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Uma framework de Design— Double Diamond

Artigo completo submetido a 29 de maio de 2022

Resumo:
Em 1972, o designer multidisciplinar Charles Eames, descrevia o Design como um plano capaz
de organizar elementos para atingir um propósito particular. Desde então, a prática do design tem sido
vista como uma solução para problemas. Eames não descarta o design nas suas finalidades gráficas,
industriais ou até mesmo decorativas, simplesmente descreve-o como um modelo focado na solução de
um problema e por isso infinito. A infinitude do design não está na procura dos seus limites enquanto
prática, mas na sua metodologia para entender quais são os limites dos problemas. Neste artigo,
inspirado pelo historiador contemporâneo da prática do design, Cameron Tonkinwise, e o conceito de
design transacional, visa-se analisar a metodologia double diamond desenvolvida pelo UK Design
Council, em 2004, e de que forma é essencial para um design social. Ligada ao design thinking, é um
processo estrutural iterativo que procura adaptar-se aos problemas da sociedade em que as pessoas são
o seu motor de desenvolvimento. Como tal, o double diamond, pressupõe um processo de descoberta,
definição, testagem e implementação de modo a explorar o problema de forma profunda.

Palavras-chave: design thinking, design transacional, double diamond.

Introdução
O presente trabalho aponta para a análise do design, bem como o entendimento
das suas metodologias projetuais para a solução de problemas perante um briefing. Para
esse efeito, foram feitas revisões bibliográficas de historiadores como Cameron
Tinkinwise e a sua visão sobre o design em transição, assim como o entendimento dos
primórdios do design thinking, o seu apogeu e a sua disseminação enquanto prática.
No particular, destaca-se a framework double diamond, metodologia
implementada, em 2004, pelo UK Design Council, visando entender a sua prática e
etapas, refletindo sobre a sua relevância na atuação de um design voltado para a
sociedade.
Assim, objetiva-se uma compreensão do design enquanto ferramenta capaz de
solucionar problemas complexos existentes na sociedade contemporânea através das
metodologias apresentadas.
1. Design Thinking: contextualização e prática
O design thinking é uma abordagem de pensamento criativo, uma ferramenta
auxiliar cujo o seu objetivo é resolver problemas complexos relacionados ao mundo real
incentivando o pensamento. Apesar do seu conceito ter-se tornado mainstream, em
1991, após a agência IDEO desenvolver a sua própria terminologia, etapas e
ferramentas deste processo, o design thinking tem vindo a ser explorado enquanto
prática desde a década de 1960.
Os anos de 1960 foram anunciados por Buckminster Fuller, como ‘’a década do
design científico’’. Em 1962, após a realização da conferência ‘’Design Methods’’
(Oxford: Pergamon, 1963) em Londres, o design lançou-se como metodologia e/ou
campo de investigação. Os pensadores da época, visavam projetar o design como uma
ciência e procuraram basear a sua prática, assim como os seus artefactos, na
objetividade e racionalidade. Esta necessidade (de agregar o design a uma área
científica) emergiu após avanços científicos e computacionais da época, bem como aos
problemas causados pela Segunda Guerra Mundial. Fuller considerava que o desgaste
humano e ambiental proveniente da guerra não poderia ser resolvido através da política
e economia, sendo apenas solucionado com base no racionalismo e tecnologia.
Sincronizados com os ideais de Fuller e a perspetiva científica do design, outros
teóricos, como Herbert Simon, apelaram para que esta metodologia fosse desenvolvida
nas universidades como uma doutrina empírica, de um corpo intelectual duro e
analítico.
A constante preocupação por tomar decisões lógicas com um planeamento
estratégico, associadas à prática do design, evoluiu rapidamente noutras abordagens,
que se assemelham à prática atual do design thinking. O contributo desta prática, para
alcançar um fluxo orgânico de experiências em situações concretas, tornou as
experiências mais inteligentes, significativas, e satisfatórias.
No ano de 1973, Horst Rittel e Melvin Webber introduziram o termo ‘’wicked
problem’’ para alertar sobre as complexidades e desafios do design na abordagem de
problemas sociais. ‘’Wicked problem’’ nada mais é, que um termo característico a
problemas multidimensionais e complexos, tais como saúde e educação, que requerem
soluções iterativas, cujas soluções de bases científicas estão sujeitas a restrições do
mundo real.
Atualmente, o design thinking centra-se na sua metodologia iterativa inspirada
pelas ferramentas projetuais difundidas pela agência IDEO. A ideia consistiu em criar
algo funcional e eficaz, a partir de um olhar holístico, que englobasse o todo, de modo a
entregar um vasto conjunto de possibilidades para superar os dilemas relativos à
condição humana como o conformismo, o status quo, a vulnerabilidade, entre outros,
são necessários valores fortes, interiorizados pelos envolvidos.
Assim, a abordagem do design thinking estrutura-se em três fundamentos para
que, de facto, possa ser exercida corretamente de modo a trazer bons resultados:
—A Empatia: ‘’Forma de identificação intelectual ou afetiva de um sujeito com
uma pessoa, uma ideia ou uma coisa’’[1]. Afinal, as pessoas escrevem a sua própria
história, porém conforme as circunstâncias que vivem. Só ao sermos empáticos é que
conseguimos analisar as suas necessidades, desejos e limitações para trabalhar a
metodologia do design thinking;
—A Colaboração: ‘’ação de colaborar com alguém; trabalho em conjunto;
cooperação; participação; ajuda; auxílio’’[2]. A colaboração é indispensável, a melhor
ideia não parte de alguém mas de vários insights que trabalham para o mesmo;
—Por fim, a Experimentação: ‘’ato ou efeito de experimentar; método científico
que consiste em provocar observações, em condições especiais, para verificar uma
hipótese’’[3]. No design thinking o ato de experimentar permite a descoberta de novas
formas soluções para erros que vão sendo identificados e consertados.

