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Curso de Aperfeiçoamento em Educação Especial e Inclusiva 1

AUDIODESCRIÇÃO PARA TIRINHAS, CHARGES E HISTÓRIAS EM


QUADRINHOS: NOVOS (CON)TEXTOS DIDÁTICOS NAS AULAS DE CIÊNCIAS
Débora Sanchez Pereira1; Alexandre Botelho José2

Resumo:
Este é um trabalho sobre como desenvolver uma atenção específica em poder descrever ou
audiodescrever imagens (estáticas) que estão ilustrados em livros, textos, e atividades cujas
figuras devam ser narradas aos alunos com deficiência visual (DV), no nosso caso usaremos as
tirinhas de histórias em quadrinhos (HQs) e uma Charge bem humorada que são facilmente
usadas em aulas de ciências e de química. Oportunizando para os alunos o chamado “humor
nerd” ou “cultura nerd” entalhado numa imagem, e assim, exemplificando o que foi explicado
durante a aula. Foram usados exemplos de tirinhas nacionais. A proposta é trabalhar a
acessibilidade através de uma técnica já usual para as pessoas com deficiências visuais, a
audiodescrição (AD). Mostraremos que esta pode ser usada tanto por deficientes visuais, como
também por autistas, disléxicos, pessoas com deficiência intelectual e até por idosos. A inserção
de HQs nas atividades é uma ação lúdica que acompanha a construção de certos conhecimentos.
Valorizando a arte e ampliando conhecimentos específicos, de vocabulário, de comportamento
social, o humor entre muitos outros.

Palavras Chave: Inclusão escolar. Audiodescrição. Histórias em quadrinhos. Acessibilidade.


Ensino de química. Cultura nerd.

Introdução:
Sou professora de química, brailista, audiodescritora escolar e guia de cegos, e nas horas
vagas sou consumidora nerd. O somatório dessas particularidades fez-me desenvolver um grau
alto de interesse em audiodescrever conteúdos de histórias em quadrinhos para as ciências,
notícias sobre cultura nerd e afins, por isso, crie e fundei o Inclusão Nerd nas redes sociais.
Atualmente é comum o uso de Histórias em Quadrinhos (HQs) nas atividades escolares,
e é muito incentivado por Vergueiro (2018) que já evoca como a nona arte, e em seus textos
acadêmicos valoriza seu uso em sala de aula como instrumento de transmissão de conhecimentos,
instrução e preceitos educativos, estas podem ser utilizadas basicamente em todas as áreas e
disciplinas. O mesmo descreve: “É possível encontrarmos uma boa literatura sobre histórias em
quadrinhos e educação que pode ajudar os professores e professoras a conhecer melhor a

1
Discente do Curso de Aperfeiçoamento em Educação Especial e Inclusiva da Fundação Cecierj; e-mail:
inclusaonerd@gmail.com
2
Mediador do Curso de Aperfeiçoamento em Educação Especial e Inclusiva da Fundação Cecierj; e-mail:
tutor.alexandrebotelho@gmail.com
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linguagem dos quadrinhos e proporcionar ideias que definirão as suas estratégias de aplicação”
(VERGUEIRO, 2018, p. 9). É preciso compreender ainda que:
Não existe qualquer barreira para o aproveitamento das histórias em quadrinhos nos
anos iniciais e tampouco para sua utilização em séries mais avançadas, mesmo em nível
universitário. A grande variedade de títulos, temas e histórias existentes permite que
qualquer professor possa identificar materiais apropriados para sua classe de alunos,
sejam de qualquer nível ou faixa etária, seja qual for o assunto que deseje desenvolver
com eles. (VERGUEIRO, 2018, pp. 24-25)

A cultura nerd, segundo Rocha (2019) é um termo que se renova de tempos em tempos,
mas de forma geral é estereotipado como consumidores de ciências, tecnologias, cultura pop e
midiática, como vemos no seguinte trecho:
[...] para além da origem do termo, a definição da palavra nerd ganhou novos
significados e se transformou com o decorrer do tempo. Entre suas características
principais, como o interesse pela ciência e pela tecnologia e o consumo de cultura pop
– parecem permanecer. Porém, outras distinções deste grupo como, por exemplo, a
marginalidade dos consumidores desses produtos, o comportamento antissocial e
atrapalhado, parecem estar se modificando. (ROCHA, 2019, p. 7)

