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As teorias políticas contratualistas Segundo Hobbes, nas sociedades primitivas “o homem era o lobo do

próprio homem”, vivendo em constantes guerras e matanças, cada qual


Thomas Hobbes (Filósofo inglês; 1588-1679) procurando garantir sua própria sobrevivência. Só havia uma solução para
dar fim à brutalidade: entregar o poder a um só homem, que seria o rei, para
Hobbes é um daqueles filósofos contratualistas que, ao longo dos séculos
que ele governasse todos os demais, eliminando a desordem e dando
XVII e XVIII, postularam que o Estado político é fruto de uma convenção segurança a todos.
entre os homens; antes dessa espécie de acordo vive-se num estado de
natureza; a passagem de uma instância à outra é conhecida como contrato John Locke (Filósofo inglês; 1632-1704)
ou pacto social. Considerado por muitos como o “Pai do Iluminismo”. Sua principal obra é
No modelo hobbesiano o estado de natureza se configura como uma o Ensaio sobre o entendimento humano, em que afirma que nossa mente
condição onde os indivíduos se encontram em guerra uns contra os outros. é uma tabula rasa, sem nenhuma ideia. Tudo o que adquirimos é devido à
Cada qual está livre para fazer o que bem entender. Não há governo: vive-se experiência. Para ele, nossas primeiras ideias vêm à mente através dos
numa anarquia completa. A vida humana nesse quadro natural é sentidos. Depois, combinando e associando as primeiras ideias simples, a
desconfortável. Miséria, violência, expectativa de existência breve e medo mente forma ideias cada vez mais complexas. Em resumo, todo o
recíproco são algumas das perturbações que atingem o homem pré-civil. conhecimento humano chega à nossa mente através dos sentidos e, depois,
Para resolver a problemática da guerra os homens pactuam entre si uma desenvolve-se pelo esforço da razão. Em termos políticos, Locke condenou
sociedade civil, ou seja, uma instância onde podem viver em paz uns com os o absolutismo monárquico, revelando sua grande preocupação em proteger
outros. Para garantir o objeto do contrato, o Estado se apresenta como uma a liberdade individual do cidadão. Para ele, o consentimento dos homens ao
força soberana e absoluta sobre a vontade dos indivíduos (súditos), que aceitarem o poder do corpo político instituído não retira seu direito de
enquanto tais estão livres apenas naquilo e tão somente naquilo que a lei insurreição, caso haja necessidade de limitar o poder do governante. Além
estatal, ou lei civil, permitir como liberdade. disso, o Parlamento se fortalece enquanto legítimo canal de representação
Diante disso, pode se indagar, o Estado postulado por Hobbes não é por da sociedade, e deve ter força suficiente para controlar os excessos do
excelência o lugar do autoritarismo? A quem diga que sim. Entretanto, é Executivo.
necessário observarmos que o propósito do contrato social é gerar uma Rousseau vai mais longe ainda, atribuindo a soberania ao ““povo
condição onde se possa viver em paz. incorporado”, isto é ao povo enquanto corpo coletivo, capaz de decidir o que
Na concepção de Hobbes (no século XVII), em estado de natureza, os é melhor para o todo social. Com isso desenvolve a concepção radical da
indivíduos vivem isolados e em luta permanente, vigorando a guerra de democracia direta, em que o cidadão é ativo, participante, fazendo ele
todos contra todos ou “o homem lobo do homem”. Nesse estado, reina o próprio as leis nas assembleias públicas.
medo e, principalmente, o grande medo: o da morte violenta. Para se
protegerem uns dos outros, os humanos inventaram as armas e cercaram as
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778)
terras que ocupavam. Essas duas atitudes são inúteis, pois sempre haverá
Nasceu em Genebra na Suíça, transferindo-se para a França em 1742,
alguém mais forte que vencerá o mais fraco e ocupará as terras cercadas. A
onde escreveu suas grandes obras. Entre elas podemos destacar O contrato
vida não tem garantias; a posse não tem reconhecimento e, portanto, não
social, na qual expôs a tese de que o soberano deveria conduzir o Estado
existe; a única lei é a força do mais forte, que pode tudo quanto tenha força
segundo a vontade geral de seu povo, sempre tendo em vista o atendimento
para conquistar e conservar.
do bem comum. Somente esse Estado, de bases democráticas, teria
Hobbes, advertindo que o homem natural vive em guerra com seus
condições de oferecer a todos os cidadãos um regime de igualdade jurídica.
semelhantes, conclui que a única maneira de garantir a paz consiste na
Em outra de suas importantes obras, o Discurso sobre a origem da
delegação de um poder absoluto ao soberano. Hobbes escreveu o livro
desigualdade entre os homens, Rousseau glorificou os valores da vida
Leviatã (o título refere-se ao monstro bíblico, citado no livro de Jó, que
natural e atacou a corrupção, a avareza e os vícios da sociedade civilizada.
governava o caos primitivo), no qual compara o Estado a um monstro todo-
Fez inúmeros elogios à liberdade que desfrutava o selvagem, na pureza do
poderoso, especialmente criado para acabar com a anarquia da sociedade
seu estado natural, contrapondo-se à falsidade e ao artificialismo do homem
primitiva.
civilizado. Rousseau tornou-se célebre como defensor da pequena Quem é o soberano? Hobbes e Rousseau diferem na resposta a essa
