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Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão

PJe - Processo Judicial Eletrônico

25/08/2023

Número: 0800538-11.2022.8.10.0102
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
Órgão julgador: Vara Única de Montes Altos
Última distribuição : 18/05/2022
Valor da causa: R$ 20.000,00
Assuntos: Fornecimento de Energia Elétrica
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? SIM
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM
Partes Procurador/Terceiro vinculado
CANDIDA RODRIGUES MORAIS (AUTOR) RAMON OLIVEIRA DA MOTA DOS REIS (ADVOGADO)
EQUATORIAL MARANHÃO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA LUCIMARY GALVAO LEONARDO GARCES (ADVOGADO)
S/A (REU) THAINARA RIBEIRO GARCIA (ADVOGADO)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
99712 22/08/2023 17:46 Sentença Sentença
941
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO MARANHÃO
COMARCA DE MONTES ALTOS

Proc. n. 0800538-11.2022.8.10.0102
AUTOR: CANDIDA RODRIGUES MORAIS
Advogado/Autoridade do(a) AUTOR: RAMON OLIVEIRA DA MOTA DOS REIS - MA13913-A
REU: EQUATORIAL MARANHÃO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S/A

Advogados/Autoridades do(a) REU: LUCIMARY GALVAO LEONARDO GARCES - MA6100-A,


THAINARA RIBEIRO GARCIA - MA14986-A

SENTENÇA

Trata-se de demanda ajuizada por Cândida Rodrigues Morais em face de Equatorial


Maranhão Distribuidora de Energia Elétrica S.A., alegando que foi surpreendida ao receber
uma fatura em valor exorbitante, referente ao mês de 08/2018, relativa a um suposto consumo
não registrado ( R$ 640,48).

Informa a autora que, no ato de notificação, não lhe foi esclarecida a origem do débito e, ainda,
que no período mencionado na fatura sequer residia no endereço.

Sustenta, ainda, que as faturas referentes ao seu padrão de consumo registram valores bem
inferiores.

Por esse motivo, postula a declaração de inexistência dos mencionados débitos, bem como a
condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais.

Liminar deferida.

Citada, a ré rebateu os argumentos do autor sustentando que compareceram na conta contrato


da parte autora para realizar uma inspeção de praxe, e naquela ocasião foi detectada
uma irregularidade no medidor; a unidade de consumo foi encontrada com desvio de energia
antes da medição, razão pela qual não foi realizada perícia; em razão da irregularidade
encontrada na conta contrato, foi formatado um processo administrativo no qual foi constatado
que, durante o período, o imóvel estava sendo abastecido de energia de forma irregular e sem a
devida contraprestação, sendo ao final gerada a fatura no valor de R$ 3.793,95, referentes ao
consumo não registrado durante todo o período da irregularidade; e, inexistem elementos que
justifiquem sua condenação em danos morais.

A parte autora não apresentou réplica à contestação.

Instadas à especificação de provas, apenas o réu requereu a realização de audiência.

Autos conclusos para julgamento.

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FUNDAMENTAÇÃO

Dispõe o art. 355, inciso I, do Código de Process0 Civil, que o juiz conhecerá diretamente do
pedido, proferindo sentença, quando não houver necessidade de produção de outras provas.

Na situação em apreço, todos os elementos necessários ao deslinde da controvérsia já se


encontram nos autos, de sorte que nada acrescentaria a produção de provas em audiência, o que
permite o julgamento do feito no estado em que se encontra.

Aliás, é firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que compete às


instâncias ordinárias exercer juízo acerca da necessidade ou não de dilação probatória, haja vista
sua proximidade com as circunstâncias fáticas da causa. Na linha desse entendimento, confiram-
se, entre outros, os seguintes julgados: AgRg no REsp 762.948/MG, Rel. Min. Castro Filho, DJ
19.3.07; AgRg no Ag 183.050/SC, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, DJ 13.11.00; REsp
119.058/PE, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 23.6.97.

