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Didática da

história no ensino
fundamental
Didática da História no
Ensino Fundamental

Fabíola Matte Bergamin


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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Bergamin, Fabíola Matte


B493d Didática da história no ensino fundamental / Fabíola
Matte Bergamin. – Londrina: Editora e Distribuidora
Educacional S.A., 2017.
132 p.

ISBN 978-85-8482-569-1

1. História (Ensino Fundamental) – Estudo e ensino.


I. Título.

CDD 372.89

2017
Editora e Distribuidora Educacional S.A.
Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza
CEP: 86041-100 — Londrina — PR
e-mail: editora.educacional@kroton.com.br
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Sumário

Tema 1 | A história no currículo como disciplina escolar 7


Tema 2 | Propostas e orientações para o ensino de história no ensino
fundamental 25

Tema 3 | O ensino da história e os PCNs 41


Tema 4 | Planejamento, problematização e critérios de seleção de
conteúdo 59
Tema 5 | Conceitos norteadores no ensino de história 73

Tema 6 | Práticas inovadoras no ensino de história 87

Tema 7 | O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de


história 103
Tema 8 | A avaliação em história no ensino fundamental 117
Convite à leitura

A História e as demais disciplinas escolares têm feito parte do cotidiano de


alunos e professores há tanto tempo a ponto de serem consideradas inerentes
à organização da escola. Distante de ter uma natureza imutável, a História como
disciplina escolar possui uma longa trajetória, permeada de conflitos na constituição
de seus conteúdos e métodos de ensino e aprendizagem.

Nesse sentido, você é convidado a refletir, a princípio, sobre as bases teóricas que
fundamentam as discussões sobre a disciplina escolar História e sua relação com a
disciplina acadêmica. Posteriormente, sua trajetória histórica no Brasil é brevemente
traçada, a fim de que você compreenda suas especificidades, suas mudanças e
permanências ao longo de sua conformação.

Trata-se de um esforço, portanto, de refletir sobre questões que envolvem


o trabalho dos professores de história e a respeito do fato de que nem sempre o
fazer cotidiano fornece as respostas prontamente. Historicizar o ensino de História,
portanto, é fundamental não só para compreender os diferentes momentos
históricos em que se constituem os saberes históricos escolares, mas também para
compreender que a disciplina nem sempre teve as mesmas finalidades e os mesmos
saberes produzidos.
Tema 1

A história no currículo como


disciplina escolar

POR DENTRO DO TEMA

1- Introdução

A discussão sobre o conceito de disciplina escolar não é uma tarefa simples, haja
vista que está relacionada a concepções sobre a escola e o saber que ela produz e
transmite.

Os debates mais expressivos têm sido realizados por pesquisadores franceses e


ingleses, com posições divergentes. As controvérsias residem, principalmente, no que
diz respeito ao conhecimento escolar, havendo defensores da ideia de disciplina como
“transposição didática” e os que concebem a disciplina como um campo autônomo.

1.1 - A transposição didática

Esta concepção cunhada pelo francês Yves Chevallard parte do pressuposto de


que as disciplinas escolares decorrem das ciências de referência, produzidas nas
universidades ou demais instituições acadêmicas. Para chegar à escola da forma mais
adequada, necessitam passar por um processo de “vulgarização” através da didática,
que cria instrumentos metodológicos para realizar essa “transposição” (BITTENCOURT,
2008).

Críticos a esse entendimento de disciplina escolar sustentam que ele defende a


existência de uma hierarquia de conhecimentos, visto que é o saber científico que
confere legitimidade às disciplinas escolares. Além disso, a escola é o lugar de recepção
e de reprodução de um conhecimento externo e cabe ao professor servir como um
intermediário nesse processo.

1.2 - Disciplina escolar, um campo autônomo

As pesquisas sobre disciplinas escolares sofreram uma renovação teórica, cujos


maiores expoentes são o inglês Ivor Goodson e o francês André Chervel. Suas reflexões
avançam no sentido de conceberem as disciplinas escolares como entidades que
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possuem e produzem um conhecimento relativamente autônomo. Deslocam-se,


assim, as decisões das influências e de legitimações exteriores em direção à escola,
inserindo o saber por ela produzido no interior de uma cultura escolar.

As disciplinas escolares se formam no interior dessa cultura, tendo objetivos


próprios e muitas vezes diferentes aos das ciências de referência. A escola, portanto, é
compreendida como uma instituição que obedece a uma lógica particular e específica
e na qual participam vários agentes, tanto internos como externos, mas que deve ser
entendida como lugar de produção de um saber próprio. As disciplinas escolares, nesse
contexto, não podem ser entendidas como simplesmente metodologias, mesmo que
tenham relações com as ciências de referência (BITTENCOURT, 2008).

A posição tem enfrentado algumas críticas, já que a concepção de Chervel, por


exemplo, provém de seus estudos sobre a história da gramática escolar na França. O
que se questiona é se essa autonomia das disciplinas escolares se estende à constituição
de outros saberes escolares. Desse modo, a análise das disciplinas escolares sob uma
perspectiva histórica tem sido essencial para identificar suas especificidades em seu
processo de conformação.

2- Abordagem histórica sobre a História no currículo

2.1 - A Introdução do ensino de História no Brasil no Século XIX: IHGB e


Colégio Pedro II

A História como área escolar obrigatória surgiu com a criação do Colégio Pedro
II, em 1837, no Rio de Janeiro. No ano seguinte foi criado o Instituto Histórico
e Geográfico Brasileiro (IHGB). Enquanto a escola havia sido criada para formar
os filhos da nobreza da Corte e prepará-los para o exercício do poder, cabia ao
IHGB construir a genealogia nacional, no sentido de dar uma identidade à nação
brasileira (ABUD, 2008).

Em um primeiro momento, a História foi incluída no currículo ao lado das


línguas modernas, das ciências naturais e físicas e das matemáticas, dividindo
espaço com a História Sagrada, a qual tinha o mesmo estatuto de historicidade
da História Universal ou Civil, pois ambas estavam voltadas para a formação moral
do aluno. A moral cívica, portanto, vinculava-se a uma moral religiosa. Os estudos
de História da Pátria seguiam os mesmos princípios dos ensinamentos da História
Sagrada, pelas narrativas da vida e dos feitos de grandes personagens da vida
pública selecionados como exemplo moral para as futuras gerações.

O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) produziu uma série de


trabalhos que gerou consequências para o ensino da História nacional, visto que
vários de seus membros eram professores do Colégio Pedro II.

Os questionamentos iam na seguinte direção: como pensar na formulação de

8 A história no currículo como disciplina escolar


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um projeto de educação para o Brasil, numa perspectiva uniformizadora tendo em


vista um quadro de diversidade social, étnica e cultural? A questão de identidade
foi colocada no centro das reflexões sobre a construção da nação, considerando
especialmente o problema da mestiçagem.

Não por acaso, em 1843, o IHGB fez, em forma de concurso, a seguinte


pergunta a seus sócios: “Como se deve escrever a História do Brasil?”. Karl Philipp
von Martius, o vencedor, propunha uma história que partisse da mistura das três
raças para explicar a formação da nação brasileira, destacando porém o elemento
branco e sugerindo um progressivo branqueamento para a civilização brasileira.
Privilegiava ainda o Estado como o principal agente da história do país, enfatizando
alguns fatos essenciais na constituição do processo histórico nacional, como as
façanhas marítimas, comerciais e guerreiras dos portugueses, a transferência e
o desenvolvimento das instituições municipais no Brasil, o papel dos jesuítas na
catequese e as relações entre a Igreja e o Estado.

A linearidade do processo histórico e o distanciamento do narrador foram


apropriados pelos organizadores/produtores da História como disciplina escolar,
utilizando-os nos programas de História do Brasil e também nos manuais didáticos
da época (ABUD, 2008).

A memorização, ademais, era a tônica do processo de aprendizagem. Aprender


História significava saber, de cor, nomes e fatos com suas datas, repetindo
exatamente o que estava escrito no livro ou copiando nos cadernos o que se lia. Um
modelo de livro didático muito utilizado em variadas escolas era o catecismo, cujo
molde muitos textos de História seguiam. A História era apresentada por perguntas
e respostas; nesse momento, os alunos deveriam repetir, oralmente ou por escrito,
exatamente as respostas do livro. Como castigo, pela imprecisão dos termos ou o
esquecimento de algumas palavras, recebiam a palmatória (BITTENCOURT, 2008).

2.2 – A História ensinada no Brasil: as disputas em torno do que ensinar

Na educação brasileira, o final do século XIX foi marcado por embates


envolvendo reformulações curriculares. Procurava-se romper com uma certa
sobreposição entre história sagrada e história profana. Foi com esse objetivo que
se introduziu, a partir da segunda década dos novecentos, a disciplina escolar
“Instrução Moral e Cívica”, que, articulada ao ensino de História, visava reforçar os
sentimentos patrióticos da população (FONSECA, 2011).

Desse modo, o ensino de História passou a ocupar no currículo um duplo


papel: o civilizatório e o patriótico. A História Universal foi substituída pela História
da Civilização, com os quatro grandes períodos, e separada definitivamente da
História Sagrada, transformando-se no eixo explicativo da História escolar: “A
cronologia continuava a organizar os conteúdos históricos escolares, tendo meta
o progresso tecnológico criado pelo homem branco” (BITTENCOURT, 2008, p.

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80).

Com relação à História Pátria, prevalecia a ideia de que a identidade nacional


deveria estar sempre calcada no “berço da Nação”, a Europa. Assim, os estudos
começam fora do espaço nacional, em Portugal, fruto de sua expansão marítima.
Seus conteúdos deveriam enfatizar as tradições do passado homogêneo, sem
contradições, de lutas pela defesa do território e da unidade nacional e os feitos
gloriosos de personagens identificados com ideais republicanos.

2.3 – A Década de 1930 e a criação dos primeiros cursos superiores de História


no Brasil

Nas décadas de 1930 e 1940 a História consolidou-se, definitivamente, como


disciplina escolar através de políticas educacionais que a colocaram no centro
das propostas de formação da unidade nacional no contexto da tomada de poder
por Getúlio Vargas. A Língua Portuguesa, a História do Brasil, juntamente com a
Educação Moral e Cívica e a Geografia, constituíram os conteúdos fundamentais
para a formação nacionalista e patriótica, sedimentando o culto aos heróis e a
criação de “tradições nacionais” nas aulas e nas festas cívicas (BITTENCOURT,
2008).

A Reforma Francisco Campos, de 1931, promoveu a centralização no recém-


criado Ministério da Educação e Saúde Pública e definiu programas e instruções
sobre métodos de ensino, significando a unificação de conteúdos e metodologias.

O ingresso ao secundário era condicionado à realização do exame de admissão


ao ginásio.

Além disso, colocava-se o estudo da História como o instrumento central da


educação política. As instruções metodológicas de História sugeridas em 1931
revelam uma tentativa de renovação metodológica do ensino, particularmente no
que se refere às sugestões de procedimentos técnicos que o professor deveria
utilizar para motivar o aluno, ressaltando e valorizando alguns aspectos, como a
necessidade da relação dos conteúdos com o presente; a utilização do método
biográfico (vida de grandes homens, heróis e condutores de homens, estudados
somente a partir de sua inserção nos contextos da sociedade em que viveram); o
privilegiamento dos fatos econômicos; além da valorização dos aspectos éticos,
em consonância com o pensamento da Escola Nova, cuja influência estava em
expansão no Brasil. A História do Brasil, contudo, continuava como um apêndice
da História da Civilização (SCHMIDT, 2012).

A formação docente foi sendo igualmente estruturada com a definição do


estatuto das universidades brasileiras em 1931. As Faculdades de Filosofia, Ciências
e Letras, criadas nos primeiros anos da década de 1930, encarregaram-se, além
da formação de pesquisadores, da profissionalização do magistério. Os cursos

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de Didática, feitos como 4° ano de formação universitária, garantiam a formação


específica para o magistério.

A Reforma Gustavo Capanema, de 1942, restabeleceu a História do Brasil como


disciplina autônoma e confirmou como seu objetivo fundamental a formação moral
e patriótica. Ficou estabelecido que o secundário teria dois níveis: o curso ginasial,
de quatro anos, e o curso colegial, separado em cursos clássico e científico, com
mais três anos.

O Clássico era voltado para alunos que iriam para o ensino superior. O Científico,
por sua vez, destinava-se a alunos interessados em trabalhar, sendo dividido em:
industrial, comercial e agrícola; vale lembrar que os alunos poderiam escolher
entre os dois cursos para fazer. No currículo, nenhum dos dois cursos tinha caráter
de especialização. Romanelli (1983) apresenta o currículo do ensino secundário: o
1º ciclo (ginásio) continha as seguintes disciplinas, distribuídas entre as 1ª, 2ª, 3ª e
4º séries: português – latim – francês – inglês – matemática – ciências naturais –
história geral – história do Brasil – geografia geral – geografia do Brasil – trabalhos
manuais – desenho – canto orfeônico. No 2º ciclo (curso Clássico), havia as
seguintes disciplinas, distribuídas entre as 1ª, 2ª e 3ª séries: português – latim – grego
(optativo) – francês (optativo), inglês (optativo) – espanhol – matemática – história
geral – história do Brasil – geografia geral – geografia do Brasil – física – química –
biologia – filosofia. O 2º ciclo (curso Científico) continha as seguintes disciplinas
das 1ª, 2ª e 3ªséries: português – francês – inglês – espanhol – matemática – física
– química – biologia – história geral – história do Brasil – geografia geral – geografia
do Brasil – desenho – filosofia.

A lei orgânica do ensino normal, de 1946, fixava as normas de funcionamento


do curso de formação de docentes de escolas primárias. O ensino normal ficou
dividido em cursos de dois níveis. No 1º ciclo (de 4 anos) funcionava o curso de
formação de regentes de ensino primário (escolas normais regionais). Os cursos
de 2º ciclo continuavam a ser para a formação de professores primários (3 anos) e
funcionariam em escolas normais.

O Ensino Normal apresentava um 1º ciclo contando com as seguintes disciplinas


nas 1ª, 2ª, 3ª e 4º séries: português – matemática – Geografia geral – geografia do
Brasil – história geral – história do Brasil – ciências naturais – anatomia e fisiologia
humanas – higiene – educação física – desenho e caligrafia – canto orfeônico –
trabalhos manuais – psicologia e pedagogia – didática e prática do ensino. No 2º
ciclo, havia as seguintes disciplinas nas 1ª, 2ª e 3ª séries: português – matemática
– física e química – anatomia e fisiologia humanas – música e canto orfeônico
– desenho e artes aplicadas – educação física, recreação e jogos – biologia
educacional – psicologia educacional – higiene, educação sanitária e puericultura
– metodologia do ensino primário – sociologia educacional – história e filosofia da
educação – prática do ensino.

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Souza (2009) sustenta que a reforma Capanema pode ser considerada uma
vitória dos defensores do currículo humanista, o último reduto da língua latina
na educação secundária e da valorização da cultura geral como eixo central da
formação da juventude.

2.4 – Regime Militar e Estudos Sociais

Sob o regime político ditatorial dos militares, foi sancionada a Lei n. 5.692, de
1971, em que o secundário foi dividido em dois níveis: o ginasial, que se tornou
uma continuidade do ensino primário (primeiro grau de oito anos); e o colegial,
que passou a ser denominado segundo grau. História e Geografia transformaram-
se em Estudos Sociais, o qual se tornou obrigatório e se estendeu para as oito
séries do antigo primeiro grau. Dessa forma, os conteúdos poderiam ser tratados
como atividades (1ª a 4ª séries sob o nome de Integração Social); áreas de estudo
(5ª a 8ª séries, sob o nome de Estudos Sociais); e disciplina (somente no 2º Grau).
Como se pode observar, o ensino de História, como disciplina isolada, ficou restrito
ao segundo grau.

A disciplina teve que competir com conteúdos dogmáticos provenientes das


disciplinas de Educação Moral e Cívica (EMC) e Organização Social e Política do
Brasil (OSPB). Tanto a disciplina EMC (instituída em 1961) quanto a OSPB (instituída
em 1962) foram ressignificadas pelo Regime Militar como disciplinas curriculares, a
serviço do nacionalismo e da exaltação do civismo.

A especificidade do objeto do conhecimento histórico foi generalizada e diluída:


“O objetivo do ensino de Estudos Sociais não era estudar, analisar, refletir sobre a
história construída, mas ‘localizar e interpretar fatos’ utilizando ‘instrumental das
ciências sociais’ em geral e não da História especificamente” (FONSECA, 2014, p.
29). Desse modo, a História aparecia como sucessão linear de fatos considerados
significativos, predominantemente de caráter político-institucional, a partir dos
quais se sobressaiam os grandes personagens, únicos sujeitos históricos.

A formação de professores também sofreu mudanças com a proliferação dos


cursos de licenciatura curta em Estudos Sociais, cujos professores saíam com
habilitação para ministrar aulas de Estudos Sociais, Geografia, História, Organização
Social e Política do Brasil e Educação Moral e Cívica.

Diversos manifestos e reações de professores, contudo, ocorreram por meio de


suas associações – como a Associação Nacional de História (Anpuh) e Associação
dos Geógrafos do Brasil (AGB) –, sendo contrários à implementação dos Estudos
Sociais. Desse modo, houve uma revisão da legislação explicitando a possibilidade
de introduzir como disciplinas autônomas História, Geografia e OSPB a partir da
5ª série.

Ademais, os atos cívicos eram recorrentes no cotidiano escolar, confundindo-

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se com o ensino de História. Nesses atos, crianças e jovens cultuavam os


símbolos e os heróis nacionais – por meio de homenagens ao hino, à bandeira – e
participavam de comemorações, tais como a da conquista do tricampeonato de
futebol em 1970. Todos esses rituais foram integrados pelo Regime Militar como
forma de manutenção da ordem e controle social.

2.5 – O repensar do ensino de História a partir da década de 1980:


apontamentos para pensar as questões atuais

No final dos anos 1970, com a crise do regime militar, com o processo de
redemocratização e com o advento de novas possibilidades de se pensar a
realidade brasileira, ficou patente a necessidade de se promoverem mudanças
no ensino de História. Esse processo foi iniciado no princípio dos anos 1980 em
alguns estados brasileiros, resultando na elaboração de novos programas e novas
propostas metodológicas a fim de abranger as transformações do público escolar
composto por vários grupos sociais.

As propostas curriculares passaram a ser influenciadas, também, pelo debate


entre as diversas tendências historiográficas, caso da história das mentalidades
e do cotidiano, recusando as abordagens históricas sustentadas nos eventos
políticos e administrativos dos estados ou exclusivamente nas análises econômicas
estruturais. Ademais, o eurocentrismo dominante e o processo evolutivo em que
as ações dos homens comuns eram desconsideradas foram questionados.

Influenciados pelas novas abordagens, materiais didáticos foram elaborados a


fim de dar conta dessa demanda, combinados às novas políticas educacionais,
sobretudo no que tange à criação do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).

Os Parâmetros Curriculares Nacionais, publicados em 1998, também fazem


parte do processo de renovação das discussões acerca do ensino de História,
tentando englobar também questões sobre o advento das novas tecnologias de
comunicação, o consumismo e a diversidade cultural.

Em 2003, foi sancionada a Lei Federal n. 10.639/2003, que alterava a Lei de


Diretrizes e Bases de 1996, determinando a obrigatoriedade, no currículo da rede
de ensino, da inclusão do estudo da História e Cultura Afro- brasileira. A aprovação
da lei foi considerada um marco efetivo na adoção de políticas públicas e ações
afirmativas de reconhecimento da diversidade étnico-racial na educação brasileira
(FONSECA, 2014).

Ademais, a Lei Federal n. 11.645/2008 determinou a obrigatoriedade da inclusão


do estudo da História e Cultura Afro-brasileira e Indígena nos ensinos fundamental
e médio. Complementavam-se as leis anteriores com o objetivo de valorizar as
contribuições culturais das populações indígenas do Brasil. É importante ressaltar
que as alterações na LDB são resultado de lutas e demandas de movimentos

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sociais que almejavam a valorização e o reconhecimento da diversidade étnico-


racial na educação brasileira.

A disciplina escolar História, portanto, não é mais a mesma desde sua


constituição no século XIX, tendo havido mudanças, mas também permanências,
no que diz respeito aos conteúdos e métodos de ensino e aprendizagem. Assim,
os saberes históricos escolares sofreram influência das transformações do
campo de conhecimento histórico, da formação dos professores, das demandas
de movimentos sociais, e também das políticas públicas referentes à educação
e da própria organização da escola. A disciplina escolar, desse modo, é objeto
constante de disputas e debates, e é imprescindível considerar os diversos atores
que contribuíram para a conformação da disciplina ao longo do tempo.

ACOMPANHE NA WEB

Uma Escola para Poucos

Este artigo apresenta um pouco sobre a história do Colégio Pedro II e sua influência
nos programas de história no século XIX.

Disponível em: <http://www.revistadehistoria.com.br/secao/educacao/uma-


escola-para-poucos>. Acesso em: 4 jun. 2015.

O que Ensinar em História

Matéria que discute a trajetória do ensino de História no Brasil. Ao final, traz uma
entrevista com uma professora de História, a qual relata suas experiências e o
modo como mudou sua forma de ensinar.

Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/passado-presente-


juntos-ensinar-428266.shtml?page=0>. Acesso em: 4 jun. 2015.

Os Impactos da Ditadura na Educação

Palestra proferida pela profa. Dra. Circe Bittencourt na Comissão estadual da


Verdade Rubens Paiva, que tratou sobre o ensino de História no período do regime
militar e sobre os desafios de ensinar História na atualidade.

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=_0DZk5tVCI8>. Acesso em:


4 jun. 2015.

Tempo: 01:10:38.

14 A história no currículo como disciplina escolar


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AGORA É A SUA VEZ

Instruções:

Agora, chegou a sua vez de exercitar seu aprendizado. A seguir, você encontrará
algumas questões de múltipla escolha e dissertativas. Leia cuidadosamente os
enunciados e atente-se para o que está sendo pedido.

Questão 1

Leia a seguir o excerto do artigo do Prof. Dr. João do Prado Ferraz de Carvalho,
intitulado “Ensino de História e cultura escolar: resistências no contexto de uma
tradição inventada”1.

[...] A criação de uma instituição de ensino secundária que


ofertasse uma formação humanista, como era o propósito do
Colégio Pedro II, foi entendida como um modo de viabilizar o
Estado nacional.
Qual a relação da disciplina com esse projeto? Beatriz Boclin
Marques dos Santos, em estudo sobre o currículo de História
no Colégio Pedro II, escreveu que a disciplina “teria um
importante papel na consolidação do Estado nacional: o de
contribuir para forjar a nacionalidade brasileira. Nesse sentido,
construir uma História nacional era fundamental ao processo
de formação de uma identidade brasileira” (2001: p. 51).
Outras pesquisadoras, como Circe Bittencourt e Arlette
Medeiros Gasparello, se debruçaram sobre o período de
criação da disciplina de História no Brasil. Elas trataram da
construção de uma narrativa histórica escolar para a qual a
produção de uma identidade nacional, ou de uma “Pedagogia
da nação”, foi fator fundamental e materializado nos manuais
escolares escritos, muitos deles, pelos professores do Colégio
Pedro II.
O século 19 também foi o período no qual a História se afirmou
como ciência e como conhecimento legítimo, originando uma
escola que ficou conhecida como positivista ou historicista,
no interior da qual o documento escrito, uma vez submetido
ao crivo da crítica historiográfica, era entendido como a fonte

1
Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/ensino-historia-cultura-escolar-
resistencias-contexto-tradicao-inventada-817807.shtml>. Acesso em: 11 maio 2015.

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principal dos estudiosos. De forma sintética, podemos dizer que


uma concepção de tempo linear, progressivo, e uma História
política, militar e factual, resumem o que viria a ser chamado de
uma História tradicional.
O objetivo deste artigo não é recuperar a trajetória da disciplina
de História nem fazer uma análise da historiografia positivista.
Pretendemos indicar traços de permanência de certa tradição à
qual devemos atentar ao trabalhar o conhecimento da área em sala.

Após a leitura, aponte traços de permanência, citados pelo autor, que podemos
identificar em nossa experiência com o ensino da disciplina escolar História atual.

Questão 2

Sobre o debate acerca do conceito de disciplina escolar, considere as seguintes


proposições:

I- A concepção de “transposição didática” parte do pressuposto de que os saberes


acadêmicos e escolares têm a mesma importância, sem hierarquização.

II- A partir do entendimento de pesquisadores como André Chervel e Ivor


Goodson, as disciplinas escolares se formam no interior de uma cultura escolar,
tendo objetivos próprios e muitas vezes diferentes aos das ciências de referência. A
escola, portanto, deve ser entendida como lugar de produção de um saber próprio
e não apenas dependente dos saberes acadêmicos.

III- De acordo com a concepção da “transposição didática”, as disciplinas escolares


decorrem das ciências de referência, dependentes da produção das universidades
ou demais instituições acadêmicas e servem como instrumento de “vulgarização”
do conhecimento acadêmico.

É correto o que se afirma:

a) apenas na proposição I.

b) apenas na proposição II.

c) apenas na proposição III.

d) apenas nas proposições II e III.

e) apenas nas proposições I e II.

16 A história no currículo como disciplina escolar


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Questão 3

Sobre a trajetória do ensino da disciplina escolar História no Brasil, é correto afirmar:

a) O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) produziu uma série de


trabalhos que não influenciou o ensino da História nacional, uma vez que seus
membros não tinham qualquer relação com o Colégio Pedro II.

b) O ensino de História sob o viés patriótico e nacionalista foi apenas utilizado na


Era Vargas.

c) Houve diversos manifestos e reações de professores, contudo, ocorreram


por meio de suas associações como a Associação Nacional de História (Anpuh)
e Associação dos Geógrafos do Brasil (AGB), contrários à implementação dos
Estudos Sociais.

d) As alterações na LDB, a partir das leis n. 10.639/2003 e n. 11.645/ 2008, as quais


determinaram a obrigatoriedade da inclusão do estudo da História e Cultura Afro-
brasileira e Indígena nos ensinos fundamental e médio, são resultados apenas de
estudos acadêmicos que colocavam essas temáticas em evidência.

e) Apenas a partir dos anos 1990 surgiram diversas propostas de reformulação dos
conteúdos e métodos do ensino de História.

Questão 4

O que é uma disciplina escolar? Quais suas especificidades em relação à disciplina


acadêmica? De acordo com Bittencourt (2008, p. 35): “essas questões não são de
simples resposta, pois remetem a concepções mais complexas sobre a escola e o
saber que ela produz e transmite”.

Tendo em vista o debate sobre o conceito de disciplina escolar, elenque as críticas


desenvolvidas a respeito da disciplina escolar como transposição didática e como
campo de conhecimento autônomo.

Questão 5

A partir dos anos 1980, vieram à tona inúmeros questionamentos sobre o ensino
de História até então, resultando na elaboração de novos programas e novas
propostas metodológicas. Explique ao menos duas influências nessa discussão e
suas consequências nas reformulações dos programas.

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FINALIZANDO

A trajetória da disciplina escolar História no Brasil e seu processo de conformação


são complexos, resultado de conflitos e debates traçados em diversos campos,
não só o acadêmico mas também o da política, dos movimentos sociais, das
associações profissionais e das próprias escolas, dentro das suas práticas. Trata-se,
portanto, de um processo dinâmico que apresentou (e apresenta) resistências em
suas diversas épocas.

É o que se pode verificar desde a sua instituição como disciplina obrigatória –


com a criação do Colégio Pedro II, em 1837, no Rio de Janeiro e a sua utilização
como instrumento pedagógico na constituição de uma identidade nacional
ligada estreitamente à moral religiosa –, passando pela ênfase na História para
desenvolver uma formação nacionalista e patriótica nos anos 1930; e chegando à
a sua diluição em Estudos Sociais até a sua restituição como disciplina, com seus
debates e reformulações nos anos 1980 e 1990.

Reformas curriculares, tanto no nível federal quanto nos níveis estadual e


municipal, são constantemente propostas. Desse modo, é importante não perder
de vista a trajetória das disciplinas escolares a fim de se questionar quais são os
objetivos e quais são os interesses (e de quem) que estão em jogo nesses debates.

Ademais, muitas vezes, no cotidiano como professor de História, fazemos uso


de métodos e conceitos que, embora muitas vezes nos pareçam naturais, são
resquícios de concepções da disciplina escolar de certo período. Ter em mente
a trajetória permite a reflexão da própria prática pedagógica no interior da escola,
além da escolha de métodos, conteúdos e abordagens na contemporaneidade.

