente


batendo a coxa na do Dante.

— Não — minto, eu não me envolvi com ninguém depois do Daniel e é


difícil esquecer um homem como ele, que é a receita perfeita para me fazer
enlouquecer.

— Teve alguma notícia dele? — ela insiste. E eu bufo, só a Olivia e a


Bianca sabem que o Daniel é o pai, por ligarem os pontos do meu interesse nele e
nas poucas coisas que falei a elas, mas não contei a mais ninguém e pretendo
deixar assim. Quanto menos pessoas souberem, menores as chances de forçarem
ele a aceitar algo que ele se recusa a reconhecer.

Nunca vi uma mentira tão deslavada quanto a dele. Estéril uma ova, tenho
certeza de que não engravidei sozinha e muito menos do espírito santo. Ele mais
do que teve tempo para vir atrás de mim, se não o fez, é porque não se importa o
bastante para isso e pensar sobre a possibilidade de não significar nada para ele
quando meu coração idiota insiste em lembrar da sua existência todos os dias, me
magoa.

— Não — respondo à pergunta — e não irei atrás.

— Certo — Dante fala — vou ter de assumir esse papel — ele brinca e eu
gargalho.

— Você mataria a criança em dois segundo — Beatrice fala rindo — só


tem jeito com os bezerros.

— E nunca matei um — mostra a força do bíceps — tenho forças para


segurar qualquer criança.

— O que você tem de força tem de desastrado — Beatrice implica, Dante


sorri lindamente para ela antes de a abraçar, apertando seu corpo contra o dele,
quase os fundindo.

— Prove um pouco da minha força — ele fala rindo.

Com o clima gostoso, aproveitamos o final da tarde antes de colocar meu


plano em ação para o Dia dos Namorados.

Envio para ambos um convite para irem a um restaurante romântico, como


prêmio de um sorteio que eles nem sabiam que tinham ganhado. No dia do jantar
a Beatrice sai extremamente arrumada, e o Dante mais cheiroso do que nunca,
agora é deixar os dois se darem conta que são almas gêmeas e ficarem juntos.
****

O tempo passa rápido e finalmente estou na semana final da minha


gravidez. Para facilitar o parto, me mudei para uma casa em Veneza, onde o
Louis tem feito morada com a Bianca lindamente grávida do segundo filho, e
Beatrice que reclama todos os dias de saudades do Dante, por mais que eu a
mande para casa ficar com ele, ela se recusa a me deixar só, e a sua afilhada.

O casal que ainda não é um casal romântico serão os padrinhos da minha


pequena que ainda não tem nome, tenho fé de que serei capaz de dar um a ela.

— O que eu coloco na certidão de nascimento? — Louis pergunta pela


enésima vez.

Pego a frigideira na minha mão e taco no braço dele com ódio da sua
insistência em saber quem é o pai da bebê. Estou quase dando à luz e não suporto
mais ouvir a voz dele.

— Louis, eu juro que te mato! — grito.

— Não mate meu papai — Cecília pede rindo, ela chora quando brigo com
ele.

— Vou afogar ele no rio!

— Está vendo piccola — Louis pega a pequena no colo — é isso que uma
gravidez faz com as mulheres, elas viram assassinas, nunca engravide.

Cecilia ri do pai e beija a bochecha dele. A pequena tem cabelos tão loiros
quanto os nossos. Será que a minha menina será loira, ou terá os cabelos pretos
como o do pai? Pensar nisso aperta meu coração, aquele desgraçado não me ligou
nenhuma vez querendo saber da nossa filha.
— Louis, pare de querer fazer a Lira te matar — Bianca pede puxando o
marido para longe.

Uma dor forte se espalha no meu ventre para as pernas e seguro a bancada
da mesa, sabendo o que significa.

— Minha filha vai nascer— grito chamando a atenção e como um vulcão


em erupção.

Louis me coloca dentro do carro e dirigi tão rápido para o hospital que
esqueceu a Bianca e a Beatrice no apartamento. Quando a dor alivia eu dou risada
da cara dele.

— Do que você ri tanto? — ele pergunta quando chegamos ao hospital.

— Você esqueceu sua esposa — respondo fazendo careta ao sentir outra


pontada aguda.

— Minha sobrinha nasce hoje e eu morro, oh combinação boa — ele fala


de testa franzida me segurando no colo e levando para a cadeira de rodas.

Um quarto já está preparado me esperando e nele fico as próximas horas


sofrendo com as contrações. Ter minha família e melhor amiga comigo, conforta
meu coração solitário.

Daniel não faz ideia do que está perdendo, mas eu sei o que estou
ganhando quando uma garotinha pesando 3 quilos e 200 gramas é colocada no
meu colo. Os cabelos tão louros que parecem brancos, cobertos de restos de
sangue, o choro preenchendo meus ouvidos e aliviando meu coração ao segurar o
meu pedacinho de mundo nos braços.

— Bem-vinda ao mundo, Lizzie — sorrio beijando sua testinha molhada.


O nome dela não poderia ser outro, meu serzinho de amor e paz, minha
piccola, Lizzie.

Daniel

Dois anos depois...


— Não acredito que sua filha já vai completar 2 anos — digo ao Louis. —
O tempo passou correndo a Cecília com 3 anos e a Alessa com 2.

— Nem acredito em como o tempo passou rápido — Louis diz servindo


uma dose de uísque — Lorran já tem 5 anos, ainda lembro quando aquele menino
era um bebê, e hoje está todo esperto se achando o máximo como irmão mais
velho — gargalha lembrando as artes do sobrinho.

— A Lorrany já tem 2 anos, né?

— Sim, Lorrany, Alessa e Lizzie nasceram no mesmo ano, mas em meses


diferentes. Lorrany no início de fevereiro, Lizzie em abril e Alessa em agosto.

Espera um segundo, esse nome é novo para mim. Busco na memória


tentando entender se esqueci o nome de uma das filhas do Louis ou do Levi, mas
que eu me lembre que cada um tem dois filhos. Levi tem o Lorran e a Lorrany, o
Louis, a Cecília e a Alessa, então quem é Lizzie?

— Acho que me confundi com tantos filhos — coço a cabeça olhando ao


redor do bar na casa do Louis na Itália — quem é Lizzie? — levo a bebida aos
lábios.

— A filha da Lira.

Engasgo cuspindo o uísque na mesa. Tusso tentando recuperar o fôlego,


como diabos a Lira tem uma filha de 2 anos e eu não fiquei sabendo disso? Louis
franze a testa para o meu espanto.

— Sério que você não sabe?

— Como diabos isso acontece? Quem é o pai?

Um desespero enorme me toma, nos últimos dois anos eu não consegui


esquecer a italiana de olhos azuis e cabelos cor de ouro, com o corpo mais
perfeito que eu já vi e mais gostosa de se provar. Um apetite sexual que rivalizava
com o meu, me enlouquecendo por dias a fio em que precisei bater punheta,
lembrando do cheiro dela, o gosto e os sons que ela fazia ao gemer rebolando no
meu pau.

Entrei em uma longa disputa sobre a pensão alimentícia com Verônica, o


que me impossibilitou de participar das reuniões da família Vittileno, jantares de
aniversário e datas comemorativas, eram todos recusados com pesar. Louis é um
grande amigo que tem me ajudado com o inferno que é, Verônica no meu lado,
por causa daquela maluca, quase fui preso. Passei sete dias na cadeia esperando a
liberdade por fiança e foi um inferno que odeio lembrar.

Nunca vou me recuperar do susto que levei com os policiais batendo na


minha porta me levando sob custódia e como principal suspeito na tentativa de
suicídio de Verônica. Fui incriminado por incitar a tentativa de suicídio daquela
maluca, nunca pensei que ela armaria dessa forma para mim devido a uma pensão
alimentícia.

Foi graças a ajuda do Louis que consegui provar a minha inocência,


enquanto eu era mantido preso esperando o julgamento para a fiança, meu amigo
fez o que era impossível para provar que meu celular tinha sido hackeado e que
as mensagens que troquei com a Verônica foi armação dela para me fazer
culpado. Que os encontros que alega que tivemos nunca aconteceram, e era um
ator no meu lugar.

A puta da Verônica conhece bem meu jeito de falar, andar e vestir. Ela
simulou com precisão cada uma das mensagens e dos encontros. Cometeu uma
tentativa de suicídio deixando uma carta em que me culpava e as provas no
celular. Óbvio que ela não morreu e foi socorrida a tempo, ela ingeriu
medicamentos para ter uma overdose e acabou com um problema grave no
estômago.

No fim, a maldita foi considerada instável mentalmente e conseguiu uma


condenação de internação em um hospital psiquiátrico por três anos. Já faz um
ano que ela cumpre pena e não duvido que seja liberta em breve. Soube que tem
se comportado bem e demonstrado avanços milagrosos em sua cura. Só de pensar
naquela mulher libertada eu tenho ânsia e vontade de cometer um assassinato.

Perdi inúmeras coisas durante esses dois anos devido à maldita e pelo visto
a chance de rever a Lira e pedir desculpas por ser um completo idiota com ela, a
última conversa que tivemos não sai da minha mente nem por um segundo dos
últimos anos e a vontade de tê-la para mim.

— Daniel, os dois últimos anos realmente te foderam — Louis diz me


trazendo de volta a realidade — a Lizzie fez aniversário em abril, e vamos
comemorar amanhã o da Alessa, e só agora você está sabendo da minha sobrinha.
— Não é como se você tivesse me contado — acuso.

— Eu amo a Lizzie — ele tem pesar no olhar — mas odeio o pai dela, evito
falar sobre para não acabar cometendo uma loucura.

Fico atento a informação, para o Louis não gostar de alguém, a pessoa deve
ser um completo babaca asqueroso. Bebo o líquido esperando que ele continue
falando sobre o cunhado, quando não o faz me deixo vencer pela curiosidade e
pergunto:

— Tá, mas quem é o pai?

— Eu não sei — fecha o punho ao redor da bebida — e é isso o que mais


me enfurece. A Lira se recusa a falar o nome do bastardo e toda vez que vejo a
Lizzie perguntando por que suas primas têm um pai e ela não, eu quero trancar
minha irmã em um quarto e fazê-la falar a verdade para poder socar a cara do
desgraçado, e fazê-lo a assumir a paternidade. A Lizzie é uma doçura, mais
encantadora e travessa que o Lorran quando tinha a idade dela, odeio ver minha
girafinha sofrendo.

— Girafa? — franzo o nariz.

— Tem um desenho que ela assiste chamando “a hora do zoológico” que


ensina as crianças a falarem e procurarem coisas, usando diversos animais, bem
bobinho, mas a Lizzie simplesmente ama e vive chamando pela “Fefinha” o
nome da girafa.

— Que fofinha — sorrio imaginando a cena, se ela é filha da Lira deve ser
perfeita como a mãe — mas o cara sabe que é o pai da Lizzie?

— Diz a Lira que contou ao desgraçado, mas ele disse que era mentira dela,
falando que era estéril e não podia ter filhos.
— Que desculpa idiota... — perco a fala na última palavra, o ar some dos
meus pulmões quando uma lembrança corta minha cabeça ao meio.

****

— Tenho de te contar algo antes, promete não esquecer disso amanhã?

— Nunca.

— Eu estou grávida.

— Quem é o pai?

****

— Um perfeito babaca — Louis fala me puxando da lembrança — você


está bem? Ficou branco feito papel.

Levantando cambaleando e segurando a cabeça sem conseguir respirar.


Inspiro, e o ar não entra nos meus pulmões. Como diabos eu tenho essa
lembrança? Quando isso aconteceu? O que significa essa memória? Uma dor
aguda corta meu cérebro novamente, e caio de joelhos recordando o restante da
conversa.

****

— Você, estou com 29 semanas, transamos sem camisinha.

— Isso é impossível. Lira.

— Não é

— Eu não posso ter filhos. O pai do seu bebê deve ser outra pessoa.

— Não estou enganada, Daniel, é você!


— Não, Lira, eu sou estéril, é uma merda que você pense que te
engravidei, mas não tem como.

****

Era sobre isso que ela falava sobre a camisinha e o exame. A Lira me
contou que o pai da sua filha sou eu, mas esqueci completamente que isso
aconteceu, e no dia seguinte fui um completo babaca com ela.

A dor se alastra forte, me fazendo perder os sentidos. Louis me segura


pelos ombros me puxando para ele, cambaleando, saímos do bar entrando na sala
onde a vejo.

Linda, segurando uma menina loura de olhos azuis. Seu olhar encontra o
meu antes de tudo ficar escuro. Apago ouvindo chamarem meu nome.

Acordo sentindo um cheiro forte no nariz, abro os olhos vendo o Louis me


encarando preocupado, e a Bianca ao seu lado. Me sento com a cabeça
explodindo em dor e tentando assimilar a lembrança que tive. Mais do que nunca
preciso conversar com a Lira sobre o que aconteceu naquela noite, nada mudou,
eu continuo sendo estéril, mas preciso entender o motivo dela achar que Lizzie é
minha.

Eu nunca abandonaria um filho, principalmente quando sou incapaz de ter


um, mas agora que sei a verdade por trás daquele dia, um desespero sem igual me
consome. Pior do que quando achei que seria condenado por causa da Verônica.

— Como você se sente? — Louis pergunta.

— Só com a cabeça doendo.

— Vou pegar um remédio — Bianca corre.


Atrás dela eu a vejo, loura como eu me lembrava, o cabelo enorme, na
altura do quadril, os olhos azuis me encaram com fúria. Os braços envoltos da
menina que descansa a cabeça no colo da mãe. A Lizzie estende a mão para mim
dando um tchauzinho sorrindo, os dentes minúsculos.

Ignoro o Louis que fala ao meu lado e fico em pé caminhando até elas
como em transe. Estendo a mão tocando a da Lizzie, sorrio ao ver que ela
responde meu carinho estendendo os braços pedindo meu colo.

Lira puxa a filha para trás, mas sou mais rápido ao pegar a menina no colo,
ela quase não pesa. As bochechas gordinhas, os olhos dois diamantes, ela aperta
os dedinhos antes de segurar minha barba e puxar os fios. Chio pela dor
recebendo sua gargalhada como recompensa, cheiro seu pescoço, o aroma de
flores invade meus sentidos e lágrimas que me tomam. Não consigo entender o
motivo de me emocionar tanto segurando-a.

— Então você lembra? — Lira pergunta com dor na voz.

— Recentemente, Louis me contou sobre ela — digo com a voz rouca, a


vontade de chorar pelo que posso ter perdido rasgando meu peito — mas não tem
como ser verdade.

— Você teve dois anos para descobrir — ela segura a cintura da filha a
puxando para si — eu te disse antes e repito. Não vou fazer nenhum teste, minha
palavra deveria ter sido o suficiente.

— Eu fiz exames Lira — aperto o punho, com ódio de mim mesmo.

Porque no final a Lira me disse a verdade, mas eu enchi a cara e a ignorei,


não acreditei em sua palavra e perdi dois anos da vida dessa princesa que sorri
sem motivos para mim. Minha cabeça tem certeza do resultado do meu exame, eu
sou estéril com zero possibilidade de reproduzir. Mas meu maldito coração chora
querendo sentir mais um pouco do cheiro da Lizzie.
— Refaça — ela diz antes de sair.

— O que foi isso? — Louis pergunta desconfiado, Bianca retorna me


entregando um remédio.

Engulo o comprimido com dificuldade, o bolo na garganta esmagando


meus sentimentos.

— Acho que cometi um grande erro, Louis.

— Qual?

— Eu acreditei no médico que a Verônica me apresentou.

E por causa daquela maldita, mais uma vez, meu mundo foi arrancado de
mim. Eu acabei de conhecer a filha inesperada que rejeitei. E o ódio da Lira não
me deixará me aproximar delas com facilidade. Aperto os punhos, perdido.
Daniel
— O que você quer dizer com isso? — Louis pergunta.

— Preciso encontrar um médico.

— Está doente? — ele me olha como se eu fosse um lunático.

— Vamos conversar em particular — puxo o Louis para o escritório


sabendo a merda que vai ser quando eu contar o que me lembrei. Espero que a
relação que desenvolvemos ao longo desses anos possa valer de alguma coisa,
agora que ele vai querer me matar.

— Me conte com calma o que aconteceu — senta-se na cadeira atrás da


mesa e me acomodo em uma de frente a ele.

— Você já percebeu que a Verônica é louca.

— Sim, maluca de pedra — revira os olhos — achei que você não quisesse
mais falar dessa mulher.

— E não quero, mas quando eu tinha 35 anos fiz um exame para saber se
eu era estéril. A Verônica também fez e os dela deram negativos, mas os meus. —
Pego meu celular no bolso, abro a nuvem contendo a cópia de todo exame que eu
já fiz e procuro o arquivo que quero — veja isso — entrego a ele o resultado do
exame.

— Porra — ele fala após analisar — agora eu entendo você nunca ter tido
filhos — me entrega — mas o que isso tem a ver com o que acabou de acontecer?

— Quando você me disse que o pai da Lizzie era alguém que fingiu ser
estéril, eu tive uma lembrança — Louis se inclina para frente, posso ver como a
irritação vai tomando conta dele — no casamento do Levi com a Olivia, recorda
que a Verônica começou o inferno devido à pensão?

— Sim, você achou que poderia beber três garrafas de uísque sem morrer.

— E quase morri — ressalto — mas em algum momento daquele dia eu


falei com a Lira, mas não me lembrava disso — me levanto, andando de um lado
para o outro, tomando cuidado com a reação do Louis. Não sou otário de deixá-lo
me bater, mas sei que cometi um deslize com a irmã dele e que odeia o homem
que a abandonou grávida.

— O que vocês conversaram? — aperta os olhos, desconfiado.

— Lembrei disso faz pouco tempo, e minha cabeça quase explode — paro
de frente para ele apoiando as mãos na cadeira vazia — a Lira disse que eu era o
pai do bebê que ela espera e eu respondi que isso era impossível por que sou
estéril. E você acabou de ver o exame, não tem como ser falso.

Louis levanta com brusquidão arrastando a cadeira para trás. E vem a mim,
encho o peito de ar pronto para o enfrentar, sou um homem de 43 anos que já
tomou muita porrada da vida, não vou abaixar a cabeça para o Louis que é mais
novo, apesar de ser o meu chefe e irmão da mulher com a mínima chance de ser a
mãe de uma filha que eu nem sabia até poucos minutos.
— Eu quero muito socar a sua cara por fazer a Lira sofrer esses anos e
deixar minha sobrinha sem um pai. Se ela acredita que você é o pai da Lizzie eu
não vou duvidar e foda-se esse exame.

— Por isso eu disse que tenho de fazer um novo. Fiz com um médico
indicado pela Verônica e depois de tudo que essa vadia fez nos últimos anos, é
capaz dela ter pagado para adulterarem o exame.

— Vou procurar um médico para você ir amanhã — ele pega o celular, me


olhando mortal — juro que se não conhecesse a maluca da sua ex, eu quebraria a
sua cara, mas depois do que aconteceu ano passado, é uma benção que a Lira e a
Lizzie estivessem longe da sua vida.

— Não tinha parado para pensar nisso — me sento — não pensei em nada
— arrasto os dedos pelo cabelo com raiva borbulhando no meu peito — o que
mais aquela desgraçada vai tirar de mim — bato na mesa.

— Tudo que você deixar — Louis se senta novamente — minha secretária


marcou uma consulta para amanhã às 10 horas, vamos ver se você realmente é
estéril, mas a Lira não se enganaria quanto a isso.

— Não consigo acreditar — deito a cabeça no encosto — perdi dois anos


da vida dela se eu realmente for o pai e nem tive a chance de absorver a notícia
imerso nas mentiras e chantagens daquela vadia.

— Agora eu te desejo boa sorte, a Lira quer arrancar seus olhos — ele
mexe no celular — vamos manter isso entre nós por enquanto, não quero dar
falsas esperanças à minha sobrinha.

— Me fala sobre ela? — peço com um aperto no peito.


— A Lizzie é maravilhosa, um verdadeiro docinho, apaixonada por girafas.
Quando ela estiver maior quero levá-la para as savanas, para poder conhecer uma
sem as grades de um zoológico.

Meu peito aperta com tamanha força que o ar me falta ao imaginar o Louis
ocupando todos os cargos que deveriam pertencer a mim. Fecho os olhos
impedindo que lágrimas desçam.

Eu passei anos me convencendo de que era estéril e nunca teria um filho, e


foi somente ver aquela linda menina de cabelos louros e olhos azuis, a segurar
nos braços e sentir seu corpinho quente contra o meu, que a certeza dela ser
minha me atingiu como um caminhão.

É difícil controlar a louca vontade de ir ver a menina e conversar com ela.


Mas preciso fazer as coisas com calma e o primeiro passo é me encontrar com um
médico e confirmar se sou ou não estéril. A Lira deixou claro que nunca faria um
exame de DNA e, porra, eu não preciso disso, as batidas loucas do meu coração
confirmando que a Lizzie é minha, é tudo o que preciso.

Me levanto decidido a não ficar choramingando, posso não me apresentar


como o pai dela ou exigir algo da Lira, mas como um visitante na casa do Louis,
eu tenho o direito de andar por aí e conversar com a Lizzie se ela estiver por
perto.

Quando tiver em minhas mãos o resultado do exame, vou encarar a Lira e a


fazer compreender que minha rejeição foi em função de algo que eu tinha certeza,
e que não passava de uma armadilha da minha ex.

Vou conquistar a minha filha e a mulher que não saiu dos meus
pensamentos nos últimos anos. Não importa quanto tempo leve, enquanto ela não
se apaixonar por outro, eu tenho chances.

— Vamos, quero conhecer a Lizzie melhor — digo saindo da sala.


— Boa sorte, os Vittileno são osso para esquecer — ele avisa.

— Eu sei, mas quando o fazem é de coração, caso não, você e seu irmão
ainda estariam sofrendo pelas mulheres que amam.

— Você tem um ponto.

Antes de sairmos, Louis segura meu ombro me impedindo de prosseguir, o


encaro.

— Vá com calma, eu te conheço e sei que você é um bom homem e será


um ótimo pai, o tipo que a Lizzie precisa, mas não faça a minha irmã sofrer, ou
eu vou ter de interceder por ela.

— Vai me afastar da empresa? — pergunto, a dúvida no ar.

— Não, você é um excelente CEO e com seu comando na empresa no


Brasil posso ficar tranquilo administrando a da Itália. Eu sei separar assuntos de
família com o trabalho, espero que você também.

— Certo.

Não sei por que me sinto mais novo que o Louis ao ser confrontado por ele
nesse momento. Tenho de voltar ao meu normal, se quiser lidar com a situação da
Lira e não deixar que a Verônica abale nossa relação também. Por causa daquela
vadia eu perdi tudo uma vez, nunca mais deixarei isso se repetir, mais do que
nunca, eu tenho pelo que lutar agora.

Saímos e o som de crianças brincando chega ao corredor. Ando rápido até o


jardim, hoje vejo um total de 4 meninas gritando, enquanto o Lorran dá ordens
como um rei de cima da cadeira no jardim com uma capa de super-herói nas
costas.
— Prestem atenção, simples mortais — ele fala empolgado, dou risada do
seu jeito e o Louis me acompanha rindo — eu vou destruir a todas se não me
trouxerem agora os seus doces mais gostosos.

— Vamos logo — a pequena Lorrany puxa a Cecília e ambas correm


entrando na cozinha. Alessa vem ao pai que a pega no colo.

— Docinhos, papai — pede e Louis sai com ela no colo.

— Ehi — uma coisinha fofa de cabelos louros e bochechas vermelhas


devido à corrida — Hai dolci?[4] — pergunta em italiano e eu tenho vontade de
morder suas bochechas e fazer cócegas nela até explodir de felicidade.

— No, ma possiamo risolverlo.[5]

Ela estende a mão para mim e a seguro, contenho a vontade de a pegar no


colo. Lizzie é extremamente simpática e imagino que foi uma bebê que ia
facilmente para o colo de estranhos, sem se importar com a sua segurança. A levo
comigo para a cozinha e vejo Lorrany e Cecília subindo em uma cadeira tentando
alcançar a parte alta do armário.

— Parem já mocinhas — falo com elas em italiano que paralisam no lugar


— é perigoso subir em cadeiras desse jeito, eu ajudo vocês.

— Noooo — Lizzie me impede fazendo bico — eu enho galar! — imagino


que ela diga que ela tem de ganhar, não me acostumei ainda com a língua de
bebês e decifrar seus códigos.

A vontade de ajudar somente ela aperta meu ser, mas não posso deixar as
outras se machucarem. Por isso levo Lizzie comigo, pego o pote de bombons em
cima do armário, e entrego a ela três bombons, ela sorri agradecendo antes de sair
correndo com os coqueirinhos balançando na cabeça loura.

— Para as duas — digo entregando um bombom a cada uma.


— Não vale! — Cecília reclama enquanto Lorrany corre para entregar o
doce ao Lorran — quelo mais — estende a mão e não consigo resistir ao seu
pedido, entrego mais um bombom a ela.

— Bilgado — agradece e sai correndo na direção do Lorran.

Vou para o quintal vendo que Alessa ganhou a disputa dos doces ao
entregar quatro barras de chocolate. Lizzie ignora a briga de Alessa e Cecília por
perderem, tentando persuadir o Lorran a fazerem ela ganhar. Minha garotinha
come os chocolates enquanto todos estão distraídos. Acho muito fofo ver como
ela fica suja pelo doce e vou até ela para a limpar.

— O que pensa que está fazendo? — a voz que povoou meus pensamentos
nos últimos anos soa irritada atrás de mim, sua mão pequena segura meu
antebraço impedindo o meu avanço na direção das crianças.

— Temos de conversar — me viro para ela, não aguentando mais a tensão


entre nós, eu a fodo ou brigamos, mas não dá para continuar assim.

— Agora você quer falar? Após vê-la?

— Você não entende Lira — puxo o celular do bolso — deixa eu te


mostrar.

— Não, Daniel, o seu tempo de falar já passou — revira os olhos bufando


— não queira confundir a cabeça da minha filha.

Ignorando o que ela falou, eu abro o resultado do exame e coloco o celular


na sua frente para ver, assim como fiz com o Louis. Lira segura o celular com
cara de cansaço antes de começar a ler e atestar que eu não menti quando falei
para ela que era estéril.

— Não tem como isso ser verdade, eu tenho certeza sobre a paternidade da
Lizzie — fala chocada.
— Eu sei que tem — digo guardando o aparelho e segurando seus ombros
— mas eu também tinha, naquela noite eu estava puto de raiva devido à minha
ex, bebi duas garrafas e meia de uísque e esqueci completamente a conversa que
tivemos, e depois foi uma caralhada de coisas acontecendo.

— Não é da minha conta — tenta se fazer de indiferente.

— Se tivéssemos ficados juntos, vocês duas poderiam ter se machucado


devido à maluca da minha ex, ela quase me jogou na cadeia. Lira — aliso sua
bochecha me aproximando, o cheiro doce e cítrico invadindo meus sentidos,
cheio de saudades.

— Isso é loucura — ela diz se afastando — Não importa o que você vai
fazer daqui em diante, eu não te quero perto de mim ou da minha filha.

— Eu vou fazer um novo teste de fertilidade para poder ter a certeza de que
o teste que fiz aos 35 anos foi uma armação da Verônica, mas eu sinto Lira —
levo a mão ao peito — que a Lizzie é minha, por favor, não seja como a vadia da
minha ex, não destruía minha vida novamente.

— Você não tem o direito de jogar sobre mim essa responsabilidade — ela
fala visivelmente abalada.

Assim como eu, não esperava chegar aqui e encontrar uma filha e perceber
o erro que cometi. Lira não imaginou que a minha reação pudesse ser algo além
da recusa, ao invés da aceitação que estou demonstrando. Vou provar a essa
mulher que nada é o que ela imagina.
Lira
Ele não tinha esse direito, não depois de dois anos e nove meses de
gravidez em que o Daniel não quis saber se a filha estava viva, bem, ou passando
por alguma dificuldade. Não deu a mínima para os medos que tive quando estava
grávida e a Lizzie não ganhava peso, não soube a felicidade quando descobri o
sexo dela ou quando ela engordou ganhando o tamanho esperado de um bebê.

Como foi sentir o hálito dela pela primeira vez mostrando que respirava, ou
o medo que tive no parto de não conseguir fazer força suficiente. Foi meu irmão
quem segurou a minha mão enquanto a médica me mandava empurrar e eu
gritava, e o Daniel fazia sei lá que merda durante o nascimento da filha.

Nunca trocou uma fralda dela ou passou noites em claro, enquanto eu


andava de um lado para o outro na fazenda da Beatrice tentando fazer a Lizzie
pegar no sono. Até o Dante já dormiu com ela no colo por estar cansado de a
ninar, e ela se recusar a dormir, Beatrice correu comigo tantas vezes para os
hospitais quando a Lizzie tinha febres, que eu nem saberia contar quantas foram.

Ele não viu quando a Lizzie estava aprendendo a andar e caiu batendo a
cabeça no chão, abrindo um corte que me levou ao desespero, e fez o Dante
dirigir como louco para o hospital enquanto eu me desesperava com a minha
pequena inconsciente no meu colo e o machucado aberto.

Quando ela tinha um ano e um mês sofreu uma concussão e ganhou uma
cicatriz no couro cabeludo de 2 centímetros.

Somente eu, Dante e Beatrice, sabemos o desespero que foi aquela noite e
muitas outras. Acompanhamos de perto os primeiros passos, as risadas, as falas
emboladas na língua que só os bebês sabem se comunicar. O primeiro aninho e
como ela estava linda vestida de joaninha, com a tiara com orelhas que ela vivia
pegando e colocando na boca.

Ele não tem o direito de aparecer depois de dois anos, e agora querer me
convencer com esse maldito teste que fala que ele não pode ter filhos. Eu tenho
certeza e foda-se que ele estava bêbado, se no dia seguinte tivesse aceitado
conversar quando tentei, ao invés de somente querer me comer, nada disso teria
acontecido sem ele por perto. Eu não teria me refugiado com a Beatrice para ter
paz e sossego, ele poderia ter cuidado da gente.

E agora vem com a desculpa de que foi preso? Nada disso faz sentido e só
mostra o perigo que ele realmente representa para a minha família. Não posso
deixar a Lizzie chegar perto de um homem com uma ex maluca, que forjou um
exame de fertilidade, vou manter a minha filha segura a qualquer custo,
independente do que seja à vontade dele.

Eu sou a mãe dela a única responsável por sua felicidade e segurança,


Daniel não vai abalar a vida tranquila que estou construindo para a minha filha,
longe dos holofotes, de qualquer confusão, ou algo que prejudique negativamente
seu crescimento.

O desgraçado ainda se atreve a pedir para que eu não destrua a vida dele? A
ira me invade como um vendável e tenho vontade de o mandar tomar no cu, se
não fosse os malditos olhos tristes e brilhantes do homem que tem atormentado
cada um dos meus pensamentos nos últimos anos, seja de ódio ou de saudades.

Perceber a vulnerabilidade de um homem maduro como o Daniel, é uma


maldita estaca na minha determinação, pois quando a raiva passa, sentimentos
ternos tomam o lugar, dando possibilidade a algo que nunca poderia existir.

— Eu sou responsável somente pela minha felicidade e da Lizzie — digo a


ele com a voz embargada — você cuide da sua sozinho, seu stronzo!

— Eu sei e sinto muito por ter te desapontado — ele fala, o idiota tem tanta
sinceridade na voz que eu quero socar a cara dele — é tudo muito novo ainda...

— Não tem nada novo — o corto, espumando em fúria — para mim as


coisas sempre foram completamente claras, você é o pai da Lizzie e a rejeitou,
assim como a mim.

— Eu tinha certeza que era infértil e não lembrava da nossa conversa, por
favor, entenda o meu lado — pede apertando os punhos.

— Não, assim como você não entendeu o meu.

Passo por ele indo até a Lizzie que se empanturra comendo chocolate.
Louis observa sem fazer nada, enquanto as crianças se lambuzam com os doces.
Esse desgraçado nunca soube colocar um limite nelas e tira o juízo das mães
quando repara nas crianças. Lorran dava para ser um traficante de doces que
nunca é preso, devido à fofura em excesso, mas dessa vez eles vão ver.

— Parem já de comer o chocolate — ordeno com as mãos na cintura.

— A Zia Lira chegou — Lorran arregala os olhos e sai correndo sabendo a


bronca que iria levar.
— Não adianta correr — grito com ele — sua mãe vai saber disso,
mocinho.

— Não conta para a mamãe — Cecília pede escondendo as mãos, e Louis


ri da filha, fulmino meu irmão com o olhar.

— Leve agora suas filhas para o banho e limpe esse chocolate delas.

— Elas só estavam brincando — ele fala com um sorriso bobo, as meninas


fazem o Louis de gato e sapato.

Se um dia achei que Bianca tinha rendido meu irmão, isso caiu por terra ao
ver como ele é com as filhas, um completo babão, que faz tudo o que elas pedem
sem recusar. A Bianca sofre tentando colocar limites, e eu que passo dor de
cabeça quando ele envolve a Lizzie no meio do seu reinado sem regras.

— Eu vou chamar a Bianca — digo a ele.

— Como você é chata, pensa que a minha mulher manda em mim? — Pega
a Cecília com o braço esquerdo e a Alessa com o direito.

— E não mando? — Bianca surge atrás dele de braços cruzados.

— Cruzes — Louis pula com o susto, e mordo o lábio para não rir.

— Zio tum meldo — Lizzie fala dando risada.

— Manda sim amor — ele beija os lábios dela, sendo recebido pela
gargalhada das filhas — e vou agora dar banho nessas confeiteiras para que você
não precise se preocupar com isso.

— Eu vi você levando a Alessa para pegar chocolate — Bianca bate na


bunda do marido — de castigo por uma semana.

Gargalho entendendo bem qual o tipo de punição será aplicado a ele.


— É assim que se faz cunhada — digo rindo. — Vem Lizzie — pego a
minha princesa no colo.

— Bola, mamãe — beija minha bochecha me enchendo de chocolate.

— Não, filha, a mamãe já tomou banho — reclamo enquanto ela me


lambuza ainda mais. Eu vou matar o Louis — quem te deu esse chocolate todo?

— O Zio — aponta. Viro de costas vendo-a apontando na direção do


Daniel. Eu odeio como ele está ainda mais lindo e com os olhos brilhando em
vontade de poder falar com a Lizzie.

Daniel tem mais fios grisalhos do que eu lembrava, o charme de homem


mais velho exala do seu corpo batendo contra o meu, a barba com o cavanhaque
branco e os outros fios negros como a costeleta que se une ao cabelo em fios
negros. O queixo quadrado, o rosto retangular, os olhos azuis-escuro penetrantes,
os ombros largos e as mãos grossas, ele enfia dentro do bolso da calça
respeitando a minha decisão, mas cheio de vontade de falar com a filha.

— Foi você quem deu chocolate a ela? — pergunto me aproximando.

— Dei bombons para ela entregar ao Lorran e ganhar a brincadeira — fala


com o peito inflado, deixando os ombros mais largos.

— Lizzie, agradeça ao zio por dar os doces.

Lizzie se estica para a frente manchando a camisa do Daniel de chocolate.


Deixo que minha filha beije a bochecha dele o sujando, e ao contrário do que
pensei que iria acontecer, Daniel envolve Lizzie com os braços e beija seu
pescoço fazendo cócegas na menina que começa a rir.