Esclareça-se que se aplica à hipótese o Código de Defesa do Consumidor, nos termos do seu
artigo 22. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica acerca da incidência do
diploma consumerista às empresas concessionárias prestadoras do serviço de fornecimento de
energia elétrica, conforme abaixo dispostos:

Art. 22, CDC. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas,


concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de
empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes,
seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM


RECURSO ESPECIAL. FORNECIMENTO DE ÁGUA. RELAÇÃO DE
CONSUMO. APLICAÇÃO DO CDC. VIOLAÇÃO DO HIDRÔMETRO NÃO
COMPROVADA. PRETENSÃO DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-
PROBATÓRIO. NÃO CABIMENTO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO
PROVIDO. 1. "A jurisprudência desta Corte possui entendimento pacífico no
sentido de que a relação entre concessionária de serviço público e o usuário
final, para o fornecimento de serviços públicos essenciais, tais como água e
energia, é consumerista, sendo cabível a aplicação do Código de Defesa do
Consumidor" (AgRg no AREsp 354.991/RJ, Rel. Min. MAURO CAMPBELL
MARQUES, Segunda Turma, DJe 11/09/2013). 2. O Tribunal a quo
entendeu que não houve violação no hidrômetro. Para afastar a conclusão
adotada pelas instâncias ordinárias, necessária seria a incursão no conjunto
fático-probatório dos autos, o que é inviável ao Superior Tribunal de Justiça,
diante do óbice contido no verbete sumular 7/STJ. 3. Agravo regimental não
provido. STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO
ESPECIAL : AgRg no AREsp 372327 RJ 2013/0229838-8.

Em se tratando de relação de consumo, portanto, toda a prova produzida deve ser analisada à
luz do CDC, levando-se em consideração o caráter de hipossuficiência do consumidor em relação
à fornecedora de serviços.

DO SUPOSTO CONSUMO NÃO REGISTRADO

O conjunto probatório demonstra, de modo irrefutável, a cobrança no valor de R$ 640,48,


referente a um suposto consumo não registrado, apurado em procedimento administrativo
realizado pela ré.

A pretensão da autora está ancorada, em síntese, na alegação de que funcionários da ré

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realizaram inspeção na Conta Contrato do autor e que, após, teria recebido a fatura questionada,
correspondente a consumo não registrado.

Da análise dos autos verifica-se que não foi realizada perícia técnica obrigatória junto ao órgão
competente, para apuração do suposto consumo não registrado. Sendo todo procedimento
realizado de forma unilateral pela ré.

A requerida alega, em sede de contestação, que a referida perícia foi dispensada em razão da
constatação de existência de desvio antes da medição.

Contudo, a parte requerida não indica qualquer documentação administativa capaz de comprovar
a realização da vistoria na unidade de consumo, ou seja, nos autos não existem provas da
realização da perícia adequada.

O artigo 114 da Resolução414/2010, diz: "Art. 114. Caso a distribuidora tenha faturado valores
incorretos por motivo atribuível ao consumidor, devem ser observados os seguintes
procedimentos: (...) II - faturamento a menor: providenciar a cobrança do consumidor das
quantias não recebidas". No entanto, da análise dos autos, não ficou demonstrado que a parte
demandada teria dado causa à cobrança ora em questão.

Ficou incontroverso que técnicos da requerida estiveram no imóvel da residência da parte autora.
Entretanto, a simples exposição dos fatos constituem apenas indícios, os quais, no entanto, por
estarem impugnados pela parte requerente não servem para comprovar cabalmente a
irregularidade apontada.

Desse modo, tem-se que a concessionária ré deve suportar o ônus da


impossibilidade/desnecessidade de realização da prova/perícia técnica, bem como da ausência
de sua juntada aos autos, não havendo que se falar em realização de prova indireta, já que seria
ela completamente inócua.

A simples alegação da ré, por si só, não é suficiente para se concluir pela irregularidade na
medição do consumo de energia elétrica da conta contrato da parte requerente. Destarte, não se
sustenta a tese de que o faturamento de energia foi realizado pela média de consumo, sendo a
fatura lançada arbitrariamente pela concessionária, sem qualquer critério razoável que pudesse
justificá-las.

Nesse sentido, cabe ressaltar que os Tribunais Pátrios por diversas vezes se deparou com a
impugnação de faturas de energia elétrica que possuem valores exorbitantes quando comparados
ao consumo médio da unidade habitacional. O entendimento majoritário é o de que cabe à
empresa concessionária, no termos do artigo 333, II, do CPC provar fato impeditivo, modificativo
ou extintivo do direito do autor.

Restou incontroverso nos autos que a conta de energia elétrica da unidade consumidora,
referente aos débitos citados, foi faturada com valor muito elevado, encontrando-se totalmente
dissonante de seu padrão de consumo, devendo, desta forma, ante a ausência de prova em
contrário, ser tornada inexistente.

Com isso, de rigor é a declaração de inexigibilidade do débito apurado, já que não houve
comprovação do efetivo consumo de tal valor pela parte autora.