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REFERÊNCIAS

ABUD, Kátia M. Currículos de História e políticas públicas: os programas de História


do Brasil na escola secundária. In: BITTENCOURT, C. (Org.). O saber histórico na
sala de aula. São Paulo: Contexto, 2008, p. 28-41.

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e


métodos. São Paulo: Cortez, 2008.

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v. 9, n. 1, p.72-90, 2009.

GLOSSÁRIO

História Sagrada: fazia parte da doutrina religiosa e predominava nos textos


escolares. Era comum a utilização de preleções com histórias sobre a vida de
santos, personagens que tratados como exemplo de caráter, de moral e de fé
(BITTENCOURT, 2008, p. 62).

Vulgarização: no sentido do texto, significa “tornar acessível”.

Cultura escolar: na interpretação de André Chervel, a instituição escolar era capaz


de produzir um saber específico cujos efeitos estendiam-se sobre a sociedade
e a cultura, e que emergia das determinantes do próprio funcionamento
institucional. A cultura que a escola legava à sociedade, apesar de muitas vezes
produzir os resultados esperados pelo programa oficial, também revelava efeitos
imprevisíveis, produzidos independentemente pelo sistema escolar (FARIA
FILHO; GONCALVES; VIDAL; PAULILO, 2004).

Escola Nova: movimento de renovação do ensino que foi especialmente forte na


Europa, na América e no Brasil, na primeira metade do século XX. No Brasil, vários
educadores se destacaram, especialmente após a divulgação do Manifesto dos
Pioneiros da Educação Nova, de 1932, como Lourenço Filho e Anísio Teixeira,
os quais propunham que o Estado organizasse um plano geral de educação e
defendia a bandeira de uma escola única, pública, laica, obrigatória e gratuita.

Educação Moral e Cívica: em 1961 a Lei n. 4.024 (Lei de Diretrizes e Bases da


Educação Nacional – LDB) consagrou, nos currículos do ensino de primeiro grau,
a disciplina “Educação Moral e Cívica” (EMC). De acordo com Filgueiras (2006), a
institucionalização da disciplina de EMC pelo Regime Militar procurou construir
um ideário patriótico, com uma nação forte, que ressaltava os valores da moral,
da família, da religião/fé e da defesa da Pátria e inculcava valores anticomunistas
nos jovens e nas crianças. A introdução da EMC nos currículos explicitava como
o Estado e os grupos dirigentes lidavam com a escolarização: a finalidade do
ensino seria a formação genérica de um cidadão, amante da pátria e defensor de
princípios moralizadores. Nessa proposta de nação coletiva, seriam eliminadas as

22 A história no currículo como disciplina escolar


T1

possíveis diferenças, tensões e desigualdades; o único lugar possível era o do ser


brasileiro, “indivíduo coletivo”.

Organização Social e Política do Brasil: em 1962, o Conselho Federal de Educação,


mediante a expedição de parecer normativo, criava, como complemento e
extensão da disciplina EMC nos estabelecimentos de ensino de segundo grau, a
disciplina “Organização Social e Política do Brasil” (OSPB). Essa disciplina nada mais
era do que a ampliação da EMC, que constava do currículo do ginasial; enquanto
a OSPB aparecia nos currículos dos ensinos médio e superior.

A história no currículo como disciplina escolar 23


Tema 2

Propostas e orientações para


o ensino de história no ensino
fundamental

POR DENTRO DO TEMA

Este tema possibilita pensar o ensino de História num contexto em que a


compreensão das transformações políticas e sociais torna-se essencial a um
debate sóbrio em torno da função da educação e principalmente da História no
ensino fundamental. Para tanto, algumas questões devem nortear o estudo sobre a
produção do conhecimento histórico, para que posteriormente seja apresentada uma
sistematização em torno da proposta sobre as orientações da abordagem histórica no
ensino fundamental.

Em ligeira análise da literatura produzida nos últimos trinta anos, pode-se


observar que várias pesquisas na área de prática de ensino vêm sendo desenvolvidas
em função do desgaste da instituição escolar e do ensino de história. Assim, entre
as questões que merecem destaque, estão aquelas que dizem respeito aos mais
de vinte anos da ditadura militar no Brasil (1964-1985).

Neste contexto em que as perseguições políticas, a censura e o autoritarismo


tomaram parte da dura realidade social brasileira, o que se presenciou no âmbito
da educação foi a exclusão do ensino de História e Geografia do que antes era
conhecido como primeiro grau. Em substituição a essas disciplinas, surgiram
outras, tais como Estudos Sociais, Educação Moral e Cívica e Organização Social
e Política do Brasil, que, de acordo com Monteiro (2005), tinham como finalidade
a doutrinação e apologia ao regime instituído (MONTEIRO apud CABRINI et al.,
2005).

Após os chamados “anos de chumbo”, já num contexto de reabertura política


em meados da década de 1980, alguns estudiosos da educação focaram seus
estudos em torno da constituição de um currículo de História e, principalmente,
sobre seus métodos de ensino. Nesse sentido, a historiografia recente, seguindo
as mesmas diretrizes, tem debatido constantemente a relação entre o ofício do
T2

historiador e os desdobramentos do exercício docente em sala de aula, visando


superar a herança de um ensino fragilizado pelo regime (BITTENCOURT, 2008;
2001; FONSECA, 2007; CABRINI et al., 2005).

Nesse quadro, tais estudos visaram articular a atividade de pesquisa a uma


proposta de ensino de história que previa o entendimento da realidade do aluno,
contribuindo para que este exercitasse, no ato de pensar e se expressar, uma
postura mais ativa no processo de construção do conhecimento.

No entanto, você pode vir a indagar “como ensinar o aluno a pensar


historicamente?”, ou ainda, “como incitá-lo a produzir o seu conhecimento
histórico sem reproduzir o conhecimento prescrito imposto pelo currículo
escolar?”. Pensando nesses possíveis questionamentos, retomaremos algumas
indagações realizadas por Selva Guimarães Fonseca em Didática e Prática de Ensino
de História, obra em que a autora discorre sobre possíveis temas que podem ser
contemplados na abordagem dos conteúdos.

Fonseca (2007, p. 31), ao abordar a temática sobre o ensino de história e a


articulação com as proposições estabelecidas pela Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (1996) e pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (1997),
problematiza: “quais os elementos da cultura devem ser transmitidos?” e ainda
“como realizar uma seleção de conhecimentos ‘representativa’ dos diversos
setores e visões sociais que respeite e valorize as diferenças culturais dos alunos?”.
Buscando possíveis respostas a tais indagações, a autora se apropria da concepção
de currículo desenvolvida por Goodson, que acresce em nossa discussão:

As diretrizes e os textos curriculares, como elementos


de políticas educacionais, são – como bem sabemos
– veiculadores de ideologias, de propostas culturais e
pedagógicas com grande poder de penetração na realidade
escolar. Como afirma Goodson (1996, p. 15), ‘o currículo é uma
invenção da tradição’ [...]. Entretanto, o documento curricular
formal é apenas um dos níveis em que se opera a seleção
cultural. O que os alunos aprendem e deixam de aprender
– o que é e o que não é transmitido a eles cotidianamente
em nossas escolas – é mais amplo e mais complexo do que
qualquer documento. (FONSECA, 2007, p. 33)

Perceba que atuar na educação como educador, professor de História e


pesquisador requer a constante problematização dos conteúdos curriculares
sob a perspectiva ideológica e política inerente às propostas e conteúdos
estabelecidos pela instituição educacional. Essa postura, como elemento essencial
e determinante de sua prática docente, estará em consonância com a definição

26 Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental


T2

das finalidades a serem alcançadas em seu projeto educacional. Portanto, nesse


sentido, a definição das atividades docentes terá que partir da análise das condições
objetivas com as quais o conhecimento está sendo construído para que então seja
desenvolvida a compreensão da historicidade dos agentes históricos com os quais
se está trabalhando.

Destarte, o que se orienta, antes de se definir a prática docente a ser desenvolvida


no ensino de história, é a ponderação sobre dois aspectos intrinsecamente
relacionados. O primeiro diz respeito à relação entre o saber/poder e a produção
do conhecimento no ensino fundamental, considerando que este conhecimento
não é uma reprodução do que é desenvolvido no ensino superior. O segundo se
refere à reflexão sobre a natureza do ensino de história com a qual se trabalha.
Desta feita, iniciaremos nossos estudos sobre as propostas para o ensino de história.

O Ensino de História

O que é História? Você já pensou sobre o porquê da seleção de determinados


conteúdos de história e não de outros? O movimento para o ensino de História
desde os anos de 1980 vem lutando contra uma concepção de história que propõe
a “reprodução” imposta pelos saberes históricos consolidados e transmitidos
pela instituição escolar. Segundo Apple (1989), cabe à instituição escolar criar as
condições de percepção das contradições sociais como elemento viabilizador de
produção de novos conhecimentos e não apenas um reflexo proposto por um
ensino pautado na dinâmica de funcionamento da economia, da sociedade e das
exigências ideológicas das classes dominantes.

Na mesma vertente desses estudos, alguns estudiosos da educação vêm se


debruçando sobre a temática, defendendo a necessidade de reconhecimento
da dinâmica cultural existente nas instituições escolares como instituições
homogeneizadoras da cultura dominante estabelecida. Assim, segundo Sacristán
(1995, p. 103):

[...] a escola como instituição surge e funciona como agência


de assimilação à cultura dominantemente estabelecida.
E as práticas organizativas e metodológicas nos sistemas
escolares compõem uma herança que impõe uma tendência
à homogeneização de tratamentos pedagógicos.

Nesse sentido, o ensino de História deve passar pela construção de um currículo


que contribua para uma educação democrática. A ideia é valorizar conteúdos da
cultura comum que permitam o acesso igualitário do que há de universal nas
produções do pensamento humano, do conhecimento e de “experiências históricas
específicas dos grupos e projetos representativos para a história de cada um”

Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental 27


T2

(FONSECA, 2007, p. 35). E também desenvolver concepções baseadas no respeito


“à diferença, à diversidade, o espírito democrático, a tolerância e a solidariedade,
sem perder de vista as referências universais da cultura, dos problemas e da história
dos homens” (FONSECA, 2007, p. 35).

Para isso, é necessário que o professor de história inicie o processo de ensino


e aprendizagem tendo como ponto de partida as problemáticas circunscritas
à realidade de vida do aluno, da escola e da comunidade da qual pertence. Do
mesmo modo, o trabalho com diferentes fontes históricas (filmes, quadrinhos,
charges, literatura, e as múltiplas manifestações humanas) tornam-se essenciais a
uma abordagem crítica condizente com o ofício do historiador. A diversificação na
abordagem dos acontecimentos históricos atua no sentido de promover o acesso
democrático no confronto de ideias e informações, contribuindo para que haja
uma ampliação da perspectiva histórica dos diferentes acontecimentos.

Memória, Identidade e Diversidade no Estudo das Diferentes Fontes Históricas


no Ensino de História

Ao falarmos em memória, identidade e diversidade, faz-se necessário partirmos


de uma apropriação efetiva dos conceitos. Assim, neste tópico, iniciaremos nossa
reflexão com algumas definições em torno do conceito de memória.

Na concepção do historiador Ulpiano Bezerra de Menezes, a memória é uma


construção social que permite a formação da imagem necessária aos processos
de constituição e reforço da identidade individual, coletiva e nacional. Ela se torna
elemento diferenciador da história na medida em que se constitui enquanto
“operação ideológica, processo psico-social de representação de si próprio que
reorganiza simbolicamente o universo das pessoas, das coisas, imagens e relações,
pelas legitimações que produz” (MENEZES, 1992, p. 22). Na contramão de tal
definição, o autor diz que a história pode ser definida por sua forma intelectual de
conhecimento e operação cognitiva.

Da leitura do excerto anterior, pode-se encaminhar nosso entendimento sobre


a memória como um elemento essencial e viabilizador de conexões da relação
coletiva que uma comunidade pode estabelecer com o seu passado. Assim, na
definição de Jacques Le Goff, citada por Silva e Silva (2006, p. 275):

A memória é a propriedade de conservar certas informações,


propriedade que se refere a um conjunto de funções psíquicas
que permite ao indivíduo atualizar impressões ou informações
passadas, ou reinterpretadas como passadas. [...] sendo a
memória social um dos meios fundamentais para se abordar
os problemas do tempo e da História. [...] A memória está nos

28 Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental


T2

próprios alicerces da história, confundindo-se com o documento,


com o monumento e com a oralidade.

Explorado o conceito, comecemos nossa análise partindo do alerta promovido


pelo historiador Eric Hobsbawn, em seu livro A era dos extremos: o breve século
XX, sobre a função da memória enquanto elemento constitutivo da identidade
histórica das nações:

A destruição do passado - ou melhor, dos mecanismos sociais que vinculam


nossa experiência pessoal à das gerações passadas - é um dos fenômenos mais
característicos e lúgubres do final do século XX. Quase todos os jovens de hoje
crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com
o passado público da época em que vivem. Por isso os historiadores, cujo ofício é
lembrar o que os outros esquecem, tornam-se mais importantes que nunca no fim
do segundo milênio. (HOBSBAWN, 1995, p.13)

De acordo com o autor, a ameaça da perda dos referenciais históricos


pela população jovem em nossa contemporaneidade, que padece dos males
provenientes da mundialização do capital, faz com que nos questionemos sobre a
afirmação do fim da História, bradado por diferentes vertentes do neoliberalismo.
Nesse contexto, a função da memória na história das civilizações assume papel de
grande relevância na afirmação da identidade nacional de cada país. Em perspectiva
semelhante, ao explorar a função da memória como principal elemento na
constituição identitária do aluno no ensino de História, Bittencourt (2008, p. 169)
alega que:

A questão da memória impõe-se por ser a base da identidade,


e é pela memória que se chega à história local. Além da
memória das pessoas, escrita ou recuperada pela oralidade,
existem os “lugares da memoria”, expressos por monumentos,
praças, edifícios públicos ou privados, mas preservados como
patrimônio histórico.

Um exemplo dessas conexões pode ser apreendido quando estudamos as


organizações dos movimentos políticos que lutam pelo reconhecimento de suas
identidades étnico-culturais, dos seus direitos e do respeito à diversidade. Por
exemplo, a partir dos anos de 1970, observa-se o surgimento de movimentos
sociais populares protagonizados por trabalhadores, mulheres, negros, índios e
homossexuais, que lutam pelo reconhecimento de seus direitos de cidadania e
de participação nos processos decisórios nacionais, resgatando a memória como

Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental 29


T2

meio de afirmação da identidade étnica e cultural (ORIÁ, 2001).

Assim, também a remissão à memória como objeto do ensino de História torna-


se matéria-prima que proporciona o entendimento das relações sociais, políticas
e culturais de um país. Portanto, nesse sentido, o historiador Ulpiano Bezerra de
Menezes desenvolve o tema da seguinte maneira:

O tema da memória está em voga, hoje mais do que nunca.


Fala-se da memória da mulher, do negro, do oprimido,
das greves do ABC, memória da Constituinte e do partido,
memória da cidade, do bairro, da empresa, da família. Talvez
apenas a memória nacional, tantas vezes acuada (e tantas
vezes acuadora) esteja retraída. Multiplicam-se as casas de
memória, centros, arquivos, bibliotecas, museus, coleções,
publicações especializadas (até mesmo periódicos). Os
movimentos de preservação do patrimônio cultural e de
outras memórias específicas já contam com força política
e têm reconhecimento público. Se o antiquariato, a moda
retrô, os revivals mergulham na sociedade de consumo, a
memória também tem fornecido munição para confrontos e
reivindicações de toda espécie. (MENEZES, 1992, p. 9)

Assim, se a memória histórica está presente em nosso cotidiano como fruto da


experiência humana e se a história deve ser pensada e apreendida como reveladora
das contradições sociais e, portanto, como instrumento de luta política, o ensino
deverá problematizar as manifestações de poder que perduram nas relações entre
classes.

Sabe-se que a historiografia da década de 1980 se debruçou nos estudos


relacionados à inserção “dos excluídos na história oficial” e que, no âmbito da
legislação, houve a ampliação do conceito de patrimônio cultural e a inserção
de noções de valorização da diversidade cultural como condição indispensável
à construção da cidadania (ORIÁ, 2001). Conforme Magaldi (1992, p. 230) essas
transformações objetivam:

Compreender o Direito à memória como dimensão


fundamental da cidadania, implica reformular as relações
entre preservação e a educação formal [...] cabe ao ensino
de 1º e 2º graus integrar em seus currículos e programas
escolares formas de incentivar ações concretas nesta área,
incorporando atividades no campo da história oral, do contato

30 Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental


T2

com acervos arquivísticos ou museológicos, e com a paisagem


urbana, de modo a vivenciar uma relação democrática com as
diferenças do passado e do presente.

A consideração do ensino de História com o uso de diferentes fontes na


construção do saber e com a inclusão de práticas vinculadas à educação
patrimonial torna-se essencial à concepção de formação escolar para a cidadania,
pois implica reconhecermos, como cidadãos, que temos direito à memória, mas
também o dever de contribuir com a preservação e manutenção da constituição
histórica de nosso país, com a formação de uma identidade cultural plural.

Portanto, a incorporação de diferentes noções, representações e linguagens


vividas fora da escola, na família, no trabalho, nos espaços de lazer e na mídia é
um dos meios que contribuem para a formação do aluno/cidadão, que se inicia e
se processa ao longo de sua vida nos diferentes espaços de vivência (FONSECA,
2007).

Assim, nesse processo de constante produção e construção de uma nova forma


de pensar e apreender as relações humanas, o ensino da história e as práticas de
ensino em sala de aula devem ser guiados sob essas diretrizes. Nesse sentido, as
ideias aqui exploradas têm o propósito de criar condições para que você venha a
firmar um compromisso de refletir sobre os fundamentos da história e sob qual
perspectiva o caminho deverá ser trilhado para a construção de uma sociedade
mais justa e democrática. Uma perspectiva foi aberta nessa breve explanação,
agora é o momento de você trabalhar com novas possibilidades. A seguir, será
tecido um exemplo de práticas de ensino que objetivam uma nova postura frente
ao saber a ser constituído.

Construindo Possibilidades para o Ensino de História

A sugestão que apresentamos a seguir foi formulada mediante leitura da obra


O saber histórico na sala de aula, organizada por Circe Bittencourt (2001). A ideia
apresentada fundamenta-se nas práticas educativas em museus como um meio de
desenvolver o resgate à memória da constituição social de diferentes sociedades,
concomitantemente à difusão cultural e ao desenvolvimento de práticas voltadas
à consolidação da cidadania.

A prática de ensino que tem como finalidade promover a análise do acervo dos
museus tem o privilégio de contar com a assessoria de uma equipe preparada, que
facilita o entendimento da disposição dos objetos que em seu conjunto formam o
discurso a ser transmitido. Sabendo-se que o Brasil dispõe de uma série de museus
que possuem departamentos de educação ou de ação educativa, a proposta

Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental 31


T2

apresentada utiliza o Museu de Arqueologia e Etnologia-MAE/USP como exemplo


para a prática docente nos museus, sem, no entanto, restringir as possibilidades a
essa instituição (ALMEIDA; VASCONCELLOS, 2001).

Partindo das demandas da realidade de vida do aluno e concebendo a


educação escolar como produtora de conhecimento, é possível criar novas
formas de compreensão do ser nas diferentes dimensões de sua vida. Por isso, o
uso de espaços educativos como os museus se torna interessante na medida em
que redimensiona o entendimento do aluno em torno dos diferentes aspectos da
sua vida. Assim, o resgate da memória histórica em torno da organização social
de diferentes sociedades e em contextos variados permite desenvolver no aluno
valores humanos de respeito e tolerância frente ao que é diverso, mas também
viabiliza a identidade com os hábitos e costumes das formas de vida no passado.

Destarte, propor um trabalho na seção indígena do MAE, com um projeto que vise
compreender as formas de organização social; a divisão das atividades de trabalho;
a relação com a natureza; os rituais religiosos; primando pelo estabelecimento de
relações com a nossa organização social, contribui para que o aluno identifique o
surgimento de determinados costumes provenientes de uma cultura com a qual
a priori ele não se identifica. Da mesma forma ocorre com outras etnias, como as
africanas, europeias e asiáticas.

Visto isso e compreendendo que as exposições apresentam objetos, textos,


fotografias, desenhos, figuras e vídeos ordenados de forma a criar um diálogo com
os visitantes e transmitir um discurso, aconselha-se que o professor de História,
antes de promover a visita com seus alunos, tome alguns cuidados frente aos
objetivos traçados.

O primeiro diz respeito a uma visita prévia para estabelecer uma familiaridade
com a disposição do espaço e organização da exposição, o segundo refere-se
ao planejamento de um roteiro de estudos que dialogue com o recorte temporal
estabelecido pela exposição, verificando a disponibilidade de uso das atividades
educativas do museu. Como próximo passo, é interessante que haja um preparo
dos alunos através de exercícios de observação, estudo de conteúdos e conceitos.
Na visita, é importante que o professor acompanhe o monitoramento da exposição
e crie possibilidades de continuidade dos estudos em sala de aula.

Assim, a ideia não é criar um receituário que deve ser seguido, mas uma
possibilidade de trabalho com a história indígena de maneira diferenciada, situando
as formas de organização social em diferentes temporalidades, questionando se
houve mudanças de hábitos e costumes e compreendendo qual a condição de
existência na sociedade contemporânea. Portanto, nesse tópico, o objetivo foi
aclarar uma possibilidade de trabalho com fontes diferenciadas na construção do
ensino. Agora é a sua vez de traçar novos métodos de estudos. Bom trabalho!

32 Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental


T2

ACOMPANHE NA WEB

Ensino de história e a prática educativa: projetos interdisciplinares

Leia este artigo que procura discutir o ensino de História e a prática educativa, através
de exemplos de projetos interdisciplinares, cujo objetivo é despertar nos alunos o
gosto pelo ensino de História. Dessa forma, pode-se contribuir significativamente
para tornar a escola um lugar de descoberta e de significado, sinônimo de novo,
onde o educador não leve um conhecimento de fora para dentro, mas sim desperte
no aluno o que ele já sabe, contribuindo para a formação de cidadãos conscientes,
sujeitos da história capazes de compreender seu cotidiano.

Link para acesso: <http://www.ucs.br/ucs/tplcinfe/eventos/cinfe/artigos/


artigos/arquivos/eixo_tematico10/ENSINO%20DE%20HISTORIA%20E%20A%20
PRATICA%20EDUCATIVA.pdf>. Acesso em: 10 junho. 2015.

Perspectivas didáticas de professores formadores de pedagogos: incidências da


significação da pedagogia

Este texto problematiza o processo de construção das perspectivas didáticas que


organizam os modos de atuação de professores formadores de pedagogos, na
interface com os significados atribuídos à Pedagogia em três dimensões: como
campo de conhecimento, como campo formativo e como campo de práticas
profissionais. Busca-se compreender o mútuo imbricamento entre práticas
docentes e elementos de significação que informam tais práticas e expressam
intencionalidades formativas, que variam em grau de explicitação no discurso,
correlação e fundamentação teórico-conceitual.

Link para acesso: <http://36reuniao.anped.org.br/pdfs_trabalhos_aprovados/


gt04_trabalhos_pdfs/gt04_3064_texto.pdf>. Acesso em: 10 junho. 2015.

Lugares de memória: espaços educativos e ensino de história

Assista a este vídeo do programa Salto para o Futuro, da TV Escola, com Circe
Bittencourt, Marta Abreu e Helena Araújo. As professoras debatem sobre o ensino
de história da cultura afro nas escolas e nos diferentes espaços educativos.
Problematizam e viabilizam uma reflexão em torno da noção histórica da cultura
africana que vai para além do entendimento da dinâmica econômica e política do
continente. Discorrem sobre a importância da fomentação de debates nas escolas
e nos diferentes espaços educativos sobre a cultura afro-brasileira partindo-se
de diferentes temporalidades e focando nas relações sociais entre as diferentes
culturas. Defendem tais ações no sentido de viabilizar a reflexão como instrumento

Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental 33


T2

de combate ao preconceito e reconhecimento de uma cultura que serviu como


base de nossa constituição nacional. O programa está dividido em três partes no
site Domínio Público. Trazemos aqui o link da primeira parte.

Link para acesso: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.


do?select_action=&co_obra=51504>. Acesso em: 10 junho. 2015.

AGORA É A SUA VEZ

Instruções:

Agora, chegou a sua vez de exercitar seu aprendizado. A seguir, você encontrará
algumas questões de múltipla escolha e dissertativas. Leia cuidadosamente os
enunciados e atente-se para o que está sendo pedido.

Questão 1

Como vimos, o ensino de História e a abordagem historiográfica sofreram, ao longo


dos anos, um processo de modificação quanto à abordagem dos temas e conteúdos
ensinados na prática docente. Sabendo-se que a história tradicional dominou o
século XIX, momento em que o ensino e a aprendizagem consubstanciavam-se
na valorização dos documentos representativos da dita “história dos vencedores
e dos heróis”, discorra sobre a importância do professor na abordagem dos fatos
presentes e a função do historiador em nossa sociedade.

Questão 2

De modo mais abrangente e levando em conta as finalidades que tem a educação


frente à formação do ser em sua integralidade, podemos esperar que o aluno, ao
término de sua escolaridade básica, demonstre:

a) Competências e habilidades para a leitura de diferentes mídias.

b) Competências e habilidades que permitam uma análise crítica da sua condição


de vida e da temporalidade histórica que vive.

c) Competências para transformar informação em conhecimento e saber utilizá-lo


em diferentes contextos.

d) Domínio das novas tecnologias exigidas pelo mundo do trabalho.

e) Domínio das técnicas de comunicação e expressão.

34 Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental


T2

Questão 3

Durante os encontros para a preparação do ano letivo em uma escola, alguns


tópicos foram considerados como os mais importantes. Dentre estes, destaca-se
o conhecimento da realidade dos estudantes e, por isso, no planejamento das
atividades, foi preciso considerar:

a) A realidade expressa nos programas escolares estabelecidos.

b) A vivência limitada das pessoas de grupos sociais minoritários.

c) O meio ambiente das classes mais favorecidas daquela região.

d) O contexto sociocultural específico da realidade dos alunos.

e) O modelo social idealizado pelos pais dos alunos da escola.

Questão 4

Retomando um pouco de nossa reflexão, descreva a função da história e do ensino


de história no Ensino Fundamental.

Questão 5

Na primeira metade do século XX, Jonathas Serrano, professor de História do


Colégio Pedro II, do Rio de Janeiro, já percebia a importância do uso das imagens
no ensino de História, afirmando que elas ajudariam os alunos a aprender “pelos
olhos”. Atualmente, em tempos de grande valorização da imagem e de maiores
facilidades para a sua difusão, discute-se a sua utilização no ensino de História,
em suas mais diversas modalidades. Como orientação metodológica, para que o
professor use a imagem em sala de aula, o que ele deve considerar?

Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental 35


T2

36 Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental


T2

FINALIZANDO

O objetivo deste tema foi problematizar a compreensão em torno do que é


História, seus objetivos e a sua função social, retomando o significado do papel
formativo da escola e as transformações pelas quais passou nos últimos anos
do século XX. Vimos também possibilidades de práticas de ensino que dão foco
à atuação prática dos diferentes sujeitos históricos, incluindo os alunos, e às
possibilidades de construção do conhecimento escolar. Assim, compartilhando da
concepção de Fonseca (2007, p. 38):

A relação ensino-aprendizagem deve ser um convite e um


desafio para os alunos e professores cruzarem ou mesmo
subverterem as fronteiras impostas entre diferentes culturas
e grupos sociais, entre a teoria e a prática, a política e o
cotidiano, a história, a arte e a vida.

Nesse sentido, compreender o que é história, os seus objetivos e a sua função


social significa retomar o significado do papel formativo do ensino de história.
Assim, caberá a você professor pensar sobre a possibilidade educativa da história
como saber disciplinar formador da consciência histórica social do homem.

Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental 37


T2

38 Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental


T2

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Adriana Mortara; VASCONCELLOS, Camilo de Melo. Porque visitar


museus. In: BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes (Org.). O saber histórico na sala
de aula. São Paulo: Contexto, 2001.

APPLE, Michael. Educação e poder. Porto Alegre: ArtMed, 1989.

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e


métodos. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2008.

CABRINI, Conceição et al. Ensino de História: revisão urgente. 3. ed. São Paulo:
Educ, 2005.

