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Introdução
A Dor é um fenômeno multidimensional, envolvendo aspectos físico-sensoriais e aspectos
emocionais; é "uma experiência sensorial e emocional desagradável associada a, ou semelhante
àquela associada a, dano real ou potencial ao tecido". (The International Association for the Study
of Pain). As células nervosas especializadas no sentido da dor (nociceptores), que existem aos
milhares em cada milímetro de nossa pele, transmitem estes impulsos ao nosso sistema nervoso
central (SNC) que responde tentando “afastar” o que está sendo afetado do estímulo doloroso.
No diagnóstico médico, a dor é considerada um sintoma de uma condição subjacente.
Cerca de 33% dos pacientes oncológicos apresentam dor no momento do diagnóstico, mais de
50 % sentem dor em algum momento da sua doença e mais de 70% sofrem na doença avançada.
Compreender a causa da dor e tratá-la é de extrema importância, pois seu descontrole é um fator
que contribui para processo de reabilitação e recuperação, gerando, inclusive, impacto na
evolução dos resultados terapêuticos. O sofrimento pode desempenhar papel importante na
qualidade de vida do paciente. Estes números levaram a Organização Mundial de Saúde (OMS) a
declarar, em 1986, a dor associada ao câncer uma Emergência Médica Mundial, levando a
publicação de um protocolo que serve até os dias atuais como guia para controle da dor
oncológica. A Escada Analgésica proposta pela OMS pode proporcionar alívio da dor em 90% dos
pacientes, reservando a utilização de tratamentos intervencionistas para situações especiais.
As síndromes dolorosas, neste cenário, podem ser agudas ou crônicas; nociceptivas (somática ou
visceral), neuropática, nociplástica ou mista; recorrentes, episódicas ou ambas – Conforme NCCN
V1 2020, maior parte tem características crônicas e mistas.
Avaliação da Dor
Todo paciente oncológico deve ser examinado e questionado quanto à presença de dor, a
cada consulta.
O exame físico detalhado é fundamental para diagnóstico preciso da fonte da dor que acomete o
paciente.
aplicação de escalas específicas, de acordo com faixa etária e cognição deve ser realizada para a
melhor avaliação destas características (cada serviço escolhe melhor instrumento para seu
perfil).
Tratamento da Dor
A terapia farmacológica é a base do tratamento da dor no paciente com câncer e deve ser
multimodal. A combinação de tratamentos não-farmacológicos (cirurgia, radioterapia,
bisfosfonatos) pode otimizar o alívio da dor. Os procedimentos intervencionistas devem ser
considerados para pacientes que não obtiveram alívio satisfatório da dor.
Para um eficiente controle da dor oncológica é necessário que uma equipe multidisciplinar de
saúde - Oncologistas, Clínicos da dor, Cirurgiões, Psiquiatras, Fisioterapeutas, Terapeutas
Ocupacionais e Enfermeiros - tenha familiaridade com uma gama de opções terapêuticas tais
como terapias antineoplásicas, medicamentos, técnicas anestésicas, procedimentos cirúrgicos,
procedimentos intervencionistas, técnicas psicológicas e técnicas de reabilitação.
A escala analgésica da OMS (1986), validada a partir de dados com mais de 80% dos pacientes
com dor oncológica controlada por esse método, norteia o manejo medicamentoso. Hoje algumas
adaptações são sugeridas para que o uso contínuo de inovações e novas formas de intervenções
sejam inseridas e disseminadas.
