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Comarca de Porto Alegre

Vara Cível do Foro Regional Tristeza


Avenida Otto Niemeyer, 2000
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Processo nº: 001/1.13.0190326-5 (CNJ:.0008321-53.2013.8.21.6001)


Natureza: Indenizatória
Autor: Pontal Sul Comércio de Artigos Esportivos Ltda
Réu: WMS Supermercados do Brasil Ltda
Juiz Prolator: Juíza de Direito - Dra. Luciana Torres Schneider
Data: 22/09/2015

Vistos etc.

PONTAL SUL COMÉRCIO DE ARTIGOS ESPORTIVOS LTDA.


ajuizou ação de indenização em desfavor de WMS SUPERMERCADOS DO
BRASIL LTDA.. Relatou manter, desde 13/11/2007, contrato de locação
comercial com o réu de um espaço situado no supermercado “BIG Zona Sul”
e que teve dificuldades em adimplir os últimos aluguéis. Salientou que, por
causa disso, o réu, em 12/07/2013, suspendeu o fornecimento de energia
elétrica para sua loja, o que entende ser abusivo. Salienta que o locador
rateia essa despesa e controla o medidor, que é único. Ao final, requereu,
inclusive liminarmente, que o réu promova o imediato restabelecimento do
fornecimento da luz elétrica, e, ao fim, a condenação do réu ao pagamento
de indenização por danos materiais (lucros cessantes) e morais sofridos em
razão do corte de energia. Pediu a AJG. Juntou procuração (fl.14) e
documentos.

A AJG restou deferida e a petição inicial foi indeferida (fl.37).

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Em sede recursal, a liminar foi deferida (fl.48), e, posteriormente,
a decisão que indeferiu a petição inicial foi reformada (fls.63-6).

Citado, o demandado contestou (fl.92). Informa que o requerente


está inadimplente por tempo considerável, o que já importa em um débito
superior a R$ 114.000,00, tanto de aluguéis, quanto dos demais encargos da
locação, dentre eles o seu consumo de energia elétrica. Aduziu que o autor
optou por utilizar o sistema de rateio da luz, desde o início da relação
contratual e que, se tivesse medidor próprio, a concessionária de energia já
teria interrompido o fornecimento de luz em razão do inadimplemento do
autor. Observou que o corte no fornecimento de energia elétrica ocorreu em
razão do inadimplemento do autor, pois além de não receber os alugueres,
tem que pagar à concessionária a energia elétrica por ele consumida,
aumentando o seu prejuízo e dos demais cotistas. Observou não ter agido
abusivamente. Ao final, requereu a improcedência da ação. Juntou
procuração (fls.89-91) e documentos.

Sobreveio réplica (fl.112).

O pedido de produção de prova oral foi indeferido (fl.123).

É O RELATÓRIO. PASSO A DECIDIR.

De início observo que não foram relatadas e não serão analisadas


as questões sobre o atraso da entrega da obra havido em 2007 e os
assaltos no local, porquanto, embora terem sido mencionados na exordial,
em nada se referem com o pedido final, que é de indenização material e
moral pelo corte de luz havido em razão do inadimplemento dos alugueres
pela parte autora.

O caso concreto, além das normas civis vigentes, está sob a


égide da Lei 8.245/91, que regulamenta as locações dos imóveis urbanos e
seus procedimentos.

E a responsabilidade civil vem disposta no art. 186 do CC, in

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verbis: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito.”

Sendo o ato ilícito o conjunto de pressupostos da


responsabilidade, necessária se faz a presença de três elementos para a
configuração do dever de indenizar, o qual vem insculpido no art. 927 do
atual diploma civil. Há um elemento formal, qual seja a violação de um dever
jurídico mediante conduta voluntária; um elemento subjetivo, que pode ser o
dolo ou a culpa; e, ainda, um elemento causal-material, correspondente ao
dano e à respectiva relação de causalidade.

Restou incontroverso que o réu promoveu o corte de luz no


estabelecimento da empresa autora em razão do inadimplemento dos
alugueres e demais encargos da locação, dentre eles o seu próprio consumo
de energia elétrica.

É induvidoso, como constou no acórdão, que a inadimplência do


inquilino não traz ao locador o direito de cortar a luz, conduta que, aliás, bem
se adequa ao conceito de 'fazer justiça com as próprias mãos', o que é
vedado no nosso ordenamento jurídico, sendo inclusive tipificada
penalmente (art. 345 do CC).