FONSECA, Selva Guimarães. Didática e prática de ensino de História: experiências,


reflexões e aprendizados. 6. ed. Campinas: Papirus, 2007.

GOODSON, Ivor. Currículo: teoria e prática. Petrópolis: Vozes, 1996.

HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: O breve século XX (1914-1991). Tradução de


Marcos Santarrita. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

LE GOFF, Jaques. A história nova. São Paulo: Martins Fontes, 1990.

MAGALDI, Cássia. O público e o privado: propriedade e interesse cultural. In: SÃO


PAULO (Município). Secretaria Municipal de Cultura. Departamento do Patrimônio
Histórico. O direito à memória: patrimônio histórico e cidadania. São Paulo: DPH,
1992.

MENEZES, Ulpiano Bezerra de. A história, cativa da memória? Para um mapeamento


da memória no campo das Ciências Sociais. Revista do Instituto de Estudos
Brasileiros, São Paulo, n. 34, 1992.

ORIÁ, Ricardo. Memória e ensino de História. In: BITTENCOURT, Circe. O saber


histórico na sala de aula. 5. ed. São Paulo: Contexto, 2001.

SACRISTÁN; José Gimeno. Currículo e diversidade cultural. In: SILVA, Tomaz


Tadeu da; MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa; GILBERT, Rob (Orgs.) Territórios
contestados. Petrópolis: Vozes, 1995.

SCHEIMER, Maria Delfina Teixeira. Ensino de História e a prática educativa: projetos


interdisciplinares. In: CONGRESSO INTERNACIONAL DE FILOSOFIA E EDUCAÇÃO,
5., 2010, Caxias do Sul. Anais... Disponível em: <http://www.ucs.br/ucs/tplcinfe/
eventos/cinfe/artigos/artigos/arquivos/eixo_tematico10/ENSINO%20DE%20

Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental 39


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SEVERO, José Leonardo Rolim de Lima. Perspectivas Didáticas de Professores


Formadores de Pedagogos: Incidências da Significação da Pedagogia. Trabalho
apresentado na 36ª Reunião Anual da ANPED 2013. In: REUNIÃO ANUAL DA
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO,
36. , 2013, Goiânia. Anais... Disponível em: <http://36reuniao.anped.org.br/pdfs_
trabalhos_aprovados/gt04_trabalhos_pdfs/gt04_3064_texto.pdf>. Acesso em: 18
dez. 2014.

SILVA, Kalina Vanderlei; SILVA, Maciel Henrique. Dicionário de conceitos históricos.


São Paulo: Contexto, 2006.

TV ESCOLA. Lugares de memória: espaços educativos e ensino de História. Salto


para o Futuro. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/
DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=51504>. Acesso em: 11 maio
2015.

GLOSSÁRIO

Educação patrimonial: educação voltada para questões referentes ao patrimônio


cultural, que compreende a inclusão de temáticas e conteúdos programáticos,
nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, que versem sobre o
conhecimento e a conservação do patrimônio histórico.

Historiador: profissional que se dedica ao estudo da história e da pesquisa científica


estabelecendo métodos e técnicas que possibilitam o pensamento histórico.

Historiografia: designa não apenas o registro escrito da História, a memória


estabelecida pela própria humanidade através da escrita do seu próprio passado,
mas também a ciência da História.

Ideologias: uma ideologia é um conjunto de ideias conscientes e inconscientes


que constituem os objetivos primordiais do indivíduo, expectativas e ações.
Uma ideologia é uma visão abrangente, uma maneira de olhar as coisas em
várias tendências filosóficas, ou um conjunto de ideias propostas pela classe
dominante de uma sociedade para todos os seus membros (o chamado produto
da socialização).

Patrimônio histórico: constitui o patrimônio histórico o conjunto de bens móveis


e imóveis existentes no país cuja preservação é motivada por interesse público,
por sua vinculação a fatos memoráveis da história, por seu valor arqueológico,
etnográfico, bibliográfico ou artístico.

40 Propostas e orientações para o ensino de história no ensino fundamental


Tema 3

O ensino da história e os PCNs

POR DENTRO DO TEMA

1. Apresentação dos PCNs

1.1 - Histórico

A ampliação do acesso à escola pública no Brasil nos últimos anos provocou


o questionamento sobre os saberes trabalhados na escola, os quais, para certos
estudiosos, faziam parte de um sistema educacional elitista. Os estudos sobre o
currículo, entre eles as obras do americano Michael Apple, também forneceram
elementos importantes nas últimas décadas para analisar a questão da seleção de
conteúdos, significados e práticas nos termos de uma cultura dominante.

De acordo com Apple (1982), a educação deve ser vista como uma seleção
e organização de todo o conhecimento social disponível em determinada
época. Uma vez que essa seleção é organizada, traz opções sociais e ideológicas
conscientes e inconscientes. Ao preservarem e distribuírem o que é considerado
“conhecimento legítimo” – o conhecimento que “todos devemos ter” –, as escolas
conferem legitimação cultural ao conhecimento de grupos específicos. Assim, é
preciso atentar para os interesses sociais e políticos orientadores da seleção e da
organização do currículo.

O processo de elaboração curricular (e sua teoria), na atualidade, tem levado


em consideração as seguintes indagações: quais elementos da cultura devem ser
transmitidos? Como realizar uma seleção “representativa” de conhecimentos dos
diversos setores e visões sociais que respeite e valorize as diferenças culturais dos
alunos? O que vale a pena ser transmitido da cultura comum? Que conhecimento
é responsabilidade da escola transmitir?

É patente constatar, por conseguinte, a grande disputa teórica e política existente


em torno dos processos de elaboração de currículos. Em diferentes contextos
sociais e políticos da história é possível identificar diversas intencionalidades
educativas inseridas nos documentos curriculares, e, além disso, distintas respostas
aos questionamentos curriculares daquele contexto histórico (FONSECA, p. 2014).

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para o Ensino Fundamental da


T3

disciplina de História, portanto, expressam os embates inseridos no seu contexto


histórico de produção. Recuperar o contexto de concepção dos PCNs, além dos
debates e de algumas polêmicas entre os envolvidos no processo, é essencial
para compreender o documento. Trata-se de situar o momento de produção do
documento compreendendo o currículo como um espaço de conflitos em que
se pode apreender a concepção, as mudanças e as permanências de determinada
disciplina escolar.

Nesse sentido, é preciso retornar ao ano de 1990, em que o Brasil participou


da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, em Jomtien, na Tailândia,
convocada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e
a Cultura (UNESCO), pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF),
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e Banco Mundial.
As decisões oriundas dessa conferência tornaram-se um importante eixo para a
constituição de políticas educacionais. Vários países da América Latina promoveram
reformas nos sistemas de ensino, em sua maioria, financiadas por agências de
fomento internacionais.

O movimento de reformulações curriculares da década de 1990 decorre,


portanto, da nova configuração mundial, que impõe um modelo econômico a fim
de submeter os outros países à lógica do mercado. As propostas eram pautadas,
em linhas gerais, na exigência imposta à sociedade de ser educada para competir
e viver de acordo com a lógica do mercado, que exige domínios mais amplos
do “conhecimento”. Para esse modelo capitalista, criou-se uma “sociedade do
conhecimento” que exige formas de manipular as informações provenientes de
um sistema de meios de comunicação complexo e de se organizar de modo mais
autônomo e individualizado nas relações de trabalho (BITTENCOURT, 2008).

As propostas para a educação apresentadas em Jomtien influenciaram o Brasil


na implementação de reformas. Debates foram realizados por todo o país, com a
participação de entidades e especialistas na área de educação, sobre os principais
problemas educacionais e a busca de alternativas para enfrentá-los. A elaboração
dos PCNs, assim, insere-se nesse contexto, e muitas vezes é interpretada como
uma resposta às exigências de organismos internacionais ao atrelar as políticas
curriculares brasileiras aos interesses e estratégias dos órgãos financiadores
internacionais, configurando-se, com isso, uma maior sujeição das políticas
educacionais brasileiras às diretrizes políticas impostas por essas entidades.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), portanto, podem ser definidos


como um documento oficial que nasce da necessidade de se construir uma
referência curricular nacional para o ensino fundamental, que possa ser discutida
e traduzida em propostas regionais nos diferentes estados e municípios brasileiros,
em projetos educativos nas escolas e nas salas de aula. O objetivo era assegurar a
todo aluno de qualquer região do país o direito de ter acesso aos conhecimentos

42 O ensino da história e os PCNs


T3

indispensáveis para sua formação.

Os PCNs para o Ensino Fundamental foram elaborados durante o primeiro


governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (1994-1998). Houve a análise
de currículos oficiais e dos currículos internacionais instituídos por meio de reformas
educacionais de modelo semelhante ao que se estava pretendendo implantar no
Brasil pela Fundação Carlos Chagas (BARRETO, 2000). A partir desses estudos
formulou-se uma “versão preliminar” e desenvolveu-se um debate nacional, do qual
participaram professores universitários, representantes de secretarias estaduais e
municipais de educação, além de outros educadores e pesquisadores.

No que tange à proposta para a disciplina de História, de acordo com Oliveira


(2003), o primeiro contato que os professores de História tiveram com a proposta
dos PCNs para o Ensino Fundamental foi durante o II Encontro Perspectivas do
Ensino de História, realizado na Universidade de São Paulo (USP), em 1996.

A repercussão da exposição do conteúdo foi intensa, dado o caráter


conservador que a proposta trazia, segundo a avaliação feita pelos profissionais
de História presentes no evento. A proposta dos PCNs para o terceiro e quarto
ciclos do Ensino Fundamental (5ª a 8ª séries) – então apresentada – negava toda
uma história de experiências e reflexões sobre o ensino de História e se restringia
ao perfil mais execrado pelos professores desta disciplina: história factual oficial
(heróis nacionais, fatos e datas) e datas comemorativas nacionais. A articulação
dos professores e pesquisadores da área do ensino de História via Associação
Nacional de História (ANPUH) forçou o chamamento, por parte do MEC, por meio
da Secretaria de Educação Fundamental (SEF), de uma nova comissão para rever/
refazer a proposta (BERGAMIN, 2013).

Verifica-se, então, uma série de contradições e embates na elaboração dos PCNs.


No Brasil, os questionamentos relacionavam-se aos saberes trabalhados, por vezes
considerados tradicionais e de teor conteudista, em uma escola caracterizada pela
democratização nas últimas décadas. Juntamente com essas indagações, que
refletiram nas elaborações curriculares, introduziram-se nas propostas os projetos
vinculados aos das políticas neoliberais, voltadas para os interesses internacionais.

Os PCNs referentes aos terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental (5ª a 8ª


séries) foram publicados, portanto, em 1998 e apresentam os seguintes volumes:

Volume 1 — Introdução aos PCN.


Volume 2 — Língua Portuguesa.
Volume 3 — Matemática.
Volume 4 — Ciências Naturais.
Volume 5 — Geografia.
Volume 6 — História.
Volume 7 — Arte.

O ensino da história e os PCNs 43


T3

Volume 8 — Educação Física.


Volume 9 — Língua Estrangeira.
Volume 10.1 — Temas Transversais — Apresentação.
Volume 10.2 — Temas Transversais — Ética.
Volume 10.3 — Temas Transversais — Pluralidade Cultural.
Volume 10.4 — Temas Transversais — Meio Ambiente.
Volume 10.5 — Temas Transversais — Saúde.
Volume 10.6 — Temas Transversais — Orientação Sexual.
Volume 10.7 — Temas Transversais — Trabalho e Consumo.
Volume 10.8 — Temas Transversais — Bibliografia.

No que diz respeito aos PCNs de História, o documento está dividido da seguinte
forma: 1) Apresentação; 2) 1ª parte: 2.1) Caracterização da área de História, 2.2)
Objetivos gerais de História, 2.3) Conteúdos de História: critérios de seleção e
organização; 3) 2ª parte: 3.1) Terceiro ciclo, 3.2) Quarto ciclo; 3.3) Orientações e
métodos didáticos; 4) Bibliografia.

Na apresentação, relata-se de forma breve como se deu a elaboração dos PCNs,


afirmando-se que ela contou com a participação de especialistas e professores
e que levou em consideração os documentos produzidos para reflexão e as
primeiras versões para a área, bem como as discussões e críticas a que foram
submetidas. Afirma-se ainda que os PCNs foram elaborados procurando articular
as diversidades regionais, culturais, políticas existentes no país e a necessidade
de construir referências nacionais comuns ao processo educativo em todas as
regiões brasileiras (BRASIL, 1998).

Em seguida, organiza-se o documento em duas partes. Na primeira parte,


um breve resumo do ensino de História no Brasil é apresentado, além de serem
discutidos princípios e conceitos pertinentes ao saber histórico escolar. Ademais,
são tratados nessa parte os objetivos gerais de História para o ensino fundamental
e também os critérios para as escolhas conceituais, métodos, conteúdos e
articulações com os Temas Transversais.

Já na segunda parte são apresentadas propostas de ensino e aprendizagem


para as últimas quatro séries do ensino fundamental, os objetivos para os ciclos,
os conteúdos e os critérios de avaliação. Orientações e métodos didáticos são
sugeridos a fim de suscitar a reflexão de professores sobre o conhecimento
histórico e suas relações com a realidade social.

A bibliografia, por fim, menciona os autores utilizados para a redação do


documento e que fundamentam os conceitos históricos e os procedimentos de
ensino e de aprendizagem apresentados.

Como o objetivo não é esgotar todo o documento em suas minúcias, serão


discutidos os principais aspectos tratados nos PCNs, considerados fundamentais

44 O ensino da história e os PCNs


T3

para a compreensão das propostas e impactos desse documento nas práticas


escolares.

1.2 - Objetivos Gerais

O desenvolvimento de noções, métodos e temas próprios do conhecimento


histórico, como tempo e sujeito histórico, na sala de aula não significa que se
pretende fazer do aluno um pequeno historiador. A intenção é que ele desenvolva
a capacidade de observar, de extrair informações e de interpretar algumas
características da realidade à sua volta, de estabelecer algumas relações e
confrontações entre informações atuais e históricas, de datar e localizar as suas
ações e as de outras pessoas no tempo e no espaço e, em certa medida, poder
relativizar questões específicas de sua época.

Desse modo, o documento apresenta os objetivos gerais para o ensino de


história no ensino fundamental, que são (BRASIL, 1998, p. 43):

Identificar relações sociais no seu próprio grupo de convívio, na localidade,


na região e no país, e outras manifestações estabelecidas em outros tempos e
espaços.

• Situar acontecimentos históricos e localizá-los em uma multiplicidade de


tempos.

• Reconhecer que o conhecimento histórico é parte de um conhecimento


interdisciplinar.

• Compreender que as histórias individuais são partes integrantes de histórias


coletivas.

• Conhecer e respeitar o modo de vida de diferentes grupos, em diversos


tempos e espaços, em suas manifestações culturais, econômicas, políticas e
sociais, reconhecendo semelhanças e diferenças entre eles, continuidades
e descontinuidades, conflitos e contradições sociais.

• Questionar sua realidade, identificando problemas e possíveis soluções,


conhecendo formas político-institucionais e organizações da sociedade
civil que possibilitem modos de atuação.

• Dominar procedimentos de pesquisa escolar e de produção de texto,


aprendendo a observar e a colher informações de diferentes paisagens e
registros escritos, iconográficos, sonoros e materiais.

• Valorizar o patrimônio sociocultural e respeitar a diversidade social,


considerando critérios éticos.

• Valorizar o direito de cidadania dos indivíduos, dos grupos e dos povos

O ensino da história e os PCNs 45


T3

como condição de efetivo fortalecimento da democracia, mantendo-se o


respeito às diferenças e a luta contra as desigualdades.

Entre os objetivos, destaca-se a ênfase na interdisciplinaridade (o diálogo da


História com as demais Ciências Humanas). De acordo com o documento, por
meio de trabalhos interdisciplinares, novos conteúdos podem ser considerados
em perspectiva histórica, como a especificidade cultural de povos e das inter-
relações, diversidade e pluralidade de valores, práticas sociais, memórias e histórias
de grupos étnicos, de sexo e de idade (BRASIL, 1998, p. 33).

Ressalta-se ainda a contribuição da História para a formação do “cidadão crítico”.


Não se trata de limitar a constituição de uma identidade nacional nos moldes
nacionalistas e patrióticos de décadas passadas, mas de fazer o aluno refletir sobre
formas de representação e atuação diante dos problemas da sociedade.

A formação intelectual através do ensino de História, ademais, é evidenciada


por objetivos que sublinham o desenvolvimento da capacidade de observar
e descrever, de estabelecer relações entre presente e passado, e de identificar
semelhanças e diferenças em diversos tempos históricos.

1.3 - História por Eixos Temáticos

Nos PCNs do Ensino Fundamental há uma parte dedicada à discussão de critérios


de seleção e organização de conteúdos de História. É importante ressaltar que não
há uma indicação específica de conteúdos por ciclo, mas apenas propostas.

Neste particular, sugere-se que sejam superados os pressupostos


tradicionalmente adotados na escola, pautados na sucessão temporal linear, e que
a flexibilidade de formas de organização programática seja adotada como critério
fundamental. A proposta que consta como sugestão de seleção e organização de
conteúdos, portanto, é a da História organizada por eixos temáticos.

É importante, contudo, fazer a distinção entre História temática e História


ensinada por eixos temáticos. Essa distinção fundamental tem sido pouco
explicitada nas propostas curriculares, o que induz a vários equívocos na prática
escolar.

De acordo com Bittencourt (2008), a História temática, normalmente produzida


pela pesquisa de historiadores – que estabelecem o tema a ser investigado e
delimitam objeto, tempo, espaço e fontes documentais a serem analisadas
–, caracteriza a produção histórica acadêmica. Cada tema é pesquisado em
profundidade, sendo a análise verticalizada, em meio às diversas possibilidades
oferecidas por intermédio de um máximo de documentação a ser selecionada
segundo critérios próprios, que é interpretada de acordo com determinadas
categorias e princípios metodológicos. O tema é precedido por exaustivas leituras

46 O ensino da história e os PCNs


T3

bibliográficas e por críticas tanto da bibliografia quanto da documentação.

Os conteúdos históricos escolares organizados por eixos temáticos ou temas


geradores obedecem a outros critérios que não se confundem com a História
temática. Eles são indicadores de uma série de temas selecionados de acordo com
problemáticas gerais, cujos princípios são estabelecidos e limitados pelo público
escolar ao qual se destina o conteúdo, norteados por pressupostos pedagógicos,
tais como faixa etária, nível escolar, tempo pedagógico dedicado à disciplina, entre
outros aspectos.

O tema gerador ou eixo temático não pode limitar o conteúdo, mas deve
servir para estabelecer e ordenar outros temas (ou subtemas), que precisam ser
abrangentes tanto no tempo quanto no espaço. Cada eixo temático é indicativo
para o estudo de cada série ou ciclo e pressupõe a delimitação dos conceitos
básicos. Os conteúdos, desse modo, decorrem do eixo temático com flexibilidade
para as diferentes situações escolares, sendo garantido, nesse processo, o domínio
dos conceitos fundamentais a serem estudados.

Assim, para o terceiro ciclo, propõe-se o eixo temático História das relações
sociais, da cultura e do trabalho, e, para o quarto ciclo, História das representações
e das relações de poder.

Os temas de ensino de História propostos pelos PCNs são, por outro lado,
articulados aos temas transversais: meio ambiente, ética, pluralidade cultural, saúde,
educação sexual, trabalho e consumo. Essa proposta de temas interdisciplinares
gera novos desafios para o ensino de História. Um deles é articular os conteúdos
tradicionais, como os de uma história política ou econômica, com conteúdos
característicos de outras disciplinas, como é o caso do meio ambiente ou questões
de saúde.

Outro cuidado que se deve ter ao se organizar os conteúdos em eixos temáticos


é a permanência da História linear e cronológica sob a “roupagem” de temas. Nesse
caso, os temas convertem-se em uma história linear, que se inicia na pré-história,
passando pelos demais períodos históricos.

1.4 - Objetivos e Conteúdos por Ciclo

Conforme discutido anteriormente, os PCNs para o Ensino Fundamental


caracterizam-se por não realizarem uma indicação específica de conteúdos por
ciclo. O que se apresenta no documento é uma sugestão de organização de
conteúdos e noções que podem ser trabalhadas pelo professor, de acordo com
sua realidade regional e também em sala de aula.

No que tange ao terceiro ciclo do ensino fundamental, sugere-se ao professor


iniciar o estudo dos temas na perspectiva da História do cotidiano.

O ensino da história e os PCNs 47


T3

Trata-se de uma escolha didática para que os alunos distingam suas vivências
pessoais dos hábitos de outras épocas e relativizem, em parte, os padrões de
comportamento do seu próprio tempo.

O documento, portanto, faz uma indicação presente em diversas partes do


texto: a opção pela história com uma abordagem cultural, que é justificada pela
série de conceitos selecionados como fundamentais, tais como cultura, trabalho,
organização social, relações de poder e representações, e que serão desdobrados
em eixos temáticos e seus subtemas.

Desse modo, para o terceiro ciclo é proposto o eixo temático História das
relações sociais, da cultura e do trabalho, que se desdobra nos dois subtemas As
relações sociais e a natureza e As relações de trabalho.

O eixo temático e os subtemas remetem para o estudo de questões sociais


relacionadas à realidade dos alunos; acontecimentos históricos e suas relações
e durações no tempo; percepção de sujeitos históricos como agentes de
transformações e/ou permanências sociais; abordagens históricas e suas
aproximações e diferenças; e conceitos históricos e seus contextos (BRASIL, 1998).

O subtema As relações sociais e a natureza sugere pesquisas e estudos históricos


sobre as relações entre as sociedades e a natureza. Podem ser trabalhadas
questões pertinentes aos recursos naturais, às matérias-primas e à produção
de alimentos, vestimentas, utensílios e ferramentas, aos mitos sobre a origem
do mundo e do homem, às relações entre os ciclos naturais e as organizações
culturais, às explicações e valores construídos para os elementos da natureza, às
representações da natureza na arte, ao tipo de propriedade e uso da terra, aos
patrimônios ambientais, às relações entre a natureza e as atividades de lazer.

O subtema As relações de trabalho recomenda pesquisas e estudos históricos


sobre como as sociedades estruturaram em diferentes épocas suas relações
sociais de trabalho, como construíram organizações sociais mais amplas e como
cada sociedade organizava a divisão de trabalho entre indivíduos e grupos sociais.
Podem ser pesquisadas, relacionadas, confrontadas e analisadas diferentes formas
de trabalho, como o comunitário, o servil, o escravo, o trabalho livre, o trabalho
assalariado; a divisão de trabalho no espaço doméstico, no espaço urbano, no
rural e na indústria; os tipos de remuneração, as diferenças entre sexos, idades,
etnias e formação escolar; e os valores culturais atribuídos ao trabalho manual.

Para o quarto ciclo, propõe-se o eixo temático História das representações e


das relações de poder, que se desdobra nos dois subtemas Nações, povos, lutas,
guerras e revoluções e Cidadania e cultura no mundo contemporâneo.

O subtema Nações, povos, lutas, guerras e revoluções sugere pesquisas, estudos


e debates sobre os vários modelos de organização política, com ênfase para a

48 O ensino da história e os PCNs


T3

constituição dos Estados Nacionais, a sua relação com o processo de organização


e conquista de territórios e as representações e mitos que legitimam a organização
das nações e os confrontos políticos internacionais, além de destacar estudos
sobre contatos e confrontos entre povos, grupos sociais e classes, as diferentes
formas de lutas sociais e políticas, guerras e revoluções.

O segundo subtema, Cidadania e cultura no mundo contemporâneo, sugere


que se desenvolvam discussões sobre o processo de expansão e crises da cultura
no mundo contemporâneo e das questões pertinentes à cidadania na História.

Percebe-se, desse modo, que os conteúdos apontados no documento são


só exemplos de possibilidades e não esgotam todas as alternativas de estudos
históricos dos subtemas. O professor, portanto, não deve ter a preocupação de
seguir todos os exemplos apresentados. A proposta principal dos PCNs de História
para o Ensino Fundamental é que se problematize a realidade atual e se identifique
um ou mais problemas para estudo em dimensões históricas.

A partir daí, o professor pode selecionar conteúdos da História brasileira, da


História da América, da Europa, da África e do Oriente, e articulá-los em uma
organização que permita ao aluno questionar, aprofundar, analisar e refletir sobre
as amplitudes históricas da realidade atual e como são construídos os processos
dinâmicos e contraditórios das relações entre as culturas e os povos, em suas
diversas temporalidades.

ACOMPANHE NA WEB

Jornada de História - Currículo da Educação Básica e Formação do historiador:


questões atuais e perspectivas

Ocorrida em maio de 2014, na Universidade de São Paulo, sob a organização


do GT de Ensino de História e Educação da ANPUH. Neste vídeo há
especificamente a discussão da Mesa Redonda 1: Currículo da Educação
Básica: o lugar do ensino de História, em que participaram os professores
doutores Carmen Teresa Gabriel (UFRJ), Circe Bittencourt (PUC/SP) e
Mauro Cezar Coelho (UFPA), que discorreram sobre o lugar da disciplina escolar
História nas atuais propostas curriculares.

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=WWAaljqgFMU>. Acesso


em: 29 mai. 2015.

Tempo: 3:03:37.

O ensino da história e os PCNs 49


T3

Por um currículo nacional, sem meias-palavras

Artigo de Fernanda Salla que discute a necessidade de um currículo nacional


unificado, apresentando, assim, uma crítica aos PCNs.

Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/politicas-publicas/curriculo-


nacional-meias-palavras-700376.shtml>. Acesso em: 29 mai. 2015.

A ciência do currículo

Artigo de Beatriz Boclin Marques dos Santos e Thiago Rodrigues Nascimento, que
retoma algumas propostas curriculares anteriores para a disciplina de História,
além de discutir as tendências atuais.

Disponível em: <http://www.revistadehistoria.com.br/secao/educacao/a-ciencia-


do-curriculo>. Acesso em: 29 mai. 2015.

AGORA É A SUA VEZ

Instruções:

Agora, chegou a sua vez de exercitar seu aprendizado. A seguir, você encontrará
algumas questões de múltipla escolha e dissertativas. Leia cuidadosamente os
enunciados e atente-se para o que está sendo pedido.

Questão 1

Apesar de os PCNs estarem em vigência desde 1998, as impressões sobre eles


não são unânimes. Leia um trecho de uma entrevista em que a pesquisadora Paula
Louzano tece críticas a respeito do documento:

“As Diretrizes Curriculares e os Parâmetros Curriculares


Nacionais (PCN) são suficientes para a especificação da base
nacional comum?
PAULA LOUZANO É importante separar PCN e diretrizes. As
diretrizes aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação
(CNE) têm força de lei, ou seja, são obrigatórias. Os PCN não.
Eles são uma sugestão. Quando falamos da especificação
da base nacional comum, estamos nos atendo àquilo que
é obrigatório, porque se não for assim não é um direito de
todos. Fica na dependência da escola definir se ela quer ou

50 O ensino da história e os PCNs


T3

não que aquelas sugestões sejam utilizadas. E as diretrizes


são extremamente genéricas. No Brasil, a definição para na
indicação de que a base nacional engloba o ensino de Língua
Portuguesa, Matemática e Ciências naturais e sociais. Ela não
chega a tratar do que deveria ser aprendido em cada área do
conhecimento.
Seria suficiente transformar os PCN em lei?
PAULA LOUZANO Não. Os PCN devem, sem dúvida, ser um
ponto de partida para a definição dessa base comum. Mas eles
falam de concepção, metodologia de ensino, sugestão didática
etc., ou seja, misturam vários aspectos. E ainda têm uma
estrutura diferente para cada área do conhecimento. Outro
ponto é que, em geral, os países costumam fazer uma discussão
sobre o currículo a cada dez anos. Os PCN são de 1996, então,
teríamos de atualizá-los (GESTÃO ESCOLAR, 2014)”.

Explique as críticas aos PCNs feitas pela pesquisadora e responda como essas
críticas podem ser contrapostas em relação aos próprios objetivos explicitados no
documento.

Questão 2

Houve uma série de discussões no decorrer do evento (II Encontro Perspectivas do


Ensino de História) nas quais foram questionados, além dos conteúdos propostos,
a forma como têm sido elaborados tais parâmetros e a partir de quais critérios,
conforme o exposto no documento introdutório. No decorrer das reuniões, decidiu-
se pela rejeição da proposta, considerada pelos participantes, por unanimidade,
como inadequada e desatualizada em relação às propostas originárias de vários
estados brasileiros, tais como as do Estado de São Paulo, Paraná, Rio Grande do
Sul, Rio de Janeiro e Minas Gerais. (ENCONTRO PERSPECTIVAS DO ENSINO DE
HISTÓRIA, 1996, p. 16).

