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22/03/2024, 12:50 Simbologia dos alimentos

Simbologia dos alimentos


Prof.ª Laura Eugenia Perez Freitas

Descrição

Os aspectos simbólicos da alimentação e sua importância para o


profissional da área da Nutrição.

Propósito

A compreensão dos aspectos simbólicos da alimentação e do


significado dos alimentos nas diferentes culturas é importante para
formação do profissional de Nutrição, pois facilitará sua atuação e
compreensão em relação ao seu público-alvo em outros contextos no
exercício da profissão.

Objetivos

Módulo 1

Simbólico da alimentação

Identificar os aspectos reais, simbólicos e imaginários da


alimentação.

Módulo 2

Identidade cultural

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Relacionar a identidade cultural e a comensalidade às dimensões
simbólicas da alimentação.

Módulo 3

Significados simbólicos

Reconhecer os significados simbólicos nas práticas de alimentação.

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Introdução
Neste conteúdo, você aprenderá a identificar os aspectos
simbólicos, reais e imaginários da alimentação. Esta carreira que
você escolheu se situa no âmbito das ciências da natureza.
Nossas crenças, nossos valores e conceitos sobre alimentação
se constroem desde a mais tenra idade e fazem parte da nossa
vida. Por esse motivo, para mudar comportamentos, o
profissional da área da Nutrição não pode ignorar os múltiplos
significados que os indivíduos atribuem aos alimentos e às suas
práticas alimentares.

No módulo 1, após uma introdução à disciplina e à importância


na sua formação acadêmica, discutiremos os aspectos reais,
simbólicos e imaginários da alimentação. O corpo-máquina
construído pelo modelo mecanicista da ciência biomédica será
pensado no âmbito do real da alimentação. Depois, na vertente
simbólica da alimentação, por meio dos múltiplos aspectos
simbólicos. Em seguida, o imaginário da alimentação será
explorado mediante as angústias dos comedores
contemporâneos em relação à comida.

No módulo 2, falaremos da construção da identidade cultural a


partir da alimentação e sobre a comensalidade e seus múltiplos
significados socioculturais.

No módulo 3, discutiremos os significados das práticas de


alimentação em diferentes momentos. Começaremos falando
sobre a importância das comidas afetivas e das memórias
gustativas, depois sobre a construção do gosto e como questões
de gênero estão associadas à alimentação, assim como as
relações existentes entre comida e sexo, esses dois polos da
sensibilidade e do prazer humano.

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1 - Simbólico da alimentação
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar os aspectos reais, simbólicos e
imaginários da alimentação.

Aspectos reais, simbólicos e


imaginários da alimentação

Por que estudar História e Antropologia da


Alimentação
Você, como estudante de Nutrição, deve estar se perguntando que
disciplina é essa e por que ela é importante para você. Então, antes de
mais nada, vamos refletir juntos sobre isto? Para entendermos
primeiramente o que é a Antropologia da Alimentação, começaremos
falando sobre Antropologia: o que vem a ser Antropologia?

Resposta

A Antropologia é uma ciência social que surgiu no século XIX e que é


fruto do Neocolonialismo. O Neocolonialismo, isto é, o novo
colonialismo, está diretamente relacionado à Revolução Industrial e foi a
expansão imperialista das potências europeias no século XIX em
direção à África e à Ásia.

Diante da crise de superprodução na Europa em função da descoberta


da utilização da eletricidade e do petróleo, esses países saíram em
busca de novos mercados, matérias-primas e mão de obra. Segundo
Laplantine (2000), os colonos e viajantes começaram assim a acumular
informações sobre os povos considerados exóticos desses países e
assim se organiza a disciplina que se propõe a estudar esses povos, a
Antropologia.

A Antropologia significa literalmente o estudo do homem (a palavra vem


do grego anthropos, que significa homem, e logos, que significa razão,

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pensamento). A Antropologia surgiu com o intuito de compreender esse
homem exótico de forma global, ou seja, sua arte, economia, religião,
seu pensamento, parentesco, sua alimentação, cultura material etc.

A Antropologia Cultural pode ser definida como a ciência que está


interessada nos aspectos culturais dos grupos e sociedades e em suas
consequências no comportamento individual e coletivo. Sendo assim,
ela reflete sobre o homem, principalmente, a partir do conceito de
cultura.

Índios Pataxó, Porto Seguro, Brasil.

Já a Antropologia da Alimentação, o que ela estuda?

Ela se ocupa justamente das dimensões culturais da alimentação. Para


melhor compreender este ponto, vamos refletir primeiramente sobre a
centralidade da alimentação em nossas vidas a partir de algumas
questões. Por que comemos? O que comemos? Como comemos e
como preparamos os alimentos? Esta última ideia de modalidade inclui
também questões como: a que horas comemos? Com quem comemos?
Onde comemos?

Necessidade física Prazer

A primeira coisa que No entanto, esse não é


nos vem à cabeça o único motivo que nos
quando pensamos leva a comer. Podemos
sobre o porquê de nos refletir também sobre a
alimentarmos é que o questão do gosto.
ato de se nutrir é uma Conforme Carneiro
necessidade fisiológica (2003), a alimentação
primordial. Não é está diretamente ligada
surpreendente que a ao prazer; às
metáfora bíblica para a associações que
sobrevivência seja “o close encontramos entre a
pão nosso de cada dia”. comida e o sexo nas
A alimentação também mais variadas culturas,
está diretamente ligada pensando somente no
à saúde humana, como vocabulário,
nos diz a ciência confirmando essa
nutricional. Comer é relação entre comida,
uma necessidade, mas, desejo e prazer.

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diferentemente de
respirar, o homem
precisa buscar seus
alimentos.

É interessante observarmos que, se o homem em algum momento de


sua história precisou lutar para encontrar alimentos, atualmente ele
enfrenta a balança: ele luta para não comer. A obesidade já é um
problema de saúde pública maior que a desnutrição. Se atualmente
produzimos tantos alimentos quanto jamais o fizemos, também
convivemos, muitas vezes, com o desperdício e o consumo pletórico de
alimentos, a fome e a desnutrição.

Toda a arte da Gastronomia é desenvolvida a partir do prazer e do


desejo. Por outro lado, a alimentação está ligada de outras formas à
dimensão psicológica dos homens. Muitas vezes comemos, por
exemplo, por estarmos ansiosos ou tristes.

Reflexão
Quem nunca “assaltou” a geladeira exageradamente depois de um mau
dia? Essa conexão entre alimentação e a psicologia humana também
pode ser percebida nos transtornos do comportamento alimentar, tais
como anorexia, bulimia e alimentação compulsiva.

Ainda temos outros motivos para comer. Se não vemos algum amigo há
muito tempo, o que fazemos? Se queremos comemorar, festejar, o que
fazemos?

Partilhamos a mesa com outros comensais em refeições que podem ser


mais ou menos festivas, a dita comensalidade, ou o ato de comermos
juntos. Na Antropologia da Alimentação, falamos em função social da
refeição.

Se pensamos no que comemos, alguns podem responder: comida! Mas


será que todos consideram aquilo que é potencialmente ingerível como
comida?

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Bife - Hinduísta

Um bife suculento é um horror para um hinduísta e para um


budista, já que, para os hinduístas, a vaca é um animal sagrado
e para os budistas não devemos comer nenhum animal.

Larvas fritas - orientais e indígenas

Um punhado de larvas fritas pode parecer repugnante para


alguns, mas é uma iguaria para orientais, muitos indígenas
brasileiros, peruanos e mexicanos, entre outros. Os insetos são
muito apreciados por alguns, inclusive aqui no Brasil, com as
farofas de tronco da formiga saúva tanajura, também
conhecida como içá, mas são considerados nojentos para
outros.

Steak Tartare - Franceses

Os americanos nunca se decidiram a comer os fofinhos


coelhos, enquanto os franceses adoram esses animais e ainda
comem carne de cavalo crua no Steak Tartare, assim como em
alguns lugares da Itália, onde não se dispensa um bom ragout
de cavalo.

Todos esses exemplos demonstram que aquilo que é considerado


comida varia enormemente de acordo com o grupo dos indivíduos.

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Os indivíduos se distinguem por aquilo que comem. Nós nos
diferenciamos de outros povos nesse quesito; em sociedades divididas
em classes como a nossa, as diferenças entre essas classes são
criadas e mantidas por meio do que se come, de como se come. A
alimentação funciona a favor desse mecanismo de distinção, desse
modo de distinguir pessoas de classes sociais diferentes. Resumindo: o
que comemos depende de muitos fatores.
Em relação à última questão, como comemos e como preparamos os
alimentos? Comemos todos do mesmo jeito?

Evidentemente, não. Comemos certas coisas com garfos, facas ou


colheres e outras com as mãos. Comemos sentados em uma mesa com
amigos ou familiares em nossa casa, ou em um restaurante, mas
também comemos solitários andando pela rua ou de frente para a TV ou
para o computador.

Muitos orientais usam o hachi para comer e, em alguns lugares da


África, todos comem com a mão no mesmo prato. Em algumas
sociedades, come-se no chão; em outras, homens, mulheres e crianças
não comem juntos, nem ao mesmo tempo. Já em alguns momentos e
situações na Antiguidade, comia-se recostado.

Menina indiana comendo com a mão.

Come-se também de forma diferente nos diferentes estratos sociais.


Podemos ter uma mesa simples onde todos comem com colheres
somente ou com a mão, e uma outra com inúmeros talheres, pratos e
copos de todo os tipos somente para uma refeição. Toda essa parte
relacionada à alimentação na Antropologia da Alimentação é chamada
de modos à mesa, que variam enormemente entre os povos e
sociedades.

Podemos ver então que a alimentação é um ótimo caminho para


pensarmos sobre o ser humano, uma vez que ela engloba dimensões
fisiológicas, psicológicas, socioculturais e econômicas.

Por este motivo, é que falamos em Antropologia da Alimentação.

A nutrição refere-se aos aspectos fisiológicos da


alimentação, mas a alimentação vai além desses aspectos.
Os fenômenos ligados à alimentação vão além dos

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nutrientes, mesmo que sempre seja estabelecido um


diálogo entre as dimensões culturais e a nutrição.

E a História da Alimentação? Não é necessário falar tão longamente


sobre a disciplina de História, pois você já a conhece bem, desde os
seus primeiros anos de estudo. Por que estudar tudo isso?

Comentário

Quando você estiver diante de seu paciente, ou quando você for planejar
o menu semanal de uma escola, empresa ou de um hospital, você não
estará diante de um aparelho digestivo, e sim de uma pessoa que
possui, além do seu histórico médico, uma história de vida, crenças e
valores acerca dos alimentos e da sua saúde, ou seja, uma pessoa que é
um universo único.

Para ser eficiente como um profissional da área da saúde, você deve


compreender que quem está no centro desse processo é o seu paciente
ou seu público-alvo. As ações devem se adaptar aos pacientes para que
haja uma efetiva mudança de comportamento no sentido da promoção
da saúde. A postura do nutricionista deve ser sempre a de orientar,
respeitando as particularidades culturais e pessoais dos indivíduos. O
olhar sobre as diferenças deve ser generoso e ético.

Exemplo
Uma paciente vegetariana foi a um nutricionista procurando auxílio na
fase de transição, porém o nutricionista a desaconselhou sobre ser
vegetariana. Ela foi embora bem chateada e procurou outro profissional.
Cabe a um nutricionista aconselhar seu paciente a não seguir
determinada filosofia alimentar pela qual ele já havia decidido? De modo
algum! Nesse caso, ele também deveria aconselhar sobre qual religião
ou namorado a pessoa deveria escolher. O paciente vegetariano pode
ser um desafio para o nutricionista, mas cabe a ele orientá-lo dentro da
sua escolha de maneira ética e comprometida.

