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Sebastião Pla
Resumo
Palavras chave:
Ensino de história, pesquisa em ensino de história, didática da história, educação histórica, ensino
de história
Professor da Universidade Pedagógica Nacional do México e Ensino de História. Ph.D. D. em Pedagogia pela Universidade
Nacional Autônoma do México. Bacharel em História pela Universidade Ibero-Americana. Especializou-se no ensino de
história no ensino secundário e entre seus livros mais importantes estão Aprendendo a Pensar Historicamente. A escrita
da história no bacharelado e Cidadania e competitividade no ensino de história. Os casos do México, Argentina e Uruguai
1990-2006 (no prelo). Também publicou artigos em revistas de pesquisa e transmissões no México, Venezuela, Argentina
e Espanha. É fundador e codiretor do Seminário Permanente de Investigação em Ensino de História e Ciências Sociais
da Universidade Pedagógica Nacional. Membro do Sistema Nacional de Pesquisadores Nível I.
Abstrato
Na História, enquanto disciplina, existe uma lógica binária a riqueza e complexidade do ensino de História como
entre pesquisa e ensino. Essa lógica coloca o ensino campo de pesquisa. Para atingir esse objetivo o artigo
numa posição marginal em relação à pesquisa, embora discute conceitos como Didática da História, Ensino
ambos os aspectos da disciplina constituam práticas de História, Educação Histórica e Ensino de História.
centrais para o historiador. Procura também situar o ensino de História na fronteira
A hierarquia reduz o ensino de História a uma simples de diversas disciplinas e evidenciar alguns problemas
transmissão de conhecimento de pesquisadores para metodológicos e teóricos que nos permitem
amplos segmentos da população. compreender melhor os processos de construção de
É por isso que o ensino de História é normalmente sentido sobre o passado na escola.
considerado um campo infértil de pesquisa. Este arti-
Palavras-chave:
Ensino de História, Pesquisa em Ensino de História, Educação Histórica, Didática da História,
Ensino de História
INTRODUÇÃO
5 a conjunção das habilidades penje,
6
sação e representações sociais, e
pesquisa em ensino As características do pensamento
a história passou por várias derrotas histórico7 diversificaram as metodologias de
O teros no México e no mundo. Com pesquisas e objetos de estudo.
relativa certeza, pode-se ter certeza de que foi No México, aproximadamente 20
a partir da década de 1970 –com os anos,8 ensino de história encontrado
estudos na Inglaterra de Dennis Shemilt–1 também um impulso significativo e
que a pesquisa contemporânea em ensino incipiente, apesar de o primeiro grande
de história começou. A partir daí, pesquisa sobre a história dos livros
pedagogos, psicólogos e em de texto data de 1970. 9 Eles foram estudados
Em menor grau, os historiadores concentraram seus os melhores mecanismos para renovar o
esforços para investigar, compreender e diversos materiais didáticos do Parala - o
10
explicar os diversos processos que são piada da história,
vivenciados no ensino desta disciplina função de escrita de histórico
dentro e fora dos sistemas escolares. construir interpretações sobre o passado
Primeiro, procurou-se incluir a metodologia dentro da escola, 11 e também seives-
dos historiadores nos programas de preocupados com a formação de
estudo; 2 Ao mesmo tempo, atenção professores e o significado atribuído ao
focado no desenvolvimento cognitivo de toria. 12 ensino de história, mas predominam em
pensar históricamente desde una pers- No nosso país, estudos deontológicos
pectiva psicogenética de origen piage- sem bases empíricas sólidas
tiano3 y, a partir de la última década del
século XX , temas como a didática da
5
história, 4 diversas perspectivas socioculturais 6
Barton y Levstik, Ensino, 2004.
Carretero e Castorina, Construção, 2010.
para os processos de ensino e aprendizagem 7
Wineburg, Histórico, 2001.
8
Plá, “Veinte”, no prelo.
9
Vázquez, Nacionalismo, 2000; Galván, “Heróis”,
1
Shemilt, “Formal”, 1976, pp. 1998, e Mendoza, Cultura, 2009.
2 Ibidem. 10
Lerner, “Como”, 1997, pp. 44-53.
