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ESTADO DO CEARÁ

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
GABINETE DESEMBARGADOR DURVAL AIRES FILHO

Processo: 0050440-28.2020.8.06.0043 - Apelação Cível


Apelante: Companhia Energética do Ceará - ENEL. Apelados: IBK - Indústria
de Borracha e Calçados Kaiana Ltda. e Sol Riso Industria de Calçados Eireli.
Custos Legis: Ministério Público Estadual ..

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL C/C


OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA.
FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE
DEFESA DO CONSUMIDOR. TEORIA FINALISTA MITIGADA. VULNERABILIDADE
TÉCNICA E ECONÔMICA. PRECEDENTE STJ. DEMANDA CONTRATADA.
RELATIVIZAÇÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. PANDEMIA DO
CORONAVÍRUS (COVID-19). CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR.
FATURAMENTO PELO CONSUMO EFETIVO. POSSIBILIDADE. ART. 393 DO
CÓDIGO CIVIL. PRECEDENTES DO TJCE. RECURSO CONHECIDO E NÃO
PROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.

ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 4ª Câmara Direito


Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em votação unânime, pelo
conhecimento e desprovimento do apelo, tudo em conformidade com os termos do
voto do eminente Desembargador Relator.

Fortaleza, data a ser indicada pelo sistema.

Presidente do Órgão Julgador

DESEMBARGADOR DURVAL AIRES FILHO


Relator

PROCURADOR (A) DE JUSTIÇA


ESTADO DO CEARÁ
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
GABINETE DESEMBARGADOR DURVAL AIRES FILHO

RELATÓRIO
Trata-se de Recurso de Apelação interposto pela Companhia
Energética do Ceará - ENEL, adversando a r. sentença de págs. 318/325, proferida
pelo d. juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Barbalha/CE, que, nos autos da AÇÃO
DE REVISÃO CONTRATUAL, C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER, C/C TUTELA DE
URGÊNCIA ANTECIPADA, proposta por Indústria de Borracha (IBK) e Calçados
Kaiana Ltda, julgou procedente em parte a aludida ação.

Na petição inicial às fls. 1/39, as autoras, afirmaram, em síntese, que


mantêm com a promovida contrato de Compra de Energia Regulada (CCER) e de
Uso do Sistema de Distribuição de Energia Elétrica (CUSD), estabelecendo o
pagamento por demanda contratada. Aduziram que com a pandemia (Covid-19) os
contratos se tornaram insustentáveis, haja vista que o Decreto Estadual n°
33.519/2020 determinou o isolamento social a partir de 20/03/2020, assim, as
requerentes, que atuam no ramo industrialização/comercialização de calçados,
ficaram impedidas de exercerem suas atividades. Diante disso, as autoras
defenderam que, em razão de força maior e fato superveniente (Covid-19), ocorreu
queda abrupta no faturamento das empresas, a ponto de justificar a necessidade
excepcional e temporária de revisão dos contratos, no sentido de que a cobrança de
energia fosse realizada pelo consumo efetivo e não pela demanda contratada, tendo
como marco inicial as faturas de março/2020, vencidas em abril/2020 e seguintes.
Ainda, argumentaram que deve ser aplicada, ao caso, a teoria do imprevisão, haja
vista que ocorreu fato extraordinário que tornou a obrigação excessivamente
onerosas, sendo a revisão do contrato medida que deveria ser imposta. Ademais,
afirmaram que deveria haver a compensação do valor da “demanda contratada”
contida nas faturas de março/2020, vencida em abril e já parceladas, com as faturas
subsequentes. Por fim, pleitearam pela concessão da tutela antecipada para que a
requerida se abstivesse de efetuar o corte de energia das promoventes, bem como
para que passasse a realizar, imediatamente, a cobrança de energia pelo consumo
efetivamente consumido.

A decisão interlocutória de fls. 160/166, deferiu parcialmente a tutela


de urgência, determinando a suspensão do pagamento na modalidade demanda
contratada, desde a fatura de abril/2020 com vencimento em maio/2020 e nas
faturas seguintes, enquanto permanecessem as medidas restritivas em razão do
enfrentamento à pandemia.

Embargos de declaração das requeridas às fls. 170/173.

Decisão interlocutória às fls.174/176, conheceu e negou provimento


aos embargos.