Minha piccola sempre foi carismática e simpática ao extremo, ia para o


colo de quem a chamava, e adorava sair para passear escondida. Me deu muitos
ataques cardíacos por causa disso.
— Oi, fofinha — ele fala.

Contenho a emoção ao ver os olhos do Daniel marejados, por anos


imaginei como seria quando ele visse Lizzie, se teria coragem de a rejeitar após
ver a fofura linda que a filha dele é. Mas indo contra tudo que imaginei, Daniel
quer ter contato com a filha, e comprovar mais do que nunca que é o pai dela,
provando que sua ex armou sobre o teste de fertilidade.

Não sei o que fazer, não me preparei o suficiente para o que aconteceria
agora. O choque de realidade não ser o que eu imaginava acaba comigo. E ver o
carinho dele com ela, tudo que eu sempre quis quando a minha menina
perguntava pelo “papa” sempre que via as primas e primo chamando os pais
deles, a dor de não saber o que responder, na minha frente, tenho a resposta para
todas as minhas orações.

Mas a dor não me permite aceitar com facilidade, a qualquer momento ele
pode desistir novamente e nos abandonar, magoar a minha menina, e isso eu não
posso deixar que aconteça. A maternidade pode ter me deixado mais mole, mas
em compensação, estou o triplo cautelosa e preocupada com quem se aproxima
da Lizzie.

— Tudo bom? — Ela pergunta rindo, é uma das poucas frases que sabe
falar direito.

— Sim e com você? — ele responde, não se importando com o chocolate


preso na barba.

— Tudo — ela ri — a mamãe ta balba. — Confidência me olhando sapeca,


ela sabe que vou reclamar por comer um monte de chocolate com o Lorran, meu
sobrinho é uma péssima influência para a glicose de uma criança.

— Não fique brava com ela, mamãe — Daniel fala me olhando enquanto
segura a mão da Lizzie — a culpa foi toda minha, brigue comigo.
— Com certeza eu vou — o encaro de rabo de olho — mas agora vou dar
um banho nessa porquinha.

— Oinque — ela faz o som do animal e eu rio, sempre acho divertido a


Lizzie imitando os animais.

— É mesmo uma porquinha — Daniel brinca levando os dedos para a


barriga dela e fazendo cócegas.

Lizzie gargalha alto se jogando contra ele, a cabeça dela para no peito do
Daniel e minha filha sorri tranquila, como se soubesse que está na presença do
pai. Eu tenho de tomar cuidado ao proteger nós duas, minha pequena não pode se
apegar a um homem com chances de desaparecer das nossas vidas se decidir que
não quer ser o pai dela, ou que é demais para ele.

— Oinqueeeeeee — ela fala antes de bocejar.

— Tá bom porquinha da mamãe — digo com um bolo na garganta — hora


do banho.

— Xaaaau zio — ela beija a bochecha do Daniel e não aguentando mais


ver a aproximação deles, eu caminho para casa.

O desgraçado me segue, Lizzie vira o encarando e posso ouvir que o Daniel


faz sons de animais, fazendo a Lizzie gargalhar. Eu queria correr e respirar em
paz, para conseguir tomar a melhor decisão sobre o que fazer em seguida com a
minha vida, e garantir que minha garotinha não sofra a dor que sofri pela falta de
um dos pais.

É somente por ela que eu decido colocar o meu orgulho de lado, vou
confrontar o Daniel e dizer tudo que deixei entalado por dois anos na garganta
como facas me cortando, sempre que eu me deitava para dormir e a nossa
conversa retornava a minha mente. Ele não sairá impune e muito menos
encontrará um mar de rosas por decidir assumir seu papel paterno.

— Mais tarde conversamos — digo a ele, sabendo que não posso viver no
limbo.

Se tem algo que aprendi com a história dos meus irmãos é que todos
merecem uma segunda chance, mas nem por isso eu tenho de passar por cima das
minhas dores, posso fazer tudo no meu tempo, quando achar que o momento
propício.
Daniel
Ela fugiu! — Penso irritado controlando os nervos enquanto espero a Lira
descer.

Todos já se recolheram em seus quartos e eu continuo plantado na sala,


esperando pela conversa que ela disse que teríamos.

É um inferno ficar perto e longe da Lizzie, a garotinha de olhos azuis como


os da mãe, conquistou meu coração e a necessidade de fazer parte da vida dela
me consome.

Por ser final de semana, vou ter de esperar a segunda para fazer o exame na
clínica que a secretária do Louis marcou. Cancelei toda a minha agenda da
semana e vou ficar na Itália para conseguir resolver as coisas com a Lira, torço
para que ela não decida voltar para a fazenda da Beatrice e fique na casa do
irmão, para podermos conversar, eu quero saber tudo sobre a Lizzie, cada detalhe.

Nunca vou conseguir recuperar o tempo perdido ou me perdoar por


acreditar naquele médico e não ter feito um segundo exame. Após perceber os
extremos em que a Verônica é capaz de chegar, não tenho dúvidas quanto à sua
armação para me fazer acreditar que não poderia ter filhos, só não consigo
entender o motivo dela ter feito isso. Ela também queria filhos.

Desde que nós nos conhecemos, o tema criança sempre foi delicado.
Verônica era uma modelo conhecida e estava em ascensão na carreira, ela se
recusava a “estragar o corpo” como ela dizia tendo a pele esticada por uma
criança. Mas eu compreendia seu anseio profissional, também tinha os meus, por
isso não insisti. E quando aos 35 anos, ela disse que tinha chegado a hora de
termos bebês, eu aceitei sem pensar duas vezes, mas logo o meu diagnóstico veio
e nossa vida desandou.

Estou em uma posição delicada onde uma das duas mulheres com quem me
envolvi contam versões diferentes para fatos que alteram a minha vida. A
primeira que eu nunca poderia ter filhos, e a segunda que tive uma filha e a
rejeitei em meio a uma bebedeira desenfreada, e a certeza inabalável de confiar
na avaliação de um médico.

Uma destrói a minha vida, a outra me oferece uma chance de ter tudo o que
eu sempre quis e me foi negado.

Eu só tenho de descobrir como fazer Lira perceber que não sou o vilão da
nossa história, mas, outra vítima de uma mulher louca. Manter a cautela vai ser o
principal no momento. Lira me odeia — e ela tem motivos — mas preciso
mostrar que mudei e o que fiz não foi usando a razão, mas em uma noite, bêbado
e irritado pela mulher que me destruiu.

Sento-me no sofá balançando a perna freneticamente. Ouço passos vindos


da escada, giro o pescoço encontrando a mulher que pode mudar completamente
o meu destino. Ela usa uma blusa de alças de cetim, marcando os bicos eriçados
dos peitos. O short jeans rasgado, realçando a grossura das coxas brancas, os fios
louros maiores do que eu me lembrava, tocando sua cintura como uma cascata, os
olhos azuis me encaram afiados, prontos para me devorar.
— Achei que não viria — digo.

— Estava colocando a Lizzie para dormir — ela responde com um suspiro.

— Ela dorme fácil?

— Não, geralmente só depois de duas histórias sobre os animais do


zoológico.

— Ela já foi em um zoológico? — pergunto observando seus passos, os pés


descalços quando ela se senta no sofá de frente a mim.

— Ainda não, o Dante já mostra muitos animais na fazenda, não preciso de


mais um monte de bicho de pelúcia que ela iria querer após vê-los — leva a mão
à cabeça como se lembrasse de algo assustador.

— Como assim? Ela tem um exército ou algo do tipo? — pergunto me


sentando de frente a ela, na ponta do sofá, querendo ir para seu lado, mas
respeitando a distância imposta.

— Sim, o safado do padrinho dela adora me enlouquecer comprando vários


ursos de pelúcia para Lizzie, o quarto dela já tem uns 10 elefantes. É um inferno
limpar todos eles.

— Quem é o padrinho dela? — pergunto, me sentindo mal por não saber ou


ter participado da escolha.

— O Dante, e a Beatrice a madrinha — alisa o pescoço, meus olhos


seguem seus dedos tocando a pele branca, deslizando pelo vão entre os seios e
parando entre as pernas grossas.

Pigarreio recuperando o foco da conversa.

Encaro os olhos da Lira, ela fez de propósito o momento da mão, medindo


o quanto consegue me atrair para a sua teia de sedução. Respondendo ao seu jogo
me recosto contra o sofá de braços abertos a deixando ter uma boa visão dos
meus músculos e coxas grossas.

— Eles são bons para ela? — pergunto.

— Mais do que você — alfineta e isso me dói.

— Não faz isso — apoio os cotovelos no joelho, sabendo que o momento


não é próprio para o sexo, apesar da tensão sexual cortando a sala.

— Não me diga o que fazer — rosna.

— Certo — ergo a mão — vamos conversar em paz.

— Diga o que você quer. — Ela entra na defensiva, deve estar achando que
planejo levar a Lizzie para mim.

— Só quero conhecer a Lizzie e entender toda a situação. Me explicar, se


você estiver disposta a me ouvir.

— Você tem até o amanhecer, se eu não gostar do que você vai falar, irei
embora com a minha filha amanhã e nem tão cedo você a verá novamente.

Mordo a língua querendo retrucar suas palavras, mas no momento eu não


tenho nada para usar de triunfo contra a Lira e a fazer ficar, ou não, levar a Lizzie
para longe de mim.

Respiro fundo, aliso as coxas me sentando confortável, pronto para a


batalha que será as próximas horas.

— Quando você descobriu a gravidez? — início.

— A primeira vez que eu te liguei foi para marcar um encontro e contar


sobre a gravidez.
— Porra — aliso os cabelos — isso foi pouco tempo depois que
transamos.
Na época achava que você queria um encontro por estar apaixonada.

— Coisa que nunca estive — olha de lado, ferindo meu orgulho.

— Nem uma única vez? — tento brincar para aliviar o clima.

— Não — fala fria como um bloco de gelo e tenho vontade de a esquentar.

— Para ser sincero com você — digo, decidindo manter a conversa no tom
adequado — naquela época comecei a ter problemas novamente com a minha
exesposa. Estava irritado, e quando pensava que você poderia ser grudenta como
ela, eu queria distância.

— Veja só o que te resultou essa distância — ironiza.

— E eu me arrependo amargamente disso — sou sincero. Lira parece


baixar a guarda por um segundo, antes de erguer os ombros.

— O que mais quer saber?

— Como foi a gravidez?

— Assustadora — os olhos dela brilham — eu estava sozinha em


Vancouver contando apenas com a minha assistente, e no meio das gravações de
um filme. Não podia pausar, corria o tempo todo, os enjoos foram terríveis e a
Lizzie não conseguia se alimentar o suficiente para crescer — ela leva a mão aos
olhos tampando e soluçando — eu tive tanto medo, e me culpei por ela não
conseguir crescer, se não fosse pela médica sempre me garantindo que a Lizzie
estava saudável, eu teria enlouquecido.

Levanto indo para o seu lado, pego o corpo pequeno contra o meu, a
envolvendo em um abraço forte, expurgando as suas dores como deveria ter feito
enquanto ela estava grávida, não a deixando passar por isso sozinha. Lira mancha
minha camisa com as lágrimas de frustração e tristeza, beijo sua cabeça alisando
suas costas para a fazer se sentir melhor.

— Me perdoa por não estar presente, por favor — peço.

— Não importa mais — me solta limpando o rosto — quando te contei


sobre a gravidez, você nem deve ter notado meu ventre pelo tamanho pequeno
que ele ainda estava.

— É verdade, me perdoe por isso — aliso seu braço — deixa eu tentar te


explicar o que se passava comigo naquele dia.

— Você e sua ex maluca, já entendi tudo — revira os olhos fungando.

— Não, Lira, você não sabe de nada e precisa me ouvir para conseguir
entender.

— Fale.

— Eu conheci a Verônica quando não tinha nada além de uma bolsa de


estudos na PUC para administração, foi o único curso que consegui passar. Cresci
na periferia Lira, nunca tive muita condição financeira, mas tinha um lar amoroso
e pais que me apoiavam independente das nossas brigas.

— Não entendo o motivo de começar a falar dessa época.

— Para você entender do começo, tudo que culminou naquela noite e nos
dias seguintes.

— Prossiga.

— Verônica cursava Arte e Designer, ela queria ser estilista e fazia bicos
como modelo. Também vinha de família humilde, mas queria o mundo a seus
pés. Foi fácil se apaixonar, começamos a namorar, e quando nós nos formamos,
eu consegui emprego na empresa do meu amigo Fábio, que também era amigo da
Verônica, éramos um trio.

— Que história linda — desdenha.

— Quieta — a puxo para meu colo batendo em sua bunda — estou sendo
sincero com você, me ouça sem julgamento.

— Seu ogro — bate no meu peito, mas não faz menção de se levantar.

— Com o tempo aprendi a fazer investimentos e acumulei em cinco anos


um capital de um milhão de reais, com esse investimento, abri a minha empresa
com o Fábio como sócio. Eu trabalhava com distribuição de produtos para outras
empresas, como a VITTILENO. A Verônica seguiu carreira como modelo
enquanto eu trabalhava como CEO da empresa. Mas foi ela quem sempre cuidou
de mim, exames, consultas médicas, alimentação, tudo era ela quem ditava, e eu
fazia.

— Que cordeirinho obediente — revira os olhos e estapeio sua coxa,


percebendo que era essa a sua intenção. Lira morde os lábios, e seguro suas
pernas, a fazendo sentar aberta em meu colo.

— Perceba Lira: a Verônica tinha controle, sobretudo, ela quem decidia


minhas roupas ao café da manhã. Eu morreria envenenado se ela me desse
amendoim e nunca suspeitaria da comida.

— Isso é perigoso.

— Agora eu percebo, ela nunca quis ter filhos para não prejudicar o corpo,
e eu estava envolvido demais na empresa. Até que do nada, quando já tínhamos
35 anos e 15 de casados, ela decidiu que queria, tentamos por cinco meses até
percebemos que tinha algo errado. Fizemos uma série de exames com o médico
que ela tinha escolhido. Quando no final, ele me disse que eu era o estéril, não
duvidei.

— Deveria ter pedido outra avaliação.

— Eu estava arrasado. Lira, Verônica me culpava por ela não poder ter
filhos, todos os dias brigávamos por causa disso. Eu queria tanto um bebê, cuidar
dele de pequeno, ver crescer, os primeiros passos e dar risada quando falasse
errado enquanto aprendia a dizer as palavras. Depois de dois anos, a ideia se
fincou no meu coração como uma árvore secular com raízes enormes. Eu tinha
aceitado que nunca teria um herdeiro, eu era estéril e nada poderia mudar isso.

— Vocês transavam sem camisinha?

— Sim, e mesmo depois do resultado ela não engravidava e dizia que não
tomava anticoncepcional. A minha vida adulta foi baseada em confiar na minha
esposa, nunca tive motivos para duvidar dela — encosto a testa em sua clavícula
— me perdoe por ser insensível e não ter desconfiado antes das intenções dela.
Eu já estava tão certo de que não poderia ter filhos, que quando você falou, me
pareceu outra mentira de alguém querendo me manipular.

— O que te faz acreditar em mim?

— Agora eu sei quem é a cobra da Verônica, passei cinco anos enfrentando


problemas sérios na empresa com a falta de verba, estava sempre no vermelho.
Aos 40 anos tive de declarar falência e vender tudo para o Fábio, quando a
Verônica me viu falido, ela sorriu e me contou a verdade. O Fábio estava
desviando fundos para eles poderem assumir o controle da empresa, ela não me
amava mais, e queria o divórcio. Eu fiquei no chão, pois amava aquela
desgraçada com cada célula do meu corpo.

— Ela te traia com seu melhor amigo e sócio?


— Sim. E ainda conseguiu ganhar no nosso divórcio metade dos meus bens
e uma pensão de 20 mil por mês. Eu não consegui provar a traição, foi uma
facada atrás da outra, e me sentia um lixo sem saber o que fazer para sair da
merda. Eu confesso que pensei em tirar minha vida — Lira me aperta em seus
braços — eu não tinha nada. Foi quando bebendo em um bar, eu vi o anúncio de
que Louis Vittileno estava procurando um CEO para as empresas no Brasil e o
quanto isso poderia agravar as ações da empresa.

— Foi logo após o nascimento da Cecília, ele queria morar na Itália com a
família.

— Sim, eu lavei a cara, vesti um terno e fui para a empresa. Louis que me
entrevistou, e no segundo em que me viu sabe o que ele perguntou?

— Não, mas posso imaginar — ela sorri me encarando — algo como


“quem te derrubou?”.

— Mais precisamente... — Eu sei quem você é, Daniel Albuquerque, sua


empresa fazia entregas para a VITTILENO, foi uma das únicas que não
receberam suborno. O que o traz aqui? — Eu contei a verdade sobre meu sócio,
a falência e minha ex demoníaca. Louis me acolheu e me deu o cargo sem pensar
duas vezes.

— Meu irmão pode ser babaca, mas sabe ser um cara decente quando
precisa — ela sorri alisando minhas bochechas — realmente, sua ex era uma
vadia.

— A parte difícil vem agora — suspiro.

— Tem mais? — arqueia a sobrancelha.

— Você nem imagina.

— Vou precisar de uma bebida.


Lira sai do meu colo e caminha até a cozinha, ela retorna com um vinho e
duas taças, sentando-se novamente na minha perna, me oferecendo o líquido. É
estranho como me sinto confortável em contar para ela sobre o meu passado,
quem sabe quando ela realmente me conhecer e entender as minhas dores, possa
me deixar fazer parte da vida de Lizzie.

Lira
Daniel foi tão machucado quanto eu em relacionamentos passados. A
esposa o usou o tempo que quis, e quando decidiu jogar fora, plantou nele a ideia
de ser estéril com tanta força que ele seria incapaz de acreditar em qualquer
pessoa que falasse o contrário.

Agora eu consigo compreender sua reação e vi o quanto ele bebeu naquela


noite, sua história não me parece mais uma desculpa — como eu tinha imaginado
— mas era a verdade que ele acreditava.

— Quando a Verônica soube que eu era o novo CEO da VITTILENO


Brasil, começou a insistir novamente em falar comigo. Foi quando o casamento
do Levi aconteceu e você me contou a verdade. Naquele dia, a vadia me ligou
pedindo um aumento de pensão, já que agora eu estava ganhando muito dinheiro
novamente. Eu contei ao Louis e enchemos a cara, depois você apareceu e eu
senti uma saudade da porra, precisava de você.

— Saudades? — Ergo a sobrancelha. Lembro bem dele ter vindo atrás de


mim.

— Sim, e estava com raiva por você ter me usado na noite anterior, sua
diaba — morde meu queixo — continuo de bolas azuis devido à sua brincadeira.
— Não foi brincadeira — puxo seu cabelo — foi vingança.

— Lira, eu tenho 43 anos e nunca conheci uma mulher como você — sua
mão pousa na minha bunda, trazendo meu centro para perto do seu pau duro. A
voz do Daniel fica um oitavo mais grossa, me prendendo à sua sedução.

— Continue a história — bebo um gole de vinho.

— Eu não lembrava que você tinha me contado sobre a Lizzie, mas naquele
momento, a certeza que eu tinha era a de que a Verônica estava me
enlouquecendo, você tinha se vingado, e após meses querendo falar comigo me
disse a única coisa que eu tinha certeza que nunca poderia acontecer; eu ter um
filho.

— Se eu tivesse falado quando você estava sóbrio, teria mudado algo?

— Eu não teria esquecido e poderia ter falado melhor sobre — ele é


sincero, e uma pontada de culpa me espeta. Deveria ter esperado o momento
certo.

— Não vou me sentir culpada... — Daniel cala meus lábios com um dedo.

— Nem por um segundo, você tentou entrar em contato, falou a verdade e


eu que preferi ignorar. Quando terminamos de conversar, a Verônica me ligou
novamente dizendo que iria me processar pelo aumento de pensão, alegando que
a deixei depressiva devido ao nosso casamento, e ela já tinha provado ao juiz que
estava impossibilitada de trabalhar e se sustentar, devido à depressão que causei
nela com uma traição.

— Não pode estar falando sério — bebo o resto do vinho, e Daniel faz o
mesmo, encho nossas taças, incrédula com o que a ex dele foi capaz de fazer.

— Eu juro, nunca encostei em outra mulher enquanto era casado. Fui


taxado de marido infiel e abusivo, só de imaginar o que a desgraçada faria em um
novo julgamento, eu queria matá-la. Eu só fui beber com o Louis como um louco
querendo esquecer tudo o que aconteceu. E acabei esquecendo aquele dia inteiro,
nem lembrava de ter me procurado.

— Não percebi que você tinha esquecido. — Se eu tivesse sido mais atenta
aos detalhes, talvez pudesse...

— Não é culpa sua — alisa minha bochecha me fazendo o olhar. — Eu ia


te procurar, para falarmos sobre o que você queria dizer com aquelas palavras
enigmáticas, quando você foi embora da casa e perdi a minha chance. Depois
disso, tudo virou um inferno completo.

— Tem como piorar? — bebo meu vinho. — Acho que vamos precisar de
algo mais forte.

— Que tal uísque?

— Venho já.

Saio do colo dele, é estranho como me sinto confortável perto do Daniel. A


raiva que nutri durante anos, estourando como bolhas de sabão. Perceber que um
homem como ele também sofreu e não foi um babaca comigo por vontade
própria, abre meus olhos. Foi dessa forma que as esposas dos meus irmãos se
sentiram quando perceberam que eles não eram babacas e as tinham rejeitado?
Como pode, três mulheres diferentes metidas na mesma teia do destino.
Mas diferente delas, eu tenho orgulho demais para me deixar envolver com
facilidade pelo Daniel. Não sou um monstro sem coração, eu sinto empatia por
sua situação e queria poder ajudá-lo, voltar no tempo e fazer as coisas diferentes,
mas não posso e agora para a frente, eu tenho a chance de decidir como deverá
ser a nossa relação.

Meu coração continua muito magoado por tudo o que já passei, e os dois
anos que estive isolada do mundo, somente na companhia das pessoas queridas
para mim e vendo a minha menina crescer, trouxeram uma calmaria da qual eu
não quero abrir mão. Vou continuar criando a Lizzie como tenho feito, mas talvez
agora, a minha menina tenha alguém para chamar de “pai”.

Tudo vai depender do ritmo dessa noite, não tenho certeza de que deveria
beber enquanto temos uma conversa séria como essa, mas de tudo que eu
esperava ouvir, com certeza não era uma história triste como a do Daniel e eu
preciso de muito álcool no meu sistema. Pego o uísque do Louis e retorno para a
sala servindo uma dose para cada. Me sento no seu colo novamente, pronta para a
bomba final.

— Continue — peço.

— Quando retornei ao Brasil, a Verônica ficou mais insistente sobre a


pensão, passou a me visitar na empresa e perseguir. Por diversas vezes fui
grosseiro com ela a mandando embora e chamando os seguranças. Seis meses
depois, eu estava sendo preso sob a acusação de ter incitado o suicídio da
Verônica.

— Como assim? — pergunto bebendo o líquido que desce queimando na


garganta — essa mulher é louca!
— Completamente — ele bebe e serve mais uma dose para a gente, sem
nunca me tirar de seu colo, a mão repousando na minha bunda. — Passei alguns
dias preso esperando o pagamento da fiança. Meus bens tinham sido congelados,
então precisei esperar o Louis ir ao Brasil com os advogados me libertarem. As
provas do delegado eram quase irrefutáveis.

— Quais eram?

— Conversas minhas com a Verônica em que eu brincava com a mente


dela, primeiro pedindo para voltar e sempre marcando encontros, quando ela ia,
eu a expulsava e chamava os seguranças. Em outros, nos encontrávamos em
locais públicos, mas nesses nunca dava para ver o meu rosto, somente as costas.

— Obviamente não era você — aponto, engolindo mais uma dose e


servindo outra.

— Era um dublê, o que importa, que me incriminava mais eram as


mensagens e os vídeos em que eu a expulsava. Com uma investigação particular,
descobri que meu celular tinha sido hackeado quando a Verônica me mandou um
link para abrir, com os documentos do nosso divórcio, enquanto eu não usava o
aparelho, ela mexia nele por meio de outro celular e mandava as mensagens.

— Como descobriu isso?

— O investigador era ótimo, mas o que me ajudou, foi que na sala em que
trabalho na empresa tinha câmeras que gravaram quando eu estava trabalhando, e
o celular acendia no meu bolso, mostrando que alguém o usava ou quando eu saia
de sala e o deixava em cima da mesa. Depois disso deduzimos que ela fazia o
mesmo quando eu estava dormindo. Os encontros foram todos armados.

— E como ela tentou se matar? Se desse errado, ela teria passado dessa
para o além — ele vira o copo e o acompanho, o álcool começando a fazer efeito.
— Ela ingeriu remédios para ter uma overdose e a governanta, que sabia do
plano, a encontrou e levou ao hospital. Conseguimos o depoimento da mulher
após provar que ela seria cúmplice. Diante do juiz eu provei a minha inocência e
a culpa da Verônica, mas a desgraçada conseguiu provar que era mentalmente
instável e por isso foi internada em um hospital psiquiátrico, com pena mínima de
dois anos, podendo sair caso melhore, e depois serviço comunitário.

— É uma merda que ela tenha conseguido se safar.

— Sim, ela já cumpriu um ano, e temo, por quando for liberta. Se você e
Lizzie estivessem na minha vida enquanto toda essa loucura aconteceu, ambas
poderiam ter se machucado — ele encosta a testa na minha — Verônica já provou
a cobra ardilosa que ela é, se ela soubesse na época sobre você e a Lizzie, eu nem
quero imaginar o que ela teria sido capaz de fazer.

— Eu a mato se ela tocar na minha filha — sirvo outra dose da bebida, já


sentindo os lábios dormentes.

— Eu também — ele toca a testa na minha, o hálito quente se misturando


ao meu, a tensão no ar ganhando força enquanto negamos o que queremos um do
outro.

— Me perdoa por dizer isso, mas talvez tenha sido uma salvação ela não
saber da Lizzie, só de imaginar ela ferindo vocês — ele aperta os punhos — me
perdoa.

— Eu te entendo — seguro seu rosto o fazendo me olhar — você foi muito


machucado, antes eu só te odiava por acreditar que tinha rejeitado a mim e a
Lizzie, mas agora eu sei a verdade. Não posso dizer que te perdoo pela dor que
me causou, pois ela ainda arde no meu peito, mas eu vou te dar a chance de fazer
as coisas direito. Você tem de ter certeza de que é isso que quer — encaro seus
olhos — você não pode entrar na vida da Lizzie, bagunçar tudo, e a rejeitar
novamente, ou eu juro que te mato.

— Eu nunca a rejeitaria — ele fala com convicção.

Meu coração aperta só de pensar em como poderia ter sido as nossas vidas,
e o inferno que a Lizzie teria passado ao crescer com uma louca perseguindo o
pai dela, como isso poderia respingar em nós duas. Ao invés de anos tranquilos
com a minha menina se apaixonando por animais, teríamos passado por um
pesadelo, causando traumas terríveis.

Agora eu percebo que a obra do destino que afastou o Daniel de nós,


protegeu o restante da minha gravidez, que me apavorava com a possibilidade de
a Lizzie nascer com alguma deficiência por minha culpa, e o desenvolvimento
dos primeiros anos de vida da minha menina.

— Você perdeu 9 meses de gravidez e dois anos de vida dela, não perca
mais um único dia.

— Não vou — balança a cabeça em negativo, me mexendo junto — eu te


prometo.

— Não faça eu me arrepender.

Uma lágrima escorre pela minha bochecha, a dor de anos finalmente


encontrando o alívio para escapar e não machucar mais. Permitindo que uma
ferida que sangrava dia e noite fosse fechada. Ele pode não ter reconhecido
naquele instante que era o pai, mas o Daniel também tinha seus demônios o
atormentando, e o que importa é o agora. Um agora em que a minha menina pode
finalmente ter um pai.

Eu ainda não acredito que tenha algum futuro para mim e ele, as mágoas
que carrego não cicatrizaram com facilidade, mas esse é um novo começo. Um
que abraço de peito aberto e leve, mas cautelosa. Disposta a não cometer os
mesmos erros do passado.

Daniel
Lira tem cheiro de uísque misturado a Jasmine de Grace, os olhos afetuosos
após me ouvir, deixando ir embora grande parte da raiva que ela carregou por
anos. Saber o quanto ela sofreu com a Lizzie durante a gestação, e seus medos,
parte meu coração e me faz sentir um lixo, mas se elas fizessem parte da minha
vida enquanto o inferno protagonizado por Verônica acontecia, a gravidez poderia
ter sido ainda mais difícil.

— Vou compensar o tempo perdido com a Lizzie, você deixa? — Peço


soprando em seus lábios entreabertos, quase posso sentir o gosto dela na minha
boca.

— Não vou me mudar para o Brasil para que isso aconteça — ela fala
decidida, embora a voz melosa.

— Eu venho para a Itália ficar com ela — aperto sua coxa em minha mão,
pronto para a deitar no sofá debaixo de mim — e com você — sopro em seus
lábios. Lira fecha os olhos, o rosto implorando por um beijo.
Seguro sua cintura e sua coxa, deitando-a e ficando por cima. Meu pau
moendo sua boceta coberta pelo short. Não lembro a última vez que transei, e a
frustração por não gozar naquela noite com Lira, ainda perturba a minha mente.

Eu preciso dela, a fazer minha e expurgar a vontade latente que crepita


entre nós sempre que nos encontramos.

— Diga que não é o álcool agindo — peço beijando seu pescoço macio.
Estico a língua lambendo a pele, distribuindo lambidas até a sua orelha, onde faço
seu lóbulo com um pequeno brinco de reféns dos meus dentes.

Lira aperta as mãos ao redor dos meus ombros, a pélvis batendo contra a
minha, enquanto ela engole um suspiro pesado, o desejo evaporando de seus
poros e se chocando com o meu. Ensandecido para ter o que me foi proibido.
Aliso sua coxa, notando os poros arrepiados, arranho o interior mordendo com
mais força sua carne, impulsionando meu quadril contra seu centro. Lira geme
baixinho puxando minha camisa.

Fico de joelhos removendo a peça com ambos os braços, flexiono os


músculos dando a ela uma visão privilegiada dos contornos dos meus membros
marcados por horas na academia. Lira tem ferocidade no olhar, suas mãos alcança
a barra da fina blusa que ela puxa para cima com agilidade. Os peitos carnudos
marcados pelo sutiã, quase pulando para fora da peça.

Agarro o esquerdo apertando a macies com minha mão e desço o rosto


entre seus peitos, sugando a carne exposta, removendo o sutiã e abocanhando o
mamilo durinho. Sugo como um animal faminto e sou surpreendido ao sentir um
líquido vazando pelo mamilo. O solto e a encaro sem entender. Lira ri de leve
antes de trazer a mão a minha barba.
— Lizzie ainda mama — ela confidencia com um sorriso travesso — eu
tento tirar o peito dela, mas sempre que ela pede manhosa não consigo evitar —
dá de ombros culpada.

— Não posso roubar o alimento da minha menina — beijo seu pescoço —


mesmo querendo te chupar inteira.

— Faz no esquerdo, já dei de mama a ela antes de dormir, ainda não tem
leite nele.

— Certo — agarro seu queixo a puxando para mim. — Mas antes vou
matar outra fome.

Prendo os lábios macios que tanto me enlouqueceram, com os dentes


desfrutando de sua carne. Sugo o inferior me deleitando. Lira retribui enlaçando
nossas bocas e eu a invado com a língua em um deslizar perfeito, um beijo
encaixado e cheio de desejo, fogo, paixão reprimida. Deito-me sobre ela
saboreando sua boca na minha, inundando meus sentidos com o seu gosto doce.
As pernas arrodeiam minha cintura se esfregando contra meu pau.

Solto seus lábios mordendo seu queixo e descendo provando a pele do


pescoço, busto, e finalmente o seio esquerdo, que não expele leite quando o
coloco na boca, brincando com o carocinho intumescido enquanto minha Lira se
contorce embaixo do meu corpo. Aperto o outro com os dedos, aproveitando os
estímulos que ela faz contra meu pau com a boceta em chamas.

Largo meu pequeno pedaço de prazer e desço beijando sua barriga


chapada, nunca diria que ela teve um filho, com a pele branca perfeita, mais
abaixo do ventre pequenas estrias brancas marcam seu colo, beijo cada uma
delas, encontrando as evidências de que a minha pequena Lizzie esteve aqui.
Foda-se que vou fazer outro exame de fertilidade, eu tenho a certeza de que sou
pai daquela garotinha, e nada vai mudar isso.
— Ganhei na gravidez — Lira fala, a voz nem um pouco insegura, ela sabe
que apesar das estrias continua linda.

— Te deixou ainda mais gostosa — mordo sua pele — espero que outros
caras não tenham visto isso — digo, o ciúme batendo com a possibilidade de ela
ter sido de outros.

— Só quem eu deixei — me provoca.

Levanto a mão e desço estralando contra sua bunda, a safada ri, sabendo
que conseguiu mexer comigo. Odeio a ideia de pensar em outro tocando o que é
meu, beijando a boca que me pertence, cheirando a boceta que somente eu posso
colocar o nariz nela. O sentimento de posse se espalhando pelo meu corpo como
uma maldita droga.

Fico de joelhos e removo o short da Lira com calcinha de uma vez, abro
suas pernas me contemplando com a visão da sua bocetinha inchada, os olhos da
maldita brilhando em excitação, ansiosa pelo que estou prestes a fazer. Desço a
mão entre suas dobras, apertando o clitóris inchado com meus dedos, ouvindo os
gemidos da minha mulher.

— Nunca mais outro homem vai te tocar aqui — eu digo, ela morde os
lábios e me preparo para a retórica.

— Todos que eu quiser — a língua estrala no céu da boca em um aviso —


eu não sou sua, Daniel. Isso é só sexo.

— Você. É. Minha — dito como um animal, descendo contra seu corpo,


atacando sua boceta com lambidas ferozes em sua carne encharcada e
malditamente deliciosa. Esfrego a barba em suas dobras arrancando-lhe gemidos
de prazer, ela tenta se controlar, mas perde o controle quando a mordo.

— Desgraçado — rosna.
— A quem você pertence? — pergunto enfiando um dedo em seu canal.

— A mim mesma — suspira, rebolando o quadril na minha cara.

— Não, Lira, você é completamente minha — mordo seu clitóris puxando


a pele sensível entre os dentes, a observando convulsionar de prazer em cima do
sofá, na beira de um orgasmo.

Perdida nas sensações que provoco em seu corpo. Lira não consegue me
responder além de gemidos doces e contidos. Estamos fodendo na sala de estar
do irmão dela e meu chefe, com a casa cheia de crianças, somos dois loucos, se
formos pegos, nunca mais nos convidam para os aniversários.

Ignorando o bom senso fico de joelhos, retiro meu pau da calça descendo
de uma vez contra a bocetinha molhada que senti falta. Meto em seu interior de
uma vez, respirando pesado contra seu rosto. Lira fecha os olhos arranhando
minha cintura com as garras que ela chama de unha. O canal escaldante e
molhado me devora com uma necessidade tão grande quanto a que tenho de
meter nela.

Aperto o braço do sofá acima da cabeça da Lira enquanto soco, fazendo-a


se mover com os movimentos, os peitos dançando para cima e baixo, batendo no
meu peitoral, minhas bolas socando contra sua bunda arrebitada e gostosa que
ainda irei comer. Os líquidos da bocetinha jorrando entre nós, facilitando o
deslizar desesperado do meu pau no seu calor apertado.