O Real, o Simbólico e o Imaginário na


psicanálise de Lacan
Quando falamos em real, simbólico e imaginário da alimentação,
estamos na realidade fazendo referência a uma classificação que é
oriunda da psicanálise de Lacan. Vamos explorar de forma bem suscinta
e simplificada o significado desses termos no pensamento do ilustre
doutor. Grosso modo, de acordo com Macarini (s.d.), que trata o assunto
de modo compreensível, o real seria aquilo que descrevemos com
palavras, aquilo que existe antes de nós e que não depende de nós.

O simbólico será resultado da maneira como construímos e como isso


vai moldar a forma com que nos relacionamos com os demais.
Interpretamos o mundo, as palavras, os sons, o que vemos,

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transformando-os em símbolos que lhes atribuem significados. Esses
termos são amplamente discutidos pela Filosofia e por outras ciências,
como a Antropologia e a História, além da Psicanálise.

O real da alimentação

O real da alimentação refere-se a todos os aspectos relacionados à


ciência da nutrição, ou seja, qual é a composição nutricional deste
alimento, como é obtido no processo de produção e suas
consequências na saúde da população e dos indivíduos. Mas o real
também se refere às características ditas organolépticas do item
alimentar ou da preparação, ou seja, tudo aquilo que diz respeito a
nossos sentidos, aparência, odor, textura e sabor.

Preparação Item alimentar

Quando falamos em Já quando falamos de


preparação, estamos item alimentar, pode ser
nos referindo a um uma fruta, um chocolate
prato preparado, que close ou um legume.
pode tanto ser uma
salada como um coelho
à caçadora.

Há quem vá se manifestar e dizer que comida real ou comida de


verdade são alimentos in natura ou levemente processados, como os
que são adeptos do Real Food (REAL, s.d.), uma tendência alimentar que
preza por uma alimentação saudável e pela sustentabilidade ambiental.
Mas, de acordo com o significado que estamos discutindo aqui, uma
lata de sardinha ou um pacote de batatas fritas é tão real quanto uma
fruta.

Exemplo
Vamos dar alguns exemplos sobre o real da alimentação. Uma salada é
uma preparação que pode variar nos seus ingredientes, mas a nossa
salada é feita de folhas verdes como alface e rúcula, pepino sem casca
e pimentão verde cru e um molho caseiro de iogurte natural comum. É
uma comida com poucas calorias, as verduras e legumes têm algumas
proteínas, fibras, sais minerais e vitaminas e poucas calorias. O iogurte
pode ser integral ou desnatado e contém várias vitaminas e nutrientes.
Outro exemplo é o de algumas sardinhas de uma lata em molho de
tomate. A sardinha não é muito calórica e possui vários nutrientes entre
vitaminas e minerais.

O simbólico da alimentação

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A alimentação e os seus aspectos


simbólicos
No video a seguir, vamos conferir a experiência de uma historiadora
especialista na área de alimentos.

Segundo Lenclud (1992), o simbólico é uma característica de todas as


culturas, que é atribuir significado ao mundo. Já o simbólico da
alimentação refere-se justamente a todos os significados que
atribuímos aos alimentos. É importante sinalizar que esses significados
variam de cultura para cultura.

Vamos aos nossos exemplos anteriores.

Exemplo
Para alguém que deseja ficar em forma e vive em um grande centro
urbano, a salada pode ser considerada um ótimo alimento, pois é leve e
saudável e não engorda. Além disso, faz bem para o intestino, pois o
iogurte contém probióticos. Nesse caso, ela já atribui vários significados
a essa preparação.

Vimos que o significado real fica no registro da ciência da Nutrição. Por


outro lado, o pepino, ainda mais sem casca, assim como o pimentão
verde cru, dependendo da sensibilidade da pessoa, não são leves e
podem dificultar a digestão e provocar azia. E somente alguns iogurtes
contém probióticos, pois possuem os organismos que sobrevivem aos
ácidos do estômago e chegam vivos aos intestinos. A maioria não tem
essa caraterística.

Outras pessoas já dispensariam a salada. Em algumas ocasiões, nos


churrascos, podemos ver pessoas questionando: “Se há tanta carne
disponível, por que alguém comeria uma salada em uma situação
destas?”.

Nesse caso, o significado atribuído à salada é que ela é algo menos


importante que a carne. E, efetivamente, alguns trabalhadores do
campo, ou mesmo pessoas nos centros urbanos, consideram as
saladas como uma comida que não tem sustância e não dá força para o
trabalho, sendo desvalorizadas (ALVES; BOOG, 2008).

Portanto, observamos diferentes valores simbólicos que foram dados à


mesma preparação. E quanto às sardinhas em lata? Elas tanto podem
significar um alimento saudável como também podem ser descartadas
por ser um produto enlatado, não considerado um alimento natural ou

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de verdade.

Você pode observar então que os valores simbólicos que conferimos


aos alimentos são culturalmente determinados e um alimento pode nem
significar comida, ou seja, não fazer parte da categoria comida, como
comentamos acima.

Aqui, é preciso sua atenção para uma diferença estabelecida pelo


antropólogo Roberto DaMatta (1986) entre alimento e comida.

Alimento Comida

É toda e qualquer coisa É aquilo que comemos


que pode ser ingerida close dentro de casa, a
pelos seres humanos. comida de mãe, comida
caseira, que comemos
na rua, mas é como se
fosse a comida de casa.
Com a comida, temos
proximidade.

O alimento está na prateleira do supermercado; a comida está no prato,


quentinha, gostosa, aconchegante. Em uma viagem, se ficamos
comendo só lanches, depois de algum tempo nos dá vontade de comer
uma “comida de verdade”. Isso porque a comida é aquele prato que
comemos sentados, que está quente, que nos é familiar.

O imaginário da alimentação

Vamos agora refletir sobre o imaginário na alimentação. Para Baczko


(apud ESPIG 2003/2004), o imaginário refere-se a ideias e imagens que
são coletivamente construídas.

Quando pensamos em termos de alimentação, o imaginário comporta


construções simbólicas sobre os alimentos que são amplamente
difundidas entre os membros de uma população ou entre os membros
de um grupo específico. O que isso significa? Que, em grupos ou
populações, os significados que fazem parte do imaginário são comuns
e frequentes.

A partir de Perez (1996), falemos de alguns exemplos relativos a um


grupo indígena amazônico que pertence ao tronco linguístico Tupi e é
conhecido como Cinta-Larga. Esses indígenas eram originariamente
guerreiros e antropófagos, como costumam ser os Tupi.

Curiosidade

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O nome Cinta-Larga refere-se a uma armadura feita com a casca de uma
árvore que os homens usavam nas guerras para proteger seus órgãos
vitais de flechadas dos inimigos.

A pesquisa em questão trata do tema da Antropologia da Saúde e da


Doença, ou seja, como esses indivíduos enxergam, do ponto de vista
tradicional, a doença, o mal, o infortúnio, como eles diagnosticam as
enfermidades e como as curam. Nesse trabalho, também pretendia-se
compreender como os profissionais não indígenas da área da saúde que
trabalhavam com saúde indígena viam os hábitos e costumes dos Cinta-
Larga.

Pois bem, esses colaboradores tinham um imaginário preconceituoso


em relação aos hábitos alimentares e de higiene tradicionais desse
povo. Eles acreditavam que a comida dos indígenas era estranha e
preparada sem nenhuma limpeza. Também pensavam que eles eram
sujos, que não cuidavam nem limpava bem suas crianças etc.

Para esses agentes, o problema da saúde indígena era a falta de higiene


e seus hábitos bizarros. Enquanto o que ocorre efetivamente é que a
saúde dessa população se deteriorou, sobretudo por conta das doenças
trazidas pelos não indígenas e pelos hábitos que eles adquiririam com o
contato: consumo de açúcar e carboidratos simples, como o arroz. Você
pode observar dessa forma que o imaginário das populações que estão
próximas a esses indígenas é extremamente preconceituoso.

Os indígenas também têm um imaginário específico em relação aos não


indígenas e seus hábitos. No que concerne à alimentação, antes mesmo
do contato, os agentes da FUNAI jogavam dos aviões sacos de arroz,
farinha e açúcar para os Cinta-Larga. Essa era uma prática comum na
época.

Saiba mais
No início do contato e até antes mesmo de ocorrer, houve grande
mortalidade dessa população devido à rubéola, uma doença que, para
os não indígenas, é praticamente incipiente. Os relatos assemelham-se
ao Apocalipse, pois eram aldeias inteiras mortas pela doença e crianças
chorando no colo de suas mães mortas deitadas na rede. Aos que
sobreviviam, cabia enterrar a enorme quantidade de mortos. Sabemos
que esses povos isolados não possuem anticorpos para uma série de
doenças comuns entre os não indígenas. Esse é um dos motivos pelos
quais a FUNAI estabelecia uma política de não entrar em contato com
os grupos indígenas isolados.

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Difundiu-se entre os Cinta-Larga a ideia de que os sacos de comida que


lhes eram lançados pelos aviões da FUNAI estavam com comida
envenenada, que tinha como objetivo espalhar a doença entre eles. Essa
teria sido a causa da grande mortandade. Isso vai ao encontro de um
imaginário entre os indígenas de que os “brancos” só querem destruí-los
e se apossar de suas terras. Infelizmente, isso não está longe da
realidade, mas, no caso, não era absolutamente a intenção da FUNAI.

Um exemplo mais próximo é a relação entre os hábitos higiênicos de


franceses e brasileiros. O imaginário sobre limpeza é bastante diferente
entre esses povos.

Enquanto no Brasil o pão é colocado em um saco de papel, lá os


franceses levam sua baguette debaixo do braço, algo que, para nós,
entende-se que vai sujar o pão e contaminá-lo com a sujeira do corpo.

Franceses têm o costume de colocar o pão embaixo do braço e pegá-lo com as mãos.

A quantidade de banhos que tomamos também é vista como um


exagero, pois eles afirmam que esse hábito destrói a camada de gordura
necessária à saúde da pele. Existem os pressupostos científicos de
higiene e contaminação, mas a limpeza e a sujeira são, antes de tudo,
imaginários culturalmente construídos. Os franceses não deixam de ter
um pouco de razão em relação à pele. Os pediatras brasileiros insistem
com as mães de recém-nascidos que o banho com sabão só deve ser
dado uma vez ao dia. Caso contrário, a mãe poderia prejudicar a saúde
da pele do bebê por excesso de lavagens.

No artigo de Espig (2004), o que a autora nos traz é que a


oposição entre real e imaginário é questionável. A ideia é
que, mesmo o que chamamos de real é de certa maneira
construído pelo imaginário. As fronteiras entre eles não
são rígidas, e sim flexíveis. O real da alimentação é como
ela se baseia também na ciência da nutrição, em que a
ciência também é uma construção.

Os carboidratos e as calorias são construções abstratas a partir de


dados e observações. Não se está dizendo que eles não existem, nem
invalidando a ciência, mas, sim, que eles somente existem na cabeça de
homens que inventaram uma ciência. Além disso, as verdades
científicas são provisórias e não definitivas. Você pode ver isso

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claramente na ciência da Nutrição, em que os itens alimentares passam
constantemente de vilões a heróis e vice-versa.