Na contestação às fls. 182/224, a promovida, defendeu que existe a


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possibilidade de solicitar, administrativamente, a redução da demanda contratada,


desde que efetuada por escrito e com antecedência mínima de 90 (noventa) dias e
que as suplicantes tinham pleno conhecimento dessas condições quando fez os
planos para seus negócios. Ainda, afirmou que, não obstante as alegações autorais,
não há nos autos nenhum documento que comprove o desequilíbrio contratual
gerado pela pandemia. Ademais, alegou que a pandemia atingiu tanto as
promoventes como a promovida, assim, não deve ser aplicada a teoria da
imprevisão, posto que tal teoria autoriza a revisão das obrigações contratuais
apenas quando existe onerosidade excessiva que afeta uma das partes. Para mais,
alegou que o corte do fornecimento de energia das autoras é autorizado por lei em
caso de inadimplência, haja vista que não exerce atividade essencial. Também,
argumentou que o pedido de antecipação de tutela não poderia ter sido deferido,
pois as demandantes não comprovaram a probabilidade do direito e o perigo de
dano para deferimento da medida. Alternativamente, requereu que a suspensão da
cobrança da demanda contratada limite-se aos meses em que houve proibição de
funcionamento das atividades das suplicantes, uma vez que não se justifica a
abstenção da cobrança pela demanda contratada após esse período.

Réplica às fls. 297/300.

Despacho de pág. 311, determinou a intimação das partes para que


indicassem se pretendiam produzir novas provas. Ressaltou que a inércia
importaria no julgamento antecipado da lide.

Sentença do juízo a quo às fls. 318/325, julgou parcialmente


procedentes os pedidos da inicial, nos seguintes termos:

“(...) Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido


inicial, confirmando em todos os seus termos a tutela de urgência
outrora deferida através das decisões de fls. 160-166 e 174-176,
cujos efeitos se consideram encerrados a partir de 15 de agosto
de 2020, diante da retomada de 100% das atividades da
promovente, conforme fundamentação retro.

Condeno a promovia no pagamento de custas e honorários


advocatícios, estes fixados em 10% do valor da causa. (...)”

Irresignada, a demandada interpôs Recurso de Apelação às fls.


332/352, pugnando pelo conhecimento e provimento do recurso para reformar
integralmente a sentença, para tanto, defendeu que não há nos autos nenhum
documento que comprove o desequilíbrio contratual gerado pela pandemia, por isso,
é inadmissível a relativização dos contratos, ainda, ressaltou que era ônus das
apeladas essa comprovação, uma vez que não se enquadram no conceito de
consumidoras. Além disso, argumentou que a não incidência da cobrança da
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demanda contratada contraria diretamente as disposições contratuais livremente


pactuadas pelas partes. Ademais, aduziu que é possível diminuir da demanda
contratada, contudo, faz-se necessária a observância do prazo mínimo exigido nos
contratos, isto é, 90 (noventa) dias, solução que não fora utilizada pelas apeladas.
Em conclusão, afirmou que a pandemia atingiu tanto as promoventes como a
promovida, assim, não deve ser aplicada a teoria da imprevisão, posto que tal teoria
autoriza a revisão das obrigações contratuais apenas quando existe onerosidade
excessiva que afeta uma das partes.

Contrarrazões às págs. 358/376, na qual as apeladas pugnam pelo


desprovimento do recurso, mantendo-se inalterada a sentença vergastada.

Parecer ministerial às págs. 384/389, onde a d. Procuradoria Geral de


Justiça deixa de se manifestar ante a ausência de interesse público que justifique
intervenção na demanda.

É o que importa relatar.

VOTO
De início, observo que o recurso preenche os requisitos extrínsecos
(recorribilidade do ato decisório, a tempestividade da irresignação, a singularidade
do recurso e preparo às págs. 353/354) e intrínsecos (legitimidade e inexistência de
fato impeditivo) de admissibilidade, pelo que dele conheço e passo à análise do
pleito formulado.

O ponto nodal da controvérsia cinge-se, em suma, quanto a suspensão


da cobrança do serviço de energia elétrica com base nos contratos celebrados entre
as partes de demanda contratada, em razão da pandemia de Covid-19 (caso fortuito
ou de força maior), determinando a cobrança com base no consumo efetivamente
utilizado.

A recorrente aduziu que as recorridas não se enquadram no conceito


de consumidor, haja vista que não eram consumidoras finais do serviço, já que
usava o serviço da requerida como meio para o seu negócio, isto posto, não deveria
ser aplicado o CDC ao presente caso.

O argumento não prospera. Explico.