A versão preliminar dos PCNs para o Ensino Fundamental, da disciplina de História,


sofreu grandes críticas devido ao caráter conservador que a proposta trazia. Assim,
uma nova comissão foi composta para refazer o documento. Desse modo, as
afirmativas a seguir representam no documento a tentativa de superar a proposta
conservadora anterior e incorporar os debates realizados, exceto a afirmativa:

a) Os PCNs para o Ensino Fundamental caracterizam-se por não realizarem uma


indicação específica de conteúdos por ciclo, apresentando, assim, uma sugestão
de organização de conteúdos e noções que podem ser trabalhadas pelo professor,
de acordo com sua realidade regional e também em sala de aula.

O ensino da história e os PCNs 51


T3

b) Verifica-se a opção pela história da cultura, justificada pela série de conceitos


selecionados como fundamentais, como cultura, trabalho, organização social,
relações de poder e representações.

c) Os PCNs expressam a preocupação de que o aluno problematize a realidade


atual e identifique um ou mais problemas para estudo em dimensões históricas.

d) Há a tentativa de superar a sucessão temporal linear no documento e a sugestão


de selecionar e organizar os conteúdos por meio de eixos temáticos.

e) Há a explicitação de conteúdos por série, optando-se pela divisão quadripartite


da História: História Antiga, Medieval, Moderna e Contemporânea.

Questão 3

Sobre os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental, da


disciplina de História, é incorreto afirmar que:

a) Os PCNs procuram articular as diversidades regionais, culturais, políticas


existentes no país e a necessidade de construir referências nacionais comuns ao
processo educativo em todas as regiões brasileiras.

b) A elaboração dos PCNs é exclusivamente uma resposta às exigências de


organismos internacionais ao atrelar as políticas curriculares brasileiras aos
interesses e estratégias dos órgãos financiadores internacionais.

c) Um debate nacional foi fomentado, do qual participaram professores


universitários, representantes de secretarias estaduais e municipais de educação,
além de outros educadores e pesquisadores.

d) No início de sua elaboração, houve a análise de currículos oficiais e dos


currículos internacionais instituídos por meio de reformas educacionais de modelo
semelhante ao que se estava pretendendo implantar no Brasil pela Fundação
Carlos Chagas.

e) Os PCNs estão inseridos em um contexto em que se verifica uma série de


contradições e embates quanto aos saberes trabalhados em sala de aula, por
vezes considerados tradicionais e de teor conteudista, e às propostas vinculadas às
políticas neoliberais, voltadas para os interesses internacionais.

Questão 4

Analise os tópicos apresentados a seguir, com conteúdos referentes ao subtema


As relações sociais, a natureza e a terra (p. 57-60), que consta nos PCNs de História:

• Relações entre a sociedade, a cultura e a natureza, em diferentes momentos


da História brasileira.

52 O ensino da história e os PCNs


T3

• Primeiros homens no território brasileiro, povos coletores e caçadores, a


natureza representada na arte, nos mitos e nos ritos dos povos indígenas.

• Natureza e povos indígenas na visão dos europeus, exploração econômica


de recursos naturais pelos colonizadores europeus, agricultura de subsistência
e comercial, criação de animais, os sertões, os caminhos, a conquista, a
ocupação e a produção e a extração de riquezas naturais.

Discuta como essa sugestão de organização de conteúdos se articula com a


proposta de eixo temático, tendo em vista seus pressupostos fundamentais.

Questão 5

Leia o excerto a seguir:

“[...] precisamos examinar criticamente não apenas como um


aluno adquire mais conhecimento (a questão dominante em
nossa área, voltada que é à eficiência), mas por que e como
determinados aspectos da cultura coletiva são apresentados
na escola como conhecimento objetivo e factual? Como,
concretamente, o conhecimento oficial representa as
configurações ideológicas dos interesses dominantes de
uma sociedade? Como as escolas legitimam esses padrões
limitados e parciais de saber como verdades intocáveis?”
(APPLE, 1982, p. 47)

A partir do excerto do livro Ideologia e Currículo, de Michael Apple, discorra sobre


as principais indagações que o autor faz a respeito do currículo e sobre como
essas questões influenciaram nos debates acerca das reformulações curriculares.

O ensino da história e os PCNs 53


T3

54 O ensino da história e os PCNs


T3

FINALIZANDO

Os PCNs para a disciplina de História, conforme foi discutido neste tema, foram
tributários de diversas discussões acerca do conhecimento desenvolvido na escola,
como a democratização do acesso à escola e a diversidade cultural. Ademais,
debates acadêmicos sobre a teoria, o currículo e seus saberes selecionados
também influenciaram a discussão sobre quais conteúdos deveriam constar no
documento, optando-se por não explicitar uma lista de conteúdos, mas apenas
fazer sugestões, respeitando, assim, a autonomia do professor, bem como sua
realidade regional e escolar.

A influência das tendências historiográficas relativas à história cultural, por sua


vez, pode ser observada na tentativa de se romper com a linearidade e os conteúdos
da história tradicional e conteudista, por meio da proposta dos eixos temáticos e
também pela sugestão de conteúdos relacionados à cultura e às relações sociais.

Por fim, a ênfase dada no domínio de procedimentos de pesquisa, aprendendo


a analisar e selecionar informações, pode ser interpretada como influência das
demandas neoliberais da sociedade do conhecimento.

Desse modo, os PCNs estão inseridos em um contexto contraditório, e seu


conteúdo expressa essas disputas na sua elaboração, em que estão presentes
diversos atores, não apenas políticos, mas também acadêmicos e sociais.

O ensino da história e os PCNs 55


T3

56 O ensino da história e os PCNs


T3

REFERÊNCIAS

APPLE, Michael. Ideologia e currículo. São Paulo: Brasiliense, 1982.

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE HISTÓRIA – ANPUH Brasil. Jornada História e


ensino básico- mesa manhã. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=WWAaljqgFMU>. Acesso em: 29 mai. 2015.

BARRETO, Elba Siqueira de Sá (Org.). Os currículos do Ensino Fundamental para


as escolas brasileiras. Campinas: Autores Associados; São Paulo: Fundação Carlos
Chagas, 2000.

BERGAMIN, Fabíola Matte. Currículo e Exame Nacional do Ensino Médio: rupturas


e permanências na conformação dos saberes históricos escolares. Dissertação
(Mestrado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São
Paulo, 2013.

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e


métodos. São Paulo: Cortez, 2008.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:


história. Brasília: MEC/SEF, 1998.

ENCONTRO PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA. Atividades do encontro, 2.,


1996. Anais... São Paulo: FEUSP, 1996, p.16.

FONSECA, Selva Guimarães. Didática e prática de ensino de História: experiências,


reflexões e aprendizados. Campinas: Papirus, 2014.

GESTAO ESCOLAR. Ed. 33, ago./set. 2014.

OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de. O direito ao passado (uma discussão necessária
à formação do profissional de História). Tese (Doutorado em História) Centro de
Filosofia e Ciências Humanas - Universidade Federal de Pernambuco, 2003.

RICO, Rosi. Paula Louzano fala sobre modelos curriculares no Brasil e no mundo.
Revista Gestão Escolar, 2014.

SALLA, Fernanda. Por um currículo nacional, sem meias-palavras. Revista Nova


Escola, 2012. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/politicas-publicas/
curriculo-nacional-meias-palavras-700376.shtml>. Acesso em: 29 mai. 2015.

SANTOS, Beatriz B. M.; NASCIMENTO, Thiago R. A ciência do currículo. Revista de


História da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, v. 89, p. 8, 2013.

O ensino da história e os PCNs 57


T3

GLOSSÁRIO

Conferência Mundial sobre Educação para Todos: conferência realizada de 5 a


9 de março de 1990 em Jomtien, na Tailândia, na qual foi aprovado um plano de
ação para satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem em nível mundial.

Interdisciplinaridade: integração entre várias disciplinas e campos do


conhecimento.

Neoliberais: referente a neoliberalismo, uma doutrina político-econômica que teve


adeptos na Inglaterra e nos EUA a partir da década de 1970, cujas características
são: liberdade de mercado, privatizações de empresas estatais, controle de gastos
públicos e menores investimentos em políticas assistencialistas.

Pluralidade cultural: a temática da pluralidade cultural diz respeito à análise e


valorização de características étnicas e culturais dos diferentes grupos sociais que
convivem no território nacional.

Temas transversais: os temas transversais caracterizam-se por um conjunto de


assuntos (Ética, Meio Ambiente, Pluralidade Cultural, Saúde e Orientação Sexual)
referentes a questões sociais da atualidade que perpassam todas as disciplinas.

58 O ensino da história e os PCNs


Tema 4

Planejamento,
problematização e critérios de
seleção de conteúdo

POR DENTRO DO TEMA

1. Introdução

A escolha de conteúdos apresenta-se como tarefa complexa e de intensa reflexão,


pois constitui a base do domínio do saber disciplinar do professor. Ademais, sua
necessidade decorre de certo consenso sobre a impossibilidade de ensinar “toda
a história da humanidade”, tornando-se necessário fazer seleções baseadas em
determinados critérios para estabelecer os conteúdos a serem ensinados.

A seleção de conteúdos de História tem sido variada ao longo da trajetória da


disciplina, cada uma com implicações para a prática pedagógica. Nesse sentido,
refletir sobre as características das formas de seleção e sequenciamento mais
utilizadas no cotidiano escolar é fundamental a fim de compreender seus limites e
possibilidades e assim propiciar ao professor o estabelecimento dos seus próprios
critérios de seleção e organização de acordo com seus objetivos e concepções
de História.

2. Formas de Seleção e Organização mais Utilizadas

2.1 Abordagem Tradicional/Linear

O exemplo clássico de organização dos conteúdos é o que se constitui a


partir das temporalidades. Preponderante ainda na maioria das escolas brasileiras,
o tempo, considerado em sua dimensão cronológica, continua sendo a medida
utilizada para explicar a trajetória da humanidade. A periodização que se impôs
desde o século XIX – História Antiga, Medieval, Moderna e Contemporânea –
está presente em grande parte dos livros didáticos; retrocede-se às origens,
estabelecendo-se trajetórias homogêneas do passado ao presente, e a organização
dos acontecimentos é feita com base na perspectiva da evolução. O que
caracteriza a organização dos conteúdos, nessa perspectiva, são a linearidade e a
sequencialidade. (BEZERRA, 2013)
T4

Entre as suas características principais, a abordagem tradicional/linear concebe


o aprendizado da História como cumulativo e segue uma sequência necessária,
cronológica, sem a qual não é possível compreender os fenômenos. Ademais,
a articulação de conteúdo independe dos interesses dos alunos, que são
considerados em bloco, do ponto de vista da formação histórica a oferecer.

Em muitas seleções tradicionais, o quadripartismo (História Antiga, Medieval,


Moderna e Contemporânea) ainda vigora e acaba tendo como resultado o
privilegiamento do papel do Ocidente na história mundial, e a redução quantitativa
e qualitativa do papel dos povos não europeus na história universal. Nesse quadro,
são utilizadas balizas temporais como fim do Império Romano, queda de Bizâncio,
as quais não têm nenhum significado para a maioria da humanidade (CERRI, 2009).

A forma tradicional de seleção de conteúdo é criticada porque desconsidera a


realidade do aluno e suas necessidades específicas de orientação temporal.

Além disso, por corresponder a um modelo muitas vezes “biográfico” de


passado, pode ser assimilada pelo aluno sem problematização.

Apesar das críticas, a abordagem tradicional ainda tem grande adesão nas
escolas brasileiras, por questões didáticas. Sua permanência se deve à facilidade
de concepções, métodos e práticas já assimiladas na cultura escolar e no senso
comum. Além disso, muitos livros didáticos ainda se pautam por essa abordagem
para organizar seus conteúdos.

Por fim, os cursos superiores de História estão organizados em sua maior parte
sob o viés linear e tradicional. Trata-se, contudo, de uma opção didática, visando
selecionar e abordar conteúdos diversos de forma com que façam sentido ao
aluno, sem que haja perda do conceito de processo histórico.

2.2 História Integrada

Com origem nos debates curriculares da década de 1980, corresponde a uma


tentativa de elaborar uma síntese que levasse em conta as críticas aos modelos
tradicionais, principalmente de separação entre História Geral e História do Brasil.
A História Integrada busca, portanto, integrar os acontecimentos/conhecimentos
históricos de diferentes sociedades, consubstanciados num mesmo tempo
cronológico. Há, neste particular, a introdução do tempo sincrônico, que permite
estabelecer novas posturas nas relações entre tempo e espaço e entre a história
nacional e a mundial.

A organização de conteúdos a partir da História Integrada, entretanto, deve


ser feita com cautela para não incidir em alguns equívocos que acabam por não
questionar os modelos tradicionais, mas reforçá-los.

Bittencourt (2008) constata que os conteúdos de História do Brasil presentes nos

60 Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo


T4

livros didáticos com a abordagem de História Integrada são apresentados, na maior


parte dessas obras, de maneira escassa. Contudo, segundo a autora, a diminuição
dos conteúdos não se explica simplesmente pela sua inserção em uma História
Integrada, mas pela opção teórica que prioriza apenas as explicações estruturais
para as situações nacionais ou regionais. Desse modo, a História do Brasil aparece
como apêndice da História global, e sua existência deve-se ao desenvolvimento do
capitalismo comercial, a partir da expansão marítima europeia.

As problemáticas nacionais deixam de constituir o eixo norteador dos


conteúdos, e as explicações históricas são fornecidas externamente. Ao enfatizar-
se a integração constante do Brasil a uma história mundial, sem situar devidamente
os problemas nacionais e ampliar o conhecimento sobre a realidade brasileira,
pode-se reforçar a ideia de que os conflitos internos e seus agentes sociais
desempenham papel secundário na construção de uma nação (BITTENCOURT,
2008).

Cerri (2009) aponta que em muitos livros os assuntos de história geral são
desenvolvidos ao largo dos de história nacional: há uma preocupação em primeiro
“acabar o assunto” na primeira e depois recuar no tempo e narrar os eventos
da história do Brasil, o que em nada contribui para que o aluno compreenda o
conceito de tempo histórico (e também contribui com a ideia equivocada de que a
história tem um sentido, uma lógica, que ocorre primeiro na história geral e depois
na história do Brasil, que decorre da primeira e segue sua lógica).

O desafio, portanto, é estabelecer relações de caráter sincrônico entre histórias


distintas e articular os conteúdos, uma vez que os ritmos, as durações e os processos
não são os mesmos, o que pode ser uma dificuldade para o ensino dessas noções
temporais. O que prevalece, na grande parte das vezes, é o encaminhamento
linear e desarticulado dos fatos e processos, compondo sequências “artificiais”, e
assim, a noção de que a cronologia é a única ou principal forma de articulação de
conhecimentos.

2.3 História por Eixos Temáticos

A proposta da organização dos conteúdos através de eixos temáticos é uma


tentativa de que haja superação dos pressupostos tradicionalmente adotados na
escola, pautados na sucessão temporal linear e de que a flexibilidade de formas
de organização programática seja adotada como critério fundamental. Contudo,
de acordo com Bittencourt (2008), a proposta tem sido alvo de questionamentos,
com aceitação e resistência por parte dos docentes.

A primeira proposta curricular a conceber um ensino de História baseado


em temas foi feita pela Secretaria de Educação de São Paulo em 1986. Foi uma
proposta polêmica, pois rompia com as divisões dos “grandes períodos históricos”
e valorizava as lutas e os movimentos sociais. Apesar de não ter sido efetivada,

Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo 61


T4

serviu como referência para secretarias estaduais e municipais, e também para os


Parâmetros Curriculares Nacionais, publicados em 1998, em nível federal.

Desse modo, os conteúdos históricos escolares organizados por eixos temáticos


partem do pressuposto de que ensinar toda a História é uma ilusão e de que o
mais importante é a compreensão dos temas, processos históricos e conceitos,
construídos por eixo temático ou tema gerador.

A seleção dos temas é realizada de acordo com problemáticas gerais com


base nos interesses/necessidades dos alunos e também nos objetivos a serem
desenvolvidos em determinado nível escolar. Assim, cada eixo temático indicado
para o estudo de cada série ou ciclo implica a delimitação dos conceitos básicos.
Os conteúdos, desse modo, decorrem do eixo temático e são desenvolvidos
com flexibilidade para as diferentes situações escolares a fim de garantir, nesse
processo, o domínio dos conceitos fundamentais pretendidos.

Por exemplo: i) a Grécia Antiga é constantemente apresentada nos seus períodos


históricos; ii) realiza-se uma comparação entre Esparta e Atenas é realizada; iii)
as Guerras Médicas e a do Peloponeso são introduzidas; iv) e, por fim, discute-
se o Helenismo. Entretanto, a Grécia Antiga pode ser objeto de estudo de um
tema como relações de gêneros. Desse modo, ao se procurar compreender a
relação entre homens e mulheres, é possível discutir sobre a democracia grega,
o cotidiano de um grego, a participação das mulheres nos diversos aspectos da
sociedade (religião, guerra).

Assim, relações de gênero, tecnologia, história da alimentação, entre outros, são


elementos e eixos que podem nortear os estudos de história, visto que aparecem
ao longo da história da humanidade e servem para desenvolver conceitos como
mudanças e permanências.

A implementação da proposta, entretanto, não tem sido fácil, e ocorrem diversos


equívocos no seu entendimento que dificultam ainda mais a sua efetivação. Na
França, a proposta curricular dos anos 1970 que tinha como pressuposto a História
por eixos temáticos fracassou, segundo um de seus proponentes, o historiador
Le Goff, em razão da permanência dos princípios organizacionais dos conteúdos
tradicionais da História linear e cronológica. Temas como a “história da agricultura”
e “história dos transportes” acabaram por se converter em uma história apenas
linear, que se iniciava na pré-história, com a criação da agricultura, e passava pelos
sistemas agrícolas (ou de transporte) nos demais períodos históricos.

Da mesma forma, a experiência com eixos temáticos na prefeitura de São Paulo


na década de 1990, sob a Reorientação curricular pela via da interdisciplinaridade,
conduziu a estudos temáticos verticalizados sobre um único conteúdo. O tema
gerador, formado por um problema socialmente vivido pelos alunos e pela
comunidade, constituía o eixo a ser trabalhado pelas diversas disciplinas em seus

62 Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo


T4

diferentes conteúdos. Entretanto, em muitos casos, os temas geradores “lixo” ou


“moradia” se converteram no único conteúdo a ser desenvolvido no decorrer de
todo o ano letivo, por todas as séries.

Esse entendimento da História organizada por temas, segundo Bittencourt


(2008), retira conteúdos tradicionais que não poderiam ser excluídos e mantém
a linearidade e o sentido de “progresso histórico” que se critica e que se pretendia
superar, além de gerar um descontentamento entre os alunos, saturados de um
tema único durante todo o ano.

Por fim, entre os principais problemas para a História temática a que se deve
atentar é a discussão ainda aberta sobre que conhecimentos/conteúdos são
essenciais e indispensáveis para a educação histórica, e quais os parâmetros e
limites para a escolha ou eliminação de conteúdos históricos.

3. Planejamento: Uma Tarefa Necessária

Os dias dedicados ao planejamento anual na escola, especialmente no início do


ano letivo, são considerados muitas vezes uma perda de tempo para grande parte
dos professores. Ademais, o planejamento escrito, solicitado pelo coordenador
pedagógico, representa uma mera burocracia e um trabalho a mais para os
professores.

Formalidades e burocracias à parte, é preciso compreender o planejamento


como uma oportunidade de refletir sobre o próprio trabalho, verificar o que deu
certo e o que deu errado no ano anterior, a fim de repensar a organização dos
conteúdos e das práticas pedagógicas.

Cada ano/série escolar apresenta objetivos específicos a serem trabalhados.


Assim, além de eleger a forma de seleção e organização dos conteúdos a serem
trabalhados ao longo do ano (e como ele será trabalhado, seja de maneira
linear, integrada, seja por eixo temático), o planejamento anual de História,
portanto, caracteriza-se por relacionar noções, conceitos e conteúdos básicos
para a compreensão do processo histórico, que permitam aos alunos construir
significados a partir de assuntos considerados relevantes no planejamento e/ou
trazidos para a sala de aula pelos próprios alunos. Desse modo, é preciso definir
as noções, os conceitos e os conteúdos a serem desenvolvidos ao longo do ano
(NEMI; MARTINS; ESCANHUELA; 2009).

O diálogo com outros professores da disciplina é fundamental, a fim de


buscar coerência e evitar a repetição de conteúdos e conceitos nos diversos
anos/série. Conversar com professores de outras disciplinas, além disso, também
é importante, a fim de estabelecer relações entre os conteúdos. Por exemplo,
conteúdos relativos à globalização e ao Imperialismo são trabalhados também
pela Geografia. É necessário articular as abordagens para evitar incoerências que

Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo 63


T4

afetem o entendimento do aluno.

A articulação com a proposta pedagógica da escola, por fim, é essencial. Cada


instituição escolar é diferente e estabelece seus próprios princípios e pressupostos
sobre educação, e, por conseguinte, articular os conteúdos ao projeto pedagógico
é importante para que o que é trabalhado na disciplina História, em vez de
permanecer isolado, repercuta nas próprias atividades e vivências escolares.

A seleção e a organização de conteúdos de História, em suma, estão longe de


ser uma tarefa fácil e acabada. Trata-se de uma construção contínua, que exige
estudo e reflexão por parte do docente. Ademais, está sujeita a inúmeros fatores:
políticas curriculares, questões estruturais relacionadas a condições de trabalho,
disponibilidade de materiais e de tempo para preparação, esses são apenas alguns
deles.

Frente a esses diversos fatores, o desafio do professor é selecionar e organizar


conteúdos históricos que não fiquem alheios às demandas da sociedade
contemporânea e que, ao mesmo tempo, apresentem conteúdos significativos
para os alunos.

ACOMPANHE NA WEB

O Agora como Mestre

Relato de prática da professora Maria Thereza Didier que propõe discutir conteúdos
históricos a partir de temas do presente.

Link para acesso: <http://www.revistadehistoria.com.br/secao/educacao/o-agora-


como-mestre>. Acesso em: 10 junho. 2015.

História Negra, Escola Branca

Entrevista com o professor Amilcar Araujo Pereira (UFRJ) em que ele discute os
conteúdos históricos trabalhados nas escolas brasileiras, principalmente aqueles
referentes à temática de cultura e história afro-brasileira e indígena.

Link para acesso: <http://www.cartanaescola.com.br/single/show/246>. Acesso


em: 10 junho. 2015.

A História como uma Janela para o Mundo

Artigo das professoras Conceição Cabrini e Andrea Montellato sobre o trabalho em

64 Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo


T4

sala de aula com base em eixos temáticos.

Link para acesso: <http://www.revistadehistoria.com.br/secao/educacao/a-


historia-como-uma-janela-para-o-mundo>. Acesso em: 10 junho. 2015.

AGORA É A SUA VEZ

Instruções:

Agora, chegou a sua vez de exercitar seu aprendizado. A seguir, você encontrará
algumas questões de múltipla escolha e dissertativas. Leia cuidadosamente os
enunciados e atente-se para o que está sendo pedido.

Questão 1

Leia o fragmento da entrevista com o professor Amilcar Araujo Pereira (UFRJ) sobre
os conteúdos históricos ensinados nas escolas do Brasil:

Carta na Escola: Além dessa falta de material acadêmico, quais


são os maiores obstáculos à aplicação das leis que preveem o
ensino de cultura e história afro-brasileira e indígena?
Amilcar Pereira: Hoje estou coordenando uma pesquisa sobre
a implementação das leis em um grupo com 12 bolsistas na
UFRJ. Entrevistamos professores e diretores em várias escolas
no Rio de Janeiro, em Duque de Caxias e em Nova Iguaçu. Há
vários entraves. Um obstáculo tradicionalmente mencionado
é o da falta de material didático. Hoje há uma quantidade
substancial de fundamentos para ajudar o trabalho dos
docentes. Não dá pra dizer, como se falava há dez anos, que
não existe material. Porém, ainda não é suficiente. Há muitas
histórias relacionadas às populações negra e indígena que
nós não conhecemos. Estudo essas questões há muitos anos
e estou sempre descobrindo coisas novas, é impressionante!
A liberação de recursos por governos, tanto o federal quanto
os estaduais, para financiar pesquisas históricas sobre as
culturas afro-brasileira e indígena também é um problema.
Outra dificuldade é a pouca quantidade de pesquisadores
com trajetória nessa área. Historicamente a cultura e a história
afro-brasileira não foi um tema prestigiado na academia.
Precisamos qualificar quadros.

Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo 65


T4

Explique a opinião do professor Amilcar Pereira a respeito dos conteúdos ensinados.


Com base no entendimento do professor e também nos seus conhecimentos
prévios, discorra sobre os principais obstáculos para que haja uma modificação
quanto a esses conteúdos.

Questão 2

Faça a correspondência em relação às formas de seleção e organização de


conteúdos mais utilizadas e depois assinale a alternativa que contém a sequência
correta de correlação (de cima para baixo).

(1) Abordagem tradicional/linear

(2) História Integrada

(3) História por Eixos Temáticos

( ) Os conteúdos decorrem dos temas e são desenvolvidos com flexibilidade.

( ) Concebe o aprendizado da História como cumulativo e segue uma sequência


cronológica.

( ) Há a introdução do tempo sincrônico a fim de articular a história nacional e a


mundial.

( ) A seleção dos temas é realizada de acordo com problemáticas gerais baseando-


se nos interesses/necessidades dos alunos e também nos objetivos a serem
desenvolvidos em determinado nível escolar.

( ) Em muitos casos, há privilegiamento do papel do Ocidente na história mundial


e redução do papel dos povos não europeus na história universal.

a) 3 – 3 – 1 – 1 – 2.

b) 1 – 1 – 2 – 3 – 3.

c) 2 – 3 – 1 – 3 – 1.

d) 3 – 2 – 1 – 3 – 1.

e) 3 – 1 – 2 – 3 – 1.

Questão 3

No que tange às questões pertinentes ao planejamento, assinale a alternativa


incorreta:

a) O diálogo com outros professores da disciplina é fundamental, a fim de buscar


coerência e evitar a repetição de conteúdos e conceitos nos diversos anos/séries.

66 Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo


T4

b) Mais do que eleger a forma de seleção e organização dos conteúdos a serem


trabalhados ao longo do ano, é preciso definir as noções, os conceitos e os
conteúdos a serem desenvolvidos ao longo do ano.

c) O planejamento deve ser considerado uma oportunidade de refletir sobre


o próprio trabalho e repensar a organização dos conteúdos e das práticas
pedagógicas.

d) A articulação com as demais disciplinas do currículo é desnecessária, uma vez


que o conteúdo será desenvolvido de forma individual, em sala de aula, por um
único professor.

e) Articular os conteúdos ao projeto pedagógico é importante para que haja uma


repercussão nas próprias atividades e vivências escolares.

Questão 4

Leia o relato da professora Júlia sobre suas práticas:

“Ah, sim. Digamos assim, é... eu procuro seguir o livro. Lógico,


eu não preciso seguir à regra os conteúdos, não. O conteúdo
é interessante estudar daqui a um mês? Digo para os alunos:
‘olhe, a gente vai ver o capítulo 3 primeiro, depois a gente
volta pro 2. Mas isso não tem problema’. Daí eu explico para
os alunos: ‘Não tem problema a gente inverter, né? Então, é
mais interessante agora’. É lógico, desde que não haja aquela
quebra de... como que eu vou te dizer... quebra muito grande
de temporalidade ou... que não fuja muito... eu não vou passar
de um conteúdo da Antiguidade pra Idade Contemporânea,
voltar pra Idade Média, eu não faço isso” (NERI, 2005, p. 90).

Com base nos elementos dados pelo relato da professora, aponte qual forma de
seleção e organização de conteúdo a professora adota e discorra brevemente
sobre suas principais características, suas vantagens e limites.