Era disso que eu precisava durante esses anos, tudo que busquei, encontrei
novamente nos braços da mulher de boca atrevida, com coragem de me deixar
sem gozar para provar o quanto se irritou comigo. Lira é uma caixinha de
surpresas arisca e de forte coração, com coragem e convicção o suficiente para
suportar as pancadas da vida.
Mas nesse segundo em que gemo contra seu ouvindo, me abrigando no
calor de seu corpo, recebendo seus gemidos e rebolado do quadril, enquanto ela
implora por mais, eu percebo que quero ficar com ela, quero mais desses
momentos, quero a provar sem o medo de ser pego por alguém. A desfrutar a
noite inteira sem pressa de ir embora, passamos anos separados e ela nunca saiu
da minha cabeça, foi meu refúgio e lugar seguro quando os pensamentos
ameaçavam me enlouquecer.

Eu tenho ciência de que estou longe de ser perdoado, mas enquanto ela me
aceitar como seu parceiro sexual, vou usar de todos os truques que eu puder para
a fazer ceder, se entregar ao fogo que queima entre nossos corpos e ser minha.
Pois já sou completamente dela. No segundo em que a revi com a nossa menina
em seus braços, eu soube: não tem como escapar de Lira Vittileno.

— Daniel — ela abafa o grito mordendo meu ombro, trazendo minha


mente de volta a realidade enquanto goza apertando meu pau com sua bocetinha.

— Goza para mim Lira— ordeno me deliciando com o prazer em seu rosto,
quando ela me solta e pende para trás de boca aberta, prendendo a respiração,
aproveitando o orgasmo.

— Sim — responde.

Soco mais duas vezes com força antes da fisgada em minhas bolas,
liberando o jato de porra que prendi enquanto a esperava atingir o seu ápice.
Gemo rouco chamando por seu nome no seu ouvido.

— Lira — deixo escapar em um último suspiro.

Desabo as pernas cansadas, suspendo meu corpo com os braços para não a
esmagar enquanto ela recupera o folego embaixo de mim. Minha coisinha
preciosa, os fios louros desgrenhados, a boca inchada e aberta enquanto inspira e
espira, as pálpebras pesadas, as mãos segurando minha cintura. Não resisto a
vontade de roubar um beijo apaixonado de sua boca carnuda.

— Minha — digo.

— Nunca — ela responde atrevida.

— Vou falar isso todos os dias até você ceder — beijo seu pescoço
enquanto ela se encolhe — vou te fazer minha, nem que dure dez ou vinte anos.
— Eca, você já vai estar um velho pelancudo — ela me provoca.

Levanto a cabeça encarando seus olhos azuis brincalhões.

— Nunca vou ficar pelancudo — mordo seu queixo arrancando uma


gargalhada dela — estou completamente em forma.

— Já deve estar usando Viagra, confessa.

— Vou te mostrar quem usa Viagra — levanto com ela no colo. Com o pé
pego nossas blusas que caíram no chão.

— Não vamos transar de novo — fala com brilho nos olhos.

— Com certeza iremos, você vai ver quem é o velho pelancudo — bato na
sua bunda branca arrebitada — sua atrevida.

— Sexo não significa nada, Daniel — ela puxa meu cabelo beijando minha
boca, a fala cansada e triste de quem já desistiu de encontrar um amor.

Eu era assim quando nos conhecemos, após o meu divórcio não acreditava
mais em paixão ou finais felizes, mas com Lira eu quero tudo, uma família
completa, e só vou desistir quando a fizer perceber que estou falando sério. Tenho
dois anos para recuperar e não posso perder um segundo.
— Vamos continuar fazendo até significar — beijo sua bochecha — e
outras coisinhas como programas em família.

— Você está realmente decidido, não é? — ela pergunta com um brilho


cansado no rosto, de quem não aguenta mais ter esperanças e ser quebrada.

Paro no topo da escada, com o pau de fora da calça e o short da Lira na


minha mão, a bunda exposta para quem quiser ver. Mesmo assim, preciso dizer
isso a ela agora.

— Eu nunca tive tanta certeza na minha vida e te farei perceber isso, nem
que demore mil anos — encosto nossas testas.

— Veremos.

Ela fala mansa, ao menos é um começo do qual não pretendo deixar passar
a pequena oportunidade que ela me dá.

— Agora vamos logo para o quarto antes que nos vejam.

— Tem razão.

Aperto sua cintura com o braço caminhando rápido até o meu quarto,
quando entramos rimos da nossa pequena demonstração de nudez e atentado ao
pudor.

— Eu não faria ideia de como explicar a uma das crianças o que fazíamos
pelados — ela confessa rindo, as bochechas ganhando um tom vermelho.

— Eles tomam banho juntos? — pergunto caminhando para o banheiro.

— Sim.

— Falaríamos que estávamos tomando banho e esquecemos a toalha.


— Ah, querido, você não faz ideia de como crianças são curiosas, uma
desculpa dessas nunca iria colar, e no outro dia a casa toda saberia — a coloco em
cima da bancada enquanto vou ligar a banheira.

— Então tenho muito o que aprender — estralo um tapa em sua bunda a


pegando no colo novamente — mas antes vou te foder mais um pouquinho.

— Só um pouquinho — ela beija meus lábios.

Transamos na banheira e na minha cama antes de apagarmos exaustos.


Meu maior desafio com a Lira será fazê-la se abrir emocionalmente para mim,
conseguimos conversar e transar sem problemas, mas o coração, esse eu vou ter
de suar para a fazer me deixar entrar e provar que posso cuidar dela e da nossa
menina.

Não importa o quanto a estrada se torne sinuosa, eu vou mostrar a ela que
sou a escolha certa.
Lira
Acordei com a cabeça a mil devido ao uísque misturado com vinho,
saudades da época em que eu bebia e não sentia nada no dia seguinte. Daniel
dorme tranquilo ao meu lado como se o mundo dele não estivesse sofrendo por
uma dor de cabeça daquelas. Saio da cama, cato minhas roupas, as vestindo,
confiro no relógio de pulso e ainda são 7:50, eu tenho 10 minutos para tomar
banho e fazer o café da manhã de Lizzie.

Cheiro meus braços percebendo que estou com uma ótima fragrância de
macho gostoso. Quem dera pudesse passar o dia assim, mas como sou uma
excelente mãe, eu saio do quarto com cuidado para não chamar a atenção de
ninguém, não sei bem como prosseguir com o Daniel, as declarações dele na
noite passada, de que pertenço a ele, mexem comigo.

Não quero me iludir ou me machucar novamente. Prefiro pensar que foi


tudo efeito do álcool e que em breve ele vai acordar não lembrando de nada, de
novo. Hoje é domingo e aniversário de Alessa, vai ser um dia cheio de gritaria e
vou usar dele para conseguir ficar longe do galanteador que mexe com meu
coração.
A última vez que tentei sair com um homem, o papo dele me cansou tanto
que desisti e fingi que a Beatrice tinha me ligado, dizendo que a Lizzie estava
chorando precisando de mim. Mas com o Daniel foi tão fácil me entregar, não
existia hesitação ou motivos para ficar longe, eu só queria continuar nos braços
dele

E é nisso que mora o perigo, sempre que me apaixono, o cara se prova um


completo babaca insensível. Coisa que Daniel já provou que pode ser, por mais
que eu entenda todos os seus motivos, não estou disposta a machucar meu
coração uma segunda vez, porque depois, colar os cacos, acaba comigo de uma
forma que me deixa desnorteada. Não posso ser uma mãe chorosa por um
coração partido, já basta eu ter bebido como se não houvesse amanhã.

Vou precisar distrair muito Lizzie até o álcool sair do meu organismo e não
contaminar mais o leite. Desde que comecei a amamentar, só bebi uma vez,
quando a Lizzie estava na casa do Louis dormindo em uma noite do pijama com
as meninas, e no dia seguinte foi choro por ela não poder mamar. Espero que
dessa vez minha pequena se distraia o suficiente com a festa e esqueça do peito.

Entro no meu quarto e tomo um banho rápido, escovando os dentes


enquanto me ensaboou. Termino em tempo recorde, Lizzie dorme com as primas
no quarto delas, sempre que as crianças se reúnem elas ficam no mesmo quarto,
com exceção do Lorran, que gosta de ficar no quarto dele, jogando vídeo game
até mais tarde. Mas por vezes sei que ele pula para dormir com as meninas, do
tanto que a Lorrany insiste em ter o irmão por perto.

Meu menino cresceu tanto em dois anos, nem consigo acreditar que ele já
tem cinco e se tornou um pequeno terrorista de doces. Olivia sofre tentando
controlar para Lorran não ter diabete, e eu e a Bianca sofremos em dobro quando
ele se junta com as primas, pois sempre dá um jeito de fazer brincadeiras que as
meninas devem conseguir docinhos para o safado. Temo por quando esse menino
ficar adulto, vai ser o pior Vittileno.

Desço pelas escadas e encontro Louis com uma mão na cintura olhando a
garrafa de uísque em cima da mesa e uma de vinho jogada no chão, por sorte não
derramou o resto do líquido. O par de copos entregando que foi obra de duas
pessoas, e as almofadas bagunçadas. Por sorte lembramos de pegar todas as peças
de roupa. Meu irmão se vira ao escutar meus passos e faz uma pergunta
silenciosa com o olhar.

— A conversa foi longa e difícil — digo suspirando, ele não precisa saber
que transamos.

— Vocês se mataram no meu sofá? — aponta o estofado.

— Basicamente eu posso ter empurrado o Daniel várias vezes — mordo o


lábio, tentando ao máximo não levantar suspeitas de que estou mentindo — você
realmente sabia sobre a Verônica e o que aquela mulher fez com ele?

— Sim, aquela mulher é um cão — alisa os cabelos antes de ajeitar as


almofadas — se eu não soubesse pelo que o Daniel passou nos últimos anos, eu
teria quebrado a cara dele quando soube que era o pai de Lizzie.

— Ele ainda vai fazer um exame — digo, pulando de um pé para o outro,


apreensiva.

— Ele tem de fazer vários, na verdade — Louis coloca a última almofada


no canto, e pega os copos me entregando — não dá para saber sobre o que mais a
Verônica mentiu quanto a saúde do Daniel, sabia que ele fazia exame de próstata
regularmente por que o pai dele morreu de câncer de próstata?

— Eu... não tinha ideia — pego as garrafas me sentindo mal pela perda do
Daniel.
— Pois é, faz uns cinco anos que isso aconteceu e todos os anos ele fazia
exame com o médico que a Verônica indicava. Ele pode ter algo de maligno no
corpo e não saber — franze a testa preocupado. — Devíamos ter suspeitado antes
que aquela mulher manipulava os exames dele.

— Mas ele não tem sintomas, tem?

De repente a ideia de o Daniel ter câncer de próstata aperta meu peito,


dificultando respirar. Ele não pode morrer agora, não após voltar para as nossas
vidas, a Lizzie precisa de um pai e eu de alguém que divida essa jornada comigo.
Não é justo ele ser tirado de nós agora que finalmente chegou.

— Por enquanto não, Daniel toma cuidado com isso, o tio dele também faz
exames e começou a apresentar sinais de que poderia desenvolver um câncer se
não tomasse certos cuidados. — Louis pressiona os olhos com força — eu sei que
o Daniel machucou você e Lizzie — se aproxima, com os copos na mão e o
uísque na outra, ele segura meus antebraços — mas ele é uma boa pessoa, por
favor, não o afaste sem antes dar uma chance a ele.

— Nunca pensei que ouviria você defendendo o Daniel — falo


embasbacada.

— Eu o conheço e ficaria feliz que você conseguisse amar e ser amada por
um homem como o Daniel — beija a minha testa — eu só quero a felicidade de
vocês. Faça as coisas no seu tempo, mas não feche o coração, ok?

— Não acredito que vivi para ver esse dia — Ouço a voz grave do Levi,
olho pela lateral do ombro do Louis encontrando meu irmão — Louis Vittileno
dando conselhos de amor para a Lira.

— Não provoca que dei a você também — Louis fala.


— Sim, por isso eu disse A — eleva a voz — Lira. Não a mim — Levi
passa um braço ao redor do meu ombro me puxando para ele — acho que agora
chegou a nossa vez de te aconselhar — beija minha cabeça — nossa pequena Lira
finalmente encontrou o amor?

— Parem já com isso, vocês dois — bufo — dessa forma parece que estão
jogando o Daniel para cima de mim.

— O que tem de errado se estivermos fazendo isso? — Levi pergunta, e


nesse segundo eu tenho a grande sensação de que eles me escondem algo.

— Contem agora o que vocês estão escondendo.

— Nada — falam com olhares culpados.

— Eu vou ter de forçar? — Ameaço, lembrando a ambos que posso ser


bastante persuasiva quando quero.

— Tá — Levi cede primeiro — a gente meio que já sabia que o Daniel


tinha interesse em você, só não fazíamos ideia de que vocês tinham dormido
juntos e ele era o pai da Lizzie.

— Expliquem melhor — peço, com um estranho calor nascendo no meu


peito.

— Ele sempre perguntava por você nas reuniões em família que você não
participava no Brasil.

— Lizzie morre de medo de avião — reclamo, odeio quando eles falam dos
eventos que perdi no Brasil.

— A gente sabe e não culpa nenhuma das duas — Louis diz — só que o
Daniel sempre perguntava o motivo de você não estar presente.
— Isso quando não ficava olhando ao redor como se você pudesse aparecer
como magia — Levi brinca.

— Ele fala algo a mais?

— Não muito, mas dava para perceber que ele queria, agora entendemos o
motivo. Era capaz dele abrir a boca e perder os dentes. — Levi reflete

— Vocês são muito agressivos — reviro os olhos — agora toda a verdade


foi exposta e só falta o nosso pai chegar e ficar sabendo, que ele não seja um
troglodita como os filhos.

— A quem você acha que puxamos? — Louis arqueia a sobrancelha loura,


e faço careta para ele.

— Ela fala isso como se fosse uma santa — Levi provoca — vamos logo
fazer o que comer dos nossos filhos antes que os monstrinhos acordem.

— Onde o Lorran dormiu? — pergunto.

— Cecília não gostou dele no quarto jogando e o puxou pelos cabelos —


Louis gargalha — ele foi levado a força para o dormitório das meninas.

— O Matriarcado prevalece na família Vittileno — comemoro.

— Precisamos ter outro menino — Levi fala — pobre do Lorran, sofre


sendo o único homem.

— Bianca não me deixa fazer outro filho nela tão cedo — Louis suspira —
ela quer aproveitar mais as meninas, e você?

— Olivia também não quer outro por hora, Lorrany ainda mama e ela disse
que só depois que a desmamar e o Lorran crescer mais e parar de ser um
terrorista dos doces.
— Isso não vai acontecer nunca — digo.

— É, eu sei — ele suspira.

— Sobra para Lira — Louis me provoca — sua missão é trazer outro


homem Vittileno.

— Vá se foder — digo fazendo careta — Lizzie ainda mama e agora minha


vida está uma bagunça com o retorno do Daniel.

— Quando vocês se resolverem — Levi fala quando entramos na cozinha


— e tudo estiver calmo, outro filho vai ser uma benção.

— Vão vocês engravidar suas mulheres — deixamos as taças na pia e jogo


a garrafa de vinho no lixo.

— Mamãaaaaaaaaaaaaaaaae — Lizzie entra na cozinha com a cara de sono


fofinha — comidinha — pede fazendo bico.

— Estou fazendo meu amor — digo a ela.

A pego no colo sentando-a na sua cadeira. Aliso os cabelos louros e beijo


sua testa. Quando me viro, vejo o Lorran entrando com a pelúcia de cachorro
debaixo do braço e os cabelos completamente bagunçados, o coitado parece que
foi para a guerra durante a noite. Não o culpo por escapar das meninas.

— Pai! — ele fala aborrecido — quero uma tranca no meu quarto! Cansei
da Cecília me selquestando! — se senta sozinho na cadeira e Levi coloca um
prato com frutas e cereal para ele comer.

— Nada de tranca nos quartos — Levi fala — seu zio Louis prometeu que
vai falar com a Cecília para ela não te machucar mais — Louis gira nos
calcanhares encarando o Levi com raiva, ele sabe que se contestar a Cecília a
filha vai ficar com raiva dele.
— Promete Zio? — Lorran pede com uma manhã na voz que até eu quero
proteger o pobre do menino.

— Prometo — Louis cede fácil — se você prometer parar com as


brincadeiras de rei dos doces.

— Quê?! — exclama ofendido e dou risada.

Enquanto preparo o café da Lizzie, morango, amora, banana e mel, com


iogurte natural. Presto atenção na discussão de argumentos acaloradas entre o
Louis e o Lorran, nenhum dos dois dispostos a ceder sem conseguirem um
benefício pela troca.

Sento dando o café a Lizzie que mastiga entretida na briga do tio e do


primo, ela fica uma fofura quando presta atenção em algo, e eu tenho vontade de
encher suas bochechas com trilhões de beijos até não aguentar mais a fofura que
é a minha filha.

A porta abre e Daniel passa, vestido uma camisa polo justa, demarcando as
linhas dos músculos, um calção social e tênis. O homem é um pacote de
resistência para qualquer mulher.

— Bom dia — a voz rouca envia calafrios ao meu estômago que se


contorce em ansiedade.

Depois de ontem e do jeito que ele quis me marcar como sua, seria mentira
eu falar que não fiquei mexida e queria me entregar sem medo. Mas os traumas
enraizados no meu coração não me permitem fazer isso, prefiro, ao menos dessa
vez, fazer as coisas com calma. Primeiro o deixar se aproximar da Lizzie e se a
minha menina mostrar que está disposta a tê-lo como pai, posso considerar um
envolvimento com Daniel.
— Fala em italiano para as crianças entenderem — Louis avisa — só o
Lorran que já fala os dois idiomas.

— Eu sou esperto — Lorran se gaba sorrindo, os dentes da frente acabaram


de cair e os permanentes estão começando a crescer. Nosso garotinho está
envelhecendo e sempre fico chorosa quando lembro tudo o que ele e o pai
passaram.

Mais um motivo para me fazer ter cautela com o Daniel, não quero atingir
a Lizzie como o Levi atingiu o Lorran com a morte da Blanca, meu sobrinho
ficou, anos sem saber como era ter um pai de verdade e o calor de uma mãe.
Espero que os machucados do passado nunca interfiram em sua vida, adolescente
e adulto, e que ele encontre no amor da família, a cura para seus machucados.

— Sua mãe que te ensinou direito — Levi fala — seu sabichão.

— Nada disso, pai, eu sou o mais inteligente da minha turma — eu tenho


vontade de morder o Lorran sempre que ele fala uma frase completa sem
gaguejar.

— Um crânio — ironizo.

— Anio — Lizzie me imita e rio dela.

— Não, meu amor, é c-r-â-n-i-o — falo devagar, ela assente antes de


repetir.

— Canio — as bochechas cheias do cereal.

— Foi quase — suspiro orgulhosa.

— Sì — ela ri.

— Buongiorno — Daniel fala se aproximando dela — Come stai?


Lizzie sorri para ele, encolhe as mãos no colo, sinal de quando ela fica
envergonhada, mas quer se comunicar direito com a pessoa que chama a sua
atenção. Daniel tem um brilho especial nos olhos azuis-escuros que se parecem
com o da nossa menina, um sorriso tranquilo, ele estende a mão grossa para ela
esperando pela resposta a seu comprimento. Lizzie ri novamente antes de
estender a mão e segurar a dele. Meu coração se aperta com o contato entre pai e
filha.

— Beh, e voi[6]? — ela dá um pequeno gritinho envergonhado quando ele


se agacha ficando da altura dos olhos dela e beija a palma de sua mão.

— Meglio ora — Lizzie se encolhe levantando os ombros e sorrindo


[7]

sapeca, totalmente capturada pela beleza e simpatia do pai.

— Zio! — ela fala e um pouco da alegria do Daniel escorre de suas feições.


Não era assim que ele esperava ser chamado.

— Paciência — digo a ele em português — ainda não é o momento certo


de contar a ela.

— Certo — ele fica em pé, notadamente triste por não poder dizer a
verdade a Lizzie — vou fazer o café, quer algo?

— Panquecas com mel e ameixa — peço.

— Fica pronto em instantes.

Daniel se afasta indo pegar os ingredientes. Noto que meus irmãos tinham
suas atenções focadas na interação que acabou de acontecer. Louis e Levi tem a
mesma impressão de quem diz “você pode ter isso todos os dias, não deixe a
chance passar”. Suspiro, sabendo que pode ser verdade ou somente mais uma
ilusão que partira meu coração. Continuo dando o comer da Lizzie enquanto
Daniel faz nosso café.
Encaro as costas dele, eu quero acreditar, mas não aguento mais me
magoar.

Daniel
Lizzie corre atrás das primas e outras crianças no jardim da mansão de
Louis. Gosto de a observar e saber que ela é uma parte de mim, o ruim é quando
ela me chama de “zio” ao invés de “pai”. Estou sendo paciente, não faz nem 48
horas que descobri sobre a Lizzie e não posso tirar o atraso de dois anos de uma
vez, ou a minha garotinha ficará assustada.

Lira se juntou a uma roda de mães, conversando animadamente, mas por


vezes eu fisgo seu olhar em mim. Ela pode não admitir, mas está balançada pela
minha presença e o sexo alucinante que fizemos. Ela nega que teremos outras
vezes, mas assim como foi anos atrás, eu sei que esse não será o caso de uma
única noite.

Lizzie e Lira significam esperança para mim. Uma nova chance de um


sonho antigo destruído pela maldade da mulher que amei com a minha alma. Se
me prender a medos passados e comparar a Lira com a Verônica, eu sei que nunca
poderei me abrir para novos sentimentos. Mas essa não é a resposta.
Eu quero Lira e Lizzie para mim, acordar de manhã e sentir o cheiro de
flores da Lira, fazer panquecas para a Lizzie e lhe ensinar a falar. Quero estar
segurando a pequena em meu colo no seu aniversário de 3 anos e em todos os
outros. Quero ouvi-la me chamando de “papai” com o sorriso banguelinha, quero
saber cada pequena coisa sobre ela.

Ouço um grito seguido por um “ploc”. Olho para a piscina descoberta e


vejo as crianças pulando dentro, uma atrás da outra, enquanto gritam e dão nomes
a seus mergulhos. Lorran sobe no trampolim de 30 centímetros, levanta os braços
antes de proclamar.

— VIVA O REINO DOS DOCINHOS — e pula como uma bola de


canhão.

Minha pequena corre vestindo um maio de flores, os cabelos lisos e louros


como ouro brilham no parco sol do domingo, enquanto ela sobe no trampolim.
Fico com medo de que se machuque e vou em sua direção pronto para
interromper o pulo da morte. Lizzie se prepara para pular, estica os braços, dou
mais um passo chegando perto, antes de conseguir a pegar. Lira é mais rápida,
subindo no trampolim e a segurando nos braços.

— Lizzie quantas vezes eu já disse que não pode pular do trampolim?

— Um montão — abre a boca exagerada fazendo bico.

— E você continua me desobedecendo — Lira revira os olhos, ao descer do


trampolim esbarra em mim. — Oh...

— Fiquei com medo do pulo dela — confesso, encaro a pequena que deita
a cabeça no ombro da mãe.
— Não posso me descuidar quando se trata de água, a Lizzie é um peixinho
— aperta a barriga da menina que começa a rir — culpa do Dante que fica
nadando com ela todos os dias no lago na fazenda.

— Zio Dante ana bien[8] — ela fala, querendo descer — pixiiiina mamãe.

— Ele, sim, mas você ainda não — beija a bochecha dela.

— Lizzie — a chamo — se quiser, quando ficar maior eu te ensino a pular


dos trampolins.

— Jula? — arregala os olhos azuis intensos na minha direção. Minha mão


coça querendo a pegar dos braços da Lira e poder beijar suas bochechas fofas.

— Sì, contanto que você não tente mais pular sozinha — levanto o
mindinho para fazermos um pacto.

— Polmeto — enlaça o mindinho no meu e minha garganta trava com


emoção.

Eu já tinha perdido todas as esperanças de um dia poder fazer uma


promessa de mindinho com um filho meu e agora estou aqui, com a Lizzie sem
ela nem saber quem sou. Vou fazer tudo o que eu puder para garantir que a nossa
promessa se torne verdade. Dante pode tê-la ensinado a nadar, mas a partir de
hoje, todos os aprendizados serão por minha conta.

— Não confie nas promessas dessa espertinha — Lira bate na bunda dela e
Lizzie ganha um ar travesso — ela sempre vai tentar te enrolar.

— Num é veldade mamãe — enlaça o pescoço da Lira rindo sapeca — eu


culpo polmessa [9]— fala empolgada e Lira gargalha alto.

— Meu Deus, trocaram a minha filha, esse anjinho cumpridor de


promessas não veio de mim.
Gargalho e não resisto ao puxar a mão da Lizzie, sem fazer cerimonias ela
vem para os meus braços. Seu cheiro de bebê e a pele macia, o corpinho leve, o
sorriso banguela, a íris azul intenso. Nesse pequeno segundo, enquanto a minha
menina ri para mim, eu encontro paz e felicidade. Desço o rosto cheirando suas
bochechas a escutando gargalhar pela minha barba em sua pele.

— Colciquinhaaaaaaaaa — grita.

— Zia Lira licença — ouço a voz do Lorran, viro de lado e o encontro


batendo o pé com o rosto impaciente. Não percebi que estávamos na frente do
trampolim impedindo a passagem deles.

— Claro, rapazinho — ela fala e saímos.

— Naaaaaaaaum pixina! — Lizzie pede, esticando os braços para a água.

— Vai lá.

Contra a minha vontade a coloco no chão que corre para a piscina. Ela para
na borda recebendo as boias que a Bianca colocou nos braços das crianças.
Apesar de saber que somente a piscina infantil seria aberta hoje, é sempre preciso
precaução em dobro.

— Quando você vai me deixar contar para ela?

— No dia que eu tiver certeza de que você vai ficar — Lira responde com
tristeza, ela não acredita nas minhas palavras.

— Vou te fazer perceber — puxo seu cotovelo — e recuperar todo o tempo


perdido.

— Certo.
— Me conta como ela era quando bebê? — puxo a Lira para se sentar na
poltrona na varanda, longe da agitação, mas onde podemos ver a Lizzie na
piscina, brincando com as primas.

— A coisinha mais fofa — seus olhos ganham um brilho nostálgico —


simpática e meiga, ia para qualquer pessoa que desse o braço a ela. Eu morria de
medo dela ser sequestrada por estranhos — rimos da sua cara assustada —
mesmo que nunca a deixasse com alguém que não fosse da família.

— E seu trabalho?

— Estou de férias prolongadas — se escora olhando para o céu — amo ser


diretora, mas quero curtir mais a infância da Lizzie. Eu teria de voltar a morar nos
Estados Unidos ou em Vancouver durante uma produção, e ficar longe dela, não
quero isso.

— Não consegue nenhuma produção pela Itália?

— Na verdade, eu tenho uma pilha de propostas de estúdios da Itália,


Espanha e França, para produções, mas ainda não me decidi. Como eu disse, a
Lizzie ainda é muito pequena e não quero perder um segundo.

— Onde vocês estão morando? — aliso seu braço, me aproximando dela.

— Com a Beatrice na fazenda e não pretendo me mudar tão cedo, é uma


delícia contar com o Dante e a Beatrice, eles não deixam eu me sentir sozinha.

— Me perdoe por fazer você se sentir só — a puxo para mim em um


abraço de lado. Por mais que fisicamente ela ceda e venha ao meu chamado, sei
que seu coração ainda não se abriu o suficiente para me deixar entrar.

— Não foi sua culpa — ela deita a cabeça no meu ombro — acho que de
ninguém. As coisas só tinham de acontecer dessa forma e ninguém pode fazer
nada para impedir — suspira pesado.
— Certo — cheiro seus cabelos — me conta mais sobre a Lizzie.

— Por onde eu começo? — ela se pergunta, antes de ganhar animação na


voz — a Lizzie é doida por animais, isso você já sabe, mas o que não imagina é
que ela tem medo de gatos.

— De gatos, como assim? — pergunto, achando interessante o fato.

— Pois é! Ela tinha um ano e sete meses quando o Dante trouxe um


gatinho que ele tinha achado na estrada. Foi mostrar o animal a Lizzie, era um de
pelo dourado com branco e olhos amarelos. A Lizzie começou a chorar e correu
para o meu colo com medo do bichano. Desde aquele dia sempre que ela vê um
chora e se esconde.

— Preciso lembrar de nunca comprar pelúcia ou um gato para ela — digo.

— Pelúcia ela não tem medo, adora brincar com a do Lorran, fato
interessante, ele briga muito com as outras meninas, mas nunca brigou com a
Lizzie e sempre faz o que ela pede sem reclamar.

— Não acredito! Lorran, o menino mais opinioso que existe, cedendo para
a Lizzie.

— Pode apostar, se ela pedisse agora para ele sair da piscina, ele o faria
sem achar ruim.

— Isso me faz até ter vontade de pedir a ele — rio e Lira me acompanha.

— Se quiser a Olivia brigando com você por usar a Lizzie para controlar o
filho dela, vá em frente.

— Prefiro evitar — encaro a Olivia que conversa animada com a irmã —


onde está Beatrice?
— Ela machucou o calcanhar na quinta e não pode vir, o Dante ficou
cuidando dela.

— Eles ainda não estão juntos?

— Não — suspira — eles são perfeitos juntos, mas o Dante é um asno que
não percebe isso.

— Verdade.

Passamos o resto do dia conversando enquanto as crianças aproveitam a


festa de aniversário da Alessa, que faz 2 anos hoje. À noite, todos se recolhem
cedo para dormir e Lira não é exceção, antes que eu pudesse a puxar para
conversarmos mais, ela já estava dormindo na cama com a Lizzie ao seu lado.

Me levanto cedo com uma ligação da minha secretária passando a agenda


do dia e confirmando a hora que retorno. Cancelo meus compromissos da
semana, e mando que me envie por e-mail tudo que poderei resolver a longa
distância. Não estou pronto para retornar ao Brasil ainda, e quando o fizer, quero
ir com a certeza de que meu lugar na vida da Lizzie foi conquistado.

No café da manhã imito o que a Lira fez ontem e deixo o prato delas
pronto. Fui o primeiro a acordar, e quando termino de fazer o meu café. Lira entra
bocejando acompanhada dos irmãos. Ouço o som das crianças no andar de cima e
imagino que Bianca e Olivia sejam as responsáveis pelo banho da tropa.

— Bom dia — nos cumprimentamos.

— Eu fiz seu café e o da Lizzie — digo a ela que me encara surpresa.

— Está vendo Lira — Levi a provoca — já dá para casar!


— Obrigada — Lira ignora o irmão e senta à mesa, os olhos brilham ao ver
a refeição que preparei. Sento-me ao seu lado — Lizzie desce daqui a pouco com
as outras crianças.

— Certo. — Viro para o Louis — vou tirar a semana, trabalhando na Itália


— o informo.

— Imaginei que faria isso.

— Vai ficar aqui por qual motivo? — Lira pergunta.

— Ainda temos muito o que conversar — a encaro com intensidade, não


dando brecha para que me contradiga.

— Bom, eu volto hoje para casa — dá de ombros — se você vai ficar aqui,
te passo o endereço da fazenda, fica a duas horas de carro.

— Não pode ficar aqui mais um pouco? — peço, segurando seu cotovelo.
Vejo seus olhos amolecerem antes de endurecer novamente.

— Não, Lizzie e eu temos uma rotina, e se você quiser, se encaixe nela.

— Certo.

Opto por não iniciar uma briga de manhã cedo. Logo Lizzie chega à
cozinha e se senta para comer. Depois do café, trabalho pela parte da manhã e de
tarde, me despeço da minha pequena com um abraço e a promessa de a ver no dia
seguinte na fazenda. Lira ficou de arrumar o quarto de hóspedes para mim.

Às 15 horas vou para a clínica realizar o novo exame de fertilidade, com


uma ajudinha do Louis o laboratório concordou em me entregar o teste amanhã.
Vou pegar antes de ir para a fazenda, só de saber que estou longe delas eu sinto
um aperto e a necessidade louca de as ter novamente ao meu lado.
Quando saio da clínica, vejo uma loja de ursos e lembro da Lira dizendo
que a Lizzie ama a girafa Fefinha. Vejo uma réplica dela na vitrine, e não me
contenho antes de comprá-la. É enorme, com um metro e meio de altura e espero
que a minha menina ame o presente. Não posso aparecer de mãos vazias, e com
certeza a Lizzie vai gostar.

No dia seguinte retorno a clínica com uma calma que nunca imaginei
sentir. Por mais que a possibilidade de eu ser estéril continue existindo, eu sinto
que isso não é verdade, que a Lizzie é minha e vou recuperar a minha família,
custe o que custar.

— Senhor Albuquerque — o médico me cumprimenta — pronto?

— Sim.

Ele abre o envelope, lê, e o coloca em cima da mesa, a expressão


indecifrável.

— O senhor nunca foi estéril.

Só fui um idiota por acreditar no médico de Verônica. Mas agora coloquei


um prego na história do passado e estou pronto para recuperar todo o tempo
perdido e escrever um novo livro com a minha família.
Lira
Eu não acredito no que estou vendo!

Encaro o carro cinza de onde Daniel desce, achava que ele viria direto para
a Lizzie, que pula eufórica no meu colo querendo mais da atenção do seu novo
“zio”. Minha menina sempre foi fácil de se apegar a adultos, mas nunca como
Daniel, de ela ficar perguntando por ele depois, e querendo sua presença ao seu
lado. Talvez ela sinta que o Daniel é diferente, que tem algo a mais nele.

E nesse segundo o “a mais” é um monte de bosta quando o vejo abrindo a


porta detrás do carro e retirando de lá uma versão da Fefinha extremamente
grande.

— Meu pai amado — sussurro incrédula, prevendo a merda que será a


minha vida para sair com essa coisa gigante.

— FEFINHAAAAAAAAAA! — Lizzie grita animada, com os braços


levantados, os olhos brilhando de felicidade.

Eu estou perdida!
Ao meu lado, Dante começa a rir, sabendo o inferno que vou passar com
uma pelúcia gigante. Já é difícil controlar a Lizzie com os pequenos, que ela vive
sujando levando para todos os lugares. Mas uma coisa desse tamanho, maior que
a minha filha, vai ser o meu fim.

— É, o cara sabe como conquistar Lizzie — Dante comenta escondendo


uma risada.

O encaro com fúria nos olhos e o safado ri mais, piso no seu pé


extravasando minha irritação. Adoro que ele se encolha, mas o odeio por
continuar rindo.

— Fefinhaaaaaaaa — Lizzie estende os braços, olho para a frente e vejo o


Daniel parado me encarando.

— Eu vou matar você por comprar uma girafa enorme — falo engasgada,
em português, para que Lizzie não entenda.

— Ela amou — rouba minha filha de mim, para ele é fácil segurar as duas
nos braços, olha o tanto de músculos que esse homem tem!

Lizzie gargalha enquanto abraça a Fefinha pelo pescoço e imagens de como


será o meu futuro inunda a minha mente como um tsunami. Respiro fundo,
deixando de lado a raiva e aproveitando o momento de pai e filha, Daniel ontem
fez o exame de fertilidade e pela sua expressão, confirmou o que eu já tinha
certeza, ele pode ter filhos e a Lizzie é dele. Nunca duvidei, e pelo visto agora,
ele também não.