A prática do Design Thinking é multifuncional e, por isso, pode contribuir para


todas realidades possíveis, sendo utilizada na arte, na educação e nos negócios. Procura
a essência, o singular, o entendimento, sendo uma prática de design virtuosa com
inovação e aprendizagem.

2. Design em transição: futuros mais sustentáveis


O termo ‘Transition Design’, traduzido por ‘Design em Transição’, exposto por
Tonkinwise, fez parte de uma tentativa de mudar a prática de design, de modo a
conceder a mudança social num rumo a futuros mais sustentáveis:

O Design em Transição é uma tentativa de nomear uma ambição por uma arte
especializada de design que reconheça a extensão das nossas crises sociais, promovendo as
práticas de design social e sustentável por meio da incorporação de uma transformação
orientada para a prática em vários estágios. (Tonkinwise, Cameron. 2014. Design for
Transition - From and to What?)

Esculpir o material tornou-se a arte e a ciência da interface entre a produção em


massa e o seu consumo excessivo. Porventura, meio século depois de antecipado, as
economias desenvolvidas são, até ao presente, pós-industriais. O Design em Transição
presume que os modos de vida dominantes contemporâneos não são sustentáveis, assim
como as necessidades de consumo global que atrapalham o ecossistema resultando em
desigualdade que exclui muitas pessoas e até mesmo diminui a forma como vivemos.
Também parte do argumento de que todas as tensões sociais estão interligadas; nenhuma
iminência desses problemas podem ser resolvidos à parte dos outras, deste modo, o
Design em Transição é instigado pela convicção de que o comum das iniciativas atuais
direcionadas para essas questões são ocas ou mal orientadas.

​O design é tanto o produto quanto o produtor do modernismo. Moldar as coisas


materiais tornou-se a arte e a ciência da interface entre a produção em massa e o consumo em
massa. No entanto, talvez meio século depois de serem previstas, as economias desenvolvidas
são agora pós-industriais. Setores de serviços, economias de informação e plataformas digitais
dominam os novos negócios.(Tonkinwise, 2015)

A transformação social irá derivar da nossa capacidade de alterar as ideias sobre


mudança em si— como se manifesta e como pode ser catalisada e direcionada.
Fundamentar a mudança é a chave para Design de Transição por três motivos:
primeiramente, a teoria de mudança está sempre presente num curso de comportamentos
planeados, quer sejam explícitos ou não. Em segundo lugar, a passagem para futuros
sustentáveis requer uma mudança definitiva na sociedade. Por fim, as nossas ideias
usuais e aparentemente intuitivas sobre mudança, estão na raiz de muitos wicked
problems (Irwin et al, 2015b).