A Escada Analgésica:
Degrau 1: Para pacientes que não estão sob tratamento analgésico e com dor leve a
moderada. Inicia-se com drogas analgésicas e anti-inflamatórias. A baixa potência associada
a efeitos colaterais limita sua eficácia;
Degrau 2: Para pacientes com dor moderada a despeito do uso de AINE deve ser adicionado
ao tratamento, opioides fracos como tramadol e codeína. Alguns autores, após publicação de
metanálise, onde a combinação de AINES e opioides fracos produziram significadamente
mais efeitos colaterais sem melhora de considerável de analgesia, levantaram a questão se o
degrau 2 deve ser abolido passando do degrau 1 para o 3 em face de dor persistente;
Degrau 3: Deve ser reservado para os pacientes que não obtiveram controle da dor com
opioides fracos e AINE. Nesse degrau substituímos os opioides fracos por opioides fortes,
como morfina, metadona, oxicodona e fentanil. É importante lembrar que não existe limite de
dosagem para os opioides fortes, e a dose considerada máxima é aquela que consegue o
melhor equilíbrio entre analgesia e efeitos colaterais – “sem dose teto”.
DOR LEVE (EVN 1-3) DOR MODERADA (EVN 4-6) DOR INTENSA (EVN 7-10)
Terapia Intervencionista
Neurólise em cadeia simpática (responsável pela aferência visceral e alvo importante para
alívio da dor relacionada ao câncer);
Ação de agentes químicos em plexos, com álcool ou fenol;
Lesão química ou térmica (radiofrequência) gânglios e nervos, por se tratar de estruturas
bem delimitadas e de dimensões compatíveis.
Considerações finais
Todos os médicos devem estar familiarizados com o uso de analgésicos. A busca ativa pelo
fenômeno dor, assim como a avaliação adequada da sua etiologia e do pacientes como um todo,
propiciará a escolha da melhor conduta a ser adotada de forma individualizada, cuidando de seu
paciente e não apenas de sua doença.
Anexos
Tabela 1:
Equipotência a morfina
Opioides fortes Características Vias ADM
oral
Droga de escolha
para introdução e
titulação de dose.
VO de liberação rápida
Metabólitos de
(10 e 30 mg e 10
eliminação renal:
mg/mL). VO de
cuidados na
liberação controlada
MORFINA presença de VO: 1 SC: 1/2 EV: 1/3
(30, 60 e 100 mg).
insuficiência renal,
IV/SC* (2 mg/mL e 10
como redução da
mg/mL). Retal.
dose total e
Espinhal.
aumento nos
intervalos de
administração.
Dose
diária
Dose de
de
fentanila
morfina
transdérmica
oral
(mcg/h)
(mg/24
h)
< 135 25
135-
50
224
Sem metabólitos
ativos.Opção de 225-
75
escolha em 314
insuficiência renal [J
315-
Pain Palliat Care 404 100
Pharmacother 21:5, Transdérmica (12,5;
2007]. Via 25; 50 e 100 mcg/h). 405-
FENTANILA 125
transdérmica não IV/SC (amp.). 494
indicada para Espinhal.Transmucosa.
titulação analgésica, 495-
150
apenas para 584
pacientes com dor
585-
já controlada. Causa 175
674
menos constipação
que a morfina. 675-
200
764
765-
225
854
855-
250
944
945-
275
1.034
1.035-
300
1.124
Depende da dose
equivalente de morfina
Potente opioide
agonista µ. Ação
antagonista de Dose
NMDA. Opção de diária de Taxa de
escolha em dor morfina conversão
neuropática. Meia- oral
vida errática, entre
VO (5 e 10 mg).
12-120 h, com risco < 100 mg 3:1
METADONA SC*. IV (amp. 10
de acúmulo.
mg/mL). 100-300 5:1
Aumenta o intervalo
QT: cuidado na
300-600 10:1
presença de
arritmias. Excreção 600-800 12:1
intestinal e
hepática, seguro na 800-1.000 15:1
insuficiência renal.
> 1.000 20:1
Agonista µ, delta e
kappa. Boa
indicação para dor
VO de liberação rápida
visceral.Efeitos
(indisponível no Brasil).
analgésicos e
VO de liberação
colaterais
controlada (10, 20 e 40
semelhantes aos da
mg). Possui tecnologia
OXICODONA morfina.Meia-vida 2:1
anti-abuso, que
aumentada em
impede a trituração e
insuficiência
maceração dos
hepática e renal
comprimidos. IV
[Cochrane
(indisponível no Brasil).