3 11
Ballard, Novo, 1971. Plá, Aprenda, 2005.
4 12
Benejam y Pagés, "Ensino", 1997. Trejo, “Ensino”, 2009, pp. 39-44.
(ensino) encontra sua identidade significativa juntos; isto é, além disso os historiadores
em relação a ele. É isso também são filhos de seu tempo, o lugar
geralmente percebe o ensino, em Social implica compromissos económicos,
como prática, apenas como transmissão de sociais e políticos, por isso escrever
resultados de pesquisa da história é forçada a respeitar
historiográfico. Essa percepção leva muitas posições que entram em jogo
algumas consequências negativas para o na interpretação do passado e na sua
ensino de história, como a sua subvalorização representação escrita. Nesse mesmo sentido,
como prática profissional e o lugar social tem sido marcado como
sua negação como objeto de investigação. um espaço asséptico, aparentemente isolado
Uma parte importante da relação binária das suas diversas influências, tão
pesquisa/ensino reside na declara-se neutra, ocultando assim componentes
maneiras pelas quais cada um deles produz básicos da produção de seus
conhecimento histórico. Entre eles estão conhecimento. A segunda característica
semelhanças e diferenças que os unem, mas é que esta aparente neutralidade
que os tornam também particulares. Ele requer um conjunto de regras que permitam e
pensamento de Michel de Certeau pode proíbam, que incluam e excluam, o que pode
ajude-nos a esclarecer esta circunstância. ser considerado pesquisa
Este historiador francês definiu o histórica o no. 18 As condições do local
operação historiográfica como a combinação social determinar de onde o
de práticas científicas, de uma historiador e os regulamentos internos de como
escrita e um lugar social. 17 O primeiro deve fazê-lo.
aspecto refere-se a um conjunto de O México não ficou isento desta
técnicas analíticas (disciplina), a segunda preocupação com a natureza política
trata-se da construção de um texto com passa pela escrita da história. Já
aspectos formais e linguísticos particulares Desde a década de quarenta do século XX,
(literatura) e o terceiro, que é o que Edmundo O'Gorman afirmava que
meinteresaresaltaraquí,alascondiciones
político, socioeconômico e cultural elevação da história à “dignidade de
aqueles em que se desenvolve a pesquisa ciência”, nada mais é do que o refinamento técnico
histórica profissional. de pesquisa que dá origem a uma metodologia
O lugar social em que ocorre renovada, mas que, no entanto,
o conhecimento profissional foi formado […] está toda ella animada e inspirada por
no Ocidente desde o nascimento de os propósitos pragmáticos e de interesse próprio de
disciplinas na primeira metade do século historiador. O que acontece é que o novo
XIX. É parte constitutiva do conhecimento metodologia […] esconde cada vez mais aqueles
19
historiográfico. Sua lógica operacional propósitos.
interno tem, entre outras, duas características
que considero relevantes. O primeiro é Anos mais tarde, seguindo Certeau,
a relação entre o lugar do conhecimento ou lugar Enrique Florescano voltou a levantar a questão
epistemológico com a sociedade como um todo
18
Ibid., pág. 81.
17 19 O'Gorman, Crise, 1947, pp. 41-42.
Certeau, Redação, 2010, p. 68.
ética dentro da sala de aula. Por esta razão, ambos linguística específica, relações de poder
Os autores respondem que devemos ensinar dentro da escola e o papel desempenhado
educação histórica, ou seja, todo pelos diferentes sujeitos no processo
de habilidades cognitivas que podem ser educativo. Da mesma forma o passado ou melhor
desenvolvidas através do método científico Os passados que disputam um lugar
do historiador. É uma resposta didática hegemônico nas salas de aula provêm de
baseada em pesquisas sérias e aprofundadas múltiplas fontes, como as metanarrativas36
que demonstraram como esses correntes nacionais, historiográficas, memórias
habilidades (localização espacial e temporal coletivas, histórias locais, culturas juvenis e
da fonte e a contextualização do tradições docentes, entre outras. As relações
documento, entre outros) requerem um hierárquicas que
processo de ensino formal e sistemático, sem ocorrem entre eles não depende da
o qual não são alcançados níveis complexos cientificidade ou não do conhecimento, mas da
de pensamento histórico. Esta afirmação, de sentido escolar que lhe é concedido. A
origem psicológica, é cada vez mais configuração final é uma ação política. Em
mais aceito no ambiente de ensino Em outras palavras, a construção de
da historia; Contudo, ao estabelecer significados sobre o passado no âmbito
como o núcleo da relação pesquisa/pesquisa a escola não é apenas uma prática periférica
ensinando o método do historiador, deixe da pesquisa histórica profissional, mas pode
além dos usos públicos da história ser observado como um
e as várias maneiras de designar o passado conhecimento histórico específico, que
dentro da escola. Tem vínculos com a historiografia profissional,
Ensino, didática e educação histórica mas também se distancia dela.