DO PEDIDO DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO

Não há que se falar em restituição de valores, uma vez que a parte autora não comprovou o
efetivo pagamento da fatura contestada, ainda que em parte.

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O art. 42 do Código do Consumidor prescreve:

Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será


exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento
ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à


repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso
, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano
justificável.

A restituição, portanto, exige o pagamento, em excesso - pela irregularidade na cobrança, por


parte do consumidor, o que não se observa nos autos.

DO DANO MORAL

A respeito do dano moral, é assente no ordenamento jurídico que somente configura dano moral
a dor, o vexame, o sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente
no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em
seu bem-estar.

O mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da


órbita do dano moral, já que tais situações não são intensas e duradouras a ponto de romper o
equilíbrio psicológico do indivíduo.

Assim, não é qualquer dissabor ou constrangimento que deve ser alçado ao patamar de dano
moral.

Nesse sentido:

……….

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA


DE NULIDADE DE CONTRATO E INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA
COM REPETIÇÃO INDÉBITA E INDENIZATÓRIA. AUSÊNCIA DE
CONTRATAÇÃO. Tendo a parte autora negado a autenticidade da
assinatura do contrato que suporta a relação entre as partes, incumbe à ré,
que produziu o documento, o ônus de demonstrar a regularidade da
assinatura, do qual não se desincumbiu. Inteligência do art. 429, II, do CPC.
Hipótese em que a prova dos autos evidencia, portanto, que a parte autora
foi vítima de terceiro fraudador que celebrou contrato de financiamento
bancário em seu nome, razão pela qual deve ser declarada a nulidade do
contrato indevido e, por consequência, a inexigibilidade do débito.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. Diante do fato de que a própria
parte ré trouxe aos autos prova das parcelas pagas indevidamente pelo
consumidor, atinentes ao contrato de seguro de vida de apólice nº
0109300002344, devendo ser reconhecido o direito à repetição em dobro do
indébito (art. 42, parágrafo único, do CDC) com a devida correção monetária
e juro s d e mo ra . DANO S MO RAI S. MERA CO BRANÇA. N ÃO
CONFIGURAÇÃO. A simples cobrança ou menção de um débito, sem
qualquer elemento coercitivo lesivo de restrição de crédito, ainda que
inexistente o débito, não caracteriza dano moral. Situação retratada na inicial
que constitui mero aborrecimento decorrente da vida cotidiana, que não se
identifica com aquelas capazes de gerar dano extrapatrimonial. RECURSO
PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70076083047, Nona

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Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares
Delabary, Julgado em 18/12/2017).

No caso em comento, o demandante não comprovou a inserção de seu nome nos cadastros de
inadimplentes, o que afasta a ocorrência de situações vexatórias e/ou graves.

Ademais, conforme iterativa jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em relação aos danos
morais, “o simples descumprimento contratual, por si só, não é capaz de gerar danos morais. É
necessária a existência de uma consequência fática capaz de acarretar dor e sofrimento
indenizável por sua gravidade” (STJ, AgInt no REsp 1817480/SP, DJe 10/09/2019).

No mesmo sentido:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA -


DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO.
INSURGÊNCIA DO AUTOR. 1. A reforma do acórdão recorrido, a fim de se
concluir pela ocorrência de dano moral com base na cobrança indevida,
demanda o reexame de fatos e provas dos autos, prática vedada pela
Súmula 7/STJ. Precedentes. 2. A jurisprudência desta Corte é pacífica
quanto à inexistência de dano moral in re ipsa quando há mera
cobrança indevida de valores. Precedentes. 3. Agravo interno
desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1685959 RO 2017/0173653-1, Relator:
Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 04/10/2018, T4 - QUARTA
TURMA, Data de Publicação: DJe 11/10/2018) (grifo).

DISPOSITIVO

Diante do exposto, tomando por base o art. 487, inciso I, do CPC, julgo parcialmente
procedentes os pedidos para declarar a inexistência do débito (fatura) discutido nos presentes
autos, no valor de R$ 640,48, referente ao mês de agosto de 2018.

Sem condenação em danos morais, pois não demonstrado nos autos.

Condeno a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais arbitro


em 10% sobre o valor da causa, atualizados pelo IPCA-E.

Serve como mandado.

Publique-se. Registre-se e intimem-se.

Montes Altos/MA, 22 de agosto de 2023.

Myllenne Sandra Cavalcante Calheiros de Melo Moreira


Juíza de Direito
Titular da Comarca de Montes Altos

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