Questão 5

Leia a seguinte reflexão:

JACQUES LE GOFF: Se emiti algumas reservas a respeito da


introdução da História por temas no ensino secundário, não foi,
evidentemente, em relação ao princípio em si. Mas é preciso
ver qual é o discurso escolar sobre o tema, e a mim parece-

Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo 67


T4

me que é o velho discurso. Existe um certo progresso quando se


faz uma História narrativa desde a carroça ao avião supersônico.
Mas se é, em primeiro lugar, de novo uma História narrativa e, em
segundo lugar, uma História que, longe de ser a dos possíveis e da
liberdade na História, de que falava Veyne, se torna ao contrário,
uma História mais determinista do que nunca, que dá a entender
que se devia forçosamente passar da carroça ao barco a vapor,
ao comboio, ao automóvel e ao avião supersônico, receio que
se tenham tornado as coisas ainda piores do que estavam, na
medida em que o conteúdo deste ensino tem seduções óbvias
e diminui ainda mais o espírito crítico dos alunos. Todos os que
aqui estão saudaram a entrada de novos objectos na História:
a história Nova pode fazer-se através do estudo de um objecto
a partir do qual toda a História de uma sociedade se desmonta
aos nossos olhos. Mas o que eu noto nessa História temática, tal
como ela se esboça, é uma História que se encerra no tema e que
não explica por que é que a carroça e o automóvel apareceram,
e como isso se inscreve na História geral das sociedades. É uma
História difícil de fazer, e se a História temática se fizesse assim,
então eu diria “bravo”! (ARIÈS et al, 1990, p. 15-16).

Com base na leitura das ponderações do historiador Jacques Le Goff sobre a


experiência francesa com o ensino de História a partir de eixos temáticos, aponte
os equívocos e os cuidados que se deve ter ao selecionar e organizar os conteúdos
históricos a partir dessa abordagem.

68 Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo


T4

FINALIZANDO

O trabalho docente de seleção e organização de conteúdos de História


apresenta-se demasiado complexo, pois acarreta escolhas e exclusões, além de
aludir a uma visão de História. Diversas formas de organização são possíveis, como
a História tradicional/linear, a História Integrada e a História por eixos temáticos,
entre tantas outras, e cada uma delas apresenta suas vantagens e suas limitações
no que diz respeito tanto às escolhas quanto às implicações em sala de aula.

Apesar de ser uma tarefa árdua, não há como escapar dela. Cabe ao professor,
a partir de seus estudos, de suas reflexões e das próprias experiências, ir trilhando
uma trajetória própria, com acertos e erros. Os momentos de planejamento, desse
modo, devem ser valorizados e aproveitados. Além disso, o diálogo com colegas
professores e a participação em cursos e seminários de formação continuada de
professores a fim de trocar experiências são necessários para fazer dessa tarefa uma
construção permanente e não um ato cristalizado que é repetido mecanicamente.

Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo 69


T4

70 Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo


T4

REFERÊNCIAS

ARIÈS, Philippe, e outros. A História - uma paixão nova. (Mesa Redonda). In: LE
GOFF, Jacques; LADURIE, Emmanuel Le Roy; DUBY, George e outros. A Nova
História. Coimbra: Almedina, 1990.

BEZERRA, Holien G. Ensino de História: conteúdos e conceitos básicos. In: KARNAL,


Leandro (Org.). História na Sala de Aula: conceitos, práticas e propostas. São Paulo:
Contexto, 2013.

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e


métodos. São Paulo: Cortez, 2008.

CABRINI, Conceição Aparecida; MONTELLATO, Andrea. A história como uma


janela para o mundo. Revista de História da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro (RJ),
v. 12, p. 82-85, 1 set. 2006. Disponível em: <http://www.revistadehistoria.com.br/
secao/educacao/a-historia-como-uma-janela-para-o-mundo>. Acesso em: 1 jan.
2015.

CERRI, Luis F. Recortes e organizações de conteúdos históricos para o ensino.


Antíteses (Londrina), v. 2, p. 131-152, 2009.

GREGORIO, Rafael. História negra, escola branca (Entrevista com o Prof. Dr.
Amilcar Araujo Pereira). Revista Carta na Escola, 2013. Disponível em: <http://www.
cartanaescola.com.br/single/show/246>. Acesso em: 1 jan. 2015.

MORAES, Maria Thereza D. O agora como mestre. Revista de História da Biblioteca


Nacional (Rio de Janeiro), 2009. Disponível em: <http://www.revistadehistoria.
com.br/secao/educacao/o-agora-como-mestre>. Acesso em: 1 jan. 2015.

NEMI, Ana; MARTINS, João C.; ESCANHUELA, Diego L. Ensino de História e


experiências. São Paulo: FTD, 2009.

NERI, Janete de Fátima Barause. A seleção de conteúdos de História por professores


do Ensino Médio. Dissertação (Mestrado em Programa de Pós-Graduação Em
Educação) - Universidade Federal do Paraná, 2005.

Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo 71


T4

GLOSSÁRIO

Conteúdos significativos: de acordo com Bittencourt (2008), os conteúdos


significativos vinculam-se a um critério de seleção baseado, direta ou indiretamente,
nos problemas do aluno e da sua vida, em sua condição social e cultural.

Tempo Sincrônico: simultâneo, concomitante. No caso da História Integrada,


propõe-se articular a História do Brasil, da América e Geral em um único processo,
explicado por relações de simultaneidade no tempo.

72 Planejamento, problematização e critérios de seleção de conteúdo


Tema 5

Conceitos norteadores no
ensino de história

POR DENTRO DO TEMA

Ao se estudar a história da educação brasileira, podemos perceber que a


concepção de ensino e sua finalidade modificam-se mediante as transformações em
curso no âmbito social. A passagem de um sistema de ensino baseado na seleção de
conteúdos rígidos e no desenvolvimento de competências restritas a uma disciplina
da grade curricular para um sistema de ensino mais flexível e integrador, que objetiva
a equidade e inclusão, é característica do modelo escolar de nosso tempo presente.

Essa concepção, que foca no desenvolvimento integral do ser, respeitando


suas limitações e trabalhando no sentido de formar o indivíduo para a integração
nas atividades sociais, surgiu como uma proposta inovadora, mas ainda hoje tem-
se tornado objeto de muita discussão entre os profissionais da educação. Nesse
contexto de valorização das potencialidades humanas, a proposição de uma
metodologia de ensino diferenciada tem ganhado proeminência nos currículos
educacionais que focam suas atividades educativas na construção de projetos
interdisciplinares. No entanto, antes de adentrarmos nos pormenores de tais
proposituras, faz-se necessário o resgate da discussão sobre qual a função social
da escola e do ensino da história.

No quadro das transformações políticas, econômicas e sociais do final do século


XX, cenário demarcado pela luta política por redemocratização após um longo
período de governo ditatorial, a concepção de escola e do ensino de história passa
por modificações quanto às metodologias de ensino a serem desenvolvidas. Nessa
nova fase, em que diversos pesquisadores da educação se reúnem para discutir
os rumos da educação, questões como o que deve ter no conteúdo curricular e
os métodos vinculados a tais proposituras tornaram-se centrais no processo de
construção de uma nova perspectiva de educação, de escola e de ensino.

Concebendo a instituição escolar de forma mais humana, como lócus social


responsável por produzir conhecimento, cultura e diferentes valores sociais,
Fonseca (2007) desenvolve:
T5

Como instituição social, a escola interage com diferentes


grupos, sujeitos e instituições. Transforma-se junto com a
sociedade, mas também contribui para essa transformação.
Assim, ocupa um lugar estratégico, porque faz a medição das
relações entre a sociedade, a educação, o Estado, a cultura
e a cidadania. Ainda que tenha uma autonomia relativa, a
escola articula as necessidades individuais às demandas da
sociedade contemporânea. Ao mesmo tempo em que fornece
escolaridade, prepara para o trabalho produtivo e a vida social
e política, transmitindo, preservando e recriando a cultura.
(FONSECA, 2007, p.101)

Em outros termos, se a escola objetiva “articular as necessidades individuais


às demandas da sociedade contemporânea”, a construção de novas propostas
pedagógicas e de conceitos para o ensino de história deverá se fundamentar no sentido
de viabilizar a condução da produção e socialização dos diferentes saberes. Destarte,
diante de tais ponderações, cabe a nós professores de História repensarmos as práticas
pedagógicas desenvolvidas no interior do espaço escolar, articulando os diferentes
conhecimentos e metodologias envolvidas no ato de educar. Cabe, nesse momento,
refletir sobre questões referentes à interdisciplinaridade e à transversalidade.

O que é Interdisciplinaridade e Transversalidade?

É comum encontrarmos nos documentos oficiais, como nos Parâmetros


Curriculares Nacionais (PCNs), elaborações que visam o trabalho interdisciplinar
com a proposição de temas transversais. No entanto, o que se presencia entre os
professores é a ausência de consenso em torno do entendimento conceitual e dos
métodos de trabalho com os diferentes componentes curriculares. Você saberia
dizer o que seriam esses conceitos? Na obra Práticas interdisciplinares na escola,
organizada por Ivani Fazenda (1993), Ferreira ressalta que na interdisciplinaridade:

O prefixo “inter” dentre as diversas conotações que podemos


lhe atribuir, tem o significado de “troca”, “reciprocidade”,
e “disciplina”, de “ensino”, “instrução”, “ciência”. Logo, a
interdisciplinaridade pode ser compreendida como sendo a
troca, de reciprocidade entre as disciplinas ou ciências, ou
melhor, áreas do conhecimento. (FERREIRA, 1993, p. 21-22)

Dessa forma, apreende-se que a interdisciplinaridade pretende garantir a construção


de conhecimentos que tenham por finalidade ultrapassar as fronteiras delineadas
pelas disciplinas, visando o comprometimento do professor com as atitudes e

74 Conceitos norteadores no ensino de história


T5

condutas interdisciplinares. Nessa diretriz, para que o trabalho interdisciplinar possa


ser desenvolvido há que se delimitar metodologias que implicam na integração de
conhecimentos que permitam:

[...] passar de uma concepção fragmentada para uma


concepção unitária de conhecimento; superar a dicotomia
entre o ensino e pesquisa, considerando o estudo e a pesquisa
a partir da contribuição das várias ciências e um processo
de ensino aprendizagem centrado numa visão de que
aprendemos ao longo da vida. (BOVO, 2004, p. 2)

Portanto, o trabalho com a interdisciplinaridade não requer o abandono da base


curricular da disciplina ao qual o professor é especialista para promover o estudo de
diferentes temas abrangentes que permeiam outras áreas do conhecimento. Em
direção contrária, a elaboração de trabalhos interdisciplinares requer do professor
especialista o pleno domínio conceitual de sua disciplina para que com isso possa
contribuir com as outras áreas do conhecimento, com aquilo que é próprio de sua
ciência de base. Sobre essas questões, Bittencourt (2008) expõe a seguinte reflexão:

Para existir interdisciplinaridade, parece óbvio que deve haver,


além de disciplinas que estabeleçam vínculos epistemológicos
entre si, a criação de uma abordagem comum em torno de
um mesmo objeto do conhecimento. [...] é fundamental o
professor ter profundo conhecimento sobre sua disciplina,
sobre os conceitos, conteúdos e métodos próprios do seu
campo de conhecimento, para poder dialogar com os colegas
de outras disciplinas. Os recortes de conteúdos de acordo
com problemáticas comuns, a seleção dos conceitos para
serem ampliados e aprofundados, enfim, a organização e
sistematização de informações que possam se integrar e
fornecer aos alunos uma visão de conjunto do objeto do
conhecimento são possíveis apenas se houver domínio por
parte dos especialistas das áreas. (BITTENCOURT, 2008, p. 256)

De acordo com a autora, o pleno domínio dos conteúdos e métodos se torna


a “garantia da preservação de um conhecimento escolar sem superficialidade, que
aborde temas interdisciplinares em profundidade” (BITTENCOURT, 2008, p.256).
Portanto, cada disciplina no processo de construção do conhecimento contribuirá
com uma especificidade inerente à ciência de base e, no momento de término
do trabalho interdisciplinar, o conhecimento adquirido contemplará o que há de
fundamental em cada área do saber. Assim, a conexão entre um saber e outro se torna

Conceitos norteadores no ensino de história 75


T5

mais efetiva no processo de desvelamento do mundo.

No entanto, você pode vir a perguntar: Como é possível alinhar os procedimentos


metodológicos do ensino de história aos procedimentos metodológicos da prática
interdisciplinar? É possível trabalhar com duas ou mais metodologias de ensino?

Quando se trabalha com o ensino de História na perspectiva da interdisciplinaridade


não podemos nos esquecer de que o professor deverá contemplar temas que
abrangem diferentes processos de transformação social nas variadas temporalidades
históricas. Essa abordagem, desenvolvida na relação com os temas transversais objetiva
a discussão de uma gama variada de objetos de estudos nos diferentes espaços sociais,
o que viabiliza outras perspectivas em relação ao aprendizado e às diferentes formas
de intervenção social.

Na obra História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas, organizada pelo


historiador Leandro Karnal (2007), Freitas Neto, ao problematizar os desafios que o
professor encontra quanto às proposições do ensino de História, revela as armadilhas
dos métodos de ensino que na busca da explicação do presente resgatam de
maneira excessiva o passado sem, no entanto, explorar a relação orgânica entre um
acontecimento e outro.

O autor argumenta que esse tipo de prática traz consequências à análise histórica
dos documentos, pois deixa de estimular no aluno a reflexão sobre a produção
da memória histórica, a ação do sujeito no tempo e no espaço, e a condução da
construção do pensamento histórico de um momento em específico. Esses vícios da
prática docente devem ser evitados em função do desentendimento do aluno sobre
os processos de intersecção entre a sua história, a de sua comunidade, cidade, estado
e país.

Acresce ao trabalho com a interdisciplinaridade a introdução de noções sobre o


uso da transversalidade no ensino de História. Freitas Neto (2007, p. 59) desenvolve a
ideia de que a análise histórica em sala de aula deve ser conduzida com a seguinte
concepção: “A transversalidade apresenta uma proposta que ultrapassa a fragmentação
dos conteúdos e disciplinas, prevendo um trabalho cujo conhecimento seja construído
em função dos temas e propostas apresentados”.

Em definição estabelecida pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) sobre o


conceito de transversalidade, observamos que ela se constitui na:

[...] possibilidade de se estabelecer, na prática educativa


uma relação entre aprender conhecimentos teoricamente
sistematizados (aprender sobre a realidade) e as questões
da vida real e de sua transformação (aprender a realidade da
realidade). (BRASIL, 1998, p. 30)

76 Conceitos norteadores no ensino de história


T5

Nessa linha, se o trabalho com a interdisciplinaridade propõe que se ultrapassem


as demarcações de fronteiras entre uma disciplina e outra promovendo a construção
do conhecimento, partindo de temas estabelecidos pelas propostas curriculares,
como podemos diferenciá-lo das propostas estabelecidas pela transversalidade? Em
primeira análise, tanto a interdisciplinaridade como a transversalidade parecem sugerir
os mesmos procedimentos para o desenvolvimento de uma educação global, no
entanto, existem especificidades que viabilizam a sua distinção.

A concepção de transversalidade permite agregar à construção da prática


pedagógica a definição dos fins a que se objetiva com a consolidação dos estudos
interdisciplinares. Ou seja, se a interdisciplinaridade permite questionar a fragmentação
dos diferentes campos de conhecimento visando os pontos de convergência
entre as várias áreas, primando pela relação epistemológica entre as disciplinas, a
transversalidade propõe temas que condizem com a realidade institucional com a
qual se está trabalhando.

Pode-se dizer que a proposição da transversalidade, aclarada nos Parâmetros


Curriculares Nacionais (PCNs), está preocupada em estabelecer temas que percorram
os estudos interdisciplinares por meio do levantamento das demandas sociais
existentes na comunidade com a qual se trabalha (BRASIL, 1998).

Os processos de transformações sociais são privilegiados na proposição de temas


elencados pelos PCNs. No sentido de contemplar um referencial que perpasse todas
as disciplinas escolares ao mesmo tempo em que se crie as condições objetivas para
se discutir temas estanques em nossa sociabilidade, os PCNs sugerem o trabalho com
eixos temáticos objetivando as discussões em torno da cidadania, do preconceito
contra grupos étnicos, do gênero e da orientação sexual, das precárias condições
de saúde de parte considerável da população, da desinformação sobre a educação
sexual, da necessidade da preservação de recursos naturais, enfim, os exemplos são
múltiplos.

O trabalho com os temas transversais contribui com a possibilidade de o aluno


desenvolver uma perspectiva da processualidade histórica, de leitura e entendimento
da realidade, contextualizando e agregando sentido ao ato de estudar. Portanto, nas
colocações de Freitas Neto (2007), não se trata de aprender que houve a escravidão
no Brasil, mas de o aluno saber se perguntar sobre as formas de organização social e
econômica de determinado período histórico, como era a divisão social do trabalho e
os problemas decorrentes de tal organização.

Assim, o trabalho com a transversalidade e interdisciplinaridade vai implicar no


reconhecimento de que o aluno assume um papel ativo no processo de construção
do saber e se admite como sujeito histórico detentor de conhecimento. Como
ressaltou Fonseca (2007):

Conceitos norteadores no ensino de história 77


T5

[...] professores e alunos não são meros consumidores de


materiais, executores de programas de ensino, mas criadores,
produtores de saberes. [...] De acordo com essa concepção,
nem professor, nem o aluno ocupam uma posição secundária,
mas ambos atuam de maneira ativa, aberta e flexível em relação
aos diferentes saberes. [...] O que se pretende é ultrapassar a
concepção de ensino como mera transmissão de conteúdos,
e desenvolver um ensino que tenha como pressupostos a
investigação e a produção de conhecimentos por professores
e alunos no espaço escolar (FONSECA, 2007, p. 102-103).

A Interdisciplinaridade e a Prática de Ensino da História Ambiental

Para finalizar nossa reflexão em torno da temática estudada, a proposta que por ora
se apresenta é a da interdisciplinaridade voltada à prática de ensino da história ambiental.
Sabendo que comumente as questões do meio ambiente são trabalhadas pelas
Ciências da Natureza (Biologia, Química, Física, Geologia) e que quando trabalhadas
nas Ciências Humanas geralmente ficam ao encargo da Geografia assumir a frente
de tais estudos, Bittencourt (2008) em sua obra Ensino de História: fundamentos e
métodos apresenta sugestões de trabalho com a interdisciplinaridade abrangendo o
leque da análise histórica com questões voltadas ao meio ambiente.

Assim, uma das abordagens expostas em sua obra merece atenção. Ressaltando
a importância das pesquisas no âmbito acadêmico e escolar para a modificação da
prática docente, a autora retrata que existem poucos trabalhos que objetivam estudar
o meio ambiente sob a perspectiva da análise crítica do relacionamento da sociedade
com a natureza. Mesmo hoje, com o crescente ritmo de publicações sobre o assunto,
ainda são raras as atividades interdisciplinares elaboradas no campo da História que
prevê o diálogo com o meio ambiente.

Como dito anteriormente, é importante que, antes de se promover a


interdisciplinaridade, parta-se de pontos fundamentais que devem permear e estruturar
as disciplinas envolvidas em trabalhos que se baseiam na concepção de conhecimento
escolar integrado (BITTENCOURT, 2008). Assim, para a educação ambiental, um
princípio articulador pode ser a concepção de que a natureza é dinâmica e existe a
necessidade de apreendê-la em sua completude, sendo o homem parte dela.

Dito isso, um bom exemplo que promove a integração das diferentes disciplinas
é o estudo dos alimentos. Apesar de ser considerado objeto de estudo da biologia,
a história pode promover uma abordagem que privilegia, além dos conteúdos
inerentes à sua área, questões relacionadas ao meio ambiente. Assim, ao se estudar
a colonização portuguesa na América, o professor tem a possibilidade de explorar

78 Conceitos norteadores no ensino de história


T5

o sistema de produção açucareiro em conjunto com os hábitos de consumo


alimentares da sociedade europeia do século XVI ao XVIII e as transformações
ocorridas com a introdução de novos produtos americanos. Da mesma forma,
pode-se estudar o que ocorreu no Brasil, com a introdução de produtos europeus
integrados às plantas alimentícias e medicinais, utilizadas por indígenas e africanos.

Essa primeira abordagem relacionada ao estudo da colonização portuguesa é


uma porta de entrada para uma série de outras questões como: a problematização
da concentração das grandes propriedades de terras e das plantações, fazendas,
sítios e pomares. A divisão social do trabalho nos diferentes espaços públicos
das feiras e mercados, os conflitos inerentes a essa organização e a cisão entre
esses trabalhadores. Enfim, as possibilidades são extensas. Nesse sentido, o
conhecimento sobre a sociedade colonial pode ser renovado com interpretações
sobre a criação de mitos e rituais religiosos construídos nessa época, o uso de
alimentos típicos regionais, próprios das festas profanas ou religiosas, e sobre o
poder de cura das ervas medicinais, enfim, a ideia é explorar o conhecimento
sobre as relações do homem com a natureza. A esse respeito Bittencourt (2008,
p. 269) afirma que: “O conhecimento das relações dos homens com a natureza
favorece a compreensão das noções de tempo histórico, mostrando os vínculos
desse passado cultural com a vida presente e a permanência dele na atualidade”.

Como foi visto, o trabalho com a perspectiva interdisciplinar tende a ampliar a


abordagem e a compreensão do aluno em torno de um eixo comum estipulado
nos temas transversais. A grande vantagem dessa metodologia de estudo incide na
troca de conhecimentos das diferentes áreas do saber. Assim, este tema pretendeu
criar um ambiente de reflexão para a prática docente com a criação de diferentes
projetos de ensino. O ponto de partida foi dado, caberá a você dar continuidade a
novas possibilidades.

ACOMPANHE NA WEB

A prática de projetos e transversalidade em sala de aula: As questões de gênero


no cotidiano escolar – uma perspectiva interacionista

Assista a esta videoaula, da professora Brigite Haertel, cuja finalidade é promover o


entendimento do conceito de transversalidade na educação, partindo-se de uma
concepção de que a escola deve reorientar a sua organização e objetivos com
a construção de novas formas de se conceber tanto as relações interpessoais
quanto as institucionais. Redirecionando a prática educativa com a apropriação de
recursos provenientes da dinâmica de organização da cidade e do entorno escolar,

Conceitos norteadores no ensino de história 79


T5

a professora defende a necessidade de execução de projetos que contemplem a


comunidade como espaço de aprendizagem, daí a necessidade da formulação de
projetos interdisciplinares e da transversalidade.

Disponível em: <http://www.eaulas.usp.br/portal/video.action?idItem=724>.


Acesso em: 2 jan. 2015. Tempo: 0:17:39.

Temas transversais e estratégias de projetos – Os caminhos da interdisciplinaridade

Com a finalidade de explanar os conceitos de interdisciplinaridade,


multidisciplinaridade e transversalidade, como elementos de compreensão da
realidade nas diferentes disciplinas escolares, o professor Ulisses Ferreira de Araújo,
por meio da exploração do pensamento de Edgar Morin, trabalha de maneira crítica
a historicidade do conceito de “disciplina” como ferramenta de compreensão dos
fenômenos sociais. A crítica à estruturação do conhecimento compartimentado
em fins do século XIX conduz ao entendimento da necessidade da instituição
de métodos diferenciados na condução das práticas escolares instituídas. Dessa
maneira, conduzindo o entendimento sobre os conceitos, como forma de
orientação das práticas de ensino em sala de aula, o professor cria possibilidades
para novas posturas no processo de ensino-aprendizagem.

Disponível em: <http://www.eaulas.usp.br/portal/video.action;jsessionid=034ACD


9BAC37883488555361C4658397?idItem=702>. Acesso em: 2 jan. 2015. Tempo:
0:20:35.

“Fronteiras Interdisciplinares no Ensino da História”, Luis Fernando Cerri

O artigo objetiva discutir a prática educativa interdisciplinar no ensino de História e


no campo das Ciências Humanas, explorando as transformações ocorridas no final
do século XX quando foram propostos os novos métodos de educação.

Disponível em: <http://www.ichs.ufop.br/perspectivas/anais/GT1502.htm>. Acesso


em: 4 jan. 2015.

“A inserção dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) nas escolas da rede


pública do Estado de Goiás – Brasil: a abordagem dos temas transversais com
ênfase no tema meio ambiente”, de Sandro Correa, Agustina Echeverria e Sandra
Oliveira

O objetivo deste estudo foi verificar o trabalho desenvolvido com os Parâmetros


Curriculares Nacionais (PCNs) e, vinculados a eles, o trabalho com os temas
transversais e o tema “meio ambiente”. Os autores analisaram as práticas
pedagógicas de professores na constituição de projetos interdisciplinares de
estudo do meio ambiente.

Disponível em: <http://www.seer.furg.br/remea/article/view/3021/1710>. Acesso

80 Conceitos norteadores no ensino de história


T5

em: 4 jan. 2015.

AGORA É A SUA VEZ

Instruções:

Agora, chegou a sua vez de exercitar seu aprendizado. A seguir, você encontrará
algumas questões de múltipla escolha e dissertativas. Leia cuidadosamente os
enunciados e atente-se para o que está sendo pedido.

Questão 1:

A abertura política, nos anos 80 do século XX, contribuiu para mudanças


epistemológicas na educação brasileira. Explique como essas mudanças
influenciaram a organização e a sistematização da prática pedagógica, destacando
os pressupostos teóricos da interdisciplinaridade e da transdisciplinaridade.

Questão 2:

A respeito da atuação em equipe, de professores especialistas que atuam em


diferentes frentes disciplinares, assinale a opção correta.

a) Uma equipe de trabalho na educação é sempre interdisciplinar.

b) Uma equipe interdisciplinar compõe-se de mais de um profissional da mesma


área envolvida no trabalho a ser realizado.

c) A equipe interdisciplinar reúne disciplinas com objetivos diferenciados e


profissionais mediados pelo diálogo.

d) Na equipe transdisciplinar, as relações internas são hierarquizadas.

e) Os trabalhos em parceria são intrinsecamente interdisciplinares.

Questão 3:

O exercício interdisciplinar tem sido uma estratégia muito utilizada na elaboração


de projetos de pesquisas e práticas sociais. A interdisciplinaridade prevê:

a) Conjugação de conflitos de diferentes áreas do conhecimento, tendo em vista


um objetivo em comum.

b) Fecunda interlocução entre diferentes áreas do conhecimento, tendo em vista


um objeto comum.

Conceitos norteadores no ensino de história 81


T5

c) Multiplicidade de ações tendo em vista diferentes objetos de estudo.

d) Justaposição de campos de saber convergindo para o mesmo objeto de estudos.

e) Articulação intercultural na coordenação de objetivos homogêneos.

Questão 4:

Discorra sobre as especificidades da interdisciplinaridade, de acordo com os PCNs,


e quais são as suas implicações no ensino.

Questão 5:

A sociedade atual exige do professor uma postura sustentada tanto na reflexão


de práticas educativas e seus efeitos quanto no desenvolvimento de novas
ferramentas de trabalho baseadas na investigação para o aprimoramento da
docência. Considerando essa postura, explique como a interdisciplinaridade e a
transversalidade podem contribuir na formação do professor prático-reflexivo.

82 Conceitos norteadores no ensino de história


T5

FINALIZANDO

Como foi abordado neste tema, pensar sobre o cotidiano escolar e os desafios
que os professores encontram em suas práticas de ensino na sala de aula implica
em construir uma postura reflexiva frente às demandas sociais da comunidade
na qual se trabalha. Dessa maneira, o trabalho com a interdisciplinaridade e com
os temas transversais devem ser construídos para tais fins. Como ressaltado por
Fonseca (2007):

[...] a busca da transdisciplinaridade na construção de projetos


educativos não pode ser, a nosso ver, considerada fórmula
para os males do ensino, nem a busca de um saber unificado,
mas fundamentalmente, uma postura crítica diante do mundo,
do conhecimento e do ensino. (FONSECA, 2007, p. 107)

Assim, pensar a educação na perspectiva de criar as condições essenciais à


formação de sujeitos críticos requer de nós, professores de História, uma postura
reflexiva sobre as concepções de ensino e os projetos educacionais que adotamos.
Nessa breve exploração do tema, a ideia foi permitir uma melhor compreensão dos
conceitos abordados como elementos viabilizadores para você, futuro docente,
elaborar novas formas de intervenção social.

Conceitos norteadores no ensino de história 83


T5

84 Conceitos norteadores no ensino de história


T5

REFERÊNCIAS

ARAÚJO, Ulisses Ferreira. Temas transversais e Estratégias de Projetos – Os


caminhos da interdisciplinaridade. e-aulas USP.

Disponível em: <http://www.eaulas.usp.br/portal/video.action;jsessionid=034ACD


9BAC37883488555361C4658397?idItem=702>. Acesso em: 2 jan. 2015.

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e


métodos. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2008.