Existem três campos de pesquisa que Vários podem pular rapidamente
pode ser incluído em um conceito mais argumentos contrários a essas abordagens,
amplo: o ensino de história. Para entre eles a ausência de aprendizagem e o
É preciso olhar para isso sob uma perspectiva problema da horizontalidade
múltipla que desloca a lógica das relações entre o conhecimento científico e
pesquisa/ensino binário. Eu entendo conhecimento não científico. Assim como o
ensinando construção de história conceito de ensino de história inclui
de significados sobre o passado dentro formação de professores, produção de
a escola. Esta construção está localizada, 35 materiais didáticos e a relação entre o
histórica e culturalmente, na qual entra conhecimento historiográfico profissional e
em primeiro plano a instituição escolar que
36
norma e disciplina formas particulares de Lyotard, Pós-modernidade, 2005. Para este autor
pense a história, regras que respondem Em francês, as metanarrativas são “precisamente as
de acordo com o momento histórico às lógicas narrativas que têm uma função legitimadora ou
legitimadora” (p. 31), mas ao contrário dos mitos, “as
curriculares, linguísticas e extralin-
metanarrativas não procuram a referida legitimidade num ato”.
fundação original, mas num futuro que deve ser
35 O situado refere-se ao fato de que todo processo produzir, ou seja, uma ideia a ser realizada” (p. 30). No
de aprendizagem e significado ocorrem nas práticas No sentido de Lyotard, o ensino da história seria
condições sociais específicas que de uma forma ou de outra os tanto uma metanarrativa (a formação do cidadão ideal)
condicionam. e um mito (legitimação numa origem fundacional).
37
Epstein, “Sociocultural”, 1997, p. 30.
ENTRE FRONTEIRAS DISCIPLINARES
38 Pesquisa em ensino de história
Como uso da história no presente, afasta-se
Em uma investigação de Terrie Epstein outro campo de pesquisa sobre a história da
realizado em uma escola secundária no meio educação e o próprio ensino da história.
Esta expressão, propagada pelos escritos de toriografia profissional. Sob este critério
Jurgüen Habermas desde os anos Podemos assumir que os estudantes afro-africanos
década de oitenta do século passado, refere-se a Americanos abusam da história
consciência histórica como responsabilidade ria, porque consideram que os livros didáticos
ética para com o presente e especialmente e a historiografia profissional não conta “toda a
sobre a função social dos historiadores história”43 da escravidão ou
res. 39 A difusão do conceito tentou ser violação repetida dos direitos civis, ou
limitado aos usos políticos da história, entendida que a construção temporal das narrativas
como um olhar investigativo. históricas dentro do Exército Zapatista de
gação na qual torna os contextos políticos e Libertação Nacional e as suas relações com
sociais inseparáveis das formas de organizações comunitárias também estão erradas;
44 enquanto
conhecimento e representação do passado- 40 No entanto, é surpreendente
que
fazer. que a interpretação caucasiana da história na
Esses estudos dão pouca atenção ao escola, baseada na validação do conhecimento
escola, porque se os significados sobre científico e sua
o passado depende dos contextos sociais e A transposição didática é um bom uso de
políticos em que ocorrem, acontece a história. As fontes históricas dentro
o mesmo acontece com os historiadores, com das escolas são muito mais do que a produção
políticos e, claro, com professores de historiadores, mesmo esta
e os alunos, como tão claramente queda a veces en segundo plano. Si quere- mos
41 convertir a la enseñanza de la his-
comprovado Epstein. Talvez esta omissão
se deva ao pouco conhecimento do história em um objeto de pesquisa, mais
contextos de ensino e aprendizagem dentro das além da transposição didática, o