Para aplicação da legislação no âmbito do Direito do Consumidor, a


doutrina majoritária brasileira baseia-se na teoria finalista, a qual define que
consumidor será a pessoa física ou jurídica, que adquira ou utilize o produto ou
serviço como destinatário final fático e econômico, é o que afirma o professor Bruno
Miragem:
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“Nosso entendimento é de que consumidor é pessoa física ou


jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final fático e econômico, isto é, sem reempregá-lo
no mercado de consumo com o objetivo de lucro” (MIRAGEM.
Bruno. Direito do Consumidor. Ano 2008. pág. 83. Revista dos
Tribunais).

Contudo, o Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido a


necessidade de abrandar o rigor do critério subjetivo do conceito de consumidor,
para admitir a incidência das normas do CDC a determinados consumidores
profissionais, desde que demonstrada sua vulnerabilidade técnica, jurídica ou
econômica, adotando o fenômeno denominado de teoria finalista mitigada ou
aprofundada. Vejamos precedente:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INVERSÃO. ÔNUS
DA PROVA. REQUISITOS. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
PESSOA JURÍDICA. TEORIA FINALISTA. MITIGAÇÃO.
VULNERABILIDADE. REEXAME DE PROVAS. 1. Recurso
especial interposto contra acórdão publicado na vigência do
Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos
nºs 2 e 3/STJ). 2. O Superior Tribunal de Justiça firmou
posicionamento no sentido de que a teoria finalista deve ser
mitigada nos casos em que a pessoa física ou jurídica,
embora não se enquadre nas categorias de fornecedor ou
destinatário final do produto, apresenta-se em estado de
vulnerabilidade ou hipossuficiência técnica, autorizando a
aplicação das normas previstas no Código de Defesa do
Consumidor. Precedentes. 3. Na hipótese, rever o entendimento
do tribunal de origem, que, com base nas provas carreadas aos
autos, concluiu pela caracterização da vulnerabilidade do
adquirente e pelo preenchimento dos requisitos para inversão do
ônus da prova, demandaria o reexame de fatos e provas,
procedimento inviável em recurso especial, a teor do disposto na
Súmula nº 7 /STJ. 4. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp
n. 1.856.105/RJ, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva,
Terceira Turma, julgado em 2/5/2022, DJe de 5/5/2022.) (g.n)

No presente caso, as apeladas se encontram em situação de


vulnerabilidade técnica e econômica em relação à recorrente, haja vista que esta é
empresa de grande porte, concessionária de serviço público, possuindo nível de
conhecimento técnico muito superior ao das autoras, que apenas utilizam o serviço
de fornecimento de energia.

Portanto, embora as promoventes não sejam as usuárias finais do


serviço, é nítida sua vulnerabilidade técnica e econômica em relação à empresa
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promovida, o que justifica a incidência da legislação consumerista, cuja aplicação se


impõe em garantia da paridade de meios, do equilíbrio entre as forças constantes e
da facilitação da defesa da hipossuficiente em juízo.

Consoante acima relatado, a questão circunda contrato de prestação


de serviço celebrado entre as partes, relativo à demanda contratada do serviço de
fornecimento de energia elétrica, entendida essa como a capacidade máxima de
fornecimento para o cliente, disponibilizada pela concessionária de acordo com a
necessidade de cada consumidor, informada quando da contratação dos serviços.

No caso da referida contratação, a ANEEL, por meio da Resolução nº


414/2010, em seu art. 54, inc. I, estabelece que a cobrança será realizada na forma
binômia e constituída por duas tarifas únicas, a saber: a demanda de potência e o
consumo de energia, determinando o art. 2º, inc. XXI, da mesma Resolução, que
nos casos de demanda contratada, o valor da demanda deve ser integralmente
paga, seja ou não utilizada durante o período de faturamento.

Pois bem, o contrato celebrado entre as partes (fls. 60/131), regido


pelo que dispõe o Código Civil, mormente no que dispõe o art. 393, expressamente
previu a possibilidade de suspensão parcial do contrato se sobrevier caso fortuito ou
força maior, senão vejamos teor do dispositivo legal citado:

Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de


caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por
eles responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no


fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

Nesse contexto, o Estado do Ceará, através do Decreto Legislativo n.°


543, de 03 de abril de 2020, decretou a ocorrência de calamidade pública no âmbito
estadual, por conta da pandemia da COVID-19 (coronavírus), bem como o Decreto
n.° 33.510, de 16 de março de 2020, que, em razão das dificuldades provocadas
pela doença, declarou situação de emergência em saúde em todo o território
estadual, sobrevindo a edição de vários decretos estaduais subsequentes
determinando a paralisação das atividades não essenciais em todo o Estado do
Ceará, as quais, eram reanalisadas diuturnamente pela equipe de Governo
Estadual, com retorno gradual setorial, como é de conhecimento público.