O real: o corpo-máquina
Antes de falarmos sobre a forma como o corpo e a doença têm sido
caracterizados pela medicina na contemporaneidade, vamos
compreender uma oposição clássica da Antropologia, aquela entre
natureza e cultura. Isso porque o corpo e as doenças são vistos por
essa medicina como algo que faz parte da natureza. E o que se está
defendendo aqui é que ele é também uma construção cultural.

Sobre essa oposição, os antropólogos preocuparam-se


primeiramente com tentar compreender em que momento
o homem teria deixado de ser um ser natural e teria
“inventado” a cultura. Para Lévi-Straus (2002), um
renomado antropólogo francês, o homem teria se separado
do mundo natural quando ele inventou uma regra que é
exclusivamente humana. E que regra seria essa? Pois bem,
Lévi-Strauss diz que é a proibição do incesto.

Todos vocês que têm algum animal de estimação sabem muito bem que
esse tipo de proibição não existe entre eles. Para ser um parceiro sexual,
a única coisa necessária é que o indivíduo tenha maturidade sexual e
que, no geral, a fêmea esteja disponível. O que você pode ver nesse caso
é que, em um domínio extremamente natural, que é aquele da
sexualidade, o homem diz que existem regras. Quais parentes são
considerados incestuosos? Isso varia de sociedade para sociedade,
mas na esmagadora maioria das vezes, pais, irmãos e filhos são
vetados à relação sexual. E outros membros da família podem entrar
nessa proibição também.

Mas por que com a proibição do incesto o homem “inventa” a cultura?

Resposta

Porque ele diz que as relações incestuosas são erradas, são sujas,
levam ao caos e, eventualmente, à morte. A partir daí, inventa-se um
juízo de valor sobre os mais variados eventos. Ao contrário dos animais,
os homens criam um ordenamento em que existem coisas que são
certas e erradas, puras e impuras, sujas e limpas, justas e injustas etc.
Esses valores são uma invenção exclusivamente humana. Os animais,
até onde se sabe, não têm essa visão da existência.

Podemos dizer que o tubarão é mau porque comeu o peixe ou que o


coelho é bonzinho porque só come plantas, mas esses animais não se
julgam bons nem maus, nem certos ou errados. Eles seguem os seus
instintos.

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Entre algumas sociedades tradicionais (povos nativos que mantiveram


formas tradicionais de organização social, de produção e de exploração
da natureza), o consumo de carne crua também é proibido, podendo
levar à loucura, como afirmam os Cinta-Larga (PEREZ, 1996). Nessa
circunstância, também é questão de natureza e cultura. A carne da caça
deve ser passada pelo filtro da cultura e ser transformada em comida
pelo cozimento. O consumo de carne crua é característico dos animais.

O corpo humano também faz parte da natureza ou da


cultura? De ambos, pois ele também é culturalmente
construído. Nosso corpo passa por um processo de
desenvolvimento que é natural, mas também é fabricado
pela cultura.

Aqui no Brasil, por exemplo, recentemente, foi proibido que as orelhas


das meninas fossem furadas na maternidade, mas, em muitos casos,
elas o são logo depois. As mulheres usam salto alto, os homens, terno.
Isso também vai no sentido de fabricar um corpo feminino e masculino.
A busca pelo corpo magro é uma forma cultural pela qual ele é
manipulado baseado em certos padrões, que também são construções
socioculturais.

A forma com que nos higienizamos, aquilo com o que o alimentamos,


tudo isso constrói o corpo. As dietas, as cirurgias plásticas, as
tatuagens, os brincos, colares, pulseiras, anéis, igualmente.

Vemos uma foto de uma mulher-girafa, um exemplo muito pertinente de


como a cultura molda o corpo.

As chamadas mulheres-girafas da etnia Karen e da tribo Kayan usam


anéis de bronze no pescoço. As argolas são parte da identidade cultural
da tribo e são associadas à beleza das mulheres.

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Agora que vimos como o corpo é culturalmente construído, vamos


continuar pensando no jeito como ele é visto e construído pela medicina
contemporânea, e qual o papel da Nutrição nesse processo.

Já mencionamos que a ciência também é uma construção. Ela vem


também se transformando com o decorrer do tempo e é importante
enfatizar que não é produzida “do nada”, a partir de uma realidade
natural que observa e descreve fielmente. Não existe percepção do
mundo natural que não seja influenciada pela maneira como se dá uma
sociedade e uma cultura determinada (QUEIROZ, 1986). Portanto, a
ciência também atende a interesses diversos e não é tão neutra assim
como você pode supor.

Com o surgimento da ciência moderna no século XVII,


formulou-se um modelo mecânico para a realidade.
Esse modelo tem a influência da vários pensadores,
como Descartes, que formulou uma separação entre o
corpo e a mente, e Galileu e Newton, este último tendo
elaborado uma visão mecanicista do Universo. Como
consequência disso, as ciências biomédicas, muito
influenciadas por essas concepções científicas,
adotam com toda força a visão do corpo-máquina
(KRAEMER et al., 2014).

Esse modelo mecanicista que considera somente aquilo que pode ser
medido objetivamente desconsidera as dimensões simbólicas,
psicológicas, sociais, que são decisivas não somente na construção do

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corpo, como vimos, mas também na compreensão de como esse corpo
adoece e se cura.

A medicina científica desenvolveu-se muito depois da Segunda Guerra,


sobretudo do ponto de vista tecnológico. Se, por um lado, pensava-se
que a cura de quase todas as doenças seria descoberta, por outro, a
intervenção nos corpos os tornava mais aptos para a produção
(QUEIROZ, 1986).

Comentário
Conforme Morais (2011), entende-se que esses princípios mecanicistas
e esse grande desenvolvimento tecnológico, ao invés de promover a
satisfação da população como um todo, pelo contrário, geraram uma
crise na medicina moderna. Isso já era apontado por Queiroz, em 1986,
e ainda continua sendo um objeto de reflexão.

As queixas vão no sentido do alto custo dos tratamentos, o atendimento


frio dos médicos, do fato de se dedicarem muito mais tempo à saúde, e
os males antigos não apenas continuarem, como ainda serem somados
a outros novos. Há uma elitização da saúde e um distanciamento cada
vez maior entre pacientes e terapeutas (ibid.). E no caso da Nutrição?

A Nutrição, como uma ciência biomédica, repete esse modelo


mecanicista. Para Kraemer et al. (2014), quando se constituiu, a
Nutrição teve necessidade de se colocar junto aos saberes biomédicos
para poder se legitimar. Consequentemente, isso a levou a uma maneira
de enxergar os alimentos de forma descontextualizada de imaginário
social e de seus vários significados socioculturais.

Para promover uma alimentação saudável, a ciência da Nutrição dita o


que se deve comer, as quantidades e quando os itens alimentares
devem ser ingeridos. Não levando em consideração os aspectos
descritos anteriormente, tampouco as conjunturas políticas e
econômicas nas quais se desenvolvem os comedores e a indústria
alimentar, a ciência reduz seu alcance explicativo (ibid.).

Somente os corpos jovens e magros são considerados saudáveis. Para


manter esses atributos, a alimentação deve ser controlada, as calorias
devem ser contadas e os indivíduos se tornam responsáveis pela sua
própria saúde ou pela falta dela. Se você está acima do peso, ou obeso,
é porque você não se cuidou o suficiente (ibid.), porque você é fraco,
sem força de vontade. Essa forma de ver as coisas, que é comum entre
os nutricionistas, não leva em conta elementos sociais, psicológicos
entre outros.

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Saiba mais
Esse modelo mecanicista acaba por se difundir em toda a população
que tem acesso a alguma informação nutricional. Barbosa (2007) fez
uma ótima enquete sobre alimentação no Brasil do ponto de vista dos
comedores e que se dá em um contexto urbano. Ele constatou que, em
todos os extratos sociais, os indivíduos sabem dizer exatamente os
alimentos vistos como saudáveis e aqueles que são prejudiciais à
saúde.

Evidentemente que a ciência da Nutrição tem demonstrado a estreita


relação entre doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) e a
alimentação. A busca pela saúde deve intervir sobre todo o nosso
comportamento alimentar como se existisse um único modelo que é
válido para todos as situações, como uma verdade absoluta e
inquestionável. Segundo Azevedo (2017), questiona-se a visão da
comida considerando somente seus aspectos bioquímicos que
determinam uma dieta específica para uma pessoa, desdenhando dos
aspectos culturais e sociais.

A comida e o comer têm múltiplos significados em todas as sociedades,


é exatamente disso que trata este conteúdo. E o que se pretende aqui é
que você seja um profissional que vá além dos nutrientes, além do
modelo mecanicista e além do corpo-máquina, de forma a enxergar seu
paciente ou seu público-alvo como uma totalidade, e não como um
aparelho digestivo ambulante.

Existem outras formas de comer que, mesmo do ponto de nutricional,


podem nos surpreender. Ribeiro (1995) afirma que a dieta dos indígenas
amazônicos corresponde a, aproximadamente, 80% a 85% de mandioca,
seja na forma de cerveja, na variedade “doce”, seja na forma de farinha e
seus derivados, na variedade “brava”. Os 15% a 20% restantes equivalem
ao consumo de proteína animal e a todos os outros produtos da
agricultura e da coleta.

Indígena Kichwa preparando a tradicional bebida chicha, feita de mandioca, típica da Bacia da
Floresta Amazônica, no Parque Nacional Yasuni (Equador).

Por outro lado, até as dietas e o peso ideal têm caráter ideológico.
Belasco (2009 apud CULTURA, 2015) nos diz que o modelo nutricional
ocidental que se tornou padrão considera a carne um alimento
fundamental. Sendo que, dentro dessa visão, os hindus e os chineses
não se alimentariam de forma adequada. O Índice de Massa Corporal é
bastante útil, mas ele tem como base o padrão da sociedade americana.
Até que ponto isso é válido para todos (KRAEMER et al. 2014)?

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Uma dieta pobre em frutas, legumes e verduras (FLV) é o contrário do


que determina a Organização Mundial da Saúde e os nutricionistas.
Todavia, no geral, os indígenas amazônicos têm uma saúde muito boa,
ficando doentes justamente quando mudam seus hábitos e regimes
alimentares em decorrência do contato com não indígenas.

Coimbra (1985), analisando quimicamente a cerveja feita de mandioca


doce, atestou que, devido à fermentação que é provocada pela saliva
das mulheres, essa preparação contém açúcares mais complexos que
aqueles presentes na mandioca in natura.

Resumindo
Refletimos nesta seção sobre o aspecto real visto a partir da construção
do corpo e da saúde no modelo mecanicista e como isso também
influencia a ciência da Nutrição. O que vimos é que o corpo não é uma
máquina em que a doença é um defeito. O corpo, com seu estado de
saúde ou doença, é construído no centro das relações sociais e do
imaginário simbólico que envolve as práticas alimentares e as diferentes
maneiras de adoecer e curar.

O simbólico: os múltiplos significados


dos alimentos
Já comentamos sobre alguns dos significados simbólicos dos
alimentos.

Os alimentos não são apenas


comidos, mas também pensados.
Em outras palavras, a comida possui
um significado simbólico – ela fala
de algo mais que nutrientes.

(WOORTMANN, 2006).

Vamos pensar em alguns itens que são passíveis de serem ingeridos.


Qual é a diferença existente, do ponto de vista nutricional, entre um bife
de carne de boi, um de carne de cachorro, um de carne de cavalo e um
de carne humana?

