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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

FACULDADE DE DIREITO E CIÊNCIAS DO ESTADO

1ª Prova Discursiva

Tópicos em Direito Econômico - Mercados Digitais

Caio Esteves Medeiros

Belo Horizonte
2022
1) Duas reportagens recentes (disponíveis no Teams – junto com esta prova) da Folha de
S. Paulo dão conta do seguinte, a respeito do Google: “Se fosse um país, Google seria 2º
em receita publicitária” (FSP, 6. set. 2019) e “Busca do Google passa a priorizar furos
jornalísticos” (FSP, 13 de set. 2019). Segundo a primeira reportagem, “apesar das
muitas atividades em que se engaja hoje a holding Alphabet, a maior parte de sua
receita ainda decorre do Google e de seus negócios de publicidade, que fizeram dele a
maior empresa de venda de anúncios do mundo”. E a segunda reportagem salienta o
seguinte: “A mudança é uma forma de tentar garantir que a receita de anunciantes seja
direcionada às companhias que investiram no trabalho de reportagem. A medida
também é um aceno às empresas de mídia que há anos demandam do Google repasse
pela verba que ele obtém a partir do conteúdo de terceiros indexado no seu site”.
Pergunta: A partir das reportagens e dos textos estudados em sala, explique os
principais elementos econômicos do mercado de plataformas (múltiplos lados) e analise
as razões pelas quais o Google anuncia uma alteração no seu algoritmo de buscas em
relação às empresas de mídia. – Questão 15 pontos

Dentre os principais elementos econômicos do mercado de plataformas digitais estão:


o cenário único, gerado por essa nova era da 3ª Revolução Industrial que possibilitou diversas
transformações tecnológicas com o advento da internet; retornos de escala significativos,
devido ao grande alcance do mercado e da redução dos custos de transação; as economias de
escopo, que permitem que a mesma empresa produza variados produtos ou serviços digitais,
de forma a diversificar o seu mercado; os efeitos de rede, que estão relacionados a essa
interligação dos diversos produtos digitais que as grandes plataformas possuem, que
possibilitam uma redução da assimetria da informação, uma conexão entre dados e uma
redução de custos para as empresas; os custos marginais e de distribuição baixos, tendo em
vista que se tratam de bens digitais, cujos custos de produção não são tão altos quanto no
mercado físico, prevalecendo a lógica da programação e da inteligência artificial, onde são
empregados os maiores gastos; alcance global, tendo em vista que a internet e os meios
digitais abarcam hoje bilhões de pessoas por todo o mundo; e a competição no mercado e
pelo mercado; visto que, devido ao crescimento das grandes plataformas, a competição
atualmente não se dá apenas no mercado, mas, também, pelo mercado, já que há uma disputa
grande por espaços em quaisquer dos mercados digitais em decorrência dos efeitos das
economias de escopo, o que gera, por parte das grandes plataformas, a compra de plataformas
menores com potencial de crescimento que prestem serviços digitais similares aos das outras
grandes plataformas.
A alteração no algoritmo do Google ocorre devido ao interesse da empresa em
concentrar ainda mais o mercado de publicidade digital. Segundo pesquisa da Emarketer, o
Google comanda cerca de 37% do mercado de anúncios digitais dos EUA. Essa sinalização
em relação às empresas de mídia busca rivalizar com outras grandes plataformas que detém
grande parte do mercado de pessoas que buscam por informação em portais de notícia nas
redes sociais, como por exemplo o Twitter ou o Facebook. Atraindo para si as notícias e
reportagens, o Google pretende abranger esse mercado de pessoas que utilizam de outras
plataformas/mídias sociais para se informarem no dia a dia, possibilitando, assim, que mais
pessoas tenham contato com as publicidades digitais vinculadas ao Google, através dessas
empresas de mídia.

2) A reportagem do Valor Econômico de 11. set. 2019 (disponível no Teams – junto com
esta prova) dá conta de que o recente movimento da Amazon aqui no Brasil – com o
lançamento do Amazon Prime – fez os concorrentes do varejo on-line perderam R$ 4,75
bilhões. Em um dado momento na reportagem há a seguinte passagem: “A Amazon não
detalha a sua estratégia de distribuição. Além disso, o grupo tem capital mais que
necessário para subsidiar sua operação por aqui” e mais adiante: “A Amazon tem
ressaltado que sua estratégia é de longo prazo e o crescimento é reflexo de oferecer ‘o
que o cliente quer sem pressa’ e com alto nível de serviço”. Pergunta: Levando em
consideração a reportagem e mais especificamente o artigo de Lina Khan – Amazon’s
Antitrust Paradox – analise o modelo/estratégia da Amazon, salientando sua
i(legalidade), inovação e poder de mercado. Se entender que é necessário algum tipo de
reação à estrutura/condutas da empresa, explore se a solução seria a aplicação de regras
antitruste ou de regulação de infraestrutura. – Questão 15 pontos

Segundo Lina Khan, as evidências têm mostrado que a concorrência nos mercados de
plataforma está em declínio, estando setores se unindo em torno de um ou dois gigantes.
Nesse sentido, a Amazon, a grande plataforma do comércio eletrônico no mundo, que serve
como infraestrutura essencial para hosts de outros negócios dependentes da plataforma, vem
adotando estratégias de negócios e de domínio atual do mercado que apresentam
preocupações anticompetitivas para a estrutura de bem-estar do consumidor, tendo os
mecanismos de antitruste falhado em reconhecer.
Por representar uma grande inovação no mercado do comércio eletrônico, a Amazon
dominou-o rapidamente, de forma a exercer bastante influência e controle sobre ele. Nesse
contexto, a empresa se utiliza de vantagens competitivas em seu ramo digital, sendo uma
delas a integração entre as linhas de negócios que possibilita à plataforma controlar a
infraestrutura essencial da qual seus rivais dependem, permitindo que a Amazon explore
informações coletadas sobre empresas que usam seus serviços para prejudicá-las como
concorrentes.
Dessa forma, a empresa vem sendo investigada por usar sua influência e quantidade
de dados para se posicionar sobre pequenos varejistas, garantindo uma homogeneização do
seu poder de mercado.
Para Lina Khan, para amenizar essas preocupações anticompetitivas e ajudar a manter
a concorrência nesses mercados, deve-se substituir a estrutura de bem-estar do consumidor
com uma abordagem orientada para a preservação de um processo competitivo e de estrutura
de mercado, restaurando os princípios antitruste tradicionais a fim de criar uma presunção de
predação, bem como proibindo a integração vertical por plataformas dominantes.
No Brasil, a empresa não detém o controle do mercado como em outros países, mas
vem ganhando espaço ao longo dos anos. Dentre outras estratégias, o lançamento do pacote
de serviços do Amazon Prime, que inclui a entrega ilimitada de produtos entregues em seu
site, constitui uma inovação interessante em relação aos seus concorrentes (Magazine Luiza,
Lojas Americanas, etc.) Todavia, faz-se necessário se atentar aos limites dessas estratégias
concorrenciais, tendo em vista que, por deter um poderio financeiro muito maior que as
empresas brasileiras, a Amazon possui capital necessário para financiar estratégias de
operação no mercado brasileiro capazes de torná-la mais competitiva em relação às suas
concorrentes, o que poderia possibilitar um amplo domínio sobre o mercado como ocorre em
outros países.

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