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TEORIA GERAL DA RELAÇÃO JURÍDICA

1.º teste de avaliação contínua – 3 de abril de 2023

Advertências:
As perguntas devem ser lidas cuidadosamente e as respostas devem ser concisas, objetivas e
devidamente justificadas, sempre que possível com recurso à lei. A ordem de resposta às
perguntas pode ser alterada, desde que as respostas identifiquem claramente a questão a que se
referem. É permitida a consulta de quaisquer diplomas legais.

O tempo disponível é de 30m.

Cotação das perguntas: I – 3,5 v.; II – 4,5 v.; III – 12 v.

I.
«O contrato de mútuo é um contrato unilateral e é sempre gratuito».
Atendendo ao que estudou sobre a classificação dos negócios jurídicos, indique se concorda com
esta afirmação.

Contratos unilaterais são aqueles dos quais apenas resultam obrigações para um dos
contraentes. [0,5]
Do contrato de mútuo só decorrem obrigações para o mutuário (restituir a quantia mutuada e,
se o mútuo for oneroso, pagar os juros a que haja lugar), pelo que o contrato de mútuo é um
contrato unilateral (art. 1142.º) [0,75 v.].
Contratos gratuitos são aqueles em que existe um sacrifício patrimonial apenas para uma das
partes, o que significa que há uma unilateralidade da atribuição patrimonial, i.e., só são gerados
sacrifícios patrimoniais para uma das partes [0,5 v.].
Ora, o contrato de mútuo pode implicar somente um sacrifício patrimonial para uma das partes
(mutuante que fica privado do uso da coisa mutuada), caso em que é gratuito. [0,75]
Contudo, se, no contrato de mútuo, houver lugar ao pagamento de juros, verificamos que
existem sacrifícios patrimoniais para ambas as partes – mútuo oneroso: o mutuário tem
obrigação de pagar os juros e o mutuante fica privado da coisa mutuada pelo tempo do mútuo.
[1]

II.
Alberto e Bento celebraram por escritura pública um contrato de compra e venda de um prédio do
séc. XIX, tendo ficado a constar da escritura que o imóvel era transacionado devoluto de pessoas
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e bens (i.e., desocupado e não incluindo o respetivo recheio).
Dois dias depois da outorga da escritura pública, Bento, comprador, encontrou Alberto num
restaurante e manifestou a este último interesse em comprar alguns quadros pertencentes a
Alberto, tendo Bento indicado estar disposto a pagar por eles 7.500€.
Alberto, que não tinha onde pendurar os quadros, de imediato comunicou a Bento aceder à
pretensão deste (aceitando o preço indicado) e redigiram um acordo escrito assinado por ambos
num papel que pediram a um funcionário do restaurante.
Identifique a forma da declaração negocial dos negócios celebrados entre Alberto e Bento.

Compra e venda de prédio – escritura pública –– 875.º - forma legal (art. 221.º) - a lei exige
forma para estas declarações negociais/negócio jurídico (compra e venda de imóvel) sob pena
de nulidade do negócio (art. 220.º) [2,25]

Compra dos quadros – forma voluntária – art. 222.º - a lei não exige forma para declaração
(219.º), mas declarantes adotam essa forma – documento particular – 363.º, n.º 1 e 2, 2.ª parte
[2,25]
[nota: serão consideradas as respostas em que os alunos indiquem estar em causa uma forma
convencional]

III.
António, artista plástico, expôs na sua galeria dez novas obras com o tema “Primavera”.
Bernardo, apreciador de obras de arte, visitou a galeria e referiu a António ter achado a peça
intitulada “Andorinha” muito bonita, acrescentando que gostaria de saber qual o preço e
condições de venda da mesma.
No dia 27 de março, António enviou uma carta a Bernardo com o seguinte teor: “Caro Bernardo,
vendo-lhe a escultura intitulada «Andorinha» pelo preço de 800€, a pronto pagamento. Aguardo
uma resposta até ao dia 31 de março”. A carta foi depositada na caixa de correio de Bernardo no
dia 28 de março.
Imagine as seguintes hipóteses, com independência entre si, e diga se ficou concluído algum
contrato, qualificando os vários momentos da negociação:
a) Bernardo respondeu, no próprio dia 28 de março, por email, referindo: “Caro António, fico
contente por me vender a escultura e desejo comprá-la. Todavia, só aceito pagar o preço indicado
caso possa fazê-lo em quatro prestações mensais de 200€”.
b) Bernardo respondeu, por carta enviada a 29 de março e depositada na caixa de correio de
António a 30 de março, aceitando comprar a escultura nas condições indicadas por António.
Todavia, António, muito ocupado com a preparação da coleção “Verão”, só foi levantar a sua
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correspondência no dia 3 de abril, tomando, nesse momento, conhecimento da carta de Bernardo.

Tópicos:

a) A conclusão do contrato pressupõe uma proposta eficaz e uma aceitação igualmente


eficaz, espelhando um mútuo acordo entre as partes (0,25).

A exposição das peças na galeria e a abordagem inicial de Bernardo consubstanciam


convites a contratar, uma vez que sinalizam o interesse de ambos em encetar
negociações, mas não são suficientemente firmes (nem precisas). Quem dirige a outrem
um convite a contratar pretende reservar-se a última palavra, ou seja, o direito de
aceitar uma proposta que lhe seja dirigida (0,75).

A carta de António, enviada no dia 27 de março, é já uma verdadeira proposta


contratual, ao manifestar uma vontade firme (vontade de vinculação jurídica através de
certo contrato) e precisa (formulada de tal forma que basta um simples “sim” para o
contrato ficar concluído) de contratar (2).
A proposta é uma declaração recetícia / recipienda (tem um destinatário determinado,
tornando-se eficaz nos termos do art. 224.º, n.º 1, 1.ª parte (0,25). A carta de António foi
depositada na caixa de correio de Bernardo no dia 28/3: enquanto momento a partir do
qual o conhecimento da declaração negocial se tornou possível (em condições normais),
por a declaração ter entrado na esfera de poder do declaratário, a chegada ao poder
determinou a eficácia da proposta (0,25).

Uma vez eficaz, e por esse ser o prazo fixado pelo proponente, a proposta vincula-o até
ao dia 31 de março: al. a) do n.º 1 do art. 228.º (0,5)

***
A aceitação tem de ser pura e simples. Contendo, como é o caso da resposta de
Bernardo, “aditamentos, limitações ou outras modificações”, importa a rejeição da
proposta (1): art. 233.º (1). Sendo a modificação suficientemente precisa, pode equivaler
a nova proposta. Nesse caso, há inversão de papéis e o proponente originário passa a
ocupar o papel de destinatário da (contra)proposta (1,5).

O contrato ainda não se concluiu. (1)

b) A missiva de Bernardo consubstancia uma aceitação, declaração negocial recetícia que


se tornou eficaz no momento em que foi depositada na caixa de correio de António, a 30
de março, nos termos do art. 224.º, n.º 1, 1.ª parte (1).

A aceitação foi tempestiva., tendo em conta o prazo assinalado pelo proponente. (0,5)

Há um contrato concluído (1). O momento da conclusão do contrato coincide com o


momento da eficácia da aceitação: o contrato ficou concluído nesse mesmo dia 30 de
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março, sendo irrelevante que António só tenha conhecido o conteúdo da carta mais tarde
(1).

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