Só de falar nisso, talvez você já esteja sentido náuseas, mas a resposta


à pergunta é: nenhuma. Talvez alguma diferença no percentual de
gordura, ou de fibras. Mas todas elas vão nutri-lo quase da mesma

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maneira.

Então, por que nós humanos desprezamos todas essas carnes que
poderiam resolver uma parte do problema da fome no mundo?

Pensando assim, não Já os cães são como


seria necessário tanto pessoas da família,
gado e tudo aquilo que impossível, para nós,
eles precisam para pensarmos em comê-
viver: terra, água etc. los. E os cavalos, que
Seria ótimo, não? O são comidos em vários
consumo de carne close lugares, para nós são
humana é um tabu como nossos
enorme, sem falar no empregados, que têm
fato de que os um nome, uma função;
cadáveres devem ser eles também não
respeitados. podem se transformar
em comida.

No entanto, não temos problema algum em comer carne de vaca, porco,


carneiro, coelho ou avestruz. Porém, em alguns casos, essas carnes são
consideradas sagradas, sujas, ou impuras por questões relacionadas a
aspectos religiosos ou não.

Uma anedota conta que perguntaram a um biólogo o que ele diria sobre
Deus segundo suas observações da vida na Terra. Ele respondeu que
Deus, certamente, tinha um grande amor por insetos, sobretudo por
besouros. Isso porque eles representam o maior número de espécies e
de indivíduos em todo o Reino Animal. Surpreendente, não? Mas por que
falar de insetos? A entomofagia, ou seja, o consumo de insetos, é um
assunto apaixonante. Afinal, os insetos são muito numerosos, como nos
esclareceu o biólogo, extremamente fáceis de serem capturados, muito
nutritivos e, segundo aqueles que os comem, muito saborosos.

Por que, nesse caso, nós dispensamos toda uma quantidade de


proteínas que tão generosamente a natureza nos oferece?

Resposta
Precisamente, por conta do significado que atribuímos a esses
potenciais alimentos. Mesmo se aqui no Brasil comemos farofa de içá,
como foi dito; se no Norte do país tem-se o costume de comer formigas
aladas, e se restaurantes famosos e estrelados servem insetos em
pratos gourmets em São Paulo, na maior parte das vezes, os insetos são
considerados repugnantes.

Estrelados
Um restaurante estrelado é aquele que recebeu Estrelas do Guia Michelin,
um guia turístico e gastronômico muito famoso na França e no mundo.

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Como vimos, aquilo que é considerado comida para uns não é para
outros. Cada cultura determinará as diferentes possibilidades que lhe
são ofertadas. A categoria comida é culturalmente construída:

Se o homem não come tudo que é


biologicamente ingerível, é porque
nem tudo que é biologicamente
comestível é culturalmente
comestível.

(FISCHLER apud COELHO, 2015)

Como salienta Flandrin (1998), desde a Pré-História, os homens têm


acesso aos mais variados itens alimentares nos lugares por onde
passam, mas nem tudo o que esses ambientes lhes oferecem é
escolhido para fazer parte da categoria comida. Essas escolhas são
feitas de acordo com regras impossíveis de serem decifradas na maioria
das vezes. Você pode perceber que essas escolhas não são baseadas
em critérios pragmáticos nem racionais. Caso contrário, todos
comeríamos insetos, pois eles existem em quase todos os lugares do
mundo.

food_bank Escargots

Na Europa, o ambiente oferece os mesmos


recursos, mas somente os franceses comem
caramujo, os famosos escargots, e rãs. Temos
tartarugas também em muitos locais, mas a sopa
feita delas é uma especialidade inglesa.
Poderíamos multiplicar os exemplos, mas já ficou
claro que não é o ambiente que determina as
escolhas alimentares, mesmo que sejam feitas a
partir dele.

food_bank Esquimós

É id t i ó ã d
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22/03/2024, 12:50 Simbologia dos alimentos
É evidente que um esquimó não pode ser
vegetariano, pois morreria de fome, mas, mesmo
em uma região com recursos tão limitados, os
homens fazem escolhas culturais diferentes. Laraia
(2007) fala sobre os esquimós que constroem suas
casas de gelo e usam trenós puxados por cães; e
os lapões, que vivem no mesmo ambiente, são
pastores de rena, constroem suas casas com a pele
delas e se locomovem tradicionalmente com
raquetes de neve.

food_bank Carne

Outro ponto interessante sobre o significado dos


alimentos é o simbolismo associado à carne.
Carneiro (2003) comenta que a Europa sempre
valorizou a alimentação carnívora. Desde a
Antiguidade Grega, a caça e o consumo de carne
são considerados importantes para preparar os
homens para a guerra, tornando-os mais ferozes e
cruéis. Sem falar no fato de que a propriedade de
rebanhos confere prestígio e riqueza.

food_bank Churrasco

Os países ocidentais valorizam muito o consumo


de carne. Aqui no Brasil, o churrasco é uma
verdadeira instituição, sendo muito comum na
Região Sul, mas também no Sudeste e no Centro-
Oeste, onde, no geral, o único acompanhamento da
carne é a mandioca cozida. Flandrin (1998) nos
ensina que nas refeições festivas de todos os

t f i ái d
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22/03/2024, 12:50 Simbologia dos alimentos
tempos sempre foi necessária a presença da carne
fresca; e, é claro, das bebidas fermentadas.

Se falamos em consumo de carne, não podemos deixar de lado a


antropofagia. De acordo com Bueno (2012), esse costume de muitos
povos indígenas brasileiros foi o que mais espantou os europeus.
Alguns rituais antropofágicos entre os Tupinambás foram descritos com
precisão por alguns cronistas, sobretudo por Hans Staden (1998), que
foi capturado por esses indígenas e viveu entre eles por alguns anos.

Antropofagia
É a prática na qual um ser humano se alimenta de partes de outro ser
humano.

Saiba mais
Para saber mais, assista ao filme Hans Staden (Brasil/Portugal, 1999.
Direção Luiz Albert Pereira).

Mesmo se os homens já comeram carne humana para matar a fome,


em momento de penúria extrema ou na Pré-História, o canibalismo do
qual se tem notícia tem sempre um significado ritual. Pode-se consumir
os inimigos para se vingar deles, para recuperar sua força ou para
aniquilá-la, mas, no caso, também pode ser uma obrigação consumir a
carne de seus parentes mortos para desumanizá-los, uma vez que são
comidos como presas e para que sua substância fique entre os
membros da família.

Para fecharmos esta seção, vamos falar sobre outra dimensão


simbólica da comida: o fato de que ela constitui uma linguagem.
Quando convidamos alguém para comer em nossa casa, a comida que
vamos servir vai falar sobre nós, expressar nosso cuidado, nosso
carinho, nossa consideração.

Os diferentes tipos de ingredientes são as letras e as preparações das


palavras. Com uma letra, você pode fazer inúmeras palavras se
combiná-la com outras letras, assim como podemos fazer um monte de
receitas diferentes misturando os ingredientes-letras. E a frase é a
refeição, em que tudo deve ser combinado de uma forma específica
para ter sentido (MONTANARI, 2008).

É claro que a forma como a frase-refeição é construída depende da


cultura, disponibilidade econômica do responsável, ocasião.

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flag
Brasil
Cotidianamente, não costumamos comer entrada, colocando a salada
no prato principal. No final da refeição, sobremesa e café. Essa ordem é
imutável.

flag
EUA
Nas cafeterias, toma-se café durante toda a refeição. Esse café é bem
fraco para os nossos padrões: é o famoso “chafé”, de tão aguado.

flag
França
Os franceses comem salada verde e queijo no final das refeições, e só
depois vem a sobremesa e o café. Eles consideram que a salada limpa o
paladar.

A frase é diferente e pode até se tornar um texto em uma refeição


festiva, como um banquete de casamento. E mesmo a gramática da
refeição é diferente nos dias da semana e no fim de semana. Por meio
das palavras, damos sentido ao mundo, criamos categorias, e a comida
faz a mesma coisa. Ela fala de nós, de nossos hábitos, valores, crenças,
origem, classe social. A comida fala!

O imaginário: as angústias do
comedor moderno
Como diz Ferrières (2002), além do medo de que falte comida, existe o
medo de comer uma comida que esteja contaminada ou apodrecida e
possa afetar negativamente a saúde. A autora traz no livro A História dos
medos alimentares um histórico desde a Idade Média das angústias
relativas àquilo que vamos incorporar ao nosso corpo. Por conta disso,
no Ocidente, desenvolveu-se pouco a pouco um controle sanitário sobre
o processo de produção dos alimentos.

Fischler (1990) afirma que o ato de comer é muito íntimo e, mesmo que
seja fonte de prazer, ele também traz medo e ansiedade no tocante à
ingestão dos mais variados itens.

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Na realidade, a ciência e todos os processos controlados


da produção de alimentos nas granjas e fazendas, nos
abatedouros e nas plantações, nas indústrias e na
distribuição geraram uma sensação de segurança no
consumidor.

No entanto, essa confiança foi quebrada com a Doença da Vaca Louca


(Encefalopatia Espongiforme Bovina), que surge na Inglaterra por volta
de 1985 (POULAIN apud DÓRIA, 2015). Essa doença ataca o Sistema
Nervoso Central e mata os animais. A origem da doença se deu por
conta dos restos de carcaças de mamíferos que entravam na
composição da ração que era dada aos animais, submetendo os
herbívoros a uma espécie de canibalismo.

Na França, essa suspeita recaiu sobre todos os tipos de carnes bovinas


e seus derivados. Para conter a doença, milhares de animais foram
sacrificados. Temia-se que a doença fosse transmitida aos humanos e a
outros animais. A utopia da segurança em relação ao que comemos foi
abalada e gerou ansiedade e medo em relação à qualidade dos
alimentos.

Por outro lado, por conta da globalização que permite uma circulação
sem precedentes de mercadorias e pessoas, os fatores de risco se
multiplicam, como declara Proença (2010). Os riscos são de
contaminação por microrganismos, problemas na manipulação e na
conservação dos alimentos, introdução acidental ou voluntária de
substâncias tóxicas, excesso de agrotóxicos etc.

Avião pulverizando plantação com agrotóxicos.

Aqui no Brasil, vimos leite contaminado com formol (ILHA, 2013), suco à
base de soja com soda cáustica (VIGILÂNCIA, 2013) e um aumento no
número de agrotóxicos liberados para utilização em 2020 (LEITE, 2020).
Isso sem falar nos transgênicos que são uma grande ameaça à
biodiversidade (OLIVEIRA, 2016). Também nos preocupamos com a
quantidade de hormônios que os animais consomem e que efeitos isso
pode ter na nossa saúde, e o assombroso consumo de antibióticos pelo
gado bovino.

Você viu que existem riscos reais à nossa saúde causados pelos
alimentos nas mais variadas fases da produção, mas se somam a essas

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outras questões que só aumentam a ansiedade do comedor. Além
desses riscos biológicos, questões de ordem ética nos preocupam. Nós
nos preocupamos com a forma como os alimentos que comemos foram
obtidos, isto é, se houve agressão ao meio ambiente ou aos
trabalhadores envolvidos no processo. Questões de sustentabilidade
ambiental e econômica nos dizem respeito. Pelo surgimento de uma
solidariedade entre espécies, não queremos que os animais que nos
servem de comida sejam tratados com violência ou desprezo.

