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Universidade de Brasília, Faculdade de Educação


Departamento de Teoria e Fundamentos
Disciplina: Psicologia da Educação (TEF0011), 1/2023
Professor: Daniel Magalhães Goulart
Estagiários Discente: Natália Neiva Milhomens e Bruno Reis Cobucci

ATIVIDADE AVALIATIVA 2 – O CASO ALICE

Objetivos

✓ Compreender conceitos da corrente teórica escolhida da disciplina para analisar o caso de Alice.
✓ Identificar, relacionar e discutir concepções de ensino, aprendizagem e desenvolvimento humano
presentes na abordagem escolhida.
✓ Compreender conceitos, informações e definições gerais dos textos básicos da Unidade 2, sobre
Psicologia da Educação, (clique aqui) na análise do caso.
✓ Construir uma atividade pedagógica inspirada nos princípios de ensino e nas concepções de
aprendizagem e desenvolvimento do teórico escolhido.

Orientações
✓ O trabalho será realizado em grupos de acordo com as principais abordagens teóricas (8 grupos) e
valerá 30 pontos da nota final.
✓ Com base na escolha da abordagem teórica a ser explorada, faça uma busca de informações sobre o
autor selecionado (Skinner, Ausubel, Piaget, Gardner, Rogers, Vygotsky, Freire, ou Hooks),
realizando também uma pesquisa bibliográfica sobre contribuições do autor para o campo da
Psicologia da Educação. Apresente essas informações de modo criativo ao introduzir a atividade
pedagógica.
✓ A atividade pedagógica desenvolvida para analisar o caso de Alice será feita a partir da abordagem
teórica de um dos 8 autores, não a partir de C. Coll e A. Mitjáns Martínez. No entanto, ideias, reflexões
e contribuições dos textos de ambos (Coll e Mitjáns Martínez) devem ser exploradas na atividade de
alguma forma.
✓ Cada grupo deve construir uma atividade pedagógica para analisar o caso em sala de aula
(PRODUTO 1), utilizando os recursos que melhor se adequarem à abordagem escolhida. A
apresentação online, que fundamentará a atividade, deve ser compartilhada com os colegas
no fórum correspondente no Aprender 3 até o dia 25/05, servindo de recurso para que todos se
aprofundem nos diferentes referenciais.
✓ Diversos recursos podem ser utilizados durante a atividade pedagógica: audiovisuais, ilustrativos,
vídeos explicativos dos/as autores/as, podcasts, pequenos trechos de texto, citações, tabelas, entre
outros. Mas algo fundamental: a forma como os conteúdos e os recursos serão apresentados
devem ter como objetivo “encarnar” o modo como o autor escolhido entende os processos de
ensino e aprendizagem. Performem o “espírito” da abordagem escolhida.
✓ Cada grupo deve construir um “plano de aula” que dê sustentação à proposta da atividade
pedagógica (PRODUTO 2) a ser desenvolvida em sala de aula. O planejamento deve ser suscinto
(cerca de 2 páginas), contendo: breve descrição dos objetivos de cada momento a ser desenvolvido
na atividade pedagógica, justificativa da escolha dos recursos utilizados em cada momento para
cumprir com o objetivo proposto, baseado nas concepções de ensino, aprendizagem e
desenvolvimento do autor escolhido, e explicitação de uma proposta de ação para o caso Alice,
justificando a escolha das ações/estratégias pedagógicas sugeridas. Lembre-se: a construção da
atividade pedagógica deve ilustrar de modo criativo a forma como o autor escolhido
encararia o caso, o que deve ser explicitado no planejamento. Esse planejamento deverá ser
postado, no dia da apresentação em sala de aula, no fórum correspondente à atividade
avaliativa 2 no Aprender 3, de modo que todos/as possam vê-la. Lembrem de colocar os nomes
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dos/as estudantes que efetivamente contribuíram na construção e desenvolvimento da atividade


pedagógica.
✓ A atividade pedagógica construída pelo grupo para discutir o caso Alice será coordenada pelo grupo
em sala de aula no dia proposto pelo cronograma. Na ocasião, ao finalizarmos a atividade, faremos
uma breve discussão sobre a forma em que o grupo abordou os princípios pedagógicos do autor ao
ministrar a aula.
✓ A avaliação será realizada pelo professor, estagiário(a) e monitor(a) mediante uso do instrumento
de co-avaliação.
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Sobre a análise de caso