salas de aula, mas também à relação dicotômica formação de identidade nacional ou de-
em que está hierarquizada desenvolvimento de habilidades cognitivas em
um conhecimento sobre outro, como acontece com nossos alunos, é necessário reconhecer
Eric Hobsbawm expressa isso claramente: “Quer outras formas válidas de construção
você goste ou não, historiadores profissionais significados dentro da escola. Se quisermos
produzem o material. permanecer numa posição que
prêmio para não profissionais usarem coloca acima do conhecimento científico sobre o
bem ou mal". 42 passado, pelo menos vale a pena
O ensino de história é uma história Vale a pena tentar, a partir da ciência, aprofundar-
toria não profissional, deslegitimada como se nas formas de construção, boas ou más
produção de conhecimento histórico. Por dependendo de como se deseja julgá-las,
portanto, professores, alunos, pais, funcionários significados sobre o passado dentro
educacionais, bem como não da instituição escolar.
os profissionais, se seguirmos Hobsbawm, Claro que não está sendo negado
utilizam bem ou mal a produção da história. importância e valor da produção
científico, antes, o que proponho é Habermas,
39 “Concerning”, 1988, pp. 40-50. veja o ensino de história como Hartog e Revel, Usages, 2001.
40
41 43
Epstein, Interpretação, 2009. Epstein, “Sociocultural”, 1997.
42 44
Hobsbawm, História, 1998, p. 270. Baschet, "História", 2001, pp. 55-74.
uso público da história no presente, com seus dano". 45 As informações são coletadas com
abusos, suas exclusões e suas entrevista em profundidade como a seguinte: “Eu:
democratizando possibilidades. Isto significa que Você se lembra de alguma coisa que aconteceu naquela
devemos investigar as diferentes inter-relações de dia, você sabe alguma coisa sobre a história de 9 de julho?
passados que /L: Mais ou menos/E: O que você lembrar./L:
46 o “E:
são ministrados dentro da escola, para poder “Que durante toda a escola primária eu tive eventos”,
assim entender o que acontece em nossas salas Você diz que antes do país se chamar Argentina
de aula e posteriormente modificar o os indígenas eram argentinos, por quê?/M: Como
práticas de diferentes contextos escolares e o território é
processos de ensino agora Argentina, acho que sempre foi
e aprendizagem. O ensino de história tem Argentina./E: E eram argentinos?
foi tradicionalmente um metarelato, mas mesmo que eles não soubessem disso?/M: Exatamente.” 47
Isto é confrontado na sala de aula, com as Os autores desta e de muitas outras entrevistas
tradições pedagógicas dos professores, a reveladoras concluem sobre o personagem
historiografia profissional, as histórias comunitárias ontológico, territorial e a-histórico do
dos alunos, as formas culturais e história dentro da escola.
históricas de ser adolescentes, finalidades
processos educacionais, de desenvolvimento Mostramos como essa “incorreção”
cognitivo e de escolarização. Em cada sala de aula, em também é produzido, “existe”: revelamos
cada comunidade escolar, a posição hierárquica evidências e analisamos seus traços no plano
ocupada por cada um desses elementos em cognitivo e, finalmente, descobrimos que é
relação aos demais varia e “incorreto” aquilo que, porque está ao serviço
Portanto, a construção de significados sobre o de formação da identidade, dificulta a
passado pode ser diferente. Sem desenvolvimento da compreensão histórica de
Contudo, é notável que os esquemas estudantes e inibe a sua capacidade como
48
interpretações interpretativas da história são necessárias cidadãos políticos.
mas insuficiente. O ensino de história, como objeto
de pesquisa, é O pensamento de Mario Carretero tem
Situa-se entre várias fronteiras disciplinares, razão experimentei um deslize desde o início
pela qual requer uma perspectiva interdisciplinar. desde a última década do século XX até hoje.