Por conta disso, surgiram novas ideologias alimentares, como, por


exemplo, o Slow Food. Esse movimento, fundado pelo italiano Carlos
Petrini em 1986, acredita que o homem, ao comer, afeta seu meio
ambiente e social e que é necessário se conscientizar e agir em
consequência disso para que esses impactos sejam benéficos.

Símbolo do movimento Slow Food.

Para isso, ao contrário do Fast-Food, é necessário ter prazer ao comer


degustando o alimento com consciência, consumir produtos artesanais,
de preferência que sejam fruto do trabalho de produtores locais e que,
nesse processo, sejam respeitados o meio ambiente e os trabalhadores
envolvidos na produção (MOVIMENTO, 2007).

Não podemos esquecer do medo de engordar, de desenvolver doenças


mesmo que os alimentos não estejam contaminados: somente sua
composição já pode nos assustar. Tudo isso levou a uma medicalização
da nutrição, como já comentamos. Diante disso, outro dilema que o
comedor enfrenta é a escolha do que comer. A quantidade de opções de
itens, de ideologias alimentares, de produtos light, diet, orgânicos, sem
glúten, sem lactose, fat free disponíveis atualmente para o comedor são
enormes (VERTHEIN; MEDINA, 2015).

Em busca do corpo perfeito e, sendo agora o responsável pela saúde e


pelas decisões sobre o que comer para atingir esses objetivos, o
comedor tem cada vez mais angústias, medos, preocupações e culpas.

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Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Na Espanha, desde sempre, o vinho é considerado um alimento


nutritivo, tanto que ele é dado até para as crianças na forma de um

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refresco de vinho feito com água e açúcar. Veja uma conversa entre
espanhóis:

- Mas ela está sempre doente.


- Claro, ela come pouco, não toma um copo de vinho, normal que
sua saúde seja fraca.

Quais dos aspectos dos alimentos estudados acima faz referência


ao texto?

Reais, pois o vinho é considerado nutritivo por conta


de polifenóis presentes na bebida que, segundo
A
pesquisas na área comprovam, protegem a saúde
do coração.

Imaginário, pois o vinho é considerado nutritivo por


B
esse povo, já que nutre o organismo.

Simbólicos, pois a Espanha é uma grande produtora


C
de vinho.

Psicológicos, pois o vinho altera o estado de


D
consciência, causando embriaguez.

E Lúdico, pois o vinho está atrelado ao ilusório.

Parabéns! A alternativa B está correta.

Os aspectos imaginários da alimentação atribuem significados aos


alimentos que são amplamente compartilhados por um grupo
cultural.

Questão 2

Leia o texto abaixo:

“Chinchulin, talvez o mais interessante e menos conhecido prato da


culinária dos nossos primitos do Sul (“hermanitos” é exagero, tenha
dó!). Se você for procurar pelo Google, encontrará muitas
referências ao quitute, quase todas em espanhol, mas nenhuma em
bom português. Chinchulin é o churrasco preparado com o primeiro
terço do intestino delgado de uma vitela. E vitela, para quem não
sabe, é uma vaca teen. (...) Chinchulin – coprofagia à Argentina.”
(Disponível em Mesapra1.)

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Quais os aspectos simbólicos que levam os brasileiros a rejeitarem
essa preparação?

Os chinchulines são muito apreciados pelos


A argentinos, pois dentro deles o leite ingerido pelo
vitelo é como um creme de queijo.

Nós, brasileiros, consideramos intestino uma


B comida nojenta, independentemente de o recheio
ser o início da digestão do leite.

No intestino delgado, ocorre a maior parte da


C digestão e absorção dos nutrientes. Esse órgão
divide-se em: duodeno, jejuno e íleo.

Uma xícara de cubinhos de chinchulines tem 118


D
kcal, 16,76 g de proteínas e 587 gramas de sódio.

No intestino grosso, ocorre a maior parte da


E
digestão e absorção dos nutrientes.

Parabéns! A alternativa B está correta.

Os aspectos simbólicos da alimentação são aqueles que se referem


aos significados que os diferentes grupos culturais atribuem aos
alimentos, além dos seus aspectos nutricionais. Aqui no Brasil,
somos muito céticos em relação a tudo que é produto da digestão.

2 - Identidade cultural

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Ao final deste módulo, você será capaz de relacionar a identidade cultural e a comensalidade
às dimensões simbólicas da alimentação.

Alimentação e identidade cultural

video_library
A cultura e sua influência na escolha
dos alimentos

Diante de tantas mudanças em relação à forma de comer, ao que comer,


quando, onde, sozinho ou acompanhado, estabelecem-se questões
relativas às identidades culturais individuais e coletivas.

O que é a identidade cultural, como podemos definir esse conceito?

Cultura Identidade cultural

É algo que está dentro e É um sentimento de


fora de nós, pois, pertencimento que é
quando nascemos, já construído pelo
existe uma sociedade, close indivíduo com base nos
mesmo que ela esteja aspectos culturais de
em constante dada sociedade.
transformação.

Se pensarmos, por exemplo, em um indivíduo que pertença a uma


sociedade tradicional, a sua identificação afirma seu pertencimento
àquela etnia, ao seu gênero e à sua posição na família: pai, mãe, filho,
todas essas sendo identidades culturais que variam de acordo com a
sociedade. As obrigações e funções de pais e filhos são culturalmente
construídas.

O gênero também é uma construção cultural, ser mulher ou homem não


significa a mesma coisa para todas as culturas. Mesmo em nossa
sociedade, a forma como uma mulher e um homem constroem seus
pertencimentos de gênero varia no tempo. Logo, a identidade cultural é
algo que se transforma.

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Mulheres

Como uma mulher se sentia mulher há 50 anos? Por meio da


maternidade, das prendas domésticas e do cuidado com a
família, a dita “mulher de cama e mesa”. E como as mulheres
ocidentais se constroem atualmente? Mediante o estudo e sua
carreira profissional. Elas têm menos filhos, ou os têm mais
tarde, e isso quando os têm, pois a maternidade não é mais
necessária para a construção do feminino. Expressões
machistas como “encalhada” e “ficou para titia” não fazem
mais nenhum sentido atualmente.

Homens

E quanto ao homem? Ele deixou de ser o provedor e o chefe de


família e, consequentemente, perdeu seu poder sobre o destino
de sua companheira. Atualmente, temos inversões dos papéis
tradicionais: mulheres que trabalham e sustentam a família,
enquanto os seus maridos cuidam da casa e dos filhos. Essas
mudanças identitárias não são fáceis de serem absorvidas e
alguns homens e mulheres ainda se questionam e ficam
incômodos com essas novas atribuições.

Nas sociedades contemporâneas, a questão da identidade cultural tem


novas dimensões. Já não criamos pertencimentos com os membros
das sociedades tradicionais, em uma sociedade complexa e
fragmentada como a nossa, pertencemos aos mais variados grupos
cultuais e temos múltiplas identidades (HALL, 1999).

Exemplo
Pertencemos a uma etnia, temos um gênero, uma religião, uma
determinada ideologia política, um hobby, como dança de salão,
pertencemos a um lugar, a uma classe social etc. Criamos uma
identificação com cada um desses grupos culturais. A identidade atual,
além de subjetiva e, consequentemente, construída, é também

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fragmentada, múltipla e, muitas vezes, até contraditória. Quem nunca foi
à missa pela manhã e comungou, depois recebeu um passe em uma
sessão de espiritismo à tarde e incorporou um Orixá em um terreiro de
candomblé à noite?

As identidades culturais também não são fixas, pois não só mudamos


nossos pertencimentos, como também alegamos diferentes identidades
em diferentes situações. Em alguns casos, é possível enfatizar mais o
gênero, a classe social ou o pertencimento étnico. Em uma situação de
violência contra a mulher, sua identidade de gênero vai prevalecer. Já
em caso de injúria racial, será o pertencimento étnico e, diante de
injustiças sociais, prevalecerá o pertencimento de classe e/ou sua
ideologia política.

Mas você deve estar se perguntando: e o que a alimentação tem a ver


com tudo isso?

Pois bem, como você se sente brasileiro? Pelo fato de ter nascido no
Brasil, pela nacionalidade? Com certeza, mas também porque fala
português e tem um código corporal diferente dos europeus, por
exemplo, nós nos tocamos o tempo todo. E à mesa, como você se sente
brasileiro? Comendo feijão com arroz, algo que se come no Brasil inteiro,
do Oiapoque ao Chuí (BARBOSA, 2007).

Aquilo que comemos é uma fonte de pertencimento muito importante.


Como nos ensina DaMatta:

Comida não é apenas uma


substância alimentar, mas é
também um modo, um estilo e um
jeito de alimentar-se. E o jeito de
comer define não só aquilo que é
ingerido, como também aquele que
o ingere.

(DAMATTA,1986)

E as comidas típicas?

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Sul
Se pensamos no sul do Brasil, logo nos vem à mente um
suculento churrasco e um chimarrão.

Norte
Já o Norte nos remete a comidas como pato no tucupi e tacacá.

Nordeste
O Nordeste tanto nos faz pensar em carne de sol com baião de
dois, como em todas aquelas comidas de origem africana.

Nordeste
Ou os com uma conotação religiosa, as comidas de santo
caraterísticas da Bahia: acarajé, vatapá, caruru, xinxim de galinha,
bobó de camarão etc.

Mas essas comidas são consumidas no dia a dia?

De maneira alguma! Geralmente, são consumidas em ocasiões festivas


ou especiais. São preparações que foram escolhidas, de certa forma,

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para representar a identidade cultural daquele lugar. Então, come-se
feijão – das mais variadas cores, segundo o local – com arroz, porque
se é brasileiro, mas o pato no tucupi representa o pertencimento da
região Norte.

Mais do que hábitos e comportamentos alimentares, as cozinhas


implicam formas de perceber e expressar determinado modo ou estilo
de vida particular a determinado grupo. Assim, o que é colocado no
prato serve para nutrir o corpo, mas também sinaliza um pertencimento,
servindo como um código de reconhecimento social (MACIEL, 2005).

A identidade alimentar, assim como as demais, constrói-se


por oposição. Sou brasileiro porque como feijoada e não
insetos fritos. Assim como falo português, e não chinês.
Pensamos sobre nós mesmos e nos reconhecemos como
diferentes a partir do outro, daquele que pertence à outra
cultura (SILVA, 2015).

Chamamos de alteridade essa percepção que temos de nós mesmos


como diferentes a partir da visão que temos dos outros. Ou, como
dizem os antropólogos, do outro, que representa aquela sociedade que
não é a minha. A alteridade se opõe à identidade cultural, ao mesmo
tempo em que é fundamental na sua construção.

O discurso da identidade não se confunde com o discurso das origens


ou uma suposta autenticidade. Vamos pensar na feijoada, um prato que
é reivindicado como um dos maiores representante da nossa identidade
cultural alimentar. O feijão-preto e a mandioca da farofa são nativos das
Américas, mas o porco, a couve, o arroz e a laranja são todos
ingredientes exóticos no sentido literal da palavra, ou seja, aquilo que é
estrangeiro, que não é nativo, mas isso não faz da feijoada um prato
menos brasileiro. Assim como pimentões e os tomates são
característicos da cozinha mediterrânea, mas são nativos das Américas
e somente após as Grandes Navegações apareceram por lá (MACIEL,
2005).

A esse propósito, é curioso o papel da feijoada na construção da


identidade nacional. Reza a lenda que a feijoada é uma invenção dos
escravos a quem eram deixadas somente as partes menos nobres. Esse
mito é difundido mesmo entre pesquisadores importantes sobre o tema.