BOVO, Marcos Clair. Interdisciplinaridade e transversalidade como dimensões da


Ação Pedagógica. Revista Urutágua, Maringá, n. 7, 2005.

Disponível em: <http://www.urutagua.uem.br/007/07bovo.htm>. Acesso em: 31


dez. 2014.

CERRI, Luis Fernando. Fronteiras interdisciplinares no ensino da História. In:


SEMINÁRIO PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA, 4., 2001. Anais... Ouro
Preto, 2001.

Disponível em: <http://www.ichs.ufop.br/perspectivas/anais/GT1502.htm>. Acesso


em: 4 jan. 2015.

CORREA, Sandro A.; ECHEVERRIA, Augustina Rosa; OLIVEIRA; Sandra de Fátima.


A inserção dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) nas escolas da rede
pública do Estado de Goiás – Brasil: a abordagem dos temas transversais com
ênfase no tema meio ambiente. Rev. eletrônica mestr. educ. ambient., v. 17, jul./
dez. 1996.

Disponível em: <http://www.seer.furg.br/remea/article/view/3021/1710>. Acesso


em: 3 jan. 2015.

FREITAS NETO, José Alves de. A transversalidade e a renovação no ensino de


História. In: KARNAL, Leandro (Org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e
propostas. 5. ed. São Paulo: Contexto, 2007.

HAERTEL, Brigite. A prática de projetos e transversalidade em sala de aula: as


questões de gênero no cotidiano escolar – uma perspectiva interacionista. e-aulas
USP.

Disponível em: <http://www.eaulas.usp.br/portal/video.action?idItem=724>.


Acesso em: 2 jan. 2015.

TEMAS TRANSVERSAIS. In: DICIONÁRIO Interativo da Educação, 2015.

Conceitos norteadores no ensino de história 85


T5

Disponível em: <http://www.educabrasil.com.br/eb/dic/dicionario.asp?id=60>.


Acesso em: 15 jun. 2015.

GLOSSÁRIO

Epistemológica: refere-se à análise crítica das ciências, à capacidade de conhecer


o próprio pensamento em exercício, em suas leis gerais e em suas leis específicas.
O que é próprio da ciência que se constitui enquanto campo de investigação.

Interdisciplinaridade: é a metodologia de ensino que prevê a construção do


conhecimento partindo do entendimento de que é necessário promover uma
ruptura com o saber fragmentado e consolidado nas diferentes frentes do saber
para se compreender qualquer tema. Assim, objetiva o diálogo entre as diferentes
disciplinas para promover uma compreensão mais ampla do objeto de estudo.

Metodologia: constitui-se num sistema de orientações e procedimentos


padronizados que são adotados no momento do desenvolvimento da pesquisa
histórica, que, na sua finalidade explicativa dos elementos que compõem o plano
da realidade, objetivam a comprovação de hipóteses.

Transversalidade: é o conhecimento desenvolvido mediante a análise de


elementos da realidade social. Geralmente, abrange temas gerais propostos pelos
Parâmetros Curriculares Nacionais, que percorrem todas as disciplinas de ensino,
cada qual com uma abordagem própria dos estudos da ciência de base.

Temas Transversais: “segundo o Ministério da Educação (MEC), ‘são temas que


estão voltados para a compreensão e para a construção da realidade social e
dos direitos e responsabilidades relacionados com a vida pessoal e coletiva e
com a afirmação do princípio da participação política. Isso significa que devem
ser trabalhados, de forma transversal, nas áreas e/ou disciplinas já existentes’. Os
temas transversais, nesse sentido, correspondem a questões importantes, urgentes
e presentes sob várias formas na vida cotidiana. Com base nessa ideia, o MEC
definiu alguns temas que abordam valores referentes à cidadania: Ética, Saúde,
Meio Ambiente, Orientação Sexual, Trabalho e Consumo e Pluralidade Cultural.
No entanto, os sistemas de ensino, por serem autônomos, podem incluir outros
temas que julgarem de relevância social para sua comunidade.” (DICIONÁRIO
INTERATIVO DA EDUCAÇÃO, 2015)

86 Conceitos norteadores no ensino de história


Tema 6

Práticas inovadoras no ensino


de história

POR DENTRO DO TEMA

As demandas por transformações nas metodologias do ensino em história não é


algo novo na educação. Sabe-se que desde a década de 1980, com a reintrodução
dos estudos de história e geografia nos currículos, criou-se uma necessidade de
repensar as finalidades do ensino nas respectivas disciplinas escolares. Assim, a partir
da década em questão, o que se presencia é a elaboração de propostas (a exemplo
dos Parâmetros Curriculares Nacionais) por parte do poder federal, dos estados e
municípios, que sugerem novos procedimentos e métodos de ensino aos docentes.

Ainda hoje, como reflexo de tais proposituras, o que se pode notar é a existência
de uma variada gama de propostas que objetivam “um ensino de história mais
significativo para a geração do mundo tecnológico” (BITTENCOURT, 2008, p. 99)
contemplando os ritmos diversos de apreensão do presente e da simultaneidade
no consumo de informações.

Situando essas propostas no tempo, pode-se dizer que estão concatenadas às


transformações políticas promovidas principalmente na década de 1990, momento
em que o neoliberalismo ganha expressividade nas diretrizes assumidas pelo
governo quando da elaboração de projetos nas diferentes frentes políticas. Assim,
no âmbito da educação as propostas educacionais implementadas demonstram
o compromisso do Ministério da Educação (MEC) frente à reformulação dos
conteúdos curriculares que abrange todas as esferas do ensino.

Em relação aos conteúdos, atualmente podemos presenciar nos currículos


uma abrangência de entendimento conceitual acerca da concepção de conteúdos
escolares que podem ser tanto aqueles que correspondem às especificidades de
cada uma das disciplinas quanto os relacionados à aquisição de valores, habilidades
e competências inerentes à prática escolar. Nessa perspectiva, Bittencourt (2008)
discorre sobre o assunto da seguinte maneira:
T6

Os conteúdos escolares incluem, por exemplo, aprendizagens


de novas linguagens, desde a norma culta da língua ao domínio
do significado das imagens de revistas em quadrinhos, de
propagandas ou de filmes. (BITTENCOURT, 2008, p. 106).

Seguindo essa tendência, os métodos de ensino em história têm considerado


importantes não apenas a prioridade ao pleno domínio dos conteúdos expressos no
entendimento dos conceitos inerentes à disciplina, mas também o desenvolvimento
de habilidades que viabilizam a leitura e correlação de análise de dados de uma tabela,
gráficos, mapas ou mesmo a interpretação de textos. Assim, o que se recomenda
é que o professor crie as condições favoráveis à potencialização da ação do aluno
como sujeito na construção do conhecimento e na produção do saber escolar.

No que diz respeito ao uso das tecnologias como recurso didático, essas também
têm sido alvo para a elaboração de novas propostas para o ensino. Levando-se
em consideração que a tecnologia tem afetado todas as formas de comunicação,
introduzindo novos referenciais para a produção do conhecimento, a escola como
reflexo das demandas sociais também deverá atuar na formulação de métodos que
contemplem a chamada geração das novas mídias. Nesse sentido, as proposições dos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para os ciclos finais do ensino fundamental,
e na disciplina de história, delimitaram em seus objetivos a necessidade do professor
de “saber utilizar diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos para adquirir
e construir conhecimentos” (BRASIL, 1998).

A respeito da constante adequação do método de ensino às demandas sociais,


Bittencourt (2008) tem trabalhos que remontam às condições culturais nas quais
os alunos estão inseridos num contexto de valorização das mídias digitais. Nesse
sentido, desenvolve:

As atuais gerações convivem com informações obtidas por


imagens e sons, e essa situação tem provocado mudanças
substantivas na escolarização. Crianças e jovens assistem a
noticiários, filmes, novelas, desenhos animados, programas
de entrevistas, futebol e estão assim imersos num “oceano de
imagens”. (BITTENCOURT, 2008, p. 107).

Compreendendo essa situação, os professores têm cada vez mais se dedicado ao


uso de diferentes mídias como forma de promover a aproximação entre os objetos
de estudo e a realidade social do aluno. Assim, partindo da concepção de que a
educação tem que buscar um diálogo com as questões relevantes colocadas em

88 Práticas inovadoras no ensino de história


T6

evidência na condução das relações sociais, o professor de história será privilegiado


com a possibilidade de transitar por diferentes linguagens e mídias objetivando criar
um ambiente propício ao desenvolvimento do raciocino crítico ao mesmo tempo em
que estimula maior interação dos alunos com o objeto de análise.

Nessa perspectiva, o professor, ao buscar conexões entre objeto de estudo e


realidade prática, deverá tomar alguns cuidados com o uso das tecnologias para que
essas não se tornem meios que favoreçam a potencialização da cultura de massa.
Dessa forma, o alerta incide em trabalhar com informações provenientes de diversas
fontes, de maneira crítica e de forma a desenvolver com os alunos uma análise que
compreenda as limitações do que está sendo veiculado, desvendando os interesses
implícitos que o autor da informação transmite. Enfim, há uma variada gama de
possibilidades de trabalhos a serem realizados com as diferentes tecnologias.

Destarte, realizadas as devidas ponderações e a contextualização das principais


transformações curriculares dos últimos trinta anos, cabe agora propor uma reflexão
em torno das possibilidades de uso tecnológico no ensino de história, ressaltando a
importância da consolidação de métodos apropriados ao ensino fundamental.

O Uso de Tecnologias para o Ensino de História

Os livros didáticos e as aulas de história a partir da metade do século passado têm


se apropriado do uso constante de imagens como instrumento de abordagem ao
objeto de estudo. Hoje em dia, além dessas, é comum encontrarmos professores
inserindo em suas práticas de ensino as imagens tecnológicas como recurso didático,
com o uso de aparelhos eletrônicos como os DVDs, a televisão e a internet, para citar
os mais corriqueiros.

A incorporação de diferentes linguagens e tecnologias no ensino denota não só


o reconhecimento frente às conexões entre os saberes escolares e a vida social, mas
também a necessidade de repensar os métodos de ensino-aprendizagem. Assim,
por mais trivial que tenha se tornado o uso desses recursos, parece-nos evidente o
problema em torno do método adequado ao manejo de diferentes tecnologias.

Dessa forma, tem sido comum encontrarmos professores entusiasmados com


o desenvolvimento de novos métodos de ensino que visam aulas mais dinâmicas
e atraentes aos alunos. No entanto, quando introduzem as tecnologias em suas
práticas docentes, delegam uma finalidade única e restrita que em seu fim se
restringe ao seu uso na sala de aula como elemento inovador, e ao objeto de
estudo caberá à função ilustrativa do conhecimento.

A incongruência de determinados aspectos das práticas de ensino têm sido


objeto de preocupação para alguns estudiosos da educação. Inserem-se nesse
quadro Bittencourt (2008), Cabrini (et al. 2005), Fonseca (2007), que têm se
dedicado às pesquisas sobre práticas de ensino de história, visando auxiliar o

Práticas inovadoras no ensino de história 89


T6

professor em suas reflexões em torno de seus métodos de ensino.

Já no âmbito da produção historiográfica, tem sido crescente a quantidade de


historiadores que se dedicam à análise de diferentes imagens como fontes e objeto
de estudo da história. Assim, as investigações sobre cinema, fotografia e televisão
tornaram-se lócus privilegiado para aqueles que se ocupam com a denominada
indústria cultural.

No entanto, antes de dar prosseguimento à nossa reflexão, vale explanar


algumas concepções em torno desse conceito. Grosso modo, resgatando a
concepção de Theodor Adorno, a indústria cultural é aquela que dentro do modo
de produção capitalista produz a imagem como mercadoria impregnada de
manipulação ideológica e sentidos. Há, porém, outras vertentes de estudos que,
partindo da lógica de produção cultural sustentada pelo capitalismo, se dedicam
ao significado das mudanças nas formas de comunicação provenientes da grande
assimilação de aparelhos tecnológicos, responsável pela inauguração da “cultura
da nova oralidade” (BITTENCOURT, 2008).

Insere-se, nesse quadro de historiadores, Elias Thomé Saliba que explica a


abordagem da seguinte forma:

O foco analítico se desloca para acompanhar como as


inovações tecnológicas da mídia (rádio, televisão, videocassete,
multimídia etc.) se inserem no cotidiano improvisado dos
grupos sociais, como se dá a relação dos receptores com
essas formas culturais eletrônicas ou como interagem “textos”
e “leitores”. (SALIBA, 1993, p. 121).

Destarte, nessa vertente de pesquisa, a abordagem se desenvolve em


apreender o papel do espectador, consumidor de imagens, como sujeito ativo
integrante do processo da assimilação da cultura e como criador de novas formas
de comunicação. Nessa perspectiva, pode-se afirmar que a análise se desloca do
plano cultural, que condiciona o indivíduo a pensar e agir de forma determinada,
para compreender como esse sujeito, além de espectador, também assume papel
ativo na produção de cultura.

Nesse sentido, Saliba (1993) adverte que o historiador deverá se precaver


no estudo e no tratamento das tecnologias, com o desenvolvimento de uma
abordagem crítica, objetivando a busca da fusão entre produção e recepção. Da
mesma forma, o professor, ao se apropriar de tecnologias como instrumento de
condução de análise, deverá em sua prática docente considerar que a produção
das diferentes linguagens, fontes e tecnologias é fruto de uma determinada
conformação social, que carrega consigo valores, interesses e ideologia.

90 Práticas inovadoras no ensino de história


T6

O Uso do Cinema na Prática de Ensino

Sabemos que a partir da década de 1980 houve um alargamento quanto aos


estudos relacionados às metodologias de ensino que ampliaram o uso de diferentes
fontes para o ensino de história. Assim, a adoção do cinema como ferramenta de
análise tem possibilitado debates diferenciados em torno da concepção do que é
história e sua função social.

Tal apropriação concorre, sem dúvida nenhuma, para despertar no aluno o


comprometimento de análise do objeto na relação intrínseca com os elementos
da realidade social da qual vivencia. Nesse sentido, pode-se dizer que o aluno ao
compreender os diferentes elementos que constituem o fundamento da disciplina
na intrínseca articulação com a vida prática assumirá uma postura mais ativa no
processo de construção do conhecimento.

Vale lembrar que o professor ao trabalhar com o cinema, deverá primar por
um planejamento que articule os temas inerentes à disciplina de história com as
temáticas abordadas pelos filmes. Nessa linha, Bittencourt (2008) ao refletir sobre
as propostas pedagógicas com o uso de filmes atenta-se aos cuidados quanto ao
método desenvolvido, ressaltando a importância da análise crítica que vai para
além da interpretação do conteúdo cinematográfico. Assim, desenvolve:

É preciso preparar os alunos para a leitura crítica de filmes,


começando por uma reflexão sobre os próprios a que eles
assistem. Como escolhem um filme para assistir ou quais
os atraem? Preferem os filmes que atinjam os sentidos e
as emoções, para que não seja preciso nenhum trabalho
intelectual? O que valorizam no filme: interpretação dos
atores ou conteúdo? (BITTENCOURT, 2008, p. 376).

De acordo com a autora, essa reflexão torna-se elemento importante


para a introdução de novos questionamentos que objetivam um pensamento
duvidoso sobre o que está sendo assistido, facilitando o entendimento da forma
como o aluno capta a imagem cinematográfica. Para além dessas indagações,
alguns especialistas da área consideram de extrema relevância à abordagem
cinematográfica o desenvolvimento de uma análise que tenha enquanto princípio
três aspectos fundamentais:

Práticas inovadoras no ensino de história 91


T6

a) Os elementos que compõem o conteúdo, como roteiro,


direção, atores, fotografia, música e atuação dos atores;
b) O contexto social e político de produção, incluindo a
censura e a própria indústria do cinema;
c) A recepção do filme e a recepção da audiência, considerando
a influência da crítica e a reação do público segundo idade, sexo,
classe e universo de preocupações. (KORNIS, 1992, p. 248).

Com base em tais orientações, e realizadas as reflexões e discussões em torno


das percepções sobre o cinema, o professor terá possibilidades de tecer abordagem
no sentido de analisar qualquer produção cinematográfica como objeto de estudo
da história. Assim, a proposta que se apresenta visa explanar possíveis relações
entre o estudo da história, com temas relacionados às formas de organização, uso
e ocupação do espaço pelas diferentes sociedades, na sua relação com outras
disciplinas por meio dos temas transversais.

Nesse sentido, nos apoiando na obra de Fonseca (2007), a proposta que se


apresenta visa analisar um curta-metragem denominado Ilha das Flores (1988)
que em nossa perspectiva pode ser considerado uma fonte inesgotável para a
produção de trabalhos interdisciplinares.

Em linhas gerais, o curta aborda de maneira objetiva e cíclica as relações que o


homem estabelece com o meio ambiente e os impactos decorrentes das formas
de uso e ocupação do espaço. No entanto, o modo de articulação e jogo das
imagens e também o enquadramento das atividades desenvolvidas em sociedade
deflagram várias possibilidades de ensino percorrendo variadas dimensões da
organização social.

Nesse sentido, o professor de história, preocupado em desenvolver uma aula


que trabalhe com o conceito de capitalismo, poderá em um primeiro momento
partir da compreensão das relações de trocas comerciais, da divisão social do
trabalho e de todas as atividades correlacionadas a cada etapa de produção da
mercadoria, para que então o conceito se torne um meio de compreensão do
funcionamento do sistema econômico.

Essa proposta possibilita o desenvolvimento de trabalhos conjuntos com outras


áreas do conhecimento como geografia e ciências. A primeira pode propor um
estudo que venha a compreender as formas de ocupação do espaço geográfico,
a análise sobre o tipo de solo e as transformações das paisagens ao longo do
tempo. Em ciências, o professor poderá desenvolver atividades de conscientização
sobre a preservação do meio ambiente, sobre os malefícios provenientes do uso
de agrotóxicos nas plantações e a degradação ambiental promovida pelo uso

92 Práticas inovadoras no ensino de história


T6

indiscriminado de elementos da natureza. Essa é apenas uma possibilidade de


trabalho conjunto, que vai demandar dos professores um comprometimento
frente à construção de projetos interdisciplinares que viabilizam a construção do
conhecimento de maneira interligada e coletiva.

Assim, ensinar história tendo como base da ação docente, realizando a articulação
entre os diferentes elementos da realidade do aluno no respeito à historicidade
dos acontecimentos quando efetuado o cotejamento entre temporalidades, é um
grande passo para a formação integral do ser humano. Nesse sentido, o propósito
deste tema foi criar as condições para que você em sua prática docente venha a
buscar novas formas de aperfeiçoamento e aprimoramento de suas atividades.
A ideia aqui não foi criar um receituário que deva ser seguido com rigor, mas
divulgar ideias que fazem parte de um movimento pela ressignificação da atividade
docente em meio a tantos desafios de nossa prática.

Assim, como Fonseca (2007) deflagrou em seus estudos, o processo de


reconstrução do ensino deverá passar por uma proposta pedagógica capaz de
estabelecer relações críticas com a concepção de história e a concepção de
mundo. Nesse sentido, escreve:

Esse processo de construção exige de nós um trabalho


permanente de reflexão sobre o sentido do trabalho e o papel
do ensino de história na sociedade em que vivemos. [...] a defesa
de um ensino de história que tenha como principal objetivo
contribuir, efetivamente, para a formação da consciência
histórica. Ou seja, um ensino de história que possibilite a
compreensão do “eu”, a afirmação da personalidade, situando
o indivíduo no espaço, no tempo, na sociedade em que
vive como sujeito ativo, capaz de compreender, construir e
transformar essa sociedade, o espaço, o conhecimento e a
história. (FONSECA, 2007, p. 250).

Assim, nossa prática deve ser direcionada por tais princípios. Nesse interim,
algumas ideias foram dadas, caberá a você trilhar um caminho. Bom trabalho!

ACOMPANHE NA WEB

Sua Escola, Nossa Escola – As Novas Tecnologias em Sala de Aula

Este vídeo desenvolve uma discussão sobre como todos os processos tecnológicos

Práticas inovadoras no ensino de história 93


T6

conseguem transformar a forma de ensinar e, principalmente, melhoram a relação


entre os alunos, professores e a comunidade. Vídeo, datashow, retroprojetor,
computadores, internet: as tecnologias são ferramentas importantes, mas o que
elas exigem dos gestores das escolas? Em que tipo de projetos podem ser usadas?
Especialistas convidados apontam suas opiniões nesse assunto.

Disponível em: <http://tvescola.mec.gov.br/tve/video?idItem=6922>. Acesso em:


20 jan. 2015. Duração: 00:25:59.

Escola Faz Tecnologia, Faz Escola: Uma Conversa

(Programa Salto para o Futuro com os Prof. Alberto Tornaghi, Profa. Adrea Ramal
e Profa. Rosália Procasko Lacerda)

Neste programa, os professores são convidados a debater sobre os usos de


diferentes tecnologias nas escolas, tendo como foco a utilização da internet
como instrumento de aprendizagem que viabiliza trocas de conhecimentos entre
professores e alunos. Ressaltam a modificação nas relações entre os sujeitos
envolvidos no processo de construção do conhecimento.

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=IJJ3iYVrsJ8>. Acesso em:


20 jan. 2015. Duração: 00:42:52.

Como Conciliar Ensino de História e Novas Tecnologias?

Este artigo traz uma reflexão teórica e metodológica sobre a elaboração do


conhecimento histórico escolar articulado a uma análise acerca de como o
computador vem sendo utilizado no processo de ensino e aprendizagem, nas
escolas públicas e privadas, no ensino fundamental e médio.

Disponível em: <http://www.uel.br/eventos/sepech/sepech08/arqtxt/resumos-


anais/CyntiaSFranca.pdf>. Acesso em: 30 jan. 2015

Ensino de História e Novas Tecnologias

O presente trabalho tem por objetivo discutir de que maneira o uso de tecnologias
aplicadas à educação, especialmente os laboratórios de informática e a internet, podem
potencializar o ensino de história a fim de contribuir com a aprendizagem histórica dos
alunos. Parte-se da premissa de que no Brasil há um movimento bastante forte de
inserção de tecnologias na educação básica, através de programas de incentivo como
o Proinfo, que se constitui no programa federal que tem como objetivo promover o
uso pedagógico de informática na rede pública de ensino no país.

Disponível em: <http://projeto.unisinos.br/rla/index.php/rla/article/


viewFile/237/190>. Acesso em: 30 jan. 2015

94 Práticas inovadoras no ensino de história


T6

AGORA É A SUA VEZ

Instruções:

Agora, chegou a sua vez de exercitar seu aprendizado. A seguir, você encontrará
algumas questões de múltipla escolha e dissertativas. Leia cuidadosamente os
enunciados e atente-se para o que está sendo pedido.

Questão 1

Sabe-se que a educação tem como finalidade a formação do indivíduo crítico e


consciente de sua atuação no processo de construção das relações sociais. Desse
modo, a utilização de diferentes linguagens e mídias no ensino, ao longo dos anos,
tem facilitado o trabalho docente quando pensamos em tais proposituras. Levando
em conta as especificidades de cada disciplina na formação humana de cada
indivíduo, desenvolva uma breve reflexão sobre o desenvolvimento de projetos
interdisciplinares com o uso de diferentes tecnologias.

Questão 2

(IFETC- RN) Segundo Belloni (2009, p. 12), o objetivo da educação para as mídias
é “a formação do usuário ativo, crítico e criativo de todas as tecnologias de
informação e comunicação”. Assinale a opção que apresenta a noção de mídia-
educação coerente com essa afirmativa de Belloni.

a) Mídia-educação abrange a integração das TICs ao processo educacional como


instrumento do processo de ensino e aprendizagem com o objetivo de alfabetizar
digitalmente o aluno para o uso do computador em situações educativas.

b) Mídia-educação é a instrumentalização dos alunos no ambiente escolar para que


eles utilizem as mídias de forma artística e criativa com o objetivo de proporcionar
o desenvolvimento da percepção humanística do mundo.

c) Mídia-educação é o uso das mídias como objeto de estudo em sala de aula, o


que supõe a inclusão de conteúdos relativos às novas tecnologias de informação
e comunicação como disciplina no currículo escolar.

d) Mídia-educação abrange estudar, aprender e ensinar a história, a criação, a


utilização e a avaliação das mídias como artes práticas e técnicas, bem como
discutir o lugar que ocupam na sociedade e o modo de percepção que elas
engendram.

Práticas inovadoras no ensino de história 95


T6

Questão 3

(IFETC- RN) As transformações decorrentes do avanço das Tecnologias da


Informação e Comunicação (TICs) têm cada vez mais exigido a formação de um
professor com capacidades de mediar o processo de descoberta, assimilação e
construção de novos conhecimentos. Esse professor seria o que inúmeros autores
classificam como mediador. Sobre mediação pedagógica, leia os postulados dados
e, em seguida, assinale a opção correta.

I. Uma prática verdadeiramente mediadora depende fundamentalmente dos meios


tecnológicos, sem os quais se torna inviável o processo de interação.

II. A mediação é a característica da interação especialmente na experiência de


aprendizagem e na transmissão cultural.

III. A mediação pedagógica não é possível em situações em que o professor utiliza


técnicas didático-pedagógicas tradicionais.

IV. O uso das TICs não garante a qualificação da prática docente mediadora,
podendo até mesmo ser um obstáculo a essa realização.

a) Apenas as afirmativas II e IV estão corretas.

b) Apenas as afirmativas II e III estão corretas.

c) Apenas as afirmativas I e III estão corretas.

d) Apenas as afirmativas III e IV estão corretas.

Questão 4

Nas últimas décadas do século XX e início do século XXI, o mundo vem assistindo
a um vertiginoso avanço das tecnologias da informação e da comunicação com
sérias implicações para as sociedades. Discorra sobre as possíveis consequências
do uso excessivo de tais tecnologias para a sociedade.

Questão 5

“Os recursos técnicos de comunicação têm protagonizado um avanço espetacular”


(GARCIA ARETIO, 2001). Reflita sobre a frase destacada e construa um pequeno
texto demonstrando em qual aspecto a tecnologia favorece o desenvolvimento do
aluno no que diz respeito à construção do saber.

96 Práticas inovadoras no ensino de história


T6

FINALIZANDO

Neste tema, partimos de uma contextualização em torno do movimento


historiográfico e educacional que pretendia redimensionar a concepção do ensino
de História contribuindo para uma formação mais humana e crítica do aluno.
Vimos a importância do desenvolvimento de uma prática de ensino que valorizasse
a construção do conhecimento histórico escolar, considerando elementos da
realidade de vida do aluno, contribuindo para que este se tornasse sujeito atuante
no processo de desenvolvimento do ensino e da aprendizagem.

Nesse sentido, a proposta que se apresentou visou possibilitar reflexões em


torno da prática docente com a introdução de técnicas inovadoras para o ensino.
Aqui a ideia foi tentar explorar possibilidades de trabalho com diferentes mídias e
tecnologias que contribuiriam com a condução das transformações necessárias à
produção de novos saberes.

Mas sabemos que para ocorrer tais transformações é preciso comprometimento


por parte dos sujeitos envolvidos quando do processo de construção do
conhecimento. É também preciso que haja, para além desse comprometimento,
constantes períodos de avaliações em torno de sua prática docente. Requer,
nesse sentido, um revolucionar na concepção do que é educação e para que ela
serve. Dessa forma, encerramos essa breve reflexão realizando um convite: que
tal começarmos a mudança partindo de nós mesmos? Alguns caminhos foram
trilhados, cabe a você decidir qual deles você vai seguir.

Práticas inovadoras no ensino de história 97


T6

98 Práticas inovadoras no ensino de história


T6

REFERÊNCIAS

BELLONI, Maria Luíza. O que é mídia-educação. Campinas, SP: Autores Associados,


2009.

BENJAMIN, Walter. A Obra de Arte na Era de sua Reprodutibilidade Técnica. In:


. Magia e Técnica, Arte e Política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São
Paulo: Brasiliense, 1985.

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de história: fundamentos e métodos.


2. ed. São Paulo: Cortez, 2008.

CABRINI, C.; CIAMPI, H.; VIEIRA, M. P. A.; PEIXOTO, M. R. C.; BORGES, V. P. Ensino
de História: Revisão Urgente. 3. ed. São Paulo: PUC, 2005.

FRANÇA, C. S.; SIMON, C. B. Como Conciliar Ensino de História e Novas


Tecnologias. VII Seminário de Pesquisa em Ciências Humanas (SEPECH), Anais...,
2008. Disponível em: <http://www.uel.br/eventos/sepech/sepech08/arqtxt/
resumos-anais/CyntiaSFranca.pdf>. Acesso em: 8 jun. 2015.