É nesse contexto que a parte autora ingressou com a ação de piso,


visando o reconhecimento de caso fortuito ou de força maior, pleiteando que a
cobrança do serviço fosse realizada em razão do consumo efetivo, o qual em franca
queda, em detrimento do contrato avençado, para o pagamento da integralidade da
demanda contratada.
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Acontece que, de acordo com o art. 317 c/c 479 do Código Civil, em
razão de fato superveniente e imprevisível, torna-se possível a revisão contratual
temporária, visando reestabelecer o equilíbrio contratual e paridade entre os
contratantes. Ora, diante do cenário de enfrentamento à pandemia do coronavírus,
situação de caso fortuito ou força maior, é perfeitamente aplicável a r. revisão
contratual, de modo que o a cobrança se dê apenas com base no efetivo consumo
de energia elétrica.

Aliás, esse é o entendimento que vem sendo adotado por este Egrégio
Tribunal Estadual de Justiça, senão vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA


QUE DETERMINOU A COBRANÇA DA CONTA DE ENERGIA
ELÉTRICA POR EFETIVO CONSUMO. CASO FORTUITO
CONFIGURADO. COVID-19. SUSPENSÃO DAS ATIVIDADES
NÃO ESSENCIAIS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO
CONHECIDO E NÃO PROVIDO. - O cerne da controvérsia diz
respeito ao pagamento do efetivo consumo de energia elétrica
pela empresa ora recorrida, ao invés do adimplemento do valor da
demanda contratada inicialmente com a ENEL, em virtude da
crise econômica advinda da pandemia causada pela Covid-19. -
Sabe-se que o princípio pacta sunt servanda, apesar de reger
os contratos entabulados entre os litigantes, não possui
aplicabilidade absoluta. Dessa forma, em situações de caso
fortuito ou força maior, os contratos podem ser flexibilizados,
sem que se configure quebra por uma das partes, mas, em
verdade, visando a própria continuidade da avença firmada,
conforme exegese do art. 393 do Código Civil. - Nessa linha de
raciocínio, é forçoso destacar que a parte apelada não pretende a
rescisão do contrato, mas apenas que a cobrança seja feita,
provisoriamente, pelo consumo efetivo medido, enquanto perdurar
a situação de anormalidade retratada. - Nesses termos, observa-
se que o contrato entabulado entre as partes preconiza, à
cláusula 24 (fl. 31), a possibilidade de, em caso de uma das
partes não poder cumprir quaisquer de suas obrigações por
motivo de caso fortuito ou força maior, suspensão da obrigação
por tempo igual ao da duração do evento e proporcionalmente aos
seus efeitos. - Lançadas essas premissas, considera-se possível
a cobrança apenas da energia efetivamente consumida, enquanto
durar o estado de calamidade ou as medidas de isolamento
social, uma vez que a situação relatada pelo promovente
certamente se enquadra na hipótese constante na cláusula
retromencionada, em razão da pandemia da Covid-19. - Portanto,
conforme entendimento exarado na decisão adversada, é viável a
cobrança da fatura de energia elétrica da parte apelada com base
na leitura do medidor e no consumo efetivo, e não pela demanda
contratada, enquanto perdurarem as normas restritivas editadas
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pelos Decretos Estaduais. - Além disso, vale dizer, tais


acontecimentos não fazem parte do risco do negócio que a
empresa demandante resolveu explorar, sendo fato externo,
estranho à atividade normalmente desempenhada pelo autor. -
Por fim, importante ponderar que a decisão de origem visou à
manutenção das atividades econômicas, mas sem pender o
reequilíbrio contratual a um dos lados, pois, em nenhum
momento, concordou manter eventual inadimplemento, mas, tão
somente, o pagamento pelo efetivo consumo. - Ademais, sabe-se
que o ramo hoteleiro foi uma das atividades mais afetadas pelo
lockdown devido às medidas de prevenção impostas, ante a
necessidade de um fluxo de consumidores que, em sua grande
maioria, é composta por turistas e visitantes, acarretando uma
queda brusca no faturamento mensal da empresa. - Recurso
conhecido e improvido. Sentença mantida. ACÓRDÃO: Vistos,
relatados e discutidos estes autos, acorda a 3ª Câmara de Direito
Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por maioria,
em conhecer e negar provimento ao Recurso, nos termos do Voto
Relator de fls. 352/359, subscrito pela eminente Desembargadora
Maria Vilauba Fausto Lopes. Fortaleza, data e hora da assinatura
digital. JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA Desembargadora
Relatora (Apelação Cível - 0227250-81.2020.8.06.0001, Rel.
Desembargador(a) JANE RUTH MAIA DE QUEIROGA, 3ª
Câmara Direito Privado, data do julgamento: 27/07/2022, data da
publicação: 31/07/2022) (g.n)