A marca característica do estudo de caso é observar o fenômeno de forma descritiva e


contextualizada, sem a apresentação de interpretações ou análises, permitindo ao/à estudante
compreender melhor as relações entre fenômeno e contexto. Uma das partes mais relevantes de um
estudo de caso é a sua análise. No contexto pedagógico, a análise de caso é de grande valia como método
de construção de conhecimento. Os três tipos mais comuns de análise de caso são: (a) descritiva, quando
a análise se preocupa em descrever o fenômeno e suas múltiplas relações com o(s) contexto(s); (b)
exploratória, quando se procura definir hipóteses; e (c) explanatória, quando se analisa o caso na
perspectiva de uma teoria.
A proposta deste exercício é fazer uma análise do Caso Alice (descrito a seguir), por meio da
construção de uma atividade pedagógica a ser desenvolvida com a turma, inspirada na abordagem
teórica escolhida. Como o autor encararia este caso? Como ele desenvolveria uma atividade para
analisar este caso junto a colegas de forma pedagógica? Em função dos objetivos desta atividade, o tipo
de análise privilegiada será a análise “explanatória” do caso. O seu material de análise consiste em
entrevistas realizadas com a professora de Alice e com a própria Alice.
Como especialistas, ao construir a atividade pedagógica, vocês deverão oferecer um olhar
sobre o caso Alice a partir da Psicologia da Educação. Para construir a atividade, o grupo deve
escolher um dos referenciais teóricos e interpretar o caso à luz dos principais conceitos e
pressupostos da teoria escolhida. Com base na análise feita, o grupo deve criar uma proposta de
ação, destacando ações/estratégias pedagógicas a serem privilegiadas, imaginando-se no lugar
de professor(a) de Alice, inspirando-se e sustentando-se nas concepções do autor escolhido.
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Roteiro para construção da atividade pedagógica:

1. Apresentação do caso da Alice, enfatizando aspectos centrais que serão abordados e destacando
a perspectiva teórica em que estes aspectos serão trabalhados.
2. Apresentação do autor e da perspectiva teórica que baseia e inspira as estratégias a serem
desenvolvidas para lidar com o caso, explorando seus principais conceitos, enfatizando as
concepções de desenvolvimento, ensino e aprendizagem derivadas da teoria (pode-se usar um
mapa e/ou tabela para descrever tais conceitos e concepções).
3. Análise do caso Alice à luz das concepções teóricas da abordagem escolhida. Explicitem como as
concepções de ensino, aprendizagem e desenvolvimento utilizadas para analisar o caso estão
articuladas a perspectiva teórica escolhida. Ao construir a análise do caso, deve-se fazer uma
reflexão sobre o campo da Psicologia da Educação, inspirados nos materiais básicos da Unidade
2.
4. Apresentação de propostas de ação construídas para o caso de Alice, detalhando e justificando a
escolha das estratégias pedagógicas a serem implementadas, a partir da abordagem teórica
utilizada.
5. Referências teóricas utilizadas para fundamentar a prática.

Obs 1: As atividades pedagógicas devem ser sucintas para que possamos aproveitar o tempo em
aula e dialogar. Nesse sentido devem ter até 30 minutos.
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Obs 2: Todos os pontos do roteiro devem ser abordados no decorrer da aula a ser ministrada
pelo grupo, inspirados pelo autor da perspectiva teórica escolhida e utilizando os recursos que
julgarem adequados.
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O CASO ALICE1

À época deste estudo, Alice, que é uma menina negra, tinha 10 anos, estava na quarta série (quinto ano),
morava com a tia e uma irmã um ano mais velha. A irmã já morava com a tia desde pequeninha. Alice
veio do Maranhão para Brasília somente aos oito anos. Quando chegou, entrou para a mesma escola da
irmã, mas repetiu a 3ª série (quarto ano). No momento da pesquisa, Alice era um caso preocupante para
a professora e a escola porque era uma aluna sem rendimento nas atividades escolares.

1. Alice vista pela professora

A Alice é uma aluna que iniciou o ano assim com muitas dificuldades. A Alice já chegou à quarta série
com uma série de etapas que precisavam ser vencidas para ela pegar o ritmo da quarta série, né?

Então, ela sempre foi uma aluna com muitas dificuldades... com dificuldade de concentração, de
aprendizagem... o que eu mais sentia na Alice, que também senti na irmã dela que estudou comigo
no ano passado, é a falta daquele desejo, aquela vontade de aprender.

