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9 Processos Adaptativos – Texto

Vamos encerrar o estudo da Biofísica estabelecendo uma ponte para o mundo


da fisiologia falando de adaptação.

Sabemos que os sistemas termodinâmicos dissipativos se mantêm estáveis à


custa de um grande gasto energético; ou seja, esta estabilidade se dá longe do
equilíbrio (estado no qual não ocorre fluxo de energia). Logo:

Os processos adaptativos promovem a evolução dos sistemas para se


tornarem cada vez mais estáveis, porém, mais distantes do equilíbrio.

Adaptação é a busca da estabilidade, à custa de gasto energético.

O equilibrista – Modelo para os sistemas estáveis à custa de gasto de energia


(portanto, longe do equilíbrio).

O modelo do equilibrista exemplifica bem o que seria um processo adaptativo


enquanto busca pela estabilidade, ainda que se pague um alto preço energético.

O sujeito consegue manter sua estabilidade sobre a corda à custa de muita


energia, no limite entre o estável e o instável. Estável graças à energia muscular e à
condição adaptativa de seus músculos, mas, se ele relaxar sua musculatura,
fatalmente cairá.

Adaptação: Processo no qual um organismo se transforma, com o objetivo de


otimizar suas relações com o meio, procurando se adequar às pressões que este meio
exerce sobre ele.

Estresse

Estresse (do inglês stress) é um conceito da física.

“Teste de estresse” para colunas de concreto;

Determinado metal de um motor está sofrendo estresse.

No campo da Biologia ou da Medicina, o estresse não é sinônimo de algo ruim,


mas sim, algo fundamental para a manutenção da própria vida.

Mas, o que é o estresse? É uma pressão adaptativa.

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Não somos sistemas isolados, estamos em contínua interação com nossa
circunvizinhança, que imprime sobre nós diversos eventos transformadores que,
invariavelmente, tendem a nos transformar.

Dependendo da natureza e da intensidade dessa força extrínseca, o sistema


pode se adaptar, mantendo sua estabilidade, ou não.

Estresse é qualquer evento (energia, força, informação), que promove


a adaptação ou a transformação de um sistema.

Logo, estresse não é algo bom nem ruim. Enquanto nosso organismo se
adapta ao estresse, tudo fica bem.

Musculação estresse do organismo se adapta, hipertrofia muscular mantendo


o sistema estável

Espécie animal num inverno rigoroso menos aptos morrem

adapta-se ao frio intenso

frio = estresse

A adaptação de uma coletividade tanto enquanto espécie (evolução), ou


enquanto organismo vivo, o estresse é uma pressão adaptativa. Contudo:

O estresse é uma ameaça à estabilidade de um sistema.

No caso de organismos vivos (coletividade de células), isso pode significar a


morte.

Os estressores (agentes que produzem estresse) podem ser


verdadeiramente agressores.

Do ponto de vista de uma coletividade de indivíduos (uma espécie), o estresse


pode ser uma pressão à extinção.

Ex: um supervírus fatal ou um vulcão que extermina uma espécie.

Sob a óptica de uma sociedade nova-iorquina, o estresse será uma pressão à


ordem civil, no caso da notícia de uma bomba no Central Park a explodir em 30
minutos.

Estressores: uma virose

um chefe psicopata produzindo estresse

a falta de dinheiro

um tiro

Homeostase

No século XIX, os fisiologistas Claude Bernard e Walter Cannon passaram a usar


o termo homeostase para definir o fenômeno de estabilidade que se observa em
diversas variáveis fisiológicas, como:

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❖ A manutenção da temperatura corporal

❖ A constância nas concentrações celulares de diversas substâncias


(glicose, sódio, potássio, cálcio, etc.)

❖ A manutenção do pH do sangue, etc.

Perceberam que esse fenômeno de manutenção da estabilidade de


parâmetros era fundamental para a manutenção da vida.

Essa estabilidade interna, com o tempo, foi comprovada como condição


indispensável para a sustentabilidade das células do organismo.

Mas, a estabilidade não é espontânea, ou seja, não é equilíbrio.

A diferença entre a concentração de sódio e potássio nas células e no meio


extracelular não está em equilíbrio.

A temperatura do corpo não está em equilíbrio com o meio ambiente.

Os processos termodinâmicos pressionam violentamente os compartimentos


internos do organismo a entrar em equilíbrio entre si e o organismo como um todo a
entrar em equilíbrio com o meio ambiente; porém esse equilíbrio corresponderia à
morte.

Para que isso não ocorra, o sistema tem uma alta demanda energética, produz
muita entropia, realiza muito trabalho. Logo:

Homeostase é a constância do meio interno à custa de trabalho do


sistema.

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Alostase e retroalimentação

O que acontece quando estamos dentro de uma sala quente e, de repente,


um ar-condicionado superpotente é ligado e a temperatura passa a ser 5ºC? Nossa
temperatura interna cai?

Não, ela permanece em torno dos 36°C de sempre.

Como a nossa temperatura interna se mantém constante a despeito da brusca


variação da temperatura do meio?

Temperatura do organismo é mantida balanço entre o nosso metabolismo e os


mecanismos relacionados com a dissipação desse calor

Vasos sanguíneos

Músculos esqueléticos Estruturas envolvidas nesse balanço

Glândulas sudoríparas

À temperatura de 5ºC o sangue circula menos na pele, dissipando menos calor


interno (mãos pálidas).