Sua perspectiva cognitivista introduziu
Novo exemplo. Em um estudo de aspectos culturais na construção do
Mario Carretero e Miriam Kriger analisam o papel conhecimento histórico dentro da escola,
das cerimônias escolares especialmente em relação à identidade nacional.
na formação da identidade nacional Seu núcleo analítico começa
Na Argentina. Com base na categoria analítica de da psicologia e relaciona-a com a história, o que
representação social cunhada por lhe permite estar constantemente em ambos os
Serge Moscovici, o objetivo é descrever lados das fronteiras.
como as cerimônias escolares, como
prática identitária, “está articulada com a 45 Carretero e Kriger, “Ensino”, 2010, p. 63.
ensino disciplinar da história e intervém na 46
Ibid., pág. 69.
formação do pensamento 47
Ibid., pág. 71.
48
história de estudantes e futuros cidadãos Ibid., pág. 80.
49 Para uma maior explicação da situação política e Quando Ronald Evans, após suas observações
política, consulte a próxima seção. sobre as práticas dos professores
da história percebeu a estreita relação entre são práticas de ensino, mas também
crenças, lógica curricular, tradições foram abertas discussões sobre o pensamento
historiográfica e a influência das filiações histórico, consciência histórica, definição
políticas existentes, decidiu desenhar uma de noções históricas, narrativa histórica, escrita
tipologia. Ele distinguiu cinco tipos da história em elaula, relação entre ensino de
dos professores: a) o contador de histórias, história e memória coletiva, conhecimento
que considera a narração como parte prévio e
fundamental da transmissão de um representações sociais entre outros. Cada
conhecimento sem problemas do passado um deles é definido a partir das origens
que pouco ou nada questiona o conhecimento diversas disciplinas: as habilidades de
prévio dos alunos; b) o historiador científico, O pensamento, por exemplo, tem uma forte
que promove a ideia de marca da psicologia cognitiva, enquanto a
a história é um problema que se resolve com categoria do pensamento histórico tenta
análise, interpretação e explicação, ou seja, aproximar o que
baseia-se no conhecimento disciplinar; possível à teoria e às práticas de
c) o reformador relativista, que considera historiografia profissional. Obviamente, esta
história como conhecimento central abordagem tem diferentes graus
para a transformação do mundo contemporâneo, e baseia-se em diversas correntes históricas.
razão pela qual é altamente influenciado Muitas vezes, forçado pela
devido à sua posição política ou religiosa; d) o caráter fronteiriço do ensino de
filósofo cósmico, que entende história, posições são combinadas
à história como uma série de padrões e historiográfico e psicológico para definir os
ciclos de progresso e declínio ou, em palavras componentes de um determinado
de Evans, metanarrativas e e) o eclético, que categoria. Em geral, todos eles partem de
pensa que a história deve ser ensinada de ideias bastante claras sobre o que é.
múltiplas maneiras, como contar aconselhável ensinar e aprender dentro
histórias, ser crítico do presente e confiar no da escola. Aqui, dada a extensão do
conhecimento científico para o texto, descreverei a categoria de pensar
formação da identidade individual e historicamente, para depois tentar
coletivo. 50 Embora possam ser identificados trazem à tona outras duas construções
essas práticas e funções de ensino teóricas: o discurso histórico escolar e
de história e às vezes há professores conhecimento histórico escolar .