Qualquer curso de ação (de design) é projetado em ideais de mudança: é gerada


uma tese sobre o caráter da mudança, e é elaborada uma dedução sobre o tratamento
claro para a resolução (dessa mudança), em conformidade com o resultado pressuposto.
Desta forma, desejar um futuro sustentável através de teorias de mudança dentro da
framework de design de transição são sugestões que conjugam conhecimentos em
constante evolução, desafiando os designers a tornarem-se alunos que olham para fora
das disciplinas do design, para ganharem novos conhecimentos (Irwin, 2015).

3. Double diamond
Double diamond é uma metodologia projetual de design instituída em 2004 pelo
British Design Council, uma organização do Reino Unido que desenvolve programas e
pesquisas que contêm design governamental e inovação social e empresarial. No âmago
do Design Council está o double diamond e a sua exploração centrada no questionar e
nas oportunidades de progresso, de modo a existir uma ação direcionada ao problema.
Na prática, esta framework de design (o double diamond) é uma abordagem de
design thinking. É um processo que visa entregar ao utilizador uma possível solução que
se suprima as suas necessidades, com base num processo iterativo de uma extensa
revisão e especulação para solucionar adversidades, sendo útil para problemas ou para
melhorar o que já existe.

Figura 1. The Double Diamond developed by Design Council to illustrate the design process. Fonte:
https://www.researchgate.net/figure/The-Double-Diamond-developed-by-Design-Council-to-illustrate-the
-design-process_fig1_338537948

Assim, esta metodologia auxilia, principalmente UX Designers, a encontrarem


soluções criativas, perduráveis e mais consistentes com os seus projetos. Para a prática
deste processo existem quatro fases que devem ser trabalhadas: a descoberta, definição,
desenvolvimento e entrega.
A primeira parte do modelo double diamond consiste na aprendizagem sobre as
diversas variáveis que afetam um problema e suas possíveis soluções (a descoberta).
Nesta etapa, o objetivo é identificar o estado de um problema ou uma oportunidade real,
assim as tarefas comuns neste estágio incluem a pesquisa de mercado e a análise do
perfil do utilizador (no contexto de UX Designers) focando-se nas necessidades e
comportamentos do mesmo.
Este kick-off é indispensável para a criação de soluções duradouras para o mundo
real. A empresa Starbucks fornece um bom exemplo: os designers contratados passam
por um estágio de um mês com baristas numa das lojas da empresa. Deste modo, existe
uma colaboração multissetorial que permite o designer ter um conhecimento prévio do
cliente antes de projetar qualquer produto. (USER EXPERIENCE, 2018)
Ainda dentro do primeiro diamante, o segundo percurso denomina-se como
‘’definição’’. Nesta fase projetual, os designers consideram os vários componentes de
um projeto, de modo a garantir que todos entendam o contexto do projeto (interno e
externo), neste estágio são definidos os recursos, os materiais e as condições financeiras
do cliente antes de projetar qualquer coisa. Assim, o processo de filtragem, de todas as
informações descobertas anteriormente, é indispensável.
O percurso projetual do primeiro diamante termina quando as suposições são
priorizadas para as verdadeiras necessidades do cliente. É nesta fase que se desenvolve a
construção de personas, a entrevista com utilizadores e toda a pesquisa de campo para
que então todo o processo de design se inicie.
Contudo, será indispensável referir que o processo em si nunca termina pois, a
vantagem do double diamond é a sua atuação iterativa na procura de soluções ou
melhorias de uma implementação já existente, é sempre possível voltar aos passos
anteriores e circunscrever para as necessidades do momento.
Doravante do problema específico em mãos, o desenvolvimento (terceira etapa
do double diamond; primeira fase do segundo diamante) explora sugestões de soluções
para a problemática em questão, semelhante à primeira fase do primeiro diamante, mas
numa perspectiva de design, pois o trabalho de campo já foi desenvolvimento, aqui
floresce a criatividade. Os designers juntam-se a parceiros internos, tais como
engenheiros, programadores ou outros departamentos que tenham a perícia necessária
no projeto, todos os intervenientes visam o mesmo resultado: pôr a ferramenta de
prototipagem a bom uso e levar a solução a bom termo. Ao ter diferentes áreas a
participar no processo de desenvolvimento, assegura-se que são necessários menos
protótipos e que são descobertos menos problemas com os testes.
Por fim, na fase de entrega é onde se inicia a implementação do projeto. Nesta
etapa iniciam-se protótipos de baixa e média fidelidade de modo a perceber questões de
usabilidade e de que modo as soluções propostas se adequam ou não ao briefing
lançado. Como referido anteriormente, é importante ter em mente que este processo não
termina efetivamente apesar de ser a sua última etapa, caso as soluções não se adequam
o projeto volta ao seu início e novas pesquisas de campo são feitas.