Câmara Cascudo (2004) já exalta a origem portuguesa da feijoada,


comparando-a com pratos europeus feitos de carnes, legumes e favas,
como os cozidos, o puchero e o cassoulet, este presente desde a
Antiguidade.

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Ele também sinaliza na mesma obra que os escravos comiam de acordo


com as posses do seu senhor, e que muitas das vezes nas fazendas era
um punhado de farinha de mandioca com o caldo e uma laranja
espremida por cima. Entretanto, foi Dória (2009) quem trouxe o tema ao
debate recentemente.

Ele argumenta que os escravos, assim como os indígenas, eram povos


subalternos, considerados coisas, como cabeças de gado, que,
inclusive, viajavam de forma muito mais cômoda que os escravos nos
navios negreiros, ou tumbeiros, como também eram chamados. Eles
não escolhiam o que iam comer, e muito menos criavam pratos.
Classificar as carnes da feijoada com menos nobres também pode ser
um equívoco, já que elas são consideradas iguarias em muitas culturas.
Na França, existe um restaurante chamado Au Pied de Cochon (aos pés
de porco, em tradução livre) que só serve pés de porco das mais
variadas maneiras.

Curiosidade
Esse mito é muito interessante e defende uma causa muito nobre, que é
a importância dos negros na formação da identidade cultural do Brasil.
Entretanto, ele é construído com esse propósito e nega, dessa forma, as
verdadeiras origens da feijoada, que são europeias. Mas, como vimos, a
identidade cultural, por ser construída, é manipulável, que é o caso aqui.
Ela é mutável, como já vimos, bem como é um produto histórico,
produzida também no contato com culturas diferentes.

Comensalidade

Compartilhamento da comida
O que é a comensalidade? Certamente, você tem pelo menos uma ideia
do que isso significa. Segundo Maciel (2011), o fato de comermos
juntos é o que faz com que o ato de se nutrir se torne um evento social.
A palavra companheiro vem do latim cum panem, que significa
compartilhar o pão. Já a comensal vem de cum mensa, que significa
compartilhar a mesa. A comensalidade refere-se àqueles que comem
juntos.

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No entanto, mesmo se não existe uma mesa, existiria comensalidade.
Câmara Cascudo (2004) nos conta que, assim como os indígenas, com
esteiras no chão, os mais pobres também comiam no Brasil colonial.
Luccock (1997), um cronista inglês, chama a atenção para o fato de que,
mesmo em famílias mais abastadas, mulheres e crianças comiam da
mesma forma nas alcovas, a parte íntima da casa. Os orientais também
comem em tapetes, sentados no chão (LIMA; NETO; FARIAS, 2015).

Saiba mais
Desde a Pré-História, os homens já se sentavam em torno de um fogo
comum para comer e conversar. Desde então, sentar-se junto à mesa
sempre foi sinal de boa paz. Durante a Idade Média, quando ainda não
existiam estruturas políticas centralizadas, as refeições tomadas em
conjunto e os banquetes que ocorriam, tanto entre os nobres como
entre os aldeões, eram a melhor forma de se comunicar decisões e
mudanças (ALTHOFF, 1998). Também serviam para fundar e reafirmar
laços sociais, por meio das trocas de refeições festivas. Os grupos
formavam alianças de comprometimento mútuo que regulavam suas
vidas em vários aspectos. Estamos falando da função social da
refeição.

Até os dias atuais, em torno de uma mesa ou em um coquetel, como os


coffee breaks, faz-se todo o tipo de acordo, de aliança e de celebração.
São estabelecidas relações de amizade, amorosas, mas também se
fecham negócios e acordos políticos, nem tão diferente do que
acontecia na Europa na Idade Média.

O clima mais descontraído das refeições festivas e banquetes, no geral,


regados a bebida alcoólica, facilita a conversa mais sincera. Daniel e
Cravo (2015) acreditam que os conchavos políticos se dão também nos
banquetes ou nos coquetéis, e não só nas câmaras ou nos palácios dos
governos. As tribos germânicas discutiam questões importantes
durante os banquetes, mas somente tomavam as decisões no dia
seguinte, quando estavam sóbrios (ALTHOFF, 1998).

Bruxelas, Bélgica. 9 de dezembro de 2019. Ministros das Relações Exteriores no início de uma
reunião com café da manhã.

No entanto, existem exceções a essa regra de estreitar relações sociais


em torno da comida. Os balineses, descritos por Geertz, associam o ato
de se alimentar a algo próximo da animalidade e, para evitar
constrangimentos, comem somente sozinhos.

Atenção!

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Sentar-se à mesa também pode ser uma forma de demonstrar poder e
afirmar hierarquias. Os lugares à mesa demonstram isso. Quanto mais
perto se está do anfitrião, maior a importância do convidado. Em muitas
casas, cada membro da família tem um lugar específico e imutável, que
também afirma a hierarquia dentro da família, com o pai e a mãe
sentados nas cabeceiras da mesa.

Mesmo se a generosidade e paz são pontos importantes quando


comemos juntos, acontece de as festas e os banquetes darem errado
por conta de rixas entre seus membros. Elas podem ser frutos de
problemas que se pretendia justamente resolver com o banquete ou,
como muitos de nós já vimos, brigas e desentendimentos que ocorrem
nas comemorações familiares. Quem nunca teve o peru de Natal
amargo por uma discussão entre aqueles primos que não se cruzam?

O compartilhamento da comida é tão importante que, mesmo em


ocasiões nada festivas, é preciso pensar no cardápio que será oferecido.
Aqui no Brasil, onde ainda se velam os mortos em casa, café e
guloseimas para os presentes são obrigatórios. Nos Estados Unidos,
após a cerimônia de sepultamento, a família sempre oferece uma
refeição aos que estavam presentes.

Atualmente, a comensalidade vem se transformando.

Você consegue fazer refeições com a sua família com frequência? Você
consegue sentar-se à mesa para fazer suas refeições? Quantas vezes
comemos na frente do computador ou da TV? Ou no transporte público
e mesmo na rua? Nós, brasileiros, valorizamos o momento da refeição
em família.

Conforme Barbosa (2007), é a hora de pais e filhos conversarem e dos


laços familiares se estreitarem. Mas será que conseguimos fazer
refeições diariamente em família? Muitas vezes, aos domingos, sim.
Outras somente no aniversário de alguém ou no Natal.

Há também uma tendência da alimentação contemporânea, que é a


individualização. Por conta das rotinas diferentes, do enfraquecimento
da instituição familiar e de uma ideologia individualista, os membros de
uma família, mesmo estando juntos em casa, comem de forma
separada (BARBOSA, 2007).

Haveria uma individualização do momento da refeição, mas também do


seu conteúdo. Na realidade brasileira, mesmo se não se come junto,
pois os horários de cada um são diferentes, a comida é a mesma para

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todos, no geral. Isso porque, como já vimos, no geral, os brasileiros
gostam do momento da refeição em família.

Já não almoçamos em casa com a família, mas a


comensalidade pode ocorrer também de vez em quando
em casa, com amigos e familiares, na casa dos outros, em
restaurantes, nos churrascos etc. (LIMA, 2015). Nosso estilo
de vida, sobretudo nas grandes cidades, faz com que
estejamos sempre correndo, mas a comensalidade toma
novos formatos, mantendo sua função social.

As formas de se comportar à mesa também são muito importantes.


Mesmo se essas regras sociais não fizerem parte das leis, não as
respeitar, ou não as conhecer pode causar muitos problemas. Vamos
supor que você vá jantar com uma pessoa em quem esteja interessado.
Você percebe rapidamente que essa pessoa não só mastiga com a boca
aberta, como também arrota à mesa. Bom, ela pode ser muito
interessante e atraente, mas com certeza esse comportamento vai
esfriar o seu interesse, ou mesmo acabar com ele. Resulta que, se
alguém não sabe se comportar à mesa, certamente será colocado em
uma situação de isolamento social.

Quando nos sentamos para comer em algum lugar fora de casa,


estando ou não acompanhados, involuntariamente observamos o
comportamento dos outros durante a refeição e fazemos julgamentos
de valor sobre sua educação, seu grau de instrução e seu pertencimento
de classe. Vimos que as diferentes classes sociais criam e afirmam
suas diferenças por meio do que se come e de como se come.

A história das regras de


comportamento à mesa está
estreitamente ligada à das boas
maneiras em sociedade.

(ROMAGNOLI, 1998).

Se, atualmente, somente comemos com as mãos sanduíches, lanches,


frutas e algumas preparações como frango à passarinho, comer com as
mãos foi a única forma de comer até pelo menos o século XIV, quando
os talheres eram usados em algumas cidades italianas. Somente no
século XVIII os talheres se popularizaram na Europa, e aqui no Brasil só
quase no século XX.

Curiosidade
No Brasil, era comum – ainda é em alguns locais – o capitão, um
bolinho feito de feijão-de-corda amassado com farinha. Originário do

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Nordeste, era uma comida fácil de ser carregada em pequenas ou
grandes viagens ou levada para a roça. Como foi dito, em muitos lugares
do mundo, ainda se come com a mão (CÂMARA CASCUDO, 2004).

Os modos à mesa na durante os meados da Idade Média na Europa


seriam considerados por nós apavorantes atualmente.

food_bank Os convivas urinavam na sala de jantar, assoavam o


nariz na toalha e não se constrangiam com suas
flatulências, como diz O Livro do Homem Civilizado,
de Daniel de Beccles, um dos primeiros livros sobre
etiqueta que data de aproximadamente o final do
século XII.

food_bank Os pratos, que podiam ser uma fatia de pão, eram


compartilhados, assim com os copos.

food_bank Não existia sequer um local apropriado para a


refeição nos castelos. Uma mesa sobre cavaletes
era trazida para o local escolhido, o que deu origem
ao que falamos atualmente “botar a mesa”. A
preocupação com as boas maneiras à mesa
iniciaram por volta do século XII, em um caminho
que durou vários séculos.

As formas de comer, a ordem dos pratos, aquilo que é considerado


importante ou trivial para a refeição variam de acordo com as diferentes
culturas. No Japão, o que caracteriza a refeição é o arroz, enquanto no
sul da Índia é o pão que cumpre esse papel. Até a temperatura pode ser
importante na definição de uma refeição. Quantas vezes comemos uma
salada, que pode até ser feita de massa, e chegamos ao fim do dia sem
a sensação de ter comido de verdade?

O processo de consumo e até de preparo dos alimentos obedece a


certas regras. Já comentamos sobre como os pratos têm certa ordem
durante a refeição segundo os significados que lhes atribuímos.
Podemos dizer também que esse processo é altamente ritualizado. O
ritual remete a um conjunto de ações que devem ser feitas de maneira
específica para que se atinja dado objetivo.

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O que, quando, onde, por que, a


sequência dos pratos servidos, o
tempo, o modo de preparo, quem
prepara, os acompanhamentos e os
comensais. Esses são elementos
que constituem a ritualização à
mesa e dão os significados a essa
prática social.

(STEFANITTI et al., 2018).

Os rituais religiosos, como, por exemplo, uma missa católica ou uma


iniciação no candomblé, devem seguir um passo a passo
minuciosamente para que o indivíduo saia purificado da missa, ou seja
iniciado no candomblé. O mesmo ocorre à mesa. Para que o comensal
esteja ao final da refeição bem alimentado e feliz, os gestos, a
sequência dos pratos, sua combinação devem ser colocados nos seus
devidos lugares. Como falamos sobre a comida como linguagem, a
frase e o texto serão incompreensíveis se as letras e palavras não
estiverem no lugar certo.