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE


OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE
URGÊNCIA. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA.
RELATIVIZAÇÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS.
PANDEMIA DO COVID-19. CASO FORTUITO E DE FORÇA
MAIOR. ARTIGO 317 E 393 DO CÓDIGO CIVIL. SENTENÇA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Cinge-se
o presente recurso apelatório na aferição da suspensão da
cobrança de serviço de energia elétrica com base no contrato
celebrado, em decorrência da pandemia do COVID-19.
Determinando a mudança da classificação do consumidor diante
da impossibilidade de adimplir com suas obrigações. Ao analisar
os autos, é entendido que a questão é referente ao contrato de
prestação de serviço celebrado entre as partes em relação a
serviço de fornecimento de energia elétrica, qual estabelece que
independente do consumo, a apelante deve pagar um a valor a
título de consumo mínimo estipulado na contratação. Desde o
final de 2019, o planeta se deparou com um novo tipo de
vírus, COVID-19 (coronavírus). Por se espalhar de maneira
rápida e ter uma taxa de letalidade a ser observada, foi
imprescindível que todos os países adotassem medidas em
busca de conter o avanço dessa nova doença e muitas
pessoas foram afetadas por elas. Nesse cenário, os
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governantes tiveram que tomar medidas drásticas para que


evitasse a propagação da doença. No âmbito estadual,
através do Decreto Legislativo nº 543/2020 e nº 33.510/220,
quais determinaram a paralisação das atividades não
essenciais em todo o Estado. Embora a regra seja que as
partes devem cumprir fielmente com as cláusulas previstas
no contrato em observância ao princípio do pacta sunt
servanda, ele não é absoluto. Observando os artigos 317, 393
do CPC, é analisado que em razão de motivos imprevisíveis e
inevitáveis, como casos fortuitos ou de força maior, esse
princípio pode ser flexibilizado, buscando uma forma de
evitar que um dos contratantes saia prejudicado e com mais
ônus da situação. Sendo assim, diante do cenário vivenciado
aplicando-se ao caso em análise, é completamente
compatível por se tratar de caso fortuito ou de força maior,
sendo necessária a revisão contratual, de maneira que a
cobrança seja realizada com base no consumo de energia
elétrica, afastando o contrato. 7. Sentença mantida. Recurso
conhecido e desprovido. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e
discutidos estes autos, acorda a 2ª Câmara Direito Privado do
Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em conhecer do presente
recurso e negar-lhe provimento para manter a sentença, nos
termos do voto da eminente Relatora. Fortaleza, 18 de Maio de
2022. CARLOS ALBERTO MENDES FORTE Presidente do
Órgão Julgador DESEMBARGADORA MARIA DAS GRAÇAS
ALMEIDA DE QUENTAL Relatora (Apelação Cível -
0228065-78.2020.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) MARIA DAS
GRAÇAS ALMEIDA DE QUENTAL, 2ª Câmara Direito Privado,
data do julgamento: 18/05/2022, data da publicação: 18/05/2022)
(g.n)

AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE


DEFERIU A TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA.
VERIFICAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES
PARA A CONCESSÃO. ABSTENÇÃO DE COBRANÇA POR
TARIFA FIXA E SUSPENSÃO DOS SERVIÇOS DE ENERGIA
ELÉTRICA. COBRANÇA POR FATURAMENTO. FATO
EXCEPCIONAL CONFIGURADO. PANDEMIA DO
CORONAVIRUS (COVID-19). DECISÃO OBJURGADA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Trata-
se de Agravo de Instrumento com Pedido de Efeito Suspensivo,
interposto contra decisão proferida pelo d. Juízo da 34ª Vara Cível
da Comarca de Fortaleza-CE, às fls. 220/224, que concedeu
liminar a favor do Autor/Agravado, em demanda judicial aforada
por Ceará Combustíveis Ltda. em desfavor de Companhia
Enérgica do Ceará – ENEL. 2. Sustenta a recorrente que a
recorrida não se enquadra nos termos de consumidor final do
CDC, bem como havia a possibilidade de redução de demanda,
desde que solicitada com antecedência de 90 (noventa) dias. 3.
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No caso dos autos, cumpre enfatizar, que a pandemia oriunda do