A Alice é aquela aluna que realmente se você não tiver um olhar diferente para ela, cobrando o tempo
inteiro ... se deixar só por ela, ela não funciona.

A reação dela na sala é sempre, sabe, muito quieta, quase não participa da aula, então para ela, abrir
a boca é a coisa mais difícil, e quando abre, nem se ouve a voz.

Então eu tentei incentivá-la ao máximo, sabe, dar reforço positivo para ela, mostrar que ela é capaz...
Desde o início do ano, a coloquei em um atendimento individualizado comigo (...) sinto que ela tem
dificuldades de entendimento, ela nunca pega da primeira vez a matéria, então, você tem que sentar
junto, tanto na sala, como [n]o atendimento individualizado (...)

(...) eu procuro elogiar quando ela faz um trabalho que eu vejo: “olha, Alice, olha como ficou lindo,
como você é capaz!” Com certeza ela pode caminhar para passar para a próxima série.

Deveres de casa, o maior problema, por quê? Porque o dever de casa necessitava dela ter aquela
vontade de querer fazer e fazer. Alice jamais mencionava! Sabe aquela vontade de dizer: “olha,
professora, me ajuda que eu não estou entendendo”?

Com relação a Português e Matemática ela apresenta grandes dificuldades na leitura, na escrita, na
produção de texto... Para ela, escrever uma idéia na produção de texto, muitas dificuldades... Então
sempre me preocupou. (...) Em matemática, ela tinha muitas dificuldades, mas as maiores
dificuldades na interpretação de problemas. Quando tocava situações problema, aí, pronto, porque
necessitava de ler, entender e interpretar, né, principalmente em matemática. Apesar que em
matemática ela já conseguia, eu percebia que ela tinha um entendimento até melhor do que
português, porque português para ela ainda é uma grande dificuldade.

Então, ela é aquela aluna que sempre, na interpretação de texto, demora, nossa, lenta, dispersa, se
acontece alguma coisa na sala, ela fica parada, olhando... É o que me preocupava, é porque era uma
aluna muito parada em sala.

2. Alice fala sobre seu passado

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Extraído e adaptado de FREIRE, S. F. C. D. Concepções Dinâmicas de Si de estudantes em escolarização: uma
perspectiva dialógico-desenvolvimental. Tese de doutorado. Faculdade de Educação. Universidade de Brasília, Brasília,
2008.
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Alice relata que nasceu no Maranhão e lá morou com os pais e, depois da separação deles, foi morar com
a avó paterna. A tia reside em Brasília há muitos anos e já havia trazido primeiramente a irmã de Alice,
Helena, então com quatro anos. A tia trouxe a Alice para Brasília quando ela fez oito anos. Conta que a
tia trabalha de esteticista em um salão de beleza próximo à escola, na Asa Norte. Alice explica:

“ela não é minha tia. (...) Ela podia ser tia e avó, (...) porque ela é irmã da minha avó (...) Mas ela
não gosta que chame ela de tia avó (sorrindo) (...) ela não fala a idade não, mas ela deve ter uns
quarenta, porque minha avó tem uns cinqüenta, e minha avó é mais velha do que ela”.

“O meu pai...É porque ele abandonou... Mas, nesse caso, a gente ia lá sempre passar o fim de semana
com ele, mas aí a gente não podia morar porque não ia estudar... porque aí, não ia morar perto da
casa da minha mãe. Mas só que [o pai] não vai com a cara do meu padrasto.

Ela afirma que queria “morar com a mãe” e com o padrasto em vez de morar com o pai. Mas, que morava
com a avó paterna.

Sandra: ... mas você gosta do seu pai?


Alice: Aperta os lábios e responde com a cabeça afirmativamente.
Sandra: E da sua mãe?
Alice: Também (fala firme, mas mantém os olhos baixos), mas só que meu pai, ele é mais violento
do que minha mãe. Minha mãe nunca me bateu... porque eu nunca aprontei com ela (riso triste).
Sandra: Você nunca aprontou com ela? E o seu pai, ele te batia?
Alice: Batia... mas por justa causa.
Sandra: E o que era a justa causa?

O diálogo continua por uma justaposição de histórias em que ela menciona, numa narrativa pouco clara,
espancamentos e abusos que ela sofreu ainda pequeninha pelo pai e pelo tio paterno. Os cenários são a
casa da avó paterna e a própria casa. Os relatos são breves e se concentram em episódios que antecedem
e sucedem às agressões, que envolvem ela, a irmã, a avó e a mãe.