Conclusão
A emergência do pensamento do design no século XX é importante neste
contexto. O significado de procurar uma base científica para o design não reside na
probabilidade de reduzir esta disciplina a mais uma ou outra das ciências. Pelo
contrário, reside na preocupação de ligar e integrar conhecimentos úteis tanto das artes
como das ciências, mas de forma adequada aos problemas e objectivos do presente.
(Tonkinwise, Cameron. 2014. Design for Transition - From and to What?)
Cada vez mais, os designers exploram interações de conhecimento que
combinam a teoria com prática para novos propósitos de produção, e esta é a razão pela
qual o design tem sido pensado em volta da cultura tecnológica.
Através do design thinking pode-se construir novos sistemas, processos,
paradigmas organizacionais, empresas, políticas e até mesmo campanhas comunitárias
para um design social. O design thinking, enquanto inovador para futuros sustentáveis,
sustenta-se num processo divergente de soluções alternativas antes de agir sobre uma
(alternativa), em comparação às abordagens de otimização tradicionais que selecionam
a solução ideal entre as opções disponíveis.
O processo de design thinking pode ser aplicado a quase todos os problemas para
transformar pessoas, organizações e sistemas. À sua prática associam-se, cada vez mais,
novas frameworks de design, como por exemplo, o double diamond de modo a tornar o
seu processo mais eficaz, construindo metodologias eficazes para a complexidade do
mundo combatendo os ‘’wicked problem’’ apresentados por Horst Rittel e Melvin
Webber.
Depreende-se assim, que metodologias como design thinking, design em
transição e double diamond vieram para ficar e se adaptarem às mudanças. O caráter
iterativo, presente nestes processos, é a chave para o design combater as problemáticas
do dia-a-dia com soluções, que são projetadas para melhorar o mundo.
Referências
[1] "Empatia", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha],
2008-2021, https://dicionario.priberam.org/empatia [consultado em 28-05-2022].
[2] "Colaboração", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha],
2008-2021, https://dicionario.priberam.org/colabora%C3%A7%C3%A3o [consultado
em 28-05-2022].
[3] "Experimentação", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha],
2008-2021, https://dicionario.priberam.org/experimenta%C3%A7%C3%A3o
[consultado em 28-05-2022].
Design Council UK, Burns, C., Cottam, H., Vanstone, C., & Winhall, J. (2016).
RED Paper 02: Transformation Design. Retrieved from
https://www.designcouncil.org.uk/sites/default/files/asset/document/red-paper-transform
ation-design.pdf
USER EXPERIENCE (2018). The Double Diamond model: what is it and
should you use it? Retrieved from
https://www.justinmind.com/blog/double-diamond-model-what-is-should-you-use/
Irwin, T., Tonkinwise, C., and Kossoff, G. (2015a). Transition Design : An
Educational Framework for Advancing the Study and Design of Sustainable Tran-
sitions. 6th International Sustainability Transitions (IST) Conference, pages 1–36.
Irwin, T., Kossoff, G. and Tonkinwise, C. (2015b). Tran- sition Design
Provocation, Design Philosophy Papers, 13:1, 3-11, DOI:
10.1080/14487136.2015.1085688
Tonkinwise, C. (2015). Design for Transitions‒from and to what? Design
Philosophy Papers, 13(1), 85–92. https://doi.org/10.1080/14487136.2015.1085686

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