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Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Leia o trecho da música de Gonzaguinha O Preto que Satisfaz


(Feijão Maravilha)

Dez entre dez brasileiros preferem feijão


Esse sabor bem Brasil
Verdadeiro fator de união da família
Esse sabor de aventura
O famoso Pretão Maravilha
Faz mais feliz a mamãe, o papai
O filhinho e a filha.

Essa estrofe faz alusão a quais conceitos respectivamente?

A Comensalidade e modos à mesa.

B Comensalidade e identidade cultural.

C Identidade cultural e modos à mesa.

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D Identidade cultural e comensalidade.

E Identidade social e modos à mesa.

Parabéns! A alternativa D está correta.

Os dois primeiros versos falam sobre a preferência dos brasileiros


em relação ao feijão e como ele é “um sabor bem Brasil”, o que faz
referência à importância do feijão na construção da identidade
cultural do brasileiro. Já a terceira estrofe fala sobre a união da
família ao comerem juntos o feijão, logo refere-se à comensalidade.

Questão 2

Comem muito e com grande avidez e, apesar de embebidos em sua


tarefa, ainda acham tempo para fazer grande bulha. A altura da
mesa faz com que o prato chegue ao nível do queixo; cada qual
espalha seus cotovelos ao redor e, colocando o pulso junto à
beirada do prato, faz com que, por meio de um movimento hábil, o
conteúdo todo se despeje na boca. Por outros motivos além deste,
não há grande limpeza nem boas maneiras, durante a refeição; os
pratos não são trocados, sendo entregues ao copeiro segurando-se
o garfo e a faca em uma mesma mão; por outro lado, os dedos são
usados com tanta frequência como o próprio garfo. (Extraído de
LUCCOCK, J. As refeições no Rio de Janeiro, princípio do século
XIX. In: CÂMARA CASCUDO, L. Antologia da Alimentação no Brasil.
Rio de Janeiro: Livros Técnico e Científicos, 1977)

O trecho cima refere-se:

A à relação entre gênero e alimentação.

B aos modos à mesa.

C à construção social do gosto.

D às comidas afetivas.

E à construção social do sabor.

Parabéns! A alternativa B está correta.

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O cronista está claramente falan do da forma como os brasileiros
se comportam à mesa.

3 - Significados simbólicos
Ao final deste módulo, você será capaz de reconhecer os significados simbólicos nas práticas
de alimentação.

Comida afetiva e memória gustativa

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Os sentimentos atrelados ao alimento

O que são as comidas afetivas?

De acordo com Garcia (1997), sabemos que a comida, por ter como
ponto de partida o universo doméstico de cada um, tem significados
afetivos. Mesmo os mais desgarrados têm lembranças relacionadas a
momentos de refeições em família e/ou de pratos para ocasiões
especiais ou para o almoço de domingo que eram feitos por uma tia ou
uma avó.

A história pessoal ilustra bem a questão das comidas


afetivas e da memória gustativa. Essa memória é aquela
que surge muitas vezes involuntariamente quando
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sentimos um gosto ou um cheiro que nos remete ao


passado (CORÇÃO, s.d.). Por um instante, aquela sensação
nos faz voltar a um momento familiar e promove uma
verdadeira viagem no tempo. Viagem para o acolhimento
que proporciona uma refeição em família ou o carinho
gostoso que foi feito só para agradar.

Na atualidade, podemos nos perguntar que memórias serão guardadas


das comidas afetivas no futuro e quem vai saber fazer as receitas de
família. Com a correria do dia a dia, a mãe ou a avó não tem mais tempo
para cozinhar para a família. Então, elas lançam mão de todo os
aparelhos eletrônicos, de comidas prontas e semiprontas, comidas
delivery e tudo que possa facilitar suas vidas e alimentar as famílias.
Ora, sabemos que, em um país como o Brasil, que tem uma
desigualdade enorme, muitas mulheres passam seu tempo de folga
cozinhando o trivial para a família se alimentar quando ela está ausente.

Nesses casos, aquela receita especial da família será talvez perdida. Se


considerarmos que as tradições culinárias de um povo são
fundamentais para a sua identidade cultural, esse saber fazer torna-se
um patrimônio imaterial daquela sociedade. Já temos desde o ano de
2000 um livro de Registro de Patrimônios Imateriais do IPHAN, do
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Até então,
somente se podia tombar patrimônios culturais materiais.

Curiosidade
O modo tradicional de fazer o acarajé baiano foi o primeiro inscrito
nesse livro em 2005. O esforço para cozinhar e transmitir receitas para
os seus descendentes é uma maneira de preservar as tradições e a
identidade cultural não somente de uma família, mas de um povo.

Fique atento às receitas da família e, se puder, faça um livro de receitas.


Um membro da família que vem a falecer sem ter transmitido esses
saberes é como um livro de receitas afetivas que se queima.

Por outro lado, essa perda de receitas vem se juntar a outra teoria sobre
a alimentação contemporânea, a homogeneização do gosto. Esta teoria
diz que, em um contexto de alto consumo de produtos industrializados e
comidas prontas, há uma tendência à pasteurização ou à
homogeneização do gosto. Todas as salsichas de uma lata têm o
mesmo gosto, assim como todos os iogurtes daquele sabor e marca e
todos os biscoitos de um pacote. As lasanhas e pizzas prontas, as latas
de feijoada, igualmente.

Essa realidade não se aplica ao caso brasileiro. Mesmo que haja um


aumento no consumo de produtos industrializados, ainda temos o
hábito de comprar os ingredientes e fazer a comida em casa, na medida
do possível. Nós, no sentido contrário da pressão que a indústria e suas
publicidades fazem, ainda temos uma gramática tradicional da refeição:
arroz, feijão, alguma proteína e algum legume ou verdura. Mesmo se
comermos fora, vamos buscar na maior parte das vezes um PF – prato

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feito – em um botequim ou uma comida mais caseira em um
restaurante a quilo.

A construção do gosto

Tipos de gosto
O gosto é algo bastante complexo. Já houve diferentes teorias sobre
como ele funciona fisiologicamente. A tese do mapa de língua durou do
século XIX até o século XX. Segundo ela, diferentes regiões da língua
sentiam diferentes gostos, mas ela já foi desacreditada.

O gosto se dá em uma interação entre as substâncias do que estamos


comendo e os botões gustativos que cobrem a língua e o palato mole.
Além dos sabores que já conhecemos, doce, salgado, amargo e azedo,
temos o umami e o alcaçuz.

O umami, um sabor definido pelos japoneses, está presente no peixe, no


tomate e no queijo parmesão, mas ele não tem uma equivalência na
nossa cultura alimentar, o que faz com que ele seja muito difícil de
descrever (MARQUES, 2015). Já o alcaçuz é uma raiz de sabor forte
com a qual se faz um doce comum na Europa e, na verdade, é outro
nome da planta regaliz.

Saiba mais
No Portal Umami, há um passo a passo que ensina como reconhecer o
sabor do umami.

Atualmente, já se sabe que o sabor envolve o gosto, mas também os


estímulos do cheiro, a percepção das formas e a sensação tátil na boca
(Id.). Comemos com os olhos também. Além de ser o principal
determinante das escolhas alimentares, o gosto também tem uma
determinação genética. Há estudos que falam que até 40% do paladar
seria geneticamente determinado. Então, sim, a couve é mais amarga
para uns do que para outros, e o gosto do alho e do café também
mudam (DONAHUE, 2018).

O gosto vai além do dado fisiológico. Ele é culturalmente construído.


Aprendemos a comer determinadas coisas, certas misturas desde

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pequenos, e vamos nos habituando a elas, mas o gosto também tem um
componente que é totalmente pessoal.

Gênero e alimentação

Relações e o ato de se alimentar


As relações entre gênero e alimentação são velhas conhecidas de todos
nós. A mulher sempre foi aquela, desde a Pré-História, que cuida e
prepara o alimento. Entre dois e quatro milhões de anos atrás, os
homens teriam inventado a divisão sexual do trabalho. Enquanto os
homens caçavam, as mulheres coletavam, cozinhavam e cuidavam das
crianças (CARNEIRO, 2003).

Mesmo que muita coisa tenha mudado desde então, as mulheres


continuam sendo as detentoras dos saberes sobre as práticas
culinárias. Já falamos sobre as receitas, um patrimônio imaterial, e
como são transmitidas sobretudo entre mulheres. Durante muito tempo,
a cozinha foi considerada, e continua sendo atualmente, um território
feminino.

As tarefas domésticas Demerteco (2015)


cotidianas das analisa livros e
mulheres foram durante cadernos de receita de
muito tempo a maior Curitiba na primeira
fonte de construção das metade do século XX.
identidades de gênero
femininas. No entanto, Ela comenta que as
esse trabalho ainda é próprias mulheres
desvalorizado e visto close consideravam esses
como algo repetitivo e trabalhos como pouco
monótono. Mesmo nos importantes, mas se
dias atuais, com as sentiam orgulhosas de
mulheres trabalhando preparar comidas
em tempo integral, elas saborosas para sua
ainda realizam a maior família.
parte das tarefas
domésticas.

Assunção (2013) fez seu trabalho sobre alimentação e relações


familiares no Morro do Caixa, uma comunidade que fica na cidade de
Tubarão, em Santa Catarina. Em um primeiro momento, as mulheres não
conseguiam compreender o porquê do interesse da pesquisadora em
um tema tão banal. O que sugere, a princípio, que esse assunto não é
importante, a mesma forma de pensar de outras mulheres 50 anos

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antes. Para as mulheres desse lugar, o cozinhar só faz sentido se a
comida é feita para outra pessoa. Conhecer as receitas e as
preferências alimentares dos membros da família confere a essas
mulheres certo poder.

No entanto, enquanto as mulheres ficam com a barriga no fogão, o


glamour da cozinha fica para os grandes chefs, que são, na sua maioria,
homens. Quando o assunto é cozinhar para a família cotidianamente, a
tarefa é monótona e repetitiva, mas, quando se trata de usar a
criatividade, aí é a vez dos homens.

Dória (2012) nos conta que, já na Idade Média, a divisão tradicional do


trabalho foi mudando. Na França, a preparação de alimentos vai sendo
passada para os homens. Claro que eles trabalham na rua vendendo
seus produtos, como os padeiros, os que fazem frios como presunto
etc.

No século XIX, surge a figura do chef, profissão destinada aos homens,


obviamente. Se temos atualmente chefs mulheres famosas, os maiores
entre eles seguem sendo homens. Na Idade Moderna, os homens são
os cozinheiros dos nobres, e são os que vão trabalhar nos restaurantes
que surgem. Até os livros de culinária são escritos por eles.

Atenção!
O profissional da área de Nutrição deve ficar atento e sempre procurar
ter interlocução privilegiada com as mulheres da família, pois ainda são
elas que, na maior parte das vezes, ocupam-se da alimentação da
família.

Outra questão relativa ao gênero é que as mulheres são as que tomam


as decisões em casa sobre o que se vai comer. Mas, no poder público,
são sub-representadas, sendo os homens que tomam todas as decisões
sobre as políticas relacionadas aos alimentos, que dizem respeito
diretamente às mulheres (COELHO, 2005).

Vamos terminar esta seção falando de enfermidades que são


culturalmente localizadas e que afetam sobretudo as mulheres: os
Transtornos do Comportamento Alimentar (TCA).