Covid-19 sobreveio de forma súbita, de modo que não tinha como
a empresa autora/agravada se precaver e solicitar a redução da
demanda de energia elétrica dentro do período oportunizado.
Ressalta-se, que devido à gravidade da crise pandêmica foi
imperiosa a decretação de estado de emergência e determinação
de delimitação das atividades comerciais (essenciais), o que
acarretou a redução das atividades desempenhadas pela
recorrida, e consequentemente, o consumo de energia elétrica. 4.
É de comum sabença, que na regra contratual impera o
princípio pacta sunt servanda, ou seja, as cláusulas
contratuais devem ser fielmente cumpridas. Entretanto, em
casos excepcionais, tais como, caso fortuito ou força maior,
os contratos podem e devem ser flexibilizados, conforme
dispõe o artigo 393 do vigente Código Civil. 5. De acordo com
o julgamento do Resp. 951.785/RS, o Superior Tribunal de Justiça
consolidou entendimento de que: "Mesmo nas relações entre
pessoas jurídicas, se da análise da hipótese concreta decorrer
inegável vulnerabilidade entre a pessoa jurídica consumidora e a
fornecedora, deve-se aplicar o CDC na busca do equilíbrio entre
as partes. Ao consagrar o critério finalista para interpretação do
conceito de consumidor, a jurisprudência deste STJ também
reconhece a necessidade de, em situações específicas, abrandar
o rigor do critério subjetivo do conceito de consumidor, para
admitir a aplicabilidade do CDC nas relações entre fornecedores e
consumidores empresários em que fique evidenciada a relação de
consumo." 6. Recurso conhecido e não provido. (Relator (a):
FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO; Comarca: Fortaleza;
Órgão julgador: 34ª Vara Cível; Data do julgamento: 30/09/2020;
Data de registro: 30/09/2020) (g.n)

E desta 4ª Câmara de Direito Privado, colho:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER


C/C PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA.
FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. DEMANDA
CONTRATADA. RELATIVIZAÇÃO DAS CLÁUSULAS
CONTRATUAIS. PANDEMIA DO CORONAVÍRUS (COVID-19).
CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR. FATURAMENTO PELO
CONSUMO EFETIVO. POSSIBILIDADE. ART. 393 DO CÓDIGO
CIVIL. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA
MANTIDA. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos,
acorda a 4ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do
Estado do Ceará, em votação unânime, pelo conhecimento e
improvimento do Apelo, tudo em conformidade com os termos do
voto do e. Desembargador Relator. Fortaleza, 31 de agosto de
2021 RAIMUNDO NONATO SILVA SANTOS Presidente do Órgão
Julgador DESEMBARGADOR DURVAL AIRES FILHO Relator
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Procurador de Justiça (Apelação Cível -


0238151-11.2020.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) DURVAL
AIRES FILHO, 4ª Câmara Direito Privado, data do julgamento:
31/08/2021, data da publicação: 31/08/2021) (g.n)

AGRAVO INTERNO E AGRAVO DE INSTRUMENTO. AMBOS


OS RECURSOS TRAZIDOS A JULGAMENTO
CONJUNTAMENTE NA MESMA SESSÃO. PERDA DO OBJETO
DO AGRAVO INTERNO. RECURSO PREJUDICADO. DIREITO
PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE COMPRA DE ENERGIA
REGULADA COM PREVISÃO DE COBRANÇA DE DEMANDA
CONTRATADA. PANDEMIA DO CORONAVÍRUS (COVID-19).
PEDIDO DE SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DAS OBRIGAÇÕES
CONTRATUAIS. CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR. ART.
393 DO CC. PREVISÃO EM CLÁUSULA CONTRATUAL. O
JUÍZO A QUO DEFERIU O PLEITO. DECISUM QUE NÃO
CARECE DE REFORMA. A vexata quaestio objeto do presente
recurso consiste em decidir se merece reforma o decisum
hostilizado que deferiu o pedido de tutela de urgência formulado
pela autora, ora agravada, para determinar a suspensão da
cobrança pela demanda contratada prevista, permitindo a
cobrança apenas do consumo efetivo, assim como determinou a
abstenção da suspensão do fornecimento de energia elétrica, sob
pena de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) limitado ao
numerário de 100.000,00 (cem mil reais). A questão posta é
permeada pelo contrato de prestação de serviço celebrado
entre as partes, relativo a demanda contratada do serviço de
fornecimento de energia elétrica, entendida essa como a
capacidade máxima de fornecimento para o cliente,
disponibilizada pela concessionária de acordo com a
necessidade de cada consumidor, informada quando da
contratação dos serviços. A modalidade de tarifa convencional,
para os consumidores do grupo A, é aplicada considerando o
binômio tarifa única para a demanda de potência (KW) e tarifa
única para consumo de energia (R$/MWh) (art. 54, I, da
Resolução 414/2010 da ANEEL). Nesse tipo de tarifa (demanda
contratada), o valor deve ser integralmente pago, utilizada ou não
durante o período de faturamento (art. 2º, XXI, da Resolução
414/2010 da ANEEL). Compulsando os autos, verifica-se que o
contrato de fls. 29/45 que regula a relação entre a agravante e a
agravada traz em sua cláusula 40 o caso de fortuito e força maior.
Observa-se que guarda consonância legal com o art. 393 do
Código Civil que estabelece que "o devedor não responde pelos
prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se
expressamente não se houver por eles responsabilizado". Verifica-
se o caso fortuito e força maior no fato necessário, cujos efeitos
não era possível evitar ou impedir (parágrafo único do art. 393 do
CC). Para estabelecer o contexto em que se insere a lide, em
meio à pandemia foi editado o Decreto do Poder Executivo
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GABINETE DESEMBARGADOR DURVAL AIRES FILHO