É um pouco incomodo saber que foi preciso dois anos para isso acontecer,
mas o importante é focar no presente, se eu me prender ao passado vou magoar a
pessoa que mais importa, a presença de um pai na vida dela. Meu pequeno
mundo, chamado Lizzie. E é só isso que o Daniel representará nas nossas vidas, o
pai da Lizzie.
— Bom te rever — Dante dá uma tapinha no ombro do Daniel que retribui
sorrindo.

— Digo o mesmo — encara a Lizzie — e pensar que esse tempo todo você
estava com esse tesouro e não me disse nada.

— A Lira não contou para a gente — Dante coça a cabeça — ao menos não
para mim.

Escapo do seu olhar entrando, eles me seguem como dois pastores alemães,
enquanto a Lizzie embarcou em uma conversa com a Fefinha, bastante animada e
cheia de palavras incompreensíveis. Beatrice sorri ao nos ver, sentada no sofá
com o pé apoiado na mesinha. Tive pena dela ter caído na lama e torcido o
calcanhar, mas ao menos o Dante cuidou dela enquanto estive fora.

— Chegou o homem que quer roubar as minhas garotas — ela fala com um
sorriso sapeca no rosto, já imagino onde essa conversa vai dar.

— Não roubar — Daniel responde — mas fazer parte da vida delas.

— Vou aceitar esse jogo de palavras — Beatrice sorri abrindo os braços —


venha aqui.

Daniel se senta ao lado dela, colocando a Lizzie no sofá e a Fefinha em pé


no chão, Lizzie agarra a girafa pelo pescoço e deita a cabeça no colo do pai.
Institivamente Daniel leva a mão a cabeça da filha fazendo carinho em sua
bochecha, quase como se ele soubesse que ela adora quando alisamos as
bochechas rosadas e fofinhas. Se continuarem desse jeito por mais 10 minutos, a
Lizzie pega no sono.

— Como você está? — Daniel pergunta encarando o pé dela — o tombo


foi feio.
— Fui inventar de correr atrás das vacas com Dante, escorreguei na lama e
cai por cima do pé — eu ainda tenho minhas dúvidas sobre essa história, já que as
vacas são tangidas pelo Dante em cima do cavalo e não correndo a pé.

— Vaca não é tangida com o vaqueiro em um cavalo? — Daniel pergunta o


que eu me contive para saber.

Beatrice é extremamente tímida e só consegue falar normalmente com


quem ela conhece e tem proximidade. Mesmo assim, é difícil a fazer se abrir e
contar sobre seu dia. Se ela me dá uma história, eu acredito e fico esperando pelo
momento em que falará o que realmente aconteceu. Forçar, nunca ajuda nesse
caso, talvez seja por esse motivo que o Dante e ela não tem nada.

Um é um bruto para romance, não entenderia que uma mulher gosta dele
nem se ela falasse, ia achar que é baboseira e paixonite que logo passa. Mas o que
Dante não percebe, é que ele é um homem extremamente atraente e atencioso, faz
qualquer mulher se apaixonar fácil. Principalmente a Beatrice que convive com
ele todos os dias e nunca negou os olhos brilhantes e apaixonados.

Eu não acredito mais no amor para mim mesma, mas esses dois, merecem
uma chance de serem felizes, ficarem juntos e terem seus traumas superados com
a força do que queima em seus corações. Um dos motivos para eu não ter ido
embora, é porque não quero deixar a minha amiga sozinha, e acredito que vou
conseguir fazer esses dois perceberem que se amam demais e podem ficar juntos.

— Não era o rebanho — Beatrice levanta as mãos as balançando em


negativa — todos os dias quando o Dante coloca as vacas no pasto eu vou junto
observar. Mas na quinta, uma saiu do curso, ele não tinha percebido e eu fui
sozinha atrás dela, nisso escorreguei e cai.

— Entendi — Daniel facilmente cai na história que não me convenceu.


Dante nunca deixa nenhuma escapar.
— Zio — Lizzie chama bocejando, o sono a pegando rapidamente —
bilgalda pela fefinha.

Daniel leva sua atenção a filha com um sorriso brilhante no rosto. Alisa a
bochecha dela e se inclina beijando sua testa. Lizzie levanta o rosto e beija a
bochecha dele de volta, antes de se aconchegar no Daniel e dormir. Está perto da
hora do almoço dela e daqui a pouco a acordo para comer. Por hora vou deixar a
interação entre eles.

— De nada, minha princesa — ele sussurra.

— Como descobriu que ela dorme com carinho na bochecha? — Dante


pergunta trazendo uma xícara de café consigo.

— Percebi quando a Lira a pegava no colo e alisava sua bochecha, ela


dormia quase na mesma hora.

Fico tocada por saber que ele me observava para aprender as coisas sobre a
Lizzie. Eu não tinha percebido que seus olhos azuis me seguiam por essa razão.
As bochechas esquentam ao saber que fui alvo dele todo esse tempo, mesmo
quando eu não percebia que estava sendo observada.

— Desde novinha o fraco da Lizzie são as bochechas — comento.

— Daniel — Dante chama — você faz ideia do que acabou de fazer ao dar
essa fefinha gigante para a Lizzie?

— Que ela gostou do presente. — Responde inocentemente.

Levo a mão a testa batendo nela e respirando fundo. Tenho vontade de o


esganar por não ter me perguntado antes sobre o absurdo de trazer uma girafa
enorme para a Lizzie.
— Ela não vai mais soltar a pelúcia e vai andar com ela para todos os lados
— respondo entre dentes — eu vou sofrer agora, sempre que saímos para levar
essa coisa enorme! — me estico sobre a Lizzie beliscando o ombro do Daniel que
se encolhe fazendo careta — obrigada por tirar a minha paz.

— Não tem problema, eu levo a girafa — responde.

— Como se você fosse estar o tempo todo aqui — aperto os olhos.

— Eu vou estar o tempo todo com vocês.

Ele tem certeza ao pronunciar cada uma das palavras e eu paraliso. Não
tem como isso ser possível, Daniel é o CEO da VITTILENO no Brasil, e nunca
poderia desistir da carreira pela Lizzie. E, porque esse desgraçado, em vez de
dizer o nome da filha, falou “vocês” como se eu quisesse a presença dele na
minha vida, eu nunca mais vou me iludir por amor.

— Você trabalha e mora no Brasil — respondo.

Percebo por canto de olho o Dante dando a volta no sofá e pegando a


Beatrice no colo. Eles pensam que saem de fininho nos dando privacidade, mas
eu noto cada um de seus passos. Os safados estão fugindo em vez de ficarem para
me dar apoio moral e ajudar a não cair na tentação que é o Daniel, demonstrando
ser um pai atencioso com a filha.

Essas coisas mexem comigo, mesmo que não devessem o fazer.

— Essa semana vou ficar na Itália para podermos decidir como serão as
coisas — ele não está me perguntando, ao invés disso assume o que deveríamos
fazer. Aperto os punhos com raiva.

— Não vou me mudar para o Brasil com você, e a Lizzie não irá para lugar
nenhum sem mim — falo decidida.
— Tudo bem — ele estica a mão tocando meu rosto — eu nunca disse que
faria vocês duas virem comigo, mas que decidiríamos como seria — alisa minha
bochecha — eu já perdi tudo uma vez, não deixarei acontecer novamente por um
emprego. Sou capacitado e posso arrumar algo na Itália, caso o Louis não queira
que eu assuma outra função na VITTILENO. Mas eu nunca vou abrir mão de
vocês duas.

— Não diga palavras que vão me dar esperança — peço com um nó na


garganta. Ninguém nunca arriscou perder tudo por mim, talvez ele esteja falando
só da boca para fora, não seja verdade, só uma forma de me fazer ceder.

— Eu nunca te direi mentiras ou meias verdades — me puxa para si, apoio


um braço no sofá tomando cuidado para não machucar a Lizzie que dorme abaixo
de mim — somente a verdade — se estica tocando o nariz no meu — vocês duas
são minhas, e vou te provar isso todos os dias das nossas vidas.

Seus lábios tocam os meus em uma promessa velada. Encosto a testa na


dele querendo bater nele por insistir em me dar esperanças, quando eu sei que
daqui a um tempo, nada disso vai importar, que ele vai desaparecer como todos
os outros e eu ficarei sozinha curando as minhas feridas.

— A Lizzie é sua filha — digo baixinho — mas eu não sou sua mulher, não
confunda as coisas — ergo a barreira que me protegerá de outra decepção. Apesar
de o perdoar e entender o que aconteceu dois anos atrás, as mágoas daquele dia
continuam fincadas em minha carne.

— Você é, sim, mesmo que ainda não admita — sorri convencido.

— Onde você vai ficar? — Me sento sobre os calcanhares dando a


distância de uma Lizzie entre nós.

— Aqui — dá de ombros.
— E quem te convidou para ficar aqui? — arqueio a sobrancelha.

— Não preciso de convite — seu olhar tem chamas poderosas nas írises
azuis forte — onde a minha filha e mulher estiverem, eu estarei.

— Tenho vontade de te esganar por ser tão convencido.

— Só se for, na cama — sussurra a última parte.

— Agora mesmo, com uma corda — ergo os punhos — seu convencido de


araque.

— Não te vi negando que ficarei aqui — ele pega a Lizzie no colo com
cuidado. Ela deita a cabeça no ombro do pai como se fosse a coisa mais natural
— onde é o seu quarto? Vou levar minhas coisas para lá.

— Mas não vai mesmo — levanto em um pulo tentando não aumentar a


voz para acordar a Lizzie.

— No corredor ou no primeiro andar? — pergunta me ignorando enquanto


anda abrindo as portas.

O sigo pelo corredor, tentando não fazer barulho quando soco suas costas.
Os músculos batem contra meus dedos e o desgraçado não sente nada do meu
ataque. Chegamos à cozinha onde Dante e Beatrice sussurram, eles se calam ao
nos ver e minha amiga tem culpa no rosto. Aposto que os safados falavam da
gente.

— Onde é o quarto da Lira? — Daniel pergunta a ela.

— Segunda porta à esquerda no primeiro andar — Beatrice responde.

— Vou ficar aqui por uma semana a princípio — Daniel a informa em vez
de pedir. Esse homem vai me enlouquecer!
— Não vai não — Dante responde — você vem comigo para a minha casa,
as damas dormem sozinhas.

— Prefiro ficar aqui — o safado responde.

— Essa é a casa da Beatrice — Dante se levanta — você tem primeiro de


saber se ela se sente confortável, meu amigo.

Raios saem do Dante se chocando contra os do Daniel. Eles travam uma


batalha de macho no meio da cozinha e temendo que eu seja acertada vou para o
lado da Beatrice e por olhar imploro que ela mande o Daniel ficar com o Dante
ou a nossa amizade será jogada no ralo pela sua traição.

— Daniel — ela começa — espero que não se magoe com o que direi. Mas
eu não gosto de pessoas invadindo meu espaço pessoal, vou precisar de um
tempo para me acostumar com a ideia de você aqui, por favor, fique com o Dante
enquanto isso. A casa dele fica a 10 metros daqui e você poderá ver a Lizzie
sempre que quiser.

— Desculpe, não queria te incomodar — ele pede — está bem, mas já


aviso que vou passar muito tempo aqui.

— Eu espero que faça isso — Beatrice sorri — está convidado para o


almoço, vai tomar um banho após a viagem?

— Sim — ele me encara — onde é o quarto da Lizzie? Vou colocá-la na


cama.

— A Lizzie dorme comigo — digo a ele — nunca se acostumou a ficar


sozinha no quarto.

— Não tem medo de a esmagar enquanto dorme?


— Não, coloco travesseiros ao seu redor, nem ela e nem eu mexemos
dormindo — digo.

Daniel me segue de perto. Preciso invocar todos os santos para me


ajudarem a manter meu coração blindado na tarefa difícil que será resistir ao
Daniel morando a 10 metros de distância. Mas sempre que eu lembrar da dor que
sofri no passado, vou encontrar forças para me manter firme. Lizzie não pode ser
afetada por um desentendimento entre mim e o pai dela.

Não vou impedir a minha garotinha de ter chance de crescer ao lado de um


pai que a ame, cuide e proteja. Lizzie merece ter o mundo girando ao seu redor,
não o ter arrancado dela.
Daniel
Como é possível que ela seja tão linda?

Lizzie agarra o peito da mãe mamando enquanto seus olhos azuis como os
meus fixam-se em mim. Amo como ela me observa e procura pelo meu colo.
Estamos há três dias juntos e eu não poderia estar mais feliz do que na presença
da minha filha e da sua mãe. Que reluta em me aceitar ao seu lado. Meus dias na
fazenda estão contados e reduzidos para somente mais dois dias e uma noite.

Preciso voltar para o Brasil, adiei reuniões importantes com parceiros da


VITTILENO, e por mais que a minha vontade seja de ficar, preciso cumprir com
os meus deveres. Não posso abandonar o Louis ou o deixar em uma posição
difícil, ele foi a pessoa que mais me estendeu a mão quando estive no buraco, não
serei um ingrato. Vou fazer dar certo a minha convivência com a Lizzie e o
trabalho.

Lira que tem se mantido afastada, como se tivesse medo de ficar ao meu
lado. As magoas que deixei em seu coração são mais profundas do que eu
imaginava e para a fazer ceder e se entregar totalmente a mim, vou precisar de
mais do que três dias sendo amigável. Morar com o Dante não é ruim, mas
preferia estar na mesma casa que a minha família.
— Lizzie tem de aprender a não ir facilmente para estranhos — eu digo
apertando seu pezinho rosado e gordinho.

— Tento ensinar isso a ela faz dois anos, se tiver dicas aceito a todas —
Lira encosta a cabeça na poltrona, claramente cansada.

— Não dormiu?

— Nem um pouco, passei a noite em claro com a Lizzie jogando a Fefinha


na minha cara. Eu odeio esse presente — seus olhos são mortais e modo o
sorriso.

— Você pode odiar, mas a nossa Lizzie ama — aperto a barriga da minha
pequena — você ama a Fefinha minha princesa?

— Sì — larga o peito para me responder com um sorriso sapeca antes de


abocanhar novamente o peito da mãe.

É então que noto uma cicatriz pequena, branca, é quase imperceptível, mas
se a Lizzie não tivesse colocado a mão abaixo dela eu não teria notado com
facilidade. Desde a nossa transa na casa do Louis, a Lira tem se mantido distante
sexualmente, ela foge sempre que tento a abraçar e insinuar que quero passar a
noite junto.

Quando paro para pensar que nunca tivemos uma noite completa de amor,
com calma, me incomoda. Em todas às vezes que estivemos juntos eu devorei a
Lira com uma fome insaciável que nunca tem fim. Mas agora eu quero ir com
calma, saborear a sua pele, desfrutar de seus gemidos ao pé do meu ouvido, eu
quero me embebedar no sabor de sua boca, tanto quanto o da sua boceta. Para
isso, primeiro preciso quebrar sua defesa e a fazer perceber que não sou um erro.

— Isso é uma cicatriz? — pergunto apontando para seu peito.

— Sim — olha a pequena marca.


— Como conseguiu?

— Sua princesa — a felicidade me invade ao ver como ela se refere a


Lizzie como minha, com carinho em cada palavra — quando tinha cinco meses
não queria deixar cortas as unhas dela, e sempre teve a mania de puxar a minha
pele quando a amamento. Ela puxou forte, a unha grande e afiada acabou
rasgando a pele e ficou a marquinha.

— Lizzie puxava cabelo?

— Muito, uma vez agarrou um tufo da cabeça do Dante que ele teve de
cortar, já que ela não largava e nenhum de nós tinha coração para bater nessas
mãos safadinhas — aperta a mão da Lizzie fazendo voz fofa. Ela cheira o dorso
com carinho e Lizzie abre um sorriso contra o peito da mãe.

— Já sei que eu teria ficado sem barba nessa época — aliso os pelos no
meu rosto — ou ela arrancaria cada um.

— Depois do incidente, Dante passou três meses de cabelo raspado. Eu e a


Beatrice vivíamos com os nossos presos e protegidos por um gorro. Mas o Louis
não teve a sorte de ser avisado.

— Lembro que teve uma época que ele ficou de cabelo muito curto, mas
não disse o motivo — puxo na memória.

— Foi a Lizzie. Assim que ele chegou e a pegou no colo, quando fui avisar
para não beijá-la, já era tarde. Ela agarrou os dois lados da cabeça dele.

— O estrago foi grande — dou risada. — Você não vai arrancar os cabelos
do pa... — Lira leva a mão contra minha boca, me impedindo de falar.

— Ainda não — ela pede com medo nos olhos.


Lira ainda não confia que vou ficar. Não posso a culpar, o que fiz anos
atrás, mesmo que tenha uma explicação para meu comportamento, não deixa de a
machucar e causar uma lacuna que somente cinco dias não seriam capazes de
resolver. Aproveito sua proximidade e beijo sua mão, seguro seu pulso a
impedindo de se afastar, mordisco a pele áspera da palma vendo as chamas se
acenderem em sua íris.

— O que acha de passarmos a noite juntos? — pergunto sedutor levando


meus beijos para seu ombro.

— Pode ser — responde engolindo em seco — a Lizzie dorme comigo,


então depois dela dormir eu te encontro na varanda.

— Perfeito — beijo seu pescoço.

Encaro minha pequena prestando atenção nos meus movimentos, e beijo


sua cabeça cheirosa. Lizzie tem um aroma de bebê que me faz sempre estar com
o nariz contra seus cabelos. Ela ama, quando me vê, estica os braços pedindo
colo, deitando a cabeça contra a minha boca pedindo pelo carinho.

Aliso suas pernas e costas, passo um braço ao redor do ombro da Lira.


Beijo o ombro da minha pequena com tanto carinho que meus olhos enchem de
lágrima por ter as duas coisas mais preciosas do mundo em meus braços. Subo o
rosto e beijo a bochecha da Lira, ela pode não ter me aceitado ainda como seu
parceiro, mas a nossa família está formada e nada mudara isso. Nunca.

Com minhas duas princesas nos braços, eu respiro aliviado, sendo invadido
por uma paz que nunca experimentei. Encaro a Lira, com os olhos marejados na
minha direção, os lábios tremendo e as barreiras levadas ao chão. Aproximo
nossos narizes, inspiro seu cheiro de flores e toco de leve seus lábios com os
meus.
— Vocês são o que tenho de mais precioso, leve o tempo que quiser para
aceitar que eu nunca vou embora — a encaro intensamente — vamos ficar juntos.
Lira, cuidar da nossa família lado a lado.

— Não é justo — ela murmura com a voz embargada — você não pode
aparecer e mexer comigo dessa forma.

— O que não é justo é você continuar sofrendo quando estou pronto para
fechar cada uma de suas feridas — sussurro contra seus lábios — você é minha, e
eu sou completamente seu. Te esperarei nem que leve uma eternidade.

— Ah, Daniel — ela murmura, dessa vez, trazendo seus lábios aos meus.

— Quelo — uma voz fininha chama nossa atenção. Abro os olhos


desgrudando da minha mulher e encarando minha filha que fica de joelhos
esticando o rosto com um bico fofo.

Aliso a cabecinha dourada e beijo sua bochecha fofinha. Puxo Lizzie para
meu colo prendendo suas pernas com um braço e o outro segurando seu pescoço.
Começo um ataque de cócegas passando a barba em seu pescoço, arrancando
altas gargalhadas dela. Suas mãos prendem na minha camisa enquanto ela grita
gargalhando.

Meu coração é preenchido por uma felicidade interminável, queria poder


congelar esse momento na história e voltar para ele infinitas vezes. A solto
encarando seu rosto com um sorriso, ela tem um olhar sapeca antes de rir e puxar
minha barba contra sua pele, querendo mais da nossa diversão. Levanto e a
balanço no braço, o riso de uma criança, da minha filha, é a injeção mais
poderosa de força que existe.

Nunca vou desistir da nossa família, Lira e Lizzie verão que sou merecedor
delas, independente do tempo que levar para abrir o coração de ambas, a mim.
No momento sei que a Lizzie me ver somente como seu “zio”, mas vou continuar
fazendo o possível e impossível para que ela me reconheça como seu pai.

— Mais? — pergunto sorrindo.

— Sì — responde com um grito fino banhado no riso.

Seguro Lizzie com a mão debaixo de sua axila. Ela encolhe as pernas e a
jogo para cima. Seu riso que já era alto ganha um tom ainda mais elevado.
Continuo na brincadeira, o ferro que puxo na academia me permitiria continuar
assim por dias. Por um segundo, quando apoio minha menina antes de a jogar,
encaro a Lira, com uma felicidade indescritível ao observar a nossa interação.
Nesse segundo eu percebo o quanto deve tê-la machucado a Lizzie não ter um
pai.

— Eu demorei a chegar — digo a ela, ficando de joelhos na sua frente


enquanto coloco a Lizzie em cima dos meus ombros — mas agora que estou aqui,
nunca irei embora. — Seguro Lizzie com uma mão e com a livre puxo a Lira para
mim — acredita em mim?

— Sim — murmura com lagrimas banhado o branco se seus olhos.

— Então vamos levar a nossa pequena para um piquenique — sacudo a


Lizzie — o que acha princesa?

— Sì! Muito solvetinhoooooo — levanta os braços, me esforço tentando


vê-la, mas não consigo.

— Lizzie, sorvete só depois do almoço — Lira fala ficando em pé. Beijo


sua barriga que fica contra meu rosto e levanto.

— TÃAAAAAAO ALTUUUU — Lizzie fala, pela voz embolada imagino


que esteja com as mãos na bochecha — polso tocar o céu!
— Com certeza princesa — digo a ela e começamos a andar seguindo sua
mãe — só lembre de abaixar quando passamos na porta.

— Celto — suas mãos agarram meu rosto, seguro suas coxas a mantendo
firme acima de mim — pega a fefinha zio.

— Vamos fazer um piquenique no lado de fora, princesa — respondo —


não tem como levar a fefinha.

— FEFINHA! — Grita fazendo manha e sacode os pés batendo contra


mim.

— Agora você vai saber o motivo de eu não ter gostado muito do presente
— Lira diz entrando na cozinha.

Me abaixo para que Lizzie não bata no arco da porta. Sua cabeça se deita
em cima da minha e suas mãos ficam mais firmes no meu pescoço, dificultando
um pouco a minha respiração pela forma que ela aperta minha garganta.
Entramos, e Lira vai preparar o lanche, enquanto vou para a geladeira, pego pães
para um sanduíche.

— Está perto da hora do almoço, vamos fazer algo melhor do que


sanduíche — ela diz.

— Tem algo em mente?

— Sobrou tortilha de ontem. Vou esquentar e levamos junto de umas frutas.


Na volta a Lizzie toma o sorvete dela.

— A fefinha quer solvete tambiem.

— Princesa — digo — não vamos levar a fefinha, ela é grande demais para
conseguir carregar as duas e a cesta de piquenique.
— Fefinha vai tambiem. — Bate de leve as mãos nas minhas bochechas —
ela é minha amilginha quelida.

— Com certeza levaremos a fefinha, o Daniel tem força para a carregar e a


você — Lizzie fala com um olhar maligno.

— Você me paga — sussurro para ela.

— No cheque ou cartão? — faz cara de sonsa e anoto mentalmente de a


punir quando estiver desfrutando do seu corpo gostoso.

— Mais tarde você verá.

— Uh, ansiosa — rosna me provocando.

— Para o quê? — Beatrice entra na cozinha segurando nas paredes.

Ela machucou o calcanhar, mas não precisou de gesso ou bota


imobilizadora. Só uma facha e bastante descanso enquanto caminha se apoiando
nas pessoas ou nas paredes.

— Pilquininique zia bea — Lizzie responde — você vem?

— Bem que eu queria meu amor — ela segura a mão da Lizzie e a beija
antes de se sentar — mas a zia não pode sair com o pé machucado, lembra?

— Veldade — Lizzie responde fofinha.

— Almoço pronto — Lira fala quando o micro-ondas apita. Guarda a


tortilha nas vasilhas junto das frutas, água e suco no isopor, antes de colocar tudo
em uma bolsa.

— Vão comer na mesa debaixo da árvore? — Beatrice pergunta. Encaro a


Lira sem saber ao que ela se refere.

— Sim, o clima está uma delícia para irmos para lá.


— Oba, paltinhos — Lizzie bate palmas e faz som de “quack” várias vezes.
Amo como ela gosta de imitar o som dos animais.

— Sim, meu amor, vamos ver os patinhos, quer colocar o biquíni para
tomar banho?

— Sì — ela bate na minha cabeça — zio delcer — pede.

Seguro sua barriga a retirando dos meus ombros.

— Vou colocar uma roupa de banho — aviso. Não quero perder a chance
de entrar no lago com a Lizzie e a ensinar a nadar.

— Celto — Lizzie sai correndo.

— Te vejo já.

Me pegando de surpresa. Lira apoia as mãos no meu peito, estica o pescoço


e captura meus lábios em um beijo rápido, antes de correr atrás da nossa filha.

— Tenha calma com ela — Beatrice pede — Lira pode demorar mais do
que você espera para se abrir, mas ela vale a pena.

— Eu sei — pisco para ela — vou esperar o quanto for preciso.

— Muito bem — sorri — agora vai se trocar que em dois minutos a Lizzie
desce apressando todo mundo.

— Ok.

Deixo a casa delas e vou para a do Dante onde tenho ficado. Pelo horário,
imagino que ele esteja no vinhedo, hoje ele iria inspecionar as uvas para a
colheita que logo acontecerá. Me troco rápido e quando retorno, eu vejo as
minhas meninas me esperando do lado de fora, vestindo vestidos com laços
amarrados no pescoço dos biquinis.
Acho graça da cara branca da Lizzie de tanto protetor que a mãe passou,
um chapéu de palha na cabeça de ambas. A bolsa com nosso almoço em cima do
banco e ao lado a girafa. O lago fica meio longe e odeio a ideia e ir andando
levando a Lizzie, a bolsa e a fefinha.

— Minha princesa, vamos deixar a fefinha em casa — peço.

— Naum! — abraça o pescoço da girafa.

— Não adianta tentar a persuadir ou vai acabar em choro nosso passeio —


Lira avisa com o olhar de “deveria ter me perguntado antes, sobre um presente
enorme como esse”.

— Vamos de carro — acho uma solução perfeita.

— Tem muitas pedras pequenas e o caminho não é linear, se formos de


carro será perda de tempo. Vamos andando — ela pega a Lizzie pela mão — você
leva a fefinha e a bolsa com o almoço.

— Naum, quelo zio — Lizzie estende os braços para mim.

— Eu não levo essas coisas pesadas — Lira arqueia a sobrancelha, ela está
gostando de me fazer sofrer.

— Eu pego 80kg na academia, levar a Lizzie, a bolsa e a fefinha não é


nada. — Respondo colocando minha filha nos ombros.

— Veremos — ri debochada.

No braço esquerdo pego a fefinha que incomoda a segurar devido ao


pescoço gigante e o rosto que bate contra o meu. No direito coloco a alça da bolsa
no ombro segurando o fundo com a mão. Lizzie nos meus ombros bate palmas
feliz e as pernas contra minha pele.

— Vamos.
— Vai ser moleza — digo.

— Se você acha.

Lira segue na frente e vou atrás como um burro de carga. Quando


chegamos no caminho com pedras, eu me amaldiçoo por comprar um presente
tão grande que fica escorregando e batendo meu rosto. Minha filha ama a fefinha,
mas eu odeio essa coisa.
Lira
Sinto um prazer interno ao ver o Daniel sofrendo com a fefinha. Ele pode
aguentar o peso que for, mas nada se compara a uma pelúcia batendo na sua cara
enquanto sua filha cantarola em cima da sua cabeça. Paro no caminho, puxo o
celular do bolso e tiro uma foto deles, tenho feito muito isso ultimamente,
capturado os momentos de interação dos dois.

Lizzie pode não ter fotos com o pai quando era bebê, mas terá um monte
daqui em diante. Daniel percebe o que estou fazendo e sorri, apesar do
sofrimento, ele aparenta gostar, e dar valor a cada pequeno momento que temos
juntos. E isso faz meu coração balançar como uma gangorra, pendendo entre
continuar mantendo distância emocionalmente ou jogar para o ar todos os meus
medos e deixar que o Daniel cuide tanto de mim como da Lizzie.

É um inferno resistir à vontade que tenho dele, pois sei que no segundo que
continuar deixando-o entrar na minha vida, vou abrir espaço no meu coração. Eu
quero confiar, acreditar que é possível a felicidade que ele me promete, mas as
coisas que acontecem na fazenda quando estamos somente nós aqui, é diferente
de como seria no mundo lá fora, com o envolvimento de outras pessoas.
Daniel me oferece conforto e calmaria em um lugar envolto disso é uma
promessa do paraíso. Mas a incerteza de como seria no lado de fora me trava,
impedindo que eu decida entre baixar a guarda ou não.

Eu sei que ele é um viciado em trabalho, passa horas trabalhando no


notebook e lidando com o fuso horário de Brasil e Itália, mas isso não o impede
de quando a Lizzie pula em seu colo, largar o notebook e ficar conversando com
a nossa menina.

Como seria se fosse em seu escritório? Ele receberia uma visita surpresa
minha e de Lizzie, pararia uma reunião para dar atenção a sua menina, ou nos
mandaria esperar, ou no pior dos casos, ir embora para não o atrapalhar. Chegaria
tarde em casa todas as noites, viria para o jantar, compareceria às apresentações
da Lizzie, são tantas incertezas sobre o nosso futuro que não consigo destravar e
permitir que a minha mente tenha paz.

Estamos há cinco dias juntos, desde o final de semana na casa do Louis e


os três na fazenda. Em mais dois ele terá de voltar para o Brasil, e sei que não
estou pronta para o ver partir, para ficar aqui com a Lizzie enquanto a minha
menina, apegada ao pai, vai chamar por ele e exigir a sua presença. Enquanto
meu coração machucado ganha mais uma cicatriz por saber que ele não pode vir
para cá sempre que sair do trabalho.

Existe um oceano entre nossas casas, trabalho, e futuramente, entre a nossa


família. Lizzie morre de medo de andar de avião, e a mera ideia de dopar minha
menina para um voo, aperta meu coração do tamanho de uma azeitona. O futuro
me assusta ao ponto de me paralisar no presente, sem saber como prosseguir,
eternamente em um limbo em que temo me entregar e mais ainda que ele parta.

— Lira — sua voz me chama, tomo um susto ao perceber que ele está uma
pedra de distância — estou bem aqui para responder a todas as suas dúvidas, não
se torture pensando em um futuro que não aconteceu ainda — beija minha testa.
Mesmo com a fefinha e a bolsa em seus braços incomodando a
proximidade de nossos corpos, eu coloco a mão em sua barriga e encosto a testa
em seu queixo, me apoiando nele. O chapéu desliza nas minhas costas indo ao
chão. Seu corpo não vacila, ele não hesita ao me segurar na cintura com uma
mão, minha pequena toca meu cabelo alisando carinhosamente como faço com
ela todas as noites.

— Se apoie em mim quando ficar difícil, prometo nunca te deixar cair —


beija minha orelha.

Soluço sentindo uma lágrima descendo pela bochecha, foram dois anos
difíceis em que esperei ouvir cada uma dessas palavras e agora que as tenho, o
medo de irem embora novamente e não serem verdade se enreda no meu coração
como uma rosa com espinhos no caule.

— Eu não consigo — inspiro tentando recuperar o folego — foram tantos


anos difíceis — confesso — antes mesmo de você aparecer.

— Eu sei — seu queixo desliza, ele se abaixa ficando na minha altura — eu


também passei pelo inferno amoroso, mas desde que te conheci, não me refiro à
noite que tivemos, mas a pessoa que você é. Nossas conversas, seu sorriso, o jeito
que você consegue me fazer sentir vivo, eu percebi que se continuar preso ao
passado eu nunca poderei ser feliz.

— Como você deixa a dor de lado? — pergunto, piscando para espantar as


lágrimas.

— Não deixo, eu a substituo por emoções mais bonitas — beija meu nariz
— pelo amor que tenho cultivado por você e nossa filha. É toda a força que
preciso para acreditar em um futuro feliz e viver um presente com vocês.

— Como faremos dar certo? — soluço — você mora no Brasil.


— Se vocês não puderem vir comigo, eu venho ficar com vocês. Mas não
vou perder mais um único dia ao seu lado e da nossa menina — beija meus lábios
selando uma promessa que pinta cores em meu coração.

— Eu te mato se você não cumprir — falo.

O nó espinhento que me enforcava começa a afrouxar, pela primeira vez


em anos eu tenho calma ao querer embarcar em algo novo. Não são somente as
palavras do Daniel, mas sua atitude que me balança. Ele poderia ter nos rejeitado,
voltado para o Brasil e continuado vivendo como se nada tivesse acontecido, mas
ele escolheu ficar aqui com a gente.

Eu deixei de ser uma mulher que era usada e usava os homens para ser a
escolha de alguém. Uma pessoa que eu me importo e quero tanto em minha vida
que o medo de não o ter me impede de seguir em frente, não me deixando ter o
que mais anseio. Uma família para chamar de minha, o amor de um homem que
eu ame e o pai para a minha filha.

— Prometo viver muito tempo para vocês — ele sussurra — mas, por
favor, vamos andar ou vou perder um braço.

— Certo — rio me afastando, ele ajeita melhor as coisas em seus braços e


Lizzie sorri, não sei se ela entende o que aconteceu, mas ver a felicidade no rosto
do meu mundo, quebra mais um pedaço da barreira que ergui, que agora
encontra-se aos escombros.

Giro nos calcanhares e continuo caminhando. O caminho em pedra termina


e chegamos a grama. Vejo a mesa de piquenique de madeira com os bancos fixos
no chão, debaixo de uma grande árvore. Daniel suspira audivelmente quando
visualiza o mesmo que eu, e corre, colocando a fefinha no banco e a bolsa na
mesa.
Rio, ele pode ter tido boas intenções com o presente, mas eu conheço a
filha que temos. Enquanto ela não se distrair com um brinquedo novo, a fefinha
será levada para todos os cantos, independentemente de ser festas, passeios, ou
jantares fora. A fefinha será o quarto membro da nossa família.

Um calor se espalha no meu peito ao constatar que é isso que somos agora.
Não é mais somente eu e ela, mas eu, ela, e o Daniel. Uma família.

Minhas bochechas queimam ao lembrar de algo que ele falou “pelo amor
que tenho cultivado por você e nossa filha” ele realmente me ama? Ainda não
tenho certeza do que sinto por ele, minha cabeça queima com os pensamentos
que meu coração não consegue processar.

Por hora decido me dar uma folga e não pensar no que posso ser com o
Daniel, mas somente aproveitar o sol gostoso contra minha pele, o lago e a minha
menina que levanta os braços pedindo ao pai para tirar sua roupa, a deixando de
biquini. Daniel abre a bolsa e pega o protetor passando mais nos braços da Lizzie
até ela virar uma vela branca. Paro ao lado dele, coloco a mão em sua cintura e
beijo seu ombro.

É gostoso poder fazer isso sem sentir nenhuma pressão por não saber se ele
quer o meu contato. Poder respirar simplesmente aliviada ao lado do homem que
eu vou dar uma chance para ficar na minha vida e da minha menina.

— Mamãe vilei o galpazinho [10]— Lizzie fala rindo e fazendo bico. — Bu.

— Ai que susto — levo a mão ao peito e Daniel me imita.

— Você sabe nadar Lizzie? — ele pergunta.

— Naum, só boia como um pelxinho.