Com a inclusão nas escolas regulares, e como o Brasil é de um tamanho continental,


coube ao professor (estudos e cursos) favorecer a acessibilidade por Lei e que muito das vezes
não são cumpridos. E nem sempre porque é algo similar a negligência, mas sim porque não há
alguém qualificado, capacitado, habilitado em certas regiões.
A audiodescrição (AD) é uma técnica de acessibilidade e de Tecnologia Assistiva (TA),
narrando o signo visual para o sonoro. Ou seja, é uma forma de tradução através de técnicas
comunicacionais. Pessoas com necessidades especiais como os deficientes visuais, deficientes
intelectuais, disléxicos, idosos, autistas e as pessoas com paralisia cerebral. Lívia Motta no site
Ver com Palavras3 traz a seguinte definição:
A audiodescrição é uma atividade de mediação linguística, uma modalidade de tradução
intersemiótica, que transforma o visual em verbal, abrindo possibilidades maiores de
acesso à cultura e à informação, contribuindo para a inclusão cultural, social e escolar.
Além das pessoas com deficiência visual, a audiodescrição amplia também o
entendimento de pessoas com deficiência intelectual, idosos e disléxicos.

Segundo Bersch e Tonolli (2006 apud BERSCH, 2017, p. 2), é esclarecido:


Tecnologia Assistiva (TA) um termo ainda novo, utilizado para identificar todo o
arsenal de recursos e serviços que contribuem para proporcionar ou ampliar habilidades
funcionais de pessoas com deficiência e consequentemente promover vida independente
e inclusão.

A frase acima conduz a realização da inclusão e acessibilidade através de instrumentos


e técnicas, no caso aqui exposto.

3
Audiodescrição (AD). In: http://vercompalavras.com.br/definicoes. Acesso em: 10 out. 2020.
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Desenvolvimento:

Foram colhidas tirinhas de HQs e charge nacionais, cujo conteúdo são sobre ciências e
química, é aconselhável esses usos no término das explicações do tema. O professor-
audiodescritor4, explicado por Dalmolin (2015, p. 6) é aquele que:
Apropria-se de signos linguísticos verbais para traduzir o que está sendo apresentado
em um contexto não verbal. Porém, no ambiente de sala de aula, designado como um
espaço interacional e dinâmico, os professores traduzem as imagens que ilustram
conceitos das disciplinas, assim como aquelas presentes no ambiente externo.

O uso dessa técnica é intuitivo, mas alguns pontos são importantes, para os praticantes
audiodescritores é natural listar:
a) Notas Proêmias: seria um breve resumo dos personagens (características e vestimentas),
cenário, tudo que for relevante para o entendimento da imagem. Lembrando que é uma técnica
usada em sala de aula, enaltecer os pontos nas imagens que são de relevância no contexto;
b) Descrição de personagens, o ideal é iniciar pelas características físicas da pessoa e depois as
vestimentas pontuando, preferencialmente, de cima para baixo;
c) Descrição dos cenários: imagens em ambientes externos e internos, preferencialmente, no foco
da contextualização.

Na química geral é abordado o conteúdo sobre Propriedades da Matéria, e nele o tema


Propriedades Físicas da Matéria, onde foram encontradas duas imagens para corroborar o
conteúdo científico. Ambas são tirinhas do personagem Bidu, criação de Mauricio de Sousa. A
primeira já bem usual no meio acadêmico e já visto em alguns livros didáticos (figura 1). Como
esse tipo e outras tirinhas poderiam ser audiodescritas em sala de aula? Iniciando por Notas
Proêmias, seguido de cada quadrinho representado pela letra ‘Q’ e o numeral sequencial em
arábico, e claro, suas audiodescrições propriamente ditas.

Quadro 1: Exemplo de audiodescrição nas tiras – figuras 1 e 2.


Tiras cômicas, ambas sem títulos, personagem Bidu: cachorro médio porte na cor azul. Cenário externo de dia,
gramado verde.
Tira 1: Q1: Bidu observa um cubo de gelo; Q2: Bidu observa uma poça d’água; Q3: Bidu observa vapores e uma
nuvenzinha e diz: “seu caso de personalidade tripla é realmente muito sério”.
Tira 2: Bidu observa um cubo de gelo se transformar em vapores e nuvens; Q2: Bidu observa um céu nublado e
escuro; Q3: Bidu pega chuva; Q4: Bidu escuta o desabafo da poça d’água “entendeu agora o meu problema de tripla
personalidade?”.