FONSECA, Selva Guimarães. Didática e Prática de Ensino de História: Experiências,


reflexões e aprendizados. 6. ed. Campinas: Papirus, 2007.

GARCIA ARETIO, Lorenzo. Bases Conceptuales. In: GARCIA ARETIO, L. La


Educación a Distancia. De la teoría a la práctica. Barcelona: Ariel, 2001. Coleción
Ariel Educación.

IDEOLOGIA Marxista. Disponível em: <http://www.brasilescola.com/filosofia/


ideologia-marxista.htm>. Acesso em: 8 jun. 2015.

KORNIS, Mônica A. História e Cinema: um debate metodológico. Estudos


Históricos: Teoria e História, Rio de Janeiro, FGV, n. 10, p. 246-247, 1992.

MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais Helena dos. Temas transversais
(verbete). Dicionário Interativo da Educação Brasileira - EducaBrasil. São Paulo:
Midiamix Editora, 2002. Disponível em: <http://www.educabrasil.com.br/eb/dic/
dicionario.asp?id=60>. Acesso em: 8 jun. 2015.

SALIBA, Elias T. A Produção do Conhecimento Histórico e suas Relações com


a Narrativa Fílmica. In: FALCÃO, Antonio Rebouças; BRUZZO, Cristina (Org.).
Coletânea Lições com Cinema. São Paulo: FDE, 1993.

SANTANA, A. Cultura de Massa. Brasil Escola. Disponível em: <http://www.


infoescola.com/sociedade/cultura-de-massa>. Acesso em: 8 jun. 2015.

Práticas inovadoras no ensino de história 99


T6

SALTO PARA O FUTURO. Escola Faz Tecnologia Faz Escola. Escola e


Tecnologia: Uma Conversa. Vídeo. Disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=IJJ3iYVrsJ8>. Acesso em: 8 jun. 2015.

SOSA, F.; TAVARES, L. C. Ensino de História e Tecnologia. Revista Latino-Americana


de História, v. 2, n. 6, ed. esp., ago. 2013. Disponível em: <http://projeto.unisinos.
br/rla/index.php/rla/article/viewFile/237/190>. Acesso em: 8 jun. 2015.

TV ESCOLA. As novas tecnologias em sala de aula. Sua Escola, Nossa Escola,


Vídeo, 2009. Disponível em: <http://tvescola.mec.gov.br/tve/video?idItem=6922>.
Acesso em: 8 jun. 2015.

GLOSSÁRIO

Neoliberalismo: doutrina desenvolvida a partir da década de 1970, que defende


a absoluta liberdade de mercado e uma restrição à intervenção estatal sobre a
economia, só devendo esta ocorrer em setores imprescindíveis e ainda assim num
grau mínimo.

Cultura de massa: é aquela criada com um objetivo específico: atingir a massa


popular, maioria no interior de uma população, transcendendo, assim, toda e
qualquer distinção de natureza social, étnica, etária, sexual ou psíquica. Todo
esse conteúdo é disseminado por meio dos veículos de comunicação de massa
(SANTANA, s/d).

Indústria cultural: no início do século XX, os primeiros autores a estudar os meios


de comunicação de massa foram os filósofos Theodor Adorno (1903-1969) e Max
Horkheimer (1896-1973), pertencente ao grupo de intelectuais conhecido por
Escola de Frankfurt. Ao analisar os meios de comunicação de massa, esses autores
concluíram que esses recursos funcionavam como uma maneira de transformar
em industrial a padronização de notícias e serviços. Dentro dessa concepção,
muda o sentido e a expressão de Cultura de Massa para Indústria Cultural.

Ideologia: é um conjunto de proposições elaborado, na sociedade burguesa, com


a finalidade de fazer aparentar os interesses da classe dominante com o interesse
coletivo, construindo uma hegemonia daquela classe (IDEOLOGIA, s/d).

Temas transversais: segundo o Ministério da Educação (MEC), “são temas que estão
voltados para a compreensão e para a construção da realidade social e dos direitos
e responsabilidades relacionados com a vida pessoal e coletiva e com a afirmação
do princípio da participação política. Isso significa que devem ser trabalhados, de

100 Práticas inovadoras no ensino de história


T6

forma transversal, nas áreas e/ou disciplinas já existentes”. Os temas transversais,


nesse sentido, correspondem a questões importantes, urgentes e presentes sob
várias formas na vida cotidiana (MENEZES, 2002).

Práticas inovadoras no ensino de história 101


Tema 7

O livro didático e outros


recursos didáticos para o
ensino de história

POR DENTRO DO TEMA

1. Concepções de Livro Didático: múltiplas facetas

O uso frequente do livro didático pelo professor faz com que seja fácil identificá-lo
e distingui-lo dos demais livros. Não obstante, conforme sustenta Bittencourt (2008),
trata-se de uma obra extremamente complexa devido à interferência de diversos
sujeitos em sua produção, circulação e consumo.

Desse modo, pode-se apreender que o livro não é apenas um objeto de


cultura, mas caracteriza-se por ser uma mercadoria, ligada ao mundo editorial e,
consequentemente, à lógica do sistema capitalista. De acordo com Munakata (2012):

Ao contrário dos livros copiados manualmente nos mosteiros,


para ali resguardar e ocultar os saberes acessíveis apenas aos
especialistas – os religiosos, em oposição aos leigos – os
livros da era gutenberguiana são para ler e divulgar, mediante
a compra. (MUNAKATA, 2012, p. 57)

O livro didático constitui também um suporte de conhecimentos escolares


propostos pelos currículos educacionais (BITTENCOURT, 2008). Os conteúdos
propostos pelos currículos são expressos pelos textos didáticos, desse modo, o livro
torna-se um instrumento fundamental na própria constituição dos saberes escolares.

Além disso, pode ser considerado um suporte de métodos pedagógicos, ao conter


exercícios, atividades, sugestões de trabalhos individuais ou em grupo e de formas de
avaliação do conteúdo escolar.

Por fim, diversas pesquisas compreendem o livro didático como um veículo de um


sistema de valores, de ideologia, de uma cultura de determinada época e sociedade.
T7

A natureza complexa do livro didático suscita debates e críticas tanto no interior


da escola quanto fora dela, envolvendo autores, editores, autoridades políticas e
intelectuais (FONSECA, 2014). Entretanto, o livro didático tem se consolidado como
o produto cultural de maior divulgação entre os brasileiros com acesso à educação
escolar básica na rede pública de ensino, contando com o incentivo de políticas
públicas específicas.

2. Políticas de Livro Didático: elaboração e avaliação

O acesso ao livro didático no Brasil é preocupação antiga das políticas públicas


para a educação básica do governo brasileiro. De acordo com Fonseca (2014), o
Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) teve início em 1929, quando o Estado
criou o Instituto Nacional do Livro (INL) a fim de dar maior legitimidade ao livro didático
nacional e auxiliar no aumento de sua produção.

A partir da década de 1960, o Estado impulsionou a indústria editorial, vinculando-a


diretamente ao processo de ampliação de produtos educacionais. Esta política
relaciona-se, segundo Fonseca (2014), com a expansão da educação escolar básica,
o que resultou na demanda por esse tipo de produto. Houve, então, uma adoção em
massa de livros didáticos, incentivada pelo Estado e pela indústria editorial brasileira,
em plena expansão, por meio de incentivos estatais. O livro didático assumiu, por
conseguinte, a forma do currículo e dos saberes históricos escolares.

No contexto da Ditadura Militar, houve a criação da Comissão Nacional do


Livro Técnico e Didático (Colted). Esse programa visava à distribuição gratuita de
livros didáticos às escolas primárias e secundárias e, com descontos nos preços, às
Universidades. Desse modo, o governo, por intermédio da Colted, adquiriu grandes
quantidades de livros didáticos, tornando-os o principal negócio da indústria editorial.
Foi extinto o INL, e a Fundação Nacional do Material Escolar (Fename) tornou-se
responsável pela execução do programa do livro didático.

Houve, assim, um crescente apoio do Estado à indústria editorial e à massificação do


livro didático no Brasil. O livro didático tornou-se uma das mercadorias mais vendidas
no campo da indústria editorial, e o governo, um dos maiores compradores de livros.

A indústria editorial e a educação escolar estiveram intimamente ligadas ao projeto


de ampliação de acesso ao ensino fundamental, o qual se vinculava ao modelo de
desenvolvimento econômico, além de corresponder aos interesses de multinacionais
no Brasil e na América Latina.

No que tange aos saberes específicos de História, o movimento de reformulação


do ensino de História foi acompanhado por um processo de mudanças na indústria
editorial, a qual passou a participar do debate acadêmico, adequando e renovando os
materiais. Ao se propor experiências alternativas, como a História por eixos temáticos,
o mercado editorial brasileiro também lançava suas novidades. Ademais, no decorrer

104 O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história


T7

dos anos 1980 e 1990, houve uma ampliação no número e no tipo de publicações de
livros paradidáticos.

Na década de 1980, no contexto da redemocratização, a política de distribuição do


livro didático no Brasil sofreu alterações. Em 1983 foi criada a Fundação de Assistência
ao Estudante (FAE) em substituição à Fename. Em 1985, a nova política foi definida
pelo Decreto Federal nº 91.542, que instituiu oficialmente o Programa Nacional do
Livro Didático (PNLD) e as regras de execução.

Desde então, o PNLD foi aperfeiçoado e ampliado. Neste particular, destaca-se o


processo permanente de avaliação dos livros didáticos, organizado e sistematizado
pelo Ministério da Educação (MEC), a partir de 1995. Em 1996 foi lançado o primeiro
Guia dos Livros Didáticos, e ocorreu a extinção da FAE, passando a responsabilidade
de execução ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). O Guia
é um documento importante para a escolha de livros didáticos pelos professores, e
traz resenhas e informações acerca de cada uma das obras aprovadas no Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD), apresentando aos docentes análises, reflexões e
orientações quanto ao conteúdo e estrutura das obras e suas potencialidades para a
prática pedagógica.

Diante da política que estimula a oferta de livros didáticos, a escolha do livro torna-
se um tanto complexa. Apesar das resenhas presentes no Guia do Livro Didático, o
professor também deve atentar-se a outros aspectos presentes nos livros e estabelecer
seus próprios critérios.

3. Escolha de Livros Didáticos: limites e possibilidades de usos

Para auxiliar e nortear a escolha e o estabelecimento de critérios, Bittencourt (2008)


apresenta alguns aspectos que devem ser analisados nos livros didáticos: a sua forma,
o conteúdo histórico escolar e seu conteúdo pedagógico.

No que tange à forma, é preciso verificar a qualidade do papel e das reproduções


e a quantidade e disposição das ilustrações nas páginas. Ademais, a maneira como
as páginas apresentam as informações (boxes, uso de itálicos e/ou negrito para
termos ou conceitos básicos) também deve ser analisada. Por fim, a observação da
materialidade do livro didático inclui analisar como estão divididos seus diferentes
tópicos característicos (introdução, índice, glossário, bibliografia, etc.) que podem
facilitar ou dificultar o trabalho dos alunos.

Com relação aos conteúdos históricos escolares, faz-se necessário que o professor
identifique a concepção de História do autor do livro, a qual nem sempre está explícita.
Desse modo, a análise da bibliografia, assim como a seleção de documentos ou
excertos de determinadas obras historiográficas, auxilia na apreensão da tendência
historiográfica dominante. Ademais, o número de páginas, a extensão das frases, a
quantidade de conceitos a serem introduzidos ou reiterados também merecem

O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história 105


T7

atenção.

De acordo com Bittencourt (2008), “além de sua capacidade de transmitir


determinado acontecimento histórico, é preciso identificar como esse conhecimento
deve ser apreendido”. Para a autora, uma análise dos conteúdos pedagógicos ou do
método de aprendizagem de um livro deve levar em consideração as propostas de
atividades, em que os alunos poderão realizar comparações, identificar as semelhanças
e diferenças entre os acontecimentos, estabelecer relações entre situações históricas
ou entre a série de documentos apresentados, além da indicação de outras obras para
leitura e realização de pesquisa.

Por fim, sempre é importante destacar o caráter de ferramenta auxiliar do livro


didático, e não um instrumento de trabalho único de professores e alunos.

Uma proposta para o uso diferenciado do livro didático deve começar pelo princípio
de leitura de uma obra. Desse modo, é importante fazer uma apresentação do livro
para os alunos. Além disso, sugere-se ensiná-los a usar o índice, para identificarem pelo
tema de estudo o capítulo a ser lido ou estudado. Trata-se, portanto, de uma forma de
conceber o livro didático não como guia a ser seguido, mas como um referencial para
a busca de informações e realização de pesquisas.

Por fim, a apreensão de que o livro didático não deve ser o único recurso didático é
fundamental para que o professor desenvolva e aprofunde suas práticas pedagógicas.
Nesse sentido, a utilização de documentos históricos, sugerida, aliás, nos PCNs, tem
sido de grande valia para a introdução do aluno no pensamento histórico, porém,
necessita de certos cuidados para não incidir em equívocos.

4. Uso de Documentos e suas Contribuições para o Ensino de História

A utilização de documentos históricos por professores muitas vezes relaciona-se


a certa pretensão em transformar o aluno em uma “espécie de historiador”. Contudo,
para os historiadores, os documentos têm uma finalidade diversa, que não se relaciona
com a situação de ensino de História. O historiador, ao selecionar suas fontes de
pesquisa, já possui um conhecimento histórico sobre o período e tem domínio de
conceitos e categorias fundamentais para a análise histórica, o que não acontece com
os alunos (BITTENCOURT, 2008).

Na sala de aula, portanto, os documentos históricos podem ser usados como


ilustração ou reforço de uma ideia trabalhada pelo professor. Podem servir também
como fonte de informação ou para introduzir o tema de estudo, assumindo a condição
de situação-problema.

Ademais, há uma grande variedade de documentos a serem utilizados em sala de


aula, cada um com uma especificidade.

106 O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história


T7

4.1 Documentos escritos

Os documentos escritos são ainda os mais comuns e os mais utilizados,


tradicionalmente, tanto por historiadores quanto por professores de História.

Entre os documentos escritos, os produzidos pelo poder institucional são bastante


utilizados nas pesquisas historiográficas, principalmente as relativas à história política. A
sua maior parte encontra-se em arquivos geridos pelo governo, os quais armazenam
documentos como processos, documentos sobre terras, documentos sobre
imigração, atas de assembleias legislativas, entre outros (ABUD; ALVES; SILVA, 2010). A
utilização desses documentos pode suscitar discussões a respeito da constituição da
cidadania, além das noções de direito, ética e poder nos diferentes períodos históricos.

As notícias de jornais também podem ser trabalhadas como documento histórico.


Não obstante, deve-se levar em consideração que seu papel como formador da
opinião pública está relacionado com o jogo político. Desse modo, uma grande
imprensa jornalística e um jornal ligado a um grupo sindical ou a um movimento social
apresentarão visões diferentes a respeito de um mesmo fato. É importante, nesse
particular, considerar a notícia como um discurso que não é neutro, mas que tem
claras intenções.

A literatura, apesar de ser muitas vezes trabalhada apenas na disciplina de Língua


Portuguesa, apresenta possibilidades interessantes como documento histórico,
sendo possível analisá-la como documento de época, cujos autores pertencem a
determinado contexto histórico e são portadores de uma cultura exposta em suas
criações, seguidores de uma determinada corrente artística e representantes do seu
tempo. Por exemplo, é possível utilizar a literatura de cordel para trabalhar o movimento
do cangaço ou mesmo as questões nordestinas e o processo migratório.

4.2 Documentos Não Escritos

Apesar do uso constante de documentos escritos por parte dos professores, a


concepção de documento abrange uma variedade de registros produzidos pelas
sociedades nos diversos períodos históricos, incluindo os documentos não escritos.
Cabe ao professor, através de procedimentos específicos, colocar o aluno em contato
com essa multiplicidade de fontes.

As fontes iconográficas, como por exemplo, fotografias, pinturas e desenhos,


podem mostrar possíveis cenários sociais e culturais sobre o momento histórico em
que foram produzidos. O professor, entretanto, deve estar atento para tratá-las com as
devidas distinções: elas são representações do real, e não o real em si, visto que são
fruto de determinadas intenções, visões de mundo, de um determinando contexto
e condições técnicas de produção. A fotografia, por exemplo, deve ser analisada
como fruto do trabalho de um sujeito que seleciona, faz recortes e possui, portanto,
determinadas intenções. Em suma, a fonte iconográfica não é neutra nem autônoma,

O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história 107


T7

mas é produzida e gerada em determinados contextos com determinadas intenções,


que devem ser consideradas pelo professor, a fim de não utilizá-las como meras
ilustrações de uma época (FONSECA, 2014).

Os objetos de museus, por sua vez, possuem grande potencial educativo no


ensino de História. Desse modo, deve-se ter o cuidado de desenvolver um trabalho
que resulte na mudança de um simples olhar de curiosidade sobre as peças de
museus, apreciadas apenas pelo seu valor estético e que desperta a imagem de um
passado “atrasado” e “ultrapassado”, para um olhar de indagação e, assim, transformar
os objetos museológicos em fontes de conhecimento histórico. Assim, o aluno deve
ser introduzido na compreensão do objeto como integrante de uma organização
social, de uma parte da vida cotidiana, dos rituais, da arte de determinado grupo
social. É importante relacioná-lo com outros objetos, para que o aluno estabeleça
comparações, observe diferenças e semelhanças entre os objetos e suas formas,
faça analogias, sugira hipóteses sobre seu uso e técnicas de fabricação. Conforme
Bittencourt (2008) sustenta, é preciso proporcionar uma atitude inquisitiva diante do
objeto.

Nesse sentido, a preparação do professor e dos alunos antes da visita ao


museu é fundamental para que sejam estabelecidos objetivos e para que haja um
aproveitamento maior da atividade. Ademais, muitos museus apresentam um “setor
educativo”, que além de oferecer visitas monitoradas e oficinas a alunos e professores,
fornecem também cursos de formação aos professores e empréstimo de material
para o uso em sala de aula, ampliando as possibilidades de trabalho ao docente.

Os filmes têm sido cada vez mais utilizados com o objetivo de deixar as aulas mais
dinâmicas. É preciso, contudo, atentar para a especificidade da linguagem ficcional
dos filmes e para o equívoco de utilizá-los como ilustração de acontecimentos
históricos e não como uma interpretação de determinado período, dependendo,
assim, de inúmeros fatores, como o diretor, o roteirista e a mensagem que o filme quer
passar. Assim, é preciso fazer uma leitura interna do filme (conteúdo, personagens,
acontecimentos principais, cenários, etc.), da produção do filme (diretor, produtor,
músicas, etc.) e, posteriormente, a análise do contexto externo do filme (ano, país,
etc.). É importante, desse modo, que o professor problematize o filme, discutindo os
vários elementos que influenciaram sua produção.

Por fim, deve-se atentar para a escolha do filme a ser trabalhado: a apresentação
de um filme longo e monótono para um sexto ano, por exemplo, pode ter resultados
desastrosos. Verificar se o conteúdo é adequado para a faixa etária dos alunos também
é um detalhe importante a ser considerado.

Por fim, a utilização da música é frequentemente discutida e sugerida devido ao


seu grande alcance e popularidade entre os alunos. O grande problema, não obstante,
reside em transformá-la em objeto de investigação. Nesse sentido, deve-se evitar o

108 O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história


T7

uso de canções como mera ilustração ou recurso de motivação, mas pensá-las como
fontes históricas produzidas por sujeitos históricos em determinados tempos e lugares
(FONSECA, 2014).

A escolha das músicas a serem trabalhadas de acordo com o tema é um primeiro


passo. Em seguida, deve-se organizar a audição, situando as obras em relação ao
tempo/época da produção, autoria, gravadora, o contexto sociopolítico e cultural da
época. Ao se interpretar a música, é importante destacar a linguagem, o vocabulário,
as metáforas, além de propor questões sobre o tema da canção, do que trata a letra,
qual é a posição que o autor assume e quais são os indícios da época estudada. Por
fim, é necessário construir uma síntese, ou seja, discutir a relação da canção com o
tema estudado, seja oralmente, seja por meio de atividades individuais ou em grupo,
que utilizem outras fontes para enriquecer o diálogo.

As possibilidades de uso de documentos no ensino de História são, por


conseguinte, diversas, e cabe ao professor explorá-los não com o intuito de introduzir
aos alunos uma metodologia de pesquisa histórica, mas de apresentar as leituras e as
relações que podem ser estabelecidas através da análise de documentos muitas vezes
desconsiderados pelos alunos, e assim, enriquecer as discussões em sala de aula.

ACOMPANHE NA WEB

Circe Bittencourt: “O bom livro didático é aquele usado por um bom professor”

Entrevista com a Profa. Dra. Circe Bittencourt sobre os usos dos livros didáticos.

Link para acesso: <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/circe-bittencourt-bom-


livro-didatico-aquele-usado-bom-professor-780314.shtml?page=0>. Acesso em: 10
junho. 2015.

A leitura crítica de fontes históricas

Reportagem que discute algumas experiências de usos de documentos históricos em


sala de aula.

Link para acesso: <http://revistaescola.abril.com.br/historia/pratica-pedagogica/


leitura-critica-fontes-historicas-526597.shtml>. Acesso em: 10 junho. 2015.

Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE)

Site que apresenta informações sobre as ações educativas desenvolvidas pelo Museu
de Arqueologia e Etnologia (MAE) da Universidade de São Paulo, as quais incluem
cursos e empréstimo de materiais.

O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história 109


T7

Link para acesso: <http://www.intranet.mae.usp.br/modules/educativo/content.


php?id=52>. Acesso em: 10 junho. 2015.

AGORA É A SUA VEZ

Instruções:

Agora, chegou a sua vez de exercitar seu aprendizado. A seguir, você encontrará
algumas questões de múltipla escolha e dissertativas. Leia cuidadosamente os
enunciados e atente-se para o que está sendo pedido.

Questão 1

Leia um trecho da entrevista da Profa. Circe Bittencourt à Revista Nova Escola:

Revista Nova Escola - O que faz um livro didático ser bom?

Circe - O uso que se faz dele - e isso tem a ver com, entre outras muitas coisas,
fazer da publicação um dos recursos possíveis para os estudantes, não o único. É
possível trabalhar com fontes primárias de pesquisa, idas a campo e experimentos
e outros mais. O bom livro didático é aquele usado por um bom professor.

Relacione a fala da Profa. Circe Bittencourt com os limites e possibilidades do uso


do livro didático no cotidiano escolar.

Questão 2

A respeito das políticas de livro didático, é incorreto afirmar:

a) A política de incentivo ao livro didático teve início em 1929, quando o Estado


criou o Instituto Nacional do Livro (INL) a fim de dar maior legitimidade ao livro
didático nacional e auxiliar no aumento de sua produção.

b) O Estado impulsionou a produção de materiais a partir da década de 1960,


por meio de uma política relacionada estritamente aos interesses de expansão da
indústria editorial brasileira.

c) Na época do Regime Militar, houve a criação da Comissão Nacional do Livro


Técnico e Didático (Colted), a qual visava à distribuição gratuita de livros didáticos
às escolas primárias e secundárias e, com descontos nos preços, às Universidades.

d) O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), com suas regras de execução,


foi instituído em 1985, pelo Decreto Federal nº 91.542.

110 O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história


T7

e) A partir de 1995, instituiu-se o processo permanente de avaliação dos livros


didáticos, organizado e sistematizado pelo Ministério da Educação (MEC), o
vinculando diretamente ao processo de ampliação de produtos educacionais.

Questão 3

Faça a correspondência entre os cuidados e especificidades relativos à utilização


de documentos escritos e não escritos no ensino de História, e depois assinale a
alternativa que contém a sequência correta.

(1) Documentos escritos.

(2) Documentos não escritos.

( ) Ainda são os mais comuns e os mais utilizados, tradicionalmente, tanto por


historiadores quanto por professores de História.

( ) Deve-se levar em consideração que seu papel como formador da opinião


pública está relacionado com o jogo político, concebendo, assim, um discurso
que não é neutro, mas que tem claras intenções.

( ) O professor deve estar atento para tratá-las como representações do real, e


não como o real em si, visto que são fruto de determinadas intenções, visões de
mundo, de um determinando contexto e condições técnicas de produção.

( ) É preciso, contudo, atentar para o equívoco de utilizá-los como ilustração de


acontecimentos históricos e não como uma interpretação de um determinado
período.

( ) Apesar de ser muitas vezes trabalhada apenas na disciplina de Língua Portuguesa,


apresenta possibilidades interessantes como documento histórico, sendo possível
analisá-la como documento de época, cujos autores pertencem a determinado
contexto histórico e são portadores de uma cultura exposta em suas criações,
seguidores de uma determinada corrente artística e representantes do seu tempo.

a) 1, 2, 1, 2, 2.

b) 1, 1, 2, 1, 1.

c) 1, 1, 2, 2, 1.

d) 2, 2, 1, 2, 1.

e) 2, 1, 2, 2, 1.

O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história 111


T7

Questão 4

“No caso específico do livro didático, como se viu, ele envolve uma miríade de
pessoas que o realizam como mercadoria: autor, editor, chefe de arte, copidesque,
preparador de texto, revisor, diagramador, as várias categorias profissionais de
gráficos, divulgador, avaliador, diretor de escola, professor, aluno e pais, só para
mencionar as mais óbvias. A produção do livro didático serve certamente para
a acumulação do capital, mas onde há o capital, há também o trabalho, os
trabalhadores e suas práticas.” (MUNAKATA, 2012)

No trecho do artigo de Munakata (2012), o autor explora uma das inúmeras facetas
do livro didático. Desse modo, relacione o excerto com os cuidados que devem
ser tomados ao se escolher um livro didático.

Questão 5

Faça uma síntese sobre os principais momentos relacionados com as políticas de


livro didático no Brasil.

112 O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história


T7

FINALIZANDO

O livro didático possui uma trajetória contraditória no Brasil, suscita debates e


críticas sobre seu conteúdo e seus usos, e tem sua utilização consolidada nas escolas.
Conforme foi discutido, políticas públicas de incentivo à produção desses livros têm
participação fundamental no processo de consolidação, desde o seu início, em 1929,
com o Instituto Nacional do Livro (INL), até o atual Programa Nacional do Livro Didático
(PNLD). Diante da política que estimula a sua oferta e dada a sua inevitável utilização, é
preciso atentar para as condições e critérios de sua seleção, principalmente no que diz
respeito à forma, ao conteúdo pedagógico e ao conteúdo histórico escolar.

Por fim, a concepção de que exista um livro didático ideal deve ser refutada. O
livro didático possui limites, vantagens e desvantagens que precisam ser considerados.
A complementação com a utilização de outros materiais é recomendável para que
o professor desenvolva e aprofunde suas práticas pedagógicas. Nesse sentido, a
utilização de documentos históricos de naturezas diversas, como músicas e imagens,
a fim de introduzir o aluno no pensamento histórico, apresenta grandes possibilidades
pedagógicas. Contudo, é preciso apenas evitar utilizá-los com o objetivo de transformar
os alunos em “pequenos historiadores”, utilizando, assim, os documentos históricos
como ilustração ou reforço de uma ideia trabalhada pelo professor, além de fonte de
informação ou para introduzir o tema de estudo.

O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história 113


T7

114 O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história


T7

REFERÊNCIAS

ABUD, K. M.; ALVES, R. C.; SILVA, A. Ch. de M. Ensino de História. 1. ed. São Paulo:
Cengage Learning, 2010.

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e


métodos. São Paulo: Cortez, 2008.

BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: História. Secretaria de Educação


Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.

FONSECA, Selva Guimarães. Didática e prática de ensino de história: experiências,


reflexões e aprendizados. Campinas: Papirus, 2014.

MUNAKATA, K. O livro didático como mercadoria. Pró-Posições, UNICAMP, v. 23,


p. 51-66, 2012.

SALLA, Fernanda. O bom livro didático é aquele usado por um bom professor.
Revista Nova Escola, ed. 269, fev. 2014.

VEROTTI, Daniela Talamoni Araujo. A leitura crítica de fontes históricas. Revista


Nova Escola, jan. 2012.

GLOSSÁRIO

Era gutenberguiana: Período relativo ao início da imprensa, com a utilização da


prensa de Gutenberg ou contemporâneo do período desta.

Situação-problema: As situações-problema caracterizam-se por recortes de um


domínio complexo, cuja realização implica mobilizar recursos, tomar decisões e
ativar esquemas. São fragmentos relacionados com nosso trabalho, nossa interação
com as pessoas, nossa realização de tarefas, nosso enfrentamento de conflitos.