que preferem um ao outro, é difícil Talvez o estudo mais significativo, embora
classifique cada professor em um, porque não o primeiro, sobre o pensamento
eles passam de um para outro inconscientemente histórico nos jovens foi o realizado
durante seu trabalho docente. por Samuel Wineburg. Este pesquisador,
Além do gosto pela lataxonomia, psicólogo de origem, realiza um exaustivo
que Evans apresenta é a necessidade de estudo comparativo entre jovens
buscar categorias analíticas que nos permitam bacharelado e especialistas (historiadores)
explicar a partir da lógica interdisciplinar no uso de fontes primárias. Por meio
para o ensino de história. Neste caso de uma série de exercícios concentra a
atenção nas habilidades cognitivas usadas
50
Evans, “Concepções”, 1991, pp. 61-94. pelos historiadores para questionar
53
Alafuente, exercício que os adolescentes não os passados. Joana Pagés, quem pode
fazem. Estas habilidades são a localização incluído neste grupo, publicou um breve estudo
espacial e temporal da fonte; comparativo entre os escritos
a contextualização do documento; o pelo marroquino Mostafa Hassani Hidrisi, o
leitura profunda; a utilização do próprio Suíço Charles Heimberg, os canadenses
conhecimento para interpretar a fonte; Robert Martineau e Stéphane Levesque
a capacidade de destacar silêncios; e a minhas investigações. Todos aceitam que
capacidade de corroborar interpretações com pensamento histórico desenvolvido por
novas fontes. Essas habilidades historiadores é um pensamento complexo
Permitem-nos ir e voltar entre o familiar e o e talvez o mais sofisticado para se pensar
estranho, entre o particular e o passado, tornando-o inútil e até mesmo
o universal. 51 Carretero, resumindo o É difícil tentar tirá-lo das salas de aula. Sem
O pensamento de Wineburg afirma que Contudo, embora seja reconhecido
metodologia como algo importante (Martineau,
para construir um “olhar” histórico, é Levesque), também se destacam
É necessário que estas duas dimensões [o conceituações relevantes, como
familiar e o estranho] entrem em jogo para causalidade, tempo histórico, intertextualidade e
organizar significativamente as relações entre narração (Heimberg, Pagés, Plá) e o peso da
o passado e o presente formando agentes linguagem na
sociais e não espectadores passivos do constituição da epistemologia da história
mundo. 52 (Hassani, Plá, Martineau). Todas essas
concepções, incluindo aquelas originadas pela
Ou seja, estes autores consideram necessário psicologia cognitiva, concentram-se em
desenvolver as competências do em aprender e ensinar
o método do historiador como base para história, permitindo-nos vislumbrar
alcançar o pensamento histórico (administrar o complexidades da construção de significados
estranho e o familiar do passado e sobre o passado dentro do
do presente). Ambos são representativos escola.
daquilo que aqui se chamou de educação Em um esforço para preencher essa lacuna
histórica. Quero lançar a mesa de discussão dois
De outra perspectiva, sem figura categorias analíticas inter-relacionadas que, do
centro tão notório e sem o poder hegemônico meu ponto de vista, nos permitem dar
em pesquisa como o mencionado acima, são os diretrizes para delinear outro olhar sobre o campo
pesquisa em ensino de história. Essas categorias
pesquisadores que relacionam o pensamento são fala
histórico para o desenvolvimento da historiografia histórico escolar e o do conhecimento histórico
profissional, mas a partir de aspectos conceituais escola. Ambos tentam apontar o
e não meramente metodológicos. É características do ensino de história como ação
Isto é, não é tanto uma forma de perguntar sobre política, ou mais precisamente, apontando os
o passado, mas uma maneira de pensar sobre o aspectos políticos e políticos
como características inerentes, na medida em que
51
Wineburg, Histórico, 2001, p. 5.
52 53
Carretero e Krieger, “Ensino”, 2010, p. 59. Páginas, “Desenvolvimento”, 2009, pp. 67-92.
pensar que sem ela a história perde o seu são antagônicas, mas ambas são suscetíveis
funcionar no ambiente escolar. Para de serem transformadas em práticas de
Chantal Mouffe, a política ensino diário dentro da escola, dependendo
de momentos históricos
É a dimensão do antagonismo que considero constitutiva e eventos conjunturais de que estamos
das sociedades humanas. falando. Mas há também as posições
nas, embora eu entenda “política” como o historiográficas, as histórias
conjunto de práticas e instituições através informais, a mídia, histórias pessoais e
do qual uma certa ordem é criada, códigos extras
organizando a coexistência no contexto einterlinguística da instituição escolar
54
do conflito derivado da política. que disputam um lugar de destaque
acima dos outros. Para as possibilidades de
Essa organização, essa ordem política, articulação de diferentes significados
se estabelece a partir de relações de poder, sobre o passado dentro da escola, eu tenho
o que resulta em algumas formas denominado discurso histórico escolar.