Database Syst
Rev:CD003712,
2015].
Agonista parcial µ.
Uso limitado em dor
oncológica,
podendo ser usado
como 4ª linha.
Transdérmica (5, 10 e
BUPRENORFINA Seguro para uso em 1:75 a 1:115
20 mg)
insuficiência renal e
hepática [Cochrane
Database Syst
Rev:CD009596,
2015].
Melhor opioide para
administração SC.
Metabolização
hepática. VO de liberação rápida
HIDROMORFONA Metabólitos (líquido). VO de
(não disponível no neurotóxicos, liberação controlada
Brasil) inadequado para (1x/dia). Retal. IV/SC.
infusão contínua [J
Pan Symptom
Manage 44:852,
2012].
Equipotência
Opioides Vias Dose Dose
Particularidades a morfina
fracos disponíveis habitual máxima
oral
Mecanismo de ação
dual (ativando os
receptores µ e inibindo
a recaptação de
serotonina e
noradrenalina). Reduzir
dose ou prolongar
intervalo de
administração em
pacientes com
50-100 400
TRAMADOL insuficiência hepática VO, IV, SC mg 6/6 h mg/d 1:5
ou renal. Risco de
redução do limiar
convulsivo – deve ser
evitado em indivíduos
com tumores cerebrais.
Menos constipante e
menor risco de
depressão respiratória
e dependência. Mais
nauseante.
Liga-se ao receptor µ e
inibe a recaptação de
50-100 500
TAPENTADOL noradrenalina [Curr VO, IV 1:2,5
mg 4/4 h mg/d
Med Res Opin 28:1775,
2012]
Medicamento EV VO TD
Morfina 10 mg 30 mg -
Codeína - 200 mg -
Oxicodona LC* - 20 mg -
* Liberação Controlada
Tabela 2:
Mecanismos
Dose Dose
Adjuvantes Particularidades de ação
habitual máxima
principais
Iniciar de 300 mg/dia a 300 mg de Estabilização
12/12 h. Titular dose com da membrana 300 a
escalonamento gradual para melhor neuronal. 1.200
adaptação aos efeitos adversos e Ativação do mg VO
melhor aderência. Reduzir doses em sistema de 8/8h 3.600
GABAPENTINA
idosos e em insuficiência renal. inibitório GABA. ou 300 mg/dia
Efeitos adversos: sonolência, tontura Inibição do a 900
e lentidão de raciocínio (cede em sistema mg VO
poucos dias com a manutenção de excitatório do de 6/6 h
dose regular). glutamato.
Estabilização
da membrana
Iniciar de 75 mg/dia a 75 mg de neuronal.
12/12 h. Titular dose com Ativação do
75-300
escalonamento gradual. Reduzir sistema 600
PREGABALINA mg de
doses em idosos e em insuficiência inibitório mg/dia
12/12 h
renal. Efeitos adversos semelhantes GABAv. Inibição
aos da gabapentina. do sistema
excitatório do
glutamato.
Potencialização
25-150
das vias 150
NORTRIPTILINA Semelhante à amitriptilina. mg à
inibitórias de mg/dia
noite
dor.
Tabela 3:
Tenoxicam 20 a 40 mg a cada 24 h 40 mg
Piroxicam 20 a 40 mg a cada 24 h -
Etoricoxibe 60 a 90 mg a cada 24 h -
BIBLIOGRAFIA
1. Pain Physician 19:281, 2016.
2. NCCN Clinical Practice Guidelines in Oncology (NCCN Guide- lines®). Adult Cancer Pain -V1
2020
8. Caraceni A. et al. Use of opioid analgesics in the treatment of cancer pain: evidence-based
recommendations from the EAPC. Lancet Oncol 2012; 13: e58– 68
9. II Consenso Nacional de Dor Oncológica. São Paulo: Grupo Editorial Moreira Jr.; 2011.
Disponível em: www.moreirajr.com.br.
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