— Vou te ensinar a ser um peixinho nadador — ele aperta o nariz dela


antes de se afastar tirando a camisa e o calção.
Babo ao ver os músculos definidos em seu corpo todo, se o Daniel tiver
10% de gordura corporal será muito. Ele é todo definido, másculo, e com uma
áurea sexy que balança minhas pernas. Sou flagrada o encarando, os cantos de
sua boca sobem em um sorriso sexy quando ele se aproxima segurando minha
cintura e beijando meus lábios com delicadeza.

— Mamãe tem namolado — Lizzie fala engraçadinha.

Sorrio nos lábios do Daniel, seguro seu peitoral macio o afastando um


pouco. O sorriso despojado em seus lábios mostrando que ele adorou a afirmação
da filha.

— Ela tem — ele responde — e você me tem — pega Lizzie no colo.

— Sì — responde confiante — banho, vamos.

— Agora minha peixinha.

— Vou ajeitar as coisas aqui, vão lá.

Daniel me beija mais uma vez e depois a Lizzie beija minha bochecha,
antes deles irem juntos para o lago. Gosto como ele testa a água antes de entrar,
segura a Lizzie pela barriga a deixando mergulhar e trazendo de volta. Minha
menina não contém o sorriso, e as palavras ao aproveitar o momento com o pai.
Arrumo a mesa do nosso almoço e retiro meu vestido entrando no lago com eles.

Nunca imaginei como um banho de lago poderia ser gostoso. Daniel ensina
a Lizzie a nadar enquanto ela fica dizendo que é um peixinho. Patos aparecem do
outro lado do lago e Lizzie fica eufórica querendo vê-los de perto.

— Já sei o que fazer — Daniel me entrega ela enquanto sai do lago e volta
com fatias de pão.
— Vamos atrair eles princesa — Daniel entrega a ela uma fatia do pão —
joga que eles devem vir.

O lago tem cerca de 60 metros de comprimento e 100 de largura, não estou


certa de que eles conseguirão chamar a atenção dos patos. Mas eles jogam tanto
pão na água que o quem vem para perto da gente são peixes. Grito sempre que
um, passa perto de mim, e Lizzie ri escandalosa quando um peixinho pequeno
pula contra a mão dela arrancando o pão de seus dedos.

Daniel pega Lizzie a colocando em cima dos ombros e nada um pouco para
o centro do lago, onde os patos chegaram. Estica uma mão com o pão chamando
a atenção das aves e com a outra, segura a Lizzie com firmeza. Fico parada para
não assustar os patos que se aproximam aos poucos, comendo o que restou do
pão.

Eu nunca imaginei que veria a Lizzie tão quieta admirando os animais que
ela ama para não os assustar. Daniel com uma mão a segurando e a outra
ajudando a ficar no lugar sem se mexer muito. Levo a mão ao peito realizada pelo
que vejo. Não só a Lizzie merece a chance de ter um pai, como eu mereço ter um
marido. Nesse segundo eu decido, não vou mais me fechar e continuar sofrendo.
Posso me machucar no futuro, mas isso é algo que resolverei quando acontecer.

Agora vou somente aproveitar a paz e felicidade que sinto ao perceber que
eu tenho uma família incrível. Rezo para nada atrapalhar a nossa paz.
Lira
Deito-me na cama com a Lizzie entre mim e Daniel. Ela capotou depois
que voltamos do lago, mas não quis largar do pai, e insistiu que ele a colocasse
para dormir. Tive de dar a janta dela com um olho aberto e outro fechado
enquanto ela dormia no colo do Daniel, sujando a camisa dele com o arroz de
leite.

— Ela é um anjinho dormindo — Daniel fala baixo para não a acordar.

— No resto do tempo é um anjo cheio de energia — respondo alisando os


cabelos da Lizzie.

Já são 19 horas e eu sei pelo que o Daniel espera. Eu disse que ficaríamos
juntos hoje. Ele tem expectativa no olhar, mas não me apressa, deixa que eu tome
a iniciativa quando me sentir pronta. Inspiro tendo a certeza de que a Lizzie
dormiu e levanto da cama. Daniel me imita, mas ao fazer isso a Lizzie se mexe
rolando para cima dele.

— Fica aqui papai — ela fala com a voz banhada em sono e cheia de
naturalidade.
Levo a mão a boca surpresa pela fala dela. Um nó na garganta me
impelindo a chorar. Como a Lizzie sabe? Ela consegue sentir o que o Daniel é
para ela? Lizzie já conheceu diversos adultos que eram simpáticos com ela, e
interage bastante com meus irmãos, e até mesmo o Dante, mas nunca chamou a
nenhum deles de pai.

Não nego que o hoje me fez querer dizer a ela por diversas vezes que
estava brincando com seu pai. Que quando ele a chama de “princesa” não é só
mais um apelido, mas uma forma que ele encontrou de esconder a “filha” em
cada uma de suas palavras. Minha menina não é boba, ouviu as palavras dele
mais cedo. Não sei como seu cérebro ou coração a fizeram chegar à conclusão de
que ele era o pai dela, mas agora eu tenho certeza, podemos contar a verdade para
a Lizzie.

— Eu fico minha filha, minha princesa — Daniel puxa Lizzie contra seu
corpo com lágrimas escorrendo por suas bochechas. Nunca o vi tão emocionado.

— Num, chola – papai — ela leva a mão as bochechas dele limpando as


lágrimas — eu amo você.

— Eu também te amo Lizzie, muito — ele beija a bochecha dela, minha


pequena sorri com os olhinhos brilhando, escondendo a cabeça na curva do
pescoço dele.

— Lizzie — chamo seu nome tocando em sua cintura, ela me olha


tranquila — isso não é uma brincadeira meu amor, o Daniel é o seu pai de
verdade.

Ela arregala os olhos e fica em pé o encarando abismada. Não sei o que se


passou na mente da minha pequena, ela pode ter imaginado o chamar de pai por
saber que somos namorados, ou pela forma como ele a trata. Mas agora chegou o
momento da verdade.
— Igual ao zio Louis é o pai da Cecília e Alessa? — encara a mim e ao
Daniel.

— Isso mesmo pequena — Daniel responde segurando a mão dela, e


aproximando a testa deles — eu sou o seu pai. Me perdoa por demorar a te
contar.

— Polque delmoro? — Lizzie tem a voz embargada, finalmente se dando


conta do que está acontecendo.

— O papai não podia ficar com a gente — digo a ela, engolindo o choro.
Viro seu ombro a fazendo me encarar, o rosto vermelho e os olhos banhados em
lágrimas.

— Polque?! — grita, começando a chorar alto.

Meu coração se parte ao ver a dor da minha menina. Eu deveria ter


insistido mais, buscado outras formas, ido até o Brasil e feito o Daniel fazer um
maldito teste de DNA. Qualquer coisa que o fizesse acreditar que a Lizzie era
dele, e evitar a dor que a minha menina sente. Estico os braços para a segurar,
mas o Daniel é mais rápido, a segurando forte contra seu peito.

— Lizzie, você lembra de quando a Fefinha foi enganada pela raposa? —


ele pergunta, ontem os dois passaram o dia assistindo ao desenho.

— Sim, a Fefinha ficou sem os almiguinhos pol calsa da raposinha. —


Soluça.

— Eu e a sua mãe fomos enganados por uma raposa malvada que não
queria deixar o papai ser feliz com vocês — ele beija a cabeça dela. Lizzie para
de soluçar e o encara com as lágrimas descendo pelas bochechas rosadas.

— Polque?
— A raposa tinha raiva do papai e fez algo muito perigoso. Se você e a
mamãe estivessem comigo, ela teria machucado vocês — ele aperta a mão dela
— eu nunca me perdoaria por vocês se machucarem. A mamãe foi esperta e
compreendeu a situação, e por isso vocês tiveram de ficar longe, para a raposa
não machucar vocês.

— É veldade mamãe? — Lizzie pergunta com um soluço sofrido.

— Sim, meu amor — acaricio sua perna coberta pelo pijama longo — a
mamãe não podia deixar a raposa fazer mal a gente. Seu papai ficou, para garantir
que a raposa malvada fosse presa e não pudesse nos machucar — engulo outro
soluço.

Não é a história verdadeira, mas é a única que uma criança de 2 anos


conseguiria entender. Quando ela for grande e se um dia perguntar o motivo de
não ter fotos dela com o pai durante dois anos de sua vida, e quando ela conseguir
entender o que aconteceu, contaremos a verdade. Mas hoje a minha bebê vai ficar
com a história da raposa malvada que afastou o seu pai.

— Papai é o heloi como a Fefinha? — ela limpa as bochechas, deitando a


cabeça no peito do pai.

— Sim, igual a Fefinha — respondo.

— Você perdoa o papai por demorar tanto? — ele pergunta.

— Sì — ela se mexe ficando em pé, segura o rosto do Daniel e beija sua


bochecha — amo o papai — sorri.

Eu nunca vi a Lizzie sorrindo com tamanha felicidade. Apesar dos olhos


inchados e banhados por lágrimas, as bochechas rosadas e o nariz escorrendo, ela
sorri tão lindo que fecha um buraco no meu coração. Minha menina enche a noite
de luz que reflete no rosto do Daniel e no meu.
— A raposa num vai mais machuca a gente? — pergunta espertinha.

— Nunca mais meu amor — Daniel a envolve em um abraço, deitando-a


novamente na cama — você e sua mãe são meus bens mais preciosos e vou
cuidar de vocês com a minha vida — beija o topo da cabeça dela.

Sua mão agarra a minha me puxando contra seu peito. Lizzie de um lado e
eu de outro, aliso os cabelos da minha menina, enquanto Daniel acaricia meus
cabelos e as costas da Lizzie. Tínhamos combinado de passar a noite juntos,
imaginei que seria fazendo sexo. Mas isso o que temos aqui, é a ainda melhor e
mais especial.

É um momento em que a nossa família é envolvida em um laço vermelho,


após superarmos o que tentou nos separar. Nunca mais choraremos de saudade
um do outro. Minha menina ganhou o pai dela, e Daniel a sua família. Uma que
representará amor e cuidado.

Nesse segundo eu tomo uma decisão, disposta a dar mais um passo rumo a
felicidade.

— Vamos para o Brasil com você — sussurro, velando o sono da Lizzie no


peito do pai.

— Tem certeza? Eu posso pedir transferência para cá ou arrumar outro


emprego, abrir uma empresa, qualquer coisa do tipo.

Descanso o queixo em seu ombro encarando suas feições. Daniel é um


homem maduro com olhar decidido. Ele nunca hesita quando se trata da gente, e
eu não tenho um único motivo para continuar me prendendo e escapando da
felicidade.

Vou ficar junto do último homem a quem darei uma chance para me amar,
e espero que fiquemos juntos até eu ter fios brancos como os dele, quando as
rugas ao redor dos meus olhos surgirem e nossa casa tiver mais filhos do que um
dia imaginei que teríamos.

— Sim — beijo seus lábios com a delicadeza de uma flor — eu quero te


dar uma chance para ser o meu homem.

— Você já é completamente minha e eu seu — ele fala com doçura, os


olhos repletos de amor.

— Um passo de cada vez — peço, um calafrio passa pela minha espinha


por estar dando um passo que jurei nunca mais arriscar — sem pressa e tudo no
seu tempo.

— O quê? Eu já estava pronto para casarmos assim que pousássemos e


termos mais três filhos.

Arregalo os olhos com medo do que ele propõe. Ainda não estou pronta
para isso, e preciso de um tempo para me acostumar com a ideia. Foram anos de
coração machucado, é impossível sarar em uma única noite.

— Estou brincando — sorri arteiro — deveria ter visto sua cara, jurava que
você ia colocar um ovo.

— Ovo não, mas quem sabe o almoço — brinco.

— Eu estou morrendo de fome — ele confidencia.

O jeito que fala, alivia a tensão do momento, causada por sua piada. Eu
agradeço por ele me dar o espaço que preciso e beijo seus lábios antes de
levantar.

— Vou fazer a nossa janta, fica aí para ela não acordar.

— Certo. — Ele responde sereno.


Deixo o quarto com o coração batendo tão rápido quanto a bateria de um
baterista de heavy metal. Desço as escadas meio anestesiada, o que foi que acabei
de fazer? De uma só vez, contei a Lizzie que o Daniel era o pai dela e depois
aceitei ir morar no Brasil, sendo que nunca pensei em me mudar!

Entro na cozinha e encontro a Beatrice e o Dante na mesa. Ambos me


encaram com preocupação no olhar. Beatrice aponta a xícara de chá e me sento
ao seu lado de frente para Dante. Eles parecem que querem fazer algum tipo de
intervenção comigo e estando ainda abalada pelo que aconteceu lá em cima, eu
fico calada bebericado o chá de ervas.

— Precisamos conversar — Beatrice começa.

— Fiz algo errado? — pergunto, estranhamente me sentindo tímida.

— Sim — respondem juntos.

— Você está desperdiçando a chance de ser feliz! — Beatrice fala com um


grunhido — eu jurei que iria ficar calada e te deixar resolver as coisas sozinhas,
mas não aguento mais ver você com os olhos brilhando de paixão pelo Daniel e
não conseguindo se abrir para ele!

— Olha só quem fala — acuso.

Ela diz isso, mas nunca teve coragem de contar ao Dante como se sente.
Vive suspirando pelos cantos, encarando o Cowboy que é uma porta para
perceber os sentimentos da minha amiga. Beatrice pisa no meu pé com o seu
calcanhar bom e eu tenho vontade de xingá-la. Mas decido me conter, sei como é
difícil para ela acreditar que alguém possa realmente a amar.

Diferente de mim que fui magoada por incontáveis homens e outros que
nunca consegui me apegar o suficiente para chamar de paixão ou amor. A
Beatrice não foi amada quando criança, e na adolescência teve uma experiência
familiar horrível. Se não fosse pela Blanca e Levi, não sei o que seria da minha
amiga. A terapia que ela faz todo mês parece que chegou em um ponto de
estabilidade, não regressa, mas não avança.

Só de pensar em a deixar aqui, meu peito aperta, ficando do tamanho do


caroço de uma azeitona. Não posso fazer isso com a Beatrice, não estou pronta
para dizer adeus as duas pessoas que tem sido a minha base e suporte durante os
dois anos que mais precisei.

— Lira — Dante chama segurando minha mão — sei que você tem medo,
mas o Daniel é um bom homem e vai cuidar da Lizzie e de você. Não existem
mais motivos para hesitar, e eu te garanto, se ele te magoar, eu o mato e escondo
o corpo dele no lago para não ser preso. Mas agora tanto a Lizzie quanto você,
estão diante da chance de serem felizes, não desperdice isso.

— Não se preocupe com a gente — Beatrice fala lendo meus pensamentos


— a fazenda é o meu lugar de paz no universo e nada nunca mudará isso. Sei que
você sempre virá nos visitar em qualquer oportunidade, e eu vou ao Brasil passar
um tempinho com vocês.

— Eu mesmo a levo — Dante fala, ele sabe o medo que a Beatrice tem de
se afastar de casa — temos a nossa afilhada preciosa para visitar. Acha mesmo
que conseguiremos ficar muito tempo longe? Eu vi aquela pestinha loura crescer,
engatinhar, e nos endoidar sempre que se machucava ou ficava doente.

— Vocês foram tão importantes para mim — murmuro com lágrima


descendo pelas bochechas — me ajudaram tanto, não quero dizer adeus.

— Não será um adeus — Beatrice fala docemente — assim como o Levi


mora no Brasil e vocês se veem direto, será o mesmo conosco.

— Vamos pegar carona no jatinho do Louis — Dante fala convencido —


ele tem dinheiro suficiente para nos levar.
— Mato ele se não fizer isso — aperto a mão de ambos — obrigada, por
tudo.

— Obrigada você por confiar em nós — Dante levanta e me envolve em


um abraço de urso. — Nossa baixinha precisa do pai dela e você do seu amor.
Não se prenda como uma planta teimosa, vá ser feliz!

— Certo — beijo seu ombro o apertando com todo o carinho e gratidão


pelo Dante ser um homem tão bom.

— Minha vez — Beatrice fala me arrastando para um abraço reconfortante.

— Obrigada, por tudo — choramingo em seu ombro.

— Obrigada você por encher a minha vida com a luz que a Lizzie carrega
consigo — beija minha bochecha — promete que vai ser feliz?

— Prometo.

— Ótimo — limpa minhas lágrimas. — O que veio fazer aqui?

Conto a eles sobre a Lizzie chamar o Daniel de pai e a história que


contamos sobre a raposa. Eles concordam que foi a melhor opção para a idade da
Lizzie. Faço uma macarrona com parmesão para jantarmos e quando o relógio
bate 20 horas eu subo com meu prato e o do Daniel. Ele dorme tranquilo
segurando a Lizzie no seu peito. Toco sua perna o acordando com um sorriso e
mostro o prato.

Daniel sorri preguiçoso, com cuidado deixa a Lizzie na cama, faz uma
montanha de travesseiros ao redor dela e vem até a minha varanda, onde
sentamos a mesa para comer. Ele me puxa para seu colo e ficamos assim,
conversando baixinho para não acordar a Lizzie. Terminamos a refeição e deito a
cabeça em seu peito, feliz e tranquila.
— Vamos fazer amor.

Ele não pergunta, mas chama. Seguro sua mão, apaixonada o sigo para o
quarto de hóspedes onde passo a noite sendo amada pelo homem que escolhi
permitir entrar no meu coração.

Uma última chance para o amor.


Lira
— Não tem como você conhecer algo que eu não tenha visto nessa fazenda
— digo ao Daniel.

Deixamos a Lizzie aos cuidados dos padrinhos para termos uma noite só
nossa, antes de voltarmos ao Brasil. Ele segura uma manta enorme e um cobertor,
enquanto eu levo uma bolsa com nosso jantar, vinho e velas.

Passei o dia atualizando meus irmãos sobre a minha decisão de dar uma
chance ao Daniel e para a minha surpresa ambos falaram que estavam torcendo
por isso.

Daniel realmente tem uma boa fama com os Vittileno. Mas eles são
homens, é mais fácil de se entenderem entre si. Bianca e Olivia amaram saber
que estou disposta a amar e formar minha família com o Daniel, conversamos por
horas até elas iniciarem o papo sobre casamento e eu desligar o celular. É cedo
demais para pensar sobre isso.

O que me mantém com os nervos calmos e a mente no lugar, é saber que eu


não preciso de pressa, posso fazer tudo no meu tempo. Daniel não me pressiona e
isso é um alívio. Posso estar apaixonada, mas sei que não é amor, é cedo demais
para me sentir assim, alguns dias não podem ser o suficiente para dizer que o
amo.

E usando de todo o tempo que eu tenho, vou como uma tartaruga,


descobrindo o que sinto e como lidar com cada uma dessas coisas ao mesmo
tempo, em que recebo os sentimentos do Daniel. Esse brilho refletido em suas
irises sempre que nossos olhares se encontram.

— Você conhece a fazenda, mas não os vinhedos — ele fala o obvio.

— Nunca vim muito para cá — dou de ombros, agora reconheço o caminho


que pegamos. É uma longa caminhada, mas a noite está amena, com um clima
sereno, nem frio e nem quente, perfeito para uma caminhada de mãos dadas e um
jantar ao luar.

— Por isso que, é surpresa — ele fala.

— Sim, senhor — brinco arrancando um sorriso dele.

Continuamos caminhando em silêncio aproveitando o som da noite e os


animais fazendo seus chiados. A Lizzie iria adorar ouvir cada um e poder imitar
os bichinhos, 20 minutos depois e um pouco de dor nas pernas, chegamos ao
lugar prometido. Daniel abre a cerca que delimita os vinhedos e entramos.

As uvas banhadas pela luz da lua parecem pequenos diamantes. Vejo


resquício de água nelas realçando o roxo de sua cor. Simplesmente perfeito, fico
sem folego ao ver tamanha beleza, Daniel me encara sorrindo confiante de sua
ideia e eu abraço sua cintura agradecendo por me mostrar esse lugar.

— A grama, ainda, está molhada, então cuidado.

— Aonde vamos nos deitar? — pergunto.


— Mais a frente tem uma estrutura de madeira para os visitantes poderem
sentar enquanto degustam o vinho, é um quadrado de dois metros, perfeito para
passarmos a noite nele.

— Não percebi que você tinha aprendido sobre o vinhedo — comento


enquanto caminhamos entre as vinhas.

— Dante me explicou bastante sobre como o negócio funciona, acabei


comprando 5% das ações. Vejo muito futuro para essa empresa, se a Beatrice
quiser, podemos transformar ela em algo enorme, de escala global, em vez de
fornecer somente para a Europa.

— A Bea não quer, já ofereci a ela transformar aqui em uma empresa


internacional. Mas a timidez da minha amiga não a permite sonhar tão alto,
teríamos de ter um CEO especializado no ramo que não arriscasse tirar a empresa
dela. Você sabe que isso é possível.

— Hoje em dia CEO’s confiáveis estão difíceis. Temos de ter mais da


metade das ações da empresa para tomar decisões, às vezes passando por cima da
vontade do Presidente. É uma posição com poder que pode destruir ou crescer,
uma moeda de dois lados.

— Igual como seu sócio fez com você — comento, Daniel não se abala ao
ter mencionado o ex-parceiro.

— Sim, e graças a confiança do Louis, consegui me reerguer e provar meu


valor. Ele é o Presidente das indústrias VITTILENO. Mas a cede brasileira eu
tenho a maior porcentagem, tendo o poder decisório.

— Você poderia roubar a VITTILENO Brasil do meu irmão? — pergunto


em tom de brincadeira, sei que ele nunca faria isso.
— Seu irmão é uma raposa ardilosa para os negócios — ele fala. Chegamos
à plataforma de madeira e Daniel estende a manta e coloca o cobertor em cima.
— Nosso contrato é extremamente restrito, com aplicação de sanções, caso eu
faça algo contra a vontade dele. Posso ter a maioria das ações, mas a empresa
ainda pertence ao Louis.

Deixo a bolsa na madeira e subo, me sentando na colcha fofinha, pego a


manta passando-a nos meus ombros, enquanto Daniel coloca nossa comida nos
pratos e enche as taças de vinho.

— Ele é esperto — digo orgulhosa.

— Igual a você — me entrega uma taça — já assisti todos os filmes que


você dirigiu, e é um melhor do que o outro. Uma diretora de puro talento — toca
sua taça na minha — minha mulher é fantástica.

Um rubor sobe a minha bochecha quando ele se refere a mim como sua.
Deito a cabeça em seu ombro bebericando o vinho tinto da adega da Beatrice.
Perfeito até a última gota, adocicado na medida certa, com um cheiro esplendido
de uva fermentada.

— Eu tinha 6 anos quando a minha mãe morreu em um acidente de carro


— a vontade de falar desperta como uma represa sendo rompida — tenho poucas
lembranças com ela, às vezes nem sei se são lembranças ou invenção da minha
mente. Você recorda de algo antes dos seus 12 anos?

— Pouca coisa, acho que mais de quando comecei a me masturbar — ele


fala e dou risada, levo a mão a seu peito tocando a camisa de algodão bege macia.

— Não lembro minha primeira masturbação — confesso com as bochechas


em chamas — mas recordo a primeira menstruação e como fiquei assustada sem
entender o que estava acontecendo com o meu corpo. Eu cresci em uma casa com
três homens e nenhum me ensinou nada sobre isso. Estava tão assustada com o
sangramento pensando que iria morrer, gritei com toda a força e o Louis entrou
como louco no banheiro.

Dou risada lembrando a cara assustada dele. Daniel ri, certamente


pensando em como o momento se desenrolou.

— Foi tão embaraçoso. Eu pensava que ia morrer e ele todo enrolando me


explicando que era normal, que mulheres sangravam todos os meses — bebo o
vinho, uma lembrança dolorosa começa a ganhar um tom cômico — dá para
imaginar o Louis falando isso?

— Certamente dá, mas não sem rir muito — responde escondendo o sorriso
na taça.

— Pois é, depois as coisas se acalmaram quando ele me deu um absorvente


que ele não fazia ideia de como usar. Mas li na embalagem e coloquei.

— Vou perguntar o obvio só para ter certeza — ele fala engolindo o riso —
mas o Louis te viu pelada colocando um absorvente?

— Ele ficou mais vermelho que o sangue na minha calcinha.

Daniel se engasga com o vinho e cai para trás rindo de ganhar lágrimas nos
olhos. Continuo sentada me divertindo com a risada dele. Nunca pensei que
poderia deixar a lembrança triste que me acompanhou por anos com um ar leve.
Em vez de chorar pela falta da minha mãe, eu rio por meu irmão ter tido a
coragem que poucos teriam.

— Aí Deus, vou morrer de tanto rir — Daniel segura a barriga.

— Depois as coisas ficaram mais fáceis quando a governanta veio me


ajudar. — Belisco sua barriga — mas o centro da história é: você tem de aprender
a como usar um absorvente e o que é um ciclo menstrual. Se algum dia — engulo
em seco — eu faltar para a Lizzie, você não pode deixá-la se sentindo perdida
como eu me senti.

— Vou garantir que você me ensinou como colocar um absorvente e sobre


ciclo menstrual — senta ficando a poucos centímetros de distância do meu rosto
— e eu te prometo, não importa o que aconteça, eu sempre vou estar ao lado da
Lizzie e de todos os filhos que tivermos.

— Não teremos outro tão cedo — tento aliviar o clima, Daniel entendeu o
que eu queria e não quero estragar nossa noite com lembranças tristes.

— Estamos transando sem camisinha, você com certeza já está esperando


outro bebê — morde meu lábio.

— Você não usa camisinha, mas eu tomo anticoncepcional há anos. Não


vou engravidar tão cedo — seguro seu rosto com uma mão — mas agora descobri
seu plano, seu safado.

— Droga, fui pego — finge que sente muito, mas o brilho em seus olhos
não mente.

— Me conta sobre sua família? — peço servindo mais uma taça para a
gente.

— Sou só eu e minha mãe, cresci na periferia, meu pai era enfermeiro e


minha mãe professora do ensino médio. Não tenho irmãos e sinto falta disso, a
Lizzie precisa de ao menos um — rio da sua tentativa.

— Continue.

— Bom, sobre a Verônica você já sabe, meu pai morreu com câncer de
próstata faz cinco anos. Dois anos antes de eu me separar da Verônica.
Atualmente minha mãe está aposentada, e amo a mimar com viagens pelo mundo
com as amigas. Agora ela e minha tia estão passando uma temporada nas praias
do Caribe, mas ela voltará correndo quando souber que tem uma neta.

— Acha que ela vai gostar de mim? — pergunto incerta.

— Ela com certeza vai te amar — ele deixa a taça de lado e segura minhas
pernas me fazendo sentar em seu colo. — E a Lizzie também.

— Você tem certeza de que a Verônica vai ficar presa e não será mais um
incômodo? Agora temos a Lizzie e só de pensar naquela mulher perto da minha
pequena eu me tremo de raiva.

— Mesmo que ela se solte, nunca chegará perto da gente. Vocês duas
sempre vão estar acompanhadas de seguranças, independente de quanto tempo se
passar. Minhas vidas, nunca as permitiria passarem por perigo.

— Por que é fácil para você se apaixonar?

— Não foi fácil Lira, foi natural, é diferente — alisa meu rosto — desde o
segundo que nos encontramos você mexeu comigo, e sei que se não fosse a
loucura da Verônica, eu teria te procurado antes. Mas não adianta ficar olhando
para o passado quando eu tenho um presente exatamente aqui, ao seu lado.

Engulo a vontade de chorar de felicidade. Nunca imaginei que receberia


tanto carinho sem pedir nada em troca. Fui uma tola por achar que conseguiria
me manter longe do Daniel, negar à vontade queimando em meu peito. Aliso seu
rosto o beijando demoradamente.

— Estou ansiosa para conhecer sua mãe — beijo seus lábios, mudando de
assunto ou vou acabar chorando. Ou pior, me declarando quando ainda não me
sinto pronta para isso. Queria ter mais da confiança do Daniel, mas por enquanto
vou mantendo a minha pequena coragem e dando os passos confiáveis para mim.
— Você verá, vai ser perfeito, minha mãe é um doce, mas muito tagarela,
então se prepare para todo tipo de pergunta.

— Ela e a Lizzie serão ótimas amigas — rio. — Nossa menina ama


conversar sobre tudo.

— É capaz da minha mãe querer morar com a gente para ficar perto da
Lizzie, você se incomoda muito com isso?

— Eu iria amar.

Não sei como é conviver com uma mãe e o Daniel tem tanto amor em sua
voz pela mãe, que eu já sinto que gosto dessa mulher e a quero perto da minha
família. Continuamos conversamos por incontáveis horas debaixo das estrelas e
jantando. O vinho rapidamente acaba e abrimos outra garrafa, o efeito começa
aos poucos a ativar nossa libido e mandar a vergonha para os ares.

— Acha que é errado transarmos aqui? — Daniel pergunta entre beijos.

— Tem câmeras em todos os lugares — eu digo o beijando, enrolo nossos


corpos com o cobertor — é só não sermos vistos pelados.

— Não estamos nas uvas — ele fala entre uma mordida.

— Exatamente — respondo.

— Eles sabiam o que faríamos quando deixaram a gente vir — Daniel


lembra — qualquer coisa eu assumo a responsabilidade — me deita na colcha
fofinha — sou o tarado que não resistiu a mulher que ama.

— Completamente.

O beijo, a felicidade explodindo mais uma vez ao saber que ele me ama.
Daniel não precisa de palavras ou proferir “eu te amo” demoradamente, seus
olhos e ações sempre foram bastante claros e nesse segundo eu me sinto o ser
humano mais amado do planeta.

Daniel
— Eu tenho meldo — Lizzie se agarra forte no pescoço da mãe ao ver o
avião que nos levará ao Brasil.

— Vem cá princesa — chamo a pegando no meu colo — se agarra bem


forte no papai que o medo passa.

— É veldade? — os olhos brilham com lágrimas contidas, ela está prestes a


chorar novamente.

Desde que Lizzie soube que iriamos para o Brasil ficou chorando, primeiro
por não querer se separar dos padrinhos e depois pelo avião que ela não queria
pegar. Tivemos de atrasar a nossa volta em quatro dias até fazer a Lizzie se
acostumar com a ideia, mas o avião continua sendo um problema.

Lira me encara com medo de precisar dar remédio para a Lizzie dormir,
opção recomendada pela pediatra dela no caso de voos que devem ser feitos.
Estamos dando um importante passo para iniciar uma nova vida juntos, como
uma família.
Minha mãe espera por nós ansiosa para conhecer sua neta e nora, meus
planos com a Lira só darão certo se ficarmos juntos, e para isso vou fazer a minha
filha atravessar um oceano para podermos ter uma vida juntos.

— Eu sou o seu pai Lizzie — falo carinhosamente alisando os fios de ouro


em sua cabeça — confia que o papai sempre irá te proteger?

— Sì — responde manhosa.

— Então segura bem forte no papai e quando o medo te fizer chorar lembre
que o papai está aqui para o enfrentar. Não vou te soltar nem um segundo.

— Polmete?

— Sim, meu amor — beijo sua bochecha.

— Tá bien papai.

Lizzie esconde o rosto no meu pescoço. Lira me encara em dúvida se


conseguiremos, não queremos dopar a Lizzie e transformar aviões em
experiências de pânico. Mas se for preciso usar o remédio o faremos em último
caso. Por hora subo as escadas embarcando no jato particular da empresa com a
Lira atrás de mim, segurando a Fefinha.

O acordo seria eu sempre levar a pelúcia enorme para todos os lugares, mas
com a Lizzie agarrada em mim como um bicho preguiça, não posso cumprir
minha parte. Eu amo que a minha filha ame o primeiro presente que dei a ela,
mas é incomodo andar o tempo todo e estar sempre limpando a Fefinha, porque a
Lizzie a suja para onde quer que vamos.

Entramos e nos sentamos um de frente para o outro. Lira coloca a Fefinha


na poltrona ao lado. Seguro Lizzie pela barriga a fazendo virar de frente para a
mãe. Minha menina continua com os olhos chorosos quando percebe que
entramos, segura firme minha roupa, coloco o cinto de segurança e a aperto nos
meus braços com muita força.

— Bom dia — a aeromoça fala — vamos decolar em 10 minutos, por


favor, todos coloquem o cinto.

— Ela não vai conseguir decolar sentada — Lira fala — a Lizzie tem medo
de aviões e só aceitou ir nos braços do pai.

— Desculpe senhorita Vittileno, mas não podemos partir sem que todos
estejam de cinto. Por mais que o senhor Albuquerque segure a menina nos braços,
não é o mesmo que o cinto de segurança.

— Papai — Lizzie começa a chorar no meu colo.

— No último minuto, antes de partimos, eu a coloco no cinto — aviso,


tomando uma difícil decisão. — Só avisar antes.

— Sim, senhor, se precisarem de algo, podem me chamar — ela sai


caminhando para a cabine na frente.

— Minha princesa — Chamo alisando seus cabelos — enquanto o avião


sobe no céu, igual aos passarinhos, você precisa ficar na cadeira — falo odiando
como a Lizzie começa a ficar desesperada.

— Não chora meu amor — Lira pede se esticando e tocando as pernas da


Lizzie — a mamãe e o papai estão aqui — puxa a Fefinha pelo pescoço — e ela
também. Vamos todos voar juntos e seguros, confia na gente filhinha.

— Naum quelo — abre a boca começando a chorar.

— Vou pegar o remédio — Lira fala com desespero nos olhos.

— Espera, ainda não. — Digo.


Seguro Lizzie a colocando na cadeirinha especial para crianças de 2 anos
voarem, presa ao assento ao meu lado. Ela chora ainda mais, me mantenho firma
ao prender o cinto na sua cintura e peitoral. Levanto sua blusa, deito a cabeça em
sua perna e começo a fazer cócegas com a barba em sua barriga, do jeito que eu
sei que ela gosta.

Lizzie grita novamente, mas dessa vez surpresa pelo que estou fazendo e
enquanto tenta chorar e rir ao mesmo tempo, ela agarra meus cabelos pedindo:

— Pala papai, faz colciciquinha!

— O quê? Ainda não consigo te ouvir — digo voltando a esfregar o rosto


na pele macia da minha bebê.

— Pode voltar — Ouço Lira dizer, imagino que seja com a aeromoça.

Sinto o avião dar sinal de que está prestes a voar. O piloto faz o anúncio
pelos altos falantes, eu levo a mão aos ouvidos da Lizzie impedindo que ela
escute o que ele fala enquanto aumento a intensidade das cócegas, fazendo tantas,
que minha menina grita, chorando de rir.

O avião não demora muito para alçar voo, ignoro a dor na coluna
parecendo que será partida em duas, e os puxões no cabelo e chutes que levo pela
Lizzie se contorcendo com as cócegas. Quando a aeromoça avisa que podemos
retirar o cinto, eu solto minha menina depressa a pegando no colo.

Seu rosto contra meu peito, as pernas presas pelo meu braço e o outro em
suas costas. Os olhos sapecas brilham de felicidade.

— Viu? Já estamos voando — digo a ela — quer ver como os passarinhos


enxergam o céu?

— Quelo — responde alegre.


Abro a janela ao lado da minha cadeira e mostro a Lizzie como são as
nuvens, ela olha encantada a visão. Coloca as mãos na janela e aproxima o rosto,
quando seus olhos batem no chão abaixo de nós ela grita encolhendo o rosto no
meu pescoço. A aperto forte.