estadual de nº 510, de 16/03/2020, em que foi decretada situação


de emergência em saúde e estabeleceu medidas para
enfrentamento e contenção da infecção humana pelo novo
Coronavírus. Ao referido decreto, seguiram-se diversos outros
determinando a paralisação das atividades não essenciais em
todo o Estado do Ceará, as quais, vem sendo reanalisadas
diuturnamente pela equipe de Governo Estadual, com retorno
gradual setorial, como é de conhecimento público. Recentemente,
em 10/04/2021, por meio do Decreto Estadual nº 34.031/21,
houve o anúncio por parte do governo do Estado, no que foi
acompanhado pela Prefeitura de Fortaleza, da postergação das
medidas para combater o avanço do coronavírus, em razão da
suspeita da nova variante no Ceará, ocasião em que foi informada
a renovação do decreto de calamidade pública no Ceará e a
manutenção de isolamento social com medidas mais duras, tais
como: de segunda a domingo, das 20h às 6h do dia seguinte, fica
suspenso o funcionamento de quaisquer atividades do comércio
ou serviços não essencial e sábados e domingos o atendimento
presencial em restaurantes, barracas de praia e demais
estabelecimentos para alimentação fora do lar somente poderão
funcionar para almoço, até 15h. Acompanhamos notícias de
novas variantes do vírus, falência do sistema de saúde com falta
de leitos de UTI nas redes públicas e privadas, falta de
abastecimento de oxigênio, essencial para a manutenção
daqueles acometidos com sintomas graves, aumento de
internações e óbitos. Verdadeira crise humanitária. Dito isso,
percebe-se o momento delicado para todos os setores da
sociedade e da economia em que se verifica o dilema em manter
os negócios ou fechar as portas diante das dificuldades. É nesse
contexto que a parte agravada ingressou com a ação, visando o
reconhecimento de caso fortuito ou de força maior, pleiteando que
a cobrança do serviço fosse realizada em razão do consumo
efetivo, o qual em franca queda, em detrimento do contrato
avençado, para o pagamento da integralidade da demanda
contratada. Sem se prolongar no mérito da ação principal, restou
demonstrada a probabilidade do direito diante do quadro
delineado, na medida em que o que está acontecendo não é algo
previsível em que fosse possível se preparar pra enfrentar sem
que haja perdas para todos. É momento de concessões em
benefício de todos os afetados pelo coronavírus de modo a
amortecer os piores impactos, que, neste caso, em última análise
representa a manutenção da vida, da atividade econômica e de
emprego e renda. É fácil perceber, no presente caso, o perigo de
dano ou o risco ao resultado útil do processo, e desnecessária
maiores aprofundamentos, tendo em vista que o atraso no
pagamento da fatura de energia elétrica enseja o corte no
fornecimento de serviço essencial, que é a energia elétrica.
Mesmo com a baixa lotação do serviço de hotelaria, é necessário
para a preservação de alimentos e manutenção da estrutura.
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GABINETE DESEMBARGADOR DURVAL AIRES FILHO

Assim, não se vislumbra fundamentos fáticos ou jurídicos para


reformar a decisão vergastada, devendo ser confirmada na
íntegra, enquanto não sobreviver mudança fática ou decisão de
mérito. Agravo interno prejudicado. Agravo de instrumento
conhecido e improvido. (Relator (a): MARIA DO LIVRAMENTO
ALVES MAGALHÃES; Comarca: Fortaleza; Órgão julgador: 4ª
Vara Cível; Data do julgamento: 04/05/2021; Data de registro:
04/05/2021) (g.n)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. TUTELA DE