burguesia e inspirador dos ideais que estiveram presentes na Revolução pergunta. Para Hobbes, o soberano pode ser um rei, um grupo de
Francesa. Rousseau, na verdade, antecipa algumas das críticas que no aristocratas ou uma assembleia democrática. O fundamental não é o número
século seguinte os socialistas farão ao liberalismo. Denuncia a propriedade dos governantes, mas a determinação de quem possui o poder ou a
como uma das causas da origem da desigualdade e, ao desenvolver os soberania. Esta pertence de modo absoluto ao Estado, que, por meio das
conceitos de vontade geral e cidadania ativa, rejeita o elitismo da tradição instituições públicas, tem o poder para promulgar e aplicar as leis, definir e
burguesa do seu tempo. Além disso, as teorias contratualistas se baseiam garantir a propriedade privada e exigir obediência incondicional dos
em uma concepção individualista da sociedade, o que é típico do governados, desde que respeite dois direitos naturais intransferíveis: o
pensamento liberal. A sociedade é compreendida como a somatória dos direito à vida e à paz, pois foi por eles que o soberano foi criado. O soberano
indivíduos, e o Estado tem por fim garantir que os interesses particulares detém a espada e a lei; os governados, a vida e a propriedade dos bens.
possam coexistir em harmonia. Esta concepção será criticada pelas teorias Para Rousseau, o soberano é o povo, entendido como vontade geral,
socialistas. pessoa moral, coletiva, livre e corpo político de cidadãos. Os indivíduos, pelo
Apesar das diferenças, o que existe em comum nas teorias contrato, criaram-se a si mesmos como povo e é a este que transferem os
contratualistas é a ênfase no caráter racional e laico (não religioso) da direitos naturais para que sejam transformados em direitos civis. Assim
origem do poder. É o próprio homem que dá o consentimento para a sendo, o governante não é o soberano, mas o representante da soberania
instauração do poder, reafirmando assim o valor absoluto do indivíduo e do popular. Os indivíduos aceitam perder a liberdade civil: aceitam perder a
cidadão. posse natural para ganhar a individualidade civil, isto é, a cidadania.
Na concepção de Rousseau (no século XVIII), em estado de natureza, Enquanto criam a soberania e nela se fazem representar, são cidadãos.
os indivíduos vivem isolados pelas florestas, sobrevivendo com o que a Enquanto se submetem às leis e à autoridade do governante que os
Natureza lhes dá, desconhecendo lutas e comunicando-se pelo gesto, pelo representa chamam-se súditos. São, pois, cidadãos do Estado e súditos das
grito e pelo canto, numa língua generosa e benevolente. Esse estado de leis.
felicidade original, no qual os humanos existem sob a forma do bom
selvagem inocente, termina quando alguém cerca um terreno e diz: “É meu”. A origem da desigualdade
A divisão entre o meu e o teu, isto é, a propriedade privada, dá origem ao A concepção política de Rousseau estabelece uma trajetória de evolução da
estado de sociedade, que corresponde, agora, ao estado de natureza organização social que difere de outros pensadores. Assim como Hobbes,
hobbesiano da guerra de todos contra todos. Rousseau constrói uma hipótese de estado de natureza e estado civil, mas
O estado de natureza de Hobbes e o estado de sociedade de considera o "estado de guerra" hobbesiano presente na sociedade civil. O
Rousseau evidenciam uma percepção do social como luta entre fracos e estado de natureza é apresentado como um momento de ampla felicidade
fortes, vigorando a lei da selva ou o poder da força. Para fazer cessar esse humana, onde os seres humanos não tinham a necessidade de se relacionarem
estado de vida ameaçador e ameaçado, os humanos decidem passar à e não havia desigualdade. Este modo de vida, hipoteticamente construído para
sociedade civil, isto é, ao Estado Civil, criando o poder político e as leis. justificar sua proposta de República, teria sido destruído com a instituição da
A passagem do estado de natureza à sociedade civil se dá por meio de propriedade privada e das leis. É na sociedade das instituições civis que reside a
um contrato social, pelo qual os indivíduos renunciam à liberdade natural e à crítica de Rousseau e o fundamento de sua teoria política. Entretanto, se com a
razão o ser humano construiu uma civilização corrompida, é com a capacidade
posse natural de bens, riquezas e armas e concordam em transferir a um
racional que a humanidade deverá encontrar suas soluções.
terceiro – o soberano – o poder para criar e aplicar as leis, tornando-se
Diante da constatação de que "o verdadeiro fundador da sociedade foi o
autoridade política. O contrato social funda a soberania. primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer ‘isto é meu’ e
Para Hobbes, os homens reunidos numa multidão de indivíduos, pelo encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo", Rousseau
pacto, passam a constituir um corpo político, uma pessoa artificial criada encontra na desigualdade humana o principal problema da organização política.
pela ação humana e que se chama Estado. Para Rousseau, os indivíduos
naturais são pessoas morais, que, pelo pacto, criam a vontade geral como
corpo moral coletivo ou Estado.

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