— Lizzie tem medo de altura ou de cair — digo a Lira.

— Então não era do avião? — ela pergunta com a testa franzida — achei
que nunca iriamos conseguir decolar.

— Lizzie — chamo — você tem medo de cair?

— Sì — responde abafado.

— Se eu te segurar firme — a aperto — não vai cair, minha princesa.

— Polmete?

— Sim.

— Quer comer Lizzie? — Lira pergunta.

— Quelo leitinho — Lizzie encara os peitos da mãe.

— Vem — Lira abre os braços. Retiro meu cinto e entrego nossa menina a
ela — também estará segura nos braços da mamãe — beija seu nariz.

— Semple mamãe — responde com carinho.

Lira desce a alça da blusa colocando o peito para fora, Lizzie não perde
tempo abocanhando o bico e começando a mamar.

— Por que ela não toma fórmula?

— Ela nunca gostou de leite de fórmula, ou de vaca, cabra, tentei todos,


mas a Lizzie só toma o meu.
— Até quando você acha que vai continuar amamentando?

— Provavelmente só esse ano, estou começando a diminuir a produção, e a


Lizzie come outras coisas agora. — Alisa a testa da nossa menina — ela está
crescendo forte e saudável, não é meu amor?

— Sì — responde com a boca cheia e dou risada.

Meu celular apita com uma notificação. Uma mensagem da minha mãe
pedindo para avisar quando pousarmos. São 9 horas da manhã na Itália,
provavelmente pousaremos às 19 horas. Com a diferença de 4 horas de fuso
horário, chegaremos às 00 horas no horário do Brasil. Aviso sobre e ela promete
ficar acordada para falar com a netinha que ela conhece somente por chamadas de
vídeo.

Lizzie termina de mamar e volta para o meu colo, a seguro firme como
prometi, enquanto assistimos ao desenho da Fefinha. Aos poucos o medo da
minha menina vai dando lugar ao divertimento. Lira deita confortavelmente
assistindo a filmes no tablet, ela é uma grande diretora e não consegue deixar de
comentar quando vê algo que poderia ter sido melhorado se o diretor fosse bom.

Sorrio sempre que a escuto dar seus comentários. Retiro a Fefinha do


acento ao seu lado e vou para lá com a Lizzie. Deixamos o desenho de lado e
vamos assistir com a mãe dela.

As horas começam a voar, o céu anoitece e Lizzie dorme fácil nos meus
braços, confesso que fiquei com eles dormentes de tanto tempo com a minha
menina no colo, mas nunca a soltaria, nem mesmo que meus braços caíssem.

Pousamos às 00 horas no aeroporto de São Paulo. Lizzie continua


dormindo confortavelmente, mas quando descemos, que a Lira vem trazendo a
Fefinha, ela me encara fazendo careta e estende o urso para mim. Entrego nossa
menina a ela e pego a cruz que é, andar com uma girafa enorme. Meu motorista
nos cumprimenta com sorrisos e quando vê a pelúcia fica em dúvida de onde a
colocar no carro.

Se eu não soubesse sobre a possibilidade de a Lizzie acordar chorando


querendo a girafa, eu a mandava ir em outro carro com as nossas bagagens, mas
como conheço a filha que tenho, faço um esforço do capeta para colocar a girafa
no banco do passageiro sem atrapalhar o motorista. Me sento atrás com a minha
família, quando cumpro minha missão após 10 minutos de luta.

— Eu estava pensando — Lira fala casualmente — talvez eu possa voltar a


trabalhar.

— Isso seria fantástico — digo, apesar do medo dela de se afastar ao voltar


aos Estados Unidos.

— Agora que eu tenho você — segura minha mão — nossa menina não
ficará sozinha ou sentirá solidão por eu estar no set. Sei que você trabalha muito,
mas é reconfortante ser uma dupla.

— Eu trabalho das 8 horas às 19 horas, todos os dias estarei em casa após


as 20 horas. Levo em média uma hora fazendo o trajeto de carro da empresa para
a nossa casa. — Friso bem a última parte.

— Eu sei que a vida de um CEO às vezes pede que ele fique mais tempo —
ela começa não acreditando nas minhas palavras.

— Não esse CEO — digo, apesar de já ter virado noites no escritório e ter
mudas de roupa preparadas para quando ficava até tarde — esse homem tem
horário de entrada e saída e vai jantar em casa todas as noites. A menos que a
empresa esteja em chamas, eu não descumprirei o horário.

— Isso é bom — responde, percebo que ela quer acreditar, mas entendo
que pode ser difícil. — Como você pretende fazer? Sei que seu estúdio fica nos
EUA.

— Ah, não mais, pedi demissão quando decidi vir para o Brasil.

— O quê? — fico surpreso, ela não me disse nada.

— É, liguei e falei que não iria mais trabalhar. Paguei a multa do contrato,
a notícia se espalhou e agora tenho mais de vinte propostas de estúdios e
emissoras brasileiras querendo me contratar como diretora. Acho que posso fazer
dar certo, me familiarizar com as produções do Brasil.

— Uau, minha mulher é mega concorrida — falo em tom de brincadeira,


mas totalmente orgulhoso por saber o valor que a Lira tem.

— Sou uma das melhores diretoras da nossa era, claro que seria disputada
— fala arrogante, com charme, dou risada do seu jeitinho.

— Já decidiu onde vai trabalhar?

— Gostei da proposta de dirigir um programa infantil, eles ofereceram um


ótimo lugar para a Lizzie poder ficar e eu trabalharia só das 8 horas às 13 horas.
O programa vai ao ar das 9 horas às 12 horas. E se eu quiser, posso deixar a
Lizzie ser uma das crianças que participam do quadro.

— Como funciona?

— Todo início de mês eles abrem seleção para 20 crianças de 5 a 10 anos


participarem ao vivo, enquanto os três apresentadores ensinam coisas básicas da
vida infantil e adulta, com brincadeiras, histórias e música. Mas o atual diretor
não está mais sabendo como manter a audiência, e embora eu nunca tenha
trabalhado com programas ao vivo, foquei mais em seriados e filmes adultos,
agora que tenho a Lizzie, estou cheia de ideias para um quadro educativo e
infantil.
— Ela poderia ficar com você enquanto trabalha sem incomodar seus
colegas de trabalho. E você ainda poderia estar em casa de tarde e eu fico com ela
a noite.

— Ela dorme a noite — arqueia a sobrancelha.

— Então fico com você — me estico por cima da cadeira da Lizzie


beijando a Lira.

— Gosto dessa possibilidade — sorri nos meus lábios.

— E as outras propostas, o que são?

— Filmes, séries, mais do que eu sempre costumei fazer no meu outro


estúdio. Eu gosto da produção adulta, mas não estou pronta para ficar horas em
um set novamente, com a Lizzie sendo tão pequena, ao mesmo tempo, em que
anseio estar dirigindo novamente alguma coisa.

— Eu vou te apoiar em qualquer decisão que você tomar — seguro sua


mão beijando seus dedos — amo o quanto você pensa na nossa menina, mas
agora tem a mim. Eu já mandei fazerem um espaço infantil para a Lizzie na
minha sala, também não quero ficar longe dela.

— Meu Deus, o grande CEO Daniel Albuquerque trabalhando com a filha


ao lado — ela contém a gargalhada, sorrindo abertamente.

— Meus acionistas vão amar isso — ironizo rindo com ela — mas é o que
eu quero e ninguém vai me impedir.

— Você tem razão — ela beija minha mão — e caso a Lizzie não se adapte
a nenhuma das nossas rotinas, ela pode ficar na creche da Olivia.

— A Olivia é maravilhosa, ainda fico maravilhada com a creche que ela


abriu, e mesmo assim não é a diretora, por não conseguir ficar sem dar aula.
— Sim, e ela trabalha e cuida dos filhos, assim como o Levi, Louis e
Bianca. Podemos fazer também.

— Com certeza — ela se estica sapecando um beijo nos meus lábios.

O carro para suavemente e vejo que chegamos a minha casa. Moro em um


condomínio de luxo em São Paulo, a casa tem no total 11 cômodos, sendo 5
quartos, uma sala de estar, uma de visitas, a cozinha e a sala de jantar, um
escritório, lavanderia e a área externa. Divididos em térreo e primeiro andar, é
uma ótima propriedade. Não chega a ser a mansão dos Vittileno, mas é tudo o que
eu preciso, luxo, conforto, e a segurança do condomínio.

Pego minha princesa no colo e descemos do carro. Lira traz a Fefinha nos
braços. Digito a senha na porta e entramos, vejo a cabeça castanha da minha mãe
deitada no sofá, dormindo profundamente, enrolada na manta com o
arcondicionado, deixando a sala um gelo.

A deixo dormindo e levo a Lizzie para seu quarto, mandei preparar um para
a minha pequena com os animais que fazem parte do desenho da Fefinha,
trouxemos parte de suas pelúcias, umas ficaram na casa da Beatrice para quando
a visitarmos.

— Não sei se ela vai se acostumar a dormir na cama sozinha — Lira fala
— ao menos hoje é melhor ela ficar com a gente, se acordar na casa estranha vai
ter medo.

— Certeza? Podemos inaugurar minha cama nova — arqueio a sobrancelha


sugestivo.

— Fazemos no banheiro — pisca — vamos.

A guio para o nosso quarto onde nossas coisas já foram colocadas. Deito
Lizzie no centro da cama, beijo sua cabeça e Lira tira a roupa dela, trocando pelo
pijama. Lizzie tem o sono pesado e nunca acorda com barulho ou se mexerem
com ela.

Quando ela termina, vamos para o banheiro da suíte e fazemos sexo quente
na banheira, evitando fazer qualquer ruído que traumatize nossa menina. Me
perco no calor da minha mulher, apertando sua bunda com a mão, os olhos
vidrados um no outro, atingindo o orgasmo juntos.

Essa é a nossa nova vida e a farei ser o melhor possível.

Sei que a Lira tem problemas para conseguir se abrir e com calma a farei
perder todo o medo que a rodeia devido a suas experiências passadas. Minha
vontade é a de colocar um anel em seu dedo e a encher de “eu te amo”, mas por
hora, vou continuar fazendo as coisas com calma, a amando todos os dias e a
deixando confortável. Quando sentir que o momento certo chegou, eu faço o
pedido de casamento.

Temos a vida toda juntos.


Lira
— Ele chega em casa todos os dias as 20 horas em ponto.

Digo a Olivia enquanto mordo um dos biscoitos que ela fez para as
crianças comerem enquanto brincam no seu apartamento. Anotei a receita para
fazer para a Lizzie, não leva açúcar, e a massa é uma delícia. Lorran e Lizzie
comem enquanto pintam na sala. Sentada no banco do balcão na cozinha, eu bebo
outro gole do meu chá.

— E isso é ruim? — ela pergunta franzindo a sobrancelha, me olhando


sobre a xícara.

— Não, é perfeito — suspiro — no início eu achava que era somente papo,


não conseguia confiar. Mas depois de cinco meses com a rotina se repetindo, eu
simplesmente não entendo o motivo de continuar hesitando. Eu vejo nos olhos do
Daniel que ele quer avançar a relação, e se contêm por minha causa, mas eu
também quero — suspiro cansada de mim mesma.

— O que te impede Lira? — ela segura minha mão me fazendo fixar o


olhar no seu.
Encaro os olhos verdes da Olivia tentando achar a resposta dentro de mim
mesma. Os últimos cinco meses tem sido perfeitos, Lizzie tem se adaptado bem
ao Brasil, convive mais com o Lorran e Lorrany, que são ótimos primos, Lorran
assumiu a missão de ensinar a Lizzie a falar português. Então todos os dias eu a
trago aqui das 16 horas às 18 horas para estudar com o primo.

Meu sobrinho é inteligente e paciente, tanto a Lorrany quanto a Lizzie


gostam de aprender com ele. Embora sua irmã canse cedo, e sempre dorme às 17
horas. Minha sobrinha ressoa baixinho no quarto do pai que deve chegar a
qualquer minuto. E antes que o Levi volte do ateliê, eu decido me abrir para
minha cunhada e amiga.

— Ele foi quem mais me incentivou a aceitar a proposta do estúdio para o


programa infantil. Daniel todos os dias me acorda com beijos carinhosos e nunca
vamos dormir sem um sorrir para o outro. Ele vive dizendo que me ama, mas
nunca o “eu te amo” que eu sei que ele quer falar — suspiro — ele respeita o meu
tempo, é um pai extremamente atencioso e às vezes leva a Lizzie com ele para a
empresa, só porque não suporta ficar muito tempo longe da nossa menina.

Minha garganta trava, agora que comecei o turbilhão de emoções explode


como um vulcão.

— Eu sempre busquei por amor e desisti quando fiquei grávida e ele me


rejeitou. — Cutuco as unhas sem coragem de a olhar — aquilo magoou tanto que
achei que a ferida nunca fosse fechar. Mas aí eu conheci o verdadeiro Daniel, o
atencioso e que se estressa sempre que vê muita bagunça, ou quando as pessoas
tentam o enganar, ele é muito cauteloso, e cuidadoso com suas ações. Daniel
sempre pensa duas vezes antes de dizer algo que vai me irritar, ou reclamar sobre
qualquer coisa.

— Você acha ruim que ele tenha cuidado com as palavras? — Pergunta,
acho que ela não consegue me entender.
— Não, eu amo como ele se preocupa comigo e com Lizzie mais do que
qualquer coisa. Mas não consigo ignorar que pode ser tudo mentira, uma fachada
para fazer eu me apaixonar perdidamente e com isso poder me manipular. Ele é
perfeito demais para ser verdade — engulo o choro — e se o conto de fadas
acabar no segundo em que eu for sincera e falar para ele como me sinto?

Olivia me puxa para um abraço reconfortante. Alisa minhas costas com


carinho enquanto me acalmo após minha pequena explosão de sinceridade. Eu
quero poder confiar no amor do Daniel, mas o medo de me machucar novamente,
de descobrir que é tudo uma mentira continua me paralisando e eu não sei o
motivo de agir assim, mas é como eu sou.

— Homens maravilhosos, existe Lira. E você encontrou um que está


disposto a dar a vida para te ver feliz. — Ela me encara — eu também tive medo
quando perdoei o Levi após tudo que passamos, mas se não o tivesse feito, hoje
eu não teria essa vida.

Olha para o filho com amor explodindo.

— Amar é corre riscos, é acreditar na outra pessoa, aceitar que você a quer
em sua vida e principalmente respeito. Você e o Daniel passaram por muita coisa
juntos e separados, mas agora conseguiram a chance pela qual sempre buscaram.
Você tem medo de se machucar, mas já pensou em como é para o Daniel, depois
de tudo que ele passou? Foram 20 anos casado com uma mulher que o
manipulava e traia, e mesmo assim ele está fazendo tudo para ter uma vida ao seu
lado.

— Eu nunca seria capaz de o magoar, principalmente como a ex dele fez.

— Eu sei, mas o que eu quero dizer é: se o Daniel, que é alguém que tinha
tudo para ser reservado e desconfiado com o amor, consegue se abrir sem medo, é
porque ele acredita em você, nos seus sentimentos, e acima de tudo, ele te ama
Lira. Qualquer um pode perceber isso, basta olhar para vocês dois juntos, e eu sei
que você também o ama, ou não estaria sofrendo por não conseguir demonstrar
isso. Sua dor não é por medo, é devido a não conseguir dizer o que sente.

— Eu amo muito ele — confesso, com o corpo gelado por admitir em voz
alta, colocando todos os meus sentimentos nas palavras. — E quero ser corajosa o
suficiente para dizer a verdade — inspiro — quero a vida que ele me promete. —
Um estalo na minha mente me faz perceber o que tenho ignorado — eu já tenho
tudo isso, mas estou presa a uma imagem que eu mesma criei nos meus medos,
não me permitindo viver o que sempre quis.

— Sim! Se sente melhor agora que percebeu que nos últimos cinco meses
você tem vivido o que sempre quis e teve medo de admitir que era real?

— Sim — uma lágrima desce pela minha bochecha — preciso ver o


Daniel.

— Quer deixar a Lizzie aqui hoje?

— Com certeza — peço rindo em meio a lágrimas.

Meu coração finalmente conseguiu encontrar a porta para se libertar do


medo que me paralisava sempre que eu pensava em dizer “eu te amo” ao Daniel.
Não importa mais o futuro e os medos de ser abandonada, pensar nisso está me
fazendo perder o presente em que um homem incrível tem me amado a cada dia
desde que nos reencontramos no aniversário da minha sobrinha.

Em breve será o aniversário de três anos da Lizzie, em abril, próximo mês,


é o da Lorrany, e vamos reunir toda a família. Meu desejo de ser cuidada e amada
foi atendido sem que eu nem mesmo me desse conta. Me levanto eufórica do
banco quando a porta do apartamento abre e meu irmão entra com uma enorme
cara de cansaço. Ele ignora a todos e vai direto para o quarto, encaro a Olivia sem
entender.
— Quando ele chega muito cansado do ateliê, vai direto atrás da Lorrany, a
pega no colo e dorme até ela acordar e o chamar.

— Por isso você a deixa na sua cama?

— Sim, é mais fácil do que o Levi a pegar no berço e levar para o quarto.
Esses dois são idênticos no quesito — faz aspas com os dedos — “estou cansado,
não quero conversa com o mundo”. Daqui a pouco o Lorran termina o desenho e
vai acordar o pai para mostrar.

Encaro meu sobrinho que pinta em cima da mesa com a Lizzie. Lorran é
um artista de primeira linha, com cinco anos faz desenhos de tirar o folego, que
eu nunca conseguiria fazer. Além de já saber ler e falar dois idiomas, às vezes
acho que ele é um mini gênio ou um superdotado.

— Eu vou indo — digo — se a Lizzie chorar muito é só me chamar.

— Ela vai dormir tranquila com o primo — confidencia o que já sabemos,


os dois se dão muito bem. A Lizzie é a única das primas que o Lorran não implica
e divide os docinhos.

— Meu amor — chamo a Lizzie — o que acha de dormir aqui hoje?

— Oba — levanta os braços — vou mimi com o Lorran.

— Não é mimi Lizzie — Lorran a corrige — é dormir.

Eu amo como ele pronuncia as palavras com eloquência o suficiente para


parecer um rapazinho. Aliso a cabeça do Lorran que sorri para mim, a janelinha
dos dentes de leite que perdeu, começam a ser preenchida pelos dentinhos que
estão quase completamente grandes.

— Isso, meu amor — a pego no colo — a mamãe vai para casa e te busca
amanhã de manhã.
— Polde sel de talde? — leva a mão a boca fazendo bico e eu rio da sua
fofura.

— Pode, sim, você pede para sua tia Olivia me ligar, que tal?

— Celto mamãe — aperta meu pescoço em um abraço.

— Vou sentir muita saudade — a encho de beijinhos — tenha uma ótima


noite meu amorzinho.

— Você talbien mamãe — beija minha bochecha — e o papai.

— Dá o beijo do papai na mamãe, em casa eu dou a ele.

Lizzie me dá outro beijo e a encho de beijinhos antes de a deixar com o


Lorran, que saiu com o desenho de um pássaro, para mostrar ao pai. Lizzie o
acompanha rapidinha. Ter meu irmão por perto é maravilhoso, sempre deixamos
os filhos na casa um do outro quando queremos uma noite a sós com nossos
parceiros.

Com o coração pulando no peito, eu desço o elevador. Levi comprou o


prédio ano passado e tem transformado aqui em uma empresa de moda. É onde
ele produz suas artes e seus funcionários trabalham. 20 andares, sendo 1
apartamento do Louis e da Bianca, o outro do Levi e da Olivia. O Ateliê dele que
se divide em três andares, um para cada coisa diferente que ele monta. Um andar
para a equipe de marketing e relações-públicas, um estúdio, e nos outros andares
tem as costureiras que produzem as roupas dos desfiles. As peças vendidas em
larga escala pelo mundo são produzidas pela VITTILENO.

Meus irmãos conseguiram construir seus sonhos ao lado das pessoas que
amam e suas famílias. É a minha vez de ser feliz, agora não me restam mais
dúvidas ou hesitação. Estou pronta para ser completamente realizada e amada
pelo Daniel. Quem sabe termos um segundo filho que ele tanto fala, ia amar ter
um rapazinho parecido com o pai que cuide da irmã como o Lorran da Lorrany,
ou outra menininha para ser a dupla da minha princesa como a Alessa é da
Cecília.

Entro no carro informando ao motorista que devemos ir para a minha casa.


Daniel estava certo quando falou sobre nunca deixar eu ou a Lizzie sem um
segurança, ou dois. A notícia de que estamos juntos e temos uma filha, correu
pelo país como um incêndio, e no último mês muitos paparazzi estão tentando
conseguir uma foto minha e da Lizzie, desde que anunciei que vou ser a diretora
do novo programa infantil.

Em três meses acaba o contrato do antigo diretor e eu assumo, estou cheia


de ideias para o programa. Quero mudar tudo, dar mais vida e acrescentar um
quadro sobre o som dos animais com a Lizzie fazendo imitações. Minha menina
ficou feliz quando perguntei se ela queria participar, minha vida entrou em eixos
que nunca imaginei e agora estou soltando fogos de artifício ao imaginar
finalmente me confessar para o Daniel e ouvir as palavras dele.

Chegamos em casa e entro como um foguete, minha sogra assiste novela na


televisão e sorri para mim. Vejo a governanta ao seu lado, as duas sempre sentam
juntas para ver a novela das 18 horas. Gosto da relação harmônica que elas têm,
minha casa tem cheiro de vida, cores, e muito amor por todos que a frequentam.

— Sogrinha — chamo me sentando ao seu lado — o que acha de sair com


suas amigas e dormir na casa de uma delas ou na sua casa?

— Oh, sem aviso, tem algo de especial para hoje? — pergunta sentindo
minhas intenções.

— Sim — contenho um pequeno gritinho de animação — estou pronta.

Os olhos dela brilham com a felicidade. Eu amo a minha sogra e a relação


harmônica que construímos juntas. Ela ama a minha filha e ao Daniel, passamos
tempo juntas, mas cada uma respeita o espaço pessoal da outra, e quando eu e o
seu filho queremos a casa só para a gente, ela gentilmente vai passear com as
amigas e dormir fora. A casa dela fica no condomínio, mas não acho ruim sua
proximidade, e adoro como ela é compreensível.

— Finalmente — suspira aliviada — meu filho vai precisar de muito


espaço hoje para comemorar — se levanta — o que acha de irmos beber
Margarida? — pergunta a governanta.

— Uma ótima ideia, deixe os jovens se divertirem por hoje — levanta-se.


— Vou me arrumar.

— Eu também.

Elas saem da sala e eu corro para meu quarto, entro no banheiro tomando
um banho longo. Tenho duas horas até o Daniel chegar, peço comida quando
acabo de me lavar e vou fazer uma maquiagem e escovar os cabelos. Passo
perfume, coloco um vestido sexy e desço de pé descalço. Na sala, me sento no
sofá com a ansiedade me corroendo, a comida chega, arrumo a mesa, duas velas e
um buque de flores que ganhei ontem do Daniel no centro. Ouço o som da porta
abrindo e me apreço indo até ele.

Daniel tem um sorriso quando me vê, não contenho a euforia e pulo no seu
colo. Beijo seus lábios macios com fome, olho no fundo, de seus olhos azuis,
segurando seu queixo e deixo as palavras fluírem.

— Eu te amo — a voz grave me acompanha ao pronunciarmos juntos nossa


confissão.

Ele sorri apaixonado me beijando e caminhando comigo para o sofá. Nunca


pensei que receberia uma confissão ao estar me confessando, nosso time foi
perfeito.
Meu coração que tremia de medo de ser magoado novamente pode
finalmente se abrir e ser preenchido com um amor que transcende.
Daniel
— Eu te amo para cacete — seguro a bunda de Lira batendo seu corpo
contra a parede, a vontade de a devorar consumindo meu ser.

Finalmente, após cinco meses juntos, ela conseguiu se libertar para meu
amor. Nunca tive dúvidas de que esse momento aconteceria, de que seriamos um
só, de corpo e alma.

Nossa convivência é tranquila e apaixonante, não tiramos as mãos um do


outro mesmo após meses morando juntos e vivendo como uma família, o desejo
por ela e por tudo que podemos ter juntos explode como um vulcão no meu peito.

— Eu também te amo, muito — ela responde em meio a um gemido. Meto


a mão na sua calcinha encharcada pela bocetinha em chamas. Puxo para o lado
alisando as dobras molhadas.

Suas pernas escancham na minha cintura, os pés apoiados na minha bunda,


quando Lira começa a puxar meu terno. Mordo seu peito por cima da roupa,
agora que ela parou de amamentar, posso chupar o quanto quiser sem roubar o
alimento da nossa filha. Com a mão livre, desço entre nossos corpos abrindo o
zíper da calça, abaixo a cueca com dificuldade, o suficiente para colocar meu pau
para fora.

— Isso Daniel — ela geme rouca ao sentir meu pau contra sua bocetinha
— mete em mim amor — passa os braços no meu pescoço rebolando o quadril.

Puxo a calcinha para o lado encontrando a entrada que eu tanto queria.


Passei o dia pensando na nossa foda de manhã, e em como fomos interrompidos
pela Lizzie que queria ir para a casa do primo. Finalmente podemos terminar o
que começamos. Seguro forte o quadril de Lira me enfiando na minha casa,
penetrando seu corpo com todo o meu fervor e amor.

— Eu te amo — rosno embebido pela beleza que é a ter para mim.

— Eu te amo demais — ela responde beijando meus lábios. O batom


vermelho como sangue pintando sua boca gostosa a deixando mais atrativa.

Agora que pude finalmente falar que a amo com todas as letras, não quero
mais deixar de repetir as palavras que queimam em meu coração como uma
erupção solar. Eu nunca amei tanto uma mulher como amo a Lira, cada pequena
coisinha dela, o jeito como penteia o cabelo para a esquerda, a fala doce de
manhã cedo, o mau-humor quando acorda com a luz do sol nos olhos.

A forma, como seus olhos reviram quando meto tão forte nela, que minhas
bolas só faltam entrar na sua bocetinha apertada e quente. Ah porra de mulher
perfeita, a minha mulher, meu amor, minha vida, a única que me pertence e a
quem eu entreguei não só meu coração, mas a minha alma, e a promessa de uma
vida regada em amor e felicidade, tudo o que tivemos nos últimos meses.

— Sente meu amor quando te como gostoso? — pergunto, seu quadril


rebolando contra o meu, o peso de seu corpo seguro pelos meus braços. — Como
meu pau reverencia sua boceta.
— Sim, sim, sim — responde em meio a suspiros deliciosos.

— Olha como eu te amo — a puxo da parede. Saio de dentro dela, a


colocando deitada no sofá, fico entre suas pernas e inclino sua cabeça para a
junção dos nossos corpos. — Veja isso, Lira.

Seguro a cabeça do meu pau pressionando sua entrada e enfiando


devagarinho, sendo perfeitamente recebido por ela, por seu amor. Entro com
lentidão fazendo carinho no seu interior macio. Chego ao fundo, fincando uma
conexão intensa entre nossos corpos. Colo a testa na dela focando em seu olho,
unidos em um só.

— Sente o quanto eu te amo? Porra poderia te comer o dia todo enquanto


você goza no meu pau.

— Me fode gostoso amor — pede manhosa, segurando meu quadril —


mete em mim do jeitinho que eu gosto. Me toma como sua — beija meu queixo
fazendo aquela coisa que eu amo no sexo. Lira contrai os músculos internos
deixando ainda mais apertado seu buraquinho.

— Completamente minha — aperto sua nuca entre meus dedos. Desço um


pé apoiando no chão e deito seu corpo por completo, começando a socar nela
com carinho e amor, rápido e forte.

Do jeito que eu sei que ela gosta que eu a ame, da forma como eu amo
amá-la. O amor único que fazemos, dessa vez, sem nenhuma única barreira entre
nós, sem medos, temores ou hesitação. Estamos mais nus e vulneráveis do que
nunca. Completamente entregues.

Sinto um aperto do cacete nas bolas indicando que estou prestes a gozar.
Lira arqueia a coluna e pescoço, contorcendo as unhas enquanto fica muda,
perdida em seu orgasmo que sempre vem silencioso, cortando todos os sons
ensandecidos que ela faz enquanto é tomada pelo prazer. Um longe gemido me
indica que ela terminou de alcançar o ápice e eu derramo nela minha porra.

— Eu te amo — digo mais uma vez, por amor, o som saindo dos meus
lábios para ela.

Me deito ao seu lado, e ela se aconchega no meu peito.

— Eu te amo — ela sopra delicadamente — acabamos pulando o jantar que


preparei.

— Estou muito satisfeito, mas aceito a sobremesa — levo a mão a sua


bunda, tocando seu cuzinho por cima da calcinha. Já tem um tempo que tento
convencê-la a me dar a bunda e Lira fica hesitando, quem sabe agora.

— Você não vai comer o meu cu hoje — ela fala fazendo careta.

— É claro que vou, estamos apaixonados, é isso que apaixonados fazem.

— É? — Levanta-se ficando apoiada no cotovelo — pois eu deixo você


comer o meu cu se eu comer o seu.

— Vai ser com vibrador ou o pau de borracha? — arqueio a sobrancelha,


não a deixando me afetar.

Minha masculinidade não será intimidada por uma simples sugestão dela
comer o meu cu. Sei a quem meu pau pertence, e se chama a boceta da Lira. E a
vontade que o desgraçado tem de lamber o cuzinho rosado que sempre me olha
quando a como de quatro, acaba com ele, precisamos de uma prova, ou sou capaz
de perder as bolas de tanta vontade.

— Você não tem jeito — ri antes de descer o rosto me beijando — só uma


provadinha — ela fala.
— Provadinha é o que eu faço com a minha boca, e você ama quando meto
a língua aqui — círculo o buraquinho com o dedo, o tesão me corroendo
novamente.

— Sim, mas seu pau é enorme, não sei se cabe — franze a sobrancelha e
tampa minha boca antes que eu responda — vamos jantar, sim? Estou faminta por
comida.

— Vamos, depois eu como sua bunda — ela levanta e agarro sua cintura
trazendo seu rosto para mim — mas antes uma provinha.

— Meu Deus, Daniel! — Grita.

— Xiu — empurro seu quadril para baixo a fazendo ficar com as mãos na
mesinha de centro e a bunda empinada na minha cara. — Só uma provinha.

Levanto seu vestido vermelho, sexy. Puxo a calcinha por suas pernas
apreciando a delícia que é sua boceta inchada na minha cara. Estico a língua para
fora da boca provando de suas dobras, meto no seu interior sugando o mel que
sou viciado até o último fio de cabelo no meu corpo. Lira começa a gemer
remexendo o traseiro na minha cara, ela pode negar, mas adora quando a bolino
no cu.

Abro as bandas da sua bunda encontrando meu centro de desejo. Não faço
cerimonia antes de enfiar a língua na dobra enrugada e deliciosa, deslizo para
cima e para baixo, em movimentos circulares. Meu pau ganha vida ficando duro
como uma rocha. Ensandecido de vontade, eu lambuzo meu indicador antes de
enfiar no buraquinho da Lira. Ela geme chorosa, não é a primeira vez que faço
isso, há meses venho acostumando-a para ser comida por trás.

Sento-me mais para trás no sofá e puxo sua bunda, a trazendo para cima de
mim, meu pau servindo de acento para sua bocetinha que pinga. O dedo metido
até o talo no seu rabo. Prendo seu pescoço com uma chave de braço, colando seu
peitoral ao meu, começo a penetrar o dedo com mais agilidade enquanto ela geme
se contorcendo.

— Eu vou foder seu cuzinho. Coloque os pés no sofá e se abre para mim.

Lira não responde, ela apoia as mãos na minha coxa quando faz o que
mandei com o pé. Beijo sua bochecha quase não acreditando que estou prestes a
fazer isso. Agarro sua boceta a puxando para cima. Lira levanta o quadril, retiro o
dedo do seu cuzinho, lambuzo meu pau na sua boceta, fazendo-a me comer duas
vezes antes de tirar para fora.

Posiciono na entrada proibida que será desbravada por mim pela primeira
vez e estremeço com o calor da sua intimidade. Aperto o braço ao redor do
pescoço dela novamente, a imobilizando. A cabeça robusta do meu pau entra
arrombando o buraquinho. Lira grita, mas não tenta sair, se retrai, e deixo que se
acostume ao meu tamanho.

— Desça a bunda sentado no meu pau — ordeno.

Círculo seu clitóris com meu dedão, e outro dedo penetro na sua bocetinha
eufórica por atenção. Lira começa a descer fazendo pequenos sons de
desconforto, quando não aguenta mais ela para no ar. Deixo que leve o seu
tempo, enquanto acaricio sua boceta e controlo meus músculos para não meter
para cima, comendo-a do jeito que preciso avidamente. É muito mais apertado, e
sinto que vou gozar a qualquer segundo.

Quando finalmente ela volta a se sentir confortável e a lubrificação da sua


boceta escorre molhando meu pau, facilitando o deslizado. Lira retorna a descer.
Até sua bunda branca bater nas minhas coxas.

— Porra, é como perder a virgindade de novo — ela reclama.


— Ah, se é — eu digo no seu ouvido — e eu amo ser o seu primeiro. Beijo
a ponta de sua orelha.

Solto seu pescoço e Lira se senta com as mãos apoiadas no meu quadril
antes de começar a subir e descer a bunda. Aprofundo o estímulo no seu clitóris
enquanto aproveito a sensação nova de a possuir dessa forma. Os cabelos louros
batendo no meu rosto com os movimentos, nossos gemidos se misturando em um
único som.

— Goza Daniel, por favor — ela pede, percebo que está chegando ao ápice
do seu prazer, mas não sei se conseguira gozar assim.

Libero meu gozo dentro do seu cuzinho com um gemido rouco. Ela para de
se mexer e sai com calma de cima de mim, deitando-se no sofá. Abro suas pernas
caindo de boca na sua bocetinha. Mal encosto em seu clitóris inchado e ela grita,
gozando na minha cara. Subo beijando seu corpo coberto encontrando seus
lábios.

— Obrigado — digo com um sorriso satisfeito — acho que não posso me


mexer por enquanto.

— Nem eu — confessa baixinho, um sorriso doce nos lábios — nunca mais


você come meu cu.

— Amanhã mesmo voltamos a praticar — a puxo para mim.

Sim, é exatamente essa a vida que eu quero, amor e prazer com a mulher
que amo.

Sinto as forças voltando para o meu corpo e pego Lira no colo a levando
para o nosso quarto. Como ela não recusou quando a prensei na parede mais
cedo, eu já imaginava que a casa estava vazia para nós dois aproveitarmos.
Sempre que queremos privacidade deixamos a Lizzie com os tios e minha mãe
desaparece gentilmente.

Entramos debaixo do chuveiro e a produção que ela fez para a noite desce
pelo ralo, quando a lavo com carinho e paixão. Tem algo que quero muito fazer,
mas que ainda não posso, por achar que não é o momento propício. Lira acabou
de declarar seu amor sem medo, e o próximo passo que quero dar já faz meses,
me parece totalmente oportuno.

Mas ela merece mais, merece romantismo e tudo que ela nunca sonhou que
receberia. A beijo com um sorriso arteiro, a ideia brotando na minha mente como
uma música.

Com certeza vai ser perfeito e a deixará sem folego.


Lira
Eu não conseguia acreditar onde estávamos.