de exclusão. Chamo as práticas articulatórias do
discurso histórico escolar de conhecimento
Práticas articulatórias através história da escola. o ensino de história
que estabelece uma certa ordem e é a acção política através da qual
o significado das instituições sociais é estabelecido Trata-se de ocultar, mitigar ou excluir
são “práticas hegemônicas” [mas isso os diferentes antagonismos inerentes
ordem] é suscetível de ser desafiado por para interpretações do passado dentro
práticas contra-hegemônicas. 55 da escola. Esta redução de antagonistas
permite-nos ordenar, por exemplo, em
Transferiu os construtos teóricos de a mesma narrativa a figuras históricas
Mouffe para ensinar história antagônicas e até mesmo fazendo-as
consegue entender política como tudo participar da mesma causa. O resultado
aquilo que é capaz de ser articulado em uma Podem ser metanarrativas nacionais
cadeia de significados sobre constituídas por uma epistemologia política.
o passado ou o passado na escola. Mas construções particulares ou muito históricas
Estas visões do passado podem muitas vezes diverso. Mas também são ações políticas
ser antagónicas entre si, por exemplo. a relação binária entre pesquisa e
Por exemplo, a lógica dos ritos escolares, ensino, bem como a mera transposição
baseados em aniversários repetitivos, promove Didática da metodologia da pesquisa histórica
um tempo cíclico do passado, um para as salas de aula. Essa articulação acaba
historia magistra vitae, enquanto a introdução formando conhecimento, mas não como algo
de competências sustentadas incorreto na
na metodologia da história promove relação com a ciência histórica ou com uma
tempos lineares. Essas formas de conceber o democracia ideal ou tentações de usos
56 sino como for-
tempo histórico e o tempo acadêmico políticos da história,
mais particular do passado que eles têm
54
Mouffe, Torno, 2009, p. 16.
55 56
Ibid., pág. 25. Hartog e Revel, Usos, 2001, p. 14.
têm a ver com a historiografia profissional, mas lares, posições historiográficas, histórias diversas
que também estão fora dela. que são introduzidas no
As articulações do político no sala de aula, se enquadram no ensino de
política da história dentro da escola- termina história. Que relações de poder se estabelecem
referindo-se ao poder e entre psicologia e história
seus mecanismos de inclusão e exclusão. como uma ciência para legitimar certas formas
No ensino de história, o poder mais conhecimento histórico dentro do
pode ser compreendido de uma forma mais sala de aula? Como o contexto cultural influencia
complexo do que uma simples imposição de e histórias locais no significado
versões estaduais da história ou crença de diferentes eventos históricos
que os livros didáticos são os fiéis dentro del aula?, ¿cómo los códigos lin- güísticos
imagem da história que está sendo ensinada. Tem y extralingüísticos son parte de
Tem também a ver com as formas de controlo do a formação de significados sobre
professor dentro da sala de aula, com as suas Como a memória coletiva constitui parte do
estratégias didácticas, com os seus mecanismos de pensamento histórico?
avaliação, fins educacionais, condições materiais dentro da escola? são exemplo de
e gestão educacional questiona que essas categorias analíticas
em que já são realizadas as interpretações eles podem aumentar. Para resolvê-los é
informais de professores e alunos que entram necessário passar ao campo das ferramentas
em sala de aula. O exercício metodologias de pesquisa.