3. Alice fala sobre sua rotina escolar

“Eu acordo quatro e meia, aí, cinco e vinte eu vou para a parada. Aí, cinco e meia já peguei o ônibus
já, aí eu chego aqui [no Plano Piloto] seis e quinze. Aí, eu vou na padaria, tomo café, que nem a Kelly.
Eu vou na padaria, tomo café, aí eu vou para o trabalho da minha tia.” Depois da escola, “eu vou
para o serviço da minha tia, aí eu vou para o restaurante, aí eu subo [no salão de beleza onde
trabalha a tia], troco de roupa. Aí minha tia manda eu dormir uma hora”. Lá, Alice descansa: “É,
porque tem uma caminha e um monte de coisa lá, uma sala que tem a maca que vem junto com o
travesseiro, aí lá ficam as coisas do trabalho dela. Aí ela bota lá, aí eu pego e fico lá. (...) Às vezes, eu
só durmo cinco minutos ou vinte”.

Aí, depois eu vou fazer meus deveres, aí eu tenho o lanche de tarde, umas três horas (...) Aí, às seis
horas eu espero minha irmã. O sinal da escola dela bate às seis horas, se ela chegar atrasada lá, uma
hora, ela não entra, ela só entra no segundo horário.

A jornada semanal de Alice também inclui aulas na escola Kumon, onde ela faz aulas de matemática e
português. Ela também têm aulas de reforço com a irmã em casa com uma professora particular. Ela
conta que “eu faço em casa também, porque tem dia que tenho três aulas. Uma de reforço a noite, porque
minha irmã ... tem dúvida naquelas coisas de História de quinta série [sexto ano], e a menina pega e explica
para ela... [Sandra: que menina?] A que dá aula para a gente. (...) Terça e quinta tenho três aulas. Então, o
resto das outras semanas [i.e. dias da semana], são duas aulas, de manhã e de noite.”

Alice fala sobre a escola


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Alice fala pouco sobre a terceira série [quarto ano] com uma atitude defensiva. Essa mesma forma de
falar, se repete quando informa timidamente que continua frequentando as aulas de atendimento
individual à tarde com a professora C, sua professora de turma. Ela retorna à tarde à escola para o
reforço “[d]os dois, português e matemática, com a Prof C.”. Mesmo explicitando sua dificuldade, diz que
a matéria de que mais gosta é matemática. É a matéria em que se sai melhor, porque aprecia as
atividades práticas e lúdicas, e gosta dos exercícios individuais que a professora dá. Porém, não gosta de
Português e História, porque, especificamente em História, “eu acho complicado entender aquelas
pesquisas”. Gosta quando a professora manda fazer tipo uma dobradura”. Às vezes a professora organiza
oficinas para a confecção de caixinhas e outros trabalhos manuais com papel ou sucata.

eu tenho que prestar muita atenção porque eu fico sem entender... não dá certo. A professora precisa
dar exemplos”. [...] “Eu gosto da professora C. e dos colegas. Gosto da calma que ela [a professora C.]
tem com a gente, quando presta atenção à gente. (...) Ela pergunta como é que a gente se sente”.

Mas, assim, eu esqueço muito o dever. Que nem ontem, eu coloquei o dever dentro do caderno, que eu
tenho aula a noite, troquei os cadernos tudinho. Quase que eu ia trocar o caderno de português....
com o da minha irmã, porque o da minha irmã é da cor do meu.

Depois de breve interação, volto a perguntar: “Mas o que você acha de você mesmo como aluna?”

Acho que... mais ou menos, porque... eu estou.... se eu não parar de ficar esquecendo as coisas... eu
estou quase para ir para a direção... [Sandra: Você o quê?] Estou quase para ir para a direção....
porque... eu esqueci o dever três vezes. Uma vez eu deixei na sala da minha tia, mas só que minha tia
não deixa eu ligar lá. A minha irmã também. [Se for para a direção,] minha tia ia achar ruim!
[Sandra: e você?] Eu ia ficar de castigo. Uma semana sem sair.