Se passaram dois meses desde que declarei meu amor ao Daniel e em


algumas semanas será o aniversário da Lizzie. Achei muito estranho quando o
Daniel me chamou para uma viagem de última hora ao Rio de Janeiro, mas
aceitei sem pensar muito.

Só que o estranho começou no segundo em que a Lizzie não veio com a


gente, e quando me despedi, minha menina tinha o sorriso espertinho de quem
sabia de algo que eu não tinha conhecimento, minha sogra também. Até mesmo o
Levi, que piscou sugestivamente quando saímos. Mas nunca imaginei que nosso
destino seria ao Cristo Redentor em um momento que ele está em manutenção.

São 16 horas da tarde e não tem outras pessoas aqui além dos encarregados
pela manutenção. Encaro o Daniel sem entender o que está acontecendo. Ele sorri
de orelha a orelha segurando minha cintura.

— Foi difícil conseguir, mas obtive autorização para subirmos até a cabeça
do Cristo Redentor e olhar a cidade pelos olhos dele. Consegue imaginar como
será isso?
— Não pode ser verdade — viro completamente o encarando com a boca
aberta, totalmente incrédula. — Como é possível?

— Eu tenho um amigo que a empresa faz manutenção na estátua, ele me


disse quando aconteceria e o que eu precisaria para poder conseguir autorização.
Acredite ou não, mas o Bispo nos deu permissão para estar aqui.

— De novo, como você conseguiu isso? — pergunto completamente


incrédula.

— Louis me ajudou — dá de ombros como se isso respondesse a muita


coisa — o que importa é que atendemos a todos os requisitos e podemos subir lá.
Vem comigo? — Estende a mão.

Seguro sua palma sentindo a adrenalina corroendo meus poros, de emoção


por saber que iremos subir na cabeça do Cristo Redentor. Sou italiana e católica
de nascença. Nunca fui extremamente fervorosa a igreja e religião, mas acredito
em Deus com uma fé inabalável, e poder estar aqui fazendo isso, é algo que eu
nunca imaginei que teria a honra de realizar.

Com a ajuda de três funcionários que ficam perto a todo o momento, eu


venço o medo subindo as escadas. Na metade do caminho o cansaço me bate e
preciso descansar um pouco. Estamos dentro da estátua, a escada é muito estreita
e frágil. Temos equipamento de segurança e pessoas capacitadas nos
acompanhando. Apesar do perigo que é subir algo assim, eu não consigo sentir
medo.

Estou preenchida pela fé que carrego comigo mesma e pelo amor e


confiança no Daniel. Sei que ele nunca me colocaria em perigo ou deixaria algo
de ruim acontecer comigo. Recupero o folego, bebo água e retornamos a
caminhada. Quando chegamos ao topo, a primeira coisa que vejo são os raios de
sol fracos do crepúsculo.
Através dos olhos da estátua eu vejo a cidade do Rio de Janeiro banhada
pelo crepúsculo. Seguro na estrutura com o coração explodindo em poder
contemplar tamanha imagem. Giro no calcanhar para falar com o Daniel e o
encontro de joelhos segurando uma caixinha de veludo vermelha.

— Ai meu Deus — levo a mão a boca não conseguindo acreditar no que


está acontecendo — Daniel você vai? — perco a fala.

A emoção trava a minha garganta, um raio de luz toca o rosto do Daniel,


iluminando seus olhos azuis brilhantes, pelas lágrimas contidas. O rosto
resplandecendo felicidade e amor.

— Lira Vittileno, eu te amo, você é a pessoa que representa o meu tudo no


meu universo. Ter te encontrado e conseguido superar as adversidades que
apareceram na nossa vida, foi um verdadeiro presente dos céus. Um anjo
mandado somente para mim com cabelos loiros e olhos azuis. Quando penso em
como Deus foi bondoso por me dar você, eu não conseguia deixar de saber que
tinha de contar com a presença dele nesse momento. E eu te trouxe aqui, no lugar
em que mais sinto que somos abençoados e cuidados por ele.

Soluço, suas palavras tocando meu coração como uma pluma.

— Você aceita se casar comigo? — abre a caixinha mostrando anel de ouro


branco com um diamante em formato de coração — aceita que eu faça parte da
sua vida, seja a sua metade, e juntos vivamos sobre a benção e proteção do
Senhor que traçou nossos destinos e nos trouxe até aqui?

— Eu aceito — caio de joelhos apertando forte seu pescoço, explodindo


em uma felicidade inimaginável. Tudo estava indo bem, dando certo e esse
momento é o mais perfeito e raro de todos.

— Eu te amo tanto — ele sussurra no meu ouvido.


— É você, Daniel — seguro seu rosto, falando em meio ao choro de
felicidade — o homem que me foi dado como um presente de Deus, o único por
quem busquei a vida toda, e Deus guardou para aparecer no momento certo.
Podemos ter cometido erros no caminho, mas conseguimos chegar até aqui.
Nada, nem ninguém, será capaz de nos fazer ficar longe.

Beijo seus lábios macios, sentindo os pelos da barba arranhando meu rosto.
Os pelos que eu amo, o rosto que eu amo, os lábios que eu amo, o nariz que eu
amo, a cabeça que eu amo, o corpo que eu amo. O homem que eu amo, e que não
poderia ser outro além dele a dividir o resto da minha vida, vivendo banhada por
amor.

— Deixa eu colocar o anel — ele segura meu dedo anelar colocando a


aliança que desliza perfeitamente. Então noto um segundo anel na caixinha, uma
aliança de ouro branco grossa e masculina.

— E esse eu coloco em você — o pego na mão inserindo no seu dedo.

— Minha noiva — beija meus lábios.

— Meu noivo — o abraço forte, o cheiro sexy mais forte do que nunca.

Ele levanta me levando consigo, me gira nos seus braços me fazendo olhar
a vista da cidade aos nossos pés. Ficamos observando o crepúsculo na cidade
maravilhosa. Eu achava que conhecia a paz, que sabia o que era respirar aliviada,
e sem medo, mas nada se compara ao sentimento no meu peito.

A calmaria e o calor, a certeza e o conforto, o amor e a benção. O Cristo


Redentor tem o poder de nos fazer protegidos e guardados pelo Criador. Sempre
senti isso quando vinha aqui, mas agora é diferente. Eu sinto que a minha vida foi
eternizada nesse momento, pelos céus e pela vontade de Deus.
Que ele apoia a minha união com o Daniel e me dá a única certeza que eu
poderia querer: a que serei feliz eternamente com a minha família e o homem
escolhido pelo Senhor, para ser o meu, felizes para sempre.

Quando as luzes internas na estátua acendem, somos informados que


devemos descer. Com o mesmo cuidado que subimos, descemos, dessa vez,
quando o cansaço me bate, vem junto o sentimento caloroso de ter realizado algo
importante, de que vale a pena a dor nas pernas.

Descemos do Cristo e pegamos o elevador. Só nós dois na cabine, sentados


e colados, meu rosto na curva de seu pescoço. Sua boca contra minha testa.

No final do percurso um carro nos espera e quando o veículo entra em


movimento suave, eu adormeço, cansada pela escalada, realizada pela minha
nova realidade. Acordo com o Daniel me chamando, descemos do veículo e
vamos para o hotel. Noto fotógrafos no lado de fora, que tiram foto da gente. Já
me acostumei com os flashs desde que voltei a participar de uma produção.

Os anúncios do programa que vai ao ar em poucas semanas têm chamado a


atenção por ser uma produção minha, assim como os novos quadros que
prometem um entretenimento para crianças com aprendizado e inovação, algo
nunca visto pela televisão brasileira. Também assinei para dirigir um novo filme
baseado em um projeto de uma editora de livros famosa no Brasil, o que tem
atraído a atenção dos fãs que esperam uma adaptação digna da obra.

Só não esperava que isso fizesse fotógrafos me acharem no Rio de Janeiro,


em uma viagem não anunciada para me flagrarem em momento íntimo com meu
noivo. Aproveito a oportunidade e mostro o anel a câmera, louca para espalhar
que estou noiva do Daniel aos quatro cantos do mundo. Nunca achei ruim a
exposição a mídia, comigo, ela acontece de forma menos intensa que aos atores, e
ajuda positivamente na minha carreira.
Faz meu nome ficar marcado na mente das pessoas sempre que leem uma
nova matéria e assistem a um filme indicado pelo artigo. Sempre vou me orgulhar
das minhas produções e espero conseguir o máximo de divulgação para o
programa, que contará com a participação da minha princesa como a ajudante
mirim de uma das apresentadoras.

Serão quatro no total, duas mulheres e um homem. E três crianças


auxiliando-os, com um estúdio aberto ao público de 20 crianças, mantendo um
pouco do que era antes com a minhas ideias. Sinto um puxão na minha mão e
vejo Daniel me encarando com um olhar divertido, ele sabe que acabei me
perdendo novamente nos pensamentos e eu rio envergonhada.

— Pega no flagra.

— Ao menos hoje, sua workaholic[11] maníaca, me dê toda a sua atenção.

— Você a tem todos os dias — beijo sua mão.

— Depois era eu o workaholic — fica emburrado e acho graça da sua


manha.

— Prometo te compensar pela minha distração — entramos no elevador


que tem mais duas pessoas presente.

— Com certeza você vai — responde me abraçando por trás.

Mantemos a descrição na frente das pessoas, mas quando passamos pela


porta do quarto, Daniel agarra minha bunda me colocando no seu colo,
caminhando para a hidromassagem no banheiro da nossa suíte presidencial.
Tiramos a roupa e entramos aproveitando a vista da janela com vidro, que impede
que nos vejam do lado de fora, mas por dentro vemos tudo que acontece do outro
lado.
Fazemos amor com a vista do Rio de Janeiro, lento e demorado. Depois
descemos para jantar e curtir um pouco da noite agitada na cidade. Terminamos
nosso passeio andando de mãos dadas no calçadão de frente para o mar. A brisa
fria da noite ricocheteando nossos rostos, apesar do cansaço, eu não quero que
esse dia termine nunca.

— E agora, podemos ter nosso segundo filho? — ele pergunta com a boca
contra minha bochecha.

— Não quando estou prestes a iniciar um novo projeto. Não quero


engravidar e passar pelo medo que foi com a Lizzie.

— Aquilo nunca aconteceria, eu te prenderia em casa e arcaria com todo o


escândalo e multas.

— Não é só escândalo e multas — imito seu jeito de falar — mas também a


minha carreira e o meu nome. É meu primeiro projeto no Brasil, quero fazer
direito.

— Um ano, que tal?

— Um ano para o quê?

— Você trabalha no programa com a Lizzie por um ano, vamos nos casar
em breve, e depois de um ano você para de tomar o anticoncepcional e deixamos
acontecer naturalmente a vinda do nosso menino.

— Você tem tanta certeza de que será um garoto — constato — e eu nem


engravidei ainda.

— Mas vai — afirma — e será um menino, igual ao pai.

— Que seja menos teimoso — o olho, brincalhona — mas posso aceitar


sua ideia. Com um ano posso deixar a produção em boas mãos para outro diretor
assumir caso eu não consiga trabalhar e cuidar o suficiente do bebê, como foi
com a Lizzie, eu pauso tudo e me dedico ao meu filhote.

— Viu, até você já aceitou que será um menino.

— 50% de chances para homem, e 50% para menina.

— Podemos tentar mais vezes — ele pausa — é só que eu já vou fazer 44


anos, não quero estar velho demais para cuidar dos nossos filhos. Você ainda está
na flor da idade, mas eu sinto que estou correndo atrás de algo, e não quero
perder absolutamente nada, inclusive meus netos.

— Se a Lizzie tiver filhos aos 30 anos, você será um avô aos 71 anos. Com
certeza ainda estará em forma e com tudo em cima.

— Não tenho dúvidas quanto a isso, minhas netas terão ciúmes do avô
bonitão, e os rapazes vão se aproveitar da minha herança para impressionar as
meninas.

Gargalho com o futuro que ele me faz ver. Daniel tem razão, nossa
diferença de idade indica que enquanto eu estiver vivendo algumas coisas no meu
tempo mais nova, ele estará mais velho, e talvez não possa aproveitar como
deseja os filhos e netos devido à idade.

— Podemos ter mais de um filho com pouca diferença entre um e o outro


antes dos seus 47, o que acha?

— Eu adoro essa ideia, vamos fazer gêmeos. — Segura minha cintura


pausando nossa caminhada — podemos começar agora.

— Bobo, não podemos decidir se serão gêmeos ou não — sorrio beijando


seus lábios apaixonada — mas podemos ter ao menos mais uns três. O que acha?
— Quantos você quiser — responde em um sussurro antes de finalizar o
assunto com muitos beijos.

Quando voltamos para o hotel, fazemos amor mais uma vez antes de
adormecer.

Nossa viagem tinha tudo para acabar de forma perfeita, se não fosse pela
mensagem que o Daniel recebeu no celular no dia seguinte que roubou a cor do
seu rosto e apertou meu coração como um punhal.
Daniel
Tomamos café enquanto verifico as notícias. Lira relaxa no meu colo
mastigando uma torrada, beijo seu ombro. Uma mensagem chega do meu
advogado. Abro e me deparo com uma notícia que não esperava ler.

“Verônica foi solta ontem de manhã, como sabia dos seus planos, resolvi
não informar até você voltar para casa. Contudo, uma ligação da sua mãe foi
feita para a polícia há poucos minutos, informando que a Verônica foi até a
Creche em que a Olivia trabalha, e a Lizzie estava na sala de aula com o primo.
Na portaria, Verônica se passou por parente da Lizzie tentando contatar a
criança. Olivia tomou uma atitude rápida, não permitindo a entrada e ligou para
a sua mãe, que chamou a polícia no mesmo instante, pedindo que não
permitissem o contato da mulher com a criança. Estou indo para a creche nesse
momento, por isso não te liguei. Quando ver a mensagem me ligue, se eu não
atender, espere.”

— Precisamos ir para casa agora — digo me levantando com ela no colo —


como essa desgraçada descobriu sobre a Lizzie e onde ela estava?

A raiva borbulha como larva escaldante no meu interior. Eu tinha medo de


que a Verônica fosse solta e viesse atrás da minha família. Contratei seguranças
para ficarem a vista e à paisana. Mas a desgraçada ainda conseguiu uma forma de
se aproximar. Se a Lizzie estivesse saindo da creche ou entrando, ela poderia ter
feito algo com a minha filha. Soco a mesa estremecendo os talheres em cima
dela.

Viro o rosto encontrando a Lira com os olhos arregalados e cheios de


medo, minha leoa selvagem mudou muito desde a primeira vez em que a vi. A
gravidez e o risco que correu, abalou sua confiança e a fez ficar mais temerosa.
Aprendi a lidar com a sua nova versão, mas o que preciso agora é da leoa
selvagem que me deixou sem gozar, da atrevida que falava o que queria na minha
cara e colocava a todos aos seus pés. Não temos mais tempo para sermos
covardes ou hesitar.

— Lira — seguro seus ombros a fazendo me olhar, atônita. — Você


entende o que está acontecendo?

— Eu vou matar essa mulher — responde indiferente. Estranho sua atitude,


dou um passo para trás a observando e então percebo que eu estava errado.

Lira não tem medo, ela está com tanto ódio que paralisou no canto. A ponta
de seus dedos treme, com a vontade de poder fazer algo contra a Verônica. Nunca
a vi dessa forma, com o olhar perdido e o corpo paralisado. Seguro seu rosto
fazendo nossos olhares se encontrarem.

— Eu faço isso, você não pode sujar suas mãos — seguro as mãos dela —
elas não merecem ser manchadas de sangue.

— O que você vai fazer? — Começa a relaxar os músculos tensos.

— Não tenho outra opção, Verônica já provou diversas vezes que não é
confiável e quer me destruir. Chegar perto da Lizzie foi a gota final, não vou
deixar essa mulher ter a mera chance de machucar a nossa filha ou a você — aliso
sua bochecha — vamos voltar para casa, vou deixar vocês duas seguras e fazer o
que é preciso.
— Você consegue lidar com o peso da morte de alguém?

— Eu consigo, sabendo que fiz isso para manter as duas pessoas mais
importantes para mim seguras. Não é justo que a Verônica possa fazer as
maldades dela e continue se safando, ela vai usar novamente a desculpa da
loucura, não vou arriscar vivermos nossas vidas com medo, temendo que a
qualquer momento ela apareça novamente.

— A vadia saiu ontem do hospital e já foi atrás da Lizzie, como ela


descobriu onde ela estava?

— Não sei, mas vamos descobrir.

Puxo a mão dela pegando nossas malas, guardamos as coisas rapidamente,


faço o check-out na recepção enquanto o carro vem nos buscar. Entramos e
vamos direto para o aeroporto. Tento falar com meu advogado, ou minha mãe,
mas não consigo, a linha fica dando ocupada e quando embarcamos no jatinho
tenho de desligar o telefone.

— Conseguiu falar com a Olivia ou seu irmão?

— Não — ela desliga o celular me encarando séria — o Levi deveria ter


entrado em contato, talvez ele ainda não saiba que isso aconteceu.

— Ou nada de ruim aconteceu para eles acharem que deveriam incomodar


a nossa viagem — penso nas possibilidades — todos sabiam que eu iria te pedir
em casamento e passaríamos a semana no Rio de Janeiro comemorando nossa
união.

— Eu mato meu irmão se ele pensar que uma maluca indo atrás da minha
filha não deve ser comunicado no mesmo instante — aperta os punhos.

— A Lizzie não se machucou, essa certeza eu tenho ou nossos celulares


teriam tocado feito, loucos.
— Espero — morde os lábios — céus, desde a minha gravidez, não sinto
uma aflição tão grande quanto essa.

— Vamos resolver — beijo a dobra de seus dedos.

— Sim, faça essa vadia desaparecer — o olhar afiado e sem hesitação.

Lembro que o irmão dela fez o mesmo, usando da ajuda da máfia italiana
para proteger a família dele. Não preciso de ajuda externa da máfia, sou capaz de
resolver isso com os meus contatos. Crescer na periferia me deu vantagens que
poucas pessoas conhecem. Nem todo o dinheiro que usei fundando a minha
empresa era limpo.

Vou precisar pousar e fazer o contato pessoalmente para limpar qualquer


rastro eletrônico. Só preciso que eles façam a Verônica sumir sem deixar rastros,
eu mesmo vou matar aquela desgraçada, apertar seu pescoço como uma galinha,
só vou parar quando escutar o estralo. Essa desgraçada já fodeu comigo de várias
formas e me roubou dois anos da vida da minha filha, nunca mais vou permitir
que ela me cause a sombra de um arrepio.

Poucas horas depois estamos pousando no aeroporto de São Paulo. Ligo o


celular assim que descemos e entramos no carro dirigido por meu segurança. O
homem me olha preocupado, faço um sinal indicando que pode começar a falar.

— A Verônica foi solta ontem e hoje presa novamente na frente da creche,


ao tentar contato com a Lizzie. A polícia foi rápida e discreta na ação, Lizzie não
faz ideia de que isso aconteceu, sua mãe está com ela em casa. O senhor Levi
também ficou na sua residência fazendo a proteção da sobrinha, mesmo com os
seguranças rondando a casa e a Verônica presa.

— O que ela queria? — Lira pergunta.


— Sua instabilidade mental está sendo um problema para descobrir os
planos da mulher. Ela fica murmurando que a Lizzie é filha dela e só foi buscar a
menina. Apesar do teatro tentando se passar de louca, a polícia está atenta a uma
possível enganação, já que a mulher conseguiu a informação e foi parar na creche
um dia após sair do hospital.

Um grito escapa dos lábios de Lira, ela leva a mão a boca. Não consigo
acreditar que a desgraçada está falando que a Lizzie é dela. Isso não faz sentido,
ela nunca quis ter filhos, me fez acreditar que eu era estéril por anos. As
autoridades podem a taxar de louca, mas eu sei a mente diabólica que existe
debaixo da fachada, do rosto bonito e das palavras desconexas.

Nunca mais serei enganado por essa vadia.

— Vamos direto para casa, quero ver a Lizzie e depois para a delegacia.

— Sim senhor.

O caminho é feito com velocidade. Lira se mantem apreensiva enquanto


aliso seus cabelos tentando dissipar o medo dela e acalmar o ódio. Sou capaz de
matar a Verônica na frente da delegacia. Pego meu celular e mando uma
mensagem para o número que sei de cabeça “preciso te ver” sei onde ele vai
aparecer e quando.

Chegamos em casa e minha mulher corre para segurar nossa filha no colo.
Lizzie ri ao nos ver sabendo que eu ia pedir a mãe em casamento. Beijo seus
cabelos e inspiro seu cheiro de bebê, aliviado por ela não ter se machucado ou
presenciado alguma cena marcante. Minha mãe me encara preocupada, seus
olhos não mentem: ela sabe quem vou encontrar e o que irei fazer, ele deve
manter mais contato com ela do que comigo. Levi toca meu ombro pedindo para
falar, deixo minha mulher e filha na sala e o sigo para meu escritório.
— Essa mulher não pode continuar a solta — fala firme — entrei em
contato com o Louis e ele disse que pode nos ajudar, como da outra vez — fala
sugestivo. — Ela estava na creche da minha esposa, perto dos nossos filhos, não
existe justiça que a mantenha presa por causa disso, principalmente com a
alegação dela de doença mental.

Recebo uma mensagem do meu contato “a caminho”. Encaro o Levi, ele


não precisa saber dos meus planos. Somente a Lira, quanto menos pessoas
tiverem ciência, menores são as chances de eu ser descoberto.

— Eu vou resolver isso, fique aqui e cuide delas, preciso ir — aperto sua
mão. Apesar de não falar, ele entende o que eu peço.

Vou até as minhas meninas e beijo novamente a cabeça da Lizzie, ela


agarra meu rosto me enchendo de beijinhos.

— Tudo celto?

— Sim, a mamãe aceitou — beijo seu pescoço e a ponho no chão — olha


como a aliança é linda — aponto o dedo da Lira.

— Uau, quelo uma, papai — pede com os olhos brilhando.

— Mais tarde compramos a sua. — Beijo os lábios da Lira — preciso ir.

— Toma cuidado — pede baixinho.

— Vocês também — beijo sua testa e da minha menina saindo.

Entro no carro e instruo o segurança para onde iremos. Não vou à


delegacia, meu advogado vai cuidar da situação naquele lugar, se eu vir a
Verônica agora, sou capaz de a enforcar por se aproximar da minha família
novamente. Sigo até o local que sei que sempre poderei encontrá-lo, já se passou
anos desde a última vez que nos vimos e agora vou aceitar a oferta que ele me fez
quando a Verônica e meu ex-sócio me apunhalaram.

Uma mensagem chega no celular, do meu advogado.

“O advogado da Verônica chegou. Ela foi considerada instável


novamente, mas como não fez nada com a Lizzie ou qualquer outra criança, saiu
sem uma investigação ser aberta, somente um alerta de que ela deve procurar
tratamento e ficar longe de vocês. Estou indo para o Ministério Publico abrir
um
processo, vou solicitar ao juiz uma ordem de restrição para vocês três. Por hora,
Verônica foi solta e não sei do seu paradeiro.”

Aperto o celular com ódio, sabia que isso aconteceria. A maldita cobra
nunca paga pelos crimes que comete. Ela não é instável, mas a porra de uma
psicopata que engana a qualquer um. Inclusive a mim, meus dias sendo feito de
palhaço terminaram quando vi quem ela realmente era. A desgraçada vai receber
de uma vez a conta, por mexer comigo.

Já é noite quando estaciono na frente da minha antiga casa na periferia.


Desço deixando meu segurança no carro, destravo o portão e entro. Nos fundos,
uma passagem no muro que usava quando era criança ligando minha residência
ao do vizinho, passo por ela com dificuldade, ganhar músculos e ter crescido
dificulta usar a passagem de uma criança.

Na antiga casa eu vejo a figura sombria me esperando contra a porta da


cozinha. Ele entra e o sigo. Longe de olhares que poderiam nos foder se
descobrissem o nosso envolvimento. Uma luz acende e revejo o rosto que não via
há mais de quatro anos.

— Oi — ele fala — finalmente decidiu aceitar a minha proposta?

— Sim, a traga a mim, quero matar ela com minhas próprias mãos.
— Imaginei que pediria isso — me entrega um celular descartável — vou
te mandar a localização de onde a deixarei para você. Quando acabar o serviço
avise que descarto o corpo, nunca mais saberão dela.

— Obrigado — aperto sua mão — como você tem estado?

É uma pergunta formal, eu sei tudo da vida dele, acompanho de perto todas
as suas façanhas, como sei que ele tem feito comigo.

— Bem, os negócios se expandindo como nunca — sorri de lado —


parabéns pelo noivado.

— Mande lembranças a sua esposa — solto sua mão — queria poder te


encontrar mais, sem ser dessa forma, mas não posso envolver a VITTILENO nos
seus esquemas.

— Eu sei, o italiano conseguiu um bom parceiro. Os contatos dele são


ótimos também, iria me sentir ofendido se procurasse a eles ao invés de mim.

— Sabe que eu nunca faria isso.

— Sim, até mais, irmão.

— Até irmão.

O abraço, faz anos que não nos vemos ou podemos ter contato. Com um
tapinha nas costas vou embora, passando pelo mesmo lugar e entrando no carro.
Só preciso esperar seu retorno. Ele nunca falhou ou foi pego, não tenho dúvidas
de que irá ter sucesso dessa vez.

Retorno para casa, e minha esposa dorme com a Lizzie na cama. Converso
um pouco com o Levi e depois ele vai embora. Pego o uísque e um copo, me
sento no terraço observando o céu escuro, pronto para dar um fim nessa história.
No meu terceiro copo sinto a presença da minha noiva, ela contorna a cadeira e se
senta no meu colo, com a mão no meu pescoço, seus olhos pedem respostas.

— Quem você foi encontrar e o que combinaram?

— Tem algo sobre mim que você não sabe.

— Pode me contar?

— Claro — deito sua cabeça no meu peito, inspirando seu aroma de flores
— eu tenho um irmão.

— Como? — ergue o rosto — eu achava que você era filho único.

— Para todos os efeitos, meu irmão morreu quando tinha 17 anos.


Ninguém, além da minha mãe, sabe que ele está vivo ou da nossa ligação, ele é
mais velho, agora deve ter uns 50 anos.

— E por que ele se fingiu de morto?

— O Leandro se envolveu cedo com o tráfico de drogas, na época minha


mãe ficou apavorada, mas o desgraçado levava jeito para a coisa. Aos 17 anos ele
sofreu um ataque de uma facção rival e ficou entre a vida e a morte, o líder da
facção dele tinha apresso pelo Leandro e forjou a sua morte, queria criar um
fantasma. Meu irmão sumiu por anos, quando eu terminei a faculdade ele
apareceu novamente, me dando dinheiro para eu investir na minha empresa.
Leandro subiu tanto na hierarquia da facção que ele já comandava vários
territórios e era procurado pela PRF, expandiu sua influência criminosa para
outros países.

— Minha nossa — dizer que a Lira ficou surpresa é um eufemismo — a


polícia sabe que vocês são irmãos?
— Não, ele atua com outro nome na facção, ou como agora é chamada,
organização criminosa. Se encontra com a nossa mãe em segredo em ocasiões
explorativas, comigo só quando realmente preciso dele, como agora. Quando a
Verônica e meu socio me deram o golpe, ele apareceu me oferecendo matar
ambos, mas neguei, ainda estava processando tudo que aconteceu. Mas depois de
hoje, entrei em contato com ele, Leandro vai trazer a Verônica para mim, vou
encerrar de uma vez esse assunto.

— Não tem risco de te descobrirem?

— Não, Leandro é cuidadoso, como o líder da maior organização criminosa


do país, ele não se expõem ao perigo de ser preso ou deixa rastros. Será tudo
silencioso e rápido.

— Seu irmão é um criminoso, mas você fala dele com orgulho e amor, não
sente raiva pelas coisas ruins que ele deve ter feito?

— Elas não me afetam, para mim ele sempre será meu irmão mais velho
que cuidou da família, mesmo a distância e em segredo — bebo meu uísque —
não procuro saber os crimes do Leandro, me mantenho longe e sem vínculos. E
agora vou usá-lo para pôr um fim em um demônio.

— Certo — ela deita a cabeça novamente no meu peito — é muito para


assimilar, mas meu irmão tem ligação com a máfia italiana, então posso aceitar
mais fácil seu irmão. Vou conhecer ele um dia?

— Não — respondo limpo e seco.

— Certo — beija meu peito — vamos dormir.

Lira me leva pela mão e pelo resto da noite esqueço os problemas.

Demora três dias para eu receber uma mensagem com um endereço. Parto
após me despedir, preciso ser rápido e cuidadoso. Lira e minha mãe serão meu
álibi, para todos estou em casa doente com a minha família, mas somente elas
sabem que fui encontrar os homens do Leandro em um galpão há mais de 10
quilômetros da cidade, abandonado em um ferro-velho. Entro na estrutura vendo
cinco homens dele e a Verônica amarrada na cadeira, sento-me de frente para ela.

— O que você queria com a minha filha? — pergunto, a desgraçada ri.

Os cabelos ruivos emaranhados ao redor do rosto, os olhos verdes letais na


minha direção, as mãos amarradas atrás do corpo que veste um vestido vermelho.
A sombra da mulher linda que foi um dia, mas a encarnação do demônio que me
assombra.

— Você não pode ter filhos, eu garanti isso. Fui só dar um fim na menina
— estico a mão acertando seu rosto com tanta força que a cadeira cai no chão —
finalmente está mostrando seu lado verdadeiro? — pergunta cuspindo sangue no
chão. — Você era a minha marionete, mas eu nunca disse que te permitiria
brincar com outra dona.

— Já chega das suas merdas.

— Sabia que é fácil descobrir tudo da vida dos Vittileno? É só pesquisar na


internet — puxo seu cabelo a fazendo ficar sentada novamente — se não fosse o
maldito porteiro eu teria pegado aquela coisinha feia. Eu não te dei permissão
para ter outra! — grita.

— Eu deveria ter te matado antes — fico em pé — não cometerei o mesmo


erro duas vezes.

Aperto seu pescoço encarando os olhos que eu odeio e que me trouxeram


desgraça, manipulação e dor. Ela esganiça, tenta se mexer, mas não consegue
fazer nada enquanto aperto cada vez mais seu pescoço fino, o rosto fica
vermelho, os olhos quase saltando para fora da órbita. Um estralo e a vida em
seus olhos desaparece. Não sinto nada além de alívio por saber que ela nunca
mais tocara em que eu amo ou armara contra mim.

Saio do galpão com um sentimento sombrio no peito.

Em casa vou direto para o banho, não posso tocar minhas meninas com as
mãos de um assassino. Tomo uma ducha demorada, enrolo a toalha na cintura e
saio do banheiro, na minha cama, vejo os cabelos louros brilhando com a luz do
sol. Minha noiva e minha filha me esperam com um sorriso tranquilo. Ela sabe o
que fiz e ainda me ama.

Caminho até elas, me deito ao seu lado. Lizzie sobe no meu peito e beija
minha bochecha antes de adormecer tranquila. Lira se aproxima beijando a ponta
do meu nariz e sorri, me dando a paz que perdi. Eu não matei alguém hoje, eu
impedi que a minha família fosse machucada. A puxo para perto, com minhas
duas vidas me dando calor, eu deixo a escuridão ir embora, sendo espantada pelo
raio de luz delas.

Lira
— Corta! — grito para o set de filmagens.
O primeiro episódio ao vivo de “Brincando de ser criança” foi ao ar, e
conseguimos a máxima de audiência para um programa infantil. Por
coincidência, hoje é o dia do aniversário da Lizzie, que sorri alegre ao lado dos
colegas de filmagem. Minha menina se saiu perfeita, uma apresentadora nata, e
consigo visualizar o seu futuro na frente das câmeras.

Uma atriz de grande nome e sucesso. Vou garantir de participar de todas as


suas atuações, não me importo que me chamem de mãe coruja, nesse segundo,
meu coração explode de felicidade pelo meu projeto e minha menina que faz 3
anos, sorrindo e pulando chamando as outras crianças para irem à festa dela hoje.

— Parabéns — reconheço a voz grave atrás de mim, levanto da cadeira


virando e encontrando meu pai com um enorme buque nos braços.

— Pai! Como o senhor entrou aqui? — vou para seus braços recebendo um
abraço caloroso.

— Ora! Após anos fazendo comerciais nessa emissora e sendo um


patrocinador ativo de muitos programas, eu sou VIP para entrar e sair quando
quiser. — Dou risada do seu jeito de falar.

— Com certeza.

— Estou orgulhoso de você — me entrega as flores — mas agora quero


levar minha netinha para almoçar e comemorar o aniversário dela, vamos?

— Se você conseguir roubar a atenção da Lizzie — aponto com a cabeça


para a rodinha com quem ela interage — ela vai ser uma estrela.

— Com certeza, Lizzie Vittileno Albuquerque, a maior atriz italiana


vivendo no Brasil e roubando holofotes.

— Foi bom eu ter registrado a Lizzie com o sobrenome do Daniel, facilitou


a paternidade dele ser reconhecida nos documentos dela.
— É verdade — beija minha testa — agora vou pegar a minha fofura.

Ele vai na direção da Lizzie, que ao ver o avô grita feliz se jogando nos
braços dele. Meu pai e o Marcelo, pai da Olivia e Bianca, tem passado bastante
tempo juntos e agora que conheceram minha sogra e o grupo viajante delas, os
solteirões estão com a corda toda, se divertindo em grupo. Sorrio feliz por poder
aproveitar tamanha felicidade e realização.

Já faz um mês que o caso com a Verônica aconteceu, ela foi dada como
desaparecida, Daniel foi interrogado, mas com o álibi que forneci, não existem
suspeitas sobre ele. Sei que, o que o meu noivo fez, foi algo extremamente
pesado, e que às vezes ele acorda com pesadelos lembrando de quando matou a
Verônica. Mas foi o necessário, a justiça não agiria rápido o suficiente a
trancando em uma prisão sem que ela cometesse um crime grave.

Aquela mulher poderia ter machucado a mim, Lizzie ou ao Daniel. Posso


não ser vidente, mas não estava disposta a arriscar um futuro feliz por uma
desgraça acontecendo em nossas vidas. Quando ele precisa, falamos sobre o que
aconteceu e o conforto com todo o meu amor e luz. Nossos dias são tranquilos e
cheios de amor, o que ajuda a amenizar o impacto causado pela vadia.

Hoje é o primeiro aniversário do Daniel com a Lizzie e o homem está uma


pilha de felicidade, se ele pudesse, teria ficado no set com a gente. Mas devido a
uma carga roubada da VITTILENO, ele precisou ficar na empresa resolvendo os
problemas. A noite estaremos juntos no salão de festas e em uma semana
subiremos ao altar para selar a nossa união como marido e mulher. Não queremos
mais esperar nem um segundo.

Finalizo minhas atividades enquanto meu pai conversa animadamente com


a diretora de imagem. Percebo o clima quente entre os dois a quilômetros de
distância. Ele pode nunca ter amado novamente ou casado, mas o safado com
certeza se diverte por aí. Pego a Lizzie no colo que se despede com uma coroa na
cabeça com as palavras “aniversariante” e meu pai traz a Fefinha. Foi
inegociável, ou trazia a girafa de pelúcia, ou a Lizzie não gravava.

Ela é tão obstinada, me pergunto a quem puxou o temperamento mandão.