4
Dalmolin (2015) usa o termo ‘professor/audiodescritor’, como se o profissional fosse ou professor ou
audiodescritor, aqui preferimos usar a terminologia ‘professor-audiodescritor’, informando que o professor é
também audiodescritor.
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Figura 1: Bidu observa o comportamento da água.


Fonte: https://www.researchgate.net/figure/Figura-1-Personagem-Bidu-observando-a-mudanca-do-
estado-fisico-da-agua-Mauricio-de_fig1_341448035.

E a segunda, já não tão comum no meio acadêmico (figura 2), proporciona uma
continuidade humorada da primeira tira, e esta também conduz análises científicas das Mudanças
dos Estados Físicos da matéria (água).

Figura 2: Bidu escuta o desabafo a água.


Fonte: https://www.researchgate.net/figure/Figura-2-Personagem-Bidu-observando-a-formacao-da-
chuva-a-partir-da-evaporacao-da-agua_fig2_341448035

O quadro e a tirinha a seguir são referentes a charge produzida por André Mansur5, onde
ilustra uma piada típica de sala de aula do estereótipo “Joãozinho e a professora”.

Quadro 2: Exemplo de audiodescrição na charge – figura 3.


Tira cômica, sem títulos, personagens: Professora de terninho e saia verdes e blusa rosa, aluna e aluno, ambos
uniformizados camisa branca e bermudão azul.
Q1: Professora com caderno na não pergunta: Alguém aí sabe o que é H2SO4? Aluna fala: “Eu sei, professora! Tá na
ponta da língua”;
Q2: Aluno aparece por trás da aluna e dá uma batida na cabeça dela e ela coloca a língua para fora;
Q3: Professora com expressão de assustada, aluna com a cabeça na carteira (saem estrelinhas) e aluno diz “Cospe
que é ácido sulfúrico”.

5
Andre Mansur: ilustrador de piadas populares, seus desenhos podem ser vistos no seu perfil da rede social.
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Figura 3: Alguém aí sabe o que é H2SO4?


Fonte: https://www.facebook.com/andremansuradvogadosassociados/posts/1869850989694361

Considerações Finais:

Ao final desse relato percebemos que o ideal seria em que toda a academia de
licenciatura já usasse essa técnica da audiodescrição, como outras na área da inclusão e educação
especial, como sendo algo prático e corriqueiro. Desse modo já poderíamos não só aplicar
oralmente a audiodescrição, mas preparar roteiros escritos para futuras atividades escolares e o
uso do braile para a independência de estudos no lar. Deixo aqui o meu alerta e a minha sugestão
de oportunizar a aplicação dessa técnica após o isolamento social causado pela pandemia do
COVID-19 para que possamos ter um processo de ensino-aprendizagem que seja eficiente, eficaz
e inclusivo.

Referências Bibliográficas:
BERSCH, R., Introdução à Tecnologia Assistiva. Porto Alegre: Assistiva – Tecnologia e
Educação, 2017. Disponível em: <http://www.assistiva.com.br/Introducao_Tecnologia_
Assistiva.pdf>. Acesso em: 20 out. 2020.

DALMOLIN, M. Audiodescrição em Sala de Aula. Anais... XII Congresso Nacional de


Educação – EDUCERE. V Seminário Internacional sobre Profissionalização Docente. Eixo
Diversidade e Inclusão, Paraná: PUCPR, 26 a 29 out. 2015. Disponível em:
Curso de Aperfeiçoamento em Educação Especial e Inclusiva 6

<https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2015/17674_8075.pdf>. Acesso em: 30 out. 2020.

ROCHA, A. A. Memória E Cultura Nerd: do Lambda ao Bazinga. Tropos: Comunicação,


Sociedade e Cultura, 8(1), 2019. Disponível em: <https://periodicos.ufac.br/index.php/tropos/
article/view/2416>. Acesso em: 28 out. 2020.

VERGUEIRO, W., As HQs e a Sala de Aula. Módulo 1 do curso Quadrinhos em Sala de Aula,
Universidade Aberta do Nordeste (UAN), Fundação Demócrito Rocha, 2018. Disponível em:
<http://ava.fdr.org.br/course/view.php?id=56>. Acesso em 10 out. 2020.

Agradecimentos:
Primeiramente a família, ao namorado Eduardo Miranda Barros e a amiga que
fielmente me apoiou, Ana Paula Sanches Devescovi.

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