Nesse sentido:
“AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO. ORDEM JUDICIAL QUE
DETERMINA QUE O LOCADOR SE ABSTENHA DE PROVIDENCIAR O CORTE DE LUZ DA
INQUILINA INADIMPLENTE, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA. AS SANÇÕES PELO
DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL SÃO AS CONTRATUAIS E LEGAIS, NÃO PODENDO O
LOCADOR PROVIDENCIAR O CORTE DE LUZ, SOB PENA DE PRATICAR CONDUTA ILEGAL E
ABUSIVA. AGRAVO DESPROVIDO EM DECISÃO MONOCRÁTICA. (Agravo de Instrumento Nº
70010649515, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Angelo Maraninchi
Giannakos, Julgado em 27/12/2004)”.

E, por força disso, em face a inadimplência do inquilino, resta ao


locador se valer do contrato e da legislação aplicável à espécie, e promover

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o despejo e a cobrança dos alugueres e demais encargos da locação.

Assim, pois, é de ser mantida a liminar para o fim de manter o


fornecimento de energia elétrica para a loja da autora, proibindo o réu de
realizar novo corte.

No que toca a pretensão indenizatória, é de ser dito que o caso é


de culpa concorrente, o que afasta a possibilidade de indenização, seja por
dano moral ou material.

Isso porque o corte de energia elétrica sofrido pelo autor


decorreu da sua própria conduta, que está inadimplente há muito tempo, o
que acarreta em severo prejuízo ao réu e demais condôminos, que são
obrigados a suportar o ônus do seu descaso.

Vale dizer que, levando em conta o valor da dívida (incontroversa,


diga-se, pois não refutada pelo autor em réplica), que era de R$ 114.000,00
em 06/2014, e o valor do aluguel, que era de R$ 2.500,00, já incluso o valor
da energia (fl.114), é de se crer que a inadimplência do autor já perdurava,
no mínimo, por mais de 2 anos, pois há que se levar em conta o encargos de
inadimplência (cláusula n° 16 do contrato – fl.20).

Nesse passo, por mais que o réu não tivesse o direito de cortar a
luz do autor em razão da sua inadimplência, se tal trouxe algum prejuízo ao
autor, induvidoso que tal adveio da sua própria desleixo, em não pagar os
alugueres e a luz que consumia por mais de 2 anos, o que, é, a toda
evidência, um ato profundamente abusivo da sua parte, razão pela qual não
pode lhe trazer benefícios, pois estaria ser beneficiando da sua própria
torpeza.

Não é demais lembrar que o lucro cessante consiste na chance


perdida de auferir vantagem econômica, ou, “perda do ganho”, pelo que
ditam os arts. 402 e seguintes do CC. E, assim, o pleiteante deve provar a
perda do lucro e a redução patrimonial, o que não se pode presumir.

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O que, no caso concreto, o autor não logrou fazer. Isso porque o
requerente não acostou o seu faturamento antes e depois do corte de luz,
motivo pelo qual não se pode ter qualquer indício de que houve queda nas
suas vendas após o ato da parte ré.

Nesse sentido:
“RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COMPRA DE
CASA PRÉ-FABRICADA. ATRASO NA ENTREGA. DANOS MATERIAIS E LUCROS CESSANTES.
DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. (…). A indenização pela perda de uma chance de locação
do imóvel reclama a comprovação incontroversa de que o lesado teve uma interrupção de um fato
vantajoso que estava em curso, sendo insuficiente à sua configuração, apenas uma mera
probabilidade de ocorrência de fato vantajoso ao sujeito. (…). Negativa de seguimento à apelação do
autor. Apelação da ré provida em parte. (Apelação Cível Nº 70053042636, Décima Câmara Cível,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcelo Cezar Muller, Julgado em 08/04/2013)”.

Isso posto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação movida


por PONTAL SUL COMÉRCIO DE ARTIGOS ESPORTIVOS LTDA. em
desfavor de WMS SUPERMERCADOS DO BRASIL LTDA., para MANTER a
LIMINAR para o fim de vedar ao réu que realize novo corte no fornecimento
de energia elétrica para a loja da autora.

Diante da sucumbência recíproca, ambas as partes pagarão as


custas processuais 'pro rata' e arcarão com os honorários advocatícios do
patrono da parte adversa, fixados em R$ 700,00, na forma do art. 20, § 4º,
do CPC, considerando o tempo e o labor despendidos pelos causídicos.
Suspendo, por ora, a exigibilidade do pagamento que toca ao autor, ante a
concessão da AJG.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Porto Alegre, 22 de setembro de 2015.


Luciana Torres Schneider,
Juíza de Direito

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