Cangaço: Nome dado ao movimento social ocorrido no Nordeste que teve


Virgulino, o Lampião, como seu principal líder.

Linguagem ficcional: Ficção é o termo usado para designar uma narrativa


imaginária, irreal. Em contrapartida, a não ficção trata de uma narrativa factual
sobre a realidade. Obras ficcionais podem ser parcialmente baseadas em fatos
reais, mas sempre contêm algum conteúdo imaginário, e para tanto usam a
linguagem ficcional.

O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história 115


T7

Metáforas: Figura de linguagem em que há o emprego de uma palavra ou uma


expressão em um sentido que não é muito comum, em uma relação de semelhança
entre dois termos. Metáfora é um termo que, no latim, pode ser explicado como:
“meta” significa “algo” e “phora” significa “sem sentido”. Esta palavra foi trazida do
grego, em que metaphorá significa “mudança” e “transposição”. Assim, metáfora é
a comparação de palavras na qual um termo substitui outro. É uma comparação
abreviada em que o verbo não está expresso, mas subentendido. Por exemplo,
ao dizer que um amigo “está forte como um touro”, é sabido que, obviamente,
ele não se parece fisicamente com o animal, mas está tão forte que faz lembrar
um touro, comparando a força entre o animal e o indivíduo. Outros exemplos de
metáfora: “Eu estou sempre dando murro em ponta de faca”.

“Eu carrego o mundo nos meus ombros”.

“Os jogadores já estão preparados e estão no gramado, que é um lindo tapete


verde”.

116 O livro didático e outros recursos didáticos para o ensino de história


Tema 8

A avaliação em história no
ensino fundamental

POR DENTRO DO TEMA

Introdução: Avaliação da Aprendizagem no Cotidiano Escolar

A avaliação da aprendizagem do aluno apresenta diversas concepções, cada uma


delas expressa objetivos e intenções relacionados às práticas educativas.

No cotidiano escolar, a avaliação se caracteriza, em grande parte, como um modelo


estandartizado por provas, exames, notas, aprovações, reprovações e dependências,
representando, assim, um claro objetivo classificatório e, muitas vezes, punitivo.

Os instrumentos de “avaliação de aprendizagem” nas instituições escolares


aparecem, deste modo, constantemente como mecanismos de controle e de
disciplina do aluno. Esse tipo de avaliação, considerado classificatório, punitivo
e reprodutivista, cumpre, na maioria das vezes, apenas o objetivo de coletar
informações sobre o que o aluno alcançou nos resultados. A avaliação não se
caracteriza como um instrumento de avaliação do processo de ensinar e aprender,
mas um meio de controle e seleção, classificação dos educandos, dos educadores
e das escolas.

Estudos sobre avaliação, não obstante, têm debatido e proposto novas formas
de avaliar, a fim de superar essa concepção tradicional. Uma das concepções
frequentemente discutidas é a avaliação diagnóstica.

Luckesi (2005) propõe a avaliação diagnóstica como uma superação da


avaliação classificatória, excludente, punitiva e autoritária. Trata-se de conceber o
diagnóstico a fim de elaborar tomadas de decisão e, assim, aprofundar e auxiliar a
aprendizagem. Neste sentido, o ato de avaliar tem a função de investigar a qualidade
do desempenho dos estudantes, tendo em vista proceder a uma intervenção
para a melhoria dos resultados, caso seja necessária. Como investigação sobre o
desempenho escolar dos estudantes, ela gera um conhecimento sobre o estado
de aprendizagem, importando, assim, o que eles aprenderam e o que ainda não
aprenderam.
T8

Pesquisas sobre avaliação da aprendizagem, ademais, têm defendido a


perspectiva de que podemos chamar de crítica ou formativa de avaliação,
conforme propõe Hoffmann (2001), sustentando que o professor deve priorizar o
viés qualitativo da avaliação sobre o que é ensinado e aprendido, utilizando-se de
instrumentos apropriados, acrescentando, em sua prática pedagógica, as práticas
avaliativas formativas e contínuas.

Uma avaliação formativa requer a maior “transparência possível” entre professor


e aluno, o que muitas vezes não acontece. É recorrente o aluno passar por
problemas de aprendizado e não conseguir revelar suas dúvidas e seus erros ao
professor, com medo de expor-se, levando-o a “iludir, mascarar suas falhas e
acentuar seus pontos fortes”. Além disso, muitos alunos utilizam como “armas” a
sedução, a conquista do professor, a memorização do conteúdo na última hora e
a “cola” para superar as avaliações da aprendizagem (FONSECA, 2014).

É neste sentido que uma avaliação formativa e qualitativa tem como intuito
identificar as carências e situar tanto o educador quanto o educando no processo
escolar. Possibilita, assim, o aperfeiçoamento do ensino, deixando de ser
meramente classificatória, tornando-se parte de uma trajetória de aprendizado dos
alunos.

No entanto, conceber a avaliação da aprendizagem sob tal perspectiva mostra-


se um desafio cada vez maior para os profissionais da área, uma vez que novos
modelos e pressupostos têm sido apresentados como norteadores das práticas
avaliativas, por meio da implementação de mecanismos que controlam e regulam
os diversos níveis de ensino. Como exemplo podemos citar, em nível nacional, o
Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) e a Prova Brasil, avaliações nacionais
desenvolvidas e implementadas pelo MEC, e, em nível estadual, o Saresp.

De acordo com Fonseca (2014), a escola brasileira passou a conviver com


novas formas de controle por meio de diferentes mecanismos, entre os quais
os currículos e os sistemas nacionais e estaduais de avaliação. Em 2007, em
continuidade e aprofundamento da política nacional de educação, o MEC lançou
“o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) com o objetivo de melhorar
substancialmente a educação oferecida às nossas crianças, jovens e adultos”. Esse
plano (atualizado em 2011), segundo o documento, “sistematiza várias ações na
busca de uma educação equitativa e de boa qualidade e se organiza em torno
de quatro eixos: educação básica; educação superior; educação profissional e
alfabetização”.

O Plano de Desenvolvimento da Educação tem como instrumento básico


de aferição de qualidade o instrumento chamado Índice de Desenvolvimento
da Educação Básica (Ideb), que articula e combina dois índices de avaliações: o
fluxo escolar, que demonstra o número de aprovações e repetências, resultante

118 A avaliação em história no ensino fundamental


T8

das informações das escolas ao Programa Educacenso, e o desempenho dos


estudantes, avaliado pela Prova Brasil nas áreas de Língua Portuguesa e Matemática.
O Ideb de cada escola é divulgado periodicamente e constitui o principal referencial
para o financiamento às escolas.

O Enem, cuja primeira edição ocorreu em 1998, também tinha como objetivo
aferir o desempenho de estudantes no final da Educação Básica e, assim, promover
políticas de melhoria da qualidade da educação brasileira. Em 2009, o MEC
apresentou uma proposta de reformulação do Enem, que passou a ser utilizado
como forma de seleção unificada nos processos seletivos das universidades
públicas federais, passando a ser chamado de Novo Enem (BERGAMIN, 2014).

Neste sentido, as avaliações externas passaram a exercer significativa influência


nas práticas pedagógicas e avaliativas dos professores, formatando as propostas
curriculares das escolas, os conteúdos a serem ensinados e as metodologias
visando atender à demanda dos sistemas avaliativos, além da utilização de
instrumentos avaliativos aplicados aos alunos para treiná-los a realizar os “modelos”
das provas dos principais exames do país. Refém da avaliação nacional, a qual
cada vez mais obtém importância e funções, o docente torna-se responsável por
apreender o conteúdo exigido nessas avaliações e por trabalhar de forma eficiente
com seus alunos.

Logo, o professor deve atentar para os critérios de avaliação e sua relação


com as práticas educativas em História, pois corre o risco de limitar, submeter,
padronizar e adequar o processo de ensino-aprendizagem em História, amplo
e complexo, aos mecanismos de controle e regulação que objetivam verificar e
classificar de acordo com os padrões de qualidade estabelecidos fora da escola.

A Avaliação em História

Tendo em vista o debate e os estudos sobre avaliação, pergunta-se: o que e


como avaliar em História? Não se trata de uma pergunta de fácil resposta, posto
que envolve conceitos e pressupostos arraigados em cada professor.

A avaliação em História deve servir para o professor avaliar o progresso


intelectual do aluno na aquisição de conhecimentos novos, no enriquecimento
e aprofundamento de noções e conceitos históricos. O objetivo é que o aluno
reflita e consiga formular problemas e estabelecer relações dentro de um processo
histórico.

A prova ainda se constitui como um dos procedimentos mais utilizados na


verificação da aprendizagem em História, contudo, não pode ser considerada o
único instrumento de avaliação possível. É necessário pensar os limites da aplicação
das provas e identificar os cuidados necessários no processo de elaboração,
correção e utilização de seus resultados (FONSECA, 2014).

A avaliação em história no ensino fundamental 119


T8

Ademais, há variadas formas de avaliação e de registro de desempenho escolar,


procedimentos que tornam possível não só identificar capacidades, mas também
reconhecer habilidades e compreender as aprendizagens dos alunos, tais como:
observação, atividades em grupo, confecção de murais, exposições, debates,
teatros, entrevistas, relatórios, portfólios, excursões, autoavaliação etc., os quais
possibilitam diferentes modos de intervenção. Os instrumentos de avaliação
diversificados permitem diagnosticar no processo a construção de noções,
conceitos históricos, a formação de atitudes, valores, saberes e habilidades. Deste
modo, o debate sobre a pluralidade de vozes, de fontes históricas, incorporado ao
processo de ensino e aprendizagem, também é contemplado nas ações avaliativas.
Neste particular, a avaliação diagnóstica e formativa deve favorecer sempre a
reflexão sobre as práticas pedagógicas, o repensar, o replanejar, a redefinição e
revisão de práticas educativas.

Independentemente do instrumento de avaliação escolhido, ele deve ser


coerente com as aulas dadas e com os objetivos essenciais propostos para cada
assunto significativo. Se as aulas privilegiarem o desenvolvimento de operações
e a formação do pensamento crítico, assim como a observação, a coleta e a
sistematização de dados, leituras e interpretações a partir de fontes diversificadas,
a avaliação também deverá conter essas características (NEMI; MARTINS;
ESCANHUELA, 2009).

O professor deve retornar frequentemente aos objetivos que propôs em seu


planejamento. Ademais, o instrumento de avaliação precisa apresentar uma
linguagem compatível com a dos alunos. As questões formuladas precisam ser
claras e contextualizadas. A contextualização da pergunta pode ser feita por
um texto ou por uma imagem (obra de arte, fotografia, gravura ou história em
quadrinhos), que o aluno analisará segundo a questão formulada.

A análise de fontes históricas diversas pode ser um instrumento de grande valia


na verificação da aprendizagem do aluno. Por exemplo, ao se estudar a história
dos bandeirantes paulistas, é possível discorrer sobre o projeto político de acentuar
o protagonismo paulista na formação territorial brasileira valendo-se da tradição
retratística europeia ao representar os bandeirantes (MARINS, 2007).

Deste modo, como atividade avaliativa, pode-se inserir uma obra representando o
rei Luís XIV e relacioná-la ao retrato de Domingos Jorge Velho. O aluno, ao compará-
las, deve verificar a semelhança na pose corporal e mesmo na indumentária. Uma
gravura feita por Belmonte e um texto relatando como os bandeirantes se vestiam
podem auxiliar o aluno a estabelecer um contraponto entre a representação dos
bandeirantes almejada e a situação em que se encontravam na época das entradas
e bandeiras. Assim, por meio da análise iconográfica, o aluno tem condições de
fazer uma reflexão que o leve a desconstruir a consagração dos bandeirantes
como heróis da história.

120 A avaliação em história no ensino fundamental


T8

Fonte: Hyacinthe Rigaud. Luis XIV em armadura, 1694. Fonte: Benedito Calixto. Domingos Jorge Velho, 1903.

Fonte: Gravura de bandeirantes por Belmonte.

“Os bandeirantes levavam arcabuzes, bacamartes, pistolas,


chumbo e pólvora, machados, facas, foices e cordas para
prender os índios escravizados. Apesar de representados, em
pinturas e esculturas, como homens bem vestidos, andavam
descalços, usando grandes chapéus de abas largas e gibões
de algodão acolchoados para se proteger das flechas.” (Fonte:
<http://www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo01/curar_
pobreza.html>. Acesso em: 28 jan. 15)

1. Qual a semelhança entre a imagem do rei Luís XIV e a imagem do bandeirante


Domingos Jorge Velho?

2. Os bandeirantes usavam este tipo de vestimenta representada no quadro de


Domingos Jorge Velho ou a imagem é elaborada com uma intenção definida?
Explique.

A avaliação em história no ensino fundamental 121


T8

3. Por que há a intenção de representar os bandeirantes como heróis?

A combinação de fontes históricas, como depoimentos, entrevistas e tabelas,


também pode ser utilizada para avaliar os alunos. No que se refere à temática da
Revolução Industrial, por exemplo, é possível discutir o controle dos trabalhadores
por meio do controle do tempo pelo relógio, em detrimento do tempo da
natureza dos trabalhadores rurais. Para isso, depoimentos de trabalhadores devem
ser analisados pelos estudantes, a fim de se analisar, ainda, as condições precárias
de trabalho às quais os operários ingleses eram submetidos.

Por fim, o cotejamento com uma tabela que mostra a idade média de
falecimento para diferentes grupos sociais na década de 1840 corrobora para
que o aluno constate as péssimas condições em que o operariado vivia. Veja um
exemplo de proposta de atividade:

Texto 1

[...] Na realidade não havia horas regulares: os mestres e gerentes faziam


conosco o que desejavam. Os relógios das fábricas eram constantemente
adiantados de manhã e atrasados à noite; em vez de serem instruídos
para medir o tempo, eram usados como disfarce para cobrir o engano e
a opressão. Embora isso fosse do conhecimento dos trabalhadores, todos
tinham medo de falar e o trabalhador tinha medo de usar o relógio, pois
não era incomum despedirem aqueles que ousavam saber demais a ciência
das horas.

Fonte: Adaptação de: Capítulos na vida de um garoto de fábrica de Dundee. In: THOMPSON, E. P. Costumes em comum:
estudos sobre a cultura popular tradicional. São Paulo: Cia das Letras, 1998.

Tabela 1 Idade média de falecimento para diferentes grupos sociais na década de 1840

Cidades/Grupo social Pequena nobreza rural Artífices/Comerciantes Trabalhadores


Rutlandshire 52 41 38
Truro 40 33 28
York 48 31 24
Derby 49 38 21
Leeds 44 27 19
Manchester 38 20 17
Bethnal Green 45 26 16
Liverpool 35 22 15
Fonte: <https://chacombolachas.wordpress.com/2008/09/11/condicoes-e-modos-de-vida-do-operariado-ingles-da-
primeira-revolucao-industrial-1780-1840/#sdfootnote66sym>. Acesso em: 28 jan. 2015.

122 A avaliação em história no ensino fundamental


T8

Texto 2

Nosso turno era das cinco da manhã até nove ou dez da noite; e no sábado
até as onze; e às vezes até às doze horas da noite; e nos faziam vir no
domingo para limpar as máquinas. Não havia horário permitido para o
café da manhã, e não se podia sentar para o jantar e não havia tempo
para o chá. Chegávamos à fábrica às cinco da manhã e trabalhávamos até
aproximadamente oito ou nove quando nos traziam o café da manhã, que
consistia em mingau, panquecas e cebola para dar sabor. O jantar consistia
em panquecas cortadas em quadro pedaços e organizadas em duas
pilhas. Uma tinha manteiga e outra com melado. Ao lado das panquecas
havia canecas de leite. Nós bebíamos o leite e com a panqueca na mão
voltávamos a trabalhar, sem sentar.

Fonte: Depoimento de John Birley ao jornal The Ashton Chronicle, 19 de maio de 1849. Tradução livre. Disponível em: <http://
spartacus-educational.com/IRpunishments.htm>. Acesso em: 28 fev. 2015.

1) Leia o Texto 1 e responda as questões a seguir:

a) Qual era, em média, a jornada em uma fábrica da Inglaterra na época tratada


no texto?

b) Qual o papel do relógio na vida dos trabalhadores?

2) Relacione o Texto 2 à Tabela 1.

Essa proposta de atividade com fontes históricas pode parecer complexa para
o ensino fundamental a princípio. Contudo, nada impede que o professor auxilie
os alunos na realização da atividade. Isso não significa responder as questões pelos
alunos, mas apenas esclarecer os novos desafios colocados por elas por meio
de uma leitura coletiva. Por conseguinte, a atividade será um momento em que
o aluno poderá desenvolver os conceitos e conteúdos que estiver aprendendo,
refletindo sobre as fontes e construindo interpretações.

Um instrumento de avaliação muito utilizado (e também criticado) é o


questionário. Contudo, não se deve excluir esse instrumento das práticas
pedagógicas. Há informações que são importantes para a aprendizagem futura
dos alunos e que podem ser feitas de forma mais objetiva.

A avaliação em história no ensino fundamental 123


T8

Fonte: Material cedido pela autora

O importante é não propor questões fragmentadas e desconectadas das


discussões de classe (apenas para verificar o conteúdo). É por meio das discussões
em sala de aula que o professor avalia se atingiu ou não os objetivos propostos, se
será necessário retomá-los em outros momentos.

Para o aluno, a avaliação é um momento de reflexão e de ampliação de


conhecimentos. Para o professor, ela deve ser um momento de revisão de sua
prática pedagógica, definindo se as discussões precisam ser retomadas ou não.

A análise dos resultados das avaliações deve ser observada pelos professores
de modo que este documento seja um reflexo também do seu desempenho. As
notas dos alunos, sejam bimestrais, trimestrais, semestrais ou anuais, devem ser
compostas durante todo o processo. Apenas uma avaliação no fim destes ciclos
não possibilita uma boa intervenção do professor no processo de aprendizagem no
decorrer dos anos. Em suma, é importante oferecer uma variedade de instrumentos
de avaliação para que o aluno tenha seu desenvolvimento intelectual avaliado de
diversas formas ao longo de sua formação.

ACOMPANHE NA WEB

Entrevista com o professor Cipriano Luckesi

Entrevista com o professor Cipriano Luckesi, em que ele discute questões sobre
avaliação, como avaliação tradicional e avaliação diagnóstica.

124 A avaliação em história no ensino fundamental


T8

Link para acesso: <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/cipriano-carlos-


luckesi-424733.shtml>. Acesso em: 10 junho. 2015.

Artigo da professora Marisa Noda

Artigo da professora Marisa Noda, que trata de avaliação em História.

Link para acesso: <http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/histensino/article/


view/11843/10416>. Acesso em: 10 junho. 2015.

Questões sobre o Ensino de História

O Programa Conexão Futura discutiu questões sobre o Ensino de História, entre


elas, a avaliação.

Link para acesso: <https://www.youtube.com/watch?v=7ZBA3x4TmJE>. Acesso


em: 10 junho. 2015.

Tempo: 23:35.

AGORA É A SUA VEZ

Instruções:

Agora, chegou a sua vez de exercitar seu aprendizado. A seguir, você encontrará
algumas questões de múltipla escolha e dissertativas. Leia cuidadosamente os
enunciados e atente-se para o que está sendo pedido.

Questão 1

Leia um trecho da entrevista de Cipriano Luckesi à Revista Nova Escola:

Revista Nova Escola: Como é feita, hoje, a avaliação de


aprendizagem escolar?
Cipriano Luckesi: A maioria das escolas promove exames,
que não são uma prática de avaliação. O ato de examinar é
classificatório e seletivo. A avaliação, ao contrário, diagnóstica
e inclusiva. Hoje aplicamos instrumentos de qualidade
duvidosa: corrigimos provas e contamos os pontos para
concluir se o aluno será aprovado ou reprovado. O processo
foi concebido para que alguns estudantes sejam incluídos e
outros, excluídos. Do ponto de vista político-pedagógico, é

A avaliação em história no ensino fundamental 125


T8

uma tradição antidemocrática e autoritária, porque centrada


na pessoa do professor e no sistema de ensino, não em quem
aprende.

Estabeleça um contraponto entre a avaliação tradicional e a avaliação na perspectiva


diagnóstica proposta por Luckesi.

Questão 2

A respeito das concepções sobre avaliação, é incorreto afirmar:

a) A avaliação diagnóstica tem como objetivo investigar o desempenho dos


estudantes, a fim de intervir para a melhoria dos resultados, se for necessário.

b) A perspectiva da avaliação crítica ou formativa tem como pressuposto a


utilização de instrumentos apropriados para identificar as dificuldades dos alunos
e, assim, servir para situar tanto o educador quanto o educando no processo de
ensino-aprendizagem.

c) Conceber a avaliação da aprendizagem sob a perspectiva formativa é um desafio


por causa das avaliações externas, as quais cada vez mais têm se mostrado como
mecanismos que controlam e regulam os diversos níveis de ensino.

d) Os instrumentos de “avaliação de aprendizagem” nas escolas aparecem


constantemente como mecanismos de controle e de disciplina do aluno por meio
de provas e exames que geram aprovações, reprovações, notas azuis e vermelhas
nos boletins.

e) As avaliações externas não exercem qualquer influência no cotidiano escolar e


nas práticas pedagógicas dos alunos, visto que seus resultados servem apenas para
aferir o desempenho dos estudantes, e não para conceber políticas educacionais
a fim de intervir nas escolas com baixo desempenho.

Questão 3

Embora amplamente criticada, a avaliação no ensino de História


tem valorizado muito a memorização; que pressupõe também
uma atribuição de notas e uma classificação. Encerrando aí o
processo de ensino/aprendizagem, exatamente no momento
em que deveria começar, ou pelo menos prosseguir. Para findar
esta prática tão comum é importante estabelecer algumas
mudanças na maneira de entender a avaliação, não como una,

126 A avaliação em história no ensino fundamental


T8

mas como práticas diárias, que devem estar presentes nas várias
atividades propostas pelo professor e nas várias metodologias de
ensino. (NODA, 2005, p. 149)

A partir do excerto do artigo de Noda (2005), considere as seguintes afirmações a


respeito de avaliação em História:

I. A prova ainda se constitui como um dos procedimentos mais utilizados na


verificação da aprendizagem em História; contudo, não pode ser considerada o
único instrumento de avaliação possível.

II. Numerosos instrumentos de avaliação podem ser utilizados para averiguar a


aprendizagem dos alunos, tais como: observação, atividades em grupo, confecção
de murais, exposições, debates, teatros, entrevistas, relatórios, portfólios, excursões,
autoavaliação etc.

III. Com relação aos tipos de avaliação que estão sendo utilizados no ensino de
História, é importante ter clareza de quando e como usá-los de forma coerente
com as premissas e os objetivos estabelecidos no planejamento.

Podem ser consideradas corretas:

a) Afirmativas I e II.

b) Afirmativas I e III.

c) Afirmativas II e III.

d) Todas as afirmativas.

e) Nenhuma das afirmativas.

Questão 4

Caracterize o instrumento de avaliação a seguir, discutindo suas vantagens e seus


limites:

1. Escreva sobre dois pensadores do Iluminismo.


2. Cite duas características do Mercantilismo.

Questão 5

Faça uma síntese sobre os principais momentos relacionados com as políticas de


livro didático no Brasil.

A avaliação em história no ensino fundamental 127


T8

Fonte: O Colosso de Rhodes de Cape Town a Cairo, Punch Magazine, 10 de dezembro de 1892.

Comente a charge tendo em vista o conteúdo estudado sobre o Imperialismo


europeu na África.

128 A avaliação em história no ensino fundamental


T8

FINALIZANDO

A avaliação da aprendizagem do aluno deve ser compreendida como parte da


trajetória do processo de ensino-aprendizagem. Ao contrário do que muitas vezes
é praticado nas instituições escolares, em que provas e atividades são utilizadas
com fins classificatórios e punitivos, a avaliação deve ser utilizada sob outro viés,
com o objetivo de situar tanto o professor quanto o aluno no processo escolar,
identificando os pontos fortes e fracos, os conteúdos que devem ser reforçados e
os que já foram assimilados.

As avaliações externas, como a Prova Brasil e o Enem, têm exercido grande


influência nas práticas pedagógicas e avaliativas dos professores, principalmente
no que diz respeito às propostas curriculares das escolas e aos conteúdos a serem
ensinados, visando atender às exigências dos exames.

Contudo, o professor deve tomar cuidado para não restringir seus critérios
de avaliação e suas práticas educativas em História às demandas desses sistemas
avaliativos. Trata-se de um desafio, visto que os resultados desses exames muitas
vezes estão atrelados a políticas de remuneração dos professores, entre outras
medidas e ações que incidem diretamente no cotidiano escolar.

Ao professor de História, o importante é proporcionar ao aluno, nos momentos


de avaliação, oportunidades de desenvolver os conceitos e os conteúdos
aprendidos, além de refletir sobre as fontes históricas e, a partir delas, construir
interpretações.

A avaliação em história no ensino fundamental 129


T8

130 A avaliação em história no ensino fundamental


T8

REFERÊNCIAS

BERGAMIN, Fabíola Matte. Currículo e Exame Nacional do Ensino Médio: rupturas e


permanências na conformação dos saberes históricos escolares. 2013. Dissertação
(Mestrado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP),
São Paulo, 2013.

CONEXÃO Futura 16/05/2013 - Ensino da História. Vídeo/Youtube, 2013. Disponível


em: <https://www.youtube.com/watch?v=7ZBA3x4TmJE>. Acesso em: 29 jan.
2015.

FERRARI, Márcio. Entrevista com Cipriano Carlos Luckesi. Revista Nova Escola,
Edição 191, ABRIL, 2006.

FONSECA, Selva Guimarães. Didática e prática de ensino de história: experiências,


reflexões e aprendizados. Campinas: Papirus, 2014.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem... mais uma vez. Revista ABC
EDUCATIO, n. 46, p. 28-29, junho de 2005.

MARINS, P. C. G. Nas matas com pose de reis: a representação de bandeirantes


e a tradição da retratística monárquica européia. Revista do Instituto de Estudos
Brasileiros, v. 44, p. 77-104, 2007.

NEMI, Ana; MARTINS, João C.; ESCANHUELA, Diego L. Ensino de História e


experiências. São Paulo: FTD, 2009.

NODA, Marisa. Avaliação e novas perspectivas de aprendizagem em história.


História & Ensino, Londrina, v. 11, p. 143-142, 2005.

THOMPSON, Edward. Tempo, disciplina de trabalho e capitalismo industrial. In:


_______. Costumes em comum: estudos sobre a cultura popular tradicional. São
Paulo: Companhia das Letras, 2008, p. 267-304.

GLOSSÁRIO

Enem: criado em 1998, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) tem o objetivo
de avaliar o desempenho do estudante ao fim da escolaridade básica. Podem
participar do exame alunos que estão concluindo ou que já concluíram o ensino
médio em anos anteriores. O Enem é utilizado como critério de seleção para os
estudantes que pretendem concorrer a uma bolsa no Programa Universidade

A avaliação em história no ensino fundamental 131


T8

para Todos (ProUni). Além disso, cerca de 500 universidades já usam o resultado
do exame como critério de seleção para o ingresso no ensino superior, seja
complementando ou substituindo o vestibular.

Portfólio: dossiê de informações sobre as atividades que estão sendo desenvolvidas.

Programa Educacenso: é uma radiografia detalhada do sistema educacional


brasileiro. A ferramenta permite obter dados individualizados de cada estudante,
professor, turma e escola do país, tanto das redes públicas (federal, estaduais e
municipais) quanto da rede privada. Todo o levantamento é feito pela internet.
A partir dos dados do Educacenso, é calculado o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (Ideb) e planejada a distribuição de recursos para alimentação,
transporte escolar e livros didáticos, entre outros.

Prova Brasil: a Prova Brasil e o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica


(Saeb) são avaliações para diagnóstico, em larga escala, desenvolvidas pelo Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep/MEC). Têm
o objetivo de avaliar a qualidade do ensino oferecido pelo sistema educacional
brasileiro a partir de testes padronizados e questionários socioeconômicos.

Saresp: é uma prova aplicada anualmente, desde 1996, pela Secretaria da Educação
do Estado de São Paulo (SEE/SP) para avaliar o Ensino Básico na rede estadual. Em
2007, passou a utilizar a metodologia dos exames nacionais (SAEB e Prova Brasil),
o que permitiu a comparação de resultados, os quais são utilizados para calcular o
Idesp (Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo).

132 A avaliação em história no ensino fundamental

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