Se bem que o pai dela não fica atrás nesse quesito. Uma vez Daniel disse que a
Lizzie puxou a língua atrevida que eu tinha quando nos conhecemos, nessa
conversa, ele apontou que eu estava diferente. Mas eu não mudei me retraindo ou
escondendo minha personalidade, eu evoluí.

Percebi que não podia continuar arisca e uma safada querendo sexo,
atrevida, fazendo tudo o que eu queria. Eu tinha uma filha que precisava de
cuidados, minhas prioridades mudaram e afetaram meu comportamento, mas
continuo sendo a mesma leoa.

Chegamos em casa onde os gritos são ouvidos assim que desço do carro.
Beatrice vem feliz pegar a afilhada no colo, Lizzie não contém a felicidade ao
abraçar a dinda dela, por trás da Beatrice eu vejo o Dante segurando a mão da sua
sobrinha. Sabia que ele ia trazê-la, mas não lembrava como a menina era linda.

— Como foi a viagem? — pergunto os abraçando.

— Perfeita — Beatrice responde.

— Oi boneca — cumprimento a menina que me abraça feliz.

— Oi, tia Lira, como você está? — ela tem 9 anos e em breve fará 10.

— Muito bem, e seus pais?

— Saíram em outra lua de mel.

— Ah, eu preciso disso — brinco, arrancando risada delas.

— A Lizzie fica com a gente — Dante fala pegando minha pequena no colo
e a jogando para cima — estou com saudades da minha pimentinha.
— Sí! — Ela responde alegre.

Entramos em casa rindo, quando vejo uma coisa inacreditável. Daniel tem
o rosto pintado de girafa e o chapéu de uma. Lizzie grita ao ver o pai e corre para
ele que a coloca em cima dos ombros e começam a correr pela casa.

— Ele fez um cavalinho versão girafa? — Beatrice pergunta.

— Parece que sim — respondo rindo da cena.

— Bom dia família! — viro de costas vendo meu irmão entrando.

Louis ostenta um sorriso ao lado da Bianca e suas filhas que correm atrás
da Lizzie com presentes na mão. Abraço o Louis e a Bianca.

— Que saudade — digo.

— Se você não vai a Itália, trazemos ela a você — Louis responde me


beijando no rosto.

— Você está ainda mais linda — Bianca fala me abraçando forte — minha
irmã já chegou?

— Acabei de chegar do estúdio, ainda não tenho certeza de quantos


convidados temos.

— Estou bem aqui — reconheço a voz da Olivia. Viro de costas a vendo


com o rosto pintado com uma onça.

— Quem está pintando vocês? — pergunto.

— O Levi — ela responde — ele agora está fazendo uma rosa no rosto da
Lorrany e depois uma girafa na Lizzie, ela disse que queria parecer com o pai.
Rio imaginando a cena, minha menina com certeza ficará linda.

— Vou fazer o mesmo.


Procuro pelo meu irmão que está no jardim debaixo da tenda, uma fila de
crianças esperando atrás dele enquanto os funcionários preparam a mesa da festa
e a decoração do zoológico. Lorran tem um pincel na mão ajudando o Levi nas
pinturas. Fico atrás das minhas sobrinhas que formam um exército. Quando ele
pinta a todas, me sento a sua frente.

— O que vai querer?

— Uma girafa, igual à da Lizzie e do Daniel.

— A família girafa — Lorran fala pegando o pincel — posso fazer, pai?

— Claro, faça os traços que te ajudo.

Com paciência, o Lorran pinta meu rosto, quando termina, percebo os


adultos atrás de mim querendo se pintarem. Dou risada da minha sogra que
manda fazer uma lula agarrando o rosto dela, meu pai entra na brincadeira
pedindo um peixe mordendo seu nariz. Bianca faz uma gatinha, e Louis um
cachorro. Dante um cisne e Beatrice um pássaro, a sobrinha dele pede por três
abelhas.

Quando termina de pintar a todos, Lorran vira de frente para o pai e


começa a desenhar uma zebra no rosto do meu irmão. Deixo-os, e vou atrás da
minha pequena, que brinca com o pai perto da mesa do bolo, admirando a arte
dos animais do zoológico que decora seu bolo. Nossa lua de mel terá uma parada
de uma semana na savana africana, para o Daniel levar a Lizzie. De lá voltamos
para a Itália e a deixamos com os padrinhos, depois vamos viajar somente nós
dois.

Nos planos do Daniel vou voltar grávida do nosso próximo menino. Eu


disse a ele que só pararia com a pílula no final do ano, mas a felicidade que eu
tenho por ter uma família, tantos sorrisos e pessoas que eu amo, os gritos de
crianças preenchendo a casa tem aquecido meu coração e a vontade de aumentar
a nossa pequena creche. Parei de tomar o anticoncepcional já tem dois dias, daqui
a um tempo deve perder completamente o efeito, como minha ginecologista
disse.

A hora passa voando, e quando percebo já estamos prontos para cantar os


parabéns com a casa cheia de convidados e pessoas que amam a minha menina.

Do estúdio algumas crianças que ela chamou compareceram, chegaram um


pouco tímidas por não conhecerem bem a Lizzie, mas em poucos segundos
estavam brincando e rindo com os rostos pintados.

Daniel segura a Lizzie no colo, e fico ao lado deles, atrás da mesa do bolo,
encaro minha família, amigos e familiares com o peito explodindo de alegria. Um
coro em italiano começa cantando parabéns para a Lizzie que bate palmas rindo
sapeca. Daniel tem os olhos marejados, é a primeira vez que ele pode parabenizar
a filha e comemorar com ela, seus braços a apertam forte contra si, ele a encara
com amor transbordando por sua íris azul.

Beija a bochecha da Lizzie.

— Parabéns, minha princesa, eu te amo muito.

— Obligada papai — ela aperta o pescoço dele beijando seu nariz — te


amo de montão.

— Assopra as velinhas, meu amor — digo a ela — mas não esqueça de


fazer um pedido.

— Celto — Daniel segura sua barriga para que ela possa se inclinar e
assoprar — quelo um ilmazinho.

— Viu Lira, até a Lizzie quer isso — ele me provoca — vamos atender ao
pedido dela.
— Você não tem jeito — bato na sua bunda.

As palmas atingem o seu ápice e acabam. Tiramos muitas fotos em família


com a Lizzie, e depois a liberamos para brincar com as crianças. Daniel rodeia
minha cintura balançando nossos corpos em um ritmo lento.

— Promete que todos os aniversários serão assim? — ele pede baixinho.

— Até ela completar trinta anos e querer comemorar em um barzinho com


as amigas — o provoco.

Daniel ri, rouco, baixinho, desliza o nariz na minha bochecha me trazendo


para mais perto. Uma bolha de amor ao nosso redor. Calorosa, protetiva e repleta
de felicidade, com promessas de uma vida plena, juntos, com a família pela qual
lutamos para ter. Aliso sua nuca lentamente, embalando nossos corpos na dança
com música infantil ao fundo.

— Ela me deixando beijar sua bochecha e dizer o quanto a amo, é tudo o


que preciso — ele fala — pode ser no início do dia ou no final, quando ela chegar
com os sapatos na mão e trocando os pés ao chegar em casa bêbada.

— Não esqueça do possível namorado a carregando.

— Eu o ponho para correr em dois tempos, Lizzie não precisa de outro


homem, já tem a mim para ser feliz.

— Seu bobo — bato em seu peito — sabe que ela vai encontrar um amor
igual ao nosso ou mais forte — suspiro — nossa menina pode viver várias dores
de uma vez ou se apaixonar uma única vez. Mas ela vai amar e ser feliz, pois
vamos garantir isso.

— Sim, se ela conhecer alguém que a machuque, eu acabo com o


desgraçado, e o irmão dela me ajuda — arqueia a sobrancelha — imagina, uma
cópia minha, ciumenta, mantendo os abrutes longe da Lizzie.
— Você vai ficar muito decepcionado se tivermos uma menina.

— Nunca! — fala convicto — vai ser outra princesa para eu proteger, nem
que precise defender o castelo sozinho.

— Vamos tentar conseguir uma escolta te ajudando — entro na brincadeira


— mas prometa ser bonzinho com eles.

— Prometo ser justo — ele ri — vamos mudar de assunto antes que eu


tenha um infarto imaginando quando a Lizzie vai ter um namorado.

Vejo um vulto louro pelo canto do olho, fico de ponta de pé olhando sobre
o ombro do Daniel e dou risada.

— Acho que você não precisa se preocupar — aponto com a testa, ele olha
por cima do ombro e ri orgulhoso.

— Ele nunca me decepciona.

— Lorran pode ser seu escoteiro sem problemas — constato.

Ao longe, um pouco afastado de todos, eu vejo a Lizzie dançando com um


coleguinha do set de filmagens. O que ela não percebe, é o Lorran correndo na
direção deles. Meu sobrinho chega e interrompe à dança, fala alguma coisa que
faz a Lizzie rir, e o menino ficar com vergonha, e puxa a mão da prima a levando
de volta as irmãs dele. Agora que percebi, todas as meninas foram reunidas em
uma roda e o Lorran mantem os rapazes longe como um gavião.

Eles são só crianças, mas uma imagem se forma na minha mente de todos,
adultos, e do Lorrran saindo com as primas e irmã para manter os rapazes longe
delas. Não sei o que o Levi deve ensinar escondido ao menino, mas com certeza
funciona. Flagro meus irmãos encarando o Lorran com orgulho, Louis faz um
joinha com a mão, e o Levi um ok. Encaro o Daniel de canto de olho, percebendo
o sorriso satisfeito em seu rosto.
Rio achando graça de como os três marmanjos treinaram o único herdeiro
homem para proteger as meninas de ameaças masculinas. Tenho pena das garotas
quando outro menino vier, elas nunca vão ter paz.

— Você participou disso — afirmo.

— Não sei do que está falando — ele diz me encarando com um sorriso
arteiro.

— Com certeza sabe, não esqueça que as mulheres da família são famosas
por colocarem os homens na linha.

— Eu me lembro bem disso — segura minha bunda me puxando para um


beijo quente. — Vou me casar com a mais felina.

Sim, e eu com o amor da minha vida, protetor e cuidadoso. Tudo o que eu


sempre pedi e nunca achei que teria, está agora nos meus braços, me embalando
em uma música. Rezo para que todos os aniversários sejam assim.
Lira
Giro na frente do espelho observando meu vestido de noiva. Usei o que a
minha mãe casou e mandei fazer alterações. Levi mais do que aceitou em ser meu
estilista, foi preciso mais tempo do que imaginei para o modelo ficar pronto, com
as lágrimas do meu irmão. Nem imagino como será quando as filhas dele se
casarem, ou ele tem um infarto, ou se desmancha tanto em lágrimas que vai
alagar a cidade.

Um decote em coração, as mangas bufantes foram reduzidas para mangas


de renda com pedrinhas de diamantes do ombro ao punho. As costas abertas em
um lindo decote que termina na base da minha coluna. A calda sereia com a renda
por cima em detalhes de flores que se juntam e desabrocham com os diamantes
contornando as pétalas.

Na cintura uma extensão do tecido formando uma calda de três metros que
arrasta quando ando, achei mais moderno essa forma de véu, do que colocar na
minha cabeça. Uma tiara com pedrinhas azuis, contornadas por diamantes, foi me
entregue pela minha sogra, é o meu “algo emprestado”, o vestido da minha mãe o
“algo velho” e a tiara azul o “algo azul”. Posso não ter a minha mãe nesse
momento, mas sinto em meu coração, ela me acompanhando a cada passo.

Os cabelos loiros presos no alto da cabeça por um penteado com um terço


do cabelo preso, formando um coque volumoso caindo em camadas onduladas e
mais finas até o centro da minha coluna. Daniel ama meus fios longos, e sempre
gostei do cabelo grande, mas ver o quanto ele aprecia o cumprimento, me fez
deixar crescer mais ainda, para que hoje pudesse usar uma parte solta.

Minha franja se divide no meio, cacheada, a maquiagem rosada em tons de


pêssego realçando a cor dos meus olhos e boca.
Meus irmãos se casaram na mansão de primavera da minha família, o lugar
em que nos reunimos, crescemos, e comporta as nossas mais preciosas
lembranças. Onde conheci o Daniel, onde nos reencontramos, e nos separamos
novamente. A ideia de poder me casar no mesmo lugar que conheci meu noivo,
aquece meu coração. Preparamos com calma a estrutura no jardim, uma tenda
com pétalas de flores penduras formando caminho para o altar.

As luzes em cumbucas de madeira de decoração, iluminando o ambiente


com um ar romântico. As cadeiras de madeira posicionadas de frente para o altar,
com vista para o pôr do sol que banhara a cerimônia com o crepúsculo. O padre
chegou, faz duas horas e tem explorado o lugar com meu pai de guia.

Todos já assumiram suas posições e eu estou no meu quarto de infância,


respirando fundo e me preparando para o momento que tristemente acreditei que
nunca teria.

Toco o vestido uma última vez alisando o tecido, antes de ouvir batidas na
porta. Giro encontrando meu pai me encarando com felicidade tremenda no olhar,
antes de se aproximar. Ele tem algo em suas mãos, uma caixa preta, para na
minha frente e sorrio feliz por ser ele quem me entregará ao Daniel.

— Seus irmãos casaram e não pude levar eles ao altar, essa era uma honra
destinada à sua mãe — segura minha mão — sei que por diversas vezes posso ter
falhado na sua criação, e peço desculpas por isso. O amor que senti por Cecília
nunca mais visitou meu coração, não tenho arrependimentos e não mudaria nada
da minha história com ela — alisa meu queixo — minha linda menina, é com
uma honra imensurável que vou te levar ao altar hoje, e queria te entregar um
segredo de família.

— Segredo? — pergunto com um nó na garganta, segurando as lágrimas o


máximo.
— Sim — ele segura a caixa — somente eu e a sua mãe sabemos sobre a
existência desse colar — vejo uma corrente de ouro dourada com uma joia
águamarinha em formato de coração na ponta, com asas, — quando você tinha
três anos, eu e sua mãe estávamos passeando. Ela parou na vitrine da joalheria
quando viu esse colar e disse “olha que lindo, o coração com asas, livre para voar.
Vou levar para dar a Lira quando ela se casar!”

Dou risada, isso é algo que minha mãe faria, pelas histórias que sei dela,
posso imaginar a cena acontecendo com facilidade. Meu peito inunda ao saber
que ela pensou em mim casando tantos anos atrás e que hoje não poderá me dar a
joia que comprou. Pressiono os lábios controlando a emoção, não quero chorar.

— E então eu disse “você nem sabe quando isso vai acontecer” e ela me
respondeu “será quando a Lira quiser, nossa menina vai crescer mais livre do que
qualquer outra e quando decidir pousar e fazer o seu ninho, será com suas asas
completamente abertas. Vamos homem, para de enrolar!” e me puxou para dentro
da loja.

Os olhos do meu pai estão vermelhos com gordas lágrimas escorrendo por
suas bochechas. Eu soluço sendo vencida pela dor causada no peito mesclada a
felicidade por saber que terei esse pedaço dela deixando para mim.

— Eu jurei para ela que te entregaria o colar, quando ela estava na UTI, e
hoje estou feliz em saber que você encontrou um amor que deixou seu coração
voar. Acendeu sua vida, trazendo tanta luz que cega a qualquer um — abre o
fecho do colar colocando no meu pescoço — sua mãe te amou com a vida dela, e
eu te amo com a minha — beija a minha testa — pronta para iniciar sua família?

— Sì — respondo chorosa.

— Agora limpe esses lindos olhos que você herdou da sua mãe e me deixe
te levar ao altar.
— Sì, pai.

Ele me abraça forte e quando me solta, vou ao espelho, limpo com


delicadeza as lágrimas. Ainda bem que usei maquiagem a prova de água, demoro
dez minutos para me acalmar por completo antes de respirar fundo pela boca e
segurar no braço do meu pai.

Descemos as escadas, ao chegar de frente a grande janela de vidro coberta


por uma cortina a cerimonialista manda ligarem a música, abre as portas, sobe a
cortina e eu vejo.

No final do tapete vermelho e do caminho feito pelas petadas de flores, está


o último homem a quem dei uma chance, e fez meu coração inchar de felicidade,
ao ponto de quase não caber no meu peito. A marcha nupcial inicia e eu dou um
passo de cada vez na direção do meu amado. Observo os familiares e amigos em
pé. Louise segurando as lágrimas enquanto pula, Beatrice, Dante, Louis, Bianca,
Olivia e Levi, no altar em suas posições como padrinhos.

Lizzie andando na minha frente enquanto saltita jogando flores no caminho


até o pai. Ela chega primeiro nele, recebe um beijo na cabeça e fica ao lado da
madrinha, esperando a hora de entregar as alianças. Encaro o meu noivo, o terno
de três peças cinza com um pingente azul na gravata. Os olhos brilhando tanto
quanto a iluminação permite, o sorriso amplamente estampado no rosto me
aguardando para ser sua.

Paro antes dos degraus. Meu pai aperta a mão do Daniel sussurrando algo
em seu ouvido. Seguro a mão do meu homem e subimos dos três degraus até
ficarmos de joelhos nas almofadas diante do padre. O senhor começa a falar, mas
eu não vejo ou escuto nada que não seja o Daniel ao meu lado. O calor emanado
do seu corpo e se chochando contra o meu. A bolha de amor se estendendo as
estrelas, tocando a todos os presentes.
Eu estou no céu na terra, um paraíso criado somente para mim.

— Vem — ele fala ficando em pé, só então percebo que é hora das alianças
— perdida com a minha beleza? — sussurra com um sorriso safado.

— Completamente — retruco.

— Aqui, mamãe — Lizzie me chama.

— É primeiro o papai amor — digo a ela.

— Veldade — estende a almofada com as alianças para o Daniel.

— Obrigado princesa — ele pega a minha aliança entre os dedos.


Acertamos com o padre que falaríamos os votos criados por nós mesmo.

Daniel respira fundo, se aproxima, pega o microfone e minhas bochechas


ficam vermelhas por saber que todos escutaram suas palavras de amor para mim.

— Lira Vittileno, você merece o mundo a seus pés. É a mulher mais forte e
atrevida que já conheci. Quando nos vimos pela primeira vez, fiquei fascinado
pela sua personalidade, mas infelizmente, encalços e temores passados
atrapalharam a nossa relação. No nosso reencontro, eu sentia que falava com uma
gata arisca pronta para me deixar cego de um olho. — Risadas são ouvidas pelos
convidados, rio também lembrando do quanto quis arrancar sua cabeça na casa do
Louis. — No tempo que estamos juntos eu aprendi que estar apaixonado e amar,
são coisas diferentes, mas quando sentimos o mesmo, pela mesma pessoa, se
transforma em um novo sentimento. Mais forte e intenso, eu não almejo somente
ter um futuro ao seu lado, eu quero um presente e passado, lembrar do dia do
nosso casamento quando estiver velho, e contar aos meus netos o quanto a avó
deles estava linda.

Daniel pausa, seus olhos ganham um brilho banhado pela água acumulada
que ele se recusa a deixar cair. A voz grossa e sexy permanece firme:
— Você é a pessoa que me faz acreditar em destino, a que eu mais amo
nessa vida e a única que tenho certeza de que reencontrarei no pós-morte. Porque
o nosso amor é capaz de vencer a tudo e todos, superar planos e ultrapassar
existência. Um amor tão grande não se apagara com a finitude da vida. Hoje eu te
pergunto, você me aceita, Daniel Albuquerque, como seu marido, para viver não
somente essa vida comigo, mas todas as nossas futuras encarnações, por toda a
eternidade?

— Aceito — murmuro com um bolo enorme na garganta.

— Eu te amo — ele beija meu dedo anelar antes de deslizar a aliança.

Engulo o choro, respirando fundo. Pego a aliança na almofada e vejo minha


menina emocionada. Ela abraça as pernas do pai, e depois a mim, e corre para o
colo do avô que a beija. Seus olhos me encarando com expectativa para saber o
que eu direi.

— Daniel Albuquerque — pego o microfone, a mão meio tremula — eu


tinha dito a mim mesma que você seria o último homem a quem daria uma
chance. Escrevi essa frase centenas de vezes no meu diário, que você vive
tentando espiar — ele ri culpado — pare de fazer isso se quiser que continuemos
felizes — agora gargalha com a minha ameaça, acompanho o som gostoso
deixando seus lábios — e eu estava certa, pois depois de você, só existirá você,
independente em qual plano seja, nunca terá outro. — Inspiro, seguro sua mão
posicionando a aliança na ponta do seu dedo, pronto para colocar nele. — Amar é
aceitar cada uma das qualidades e defeitos do parceiro, todas que te fazem querer
estar com aquela pessoa e a matar ao mesmo tempo. Com você eu passei por
várias fazes, e uma delas perdura até hoje. O carinho e paciência que você teve,
esperando pelo meu tempo, eu sei que foi difícil para você, quase um ano depois
que nos reencontramos, agora que estamos nos casando, mas eu percebi naquela
noite estrelada no vinhedo que você casaria comigo no dia seguinte.
Trago sua mão aos meus lábios, beijando seu dedo anelar.

— Obrigada por esperar, me deixar confortável e cuidar de mim todos os


dias desde que nos conhecemos. Você aceita a mim, Lira Vittileno, como sua
esposa para passar a eternidade ao seu lado, te amando e retribuindo todo o
carinho e felicidade que você me dá, estando ao seu lado para realizar todos os
seus desejos, e juntos construirmos algo lindo com o nosso amor?

— Sim — responde.

Deslizo a aliança no seu dedo olhando em seus olhos emotivos.

— Eu te amo — digo.

O padre abençoa a nossa união e Daniel me toma em seus braços


colocando a boca na minha em um beijo terno e carinhoso. Não temos pressa ao
deslizar a língua uma pela outra, ao segurar o outro, querendo fundir nossos
corpos. Não existe urgência de terminar logo, não tem motivos para desculpas do
porquê não paramos de nos beijar, mesmo quando as palmas acabam, pois
estamos fazendo o que queremos no nosso tempo, regado por amor.

Um tão forte e precioso, que derrubara o tempo e espaço para continuarmos


juntos a cada dia da existência das nossas almas.
Daniel
Eu disse a Lizzie que seria eu a levar ela para ver os animais de perto, e
nunca volto atrás com a minha palavra.

Meu casamento com a Lira foi perfeito e apaixonante, ainda sinto os efeitos
do nosso amor e da noite que passamos juntos, comemorando, e no dia seguinte
quando não a deixei sair da cama e recebemos comida no quarto, só o suficiente
para minha esposa ter energias para o tanto de vezes em que meti na boceta que
pertence a mim.

Estamos no nosso terceiro dia de casados e acabamos de pousar na África


do Sul. Lizzie ainda tem medo de voar de avião, mas aceita se a fefinha estiver ao
seu lado e eu a segurando forte nos braços. Descemos e vamos direto para a nossa
suíte presidencial guardar as malas. Na janela do quarto seguro minha menina nos
braços e aponto para os animais ao longe.

— Está vendo Lizzie?

— AAAAAAH — Abre a boca em O com as mãos nas bochechas, dou


risada do seu jeitinho — como são glades papai.

— Vamos tomar um banho e trocar de roupa e te levo para vê-los de perto,


se quiser pode até tocar nos mansinhos.

— Na gilafinha também?

— Se conseguimos ver alguma e for seguro, com certeza.

— Oba! — levanta os braços — me solta papai, vou plo banho.

— Como o porquinho faz quando quer banho?

— Oooooooooinque — ri sapeca.
Os dentes dela terminaram de crescer, pequenos e as coisas mais fofas,
elevando a fofura a níveis perigosos para o meu coração. Lira pega nossa
porquinha no colo e vai com ela para o banheiro. Enquanto elas tomam banho, eu
separo a roupa da Lizzie, sapato, o perfume e creme para pentear as madeixas
loura. Pego o protetor solar deixando em cima da cama, com uma toalha no
ombro vou para o banho.

Lira sai com a Lizzie no segundo em que entro, essa foi rápida. Só de olhar
para o cabelo seco da Lizzie percebo que ela deve ter apressado a mãe. Rio ao
imaginar o banho de gato e cheio de conversa, tomo uma ducha rápida com a
Lizzie batendo na porta mandando me apressar e visto a roupa apropriada para os
safaris.

— Naum, fefinha também — Lizzie reclama quando saímos sem a pelúcia.

— Lizzie se a gente levar a Fefinha — Lira começa a falar — não teremos


como fazer o passeio. Ela vai ficar dormindo e quando você voltar conta tudo
para ela sobre os animais que viu, certo?

— Papai — faz manha com bico.

A pego no colo e entramos no elevador.

— Lizzie, a fefinha é muito grande e não permitem bichinhos do tamanho


dela perto dos animais, ou as girafas vão querer levar a fefinha pensando que é
filha dela — digo a ela com calma, mais uma vez arrependido pelo presente
enorme, se ela tivesse trinta centímetros, seria mais fácil de andar pelos lugares.
— Você quer ficar sem a fefinha?

— Não — responde firme.

— Então precisamos deixá-la aqui para ficar segura.

— Polmete que ela vai estar aqui quando voltar? — pergunta.


— Sim — digo confiante.

— Mamãe, polmete.

— Eu prometo meu amor — Lira beija a mão da filha — e depois a gente


dá sorvete a fefinha, o que acha?

— Pelfeito!

Até que foi fácil dessa vez. Geralmente é mais difícil convencer a Lizzie a
deixar a girafa em casa quando saímos em família. Faz uns dois meses que fomos
a um restaurante e não teve acordo, precisamos levar a girafa, foi constrangedor
jantar com várias pessoas olhando a pelúcia enorme e comentando sobre
deixarmos ela levar.

Acontece que eu sou um pai extremamente babão que não se controla


diante do choro da filha querendo algo. Lira diz que no futuro isso vai me custar
todos os meus cartões de crédito, mas eu ficaria pobre sorrindo, se fosse para ver
a Lizzie feliz e amando o pai coruja dela.

Saímos do elevador e o guia turístico nos recebe com um sorriso. Um


homem com dreads nos cabelos e pele negra, conversa amigável antes de
entrarmos no, jeep, acompanhado de sua equipe. Lizzie adora os dreads na cabeça
dele e fica brincando com os coloridos.

Posso ainda ter pesadelos com a morte da Verônica, sei que fiz o que era
necessário, mas nem por isso a culpa me deixa em paz, com o passar dos dias,
tem amenizado cada vez mais, principalmente em momentos como esse, que não
precisamos de uma escolta de seguranças para um passeio em família. Em que eu
posso respirar sentindo o sol quente no rosto e o vento seco, mas nada ameaça à
segurança da minha família e continuará assim por décadas.
Leva meia hora até vermos os primeiros animais. Seguro uma Lizzie
eufórica e totalmente maravilhada ao ver os elefantes bebendo água. Ficamos o
tempo todo dentro do, jeep, por ser a opção mais segura, com ajuda de binóculos
mostra a ela hipopótamos do outro lado do rio.

— Eles parecem inofensivos — Lira fala maravilhada.

— São os mais perigosos da região — nosso guia diz — por ano matam
muitos humanos que ignoram as regras da selva e mexem com os animais. A
natureza tem de ser respeitada, não caçada e ameaçada.

— E as gilafas? — Lizzie pergunta — quelo ver.

— O local delas fica mais a frente, vamos — ele dá a partida.

— Ai, meu Deus, são leões! — Lira fala.

Giro a cabeça encontrando dois leões dormindo tranquilamente, enquanto


as leoas ficam debaixo da sombra da árvore, de olho no território. Lizzie faz um
“raum” quando passamos por eles e aperto minha filha com medo de um dos
bichos querer a pegar devido à sua brincadeira.

Quando estamos longe o suficiente do bando avistamos zebras. Demora


meia hora para chegarmos ao local que as girafas ficam.

Com a permissão do guia, descemos do, jeep e nos aproximamos delas que
comem tranquilamente. Uma deitada parece mais dócil, o guia toca em seu
pescoço fazendo carinho, e os olhos da Lizzie brilham como se ela estivesse
vendo a coisa mais preciosa do mundo.

— Quer ir lá? — pergunto.

— SIM! — Responde animada, rio do seu jeitinho.


— Eu fico aqui — Lira fala com a sobrancelha franzida — perto demais
para mim.

— Mamãe meldosa — Lizzie zomba.

Antes que sua mãe responda, saio com minha filha a protegendo da leoa
Lira. A girafa não se mexe com a nossa aproximação, mantenho a Lizzie presa
contra meu peito. Minha pequena estica as mãos tocando a pele da girafa e sorri
tão linda, que o sol parece brilhar mais forte.

— Obrigada, papai — beija minha bochecha.

— De nada, minha princesa — beijo a dela.

Sim, essa foi a vida pela qual eu lutei para proteger, o doce sorriso inocente
da minha menina, e faria isso quantas vezes mais fossem precisos.

Quinze anos depois.


— EU VOU MATAR VOCÊ — A voz fina da Lizzie grita com tanta força
que a escuto no segundo em que coloco a chave na fechadura da porta.

— EU MATO VOCÊ ANTES — A voz grossa de Lucca responde à irmã.

Coço a cabeça sabendo o que terei de lidar, hoje a Lira está no estúdio
gravando até mais tarde, os meninos vão ficar comigo a noite toda, e tendo três
filhos, dois homens, e uma menina na adolescência, é de enlouquecer a cabeça de
um.

Lizzie já completou 18 anos e quer uma vida independente, que é


constantemente arruinada pelas peças que os gêmeos, Lucca e Leon, pregam na
irmã. Os meninos só têm 14 anos, mas são verdadeiros monstrinhos no corpo de
humanos.
Entro em casa vendo a guerra travada na sala, roupa jogada para todos os
lados, e uma Lizzie furiosa com um batom quebrado na mão e um Lucca sorrindo
arteiro. Meus filhos, quando se juntam com o Lorran, se tornam verdadeiros
delinquentes, mas a minha Lizzie consegue colocar ordem em cada um deles
quando levanta a mão e os puxa pela orelha.

Observo enquanto ela leva a mão a orelha do Lucca puxando com tanta
força, que poderia arrancar, e o faz ficar de joelhos. Decido não intervir, por
enquanto não temos mancha de sangue. Lira sempre briga comigo por deixar uma
pequena briguinha acontecer entre eles, mas não consigo evitar, é divertido ver a
Lizzie dominando os irmãos, para depois se estressar com outra peça pregada por
eles.

— Você destruiu os meus batons e agora eu vou destruir sua coleção de


mangás para você aprender a não tocar no que é meu.

— Epa — intervenho.

Lizzie pode ter perdido uns batons essenciais para a vida como atriz que
ela, tanto, ama, mas posso comprar novos a qualquer instante. Mas Lucca tem um
apego emocional muito forte aos mangás e os perder não causaria somente uma
raiva, mas uma ira incontrolável no gêmeo do mal. Me aproximo deles e Lizzie
solta a orelha do irmão.

— Pai, ele destruiu minha maquiagem!

— Lucca, por que você fez isso?

— A Lizzie não me dava atenção, sabia que ela tem um namorado?

— NÃO TENHO — Grita, com medo da minha reação.

Ergo a sobrancelha, não estava sabendo de nenhum garoto rondando minha


menina. Pelo jeito vou precisar da ajuda do Lorran para espantar o espertinho.
Lucca e Leon ainda não possuem idade e tamanho o suficiente para espantar os
pretendentes da Lizzie, mas o Lorran sempre dá conta. Eu não sou contra ela
namorar, mas pelo menos que seja com um cara legal, e depois dos 20. Agora que
ela é maior de idade, vai ser cada vez mais difícil impedir o contato.

— Quem é o rapaz?

— Pai, para e foca no Lucca quebrando minha maquiagem.

— Lucca vai ficar de castigo, um mês sem comprar manga novo e nem ler
os capítulos online, agora quem é seu pretendente? — Cruzo os braços.

— PAI NÃO — Lucca fala arregalando os olhos — ficar sem comprar já é


tortura, mas sem ler? Se quer me matar me joga de um penhasco ou dá um tiro na
minha cabeça.

— Se continuar reclamando, digo ao Leon para te dar spoilers, você não


pode quebrar as coisas da Lizzie, independente do que ela tenha feito.

— Mas pai...

— Você é um home Lucca, haja como um, e respeite a vida privada da sua
irmã. Se ela tem um namorado, eu e sua mãe lidamos com isso, não é certo você
ficar irritado e quebrar as coisas dela.

Omito de todos que vou pedir ao Lorran para ficar de olho e espantar o
garoto. É aquele ditado “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”. Preciso
agir como pai ao educar meus filhos, mas nada impede que eu tenha minhas
artimanhas.

— Peça desculpas agora a sua irmã.

— Desculpa Lizzie.
— E você ao seu irmão por tê-lo ignorado, não é assim que tratamos a
família.

— Desculpa Lucca — ela fala sem contestar.

Lizzie pode ser uma leoa como a mãe, mas sabe obedecer, e continua sendo
a minha garotinha. Beijo a cabeça de ambos e mando irem chamar o Leon para o
jantar. Quando eles desaparecem, ligo para o Lorran que atende no primeiro
toque.

— Águia rondando o passarinho — uso o código que os irmãos Vittileno


inventaram para avisar quando uma das meninas tem garoto rondando-as.

— Então, tio — ele fala hesitante — o rapaz é meu amigo, eu meio que
apresentei ele a Lizzie. Prometo que é uma boa

pessoa. — Você está morto — aviso e desligo. — Pai — Leon aparece —

quem vai morrer?

— Eu, se seus irmãos continuarem brigando assim, por que você não
interveio?

— E arriscar a Lizzie arrancar minha orelha? Nem pensar.

Os gêmeos têm cabelos pretos como os meus, e olhos azuis-claros como os


da mãe. Dou por vencido o argumento do Leon. Jantamos os quatro, e depois
vemos um filme juntos, quando compro um novo quite de maquiagem pela
internet para a Lizzie, ela sorri e me beija, subindo para o quarto.

Os gêmeos vão jogar e eu vou para o meu próprio quarto. Me deito e


investigo o Instagram da Lizzie e do Lorran tentando descobrir quem é o garoto.

— Você não vai acreditar — Lira entra com os olhos arregalados.


— Você que não vai, a Lizzie tem algum namorado — faço careta.

— Eu sei, ela acabou de me contar — senta-se na cama — é o par


romântico dela na novela, o Victor.

— O quê?! — fico sem acreditar, o moleque vive aqui em casa — eu


deveria ter desconfiado das vindas dele!

— Pois é, ele a pediu em namoro hoje, e você está proibido de fazer algo
como mandar o Lorran espantar o menino, a Lizzie já tem 18 anos.

— Eu gosto do Victor, o merdinha sabe conversar e sempre foi um


cavalheiro com a Lizzie.

— Exatamente — da risada — debaixo do meu nariz e não percebi.

— Espera — digo — como você sabe que usamos o Lorran para espantar
garotos?

— Todas sabemos, até mesmo a Beatrice — dá de ombros — vocês não são


tão discretos e as meninas vivem reclamando dele interrompendo os encontros
delas.

— Merda.

— Estou cansada, quero um orgasmo bem gostoso — se deita na cama.

— Trancou a porta? — desde que a Lizzie quase nos flagrou transando por
entrar com a porta destrancada, a mantemos bem fechada e a prova de crianças.

— Com certeza.

— Garota esperta.

Beijo os lábios da minha esposa com o mesmo fogo e paixão de anos atrás.
Os anos passaram, nossas vidas continuam seguindo, mas nada muda o amor que
sentimos um pelo outro. Ficaremos juntos pela eternidade e por todos os planos
depois desse.

Lira e Daniel, eternizados no universo.

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