Esses transtornos estão ligados à autoimagem e se


traduzem pelo medo excessivo de engordar. Eles se
desenvolvem sobretudo em mulheres jovens. Mesmo se
essas doenças já existiam, sua incidência tem aumentado
muito (OLIVEIRA; HUTZ, 2010).

Há uma perversão em relação aos padrões de beleza do corpo feminino.

Idade Média Atualmente

Na Idade Média e na Atualmente, quando há


Renascença, a excesso de alimentos,

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opulência corporal era pelo menos em uma
sinônimo de opulência grande parte da
econômica, e o corpo população o corpo belo
mais robusto era o mais é o corpo magro. A
belo. Nessa época, os close mulher magra é
mais pobres tinham disciplinada, sabe se
muitas dificuldades em cuidar; enquanto as
comer de forma obesas sofrem
conveniente, logo eram preconceito e são
magros e considerados consideradas relaxadas,
feios. sem força de vontade.

Como vimos, o sujeito é responsabilizado pela sua doença, em


desconsideração a todos os demais fatores, e “só é gordo quem quer”
(KRAEMER et al., 2014). Enquanto a indústria da beleza impulsiona a um
ideal corporal que sequer existe, pois muitas das imagens são
manipuladas, a indústria alimentar faz produtos cada vez mais
calóricos, gordurosos e deliciosos.

Atenção!
Os TCA são doenças graves, muitas vezes fatais, e que podem deixar
sequelas. Podem fazer adoecer toda uma família, tal qual a dependência
química. São problemas que têm um componente cultural muito forte e
que são muito influenciados pela mídia.

Comida e sexo

O prazer associado à alimentação


Em muitas línguas, o vocabulário relativo ao sexo e à alimentação se
assemelha. Desde a inocente lua de mel até o se lambuzar no ato
sexual, as associações são muitas. Aqui no Brasil, o verbo comer refere-
se também à cópula, passando pelo “gostoso(a)”.

O vocabulário amoroso se entrelaça


constantemente com o
gastronômico [...] implícito nas
expressões “pele de pêssego”,
“olhos amendoados” ou “cor de
avelã”, “boca de cereja”, “lábios
polpudos”, “formas apetitosas”, sem
esquecer a “lua de mel” que, tantas

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vezes, acaba com o “caldo


entornado”.

(NASCIMENTO apud AZEVEDO, 2017).

Não podemos esquecer as mais variadas mulheres frutas aqui no Brasil,


que reforçam a associação entre sexo e comida, o primeiro é
fundamental para a sobrevivência da espécie e o outro imprescindível
para a sobrevivência do indivíduo. Duas necessidades banais e
essenciais que estão do lado da reprodução biológica. Os dois polos do
prazer e do desejo. Talvez por isso mesmo tenhamos inventado um
enorme edifício simbólico para significar ambos com uma séria de
regras, valores, crenças, preferências, rejeições, medos.

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Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Sabores de infância: a comida que lembra os tempos de criança.


Quando levou à boca a primeira garfada de “ratatouille” – um
refogado de vegetais tradicional da França – o crítico gastronômico
Anton Ego até se esqueceu de que estava ali, à mesa, para avaliar o
restaurante que acabava de lhe servir aquele prato. De repente,
aquele sabor fez o mundo parar, e ele pôde se sentir novamente o
menino que, depois das brincadeiras, chegava em casa para a
refeição, ganhava um afago da mãe e comia o “ratatouille” feito por
ela com amor. De repente, ele não era mais um adulto ranzinza; era
o garoto protegido pelos carinhos culinários da mãe. Fonte: Acervo
Museu da Pessoa.

O texto acima faz referência a qual conceito?

A Construção social do gosto.

B Função social da refeição.

C Memória gustativa.

D Real da alimentação.

E Memória social.

Parabéns! A alternativa C está correta.

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A memória gustativa é justamente quando um sabor nos traz
alguma lembrança forte.

Questão 2

Ofício das Baianas de Acarajé:

“Este bem cultural de natureza imaterial, inscrito no Livro dos


Saberes em 2005, é uma prática tradicional de produção e venda,
em tabuleiro, das chamadas comidas de baiana, feitas com azeite
de dendê e ligadas ao culto dos orixás, amplamente disseminadas
na cidade de Salvador, Bahia. Dentre as comidas de baiana,
destaca-se o acarajé, bolinho de feijão-fradinho preparado de
maneira artesanal, na qual o feijão é moído em um pilão de pedra
(pedra de acarajé), temperado e, posteriormente, frito no azeite de
dendê fervente. Sua receita tem origens no Golfo do Benim, na
África Ocidental, tendo sido trazida para o Brasil com a vinda de
escravos dessa região.” Fonte: IPHAN.

O ofício das Baianas de Acarajé foi o primeiro Patrimônio Cultural


Imaterial a ser inscrito no Livro dos Saberes. Por que ele tem esse
status?

Porque o acarajé é uma comida afetiva para a maior


A
parte dos baianos.

Porque o acarajé é uma comida religiosa para a


B
população da Bahia.

Porque o acarajé faz parte das tradições e constrói


C
a identidade cultural dos baianos.

Porque o acarajé faz alusão à construção do gênero


D
feminino.

Porque o acarajé faz alusão à construção do gênero


E
masculino

Parabéns! A alternativa C está correta.

O que faz com que algo que faça parte da cultura material ou
imaterial seja considerado um patrimônio cultural é sua importância
nas tradições e na identidade cultural de um povo.

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Considerações finais
Neste conteúdo, vimos os aspectos simbólicos da alimentação e como
não podemos pensar os alimentos somente em termos de nutrientes,
fora do contexto social e cultural no qual eles se encontram. O
nutricionista deve sempre estar atento aos múltiplos significados que
seus pacientes ou seu público-alvo dão aos alimentos, sob pena de não
ser um profissional ético e competente.

Vimos no módulo 1 que, além do aspecto real, que diz respeito às


caraterísticas nutricionais e organolépticas dos alimentos, os grupos e
indivíduos moldam seus hábitos alimentares segundo o imaginário
simbólico construído pela sua sociedade. O que comer, quando, com
quem, antes de que, depois de que, preparado por quem são
consequências desses significados simbólicos que os homens atribuem
aos alimentos.

Vimos no módulo 1 que, além do aspecto real, que diz respeito às


caraterísticas nutricionais e organolépticas dos alimentos, os grupos e
indivíduos moldam seus hábitos alimentares segundo o imaginário
simbólico construído pela sua sociedade. O que comer, quando, com
quem, antes de que, depois de que, preparado por quem são
consequências desses significados simbólicos que os homens atribuem
aos alimentos.

No módulo 2, observamos como a alimentação é fonte de


pertencimento e de identificação. Discutimos também sobre como o
fato de se sentar junto à mesa estabelece e reforça os mais variados
vínculos entre os comensais. Discutimos igualmente sobre as
mudanças que estão ocorrendo na comensalidade atualmente e como
os modos à mesa são regras muito importantes que regem a forma de
se abordar o alimento e de se comportar em uma refeição.

No módulo 3, vimos os significados das práticas de alimentação sob


vários aspectos. Falamos sobre como o ato de comer desperta em nós
diversos afetos; como certas comidas nos remetem a situações e
memórias, como elas são parte da nossa história. As receitas e os
modos de fazer comida de uma família são parte do patrimônio
imaterial daquele povo, por isso, deveríamos tentar não perder as
receitas de família e o hábito de cozinhar juntos. Nestes tempos, em que
corremos tanto e mal temos tempo de comer, quanto mais de cozinhar e
ensinar, é necessário um esforço para mantermos esse patrimônio.

Seguimos com a construção do gosto e suas variadas facetas e, depois,


tratamos da discussão sobre gênero e alimentação e o quanto é a
mulher que efetivamente se ocupa da alimentação e da saúde da
família, sendo assim a melhor interlocutora do nutricionista.

Fechamos discorrendo sobre as associações entre comida e sexo e


como esses dois polos do prazer humano tão necessários à nossa

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sobrevivência deram origem a tantos significados distintos.

headset
Podcast
No podcast a seguir, veremos um breve resumo sobre o tema.

Explore +
Pesquise na internet e assista aos seguintes documentários:

Programa Multiponto Alimentação, Cultura e Identidade, que se


encontra no site do repositório digital da UFRGS.

Comida e Afetos reunidos em um documentário, produzido pelo portal


de jornalismo da ESPM.

Comida como cultura, uma reportagem especial que faz parte de um


projeto desenvolvido no município de Peritiba, que resgata culturas e
modos de vida.

Leia as indicações:

DÓRIA, C. Flexionando o gênero: a subsunção do feminino no discurso


moderno sobre o trabalho culinário. Cadernos Pagu (39):251-271, 2012.

KRAEMER, F. et al. O discurso sobre a alimentação saudável como


estratégia de biopoder. Rio de Janeiro: Physis Revista de Saúde
Coletiva, 24 (4): 1337-1359, 2014.

Referências
ALTHOFF, G. Comer Compromete: refeições, banquetes e festas. In:
FLANDRIN, J.; MONTANARI, M. (org.). História da Alimentação. 2. ed.
São Paulo: Estação Liberdade, 1998. p. 300-310.

ASSUNÇÃO, V. Comida de mãe: notas sobre alimentação e relações


familiares. In: XXVI Reunião Brasileira de Antropologia, 2013, Porto

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Seguro, Bahia, Brasil.

AZEVEDO, E. Alimentação, sociedade e cultura: temas contemporâneos.


Sociologias, Porto Alegre, ano 19, n. 44, , p. 276-30 jan/abr 2017.
Consultado em: 01 set. 2020.

BARBOSA, L. Feijão com arroz e arroz com feijão: o Brasil no prato dos
brasileiros. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 13, n. 28, p. 87-
116, jul./dez. 2007.

BOOG, M; ALVES, H. Representações sobre o consumo de frutas,


verduras e legumes entre fruticultores de zona rural. Rev. Nutr.,
Campinas, 21(6):705-715, nov./dez., 2008.

BUENO, E. Brasil: uma história. Cinco séculos de um país em


construção. Rio de Janeiro: Leya, 2012.

CÂMARA CASCUDO, L. História da Alimentação no Brasil. São Paulo:


Global, 2004.

CARNEIRO, H. Comida e Sociedade: Uma História da Alimentação. 6.ed.


Rio de Janeiro: Elsevier, 2003.

COELHO, C. História e Antropologia da Nutrição. Rio de Janeiro: SESES,


2015.

COIMBRA, C. Estudo de Ecologia Humana entre os Suruí do Parque


Indígena Aripuanã, Rondônia. Aspectos Alimentares. Boletim do Museu
Paraense Emílio Goeldi, série Antropologia 2(1) 57-87, 1985.

CORÇÃO, M. Memória gustativa e identidades: de Proust à Cozinha


Contemporânea. Disponível em
http://www.historiadaalimentacao.ufpr.br/grupos/textos/memoria_gustativa
. Acesso 03 abr. 2015.

CULTURA e Gastronomia. Dossiê Cultura e Gastronomia. Cult. São


Paulo, 198,16-18, fev. 2015.

DA MATTA, R. O que faz o brasil, Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 1986.

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CANESQUI, A. M.; GARCIA, R. W. D. (Org). Antropologia e Nutrição: Um
diálogo possível. Rio de Janeiro: ABRASCO, 2005.

DEMERTECO, S. De mãe para filha: livros e cadernos de recitas


familiares testemunham hábitos e afetos femininos em torno da
cozinha. Revista de História da Biblioteca Nacional. Decifrando o ato de
comer. Ano 10, 115, 34-35, abril 2015.

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