URGÊNCIA CONCEDIDA. PROBABILIDADE DO DIREITO.
ARTIGO 393 DO CÓDIGO CIVIL. PANDEMIA CORONA VÍRUS
(COVID-19). RELATIVIZAÇÃO DAS CLÁUSULAS
CONTRATUAIS. PERIGO DE DANO GRAVE DEMONSTRADO.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. A questão posta em
análise cinge-se em verificar se estão presentes os requisitos
legais para a concessão da tutela de urgência requerida na inicial,
nos termos do artigo 300 do CPC: probabilidade do direito
alegado e perigo de dano grave. Em que pese os argumentos da
parte agravante, infere-se da leitura da decisão impugnada que o
magistrado apresentou fundamentação adequada para deferir a
tutela de urgência, porquanto concluiu que a crise financeira
decorrente da pandemia do corona vírus (COVID-19) pode ser
considerada uma hipótese de caso fortuito e força maior, impondo-
se, por consequência, a aplicação da regra disposta no artigo 393
do Código Civil in verbis: "O devedor não responde pelos
prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se
expressamente não se houver por eles responsabilizado.". Não
obstante o princípio pacta sunt servanda preconize que as
cláusulas contratuais devem ser cumpridas, nas situações de
caso fortuito ou força maior, os contratos podem e devem ser
flexibilizados, visando a própria continuidade do pacto
firmada. Outrossim, é notório que no momento atual vive-se uma
crise sanitária decorrente da pandemia do novo corona vírus
(Covid-19) decretada pela Organização Mundial de Saúde, o que
levou o Congresso Nacional a reconhecer estado de calamidade
pública do país (Decreto Legislativo n.º 6, de 20 de março de
2020), gerada pela famigerada patologia. Com a finalidade
enfrentar a citado vírus, o Estado do Ceará editou o Decreto nº
33.519, de 19/03/2020, o qual determinou a suspensão do
funcionamento de diversas atividades econômicas consideradas
não essenciais. Também, mostra-se correta a conclusão do
magistrado pela existência de perigo de dano grave, pois a
manutenção integral do contrato geraria, diante das
peculiaridades do caso, perigo de dano grave e de difícil
reparação a empresa recorrida. Quanto ao valor da multa imposta,
não se mostra adequado, nessa fase processual, seu
redimensionamento, pois não há notícias do descumprimento da
decisão judicial recorrida e, por consequência, da sua incidência.
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Além disso, o valor imposto pelo magistrado mostra-se


proporcional e adequado à finalidade coercitiva da multa. Agravo
de Instrumento conhecido e não provido. (Relator (a): RAIMUNDO
NONATO SILVA SANTOS; Comarca: Fortaleza; Órgão julgador:
29ª Vara Cível; Data do julgamento: 29/09/2020; Data de registro:
29/09/2020) (g.n)

Pelo exposto, embora a recorrente defenda que existia a possibilidade


de redução de demanda, desde que solicitada com antecedência de 90 (noventa)
dias, o argumento não prospera, haja vista que a pandemia oriunda do Covid-19
sobreveio de forma súbita, de modo que não tinha como as apeladas se precaverem
e solicitar a redução da demanda de energia elétrica dentro do período
oportunizado.

Em conclusão, é incontroverso que a apelante também fora afetada


pela crise econômica ocasionada pela pandemia, contudo, a onerosidade maior é
das apeladas, visto que tiveram suas atividades suspensas pelas restrições
sanitárias impostas em razão da COVID-19, razão pela qual a relativização faz-se
necessária.

Portanto, o caso em questão reflete exatamente a situação em que o


contrato não fora cumprido por razões alheias às vontades das partes, mormente
pela imprevisibilidade causada pela pandemia do coronavírus, motivo pelo qual se
faz necessária a flexibilização dos contratos, a fim de garantir o equilíbrio das
relações contratuais.

Ante o exposto, diante dos fundamentos fáticos, legais e


jurisprudenciais acima expendidos, voto pelo CONHECIMENTO e
DESPROVIMENTO do presente recurso apelatório, mantendo-se inalterada a
sentença vergastada.

Custas e honorários advocatícios a cargo da promovida, estes últimos


arbitrados em 15% do valor atualizado da causa, a teor do art. 85, § 11, do CPC.

É como voto.

DESEMBARGADOR DURVAL AIRES FILHO


Relator

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