do poder, em suas diferentes ramificações
dentro da sala de aula, acaba selecionando
práticas hegemônicas, mas ao mesmo tempo FERRAMENTAS METODOLÓGICAS
O tempo abre a possibilidade, dependendo das
diferentes conjunturas, de espaços contra- Quando Linda Levstik57 perguntou sobre o
hegemónicos. Seguindo um pouco da sociologia diferentes interpretações sobre o passado
da educação, podemos dizer que Estudantes neozelandeses de origem europeia
ensinar história pode fazer parte e maori, eventos selecionados
de reprodução cultural ou instrumento de acontecimentos históricos que considerou relevantes, aplicou
resistência e educação crítica. uma série de entrevistas, fiz atividades
O poder, entendido em sua complexidade sessões grupais e individuais baseadas em
Como articulador do político na política, tem imagens e análises curriculares desenvolvidas. De
aspectos negativos, mas possibilidades Da mesma forma, Keith Barton58 aplicou uma
construtivas, por exemplo, uma série de entrevistas para comparar o impacto
ensino de história mais democrático. das histórias familiares e dos contextos políticos
As categorias analíticas do discurso histórico e religiosos com a história
escolar e do conhecimento histórico escolar escolaridade das crianças irlandesas. Para entender
permitem-nos formular diversas questões para a construção do pensamento histórico
ensinar história como objeto em adolescentes Samuel Wineburg59 com-
de investigação. Da relação binária pesquisa/
ensino ao exercício do poder dentro da sala de 57 Levstik, "Bem", 1999.
aula por 58
Barton, “História”, 2009, pp. 13-2
do professor, passando por lógicas curriculares 59
Wineburg, Histórico, 2001.
é insuficiente para compreender os objetos mudando ao mesmo tempo seu lugar e sua
doença. 67
processos de ensino e aprendizagem
da história hoje, como é possível
que seja o conteúdo principal do ensino? É Mas este gesto que o historiador faz para
útil ensinar algo que não pode ser preencher e dar forma a ideias ou hipóteses
explique-se? configuradas a priori é precedido por
As fontes de pesquisa em geralmente uma operação técnica: a criação
o ensino de história se aproxima e de arquivos. O historiador reorganiza o que já
Eles se afastam daqueles construídos por estava deixado de lado com
historiografia profissional. Desde o surgimento anterioridade.
da escola dos Annales tudo é O ensino também deixa de lado
capaz de ser história, de se tornar alguma coisa, mas esse objeto difere em
em fonte histórica: documentos oficiais, vários componentes das fontes da historiografia
anúncios, planos de estudo, imagens, pedras, profissional. Também a pesquisa
prédios escolares e da configuração de significados sobre
inúmeros objetos materiais. A este o passado dentro da escola exige
imenso acúmulo de objetos potenciais de um processo técnico que o separa, mas
transformá-los em “documentos”, o Este processo não precede a investigação,
o historiador tenta observá-los de uma forma mas é uma de suas partes constituintes.
original, inovador, através de uma questão de A operação técnica e criação do
investigação. A partir disso e fontes fazem parte do mesmo processo. Em
da ideia, hipótese ou modelo que relacionamento com a fonte o objeto é uma
subjacente, o historiador inicia um processo interação que está ocorrendo ou pelo menos
de seleção, uma isso simplesmente aconteceu, não que tenha
acontecido. O que se estuda faz parte de um processo histórico
gesto de pôr de lado, de reunir, de converter isso não terminou. Daí a sua condição
em “documento” alguns objetos distribuídos inalienável da situação. Mas não só
de outra forma […] Na realidade consiste Que, ao estudar o uso da história na
na produção dos documentos do fato o presente dentro da escola o que
coletar, transcrever ou fotografar o dito pesquisador tem que separar não são alguns
vestígios de outros para transformá-los em
expor aqui. Basicamente, os autores se concentram na documentos, mas deve deixar de lado
análise de fontes primárias e de textos geralmente o que te interessa numa referência instantânea
escritos. Contudo, é inevitável lembrar e que tem grande probabilidade de não deixar
o tom irônico com que Hyden White definiu o marca, de não terminar
método dos historiadores do século XIX que, entre em qualquer arquivo. Esta referência oferece
ciência e arte, “consiste no estudo de alguns
inúmeras fontes: as mais óbvias e as
línguas, em trabalhar e viajar através de arquivos, e em
os últimos são os livros didáticos e
execução correta de alguns exercícios que
familiarize-se com livros e períodos em sua área. Para o
os planos de estudo, talvez com sorte
alguns cadernos de estudante, mas o mais rico
outros, uma experiência geral dos assuntos humanos,
leituras em campos periféricos, autodisciplina e horas são os momentos
na área de trabalho é tudo o que é necessário.” Branco,
67
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