Se estávamos suando, percebemos que, depois da queda de temperatura, não


há mais suor na pele (não há evaporação de líquido para refrigerar a pele) e, logo,
começaremos a tremer (atividade muscular aumenta “queimando” nutrientes e
produzindo calor).

Em uma sauna acontece tudo ao contrário: os músculos relaxam

bastante transpiração

vermelhidão na pele

O organismo está atento às mudanças externas e adapta seu maquinário


interno Homeostase

Nosso amigo equilibrista Se você ficar sem Maratona

comer o dia todo

Está estável sobre a corda Frequência

Tensão na musculatura O organismo começa cardíaca e

Oscila o tempo todo a transformar aminoácidos respiratória

Busca manter a estabilidade e gorduras em glicose vão aumentar

para manter as taxas para otimizar

sanguíneas em níveis ideais oxigênio para

os tecidos

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O conjunto de adaptações que ocorrem a fim de preservar a
estabilidade (Homeostase) recebe o nome de Alostase.

Alos = diferente; estase = constante

Portanto, diferente do constante.

Alostase: conjunto de processos adaptativos que ocorrem a fim de tentar manter a


homeostase.

Alostase é o trabalho do sistema com o objetivo de manter a homeostase.

Ocorre à custa de gasto de energia.

Quantidade de energia alocada a fim de que a alostase possa ocorrer = Carga


alostática.

Em situações extremas, como doenças, alterações bruscas e intensas do meio,


a carga alostática (energia) alocada para se atingir a homeostase pode ser muito
alta, podendo chegar a ser insuficiente para manter o organismo vivo.

O excesso de energia utilizado para tentar, a todo custo, manter a homeostase


se denomina Sobrecarga alostática.

Carga alostática é a quantidade de energia desprendida no processo de alostase.

Quem controla os mecanismos alostáticos?

Seus próprios efeitos. Se um mecanismo está “fraco”, o efeito ineficiente o


força a ser intensificado; se o mecanismo está “intenso” demais, o excesso de efeito
o força a ser atenuado.

Isso se chama Retroalimentação ou feedback.

Exemplo de mecanismo alostático retroalimentado: sistema de refrigeração


de uma geladeira.

Se a temperatura ideal para exercer suas funções (homeostase) for de 10°C,


quando a abrimos, a temperatura interna irá subir, para tentar o equilíbrio com o
ambiente. Então, o termostato (sensor) é ativado e liga o motor para ela começar a
esfriar de novo.

Quando a temperatura chega aos 10°C originais, o mesmo termostato


desarma o sistema de refrigeração.

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Os organismos vivos têm diversos sensores que fornecem informações ao
próprio organismo a respeito, do estado atual de seus parâmetros (temperatura, pH,
etc.). Esses sensores “ligam” e “desligam” os mecanismos alostáticos, promovendo
a regulação do organismo.

O organismo vivo é um sistema auto-organizável, ou seja, um sistema


que mantém sua estabilidade por meio de mecanismos de retroalimentação.

Retroalimentação (Feedback) é o mecanismo compensatório utilizado


pelos sistemas auto-organizáveis.

Existem processos de retroalimentação (feedback):

❖ Negativa

❖ Positiva

Feedback Negativo: é o fenômeno no qual o resultado de um processo se mantém


constante, uma vez que o resultado ajusta a intensidade de ocorrência do processo.

Ex: Regulação da pressão arterial; regulação da glicemia

Feedback Positivo: fenômeno em que o resultado de um processo aumenta sua


intensidade de ocorrência. Existem poucos exemplos na fisiologia humana.

Ex: A ovulação que ocorre durante o ciclo menstrual

Contrações no parto

Ruptura da Homeostase

Febre é um fenômeno de reação do organismo a uma agressão qualquer


(infecção, um trauma extenso, um tumor maligno em crescimento, etc.), e ela existe
por um motivo termodinâmico: com o aumento da temperatura interna todos os
processos metabólicos e fisiológicos de reação ao estresse que envolvem reações
químicas são acelerados, uma vez que o calor aumenta a energia cinética das
moléculas.

Esse processo aumenta a entropia, mas leva à transformação e à adaptação


do sistema a fim de reagir à agressão. Logo, a febre é um mecanismo de alostase.

Em nome da necessidade do organismo de abolir a agressão, os sistemas


alostáticos ignoram todo o resto do organismo em busca do seu objetivo de destruir

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a fonte de agressão. A temperatura pode subir descontroladamente a níveis fatais.
Acima dos 42ºC as reações enzimáticas entram em colapso, pois as enzimas se
desnaturam em altas temperaturas. Então a homeostase é corrompida, e surge
a doença.

Doença: processo de ruptura da homeostase.

Faixa de tolerância: intervalo dentro do qual a sobrecarga alostática ainda


consegue ser compensada.

Ex: Temperaturas entre 36 e 42ºC exigem do organismo maiores esforços


(sobrecarga alostática) para manter a sua estabilidade.

Geralmente, todo mecanismo alostático foi feito para atuar em um curto


espaço de tempo, buscando a compensação orgânica. A ativação prolongada de um
desses mecanismos acaba por comprometer a economia do organismo como um
todo.

Assim, terminamos nosso curso de Biofísica, e esperamos que essa disciplina


sirva de alicerce para a construção de seus conhecimentos futuros.

1 – Biofísica Essencial – Carlos Alberto Mourão Júnior, Dimitri Marques


Abramov – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

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