Finalmente, acerca de si mesma,

“eu me acho legal, mas tem pessoas que não acham. O problema não é assim eu gostar das pessoas.
O problema é o jeito delas (...) Quando agem com ignorância, igual ao meu pai é. Que nem uma vez,
meu pai bateu na minha irmã de corda porque ela jogou muito sabão na água. E tinha um brinquedo
lá e ele pegou, sabe tia, um brinquedo assim (gesticula), ele pegou bateu nela. (...) Igual a uma vez, o
meu tio me bateu que saiu sangue das minhas costas. (silencia)

Pergunto sobre o significado de ignorância na escola: “e aqui na escola, quando que as crianças
aqui agem com ignorância?” Ao que ela responde: “é... Ser grosso com você. Eu fico perguntando as
coisas e eles respondem de mau jeito”. Sugere que possui uma incrível sensibilidade com relação a
rejeição e violência de qualquer natureza, o que nos leva a considerar que a história de
espancamento e maus tratos físicos não dessensibiliza a criança para agressões “mais leves”. No
caso de Alice, parece haver uma sensibilidade aguçada sobre qualquer situação que de desrespeito
ao outro.

A concepção de ser uma pessoa legal se apoia em sua habilidade de “brincar com as pessoas” e elas
acharem legal.

Depois do fim do ano, na última entrevista, ela afirma que adorava a professora:

“Quando ela [a professora] corrigia os deveres... Ela dizia que eu estava melhorando cada vez mais.
E, eu achava que estava melhorando também. (balança a cabeça)”. A professora era assim
‘incentivadora’ “com todas as crianças [...] Uma vez que eu fiz uma poesia, aí eu fiz tudinho parecendo
um texto [em vez de estrofes]. Aí ela pegou e me ajudou a botar umas frases. Ela me dizia assim: que
você é capaz de fazer alguma coisa e gostava quando ela [a professora] escrevia no papel assim: tipo
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assim, entregava a prova e aqui ela escreve: prestar atenção. Aí ela pega e ela escreve assim: Você é
capaz”.

Segundo Alice, a professora acha “que melhorei nisso tudo ai que eu falei, e que só falta eu ter mais um
pouco de agilidade, e para eu prestar mais atenção na aula”. Porém, as questões agilidade e atenção
voltam a aparecer ao falar das atividades de grupo em sala: “Eles [os colegas] falavam que eu era lerda...
para eu escrever rápido. Aí, no meio do ano, eu fiquei mais rápida, era a primeira a terminar...”.

Quando a gente fazia a auto-avaliação dos grupos, eles diziam que eu participava... participava, mas
eles é que às vezes não deixavam eu fazer as outras coisas. [Por exemplo] a moldura, escrever...
(pausa) Porque diziam que minha letra era feia... (...) É, aí eles davam para quem tinha a letra mais
bonita...” [...] “Aí, quando eles chegavam lá na frente eles falavam que eu não fazia nada. Aí eu falava
que eu participava, que eles não deixavam eu fazer nada”. “Com a Indira e o Paulo quando a gente
estava... como é mesmo... da África. Eu fiz moldura, os desenhos... e os colegas do grupo [disseram]
que ficou bem, acharam bonito”.

Abre um sorriso e diz que se sentiu “bem”. Pergunto, “e o que é se sentir bem?” Ao que ela responde
sorrindo: “É estar satisfeita com o trabalho que você fez”.

Lá no Maranhão, na escola não tinha esse tipo de conselho, não é? Como é que foi quando você
chegou aqui e tinha esse tipo de conselho, para falar da sua aprendizagem, do seu
relacionamento...

Finalmente ela se manifesta, interrompendo minha fala com um súbito “Eu não falava nada”. Muda
o sujeito da ação da oração para a segunda pessoa e continua: “[Mas] É bom, porque, é como se,
tipo, você fala o que está sentindo e o que você está passando”. Na tentativa de trazê-la para sujeito
da ação, pergunto “E você, consegue falar o que você está sentindo e o que você está passando no
conselho (CCP)?” Ela volta a silenciar. Nega com a cabeça. Insisto: “Não? Por quê?”. Falando
baixinho e pausadamente ela responde: “Porque não tenho coragem” (aperta os lábios).

Apesar de mencionar todos os aspectos em que melhorou na quarta série, ela ainda se sente um pouco
reticente com relação à sua ‘agilidade’. Mesmo declarando que se sente capaz de ir para a quinta série,
confessa que tem um pouco de “medo”, “de chegar lá e de não acompanhar o dever todo, não dar conta de
escrever tudo”. Entretanto, ao finalizar nossa entrevista, enfatiza que o quesito amizade foi sua mudança
mais significativa durante a quarta série. Pergunto: “Todas essas coisas que você me falou sobre a escola,
sobre suas mudanças, você acha que tem alguma coisa que mudou no seu jeito de ser (...)?” Ela assegura:
“Tem, fazer amigos”.

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